PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Direito
COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
Autor: Edson Carlos Soares de Almeida
Orientadora: Doutora Arinda Fernandes
EDSON CARLOS SOARES DE ALMEIDA
COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
Monografia apresentada ao curso de graduação
em Direito da Universidade Católica de
Brasília, como requisito parcial para obtenção
do Título de Bacharel em Direito.
Orientadora: Profª. Doutora Arinda Fernandes.
Brasília - DF
2009
Monografia de autoria de Edson Carlos Soares de Almeida, intitulada
“COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL”, apresentada como requisito parcial
para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília, em
__________________, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:
_______________________________________________
Professora Doutora Arinda Fernandes
Orientadora
Curso de Direito/Programa de Graduação – UCB
_______________________________________________
Professor Doutor João Rezende Almeida Oliveira
Curso de Direito/Programa de Graduação – UCB
_______________________________________________
Professor Doutor Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy
Curso de Direito/Programa de Graduação – UCB
Brasília – DF
2009
À minha filha Mariana, que em 2004, foi
curada de uma grave Leucemia por obra e
graça de Deus.
Ao meu pai, Antonio de Almeida Filho, in
memorian, que me ensinou os valores da
honestidade, da força e da coragem.
À minha mãe Mariene, onde encontro os mais
belos sentimentos humanos de amor e de paz.
À minha eterna e amada esposa Hisdenia: Se
um dia sobrevierem as agruras dos desgastes
naturais da vida, saiba que o meu desejo por
você só aumentará, pois estar ao seu lado, é,
para mim, eternizar o mais sincero amor!
A todos Policiais, membros do Ministério
Público, Magistrados e demais autoridades,
que se dedicam, diuturnamente, ao Combate
ao Crime Organizado no Brasil com coragem,
abnegação, honestidade, profissionalismo e
sacrifícios, por vezes, da própria vida; são
heróis
anônimos
que
não
almejam
reconhecimento ou glórias, mas apenas lutam
por amor ao ideal de uma sociedade livre,
justa, segura e igualitária.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, fonte inspiradora de justiça e de saber;
A Professora Doutora Arinda Fernandes, por sua inestimável ajuda nesse trabalho,
consignando a sua imensurável experiência no campo das Ciências Penais, sempre de forma
muito atenciosa, dedicada e carinhosa, a todos estimulando com a sua grande paixão em
ensinar, fornecendo brilhantes lições jurídicas que ficarão indeléveis em minha memória para
sempre!
Agradeço, também, a todos os professores da Universidade Católica de Brasília
(UCB), que com dedicação e afinco, souberam assinalar o verdadeiro conhecimento em
nossos corações, apontando o rumo para um Direito mais justo e equânime, mola mestra da
busca por Justiça.
“Felizes as nações (se existem algumas) que
não esperaram que revoluções lentas e
vicissitudes incertas fizessem do exceder-se do
mal uma norma para o bem, e que, por meio de
leis sábias, apressaram a passagem de um a
outro”
Cesare Beccaria.
RESUMO
Referência: ALMEIDA, Edson Carlos Soares de. Combate ao Crime Organizado no Brasil.
2009. 142 folhas. Monografia (Direito) – Universidade Católica de Brasília – UCB, Brasília,
2009.
A presente monografia versa sobre o crime organizado no Brasil. Apresenta e confronta a
legislação pertinente com os meios eficazes de combate a esta modalidade criminosa,
analisando, sob a perspectiva das autoridades policiais brasileiras, os meios onde se tem
alcançado os resultados mais expressivos. A legislação brasileira que trata do tema é esparsa,
e a falta de sistematização traz conseqüências complicadoras, já que não permite a
interpretação extensiva. Por isso, aborda, também, o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº
150/2006, que visa consolidar a matéria em um único diploma especifico. A análise da
aplicação destas Leis visa confrontá-las com os meios de investigação e de combate às
organizações criminosas, no ponto em que se tornam eficazes instrumentos para a formação,
no Processo Penal, da verdade real, buscando fontes na doutrina e jurisprudências pátrias. Ao
final, apresenta sugestões fundadas nesta confrontação, amparadas, também, pela visão
policial do autor, um apaixonado pelo tema e pela investigação desta modalidade criminosa,
que tem se tornado cada vez mais atuante no Brasil.
Palavras-Chave: Crime Organizado. Convenção de Palermo. Leis Penais Especiais. PLS nº
150/2006. Jurisprudências. Combate. Meios operacionais. Confronto entre a legislação e os
meios efetivos operacionais. Sugestões.
ABSTRACT
The present monograph turns on the crime organized in Brazil. It presents and it collates the
pertinent legislation with the efficient ways of combat to this criminal modality, analyzing,
under the perspective them Brazilian police authorities, the ways where if it has reached the
results expressive. The Brazilian legislation that deals with the subject is sparse, and the
systematization lack brings complex consequences, since it does not allow the extensive
interpretation. Therefore, it approaches, also, the Project of Law of Senate (PLS) nº 150/2006,
that it aims at to consolidate the substance in an only diploma I specify. The analysis of the
application of these Laws aims at to collate them with the ways of inquiry and combat to the
criminal organizations, in the point where if they become efficient instruments for the
formation, in the Criminal proceeding, of the real truth, searching native sources in the
doctrine and jurisprudences. To the end, it presents suggestions established in this
confrontation, supported, also, for the police vision of the author, one gotten passionate for
the subject and the inquiry of this criminal modality, that it has become each more operating
time in Brazil.
Keywords: Organized Crime. Palermo Convention. Special Penal Laws. PLS no. 150/2006.
Jurisprudences. Combat. Operational means. Confrontation between the law and the effective
operational. Suggestions.
LISTA DE ABREVIATURAS
o ABIN – Agência Brasileira de Informação
o ADA – Amigos dos Amigos (facção criminosa)
o ADI ou ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade (STF)
o BACEN – Banco Central do Brasil
o CIA – Central Intelligence Agency (Agência Central de Inteligência)
o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras
o CPB – Código Penal Brasileiro
o CPP – Código de Processo Penal
o CV – Comando Vermelho (facção criminosa)
o CVM – Comissão de Valores Mobiliários
o DARM – Divisão de Repressão ao Tráfico Ilícito de Armas/DPF
o DCOR – Divisão de Combate ao Crime Organizado/DPF
o DFIN – Divisão de Combate aos Crimes Financeiros/DPF
o DIP – Diretoria de Inteligência Policial/DPF
o DIREX – Diretoria Executiva/DPF
o DPAT – Divisão de Repressão a Crimes Contra o Patrimônio/DPF
o DPF – Departamento de Polícia Federal
o DOU – Diário Oficial da União
o DJ – Diário da Justiça
o DJe – Diário da Justiça Eletrônico
o DJU – Diário da Justiça da União
o DRCI – Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional
o ENCLA – Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro
o Ext. – Extradição (STF)
o FARC – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia ou Exército do Povo
o FBI – Federal Bureau of Investigation (Agência Federal de Investigação)
o FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos
o FMI – Fundo Monetário Internacional
o GAECO – Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado do
Ministério Público do Estado de São Paulo
o GAFI – Grupo de Ação Financeira
o GGI-LD – Gabinete de Gestão Integrada de Prevenção e Combate à Lavagem
de Dinheiro
o GCOC – Grupo de Combate às Organizações Criminosas
o GNCOC – Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas
o GSI/PR – Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República
o HC – Habeas Corpus
o INTERPOL – International Criminal Police Organization (Organização
Internacional de Polícia Criminal)
o MJ – Ministério da Justiça
o MPDFT – Ministério Público do Distrito Federal e Territórios
o OCRIM ou OCRIM(s) (singular ou plural) – Organização Criminosa
o ONODCCP – Escritório das Nações Unidas para o Controle de Drogas e
Combate ao Crime
o ONU – Organização das Nações Unidas
o PCC – Primeiro Comando da Capital (facção criminosa)
o PLS – Projeto de Lei do Senado Federal
o Rcl. – Reclamação Constitucional (STF)
o RE – Recurso Extraordinário (STF)
o RHC – Recurso em Habeas Corpus (STF e STJ)
o RI – Regimento Interno
o SARs – Suspicious Activity Report – (Relatórios de Atividades Suspeitas)
o SFN – Sistema Financeiro Nacional
o SISBIN – Sistema Brasileiro de Inteligência
o STF – Supremo Tribunal Federal
o STJ – Superior Tribunal de Justiça
o TCO – Termo Circunstanciado de Ocorrência
o TC – Terceiro Comando (facção criminosa)
o TJDFT – Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios
o UIF – Unidade de Inteligência Financeira
o UNODC – Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime
o v.g. – Verbi Gratia, por exemplo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO _______________________________________________________ 11
CAPÍTULO 1: NOÇÕES SOBRE CRIME ORGANIZADO ____________________ 12
1
Considerações iniciais ______________________________________________ 12
2
A gênese do crime organizado ________________________________________ 14
2.1
Conceitos ______________________________________________________ 17
2.2
Evolução _______________________________________________________ 23
2.3
Características e estruturas básicas _________________________________ 26
3
Organizações criminosas específicas __________________________________ 31
CAPÍTULO 2: NORMAS APLICÁVEIS AO CRIME ORGANIZADO ___________ 37
1
Princípios e interpretação da norma penal brasileira _____________________ 37
2
Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional ___ 39
3
Legislação aplicável ao crime organizado no Brasil ______________________ 43
3.1
Lei nº 9.034, de 05 de maio de 1996 _________________________________ 45
3.2
Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998 ________________________________ 48
4
PLS nº 150/2006___________________________________________________ 51
CAPÍTULO 3: COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL ___________ 56
1
Meios de combate ao crime organizado ________________________________ 56
1.1
Escutas telefônica, ambiental e clandestina – Lei nº 9.296/96 ___________ 59
1.2
Agente infiltrado – Leis nº 10.217/01 e 11.343/06 _____________________ 62
1.3
Ação controlada ou entrega vigiada – Leis nº 9.034/95 e 11.343/06 _______ 66
1.4
Quebras dos sigilos bancário e fiscal – LC 105/2001 e Lei nº 9.613/98 ____ 68
1.5
Delação premiada – Lei nº 9.807/1999 _____________________________ 71
2
Atividade de inteligência, sigilo e segredo de justiça ______________________ 74
3
Sugestões para o combate ao Crime Organizado no Brasil _________________ 77
CONCLUSÃO ________________________________________________________ 79
REFERÊNCIAS ______________________________________________________ 82
ANEXO A ____________________________________________________________ 87
ANEXO B ___________________________________________________________ 142
11
INTRODUÇÃO
Os conflitos, ao longo da história da humanidade, sempre estiveram presentes no
desenrolar do convívio social e das vicissitudes naturais da sobrevivência do homem. Já o
crime, como fenômeno social mais complexo, tem-se especializado ao longo do tempo a
ponto de se tornar o foco das grandes pesquisas e amplos debates acadêmicos na área
criminal. A origem do crime "surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso
porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou" (NORONHA, 2003, v. 1, p. 29).
Visa o presente trabalho realizar um estudo sobre o Crime Organizado no Brasil, cuja
esparsa legislação brasileira dificulta o pleno emprego eficaz por parte dos aplicadores do
direito. Por isso, como principal ponto, traça um paralelo entre as normas brasileiras
aplicáveis a espécie, e os meios eficazes de combate a esta especialidade do crime,
apresentando, também, o PLS nº 150/2006, que visa unificar o tema abordado.
Dado o fascínio que o autor nutre pelo estudo dessa modalidade delitiva especializada,
e ao incremento do caráter transnacional, além do poder que não conhece barreiras,
corrompem governos, alicia funcionários públicos, entranha-se nas instituições do poder,
contaminando os valores básicos da sociedade hodierna, a escolha do tema visa, além disso,
expor um pouco da visão policial e fornecer subsídios ao efetivo combate às Organizações
Criminosas no Brasil, doravante denominadas OCrim(s).
Parte-se dos conceitos e da gênese do Crime Organizado, onde se expõe as noções
propedêuticas, necessárias à correta análise do tema, passando-se ao estudo das normas
aplicáveis a espécie, da Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado
Transnacional, até comentários sobre as Leis nº 8.137/90, 9.034/95, 9.296/96, 9.613/98,
9.807/99 e 11.343/06, que versam sobre meios efetivos de combate a este crime, além da sua
respectiva confrontação com àquelas normas.
Conclui, expondo sugestões consideradas mais adequadas, dentre as quais, destacamse: O investimento na compra de equipamentos de inteligência; a formação de agentes
infiltrados; e a criação de Forças-tarefas, estruturadas especialmente para o combate ao crime
organizado.
O trabalho está longe de esgotar o tema, sempre dinâmico, extenso e profundo a exigir
tempo e pesquisas, o que o autor irá empreender num futuro compêndio. Por ora, traçará
breves as linhas gerais de uma introdução ao combate ao Crime Organizado no Brasil.
12
CAPÍTULO 1
NOÇÕES SOBRE CRIME ORGANIZADO
1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Encontram-se várias teorias do estudo pormenorizado do crime em função da pena
aplicada – “castigo” aposto como conseqüência da prática do ilícito penal. Alguns autores
relacionam a história do crime e da pena à história da própria legislação penal, outros, às
ideologias que norteiam a evolução do Direito Penal.
O que parece indissociável é a história do crime às penas cominadas. Confirma Helena
Márcia Bento Vincentini (2009, p. 11), que divide a história do crime em três épocas, a saber:
I. Primeira época, que era o atentado contra os deuses, cuja pena era um meio de
aplacar a cólera divina;
II. Segunda época, sendo este uma agressão violenta de uma tribo contra outra,
onde a pena era a vingança de sangue de tribo a tribo;
III. Terceira época, que era a transgressão da ordem jurídica estabelecida pelo Poder
do Estado, e a pena era a reação do Estado contra a vontade individual oposta à
sua.
Acrescentam-se os ensinamentos do argentino Eugenio Raúl Zaffaroni (2006, p. 157),
quando discorre sobre a evolução histórica do delito:
Assim, uma das distinções mais comuns que têm sido formuladas trata da vingança
privada como período primitivo, a vingança pública quando o Estado toma a seu
cargo a pena, a humanização da pena a partir do século XVIII, e o período atual, em
que cada autor dá como triunfantes suas próprias idéias.
E continua sua manifestação, advertindo que o estudo da legislação penal deve ser
feito desvinculado das ideologias criminais dominantes:
Embora não se deva confundir a história da legislação penal com a história das
idéias penais, pode parecer arbitrário separar o seu estudo. Sem embargo, cremos
que é conveniente fazê-lo, já que a história das idéias penais nem sempre coincide
exatamente com a da legislação e porque, em geral, esta recolhe dos ideólogos o que
convém à estrutura de poder em que esta inserida (p. 157).
Em sentido contrário é o entendimento de Aníbal Bruno (1976, p. 15), na sua clássica
obra “Das Penas”:
Podemos acompanhar a evolução da maneira de encarar e combater as
manifestações criminosas, através da história, seguindo a linha das idéias debatidas
no campo do pensamento jurídico-penal; não que as teorias dominassem os
13
costumes ou os orientassem, mas porque as concepções vigentes nas forças vivas da
cultura, em determinados momentos da sua evolução, sugeriram as soluções práticas
e muitas vezes as próprias construções da doutrina.
O citado autor opta, ao discorrer sobre o desenvolvimento das idéias penais, pelo
estudo vinculado as linhas ideológicas do pensamento jurídico-penal, para analisar as formas
históricas de combater as manifestações criminosas, o que inclui a legislação penal.
Ora, Zaffaroni alerta que o caminho a ser empreendido no estudo da legislação penal
não deve sofrer quaisquer influências ideológicas, já que nem sempre a norma penal é
influenciada pelo aspecto histórico-ideológico, e, de regra, apenas retira dos ideólogos a
conformação jurídico-positivista que se adéqua ao poder reinante da época, o que se
entende, não permitiria a exata compreensão dos efetivos alcance e significado que o
legislador intentou para norma penal estudada, e nem seria ético a sua tendenciosa análise
vinculada a qualquer ideologia penal a que se tentasse submetê-la.
Portanto, adotar-se-á a corrente de Eugenio Raúl Zaffaroni, quanto ao estudo sobre o
crime organizado no Brasil, aplicando-se a sua prudente recomendação: O confronto entre a
legislação e a sua eficaz aplicação será desvinculada de qualquer ideologia penal
(ZAFFARONI, 2006, p 158).
Ressalta-se, porém, que a análise da legislação pertinente ao crime organizado no
Brasil não se realizará de forma desvinculada das causas práticas e da realidade que
circundam o crime ou seus elementos subjetivos, observando-se, sempre que possível, a
jurisprudência e a doutrina abalizada relacionadas com os casos concretos da vida real.
A atenção dada à atividade interpretativa da lei penal deve basear-se nos fins
almejados por ela, buscando-se a sua aplicação prática, sem, contudo, optar-se apenas por um
método interpretativo específico, como, prematuramente, o fazem, parte dos pesquisadores da
matéria. Nesse desiderato, aduz Damásio Evangelista de Jesus, quando trata, em sua obra de
Direito Penal, no capítulo destinado à interpretação da lei penal:
A interpretação consiste em extrair o significado e a extensão da norma em
relação à realidade. É uma operação lógico-jurídica que se dirige a descobrir a
vontade da lei, em função de todo ordenamento jurídico e das normas superiores de
cultura, a fim de aplicá-las aos casos concretos da vida real (2005, v. 1, p. 33,
grifo nosso).
A atividade cognitiva do intérprete da norma penal deve se pautar-se pela liberdade de
escolha do método que julgar mais adequado, buscando integrar essa norma a todo
ordenamento jurídico em que se encontra inserida, paralela à análise dos casos práticos da
vida real, estudado em comparação com as doutrinas e jurisprudências sobre a matéria.
14
2
A GÊNESE DO CRIME ORGANIZADO
O comércio mundial se acelerou nas últimas décadas, oriundo, em grande parte, do
fenômeno da globalização 1, o que aumentou a circulação de riquezas e de capitais, e
propiciou uma intensificação nas relações econômicas, políticas, sociais e culturais das
nações, facilitando as transações comerciais internacionais quase instantaneamente, e, na
maioria das vezes, sem nenhum controle ou fiscalização por parte dos Estados.
A busca pelo crescimento dos negócios relativos a produtos e serviços, por parte das
empresas que internacionalizaram suas operações intentando aumentar as margens de lucros,
aliada a um grande interesse dos Estados modernos em disputar novos mercados, subsidiando
os seus produtos internos e buscando aumentar o seu Produto Interno Bruto (PIB), produziram
uma queda nas barreiras da fiscalização comercial transnacionais.
Recentemente, uma reportagem do jornal Folha de São Paulo, intitulada “Brecha
permite fraude em exportações” (ROLLI; FERNANDES, 2009, caderno B, p. 1), destacou as
deficiências na fiscalização das exportações brasileiras por parte do Sistema Integrado de
Comércio Exterior (SISCOMEX) 2, informando que “falhas na forma de registrar vendas e
falta de fiscalização abrem espaço para lavagem de dinheiro e envio de produtos ilegais”.
Mencionou, também, que as exportações brasileiras totalizaram, no ano passado,
conforme dados do SISCOMEX, US$ 175,5 bilhões (cento e setenta e cinco bilhões de
dólares) (p. 3).
Não obstante a diminuição nesse tipo de fiscalização ser oriunda, em grande parte, da
imposição de políticas governamentais de incentivo ao comércio exterior, o órgão de
inteligência do fisco brasileiro
1
3
revela números expressivos nas apreensões dos produtos
Globalização, no dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, possui duas definições que interessam a esse
estudo, todas no campo da economia política, a saber: É o “intercambio econômico e cultural entre diversos
países, devido à informatização, ao desenvolvimento dos meios de comunicação e transporte, à ação
neocolonialista de empresas transnacionais e à pressão política no sentido de abdicação de medidas
protecionistas”; e, “integração cada vez maior das empresas transnacionais, num contexto mundial de
livre-comércio e de diminuição da presença do Estado, em que empresas podem operar simultaneamente
em muitos países diferentes e explorar em vantagem própria as variações nas condições locais” (2001, p.
1457, grifo nosso).
2
O Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX) é um sistema informatizado de facilitação das
exportações brasileiras, administrado pelos órgãos gestores que são: Secretaria de Comércio Exterior (SECEX),
Receita Federal do Brasil (RFB) e o Banco Central do Brasil (BACEN). Esse sistema visa reduzir a burocracia
das atividades de exportação, aumentando a competitividade das empresas nacionais no mercado exterior
(MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR, 2009).
3
O Sistema de Inteligência Fiscal (SIF) foi instituído pelo Protocolo ICMS nº. 66, de 03 de julho de 2009,
publicado no DOU, de 15 de julho de 2009, e prevê uma Doutrina de Inteligência Fiscal (DIF) que fundamenta
a integração das Unidades de Inteligência Fiscal (UnIF), no âmbito das secretarias de Fazenda, Receita,
15
proveniente das atividades ilícitas, como registrou no ano de 2008, onde R$ 572,5 milhões
(quinhentos e setenta e dois mil e quinhentos reais) em mercadorias foram apreendidos e
aplicados R$ 2,2 bilhões (dois bilhões e duzentos milhões de reais) em autos de infração
(ROLLI; FERNANDES. caderno B, p. 3).
Contudo, essas dificuldades ou deficiências no controle e no comércio das fronteiras
não é um problema apenas do Brasil. Nos Estados Unidos, “a cada ano, 60 milhões de
pessoas entram no país em mais de 657 mil vôos comerciais e privados, e 370 milhões
entram por terra. Além disso, 116 milhões de veículos atravessam os postos de
fronteira”, constituindo-se uma missão impossível “acreditar que as agências do governo,
[...] possam neste momento bloquear uma fronteira tão porosa” (NAÍM, 2006, p. 169, grifo
nosso), com grande fluxo de migrantes ilegais, que são provenientes de regiões fronteiriças.
Alguns países têm buscado a cooperação internacional como uma solução imediata,
porém, estes instrumentos de cooperação internacional, firmados por entes de direito
internacional público, encontram diversas barreiras, tais como a própria burocracia interna
dos países signatários, em contraste com a intensa dinâmica e diversidade dos delitos
praticados pelos “contrabandistas” internacionais.
De outra ordem, algumas nações estão envolvidas nas próprias teias do crime
globalizado, como a Coréia do Norte, onde altas autoridades patrocinam vigorosamente o
“tráfico mundial de drogas, armas, pessoas e espécies ameaçadas” entre outros (NAÍM, p. 31).
Como ressalta esse autor, a globalização abriu novos horizontes aos contrabandistas,
que encontram não só dinheiro, mas também poder político, criando um gigantesco comércio
ilícito internacional, contrabandeando produtos que vão de armas leves a ogivas nucleares;
tráfico de drogas – ainda o comércio ilícito mais lucrativo –; tráfico de pessoas,
principalmente de mulheres e de crianças, utilizados para o trabalho escravo e a prostituição
internacional; “lavagem de dinheiro” dos lucros obtidos nas diversas atividades ilegais;
tráficos de órgãos humanos, animais e obras de arte (NAÍM, p. 9 – 164) e explosivos –
inclusive alimentando o terrorismo internacional.
Existe, ainda, a denominada pirataria internacional, que compreende a falsificação
de diversos produtos, tais como, DVDs, cópias ilegais de softwares, relógios, roupas, obras de
arte, fármacos, máquinas industriais, livros e tantos outros, que também foram alavancados
pelos efeitos da globalização no comércio mundial.
Finanças ou Tributação, dentro das unidades da federação, estabelecendo regras de cooperação técnica e de
troca de informações de interesse do fisco (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2009). São órgãos integrantes do
sistema de fiscalização do Fisco brasileiro, que produzem dados importantes ao combate ao Crime Organizado
no Brasil.
16
Dentro desse contexto caótico, o Crime Organizado surge como “decorrente da
modernização dos meios de comunicação, equipamentos tecnológicos de toda natureza, dos
meios de transporte e de processamento de dados” (MENDRONI, 2009, p. 7) e,
principalmente, apoiado pelas facilidades e lucros obtidos no comércio ilícito internacional,
que desprovido de efetivos meios de controle e fiscalização, graças às políticas
governamentais de apoio ao comércio exterior, inclusive em mercados como o MERCOSUL,
favorecem o surgimento, investimento e capitalização, pelas OCrim(s), nesse comércio ilegal.
A dinâmica na busca pelo lucro incessante e do caráter transnacional que, quase
sempre, evolve o Crime Organizado, rompe com as fronteiras da distância abrindo espaços
para “novos mercados”, diversificando os crimes. Este quadro ainda é agravado, como foi
enfatizado, por políticas governamentais de redução da fiscalização do comércio exterior.
Como organização que empreende negócios ilícitos, na busca e capitalização do lucro,
as OCrim(s), marcadamente, se assemelham às estruturas de uma moderna empresa. Guaracy
Mingardi aduz que, “o crime organizado caracteriza-se pela previsão de lucros, hierarquia e
planejamento empresarial”. (apud SANTOS, 2006, p. 11). Isso contribui para dificultar as
investigações e a correta identificação das atividades ilegais desenvolvidas pelas OCrim(s),
levando a séria advertência de Marcelo Batlouni Mendroni, no sentido de que “a partir da
constatação das complexas estruturas que envolvem a existência de uma organização
criminosa, torna-se imperioso concluir pela impossibilidade de eficiente investigação de todos
os participantes e de todas as suas atividades” (p. 45). Nesse ponto, ousamos discordar do
citado autor. Acredita-se que uma análise global das modalidades criminosas empreendidas,
utilizando-se dos meios efetivos de combate e prevenção, citados mais adiante, auxiliados
por uma moderna legislação compatível com a aplicação desses instrumentos,
possibilitará uma ampla investigação de todos os participantes e atividades ilícitas envolvidas,
e, consequentemente, na formação das provas que subsidiem a ação penal pertinente.
No Brasil, agravam a situação às deficiências da justiça criminal e do sistema
carcerário brasileiro, como expõe o documentário de Maria Augusta Ramos (JUSTIÇA,
2004), que mostra o cotidiano da Justiça Criminal no Fórum do Rio de Janeiro e a precária
situação dos presos que ficam em celas superlotadas dominadas por facções criminosas.
A gênese do crime organizado se pauta pela observância das estruturas e elementos
que o integram, envoltos em uma complexa dinâmica, decorrente da prática de várias
atividades criminosas. Nesse contexto, torna-se necessário discorrer, sucintamente, sobre os
seus conceitos – aspecto formal –; evolução histórica; além, evidentemente, de apontar-lhe as
características e estruturas – que seriam os aspectos materiais.
17
2.1 CONCEITOS
Preliminarmente, para uma correta compreensão da gênese do Crime Organizado, são
necessários alguns conceitos propedêuticos, comuns à ciência do Direito, e que integram o
núcleo do tema abordado. Trata-se das noções de Estado, crime, quadrilha ou bando,
associação ilícita, Crime Organizado e Organização Criminosa (OCrim).
Assim, começando-se pelo Estado, traz-se à colação a lição do saudoso mestre
Hildebrando Accioly, para quem constitui um “agrupamento humano, estabelecido
permanentemente em um território determinado e sob um governo independente” (2002, p.
83). São elementos do Estado, o território, o povo e a soberania (DALARI, 2005, p. 74).
Destaca-se o território como o elemento constitutivo do Estado mais importante para o
combate ao Crime Organizado, pois é nele que se estabelecem as fronteiras físicas entre os
países, criando os limites reais para atuação da soberania estatal, ou seja, a delimitação da
eficácia das leis penais no espaço, as regras para atuação dos agentes públicos ou políticos,
entre outros elementos, que informam a persecução e ação penal.
Importa, ainda, a noção de reconhecimento entre os “entes” de direito internacional,
extraída do Direito Internacional Público 4.
Para Maria Helena Diniz, reconhecer um “ente” significa “ato unilateral pelo qual um
Estado soberano aceita uma situação fática ou jurídica de outro, legitimando-a.” (2005, v. 4,
p. 68), ou seja, significa aceitá-lo como destinatário das normas de Direito Internacional,
adquirindo, assim, personalidade jurídica. Nessa seara, o professor Valério Mazzuoli, leciona
que “não se tem uma definição precisa para o reconhecimento de Estado. Para os fins do
Direito Internacional o reconhecimento do Estado é um 'ato livre’ pelo qual um ou mais
Estados reconhecem a existência, em um território determinado, de uma sociedade
humana politicamente organizada, independente de qualquer outro Estado existente e
capaz de observar as prescrições do Direito Internacional.” (2008, p. 34, grifo nosso).
4
Aqui, para os fins desse trabalho, restringir-se-á o conceito de “ente” a todas as entidades ou sujeitos de Direito
Internacional, que se relacionam, de alguma forma, com o controle, combate e repressão ao crime organizado no
mundo; tais como, Organizações das Nações Unidas (ONU), Polícia Internacional (INTERPOL), entre outras.
Esta noção é importante para o estudo do crime organizado, tanto pelo caráter transnacional destes crimes como
pela adesão aos tratados, acordos, convenções e demais instrumentos normativos celebrados entre estes “entes” e
o Brasil, v.g., a Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional, que foi promulgada
no Brasil, pelo Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004. O reconhecimento entre os “entes” de Direito
Internacional permite celebrar acordos internacionais que, in casu, permite uma atuação mais efetiva no combate
ao Crime Organizado por parte dos países signatários.
18
Crime é quando ocorre uma ação ou omissão, voluntária ou não, que viola a norma
protetiva dos direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade (art. 5º, in
fine, da Constituição Federal de 1988), e outros, que o legislador elege como fundamentais
para a vida em sociedade.
Ao se estudar o crime, torna-se imperioso se mencionar o consagrado princípio da
anterioridade, previsto no inciso XXXIX, da Constituição Federal de 1988, que proclama:
“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, sendo
fundamental a existência prévia de uma lei definidora do fato típico e antijurídico, dentro do
ordenamento jurídico brasileiro, para que reste configurado o crime, ou seja, este passe a
subsumir determinada conduta descrita na norma incriminadora, tornando-a ilícita, ou, se
prevista em tratados e convenções internacionais, criminalizando a conduta tipificada nos
países signatários destas, sempre condicionadas ao Controle de Constitucionalidade.
Julio Fabbrini Mirabete, citando o renomado mestre Francesco Carrara, introduz em
sua obra a definição de crime como “a infração da lei do Estado, promulgada para proteger a
segurança dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo,
moralmente imputável e politicamente danoso” (2005, p. 39).
O crime de Quadrilha ou bando, por sua vez, ocorre quando, associam-se mais de
três pessoas para o fim de cometer crimes, segundo se extrai do art. 288, do Código Penal
Brasileiro, inserido no título que aborda os crimes contra a paz pública.
Importa mencionar-se a origem histórica do crime de quadrilha ou bando no Brasil,
que remonta ao período da década de 30, quando foi “introduzido no ordenamento jurídicopenal nacional para dar combate ao cangaço” (QUEIROZ, 1998, p. 72).
É imperioso observar que quadrilha e bando são termos unívocos. Nesse sentido,
encontra-se o lapidar entendimento do professor Rogério Greco, que cita ser inútil diferenciar
quadrilha e bando, já que o Código Penal encara essas palavras como sinônimas (2009, p.
206).
Deve-se enfatizar a lição de Guilherme de Souza Nucci (2007a, p. 938), para quem
“associar-se significa reunir-se em sociedade, agregar-se ou unir-se. O objeto da conduta é a
finalidade de cometimento de crimes”, exigindo-se a estabilidade e permanência dos
criminosos envolvidos, além do intento doloso para a prática de crime (s).
Como se verifica, pune-se a intenção dos agentes – mais de três –, mesmo que apenas
um pratique o crime, e, até mesmo, “a reunião premeditada em grupo deve ser punida porque
em si já consiste em abalo à ordem pública” (MENDRONI, p. 8 e 9), já que o crime de
quadrilha ou bando é autônomo e específico, prescindindo da posterior prática criminosa,
19
como já decidiu o Colendo STF 5. Contudo, cumpre observar que não incorre no crime de
quadrilha ou bando a reunião de indivíduos para o consumo de drogas 6.
Apesar de a conduta perpetrada por indivíduos usuários de drogas macular o bem
jurídico que protege a Saúde Pública, o art. 28, da Lei nº 11.343/2006 (nova Lei de drogas),
em confronto com § 3º, do art. 33, desse mesmo diploma legal, informa que a postura do
usuário que repassa drogas a desconhecido, quando este estiver fora do seu círculo pessoal,
íntimo ou familiar, deve ser tipificada como tráfico de drogas, conforme a doutrina de
Vicente Greco Filho e João Daniel Rassi (2007, p. 45 – 47), e em consonância com a firme
decisão do pretório excelso sobre a matéria, proferida em acórdão unânime, verbis:
[...] A cessão gratuita de substância canabis ("maconha") equivale, juridicamente, ao
fornecimento oneroso de substância tóxica, pelo que ambos os comportamentos
realizam, no plano da tipicidade penal, a figura delituosa do tráfico de entorpecentes
[...] A condenação pelo crime de tráfico – que se constitui também pelo
fornecimento gratuito de substancia entorpecente – não é vedada pelo fato de
ser o agente um usuário da droga. Não descaracteriza o delito de tráfico de
substância entorpecente o fato de a Polícia haver apreendido pequena
quantidade do tóxico em poder do réu [...] (STF: HC nº 69806,
Relator Ministro Celso de Mello, Primeira Turma, julgado em
09.03.1993, DJ 04.06.1993, grifo nosso).
Ressalta-se que o crime de quadrilha ou bando não abarca as contravenções penais, o
que dificulta a repressão ao “jogo do bicho”, jogo de azar muito comum no Brasil com fortes
laços com o Crime Organizado e com a “lavagem de dinheiro”.
Na hipótese de o bando ser armado, fica caracterizada a qualificadora prevista no
parágrafo único, do art. 288, do CPB. Com relação a essa conduta, apesar da grande discussão
doutrinária, predomina o entendimento de que basta apenas um membro da quadrilha ou
bando estar armado, não importando se é arma própria ou imprópria, para que se configure a
qualificadora de bando armado, porém, com o prévio conhecimento da existência do
integrante armado por todos demais, configurando, no mínimo, a culpa (DELMANTO, 2007,
p. 719), condição necessária para a punibilidade de toda quadrilha ou bando.
Associação ilícita é expressão procedente da ab-rogada lei de “entorpecentes” 7, Lei nº
6.368, de 21 de outubro de 1976, a qual, em seu art. 14, previa: “Associarem-se 2 (duas) ou
5
Nesse sentido, decidiu o Egrégio STF: “AÇÃO PENAL. Crime de quadrilha ou bando. Delito formal contra a
paz pública. Circunstâncias elementares do tipo. Concurso de, pelo menos, quatro pessoas, finalidade específica
dos agentes e estabilidade do consórcio. Exigência da prática ulterior de delito compreendido no projeto
criminoso. Desnecessidade. Figura autônoma. Descrição suficiente dos fatos elementares. Denúncia apta.
Impossibilidade de aprofundar a cognição dos fatos à luz da prova. HC denegado. Inteligência do art. 288 do
Código Penal. Precedentes. Crime formal, o delito de quadrilha ou bando consuma-se tanto que aperfeiçoada a
convergência de vontade dos agentes e, como tal, independe da prática ulterior de qualquer delito compreendido
no âmbito de suas projetadas atividades criminosas” (HC nº 88978, Relator Ministro Cezar Peluso, Segunda
Turma, julgado em 04.09.2007, DJ 21.09.2007, grifo nosso).
6
Com esse entendimento, cita-se o julgado do STF: RHC nº 53119/GB – Guanabara, Relator Ministro Aliomar
Baleeiro, Primeira Turma, julgado em 25.02.1975, DJ 11.04.1975.
20
mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos
Arts. 12 ou 13 desta Lei”.
O termo associação ilícita foi implicitamente revogado pela Lei nº 8.072, de 25 de
julho de 1990, embora haja jurisprudência deste período entendendo que não 8. Consistente
doutrina da época entendia que haveria incompatibilidade com a definição de quadrilha ou
bando, prevista no art. 288, do Código Penal Brasileiro (GRECO FILHO, 1996, p.103).
Portanto, entende-se que, ab-rogada a Lei 6.368/76, empregar associação ilícita para
definir os crimes de quadrilha ou bando é, hodiernamente, incorreto.
Por derradeiro, também mencionam associação ilícita o art. 2º, da Lei nº 2.889, de 01º
de outubro de 1956, que “define e pune o crime de genocídio”, e os arts. 16 e 25, da Lei nº
7.170, de 14 de dezembro de 1983, que “define os crimes contra a segurança nacional, a
ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências”. O art.
2º, que pertinente a primeira Lei, tipifica a associação de mais de três pessoas para a prática
dos crimes relacionados com o de genocídio (art. 1º, “a” – “e”); já a Lei nº 7.170/83, nos seus
artigos 16 e 25, prevê as associações que atentem contra a ordem política vigente. Destarte,
são crimes específicos que, por si só, não restabelecem autonomia a expressão associação
ilícita.
Nessa senda, corrobora a lição de Guilherme de Souza Nucci, quando aduz, ao se
referir ao art. 2º, da Lei nº 2.889/56, que deve tipificar a conduta de quadrilha ou bando a
prática que se destinar a crimes em geral, “porém, se a associação disser respeito à prática de
genocídio, optou o legislador por criar um tipo específico” (2007b, p. 590).
Impõe-se mencionar que alguns operadores do direito insistem no emprego da
expressão “associação ilícita” como elemento pertencente ao conceito de Crime Organizado,
porém, apenas “considerando a pluralidade de sujeitos consorciados para a prática de delitos”
(SANTOS, 2006, p. 9). Nesse caso, não é empregada no sentido de uma expressão autônoma,
mas apenas designa o que reproduz – uma associação –, o que se entende, mesmo assim, não
é adequado, principalmente, para se referir às Organizações Criminosas.
7
Em monografia apresentada pelo autor desse trabalho, apontou-se que além do termo “entorpecente” ter sido
banido pela Organização Mundial de Saúde – OMS, e ainda ser espécie do gênero “tóxico” – também abolido –,
a nova Lei de drogas, Lei nº 11.343, de 24 de agosto de 2006, que ab-rogou as Leis nº 6.368/1976 e nº
10.409/2002, adotou e definiu, em seu art. 1º, o conceito de drogas, acabando de vez com este imbróglio. Assim,
temos, In verbis: “Art. 1º. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias capazes de causar
dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder
Executivo da União” – ou seja, é uma norma penal em branco que depende das listas publicadas pela
ANVISA, relacionando as substâncias que causam dependência (ALMEIDA, 2006, p. 19).
8
Nesse sentido, ver decisão do STF que discute a existência do crime de associação para o tráfico, no HC nº
72862, Relator Ministro Néri da Silveira, Segunda Turma, julgado em 07.11.1995, DJ 25.10.1996.
21
Analisar o conceito de Crime Organizado é tema tormentoso devido à absoluta
ausência de uma definição legal que abarque, de uma só vez, todas as formas e espécies deste
crime, considerado, além disso, a sua notável dinâmica motivacional – o lucro desmedido.
O conceito de crime organizado é mais extenso e complexo do que o de quadrilha ou
bando, previsto no art. 288, do CPB, que foi erroneamente absorvido pela Lei nº 9.034/1995,
já em seu artigo primeiro os equipara nos seguintes termos, verbis: “Esta Lei define e regula
meios de prova e procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de
ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de
qualquer tipo”.
Percebe-se, na simplicidade e desleixo do legislador nesse artigo, que iguala, também,
organizações e associações criminosas.
Manifesta-se, pois, filiando-se a doutrina nacional majoritária, pela não concordância
com a disposição contida nesse artigo 1º, da Lei nº 9.034/1995, que se constitui em gravíssima
falha legislativa.
Revela-se o que aduz o eminente Promotor de Justiça, Marcelo Batlouni Mendroni,
que conclui, após analisar as mais diversas definições, entre as quais, citam-se às do
President’s Comission on Organized Crime (PCOC); da Organização das Nações Unidas
(ONU); do Federal Bureu of Investigation (FBI); da Polícia Internacional (INTERPOL) e a
inserida na própria Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional,
entre outras, verbis:
Observa-se que existem diversas definições com pontos semelhantes, mas de
conteúdo geral distintas. Pergunta-se: Qual a correta? Resposta: todas e nenhuma.
Explica-se. Na verdade, não se pode definir organização criminosa através de
conceitos estritos ou mesmo de exemplos de condutas criminosas como
sugerido. Isso porque não se pode engessar este conceito, restringindo-o a esta
ou aquela infração penal, pois elas, as organizações criminosas detêm incrível
poder variante. Elas podem alterar as suas atividades criminosas, buscando
aquela atividade que se torne mais lucrativa, para tentar escapar da persecução
criminal ou para acompanhar a evolução mundial tecnológica e com tal rapidez,
que quando o legislador pretender alterar a Lei para amoldá-la à realidade – aos
anseios da sociedade –, já estará alguns anos em atraso. E assim ocorrerá
sucessivamente (2009, p. 18, grifo nosso).
A conclusão a que o autor chega confirma a dificuldade em se definir o conceito de
Crime Organizado, dada a intensa dinâmica que envolve às suas atividades ilegais, pugnando
que qualquer norma penal que se proponha a limitá-lo – o conceito –, estará fadada ao
fracasso diante do caráter facilmente adaptável dessa modalidade especializada do crime.
Observando-se a firme lição, que diz ser uma norma definidora do Crime Organizado
limitante do seu conceito, destaca-se o que, considerando o todo da Convenção das Nações
22
Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, acredita-se é a mais profícua definição,
quando trata de “grupo criminoso organizado", em seu art. 2, alínea “a”, verbis:
“Grupo criminoso organizado" - grupo estruturado de três ou mais pessoas,
existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de
cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção,
com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou
outro benefício material. (art. 2, “a”, do Decreto nº 5.015, de 12 de
março de 2004, que promulgou a Convenção das Nações Unidas
contra o Crime Organizado Transnacional no Brasil, grifo nosso) (ver
Anexo A).
Grupo criminoso organizado é a tradução oficial, realizada pelo governo brasileiro,
para a palavra Organized criminal group, constante do art. 2, “a”, do original da citada
Convenção, e que, desse modo, possui o mesmo significado de Organização Criminosa
(OCrim), cujos elementos foram abordados acima. A par da generalidade empregada nos
termos da citada Convenção, faz-se as seguintes considerações:
1. Embora similar a definição de quadrilha ou bando, impõe a existência de um
“grupo estruturado”, o que demanda hierarquia e divisão de tarefas;
2. “Existente há algum tempo”, que traz a noção de estabilidade;
3. “Atuando concertadamente” (em concerto), ou seja, de forma organizada;
4. Com o “propósito de cometer infrações graves ou enunciadas na presente
convenção”. Trata-se da intenção de praticar infrações graves, ou, de outras
relacionadas como atividades de OCrim(s). A Convenção considera
infrações graves às punidas com a pena privativa de liberdade superior ou igual
há quatro anos, ou às relacionadas na própria convenção, que contém alguns
tipos abertos (corrupção, extorsão, seqüestro etc., a cargo da própria legislação
dos estados integrantes); e,
5. Com a “intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou
outro benefício material”, significando dizer que estes grupos possuem a
intenção de auferir lucros oriundos de bens econômicos ou quaisquer
vantagens
econômicas
(v.g.,
bens
móveis,
imóveis
e
semoventes,
investimentos em ações ou aplicações financeiras que gerem dividendos, etc.).
A própria Convenção com objetivo de combater e reprimir o Crime Organizado nos
países signatários traz importantes conceitos “a serem utilizados de forma uniforme pelos
países subscritores” (MENDRONI, p. 32).
Deveras importante é mencionar o art. 24, da já mencionada Lei nº 7.170/83 – Lei da
Segurança Nacional –, que traz, in verbis (grifo nosso): “Constituir, integrar ou manter
23
organização ilegal de tipo militar, de qualquer forma ou natureza armada ou não, com ou
sem fardamento, com finalidade combativa”.
Considera-se o art. 24, da Lei nº 7.170/83, como conceito de Organização Criminosa
em sentido estrito, já que tipifica a conduta criminosa praticada por organização de tipo
militar, a exemplo das FARC que atuam na Colômbia, onde empreendem combates de
guerrilha além de seqüestros e tráfico de drogas, ou seja, uma espécie de OCrim(s) específica
voltada para a prática de ações ilegais de natureza militar.
Ora, como forma subsidiária, a doutrina tem buscado definições de Crime Organizado
em seus elementos caracterizadores e na sua estrutura básica, que serão tratados
detalhadamente neste capítulo, na seção 2.3.
2.2 EVOLUÇÃO
As origens do Crime Organizado no Brasil, para doutrina em geral, são imprecisas e
carentes de pesquisas científicas que comprovem o seu surgimento exato. Alguns autores
desconsideram a importância dos estudos nesta área por acreditarem ser de pouca utilidade no
Brasil, já que de regra, não são imediatos os efeitos dos crimes praticados por estas
organizações criminosas. Citam-se os crimes de “lavagem de dinheiro” e de tráfico de drogas,
que ocultam a origem dos seus lucros e das suas respectivas operações ilegais principais –
grandes movimentações de moedas e de drogas.
Porém, sem se conhecer o histórico do Crime Organizado no Brasil, as autoridades
incumbidas de combatê-lo não terão subsídios suficientes para reprimi-lo de maneira eficaz.
Considera-se evolução o histórico no aprimoramento dos métodos empregados pelas
diversas OCrim(s) estabelecidas no país, ou seja, como surgiram e evoluíram esses crimes e
de onde provém a capacidade em diversificar e encobrir o capital proveniente das mais
diversas operações ilegais.
Sabe-se que parte considerável dos estudiosos da matéria, avalia, hoje, como facções
criminosas “sui generis”, por manterem características próprias, às que operam no Estado do
Rio de Janeiro. O Doutor Benjamin Lessing, num estudo desenvolvido no Brasil, concluiu
que “o que as diferencia é menos a capacidade de estabelecer o monopólio local sobre o
24
comércio de drogas do que a resiliência 9 da sua estrutura interna e, portanto, a duração da sua
existência e dominação” (2009, p. 42, grifo do autor).
Estas OCrim(s), sucintamente, surgiram quando presos políticos passaram a dividir as
mesmas celas onde estavam criminosos comuns, e isso, historicamente, “continua depois do
levante comunista de 1935” (AMORIM, 2007, p.63).
Nessa seara, a par dos parcos estudos em relação à origem das organizações
criminosas no Brasil, e considerando o que diz o eminente professor Marcelo Bartouni
Mendroni quando aduz que tudo sobre este tema no país “ainda não se pode considerar
definitivo, porque não foi realizado nenhum estudo sério e profundo a respeito” (2009, p. 33),
discorda-se, no entanto, dessa afirmação por entender-se que assiste razão ao jornalista Carlos
Amorim, cuja pesquisa sobre o tema foi publicada no livro intitulado, “CV-PCC: A
irmandade do Crime”.
As pesquisas empreendidas pelo citado jornalista, com fulcro nas facções criminosas
Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC) (Ver quadros 1 e 2,
Anexo B), em suma, nos informam que a primeira surgiu dentro do presídio Cândido Mendes,
também conhecido como presídio da Ilha Grande ou “caldeirão do diabo”, situado no litoral
sul do Rio de Janeiro.
Destacam-se, aqui, por oportunas, suas afirmações:
As origens do Comando Vermelho estão, de certa forma, associadas à luta política.
Já conhecemos a história de presos comuns que se organizaram a partir do contato
com a esquerda aprisionada, durante os períodos de exceção. Os revolucionários,
possivelmente, não pretenderam ensinar criminosos a fazer guerrilhas.
E, prossegue, o autor:
Em muitos anos de pesquisas, nunca encontrei indício claro de que houvesse uma
intenção – menos ainda uma estratégia – para envolver o crime na luta de classes.
Mesmo assim, a experiência do confronto armado contra o regime militar e do
método de construção de grupos militantes – transferida pelo convívio nas
cadeias – foi o ensinamento que faltava para o salto de qualidade rumo ao
crime organizado (p. 263, grifo nosso).
A partir da década de 1980, motivadas pelo fenômeno da globalização, as OCrim(s)
têm passado por um processo de mudança no seu modus operandi, tais como:
a. Redução do número de membros dentro da OCrim;
b. Busca por especialistas em setores específicos do crime, inclusive, terceirizando
algumas atividades ilícitas;
9
A resiliência, para o Doutor Benjamim Lessing, está ligada a estabilidade e capacidade de reestruturação, ou,
“em outras palavras, tudo indica que o narcotráfico carioca exibe um equilíbrio estável, de baixa variação e com
um nível muito alto de organização” (LESSING, 2009, p. 58).
25
c. Prática das atividades criminosas por breves períodos de tempo, diversificando-as,
quando possível, para manter o lucro constante;
d. Rápidas mudanças territoriais, logo após a prática e/ou obtenção dos lucros da
atividade delitiva, se aproveitando-se da incomunicabilidade das autoridades
estaduais.
Marcelo B. Mendroni explica que, agindo dessa forma, essas organizações criminosas
dificultam as investigações das autoridades locais, e não se confrontam com as OCrim(s) préestabelecidas em bases territoriais fixas (2009, p. 47).
Acredita-se que a crescente intensificação das atividades de combate ao Crime
Organizado por parte dos órgãos da Segurança Pública no Brasil, apoiados por diversos
“entes”, tais como a INTERPOL e os órgãos de inteligência de outros países, adquirindo
características de força-tarefa de cooperação internacional, também contribuem para o novo
processo de mudança das OCrim(s).
Assim sendo, as características e estruturas das organizações criminosas tradicionais,
estão passando por um processo de mutação no seu modo de operação, sem, contudo,
descaracterizar-se as máfias tradicionais (Russas, Chinesas, Japonesas e outras) e as mais
conhecidas organizações criminosas no Brasil (CV, PCC, ADA, TC e outras), que continuam
existindo e atuando em bases territoriais fixas.
Em 1995, a repórter do Jornal da Band, pertencente a então emissora TV Bandeirante,
Fátima de Souza, alertou para o surgimento de uma Organização Criminosa denominada
Primeiro Comando da Capital (PCC). Contudo, “as autoridades públicas não deram a menor
importância ao que a jornalista estava denunciando. Anos depois, o PCC desabou sobre o
sistema penal paulista como uma força incontrolável” (AMORIN, p. 374).
O PCC foi criado “para supostamente defender os direitos de cidadãos encarcerados
no país. Foi fundado em 31 de agosto de 1993, por oito presidiários, no Anexo da casa de
Custódia de Taubaté, chamada de „Piranhão‟ até então a prisão mais segura do Estado de São
Paulo” (COSTA JR., 2009, p. 30). No início, o PCC promovia rebeliões isoladas e restritas
aos interiores dos estabelecimentos prisionais do estado São Paulo, de onde provinham às
ordens emanadas dos líderes presos. Posteriormente as rebeliões se intensificaram em todo o
Estado, se espalhando para fora dos presídios paulistas.
Hoje, o PCC é chamado de “partido do crime”, possuindo estatuto próprio com 16
regras obrigatórias, e muitas semelhanças com a forma de atuação do CV no interior dos
estabelecimentos prisionais do Rio de Janeiro, onde, por intermédio de interceptações
telefônicas autorizadas pela justiça, realizadas em cima dos principais líderes presos do tráfico
26
de drogas, constatou-se “o que todo mundo já sabia: mesmo atrás das grades, os homens do
Comando Vermelho continuavam à frente dos negócios” (AMORIN, p. 380). Às OCrim(s)
nunca param de evoluir nos métodos associados à tecnologia voltada para o crime.
Essas são apenas duas das facções criminosas organizadas que surgiram dentro dos
presídios brasileiros. Sem dúvida, a situação precária do sistema prisional, aliadas a
corrupção, miséria e crescimento da violência nas grandes metrópoles, corroboram para o
surgimento e crescimento dessas OCrim(s), que se assemelham às clássicas ou tradicionais.
Para o Delegado de Polícia Federal e professor da Academia Nacional de Polícia
(ANP/DPF), Rodrigo Carneiro Gomes (2006), “a existência do crime organizado é uma
demonstração de um poder paralelo não legitimado pelo povo, que ocupa lacunas deixadas
pelas deficiências do Estado Democrático de Direito e demonstra a falência do modelo estatal
de repressão à macro-criminalidade, que, no dia-a-dia, vem mostrando-se um Estado
anêmico”.
2.3 CARACTERÍSTICAS E ESTRUTURAS BÁSICAS
Inicialmente, faz-se o alerta: Na doutrina nacional, a utilização de expressões
sinônimas tem sido recorrente ao se expor as características e estruturas do Crime
Organizado.
Adotar-se-ão os elementos caracterizadores que definem grande parte das OCrim(s)
que atuam no Brasil, utilizando-se da classificação do Doutor Marcelo Batlouni Mendroni
(2009, p. 20 – 37), que anui como organização criminosa clássica ou tradicional
10
às que
possuem as seguintes características, a saber:
a. Membros restritos;
b. Divisão direcionada de tarefas;
c. Estrutura hierárquico-piramidal;
d. Agentes públicos participantes ou envolvidos;
e. Orientação para a obtenção de dinheiro e de poder;
f. Domínio territorial; e,
10
Já se mencionou o contexto em que se deu a evolução do crime organizado contemporâneo, mais adiante,
abordar-se-ão as OCrim(s) específicas, dos tipos econômicas e mafiosas, sem se descurar do foco principal
desse trabalho, que aborda, também, as facções criminosas brasileiras ou “sui generes”.
27
g. Entende-se compor, também, a capacidade ou poder de persuasão.
A base de uma OCrim é funcionar com membros restritos, pois a especialidade dos
seus integrantes é a condição de sobrevivência no submundo do crime.
Está imbricada ao segredo das operações criminosas – tratada por alguns como
compartimentação –, a especialidade dos membros e a confiança dos integrantes no
desempenho das tarefas que lhes são designadas. Ademais, deverão obedecer a uma rígida
hierarquia e possuírem capacidade para o cometimento de crimes, quando assim forem
designados, sem hesitar.
O recrutamento é feito através de “testes de habilidades, parentescos, indicações por
outros membros, raça, fichas ou autuações criminais e considerações similares”
(MENDRONI, p. 36).
A divisão direcionada de tarefas se estrutura com base na especialidade criminosa,
dividida em módulos, que por sua vez, se subdividem em ramos variados de crimes. Consiste
no emprego de um membro restrito da OCrim, em uma função para qual este seja o mais
indicado, ou por conhecimento especifico (especialista) ou experiências anteriores que o
habilitam a prática de um determinado crime.
Para que esta divisão ocorra de forma organizada – base da sua denominação – se faz
necessário uma estrutura hierárquico-piramidal, em que alguns membros possuem posição
hierárquica de controle, e outros, de execução. Existem os chefes – controlam os demais
membros –; gerentes – membros da confiança dos chefes –, e, aviões – que executam ordens
e ações criminosas (MENDRONI, p.35). Há de se mencionar os denominados soldados –
responsáveis pela “contenção” ou “segurança” do território de atuação das OCrim(s), dos
membros do grupo ou para atuar em determinadas ações criminosas – que é uma função
especializada dos aviões.
De regra, as OCrim(s) possuem código de honra próprio, que impondo regras de
cumprimento obrigatório, prevêem punições com variado nível de gradação, indo de uma
simples advertência a aplicação da pena capital para os casos de graves violações, v.g., traição
da própria organização ao revelar informações crucias das sua operações a terceiros.
A denominada “Operação Anaconda”, realizada pelo Departamento de Polícia Federal
(DPF) em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF), foi desencadeada na manhã do
dia 30 de outubro de 2003, evidenciou que dentro da organização criminosa investigada havia
agentes públicos participantes ou envolvidos, outra característica.
28
A reportagem do jornal Folha de São Paulo, contida no compêndio jornalístico de
Frederico Vasconcelos (VASCONCELOS, 2005, p. 301), noticiou que “os membros da
quadrilha autuavam na intermediação de sentenças judiciais favoráveis”.
A corrupção de agentes públicos pertencentes às altas esferas do poder, é uma
atividade regularmente empreendida pelas OCrim(s) brasileiras, que intentam obter acesso às
informações privilegiadas a respeito da fiscalização, do policiamento, ou de outras que
facilitem as suas operações ilegais, além de se buscar as vantagens econômicas provenientes
do desvio de verbas públicas, da formação de cartéis, do tráfico de influência, da prevaricação
etc., que só nos anos de 2008 e 2009, com relação aos crimes de desvio de verbas públicas,
foram desencadeadas pelo Departamento de Polícia Federal (DPF) as seguintes operações:
“Harpia”, “Rapina III”; “Rapina IV”; “Gestão Plena”; “Porto”; “Satiagraha”; “Vassoura de
Bruxa”; “Passagarda” (DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL, 2009).
A orientação para a obtenção de dinheiro e de poder é uma das características mais
específica das OCrim(s), pois se refere à obtenção dos lucros proveniente das atividades
ilegais empreendidas e a rápida circulação desse capital ilegal em outras atividades que o
tornem “lícito” – crime de “lavagem de dinheiro” ou “branqueamento de capitais”,
levando ao acumulo de poder. Assim, “Dinheiro traz poder, poder traz dinheiro”
(MENDRONI, p. 37).
Além disso, a obtenção e a manutenção do poder é ligada a forma como a OCrim gere
os seus lucros ilegais, consolidando-se perante outras organizações criminosas e até diante das
instituições do próprio Estado, impondo o respeito, medo, e corrupção aos que lhe interessam.
Dentro dessa característica, encontramos a atuação em vários “ramos” ilegais,
funcionando como uma espécie de Holding, como ocorre com as OCrim(s) que traficam
drogas e freqüentemente se utiliza do tráfico de armas de guerra para assegurar o domínio
territorial e/ou à “segurança” no transporte dos carregamentos de drogas. Confirma a mídia,
que notícia corriqueiramente a apreensão pela polícia de grandes quantidades de fuzis,
granadas, submetralhadoras e pistolas, de diversos calibres, nos morros do Rio de Janeiro,
dominados por facções criminosas que atuam no tráfico de drogas.
O domínio territorial compreende o estabelecimento e a manutenção de um território,
base ou “quartel general”, para empreenderem as suas atividades ilegais. Pode ser fixos ou
permanentes; temporários, até que se obtenha o controle efetivo do novo território; ou
estratégicos, para a prática de determinado(s) objetivo(s), tais como entrepostos para o
29
transporte ou refino de drogas, dissimulação de atividades ilícitas, etc.
11
, mantendo estes
territórios até cesse o interesse e surjam outros, ou, sejam descobertos pelas autoridades.
Entende-se, do mesmo modo, como característica das OCrim(s), o que passa a se
denominar capacidade ou poder de persuasão, fato não relacionado por Marcelo B.
Mendroni 12.
A capacidade de persuasão se consolida como importante aspecto para a preservação
das OCrim(s) no poder, pois envolve a plêiade de instrumentos utilizados para preservar os
interesses das OCrim(s) em determinadas área de interesse ou praticar atentados contra o
próprio Estado, no intuito de causar pânico e terror 13. Consolidam-se nas ameaças, extorsões,
chantagens e em todas as demais formas de controle, fundadas no medo da violência,
associadas à insegurança causada pela ausência do Estado na proteção e amparo aos cidadãos,
que vivem nas comunidades sob controle dessas organizações criminosas.
Observa-se que as OCrim(s) instaladas em comunidades carentes, agem no “papel” de
Organizações Não Governamentais (ONG), praticando o assistencialismo dentro das
comunidades carentes que dominam não com intuito de prestar solidariedade, mas de cooptar
os moradores para que colaborem com a proteção dos seus interesses econômicos na região e
fiquem submissos aos seus favores, impondo, também, a “lei do silêncio”.
11
Citam-se algumas favelas do Rio de Janeiro dominadas por facções criminosas, onde ocorrem, por vezes,
invasões para se tomar as chamadas “bocas de fumo”, que, algum tempo depois, são retomadas pela facção rival
originária, que reinicia as atividades do tráfico de drogas – para as facções que invadem, esse é um exemplo de
território temporário; outro exemplo é o estabelecimento de laboratórios para o refino de drogas fora da
Colômbia, pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia ou Exército do Povo (FARC), com objetivos de
dificultar a atuação das autoridades colombianas e facilitar a distribuição da droga aos países consumidores
finais, classificam-se como territórios estratégicos.
12
O citado autor, à p. 39, trata do uso da violência como parte das “atividades de execução” das OCrim(s).
13
Nesse sentido, transcreve-se na íntegra, a ementa da decisão emanada pelo Egrégio STJ, que condena um
integrante do Primeiro Comando da Capital (PCC): HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO POR
CRIME DE INCÊNDIO CONTRA ÔNIBUS DE TRANSPORTE URBANO (POR SEIS VEZES) E
FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO ARMADO, SUPOSTAMENTE INTEGRANTE DE FACÇÃO
CRIMINOSA (PCC). PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MATERIALIDADE
COMPROVADA. INDÍCIOS DE AUTORIA. PERICULOSIDADE EVIDENCIADA. MODUS OPERANDI
DA CONDUTA CRIMINOSA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA E DE INOCÊNCIA.
QUESTÕES QUE DEMANDAM DILAÇÃO PROBATÓRIA INCOMPATÍVEL COM O RITO CÉLERE DO
MANDAMUS. ORDEM DENEGADA. 1. O paciente foi preso em razão de fortes indícios de ser integrante de
organização criminosa (PCC), que teria sido a responsável por ataques na região do Guarujá, litoral Paulista, nos
quais foram incendiados diversos ônibus de transporte coletivo. A ação, segundo a denúncia, teria ocorrido em
represália à transferência de membros e líderes da facção para penitenciária de segurança máxima, entre outros
motivos não determinados (fls. 48). A denúncia foi alicerçada em escutas telefônicas devidamente autorizadas
judicialmente. 2. O decreto prisional encontra-se devidamente justificado na garantia da ordem pública, pois
levou em consideração a periculosidade do paciente, consubstanciada no modus operandi da conduta criminosa e
o fato de supostamente pertencer à facção criminosa denominada PCC. 3. As assertivas de cerceamento de
defesa e de negativa de autoria não podem ser apreciadas nesta ação de Habeas Corpus, pois, além de não
aflorarem evidentes dos documentos acostados aos autos, implicam dilação probatória incompatível com a
natureza do mandamus, que pressupõe prova pré-constituída do direito alegado. 4. Ordem denegada, em
consonância com o parecer ministerial (HC nº 88.102/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta
Turma, julgado em 17.04.2008, DJe 19.05.2008).
30
Nas comunidades onde se estabeleceram as OCrim(s), ora essas se valem do medo
para corromper, extorquir e, até mesmo, interferir nas políticas do governo local (vide os
atuais distritos Colombianos), ora para gerir e modificar a economia da região ao se utilizar de
práticas tais como extorsões e regras para o funcionamento do comércio local, a criação de
“empresas” para “lavagem de dinheiro” e o estabelecimento de casas de jogos e prostituição,
consolidando-se como instrumentos do poder local.
A capacidade de persuasão surge, principalmente, da ausência do Estado nas
comunidades carentes que dominadas pelo medo, dificultam o combate às ações ilegais destas
OCrim(s), já que impera o controle absoluto pela “lei do silêncio”, que a práxis da atividade
policial tem mostrado que funciona como um poderoso instrumento de intimidação, pois os
próprios moradores locais, intimidados pelas OCrim(s), não colaboram com trabalho de
investigação e se recusam a testemunhar ou prestar qualquer tipo de informação.
Negar o poder de persuasão das OCrim(s) fere os Princípios constitucionais da
Cidadania, da Dignidade da Pessoa Humana, da Liberdade, da Segurança e da Propriedade,
previstos nos arts. 1º, incisos II e III, e 5º, caput, da CF de 1988, ademais, por recusar a
omissão estatal nessas comunidades como à gênese formadora do crime organizado no Brasil.
É importante ressaltar-se que uma importante características das OCrim(s) é a
estabilidade, oriunda da lógica decorrente das suas operações, ou seja, da existência há algum
tempo atuando no mundo do crime de forma organizada.
É característica lógica porque pressupõe que se constituiu organizadamente no intuito
de obter proveitos econômicos ilimitados, recrutando membros restritos que atuam sob forte
hierarquia piramidal, e dividindo a suas atividades em tarefas especificas que contam com a
participação ou envolvimento de agentes públicos, o que sem duvida consome tempo e forte
organização para a sua consecução.
Portanto, a estabilidade está ligada à duração do tempo necessário para o desempenho
e organização de todas as suas atividades ilegais. As OCrim(s) não surgem do dia para noite.
Isso é um fato.
Quanto à distinção entre as OCrim(s), Marcelo Mendroni as classifica em Grande
e/ou Transnacionais, Médias, Pequenas e Temporárias conforme critérios próprios (p. 48 –
50). O citado autor se utiliza de elementos baseados apenas no território de atuação das
OCrim(s), como cita para as OCrim(s) médias: “concentram suas atividades nas cidades
médias. Em regra são intermunicipais, embora possam atuar e ser interestaduais”
(MENDRONI, p. 48).
31
Devido ao caráter dinâmico das OCrim(s), optou-se pela corrente que mescla,
também, a distinção baseada na formação das características das organizações do tipo
clássicas e tradicionais – citada pelo próprio autor nas paginas 49 – 50 –, pois se acredita que
com o crescimento, especialidade, aumento dos lucros etc., estas evoluam para Médias,
Grandes e/ou Transnacionais. Dessa forma, a distinção busca valorizar as características
básicas das OCrim(s).
Podem-se dividir as OCrim(s), quanto ao tamanho das suas estruturas, analisando-se
do número de membros restritos; o tamanho da divisão direcionada de tarefas ou a estrutura
hierárquico-piramidal; o volume estimado na movimentação de dinheiro, ou a extensão do
domínio territorial, e/ou a projeção do poder (político, econômico e de persuasão), ou seja,
das todas as classificações já apresentadas.
Portanto, tendo-se como base esses critérios, classificam-se as OCrim(s) em
pequenas, caso operem, v.g., no território limitado a uma cidade. Porém, a distinção deverá
levar em conta todos os critérios apontados, conjuntamente, já que a OCrim poderá
possuir grande influência política, caso possua como membros funcionários públicos nas altas
esferas do poder Estatal e operem com grandes somas de valores.
3 ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS ESPECÍFICAS
No início desse trabalho, abordaram-se todas as peculiaridades relativas ao
surgimento, evolução, características e estruturas das organizações criminosas, entendidos
como formadores da gênese do crime organizado – Seção 2.
A seção 2.3, tratou das características e estruturas das OCrim(s) que se enquadram no
tipo clássica ou tradicional, discorrendo-se a respeito dos seus aspectos característicos
fundamentais que, como se mencionou, funcionam como um referencial básico para todas as
Organizações Criminosas.
Este referencial foi devidamente adaptado a realidade das OCrim(s) brasileiras,
considerando-se os seus “modus operandi”, as questões sociais relacionadas com surgimento
da criminalidade no Brasil e a precariedade do sistema judicial e prisional brasileiros,
passando então a se empregar, para designá-las, as expressões facção criminosa ou apenas
facção, e facções criminosas “sui generis” (LESSING, 2009, p. 42).
32
Facção é sinônimo, no sentido literal, de “agrupamento, assembléia, consociação, [...]
federação, grege, grei, grêmio, grupo, partido, reunião”, e ainda, “congregação, classe,
associação e agremiação” (HOUAISS, p. 120, grifo nosso).
O Primeiro Comando da Capital (PCC) é tratado dentro dos presídios paulistas, pelas
alcunhas de federação ou partido do crime (AMORIN, P. 371 – 447), e, como já abordado
anteriormente, é tratado erroneamente por alguns autores como associações criminosas ou
delituosas.
A popularidade da expressão facção criminosa para designar as OCrim(s) brasileiras,
tem na mídia o seu maior contributo, que consagrou o emprego da expressão, além dos
estudiosos como o Doutor Benjamin Lessing (2009, p. 43 – 62) que o emprega em seus
trabalhos, sem, no entanto, justificar o seu uso.
Também se constata na jurisprudência nacional a mesma confusão, como se observa
na transcrição de parte da ementa da decisão proferida pelo TRF da 2ª Região:
[...] tendo o primeiro denunciado admitido ao condutor, Subtenente da Polícia
Militar do Estado do Rio de Janeiro, Paulo Emanoel Dias Moreira, pertencerem às
organizações criminosas Terceiro Comando e Facção ADA (Amigo dos Amigos),
e que a intenção do grupo era a tomada dos Morros do Estado e do Cavalão; a
quatro, porque o contrabandista Valdenício Antunes Barbosa, em suas declarações
(fls85/93), expressamente aponta Wanderley Soares, vulgo Orelha ou Louco, como a
pessoa que encomendava as armas, não fazendo qualquer menção aos réus, não
querendo significar, o só fato de fazerem os apelantes parte da mesma facção
criminosa do "importador" do armamento - Wanderley Soares, vulgo Orelha ou
Louco (universo maior), qual seja, Terceiro Comando/ADA, encomendado ao
"contrabandista" Valdenício Antunes Barbosa, que façam parte da mesma
quadrilha ou subgrupo (universo menor), ou ainda, que tenham sido os
destinatários das armas por ele irregularmente introduzidas no país (fls.85/93) [...]
(Processo nº 2002.51.02.001545-3, Desembargador Federal Poul Erik
Dyrlund, Sexta Turma, julgado em 17.12.2003, DJU 27.01.2004, grifo
nosso).
A destacada decisão classifica o Terceiro Comando (TC) como uma OCrim,
separando-o das demais, e os Amigos dos Amigos (ADA)
14
de facção, utilizando-se ainda
das expressões “universo maior” e “universo menor” para diferi-los, e, ao final do acórdão,
equipara-os a um só tipo, gerando confusão com relação à correta designação. Entende-se que
não há erro em se empregar facção criminosa para designar as OCrim(s) que atuam no Brasil,
já que possuem características específicas e não se diferem das do tipo clássica ou tradicional.
14
A facção Amigos dos Amigos (ADA) é a OCrim que também atua no tráfico de drogas no Rio de Janeiro.
Surgida dentro dos presídios cariocas, inicialmente se aliou ao Terceiro Comando (TC) contra o Comando
Vermelho (CV), e, posteriormente, após a morte do traficante “Uê” dentro do presídio de Bangu I, um dos
líderes do TC, este se dividiu, sendo que parte dos seus integrantes ficou na ADA e outra fundou o Terceiro
Comando Puro (UNODC. Disponível em: <www.unodc.org/pdf/brazil/word_midia/favelas.doc>. Acesso em:
14 out. 09.).
33
Para melhor compreensão do tema abordado, inseriu-se no anexo B desse trabalho, os
quadros 1 e 2 que mostram as principais OCrim(s) que atuam nos estados do Rio de Janeiro e
São Paulo, um breve histórico da sua criação, suas dissidências e o período do seu surgimento
conhecido.
Importante ressaltar-se a atuação de outras OCrim(s) nos estados brasileiros, a saber:
Paz, Liberdade e Direito (PLD) – Distrito Federal; Primeiro Comando do Mato Grosso do Sul
(PCMS) e Primeiro Comando da Liberdade (PCL) – Mato Grosso do Sul; Primeiro Comando
Mineiro (PCM) e Comando Mineiro de Operações Criminosas (COMOC) – Minas Gerais;
Primeiro Comando do Paraná (PCP) – Paraná; Comando Norte-Nordeste (CNN) –
Pernambuco; Primeiro Comando de Natal (PCN) – Rio Grande do Norte; Os Manos e Brasas
– Rio Grande do Sul (MALAGUETA, 2007, p. 87 – 99).
Como se observa, as facções criminosas brasileiras, surgidas, em sua maioria, dentro
dos estabelecimentos penitenciários nacionais, são numerosas e muito organizadas. Algumas
possuem estatutos próprios e códigos de honra, sendo esse último característica das OCrim(s)
do tipo mafioso, como se demonstra, a seguir.
As peculiaridades das organizações criminosas dos tipos econômico e mafioso,
possuem atuações e características que as distinguem das OCrim(s) clássicas ou tradicionais e
se inserem dentro do universo das Organizações Criminosas específicas.
Mencionou-se que dinâmica é a facilidade como se alternam as atividades criminosas
com o objetivo de dificultar as investigações criminais – que caracteriza a atuação das
OCrim(s) clássicas ou tradicionais. Porém, embora atuem em ramos de crimes específicos, as
OCrim(s) econômicas também possuem essa característica.
São crimes praticados por OCrim(s) de tipo econômico:
a. Formação de cartéis (8.137/90);
b. Lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores (Lei nº 9.613/98);
c. Fraudes em licitações, contratos e concorrências (Leis nº 8.666/93 e 9.279/96);
O crime de formação de cartel é regulado pela Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de
1990, e ocorre quando grupos organizados se formam com o fito de obter lucros, lesionando
financeiramente uma coletividade consumidora – por óbvio, indeterminada – que é ludibriada.
Já os crimes popularmente chamados de “lavagem de dinheiro” ou lavagem ou
ocultação de bens, direitos e valores, ou ainda, branqueamento de capitais, será mais bem
discutido no capítulo 2, na seção 3.2, desse trabalho. De forma ampla, atingem, também, o
Sistema Financeiro Nacional (SFN), porém, há discussões doutrinárias quanto a esses crimes
praticados por OCrim(s), como previsto no art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613/98. Nucci
34
menciona que “não há uma definição legal sobre o que vem a ser organização criminosa [...]
logo temos um sério entreve para aplicação deste inciso” (NUCCI, 2007b, p. 718).
Os crimes de fraude em licitações e contratos celebrados pela administração pública
encontram-se previstos na seção III, do capitulo IV, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993,
ocorrendo nas hipóteses especificas previstas nos arts. 89 a 99. Esses crimes são praticados
contra administração pública, que encontram a tipificação legal nos arts. 312 a 359-H, do
CPB.
As OCrim(s) econômicas atuam, de forma geral, nos crimes contra a ordem econômica
e contra as relações de consumo, também denominados “crimes econômicos”, constantes de
todo o capítulo II, da Lei nº 8.137/90, da qual se traz o conteúdo tipificado no rol do art. 4º:
Art. 4° Constitui crime contra a ordem econômica:
I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou
parcialmente, a concorrência mediante:
a) ajuste ou acordo de empresas;
b) aquisição de acervos de empresas ou cotas, ações, títulos ou direitos;
c) coalizão, incorporação, fusão ou integração de empresas;
d) concentração de ações, títulos, cotas, ou direitos em poder de empresa, empresas
coligadas ou controladas, ou pessoas físicas;
e) cessação parcial ou total das atividades da empresa;
f) impedimento à constituição, funcionamento ou desenvolvimento de empresa
concorrente.
II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando:
a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas;
b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas;
c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de
fornecedores.
III - discriminar preços de bens ou de prestação de serviços por ajustes ou acordo de
grupo econômico, com o fim de estabelecer monopólio, ou de eliminar, total ou
parcialmente, a concorrência;
IV - açambarcar, sonegar, destruir ou inutilizar bens de produção ou de consumo,
com o fim de estabelecer monopólio ou de eliminar, total ou parcialmente, a
concorrência;
V - provocar oscilação de preços em detrimento de empresa concorrente ou
vendedor de matéria-prima, mediante ajuste ou acordo, ou por outro meio
fraudulento;
VI - vender mercadorias abaixo do preço de custo, com o fim de impedir a
concorrência;
VII - elevar sem justa causa o preço de bem ou serviço, valendo-se de posição
dominante no mercado (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994).
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.
Em 1919, nos EUA, a criação da Lei seca impulsionou as primeiras OCrim(s) de tipo
mafioso a expandirem os seus negócios ilícitos e a aumentarem os seus lucros.
35
No Brasil contemporâneo, contudo, agentes da ABIN mencionam que não existem
OCrim(s) de tipo mafiosa atuando de forma estruturadas em nosso país 15.
Devem-se considerar, entretanto, os vários registros que informam às atividades de
organização criminosas, como a japonesa Yakuza, no Brasil. Nesse aspecto, confirma o
Delegado de Polícia Civil, Ricardo Ambrosio Fazzani Bina (2009, p. 34, grifo nosso), ao se
referir sobre a “conexão brasileira”:
Não há dúvida de que as máfias italianas, americanas, russas, nigerianas e a própria
Yakuza atuam no Brasil, em atividades como o tráfico de drogas e de pessoas,
jogos ilegais e contrabando de armas. Há também registros do envolvimento das
máfias chinesas e coreanas. Estudiosos apontam a Cosa Nostra como principal
precursora do crime organizado no País, principalmente no tocante aos jogos
clandestinos (bingos, caça-níqueis, “jogo do bicho” etc.).
Máfia é um tipo de organização criminosa que possui características bem específicas
que a distingue das clássicas ou tradicionais. Elas têm como principais elementos
caracterizadores (BINA, p. 33):
a. Perenidade;
b. Sociabilidade;
c. Hierarquia rígida; e,
d. Várias atividades ilegais.
A perenidade é proveniente de uma longa existência que não é abalada pela troca,
prisão ou morte dos seus líderes, Capo ou Don, no que difere das clássicas ou tradicionais que
são afetadas pela destituição dos seus chefes principais, ponderando-se, contudo, a resiliência
das facções cariocas envolvidas com o tráfico de drogas, como apontou o professor Doutor
Benjamin Lessing (p. 43, 58).
A máfia possui a simpatia das diversas camadas da sociedade com se relaciona, pois se
valem fortemente do tráfico de influência política, dos laços de amizade e da capacidade de
persuasão, inclusive com ameaças, violências e corrupção, para alcançarem os seus objetivos.
A essa característica dá-se nome de sociabilidade.
Outra destacada diferença com relação às OCrim(s) clássicas ou tradicionais é a
hierarquia rígida:
As organizações mafiosas se estruturam, de fato como associações rígidas, com
precisa repartição de competências, com órgãos de deliberação, executivos e
jurisdicionais, com coligações amplas e diferenciadas, de cujos pontos derivam a
maior força de intimidação a que a lei faz citação (MENDRONI, p. 42).
15
Essa informação foi proferida durante uma palestra realizada na sede da ABIN, em Brasília/DF, em
16.10.2009, no auditório do bloco C, para os alunos do mestrado e da graduação em direito da Universidade
Católica de Brasília – UCB, sob a coordenação da Professora Arinda Fernandes, onde a platéia foi desafiada a
apontar alguma organização criminosa estrangeira estruturada e atuante no Brasil.
36
As várias atividades ilegais de que a Máfia se utiliza: “tráfico de drogas, de pessoas e
de órgãos; contrabando de armas; prostituição; biopiratarias [crimes ambientais]; jogatinas e
outros” (BINA, p. 33), são mais extensas e diversificadas que das OCrim(s) clássicas ou
tradicionais.
Em algumas máfias prepondera o elemento honra como um conceito que nasce na
cultura de determinadas regiões, tais como a Sicilia, na Itália, onde se valoriza o homem de
honra. Nessas culturas, os homens tornam-se honrados a partir das atitudes demonstradas em
momentos públicos, tais como o respeito à família, a lealdade para com os membros da máfia,
a coragem, a astúcia etc.
É importante destacar o elemento da honra, pois “na Itália, a mera caracterização de
alguém como „uomo d‟onore‟ – homem de honra, já serve como „notitia criminis‟ para a
instauração de uma investigação a respeito da participação em organização criminosa de tipo
mafiosa, tamanha é a notoriedade” (MENDRONI, p. 293).
Existem inúmeros tipos de máfias atuando no mundo (ROBINSON, 2001, 99 – 128)
que se classificam como OCRIM(s) grandes ou transnacionais. Somente os esforços
conjuntos dos diversos países envolvidos tornarão efetivos o seu combate e controle.
37
CAPÍULO 2
NORMAS APLICÁVEIS AO CRIME ORGANIZADO
1
PRINCÍPIOS E INTERPRETAÇÃO DA NORMA PENAL BRASILEIRA
Todo trabalho que verse sobre um tema jurídico especifico, como é o Crime
Organizado no Brasil, deve analisar os princípios ligados ao ramo do Direito a que se vincula.
Assim, os princípios constitucionais atrelados ao Direito Penal devem dirigir esse estudo,
cabendo apenas mencionarem-se os mais importantes.
Com referência a esses princípios, tem-se:
a. “Não há crime, sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação
legal” (art. 5º, XXXIX), Principio da Legalidade ou da Reserva Legal;
b. “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (inc. XL), Principio da
Irretroatividade Penal;
c. “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens, sem o devido processo
legal” (art. 5º, LIV), Princípio da Vedação do Confisco; e,
d.
“São assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ele
inerentes” (art. 5º, LV), Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório.
Esses princípios norteiam todo sistema normativo penal vigente no Brasil, aplicandose a doutrina que trata do Crime Organizado.
Referentemente ao Crime Organizado no Brasil, a maior parte da doutrina é unânime
em afirmar que a legislação brasileira é deficitária:
Há muito que melhorar na legislação brasileira no que se refere a combate de crime
organizado, e para a constatação basta analisar as leis especiais editadas pelos países
cujos doutrinadores mais se empenharam em estudar o fenômeno: Itália e EUA
(MENDRONI, p. 67).
Porém, existem opiniões no sentido de que a legislação nacional produz instrumentos
eficazes para o combate às OCrim(s), por meio da ação controlada ou entrega vigiada
(GOMES, 2006).
A dificuldade está mais ligada à dinâmica desse tipo de ação criminosa do que
propriamente a possíveis falhas na legislação existente, já que, como dito anteriormente, a
facilidade com que se alternam as atividades criminosas faz com que o legislador, no exato
38
instante de manifestar sua intenção de modificar a lei – mens legislatori ou vontade do
Legislador – por meio de projetos de lei para combater determinadas práticas delituosas, essas
normas já se terão tornado ineficazes ao entrar em vigor, pois a prática criminosa terá sido
modificada para escapar do novo meio de combatê-la.
É preciso ter-se em mente que a legislação penal brasileira, embora esparsa e
deficiente, tem sido aplicada com relativa eficácia na exata proporção dos esforços
empreendidos pelos agentes públicos envolvidos, tais como Policiais, Promotores,
Procuradores, Juízes e Desembargadores, que cumprem a função de enfrentar o Crime
Organizado utilizando-se dos legais postos à sua disposição e superando as carências de
ordem material como serão mostradas oportunamente, mais adiante.
Todavia, é preciso registrar a necessidade de se concatenar os instrumentos normativos
de combate ao crime organizado em uma só diploma, tanto para facilitar a aplicação por parte
dos operadores do direito, como tornar efetivos os meios empregados, aptos a uma utilização
conjunta por todos os órgãos envolvidos, o que por óbvio, trará presteza às investigações das
OCrim(s) no Brasil.
Quanto à interpretação a ser empregada, Maria Helena Diniz destaca que, “por mais
clara que seja uma norma, ela requer sempre interpretação.”, e completa: “Interpretar é
descobrir o sentido e alcance da norma, procurando a significação dos conceitos jurídicos”
(2004, p. 420).
Encontrar o sentido e alcance da norma é entender os seus fundamentos, e para que
isso ocorra, devem-se empregar métodos corretos, e com relação a esses, Zaffaroni aduz que,
“é claro que “método” significa “caminho”, e este está condicionado pela meta que se
pretende atingir” (2006, p. 143).
Como se mencionou no início deste trabalho, com ênfase na polêmica em torno da
correta metodologia a ser empregada na interpretação das normas jurídicas, adotar-se-á a
chamada teoria objetiva, que procura o sentido real contido em seu próprio texto, cuidando-se,
em relação à norma penal aplicável ao Crime Organizado, primeiramente, de confrontá-la
dentro do ordenamento jurídico em que se insere, e, posteriormente, trazendo a doutrina
dominante e as decisões reiteradas dos tribunais superiores sobre a matéria.
Por fim, devem-se, subsidiariamente, empregar as Leis Penais Especiais, o Código
Penal (CP) e de Processo Penal Brasileiro (CPP), Decretos-Leis nº 2.848, de 07 de dezembro
de 1940, e nº 3.689, de 03 de outubro de 1941, respectivamente, com as suas posteriores
modificações, “e sem prejuízo de medidas administrativas e do âmbito processual civil
cabíveis” (MENDRONI, p. 68).
39
2
CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO
TRANSNACIONAL
Dentro da malha dos Tratados, Convenções e Acordos internacionais que se
relacionam com o combate o Crime Organizado no mundo, campo de estudo do direito
comparado, confrontar essas normas e os ordenamentos referentes a cada Estado ou entes
direito internacional é uma árdua tarefa.
Para se ter a breve noção da gama de normas de direito internacional público, que
versam sobre matérias relacionadas com o Crime Organizado, citar-se-á, apenas no âmbito da
ONU, as seguintes (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL, 2009):
a. Convenção contra a Corrupção (Resolução 55/61, de 4 de dezembro de 2000);
b. Convenção Única sobre Drogas Narcóticas de 1961;
c. Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971;
d. Convenção contra o Tráfico Ilícito de Drogas Narcóticas e Substâncias
Psicotrópicas de 1988;
e. Convenção sobre a Escravatura, de 25 de setembro 1926;
f. Convenção sobre os Direitos da Criança, de 20 de novembro de 1989;
Porém, a norma fundamental para o combate ao crime organizado no mundo é a
Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional (ver o Anexo
A), que foi aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, e
promulgada pelo Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004.
Essa convenção, conhecida como Convenção de Palermo, foi adotada em Nova
York, em 15 de dezembro de 2000, entrando em vigor internacional, em 29 de setembro de
2003, e, após o depósito do instrumento de ratificação, junto à Secretária-Geral da ONU,
passou a vigorar no Brasil, em 28 de fevereiro de 2004.
É importante ressaltar que “A malha de tratados e compromissos internacionais
ganham operacionalidade jurídica e política quando incorporada aos ordenamentos legais dos
estados signatários, transformando-se, pelo processo de ratificação, em leis nacionais”
(VENÂNCIO, 2004, P. 296). A Convenção de Palermo possui a forte tendência a atrair a
adoção pelos países não signatários, pois trata dos crimes de caráter transnacional 16.
16
As organizações criminosas grandes e/ou transnacionais, como já foram abordadas, de regra, não conhecem os
limites territoriais das nações e causam enormes prejuízos econômicos, políticos e sociais, necessitando de um
regramento eficaz que atenda aos interesses dos diversos Estados.
40
A Convenção de Palermo possui 41 artigos que contêm normas de direito material e
processual, sendo completa por abordar vários aspectos concernentes às atividades variadas
praticadas por OCrim(s). Ela delineia todas as regras a serem adotadas pelos Estados partes.
A convenção trouxe, no art. 2, alínea “a”, o conceito de Crime Organizado, do qual
já se tratou, resumidamente, na seção 2.1 desse trabalho. Contudo, constitui-se o aspecto mais
destacado da presente norma internacional, pois contêm o significado dos termos empregados
ao longo dos seus dispositivos, impondo destacar o artigo 2, in verbis:
Para efeitos da presente Convenção, entende-se por:
a) "Grupo criminoso organizado" - grupo estruturado de três ou mais pessoas,
existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer
uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção
de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício
material;
b) "Infração grave" - ato que constitua infração punível com uma pena de privação
de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena superior;
c) "Grupo estruturado" - grupo formado de maneira não fortuita para a prática
imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções
formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não
disponha de uma estrutura elaborada;
d) "Bens" - os ativos de qualquer tipo, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis,
tangíveis ou intangíveis, e os documentos ou instrumentos jurídicos que atestem a
propriedade ou outros direitos sobre os referidos ativos;
e) "Produto do crime" - os bens de qualquer tipo, provenientes, direta ou
indiretamente, da prática de um crime;
f) "Bloqueio" ou "apreensão" - a proibição temporária de transferir, converter, dispor
ou movimentar bens, ou a custódia ou controle temporário de bens, por decisão de
um tribunal ou de outra autoridade competente;
g) "Confisco" - a privação com caráter definitivo de bens, por decisão de um tribunal
ou outra autoridade competente;
h) "Infração principal" - qualquer infração de que derive um produto que possa
passar a constituir objeto de uma infração definida no Artigo 6 da presente
Convenção;
i) "Entrega vigiada" - a técnica que consiste em permitir que remessas ilícitas ou
suspeitas saiam do território de um ou mais Estados, os atravessem ou neles entrem,
com o conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com a
finalidade de investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua prática;
j) "Organização regional de integração econômica" - uma organização constituída
por Estados soberanos de uma região determinada, para a qual estes Estados tenham
transferido competências nas questões reguladas pela presente Convenção e que
tenha sido devidamente mandatada, em conformidade com os seus procedimentos
internos, para assinar, ratificar, aceitar ou aprovar a Convenção ou a ela aderir; as
referências aos "Estados Partes" constantes da presente Convenção são aplicáveis a
estas organizações, nos limites das suas competências.
O artigo em comento demonstra a grande preocupação com as definições de grupo
criminoso organizado; infração grave; grupo estruturado; bens; produto do crime; bloqueio ou
apreensão; confisco; infração principal; entrega vigiada e organização regional de integração
econômica.
41
O conceito de organização regional de integração econômica (art. 2, alínea “j”) se
refere aos acordos econômicos celebrados no âmbito do Direito Internacional Público, como o
Tratado de Assunção, que assinado em 26 de março de 1991, entre Argentina, Brasil,
Paraguai e Uruguai, criaram o Mercado Comum do Sul ou MERCOSUL.
Abordar-se-á a definição de grupo criminoso organizado (art. 2, alínea “a”), pois a de
entrega vigiada (art. 2, alínea “i”) será discutido mais adiante nesse trabalho. As demais
definições, contidas nas alíneas “b” à “h”, do art. 2, são auto-explicativas e não exigem uma
maior reflexão, complementando os conceitos trazidos pela convenção.
Para grupo criminoso organizado, tem-se:
a. Grupo estruturado [alínea “c”] de três ou mais pessoas;
b. Existente há algum tempo;
c. Atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações
graves [alínea “h”] ou enunciadas na presente Convenção;
d. Com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou
outro benefício material.
O conceito de grupo criminoso organizado foi amplamente discutido quando se tratou
do conceito de Crime Organizado, que se reforça, apresenta-se como a sua melhor definição
legal, considerando-se o todo da convenção.
A técnica adotada pela Convenção de Palermo para tratar dos diversos conceitos
ligados ao Crime Organizado deve merecer amplos encômios, ademais, prevê tipos penais
abertos, inseridos no corpo da convenção, que facilitam enquadrar várias atividades ilegais
praticadas por OCrim(s).
Em seu art. 3, a convenção preconiza que ela se destina à “prevenção, investigação,
instrução e julgamento”, das infrações previstas em seu bojo, e “sempre que tais infrações
sejam de caráter transnacional e envolvam um grupo criminoso organizado”, ou seja, a
norma internacional contém regras de direito material e de direito processual e que o seu
alcance é limitado aos delitos cometidos por Organizações Criminosas Transnacionais.
Com relação ao caráter de transnacionalidade dos crimes, estes ocorrerão nas
hipóteses do art. 3, item 2, da Convenção de Palermo, verbis:
2. Para efeitos do parágrafo 1 do presente Artigo, a infração será de caráter
transnacional se:
a) For cometida em mais de um Estado;
b) For cometida num só Estado, mas uma parte substancial da sua preparação,
planejamento, direção e controle tenham lugar em outro Estado;
c) For cometida num só Estado, mas envolva a participação de um grupo criminoso
organizado que pratique atividades criminosas em mais de um Estado; ou
42
d) For cometida num só Estado, mas produza efeitos substanciais noutro Estado.
Essas hipóteses são taxativas e aplicáveis, apenas, quando os crimes forem cometidos
por OCrim(s) que atuem em mais de um Estado signatário, quando então deverá ser
obrigatoriamente aplicada a Convenção de Palermo.
Sobre a convenção, vale ainda mencionar que ela contem mecanismos de prevenção,
repressão e cooperação entre os países signatários, mencionando, inclusive, regras em matéria
de extradição 17, procedimentos investigatórios e assistência legal.
Importa mencionar como vem decidindo a Egrégia Corte Constitucional brasileira,
com relação aos crimes transnacionais (grifo nosso), verbis:
[...] É o que parece decorrer da Convenção de Palermo (Convenção das Nações
Unidas contra o Crime Organizado Transnacional), pois esta, objetivando tornar
efetiva a repressão à macrodelinqüência, não só dispôs sobre assistência judiciária
recíproca (Artigo 18), como estabeleceu, ainda, fora do âmbito do Poder Judiciário,
meios de cooperação entre as autoridades competentes para a aplicação da lei, aí
compreendidos, dentre outros órgãos, o Ministério Público e os organismos policiais
(Artigo 27). Com o objetivo de implementar e conferir operacionalidade às cláusulas
gerais inscritas na Convenção de Palermo, o Brasil e a Federação Russa, por
intermédio de suas respectivas Procuradorias-Gerais, celebraram “Memorando de
entendimento para intensificar a cooperação jurídica mútua entre a Procuradoria
Geral da República Federativa do Brasil e a Procuradoria Geral da Federação da
Rússia” (fls. 78/81), fazendo-o com fundamento no Artigo 27 de referida
Convenção, que permite, no contexto da cooperação direta entre as autoridades
de ambos os países, notadamente em matéria penal, a adoção de ações
coordenadas em tema de persecução “de crimes de caráter transnacional”
(itens ns. 5 e 6) e o intercâmbio de informações independentemente “de
formalidades específicas” (item n. 7), inclusive a remessa de documentos, que
deverão ser redigidos “na língua oficial da parte requerida ou em inglês” (item
n. 10). Assinale-se, neste ponto, que o Memorando de entendimento em questão
representa instrumento concretizador das cláusulas gerais existentes no texto da
Convenção de Palermo, vocacionado a dar, a esse ato de direito internacional
público, aplicabilidade e executoriedade, em aspectos pontuais e específicos, a
propósito da “cooperação jurídica mútua entre a [...] Publique-se. Brasília, 03 de
agosto de 2009. Ministro CELSO DE MELLO Relator (HC 98896 MC, Relator
Ministro Celso De Mello, julgado em 03.08.2009, publicado em DJe 06.08.2009 DJ
07.08.2009).
A Convenção de Palermo é um importante instrumento para enfrentamento das
OCrim(s) que atuam em diversos países, e isso se confirma no livro de Jeffrey Robinson,
intitulado, “A globalização do crime”, onde se ressalta que, “as organizações criminosas
transnacionais abordam a logística, gestão de pessoal e contabilidade de maneira profissional.
Elas pesquisam e desenvolvem novos produtos [destinados a atingir novos mercados ilegais]”
(2001, p.19), ou seja, às OCrim(s), invariavelmente, são o alvo da preocupação internacional.
17
Neste sentido, veja-se o polêmico caso da extradição do italiano Cessare Battisti, que foi declarado preso
político pelo governo brasileiro, via Ministério da Justiça (MJ), e encontra-se, até a presente data, aguardando o
julgamento pelo STF (Ext. 1085) já que no Brasil “não será concedida extradição de estrangeiro por crime
político ou de opinião” (CF, art. 5º, LII).
43
3
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
A fundamentação para o efetivo combate ao Crime Organizado no Brasil é encontrada
na esparsa legislação penal, que regulamenta os meios utilizados em investigações e
operações policiais, assim como procedimentos específicos realizados no curso da ação penal.
Como mencionado no início deste trabalho, por ocasião das considerações iniciais,
buscar-se-á a análise das legislações pertinentes desvinculada das ideologias penais segundo
apregoa Zaffaroni. Isso será feito, detalhadamente, no Capítulo 3.
Por ora, mencionar-se-á apenas o que versa cada um dos principais diplomas
legislativos pertinentes ao Crime Organizado no Brasil, fixando uma noção geral sobre o
tema, relacionando-as abaixo por ordem crescente de publicação no DOU.
Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, (publicada no DOU em 28.12.1990),
“define sobre os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo
e dá outras providencias”.
Lei nº 9.034, de 03 de maio de 1995, (publicada no DOU em 04.05.1995), “dispõe
sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por
organizações criminosas”, e foi alterada pelas Leis nº 9.303/1996 e nº 10.217/2001, e cuida do
instituto da ação controlada ou entrega vigiada.
Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, (publicada no DOU em 25.07.1996),
“regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5º da Constituição Federal”, e trata da
interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.
Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998, (publicada no DOU em 04.03.1998), “dispõe
sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, a prevenção da utilização
do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta lei, cria o Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (COAF), e dá outras providências”, contendo dispositivos que
dispõem da quebra dos sigilos bancário e fiscal.
Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, (publicada no DOU em 14.07.1999), “estabelece
normas para a organização de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas
ameaçadas, institui o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas
e dispões sobre a proteção de acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado
efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal”.
Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004, (publicado no DOU em 15.03.2004),
“promulga a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional” –
44
Convenção de Palermo, já tratada no item 2 desse trabalho., tipificando a conduta das
OCrim(s) de caráter transnacional.
Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, (publicada no DOU em
11.01.2001), que trata do Crime Organizado em um dispositivo isolado, cuidando da quebra
dos sigilos bancário e fiscal, porém, apenas como exceção a regra do sigilo das operações
realizadas pelas instituições financeiras.
Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, (publicada no DOU em 24.08.2006), “institui
o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD; prescreve medidas para
prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas;
define crimes e dá outras providências.”. Essa lei, embora específica para o combate e
prevenção ao tráfico de drogas – crime hediondo –, traz, em seus arts. 41 e 53, disposições
sobre os institutos da delação premiada e da entrega vigiada, ab-rogando a antiga norma
que tratava sobre o tema, a Lei nº 10.409/2002.
Lei nº 11.707, de 19 de junho de 2008, (publicada no DOU em 20.06.2008), “altera a
Lei nº 11.530, de 24 de outubro de 2007, que institui o programa nacional de segurança
pública com cidadania – PRONASCI”, prevendo a “intensificação e ampliação das medidas
de enfrentamento do crime organizado e da corrupção policial” (art. 3º, inciso IX) e o “foco
repressivo: combate ao crime organizado” (art. 4º, inciso IV).
Decreto nº 6.748, de 22 de janeiro de 2009, (publicado no DOU em 23.01.2009),
“promulga o acordo de cooperação entre o governo da república federativa do Brasil e o
governo da república de Moçambique sobre o combate à produção, ao consumo e ao tráfico
ilícitos de entorpecentes, substâncias psicotrópicas e sobre o combate às atividades de
lavagem de ativos e outras transações financeiras fraudulentas, firmado em Brasília, em 31 de
agosto de 2004”.
Tramita no Senado Federal o PLS nº 150/2006, de autoria da Senadora Serys
Slhessarenko, que “dispõe sobre a repressão ao crime organizado e dá outras providências”.
Se aprovado, o referido Projeto de Lei concatenará em único diploma os meios e instrumentos
de combate ao Crime Organizado no Brasil.
45
3.1 LEI Nº 9.034, DE 05 DE MAIO DE 1996
Cumpre discorrer, sucintamente, sobre os principais aspectos da norma penal brasileira
especifica para o combate ao Crime Organizado no Brasil, a Lei nº 9.034, de 05 de maio de
1996, publicada no DOU de 04 de maio de 1995 (ver o Anexo A), que trata da “utilização de
meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações
criminosas”
A norma é pequena e contém 13 (treze) artigos, distribuídos em 3 (três) capítulos, a
saber:
a. Capítulo 1: Da definição de ação praticada por organizações criminosas e dos
meios operacionais de investigação e prova;
b. Capítulo 2: Da preservação do sigilo constitucional;
c. Capítulo 3: Das disposições gerais;
A Lei nº 9.034/1996 desde a sua publicação passou por pequenas alterações, tendo
sido sendo modificada no art. 8º, pela Lei nº 9.303, de 05 de setembro de 1996, e nos artigos
primeiro e segundo, pela Lei nº 10.217, de 11 de abril de 2001.
Como já se mencionou, existem deficiências na Lei nº 9.034/95, embora esta se
assemelhe à norma penal italiana que cuida dessa mesma matéria. A precariedade se encontra
na ausência da previsão em seu texto dos mecanismos eficazes ao combate ao Crime
Organizado no Brasil, como se impende da seguinte observação:
A lei brasileira de combate às organizações criminosas (L. 9.034/95) possui grandes
semelhanças com a legislação italiana, mas ainda é insuficiente na busca de
resultados práticos. Faltam varas especializadas para o processo e julgamento desses
criminosos, assim como as normas dispondo sobre a infiltração, captação e
gravações ambientais, além de um eficiente sistema de informações entre os entes da
Federação (BINA, p.34).
A Lei é completamente incipiente ao tratar da definição legal da ação praticada por
Organizações Criminosas, pois prescreve, in verbis:
Art. 1º Esta Lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que
versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou
organizações ou associações criminosas de qualquer tipo.
Como se tratou no capítulo 1 desse trabalho, a norma, nesse ponto, é bastante criticada
em peso pela doutrina nacional, já que cria diversas definições, tanto para OCrim como para
Crime Organizado. Nesse aspecto, com relação à Lei 9.034/95, acentua Guilherme de Souza
Nucci:
46
Não há definição e, além disso, incluíram-se a quadrilha ou bando e também
qualquer tipo de associação criminosa. Esta Lei representa outra construção
casuística, sem respeito ao principio da taxatividade. Há vários enfoques fornecidos
pela doutrina nacional, para conceituar organização criminosa ou crime organizado
(2007b, p.250, grifo do autor).
O citado mestre concorda com a definição de OCrim proposta por Marcelo B.
Mendroni, que resumidamente diz que são empresas voltadas para prática das várias
atividades delituosas (apud MENDRONI, p. 250) – que se constitui em infrações penais.
A norma menciona em seu preâmbulo, que se destina a operacionalizar os meios de
prevenção e repressão às atividades praticadas pelas OCrim(s).
É o que diz o artigo 2º ao promover meios eficazes de combate ao Crime Organizado
no Brasil, tratados no próximo capítulo, nos seguintes termos:
Art. 2º Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já
previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas:
I – (Vetado).
II – a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe
ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida
sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no
momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de
informações;
III – o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e
eleitorais.
IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou
acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial;
V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação,
constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada
autorização judicial.
Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e permanecerá
nesta condição enquanto perdurar a infiltração.
Os incisos IV e V foram inseridos pela Lei nº 10.217/2001, prevendo a chamada
captação e interceptação ambiental, tratada na Lei 9.296/96 e a infiltração por agentes de
polícia ou de inteligência, prevista, também, nas Leis nº 10.217/01 e 11.343/96.
O art. 3º trata das regras que o juiz, pessoalmente, deve adotar na hipótese de ocorrer
violação de sigilo preservado pela Constituição ou por lei, com relação ao acesso a dados,
documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais (art. 2º, inciso III, da Lei
nº 9.034/95).
Esse artigo prevê a figura do juiz inquisidor, que perquire a verdade real ou material,
ou seja, que busca a verdade que mais se aproxima dos fatos reais, o que subverte a ordem
jurídica ao alterar a posição de imparcialidade que o magistrado deve manter no processo.
Ademais, a lei atribui a função de investigar somente aos órgãos previstos na Constituição
47
Federal, nos arts. 129, I e VIII, e § 2º, e 144, §1º, I e IV, e § 4º, que são o Ministério Público e
às Polícias Federal e Civil (NUCCI, 2007b, p. 256).
O Procurador Geral da República, com base nessas premissas e amparado pelo art.
103, inciso VI, da Constituição Federal, propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADIN) contra o art. 3º, da Lei 9.034/95, alegando ofensa ao disposto no arts. 5º, incisos LIV
e LV, 93, IX, e 129, I, da Carta Magna de 1988.
O art. 4º da citada lei, dentro do capítulo que trata das disposições gerais, cuida da
formação, por parte dos órgãos pertencentes à Polícia Judiciária, “de setores e policiais
especializados no combate à ação praticada por organizações criminosas” (ver o Anexo A).
A norma em comento não prevê a concessão da liberdade provisória, com ou sem
fiança, conforme se impende do seu art. 7º. Isso se aplica aos membros restritos de uma
determinada OCrim(s), o que implica em “intensa participação" nas suas atividades
delituosas, e que tenham sido presos em flagrante delito, ou seja, que se encontrem nas
hipóteses previstas no art. 302 e 303, do CPP, a saber, verbis:
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa,
em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que
façam presumir ser ele autor da infração.
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito
enquanto não cessar a permanência.
Correta é a posição de Daniela Cristina Rios Gonçalves (2004, p. 18) que informa que
o ordenamento nacional proíbe a privação da liberdade de outrem sem que ocorram o
requisitos do “fumus boni iuris” e do “periculum in mora”, ao ensinar:
O fumus boni iuris, quando alguém é surpreendido em uma das hipóteses do art. 302
do Código de Processo Penal, decorre da própria certeza visual do crime e de sua
autoria, estampada nos depoimentos das testemunhas e do condutor durante a
lavratura do auto de prisão em flagrante e por eventual laudo de exame de corpo de
delito, quando a infração deixar vestígios. [...] O periculum in mora, que autoriza a
captura no instante inicial, justifica-se, por sua vez, pela possibilidade de colheita
imediata de prova materialidade e autoria ainda “fresca” na memória das
testemunhas e do condutor.
Os artigos seguintes cuidam dos procedimentos processuais específicos relativos à
repressão e prevenção as OCrim(s). Vale destacar os prazos para o encerramento da instrução
criminal, que estão previstos no art. 8º:

81 (oitenta e um) dias para o réu preso; e,

120 (cento e vinte) dias para o réu solto.
48
3.2 LEI Nº 9.613, DE 03 DE MARÇO DE 1998
A Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, publicada no DOU em 04 de março de 1998,
“dispõe sobre os crimes de „lavagem‟ ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da
utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de
Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências”.
O termo “lavagem de dinheiro” teve origem nos EUA, onde se empregava o nome
Money Laundering para “caracterizar o surgimento, por volta dos anos 20, de uma rede de
lavanderias que tinham por objetivo facilitar a colocação em circulação do dinheiro oriundo
de atividades ilícitas, conferindo-lhe a aparência de lícito” (MINK, 2005, p.8).
A norma também fala da ocultação de bens, direitos e valores como sinônimo de
“lavagem de dinheiro”, ao se referir nas suas disposições e no título dado ao capítulo I.
A expressão assume diversos “nomen iuris” – nomes jurídicos – a depender da
nacionalidade de origem da norma. Assim, temos (MINK, p.8):
a. Portugal: Branqueamento de Capital;
b. França e Bélgica: Blanchiment d´Argent;
c. Itália: Riciclagio di Denaro;
d. Espanha: Blanqueo de Dinero; e,
e. Colômbia: Lavado de Activos.
Guilherme de Souza Nucci (2007b, p.714, grifo do autor) não anui com o emprego das
expressões “lavagem de dinheiro” e “branqueamento de capitais” adotados no Brasil:
O termo lavagem, em nosso entendimento, é inapropriado. Decorrente da cultura
norte-americana, origina-se da década de 20, nos EUA, quando a máfia criou
lavanderias para dar aparência lícita a negócios ilícitos, ou seja, buscava-se
justificar, por intermédio de um comercio legalizado a origem criminosas do
dinheiro arrecadado. Em outros países, o delito é chamado de branqueamento de
dinheiro (Portugal, França e Espanha). Nos EUA, porém, consolidou-se a
denominação lavagem de dinheiro (money laudering).
O citado mestre se justifica alegando que o Brasil apenas copiou outros países e que o
termo “branqueamento” enseja “inferências racista do vocábulo, motivando estéreis e
inoportunas discussões” (p. 714).
Na cartilha do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) (2009, p.3),
“lavagem de dinheiro” “constitui um conjunto de operações comerciais ou financeiras que
buscam a incorporação na economia de cada país dos recursos, bens e serviços que se
originam ou estão ligados a atos ilícitos”.
49
É o próprio COAF que faz um alerta sobre os crimes financeiros no mundo:
Especialistas estimam que cerca de US$500 bilhões em "dinheiro sujo" – cerca de
2% do PIB mundial – transitam anualmente na economia.
Trata-se de uma ameaça global crescente e as medidas para controlar o problema
tornaram-se foco de um intenso esforço internacional. Durante os últimos dez anos,
inúmeras organizações envolveram-se na luta contra a lavagem de dinheiro,
promovendo a cooperação para assegurar que as instituições financeiras tomem as
providências necessárias a fim de minimizar os efeitos danosos dessa prática (p. 3).
E exatamente por trazerem grandes prejuízos financeiros aos países e que as proteções
à ordem econômica e ao consumidor encontram fundamentos, respectivamente, nos arts. 170
e 5º inciso XXXII, da Constituição Federal de 1988.
Deve-se frisar que as Organizações Criminosas dos tipos econômicas, como se
mostrou anteriormente, atuam prioritariamente nos crimes contra a ordem econômica e contra
as relações de consumo, também denominados “crimes econômicos”, que são previstos em
todo o capítulo II, da Lei nº 8.137/90.
Porém, não são apenas esses tipos de OCrim(s) que praticam o crime de “lavagem de
dinheiro”, pois como já ficou demonstrado antes, o poder que advêm da obtenção dos lucros
provenientes das suas operações ilegais, é uma das características mais específicas e comuns a
todas OCrim(s), que se consubstancia na citada característica da orientação para a obtenção
de dinheiro e de poder.
Com esse mesmo entendimento, Nucci concorda com os vários autores da matéria que
associam os crimes de “lavagem de dinheiro” com o Crime Organizado:
Não resta a menor dúvida de que esta é uma realidade. Muito dinheiro é reciclado,
transformando-se em ativos lícitos, cuja procedência é a criminalidade de alto poder
aquisitivo, seja este poder proveniente do denominado criminoso de colarinho
branco, seja do traficante de entorpecentes ou de outras formas de delinqüência que
chamaríamos de rica, de onde o dinheiro flui com facilidade (2007b, p. 714).
Para gerir e circular rapidamente todo esse capital ilegal, as OCrim(s) buscam outras
atividades que o tornem “lícito”, ou seja, praticam freqüentemente o crime de “lavagem de
dinheiro” ou “branqueamento de capitais” dificultando a identificação da origem desse capital
por meio, v.g., de empresas legalmente constituídas.
A Convenção de Palermo, em seu art. 7, prescreve medidas aos países membros para
combater o crime de “lavagem de dinheiro”.
Alerta-se que, no entanto, para que fique configurado tipicamente o crime de “lavagem
de dinheiro”, exige-se o necessário nexo de causalidade entre esse delito e os crimes
antecedentes praticados ou não por essas OCrim(s). É como tem decidido o Colendo STF:
[...] demonstração da existência de vínculo causal entre esse ilícito penal e os crimes
antecedentes, pois – consoante adverte a doutrina (MARCO ANTONIO DE
50
BARROS, “Lavagem de Capitais e Obrigações Civis Correlatas”, p. 93/96, item n.
4.3, 2004, RT; ANTÔNIO SÉRGIO A. DE MORAES PITOMBO, “Lavagem de
Dinheiro: A tipicidade do crime antecedente”, p. 109/111, itens ns. 5.3.1 e 5.3.2,
2003, RT; MARCIA MONASSI MOUGENOT BONFIM e EDILSON
MOUGENOT BONFIM, “Lavagem de Dinheiro”, p. 58/59, item n. 12.1, 2ª ed.,
2008, Malheiros, v.g.) – a comprovação da realidade material dos delitos
antecedentes, ainda que desconhecido ou isento de pena o seu autor, atua como
verdadeiro pressuposto jurídico-penal do crime de lavagem de dinheiro. Isso
significa que a prolação de sentença penal condenatória nos casos do crime de
lavagem de dinheiro supõe a demonstração da efetiva ocorrência do delito
antecedente (principal ou primário) e do nexo de causalidade que o vincula ao crime
de lavagem de dinheiro (acessório ou derivado). Não se impõe, contudo, ao
Ministério Público, ao denunciar alguém pela suposta prática do delito de lavagem
de dinheiro, que comprove, desde logo, a configuração material do crime
antecedente, bastando, na fase introdutória do processo penal de conhecimento, que
instrua a peça acusatória com indícios suficientes da existência do crime básico ou
antecedente. Não é por outra razão que a Lei nº 9.613/98 dispõe que a denúncia
deverá ser instruída “com indícios suficientes da existência do crime antecedente”
(art. 2º, § 1º), ainda que praticado este em outro país (art. 2º, II). [...]
Comentar-se-á apenas o dispositivo da Lei nº 9.613/98 que faz menção ao Crime
Organizado, para não se fugir do foco principal deste trabalho.
Nesse passo, mister sublinhar o art. 1º, inciso VII, desse diploma legal, que prescreve
(grifo nosso):
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,
movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou
indiretamente, de crime:
[...]
VII - praticado por organização criminosa.
[...]
Pena: reclusão de três a dez anos e multa.
O art. 1º traz um rol taxativo dos crimes antecedentes ao de “lavagem de dinheiro”, e
dentre esses, destaca-se o crime praticado por OCrim.
Encontraram-se divergências com relação à interpretação pontual desse dispositivo –
art. 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613/98. Alguns autores entendem que não existe uma definição
legal para Organização Criminosa, causando obstáculos à aplicação desse inciso, já que
“qualquer crime praticado por quadrilha ou bando (art. 288, CP), dando origem a ocultação
dos valores obtidos seria suficiente para a configuração do delito previsto no art. 1º, VII, da
Lei nº 9.613/98” (NUCCI, 2007b, p. 718).
Mendroni (p. 187, grifo do autor) ensina:
Ainda pela interpretação lógica, o sistema legal brasileiro pretendeu a diferenciação
entre “Bando ou Quadrilha” e “Organização Criminosa”. Note-se que o dispositivo
ora analisado especificou a punição pelo crime de lavagem de dinheiro,
“proveniente” de crime: praticado por organização criminosa. A Lei de Lavagem de
dinheiro, nº 9.613/98, é posterior à Lei nº 9.034/95.
Nesta, o legislador revelou a existência de diferenciação entre “Bando ou
Quadrilha” – previsto no artigo 288, do Código Penal –, e “Organização
51
Criminosas”, não prevista como tipo penal, tanto que no artigo 1º estabeleceu:
“Esta lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem
sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou
organizações criminosas de qualquer tipo” [art. 1º, da Lei nº 9.034/96].
Ora, se pretendesse o legislador equiparar os dois conceitos, não haveria feito a
distinção. Mas demonstrou expressamente a distinção de ambos.
Concorda-se com a posição de Marcelo B. Mendroni, pois como se expos, o referido
dispositivo da Lei nº 9.613/98, de forma expressa e taxativa, diferencia a conduta de quadrilha
ou bando da praticada por OCrim ao prescrever apenas para esse último o cometimento do
delito de “lavagem de dinheiro”.
O Colendo STF, em julgamento realizado em 07 de outubro de 2008, no HC nº 96007,
se manifestou nesse mesmo sentido, no brilhante voto do Ministro relator, Marco Aurélio 18.
4
PLS Nº 150/2006
O processo legislativo é a maneira por meio da qual o Estado se utiliza para a
elaboração, redação, alteração e consolidação das leis, obedecendo ao disposto na
18
DECISÃO AÇÃO PENAL 'LEIS Nº 9.034/95 E 9.613/98' TIPICIDADE 'SUSPENSÃO DO PROCESSOCRIME' LIMINAR INDEFERIDA. 1. A Assessoria assim retratou as balizas desta impetração: Habeas corpus
impetrado em favor de Estevan Hernandes Filho e Sônia Haddad Moraes Hernandes, membros da Igreja
Renascer em Cristo, apontando como coator o Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu a ordem requerida em
idêntica medida' de nº 77.771. O impetrante informa que está em curso contra os pacientes, no Juízo de Direito
da Primeira Vara Criminal da Comarca da Capital, Estado de São Paulo, a Ação Penal nº 1063/2006, em que lhes
é imputada a suposta prática do delito tipificado no artigo 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613/98 - lavagem de
dinheiro e ocultação de bens, por meio de organização criminosa. Sustenta a atipicidade da conduta, porque,
consoante a legislação brasileira, o enquadramento como lavagem de dinheiro não dispensaria a ocorrência de
crime antecedente. Aduz, também, ser atípica a acusação relativa à organização criminosa, que não encontraria
definição nas Leis nºs 9.034/95 e 9.613/98. Alega a inépcia da denúncia e pede, em liminar, o sobrestamento do
processo em curso no Juízo. No mérito, busca o trancamento da ação. Contra o ato de recebimento da denúncia
foi impetrado habeas corpus no Tribunal de Justiça. A ordem veio a ser indeferida (folha 146 a 161). Teve a
mesma sorte idêntica medida formalizada no Superior Tribunal de Justiça. A Corte entendeu que, na denúncia,
descreve-se a existência de organização criminosa que se valia da estrutura de entidade religiosa e de empresas
vinculadas, para arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante variadas fraudes, desviando os
numerários oferecidos para determinadas finalidades ligadas à Igreja em proveito próprio e de terceiros, além de
pretensamente lucrar na condução das diversas empresas, algumas por meio de 'testas-de-ferro', desvirtuando as
atividades eminentemente assistenciais e aplicando seguidos golpes. Acentuou que o crime cometido, em tese,
pelos pacientes, tipificado no artigo 1º, inciso VII, da Lei nº 9.613/98, não requer a existência de delito
antecedente específico para a configuração de lavagem de dinheiro, bastando a prática por organização
criminosa, nos termos disciplinados no artigo 1º da Lei nº 9.034/95, com a redação dada pela Lei nº
10.217/2001, combinado com o Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, que implicou a
ratificação da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo
Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004. Acrescentou que o ato de recebimento da denúncia traduziria mera
admissibilidade diante da existência de indícios de autoria e materialidade, inexistindo a alegada inépcia.
Consignou, mais, não se exigir à persecução a demonstração cabal do que imputado, pois esse grau de certeza
estaria reservado para a prolação do juízo de mérito. Assim, seria prematuro e temerário o acolhimento do
pedido de trancamento da ação penal. [...] (HC nº 96007, Relator Ministro Marco Aurélio, julgado em
07.10.2008, publicado em DJe 14.10.2008 DOU 15.10.2008, grifo nosso).
52
Constituição Federal de 1988. Para José Afonso da Silva o “processo legislativo é o conjunto
de atos preordenados visando à criação de normas de Direito” (2009, p. 525).
Com relação ao tema, assim dispôs a Constituição Federal de 1988, em seu art. 59
(grifos nossos), in verbis:
Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
I – emenda à Constituição;
II – leis complementares;
III – leis ordinárias;
IV – leis delegadas;
V – decretos legislativos;
VI – medidas provisórias;
VII – resoluções.
Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e
consolidação das leis.
A Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, estabeleceu as regras
previstas neste Parágrafo Único.
Analisando-se o art. 61, da Constituição de 1988, constata-se que para as leis
complementares e ordinárias a competência é concorrente, o que confirma José Afonso da
Silva: “compete a qualquer membro ou comissão da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República e aos cidadãos” (p. 525).
Não serão discutidas as minudências do processo legislativo, dispostos nos arts.
59 e seguintes, da Constituição Federal de 1988, nem as regras contidas na LC nº 95/98 ou
nos Regimentos Internos do Congresso Nacional, já que estes não são os objetivos principais
deste trabalho. Cabe apenas mencionar que na redação das normas não haverá “vaguidade,
ambigüidade do texto, imperfeição e falta de terminologia técnica, má redação.” (DINIZ,
2004, p. 420)
Nesse ponto há que se falar da competência para legislar sobre matérias de Direito
Penal, que é exclusiva da União – Congresso Nacional –, conforme o dispõe o inciso I, do art.
22, da Constituição Federal.
No intuito de consolidar a legislação nacional sobre Crime Organizado, o tramita
no Senado o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 150, de 23 de maio de 2006, de autoria da
Senadora Serys Slhessarenko. Atualmente, aguardando na Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ) do Senado Federal a realização de uma audiência pública.
Esse projeto trata da repressão ao crime organizado e prevê outras providências.
Sua exposição de motivos aponta a dificuldade enfrentada pela Senadora Serys para
conceituar Crime Organizado, que admitiu, porém, sua necessidade:
Diante da difícil, mas necessária tarefa de definir, para efeitos penais, o conceito de
“crime organizado”, resolvemos apresentar o presente projeto de lei, que pretende
disciplinar a investigação criminal, os meios de obtenção de prova e o procedimento
judicial aplicável ao referido crime, sem desrespeito às garantias do devido processo
53
legal, tampouco às atribuições constitucionais dos órgãos envolvidos na persecução
criminal.
Conforme a mencionada exposição de motivos, o Projeto de Lei difere das outras
proposições legislativas que optaram pelo verbo “associar-se” como núcleo integrante do tipo
penal já que não são “suficientemente explícitas para a compreensão mais abrangente do
fenômeno delitivo que mereça o nomen iuris de “crime organizado” (não obviamente de
“organização criminosa”, que possui um sentido mais sociológico do que jurídico-penal)”
(SENADO FEDERAL, 2009).
Ao analisar esse aspecto do PLS nº 150/2006, o Delegado de Polícia Federal
Marcus Vinicius da Silva Dantas (2009) confirma a já apontada dificuldade em se conceituar
Crime Organizado e aponta para o perigo das definições imprecisas e vagas:
Como bem ressalta a exposição de motivos do projeto, é árdua a tarefa de se definir
a expressão “crime organizado”. Poucas formas as legislações que ousaram fazê-lo
para fins penais, considerando a dificuldade, senão impossibilidade, de se englobar
em um conceito jurídico-penal todos os casos, formas e nuances com que a atividade
se apresenta na realidade fática. O risco da existência de “claros” no conceito
adotado permitiria posteriores alegações de atipicidade das condutas dos agentes
envolvidos.
Trata-se do artigo mais importante do PLS nº 150/06:
Art.1º Esta Lei define o crime organizado e dispõe sobre a investigação criminal,
meios de obtenção de prova, crimes correlatos e procedimento criminal a ser
aplicado.
O projeto busca definir o conceito de Crime Organizado, e, nesse aspecto,
posiciona-se desfavoravelmente, pelos motivos já expendidos anteriormente, além de
apresentar pontos controversos quando destaca, em seu capitulo II, a investigação criminal, e,
meios de obtenção de prova mais modernos dos que os previstos no diploma processual penal
brasileiro, de 1941, embora com a grave falha de proibir a infiltração policial.
O mesmo delegado (2006), faz críticas pontuais ao PLS 150/2006: “[...]
especialmente na fase investigatória, que com absoluta certeza retirará a necessária eficiência
e agilidade dos órgãos responsáveis pela persecução criminal na elucidação de crimes”; e
continua: “deve ser evitada a adoção de dispositivos legais que limitem a abrangência dos
tipos penais e a atuação dos órgãos de persecução penal”.
O projeto chega às minúcias de tipificar as condutas ocorridas durante as
investigações criminais e na obtenção de prova (arts. 12 a 16), v.g., “fotografar ou filmar o
colaborador, sem sua prévia autorização por escrito”, o que dará ensejo a grandes polêmicas,
pois o “colaborador” – ou informante –, nessa fase inquisitorial, quase sempre é um membro
restrito de uma OCrim sob investigação, e filmá-lo ou fotografá-lo visa apenas facilitar a sua
posterior identificação pela unidades especializadas e restritas de policiais.
54
Ora, se é uma equipe especializada composta por policiais reservados 19, não serão
essas ações – filmar e fotografar – que colocarão o informante em risco. Busca-se apenas
facilitar a identificação por parte dos outros policiais membros da seleta equipe, quando o
policial que se relaciona com o colaborador não puder mais fazê-lo, e outro deva assumir em
seu lugar. Claro que isso seria feito apenas por membros da equipe.
Não se trata de proteção ao colaborador, mais se deve preservar a confiança e a
segurança da equipe, afinal, entre um membro de OCrim e a segurança das operações de
investigação criminal, incluindo da equipe policial envolvida, crer-se que a última deva
prevalecer.
Manifesta-se favoravelmente quanto à conduta que revelar a identidade do
colaborador, prevista no início do art. 12.
O PLS 150/2006 antes de se transformar em lei, já gera polêmicas, pois entra em
choque com o disposto nos arts. 2, 3 e seguintes, da “Convenção de Palermo”.
Destacam-se os pontos controversos:
a. Quando prevê que “associação criminosa” deva ter estrutura organizacional,
divisão de tarefas e estabilidade entra em confronto com a “Convenção de
Palermo”, que informa, apenas, que o grupo destinado a pratica da infração
penal seja não eventual;
b. Estatui a existência de pelo menos 5 (cinco) membros integrantes da OCrim,
enquanto a Convenção impõe o mínimo de 3 (três);
c. Elenca um rol taxativo de crimes que enquadra como típicos de OCrim(s),
enquanto a Convenção define que além dos delitos especificados, outros cuja
pena máxima privativa de liberdade seja igual ou superior a quatro anos;
d. Limitam a investigação criminal e os meios de obtenção da prova a prévia
autorização judicial, criando empecilhos para as atividades de Polícia
Judiciária; e,
e. Por fim, enquanto a Convenção permite a infiltração policial (agente
infiltrado), desde que autorizada pelas normas do país signatário, o PLS nº
150/2006 proíbe completamente este eficaz meio!
19
São elementos escolhidos, separados e treinados dentro uma unidade especializada da Policia, para atuar
especificamente no combate ao Crime Organizado, e que deve necessariamente atuar com grau de confiabilidade
uniforme, ou seja, às informações que um membro tiver acesso deverão ser compartilhados pelos demais
membros, sob pena de ocorrer à famigerada compartimentação, que destrói a unidade de equipe. Fica uma
sensação de desconfiança que é elemento de desestabilização nas relações humanas. Isso, só a experiência
policial nos ensina.
55
Com relação à limitação da investigação e dos meios de combate às OCrim(s),
discorre, ainda, o delegado (2009):
É que o parágrafo único do art. 3º e caput do art. 9º condicionam a obtenção de
dados cadastrais, documentos e informações eleitorais, comerciais e de provedores
de internet a prévia autorização judicial, trazendo novas “amaras” às já incontáveis
dificuldades enfrentadas pelas polícias judiciárias no exercício de seu mister.
Com efeito, deve ser observado que é obrigação da autoridade policial “colher todas
as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias” (art. 6º,
inc. III do CPP), devendo representar ao juiz apenas quando envolvidas questões
referentes a bens jurídicos protegidos em lei (sigilo e inviolabilidade do domicílio),
o que não é o caso de dados cadastrais e informações eleitorais, comerciais e de
provedores de internet.
Do exposto, verifica-se certa incompatibilidade do previsto no PLS nº 150/06 e o
que traz o art. 6, inciso III, do CPP, que ampla liberdade a autoridade policial para a coleta de
provas, ademais, não considera as enormes dificuldades da citada autoridade ao se deparar
com OCrim(s) estruturadas e com ramificações em diversos rincões do Brasil, que diga-se,
possui dimensões continentais, assim como a variada forma de investigar dos organismos de
policia judiciária estaduais.
Nesse aspecto, o mencionado Projeto de Lei está em total descompasso com a
realidade nacional.
Confirma o exposto o artigo intitulado “projeto de lei sobre a repressão ao Crime
Organizado – Críticas e Sugestões”, de autoria do Delegado de Polícia Federal Maurício
Manica Gössling (2008, p. 34 – 35), quando prescreve necessárias adequações do PLS nº
150/06 à Convenção de Palermo, ao concluir: “Por fim, acrescentamos que o Projeto de Lei
deveria avançar no sentido de dar plena eficácia e aplicabilidade a todos os compromissos
assumidos pelo Brasil na Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado
Transnacional”.
Assim, o PLS 150/2006, embora seja louvável na iniciativa de combater o Crime
Organizado, contêm, em seu bojo, graves falhas.
56
CAPÍTULO 3
COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL.
1 MEIOS DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO
Como este trabalho se presta igualmente a estudar os meios efetivos de combate ao
Crime Organizado no Brasil, notadamente na parte relativa à persecutio criminis, analisa-se,
pormenorizadamente, apenas alguns dos institutos disponíveis, em face da complexidade que
envolve o tema 20.
É importante frisar que os meios postos à disposição das autoridades, notadamente dos
órgãos policiais, são orientados, primeiramente, pelas normas pertinentes a cada especialidade
investigativa (Leis Penais Especiais), e, subsidiariamente, pelas normas penais e processuais
penais pátrias.
Dada a importância dos organismos policias na investigação e combate ao crime
organizado no Brasil, citamos o seguinte comentário, verbis: “Já ficou dito que no Brasil, sem
prejuízo da atuação de outras agências de fiscalização e controle, o esforço de prevenção e
repressão ao crime organizado é assentado nas estruturas da Polícia Federal e das polícias
civis dos Estados [...]” (SANTOS, 2006, p. 28), e continua, verbis: “Neste mister, o aparelho
policial desenvolve e emprega meios e técnicas operacionais diversos, no esforço de
investigar e de neutralizar as ações de grupos criminosos” (ibidem).
Quando se trata de crimes cometidos por organizações criminosas, nas condições
estabelecidas no art. 3, item 2, da “Convenção de Palermo”, obrigatoriamente aplicar-se-á a
citada convenção, ou seja, quando estes possuírem o caráter de transnacionalidade (já
estudado).
No que se refere aos crimes praticados por OCrim(s), podemos dividi-los em
“principais”, “secundários” e de “terceiro nível”, conforme divisão de Marcelo B.
Mendroni (2009, p. 27 – 28).
20
Comentar os diversos institutos legais, possíveis de serem utilizados no combate às OCrim(s), foge ao mote
principal desse trabalho, que visa abordar os instrumentos mais efetivos de combate ao Crime Organizado no
Brasil. Assim, não se mencionarão às diversas perícias criminais que atuam nas investigações criminais dos
crimes que deixam vestígios, emitindo laudos técnicos, ademais, também, não se tratarão da acareação e do
reconhecimento de pessoas, da reconstituição dos fatos, da documentoscópia e da papiloscópia, dentre outros,
mais tendentes a confirmar ou produzir provas nos crimes comuns.
57
Citar-se-ão os “Crimes principais”, que possivelmente servirão de “bases” às
OCrim(s), utilizando-se das listas de Marcelo B. Mendroni, verbis:

Extorsões;

Tráfico de entorpecentes;

Tráfico de armas;

Contrabando e descaminho;

Jogos de azar;

Promoção e favorecimento à prostituição;

Tráfico de pessoas (mulheres);

Receptações (em grande escala);

Fraudes diversas (estelionatos, falsificações de documentos etc.;

Falsificação de mercadorias;

Seqüestro de pessoas;

Golpes econômicos contra o estado (fraude a concorrências etc.);

Cartelização de empresas; e,

Roubo/furto de cargas;
E para os “Crimes secundários”:

Corrupção e concussão (dentre outros crimes contra a administração publica);

Ameaças e intimidações (de vitimas e testemunhas);

Fraudes diversas (estelionatos, falsificação de documentos etc.);

Falsificação de dinheiro;

Crimes de informática;

Tráfico de influência;

Homicídios; e,

Lesões corporais dolosas;
Para finalizar com o que considera “Crimes de terceiro nível”:

“Lavagem de dinheiro”.
O objetivo é mostrar a plêiade dos crimes que envolvem as OCrim(s), e informar que,
desses, poderão surgir outros, já que fenômenos tais como a globalização e o estabelecimento
de mercados comuns – MERCOSUL, ALCA 21, ALADI 22, entre outros –, facilitam o trânsito
21
Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), acordo de livre comércio previsto para todos países da
América, exceto Cuba (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR).
22
Associação Latino-Americana de Integração (ALADI) é o acordo internacional que busca a integração da
região latino-americana, procurando garantir seu desenvolvimento econômico e social (ibidem).
58
das OCrim(s) que possuem o caráter transnacional, e, por conseguinte, dificultam a
identificação desses delitos e o combate uniforme.
Importante destacar que muitas OCrim(s), como já exposto, não limitam a sua atuação
criminosa apenas a um território fixo.
As OCrim(s) que atuam no roubo e furto de cargas no Brasil, “se aproveitam também
da deficiência ou inexistência de comunicação e de integração entre os órgãos de segurança
pública estaduais, cujas ações também são retraídas pelos limites de suas respectivas
circunscrições” (DOS SANTOS, 2006, p. 12).
O objetivo principal da investigação policial é fornecer os elementos de prova que
ensejam à ação penal. Ou seja, àqueles aptos a provarem a existência e os elementos
caracterizadores dos delitos praticados por OCrim(s) e identificarem os seus autores.
Ora, dentre a gama de atribuições da Polícia Federal brasileira, prescreve o caput, do
art. 144, in fine, da Constituição Federal de 1988, verbis: “[...] assim como outras infrações
cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme,
segundo se dispuser em lei”.
Assim, dentro da estrutura do Departamento de Polícia Federal, de forma centralizada,
foi criada a Diretoria de Combate ao Crime Organizado (DCOR). Subordina-se a esta
diretoria, dentre outras divisões, a Divisão de Repressão a Crimes Contra o Patrimônio
(DPAT/DCOR), criada em 2003 para combater especificamente o roubo e o furto de cargas e
valores no Brasil.
Nesse ponto, os principais meios de combate ao Crime Organizado no Brasil, são:
a. Escutas telefônica, ambiental e clandestina – Lei nº 9.296/96;
b. Agente infiltrado – Leis nº 10.217/01;
c. Ação controlada ou entrega vigiada – Leis nº 9.034/95 e 11.343/2006;
d. Quebras dos sigilos bancário e fiscal – LC nº 105/2001 e Lei nº 9.613/98;
e. Deleção premiada – Lei nº 9.807/99.
Por fim, impõe-se mencionar que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas
por meios ilícitos” (art. 5º, inciso LVI, da Constituição Federal de 1988), significando que a
prova “ilegal igualmente corrompe as demais provas dela decorrentes, sendo inadmissíveis
para embasar eventual juízo de condenação”, conforme assentou o Superior Tribunal de
Justiça, no HC 64.096/PR, Relator ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta turma, julgado em
27.05.2008, DJe 04.08.2008.
59
1.1 ESCUTAS TELEFÔNICA, AMBIENTAL E CLANDESTINA – LEI Nº 9.296/96
Inicialmente, prevê o art. 5º, inciso XII, in fine, da Constituição Federal de 1988,
quando trata do sigilo das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas, in verbis:
Art. 5º.
[...]
XII. É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de
dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial,
nas hipóteses e na forma que a Lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal (grifo nosso).
Observa-se que somente em caráter excepcional, e mediante ordem escrita e
fundamentada da autoridade judicial competente, é que serão autorizadas as escutas
telefônicas e ambientais, pois atingem os princípios constitucionais que protegem à
Intimidade, à vida privada e à Imagem pessoais (art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de
1988).
A norma que trata dessas matérias é a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, que
regulamenta os procedimentos de execução na interceptação das comunicações telefônicas, de
qualquer natureza, pelas autoridades responsáveis pela quebra desse sigilo.
Os significados de interceptar e interceptação são, respectivamente, “fazer parar; deter;
barrar o acesso a” e “interrompimento, posse de surpresa do que é enviado a outrem”
(HOAISS, p. 1632). Ou seja, significa interromper uma determinada trajetória ou fluxo que se
direciona a algo ou a alguém.
Na doutrina nacional, encontramos as seguintes definições para o termo interceptação
telefônicas:
a. “Conclusivamente, a interferência – sempre – de terceiros em comunicação alheia
(MENDRONI, p. 120);
b. “É imiscuir-se ou intrometer-se em comunicação alheia” (NUCCI, 2007b, p.648).
c. “Ato de interferência nas comunicações telefônicas, quer para impedi-las – com
conseqüências penais – quer para delas apenas tomar conhecimento – neste caso,
também com reflexos no processo” (AVOLIO, 2003, p.90).
Sublinha-se que esse é um importante meio de prova, utilizado de forma eficaz para
identificar, rastrear, e classificar tanto a hierarquia, como membros restritos – autoria
delitiva –, atividades ilícitas etc. de uma determinada OCrim.
60
A interceptação telefônica stricto senso consiste no rastreamento das conversas
telefônicas sem o conhecimento dos interlocutores, realizada por uma terceira pessoa.
Já a escuta telefônica, funciona da mesma forma da interceptação telefônica, porém,
com o consentimento de um dos interlocutores.
A gravação, captação direta, interceptação ambiental ou escuta clandestina é
realizada mediante a interceptação das conversas de um sinal telefônico especifico ou dentro
de um determinado ambiente, por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro e
autorização legal.
Com relação a esse meio que não tem previsão legal, dispõe Guilherme de S. Nucci:
Captação direta: é possível que duas pessoas mantenham uma conversa, por telefone
ou num recinto qualquer, enquanto um delas grava o que se passa. Cuida-se de uma
gravação clandestina, pois um dos interlocutores não sabe que está sendo registrada
a conversação. Crime não há. Resta saber se a gravação pode ser usada como prova.
Porém, cumpre ressaltar que se for autorizada judicialmente, torna-se válida como
prova de um dado crime. É o que se observa na decisão proferida pelo Egrégio STF:
EMENTA: PROVA EMPRESTADA. Penal. Interceptação telefônica. Escuta
ambiental. Autorização judicial e produção para fim de investigação criminal.
Suspeita de delitos cometidos por autoridades e agentes públicos. Dados obtidos em
inquérito policial. Uso em procedimento administrativo disciplinar, contra outros
servidores, cujos eventuais ilícitos administrativos teriam despontado à colheira
dessa prova. Admissibilidade. Resposta afirmativa a questão de ordem. Inteligência
do art. 5º, inc. XII, da CF, e do art. 1º da Lei federal nº 9.296/96. Precedente. Voto
vencido. Dados obtidos em interceptação de comunicações telefônicas e em
escutas ambientais, judicialmente autorizadas para produção de prova em
investigação criminal ou em instrução processual penal, podem ser usados em
procedimento administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas
em relação às quais foram colhidos, ou contra outros servidores cujos supostos
ilícitos teriam despontado à colheita dessa prova. (Inq. 2424 QO-QO, Relator
Ministro Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 20.06.2007, DJe 24.08.2007, DJ
24.08.2007, grifo nosso).
O citado julgado mostra que mesmo dados obtidos por meio de escutas ambientais,
quando autorizadas judicialmente para produção de provas em investigação ou em Processo,
são considerados lícitos e aptos a formarem o livre convencimento do magistrado.
A escuta ambiental é outro meio de investigação de que se podem valer os órgãos
policiais, na busca de provas que comprovem a autoria e a materialidade dos crimes
cometidos pelas OCrim(s).
A Lei nº 9. 296/1996 traz seu art. 1º:
Art. 1º. A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para
prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o
disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob
segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de
comunicações em sistemas de informática e telemática.
61
A jurisprudência tem aceitado pacificamente as provas angariadas por meio de escutas
telefônicas autorizadas judicialmente 23.
Esse é um importantíssimo método para obtenção de informações preliminares,
principalmente quando se iniciam as investigações sobre determinada(s) OCrim(s), pois ao
identificar um membro restrito (alvo), poderá, paulatinamente, mapear a estrutura
hierárquico-piramidal e a própria divisão direcionada de tarefas.
Muitas operações policiais têm sido desencadeadas amparadas ou iniciadas por
interceptações telefônicas autorizadas judicialmente.
Porém, parte alguns operadores do direito tem tecido duras críticas em relação à
divulgação dos “grampos”
24
por parte da mídia, culpando as autoridades encarregadas pelas
investigações do caso, e propalando que houve violação ao art. 5º, inciso XII, da CF/88.
Assim, Nucci (2007b, p.650) tece fundadas ponderações ao mencionar o equilíbrio
entre o segredo de justiça e a liberdade de imprensa:
Por isso os meios de comunicação podem ter acesso aos atos processuais de
audiência (note-se que o referido art. 92, IX, refere-se a julgamentos públicos e não
a dados contidos nos autos do processo) e divulgar a informação encontrada, com
regra. Mas quando o sigilo for corretamente decretado, por envolver interesse
público relevante (ex.: a investigação complexa de uma quadrilha que atua
organizadamente), o direito à informação deve sucumbir, aguardando a melhor hora
para a divulgação, sob pena de promover a perda total da colheita eficiente da prova.
Como bem se observa, é preciso uma análise correta do equilíbrio entre a liberdade de
imprensa em confronto com o sigilo das investigações criminais, mormente quando envolver
os crimes praticados por OCrim(s), que, invariavelmente, implica na multiplicidade de réus e
de bens de alto valor econômico, além do intuito principal que é preservar a segurança (art. 5º,
caput, CF/88) da própria sociedade, vítima dessa violência organizada.
23
Nesse sentido, decidiu o Egrégio STJ: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS.
PRISÃO EM FLAGRANTE. EXCESSO DE PRAZO. PLURALIDADE DE RÉUS. COMPLEXIDADE DA
CAUSA. CONCLUSÃO DA INSTRUÇÃO. ALEGAÇÃO SUPERADA. SÚMULA 52. LIBERDADE
PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. QUANTIDADE EXPRESSIVA DE DROGAS. FUNDAMENTAÇÃO
IDÔNEA. ORDEM DENEGADA. 1. Ultimada a instrução processual penal, resta superada a alegação de
excesso de prazo. Súmula 52 desta Corte. Ademais, trata-se de feito complexo, envolvendo pluralidade de réus
(seis), o que torna razoável a delonga no procedimento, excedendo-se a mera soma aritmética dos prazos
processuais. 2. Presentes indícios de autoria e prova da materialidade, decorrentes de escutas telefônicas, e
apreensão de mais de sete quilos de cocaína, verificam-se os pressupostos de cautelaridade para a prisão
preventiva. 3. Ordem denegada. (HC nº 99.443/SP, Relatora Ministra Maria Thereza De Assis Moura, Sexta
turma, julgado em 21.08.2008, DJe 29.09.2008, grifo nosso).
24
Expressão popularizada pela mídia nacional ao se referir as interceptações telefônicas, cuja origem provável
tenha sido as escutas clandestinas realizas no período ditatorial, onde “arapongas” – espiões – pertencentes ao
antigo SNI – “grampeavam” indivíduos suspeitos de crimes contra a segurança nacional (FIGUEREIDO, 2005).
62
1.2 AGENTE INFILTRADO – LEIS Nº 10.217/01 E 11.343/06
Um meio de investigação muito debatido pela doutrina e que, infelizmente, é vedada
no Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 150/2006, em tramitação no Senado Federal, é o
denominado “agente infiltrado”.
Este eficaz meio de investigação consiste em disfarçar um agente policial ou de
inteligência, para que o mesmo se passe por um membro restrito de uma determinada
OCrim, infiltrando-se como se fosse um novo integrante.
Basta dizer que, se uma das principais características das OCrim(s) é possuir
membros restritos, isto ocorre porque a organização confia a esses integrantes informações
vitais, que não são acessíveis por ouros meios de investigação.
E justamente porque é muito eficaz na obtenção de dados cruciais é que as OCrim(s),
cada vez mais, restringem o acesso de novos membros. Porém, como toda boa técnica de
investigação, será o treinamento exaustivo deste homem o fator mais importante para o
sucesso da missão de infiltração e inteligência policiais.
O instituto da infiltração policial consta da Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional – Convenção de Palermo –, que foi adotada em Nova York,
em 15 de novembro de 2000, no art. 20, que trata das “técnicas especiais de investigação”:
1. Se os princípios fundamentais do seu ordenamento jurídico nacional o permitirem,
cada Estado Parte, tendo em conta as suas possibilidades e em conformidade com as
condições prescritas no seu direito interno, adotará as medidas necessárias para
permitir o recurso apropriado a entregas vigiadas e, quando o considere adequado, o
recurso a outras técnicas especiais de investigação, como a vigilância eletrônica ou
outras formas de vigilância e as operações de infiltração, por parte das autoridades
competentes no seu território, a fim de combater eficazmente a criminalidade
organizada.
Foi no intuito de se adequar a Convenção de Palermo que a Lei nº 10.217, de 11 de
abril de 2001
25
, alterou “os arts. 1º e 2º da Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995, que dispõe
sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por
organizações criminosas”.
Assim é que esse importante instrumento passou a constar da Lei nº 9.034/1995 nos
seguintes termos:
Art. 2º Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já
previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas:
25
A Lei nº 10.217, de 11 de abril de 2001, por se tratar apenas de uma alteração na Lei 9.034, de 3 de maio de
1995, e não representar um diploma independente, não foi citada no capitulo relativo às “Normas aplicáveis ao
Crime Organizado no Brasil” (Capítulo II).
63
[...]
V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação,
constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada
autorização judicial.
Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e permanecerá
nesta condição enquanto perdurar a infiltração.
Na verdade, a Lei nº 11.343/2006 – “Lei de Drogas”, mais recente, reproduziu, no
inciso I, do art. 53, a mesma redação contida na Lei nº 9.034/1995, alterada pela Lei nº
10.217/2001, in verbis:
Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta
Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e
ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:
I - a infiltração por agentes de polícia, em tarefas de investigação, constituída pelos
órgãos especializados pertinentes;
[...]
Ora, o que o legislador pátrio fez foi adequar a legislação nacional ao contido na
Convenção de Palermo, tornando válida a utilização da técnica de infiltração policial.
É preciso registrar que há operações em que o policial infiltrado consegue agir de
forma relativamente segura e eficaz, quando possui o apoio de outros policiais infiltrados e de
uma base de apoio, apta a resgatá-lo, caso ocorra alguma emergência.
Tema deveras tormentoso é a vedação a co-participação delituosa, pelo qual o agente
infiltrado não poderá participar de nenhum crime, como se impende do próprio art. 288, do
CPB, que tipifica a conduta da participação em quadrilha ou bando.
A doutrina entende que haveria natural exclusão da antijuridicidade desta(s)
conduta(s), caso perpetrada pelo policial infiltrado, já que “[...] havendo autorização para a
infiltração do agente, o que significa integrar o bando, mas para fins de investigação criminal,
que serve aos fins dos órgãos de persecução, ele não estaria na verdade integrando a
organização criminosa, mas sim dissimulando a sua integração com a finalidade de coletar
informações e melhor viabilizar o seu combate” (MENDRONI, 2009, p. 110).
Ora, ao infiltrar-se em uma determinada OCrim, com o fito de combatê-la, o agente
deverá agir como qualquer membro restrito desta organização, e caso deixe de participar dos
delitos praticados pelos demais membros do grupo, se tornara figura suspeita. Haveria, além
disso, a questão da hierarquia e da confiança, que como bem mostra a nossa experiência
policial, determina que quanto mais “envolvido” com o grupo, mais respeito e confiança são
angariados, o que, invariavelmente, traduz-se na pratica de crimes concernentes as atividades
da OCrim, e nesta seara, na obtenção pelo agente infiltrado de informações cruciais para a
investigação criminal.
64
A Polícia Federal solicitou a adoção de um dispositivo que regulasse os
procedimentos do agente infiltrado, no que concerne a exclusão da antijuridicidade da coparticipação. Esta autorização já existe em países como os Estados Unidos da América, onde
se resguarda o policial infiltrado, que age motivado por um valor moral maior: o interesse
social no combate ao crime organizado.
A jurisprudência nacional sobre o tema é muito acanhada. Destaca-se o trecho da
decisão do STF, em que regula a legalidade da modalidade “agente infiltrado” como meio de
prova, verbis:
Trata-se de reclamação proposta por Túlio Marcelo Denig Bandeira, que postula em
nome próprio, contra ato do Juiz de Direito da Vara Criminal de Santo Antônio do
Sudoeste/PR. 2. O reclamante sustenta que o mandado de prisão temporária, contra
ele expedido, posteriormente convertida em prisão preventiva, seria ilegal. Afirma
que a investigação criminal e a prisão foram efetuadas pela Polícia Militar,
desprovida de competência para promover esses procedimentos. 3. Alega que a
Polícia Militar, por não desenvolver atividade persecutória da investigação criminal,
não pode ter seus agentes “infiltrados em organizações criminosas como autoriza
a lei e, se fizer, dará margem à colheita de provas obtidas por meio ilícito” [fl. 6].
(Rcl. 5705, Relator Ministro Eros Grau, julgado em 29.05.2008, DJ 04.06.2008,
grifo nosso).
Apesar das poucas decisões prolatadas pela justiça, o fascínio que este assunto
desperta na doutrina é patente nas novas publicações
26
, que têm buscado referendar o
instituto como um importante meio de prova, além do auxilio que presta a outras formas de
investigação tais como a ação controlada.
É preciso destacar a importância do método a ser empregado pela organização policial
que infiltrará o policial, pois utilizar-se de policiais inexperientes ou que possuam
personalidade inadequada ao perfil desejado, traçado por policias experientes que já atuaram
em diversas investigações da OCrim alvo.
Propõem-se, portanto, quatro momentos:
1. Escolha do agente policial verificando-se sinais característicos que o identifiquem
como membro restrito da OCrim(s) e, principalmente, das qualidades pessoais
inerentes à personalidade e a conduta social;
2. Treinamento e preparação do agente policial, utilizando-se de métodos e técnicas
específicas, inclusive das informações extraídas dos colaboradores – informantes
– pertencentes à OCrim alvo da investigação, claro que sem revelar o objetivo da
informação prestada;
26
Nesse sentido, ver os livros: ONETO, Isabel. O Agente Infiltrado: Contributo para a compreensão do regime
jurídico das acções encobertas. Coimbra: Coimbra Ed., 2005. 221 p.; PACHECO, Rafael. Crime organizado:
Medidas de controle e infiltração policial. Curitiba: Juruá, 2007. 215 p.; entre outros.
65
3. Instalação de uma unidade de apoio ao policial infiltrado contando com membros
da sua estrita confiança e com equipe de apoio de policias (táticos) apta a resgatálo em uma emergência;
4. Criação de uma nova identidade e “estória cobertura” para facilitará o seu
ingresso no grupo criminoso organizado; e,
5. Infiltração do agente, inclusive rompendo-se o contato com familiares, amigos,
conhecidos etc. mantendo apenas o contato com a equipe de apoio em períodos e
lugares previamente combinados.
Para o sucesso desse importante meio é fundamental o sigilo total da operação,
inclusive separando-se a unidade de apóio da própria estrutura policial, que ficaria, então,
subordinada apenas ao chefe, diretor ou superintendente da organização – Por isso seria uma
boa denominação Unidade Independente de Apoio à Infiltração (UIAI)!
Por conter altos riscos a utilização dessa técnica deve ser empregada somente quando
for necessária para obtenção de dados e provas específicos e primordiais à investigação
policial e condicionada a prévia autorização judicial. Nesse último aspecto, convém salientar
que “contrariando a tendência dos países da Europa e dos Estados Unidos, onde a autorização
é efetivada pelo Ministério Público, optou o legislador brasileiro pela autorização judicial”
(MENDRONI, p. 111).
A especificidade é o objetivo específico da missão de infiltração policial, pois
“interessa saber, a qualquer agente infiltrado, o âmbito e o limite de suas atividades na coleta
das evidencias e provas encontradas no seio da organização criminosa” (MENDRONI, p.
111).
Deve ser assegurada ao policial infiltrado, após o término da operação, a sua remoção
para outra cidade ou estado e a restituição da sua identidade original, bem como o apoio dos
policias locais pertencentes a sua organização. Benefícios tais como promoções, e a
possibilidade de escolher qual a cidade onde queira residir são incentivos para o policial e
para a sua segurança pessoal.
Manifesta-se, nesse caso, uma vantagem ao Departamento de Polícia Federal que atua
no âmbito de todo território nacional e possui uma logística mais flexível.
Por fim, como já se mencionou, a infiltração é muito importante a técnica da ação
controlada ou entrega vigiada, com se verá adiante.
66
1.3 AÇÃO CONTROLADA OU ENTREGA VIGIADA – LEIS Nº 9.034/95 E
11.343/2006
Quando investiga um determinado crime, a polícia pode se deparar com a situação em
que membros de uma determinada quadrilha organizada, transportem produto(s) ilícito(s)
quaisquer. A sua apreensão imediata pode implicar graves prejuízos a persecução penal – fuga
dos demais integrantes (ou a sua correta identificação) e a não apreensão de todos os bens
ilegais –, vislumbrou-se a possibilidade de consentir ao aparelho policial, encarregado desta
cautela, que acompanhasse estes produtos ilegais até o seu destino final, ou até o momento em
que fosse possível identificar todos os demais envolvidos e/ou apreender os bens envolvidos.
Assim, em socorro, surge a Lei nº 9.034, de 03 de maio de 1995, que “Dispõe sobre a
utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por
organizações criminosas” (Anexo A).
Ora, trata-se de instrumento que, como posto acima, reflete a possibilidade de
acompanhar o transporte de produtos ilegais até seja possível identificar todos os envolvidos
e/ou produtos, a fim de responsabilizar um maior numero de integrantes.
A Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, mais uma vez inovou, ao reproduzir em seu
texto, dispositivos permitindo a entrega controlada ou vigiada, verbis:
Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta
Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e
ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:
[...]
II - a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos
ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território
brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de
integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal
cabível.
Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida
desde que sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do
delito ou de colaboradores.
Nas operações de roubo de Tráfico de entorpecentes; Tráfico de armas; Contrabando e
descaminho; Receptações (em grande escala); Falsificação de mercadorias e no Roubo/furto
de cargas é crucial a utilização da entrega controlada ou vigiada, para se identificar todos os
membros restritos de uma OCrim.
Marcelo B. Mendroni enfatiza a necessidade do agente infiltrado para o sucesso da
ação controlada “posto que o controle depende das informações que advirão daquele agente,
67
uma vez íntimo das situações e circunstâncias utilizadas pela organização criminosa” (2009,
p. 110). O que corrobora a importância do agente infiltrado.
Em termos práticos, a título de exemplo, ocorreria a ação controlada ou a entrega
vigiada quando a Polícia:
a. Por meio de interceptação telefônica autorizada judicialmente, tomasse
conhecimento de um carregamento de entorpecentes proveniente do Paraguai;
b. Sabendo que essa droga será transportada por meio das rodovias interestaduais até
o ponto de distribuição, e conhecendo todo o itinerário, porém, sem saber quais
são todos os membros envolvidos na OCrim e obtendo a informação do agente
infiltrado que estes estariam presentes na entrega da droga;
c. Então, poderia planejar a ação controlada para apreender o carregamento ilegal
no ato da entrega e prender todos os membros integrantes do grupo criminoso
organizado.
Seriam empregados, nesse hipotético exemplo, três importantes meios de combate a
OCrim, que permitiram a completa identificação e prisão em flagrante delito (art. 302, do
CPP) de todo os membros envolvidos pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, da Lei nº
11.343/2006), a apreensão do produto ilícito e do bem, in casu, um caminhão utilizado paro o
transporte da droga (art. 62, da Lei nº 11.343/2006).
Por fim, vale destacar a definição dada por Marcelo B. Mendroni (p. 105) para o
citado instituto:
Consiste no retardamento e na espera do melhor momento para a atuação policial
repressiva contra os criminosos integrantes da organização.
[...]
Concede-se à Polícia o direito de aguardar o momento a oportunidade mais eficiente
para atuar, seja prender, surpreender, ou agir, de qualquer forma, de modo que no
momento oportuno – segundo a interpretação dos agentes que participam da
operação – a situação seja mais favorável para a obtenção de provas.
É importante ressaltar que o Egrégio Supremo Tribunal Federal, tem conferido
validade e plena eficácia ao dispositivo 27, ademais, como importante meio de prova.
27
[...] Informam os impetrantes que em 10/7/2008 foi decretada a prisão preventiva do paciente, em razão de
operação deflagrada pela Polícia Federal, constando dos autos que o paciente teria participado de oferecimento
de vantagem ilícita a um dos policiais federais, para que não fossem investigados o Sr. Daniel Valente Dantas e
seus familiares. 12. O paciente foi flagrado em “Ação Controlada” promovida pela Polícia Federal,
“Operação Satiagraha”, tentando corromper delegado de polícia com significativa quantia em dinheiro.
Há, portanto, indícios suficientes para o oferecimento de denúncia pela prática do crime descrito no artigo
333 do Código Penal, sendo desnecessária a prisão cautelar por conveniência da instrução criminal. 13.
Prisão cautelar em circunstâncias que não a justifiquem vigorosamente equivale a antecipação do cumprimento
de pena a ser, no futuro, eventualmente imposta em sentença transitada em julgado. A afronta ao princípio da
68
1.4 QUEBRAS DOS SIGILOS BANCÁRIO E FISCAL – LC Nº 105/2001 E LEI Nº
9.613/98
Diariamente a mídia nos informa sobre o aumento dos lucros da criminalidade
organizada, notadamente, do influxo de capitais gerados por essas “empresas criminosas”.
Cita-se a matéria do jornal Correio Braziliense, do dia 12 de abril de 2009, à página 21,
intitulada: “R$ 2,2 tri no submundo – Montanhas de dinheiro circulam no Brasil sem
nenhum tipo de regulação. Essa economia que funciona nas sombras é movimentada por
criminosos que usam futebol, imóveis e lojas de arte como negocio de fachada” (grifo
nosso).
Outra reportagem que chamou bastante atenção pela polêmica gerada em torno das
investigações sobre o banqueiro Daniel Dantas, foi publicada no sítio do jornal o Estado de
São Paulo (Disponível em: <http://www.estadao.com.br/nacional/not_nac363325,0.htm>.
Acesso em 10 de Abril de 2009, grifo nosso):
O executivo Roberto Amaral caiu na malha da Operação Satiagraha - investigação
da Polícia Federal sobre envolvimento do banqueiro Daniel Dantas em suposto
esquema de crimes financeiros e lavagem de dinheiro. Ele foi indiciado pela PF
por crimes de evasão de divisas, formação de quadrilha e ligação com
organização criminosa. Amigo e consultor empresarial de Dantas, Amaral é um
dos 13 indiciados no inquérito Satiagraha.
Quando se trata dos princípios constitucionais da Privacidade e da Intimidade (art.
5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988), a Carta Magna exige a necessidade da
ocorrência de situações expressas que justifiquem possíveis violações, sempre na prevalência
do interesse público (coletivo) sobre o individual (particular).
Este é o caso da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, que “Dispõe
sobre o sigilo das operações de instituições financeiras e dá outras providências”. Esse meio
consiste na autorização judicial para quebra dos sigilos bancário e fiscal, quando necessárias
para apuração, tanto no inquérito como no processo judicial, e somente nas hipóteses
especificas do art. 1º, § 4º, a LC nº 105/2001, in verbis:
Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e
passivas e serviços prestados.
presunção de inocência, contemplado no plano constitucional, é flagrante. 14. O paciente é tecnicamente
primário, possui bons antecedentes e residência fixa. Além disso, apresentou-se espontaneamente à autoridade
policial. Afasto o óbice da Súmula 691/STF e defiro o pedido de liminar a fim de que o paciente seja posto
imediatamente em liberdade, até o julgamento definitivo desta impetração. Comunique-se. Os autos estão
suficientemente instruídos. Dê-se vista ao Ministério Público Federal. Publique-se. Brasília, 12 de agosto de
2008. Ministro Eros Grau - Relator - (HC 95693 MC, Relator(a): Min. EROS GRAU, julgado em 12/08/2008,
publicado em DJe-153 DIVULG 15/08/2008 PUBLIC 18/08/2008) .
69
[...]
§ 4o A quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração de
ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial,
e especialmente nos seguintes crimes:
I – de terrorismo;
II – de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
III – de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado a sua
produção;
IV – de extorsão mediante seqüestro;
V – contra o sistema financeiro nacional;
VI – contra a Administração Pública;
VII – contra a ordem tributária e a previdência social;
VIII – lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores;
IX – praticado por organização criminosa. (grifo nosso).
A quebra dos sigilos bancário e fiscal se destina a fornecer, principalmente, dados
sobre os crimes de “lavagem de dinheiro” ou “branqueamento de capitais”.
A par das Leis que tratam dos crimes contra o sistema financeiro (7.492/86) e contra o
mercado de capitais (6.385/76), é a Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998, que “dispõe sobre
os crimes de „lavagem‟ ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do
sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta lei; cria o Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (COAF), e dá outras providências”
Essa lei tipifica o crime de “lavagem de dinheiro” e distribui funções fiscalizadoras a
órgãos pertencentes ao Sistema Financeiro Nacional - SFN. Ora, já se tratou das hipóteses
autorizadoras da quebra dos sigilos bancário e fiscal, e da Lei nº ; citaremos as autoridades
administrativas encarregadas de promoverem a aplicação desta lei: o Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (COAF); o Banco Central do Brasil (BACEN); a Comissão de Valores
Mobiliários (CVM); a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP); e a Secretaria de
Previdência Complementar (SPC) (MAGALHÃES, p. 17).
Para essa consecução, o art. 9º, da Lei nº 9.613/98, “sujeitam as pessoas jurídicas que
tenham, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória,
cumulativamente ou não” (todas as atividades estão relacionadas nos incisos do art. 9º), a
identificar os seus clientes e a manter os registros das operações realizadas por estes, além de
comunicar a essas autoridades administrativas, acima mencionadas, todas as operações
financeiras por elas realizadas.
70
Há de se mencionar o art. 26, da Lei nº 8.625/93 – Lei Orgânica do Ministério Público
–, que autoriza o Ministério Público requisitar informações dos órgãos e entidades, o que
inclui, além dos órgãos citados, os bancos 28.
Para essa fim, é fundamental a formação das Forças-tarefas entre os vários órgãos
incumbidos da fiscalização das atividades financeiras, para, coordenadamente, atuarem no
combate ao crime organizado, onde a quebra dos sigilos fiscal, bancário, telefônico e dados
eletrônicos, paralelamente ao cruzamento das informações advindas do levantamento de
campo (Polícia), são ideais para identificação do crime de lavagem de dinheiro
29
.
Neste desiderato, e tendo em vista a possível atuação em conjunto desses órgãos,
destaca-se a Portaria nº 126, de 13 de março de 2007, que “disciplina a atuação do Ministério
Público do Distrito Federal e Territórios no que concerne ao combate à criminalidade
organizada e define a estrutura e as atribuições do Núcleo de Combate às Organizações
Criminosas – NCOC e dá outras providências” (termo da citada Portaria).
A citada portaria busca centralizar as informações e as investigações recebidas ou
conhecidas pelo MPDFT, no então criado, em 2007, Núcleo de Combate às Organizações
Criminosas (NCOC), visando à “necessidade de articular e diferenciar as atividades de
inteligência e de produção de provas”.
Ora, a confirmar a importância da formação das forças-tarefas, destaca-se um trecho
da citada portaria que menciona “que não se pode combater organizações criminosas
reprimindo apenas suas ações isoladas sem uma visão de conjunto, obtida por intermédio do
entrelaçamento de dados e informações”.
28
Nesse sentido, decidiu o STF: EMENTA: CONSTITUCIONAL. SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA.
ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO. CF, art. 5º, X. I. - Se é certo que o sigilo bancário, que é
espécie de direito à privacidade, que a Constituição protege art. 5º, X não é um direito absoluto, que deve
ceder diante do interesse público, do interesse social e do interesse da Justiça, certo é, também, que ele há
de ceder na forma e com observância de procedimento estabelecido em lei e com respeito ao princípio da
razoabilidade. No caso, a questão foi posta, pela recorrente, sob o ponto de vista puramente constitucional,
certo, entretanto, que a disposição constitucional é garantidora do direito, estando às exceções na norma
infraconstitucional. II. - R.E. não conhecido. (RE 219780, Relator Ministro Carlos Velloso, Segunda Turma,
julgado em 13.04.1999, DJ 10.09.1999, grifo nosso).
29
Nesse sentido, decidiu o STJ: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO DIAMANTE.
TRÁFICO.
LAVAGEM DE DINHEIRO. FALSIDADE IDEOLÓGICA.
DELITOS SUJEITOS A
PROCEDIMENTOS DIVERSOS. ART. 38 DA LEI 10.406/2002. ADOÇÃO DO PROCEDIMENTO
ORDINÁRIO. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. Imputados aos réus delitos
sujeitos a procedimentos diferentes, é possível a adoção do procedimento ordinário previsto para os delitos
apenados com reclusão, pois é o mais abrangente, próprio a garantir ao Paciente e aos co-réus a forma mais
irrestrita de ampla defesa. 2. Operação irrompida pela Polícia Federal, conhecida por “Operação
Diamante", em que se deflagrou o cometimento de inúmeros delitos, por organização criminosa complexa
e que se estenda por vários países, o que justifica a adoção do procedimento ordinário. 3. A concessão da
delação premiada não está atrelada à existência ou inexistência da defesa preliminar, prevista no art. 38
da Le n.º 10.409/2002, eis que pode ser conhecida em razão do acordo ou proposta do Ministério Público,
atendidos os requisitos legais. 4. Ordem DENEGADA. (HC nº 46.337/GO, Relator Ministro CARLOS
FERNANDO MATHIAS, Sexta turma, julgado em 23.10.2007, DJ 10.12.2007 p. 444, grifo nosso).
71
Assim é que a devida atuação em conjunto das Polícias (Federal e Civil), dos núcleos,
grupos ou unidades de combate às organizações criminosas dos MPs (Estaduais, Federal e do
DF), dos órgãos de fiscalização financeira (COAF, CVM, BACEN, DRCI, GAFI, UIF, SPC e
SUSEP) e de outros órgãos nacionais (GGI-LD, ABIN etc.) e internacionais
(ONODCCP/ONU, INTERPOL, SARs, CIA, FBI etc.) e outros que porventura interessem,
em uma atividade, no primeiro momento, de cruzamento de informações, seria a forma mais
eficaz de combater estas OCrim(s).
O que se referenda, porém, com a ressalva que o modelo de repressão adotado em
diversos países, baseando-se na cooperação entre os diversos órgãos estatais e internacionais,
o que se comentará mais adiante, tem se revelado bastante eficiente.
Importante enaltecer a brilhante atuação da Divisão de Combate aos Crimes
Financeiros – DFIN, do Departamento de Polícia Federal, nas operações em que atuou em
conjunto com o Ministério Público Federal – MPF, tornando-se exemplo de eficácia no
combate a estes crimes no Brasil.
1.5 DELAÇÃO PREMIADA – LEI Nº 9.807/99
A delação premiada surge do acordo voluntário firmado entre a testemunha de um
determinado crime (ou partícipe) e a autoridade judiciária competente. Alguns autores a
denominam como “colaboração eficaz” (SANTOS et al, 2006, p. 34).
A delação premiada objeta informar a investigação criminal, em troca, se for o caso,
da redução na pena do delator. Para Nucci, “delatar significa acusar, denunciar ou revelar”
(2009, p. 432), porém, ponderando que se deve utilizar “o termo quando um acusado,
admitindo a prática criminosa, revela que outra pessoa também o ajudou de qualquer forma”
(p. 433).
Logo que surgiu, a deleção premiada foi bastante criticada por alguns autores, já era
um instrumento de barganha na esfera criminal, ou seja, permitia um tipo de “mercado”
paralelo de informações sem o devido controle ético-moral. Contudo, alguns saíram em
defesa do citado instituto, utilizado em diversos países do mundo, tais como Itália, EUA e
outros, adaptando-o ao Brasil, justamente por elucidar os crimes mais graves:
Alguns sustentam, por isso mesmo [instrumento de barganha], que se reveste
de prática antiética. Não concordamos com esse raciocínio porque se busca
72
exatamente a aplicação de um instrumento previsto em lei – trazido, portanto, ao
mundo jurídico, que tem a finalidade de tornar mais eficiente a aplicação de justiça,
exatamente nos casos considerados mais graves, que abalem de forma mais
agressiva a ordem pública. (MENDRONI, p. 82).
A Lei nº 9.034/95 faz menção a esse importante meio de combate às OCrim(s), em seu
art. 6º, nos seguintes termos, verbis:
Art. 6º Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um
a dois terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de
infrações penais e sua autoria.
Embora o instituto da delação premiada seja mencionado, também, nas Leis nº
9.613/98, 8.072/90 – lei dos crimes hediondos –, 8.137/90, 7.492/86 – “Define os crimes
contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências” – e 9.269/96, é no Capítulo II,
da Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, que encontramos a melhor definição quando “da
proteção aos réus colaboradores”, verbis:
Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação
policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes
do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois
terços.
Apesar de o verbo colaborar ensejar apenas uma ação espontânea, quem testemunha
um crime é obrigado a depor sob pena de sofrer as medidas de condução coercitiva e incorrer
no crime de desobediência, previstos nos arts. 201, 218 e 219, do CPP, ou, caso falte com a
verdade perante a autoridade responsável, incorrerá no crime de falso testemunho, infração
contida no art. 342, do CPB.
A confissão deve ser espontânea para ser legal, pois se for prestada sob coação,
tortura, ameaça ou promessa de recompensa, tonar-se uma prova ilícita, e, como tal,
imprestável para o processo (Art. 5º, LVI, CF/88). O próprio Código Penal, em seu art. 65,
inciso III, alínea “d”, trata das circunstâncias que atenuam a pena quando o agente tiver
“confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime” (grifo nosso).
Assim, a colaboração enseja uma atitude espontânea, voluntária e sincera.
Voluntariedade para Nucci que “é a ação ou omissão empreendida livre de qualquer coação
física ou moral” (2007b, p. 946), corroborando o que se afirmou.
As informações prestadas pela(s) testemunha(s) serão analisadas no decorrer da
investigação penal, embora este critério seja muito subjetivo, a jurisprudência nacional a
utiliza como um eficaz meio de prova, apta a formar o livre convencimento do magistrado e a
instruir, o que é muito provável, novas investigações noutros crimes 30.
30
Nessa seara, decidiu o STF: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. NULIDADE DO
INTERROGATÓRIO. SIGILO NA QUALIFICAÇÃO DE TESTEMUNHA. PROGRAMA DE PROTEÇÃO À
73
O Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC) lançou em 14 de
fevereiro de 2008, em Viena, na Áustria, um manual intitulado "boas práticas em proteção de
testemunhas em processos penais ligados ao crime organizado". Essa publicação busca
auxiliar os Estados membros da ONU a criarem seus próprios programas de proteção a
vítimas e testemunhas de crimes graves. O Brasil já exerce essa importante missão que é
encampada, no âmbito do Departamento de Polícia Federal (DPF), pela Divisão de Direitos
Humanos (DDH), subordinada à Diretoria de Combate ao Crime Organizado (DCOR).
Vale destacar trecho da Convenção de Palermo que traz didáticas orientações aos
países signatários, quanto a proteção das testemunhas que colaborem com as investigações
das OCrim(s), dentro das regras mínimas para existência com dignidade e segurança.
Artigo 24
Proteção das testemunhas
1. Cada Estado Parte, dentro das suas possibilidades, adotará medidas apropriadas
para assegurar uma proteção eficaz contra eventuais atos de represália ou de
intimidação das testemunhas que, no âmbito de processos penais, deponham sobre
infrações previstas na presente Convenção e, quando necessário, aos seus familiares
ou outras pessoas que lhes sejam próximas.
2. Sem prejuízo dos direitos do argüido, incluindo o direito a um julgamento regular,
as medidas referidas no parágrafo 1 do presente Artigo poderão incluir, entre outras:
a) Desenvolver, para a proteção física destas pessoas, procedimentos que visem,
consoante as necessidades e na medida do possível, nomeadamente, fornecer-lhes
um novo domicílio e impedir ou restringir a divulgação de informações relativas à
sua identidade e paradeiro;
b) Estabelecer normas em matéria de prova que permitam às testemunhas depor de
forma a garantir a sua segurança, nomeadamente autorizando-as a depor com
recurso a meios técnicos de comunicação, como ligações de vídeo ou outros meios
adequados.
3. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de celebrar acordos com outros
Estados para facultar um novo domicílio às pessoas referidas no parágrafo 1 do
presente Artigo.
4. As disposições do presente Artigo aplicam-se igualmente às vítimas, quando
forem testemunhas.
TESTEMUNHA. ACESSO RESTRITO À INFORMAÇÃO. CRIMINALIDADE VIOLENTA. ALEGAÇÕES
NÃO APRESENTADAS NO STJ. ORDEM DENEGADA NA PARTE CONHECIDA. 1. A tese de nulidade do
ato do interrogatório do paciente devido ao sigilo das informações acerca da qualificação de uma das
testemunhas arroladas na denúncia não deve ser acolhida. 2. No caso concreto, há indicações claras de que houve
a preservação do sigilo quanto à identidade de uma das testemunhas devido ao temor de represálias, sendo que
sua qualificação foi anotada fora dos autos com acesso restrito aos juízes de direito, promotores de justiça e
advogados constituídos e nomeados. Fatos imputados ao paciente foram de formação de quadrilha armada, da
prática de dois latrocínios e de porte ilegal de armas. 3. Legitimidade da providência adotada pelo magistrado
com base nas medidas de proteção à testemunha (Lei nº 9.807/99). Devido ao incremento da criminalidade
violenta e organizada, o legislador passou a instrumentalizar o juiz em medidas e providências tendentes
a, simultaneamente, permitir a prática dos atos processuais e assegurar a integridade físico-mental e a
vida das pessoas das testemunhas e de co-autores ou partícipes que se oferecem para fazer a delação
premiada. 4. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nesta parte, denegado (HC nº 90321, Relator Ministro
Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 02.09.2008, DJ em 26.09.2008, grifo nosso).
74
Dentro desse dispositivo se faz menção a utilização de vídeo ou outros meios
adequados ao seu testemunho.
Neste desiderato, Lei nº 11.900, de 08 de janeiro de 2009, que alterou “dispositivos do
Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para prever a
possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de
videoconferência, e dá outras providências”, criou a possibilidade para essas testemunhas
deporem em total segurança e sigilo do local onde se encontrem.
2 ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA, SIGILO E SEGREDO DE JUSTIÇA
Não se pode olvidar a importância da atividade de inteligência para obtenção de dados
e informações que possuem interesses diversos, mas que, porém, podem auxiliar
sobremaneira ao combate ao Crime Organizado.
Com relação à importância da atividade de inteligência, destaca o Delegado de Polícia
Federal Rodrigo Carneiro Gomes (2006), que:
Embora a legislação federal assegure, por meio da utilização da entrega vigiada ou
da ação controlada, um instrumento eficaz de combate ao crime organizado, há
dificuldades materiais, mesmo com a conjugação de ações de inteligência, com as
quais o Estado continuará se deparando para alcançar todos os integrantes da
organização de criminosos como a insuficiência de informações, a
proporcionalidade e disponibilidade de recursos, a falta de acordo com as
autoridades internacionais e o conhecimento do destino final das cargas, mercadorias
ou drogas ilícitas, com o risco de perda.
Assim, a Lei nº 9.883, de 07 de dezembro de 1999, “institui o Sistema Brasileiro de
Inteligência, cria a Agência Brasileira de Inteligência - ABIN, e dá outras providências”.
A definição da atividade de inteligência é encontrada no § 2º, do art. 1º, da norma em
comento, verbis:
§ 2o Para os efeitos de aplicação desta Lei, entende-se como inteligência a atividade
que objetiva a obtenção, análise e disseminação de conhecimentos dentro e fora do
território nacional sobre fatos e situações de imediata ou potencial influência sobre o
processo decisório e a ação governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da
sociedade e do Estado.
Embora a citada norma se destine ao processo de “obtenção, análise e disseminação da
informação necessária ao processo decisório do Poder Executivo, bem como pela salvaguarda
da informação contra o acesso de pessoas ou órgãos não autorizados”, termos do § 1º, o caput
do art. 2º, congrega os seus órgãos integrantes, verbis:
75
Art. 2º os órgãos e entidades da Administração Pública Federal que, direta ou
indiretamente, possam produzir conhecimentos de interesse das atividades de
inteligência, em especial aqueles responsáveis pela defesa externa, segurança interna
e relações exteriores, constituirão o Sistema Brasileiro de Inteligência, na forma de
ato do Presidente da República.
Esses órgãos e entidades estão relacionados no Decreto nº 4.376, de 13 de setembro de
2002, que modificado pelo Decreto 4.872, de 06 de novembro de 2003, passou o art. 4º a
contar com a seguinte redação:
Art. 4o O Sistema Brasileiro de Inteligência é composto pelos seguintes órgãos:
I - Casa Civil da Presidência da República, por meio do Centro Gestor e Operacional
do Sistema de Proteção da Amazônia - CENSIPAM;
II - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, órgão de
coordenação das atividades de inteligência federal;
III - Agência Brasileira de Inteligência - ABIN, do Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da República, como órgão central do Sistema;
IV - Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública, da
Diretoria de Inteligência Policial do Departamento de Polícia Federal, do
Departamento de Polícia Rodoviária Federal, do Departamento Penitenciário
Nacional e do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional, da Secretaria Nacional de Justiça;
V - Ministério da Defesa, por meio do Departamento de Inteligência Estratégica da
Secretaria de Política, Estratégia e Assuntos Internacionais, da Subchefia de
Inteligência do Estado-Maior de Defesa, do Estado-Maior da Armada, do Centro de
Inteligência da Marinha, do Centro de Inteligência do Exército e do Centro de
Inteligência da Aeronáutica;
VI - Ministério das Relações Exteriores, por meio da Coordenação-Geral de
Combate aos Ilícitos Transnacionais da Subsecretaria-Geral da América do Sul;
VII - Ministério da Fazenda, por meio da Secretaria-Executiva do Conselho de
Controle de Atividades Financeiras, da Secretaria da Receita Federal do Brasil e do
Banco Central do Brasil;
VIII - Ministério do Trabalho e Emprego, por meio da Secretaria-Executiva;
IX - Ministério da Saúde, por meio do Gabinete do Ministro de Estado e da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA;
X - Ministério da Previdência Social, por meio da Secretaria-Executiva;
XI - Ministério da Ciência e Tecnologia, por meio do Gabinete do Ministro de
Estado;
XII - Ministério do Meio Ambiente, por meio da Secretaria-Executiva; e
XIII - Ministério da Integração Nacional, por meio da Secretaria Nacional de Defesa
Civil.
XIV - Controladoria-Geral da União, por meio da Secretaria-Executiva.
Parágrafo único. Mediante ajustes específicos e convênios, ouvido o competente
órgão de controle externo da atividade de inteligência, as unidades da Federação
poderão compor o Sistema Brasileiro de Inteligência.
Esse artigo traz um rol extenso dos órgãos encarregados de alimentar o SISBIN, e
dentre esses encontramos a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), a Diretoria
de Inteligência Policial do Departamento de Polícia Federal (DIP/DPF), o Departamento de
Polícia Rodoviária Federal (DPRF), o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) e do
76
Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), da
Secretaria Nacional de Justiça (SNJ).
Os órgãos acima apontados possuem atuação ativa na investigação das OCrim(s) que
atuam no Brasil, o que já permitiria uma intensa troca de informações e dados de inteligência
incluindo os de evasão de divisas, de políticas e dados penitenciários, de inteligência policial
e de políticas nacionais de segurança pública.
As demais entidades reforçariam as informações necessárias para o emprego dos
instrumentos adequados de combate ao Crime Organizado no Brasil, atuando de forma
conjunta, como se formassem uma “Força-Tarefa”.
Reitera-se a cooperação entre os diversos órgãos e entidades públicas, com a elucidar
lição de Marcelo B. Mendroni (p.52), que discorre sobre a eficácia da “Força-Tarefa”:
Os grupos denominados task-force (força tarefa) são considerados pelos agentes
norte-americanos o melhor sistema para o efetivo combate às organizações
criminosas. Concebidos sob ideologia da mútua cooperação entre os diversos órgãos
de persecução detentores de atribuições variadas para a atuação na área penal,
reúnem-se e passam a trabalhar em conjunto, com unidades de atuação e de esforços,
com o direcionamento para a investigação, análise e iniciativa de medidas
coercitivas voltadas para o desmantelamento de estruturas criminosas, utilizando-se
dos mais variados instrumentos de investigação e mecanismos legais.
Portanto, o SISBIN fornece um excelente referencial para o emprego do sistema de
Força-Tarefa de combate ao Crime Organizado no Brasil.
Importa mencionar os institutos do sigilo nas investigações e o segredo de justiça, pois
são temas correlatos ao Combate ao Crime Organizado no Brasil que são amplamente
debatidos na doutrina nacional
31
e têm originado acalorada discussão nas recentes decisões
do Poder Judiciário nacional 32.
O sigilo nas investigações criminais se justifica pela necessidade de se preservar
informações cruciais, que ainda estão sob apuração, além de proteger a pessoa do investigado
dos possíveis prejuízos decorrentes da divulgação dos seus dados pessoais associados a uma
determinada prática delituosa.
A Constituição Federal de 1988 consagra e protege o direito à intimidade e à vida
privada das pessoas, como decorrente do próprio Estado democrático de Direito, prevendo,
em seu artigo 5º, inciso X, inserido no título dos direitos e garantias fundamentais, que “são
31
Podem-se mencionar, dentre várias obras nacionais que tratam do tema, às seguintes: - SAMPAIO, José
Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. 615 p.; - COSTA JR.,
Paulo José da. O direito de estar só: tutela penal da intimidade. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
128p.; e, - ARAÚJO, José Laércio. Intimidade, Vida Privada e Direito penal. São Paulo: Madras, 2000. 152 p.
32
77
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito
à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Porém, a investigação criminal busca a veracidade dos fatos ligados a ocorrência de
um determinado crime, possuindo inconteste caráter público, mormente quando ele atinge, de
forma gravosa, toda a coletividade que o circunscreve, às vezes com repercussões na esfera
internacional, como ocorre com os crimes de terrorismo, tráfico de pessoas, genocídio, tráfico
de drogas, praticados ou não por Organizações Criminosas, atingindo o âmago do Estado.
Apurar todos os fatos concernentes aos delitos cometidos e punir os seus infratores se
constitui como uma das principais obrigações do Estado, inclusive razão da sua própria
existência, pois esse visa à proteção dos cidadãos das ameaças externas e assegurar a ordem
interna, fundada nos direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
termos do próprio caput do artigo 5º, da Constituição Federal, o que fatalmente ocorreria se o
crime grassasse impunemente, sem uma eficaz investigação criminal escudada na liberdade
das autoridades públicas criminais.
Por outro lado, têm-se os Direitos à intimidade e à vida privada, como garantia
constitucional individual, e do outro, como limites a esse princípio, o Direito a liberdade
pública de acesso a informação, previsto no art. 5º, inciso XIV.
Desse impasse, Marcelo B. Mendroni faz uma sensata ponderação, com relação ao
sigilo dos dados bancários e fiscal, verbis:
De um lado, a necessidade de preservação da privacidade como garantia
constitucional. De outro, o direito à publicidade, também constitucional. E i que
pesa na balança do direito? Admito a minha dificuldade de entender a razão pela
qual os dados bancários e bens das declarações de Imposto de Renda devam estar
inseridos naqueles tais “sigilos da privacidade das pessoas” (2009, p. 173).
O segredo que envolve as operações empreendidas pelas OCrim(s) não pode ser
amparado pelo princípio à intimidade e à vida privada, sob pena de se proteger elementos
nocivos não só ao Estado mais a toda a sociedade.
3 SUGESTÕES PARA O COMBATE AO CRIME ORGANIZADO NO
BRASIL
Como se demonstrou, a atividade de inteligência exerce um importante papel para
o fornecimento de dados que subsidiarão a ação penal pertinente e que poderão ser reunidos
78
dentro do contexto de uma Força-Tarefa, se tornando instrumentos eficazes para o confronto
ao Crime Organizado no Brasil.
A legislação brasileira promove meios eficazes a esse combate, porém, de maneira
esparsa e, por certo, com as já citadas falhas.
Isto posto apresenta-se, a título de sugestões, o que se considera adequado:

Legislação moderna sem as falhas apontadas no PLS nº 150/2006;

Investimentos na compra de equipamentos de tecnologia de ponta (escuta
telefônica, ambiental e vigilância eletrônica, softwares de inteligência, etc.),
utilizando-se dos instrumentos de cooperação internacional e de convênios
com empresas de manutenção desses equipamentos;

O treinamento de policiais em técnicas de infiltração ou de agentes
infiltrados, fornecendo ampla cobertura de apoio por meio de outros agentes
infiltrados e de bases de operações fixas e móveis; e,

Talvez, a mais importante: A criação de várias forças-tarefas de combate ao
crime organizado, envolvendo tanto órgãos do Estado incumbidos da
persecução penal, como as entidades de fiscalização financeira (Banco
Central do Brasil – BACEN, Conselho de Controle de Atividades Financeiras
– COAF, Comissão de Valores Mobiliários – CVM etc.), que juntos,
congreguem todas as informações disponíveis no intuito de combater às
OCrim(s) (RUWEL, 2008).
79
CONCLUSÃO
Ao se concluir este trabalho, informa-se que a legislação relativa ao combate ao
crime organizado no Brasil, apesar de esparsa, cobre, com relativa efetividade, os meios legais
disponíveis de investigação e repressão.
Apresentou-se a gênese do crime organizado, como sendo os conceitos mais
importantes, partindo-se do estudo da sua evolução histórica e das suas basilares
características, importantes fontes para se conceituar o crime organizado, além da divisão das
suas estruturas com critérios extraídos das suas características.
Como ficou demonstrado, ao se discorrer sobre o Crime Organizado no Brasil e
tratar-se dos seus fundamentos, deve-se entender a dinâmica que envolve a prática das
diversas ações criminosas, derivadas da busca ilimitada pelo poder político e econômico, e
amplificadas pelo comércio multilateral surgido do fenômeno da globalização e amplificada
pelas políticas internacionais de abertura das fronteiras transnacionais.
A dinâmica das Organizações Criminosas e o seu caráter transnacional exigem um
constante aperfeiçoamento dos operadores do direto, notadamente dos órgãos policiais, e
neste contexto não se pode deixar de manifestar críticas a uma maior integração dos órgãos da
Segurança Pública envolvidos neste embate, com uma maior troca de informações e
experiências na área.
Confrontaram-se as normas e os meios efetivos de combate ao crime organizado.
Reclamou-se da falta de uma norma única, porém, manifestou-se a crítica ao PLS nº 150/2006
que, quando confrontado com a “Convenção de Palermo” – importante instituto de combate
ao crime organizado transnacional –, apresentou diversos conflitos, demonstrando que,
mesmo antes de entrar em vigor, já traz graves vícios.
Poder-se-ia citar tantos outros institutos e métodos utilizados no Combate ao
Crime Organizado no mundo, que, devidamente adaptados a nossa legislação penal e ao
modus operandi da criminalidade atuante no território nacional, seriam meios eficazes para
identificar os autores e a materialidade relacionada a estes fatos. Porém, o espaço desta
monografia não nos permite ir além, ademais, crê-se ter atingido todos objetivos.
Não obstante o Crime Organizado no Brasil possuir a capacidade de resiliência,
conforme ensina o Doutor Benjamin Lessing (2009, p. 43, 58), é primordial uma atuação
efetiva do Estado nas questões sociais, notadamente, nas áreas da educação, saúde, emprego e
moradia, reduzindo a miséria e a marginalização, e, por conseguinte, reduzindo o campo de
80
atuação das facções criminosas, que cooptam integrantes e fixam bases territoriais em
comunidades abandonadas pelo Estado.
Urge que o Estado adote medidas eficazes de combate ao Crime Organizado no
Brasil, utilizando-se do aprimoramento dos meios legais, para que não se propague o poder
político e econômico das OCrim(s), além da consequente degradação dos valores sociais
fundamentais – insculpidos na Liberdade, na Segurança e na Cidadania.
Falar-se-ia muito mais, porém, o espaço que comporta este trabalho é exíguo e
não nos permite ir além.
81
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766 p.
86
ANEXO A
NORMAS APLICÁVEIS AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
LEI Nº 9.034, DE 3 DE MAIO DE 1995 33
(Alterada pelas Leis nº 10.217, de 11.4.2001, e nº 9.303, de 5.9.1996)
Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para
a prevenção e repressão de ações praticadas por
organizações criminosas.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
Da Definição de Ação Praticada por Organizações Criminosas e dos Meios Operacionais de
Investigação e Prova
Art. 1º Esta Lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem
sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou
associações criminosas de qualquer tipo.
Art. 2º Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos
em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas:
I – (Vetado).
II – a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação
praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob observação
e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto
de vista da formação de provas e fornecimento de informações;
III – o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e eleitorais.
IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e
o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial;
33
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL: banco de dados. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 out. 2009.
87
V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação,
constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada autorização
judicial.
Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e permanecerá nesta
condição enquanto perdurar a infiltração.
CAPÍTULO II
Da Preservação do Sigilo Constitucional
Art. 3º Nas hipóteses do inciso III do art. 2º desta lei, ocorrendo possibilidade de violação de
sigilo preservado pela Constituição ou por lei, a diligência será realizada pessoalmente pelo
juiz, adotado o mais rigoroso segredo de justiça (Observar no STF, ADIN nº 1.570-2).
§ 1º Para realizar a diligência, o juiz poderá requisitar o auxílio de pessoas que, pela natureza
da função ou profissão, tenham ou possam ter acesso aos objetos do sigilo.
§ 2º O juiz, pessoalmente, fará lavrar auto circunstanciado da diligência, relatando as
informações colhidas oralmente e anexando cópias autênticas dos documentos que tiverem
relevância probatória, podendo para esse efeito, designar uma das pessoas referidas no
parágrafo anterior como escrivão ad hoc.
§ 3º O auto de diligência será conservado fora dos autos do processo, em lugar seguro, sem
intervenção de cartório ou servidor, somente podendo a ele ter acesso, na presença do juiz, as
partes legítimas na causa, que não poderão dele servir-se para fins estranhos à mesma, e estão
sujeitas às sanções previstas pelo Código Penal em caso de divulgação.
§ 4º Os argumentos de acusação e defesa que versarem sobre a diligência serão apresentados
em separado para serem anexados ao auto da diligência, que poderá servir como elemento na
formação da convicção final do juiz.
§ 5º Em caso de recurso, o auto da diligência será fechado, lacrado e endereçado em separado
ao juízo competente para revisão, que dele tomará conhecimento sem intervenção das
secretarias e gabinetes, devendo o relator dar vistas ao Ministério Público e ao Defensor em
recinto isolado, para o efeito de que a discussão e o julgamento sejam mantidos em absoluto
segredo de justiça.
88
CAPÍTULO III
Das Disposições Gerais
Art. 4º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão setores e equipes de policiais
especializados no combate à ação praticada por organizações criminosas.
Art. 5º A identificação criminal de pessoas envolvidas com a ação praticada por organizações
criminosas será realizada independentemente da identificação civil.
Art. 6º Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois
terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações
penais e sua autoria.
Art. 7º Não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham
tido intensa e efetiva participação na organização criminosa.
Art. 8º O prazo para encerramento da instrução criminal, nos processos por crime de que trata
esta Lei, será de 81 (oitenta e um) dias, quando o réu estiver preso, e de 120 (cento e vinte)
dias, quando solto.
Art. 9º O réu não poderá apelar em liberdade, nos crimes previstos nesta lei.
Art. 10 Os condenados por crime decorrentes de organização criminosa iniciarão o
cumprimento da pena em regime fechado.
Art. 11 Aplicam-se, no que não forem incompatíveis, subsidiariamente, as disposições do
Código de Processo Penal.
Art. 12 Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 13 Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 3 de maio de 1995; 174º da Independência e 107º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Milton Seligman
Publicado no DOU, de 4 de mai de 1995.
89
LEI Nº 9.613, DE 3 DE MARÇO DE 1998 34.
Dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação
de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização
do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta
Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades
Financeiras - COAF, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
Dos Crimes de "Lavagem" ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II – de terrorismo e seu financiamento;
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;
IV - de extorsão mediante seqüestro;
V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de
atos administrativos;
VI - contra o sistema financeiro nacional;
VII - praticado por organização criminosa.
VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira (arts. 337-B, 337-C
e 337-D do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal).
Pena: reclusão de três a dez anos e multa.
§ 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou
valores provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo:
I - os converte em ativos lícitos;
II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito,
movimenta ou transfere;
III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.
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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL: banco de dados. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 out. 2009.
90
§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores que sabe serem
provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo;
II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade
principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.
§ 3º A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código Penal.
§ 4º A pena será aumentada de um a dois terços, nos casos previstos nos incisos I a VI do
caput deste artigo, se o crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de
organização criminosa.
§ 5º A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprida em regime aberto,
podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos
que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens,
direitos ou valores objeto do crime.
CAPÍTULO II
Disposições Processuais Especiais
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes punidos com
reclusão, da competência do juiz singular;
II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo
anterior, ainda que praticados em outro país;
III - são da competência da Justiça Federal:
a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em
detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou
empresas públicas;
b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.
§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente,
sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor
daquele crime.
§ 2º No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Código
de Processo Penal.
91
Art. 3º Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e liberdade provisória e,
em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar
em liberdade.
Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou representação da autoridade
policial, ouvido o Ministério Público em vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes,
poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,
direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos crimes previstos nesta
Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de
1941 - Código de Processo Penal.
§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se a ação penal não for
iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da data em que ficar concluída a diligência.
§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores apreendidos ou seqüestrados
quando comprovada a licitude de sua origem.
§ 3º Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado,
podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou
valores, nos casos do art. 366 do Código de Processo Penal.
§ 4º A ordem de prisão de pessoas ou da apreensão ou seqüestro de bens, direitos ou valores,
poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata
possa comprometer as investigações.
Art. 5º Quando as circunstâncias o aconselharem, o juiz, ouvido o Ministério Público,
nomeará pessoa qualificada para a administração dos bens, direitos ou valores apreendidos ou
seqüestrados, mediante termo de compromisso.
Art. 6º O administrador dos bens:
I - fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz, que será satisfeita com o produto dos bens
objeto da administração;
II - prestará, por determinação judicial, informações periódicas da situação dos bens sob sua
administração, bem como explicações e detalhamentos sobre investimentos e reinvestimentos
realizados.
Parágrafo único. Os atos relativos à administração dos bens apreendidos ou seqüestrados
serão levados ao conhecimento do Ministério Público, que requererá o que entender cabível.
92
CAPÍTULO III
Dos Efeitos da Condenação
Art. 7º São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal:
I - a perda, em favor da União, dos bens, direitos e valores objeto de crime previsto nesta Lei,
ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
II - a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor, de
membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art.
9º, pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada.
CAPÍTULO IV
Dos Bens, Direitos ou Valores Oriundos de Crimes Praticados no Estrangeiro
Art. 8º O juiz determinará, na hipótese de existência de tratado ou convenção internacional e
por solicitação de autoridade estrangeira competente, a apreensão ou o seqüestro de bens,
direitos ou valores oriundos de crimes descritos no art. 1º, praticados no estrangeiro.
§ 1º Aplica-se o disposto neste artigo, independentemente de tratado ou convenção
internacional, quando o governo do país da autoridade solicitante prometer reciprocidade ao
Brasil.
§ 2º Na falta de tratado ou convenção, os bens, direitos ou valores apreendidos ou
seqüestrados por solicitação de autoridade estrangeira competente ou os recursos provenientes
da sua alienação serão repartidos entre o Estado requerente e o Brasil, na proporção de
metade, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé.
CAPÍTULO V
Das Pessoas Sujeitas À Lei
Art. 9º Sujeitam-se às obrigações referidas nos arts. 10 e 11 as pessoas jurídicas que tenham,
em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente
ou não:
I - a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda
nacional ou estrangeira;
II – a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo financeiro ou instrumento
cambial;
93
III - a custódia, emissão, distribuição, liqüidação, negociação, intermediação ou administração
de títulos ou valores mobiliários.
Parágrafo único. Sujeitam-se às mesmas obrigações:
I - as bolsas de valores e bolsas de mercadorias ou futuros;
II - as seguradoras, as corretoras de seguros e as entidades de previdência complementar ou de
capitalização;
III - as administradoras de cartões de credenciamento ou cartões de crédito, bem como as
administradoras de consórcios para aquisição de bens ou serviços;
IV - as administradoras ou empresas que se utilizem de cartão ou qualquer outro meio
eletrônico, magnético ou equivalente, que permita a transferência de fundos;
V - as empresas de arrendamento mercantil (leasing) e as de fomento comercial (factoring);
VI - as sociedades que efetuem distribuição de dinheiro ou quaisquer bens móveis, imóveis,
mercadorias, serviços, ou, ainda, concedam descontos na sua aquisição, mediante sorteio ou
método assemelhado;
VII - as filiais ou representações de entes estrangeiros que exerçam no Brasil qualquer das
atividades listadas neste artigo, ainda que de forma eventual;
VIII - as demais entidades cujo funcionamento dependa de autorização de órgão regulador dos
mercados financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros;
IX - as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, que operem no Brasil como
agentes, dirigentes, procuradoras, comissionárias ou por qualquer forma representem
interesses de ente estrangeiro que exerça qualquer das atividades referidas neste artigo;
X - as pessoas jurídicas que exerçam atividades de promoção imobiliária ou compra e venda
de imóveis;
XI - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem jóias, pedras e metais preciosos,
objetos de arte e antigüidades.
XII – as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de luxo ou de alto valor ou
exerçam atividades que envolvam grande volume de recursos em espécie.
CAPÍTULO VI
Da Identificação dos Clientes e Manutenção de Registros
Art. 10. As pessoas referidas no art. 9º:
I - identificarão seus clientes e manterão cadastro atualizado, nos termos de instruções
emanadas das autoridades competentes;
94
II - manterão registro de toda transação em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores
mobiliários, títulos de crédito, metais, ou qualquer ativo passível de ser convertido em
dinheiro, que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções
por esta expedidas;
III - deverão atender, no prazo fixado pelo órgão judicial competente, as requisições
formuladas pelo Conselho criado pelo art. 14, que se processarão em segredo de justiça.
§ 1º Na hipótese de o cliente constituir-se em pessoa jurídica, a identificação referida no
inciso I deste artigo deverá abranger as pessoas físicas autorizadas a representá-la, bem como
seus proprietários.
§ 2º Os cadastros e registros referidos nos incisos I e II deste artigo deverão ser conservados
durante o período mínimo de cinco anos a partir do encerramento da conta ou da conclusão da
transação, prazo este que poderá ser ampliado pela autoridade competente.
§ 3º O registro referido no inciso II deste artigo será efetuado também quando a pessoa física
ou jurídica, seus entes ligados, houver realizado, em um mesmo mês-calendário, operações
com uma mesma pessoa, conglomerado ou grupo que, em seu conjunto, ultrapassem o limite
fixado pela autoridade competente.
Art. 10A. O Banco Central manterá registro centralizado formando o cadastro geral de
correntistas e clientes de instituições financeiras, bem como de seus procuradores.
CAPÍTULO VII
Da Comunicação de Operações Financeiras
Art. 11. As pessoas referidas no art. 9º:
I - dispensarão especial atenção às operações que, nos termos de instruções emanadas das
autoridades competentes, possam constituir-se em sérios indícios dos crimes previstos nesta
Lei, ou com eles relacionar-se;
II - deverão comunicar, abstendo-se de dar aos clientes ciência de tal ato, no prazo de vinte e
quatro horas, às autoridades competentes:
a) todas as transações constantes do inciso II do art. 10 que ultrapassarem limite fixado, para
esse fim, pela mesma autoridade e na forma e condições por ela estabelecidas, devendo ser
juntada a identificação a que se refere o inciso I do mesmo artigo;
b) a proposta ou a realização de transação prevista no inciso I deste artigo.
§ 1º As autoridades competentes, nas instruções referidas no inciso I deste artigo, elaborarão
relação de operações que, por suas características, no que se refere às partes envolvidas,
95
valores, forma de realização, instrumentos utilizados, ou pela falta de fundamento econômico
ou legal, possam configurar a hipótese nele prevista.
§ 2º As comunicações de boa-fé, feitas na forma prevista neste artigo, não acarretarão
responsabilidade civil ou administrativa.
§ 3º As pessoas para as quais não exista órgão próprio fiscalizador ou regulador farão as
comunicações mencionadas neste artigo ao Conselho de Controle das Atividades Financeiras COAF e na forma por ele estabelecida.
CAPÍTULO VIII
Da Responsabilidade Administrativa
Art. 12. Às pessoas referidas no art. 9º, bem como aos administradores das pessoas jurídicas,
que deixem de cumprir as obrigações previstas nos arts. 10 e 11 serão aplicadas,
cumulativamente ou não, pelas autoridades competentes, as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa pecuniária variável, de um por cento até o dobro do valor da operação, ou até
duzentos por cento do lucro obtido ou que presumivelmente seria obtido pela realização da
operação, ou, ainda, multa de até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais);
III - inabilitação temporária, pelo prazo de até dez anos, para o exercício do cargo de
administrador das pessoas jurídicas referidas no art. 9º;
IV - cassação da autorização para operação ou funcionamento.
§ 1º A pena de advertência será aplicada por irregularidade no cumprimento das instruções
referidas nos incisos I e II do art. 10.
§ 2º A multa será aplicada sempre que as pessoas referidas no art. 9º, por negligência ou dolo:
I – deixarem de sanar as irregularidades objeto de advertência, no prazo assinalado pela
autoridade competente;
II – não realizarem a identificação ou o registro previstos nos incisos I e II do art. 10;
III - deixarem de atender, no prazo, a requisição formulada nos termos do inciso III do art. 10;
IV - descumprirem a vedação ou deixarem de fazer a comunicação a que se refere o art. 11.
§ 3º A inabilitação temporária será aplicada quando forem verificadas infrações graves quanto
ao cumprimento das obrigações constantes desta Lei ou quando ocorrer reincidência
específica, devidamente caracterizada em transgressões anteriormente punidas com multa.
§ 4º A cassação da autorização será aplicada nos casos de reincidência específica de infrações
anteriormente punidas com a pena prevista no inciso III do caput deste artigo.
96
Art. 13. O procedimento para a aplicação das sanções previstas neste Capítulo será regulado
por decreto, assegurados o contraditório e a ampla defesa.
CAPÍTULO IX
Do Conselho de Controle de Atividades Financeiras
Art. 14. É criado, no âmbito do Ministério da Fazenda, o Conselho de Controle de Atividades
Financeiras - COAF, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber,
examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem
prejuízo da competência de outros órgãos e entidades.
§ 1º As instruções referidas no art. 10 destinadas às pessoas mencionadas no art. 9º, para as
quais não exista órgão próprio fiscalizador ou regulador, serão expedidas pelo COAF,
competindo-lhe, para esses casos, a definição das pessoas abrangidas e a aplicação das
sanções enumeradas no art. 12.
§ 2º O COAF deverá, ainda, coordenar e propor mecanismos de cooperação e de troca de
informações que viabilizem ações rápidas e eficientes no combate à ocultação ou
dissimulação de bens, direitos e valores.
§ 3o O COAF poderá requerer aos órgãos da Administração Pública as informações cadastrais
bancárias e financeiras de pessoas envolvidas em atividades suspeitas.
Art. 15. O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos
procedimentos cabíveis, quando concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de
fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro ilícito.
Art. 16. O COAF será composto por servidores públicos de reputação ilibada e reconhecida
competência, designados em ato do Ministro de Estado da Fazenda, dentre os integrantes do
quadro de pessoal efetivo do Banco Central do Brasil, da Comissão de Valores Mobiliários,
da Superintendência de Seguros Privados, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da
Secretaria da Receita Federal, de órgão de inteligência do Poder Executivo, do Departamento
de Polícia Federal, do Ministério das Relações Exteriores e da Controladoria-Geral da União,
atendendo, nesses quatro últimos casos, à indicação dos respectivos Ministros de Estado.
§ 1º O Presidente do Conselho será nomeado pelo Presidente da República, por indicação do
Ministro de Estado da Fazenda.
§ 2º Das decisões do COAF relativas às aplicações de penas administrativas caberá recurso ao
Ministro de Estado da Fazenda.
97
Art. 17. O COAF terá organização e funcionamento definidos em estatuto aprovado por
decreto do Poder Executivo.
Art. 18. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 3 de março de 1998; 177º da Independência e 110º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Iris Rezende
Luiz Felipe Lampreia
Pedro Malan
Este texto não substitui o publicado no DOU de 4.3.1998.
98
DECRETO Nº 5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004 35.
Promulga a Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso
IV, da Constituição, e Considerando que o Congresso Nacional aprovou, por meio do Decreto
Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, o texto da Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional, adotada em Nova York, em 15 de novembro de 2000;
Considerando que o Governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação junto à
Secretaria-Geral da ONU, em 29 de janeiro de 2004; Considerando que a Convenção entrou
em vigor internacional, em 29 de setembro de 2003, e entrou em vigor para o Brasil, em 28 de
fevereiro de 2004; DECRETA:
Art. 1o A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, adotada
em Nova York, em 15 de novembro de 2000, apensa por cópia ao presente Decreto, será
executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém.
Art. 2o São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam resultar
em revisão da referida Convenção ou que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao
patrimônio nacional, nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição.
Art. 3o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 12 de março de 2004; 183o da Independência e 116o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Samuel Pinheiro Guimarães Neto
Este texto não substitui o publicado no DOU de 15.3.2004.
CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL
Artigo 1
Objetivo
35
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL: banco de dados. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 out. 2009.
99
O objetivo da presente Convenção consiste em promover a cooperação para prevenir e
combater mais eficazmente a criminalidade organizada transnacional.
Artigo 2
Terminologia
Para efeitos da presente Convenção, entende-se por:
a) "Grupo criminoso organizado" - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há
algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações
graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou
indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material;
b) "Infração grave" - ato que constitua infração punível com uma pena de privação de
liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena superior;
c) "Grupo estruturado" - grupo formado de maneira não fortuita para a prática imediata de
uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções formalmente definidas, que
não haja continuidade na sua composição e que não disponha de uma estrutura elaborada;
d) "Bens" - os ativos de qualquer tipo, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis,
tangíveis ou intangíveis, e os documentos ou instrumentos jurídicos que atestem a propriedade
ou outros direitos sobre os referidos ativos;
e) "Produto do crime" - os bens de qualquer tipo, provenientes, direta ou indiretamente, da
prática de um crime;
f) "Bloqueio" ou "apreensão" - a proibição temporária de transferir, converter, dispor ou
movimentar bens, ou a custódia ou controle temporário de bens, por decisão de um tribunal ou
de outra autoridade competente;
g) "Confisco" - a privação com caráter definitivo de bens, por decisão de um tribunal ou outra
autoridade competente;
h) "Infração principal" - qualquer infração de que derive um produto que possa passar a
constituir objeto de uma infração definida no Artigo 6 da presente Convenção;
i) "Entrega vigiada" - a técnica que consiste em permitir que remessas ilícitas ou suspeitas
saiam do território de um ou mais Estados, os atravessem ou neles entrem, com o
conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com a finalidade de
investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua prática;
j) "Organização regional de integração econômica" - uma organização constituída por Estados
soberanos de uma região determinada, para a qual estes Estados tenham transferido
competências nas questões reguladas pela presente Convenção e que tenha sido devidamente
mandatada, em conformidade com os seus procedimentos internos, para assinar, ratificar,
100
aceitar ou aprovar a Convenção ou a ela aderir; as referências aos "Estados Partes" constantes
da presente Convenção são aplicáveis a estas organizações, nos limites das suas
competências.
Artigo 3
Âmbito de aplicação
1. Salvo disposição em contrário, a presente Convenção é aplicável à prevenção, investigação,
instrução e julgamento de:
a) Infrações enunciadas nos Artigos 5, 6, 8 e 23 da presente Convenção; e
b) Infrações graves, na acepção do Artigo 2 da presente Convenção;
sempre que tais infrações sejam de caráter transnacional e envolvam um grupo criminoso
organizado;
2. Para efeitos do parágrafo 1 do presente Artigo, a infração será de caráter transnacional se:
a) For cometida em mais de um Estado;
b) For cometida num só Estado, mas uma parte substancial da sua preparação, planeamento
[Sic. – planejamento], direção e controle tenha lugar em outro Estado;
c) For cometida num só Estado, mas envolva a participação de um grupo criminoso
organizado que pratique atividades criminosas em mais de um Estado; ou
d) For cometida num só Estado, mas produza efeitos substanciais noutro Estado.
Artigo 4
Proteção da soberania
1. Os Estados Partes cumprirão as suas obrigações decorrentes da presente Convenção no
respeito pelos princípios da igualdade soberana e da integridade territorial dos Estados, bem
como da não-ingerência nos assuntos internos de outros Estados.
2. O disposto na presente Convenção não autoriza qualquer Estado Parte a exercer, em
território de outro Estado, jurisdição ou funções que o direito interno desse Estado reserve
exclusivamente às suas autoridades.
Artigo 5
Criminalização da participação em um grupo criminoso organizado
1. Cada Estado Parte adotará as medidas legislativas ou outras que sejam necessárias para
caracterizar como infração penal, quando praticado intencionalmente:
a) Um dos atos seguintes, ou ambos, enquanto infrações penais distintas das que impliquem a
tentativa ou a consumação da atividade criminosa:
i) O entendimento com uma ou mais pessoas para a prática de uma infração grave, com uma
intenção direta ou indiretamente relacionada com a obtenção de um benefício econômico ou
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outro benefício material e, quando assim prescrever o direito interno, envolvendo um ato
praticado por um dos participantes para concretizar o que foi acordado ou envolvendo a
participação de um grupo criminoso organizado;
ii) A conduta de qualquer pessoa que, conhecendo a finalidade e a atividade criminosa geral
de um grupo criminoso organizado, ou a sua intenção de cometer as infrações em questão,
participe ativamente em:
a. Atividades ilícitas do grupo criminoso organizado;
b. Outras atividades do grupo criminoso organizado, sabendo que a sua participação
contribuirá para a finalidade criminosa acima referida;
b) O ato de organizar, dirigir, ajudar, incitar, facilitar ou aconselhar a prática de uma infração
grave que envolva a participação de um grupo criminoso organizado.
2. O conhecimento, a intenção, a finalidade, a motivação ou o acordo a que se refere o
parágrafo 1 do presente Artigo poderão inferir-se de circunstâncias factuais objetivas.
3. Os Estados Partes cujo direito interno condicione a incriminação pelas infrações referidas
no inciso i) da alínea a) do parágrafo 1 do presente Artigo ao envolvimento de um grupo
criminoso organizado diligenciarão no sentido de que o seu direito interno abranja todas as
infrações graves que envolvam a participação de grupos criminosos organizados. Estes
Estados Partes, assim como os Estados Partes cujo direito interno condicione a incriminação
pelas infrações definidas no inciso i) da alínea a) do parágrafo 1 do presente Artigo à prática
de um ato concertado, informarão deste fato o Secretário Geral da Organização das Nações
Unidas, no momento da assinatura ou do depósito do seu instrumento de ratificação,
aceitação, aprovação ou adesão à presente Convenção.
Artigo 6
Criminalização da lavagem do produto do crime
1. Cada Estado Parte adotará, em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito
interno, as medidas legislativas ou outras que sejam necessárias para caracterizar como
infração penal, quando praticada intencionalmente:
a) i) A conversão ou transferência de bens, quando quem o faz tem conhecimento de que esses
bens são produto do crime, com o propósito de ocultar ou dissimular a origem ilícita dos bens
ou ajudar qualquer pessoa envolvida na prática da infração principal a furtar-se às
conseqüências jurídicas dos seus atos;
ii) A ocultação ou dissimulação da verdadeira natureza, origem, localização, disposição,
movimentação ou propriedade de bens ou direitos a eles relativos, sabendo o seu autor que os
ditos bens são produto do crime;
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b) e, sob reserva dos conceitos fundamentais do seu ordenamento jurídico:
i) A aquisição, posse ou utilização de bens, sabendo aquele que os adquire, possui ou utiliza,
no momento da recepção, que são produto do crime;
ii) A participação na prática de uma das infrações enunciadas no presente Artigo, assim como
qualquer forma de associação, acordo, tentativa ou cumplicidade, pela prestação de
assistência, ajuda ou aconselhamento no sentido da sua prática.
2. Para efeitos da aplicação do parágrafo 1 do presente Artigo:
a) Cada Estado Parte procurará aplicar o parágrafo 1 do presente Artigo à mais ampla gama
possível de infrações principais;
b) Cada Estado Parte considerará como infrações principais todas as infrações graves, na
acepção do Artigo 2 da presente Convenção, e as infrações enunciadas nos seus Artigos 5, 8 e
23. Os Estados Partes cuja legislação estabeleça uma lista de infrações principais específicas
incluirá entre estas, pelo menos, uma gama completa de infrações relacionadas com grupos
criminosos organizados;
c) Para efeitos da alínea b), as infrações principais incluirão as infrações cometidas tanto
dentro como fora da jurisdição do Estado Parte interessado. No entanto, as infrações
cometidas fora da jurisdição de um Estado Parte só constituirão infração principal quando o
ato correspondente constitua infração penal à luz do direito interno do Estado em que tenha
sido praticado e constitua infração penal à luz do direito interno do Estado Parte que aplique o
presente Artigo se o crime aí tivesse sido cometido;
d) Cada Estado Parte fornecerá ao Secretário Geral das Nações Unidas uma cópia ou
descrição das suas leis destinadas a dar aplicação ao presente Artigo e de qualquer alteração
posterior;
e) Se assim o exigirem os princípios fundamentais do direito interno de um Estado Parte,
poderá estabelecer-se que as infrações enunciadas no parágrafo 1 do presente Artigo não
sejam aplicáveis às pessoas que tenham cometido a infração principal;
f) O conhecimento, a intenção ou a motivação, enquanto elementos constitutivos de uma
infração enunciada no parágrafo 1 do presente Artigo, poderão inferir-se de circunstâncias
fatuais objetivas.
Artigo 7
Medidas para combater a lavagem de dinheiro
1. Cada Estado Parte:
a) Instituirá um regime interno completo de regulamentação e controle dos bancos e
instituições financeiras não bancárias e, quando se justifique, de outros organismos
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especialmente susceptíveis de ser utilizados para a lavagem de dinheiro, dentro dos limites da
sua competência, a fim de prevenir e detectar qualquer forma de lavagem de dinheiro, sendo
nesse regime enfatizados os requisitos relativos à identificação do cliente, ao registro das
operações e à denúncia de operações suspeitas;
b) Garantirá, sem prejuízo da aplicação dos Artigos 18 e 27 da presente Convenção, que as
autoridades responsáveis pela administração, regulamentação, detecção e repressão e outras
autoridades responsáveis pelo combate à lavagem de dinheiro (incluindo, quando tal esteja
previsto no seu direito interno, as autoridades judiciais), tenham a capacidade de cooperar e
trocar informações em âmbito nacional e internacional, em conformidade com as condições
prescritas no direito interno, e, para esse fim, considerará a possibilidade de criar um serviço
de informação financeira que funcione como centro nacional de coleta, análise e difusão de
informação relativa a eventuais atividades de lavagem de dinheiro.
2. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de aplicar medidas viáveis para detectar e
vigiar o movimento transfronteiriço de numerário e de títulos negociáveis, no respeito pelas
garantias relativas à legítima utilização da informação e sem, por qualquer forma, restringir a
circulação de capitais lícitos. Estas medidas poderão incluir a exigência de que os particulares
e as entidades comerciais notifiquem as transferências transfronteiriças de quantias elevadas
em numerário e títulos negociáveis.
3. Ao instituírem, nos termos do presente Artigo, um regime interno de regulamentação e
controle, e sem prejuízo do disposto em qualquer outro artigo da presente Convenção, todos
os Estados Partes são instados a utilizar como orientação as iniciativas pertinentes tomadas
pelas organizações regionais, inter-regionais e multilaterais para combater a lavagem de
dinheiro.
4. Os Estados Partes diligenciarão no sentido de desenvolver e promover a cooperação à
escala mundial, regional, sub-regional e bilateral entre as autoridades judiciais, os organismos
de detecção e repressão e as autoridades de regulamentação financeira, a fim de combater a
lavagem de dinheiro.
Artigo 8
Criminalização da corrupção
1. Cada Estado Parte adotará as medidas legislativas e outras que sejam necessárias para
caracterizar como infrações penais os seguintes atos, quando intencionalmente cometidos:
a) Prometer, oferecer ou conceder a um agente público, direta ou indiretamente, um benefício
indevido, em seu proveito próprio ou de outra pessoa ou entidade, a fim de praticar ou se
abster de praticar um ato no desempenho das suas funções oficiais;
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b) Por um agente público, pedir ou aceitar, direta ou indiretamente, um benefício indevido,
para si ou para outra pessoa ou entidade, a fim de praticar ou se abster de praticar um ato no
desempenho das suas funções oficiais.
2. Cada Estado Parte considerará a possibilidade de adotar as medidas legislativas ou outras
que sejam necessárias para conferir o caráter de infração penal aos atos enunciados no
parágrafo 1 do presente Artigo que envolvam um agente público estrangeiro ou um
funcionário internacional. Do mesmo modo, cada Estado Parte considerará a possibilidade de
conferir o caráter de infração penal a outras formas de corrupção.
3. Cada Estado Parte adotará igualmente as medidas necessárias para conferir o caráter de
infração penal à cumplicidade na prática de uma infração enunciada no presente Artigo.
4. Para efeitos do parágrafo 1 do presente Artigo e do Artigo 9, a expressão "agente público"
designa, além do funcionário público, qualquer pessoa que preste um serviço público, tal
como a expressão é definida no direito interno e aplicada no direito penal do Estado Parte
onde a pessoa em questão exerce as suas funções.
Artigo 9
Medidas contra a corrupção
1. Para além das medidas enunciadas no Artigo 8 da presente Convenção, cada Estado Parte,
na medida em que seja procedente e conforme ao seu ordenamento jurídico, adotará medidas
eficazes de ordem legislativa, administrativa ou outra para promover a integridade e prevenir,
detectar e punir a corrupção dos agentes públicos.
2. Cada Estado Parte tomará medidas no sentido de se assegurar de que as suas autoridades
atuam eficazmente em matéria de prevenção, detecção e repressão da corrupção de agentes
públicos, inclusivamente conferindo a essas autoridades independência suficiente para
impedir qualquer influência indevida sobre a sua atuação.
Artigo 10
Responsabilidade das pessoas jurídicas
1. Cada Estado Parte adotará as medidas necessárias, em conformidade com o seu
ordenamento jurídico, para responsabilizar pessoas jurídicas que participem em infrações
graves envolvendo um grupo criminoso organizado e que cometam as infrações enunciadas
nos Artigos 5, 6, 8 e 23 da presente Convenção.
2. No respeito pelo ordenamento jurídico do Estado Parte, a responsabilidade das pessoas
jurídicas poderá ser penal, civil ou administrativa.
3. A responsabilidade das pessoas jurídicas não obstará à responsabilidade penal das pessoas
físicas que tenham cometido as infrações.
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4. Cada Estado Parte diligenciará, em especial, no sentido de que as pessoas jurídicas
consideradas responsáveis em conformidade com o presente Artigo sejam objeto de sanções
eficazes, proporcionais e acautelatórias, de natureza penal e não penal, incluindo sanções
pecuniárias.
Artigo 11
Processos judiciais, julgamento e sanções
1. Cada Estado Parte tornará a prática de qualquer infração enunciada nos Artigos 5, 6, 8 e 23
da presente Convenção passível de sanções que tenham em conta a gravidade dessa infração.
2. Cada Estado Parte diligenciará para que qualquer poder judicial discricionário conferido
pelo seu direito interno e relativo a processos judiciais contra indivíduos por infrações
previstas na presente Convenção seja exercido de forma a otimizar a eficácia das medidas de
detecção e de repressão destas infrações, tendo na devida conta a necessidade de exercer um
efeito cautelar da sua prática.
3. No caso de infrações como as enunciadas nos Artigos 5, 6, 8 e 23 da presente Convenção,
cada Estado Parte tomará as medidas apropriadas, em conformidade com o seu direito interno,
e tendo na devida conta os direitos da defesa, para que as condições a que estão sujeitas as
decisões de aguardar julgamento em liberdade ou relativas ao processo de recurso tenham em
consideração a necessidade de assegurar a presença do argüido em todo o processo penal
ulterior.
4. Cada Estado Parte providenciará para que os seus tribunais ou outras autoridades
competentes tenham presente a gravidade das infração previstas na presente Convenção
quando considerarem a possibilidade de uma libertação antecipada ou condicional de pessoas
reconhecidas como culpadas dessas infrações.
5. Sempre que as circunstâncias o justifiquem, cada Estado Parte determinará, no âmbito do
seu direito interno, um prazo de prescrição prolongado, durante o qual poderá ter início o
processo relativo a uma das infrações previstas na presente Convenção, devendo esse período
ser mais longo quando o presumível autor da infração se tenha subtraído à justiça.
6. Nenhuma das disposições da presente Convenção prejudica o princípio segundo o qual a
definição das infrações nela enunciadas e dos meios jurídicos de defesa aplicáveis, bem como
outros princípios jurídicos que rejam a legalidade das incriminações, são do foro exclusivo do
direito interno desse Estado Parte, e segundo o qual as referidas infrações são objeto de
procedimento judicial e punidas de acordo com o direito desse Estado Parte.
Artigo 12
Confisco e apreensão
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1. Os Estados Partes adotarão, na medida em que o seu ordenamento jurídico interno o
permita, as medidas necessárias para permitir o confisco:
a) Do produto das infrações previstas na presente Convenção ou de bens cujo valor
corresponda ao desse produto;
b) Dos bens, equipamentos e outros instrumentos utilizados ou destinados a ser utilizados na
prática das infrações previstas na presente Convenção.
2. Os Estados Partes tomarão as medidas necessárias para permitir a identificação, a
localização, o embargo ou a apreensão dos bens referidos no parágrafo 1 do presente Artigo,
para efeitos de eventual confisco.
3. Se o produto do crime tiver sido convertido, total ou parcialmente, noutros bens, estes
últimos podem ser objeto das medidas previstas no presente Artigo, em substituição do
referido produto.
4. Se o produto do crime tiver sido misturado com bens adquiridos legalmente, estes bens
poderão, sem prejuízo das competências de embargo ou apreensão, ser confiscados até ao
valor calculado do produto com que foram misturados.
5. As receitas ou outros benefícios obtidos com o produto do crime, os bens nos quais o
produto tenha sido transformado ou convertido ou os bens com que tenha sido misturado
podem também ser objeto das medidas previstas no presente Artigo, da mesma forma e na
mesma medida que o produto do crime.
6. Para efeitos do presente Artigo e do Artigo 13, cada Estado Parte habilitará os seus
tribunais ou outras autoridades competentes para ordenarem a apresentação ou a apreensão de
documentos bancários, financeiros ou comerciais. Os Estados Partes não poderão invocar o
sigilo bancário para se recusarem a aplicar as disposições do presente número.
7. Os Estados Partes poderão considerar a possibilidade de exigir que o autor de uma infração
demonstre a proveniência lícita do presumido produto do crime ou de outros bens que possam
ser objeto de confisco, na medida em que esta exigência esteja em conformidade com os
princípios do seu direito interno e com a natureza do processo ou outros procedimentos
judiciais.
8. As disposições do presente Artigo não deverão, em circunstância alguma, ser interpretadas
de modo a afetar os direitos de terceiros de boa fé.
9. Nenhuma das disposições do presente Artigo prejudica o princípio segundo o qual as
medidas nele previstas são definidas e aplicadas em conformidade com o direito interno de
cada Estado Parte e segundo as disposições deste direito.
Artigo 13
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Cooperação internacional para efeitos de confisco
1. Na medida em que o seu ordenamento jurídico interno o permita, um Estado Parte que
tenha recebido de outro Estado Parte, competente para conhecer de uma infração prevista na
presente Convenção, um pedido de confisco do produto do crime, bens, equipamentos ou
outros instrumentos referidos no parágrafo 1 do Artigo 12 da presente Convenção que se
encontrem no seu território, deverá:
a) Submeter o pedido às suas autoridades competentes, a fim de obter uma ordem de confisco
e, se essa ordem for emitida, executá-la; ou
b) Submeter às suas autoridades competentes, para que seja executada conforme o solicitado,
a decisão de confisco emitida por um tribunal situado no território do Estado Parte requerente,
em conformidade com o parágrafo 1 do Artigo 12 da presente Convenção, em relação ao
produto do crime, bens, equipamentos ou outros instrumentos referidos no parágrafo 1 do
Artigo 12 que se encontrem no território do Estado Parte requerido.
2. Quando um pedido for feito por outro Estado Parte competente para conhecer de uma
infração prevista na presente Convenção, o Estado Parte requerido tomará medidas para
identificar, localizar, embargar ou apreender o produto do crime, os bens, os equipamentos ou
os outros instrumentos referidos no parágrafo 1 do Artigo 12 da presente Convenção, com
vista a um eventual confisco que venha a ser ordenado, seja pelo Estado Parte requerente,
seja, na seqüência de um pedido formulado ao abrigo do parágrafo 1 do presente Artigo, pelo
Estado Parte requerido.
3. As disposições do Artigo 18 da presente Convenção aplicam-se mutatis mutandis ao
presente Artigo. Para além das informações referidas no parágrafo 15 do Artigo 18, os
pedidos feitos em conformidade com o presente Artigo deverão conter:
a) Quando o pedido for feito ao abrigo da alínea a) do parágrafo 1 do presente Artigo, uma
descrição dos bens a confiscar e uma exposição dos fatos em que o Estado Parte requerente se
baseia, que permita ao Estado Parte requerido obter uma decisão de confisco em
conformidade com o seu direito interno;
b) Quando o pedido for feito ao abrigo da alínea b) do parágrafo 1 do presente Artigo, uma
cópia legalmente admissível da decisão de confisco emitida pelo Estado Parte requerente em
que se baseia o pedido, uma exposição dos fatos e informações sobre os limites em que é
pedida a execução da decisão;
c) Quando o pedido for feito ao abrigo do parágrafo 2 do presente Artigo, uma exposição dos
fatos em que se baseia o Estado Parte requerente e uma descrição das medidas pedidas.
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4. As decisões ou medidas previstas nos parágrafo 1 e parágrafo 2 do presente Artigo são
tomadas pelo Estado Parte requerido em conformidade com o seu direito interno e segundo as
disposições do mesmo direito, e em conformidade com as suas regras processuais ou com
qualquer tratado, acordo ou protocolo bilateral ou multilateral que o ligue ao Estado Parte
requerente.
5. Cada Estado Parte enviará ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas uma
cópia das suas leis e regulamentos destinados a dar aplicação ao presente Artigo, bem como
uma cópia de qualquer alteração ulteriormente introduzida a estas leis e regulamentos ou uma
descrição destas leis, regulamentos e alterações ulteriores.
6. Se um Estado Parte decidir condicionar a adoção das medidas previstas nos parágrafos 1 e
2 do presente Artigo à existência de um tratado na matéria, deverá considerar a presente
Convenção como uma base jurídica necessária e suficiente para o efeito.
7. Um Estado Parte poderá recusar a cooperação que lhe é solicitada ao abrigo do presente
Artigo, caso a infração a que se refere o pedido não seja abrangida pela presente Convenção.
8. As disposições do presente Artigo não deverão, em circunstância alguma, ser interpretadas
de modo a afetar os direitos de terceiros de boa fé.
9. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de celebrar tratados, acordos ou protocolos
bilaterais ou multilaterais com o objetivo de reforçar a eficácia da cooperação internacional
desenvolvida para efeitos do presente Artigo.
Artigo 14
Disposição do produto do crime ou dos bens confiscados
1. Um Estado Parte que confisque o produto do crime ou bens, em aplicação do Artigo 12 ou
do parágrafo 1 do Artigo 13 da presente Convenção, disporá deles de acordo com o seu direito
interno e os seus procedimentos administrativos.
2. Quando os Estados Partes agirem a pedido de outro Estado Parte em aplicação do Artigo 13
da presente Convenção, deverão, na medida em que o permita o seu direito interno e se tal
lhes for solicitado, considerar prioritariamente a restituição do produto do crime ou dos bens
confiscados ao Estado Parte requerente, para que este último possa indenizar as vítimas da
infração ou restituir este produto do crime ou estes bens aos seus legítimos proprietários.
3. Quando um Estado Parte atuar a pedido de um outro Estado Parte em aplicação dos Artigos
12 e 13 da presente Convenção, poderá considerar especialmente a celebração de acordos ou
protocolos que prevejam:
a) Destinar o valor deste produto ou destes bens, ou os fundos provenientes da sua venda, ou
uma parte destes fundos, à conta criada em aplicação da alínea c) do parágrafo 2 do Artigo 30
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da presente Convenção e a organismos intergovernamentais especializados na luta contra a
criminalidade organizada;
b) Repartir com outros Estados Partes, sistemática ou casuisticamente, este produto ou estes
bens, ou os fundos provenientes da respectiva venda, em conformidade com o seu direito
interno ou os seus procedimentos administrativos.
Artigo 15
Jurisdição
1. Cada Estado Parte adotará as medidas necessárias para estabelecer a sua competência
jurisdicional em relação às infrações enunciadas nos Artigos 5, 6, 8 e 23 da presente
Convenção, nos seguintes casos:
a) Quando a infração for cometida no seu território; ou
b) Quando a infração for cometida a bordo de um navio que arvore a sua bandeira ou a bordo
de uma aeronave matriculada em conformidade com o seu direito interno no momento em que
a referida infração for cometida.
2. Sem prejuízo do disposto no Artigo 4 da presente Convenção, um Estado Parte poderá
igualmente estabelecer a sua competência jurisdicional em relação a qualquer destas
infrações, nos seguintes casos:
a) Quando a infração for cometida contra um dos seus cidadãos;
b) Quando a infração for cometida por um dos seus cidadãos ou por uma pessoa apátrida
residente habitualmente no seu território; ou
c) Quando a infração for:
i) Uma das previstas no parágrafo 1 do Artigo 5 da presente Convenção e praticada fora do
seu território, com a intenção de cometer uma infração grave no seu território;
ii) Uma das previstas no inciso ii) da alínea b) do parágrafo 1 do Artigo 6 da presente
Convenção e praticada fora do seu território com a intenção de cometer, no seu território, uma
das infrações enunciadas nos incisos i) ou ii) da alínea a) ou i) da alínea b) do parágrafo 1 do
Artigo 6 da presente Convenção.
3. Para efeitos do parágrafo 10 do Artigo 16 da presente Convenção, cada Estado Parte
adotará as medidas necessárias para estabelecer a sua competência jurisdicional em relação às
infrações abrangidas pela presente Convenção quando o presumível autor se encontre no seu
território e o Estado Parte não o extraditar pela única razão de se tratar de um seu cidadão.
4. Cada Estado Parte poderá igualmente adotar as medidas necessárias para estabelecer a sua
competência jurisdicional em relação às infrações abrangidas pela presente Convenção
quando o presumível autor se encontre no seu território e o Estado Parte não o extraditar.
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5. Se um Estado Parte que exerça a sua competência jurisdicional por força dos parágrafos 1 e
2 do presente Artigo tiver sido notificado, ou por qualquer outra forma tiver tomado
conhecimento, de que um ou vários Estados Partes estão a efetuar uma investigação ou
iniciaram diligências ou um processo judicial tendo por objeto o mesmo ato, as autoridades
competentes destes Estados Partes deverão consultar-se, da forma que for mais conveniente,
para coordenar as suas ações.
6. Sem prejuízo das normas do direito internacional geral, a presente Convenção não excluirá
o exercício de qualquer competência jurisdicional penal estabelecida por um Estado Parte em
conformidade com o seu direito interno.
Artigo 16
Extradição
1. O presente Artigo aplica-se às infrações abrangidas pela presente Convenção ou nos casos
em que um grupo criminoso organizado esteja implicado numa infração prevista nas alíneas a)
ou b) do parágrafo 1 do Artigo 3 e em que a pessoa que é objeto do pedido de extradição se
encontre no Estado Parte requerido, desde que a infração pela qual é pedida a extradição seja
punível pelo direito interno do Estado Parte requerente e do Estado Parte requerido.
2. Se o pedido de extradição for motivado por várias infrações graves distintas, algumas das
quais não se encontrem previstas no presente Artigo, o Estado Parte requerido pode
igualmente aplicar o presente Artigo às referidas infrações.
3. Cada uma das infrações às quais se aplica o presente Artigo será considerada incluída, de
pleno direito, entre as infrações que dão lugar a extradição em qualquer tratado de extradição
em vigor entre os Estados Partes. Os Estados Partes comprometem-se a incluir estas infrações
entre aquelas cujo autor pode ser extraditado em qualquer tratado de extradição que celebrem
entre si.
4. Se um Estado Parte que condicione a extradição à existência de um tratado receber um
pedido de extradição de um Estado Parte com o qual não celebrou tal tratado, poderá
considerar a presente Convenção como fundamento jurídico da extradição quanto às infrações
a que se aplique o presente Artigo.
5. Os Estados Partes que condicionem a extradição à existência de um tratado:
a) No momento do depósito do seu instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão
à presente Convenção, indicarão ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas se
consideram a presente Convenção como fundamento jurídico para a cooperação com outros
Estados Partes em matéria de extradição; e
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b) Se não considerarem a presente Convenção como fundamento jurídico para cooperar em
matéria de extradição, diligenciarão, se necessário, pela celebração de tratados de extradição
com outros Estados Partes, a fim de darem aplicação ao presente Artigo.
6. Os Estados Partes que não condicionem a extradição à existência de um tratado
reconhecerão entre si, às infrações às quais se aplica o presente Artigo, o caráter de infração
cujo autor pode ser extraditado.
7. A extradição estará sujeita às condições previstas no direito interno do Estado Parte
requerido ou em tratados de extradição aplicáveis, incluindo, nomeadamente, condições
relativas à pena mínima requerida para uma extradição e aos motivos pelos quais o Estado
Parte requerido pode recusar a extradição.
8. Os Estados Partes procurarão, sem prejuízo do seu direito interno, acelerar os processos de
extradição e simplificar os requisitos em matéria de prova com eles relacionados, no que se
refere às infrações a que se aplica o presente Artigo.
9. Sem prejuízo do disposto no seu direito interno e nos tratados de extradição que tenha
celebrado, o Estado Parte requerido poderá, a pedido do Estado Parte requerente, se
considerar que as circunstâncias o justificam e que existe urgência, colocar em detenção uma
pessoa, presente no seu território, cuja extradição é pedida, ou adotar a seu respeito quaisquer
outras medidas apropriadas para assegurar a sua presença no processo de extradição.
10. Um Estado Parte em cujo território se encontre o presumível autor da infração, se não
extraditar esta pessoa a título de uma infração à qual se aplica o presente Artigo pelo único
motivo de se tratar de um seu cidadão, deverá, a pedido do Estado Parte requerente da
extradição, submeter o caso, sem demora excessiva, às suas autoridades competentes para
efeitos de procedimento judicial. Estas autoridades tomarão a sua decisão e seguirão os
trâmites do processo da mesma forma que em relação a qualquer outra infração grave, à luz
do direito interno deste Estado Parte. Os Estados Partes interessados cooperarão entre si,
nomeadamente em matéria processual e probatória, para assegurar a eficácia dos referidos
atos judiciais.
11. Quando um Estado Parte, por força do seu direito interno, só estiver autorizado a
extraditar ou, por qualquer outra forma, entregar um dos seus cidadãos na condição de que
essa pessoa retorne seguidamente ao mesmo Estado Parte para cumprir a pena a que tenha
sido condenada na seqüência do processo ou do procedimento que originou o pedido de
extradição ou de entrega, e quando este Estado Parte e o Estado Parte requerente concordarem
em relação a essa opção e a outras condições que considerem apropriadas, a extradição ou
112
entrega condicional será suficiente para dar cumprimento à obrigação enunciada no parágrafo
10 do presente Artigo.
12. Se a extradição, pedida para efeitos de execução de uma pena, for recusada porque a
pessoa que é objeto deste pedido é um cidadão do Estado Parte requerido, este, se o seu
direito interno o permitir, em conformidade com as prescrições deste direito e a pedido do
Estado Parte requerente, considerará a possibilidade de dar execução à pena que foi aplicada
em conformidade com o direito do Estado Parte requerente ou ao que dessa pena faltar
cumprir.
13. Qualquer pessoa que seja objeto de um processo devido a qualquer das infrações às quais
se aplica o presente Artigo terá garantido um tratamento eqüitativo em todas as fases do
processo, incluindo o gozo de todos os direitos e garantias previstos no direito interno do
Estado Parte em cujo território se encontra.
14. Nenhuma disposição da presente Convenção deverá ser interpretada no sentido de que
impõe uma obrigação de extraditar a um Estado Parte requerido, se existirem sérias razões
para supor que o pedido foi apresentado com a finalidade de perseguir ou punir uma pessoa
em razão do seu sexo, raça, religião, nacionalidade, origem étnica ou opiniões políticas, ou
que a satisfação daquele pedido provocaria um prejuízo a essa pessoa por alguma destas
razões.
15. Os Estados Partes não poderão recusar um pedido de extradição unicamente por
considerarem que a infração envolve também questões fiscais.
16. Antes de recusar a extradição, o Estado Parte requerido consultará, se for caso disso, o
Estado Parte requerente, a fim de lhe dar a mais ampla possibilidade de apresentar as suas
razões e de fornecer informações em apoio das suas alegações.
17. Os Estados Partes procurarão celebrar acordos ou protocolos bilaterais e multilaterais com
o objetivo de permitir a extradição ou de aumentar a sua eficácia.
Artigo 17
Transferência de pessoas condenadas
Os Estados Partes poderão considerar a celebração de acordos ou protocolos bilaterais ou
multilaterais relativos à transferência para o seu território de pessoas condenadas a penas de
prisão ou outras penas de privação de liberdade devido a infrações previstas na presente
Convenção, para que aí possam cumprir o resto da pena.
Artigo 18
Assistência judiciária recíproca
113
1. Os Estados Partes prestarão reciprocamente toda a assistência judiciária possível nas
investigações, nos processos e em outros atos judiciais relativos às infrações previstas pela
presente Convenção, nos termos do Artigo 3, e prestarão reciprocamente uma assistência
similar quando o Estado Parte requerente tiver motivos razoáveis para suspeitar de que a
infração a que se referem as alíneas a) ou b) do parágrafo 1 do Artigo 3 é de caráter
transnacional, inclusive quando as vítimas, as testemunhas, o produto, os instrumentos ou os
elementos de prova destas infrações se encontrem no Estado Parte requerido e nelas esteja
implicado um grupo criminoso organizado.
2. Será prestada toda a cooperação judiciária possível, tanto quanto o permitam as leis,
tratados, acordos e protocolos pertinentes do Estado Parte requerido, no âmbito de
investigações, processos e outros atos judiciais relativos a infrações pelas quais possa ser
considerada responsável uma pessoa coletiva no Estado Parte requerente, em conformidade
com o Artigo 10 da presente Convenção.
3. A cooperação judiciária prestada em aplicação do presente Artigo pode ser solicitada para
os seguintes efeitos:
a) Recolher testemunhos ou depoimentos;
b) Notificar atos judiciais;
c) Efetuar buscas, apreensões e embargos;
d) Examinar objetos e locais;
e) Fornecer informações, elementos de prova e pareceres de peritos;
f) Fornecer originais ou cópias certificadas de documentos e processos pertinentes, incluindo
documentos administrativos, bancários, financeiros ou comerciais e documentos de empresas;
g) Identificar ou localizar os produtos do crime, bens, instrumentos ou outros elementos para
fins probatórios;
h) Facilitar o comparecimento voluntário de pessoas no Estado Parte requerente;
i) Prestar qualquer outro tipo de assistência compatível com o direito interno do Estado Parte
requerido.
4. Sem prejuízo do seu direito interno, as autoridades competentes de um Estado Parte
poderão, sem pedido prévio, comunicar informações relativas a questões penais a uma
autoridade competente de outro Estado Parte, se considerarem que estas informações poderão
ajudar a empreender ou concluir com êxito investigações e processos penais ou conduzir este
último Estado Parte a formular um pedido ao abrigo da presente Convenção.
5. A comunicação de informações em conformidade com o parágrafo 4 do presente Artigo
será efetuada sem prejuízo das investigações e dos processos penais no Estado cujas
114
autoridade competentes fornecem as informações. As autoridades competentes que recebam
estas informações deverão satisfazer qualquer pedido no sentido de manter confidenciais as
referidas informações, mesmo se apenas temporariamente, ou de restringir a sua utilização.
Todavia, tal não impedirá o Estado Parte que receba as informações de revelar, no decurso do
processo judicial, informações que inocentem um argüido. Neste último caso, o Estado Parte
que recebeu as informações avisará o Estado Parte que as comunicou antes de as revelar e, se
lhe for pedido, consultará este último. Se, num caso excepcional, não for possível uma
comunicação prévia, o Estado Parte que recebeu as informações dará conhecimento da
revelação, prontamente, ao Estado Parte que as tenha comunicado.
6. As disposições do presente Artigo em nada prejudicam as obrigações decorrentes de
qualquer outro tratado bilateral ou multilateral que regule, ou deva regular, inteiramente ou
em parte, a cooperação judiciária.
7. Os parágrafos 9 a 29 do presente Artigo serão aplicáveis aos pedidos feitos em
conformidade com o presente Artigo, no caso de os Estados Partes em questão não estarem
ligados por um tratado de cooperação judiciária. Se os referidos Estados Partes estiverem
ligados por tal tratado, serão aplicáveis as disposições correspondentes desse tratado, a menos
que os Estados Partes concordem em aplicar, em seu lugar, as disposições dos parágrafos 9 a
29 do presente Artigo. Os Estados Partes são fortemente instados a aplicar estes números, se
tal facilitar a cooperação.
8. Os Estados Partes não poderão invocar o sigilo bancário para recusar a cooperação
judiciária prevista no presente Artigo.
9. Os Estados Partes poderão invocar a ausência de dupla criminalização para recusar prestar
a assistência judiciária prevista no presente Artigo. O Estado Parte requerido poderá, não
obstante, quando o considerar apropriado, prestar esta assistência, na medida em que o decida
por si próprio, independentemente de o ato estar ou não tipificado como uma infração no
direito interno do Estado Parte requerido.
10. Qualquer pessoa detida ou a cumprir pena no território de um Estado Parte, cuja presença
seja requerida num outro Estado Parte para efeitos de identificação, para testemunhar ou para
contribuir por qualquer outra forma para a obtenção de provas no âmbito de investigações,
processos ou outros atos judiciais relativos às infrações visadas na presente Convenção, pode
ser objeto de uma transferência, se estiverem reunidas as seguintes condições:
a) Se referida pessoa, devidamente informada, der o seu livre consentimento;
115
b) Se as autoridades competentes dos dois Estados Partes em questão derem o seu
consentimento, sob reserva das condições que estes Estados Partes possam considerar
convenientes.
11. Para efeitos do parágrafo 10 do presente Artigo:
a) O Estado Parte para o qual a transferência da pessoa em questão for efetuada terá o poder e
a obrigação de a manter detida, salvo pedido ou autorização em contrário do Estado Parte do
qual a pessoa foi transferida;
b) O Estado Parte para o qual a transferência for efetuada cumprirá prontamente a obrigação
de entregar a pessoa à guarda do Estado Parte do qual foi transferida, em conformidade com o
que tenha sido previamente acordado ou com o que as autoridades competentes dos dois
Estados Partes tenham decidido;
c) O Estado Parte para o qual for efetuada a transferência não poderá exigir do Estado Parte
do qual a transferência foi efetuada que abra um processo de extradição para que a pessoa lhe
seja entregue;
d) O período que a pessoa em questão passe detida no Estado Parte para o qual for transferida
é contado para o cumprimento da pena que lhe tenha sido aplicada no Estado Parte do qual for
transferida;
12. A menos que o Estado Parte do qual a pessoa for transferida, ao abrigo dos parágrafos 10
e 11 do presente Artigo, esteja de acordo, a pessoa em questão, seja qual for a sua
nacionalidade, não será objecto [Sic. – objeto] de processo judicial, detida, punida ou sujeita a
outras restrições à sua liberdade de movimentos no território do Estado Parte para o qual seja
transferida, devido a atos, omissões ou condenações anteriores à sua partida do território do
Estado Parte do qual foi transferida.
13. Cada Estado Parte designará uma autoridade central que terá a responsabilidade e o poder
de receber pedidos de cooperação judiciária e, quer de os executar, quer de os transmitir às
autoridades competentes para execução. Se um Estado Parte possuir uma região ou um
território especial dotado de um sistema de cooperação judiciária diferente, poderá designar
uma autoridade central distinta, que terá a mesma função para a referida região ou território.
As autoridades centrais deverão assegurar a execução ou a transmissão rápida e em boa e
devida forma dos pedidos recebidos. Quando a autoridade central transmitir o pedido a uma
autoridade competente para execução, instará pela execução rápida e em boa e devida forma
do pedido por parte da autoridade competente. O Secretário Geral da Organização das Nações
Unidas será notificado da autoridade central designada para este efeito no momento em que
cada Estado Parte depositar os seus instrumentos de ratificação, aceitação, aprovação ou
116
adesão à presente Convenção. Os pedidos de cooperação judiciária e qualquer comunicação
com eles relacionada serão transmitidos às autoridades centrais designadas pelos Estados
Partes. A presente disposição não afetará o direito de qualquer Estado Parte a exigir que estes
pedidos e comunicações lhe sejam remetidos por via diplomática e, em caso de urgência, e se
os Estados Partes nisso acordarem, por intermédio da Organização Internacional de Polícia
Criminal, se tal for possível.
14. Os pedidos serão formulados por escrito ou, se possível, por qualquer outro meio capaz de
produzir registro escrito, numa língua que seja aceita pelo Estado Parte requerido, em
condições que permitam a este Estado Parte verificar a sua autenticidade. O Secretário Geral
das Nações Unidas será notificado a respeito da língua ou línguas aceitas por cada Estado
Parte no momento em que o Estado Parte em questão depositar os seus instrumentos de
ratificação, aceitação, aprovação ou adesão à presente Convenção. Em caso de urgência, e se
os Estados Partes nisso acordarem, os pedidos poderão ser feitos oralmente, mais deverão ser
imediatamente confirmados por escrito.
15. Um pedido de assistência judiciária deverá conter as seguintes informações:
a) A designação da autoridade que emite o pedido;
b) O objeto e a natureza da investigação, dos processos ou dos outros atos judiciais a que se
refere o pedido, bem como o nome e as funções da autoridade que os tenha a cargo;
c) Um resumo dos fatos relevantes, salvo no caso dos pedidos efetuados para efeitos de
notificação de atos judiciais;
d) Uma descrição da assistência pretendida e pormenores de qualquer procedimento
específico que o Estado Parte requerente deseje ver aplicado;
e) Caso seja possível, a identidade, endereço e nacionalidade de qualquer pessoa visada; e
f) O fim para o qual são pedidos os elementos, informações ou medidas.
16. O Estado Parte requerido poderá solicitar informações adicionais, quando tal se afigure
necessário à execução do pedido em conformidade com o seu direito interno, ou quando tal
possa facilitar a execução do pedido.
17. Qualquer pedido será executado em conformidade com o direito interno do Estado Parte
requerido e, na medida em que tal não contrarie este direito e seja possível, em conformidade
com os procedimentos especificados no pedido.
18. Se for possível e em conformidade com os princípios fundamentais do direito interno,
quando uma pessoa que se encontre no território de um Estado Parte deva ser ouvida como
testemunha ou como perito pelas autoridades judiciais de outro Estado Parte, o primeiro
Estado Parte poderá, a pedido do outro, autorizar a sua audição por videoconferência, se não
117
for possível ou desejável que a pessoa compareça no território do Estado Parte requerente. Os
Estados Partes poderão acordar em que a audição seja conduzida por uma autoridade judicial
do Estado Parte requerente e que a ela assista uma autoridade judicial do Estado Parte
requerido.
19. O Estado Parte requerente não comunicará nem utilizará as informações ou os elementos
de prova fornecidos pelo Estado Parte requerido para efeitos de investigações, processos ou
outros atos judiciais diferentes dos mencionados no pedido sem o consentimento prévio do
Estado Parte requerido. O disposto neste número não impedirá o Estado Parte requerente de
revelar, durante o processo, informações ou elementos de prova ilibatórios de um argüido.
Neste último caso, o Estado Parte requerente avisará, antes da revelação, o Estado Parte
requerido e, se tal lhe for pedido, consultará neste último. Se, num caso excepcional, não for
possível uma comunicação prévia, o Estado Parte requerente informará da revelação,
prontamente, o Estado Parte requerido.
20. O Estado Parte requerente poderá exigir que o Estado Parte requerido guarde sigilo sobre
o pedido e o seu conteúdo, salvo na medida do que seja necessário para o executar. Se o
Estado Parte requerido não puder satisfazer esta exigência, informará prontamente o Estado
Parte requerente.
21. A cooperação judiciária poderá ser recusada:
a) Se o pedido não for feito em conformidade com o disposto no presente Artigo;
b) Se o Estado Parte requerido considerar que a execução do pedido pode afetar sua
soberania, sua segurança, sua ordem pública ou outros interesses essenciais;
c) Se o direito interno do Estado Parte requerido proibir suas autoridades de executar as
providências solicitadas com relação a uma infração análoga que tenha sido objeto de
investigação ou de procedimento judicial no âmbito da sua própria competência;
d) Se a aceitação do pedido contrariar o sistema jurídico do Estado Parte requerido no que se
refere à cooperação judiciária.
22. Os Estados Partes não poderão recusar um pedido de cooperação judiciária unicamente
por considerarem que a infração envolve também questões fiscais.
23. Qualquer recusa de cooperação judiciária deverá ser fundamentada.
24. O Estado Parte requerido executará o pedido de cooperação judiciária tão prontamente
quanto possível e terá em conta, na medida do possível, todos os prazos sugeridos pelo Estado
Parte requerente para os quais sejam dadas justificações, de preferência no pedido. O Estado
Parte requerido responderá aos pedidos razoáveis do Estado Parte requerente quanto ao
118
andamento das diligências solicitadas. Quando a assistência pedida deixar de ser necessária, o
Estado Parte requerente informará prontamente desse fato o Estado Parte requerido.
25. A cooperação judiciária poderá ser diferida pelo Estado Parte requerido por interferir com
uma investigação, processos ou outros atos judiciais em curso.
26. Antes de recusar um pedido feito ao abrigo do parágrafo 21 do presente Artigo ou de
diferir a sua execução ao abrigo do parágrafo 25, o Estado Parte requerido estudará com o
Estado Parte requerente a possibilidade de prestar a assistência sob reserva das condições que
considere necessárias. Se o Estado Parte requerente aceitar a assistência sob reserva destas
condições, deverá respeitá-las.
27. Sem prejuízo da aplicação do parágrafo 12 do presente Artigo, uma testemunha, um perito
ou outra pessoa que, a pedido do Estado Parte requerente, aceite depor num processo ou
colaborar numa investigação, em processos ou outros atos judiciais no território do Estado
Parte requerente, não será objeto de processo, detida, punida ou sujeita a outras restrições à
sua liberdade pessoal neste território, devido a atos, omissões ou condenações anteriores à sua
partida do território do Estado Parte requerido. Esta imunidade cessa quando a testemunha, o
perito ou a referida pessoa, tendo tido, durante um período de quinze dias consecutivos ou
qualquer outro período acordado pelos Estados Partes, a contar da data em que recebeu a
comunicação oficial de que a sua presença já não era exigida pelas autoridades judiciais, a
possibilidade de deixar o território do Estado Parte requerente, nele tenha voluntariamente
permanecido ou, tendo-o deixado, a ele tenha regressado de livre vontade.
28. As despesas correntes com a execução de um pedido serão suportadas pelo Estado Parte
requerido, salvo acordo noutro sentido dos Estados Partes interessados. Quando venham a
revelar-se necessárias despesas significativas ou extraordinárias para executar o pedido, os
Estados Partes consultar-se-ão para fixar as condições segundo as quais o pedido deverá ser
executado, bem como o modo como as despesas serão assumidas.
29. O Estado Parte requerido:
a) Fornecerá ao Estado Parte requerente cópias dos processos, documentos ou informações
administrativas que estejam em seu poder e que, por força do seu direito interno, estejam
acessíveis ao público;
b) Poderá, se assim o entender, fornecer ao Estado Parte requerente, na íntegra ou nas
condições que considere apropriadas, cópias de todos os processos, documentos ou
informações que estejam na sua posse e que, por força do seu direito interno, não sejam
acessíveis ao público.
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30. Os Estados Partes considerarão, se necessário, a possibilidade de celebrarem acordos ou
protocolos bilaterais ou multilaterais que sirvam os objetivos e as disposições do presente
Artigo, reforçando-as ou dando-lhes maior eficácia.
Artigo 19
Investigações conjuntas
Os Estados Partes considerarão a possibilidade de celebrar acordos ou protocolos bilaterais ou
multilaterais em virtude dos quais, com respeito a matérias que sejam objeto de investigação,
processos ou ações judiciais em um ou mais Estados, as autoridades competentes possam
estabelecer órgãos mistos de investigação. Na ausência de tais acordos ou protocolos, poderá
ser decidida casuisticamente a realização de investigações conjuntas. Os Estados Partes
envolvidos agirão de modo a que a soberania do Estado Parte em cujo território decorra a
investigação seja plenamente respeitada.
Artigo 20
Técnicas especiais de investigação
1. Se os princípios fundamentais do seu ordenamento jurídico nacional o permitirem, cada
Estado Parte, tendo em conta as suas possibilidades e em conformidade com as condições
prescritas no seu direito interno, adotará as medidas necessárias para permitir o recurso
apropriado a entregas vigiadas e, quando o considere adequado, o recurso a outras técnicas
especiais de investigação, como a vigilância eletrônica ou outras formas de vigilância e as
operações de infiltração, por parte das autoridades competentes no seu território, a fim de
combater eficazmente a criminalidade organizada.
2. Para efeitos de investigações sobre as infrações previstas na presente Convenção, os
Estados Partes são instados a celebrar, se necessário, acordos ou protocolos bilaterais ou
multilaterais apropriados para recorrer às técnicas especiais de investigação, no âmbito da
cooperação internacional. Estes acordos ou protocolos serão celebrados e aplicados sem
prejuízo do princípio da igualdade soberana dos Estados e serão executados em estrita
conformidade com as disposições neles contidas.
3. Na ausência dos acordos ou protocolos referidos no parágrafo 2 do presente Artigo, as
decisões de recorrer a técnicas especiais de investigação a nível internacional serão tomadas
casuisticamente e poderão, se necessário, ter em conta acordos ou protocolos financeiros
relativos ao exercício de jurisdição pelos Estados Partes interessados.
4. As entregas vigiadas a que se tenha decidido recorrer a nível internacional poderão incluir,
com o consentimento dos Estados Partes envolvidos, métodos como a intercepção de
120
mercadorias e a autorização de prosseguir o seu encaminhamento, sem alteração ou após
subtração ou substituição da totalidade ou de parte dessas mercadorias.
Artigo 21
Transferência de processos penais
Os Estados Partes considerarão a possibilidade de transferirem mutuamente os processos
relativos a uma infração prevista na presente Convenção, nos casos em que esta transferência
seja considerada necessária no interesse da boa administração da justiça e, em especial,
quando estejam envolvidas várias jurisdições, a fim de centralizar a instrução dos processos.
Artigo 22
Estabelecimento de antecedentes penais
Cada Estado Parte poderá adotar as medidas legislativas ou outras que sejam necessárias para
ter em consideração, nas condições e para os efeitos que entender apropriados, qualquer
condenação de que o presumível autor de uma infração tenha sido objeto noutro Estado, a fim
de utilizar esta informação no âmbito de um processo penal relativo a uma infração prevista
na presente Convenção.
Artigo 23
Criminalização da obstrução à justiça
Cada Estado Parte adotará medidas legislativas e outras consideradas necessárias para conferir
o caráter de infração penal aos seguintes atos, quando cometidos intencionalmente:
a) O recurso à força física, a ameaças ou a intimidação, ou a promessa, oferta ou concessão de
um benefício indevido para obtenção de um falso testemunho ou para impedir um testemunho
ou a apresentação de elementos de prova num processo relacionado com a prática de infrações
previstas na presente Convenção;
b) O recurso à força física, a ameaças ou a intimidação para impedir um agente judicial ou
policial de exercer os deveres inerentes à sua função relativamente à prática de infrações
previstas na presente Convenção. O disposto na presente alínea não prejudica o direito dos
Estados Partes de disporem de legislação destinada a proteger outras categorias de agentes
públicos.
Artigo 24
Proteção das testemunhas
1. Cada Estado Parte, dentro das suas possibilidades, adotará medidas apropriadas para
assegurar uma proteção eficaz contra eventuais atos de represália ou de intimidação das
testemunhas que, no âmbito de processos penais, deponham sobre infrações previstas na
121
presente Convenção e, quando necessário, aos seus familiares ou outras pessoas que lhes
sejam próximas.
2. Sem prejuízo dos direitos do argüido, incluindo o direito a um julgamento regular, as
medidas referidas no parágrafo 1 do presente Artigo poderão incluir, entre outras:
a) Desenvolver, para a proteção física destas pessoas, procedimentos que visem, consoante as
necessidades e na medida do possível, nomeadamente, fornecer-lhes um novo domicílio e
impedir ou restringir a divulgação de informações relativas à sua identidade e paradeiro;
b) Estabelecer normas em matéria de prova que permitam às testemunhas depor de forma a
garantir a sua segurança, nomeadamente autorizando-as a depor com recurso a meios técnicos
de comunicação, como ligações de vídeo ou outros meios adequados.
3. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de celebrar acordos com outros Estados
para facultar um novo domicílio às pessoas referidas no parágrafo 1 do presente Artigo.
4. As disposições do presente Artigo aplicam-se igualmente às vítimas, quando forem
testemunhas.
Artigo 25
Assistência e proteção às vítimas
1. Cada Estado Parte adotará, segundo as suas possibilidades, medidas apropriadas para
prestar assistência e assegurar a proteção às vítimas de infrações previstas na presente
Convenção, especialmente em caso de ameaça de represálias ou de intimidação.
2. Cada Estado Parte estabelecerá procedimentos adequados para que as vítimas de infrações
previstas na presente Convenção possam obter reparação.
3. Cada Estado Parte, sem prejuízo do seu direito interno, assegurará que as opiniões e
preocupações das vítimas sejam apresentadas e tomadas em consideração nas fases adequadas
do processo penal aberto contra os autores de infrações, por forma que não prejudique os
direitos da defesa.
Artigo 26
Medidas para intensificar a cooperação com as autoridades competentes para a aplicação da
lei
1. Cada Estado Parte tomará as medidas adequadas para encorajar as pessoas que participem
ou tenham participado em grupos criminosos organizados:
a) A fornecerem informações úteis às autoridades competentes para efeitos de investigação e
produção de provas, nomeadamente
i) A identidade, natureza, composição, estrutura, localização ou atividades dos grupos
criminosos organizados;
122
ii) As conexões, inclusive conexões internacionais, com outros grupos criminosos
organizados;
iii) As infrações que os grupos criminosos organizados praticaram ou poderão vir a praticar;
b) A prestarem ajuda efetiva e concreta às autoridades competentes, susceptível de contribuir
para privar os grupos criminosos organizados dos seus recursos ou do produto do crime.
2. Cada Estado Parte poderá considerar a possibilidade, nos casos pertinentes, de reduzir a
pena de que é passível um argüido que coopere de forma substancial na investigação ou no
julgamento dos autores de uma infração prevista na presente Convenção.
3. Cada Estado Parte poderá considerar a possibilidade, em conformidade com os princípios
fundamentais do seu ordenamento jurídico interno, de conceder imunidade a uma pessoa que
coopere de forma substancial na investigação ou no julgamento dos autores de uma infração
prevista na presente Convenção.
4. A proteção destas pessoas será assegurada nos termos do Artigo 24 da presente Convenção.
5. Quando uma das pessoas referidas no parágrafo 1 do presente Artigo se encontre num
Estado Parte e possa prestar uma cooperação substancial às autoridades competentes de outro
Estado Parte, os Estados Partes em questão poderão considerar a celebração de acordos, em
conformidade com o seu direito interno, relativos à eventual concessão, pelo outro Estado
Parte, do tratamento descrito nos parágrafos 2 e 3 do presente Artigo.
Artigo 27
Cooperação entre as autoridades competentes para a aplicação da lei
1. Os Estados Partes cooperarão estreitamente, em conformidade com os seus respectivos
ordenamentos jurídicos e administrativos, a fim de reforçar a eficácia das medidas de controle
do cumprimento da lei destinadas a combater as infrações previstas na presente Convenção.
Especificamente, cada Estado Parte adotará medidas eficazes para:
a) Reforçar ou, se necessário, criar canais de comunicação entre as suas autoridades,
organismos e serviços competentes, para facilitar a rápida e segura troca de informações
relativas a todos os aspectos das infrações previstas na presente Convenção, incluindo, se os
Estados Partes envolvidos o considerarem apropriado, ligações com outras atividades
criminosas;
b) Cooperar com outros Estados Partes, quando se trate de infrações previstas na presente
Convenção, na condução de investigações relativas aos seguintes aspectos:
i) Identidade, localização e atividades de pessoas suspeitas de implicação nas referidas
infrações, bem como localização de outras pessoas envolvidas;
ii) Movimentação do produto do crime ou dos bens provenientes da prática destas infrações;
123
iii) Movimentação de bens, equipamentos ou outros instrumentos utilizados ou destinados a
ser utilizados na prática destas infrações;
c) Fornecer, quando for caso disso, os elementos ou as quantidades de substâncias necessárias
para fins de análise ou de investigação;
d) Facilitar uma coordenação eficaz entre as autoridades, organismos e serviços competentes e
promover o intercâmbio de pessoal e de peritos, incluindo, sob reserva da existência de
acordos ou protocolos bilaterais entre os Estados Partes envolvidos, a designação de agentes
de ligação;
e) Trocar informações com outros Estados Partes sobre os meios e métodos específicos
utilizados pelos grupos criminosos organizados, incluindo, se for caso disso, sobre os
itinerários e os meios de transporte, bem como o uso de identidades falsas, de documentos
alterados ou falsificados ou outros meios de dissimulação das suas atividades;
f) Trocar informações e coordenar as medidas administrativas e outras tendo em vista detectar
o mais rapidamente possível as infrações previstas na presente Convenção.
2. Para dar aplicação à presente Convenção, os Estados Partes considerarão a possibilidade de
celebrar acordos ou protocolos bilaterais ou multilaterais que prevejam uma cooperação direta
entre as suas autoridades competentes para a aplicação da lei e, quando tais acordos ou
protocolos já existam, considerarão a possibilidade de os alterar. Na ausência de tais acordos
entre os Estados Partes envolvidos, estes últimos poderão basear-se na presente Convenção
para instituir uma cooperação em matéria de detecção e repressão das infrações previstas na
presente Convenção. Sempre que tal se justifique, os Estados Partes utilizarão plenamente os
acordos ou protocolos, incluindo as organizações internacionais ou regionais, para intensificar
a cooperação entre as suas autoridades competentes para a aplicação da lei.
3. Os Estados Partes procurarão cooperar, na medida das suas possibilidades, para enfrentar o
crime organizado transnacional praticado com recurso a meios tecnológicos modernos.
Artigo 28
Coleta, intercâmbio e análise de informações sobre a natureza do crime organizado
1. Cada Estado Parte considerará a possibilidade de analisar, em consulta com os meios
científicos e universitários, as tendências da criminalidade organizada no seu território, as
circunstâncias em que opera e os grupos profissionais e tecnologias envolvidos.
2. Os Estados Partes considerarão a possibilidade de desenvolver as suas capacidades de
análise das atividades criminosas organizadas e de as partilhar diretamente entre si e por
intermédio de organizações internacionais e regionais. Para este efeito, deverão ser elaboradas
e aplicadas, quando for caso disso, definições, normas e metodologias comuns.
124
3. Cada Estado Parte considerará o estabelecimento de meios de acompanhamento das suas
políticas e das medidas tomadas para combater o crime organizado, avaliando a sua aplicação
e eficácia.
Artigo 29
Formação e assistência técnica
1. Cada Estado Parte estabelecerá, desenvolverá ou melhorará, na medida das necessidades,
programas de formação específicos destinados ao pessoal das autoridades competentes para a
aplicação da lei, incluindo promotores públicos, juízes de instrução e funcionários aduaneiros,
bem como outro pessoal que tenha por função prevenir, detectar e reprimir as infrações
previstas na presente Convenção. Estes programas, que poderão prever cessões e intercâmbio
de pessoal, incidirão especificamente, na medida em que o direito interno o permita, nos
seguintes aspectos:
a) Métodos utilizados para prevenir, detectar e combater as infrações previstas na presente
Convenção;
b) Rotas e técnicas utilizadas pelas pessoas suspeitas de implicação em infrações previstas na
presente Convenção, incluindo nos Estados de trânsito, e medidas adequadas de combate;
c) Vigilância das movimentações dos produtos de contrabando;
d) Detecção e vigilância das movimentações do produto do crime, de bens, equipamentos ou
outros instrumentos, de métodos de transferência, dissimulação ou disfarce destes produtos,
bens, equipamentos ou outros instrumentos, bem como métodos de luta contra a lavagem de
dinheiro e outras infrações financeiras;
e) Coleta de provas;
f) Técnicas de controle nas zonas francas e nos portos francos;
g) Equipamentos e técnicas modernas de detecção e de repressão, incluindo a vigilância
eletrônica, as entregas vigiadas e as operações de infiltração;
h) Métodos utilizados para combater o crime organizado transnacional cometido por meio de
computadores, de redes de telecomunicações ou outras tecnologias modernas; e
i) Métodos utilizados para a proteção das vítimas e das testemunhas.
2. Os Estados Partes deverão cooperar entre si no planejamento e execução de programas de
investigação e de formação concebidos para o intercâmbio de conhecimentos especializados
nos domínios referidos no parágrafo 1 do presente Artigo e, para este efeito, recorrerão
também, quando for caso disso, a conferências e seminários regionais e internacionais para
promover a cooperação e estimular as trocas de pontos de vista sobre problemas comuns,
incluindo os problemas e necessidades específicos dos Estados de trânsito.
125
3. Os Estados Partes incentivarão as atividades de formação e de assistência técnica
suscetíveis de facilitar a extradição e a cooperação judiciária. Estas atividades de cooperação
e de assistência técnica poderão incluir ensino de idiomas, cessões e intercâmbio do pessoal
das autoridades centrais ou de organismos que tenham responsabilidades nos domínios em
questão.
4. Sempre que se encontrem em vigor acordos bilaterais ou multilaterais, os Estados Partes
reforçarão, tanto quanto for necessário, as medidas tomadas no sentido de otimizar as
atividades operacionais e de formação no âmbito de organizações internacionais e regionais e
no âmbito de outros acordos ou protocolos bilaterais e multilaterais na matéria.
Artigo 30
Outras medidas: aplicação da Convenção através do desenvolvimento econômico e da
assistência técnica
1. Os Estados Partes tomarão as medidas adequadas para assegurar a melhor aplicação
possível da presente Convenção através da cooperação internacional, tendo em conta os
efeitos negativos da criminalidade organizada na sociedade em geral e no desenvolvimento
sustentável em particular.
2. Os Estados Partes farão esforços concretos, na medida do possível, em coordenação entre si
e com as organizações regionais e internacionais:
a) Para desenvolver a sua cooperação a vários níveis com os países em desenvolvimento, a
fim de reforçar a capacidade destes para prevenir e combater a criminalidade organizada
transnacional;
b) Para aumentar a assistência financeira e material aos países em desenvolvimento, a fim de
apoiar os seus esforços para combater eficazmente a criminalidade organizada transnacional e
ajudá-los a aplicar com êxito a presente Convenção;
c) Para fornecer uma assistência técnica aos países em desenvolvimento e aos países com uma
economia de transição, a fim de ajudá-los a obter meios para a aplicação da presente
Convenção. Para este efeito, os Estados Partes procurarão destinar voluntariamente
contribuições adequadas e regulares a uma conta constituída especificamente para este fim no
âmbito de um mecanismo de financiamento das Nações Unidas. Os Estados Partes poderão
também considerar, especificamente, em conformidade com o seu direito interno e as
disposições da presente Convenção, a possibilidade de destinarem à conta acima referida uma
percentagem dos fundos ou do valor correspondente do produto do crime ou dos bens
confiscados em aplicação das disposições da presente Convenção;
126
d) Para incentivar e persuadir outros Estados e instituições financeiras, quando tal se
justifique, a associarem-se aos esforços desenvolvidos em conformidade com o presente
Artigo, nomeadamente fornecendo aos países em desenvolvimento mais programas de
formação e material moderno, a fim de os ajudar a alcançar os objetivos da presente
Convenção.
e) Tanto quanto possível, estas medidas serão tomadas sem prejuízo dos compromissos
existentes em matéria de assistência externa ou de outros acordos de cooperação financeira a
nível bilateral, regional ou internacional.
4. Os Estados Partes poderão celebrar acordos ou protocolos bilaterais ou multilaterais
relativos a assistência técnica e logística, tendo em conta os acordos financeiros necessários
para assegurar a eficácia dos meios de cooperação internacional previstos na presente
Convenção, e para prevenir, detectar e combater a criminalidade organizada transnacional.
Artigo 31
Prevenção
1. Os Estados Partes procurarão elaborar e avaliar projetos nacionais, bem como estabelecer e
promover as melhores práticas e políticas para prevenir a criminalidade organizada
transnacional.
2. Em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito interno, os Estados Partes
procurarão reduzir, através de medidas legislativas, administrativas ou outras que sejam
adequadas, as possibilidades atuais ou futuras de participação de grupos criminosos
organizados em negócios lícitos utilizando o produto do crime. Estas medidas deverão incidir:
a) No fortalecimento da cooperação entre autoridades competentes para a aplicação da lei ou
promotores e entidades privadas envolvidas, incluindo empresas;
b) Na promoção da elaboração de normas e procedimentos destinados a preservar a
integridade das entidades públicas e privadas envolvidas, bem como de códigos de conduta
para determinados profissionais, em particular advogados, tabeliães, consultores tributários e
contadores;
c) Na prevenção da utilização indevida, por grupos criminosos organizados, de concursos
públicos, bem como de subvenções e licenças concedidas por autoridades públicas para a
realização de atividades comerciais;
d) Na prevenção da utilização indevida de pessoas jurídicas por grupos criminosos
organizados; estas medidas poderão incluir:
i) O estabelecimento de registros públicos de pessoas jurídicas e físicas envolvidas na criação,
gestão e financiamento de pessoas jurídicas;
127
ii) A possibilidade de privar, por decisão judicial ou por qualquer outro meio adequado, as
pessoas condenadas por infrações previstas na presente Convenção, por um período adequado,
do direito de exercerem funções de direção de pessoas jurídicas estabelecidas no seu
território;
iii) O estabelecimento de registros nacionais de pessoas que tenham sido privadas do direito
de exercerem funções de direção de pessoas jurídicas; e
iv) O intercâmbio de informações contidas nos registros referidos nas incisos i) e iii) da
presente alínea com as autoridades competentes dos outros Estados Partes.
3. Os Estados Partes procurarão promover a reinserção na sociedade das pessoas condenadas
por infrações previstas na presente Convenção.
4. Os Estados Partes procurarão avaliar periodicamente os instrumentos jurídicos e as práticas
administrativas aplicáveis, a fim de determinar se contêm lacunas que permitam aos grupos
criminosos organizados fazerem deles utilização indevida.
5. Os Estados Partes procurarão sensibilizar melhor o público para a existência, as causas e a
gravidade da criminalidade organizada transnacional e para a ameaça que representa. Poderão
fazê-lo, quando for o caso, por intermédio dos meios de comunicação social e adotando
medidas destinadas a promover a participação do público nas ações de prevenção e combate à
criminalidade.
6. Cada Estado Parte comunicará ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas o
nome e o endereço da(s) autoridade(s) que poderão assistir os outros Estados Partes na
aplicação das medidas de prevenção do crime organizado transnacional.
7. Quando tal se justifique, os Estados Partes colaborarão, entre si e com as organizações
regionais e internacionais competentes, a fim de promover e aplicar as medidas referidas no
presente Artigo. A este título, participarão em projetos internacionais que visem prevenir a
criminalidade organizada transnacional, atuando, por exemplo, sobre os fatores que tornam os
grupos socialmente marginalizados vulneráveis à sua ação.
Artigo 32
Conferência das Partes na Convenção
1. Será instituída uma Conferência das Partes na Convenção, para melhorar a capacidade dos
Estados Partes no combate à criminalidade organizada transnacional e para promover e
analisar a aplicação da presente Convenção.
2. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas convocará a Conferência das Partes,
o mais tardar, um ano após a entrada em vigor da presente Convenção. A Conferência das
Partes adotará um regulamento interno e regras relativas às atividades enunciadas nos
128
parágrafos 3 e 4 do presente Artigo (incluindo regras relativas ao financiamento das despesas
decorrentes dessas atividades).
3. A Conferência das Partes acordará em mecanismos destinados a atingir os objetivos
referidos no parágrafo 1 do presente Artigo, nomeadamente:
a) Facilitando as ações desenvolvidas pelos Estados Partes em aplicação dos Artigos 29, 30 e
31 da presente Convenção, inclusive incentivando a mobilização de contribuições voluntárias;
b) Facilitando o intercâmbio de informações entre Estados Partes sobre as características e
tendências da criminalidade organizada transnacional e as práticas eficazes para a combater;
c) Cooperando com as organizações regionais e internacionais e as organizações nãogovernamentais competentes;
d) Avaliando, a intervalos regulares, a aplicação da presente Convenção;
e) Formulando recomendações a fim de melhorar a presente Convenção e a sua aplicação;
4. Para efeitos das alíneas d) e e) do parágrafo 3 do presente Artigo, a Conferência das Partes
inteirar-se-á das medidas adotadas e das dificuldades encontradas pelos Estados Partes na
aplicação da presente Convenção, utilizando as informações que estes lhe comuniquem e os
mecanismos complementares de análise que venha a criar.
5. Cada Estado Parte comunicará à Conferência das Partes, a solicitação desta, informações
sobre os seus programas, planos e práticas, bem como sobre as suas medidas legislativas e
administrativas destinadas a aplicar a presente Convenção.
Artigo 33
Secretariado
1. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas fornecerá os serviços de
secretariado necessários à Conferência das Partes na Convenção.
2. O secretariado:
a) Apoiará a Conferência das Partes na realização das atividades enunciadas no Artigo 32 da
presente Convenção, tomará as disposições e prestará os serviços necessários para as sessões
da Conferência das Partes;
b) Assistirá os Estados Partes, a pedido destes, no fornecimento à Conferência das Partes das
informações previstas no parágrafo 5 do Artigo 32 da presente Convenção; e
c) Assegurará a coordenação necessária com os secretariados das organizações regionais e
internacionais.
Artigo 34
Aplicação da Convenção
129
1. Cada Estado Parte adotará as medidas necessárias, incluindo legislativas e administrativas,
em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito interno, para assegurar o
cumprimento das suas obrigações decorrentes da presente Convenção.
2. As infrações enunciadas nos Artigos 5, 6, 8 e 23 da presente Convenção serão incorporadas
no direito interno de cada Estado Parte, independentemente da sua natureza transnacional ou
da implicação de um grupo criminoso organizado nos termos do parágrafo 1 do Artigo 3 da
presente Convenção, salvo na medida em que o Artigo 5 da presente Convenção exija o
envolvimento de um grupo criminoso organizado.
3. Cada Estado Parte poderá adotar medidas mais estritas ou mais severas do que as previstas
na presente Convenção a fim de prevenir e combater a criminalidade organizada
transnacional.
Artigo 35
Solução de Controvérsias
1. Os Estados Partes procurarão solucionar controvérsias relativas à interpretação ou
aplicação da presente Convenção por negociação direta.
2. Qualquer controvérsia entre dois ou mais Estados Partes relativa à interpretação ou
aplicação da presente Convenção que não possa ser resolvida por via negocial num prazo
razoável será, a pedido de um destes Estados Partes, submetida a arbitragem. Se, no prazo de
seis meses a contar da data do pedido de arbitragem, os Estados Partes não chegarem a acordo
sobre a organização da arbitragem, qualquer deles poderá submeter a controvérsia ao Tribunal
Internacional de Justiça, mediante requerimento em conformidade com o Estatuto do
Tribunal.
3. Qualquer Estado Parte poderá, no momento da assinatura, da ratificação, da aceitação ou da
aprovação da presente Convenção, ou da adesão a esta, declarar que não se considera
vinculado pelo parágrafo 2 do presente Artigo. Os outros Estados Partes não estarão
vinculados pelo parágrafo 2 do presente Artigo em relação a qualquer Estado Parte que tenha
formulado esta reserva.
4. Um Estado Parte que tenha formulado uma reserva ao abrigo do parágrafo 3 do presente
Artigo poderá retirá-la a qualquer momento, mediante notificação do Secretário Geral da
Organização das Nações Unidas.
Artigo 36
Assinatura, ratificação, aceitação, aprovação e adesão
130
1. A presente Convenção será aberta à assinatura de todos os Estados entre 12 e 15 de
Dezembro de 2000, em Palermo (Itália) e, seguidamente, na sede da Organização das Nações
Unidas, em Nova Iorque, até 12 de Dezembro de 2002.
2. A presente Convenção estará igualmente aberta à assinatura de organizações regionais de
integração econômica, desde que pelos menos um Estado-Membro dessa organização tenha
assinado a presente Convenção, em conformidade com o parágrafo 1 do presente Artigo.
3. A presente Convenção será submetida a ratificação, aceitação ou aprovação. Os
instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação serão depositados junto do Secretário
Geral da Organização das Nações Unidas. Uma organização regional de integração
econômica poderá depositar os seus instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação se
pelo menos um dos seus Estados-Membros o tiver feito. Neste instrumento de ratificação,
aceitação ou aprovação, a organização declarará o âmbito da sua competência em relação às
questões que são objeto da presente Convenção. Informará igualmente o depositário de
qualquer alteração relevante do âmbito da sua competência.
4. A presente Convenção estará aberta à adesão de qualquer Estado ou de qualquer
organização regional de integração econômica de que, pelo menos, um Estado membro seja
parte na presente Convenção. Os instrumentos de adesão serão depositados junto do
Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. No momento da sua adesão, uma
organização regional de integração econômica declarará o âmbito da sua competência em
relação às questões que são objeto da presente Convenção. Informará igualmente o
depositário de qualquer alteração relevante do âmbito dessa competência.
Artigo 37
Relação com os protocolos
1. A presente Convenção poderá ser completada por um ou mais protocolos.
2. Para se tornar Parte num protocolo, um Estado ou uma organização regional de integração
econômica deverá igualmente ser Parte na presente Convenção.
3. Um Estado Parte na presente Convenção não estará vinculado por um protocolo, a menos
que se torne Parte do mesmo protocolo, em conformidade com as disposições deste.
4. Qualquer protocolo à presente Convenção será interpretado conjuntamente com a presente
Convenção, tendo em conta a finalidade do mesmo protocolo.
Artigo 38
Entrada em vigor
1. A presente Convenção entrará em vigor no nonagésimo dia seguinte à data de depósito do
quadragésimo instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão. Para efeitos do
131
presente número, nenhum dos instrumentos depositados por uma organização regional de
integração econômica será somado aos instrumentos já depositados pelos Estados membros
dessa organização.
2. Para cada Estado ou organização regional de integração econômica que ratifique, aceite ou
aprove a presente Convenção ou a ela adira após o depósito do quadragésimo instrumento
pertinente, a presente Convenção entrará em vigor no trigésimo dia seguinte à data de
depósito do instrumento pertinente do referido Estado ou organização.
Artigo 39
Emendas
1. Quando tiverem decorrido cinco anos a contar da entrada em vigor da presente Convenção,
um Estado Parte poderá propor uma emenda e depositar o respectivo texto junto do Secretário
Geral da Organização das Nações Unidas, que em seguida comunicará a proposta de emenda
aos Estados Partes e à Conferência das Partes na Convenção, para exame da proposta e
adoção de uma decisão. A Conferência das Partes esforçar-se-á por chegar a um consenso
sobre qualquer emenda. Se todos os esforços nesse sentido se tiverem esgotado sem que se
tenha chegado a acordo, será necessário, como último recurso para que a emenda seja
aprovada, uma votação por maioria de dois terços dos votos expressos dos Estados Partes
presentes na Conferência das Partes.
2. Para exercerem, ao abrigo do presente Artigo, o seu direito de voto nos domínios em que
sejam competentes, as organizações regionais de integração econômica disporão de um
número de votos igual ao número dos seus Estados-Membros que sejam Partes na presente
Convenção. Não exercerão o seu direito de voto quando os seus Estados-Membros exercerem
os seus, e inversamente.
3. Uma emenda aprovada em conformidade com o parágrafo 1 do presente Artigo estará
sujeita à ratificação, aceitação ou aprovação dos Estados Partes.
4. Uma emenda aprovada em conformidade com o parágrafo 1 do presente Artigo entrará em
vigor para um Estado Parte noventa dias após a data de depósito pelo mesmo Estado Parte
junto do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas de um instrumento de
ratificação, aceitação ou aprovação da referida emenda.
5. Uma emenda que tenha entrado em vigor será vinculativa para os Estados Partes que
tenham declarado o seu consentimento em serem por ela vinculados. Os outros Estados Partes
permanecerão vinculados pelas disposições da presente Convenção e por todas as emendas
anteriores que tenham ratificado, aceite ou aprovado.
Artigo 40
132
Denúncia
1. Um Estado Parte poderá denunciar a presente Convenção mediante notificação escrita
dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. A denúncia tornar-se-á
efetiva um ano após a data da recepção da notificação pelo Secretário Geral.
2. Uma organização regional de integração econômica cessará de ser Parte na presente
Convenção quando todos os seus Estados-Membros a tenham denunciado.
3. A denúncia da presente Convenção, em conformidade com o parágrafo 1 do presente
Artigo, implica a denúncia de qualquer protocolo a ela associado.
Artigo 41
Depositário e línguas
1. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas será o depositário da presente
Convenção.
2. O original da presente Convenção, cujos textos em inglês, árabe, chinês, espanhol, francês
e russo fazem igualmente fé, será depositado junto do Secretário Geral da Organização das
Nações Unidas.
EM FÉ DO QUE os plenipotenciários abaixo assinados, devidamente mandatados para o
efeito pelos respectivos Governos, assinaram a presente Convenção.
133
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº , DE 2006 36
(Com remissões às normas pertinentes)
Dispõe sobre a repressão ao crime organizado e dá
outras providências.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
CAPÍTULO I
DO CRIME ORGANIZADO
Art. 1º Esta Lei define o crime organizado e dispõe sobre a investigação criminal, meios de
obtenção de prova, crimes correlatos e procedimento criminal a ser aplicado.
Art. 2º Promover, constituir, financiar, cooperar ou integrar, pessoalmente ou por interposta
pessoa, associação, sob forma lícita ou não, de cinco ou mais pessoas, com estabilidade,
estrutura organizacional hierárquica e divisão de tarefas para obter, direta ou indiretamente,
com o emprego de violência, ameaça, fraude, tráfico de influência ou atos de corrupção,
vantagem de qualquer natureza, praticando um ou mais dos seguintes crimes:
I – tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou
psíquica (Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976);
II – terrorismo;
III – contrabando ou tráfico ilícito de armas de fogo, acessórios, artefatos, munições,
explosivos ou materiais destinados à sua produção (Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997);
IV – extorsão mediante seqüestro e suas formas qualificadas (art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º, o
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal);
V – contra a administração pública (arts. 312, caput e § 1º, 313-A, 313-B, 314, 315, 316,
caput e § 2º, 317, 318, 319, 320, 321, 325, 326, 332, 334, 335, 337, 337-A, 337-B, 337-C,
342, 344 e 347 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal);
VI – contra o sistema financeiro nacional (Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, salvo o
parágrafo único do art. 4º);
VII – contra a ordem tributária ou econômica (arts. 1º a 6º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro
de 1990);
36
SENADO FEDERAL: Banco de dados: Atividades legislativas: PLS 150/2006: Texto inicial. Disponível
em: <http://www.senado.gov.br/sf/atividade/default.asp>. Acesso em: 15 de out. de 2009.
134
VIII – contra as empresas de transporte de valores ou cargas e a receptação dolosa dos bens
ou produtos auferidos por tais práticas criminosas;
IX – lenocínio e tráfico de mulheres (arts. 227 a 231 do Decreto- Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal);
X – tráfico internacional de criança ou adolescente (art. 239 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990);
XI – lavagem de dinheiro, ocultação de bens, direitos e valores (Lei nº 9.613, de 3 de março
de 1998);
XII – tráfico ilícito de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano (Lei nº 9.434, de 4 de
fevereiro de 1997);
XIII – homicídio qualificado (art. 121, § 2º, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940 – Código Penal);
XIV – falsificação, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou
medicinais (art. 273, caput e §§ 1º, 1º-A e 1º-B, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940 – Código Penal);
XV – contra o meio ambiente e o patrimônio cultural (Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de
1998);
XVI – outros crimes previstos em tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja
parte.
Pena – reclusão, de cinco a dez anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes aos
demais crimes cometidos.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem, por meio do crime organizado:
I – gere, direta ou indiretamente, ou controla, de qualquer modo, atividades econômicas ou
serviços públicos com o fim de auferir proveito econômico;
II – frauda licitações, em qualquer de suas modalidades, ou concessões, permissões e
autorizações administrativas;
III – intimida ou influencia, por qualquer dos modos de execução referidos no caput deste
artigo, testemunhas ou funcionários públicos responsáveis pela apuração de atividades do
crime organizado; impede ou dificulta, valendo-se dos mesmos modos, a investigação do
crime organizado;
IV – financia campanhas políticas destinadas à eleição de candidatos com a finalidade de
garantir ou facilitar as ações do crime organizado ou a impunidade de seus membros.
135
§ 2º Nas mesmas penas incorre, ainda, quem fornece, oculta ou tem em depósito armas,
munições e instrumentos destinados ao crime organizado; quem lhe proporciona locais para
reuniões ou, de qualquer modo, alicia novos membros.
§ 3º A pena é aumentada de um terço até a metade:
I – se a estrutura do crime organizado for constituída por mais de vinte pessoas;
II – se, na atuação do crime organizado, houver emprego de arma de fogo, concurso de agente
público responsável pela repressão criminal ou colaboração de criança ou adolescente;
III – se qualquer dos concorrentes for funcionário público, valendo-se o crime organizado
dessa condição para a prática de infração penal;
IV – se o produto ou proveito da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior.
§ 4º A pena é aumentada de metade para quem exerce o comando, individual ou coletivo, do
crime organizado, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.
§ 5º Se qualquer um dos concorrentes do crime organizado for funcionário público, o
recebimento da denúncia quanto a ele, após a defesa preliminar no prazo de dez dias, poderá
provocar o afastamento cautelar do exercício de suas funções, sem prejuízo de remuneração e
dos demais direitos previstos em lei, até o julgamento final da ação penal.
§ 6º A condenação acarretará ao funcionário público a perda do cargo, função, emprego ou
mandato eletivo, e a interdição para o exercício de função ou cargo público pelo dobro do
prazo da pena aplicada.
CAPÍTULO II
DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA
Art. 3º Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já
previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da prova:
I – colaboração premiada do investigado ou acusado;
II – interceptação de comunicação telefônica e a interceptação ambiental de sinais
eletromagnéticos, óticos ou acústicos, nos termos da legislação específica;
III – ação controlada;
IV – acesso a registros de ligações telefônicas, dados cadastrais, documentos e informações
eleitorais, comerciais e de provedores da internet;
V – quebra dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação específica.
Parágrafo único. Os meios de obtenção de provas mencionados nos incisos II a V dependerão
de prévia autorização judicial.
136
Seção I
Da colaboração premiada
Art. 4º O juiz, de ofício ou a requerimento das partes, poderá conceder o perdão judicial e
declarar extinta a punibilidade do investigado ou acusado que, sendo primário, tenha
colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde
que dessa colaboração tenha resultado, alternativamente: I – a identificação dos demais coautores e partícipes do crime organizado e das infrações penais por eles praticadas;
II – a revelação da estrutura organizacional hierárquica e da divisão de tarefas;
III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades do crime organizado;
IV – a recuperação total ou parcial do produto da infração penal;
V – a localização da eventual vítima com a sua integridade física preservada.
Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do
colaborador e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.
Art. 5º O juiz poderá ainda, presentes os requisitos dos incisos I a V do artigo anterior, reduzir
de um terço a dois terços a pena do investigado ou acusado que tiver colaborado
voluntariamente na investigação policial ou no processo criminal.
Art. 6º São direitos do colaborador:
I – usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica;
II – ter seu nome, sua qualificação e demais informações pessoais preservados durante a
investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em contrário;
III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;
IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;
V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou
filmado, sem sua prévia autorização por escrito;
VI – cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais co-réus ou condenados.
Seção II
Da ação controlada
Art. 7º Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial relativa à ação praticada
por crime organizado ou a ele vinculado, desde que mantida sob observação e
acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação
de provas e obtenção de informações.
137
§ 1º O retardamento da intervenção policial será imediatamente comunicado ao juiz que, se
for o caso, estabelecerá seus limites, após a manifestação do Ministério Público.
§ 2º A comunicação será sigilosamente distribuída de forma a não conter informações que
possam indicar a operação a ser efetuada.
§ 3º O acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e à autoridade policial,
como forma de garantir o sigilo das investigações.
Art. 8º Se a ação controlada envolver transposição de fronteiras, o retardamento da
intervenção policial somente poderá ocorrer quando as autoridades dos países que figurem
como provável itinerário do investigado oferecerem garantia contra a sua fuga e o extravio de
produtos ou substâncias ilícitas transportadas.
Seção III
Do acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações
Art. 9º A autoridade policial ou o Ministério Público, no curso da investigação policial ou da
ação penal, poderão requerer, de forma fundamentada, a autorização do juiz para a obtenção
de registros de ligações telefônicas, dados cadastrais, documentos e informações eleitorais,
comerciais e de provedores da internet.
Parágrafo único. No caso de recusa por parte do detentor da informação requisitada, o juiz,
de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade
policial, expedirá mandado de busca e apreensão.
Art. 10. As empresas de transporte possibilitarão, pelo prazo de cinco anos, acesso direto e
permanente do juiz, do Ministério Público e da autoridade policial aos bancos de dados de
reservas e registro de viagens.
Art. 11. As concessionárias de telefonia fixa ou móvel manterão, pelo prazo de cinco anos,
registros de identificação dos números dos terminais de origem e de destino das ligações
telefônicas internacionais, interurbanas e locais.
Seção IV
Dos crimes ocorridos na investigação criminal e na obtenção de prova
Art. 12. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização
por escrito.
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.
138
Art. 13. Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração
penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de crime
organizado que sabe inverídicas.
Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa.
Art. 14. Quebrar o sigilo das investigações que envolvam a ação controlada.
Pena – reclusão, de dois a quatro anos, e multa.
Art. 15. Recusar, retardar ou omitir dados cadastrais, documentos e informações eleitorais,
comerciais ou de provedores da internet, requisitados por comissão parlamentar de inquérito
ou por autoridade judicial.
Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
Art. 16. Revelar o nome, a qualificação ou demais informações pessoais da vítima,
testemunha, investigado ou acusado-colaborador que tenha a sua identidade preservada em
juízo, assim como quebrar o sigilo do respectivo procedimento judicial.
Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa.
CAPÍTULO III
DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
Art. 17. O crime organizado e as infrações penais conexas serão apurados mediante
procedimento ordinário previsto no Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código
de Processo Penal, observadas as disposições especiais do presente Capítulo.
Art. 18. O interrogatório do acusado preso poderá ser feito no estabelecimento penal em que
se encontrar, em sala própria, desde que garantidas a segurança do juiz, de seus auxiliares e
dos demais participantes, a presença do defensor e a publicidade do ato.
Parágrafo único. Antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de
entrevista reservada, e por tempo de até trinta minutos, do acusado com o seu defensor.
Art. 19. O juiz poderá determinar, em decisão fundamentada, durante o inquérito policial ou
no processo criminal, a preservação do nome, endereço e demais dados de qualificação da
vítima ou de testemunhas, assim como do investigado ou acusado colaborador.
§ 1º Não será admitida a preservação da identidade se não houver notícia de práticas de atos
de intimidação ou indícios de riscos resultantes dos depoimentos ou declarações prestados.
§ 2º A medida de que trata o caput deste artigo poderá ser decretada de ofício, mediante
representação da autoridade policial ou a pedido do Ministério Público, da vítima, da
testemunha, do investigado ou acusado colaborador e de seu defensor.
139
Art. 20. O pedido para a preservação da identidade será autuado em apartado, em
procedimento sigiloso, ouvido o Ministério Público no prazo de vinte e quatro horas,
decidindo o juiz em igual prazo.
§ 1º Se o pedido resultar de representação da autoridade policial ou de requerimento na fase
de inquérito policial, será encaminhado ao juízo competente contendo o nome, endereço e
demais dados de qualificação do beneficiário, que passará a ser identificado nos autos por
meio de um código correspondente ao seu nome.
§ 2º O Ministério Público fará constar da denúncia o código correspondente à pessoa que tem
a sua identidade preservada.
§ 3º Os mandados judiciais serão elaborados e cumpridos por funcionário, designado pelo
juiz, que deverá fazê-los, em separado, individualizados, garantindo que o nome e o endereço
das pessoas preservadas permaneçam desconhecidos.
§ 4º Os mandados cumpridos serão entregues ao escrivão do cartório judicial, que procederá a
juntada no procedimento instaurado para a preservação da identidade.
§ 5º Os autos do pedido de preservação ficarão sob a guarda da Corregedoria-Geral da Justiça,
podendo a eles ter acesso apenas o juiz, o Ministério Público, a autoridade policial e o
defensor da pessoa protegida.
Art. 21. O juiz poderá autorizar, a requerimento da defesa e se entender imprescindível, ante
as circunstâncias do caso concreto, a revelação do nome e do eventual apelido da vítima, da
testemunha e do acusado colaborador, mediante decisão fundamentada, após a concordância
da pessoa protegida e de seu defensor, e manifestação do Ministério Público.
Art. 22. Determinada a medida de que trata o art. 19 desta Lei, os depoimentos das
testemunhas, as declarações da vítima e as respostas do investigado ou acusado colaborador
apenas terão relevância probatória quando roborados [Sic. – corroborados] por outros meios
de prova.
Art. 23. O prazo para encerramento da persecução criminal, nos processos por crime de que
trata esta Lei, será de cento e vinte dias quando o réu estiver preso.
Art. 24. O Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da
autoridade policial, ouvido o Ministério Público em vinte e quatro horas, havendo indícios
suficientes, poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o
seqüestro de bens, direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos
crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do Decreto-Lei 3.689,
de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal.
140
§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se a ação penal não for
iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da data em que ficar concluída a diligência.
§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens direitos e valores apreendidos ou seqüestrados,
quando comprovada a licitude de sua origem.
Art. 25. O juiz, na hipótese de sentença condenatória, decidirá fundamentadamente, com base
em elementos do processo, sobre a necessidade do acusado recolher-se à prisão para apelar.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 26. O sigilo da investigação criminal poderá ser decretado pela autoridade judicial
competente, para garantia da celeridade e da eficácia das diligências investigatórias.
Parágrafo único. Determinado o depoimento do investigado, seu advogado terá prévia vista
dos autos, com tempo suficiente para o conhecimento completo da investigação.
Art. 27. Legislação específica disporá sobre a regulamentação dos procedimentos desta Lei
relativos à competência e atribuições do órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência –
SISBIN.
Art. 28. O art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de l940 – Código Penal, passa
a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 288. Associarem-se três ou mais pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer
infração penal.
Pena – reclusão, de dois a quatro anos.
Parágrafo único. A pena será aumentada de metade se houver emprego de arma de fogo ou
participação de criança ou adolescente. (NR)”
Art. 29. O art. 342 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de l940 – Código Penal, passa
a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 342. ….......................……………………………….….
Pena – reclusão, de dois a quatro anos, e multa.
......................................................................................... (NR)”
Art. 30. Esta Lei entra em vigor quarenta e cinco dias após a sua publicação.
Art. 31. Revoga-se a Lei nº 9.034, de 3 de maio de l995.
141
ANEXO B
PRINCIPAIS OCRIM(S) NOS ESTADOS DE SÃO PAULO E RIO DE JANEIRO 37
OCRIM(S) /HISTÓRICO
Primeiro Comando da
Capital (PCC)
Surgiu na Casa de Custódia e
Tratamento de Taubaté.
Seita Satânica (SS)
Surgiu na Casa de Detenção
de São Paulo, se aliando ao
PCC.
Comando Revolucionário
Brasileiro da
Criminalidade (CRBC)
Surgiu na Penitenciária José
Parada Neto, Guarulhos/SP.
DISSIDÊNCIAS
SURGIMENTO
Terceiro Comando da Capital
(TCC)
Surgiu em 2002.
Em 31 de agosto de
1993.
–
Em 1994.
–
Em 1999.
Quadro 1 – Principais organizações criminosas que atuam no estado de São Paulo.
OCRIM(S) /HISTÓRICO
Comando Vermelho (CV)
Surgiu no Presídio da Ilha
Grande/RJ.
Terceiro Comando (TC)
Surgiu nos presídios do RJ
em oposição ao CV. Foi
substituída por suas
dissidências.
Amigos dos Amigos (ADA)
Surgiu nos presídios do RJ
das dissidências do CV e TC.
Formou aliança com o TC
para enfrentar o CV.
Milícias (Liga da Justiça)
Pequenas OCrim(s) formadas
por Policiais e Bombeiros
que cobram pelo serviço de
segurança.
DISSIDÊNCIAS
SURGIMENTO
Comando Vermelho Jovem
(CVJ).
Década de 1980, com
esse nome.
Terceiro Comando Puro (TCP)
Década de 1990.
Terceiro Comando Jovem (TCJ).
Após 2002, se dividiu:
Parte dos membros ingressou no
Terceiro Comando Puro (TCP).
Década de 1990.
Existem várias milícias espalhadas
atuando no estado do RJ. A mais
conhecida é a Liga da Justiça.
Década de 1970.
Quadro 2 – Principais organizações criminosas que atuam no estado do Rio de Janeiro.
37
Fontes: MALAGUETA, 2007; UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME (UNODC), 2009.
142
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Edson Carlos Soares De Almeida