Concordância verbal do pronome tu
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A VARIAÇÃO DA CONCORDANCIA VERBAL DO PRONOME
TU NO PORTUGUÊS FALADO EM SÃO LUÍS
Claudiene Diniz da Silva1
Resumo
Este artigo faz uma análise sobre a aplicação ou não da regra de concordância verbal em
relação ao pronome pessoal de segunda pessoa tu, na linguagem oral espontânea. A
partir dos conceitos da Teoria da Variação de Labov e da análise de um corpus
composto por conversações espontâneas de ludovicenses, tenta determinar os fatores
lingüísticos e sociais que levam a ocorrência deste fenômeno, restrito ao extremo Sul do
país e algumas partes da região Norte e à cidade de São Luís do Maranhão, no Nordeste.
Palavras-chave: Tu. Concordância verbal. Sociolingüística quantitativa
Resumen
Este artículo hace un análisis sobre la aplicación o no de la regra de concordancia verbal
en relación al pronombre personal de segunda persona tú, en el lenguaje oral
espontáneo. A partir de los conceptos de la Teoría de la Variación de Labov y del
análisis de un corpus compuesto por conversaciones espontáneas de ludo vicenses,
intenta determinar los factores linguísticos y sociales que llevan a la ocurrencia de este
fenómeno, restricto al extremo Sur del país y algunas partes de la región Norte y a la
ciudad de São Luís do Maranhão, en el Nordeste.
Plabras-clave: Tú. Concordancia verbal. Sociolingüística cuantitativa
Introdução
São Luís, assim como poucas cidades do Brasil, usa o pronome tu para se referir à 2ª
pessoa do discurso (aquela com quem se fala), pois na realidade nacional predomina o
uso do pronome de tratamento você. Tal fato despertou em todo o país, o interesse de
muitos pesquisadores que começaram a buscar as causas desse fenômeno. Na capital do
Maranhão, o estudo pioneiro nessa área é realizado pela doutoranda Honorina Carneiro
(UFMA/UNESP-Araraquara).
Foi participando como auxiliar de pesquisa do referido estudo de doutorado,
cujo tema é a alternância do tu/você no português falado do ludovicense, que
começaram os primeiros contatos com o objeto de estudo deste artigo. A participação
envolvia levantamento bibliográfico, elaboração de estratégias para obtenção do corpus
para análise, gravações de fala espontânea dos falantes ludovicenses.
1
Instituto de Ensino Superior Franciscano - IESF.
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Após muitas observações, percebeu-se no corpus (ainda em construção) que,
independentemente da faixa etária, nível de escolaridade e classe social, em situações de
comunicação espontânea, os falantes nem sempre realizam a concordância conforme
prescreve a gramática tradicional, desmentindo o mito de que no Maranhão e em outras
localidades do país se tem o português mais bem falado do Brasil, já que lá ocorreria a
concordância do verbo com o sujeito. Tal está expresso em (BAGNO, 2007, p.46-47),
ao dizer que:
É sabido que no Maranhão ainda se usa com grande regularidade o pronome
tu, seguido das formas verbais clássicas, com a terminação em -s
característica da segunda pessoa: tu vais, tu queres, tu dizes, tu comias, tu
cantavas etc. (...) se perpetua o mito de que o Maranhão é o lugar “onde
melhor se fala o português” no Brasil.
Este artigo é uma ramificação da tese de doutorado pioneira sobre a alternância
tu/você no português falado pelo ludovicense, e, como tal, é algo totalmente novo,
sendo também um abrir caminhos para o desenvolvimento de estudos sustentados no
modelo teórico-metodológico da Sociolingüística laboviana em São Luís. Além de
resgatar a história do português falado na cidade e tentar compreender os fatores
internos e externos que influenciam o fenômeno em estudo, traz à tona uma reflexão
sobre o que vem a ser “o melhor português do Brasil”. Também contribui para
desmistificação de argumentos que produzem preconceitos lingüísticos.
A não-concordância verbal do pronome tu é o tema central desta pesquisa, que
se propõe a investigar se na cidade de São Luís os falantes em comunicação espontânea,
concordam o verbo com o sujeito conforme prescrevem os compêndios gramaticais.
Em busca de repostas para esta investigação, este artigo tem como objetivo
maior descrever as condições lingüísticas e sociais que favorecem a não-concordância
verbal com o pronome de segunda pessoa tu, na fala do ludovicense.
Esta pesquisa, segundo Vergara (2003) é classificada como descritiva,
explicativa, bibliográfica e de campo. Trata-se de uma investigação descritiva e
explicativa por expor e esclarecer os fatores envolvidos no uso do tu pelo ludovicense,
desde as motivações históricas e sociais como também a questão da concordância deste
pronome com o verbo; bibliográfica por elencar as literaturas sobre a Sociolingüística,
ciência que estuda a relação entre a língua e a sociedade e sobre o pronome em questão
e de campo por necessitar de um corpus formado pela fala espontânea.
Para tal, far-se-á uma breve abordagem sobre o pronome tu, concordância
verbal e visão da sociolingüística sobre o fenômeno, mais especificamente em se
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tratando de mudança lingüística para então passar a descrição e análise dos dados
coletados (conversações espontâneas de ludovicenses).
Pronome tu
De acordo com a gramática tradicional, tu é um pronome pessoal do caso reto usado
para representar a 2ª pessoa gramatical, mas em todo o Brasil o você é usado em
referência a esta pessoa, confrontando com o prescrito pela gramática. Como afirmam
Cunha e Cintra (2007), em quase todo o território brasileiro, o tu foi substituído pelo
você, empregado como forma de intimidade. Este fato difere do português europeu, cujo
tratamento de intimidade é tu, usado entre “pais para filhos, de avós ou tios para netos e
sobrinhos, entre irmãos ou amigos, marido e mulher, entre colegas de faixa etária igual
ou próxima” (p.305).
Almeida (1980) também afirma que embora o pronome tu seja o referente da 2ª
pessoa do singular, ele quase nunca é usado, pois o pronome você que usado é na
maioria dos casos:
[...] no Brasil (com exceção do Amazonas, Pará e Rio Grande do Sul; neste
último estado flexionam, popularmente, o verbo na 3ª do sing.; “tu quer”, e
consideram ríspido o “você”) quase sempre nunca tratamos por “tu” a pessoa
com que falamos; sempre tratamos o interlocutor por um pronome de
tratamento: “você”, “senhor”, “vossa senhoria” (V.Sª), “vossa excelência”
(V.Exa.).”(ALMEIDA, 1980, p.180)
A quebra do paradigma em questão, já se solidificou na linguagem oral
cotidiana, porém esta realidade linguística ou não é levada em consideração pelos
gramáticos ou poucos tentam assumir o caráter pronominal de segunda pessoa para você
acompanhado do verbo na terceira.
Já os lingüistas, admitem essa quebra, afirmando que o quadro pronominal está
sofrendo uma (re)organização nos últimos anos. Descrevem uma gramática de usos
apesar de partir da classe de palavras proposta pela gramática tradicional. Vamos
transcrever Tarallo (1993) que expõe a questão com clareza:
“o paradigma pronominal [...] no PB moderno não é o mesmo encontrado nas
gramáticas do português padrão. Os dados históricos coletados [...]
abrangendo a gramática do PB nos últimos 250 anos mostraram que a
reorganização foi maciça (TARALLO, 1993, p. 48)
E a propósito da co-ocorrência do tu/você, damos a palavra a Herênio (2006):
“costuma-se descrever a forma „você‟ como variante dominante do centro do país,
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apresentando a variante „tu‟ como regionalismo fortemente associado à variedade do
português gaúcho.” (p. 41). A esse respeito Menon (1995), ressalta que embora o uso do
você seja uma realidade nacional, existem ainda áreas, onde uso do tu se sobressai.
Concordância verbal
Em se tratando de concordância, sabe-se que na literatura lingüística há um grande
número de estudos sobre a concordância verbal (CV) no português brasileiro, embora os
estudos, em sua maioria, abordem a 1ª e 3ª pessoa do plural. Estas pesquisas
demonstram que a aplicação ou não da regra de concordância são fenômenos
recorrentes na fala dos brasileiros das mais diferentes regiões, sejam da zona urbana ou
rural.
Acredita-se que a questão da concordância verbal está relacionada à pelo
menos dois aspectos: um, histórico-social, baseado nas mudanças de estrutura social e
heranças históricas; outro na fonética, visto que os lingüistas concluem que ela exerce
uma influência decisiva na realização da concordância.
Em São Luís, o âmbito histórico-social é claramente representado pela visão
que se tinha e ainda tem da cidade, de que o Maranhão tem o melhor português do
Brasil. Isso porque a posição geográfica do estado favoreceu uma história de estreitas
relações com a Coroa portuguesa em seu processo de edificação.
Com a independência, a capital do Maranhão, passou a ocupar o quarto lugar
entre as cidades brasileiras mais distintas, devido o bom comportamento e pelo tom
seguro e educado de sociedade. A explicação a tudo isso foi a de que era comum no
Maranhão mandar educar seus jovens de família abastadas na Inglaterra e na
França.(Viveiros, 1990). Daí surgiram autores de produção literária conhecida em todo
o Brasil e no Mundo, como Gonçalves Dias, Artur Azevedo, João Lisboa, José Cândido,
Gomes de Sousa, Odorico Mendes, Sotero dos Reis, Dias Carneiro, Gentil Braga,
Trajano Galvão, Marques Rodrigues, Joaquim Serra, César Marques, Sousândrade.
(MEIRELES,1986).
Esses grandes escritores tornaram São Luís no século XIX a Atenas Brasileira,
que passou a ser considerado o local a ter o português mais bem falado do Brasil. São
Luís também é a cidade onde foi escrita e editada a primeira gramática do Brasil, pelo
escritor Sotero dos Reis. Esse momento áureo da capital se sustenta até hoje no
imaginário maranhense e para muitos autores surge daí a afirmação de que o Maranhão
tem o melhor português do Brasil.
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Observa-se que o aspecto histórico-social é muito influenciou para entender o
estudo em questão, no entanto, no âmbito fonético, mesmo que as literaturas lingüísticas
sobre CV se limitem ao plural, é consenso nos estudos de Naro (1981); Guy (1981);
Bortoni-Ricardo (1985); Rodrigues (1987); Naro & Scherre (1999); Pereira &
Rodrigues (2003), que a saliência fônica exerce influência decisiva sobre a
concordância, pois “quanto maior for a diferença entre as formas verbais (...) maior a
probabilidade de aplicação da regra”(PEREIRA, 2004, p.34).
Naro (1981) propõe duas dimensões fônicas para compreensão do fenômeno, o
grau de diferenciação material entre as forma verbais e a intensidade dos segmentos
fônicos, Bortoni-Ricardo (1985), propõem que a acentuação também pode ser um fator
determinante. E todos eles apontam para a distância do sujeito em relação ao verbo.
Ressaltamos que muitos estudos foram feitos a respeito desse fenômeno, a
concordância verbal, no entanto, nenhum estudo mais detalhado foi desenvolvido
especificamente em São Luís-MA.
Sociolinguística: teoria da variação laboviana
Ciente de que a gramática normativa considera a não-concordância um erro, este estudo
vai além dessa perspectiva reducionista, embora consagrada, que se limita a prestigiar
suas próprias descrições. Para isso, buscou-se um modelo que reconheça a existência da
variação como também do caráter dinâmico e heterogêneo da língua. Como resultado
dessa busca, chegou-se ao modelo teórico-metodológico da Sociolingüística
Variacionista.
William Labov, Uriel Weinreich e Marvin Herzog, escreveram, juntos, o artigo
Empirical foundations for a theory of language change, considerado o texto fundador da
Sociolingüística. Nele, fazem um apelo para uma análise da língua que leve em conta os
componentes sociais e estilísticos:
[...] sugerimos que um modelo de língua que acomode os fatos do uso
variável e seus determinantes sociais e estilísticos não só leva a descrições
mais adequadas da competência lingüística, mas também suscita
naturalmente uma teoria da mudança lingüística que ultrapassa os estéreis
paradoxos contra os quais a lingüística histórica vem lutando a mais de meio
século. (2006, p.34)
Esse modelo que encara o “real” e desconsidera o “ideal” pregado pelos
formalistas é denominado Teoria da Variação em Mudança, que, como o próprio nome
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já diz, analisa os fatores envolvidos no processo de variação lingüística e de mudanças
que a língua sofre ao longo dos tempos.
É valido ressaltar que outros, além de Labov, propuseram estudos sobre a
relação entre língua e sociedade. Aluno de Saussure, Antoine Meillet, rompeu com o
mestre após a publicação do Curso de Lingüística Geral, onde afirmou ser infrutífero o
estudo de fenômenos externos a língua. Meillet pelo contrário, defendia que as
mudanças lingüísticas tendem a acompanhar as mudanças sociais, por isso torna-se
impossível estudá-las longe da história, da cultura e da sociedade.
[...] com a publicação (póstuma) do Curso de lingüística geral, Meillet tomou
distância e, na resenha que faz do livro, ele ressalta que “ao separar a
variação das condições externas de que ela depende, Ferdinand Saussure a
priva da realidade; ele a reduz a uma abstração que é necessariamente
inexplicável”. (CALVET, 2002. p 14)
Weinreich, Labov e Herzog também conseguiram fundamentar a relação entre
variação e mudança, mostrando que existe uma sistematicidade na variação. Este fato
derrubou a crença dos formalistas que abdicaram de estudar a variação por considerá-la
um campo imponderável, imprevisível e de impossível sistematização.
A sistematicidade proposta por eles se sobressai por estimar os fatores externos
na análise lingüística e por ver a língua não somente como estrutura, mas sim como um
instrumento de comunicação. Com isso, foi possível visualizar os padrões que regulam
as estruturas variantes, que nas palavras de Lucchesi (2004), “de tão sistemáticos, não
podem ser devidos ao acaso”.
Os padrões de regularidade são revelados por causa da análise quantitativa das
variantes, justificando, assim, o nome Sociolingüística Variacionista, também chamada
de Sociolinguística Quantitativa. A quantificação dos dados, relacionados aos fatores
extralingüísticos, serve para revelar as condições indispensáveis para que a variação
aconteça. Desta forma, tem-se uma concepção de sistema lingüístico dinâmico, cujas
variações derivam de situações concretas de falantes reais, inseridos em uma
determinada sociedade num dado momento histórico.
Como o estudo proposto por Labov é quantitativo, usa-se o programa
GOLDVARB (LAWRENCE; TOBINSON; TAGLIAMONTE, 2001) para o tratamento
estatístico dos dados, “efetuando cálculos de freqüência e probabilidade de aplicação de
uma determinada regra gramatical, avaliando o peso relativo de cada fator
condicionante e realizando o cruzamento de fatores” (PEREIRA, 2004, p.16). Desta
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forma, podem-se identificar os fatores internos e externos que regem a variação, bem
como correlacionar a língua com a sociedade.
Na obra Sociolinguistic patterns, Labov (1972) também introduz alguns
conceitos teórico-metodológicos de extrema relevância para a realização da nossa
pesquisa. Segundo ele, uma determinada gramática abrange tanto regras categóricas
(regras lingüísticas que sempre se aplicam) quanto regras variáveis (opcional, mas com
certa sistemática). Outro conceito é o nome dado às formas lingüísticas em processo de
variação: variante lingüística – que são formas alternativas de dizer a mesma coisa, em
uma mesma situação, porém, apesar de terem a mesma significação, podem ir contra o
social ou estilístico. Já o conjunto de variantes é denominado variável lingüística.
Assim, a concordância verbal no português de São Luís representa uma regra variável e,
por conseguinte uma variável lingüística que abrange duas variantes: a aplicação e nãoaplicação da regra.
Nesta perspectiva, ratifica-se o caráter sistemático e não-aleatório da variação
lingüística, condicionada por fatores estruturais (no estudo em pauta, principalmente a
sintaxe) e fatores extralingüísticos, estes abrangendo:
“a história, a cultura e o sistema de organização política, social, econômica e
geográfica de uma comunidade; características individuais do falante, como
sexo, idade, escolaridade, classe social, ocupação, etc; aspectos da situação
imediata, ou seja, do contexto em que o discurso é produzido. (PEREIRA,
2004, p.16)
Ambos os fatores são também denominados variáveis independentes, enquanto
o fenômeno lingüístico em estudo recebe o nome de variável dependente. Sendo assim,
a variável dependente deste trabalho é a concordância/não concordância do verbo com
pronome pessoal tu, exercendo função de sujeito.
Para analisar o objeto em questão, seguindo o modelo proposto pela
Sociolingüística Quantitativa, faz-se necessária a organização de um corpus composto
pela fala de ludovicenses em situação espontânea, considerando as diferentes faixas
etárias, os diferentes graus de escolaridade e de classe social, assim como ambos os
sexos/gêneros. Para tal utilizaremos os dados coletados na pesquisa do doutorado que
deu origem à proposta deste trabalho.
Análise dos dados
A partir dos pressupostos teórico-metodológicos da Teoria variacionista, passaremos à
análise dos dados do referido fenômeno para saber se ao usar o tu, o ludovicense
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concorda o sujeito com o verbo, conforme prescrevem os compêndios gramaticais e os
lingüistas consagrados como Marcos Bagno já citado anteriormente.
Os dados que serviram de base para análise foram produzidos por falantes
ludovicenses de diferentes escolaridade, faixa etária e sexo/gênero, coletados
primeiramente para a pesquisa de doutorado (em construção) da professora Honorina
Carneiro, cujo objetivo é estudar a alternância do tu/você no português falado do
ludovicense. O corpus constituído por 36 informantes distribuídos conforme esclarece a
tabela a seguir:
Homem
15 à 25
26 à 55
Acima de 55
Fundamental
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Médio
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Superior
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Mulheres
15 à 25
26 à 55
Acima de 55
Fundamental
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Médio
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Superior
2 informantes
2 informantes
2 informantes
Dos 36 informantes em estudo, foram encontradas 72 ocorrências do pronome
tu em função de sujeito da oração que serão analisadas conforme os fatores elencados.
Cada fator será analisado com o auxílio de um gráfico. Partindo da variável dependente
deste trabalho, e seguindo as variáveis independentes externas (sexo, escolaridade e
faixa etária), vejamos alguns exemplos e a análise do corpus coletado:
A variável dependente
Sendo a variável dependente deste artigo a concordância/não-concordância do
pronome tu na função de sujeito da oração, temos 72 ocorrências, onde se constatou que
deste total apenas 4 ocorrências concordaram o verbo com o sujeito conforme prescreve
a gramática tradicional. A seguir vêem-se alguns exemplos de concordância e da não
concordância extraídos do corpus.
(c) concorda
43: ela perguntou se tu preferes comer logo.
(n) não concorda
06: tu recebe duas cartas
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As variáveis independentes externas
Faixa etária
Para analisar a faixa etária, dividiu-se em três grupos, seguindo o padrão de
outras pesquisas sociolingüísticas, é o que se exemplifica a seguir:
a) Faixa etária: 15 a 25 anos
06: eu tô, tu quer?
b) Faixa etária: 26 a 55 anos
01: quanto tempo tu ta lá?
c) Faixa etária: acima de 55 anos
08: o que tu queres que ele diga?
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Cada faixa etária é representada separadamente no gráfico, visto que o número
de ocorrências não é equivalente. Dos 15 aos 25 anos, das 26 ocorrências analisadas,
todas não fizeram a concordância adequadamente. Na segunda faixa etária, somente 2/
26 ocorrências seguiram a norma prescrita pela gramática tradicional. E no grupo de
acima de 55 anos, 17/ 19 ocorrências fugiram aos compêndios gramaticais.
Sexo/gênero
Neste fator houve um equilíbrio em se tratando do número de ocorrências, 36
em cada. Porém, das 72 ocorrências, 4 concordaram o verbo com o sujeito, sendo estas
todas do sexo/gênero feminino, e no masculino não houve nenhuma caso de
concordância. Após exemplos, seguidos do gráfico.
(M) Masculino
56: Tu num pode perguntar lá?
(F) Feminino
46: minha filha, tu foi lá quando saiu do plantão?
Escolaridade
Ao analisar a escolaridade, observou-se a concordância nos ensinos
fundamental, médio e superior, (in)completos, visto que há um mito de quanto maior
grau de formação, maior o índice de aplicação da norma tradicional. Embora se tenha
este mito, os números comprovam que, mesmo os indivíduos mais escolarizados, em
um contexto de comunicação espontânea, não fazem uso da concordância. De acordo
com os dados, no nível fundamental 26/26 ocorrências não aplicaram a regra de
concordância, já no médio, apenas 2/26 concordaram o sujeito com o verbo
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adequadamente, e o mesmo número no que se refere ao ensino superior, 2/19
ocorrências. Seguem fragmentos tirados do corpus, e a tabela com as porcentagens:
(a) fundamental
85: tu trabalha com venda
(b) Ensino médio
67: por que tu num trouxe logo?
(c) Superior
56: tu tem que ir lá pra saber como é.
Considerações finais
Este artigo, com proposta pioneira, buscou analisar, de um ponto de vista sincrônico e
quantitativo a variação entre a aplicação e a não aplicação da regra de concordância da
2ª pessoa do singular tu, em orações em que exerce função de sujeito, no português
falado por ludovicenses em situação de comunicação espontânea.
Após uma melhor compreensão dos pressupostos teórico-metodológicos da
Sociolingüística Laboviana, e uma alusão à trabalhos sobre concordância, foram
elencados fatores para serem analisados.
As análises nos levam a conclusão que embora se acredite que no Maranhão,
mais especificamente em São Luís, fala-se o „melhor‟ português do Brasil porque se
concorda o verbo com o sujeito tu conforme prescreve a norma gramatical, isso não
consiste em uma verdade, pois os dados mostram que nesta cidade, pouco se faz a
concordância, sendo insignificante o percentual de aplicação da regra.
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Este fato, não deve ser motivo para desvalorização do português ludovicense,
mas serve para desmistificar o que vem a ser o „melhor‟ português do país. Afinal julgar
o que faz uma forma de falar ser melhor que outra na traz nenhuma contribuição, pelo
contrário, produz preconceito não só lingüístico como também social, pois se, por
exemplo, julgarmos a fala daqueles que não tiveram acesso ao ensino, como uma fala
inferior, seremos injustos, com eles e com a variante, já que esta variante nada mais é
que, uma forma criativa de usar a língua, de forma diferente da padrão.
Também nos faz refletir sobre o caráter dinâmico e heterogêneo da língua, que
a leva a mudanças, sendo que estas não significam sua deterioração e sim evolução
deste instrumento vital para a vida em sociedade.
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