UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA – UCB
GRADUAÇÃO EM DIREITO
Dois Pontos Controversos do Processo
Administrativo Fiscal Federal:
I - Possibilidade de os Conselhos de Contribuintes
deixarem de aplicar lei ou ato normativo por considerá-los
inconstitucionais;
II - Possibilidade de revisão das decisões dos Conselhos de
Contribuintes pelo Poder Judiciário.
Aluno: Benício Ferraz Zinato
Orientador: Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho
Brasília
2006
Aos meus pais Nelson e Dória; às minhas
mães afetivas Anelita e Maria Moraes; às
minhas irmãs Brígida, Brícia, Brênia e
Maria da Conceição; aos meus sobrinhos
Pedro José e Manuela - paixões da minha
vida; aos meus cunhados Abreu e
Cristiano e ao estimado amigo Paulo
Bosco.
À Deus - meu Pai amado que me ajudou a
superar momentos difíceis de minha vida.
À minha família - base de tudo.
Ao meu prezado orientador.
“Se deixares de lutar pelo direito luta pela
justiça”.
Dos mandamentos do advogado
Eduardo Couture
LISTA DE SIGLAS
SIGLAS
CF – Constituição Federal
PAF – Processo Administrativo Fiscal
LGPAF – Lei Geral do Processo Administrativo Federal
CTN – Código Tributário Nacional
SRF – Secretaria da Receita Federal
MPF – Mandado de Procedimento Fiscal
DRJ – Delegacia da Receita Federal de Julgamento
MF – Ministério da Fazenda
CC – Conselhos de Contribuintes
RICC – Regimento Interno dos Conselhos de Contribuintes
IR – Imposto sobre a Renda
CSL – Contribuição Social sobre o Lucro
LC – Lei Complementar
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
IOF – Imposto sobre Operações Financeiras
PIS/PASEP – Contribuições para o Programa de Integração Social e de
Formação do Servidor Público
COFINS – Contribuições para o Financiamento da Seguridade Social
FINSOCIAL – Contribuições para o Fundo de Investimento Social
CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de
Valores e de Créditos e de Direitos de Natureza Financeira
II – Imposto sobre Importação
IE – Imposto sobre Exportação
SIMPELS – Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições
de Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte
ITR – Imposto sobre Propriedade Territorial Rural
CSRF – Câmara Superior de Recursos Fiscais
STF – Supremo Tribunal Federal
RE – Recurso Extraordinário
PGFN – Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
SUMÁRIO
Introdução_________________________________________________________ 9
Capítulo 1 - Processo Administrativo Fiscal Federal - PAF
1.1. Considerações gerais___________________________________________________ 12
1.2. O Decreto n. 70.235/1972 e a Lei n. 9.784/1999______________________________13
1.3. Características do Processo Administrativo Fiscal____________________________16
1.4. Princípios comuns ao Procedimento e ao Processo Administrativo Fiscal_________17
1.5. Princípios do Processo Administrativo Fiscal________________________________20
1.6. O início do Procedimento Fiscal__________________________________________ 22
1.7. Da Intimação_________________________________________________________ 23
1.8. O Auto de Infração_____________________________________________________23
1.8.1. A Impugnação ao Auto de Infração - O Início do PAF______________________ 24
Capítulo 2 - Do Julgamento no Processo Administrativo Fiscal Federal
2.1. Do Julgamento em Primeira Instância
2.1.1. As Delegacias da Receita Federal de Julgamento_____________________26
2.2. Do Julgamento em Segunda Instância - Da Fase Recursal
2.2.1. Os Conselhos de Contribuintes - CC_____________________________________ 27
2.2.2. Competência dos Conselhos de Contribuintes______________________________29
2.2.3. O Recurso Voluntário para os Conselhos de Contribuintes___________________ 31
2.2.4. Remessa de Ofício para os Conselhos de Contribuintes______________________ 33
2.2.5. Da Decisão em forma de acórdão ou resolução_____________________________33
2.2.6. Dos Embargos e Inexatidões Materiais___________________________________ 34
2.2.7. Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF_____________________________ 34
2.2.7.1. Recurso à CSRF - Recurso Especial (Administrativo)______________________36
2.2.7.2. Recurso à CSRF - Recurso Voluntário__________________________________38
Capítulo 3 - Possibilidade de os Conselhos de Contribuintes deixarem de aplicar
lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais
3.1. A autoridade administrativa, como julgadora no processo administrativo fiscal, pode
deixar de aplicar lei ou ato normativo por considerá-los contrários aos preceitos
constitucionais?___________________________________________________________40
3.2. Corrente que defende a impossibilidade de os Conselhos de Contribuintes deixarem de
aplicar lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais___________________ 40
3.3. Corrente que defende a possibilidade de os Conselhos de Contribuintes deixarem de
aplicar lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais___________________ 48
3.4. Corrente que prevalece_________________________________________________ 52
Capítulo 4 - Possibilidade de revisão das decisões dos Conselhos de
Contribuintes pelo Poder Judiciário___________________________________ 56
4.1. Corrente defensora da tese de que a Fazenda Nacional não pode recorrer ao
Judiciário para anular decisão administrativa que lhe foi desfavorável______________ 56
4.1.1. Exceções____________________________________________________________64
4.1.2. A Inconstitucionalidade do Parecer da Procuradoria da Fazenda Nacional n. 1.087
de 19.07.2004 (Submissão ao Poder Judiciário de decisões do Conselho de Contribuintes
do Ministério da Fazenda contrárias à Fazenda Nacional).________________________64
4.2. Corrente defensora da possibilidade de recurso judicial por parte da Fazenda
Nacional contra as decisões prolatadas pelos Conselhos de Contribuintes que lhe forem
desfavoráveis_____________________________________________________________ 66
Conclusão_______________________________________________________________ 74
Referências______________________________________________________________ 77
9
INTRODUÇÃO
Neste trabalho acadêmico é objeto de pesquisa o Processo Administrativo
Fiscal – PAF, no âmbito federal que mostrará para os leitores uma visão simplificada
e clara do funcionameto dos órgãos judicantes da Administração Pública Federal.
Além disso, demonstra a importância do PAF para o julgamento das lides
tributárias, assegurando aos contribuintes, por exemplo, a possibilidade de
discutirem com o Fisco (e não somente no Judiciário) supostas ilegalidades e
arbitrariedades no lançamento de determinados tributos, ocasionando com isto a
suspensão da exigibilidade do crédito tributário até o julgamento final que será
proferido pelos Conselhos de Contribuintes do Ministério da Fazenda por meio da
instância especial denominada Câmara Superior de Recursos Fiscais.
Esta monografia é composta por quatro capítulos, sendo que, o “capítulo 1”
abrange um estudo do Processo Administrativo Fiscal de uma forma geral, desde o
seu
surgimento,
passando
pela
legislação
regulamentadora,
princípios,
características, até a diferenciação que há entre procedimento e processo
administrativo fiscal.
Posteriormente, o “capítulo 2”, trata da formação de toda a estrutura de
julgamento do processo administrativo fiscal que é bastante similar àquela existente
no Judiciário, composta pela primeira e segunda instância administrativas.
A primeira instância inicia-se com a impugnação do auto de infração (pelo
contribuinte) e o seu julgamento pelas Delegacias da Receita Federal de
Julgamento.
Em contrapartida, o acesso à segunda instância aos contribuintes só é
possível graças à possibilidade que eles têm de recorrer a uma instância superior
(Conselhos de Contribuintes e Câmara Supeior de Recursos Fiscais) das decisões
de primeira instância que lhes forem desfavoráveis, sendo assim, garantido a estes a
ampla defesa, que consiste em um direito assegurado constitucionalmente.
Já os “capítulos três e quatro” tratam da temática central desta monografia,
que consiste em analisar dois aspectos controvertidos existentes no Processo
Administrativo Fiscal Federal, quais sejam: se os Conselhos de Contribuintes podem
10
deixar de aplicar lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais sem mesmo
antes de terem sido declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal;
bem como a possibilidade de revisão das decisões administrativas definitivas
desfavoráveis ao Fisco pelo Poder Judiciário.
É importante ressaltar que são temas bastante polêmicos, haja vista que
existem divergências tanto por parte da doutrina especializada quanto pela
jurisprudência dos Conselhos de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos
Fiscais.
Em relação ao primeiro tema analisado no “capítulo 3” são apresentadas
correntes formadas por juristas e julgadores os quais têm entendimentos diferentes
sobre a possiblidade dos Conselhos de Contribuintes, incluindo a Câmara Superior
de Recursos Fiscais, terem ou não competência para deixar de aplicar lei ou ato
normativo que considerem inconstitucionais, uma vez que o controle de
constitucionalidade é privativo do STF.
E, finalmente, no “capítulo quatro” é abordado outro tema bastante intrigante
que diz respeito à possibilidade da Fazenda Pública Nacional recorrer ao Judiciário
das decisões administrativas que lhe forem desfavoráveis, direito este que é
assegurado a qualquer tempo ao contribuinte. Resta saber se pode ser invocado
pela Administração os Princípios do “Contraditório e da Ampla Defesa” e “da
Igualdade” como um dos argumentos para garantir seu acesso ao Judiciário e se a
decisão final administrativa faz coisa julgada ou se sofre os efeitos da preclusão.
Outro fator que torna esse tema bastante discutido na seara jurídica é aquele que
garante de uma forma unânime aos contribuintes o direito de buscarem rever as
deciões administrativas que lhes forem desfavoráveis no Judiciário, porém o mesmo
não pode ser dito em relação à Administração.
Além disso, o tema escolhido para ser desenvolvido neste trabalho de
conclusão de curso de graduação chama a atenção por ser bastante rico pois
abrange não só o Direito Tributário material e processual, como também, os direitos
Constitucional, Administrativo e Processual Civil.
Este trabalho acadêmico não tem a intenção de influenciar a mudança de
opinião ou de entendimento dos leitores acerca do tema, mas demonstrar o quanto o
Direito é enriquecedor e instigante, pois sempre traz entendimentos diversos sobre
11
um mesmo tema, como não é diferente com este aqui analisado sobre vários
ângulos.
Boa leitura a todos!
12
CAPÍTULO 1
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL FEDERAL – PAF
1.1. Considerações Gerais
O conceito de processo administrativo, de uma forma ampla, exprime a idéia
de que os mecanismos de controle da legalidade dos atos administrativos devem
obedecer a um princípio de jurisdicionalização, ou seja, ao modelo de processo que
desenvolve nos tribunais, ressalvadas as especificidades decorrentes da natureza
não independente do órgão de julgamento, integrado na Administração.
O Processo Administrativo Fiscal, propriamente dito, “disciplina o regime
jurídico para a solução das lides fiscais formalizadas perante a administração
tributária, cuidando das impugnações, atos processuais administrativos, produção de
provas, julgamento da lide e seus recursos administrativos, sob a regência do
princípio da ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes”1.
É um mecanismo alternativo de composição de lides tributárias, situando-se
em verdadeira posição para-judicial, ao lado assim do modelo jurisdicional de
solução de conflitos de interesse.
O Processo Administrativo Fiscal tem a finalidade de dar oportunidade ao
sujeito passivo da relação obrigacional tributária de exercer o direito, assegurado
constitucionalmente, de discutir a exigência tributária.
Ressalta-se que o processo na esfera administrativa é muito menos oneroso
e muito mais informal, constituindo um poderoso instrumento do exercício da
cidadania.
Em um contexto histórico, o sistema brasileiro de solução administrativa das
lides tributárias, por meio do surgimento do processo administrativo remonta de
1889, sendo fruto de lenta evolução legislativa que vem tendendo, de forma
desordenada e tímida, à edição de normas especificamente voltadas ao processo
1
MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro (Administrativo e Judicial). 3. ed. São Paulo:
Dialética, 2003, p. 96.
13
administrativo sem que, no entanto, se verifique o necessário empenho na criação
de norma geral (nacional) que regulamente a matéria de forma ampla e sistemática.
A revigoração constitucional do processo administrativo brasileiro deu-se
somente a partir da Constituição Federal de 1988 que consagrou o processo
administrativo como garantia fundamental, individual do cidadão e informado pelos
princípios do Contraditório e da Ampla Defesa previstos na CF/88, art. 5º, LV: “aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes”.
Subsistem entre nós as normas processuais existentes na Constituição
Federal de 1998, no Código Tributário Nacional, no Decreto n. 70.235/72 (que regula
o Processo Administrativo Fiscal na esfera federal - PAF), na Lei 9.784/99 (Lei Geral
do Processo Administrativo Federal - LGPAF) e nas legislações estaduais e
municipais.
1.2. O Decreto n. 70.235/1972 e a Lei n. 9.784/1999
O Decreto n. 70.235 de 06 de março de 1972, que regula o Processo
Administrativo Fiscal Federal, é ato normativo exarado pelo Poder Executivo que,
embora sem ter origem congressual, foi recepcionado em nosso sistema como lei
ordinária em virtude da norma inserida no art. 22, I, da CF/88 (competência da União
para legislar sobre processo). O Decreto sob enfoque foi editado como ato
administrativo do Poder Executivo com fundamento no Decreto-Lei n. 822/69, art. 2º:
“O Poder Executivo regulará o processo administrativo de determinação e exigência
de créditos tributários federais, penalidades, empréstimos compulsórios e o de
consulta”.
A própria jurisprudência da Justiça Federal é uniforme no sentido de que o
Decreto n. 70.235/72 tem status de lei, uma vez que foi editado por delegação de
competência do Poder Legislativo.
Tal orientação jurisprudencial pode ser representada pelo seguinte julgado
do Tribunal Federal de Recursos (MAS 106.747-DF), com o voto proferido pelo
14
Ministro Ilmar Galvão, conforme cita o material da Secretaria da Receita Federal
utilizado no Programa de Formação do edital ESAF 19/2000:
“Cabe, aqui, portanto, a reprodução dos argumentos que foram por
mim expendidos na AMS 106.307-DF, onde a questão da
competência do Presidente da República para editar normas de
processo foi assim enfocada: o Decreto-Lei n. 822, de 05/09/1969,
editado pelos Ministros Militares, com base nos Atos Institucionais 05
e 12, delegou em seu art. 2º, ao Poder Executivo, competência para
regular o processo administrativo de determinação e exigência de
créditos tributários federais. Achava-se o País sob o império de duas
ordens jurídicas: uma constitucional e outra institucional. Ambas
coexistiam, cada qual operando em seu setor próprio. Entre os
poderes atribuídos ao Presidente da República encontrava-se o de
legislar sobre todas as suas matérias, decretando desta forma o
recesso parlamentar, com o Ato Complementar 38, de 13/12/68.
No exercício destas atribuições legislativas, editaram os Ministros
Militares, em 05/09/69, (quando investidos temporariamente das
funções de Presidente da República, por força do Ato Institucional n.
12, de 31/08/69), o Decreto-Lei n. 822 que, em seu art. 2º, delegou
ao
Poder
Executivo
competência
para
regular
o
processo
administrativo de determinação e exigência de créditos tributários
federais. Em 17 de outubro de 1969, as mesmas autoridades
promulgaram a Emenda Constitucional n. 01, que entrou em vigor no
dia 30 do mesmo mês. Em seu art. 181, III, a aludida emenda
aprovou e excluiu de apreciação judicial, entre outros atos, os de
natureza legislativa, expedidos com base nos atos institucionais e
complementares indicados no item 1. Vale dizer que, conquanto haja
a nova Constituição vedado a delegação de atribuições (art. 6º,
parágrafo único), e reservado à lei federal toda a matéria de Direito
Processual e de Direito Financeiro (art. 18, § 1º), permaneceu, como
se viu, com plena vigência o Decreto-Lei n. 822/69. Invocando a
delegação contida neste diploma legal, baixou o Presidente da
República, em 06/03/72, o Decreto n. 70.235/72 (...)”2.
2
BORBA, Cláudio. Processo Administrativo Federal e do INSS anotados e comentados: teoria,
jurisprudência e provas de concursos anteriores. Niterói: Impetrus, 2004, pp. 20 e 21.
15
Tenha-se presente que ao referido Decreto é aplicável subsidiariamente a
Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999 (doravante LGPAF), a qual estabelece, em
níveis federais, normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos
direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração. Esta
Lei tornou a interpretação e aplicação do Decreto n. 70.235/72 mais compatível com
o atual estágio de evolução do processo administrativo brasileiro.
É precisamente a grande abrangência principiológica da LGPAF que
determina a extensão de sua aplicação subsidiária ao Decreto n. 70.235/72, já que
este Decreto do Poder Executivo, que disciplina há mais de trinta anos o processo
fiscal federal, não cuidou de elencar explicitamente princípios da atividade
administrativa julgadora. Portanto, os dois regimes (geral e especial) são
complementares em suas finalidades e devem ser objeto de leitura e interpretação
conjugada, consoante James Marins.
A Lei n. 9.784/99 encontra variado espectro de atuação, pois informa todo o
processo administrativo no âmbito da administração direita e indireta federal. Além
disso, tem como ponto de partida a proteção dos direitos dos administrados e visa o
melhor cumprimento dos fins da administração (art. 1º, caput).
O denominado Processo Administrativo Fiscal Federal (PAF), em sentido
amplo, abrange duas fases: a primeira, denominada procedimento fiscal, que
consiste na ação de fiscalização a cargo da Secretaria da Receita Federal para
constituição dos créditos tributários; a segunda fase, que é o processo fiscal, em
sentido estrito, tem início com a impugnação do lançamento efetuado pela
autoridade fiscal (auto de infração) na fase anterior. As normas relativas a
procedimentos são dadas pelos artigos 7º ao 22º do Decreto n. 70.235/72.
O momento em que se inicia o procedimento fiscal é um marco da maior
relevância, tanto para a Administração quanto para o administrado. Isso porque o
início do procedimento fiscal é fundamental para a contagem dos prazos e,
principalmente, porque é a partir dele que são gerados os efeitos jurídicos inerentes
ao procedimento fiscal.
16
1.3. Características do Processo Administrativo Fiscal
São características do Processo Administrativo Fiscal, na concepção de
Cláudio Borba:
- INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO TRIANGULAR – No processo
administrativo, a administração é parte e julgador ao mesmo tempo.
Existem autores que declaram ser um exagero se falar em processo
administrativo, eis que, na verdade, para eles, não há composição de
litígio com os três elementos subjetivos que lhe são típicos (autor, réu
e julgador), o que só aconteceria na esfera judiciária.
- LIMITAÇÃO DA EFICÁCIA DAS DECISÕES - no Brasil, as
decisões administrativas, mesmo que proferidas em última instância,
são anuláveis via Poder Judiciário (entendimento que possui
divergências). É o princípio da “universalidade da jurisdição”, ou
“tutela jurisdicional”, ou ainda “inafastabilidade de apreciação pelo
Judiciário (art. 5º, XXXV da CF).
- NÃO POSSUIR CARÁTER EXPROPRIATÓRIO – Em sendo
decidida definitivamente na órbita administrativa a procedência do
crédito tributário (tributo e / ou multa são devidos), a Administração
só pode executar o patrimônio do sujeito passivo pela via judicial,
através de uma ação de execução fiscal.
- COMPOSIÇÃO – A Administração julgadora ou judicante seria o
termo que designa a estrutura montada dentro do Poder Executivo
para o julgamento dos processos administrativos. Tal estrutura é
análoga à do Poder Judiciário, possuindo autoridades julgadoras de
primeira instância (órgãos singulares) e colegiados de julgadores de
segunda instância (órgãos coletivos), que reexaminam as decisões
de primeira, em havendo recursos.
- LEI DE REGÊNCIA – Por se tratar de controle interno da legalidade
dos atos da Administração (o processo administrativo é disciplina
muito mais afeta ao Direito Administrativo do que ao Processual ou
Tributário), cada pessoa política estabelece as normas sobre o
processo administrativo dos tributos de que tem competência para
instituir. Portanto, a União tem suas normas (Decreto n. 70.235/72),
17
cada Estado membro as suas e a mesma coisa acontecendo com os
Municípios.3
Essas regras definem os órgãos incumbidos do julgamento (em geral,
órgãos especializados que integram a própria estrutura da respectiva Fazenda
Pública ou autarquia incumbida da administração do tributo), prazos processuais,
recursos cabíveis e outras formalidades.
A que se destacar que o processo administrativo é uma mera opção para o
sujeito passivo que pode, a qualquer momento, socorrer-se da via judicial, sem a
necessidade de exaurir as instâncias administrativas.
Modernamente, visando promover a imparcialidade, em geral são criados
órgãos julgadores com relativa autonomia dos órgãos lançadores do crédito
tributário, a fim de que se evite a pressão hierárquica, o coleguismo nocivo e o
corporativismo.
Ainda visando a imparcialidade, é muito comum que os colegiados sejam
formados em representação paritária (parte dos membros são funcionários do fisco,
outra parte, representantes dos contribuintes).
1.4. Princípios comuns ao Procedimento e ao Processo Administrativo
Fiscal
Conforme observado por James Marins “o regime do procedimento e do
processo administrativo contém um núcleo lógico-jurídico comum consubstanciado
em princípios de observância obrigatória em ambas as fases do caminho percorrido
pela Administração desde a formalização da pretensão até o julgamento da eventual
lide tributária. Este núcleo principiológico comum é composto por um conjunto de
seis princípios que conferem coesão à atividade tributária estatal”4.
a. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE OBJETIVA. O princípio da legalidade é
primado universal do Direito. Está consagrado no art. 5º, II; art. 37, caput; art. 150, I,
todos da Constituição Federal de 1988. No plano infraconstitucional a legalidade
3
BORBA, Cláudio. Processo Administrativo Federal e do INSS anotados e comentados: teoria,
jurisprudência e provas de concursos anteriores. Niterói: Impetrus, 2004, pp. 22/24.
4
MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro (Administrativo e Judicial). 3. ed. São Paulo:
Dialética, 2003, pp. 175 e 176.
18
tributária é reafirmada no art. 3º do Código Tributário Nacional. No âmbito do
processo administrativo federal a Lei n. 9.784/99 consagra logo em seu art. 1º a
observância do princípio da legalidade. Além disso, na mesma lei, a legalidade e a
justiça aparecem justapostas no inc. I do art. 2º, sob a forma e obrigatoriedade de
atuação conforme a lei e o Direito.
O princípio da legalidade objetiva tem a finalidade de realçar o caráter
objetivo e impessoal do atuar do agente administrativo (como decorrência do
princípio da impessoalidade) e em contraste com o caráter subjetivo (pessoal) da
esfera jurídica do particular e amparando e fundamentando a aplicação do princípio
da imparcialidade.
Este princípio deve governar, sob pena de invalidade, toda atividade
procedimental e processual tributária que irá se desenvolver em estrita vinculação
com a lei e para a finalidade de preservar a aplicação do sistema jurídico tributário.
A legalidade objetiva é o corolário do princípio da autotutela-vinculada da
administração tributária, o que significa dizer que embora o Estado tenha a
prerrogativa de promover todas as providências necessárias para a formalização de
sua relação de crédito em face do contribuinte, somente pode fazê-lo com
obediência à norma jurídica que disciplina e instrumentaliza sua atuação.
Nenhum ato administrativo-fiscal , seja de formalização seja de julgamento,
pode ser discricionário, pois as atividades administrativo-fiscais de fiscalização,
apuração, lançamento e julgamento são atividades plenamente vinculadas (art. 3º do
CTN) que devem atender às normas jurídicas de procedimento e processo com a
finalidade de aplicar a lei e o Direito na exata medida da inteireza constitucional e
infraconstitucional do sistema jurídico que rege a relação jurídico-tributária, e desse
modo preserva a distribuição da justiça sob o ponto de vista do Direito.
b. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO. A função tributária do Estado deve se
realizar por meio de atividade administrativa plenamente vinculada. O art. 3º do CTN
refere-se a tributo como a prestação pecuniária cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada. Também o parágrafo único do art. 142 do CTN
prescreve que a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória.
Dá-se a vinculação do ato ou do procedimento administrativo quando existe
prévia e objetiva tipificação legal do comportamento da Administração, inexistindo
19
para o agente terreno de apreciação subjetiva. Ato vinculado é o oposto de ato
discricionário, naquele deve haver estrita correspondência entre o comando da
norma ao administrador e o ato praticado e neste a norma jurídica confere ao agente
a faculdade de escolher subjetivamente os caminhos possíveis abertos pela norma.
c. PRINCÍPIO DA OFICIALIDADE. A autoridade administrativa tem a
obrigação de promover a impulsão oficial ao procedimento e ao processo
administrativo, mesmo nos casos que tenha sido iniciado pelo contribuinte, já que no
âmbito administrativo não vigora o princípio dispositivo que atribui às partes o ônus
processual concernente à continuidade do feito.
O avanço do procedimento ou do processo promovido ex officio é condição
para que o interesse público seja objetivamente realizado, cumprindo-se
adequadamente com o dever de investigação e promovendo (autonomamente mas
sob estrita vinculação legal) a tutela dos interesses tributários do Estado.
d. PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL. Busca pela aproximação entre a
materialidade do evento econômico e sua formalização por meio do lançamento
tributário. Em outras palavras, o dever de investigação da Administração e o dever
de colaboração por parte do particular têm por finalidade propiciar a aproximação da
atividade formalizadora com a realidade dos acontecimentos.
No processo administrativo fiscal a autoridade administrativa pode e deve
promover as diligências averiguatórias e probatórias que contribuam para a
aproximação com a verdade objetiva ou material.
e. PRINCÍPIO DO DEVER DE INVESTIGAÇÃO. Para a consecução de seus
objetivos fiscais a Administração tributária tem o dever de investigar as atividades
dos particulares de modo a identificar aquelas que guardem relação com as normas
tributárias e, em sendo o caso, proceder ao lançamento do crédito. O art. 145, § 1º
da CF/88 faculta à Administração tributária identificar o patrimônio, os rendimentos e
as atividades econômicas dos contribuintes, desde que observados os direitos
individuais.
Estabelece o parágrafo único do art. 142 do CTN que a atividade de
lançamento (que compreende, quando necessário, a tarefa de fiscalização) é
obrigatória sob pena de responsabilidade funcional.
20
O dever de investigar deve corresponder a poderes investigatórios,
entretanto, não são ilimitados, pois encontram barreiras no campo das garantias
individuais do cidadão, como aquelas previstas no art. 5º da Constituição.
f. PRINCÍPIO DO DEVER DE COLABORAÇÃO. Contribuintes e terceiros
têm não apenas a obrigação de fornecer os documentos solicitados pela autoridade
tributária, mas também o dever de suportar as atividades averiguatórias.
O dever de colaboração vai até o limite legal concernente às mesmas
garantias que limitam os poderes de investigação da Administração tributária.
O art. 4º da Lei n. 9.784/99 tornou explícitos os deveres do administrado,
que se alinham, de modo genérico, com o princípio do dever de colaboração do
indivíduo para com a Administração e evidenciam seu conteúdo ético: I – expor os
fatos conforme a verdade; II – proceder com lealdade, urbanidade e boa-fé; III – não
agir de modo temerário; IV – prestar as informações que lhe forem suscitadas e
colaborar para o esclarecimento dos fatos.
1.5. Princípios do Processo Administrativo Fiscal
a. PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. Este princípio expressa as
garantias elementares das quais derivam vários princípios de processo tanto
administrativo quanto judicial. As garantias individuais elementares do processo
administrativo tributário devem ser observadas no âmbito do processo fiscal da
União, Estados, Distrito Federal e Municípios, uma vez que representam as
implicações jurídicas mais diretas das cláusulas constitucionais expressas do devido
processo legal.
b. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. O crédito fiscal do Estado cristalizado
no ato de lançamento e notificado ao contribuinte exprime pretensão do ente
tributante sobre o patrimônio do cidadão. Pretensão de tal natureza, por submeter-se
à cláusula constitucional segundo a qual ninguém será privado de seus bens sem o
devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/88), somente será válida quando obedecer às
garantias
materiais
e
processuais
dos
contribuintes.
Este
intrinsecamente ligado ao Princípio da Ampla Defesa (art. 5º, LV).
princípio
está
21
Assim, não é lícito à administração, no âmbito processual, produzir
informações, argumentos ou elementos de fato ou de direito, sem que seja
concedida ao contribuinte a oportunidade de se manifestar.
c. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. Todo processo administrativo, para que
se afigure constitucionalmente válido, deve ensejar ao particular a possibilidade de
ver conhecidas e apreciadas todas as suas alegações e de produzir todas as provas
necessárias à comprovação de suas alegações.
Toda a matéria de defesa produzida pelo contribuinte deve ser conhecida e
apreciada pelo órgão da administração encarregado do julgamento do conflito fiscal.
Não pode se escusar a autoridade julgadora de apreciar matéria de Direito ou de
fato, questões preliminares ou de mérito.
d. PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE COGNIÇÃO. A idéia de revisão recursal
dos julgamentos administrativos ou judiciais atende a necessidades de qualidade e
segurança da pretensão estatal julgadora. Representa o direito a recurso (direito a
ampla defesa).
Denomina-se de “hierárquico” o recurso que submete a revisão da decisão a
órgão julgador, monocrático ou colegiado, de hierarquia superior, competente para a
reapreciação e rejulgamento da lide fiscal. Para que se dê cumprimento ao
dispositivo constitucional em tela, a estrutura administrativa destinada ao julgamento
das lides fiscais deve comportar ao menos uma etapa de revisão hierárquica dos
julgamentos fiscais.
e. PRINCÍPIO DO JULGADOR COMPETENTE. Os órgãos julgadores
administrativos devem ser dotados de julgadores imparciais, ter competência
julgadora previamente estabelecida na legislação e adequados mecanismos prévios
de determinação de competência para cada caso concreto que lhes for submetido à
apreciação.
Por outras palavras, a causa deve ser julgada por autoridade julgadora
imparcial, competente, pré-constituída pela lei, isto é, constituído primeiro que o fato
a ser julgado. Este princípio decorre do disposto nos incisos XXXVII e LIII do art. 5º
da CF/88.
22
1.6. O Início do Procedimento Fiscal
O início do procedimento fiscal depende na maioria das vezes, de acordo
com a Portaria SRF 3.007, de 26 de novembro de 2001, da emissão de Mandado de
Procedimento Fiscal – MPF, que deverá ser apresentado pelos Auditores Fiscais da
Secretaria da Receita Federal ao contribuinte na execução do procedimento fiscal. A
sua instituição visa dar maior transparência ao trabalho fiscal e maior segurança ao
contribuinte sobre qual será o objeto desta atividade.
Ao receber um Mandado de Procedimento Fiscal o contribuinte pode
verificar a autenticidade do mesmo com a utilização do programa Consulta Mandado
de Procedimento Fiscal na página da Secretaria da Receita Federal na internet.
Com relação ao objeto do Mandado de Procedimento Fiscal, a jurisprudência
dos Conselhos de Contribuintes do Ministério da Fazenda tem uma interpretação
ampla, considerando a cláusula genérica de que o mesmo pode abranger os tributos
e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal nos últimos cinco
anos.
Um dos efeitos mais importantes da formalização do início do procedimento
de fiscalização é a exclusão da espontaneidade do contribuinte para fins de
recolhimento nos termos do art. 138 do Código Tributário Nacional, que trata da
denúncia espontânea. Porém, esta exclusão dá-se apenas em relação aos tributos
em fiscalização, dentro dos períodos em que estejam sendo examinados, e em
relação à matéria em exame, constantes dos termos que registram o início da
fiscalização.
O Mandado de Procedimento Fiscal se extingue pela conclusão do
procedimento fiscal.
1.7. Da Intimação
A intimação é o ato pelo qual o sujeito passivo é convocado pela autoridade
fiscal para cumprir alguma obrigação ou exigência a ela imposta. O lançamento só
se aperfeiçoa após a intimação regular do sujeito passivo.
23
As intimações são freqüentes no processo administrativo, quer na fase
procedimental, quer na fase processual e o momento exato em que a intimação se
completa é de importância fundamental para fins de contagem de prazos para que o
sujeito passivo promova a extinção do crédito, normalmente por meio de pagamento.
No Processo Administrativo Fiscal, apenas o art. 23 do Decreto n. 70.235/72,
trata da matéria prevendo três modos diferentes para se promover a intimação:
pessoalmente; por via postal ou outro modo semelhante a ele; e por edital.
Ainda sobre a intimação deve se atentar para as regras que o artigo 23 do
PAF traz quanto ao momento em que a intimação se completa, conforme seu
parágrafo 2º. Para o caso de intimação via postal ou telegráfica, se não constar do
aviso a data do recebimento, há um prazo de 15 dias para que se complete a
intimação. O mesmo ocorre com a intimação via edital que só se aperfeiçoa após 15
dias da data de sua publicação ou afixação.
1.8. O Auto de Infração
O auto de infração, previsto no art. 10 do Decreto n. 70.235/72, formaliza a
exigência do crédito tributário, decorrente de uma atividade de fiscalização (uma
atividade externa ao órgão administrador do tributo), materializando o lançamento.
Por ser um ato administrativo resultante de atividade vinculada (art. 142 do
CTN), a constituição do crédito por meio do lançamento goza dos atributos próprios
dos atos administrativos. Assim, o Auto de Infração tem os atributos consagrados
doutrinariamente (presunção de legitimidade, executoriedade, imperatividade e
exigibilidade) desde que se comprove sua validade por ter sido emanado por sujeito
competente, segundo a formalidade prevista em lei, incidente sobre objeto possível,
possuindo motivos adequados ao conteúdo e dirigindo-se à finalidade legal prevista.
No cumprimento de um procedimento fiscal, os inspetores ou auditores do
fisco intimam o sujeito passivo para que apresente os documentos fiscais e
contábeis e, mesmo outros documentos auxiliares que serão examinados no
trabalho de fiscalização. Promovem também diligências nos estabelecimentos
fiscalizados, onde examinam as atividades exercidas.
24
Se nos trabalhos de fiscalização ficar demonstrado o descumprimento de
obrigações tributárias, estas devem ser, obrigatoriamente, objeto de lançamento
tributário por meio da lavratura de auto de infração. Ao agir assim, os agentes do
Fisco o fazem em cumprimento ao que dispõe o artigo 142 do CTN:
“Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o
crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento
administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da
obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o
montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o
caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é
vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”.
1.8.1. A Impugnação ao Auto de Infração – O início do Processo
Administrativo Fiscal
Caso se sinta inconformado com a autuação sofrida o contribuinte tem o
direito de litigar na esfera administrativa. Para tanto, deverá impugnar o auto de
infração que dá início à fase litigiosa do procedimento (art. 14 do Decreto n.
70.235/72). Trata-se de direito tutelado constitucionalmente pela CF/88, art. 5º,
incisos XXXIV e LV. Além disso, o prazo para impugnação é, normalmente, de trinta
dias contados da notificação do auto de infração (art. 15 do Decreto n. 70.235/72).
Por razões de celeridade e economia agregam-se à fase de instauração do
PAF (Impugnação) providências de caráter probatório relativas às provas
documentais, exames e perícias, que se não cumpridas geram o ônus da preclusão.
É importante ressaltar que a apresentação de impugnação administrativa,
quando o contribuinte não concorda com a exigência fiscal, apresenta algumas
vantagens, quais sejam: amplas possibilidades de rebater os argumentos fáticos e
jurídicos do lançamento; especialização na matéria tributária dos Conselhos de
Contribuintes; e suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do artigo
151, III, do Código Tributário Nacional.
A impugnação não deve ser genérica, conforme assevera Lídia Maria Ribas:
25
Na peça inicial apresentada pelo contribuinte contra a
pretensão fiscal devem ser descritos os fatos com a necessária
especificidade que delimite o objeto da controvérsia e indicados
os fundamentos legais pertinentes. O impugnante é que
delimita o objeto do processo, traçando-lhes as fronteiras,
segundo suas alegações”5.
Ao apreciar as questões alegadas em uma impugnação ou recurso, a
autoridade julgadora o faz segundo uma seqüência lógica, em que determinado tipo
de matéria é examinado antes de outro. Então, dentro de um mesmo julgamento há
dois momentos: um em que se aprecia as questões preliminares e um outro onde se
faz o mesmo com as questões de mérito. O que resulta concluído do exame das
preliminares influencia a apreciação do mérito.
As questões preliminares são conhecidas e decididas antes e, se atacadas,
vão impedir que se prossiga conhecendo e decidindo as demais questões a elas
relacionadas. Nas preliminares discutem-se as questões que podem modificar ou
anular o lançamento.
Já o mérito diz respeito ao próprio fato jurídico causador da autuação.
Quando contesta o mérito do lançamento, o autuado ataca a pretensão fiscal, em si,
tentando demonstrar com fatos e provas que esta é indevida. O impugnante, na
defesa de mérito direta, contesta a própria pretensão fiscal visando atingir seu
suporte fático e jurídico. A defesa de mérito também pode ser indireta, quando o
contribuinte não contesta o fato alegado, mas apresenta um outro que impede o
exercício do direito pelo Fisco.
Em função do resultado do julgamento o auto de infração pode ser retificado
ou anulado.
5
RIBAS, Lídia Maria Lopes Rodrigues. Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Malheiros
Editores, 2000, p. 120.
26
CAPÍTULO 2
DO JULGAMENTO NO PROCESSO
ADMINISTRATIVO FISCAL FEDERAL
2.1. DO JULGAMENTO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA
2.1.1. As Delegacias Da Receita Federal de Julgamento
Encerrada a fase preparatória e instrutória do processo administrativo, dá-se
início a sua fase de julgamento em primeira instância, que será realizada no âmbito
das Delegacias da Receita Federal de Julgamento – DRJ’s - (diretamente
subordinadas ao Secretário da Receita Federal) assessoradas por suas Divisões de
Julgamento, instaladas em todo o país em suas respectivas Regiões Fiscais que
abrangem todas as unidades federativas do país.
O julgamento dos processos e contribuições administrados pela Secretaria
da Receita Federal não mais se dá pelos Delegados, monocraticamente, mas sim
por órgãos colegiados os quais irão julgar a impugnação administrativa de acordo
com o art. 25, I, “a” do Decreto n. 70.235/72, a partir das alterações promovidas pela
Lei n. 11.119/05.
As DRJ’s são constituídas por turmas de julgamento, cada uma delas
integradas por cinco julgadores (Portaria MF n. 258/01, art. 2º). As turmas são
dirigidas por um presidente nomeado entre os julgadores, sendo uma delas
presidida pelo Delegado da DRJ, que também exerce a função de julgador. O
julgador é nomeado pelo Secretário da Receita Federal para mandato de até dois
anos, com término no dia 31 de dezembro do ano subseqüente ao da designação,
admitida a recondução (Portaria MF n. 258/01, art. 4º).
Os processos devidamente preparados, isto é, que se encontrem em
condições de julgamento, serão encaminhados para as DRJ’s devendo receber
prioridade aqueles que tratem da exigência de crédito tributário de valor superior a
27
dez milhões de reais (consoante Portaria Ministerial 258/01) ou os que contiverem
circunstâncias de crime contra a ordem tributária (art. 27 do Decreto n. 70.232/72).
2.2. DO JULGAMENTO EM SEGUNDA INSTÂNCIA - DA FASE
RECURSAL
2.2.1. Os Conselhos de Contribuintes - CC
Em decorrência ao princípio do Duplo Grau de Jurisdição, o processo
administrativo fiscal, obrigatoriamente, deverá prever a possibilidade de o
contribuinte recorrer a outro órgão da decisão de primeira instância tributária que lhe
seja desfavorável. Este reexame em segunda instância da esfera julgadora
Administrativa é efetuado pelos Conselhos de Contribuintes (art. 25, II, do Decreto n.
70.235/72 com alterações introduzidas pela MP n. 232/04), competindo-lhes o
julgamento administrativo dos recursos em litígio fiscal.
Os Conselhos de Contribuintes julgam os recursos voluntários e de ofício de
decisão de primeira instância prolatada pelas Delegacias de Julgamento da Receita
Federal (DRJ’s), decorrentes de lançamentos efetuados pela fiscalização federal,
tendo por objeto tributos e contribuições administradas pela Secretaria da Receita
Federal (SRF), bem assim referentes a outros procedimentos administrativos dos
quais caiba manifestação de inconformidade por parte do contribuinte.
A finalidade dos Conselhos de Contribuintes está definida no seu Regimento
Interno aprovado pela Portaria MF n. 55, de 16 de março de 1998, com redação
dada pelo art. 5º da Portaria MF n. 103, de 23 de abril de 2002, que determina em
seu Anexo II, art. 1°: “[...] o julgamento administrativo, em segunda instância, dos
litígios fiscais [...]”.
Os Conselhos de Contribuintes são órgãos colegiados judicantes que
integram a estrutura básica do Ministério da Fazenda, diretamente subordinados ao
Ministro de Estado.
Porém, conforme assevera Alberto Xavier:
28
Essa subordinação é apenas [...] organizacional ou burocrática, e
não uma verdadeira subordinação hierárquica.
Com efeito não pode falar-se em “poder hierárquico” do Ministro da
Fazenda , pois este não detém, pelo menos no que concerne ao
núcleo essencial da competência judicante dos Conselhos de
Contribuintes [...], os atributos essenciais de tal poder, que são o
poder de direção – a faculdade de dar ordens [...] e o poder de
revisão – que consiste na faculdade de o superior revogar ou
suspender os atos praticados pelo subalterno, seja por sua iniciativa
ou em conseqüência de recurso hierárquico, seja com fundamento
em ilegalidade (anulação) ou em inconveniência (revogação).6
Além disso, os CC são formados por igual número de representantes da
Fazenda Nacional (auditores-fiscais) e de contribuintes (indicados por entidades de
classe de suas categorias de âmbito nacional), tratando-se, assim, de órgãos
paritários, o que garante, pelo menos em tese, a imparcialidade nas decisões
tomadas em sede de recurso administrativo fiscal. E essa imparcialidade permite
que tanto a Administração quanto o administrado, na questão fiscal, tenham direito a
uma decisão fruto de uma discussão eqüitativa entre os diversos julgadores dos
órgãos colegiados, que em igual número, representam os interesses da Fazenda e
dos contribuintes, de acordo com a sua formação e origem.
Entretanto,
esta
imparcialidade
característica
dos
Conselhos
de
Contribuintes não é por si só suficiente para reconhecê-los como verdadeiros
“tribunais”, exercendo plenamente função jurisdicional, de acordo com os
ensinamentos de Alberto Xavier7, segundo o qual os órgãos de julgamento do Fisco
não são independentes, no sentido de não estarem integrados num Poder
absolutamente autônomo em relação àquele em que se integra uma das partes do
conflito, pois tanto a Administração ativa (parte) como a Administração judicante
(julgador) pertencem ao Poder Executivo. Não gozam, por isso, de uma
“independência organizatória” como existe no Judiciário.
Inicialmente existiam quatro Conselhos de Contribuintes previstos no
Decreto n. 70.235/72. Porém, com o advento do Decreto n. 76.930/77 este número
6
XAVIER, Alberto. Princípios do Processo Administrativo e Judicial Tributário. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 47.
7
XAVIER, Alberto. Princípios do Processo Administrativo e Judicial Tributário. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, pp. 48 e 49.
29
fora reduzido para três, com a extinção do Terceiro Conselho e passando denominar
o Quarto como Terceiro Conselho de Contribuintes.
O Primeiro Conselho é composto por um Conselho Pleno e oito Câmaras e
uma Secretaria-Executiva (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 2º, I, e
alíneas).
Os Presidentes das Câmaras são escolhidos entre os representantes da
Fazenda Nacional e os Vices - Presidentes entre os representantes dos
contribuintes.
Observada a composição paritária, as Câmaras poderão dividir-se em
Turmas. Cada Câmara tem oito Conselheiros titulares e quatro Suplentes, nomeados
pelo Ministro da Fazenda, de reconhecida competência e possuidores de
conhecimentos especializados em assuntos tributários.
Os Conselhos serão dirigidos por Presidentes, designados pelo Ministro de
Estado, escolhidos dentre os Presidentes das Câmaras.
A composição do Segundo e Terceiro Conselho de Contribuintes é
estruturalmente semelhante à do Primeiro CC, distinguindo-se por possuírem
apenas três Câmaras (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 2º, II e III, e
alíneas, alterada pela Portaria MF n. 103/02), ao contrário das oito do Primeiro
Conselho.
No âmbito dos Conselhos de Contribuintes não se admite a inovação de
modo a que se apliquem disposições legais distintas daquelas constantes na
autuação, vinculados que estão os Conselhos à matéria jurídica e fática produzida
nas fases de preparação, instrução e julgamento.
2.2.2. Competência dos Conselhos de Contribuintes
A competência dos três Conselhos de Contribuintes é estabelecida por
matéria à qual se refere o recurso da decisão de primeira instância.
Assim, compete ao Primeiro Conselho de Contribuintes julgar recursos de
ofício e voluntários de decisões de primeira instância, relativos à Imposto sobre a
Renda – IR e proventos de qualquer natureza, adicionais e empréstimos
30
compulsórios a ele vinculados e outras contribuições, observada a distribuição de
competências a cada uma das oito Câmaras, dentre elas julgar os recursos
voluntários relativos à tributação de pessoa jurídica; julgar recursos relativos a
tributação de pessoa física e a incidência de imposto retido na fonte; julgar os
recursos relativos à exigência da Contribuição Social sobre o Lucro – CSL, das
pessoas jurídicas; recursos relativos à contribuição social sobre faturamento
instituída pela LC n. 70/91, e das contribuições sociais para o PIS, PASEP e
FINSOCIAL, etc (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 7º, caput, I e alíneas,
e II, alterada pela Portaria MF n. 103/02).
Já ao Segundo Conselho de Contribuintes compete julgar os recursos de
ofício e voluntários de decisões de primeira instância, relativos à Imposto sobre
Produtos Industrializados - IPI, inclusive adicionais e empréstimos compulsórios a
ele vinculados; Imposto sobre Operações Financeiras – IOF; Contribuições para o
Programa de Integração Social e de Formação do Servidor Público – PIS/Pasep e
para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS; Contribuições para o Fundo
de Investimento Social – FINSOCIAL e para o Fundo do Programa Integração Social
– PIS; Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de
Créditos e de Direitos de Natureza Financeira – CPMF; dentre outras competências
(Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 8º, caput, I a VII, alterada pela Portaria
MF n. 103/02).
E, por último, ao Terceiro Conselho de Contribuintes compete julgar os
recursos de ofício e voluntários de decisões de primeira instância, relativos à
Imposto sobre Importação e a Exportação – II e IE; IPI nos casos de importação;
Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições de Microempresas e
das Empresas de Pequeno Porte – SIMPLES; Imposto sobre Propriedade Territorial
Rural – ITR; Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; tributos e
empréstimos compulsórios e matéria correlata não incluídos na competência
julgadora dos demais Conselhos ou de outros órgãos da Administração Federal;
dentre outras competências (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 9º, caput, I
a XIX, alterada pela Portaria MF n. 103/02).
Compete a cada um dos Conselhos Plenos propor ao Ministro de Estado: a
modificação do Regimento Interno dos Conselhos de Contribuintes, a elevação ou
redução do número de Conselheiros, bem como a criação ou extinção de Câmaras,
31
modificação na legislação tributária infralegal; dirimir conflitos de competência entre
as Câmaras; aprovar súmula de jurisprudência do Conselho, etc (Portaria MF n. 55,
de 16/03/98, R.I.C.C., art. 10, caput, I a X).
E, finalmente, compete também a cada uma das Câmaras dos Conselhos de
Contribuintes proporem ao Conselho Pleno sua divisão em Turmas; dirimir conflitos
de competência entre Turmas; propor ao Conselho Pleno a modificação do
Regimento Interno; corrigir erro material cometido no julgamento de recursos de sua
competência, dentre outras competências dispostas na Portaria MF n. 55, de
16/03/98, R.I.C.C., art. 11, caput, I a XI.
Percebe-se, portanto, que além das atividades relativas a julgamento, tanto
os Conselhos Plenos de cada Conselho de Contribuintes como as Câmaras têm
também atribuições administrativas, ligadas, ao regimento interno que regula o
funcionamento do mesmo Conselho.
2.2.3. O Recurso Voluntário para os Conselhos de Contribuintes
É o meio processual utilizado pelo contribuinte para pedir a revisão do
julgamento administrativo desfavorável, de primeira instância, realizado nas
Delegacias de Julgamento, ou seja, se a decisão final de primeira instância for
integral ou parcialmente desfavorável ao contribuinte faculta-se-lhe a interposição de
recurso voluntário no prazo de trinta dias da ciência da decisão (também
denominado recurso hierárquico), para que a lide seja reapreciada pelos Conselhos
de Contribuintes (art. 33, caput, do Decreto 70.235/72).8
Assim dispõe o art. 25, II, § 1º do Decreto n. 70.235/72: “Os Conselhos de
Contribuintes julgarão os recursos, de ofício e voluntário, de decisão de primeira
instância”.
O Recurso Voluntário deverá mencionar o Conselho de Contribuintes a que
é dirigido, a qualificação do sujeito passivo (recorrente) e os motivos de fato e de
direito em que se fundamenta.
8
“Da decisão caberá recurso voluntário, total ou parcial, com efeito suspensivo, dentro dos trinta dias
seguintes à ciência da decisão”.
32
É importante ressaltar que o Recurso Voluntário deverá contestar todos os
itens, caso o sujeito passivo não concorde com a íntegra da decisão de primeira
instância, apresentando as suas razões para cada um deles. A omissão de um item
no recurso, por si só, pode caracterizar a concordância do recorrente relativo a esta
parte. Nesse caso, a autoridade tributária poderá, se cabível, providenciar a
formação de autos apartados para a imediata cobrança da parte não-contestada,
sendo que a parte recorrida seguirá para um dos três Conselhos de Contribuintes.
Porém, em conformidade com o disposto pelo § 2º do art. 33 do Decreto
70.235/72, incluído pela Lei n. 10.522/02, “[...] o recurso voluntário somente terá
seguimento se o recorrente arrolar bens e direitos de valor equivalente a 30% (trinta
por cento) da exigência fiscal definida na decisão”.
No que diz respeito à exigência de prévio depósito de multa, como requisito
para o conhecimento do recurso administrativo, a jurisprudência remansosa do
Supremo Tribunal Federal tem toda sido, pelo menos até agora, no sentido da
constitucionalidade do depósito. O que aponta, também, para a legitimidade da
exigência de depósito prévio, total ou parcial, do valor do crédito tributário, como
condição para o exame do recurso administrativo do contribuinte. Registra-se que
caso a decisão final seja favorável ao contribuinte o depósito será devolvido ao
mesmo.
Este depósito não tem a finalidade de suspender a exigibilidade do crédito,
pois as simples impugnações administrativas já impedem que o crédito se torne
exigível (CTN, art. 151, III). Criou-se apenas uma condição de procedibilidade para o
recurso administrativo e a garantia processual recursal.
Cumpre informar, no entanto, que esta matéria relativa à legitimidade da
exigência de prévio depósito como condição de admissibilidade de recurso na esfera
administrativa vem sendo reexaminada pela nova composição plenária do STF, por
exemplo, nos Agravos Regimentais em Agravos de Instrumentos ns. 398.933 e
408.914.
33
2.2.4. Remessa de Ofício para os Conselhos de Contribuintes
É o expediente utilizado pelo Delegado de Julgamento da Receita Federal
com a finalidade de remeter para a reapreciação obrigatória pelos Conselhos de
Contribuintes a decisão favorável ao contribuinte, isto é, aquela que exonerar o
sujeito passivo do pagamento de tributo e encargos de multa de valor total superior a
quinhentos mil reais.
É obrigação funcional do Delegado de Julgamento, diante de decisão no
todo ou em parte desfavorável à Fazenda Pública, providenciar a remessa do
processo para reapreciação pelo órgão superior (Conselhos de Contribuintes). Neste
caso, o Recurso de Ofício é interposto mediante declaração na própria decisão.
Em face da decisão dos Conselhos de Contribuintes que tenham dado
provimento à remessa de ofício, o contribuinte pode interpor Recurso Voluntário
dirigido ao Presidente da Câmara Superior de Recursos Fiscais.
2.2.5. Da decisão em forma de acórdão ou resolução
Para tomar suas decisões, que poderão ser através de resolução quando,
obrigatoriamente, a mesma ou outra Câmara do Conselho ou, ainda, de outro
Conselho de Contribuintes, deva pronunciar-se sobre o mesmo recurso, ou acórdão,
nos demais casos, as Câmaras dos Conselhos de Contribuintes devem obedecer
procedimentos estabelecidos no Regimento Interno.
A decisão deverá ser assinada pelo Relator e pelo Presidente da Câmara,
mencionando-se os Conselheiros presentes e, especificando, se houver, os vencidos
e impedidos.
Posteriormente, a Secretaria da Câmara fará publicar no Diário Oficial da
União – DOU, o ementário dos acórdãos formalizados no mês, no qual deverão
constar os números do processo e do recurso, a matéria, o exercício
correspondente, o nome dos interessados, a data da sessão e o número do acórdão.
34
2.2.6. Dos Embargos e Inexatidões Materiais
É assegurada às partes, antes de interpor Recurso Especial, a possibilidade
de interpor Embargos de Declaração quando existir no acórdão obscuridade, dúvida
ou contradição entre a decisão e os seus fundamentos, ou for omitido ponto sobre o
qual devia pronunciar-se a Câmara e até mesmo, através de requerimento, pedir a
retificação de inexatidões materiais devidas a lapso manifesto e os erros de escrita
ou de cálculo existentes na decisão (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 27,
caput).
Os embargos serão interpostos, por Conselheiro da Câmara julgadora, pelo
Procurador da Fazenda Nacional, pelo sujeito passivo, pela autoridade julgadora de
primeira instância ou pela autoridade encarregada da execução do acórdão,
mediante petição fundamentada, dirigida ao Presidente da Câmara, no prazo de
cinco dias contado da ciência do acórdão (Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C.,
art. 27, § 1º).
2.2.7. Câmara Superior de Recursos Fiscais - CSRF
A Câmara Superior de Recursos Fiscais, órgão subordinado diretamente ao
Ministro da Fazenda, foi instituído pelo Decreto n. 83.304/79, e consiste em um
órgão colegiado que tem por finalidade o julgamento administrativo, em instância
especial do Processo Administrativo Fiscal, julgando, portanto, recursos especiais ou
voluntários contra decisões de Câmaras dos Conselhos de Contribuintes ou da
própria Câmara Superior de Recursos Fiscais, interpostos pelos contribuintes ou
pelos Procuradores da Fazenda Nacional.
Seu funcionamento obedece às disposições gerais de seu decreto
instituidor, com as modificações operadas pelo Decreto 89.892/84, e às regras
aprovadas em seu Regimento Interno, disposto pela Portaria MF n. 55/98, Anexo I.
A CSRF é composta pelo Pleno e por três Turmas, todas formadas por
conselheiros Presidentes e Vice – Presidentes dos três Conselhos de Contribuintes
(Portaria MF n. 55/98, Anexo I, art. 2º).
35
A Câmara Superior de Recursos Fiscais é integrada pelo Presidente e VicePresidente do Primeiro Conselho de Contribuintes na qualidade de Presidente e
Vice-Presidente da Câmara, e ainda pelo Presidente e Vice-Presidente das demais
Câmaras do Primeiro Conselho de Contribuintes, quando se tratar de recurso
interposto de decisão prolatada por qualquer das Câmaras do mesmo Conselho;
pelo Presidente e Vice-Presidente do Segundo Conselho de Contribuintes e pelo
Presidente e Vice-Presidente das Câmaras do Segundo Conselho de Contribuintes,
quando se tratar de recurso interposto de decisão proferida pelo Segundo Conselho;
e pelo Presidente e Vice-Presidente das Câmaras do Terceiro Conselho de
Contribuintes, quando se tratar de recurso interposto de decisão prolatada por
qualquer das Câmaras do mesmo Conselho.
Compete a CSRF julgar: recurso de decisão não unânime de Câmara de
Conselho de Contribuintes, quando for contrária à lei ou à evidência de prova (art.
3º, I, do Anexo I da Portaria n. 55/98); recurso de decisão que der à lei interpretação
divergente da que tenha dado outra Câmara de Conselho de Contribuintes ou a
própria Câmara Superior de Recursos Fiscais (art. 3º, II, do Anexo I da Portaria n.
55/98); recurso de decisão de Câmara de Conselho de Contribuintes que prover
recurso de ofício – decisão contra o sujeito passivo (art. 10 do Anexo I da Portaria n.
55/98).
O art. 3º do Anexo I da Portaria MF n. 55/98 traz as matérias de
competência das três Turmas da CSRF.
Já o art. 6º do Anexo I da Portaria MF n. 55/98 dispõe sobre a competência
do Conselho Pleno, a saber: propor ao Ministro de Estado modificação na legislação
tributária infralegal; dirimir conflitos de competência entre os Conselhos; aprovar
súmula de jurisprudência da Câmara; dentre outras competências.
A decisão proferida pela Câmara Superior de Recursos Fiscais é terminativa
e encerra o processo administrativo fiscal, dela não cabendo pedido de
reconsideração (RICSRF, art. 32 do Anexo I da Portaria n. 55/98).
A partir deste ponto o sujeito passivo, não satisfeito com a decisão, terá que
tentar a via judicial para modificar a decisão.
36
Se a decisão foi desfavorável ao contribuinte e tiver sido feito depósito em
garantia, este será convertido em renda se o sujeito passivo não comprovar, no
prazo legal, a propositura de ação judicial.
No caso de decisão definitiva favorável ao contribuinte, cumpre a autoridade
preparadora exonerá-lo, de ofício dos gravames decorrentes do litígio. Porém, esta é
uma questão controvertida, se a Fazenda Nacional igualmente ao contribuinte pode
recorrer ao Judiciário de decisão que lhe for desfavorável, conforme estudo adiante
feito no capítulo 4.
De acordo com a Portaria MF n. 103/2002, no julgamento de recurso
voluntário, de ofício ou especial, fica vedado aos Conselhos de Contribuintes
afastarem a aplicação, em virtude de inconstitucionalidade, de lei ou ato normativo
em vigor. Esta questão será melhor tratada e aprofundada no próximo capítulo.
2.2.7.1. Recurso à CSRF - Recurso Especial (administrativo)
O recurso especial administrativo é instrumento final de revisão de julgados
dos Conselhos de Contribuintes; é recurso de fundamentação vinculada às
hipóteses de cabimento previstas nas normas do Regimento Interno do Conselho de
Contribuintes - RICC e será apreciado pela CSRF (§ 4º do art. 25 do Decreto n.
70.235/72 c/c arts. 32 e ss. do RICC).
O recurso especial administrativo veio a substituir a antiga “instância
especial” do Ministro da Fazenda, ainda prevista no art. 26 do Dec. 70.235/72, mas
revogada tacitamente pelo Decreto 83.304/79.
Nas seguintes hipóteses, no prazo de quinze dias, será cabível – das
decisões proferidas pelas Câmaras dos Conselhos de Contribuintes – a interposição
de recurso especial administrativo para a Câmara Superior de Recursos Fiscais: I –
de decisão não unânime de Câmara, quando for contrária à lei ou à evidência da
prova; e II – de decisão que der à lei tributária interpretação divergente da que lhe
tenha dado outra Câmara de Conselho de Contribuintes ou a própria Câmara
Superior de Recursos Fiscais.9
9
Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., arts. 32 e ss.
37
No caso do inciso II do art. 32 do RICC quando a divergência se der entre
Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, a matéria objeto da divergência
será decidida pelo Pleno da própria CSRF.
A interposição do Recurso Especial administrativo requer do contribuinte
atenção e alguns cuidados, a saber:
a) Prequestionamento: somente poderá ser recorrida a matéria que foi
expressamente
abordada
pela
decisão
recorrente,
devendo
o
Recorrente
demonstrar nas razões de seu recurso a existência desse prequestionamento;
b) Não se admite como paradigma para a interposição do Recurso Especial
decisão que já tenha sido reformada pela CSRF;
c) O recurso deverá ser protocolado na repartição que intimou o sujeito
passivo da decisão de um dos Conselhos de Contribuintes (normalmente uma DRF).
Não se faz o protocolo de Recurso Especial diretamente na Secretaria da Câmara
Superior ou de Conselho de Contribuintes;
d) O recurso deverá demonstrar, fundamentadamente, a divergência
argüida;
e) Para a comprovação da divergência, o Recurso Especial deverá estar
instruído com cópia autenticada do inteiro teor da decisão paradigma ou de cópia da
publicação em que tenha sido divulgada. Este requisito formal consta na maioria dos
precedentes da CSRF, entretanto, é relativizado pela jurisprudência da CSRF, haja
vista que a ausência de uma dessas cópias mencionadas não é óbice ao
conhecimento do recurso, desde que as decisões divergentes sejam ratificadas pela
Administração; ou comprovada mediante indicação do Acórdão (pela Recorrente) no
qual se encontra configurada a divergência.
O despacho que admitir recurso especial interposto pela Fazenda Nacional
será juntado aos autos e encaminhado à repartição preparadora para a ciência do
sujeito passivo, assegurando-se-lhe o prazo também de quinze dias para oferecer
contra-razões ou recorrer da parte que lhe foi desfavorável em igual prazo.
Da decisão que negar seguimento a Recurso Especial cabe a apresentação
de agravo. Neste caso, o reexame de admissibilidade de Recurso Especial será
38
requerido ao Presidente da Câmara Superior de Recursos Fiscais, no prazo de cinco
dias contado da ciência da decisão que lhe negou seguimento.10
Em contrapartida, não caberá recurso especial de decisão de qualquer das
Câmaras dos Conselhos que na apreciação de matéria preliminar decida pela
anulação da decisão de primeira instância.
Em restrição de caráter anti-isonômico prescreve o RICC que a hipótese de
cabimento calçada em contrariedade à lei ou à evidência da prova é privativa do
Procurador da Fazenda Nacional, enquanto o cabimento pela divergência é
facultado tanto à Fazenda Pública como ao contribuinte.
A cláusula de “recurso privativo”, prevista na primeira parte do § 1º do art. 32
do RICC, em virtude de representar conspiração contra o princípio da isonomia e de
não encontrar fundamentos de validade em nosso sistema jurídico, segundo James
Marins, não pode ser eficaz como comando restritivo da faculdade do contribuinte
em efetivar sua defesa com os mesmos meios e recursos oferecidos para a Fazenda
Pública. De acordo com o mencionado jurista isto significa que não é lícito à CSRF
recusar a admissibilidade de recurso especial administrativo interposto pelo
contribuinte com fundamento em acórdão não unânime que apresenta contrariedade
à lei ou à evidência da prova.
Caso o contribuinte, em juízo de admissibilidade, veja o seguimento de seu
recurso especial fundamentado no inciso I do art. 32, por ser fundamento privativo
da Fazenda Nacional, deve utilizar-se de mandado de segurança, com fundamento
direto no art. 5º, caput (princípio da isonomia) e inc. LV (direito aos meios e recursos
inerentes à ampla defesa) para suspender os efeitos da decisão de modo a que o
recurso em questão seja regularmente processado e apreciado em seu mérito pela
CSRF, corrigindo-se a coação e restaurando-se a igualdade processual.
2.2.7.2. Recurso à CSRF - Recurso Voluntário
Este recurso está regulado pelo Regimento Interno da Câmara Superior de
Recursos Ficais (art. 36 da Portaria MF n. 55/98, Anexo II), bem como no art. 25, §
4º do Decreto n. 70.235/72.
10
Portaria MF n. 55, de 16/03/98, R.I.C.C., art. 35, caput e § 1º.
39
Na hipótese de julgamento proferido pelas Câmaras dos Conselhos de
Contribuintes em que se tenha dado provimento à remessa de ofício, o Recurso
Voluntário do contribuinte deve ser apresentado na repartição preparadora, no prazo
de trinta dias, contado da data da ciência do acórdão, e dirigido, em petição
fundamentada, ao Presidente da Câmara Superior de Recursos Ficais.
Os Procuradores da Fazenda Nacional serão intimados dos recursos
voluntários interpostos pelo sujeito passivo para oferecer contra – razões também no
prazo de trinta dias.
O Recurso Voluntário dá ao sujeito passivo a possibilidade de questionar
uma decisão que lhe foi desfavorável, em segunda instância, uma vez que a própria
Administração em primeira instância decidiu a seu favor.
40
CAPÍTULO 3
POSSIBILIDADE DE OS CONSELHOS DE CONTRIBUINTES
DEIXAREM DE APLICAR LEI OU ATO NORMATIVO POR
CONSIDERÁ-LOS INCONSTITUCIONAIS
3.1. A autoridade administrativa, como julgadora no processo
administrativo fiscal, pode deixar de aplicar a lei ou ato normativo por
considerá-los contrários aos preceitos constitucionais?
É importante salientar, inicialmente, que o tema que será esposado neste
capítulo é bastante polêmico, haja vista que tem entendimentos diversos por parte
da doutrina e da jurisprudência.
Existem duas correntes de pensamento: uma entende que ao julgador
administrativo, por estar exercendo cargo criado e administrado pelo Poder
Executivo, contra suas normas é vedado deixar de aplicá-las, sob o argumento de
que são violadoras da Constituição; outra que entende estar o julgador
administrativo livre para decidir as questões que lhe forem postas nos processos
administrativos, segundo os princípios gerais de direito, em total obediência à
Constituição Federal.
3.2. Corrente que defende a impossibilidade de os Conselhos de
Contribuintes deixarem de aplicar lei ou ato normativo por considerálos inconstitucionais.
A primeira corrente, predominante na jurisprudência e para grande maioria
dos doutrinadores, defende que os Conselhos de Contribuintes do Ministério da
Fazenda, por intermédio de seus julgadores administrativos, não se detêm em
analisar a inconstitucionalidade de lei que fundamenta o lançamento tributário
impugnado pelo contribuinte.
41
Este entendimento é previsto pelo próprio regimento interno da Câmara
Superior de Recursos Fiscais e dos Conselhos de Contribuintes aprovado pela
Portaria MF n. 55/98, posteriormente, alterado pela Portaria n. 103 do Ministério da
Fazenda, de 23 de abril de 2002, o qual acrescentou o artigo 22-A, que dispõe o
seguinte:
Art. 22-A. No julgamento de recurso voluntário, de ofício ou especial,
fica vedado à Câmara Superior de Recursos Fiscais afastar a
aplicação, em virtude de inconstitucionalidade, de tratado, acordo
internacional, lei ou ato normativo em vigor.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica aos casos de
tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo em vigor:
I – que já tenha sido declarado inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal, em ação direta, após a publicação da decisão, ou
pela via incidental, após a publicação da Resolução do Senado
Federal que suspender a execução do ato.
Pelo disposto no regimento os Conselhos e a Câmara Superior de Recursos
Fiscais não possuem competência para o controle de constitucionalidade11, restrito
ao Poder Judiciário.
Com relação à jurisprudência dos Conselhos de Contribuintes e da Câmara
Superior de Recursos Fiscais a maioria dos julgados inclina-se no sentido da
inexistência de competência de ambos os órgãos para a apreciação de questão de
inconstitucionalidade, muito embora existam decisões, em sentido contrário,
proferidas pela Câmara Superior de Recursos Fiscais.
Vejam-se as seguintes decisões desfavoráveis à possibilidade de apreciação
da constitucionalidade das leis pelos Conselhos de Contribuintes e pela Câmara
Superior de Recursos Fiscais:
CONSTITUCIONALIDADE
DAS
LEIS
-
A
apreciação
de
constitucionalidade ou não de lei regularmente emanada do Poder
11
A idéia de controle de constitucionalidade está ligada à Supremacia da Constituição sobre todo o
ordenamento jurídico e, também, à de rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais
previstos na constituição que, além de configurarem limites ao poder do Estado, são também uma
parte da legitimação do próprio Estado, determinando seus deveres e tornando possível o processo
democrático em um Estado de Direito. Controlar a constitucionalidade significa verificar a
compatibilidade de uma lei ou de um ato normativo com a constituição. (MORAES, Alexandre de.
Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 598/600)
42
Legislativo é matéria de exclusiva competência do Poder Judiciário,
não podendo o Conselho de Contribuintes, como Órgão do Poder
Executivo, desempenhar tal mister, sob pena de invasão indevida na
esfera de competência exclusiva de outro Poder da República,
ferindo disposição expressa da Carta Magna, nada impedindo,
entretanto, que reiteradas decisões do Excelso Pretório sejam
adotadas na esfera administrativa, poupando a Fazenda Pública do
ônus da sucumbência em possíveis ações judiciais.12
IRPF – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEIS –
INCOMPETÊNCIA DOS ÓRGÃOS ADMINISTRATIVOS – Os órgãos
administrativos
judicantes
estão
impedidos
de
declarar
a
inconstitucionalidade de lei ou regulamento, em face da inexistência
de previsão constitucional.13
ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE – APRECIAÇÃO NA
ESFERA ADMINISTRATIVA – IMPOSSIBILIDADE – A declaração de
inconstitucionalidade de lei é atribuição exclusiva do Poder Judiciário,
conforme previsto nos artigos 97 e 102, I, “a” e III, “b” da Constituição
Federal. No âmbito administrativo fica vedado aos órgãos julgadores
afastar a aplicação, em virtude de inconstitucionalidade, de lei em
vigor.14
NORMAS
PROCESSUAIS.
DECLARAÇÃO
DE
INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. Por expressa determinação do Decreto n. 2.346/97,
devem
os
órgãos
julgadores,
singulares
ou
coletivos,
da
Administração Fazendária, afastar a aplicação da lei, tratado ou ato
normativo federal, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal.Cumpre restaurar a norma de regência da matéria anterior
àquela declarada inconstitucional.15
Ao Executivo, como aos demais poderes, impõem-se atuar no seu
campo específico de atribuições, em estrita observância à ordem
jurídica. É curial, portanto, que deve, toda vez que tenha de dar
execução a uma lei, examiná-la, interpretá-la e, naturalmente,
considerá-la em cotejo com a Magna Carta. Ao contrário do que
12
Trecho extraído do acórdão n. 101-90.768, Primeira Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes.
Trecho extraído do acórdão n. 106-14448, Sexta Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes.
14
Trecho extraído do acórdão n. 108-08276, Oitava Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes.
15
Trecho extraído do acórdão n. 203-09960, Terceira Câmara do Segundo Conselho de Contribuintes.
13
43
pretendem os que perfilham opinião diferente, todos os Poderes têm
missão de guardiões da Constituição e não apenas o Judiciário e a
todos é de rigorosamente cumpri-la, toda vez que tenham que agir no
âmbito de sua esfera de atribuições.16
PROCESSO
ADMINISTRATIVO
INCONSTITUCIONALIDADE
FISCAL
DAS
–
LEIS
ARGÜIÇÃO
NA
DE
ESFERA
ADMINISTRATIVA – O Direito brasileiro, desde a Constituição
Republicana de 1897, é dominado pelo princípio da universalidade
da jurisdição, ou sistema de jurisdição única, segundo o qual a
função jurisdicional é monopólio do Poder Judiciário, de cuja
apreciação não pode ser excluída qualquer lesão ou ameaça de
lesão de direito individual, ainda que tal lesão ou ameaça seja
decorrente de ato da Administração. Trata-se, pois, de uma reserva
absoluta de jurisdição aos órgãos do Poder Judicial, que tem como
corolário a impossibilidade de atribuição de poderes jurisdicionais
aos órgãos do Poder Executivo.17
Observa-se que na grande maioria da jurisprudência dos CC e da CSRF, os
órgãos julgadores da Fazenda Nacional, por estarem na condição de órgãos
pertencentes
ao
ente
político
lançador,
não
se
pronunciam
sobre
a
constitucionalidade das leis e dos atos normativos, pois esta é tarefa atribuída a
mais alta corte de justiça (STF), a quem cabe dizer se determinada lei goza de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade. Aos órgãos administrativos só resta
cumprir a lei.
Assim, cabe à Administração Pública apenas aplicar a norma, pois está
sujeita ao Princípio da estrita Legalidade18, previsto no artigo 37 da CF/88, ou seja, a
Administração está subordinada à lei, não podendo deixar de cumpri-la a pretexto de
sua inconstitucionalidade. O administrador público deve cumprir a lei mesmo
considerando-a inconstitucional. O dever do administrador é acatar a lei, não lhe
cabendo dizer se a lei é inconstitucional ou não, em homenagem ao Princípio da
Segurança Jurídica.
16
Passagem do voto do Conselheiro Adelmo Martins Silva, citando Miguel Reale, no acórdão n. 10801.182, Oitava Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes.
17
Trecho extraído do acórdão n. CSRF/01-03.298, Primeira Turma da CSRF. Segundo Conselho de
Contribuintes.
18
O Poder Executivo está obrigado a pautar sua conduta pela estrita legalidade, observando,
primeiramente, como primado do Estado de Direito Democrático, as normas constitucionais.
(MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 601)
44
Na esfera administrativa, prevalece a tese de que não é possível analisar a
inconstitucionalidade de determinada lei, suscitada pelo contribuinte, pois, neste
caso, haveria interferência de um Poder (Executivo) no âmbito de competência de
outro (Poder Judiciário), uma vez que estaria ferindo o Princípio da Harmonia19 e da
Separação dos Poderes.20
Quando os contribuintes alegam a inconstitucionalidade de uma lei, não
pedem aos CC que declarem a inconstitucionalidade da lei, mas que façam cumprir
a Constituição. Pedem, na realidade, que determinado dispositivo de lei não seja
aplicado àquele caso concreto, por ser inconstitucional.
Zeno Veloso, em síntese, assere que:
Permitir que o Poder Executivo cancele a eficácia de norma jurídica,
porque
reputa
contrária
à
Constituição,
é
consagrar
tese
perigosíssima, que pode pôr em risco a democracia, num País em
desenvolvimento, como o nosso, com tantas e tão graves limitações
e carências, com uma vocação histórica – e até o momento
incontrolável
–
para
o
autoritarismo,
com
um
executivo
verdadeiramente formidável e imperial, significando o princípio da
divisão de poderes quase uma letra morta no texto Magno.21
De acordo com o mesmo autor, “[...] não podemos esquecer que há a
presunção da constitucionalidade das leis, embora não seja absoluta. Esta
presunção só pode ser informada por decisão do Poder Judiciário, e ressalta-se;
tratando-se de tribunal, somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros, a
inconstitucionalidade pode ser declarada (CF, art. 97).”
19
A harmonia entre os poderes verifica-se pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito
às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. Cabe assinalar que nem a divisão
de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que
visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à
realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em
detrimento do outro e especialmente dos governadores. (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito
Constitucional Positivo. 19 ed., revista e atualizada. Malheiros Editores, 2001. p. 114)
20
O princípio da separação ou divisão dos poderes foi sempre um princípio fundamental do
ordenamento constitucional brasileiro, previsto no art. 2º da CF/88. Atualmente este princípio não
configura mais aquela rigidez de outrora. A ampliação das atividades do Estado contemporâneo
impôs nova visão da teoria da separação de poderes e novas formas de relacionamento entre os
órgãos do legislativo e executivo e destes com o judiciário, tanto que atualmente se prefere falar em
colaboração de poderes. (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19 ed.,
revista e atualizada. Malheiros Editores, 2001. pp. 110 e 113).
21
VELOSO, Zeno. Controle jurisdicional de constitucionalidade. 2ª ed. pp. 322 e 323.
45
Pelo que se depreende da Carta Magna de 1998, ela não atribui
competência para que a autoridade administrativa ou os órgãos administrativos
jurisidicionais, como é o caso dos Conselhos de Contribuintes, deixem de aplicar, no
caso concreto, uma lei ou ato normativo, por considerá-los inconstitucionais. Além
disso, esta ausência de competência não significa cerceamento de defesa no
processo administrativo, pois é a legislação que veda, expressamente, a análise da
questão constitucional pelo agente administrativo.
Este também é o entendimento do professor Marcos Aurélio Pereira Valadão
para o qual não procede o argumento de que os Conselhos de Contribuintes podem
verificar da inconstitucionalidade e da legalidade da legislação tributária com base
no Princípio da Ampla Defesa, previsto no art. 5º da CF de 88, por dois motivos
principais:
Primeiro, porque a ampla defesa referida acima se restringe ao que
se pode discutir dentro do processo administrativo. O que se adequa
ao
ditame
inserto
na
parte
final
do
mencionado
preceito
constitucional, isto é, a ampla defesa deve dar-se ‘com os meios e
recursos a ela inerentes’. Assim, o contribuinte não pode se utilizar
deste meio de defesa (inconstitucionalidade e ilegalidade da norma
tributária embasadora do lançamento), não em virtude de restrição
do seu direito, mas porque a Administração não pode dizer da lei,
mas deve, sim, cumprir a lei.
Segundo, em virtude da efetividade do julgado. No sistema brasileiro
o julgado administrativo não faz coisa julgada, podendo ser
contestado pela via judiciária. Em conseqüência, o contribuinte que
perde na esfera administrativa pode recorrer ao Judiciário. Se a
Administração se adiantar na questão da inconstitucionalidade ou
ilegalidade da legislação tributária, estaria se antecipando àquilo que
é da competência do Poder Judiciário, já que somente este Poder
tem competência para resolver definitivamente a questão. Assim, por
hipótese, poderiam os Conselhos de Contribuintes deixarem de
aplicar determinada legislação tributária por entendê-la ilegal, mas o
Judiciário poderia julgá-la perfeitamente legal. O problema é que
neste caso, se o contribuinte vê atendida sua pretensão pelos
Conselhos de Contribuintes, por via de recurso administrativo, estará
encerrado definitivamente o processo, já que a Administração não
46
poderá ir à Justiça para contestar ato dela própria. A perplexidade é
ainda maior nesses casos quando determinado contribuinte que
recorreu somente à Administração viu sua pretensão satisfeita, e
outro contribuinte, com um caso idêntico, que optou diretamente pela
via judicial, teve mantido o lançamento (também em caráter
definitivo).22
Assim, aos Conselhos, por meio de seus julgadores (conselheiros), não
resta
outra
alternativa,
senão
aplicar
a
lei
sem
questionar
a
sua
constitucionalidade/inconstitucionalidade, quando o Supremo ainda não tenha se
pronunciado e declarado a inconstitucionalidade de determinada lei.
Caso contrário, se o plenário dos CC ou da CSRF, deixar de aplicar lei ou
ato normativo, por considerá-los inconstitucionais, antes de pronunciamento
definitivo do Judiciário pelo Supremo, pode acontecer, por exemplo, de o órgão
julgador administrativo deixar de aplicar uma lei por entendê-la inconstitucional, e o
STF posteriormente julgar a mesma lei constitucional, o que poderia provocar efeitos
perversos e danos irremediáveis ao erário.
Assim, por exemplo, o contribuinte, teria deixado de pagar o tributo ou
contribuição com a autorização da própria Administração. Não há outra conclusão
possível, a não ser a de que o órgão o qual exarou a decisão extrapolou os poderes
dos quais foi, originalmente investido. E mais, pode ter ocorrido a prescrição do
crédito tributário se entre a decisão do STF e a decisão dos Conselhos de
Contribuintes tiver decorrido mais de cinco anos, o que significaria dizer que o
prejuízo ao erário tornou-se irrecuperável.
Para corroborar esta tese, chama-se a atenção para o julgado dos
Conselhos de Contribuintes, verbis:
O Conselho de Contribuintes afastou a cobrança da majoração do
Finsocial das empresas exclusivamente prestadoras de serviço, e
posteriormente, o STF reconheceu a constitucionalidade desta
VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. “Conselho de Contribuintes, Processo Administrativo Fiscal e
Controle da Legislação Tributária”. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT. FILHO, Oswaldo
Othon de P. Saraiva (diretor). Bimestral. Ano V, n. 4, julho / agosto. Belo Horizonte: Fórum, 2003.
22
47
cobrança, conforme o RE n. 150.755/PE23 , seguido de diversos
outros RE’s no mesmo sentido.24
Em um segundo julgado o Conselho de Contribuintes afastou a aplicação da
TR (veja-se, por exemplo, o Recurso n. 090952, 3ª Câmara, 2º Conselho de
Contribuintes, julgado em 06/07/1994), entendendo, na mesma linha, que os
tribunais vinham adotando naquela época, que a TR não se prestava como
substituto de índice de correção monetária, mesmo havendo Instrução Normativa
específica da Secretaria da Receita Federal dizendo que devia se dar a cobrança.
Porém, o STF, no RE 218290/RS (julgado unânime de 22/02/2000), entendeu que
devia ser cobrada a TR sobre os débitos fiscais, decidindo pela constitucionalidade
desta cobrança.
É notório, então, que a decisão administrativa de deixar de aplicar, total ou
parcialmente, por inconstitucionalidade ou ilegalidade, lei ou ato normativo que não
esteja com sua eficácia suspensa ou não tenha sido objeto, pelo menos de
declaração incidental de inconstitucionalidade pelo Judiciário não terá validade.
Portanto, os órgãos administrativos não podem declarar a inconstitucionalidade de
determinada lei, porque essa é tarefa exclusiva do Supremo Tribunal Federal
(CF/88, art. 102, inciso I, letra a), por meio dos controles concentrado25 e difuso26 de
constitucionalidade.
Reforça, ainda, esta tese o entendimento do professor Hugo de Brito
Machado, segundo o qual foge da alçada dos Conselhos analisar se a lei se adequa
ou não à Constituição Federal. De acordo com o tributarista “[...] se um órgão do
Contencioso
Administrativo
Fiscal
pudesse
examinar
a
argüição
de
inconstitucionalidade de uma lei tributária, disso poderia resultar a prevalência de
23
Julgado em 18/11/1992, unânime, Tribunal Pleno, DJ, 20 ago. 1993, p. 16322.
Por exemplo: RE n. 163878/PE, julgado em 23/10/1998, Primeira Turma, DJ, 23 out. 1998, p. 9; RE
187436/RS, Tribunal Pleno, DJ, 31 de out. 1997, p. 55562; RE n. 192294/PR, Segunda Turma, DJ, 20
de mar. 1998, p. 16; RE 166656/RS; Primeira Turma, DJ, 2 jun. 1995, p. 16243.
25
Por meio desse controle, procura-se obter a declaração de inconstitucionalidade da lei ou do ato
normativo em tese, independentemente da exigência de um caso concreto, visando a obtenção da
invalidação da lei, a fim de garantir-se a segurança das relações jurídicas, que não pode, ser
baseadas em normas inconstitucionais. (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16. ed. São
Paulo: Atlas, 2004. p. 627)
26
Também conhecido como controle por via de exceção ou defesa e caracteriza-se pela permissão a
todo e qualquer juiz ou tribunal realizar no caso concreto a análise sobre a compatibilidade do
ordenamento jurídico com a Constituição Federal. (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional.
16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 608)
24
48
decisões divergentes sobre um mesmo dispositivo de uma lei, sem qualquer
possibilidade de uniformização”.
Além do mais para o citado jurista “[...] uma decisão do Contencioso
Administrativo Fiscal, que diga ser inconstitucional uma lei, e por isto deixe de aplicála, tornar-se-á definitiva à míngua de mecanismo no sistema jurídico, que permita
levá-la ao Supremo Tribunal Federal. [...] Não é razoável, portanto, admitir-se que
uma autoridade administrativa possa decidir a respeito dessa inconstitucionalidade,
posto que o sistema jurídico não oferece instrumento para que essa decisão seja
submetida à Corte Maior”27.
Assim, encerra-se o entendimento desta corrente majoritária, da qual me
aproximo, com o exposto pelo respeitado jurista Celso Bandeira de Melo:
O Executivo não pode descumprir lei inconstitucional, e não pode
fazê-lo porque o Executivo não tem poder jurídico de expulsar norma
do sistema. Ele pode expelir atos administrativos do sistema, mas
não pode expelir leis. O senhor de introdução de uma lei no sistema
é o Poder Legislativo. O senhor da retirada dessa lei do sistema, por
inválida, por inconstitucional, é o Poder Judiciário. O direito positivo
estabelece os mecanismos e sistemas pelos quais uma norma perde
a sua força jurídica, não conferindo ao Executivo esta função do
Poder Judiciário.28
3.3. Corrente que defende a possibilidade de os Conselhos de
Contribuintes deixarem de aplicar lei ou ato normativo por considerálos inconstitucionais.
Por outro lado, esta segunda corrente defende a possibilidade de a Fazenda
Nacional não aplicar lei em virtude de sua inconstitucionalidade. Determinado
posicionamento está externado por menor parte da jurisprudência dos Conselhos e
da CSRF, segundo a qual uma lei ao violar preceito constitucional é nula, não
27
MACHADO, Hugo de Brito. Processo Administrativo Tributário. Pesquisas tributárias. In MARTINS,
Ives Gandra da Silva (Coord.). Nova série; n. 5. 2. ed. atual. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 153.
28
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 10. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 1998, pp. 12-18.
49
podendo, portanto, obrigar o Executivo (CC e CSRF) que a cumpra, podendo em
face disso interpretar a norma, negando-lhe execução.
Esta corrente de pensamento, segundo a doutrina, entende também que o
artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal (que trata do contraditório e da ampla
defesa) deve ser aplicado sem quaisquer restrições ao processo administrativo, o
que permitiria aos Conselhos de Contribuintes deixarem de aplicar lei que lhe pareça
inconstitucional.
Para corroborar esta corrente de pensamento, vejam-se as seguintes
decisões favoráveis à apreciação da constitucionalidade das leis pelos Conselhos de
Contribuintes e pela Câmara Superior de Recursos Fiscais:
NORMAS CONSTITUCIONAIS – COMPETÊNCIA PARA APLICÁLAS A CASOS CONCRETOS – Em face do art. 5º, inc. LV da
Constituição Federal, os órgãos administrativos judicantes estão
obrigados a aplicar, sempre, a Lei Maior em detrimento da norma
que
considerem
inconstitucional.
Impor
limitação
ao
livre
convencimento da autoridade julgadora, assim como não conhecer
esta de matéria constitucional argüida pelo litigante em qualquer
instância, implica cerceamento da plena defesa e violação da Lei
Fundamental.29
PRETERIÇÃO DO DIREITO DE DEFESA DA PARTE – MATÉRIA
CONSTITUCIONAL – A jurisprudência dos Tribunais Superiores e a
Doutrina reconhecem que o Poder Executivo pode deixar de aplicar
lei que contrarie a Constituição do País. Os Conselhos de
Contribuintes, como órgãos judicantes superiores do Poder Executivo
encarregados de realizar justiça administrativa nos litígios fiscais, têm
o dever de assegurar ao contribuinte o contraditório e a ampla
defesa, analisando e avaliando a aplicação de norma que implique
em violação de princípios constitucionais estabelecidos na Lei Maior,
afastando
a
exigência
fiscal
baseada
em
dispositivo
inconstitucional.30
Acrescenta a recorrente que não é da competência dos Conselhos
de Contribuintes a declaração de inconstitucionalidade de Decretos29
Trecho extraído do acórdão n. 108-01.184, Oitava Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes.
Trecho extraído do acórdão n. CSRF/01-03.620, Câmara Superior de Recursos Fiscais. Primeiro
Conselho de Contribuintes.
30
50
leis ou quaisquer outros atos legislativos. De fato, só o Poder
Judiciário é que pode, por via direta ou indireta, declarar tal
inconstitucionalidade. Também aqui se equivocou a Fazenda
Nacional. Em primeiro lugar, a Câmara recorrida em momento algum
declarou a inconstitucionalidade do art. 21 do Decreto-Lei n.
2.065/83. Deteve-se, apenas, na análise do caso concreto,
entendendo que esse artigo se aplica a partir da vigência da lei. É
comum, nos meios fazendários, confundir-se declaração jurisdicional
de inconstitucionalidade da lei, que é apanágio do Poder Judiciário,
com aplicação de princípio constitucional, que nada mais é do que
aplicação do princípio da legalidade ao caso concreto. No caso em
julgamento a Câmara recorrida simplesmente aplicou o art. 21 do
Decreto-Lei
n.
2.065/83
em
consonância
com
o
princípio
constitucional da irretroatividade da lei, que consta no art. 153, § 3º,
da Carta Magna. Se a missão dos Conselhos de Contribuintes,
consoante consta do art. 8º do Regimento Interno, ao qual está
submetida a Câmara recorrida, é aplicar a lei tributária, o Colegiado
se portou dentro do que lhe manda o Regimento, já que sendo a
Constituição a lei das leis deverá ser “aplicada” em primeiro lugar.31
Além disso, esta segunda corrente encontra fundamento nos ensinamentos
do notável jurista Pontes de Miranda, o qual ensina que “[...] quando o órgão tem de
agir, dependendo a sua ação de implícita solução à questão prévia de
inconstitucionalidade, ou da legalidade, pode ele abster-se, e dizer por que se
abstém”32.
Reforça esta tese o posicionamento do mestre Ives Gandra o qual defende
que a autoridade administrativa como julgadora no processo administrativo fiscal
pode deixar de aplicar a lei por considerá-la inconstitucional, devendo, sempre que
solicitado, examinar questões de constitucionalidade. De acordo com o autor, “se a
autoridade administrativa tem convicção de que a norma é inconstitucional, é sua
obrigação, como servidora da lei, fazer prevalecer a norma constitucional e não a lei
inconstitucional”33.
Além disso, Dejalma de Campos exprime que:
31
Trecho extraído do acórdão nº CSRF/01-0.866, Câmara Superior de Recursos Fiscais.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Comentários à Constituição de 1967. 2. ed., p. 624.
33
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Pesquisas tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 75.
32
51
No exercício de sua competência os Conselhos de Contribuintes
podem
conhecer
e
decidir
de
recurso
em
que
argúi
a
inconstitucionalidade da exigência fiscal mantida pela decisão
recorrida.
Sendo ele um órgão que em segunda instância administrativa foi
encarregado de exercer o controle da legalidade dos atos
administrativos
contribuintes,
de
natureza
competindo-lhes,
tributária,
pois,
contestados
decidir
a
pelos
respeito
da
conformidade ou não de tais atos com as disposições constitucionais
e legais que regem a tributação. Se o ato administrativo examinado
afrontar dispositivo constitucional ou legal vigente, os Conselhos de
Contribuintes não somente podem, como devem, anular esse ato a
pretexto de sua inconstitucionalidade ou de sua ilegalidade e, assim
procedendo, não estará declarando a inconstitucionalidade de lei,
mas sim exercendo a faculdade que a doutrina do Supremo Tribunal
Federal reconheceu à administração pública em geral, de anular ou
revogar os próprios atos quando eivados de tais defeitos.34
O professor e Procurador Fazendário Oswaldo Othon também comunga da
tese favorável à possibilidade dos CC e da CSRF do Ministério da Fazenda, por
meio de seus órgãos julgadores, não aplicarem lei que julgarem ser inconstitucional,
ressaltando que:
[...] embora a legislação infra-constitucional acerca do processo
administrativo fiscal e da competência dos órgãos administrativos
decididores não tenham deixado essa matéria explicitada, como o
Estatuto Político de 1988, assegurou aos litigantes e aos acusados
em geral, também no processo administrativo, o contraditório e a
ampla defesa, só posso entender que ao administrado foi garantido o
direito de argüir a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo
que serviu de supedâneo do lançamento ou da autuação, tendo sido
dado, conseqüentemente aos órgãos julgadores administrativos a
competência para aplicar a Lei Constitucional e deixar de aplicar o
diploma legal, no caso concreto, por considerá-lo inconstitucional.35
34
CAMPOS, Dejalma de. Direito processual tributário, 5. ed., Atlas, p. 98 e 99.
SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. Processo Administrativo Tributário. Pesquisas
tributárias. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Nova série; n. 5. 2. ed. atual. São Paulo:
CEU e RT, 2002, p. 696.
35
52
3.4. Corrente que prevalece
No seio dos CC e da CSRF do Ministério da Fazenda prevalece o
entendimento majoritário de que não cabe aos órgãos administrativos apreciar
questões constitucionais, mas devem aplicar a Constituição, em detrimento da
aplicação de leis ordinárias, sob duas formas: por adoção pura e simples de
jurisprudência do STF, que já tenha declarado determinado dispositivo legal como
inconstitucional, ou por não aplicação de determinado dispositivo legal, sem declarar
a sua inconstitucionalidade, quando num caso concreto ele colida com alguma
norma constitucional. Portanto prevalece o entendimento dado pela primeira
corrente, do qual compartilho.
Nem mesmo o Presidente da República, chefe do Poder Executivo, pode
deixar de aplicar a lei por entendê-la inconstitucional. Caso este tenha o propósito de
deixar de aplicar uma lei, deverá pedir ao STF que a declare inconstitucional. Se foi
sancionado o projeto aprovado pelo legislativo, que poderia ser vetado total ou
parcialmente se assim entendesse o Presidente da República quando de sua
sanção, não pode funcionário subordinado dizer se a lei é ou não constitucional.
Sempre que um funcionário subordinado (membro dos Conselhos de Contribuintes)
vislumbrar o vício de inconstitucionalidade legislativa deverá propor a submissão da
matéria ao titular do Poder Executivo, até para fins de uniformização da ação
administrativa.
Nesse caso, é correto o entendimento defendido por Marco Aurélio Greco,
que assim esclarece:
[...] quando a autoridade administrativa entende que determinada lei
é inconstitucional, cabe-lhe sobrestar o julgamento e representar o
Chefe do Poder Executivo suscitando a questão pertinente. Cabe ao
Chefe do Poder Executivo analisar se, ao seu juízo, há ou não
inconstitucionalidade. Se houver poderá promover as medidas
adequadas (inclusive Ação Direta de Inconstitucionalidade)36; por
36
O autor desta ação pede ao STF que examine a lei ou ato normativo federal ou estadual em tese.
Visa-se, pois, obter a invalidação da lei, a fim de garantir-se a segurança das relações jurídicas, que
não podem ser baseadas em normas inconstitucionais. (MORAES, Alexandre de. Direito
Constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 628)
53
outro lado, se entender que não há inconstitucionalidade, a
autoridade administrativa não pode deixar de aplicar a lei”37.
Aprofundando-se um pouco mais nessa questão, confira-se parte do voto do
Ministro relator Moreira Alves, quando julgou pedido de medida liminar na Ação
Direta de Inconstitucionalidade 221/DF:
[...] os Poderes Executivo e Legislativo podem declarar nulos, por
ilegalidade ou por inconstitucionalidade, atos administrativos seus, e
não leis ou atos com força de lei, e quando declaram a nulidade
desses atos ficam sujeitos ao controle do Poder Judiciário, e poderão
ser responsabilizados pelos prejuízos advenientes dessa declaração
se este entender que inexiste a pretendida ilegalidade ou
inconstitucionalidade. (RTJ 151/342)
Não é objeto do Processo Administrativo Fiscal (PAF) a verificação da
inconstitucionalidade ou ilegalidade da legislação tributária. A questão de justiça da
legislação tributária, de sua inconstitucionalidade, de sua ilegalidade é matéria
estranha à competência dos órgãos julgadores administrativos.
Admitir-se que os órgãos julgadores podem deixar de aplicar um decreto
presidencial, uma portaria ministerial, uma instrução normativa da Secretaria da
Receita Federal (SRF) ou mesmo um ato declaratório normativo da CoordenaçãoGeral de Tributação (órgão normativo da SRF), é admitir-se a transformação dos
órgãos julgadores em órgãos legisladores, ainda que pela via negativa, pois
desconstituem atos, os quais não têm competência para editar ou rever.
Deve-se deixar claro que, do mesmo modo que a Administração não pode
dizer da inconstitucionalidade da legislação tributária como base para proferir um
julgamento, não pode também questionar da legalidade da legislação tributária
infralegal (decretos, portarias, instruções normativas, etc.). Os Conselhos de
Contribuintes não têm competência para exercer o controle desses atos, pois a
competência dos Conselhos restringe-se à verificação da legalidade do lançamento,
isto é, se o lançamento foi efetivado com base em legislação vigente à época do fato
gerador, se não houve erros materiais, se foram enquadradas corretamente as
37
GRECO, Marco Aurélio. Processo Administrativo Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva
(Coord.). Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 708.
54
infrações à legislação tributária, se cominadas, de maneira acertada, as penalidades
cabíveis.
Em linhas gerais, é importante salientar que:
[...] não é vedado aos julgadores administrativos examinar a questão
da norma ordinária ou inferior e sua validade em relação à
Constituição, o que deverá ser feito, contudo, sempre com a maior
atenção e cuidado possível, pois a presunção inicial é de que toda
norma posta no ordenamento jurídico é constitucional, até que o
Poder Judiciário diga o contrário, já que é impossível fazer justiça
sem obediência à Lei Magna.38
Segundo o professor Marcos Aurélio Pereira Valadão só existem quatro
circunstâncias em que a Administração deve deixar de aplicar a legislação declarada
inconstitucional, sendo que três decorrem de expressa previsão constitucional:
A primeira ocorre quando o STF, em sede de ação direta de
inconstitucionalidade ou declaratória de constitucionalidade39, declara
a inconstitucionalidade de determinada legislação tributária.
A segunda, quando o STF declara a inconstitucionalidade da
legislação tributária na via incidental, por meio de recurso
extraordinário e o Senado Federal suspende sua execução (art. 52,
inciso X, da Constituição de 1988).
E terceiro, quando o Congresso Nacional susta ato normativo do
Poder Executivo que exorbite do poder regulamentar ou dos limites
de delegação legislativa, conforme o disposto no art. 49, inciso, V, da
Constituição
de
1988
–
trata-se
de
controle
político
de
40
constitucionalidade . Veja-se que nestes três casos ficou assentada
a inconstitucionalidade da legislação, assim como há o efeito erga
omnes.
38
FEITOSA, Celso Alves. Processo Administrativo Fiscal. Coordenador: ROCHA, Valdir de Oliveira.
Dialética. São Paulo, 1997. p. 36.
39
A finalidade precípua da ação declaratória de constitucionalidade é transformar a presunção relativa
de constitucionalidade em presunção absoluta, em virtude de seus efeitos vinculantes. O objetivo
primordial da ação declaratória de constitucionalidade é transferir ao STF a decisão sobre a
constitucionalidade de um dispositivo legal que esteja sendo atacado pelos juízes e tribunais
inferiores, afastando-se o controle difuso da constitucionalidade, uma vez que declarada a
constitucionalidade da norma, o Judiciário e também o Executivo ficam vinculados à decisão
proferida. (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 658)
40
O controle de constitucionalidade político é o que entrega a verificação da inconstitucionalidade a
órgãos de natureza política, tais como o próprio Poder Legislativo. (SILVA, José Afonso da. Curso de
Direito Constitucional Positivo. 19 ed., revista e atualizada. Malheiros Editores, 2001. p. 49).
55
A quarta situação, que, em princípio, não vincula a Administração,
mas que pode vir a surtir esse efeito, decorre de comando legal, e diz
respeito ao caso de reiterados julgados (decisões inequívocas e
definitivas) sobre a mesma matéria de direito, pelo STF, decidindo
pela inconstitucionalidade de determinada legislação tributária.41
Para não restar dúvidas de que os CC nem a CSRF não podem deixar de
aplicar determinada lei por considerarem-na inconstitucional, a seu bel-prazer, basta
reportar-se à súmula 1º CC n. 2, segundo a qual, “o Primeiro Conselho de
Contribuintes não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de
lei tributária”42. Segundo o vice-presidente do conselho, Mário Franco, “[...] as
súmulas servem apenas para orientar as decisões dos Conselhos sobre temas
reiteradamente julgados pela corte administrativa”43. Portanto, a partir desta súmula
do Primeiro Conselho de Contribuintes, prevalece a tese de que não cabe aos
órgãos julgadores administrativos apontar inconstitucionalidade de lei.
VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. “Conselho de Contribuintes, Processo Administrativo Fiscal e
Controle da Legislação Tributária”. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT. SARAIVA FILHO,
Oswaldo Othon de Pontes (diretor). Bimestral. Ano V, n. 4, julho / agosto. Belo Horizonte: Fórum,
2003.
42
As Súmulas 1º CC n. 1 a 15 foram publicadas no DOU, Seção 1, dos dias 26, 27 e 28/06/2006,
vigorando a partir de 28/07/2006. Fonte: site oficial dos Conselhos de Contribuintes – Ministério da
Fazenda.
43
Fonte – matéria: “Súmulas do Conselho valem em agosto”, veiculada no Jornal Valor Econômico de
06 de julho de 2006.
41
56
CAPÍTULO 4
POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS DECISÕES DOS CONSELHOS
DE CONTRIBUINTES PELO PODER JUDICIÁRIO.
A possibilidade de a Fazenda Nacional recorrer ao Judiciário contra as
decisões dos Conselhos de Contribuintes que lhes for desfavorável não é aceita por
grande parte da doutrina especializada, sob o principal argumento de que o
Processo Administrativo já é conduzido em favor da União. Segundo esta corrente
as decisões definitivas proferidas em processo administrativo “[...] têm uma força
semelhante à de coisa julgada formal, uma vez que são vinculantes e imutáveis para
a própria Administração, privada de meios jurídicos para reabrir o debate face ao
Poder Judiciário, em caso de decisão desfavorável proferida pelos órgãos da
Administração judicante”44.
Em contrapartida, há uma corrente minoritária que defende ser possível a
Fazenda Nacional, por meio de seus órgãos próprios, recorrer ao Poder Judiciário
contra certas decisões que lhe sejam desfavoráveis, em última instância, no âmbito
dos Conselhos de Contribuintes, invocando o Princípio da Isonomia, pelo qual deve
ser tratado igualmente o particular e a União.
Já em relação ao contribuinte, a unanimidade da doutrina e da jurisprudência
não contesta a possibilidade deste, ante uma decisão desfavorável dos Conselhos,
recorrer ao Judiciário para tentar reverter o quadro negativo.
4.1. Corrente defensora da tese de que a Fazenda Nacional não pode
recorrer ao Judiciário para anular decisão administrativa que lhe foi
desfavorável.
O primeiro argumento que revela não ser cabível recurso ao Poder
Judiciário, por iniciativa da União, das decisões dos Conselhos de Contribuintes,
44
XAVIER, Alberto. Princípios do processo administrativo e judicial tributário. Rio de Janeiro: Forense,
2005, p. 137.
57
segundo Alberto Xavier, resulta do Princípio da Unidade da pessoa jurídica de
Direito Público que é a União Federal e da conseqüente unidade que lhe é
imputável.
Nos dizeres de Alberto Xavier:
Não faria qualquer sentido que a Administração Pública – que já é
dotada do privilégio de praticar atos executórios – e que é, além
disso, obrigada constitucionalmente a exercer imparcialmente
funções de autocontrole da legalidade dos seus atos, mediante
processo administrativo baseado nos princípios da ampla defesa e
do contraditório, pudesse rebelar-se contra decisões definitivas dos
seus próprios órgãos judicantes, ou seja, propor um processo contra
si mesmo.
[...]
A decisão irrecorrível dos Conselhos de Contribuintes exprime a
vontade definitiva do Estado, expressa por meio de procedimento
próprio (o processo administrativo fiscal) pelos seus órgãos
competentes (órgãos judicantes), vontade essa que é, por natureza
una e incindível.45
A
definitividade
e
imutabilidade
das
decisões
dos
Conselhos
de
Contribuintes para a União conduziram o Código Tributário Nacional, no seu art. 156,
inciso IX, a declarar como causa de extinção de crédito tributário “a decisão
administrativa irreformável, assim entendida a definitiva, na órbita administrativa, que
não possa ser mais objeto de ação anulatória”.
No mesmo sentido, o art. 42 do Processo Administrativo Fiscal (PAF),
pronuncia:
São definitivas as decisões:
[...];
II – de segunda instância, de que não caiba recurso ou, se cabível,
quando decorrido o prazo sem sua interposição;
III – de instância especial.
45
XAVIER, Alberto. Princípios do processo administrativo e judicial tributário. Rio de Janeiro: Forense,
2005, p. 140.
58
Isto mesmo dispõe o art. 32 do Regimento Interno da Câmara Superior de
Recursos Fiscais (Portaria n. 55, de 16 de março de 1998), ao dispor que a decisão
dessa Câmara “será final e encerrará o processo administrativo fiscal, dela não
cabendo pedido de reconsideração”.
Este entendimento majoritário, do qual também eu compartilho, ganha
expressividade quando é corroborado pelo jurista Hugo de Brito Machado, para o
qual:
A verdadeira questão está em saber quem, na Administração
Pública, tem competência para dizer a última palavra a respeito da
legalidade. Se o sistema jurídico alberga normas que conferem a
determinados órgãos o poder de julgar os conflitos entre a
Administração Tributária e o contribuinte, cabe a estes órgãos
manifestarem a vontade da própria Administração, naquilo que
julgam.
É
incongruente,
portanto,
admitir que
essa
mesma
administração, representada por outro órgão seu, peça ao juiz para
desconstituir seus atos. 46
Hugo de Brito Machado Segundo, outro defensor da tese que não admite o
Judiciário rever as decisões definitivas prolatadas no âmbito administrativo pelos
Conselhos e pela CSRF, assevera que:
[...] a preclusão administrativa, e a impossibilidade de impugnação
judicial por parte da Administração, decorrem, em última análise, de
uma questão de atribuição de competência. O Poder Público é
composto de órgãos, cada um dotado de competência para o
exercício
de
determinadas
funções.
Quando
há
decisão
administrativa definitiva, tem-se que foi a Administração, por meio do
órgão competente, que decidiu pela validade, ou invalidade, do ato
impugnado, pelo contribuinte. Assim, outros órgãos, como, por
exemplo, Procuradorias de Fazenda, simplesmente não têm
competência para rever tal decisão, e o ente público por eles
integrado não tem interesse de agir para questionar judicialmente um
ato dele próprio, que nada mais fez que rever um ato também
próprio.
[...]
46
MACHADO, Hugo de Brito. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 156.
59
Nem se argumente, em oposição, que isso representaria ofensa ao já
citado inciso XXXV do art. 5º da CF/88, que garante a
inafastabilidade da tutela jurisdicional. Na verdade, não se trata de
negar o acesso ao Judiciário, mas de não admitir que alguém
ingresse em juízo contra si mesmo, o que é bem diferente. Quando
um processo administrativo é concluído de modo favorável ao
administrado, é a própria administração, por meio de um de seus
órgãos, que assim o reconhece. Seria insólito admitir que a
Administração questionasse judicialmente um ato dela própria, pois
isso colocaria o ente público correspondente na condição de autor e
réu da mesma ação.47
Há ainda o fato de que como se sabe a finalidade do contencioso
administrativo consiste precisamente em reduzir a presença da Administração
Pública em ações judiciais. Assim, o contencioso administrativo funciona como um
filtro, não podendo a própria Administração ir a juízo quando seu próprio órgão
entende que razão não lhe assiste. A não ser assim, a existência dos Conselhos de
Contribuintes, com função jurisdicional, seria inútil.
Um outro aspecto a ser levado em consideração é o de que os Conselhos de
Contribuintes juntamente com a Câmara Superior de Recursos Fiscais não exercem
poder jurisdicional. Resultam da simples especialização de funções dentro do Poder
Executivo. Nada mais são do que departamentos do Executivo, aos quais o
ordenamento jurídico atribui a função de dizer à Administração dos seus limites
jurídicos. Por isto, também não pode a Administração ir a juízo questionar as
decisões desses órgãos, que são decisões dela própria.
Um outro argumento que reforça o não cabimento de recurso ao Poder
Judiciário por iniciativa da União das decisões dos CC, parte dos ensinamentos de
Alberto Xavier:
[...] resulta do caráter equivocado do argumento que se baseia numa
pretensa igualdade de posições jurídicas da União e dos particulares
no processo administrativo e que deveria conduzir a que também a
União tivesse acesso ao Poder Judiciário, já que tal acesso é
garantido ao contribuinte pelo inciso XXXV do art. 5º da Constituição,
47
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado, Impossibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei
pela autoridade administrativa de julgamento, RDDT 98 (2003), 95, nota 12 e 96.
60
segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito” 48.
Porém, a referida lesão ao direito a que faz menção o citado inciso XXXV, foi
sanada pela própria Fazenda, e não pode a mesma entender que tem o direito de se
“autocontestar”, discordando de decisão que proferiu, por pretensa lesão a um
direito que teria e que ela própria reconheceu que não tem.
O art. 5º da CF/88 visa tão somente a delimitar os poderes do Estado pela
outorga de direitos aos particulares e não a assegurar um tratamento falsamente
paritário e isonômico entre o Poder Público e os cidadãos.
Nesse sentido observou Hugo de Brito Machado:
O primeiro e mais grave desses equívocos consiste na visão que têm
do Direito, da qual decorre a suposição de que a Fazenda pode
sempre se equiparar ao cidadão, para desfrutar de todas as
garantias que a ordem jurídica a este oferece. O segundo desses
equívocos consiste em pensar que a Administração, quando julga um
processo administrativo fiscal, assume personalidade autônoma. O
terceiro consiste em esquecer que o Direito é instrumento, o melhor
senão o único, capaz de preservar a harmonia entre os homens.
Também adverte o jurista que a generalidade das garantias
constitucionais – entre elas o direito à jurisdição – são destinadas ao
cidadão e não ao próprio Estado.49
É de fundamental importância ter-se presente que o objeto da garantia
constitucional do art. 5º, XXXV, da CF/88, são direitos ameaçados ou lesados. No
caso em apreço é a própria Administração Pública, por meio dos órgãos
competentes para dar a última palavra a respeito da legalidade dos atos
administrativos, que declara a inexistência de um direito seu, pelo que não faz
qualquer sentido a invocação do referido preceito constitucional como fundamento
de uma eventual impugnação por iniciativa da União.
Além disso, esse dispositivo constitucional é aplicável somente como
garantia do contribuinte, não podendo ser invocado pelo Poder Público, perdedor na
48
XAVIER, Alberto. Princípios do Processo Administrativo e Judicial Tributário. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 143.
49
MACHADO, Hugo de Brito. Impossibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei pela
autoridade administrativa de julgamento, RDDT 98 (2003), 95, pg. 154 ss.
61
esfera administrativa, quanto à decisão de um órgão julgador que faz parte de sua
própria estrutura administrativa, e após o exame da questão por duas instâncias
administrativas, com possibilidade de recurso especial para revisão do julgado
quando a decisão não lhe for favorável.
Por todas estas razões a doutrina jurídica inclina-se, em grande maioria, no
sentido do não recebimento de ação judicial, por iniciativa da Administração, com o
fim de anular decisões dos seus órgãos judicantes. Este entendimento é
corroborado também por diversos outros tributaristas que participaram do XXIII
Simpósio Nacional de Direito Tributário.50
Dentre eles, Ives Gandra, fiel defensor desta tese, entende que o “[...] art.
142 do CTN não admite lançamento judicial, ou seja, reconstituição de crédito
tributário por lançador tributário, que seria o juiz”51. Isto quer dizer que uma vez
extinto o crédito tributário para o contribuinte, em sede administrativa, mediante
decisão de um colegiado dos Conselhos, o mesmo não pode ser constituído
novamente por decisão judicial.
Para o citado jurista “os caminhos que são abertos, processualmente à
Fazenda são os da execução fiscal, desde que respeitados os prazos do art. 174 do
CTN ou das interpelações judiciais para interromper a prescrição, não podendo
reabrir, em juízo, discussão encerrada em sede administrativa que lhe foi adversa”52.
Além disso, segundo professora Ives Gandra, por força do princípio
constitucional da Segurança Jurídica, admitir que a Fazenda recorra ao Judiciário
para anular decisão dos Conselhos é inaceitável, pois se instauraria em relação ao
contribuinte que discutiu com êxito administrativo, mas sem direito à sucumbência, a
insegurança absoluta, pois todo o processo em que a Fazenda desempenhou
essencialmente os papéis de “parte e juiz” poderia ser reaberto, a qualquer
momento, reiniciando-se discussão interminável.
No Estado Democrático, o direito à segurança jurídica é um direito pleno,
que não comporta interpretações restritivas, devendo ser afastada a possibilidade de
50
Congresso que deu origem à obra de Processo Administrativo Tributário. MARTINS, Ives Gandra da
Silva (coord.). Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. 2. ed. atual. São Paulo: CEU e RT, 2002.
51
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário, 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 79.
52
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário, 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 79
62
anulação de decisão administrativa contrária à Fazenda Pública, a seu pedido,
perante o Judiciário.
Outro doutrinador defensor desta tese majoritária é Ricardo Mariz de
Oliveira53, para o qual a decisão administrativa (dos CC e da CSRF) é proferida no
seio do próprio Poder Executivo, como parte do procedimento complexo para
constituição definitiva do crédito tributário. Portanto, a decisão dos Conselhos, ainda
que prolatada por órgão paritário, é decisão que exclui o interesse de agir da
Fazenda Pública, no que diz respeito a anulá-la.
Para o tributarista Valdir de Oliveira Rocha “[...] admitir que a Fazenda
Pública se valha do Poder Judiciário para obter a anulação de decisão administrativa
a ela contrária é ignorar a natureza jurídica do processo administrativo, que é a de
validador do ato administrativo questionado pelo contribuinte”54.
José Eduardo Soares de Melo, por sua vez, defende que “[...] as decisões
fiscais definitivas devem ser obedecidas pela respectiva Administração Pública, a fim
de prestigiar a postura adotada por seus órgãos julgadores, principalmente aqueles
de composição paritária, uma vez que suas manifestações consubstanciam prudente
e equilibrada atuação, mantendo a perfeita integração entre Fisco e contribuinte” 55.
Este mesmo escritor defende a premissa, da qual comungo, de que os
órgãos julgadores administrativos serão vistos com respeito pelo Judiciário somente
a partir do momento que possuírem independência de pensamento, não ficando
atrelados a prévias orientações ou determinações das autoridades fiscais. Devem
necessariamente constituir a última instância administrativa em matéria tributária,
razão pela qual suas decisões não podem ser reexaminadas (sequer modificadas)
por nenhuma autoridade, a quem não se confere a faculdade de proceder (ou não) à
sua homologação.
A ação anulatória de decisão administrativa por parte da Fazenda além de
não está prevista na legislação, tal pretensão ofende o princípio da Moralidade (art.
37, CF/88), realçando o comportamento ético, justo e honesto da Administração
53
OLIVEIRA, Ricardo Mariz. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 217.
54
ROCHA, Valdir de Oliveira. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 258.
55
MELO, José Eduardo Soares. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 306.
63
Pública. Assim, a decisão administrativa tem limites e fronteiras e deve ser
respeitada pelo Estado, pois do contrário atingiria e feriria direitos dos contribuintes.
Para Kiyoshi Harada, outro importante tributarista que participou do
Simpósio mencionado anteriormente, assevera que:
“[...] Não é dado à Administração Pública recorrer ao Judiciário para
invalidar a sua própria decisão proferida, regularmente, em processo
administrativo fiscal. Assim, atentaria também contra o princípio da
Moralidade administrativa o fato de a Administração não querer se
sujeitar à decisão que ela própria proferiu, no exercício regular de
suas atribuições. Seria o mesmo que autodestruir o poder legalmente
exercitado pela Administração, só porque resultou em uma decisão
que é contrária a seus interesses privados. Seria tornar inútil e
desnecessário, com desperdício de tempo e de dinheiro, se pudesse
a Administração Pública pleitear a anulação judicial de decisões
administrativas que lhes forem contrárias, já que quando contrárias
aos particulares, estes poderão, sempre, ingressar em juízo na
defesa de seus interesses” 56.
Este também é o entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal:
Coisa julgada fiscal e direito subjetivo. A decisão proferida pela
autoridade fiscal, embora de instância administrativa, tem, em
relação ao Fisco, força vinculatória, equivalente à coisa julgada,
principalmente quando aquela decisão gerou direito subjetivo para o
contribuinte. Recurso Extraordinário conhecido e provido.57
A respeito da coisa julgada administrativa, reporta-se a Vittorio Cassone58,
para o qual a decisão final tida no Processo Administrativo faz coisa julgada em
relação ao Fisco e não para o Contribuinte, haja vista que a lei faculta ao sujeito
passivo, a qualquer momento, mesmo depois de esgotados todos os recursos e ter
decisão final desfavorável, a faculdade de dirigir-se ao Judiciário (Lei n. 6.830/80,
art. 38, parágrafo único).
56
HARADA, Kiyoshi. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo Tributário. In
MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, pp. 271 e 272.
57
Ac. un. da 1ª T. do STF – Rel. Min. Barros Monteiro – RE 68253/PR julgado em 02/12/1969 – DJ
08.05.70.
58
CASSONE, Vitorrio; CASSONE, Maria Eugênia Teixeira. Processo Tributário: Teoria e Prática. 7.
ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 122.
64
4.1.1. Exceções
Porém, é importante enfatizar (abro parêntese) que se a decisão contiver um
vício de ilegalidade, tem aplicação o previsto na Súmula 47359 do STF; ou seja, a
Administração pode anular seu próprio ato, ressalvando-se, neste caso, a
apreciação judicial desta anulação.
Tal entendimento jurisprudencial deve ser interpretado com temperamentos.
Ninguém nega que a Administração Pública pode rever seus atos anulando-os, caso
constate que os mesmos estão viciados por invalidade (e não somente ilegalidade),
todavia, para tanto, há que observar a natureza do ato objeto de tal anulação, bem
como a garantia do devido processo legal, sem contar a possibilidade dos
administrados prejudicados socorrerem-se do Poder Judiciário a fim de verem
reparados os prejuízos que tal revisão tenha lhe causado.
Outra hipótese que entendo conferir à Administração Pública o interesse de
pleitear judicialmente a anulação de decisão administrativa a ela contrária pode
ocorrer nas situações em que haja evidência de que tal decisão tenha sido proferida
com dolo, má-fé ou fraude pelo agente que a proferiu.
4.1.2. A Inconstitucionalidade do Parecer da Procuradoria da Fazenda
Nacional n. 1.087 de 19.07.2004 (Submissão ao Poder Judiciário de
decisões do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda
contrárias à Fazenda Nacional).
Inexiste qualquer interesse da Administração Pública em recorrer ao Poder
Judiciário, uma vez que a própria administração reconheceu o direito do contribuinte
no julgamento da lide, em sede administrativa. Nesta, a decisão favorável ao
contribuinte é definitiva.
Além disso, como se sabe a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
participa, ativamente, do processo administrativo (art. 2º do Decreto n. 75.445/75 e
59
Súmula 473 do STF: “A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios
que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de
conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a
apreciação judicial”.
65
art. 5º do Decreto n. 83.304). Portanto, é da competência da PGFN acompanhar e
analisar as decisões dos Conselhos de Contribuintes (art. 8º do Regimento Interno
da PGFN).
Há ainda o fato de que, pelo que se depreende do artigo 43 do Decreto n.
70.235/72, a decisão definitiva contrária ao sujeito passivo será cumprida no prazo
para cobrança amigável fixado no art. 21 do citado decreto. E, uma vez, esgotado
este prazo de cobrança amigável, o órgão preparador declarará o contribuinte
devedor e encaminhará o processo à autoridade competente para a execução da
dívida.
Caso contrário, sendo a decisão definitiva favorável ao contribuinte, deve a
autoridade preparadora exonerá-lo de ofício, dos gravames decorrentes do litígio,
consoante art. 45 do decreto que regula o processo administrativo fiscal na área
federal.
Ainda em relação à Portaria n. 1.087/04 da PGFN o mestre Ives Gandra,
tece louváveis comentários, advertindo que:
Como se percebe, o Poder Judiciário, com a neutralidade de um
poder técnico, não agasalha tal tipo de aventura – capaz de ensejar,
a meu ver, até responsabilização do Erário, por força do § 6º do art.
37 da CF/88, pelos prejuízos que tal conduta causar aos
contribuintes -, razão pela qual o infeliz parecer do digno e
competente Procurador Geral da Fazenda Nacional – cujo teor
causou-me surpresa, por conhecer a inteligência e cultura jurídica de
seu autor – não deverá ter qualquer êxito, quando e se vier a ser
utilizado, perante o Judiciário. Até porque não supera a falta de uma
das condições da ação, que é o legítimo interesse de agir.60
Além disso, à PGFN é assegurado o contraditório e a ampla defesa em todo
o processo administrativo, desde a impugnação pelo sujeito passivo até a decisão
final da Câmara Superior de Recursos Fiscais (última instância administrativa).
Soma-se a isto o fato de que se o Judiciário acatasse o Parecer Fazendário, seria
favorável aos gastos desnecessários da União Federal com honorários de
sucumbência, uma vez que houve trânsito em julgado dasfavorável à União Federal.
Por isso mesmo, não cabe à Fazenda Nacional socorrer-se ao Judiciário para
60
Fonte: Jornal Valor Econômico de 30.09.2004.
66
reverter situação que lhe for desfavorável no processo administrativo. Portanto, o
Parecer da PGFN de n. 1.807 padece de ilegalidade e de inconstitucionalidade.
4.2. Corrente defensora da possibilidade de recurso judicial por parte
da Fazenda Nacional contra as decisões prolatadas pelos Conselhos de
Contribuintes que lhe forem desfavoráveis.
De acordo com esta corrente minoritária, porém não menos importante, é
defendida a tese de que é possível, ao menos no plano teórico, falar-se na
possibilidade da Fazenda Nacional, por meio de seus órgãos próprios e mediante os
procedimentos adequados, recorrer ao Poder Judiciário contra certas decisões
administrativas, de última instância, proferidas pela CSRF que lhe sejam
desfavoráveis, posição esta defendida pela própria Fazenda e por alguns
doutrinadores.
Um dos argumentos utilizados por esta corrente de pensamento é o de que
deve haver tratamento isonômico entre a Administração e o administrado, tornando
necessário, assim, o recurso da Fazenda Nacional ao Poder Judiciário em algumas
hipóteses nas quais a mesma restar vencida perante os Conselhos de Contribuintes.
De acordo com os que aderem a esta segunda corrente “[...] por que razão
se justificaria a quebra de igualdade entre as partes, não se facultando à Fazenda a
mesma oportunidade concedida ao particular (contribuinte), já que pelo princípio da
Isonomia, explicitado na CF/88, art. 5º, caput, só pode haver tratamento diferenciado
para pessoas que se encontrem em situações também diferentes”61.
Além disso, os defensores desta tese questionam que deve ser garantido o
recurso ao Poder Jurisdicional pela Administração, tendo em vista a primazia do
interesse público sobre o interesse privado, que também é um princípio que deve
nortear toda a atividade da Administração Pública.
Outro argumento não menos relevante suscitado pelos que defendem ser
possível a Fazenda Pública Nacional recorrer ao Judiciário de decisão definitiva da
CSRF que lhe for desfavorável, decorre do fato de que a composição dos Conselhos
61
PINHEIRO, Juliana de Melo Vilar Pitta. Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional. Ano 6/7 –
n. 6/7. Brasília: Fortium Editora, 2004/2005, p. 172.
67
de Contribuintes é paritária, significando dizer que na sua formação existe, em
número igual representantes da Fazenda e de contribuintes, o que garante, pelo
menos em tese, a imparcialidade nas decisões tomadas em sede de recurso
administrativo fiscal.
Essa imparcialidade permite que tanto a Administração quanto o
administrado, na questão fiscal, tenham direito a uma decisão fruto de uma
discussão eqüitativa entre os diversos julgadores do Órgão Colegiado, que em igual
número, representam os interesses da Fazenda e dos contribuintes, de acordo com
a sua formação e origem.
Portanto,
para
esta
segunda
corrente,
diante
dos
Conselhos
de
Contribuintes, a Administração Tributária e o contribuinte estão em condição de
igualdade, não havendo qualquer diferença entre eles que pudesse justificar um
tratamento diferenciado quanto à possibilidade de recurso judicial contra as decisões
proferidas no âmbito da instância superior do Processo Administrativo Fiscal.
Outro enfoque dado à questão é se o contribuinte, que pode ou não escolher
discutir a lide fiscal no âmbito administrativo, tem o direito de recorrer ao Judiciário
sempre que estiver diante de uma decisão desfavorável, razão esta que assiste
também a Fazenda Nacional para se socorrer do Judiciário quando as decisões dos
Conselhos lhes forem desfavoráveis, já que a submissão ao processo administrativo
não é voluntária, mas ocorre sempre que o contribuinte elege tal via para discutir a
matéria fiscal.
Para Juliana de Melo Vilar, que adere também a esta segunda corrente, “[...]
alguns princípios fundamentam a tese ora defendida, de que a Fazenda Pública
pode ir a juízo pleitear a anulação das decisões proferidas pelos Conselhos de
Contribuintes que lesem o seu direito, dentre eles o princípio da Isonomia, do Direito
de Ação, da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado”62.
Outro argumento utilizado para os defensores desta tese é que a decisão
definitiva dos Conselhos quando negativa à Fazenda, segundo Nadja Aparecida:
[...] não se reveste dos efeitos inerentes à coisa julgada porque dela
inafastável o controle judicial. O sistema normativo brasileiro não
valida a figura da coisa julgada administrativa porque mesmo a auto62
PINHEIRO, Juliana de Melo Vilar Pitta. Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional. Ano 6/7 –
n. 6/7. Brasília: Fortium Editora, 2004/2005, p. 178.
68
executoriedade e o exercício da autotutela sobre seus atos – poderes
inerentes à Administração Pública – não estão livres do controle
jurisdicional.63
Importante salientar também que esta segunda corrente tem defensores
renomados que também tiveram participação no XXIII Simpósio Nacional de Direito
Tributário, dentre eles José Augusto Delgado, o qual considera que “a competência
atribuída aos órgãos julgadores da Administração é de natureza relativa e sujeita ao
controle do Poder Judiciário, pouco importando que a decisão seja a favor ou contra
o Estado. [...] Os instrumentos jurisdicionais postos para o controle da legalidade, da
moralidade, da igualdade, do justo pagamento do tributo tanto servem ao cidadãocontribuinte como ao Estado”64.
Outro doutrinador que também deixou sua contribuição intelectual para o
referido Congresso foi Francisco de Assis Alves ao expressar que “[...] toda decisão
só se torna definitiva sobre uma dada controvérsia, quando ditada pelo Poder
Judiciário. As garantias constitucionais de acesso ao Judiciário, da ampla defesa e
do devido processo legal são asseguradas tanto ao contribuinte quanto à Fazenda
Pública. Não há no Texto Maior qualquer ressalva nesse sentido. Portanto, do
aspecto legal nada impede que a Fazenda Pública intente ação anulatória contra
decisão administrativa a ela contrária”65.
Cita-se também a participação de Dirceu Antônio Pastorello no Seminário
que também entende ser possível a presença da Fazenda Pública em juízo para
pedir a anulação da decisão administrativa a ela adversa quando, por exemplo, for
proferida contra orientação uniforme, mansa e pacífica do Plenário do Superior
Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Ainda de acordo com o mesmo
autor, “[...] essa atitude da Administração em nada afeta a estabilidade das relações
jurídicas entre administração e administrado, porque senão teríamos que afirmar
também que o acesso ao judiciário por parte do administrado afetaria essa relação.
A decisão da administração não dá origem a um contrato imutável com o
63
Revista de Informação Legislativa, ano 9, n. 34. Senado Federal. ARAUJO, Nadja Aparecida Silva
de. Atuação do Poder Executivo no controle de constitucionalidade, p. 285.
64
DELGADO, José Augusto. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 115.
65
ALVES, Francisco de Assis. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 464.
69
administrado nem pode lhe atribuir mais ou menos direitos. Também não implica em
desprestígio dos órgãos internos, singulares ou coletivos”66.
Reforça essa corrente de pensamento Vinicius T. Campanile ao citar Celso
Alves Feitosa: “[...] com respeito ao tema da revisão da decisão administrativa
proferida, não fico chocado com a possibilidade, em sendo a matéria constitucional,
porque se é verdade que cabe ao Supremo Tribunal, em última instância examinar a
inconstitucionalidade, a liquidação da questão em sede do recurso administrativo
violaria os princípios da isonomia e da liberdade de defesa”67.
Importante também destacar um trecho do pronunciamento do Senhor
Ministro Moreira Alves do Supremo Tribunal Federal, na Conferência Inaugural do
XXIV Simpósio Nacional de Direito Tributário:
[...] o problema do acesso ao Poder Judiciário é um problema que se
desloca. Porque aqui há, também, violação de um direito subjetivo,
porque o Estado tem direito subjetivo de cobrar aquilo que lhe é
devido. E se um órgão subalterno (leia-se Conselho de Contribuintes)
entende que não é devido e o Estado, por sua representação mais
alta, não puder opor-se àquilo, a meu ver, é difícil sustentar que se
possa, nesse caso – nem sequer por lei, mas por mera interpretação
– impedir que o Estado possa socorrer-se ao Judiciário.68
Entretanto, recentemente o i. Ministro do STF, em Conferência Inaugural ao
XXX Simpósio de Direito Tributário, abra-se um parêntese, mudou, em parte, o seu
entendimento dado à matéria sob estudo, aproximando-se dos defensores da
impossibilidade de revisão das decisões dos Conselhos pelo Judiciário, ao afirmar:
[...] é difícil admitir-se que, em que haja uma lei que resolva a
questão constitucional, dando, inclusive, uma personalidade, ainda
que formal ao Conselho de Contribuintes – à semelhança do que
ocorre com o condomínio, por exemplo – possa a Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional mover uma ação em nome da União Federal
(autora) contra a própria União (ré) tendo em vista a circunstância de
66
PASTORELLO, Dirceu Antônio. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo Administrativo
Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT, 2002, p. 534.
67
FEITOSA, Celso Alves apud CAMPANILE, Vinícius T. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5.
Processo Administrativo Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo:
CEU e RT, 2002, p. 588.
68
ALVES, José Carlos Moreira. Direitos Fundamentais do Contribuinte – Pesquisas Tributárias. Nova
série; n. 6. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.), São Paulo: CEU e RT, 2000, pp. 40 e 41.
70
que ela estaria como que representada pelo Conselho de
Contribuintes.
Agora, também, excluir totalmente essa possibilidade me parece
exagero. Aqui o problema mereceria solução por meio de lei ordinária
que afastasse justamente essa problemática infraconstitucional.
Realmente, em face das regras do processo civil, como hoje existem,
fica difícil sustentar processualmente essa possibilidade de autor e
réu ser, em última análise, a mesma pessoa.
De modo que, hoje, eu já acho que seria necessário que houvesse
legislação
a
respeito,
para
afastar
esses
problemas
infraconstitucionais, que são relevantes, não só no sentido de serem
autor e réu a mesma pessoa, como também em virtude da problema
do interesse processual.69
A partir da reflexão do Ministro Moreira Alves sobre este tema bastante
debatido na seara jurídica reforça-se ainda mais a tese de que somente ao
contribuinte é assegurado o direito de recorrer ao Judiciário de decisão
administrativa que lhe for prejudicial.
Contrapondo-se a esta nova tese suscitada pelo jurista Moreira Alves, antes
mesmo que ela viesse à tona, cita-se o Procurador Fazendário Oswaldo Othon,
defensor da possibilidade de a Fazenda ir a juízo para tentar reverter decisão dos
CC ou da CSRF que lhe foi contrária. Para ele o direito de ação deve ser
assegurado tanto ao contribuinte quanto à União, como também assevera que não
há necessidade de lei específica para atribuir personalidade aos Conselhos de
Contribuintes, nos termos a seguir transcritos:
Com o socorro da via judicial, que jamais pode ser afastada a quem
quer que tenha sofrido lesão a direito subjetivo, a Fazenda poderá
obter a ressurreição do crédito tributário previsto em lei, que havia
sido, provisoriamente, extinto, desde, como diz, expressamente, a
norma do artigo 156, IX, do CTN, que ainda possível o ajuizamento,
pelo Estado, de ação anulatória da decisão administrativa e
declaratória da regular existência e exigência do seu crédito, já
constituído pelo respectivo lançamento, colocando o beneficiário da
69
ALVES, José Carlos Moreira. Princípio da Eficiência em Matéria Tributária – Pesquisas Tributárias.
Nova série; n. 12. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.), São Paulo: CEU e RT, 2006, p. 20.
71
decisão como réu, ou de mandado de segurança contra o Presidente
do órgão administrativo jurisdicional, figurando o contribuinte
beneficiário do ato jurisdicional administrativo na condição de
litisconsorte.70
Oswaldo Othon71 também professora que as decisões definitivas no
processo administrativo fiscal fazem tão somente preclusão administrativa, haja vista
que apenas as decisões do Poder Judiciário possuem o efeito da coisa julgada. De
acordo com o doutrinador, a Fazenda pode tentar ressuscitar o crédito tributário, via
Judiciário, pois a decisão administrativa definitiva desfavorável ao Fisco torna
apenas “perempta” a decisão na esfera administrativa.
Segundo o tributarista cearense, devido à relatividade da decisão
administrativa definitiva diante da via judicial, não havendo mais possibilidade de
defesa do administrado na órbita administrativa, nem de demonstração do direito do
Fisco, isto tudo não impede que essa última decisão administrativa seja atacada por
via judicial.
É ponderado também pelo mestre Oswaldo Othon que as decisões finais
dos Conselhos de Contribuintes são “atos administrativos jurisdicionais, mas não
judiciais”. Essas decisões fazem apenas “preclusão administrativa” no mesmo
processo administrativo fiscal, mas não impede que a Fazenda se socorra do Poder
Judiciário em defesa de seu direito subjetivo, exatamente porque, em casos
excepcionais, a vontade dos Conselhos de Contribuintes pode não corresponder à
vontade das mais altas autoridades políticas do Estado.
Ainda em relação à preclusão administrativa defendida pelo jurista sob
comento, o mesmo pondera “[...] que as decisões dos chamados órgãos, singulares
ou colegiados, quase judiciais ou jurisdicionais impróprios, assim considerados
porque não são verdadeiros órgãos jurisdicionais administrativos, não possuindo
seus membros a condição de total imparcialidade nem a garantia institucional e
funcional da vitaliciedade, nunca fazem coisa julgada, ou decisão definitiva, sendo
capazes de produzir, no máximo, decisão terminativa na esfera administrativa,
70
SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “Tendências Atuais do Processo Administrativo
Fiscal”. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT. Bimestral. n. 22, Belo Horizonte: Fórum, 2006,
pp. 104 a 105.
71
SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “Tendências Atuais do Processo Administrativo
Fiscal”. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT. Bimestral. n. 22, Belo Horizonte: Fórum, 2006,
pp. 81 a 117.
72
sujeita à reforma judicial por força do sistema da Constituição brasileira da jurisdição
única”72.
O citado doutrinador diverge por completo da primeira corrente majoritária
quando afirma que existindo lesão a um direito subjetivo, que a seu ver pode ser do
Estado contra o contribuinte, e mesmo que não haja previsão de lei específica, basta
a auto-aplicável garantia constitucional de acesso ao Poder Judiciário a toda e
qualquer pessoa, inclusive o Estado, que venha a sofrer lesão ou ameaça a direito
seu subjetivo, conforme os ditames do art. 5º, caput, XXXV e § 1º da CF/88. Ainda é
externado pelo mesmo autor que há interesse processual da Fazenda Pública, para
acionar o Judiciário, pleiteando a revisão judicial de decisão definitiva no âmbito
administrativo do Conselho de Contribuintes.
Oswaldo Othon afirma também que “o ingresso da União em juízo, em casos
exepcionais, para pleitear reforma ou anulação de decisões preclusas na esfera
administrativa, que lhes sejam desfavoráveis, não fere, em absoluto, ao princípio da
moralidade administrativa, mesmo porque o foco principal é a existência de um
direito indisponível, previsto em lei, ao crédito tributário”73.
A possibilidade jurídica da anulação, mediante ação judicial, das decisões
definitivas desfavoráveis ao Fisco está também estampada no Parecer da PGFN n.
1.087/04 (o qual defendemos, anteriormente, ser inconstitucional), por meio do qual
há também o entendimento de que as decisões do Conselho de Contribuintes
também se revestem da natureza de ato administrativo. Pelo exposto no Parecer
Fazendário a invalidação dos atos administrativos cabe tanto à Administração
Pública quanto ao Judiciário. O mesmo Parecer usa da doutrina de Hely Lopes
Meirelles ao sustentar que nenhum ato do poder público poderá ser subtraído do
exame judicial (de legalidade ou da lesividade ao patrimônio público) e que provenha
de qualquer agente, órgão ou poder.
No Parecer n. 1.087/04 da PGFN é utilizado também como fundamento
jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em especial, trechos do
72
SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. Pesquisas Tributárias. Nova série; n. 5. Processo
Administrativo Tributário. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). 2. ed. São Paulo: CEU e RT,
2002, p. 698.
73
SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes – “Tendências Atuais do Processo Administrativo
Fiscal”. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT. Bimestral. n. 22, Belo Horizonte: Fórum, 2006.
73
voto proferido pelo Desembargador Federal Antônio de Sousa Prudente, na relatoria
da Apelação Cível n. 95.01.05547-7/PA, in verbis:
“Ao que penso, os atos administrativos definitivamente julgados pela
Administração, porque exauridos os meios regulares previstos no
ordenamento processual respectivo, têm força característica dos atos
preclusos, para si própria, tornando-se irretratável, no plano
administrativo.
Tal conclusão não conduz a inatacabilidade do ato em via
contenciosa,
quer
pelo
administrado,
quer
pela
própria
Administração, através de seu representante judicial, porque a
anulação no direito administrativo é instituto regido pelo direito
público, balizado pelos princípios da legalidade, da moralidade, com
vistas à satisfação da finalidade pública. Sendo o ato defectivo de
quaisquer elementos seus constitutivos, não se conformando à lei,
portando defeito de legalidade, de competência, finalidade, forma e
objeto, se sujeita ao desfazimento, quer pela Administração, quer
pelo Judiciário. E se só o Judiciário comporta o monopólio da
jurisdição judicial, de decidir com força de coisa julgada, não é
possível interditar-se à própria Administração fazê-lo em nível
judicial”.
A esta corrente minoritária adere-se também o Ministro do Superior Tribunal
de Justiça, José Delgado, segundo o qual, em posicionamento doutrinário, “[...] a
vedação do acesso da Fazenda Pública ao Judiciário implicaria em conferir
imutabilidade da coisa julgada a uma decisão do Poder Executivo, contrariando o
que estabelece a CF/88, que confere o monopólio jurisidicional ao Poder Judiciário”
74
74
.
Pesquisas Tributárias – Nova Série 5. Processo Administrativo Tributário. In MARTINS, Ives Gandra
da Silva (Coord.). 2 ed. São Paulo: CEU e RT, 2002.
74
CONCLUSÃO
Nesta monografia jurídica ficou demonstrado a importância do Processo
Administrativo Fiscal como importante ferramenta para o contribuinte buscar a
resolução de suas lides fiscais com o Estado ao recorrer aos órgãos julgadores
administrativos em busca da justiça fiscal.
Além disso, restou comprovado que o PAF apresenta uma série de
vantagens aos contribuintes, tais como:
- a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, enquanto discutido na
esfera administrativa; especialização na matéria tributária dos Conselhos de
Contribuintes;
- a impugnação ou recurso do contribuinte é julgado por um colegiado e por
órgão paritário, isto é, formado por igual número de representantes do Fisco e de
contribuintes, e imparcial. Essa imparcialidade permite que tanto a Administração
quanto o administrado, na questão fiscal, tenham direito a uma decisão fruto de uma
discussão eqüitativa, o que garante certa segurança jurídica aos contribuintes;
- têm assegurado o contraditório e a ampla defesa, pois os contribuintes
tendo decisão desfavorável em primeira instância, tem garantido o acesso à
instâncias superiores do PAF, e a qualquer tempo ao Judiciário;
- é menos oneroso que o Judiciário, tendo em vista que os contribuintes não
têm de pagar custas processuais, tendo apenas que arrolar bens e direitos de valor
equivalente a 30% (trinta por cento) da exigência fiscal definida na decisão de
primeira instância quando decide recorrer à segunda instância administrativa,
assegurada a devolução desse percentual caso saia vitorioso do julgamento.
Alguns tributaristas defendem também a aplicação do Princípio do
Contraditório e da Ampla Defesa para a Administração. Para seus defensores o
direito de ação deve ser garantido tanto ao particular quanto ao Fisco.
Ultrapassada esta análise geral do Processo Administrativo Fiscal no âmbito
Federal esta monografia tratou de dois temas bastante polêmicos no âmbito do PAF,
quais sejam:
75
- possibilidade de os Conselhos de Contribuintes deixarem de aplicar lei ou
ato normativo por considerá-los inconstitucionais;
- possibilidade de revisão das decisões definitivas da Câmara Superior de
Recursos Fiscais desfavoráveis à Fazenda Nacional pelo Poder Judiciário.
O primeiro tema, exaustivamente analisado, levou-se em consideração a
existência de uma corrente contra e outra favorável à possibilidade dos Conselhos
deixarem de aplicar lei ou ato normativo por considerá-los inconstitucionais. E, ao se
comparar os argumentos tanto de uma quanto de outra corrente, a meu ver,
prevalece a tese de que não é possível os Conselhos de Contribuintes afastarem a
aplicação de lei ou ato normativo sem antes ter sido declarado inconstitucional pelo
STF, pois o controle de constitucionalidade é exclusivo do Judiciário. Tal
impedimento dos Conselhos de Contribuintes está previsto no seu próprio regimento
interno, como também na maioria da jurisprudência dos Conselhos e da CSRF,
corroborado pela jurisprudência do STF.
Em relação ao segundo tema exposado também foi objeto de análise os
argumentos utilizados tanto pela corrente contra e quanto pela corrente favorável à
possibilidade de revisão das decisões definitivas da CSRF desfavoráveis à Fazenda
Nacional pelo Judiciário.
Posteriormente, confrontando as duas correntes, verifica-se que é
predominante aquela que defende a tese de que não é possível a Fazenda Nacional
se socorrer do Judiciário para rever decisão administrativa que lhe foi desfavorável,
pois não pode ser autor e réu da mesma ação, não fazendo sentido propor um
processo contra si mesmo.
O direito que os contribuintes têm de recorrer ao Judiciário de decisão
administrativa terminativa que lhe foi desfavorável não deve ser estendido a
Administração, pois não se aplica ao caso os Princípios da Igualdade, do
Contraditório e da Ampla Defesa, invocados pela corrente Pro- Fisco.
A decisão definitiva prolatada pela última instância administrativa, mesmo
que desfavorável ao Fisco, é vinculante e imutável para este, devendo, portanto
exonerar o sujeito passivo da obrigação tributária.
Por fim, não teria razão de existir toda esta estrutura de julgamento do
Processo Administrativo Fiscal se suas decisões não forem cumpridas pela própria
76
Administração Pública. Seria ferir de morte a existência e acima de tudo
desprestigiar as decisões prolatadas pelos Conselhos de Contribuintes e pela
Câmara Superior de Recursos Fiscais.
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Benicio Ferraz Zinato - Universidade Católica de Brasília