RESISTÊNCIA À TRAÇÃO DE AREIA ASFALTO USINADA A QUENTE (AAUQ)
COM ADIÇÃO DE FIBRAS METÁLICAS
PRISCILA
FIOCHI BENTO
Mestre
Universidade de
Brasília - UNB
Brasília - Brasil
JOSÉ CAMAPUM
DE CARVALHO
PhD
Universidade de
Brasília
Brasília - Brasil
SUMÁRIO
A região petrolífera de Urucu localiza-se no município de Coari, situado a 650Km da capital do
estado, apresentando características que tornam inviáveis a execução de serviços de
pavimentação usualmente utilizados nas grandes cidades. Assim, utilizou-se para a execução
de areia asfalto usinada a quente (AAUQ) duas areias regionais, que foram submetidas a ensaio
Marshall para verificar as propriedades de estabilidade e fluência. Para as amostras que
apresentaram melhor desempenho foi efetuado ensaio de tração por compressão diametral com
fibra metálica, variando o teor da mesma.
1. INTRODUÇÃO
A região Amazônica caracteriza-se por um clima tropical quente e úmido com altas
temperaturas e elevados índices pluviométricos durante a maior parte do ano. Com o seu
desenvolvimento surgiu a necessidade de se integrar os espaços, necessitando, assim, da
construção de novas rodovias. Os principais problemas encontrados nas obras executadas na
região Amazônica são [1]:
• Carência de material granular associada à dificuldade de transporte do mesmo;
• Existência de solos com baixa capacidade de suporte;
• Solos sensíveis à variação de umidade;
• Altos índices pluviométricos, que aceleram a degradação do pavimento.
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Devido a essas características, as obras rodoviárias se tornam cada vez mais complexas, na
medida em que o solo se torna muito úmido, dificultando a compactação e provocando a rápida
deteriorização do pavimento.
Dentro deste contexto situa-se a área de estudo, localizada no município de Coari, interior do
estado do Amazonas. Lá se encontra o pólo de produção de gás natural e petróleo da
Amazônia, denominado Província Petrolífera de Urucu. Com o seu advento, foi necessário a
construção de uma infra-estrutura adequada tornando-se necessária à construção de estradas de
acesso para os diversos pontos de extração de gás e petróleo dentro da província, a fim de
facilitar a entrada de máquinas e equipamentos assim como possibilitar o escoamento da
produção até o local de transporte.
Inicialmente muitos problemas foram encontrados com o solo local, assim como também para
o revestimento asfáltico, uma vez que a região não dispunha de material pétreo para a execução
dos revestimentos usualmente utilizados. Assim, optou-se pela execução de AAUQ com duas
areias regionais: areia fina, proveniente do Rio Urucu e a areia grossa, proveniente da cidade
de Coari.
Projetos de pesquisa já foram desenvolvidos no local [2], resolvendo parcialmente os
problemas no que diz respeito à baixa capacidade de suporte do solo local. Porém, em alguns
trechos, existe o aparecimento de trincas (Figura 1) que se tornam caminhos preferenciais de
água acelerando a degradação do pavimento.
Figura 1: Trinca localizada no revestimento.
Portanto, o presente artigo trata da incorporação de fibras metálicas na massa asfáltica assim
como da incorporação de cal à mesma, sendo sua influência no comportamento mecânico
avaliada por meio do ensaio de resistência à tração. O uso desse ensaio objetiva avaliar a
influência da fibra no combate ao processo de fissuração.
2. MATERIAIS UTILIZADOS
2.1 Fibras Metálicas
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As fibras metálicas utilizadas foram fornecidas pela BELGO MINEIRA no modelo RC 60/35,
e apresentam as especificações da Tabela 1. As porcentagens empregadas para os ensaios de
tração foram de 0,50%, 1,00% e 2,00%.
Tabela 1 - Especificações da fibra metálica Dramix RC 65/35.
Fator de Forma (L/D)
Comprimento (mm) e Diâmetro (mm)
Resistência a Tração (MPa)
64
35 e 0,55
1150
2.2 Cal
A cal utilizada é do tipo calcítica hidratada (CH-I) e foi empregada como material de
enchimento (filler) para a confecção da AAUQ. O peso específico real dos grãos é de 22,90
kN/m³ e suas características químicas bem como a granulometria encontram-se na Tabela 2 e
Figura 2, respectivamente.
Tabela 2 - Características da cal utilizada nas misturas solo-cal (Petrobrás).
Componentes
Fórmula
Estado Físico
Massa-molar
Concentração
Principais
Química
Hidróxido de Cálcio
Sólido pó
Ca (OH)2
74,10g/gmol
90,00%
Sílica
Sólido pó
SIO2
60,08g/gmol
2,50%
Hidróxido de Magnésio
Sólido pó
Mg(OH)2
58,08g/gmol
2,00%
Granulometria
Sem Ultra Som
Com Ultra Som
100,0
90,0
80,0
% que passa
70,0
60,0
50,0
40,0
30,0
20,0
10,0
0,0
0,00001
0,0001
0,001
0,01
0,1
1
Diâmetro das Partículas (mm)
Figura 2 - Granulometria da cal estudada.
Para o seu emprego como filler em AAUQ, deve se enquadrar nos parâmetros de granulometria
exigidos pela norma vigente [3], como é apresentado na Tabela 3.
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Tabela 3 - Granulometria para utilização de cal como filler .
Peneira
% mínima passando [3]
% passando
Nº 40
100
100
Nº 80
95
97,05
Nº 200
65
94,31
2.3 Betume
O betume utilizado foi o cimento asfáltico de petróleo (CAP) oriundo da Refinaria Isaac Sabbá
(REMAN). Suas características e normas correlatas apresentam-se na Tabela 4.
Tabela 4 - Características do betume utilizado na mistura asfáltica.
Valor
Características
Norma
Especificação
Encontrado
Ponto de Amolecimento (ºC)
54
MB-164/72
Anotar
Ductilidade a 25 ºC (cm)
100
MB-167
20
Ponto de Fulgor e Combustão (ºC)
342
MB-50/89
235
Viscosidade Saybolt Furol a 135ºC (s)
196
MB 517/71
120
DNER-ME
Densidade Aparente (g/cm³)
1,0039
Anotar
193/96
DNER-ME
Penetração (0,1mm)
50
50
003/99
Assim, o material utilizado é classificado como CAP-20 de acordo com a sua viscosidade e
como CAP 50/60 segundo a penetração.
2.4 Areias
Foram utilizados dois tipos de areia: uma oriunda do Rio Urucu, denominada aqui de Areia A e
a outra da cidade de Coari, denominada de Areia B. O peso específico real dos grãos
encontrado foi de 25,43 kN/m³ e 26,38 kN/m³ respectivamente, sendo a granulometria
apresentada na Figura 3 e executada de acordo com a especificação exigida [4].
Como especificação de agregado para AAUQ, as areias estudadas devem apresentar
equivalente de areia igual ou superior a 55%. O ensaio visa detectar a presença de materiais
finos, geralmente argilas, que possam modificar o comportamento da mistura betuminosa [5].
Para as areias estudadas os valores de equivalente de areia apresentados foram de 97% e 95%
para as areias A e B, respectivamente.
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Areia B
Areia A
100,00
90,00
80,00
% Passando
70,00
60,00
50,00
40,00
30,00
20,00
10,00
0,00
0,01
0,1
Diâm etro (m m )
1
10
Figura 3 - Granulometria das areias utilizadas para a confecção da mistura asfáltica.
3. METODOLOGIA
A confecção da AAUQ é realizada por meio da combinação de 3 componentes que são: areia,
ligante e material de enchimento (filler, que pode ou não ser utilizado). Esses materiais,
isoladamente e quando misturados, devem apresentar determinadas características estipuladas
em norma, a fim de que possam estar aptos à utilização para tal finalidade. Desta forma, o
material utilizado como agregado deve enquadrar-se em uma das faixas contidas na Tabela 5.
Tabela 5 - Faixas granulométricas especificadas para as misturas de AAUQ [3].
Peneira
Abertura
(mm)
4
10
40
80
200
4,8
2
0,42
0,18
0,074
A
100
90-100
40-90
10 a 47
0-7
% que passa
B
100
90-100
30-95
5 a 60
0 - 10
C
100
85-100
25-100
0-62
0-12
Inicialmente avaliou-se em que faixa se enquadrava a mistura. Optou-se em seguida pela
mistura 2 para a avaliação do comportamento mecânico. Para isso o método escolhido foi o
Ensaio Marshall [6], permitindo verificar as condições de vazios, estabilidade e fluência da
mesma. Para o tipo de revestimento estudado, as especificações estão descritas na Tabela 6. O
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teor de betume inicial considerado foi de 7%, em vista de ser o mínimo recomendado,
verificando o comportamento das misturas para a especificação mínima.
Tabela 6 - Valores exigidos para AAUQ [3].
Porcentagem de Vazios (%)
3a8
Relação Betume-Vazios (%)
65-82
Estabilidade Mínima (Kgf)
150 (50 golpes)
Fluência (mm)
2,4 a 4,5
Para as amostras que apresentaram bom desempenho no Ensaio Marshall enquadrando-se nos
parâmetros estabelecidos para AAUQ, foi realizado ensaio de tração por compressão diametral
nos teores já especificados [7]. Este ensaio utiliza a prensa Marshall por meio da adaptação de
dois frisos metálicos como mostra a Figura 4.
Figura 4: Ensaio de tração por compressão diametral.
4. RESULTADOS
4.1 Enquadramento em faixa especificada
A mistura 1 é composta pela Areia A e enquadrou-se na faixa B. A mistura 2 é composta pela
areia B e enquadrou-se na faixa C (Figura 5). Para a mistura 1 a areia apresenta-se uniforme
sendo os grãos de menores diâmetros sobrepondo o limite inferior exigido pela faixa
granulométrica, enquanto que os grãos de maior diâmetro sobrepõe o limite superior. Para a
mistura 2, apesar da boa distribuição do tamanho dos grãos, encontra-se próxima do mínimo
exigido pela faixa em que se enquadra.
Dada a melhor distribuição granulométrica da mistura 2 e os melhores resultados preliminares,
optou-se pela utilização desta mistura na continuidade do estudo. Vale ressaltar que os dois
tipos de areia, são os únicos materiais disponíveis na região para a confecção do revestimento
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asfáltico, sendo necessário identificar a mistura que apresente melhor desempenho a fim de
aproveitar ao máximo suas características para essa finalidade.
Mistura 1
100
% Passando
80
60
40
20
0
0,01
0,10
Máximo - Faixa B
. (mm)
Diâmetro
1,00
Mínimo - Faixa B
10,00
Mistura 1
Mistura 2
120
% Passando
100
80
60
40
20
0
0,01
0,10
1,00
10,00
Diâmetro (mm)
Máximo - Faixa C
Mínimo - Faixa C
Mistura 2
Figura 5: Composição granulométrica para as misturas 1 e 2.
4.2 Ensaio Marshall
A composição que apresentou melhor comportamento foi a mistura 2 com e sem adição de cal
[8]. A Tabela 7 mostra os parâmetros do ensaio Marshall obtidos para as duas combinações de
materiais na preparação da AAUQ, sendo essas misturas utilizadas no ensaio de resistência à
tração.
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Tabela 7: Misturas utilizadas para ensaio de resistência à tração.
Mistura
Parâmetro
92% Areia 2 +
90% Areia 2 + 7% betume
8% betume
+ 3% cal
Estabilidade (kgf)
212
233
Fluência (mm)
13,5
13
%Vazios
6,5
5,2
RBV
72,7
74,9
4.3 Ensaio de resistência à tração por compressão diametral
Os resultados de resistência à tração encontram-se na Figura 6.
90% Areia 2 + 7%CAP + 3%cal
92% Areia 2 + 8% CAP
Resistência a Tração (kPa)
760
740
720
700
680
660
640
620
600
0,00
0,50
1,00
1,50
2,00
Teor de fibra (%)
Figura 6: Resistência à tração para amostras com fibras metálicas.
Para todos os casos analisados, a resistência das misturas sem cal com a adição de fibras ficou
abaixo do valor obtido para a mistura sem fibra, atingindo valores por volta de 620kPa.
Já para a amostra com cal, ganhos significativos são observados quando se compara a amostra
sem adição de fibras e com a incorporação de 1,00% de fibra metálica, ocasionando um ganho
de resistência de 21%. Já entre aos teores de 1,00% e 2,00% não foi constatada mudança
significativa no valor da resistência que justificasse o custo envolvido para o aumento do teor
de fibra.
Portanto, a mistura com adição de cal e 1,00% de fibras apresentou resultados mais
satisfatórios do que as demais combinações efetuadas, uma vez que a cal proporciona uma
maior rigidez para a mistura e com isso auxilia a fibra a obter melhores resultados.
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5. CONCLUSÕES
A partir dos resultados obtidos pode-se concluir que:
ƒ A adição de 3% de cal com a redução de 1% de betume gerou um pequeno decréscimo na
resistência à ração da mistura;
ƒ A incorporação de fibra metálica na mistura de areia-asfalto só propiciou algum ganho
quando da incorporação conjunta com a cal, sendo este resultado obtido para a areia
grossa;
ƒ Dado o problema de fissuras e trincas prematuras que se verifica nas estruturas de
pavimento regionais com o uso de AAUQ, a melhoria verificada com a adição de cal e
fibra metálica poderá contribuir para a mitigação deste problema.
6. AGRADECIMENTOS
Os autores gostariam de agradecer ao CNPq pelo apoio financeiro, à Petrobrás por possibilitar
o desenvolvimento desta pesquisa em uma de suas área de exploração de gás e petróleo e a
Belgo Mineira, pelo fornecimento das fibras metálicas.
7. REFERÊNCIAS
[1] Garcez , G. L., Vidal, D., Ribeiro,W. (1998). “A Utilização de Geossintéticos em Obras
Viárias da Região Amazônica”. XI COBRANSEG, Brasília-DF, v2: p. 1205-1212.
[2] Pessoa, F.H.C. (2004). “Análise dos Solos de Urucu para Fins Uso Rodoviário”.
Dissertação de Mestrado, Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade
de Brasília, Brasília, DF. 151p.
[3] DNER (1997). “DNER-ES 312. Pavimentação – areia-asfalto a quente”. Especificação de
Serviço, Departamento Nacional de Estradas e Rodagens, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13p.
[4] DNER (1998). “DNER-ME 083. Agregados: Análise Granulométrica”. Método de
Ensaio, Departamento Nacional de Estradas e Rodagens, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 5p.
[5] DNER (1997). “DNER-ME 054. Equivalente de Areia”. Método de Ensaio,
Departamento Nacional de Estradas e Rodagens, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 10p.
[6] DNER (1995). “DNER-ME 043. Misturas betuminosas à quente – ensaio Marshall”.
Método de Ensaio, Departamento Nacional de Estradas e Rodagens, Rio de Janeiro, RJ,
Brasil, 11p.
[7] DNER (1994). “DNER-ME 138. Misturas betuminosas – Determinação da resistência à
tração por compressão diametral”. Método de Ensaio, Departamento Nacional de
Estradas e Rodagens, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 4p.
[8] Bento, P.F. (2006). “Uso de Cal e Fibras na Melhoria de Materiais para Utilização em
Estruturas de Pavimentos”. Dissertação de Mestrado, Publicação nº G. DM – 144/06,
Departamento de Engenharia Civil, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 120 p.
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