INVESTIGAÇÃO DAS REAÇÕES DE POLICONDENSAÇÃO DO GLICEROL
COM ÁCIDOS DICARBOXÍLICOS
Helifas Duarte Pascoal1; Olacir Alves Araújo2
1
Bolsista PIBIC/CNPq, Graduado em Química Licenciatura, UnUCET- UEG.
2
Orientador, docente do Curso de Química, UnUCET – UEG.
RESUMO
O biodiesel tem sido, na última década, objeto de grande interesse como combustível
renovável e ambientalmente favorável. Com o grande aumento na produção de biodiesel e,
conseqüentemente, o aumento na purificação e venda do glicerol, houve também o
crescimento da oferta deste produto, o que resultou na diminuição do seu preço. Assim,
pequenos produtores simplesmente descartam o glicerol como resíduo nos mananciais
aquáticos, o que pode tornar-se um sério problema ambiental. O glicerol como subproduto
representa aproximadamente 10% da massa total de biodiesel produzido e, portanto, pode ser
utilizado para melhorar a rentabilidade do processo. Assim, a conversão do glicerol em outro
produto de valor agregado é altamente desejável. O glicerol possui três sítios (três grupos
hidroxila) que podem reagir com outras moléculas, sob condições específicas, dando origem a
reações de polimerização. Este trabalho teve por objetivo à investigação e preparação de
poliésteres a partir de reações de policondensação do glicerol com o ácido adípico. Os
poliésteres foram preparados adicionando-se os monômeros em diferentes proporções
estequiométricas sob condições específicas de síntese e diferentes catalisadores: ácido
dodecilbenzeno sulfônico (ADBS), cloreto de estanho e mistura ADBS/SnCl2. Levando-se em
consideração o tempo de reação e as características mecânicas dos polímeros obtidos, o
sistema descrito em S5, foi o que apresentou as melhores condições de sínteses. Testes
qualitativos de solubilidade foram realizados, constatando-se a hidrólise ácida do polímero em
sistema aquoso. Do ponto de vista ambiental isso é particularmente interessante, pois pode
reduzir o tempo de degradação do poliéster quando disposto no meio ambiente. A
polimerização e formação do poliéster foi comprovada pela análise dos espectros de
infravermelho que apresentaram bandas características do grupo éster.
Palavras-chave: biodiesel, glicerol, poliéster alifático.
Introdução
O Biodiesel, produzido a partir de óleos vegetais ou gordura animal, é renovável,
benéfico ao meio ambiente, biodegradável, contém pouca quantidade de enxofre e não contém
hidrocarbonetos aromáticos policíclicos ou resíduos de óleo cru. O processo dominante de
produção do biodiesel, a trans-esterificação, envolve a reação de um álcool alquílico
(geralmente metanol) com o óleo vegetal ou gordura animal, na presença de um catalisador
1
para produzir o éster alquílico (biodiesel) e glicerol (ou glicerina) como subproduto, conforme
demonstrado na Figura 1 (ATAYA et al, 2007; CHONGKHONG et al, 2007; DeMELLO et
al, 2007; TIWARI et al, 2007; ZAFIROPOULOS et al, 2007; SAWANGKEAW et al, 2007).
OCOR
OCOR
OCOR
OH
+
3 H3C
OH
OH
+
3 RCOO
CH3
OH
glicerol
(glicerina)
Biodiesel
Figura 1. Esquema demonstrando a conversão do ácido graxo em biodiesel e o subproduto glicerol.
Na reação de produção do biodiesel são gerados alguns subprodutos, os quais devem
ser foco de atenção mais detalhadas, pois podem ser um fator determinante para a viabilidade
econômica e ambiental da produção desse combustível. O principal, e mais importante,
subproduto é o glicerol ou glicerina, que representa aproximadamente 10% da massa total de
biodiesel produzido, e é o foco de atenção deste trabalho (CHIU et al, 2006; MU et al, 2006).
O glicerol é o tipo de monômero apropriado para processos de formação de
polímeros, pois apresenta funcionalidade igual a três para reações de policondensação, ou
seja, possui três sítios (três grupos hidroxila) que podem reagir com outras moléculas, sob
condições específicas, dando origem a reações de polimerização. O glicerol pode reagir com
ácidos orgânicos di-carboxílicos, dando origem a poliésteres, que são, dentre os polímeros
sintéticos, os mais versáteis quanto ao uso comercial podendo dar origem a fibras (tecidos),
artigos plásticos e revestimentos. Dependendo da estrutura química também podem ser
biodegradáveis (IGLESIAS et al, 1999). Neste contexto, o presente trabalho aborda as
reações de policondensação do glicerol, visando a sua utilização como matéria-prima para a
produção de poliésteres, através da investigação das reações com o ácido adípico, usando
diferentes catalisadores.
Material e Métodos
Foram realizadas diversas sínteses utilizando diferentes catalisadores e sem o uso de
catalisador. As sínteses descritas abaixo serão denominadas de Sn, sendo n um número inteiro
e positivo, indicando as diferentes sínteses realizadas.
1)
Síntese S1
A primeira síntese foi realizada sem o uso de catalisador, de acordo com o seguinte
experimento: Em um balão de duas bocas de fundo redondo de 500mL foram adicionados
2
25mL de glicerol e 20g de ácido adípico, sob agitação magnética constante e aquecimento em
banho de óleo. Utilizou-se também um tubo de Dean Stark e condensador. A temperatura do
sistema foi mantida a 150°C e o tempo de reação foi de 40 horas. A figura 2 mostra a
fotografia do sistema utilizado para a realização das sínteses.
Figura 2: Fotografia do sistema utilizado para todas as sínteses.
2)
Síntese S2
Em seguida foi realizada outra síntese utilizando quantidades eqüimolares de glicerol
(31,5g, 0, 342mol) e ácido adípico (49,9g, 0,342mol). Como catalisador utilizou-se a mistura
ADBS /SnCl2 2,0g:1,0g. A temperatura máxima atingida foi de 180°C e o tempo de reação foi
de 21 horas. Posteriormente fez-se o teste qualitativo de solubilidade utilizando 4 solventes
(álcool isopropílico, hexano, NMP e água). Por último fez-se a filtração a vácuo e secou-se o
material a 100°C por 6 horas.
3)
Síntese S3
Essa síntese foi realizada utilizando as mesmas quantidades dos monômeros em massa,
alterando apenas o catalisador. Foram utilizadas 2,0 g de ADBS como catalisador. A
temperatura máxima atingida foi de 180°C e o tempo de reação foi de 20 horas.
4)
Síntese S4
Nessa síntese utilizou-se como catalisador 1,0 g de SnCl2 , realizada sobre as mesmas
condições de sínteses anteriores. A temperatura máxima atingida foi de 180°C e o tempo de
reação foi de 35 horas.
5)
Síntese S5
Fez-se outra síntese com razão molar glicerol/ácido adípico 1:1 e 0,499g de SnCl2,
utilizou-se também pressão reduzida e unidade de refrigeração de água a 15 °C para o
condensador. A temperatura máxima atingida foi de 180 °C e o tempo de reação foi de 4
horas. Posteriormente fez-se o teste qualitativo de solubilidade utilizando os mesmo solventes
descritos anteriormente. Em seguida fez-se a filtração a vácuo e secou-se o material a 100°C
por 6 horas.
3
Resultados e Discussão
O esquema 1 mostra a equação química para a produção do poliéster. A estrutura geral
do poliéster pode admitir três combinações, levando-se em consideração a natureza dos
grupos terminais.
Esquema 1 : Equação química para obtenção dos poliésteres.
As três combinações possíveis para os poliésteres obtidos nas sínteses realizadas podem ser:
1)
R1= H, R2= C3H7O2 ;
2) R1= H, R2= OH ;
3) R1= C6H9O3, R2= OH
Na primeira síntese realizada S1, baseando-se no alto tempo de reação, na temperatura
elevada e nas poucas mudanças macroscópicas observadas, conclui-se que sem o uso de
catalisador a polimerização se torna muita lenta. Em S2 foi utilizado a combinação ADBS
/SnCl2 como catalisadores. A temperatura máxima atingida foi de 180°C e o tempo total de
síntese foi de 21 horas. Com o fim do aquecimento, obteve-se um sólido com aspecto
borrachoso de cor marrom claro. Este material foi purificado utilizando 4 solvente diferentes:
hexano, álcool isopropílico, NMP e água. Foram retiradas 4 amostras de 5 gramas e colocadas
nos respectivos solventes, com tempo de agitação variando de 8 a 15 horas. O material foi
insolúvel em hexano, formando um aglutinado do material polimérico, indicativo de baixa
interação solvente-soluto. No sistema contendo álcool isopropílico, também foi observada
baixa solubilidade, com pedaços do sólido dispersos no solvente, o qual permaneceu incolor.
No sistema com NMP observou-se que o solvente, inicialmente incolor, adquiriu coloração
alaranjado claro e aumento aparente na viscosidade, com pequenos fragmentos sólidos. No
sistema contendo água, observou-se a completa solubilização, com indícios de que pode ter
ocorrido degradação do polímero por hidrólise ácida dos grupos ésteres, ficando a solução
com coloração marrom claro. Posteriormente fez-se a filtração à vácuo de todos os sistemas,
exceto o aquoso. Os materiais obtidos foram secos em estufa à vácuo à 70°C durante 6 horas.
A Figura 3 mostra a fotografia das amostras após o teste de solubilidade.
Figura 3. Fotografia do poliéster após
purificação nos solventes: (A) álcool
isopropílico, (B) NMP e (C) hexano.
Em seguida, realizou-se mais duas sínteses (S3 e S4), em S3 utilizando como catalisador
2,0 g de ADBS, e em S4, 1,0 g de cloreto de estanho. Essa duas sínteses foram realizadas para
4
investigar como cada catalisador atua na reação separadamente, observando-se assim,
aspectos como: tempo de reação, aspecto do material obtido e características mecânicas do
material. Os tempos de reação foram respectivamente 20 e 35 h. O material obtido apresentou
aspecto borrachoso para o cloreto de estanho e aspecto de cera para o ADBS.
Na tentativa de diminuir o tempo de reação descrito em S2, foi realizada outra
síntese, S5 utilizando como catalisador SnCl2, pressão reduzida e unidade de refrigeração de
água a 15°C. O tempo de reação foi reduzido para 4 horas. Obteve-se um material bastante
borrachoso e transparente. A figura 4 mostra a fotografia do material obtido após
polimerização.
Figura 4: Fotografia das amostras obtidas em S5.
A figura 5 mostra fotografias dos poliésteres expostos à condições de temperatura
e umidade ambientes durante 30 dias. O material originalmente sólido borrachoso tornou-se
lentamente um líquido viscoso, indicando processo de degradação, provavelmente hidrólise
dos grupos ésteres.
Figura 5: Fotografias das amostras após exposição à condições de temperatura e umidade ambientes.
A Figura 6 mostra o espectro de infravermelho da amostra catalisada com ADBS/
SnCl2 na síntese descrita em S2. As bandas de absorção em 1734 e 1176 cm-1, atribuídos aos
grupos C=O e C—O de ésteres, confirmam a polimerização.
Figura 8: Espectro na região do Infravermelho do Poliéster.
Conclusões
5
Foram obtidos polímeros derivados da policondensação entre o glicerol e ácido
adípico. Baseando-se no alto tempo de reação, na temperatura elevada e nas poucas mudanças
macroscópicas observadas na síntese, concluiu-se que sem o uso de catalisador a
polimerização se torna muita lenta. O uso de pressão reduzida e da unidade de refrigeração de
água foi significativo para obtenção de polímeros com menor tempo de polimerização.
Levando-se em consideração o tempo de reação e as características mecânicas dos polímeros
obtidos, o sistema descrito em S5, foi o que apresentou as melhores condições de sínteses.
Quanto aos testes de solubilidade é importante ressaltar o teste feito em água, a qual houve a
completa solubilização do material, não sendo possível recuperar o polímero após secagem do
solvente, indicando que ocorreu hidrólise ácida dos grupos ésteres. Essa hidrólise ácida do
polímero em sistema aquoso é particularmente interessante, do ponto de vista ambiental, pois
pode reduzir o tempo degradação do poliéster quando disposto no meio ambiente. Por fim, a
polimerização e formação do poliéster foi comprovada pela análise dos espectros de
infravermelho que apresentaram bandas características do grupo éster.
Referências Bibliográficas
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