UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS
CURSO DE FARMÁCIA
MILENA SOUZA SANTOS
ANEMIA FALCIFORME: DA DOENÇA AO TRATAMENTO
Anápolis
2011
MILENA SOUZA SANTOS
ANEMIA FALCIFORME: DA DOENÇA AO TRATAMENTO
Trabalho
monográfico
apresentado
à
Coordenação do Curso de Farmácia da
Universidade Estadual de Goiás como
requisito necessário à obtenção do título de
Bacharel em Farmácia.
Orientador: Prof. MsC Marc Alexandre Duarte Gigonzac
Anápolis
2011
Dedico este trabalho a Deus, meu Pai e criador que zela por mim
em todos os dias e me carrega nos braços em momentos de
tribulação. Aos meus pais Marcelino José dos Santos e Aldaci
de Souza Costa Santos, que sempre confiaram e acreditaram em
mim. A minha tia Edileuza de Jesus Santos (em memória), que
tanto lutou contra a anemia falciforme, e a todos meus familiares
e amigos que contribuíram e ainda contribuem para o meu
sucesso.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela força de cada dia, por cada suspiro e por cada
amanhecer que ele me concedeu até hoje. Ao meu Pai e minha Mãe pelo apoio diário, que
mesmo com distância não deixou de se manter presente no meu dia-a-dia, acreditando em
mim e não permitindo que eu desanimasse. Aos meus irmãos Guilherme Souza Santos e
Gabriel Souza Santos minhas alegrias quando eu estava triste. Aos meus Avos pela
inesgotável dedicação, me auxiliando, elogiando e repreendendo quando necessário. A minha
prima Camilly de Souza Magalhães e minha Tia Edileuza de Jesus Santos (em memória)
minha fonte de inspiração para a execução deste trabalho. A todos meus familiares que
acreditaram no meu potencial. Ao meu namorado Gabriel Jara Bigio por permanecer ao meu
lado nos momentos difíceis e pela incansável paciência. Aos vários Anjos que entraram na
minha vida, meus Amigos, aos que já foram em busca de novos horizontes e aos que
permanecem comigo ao meu lado na minha trajetória de vida e conhecimento, me ensinando,
orientando, enfim contribuindo para meu crescimento acadêmico e principalmente como ser
humano.
“A cada dia que vivo mais me convenço de que o
desperdício da vida está no amor que não damos, nas
forças que não usamos, na prudência egoísta que nada
arrisca, e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos
também a felicidade.”
(Carlos Drummond de Andrade, poeta, contista e cronista
brasileiro)
RESUMO
Anemia falciforme é a forma mais comum de um grupo de hemoglobinopatias genéticas na
qual a hemoglobina humana normal (Hb A) é parcial ou completamente substituída por
hemoglobina falciforme mutante (Hb S). A causa da Hb S é uma mutação puntiforme com
uma única substituição de amino-ácidos na porção 6 da cadeia de b-globina. A hidroxiuréia,
fármaco citotóxico, é a estratégia terapêutica disponível para o tratamento, e atua como fonte
de óxido nítrico beneficiando pacientes por aumentar os níveis de hemoglobina fetal, uma
hemoglobina geneticamente distinta que evita a polimerização de hemoglobina falciforme
desoxigenada. Concentrações elevadas de hemoglobina fetal podem diminuir a gravidade da
doença por inibir a polimerização da hemoglobina S. O mecanismo de ação da hidroxiuréia
não é plenamente conhecido. Sabe-se que eleva os níveis de Hb F nos eritrócitos, diminui o
número de neutrófilos e altera a adesividade das hemácias ao endotélio. Apesar de apresentar
efeitos adversos ainda desconhecidos e questionáveis, o uso da hidroxiureia vem se tornando
cada vez mais freqüente, pois o alto índice de adesão ao tratamento e a grande eficácia deste
medicamento justificam o seu uso.
Palavras-Chaves: Anemia Falciforme, Hidroxiuréia.
ABSTRACT
Sicle cell anemia is the most common form of group of genetic hemoglobinopathies in which
normal human hemoglobin (Hb A) is partially or completely replaced by mutant sickle
hemoglobin (HB S). The cause of Hb S is punctiform mutation with a single aminoacid
substitution in the portion 6 of the β-globin chain. Hydroxyurea, cytotoxic drug, is available
for the therapeutic treatment, and acts as a source of nitric oxide benefit patients by increasing
the levels of fetal hemoglobin, hemoglobin genecally distinct that prevents the polymerization
of
deoxygenated
sickle
hemoglobin. High
concentrations
of fetal
hemoglobin may decrease the severity of the disease by inhibiting polymerization of
hemoglobin S. The mechanism of action of hydroxyurea is not fully known. It is
known that raises the levels of
HbF,
decreases
the number
of neutrophils and
alters the adhesion of erythrocytes to the endothelium. Despite showing adverse effects are
still unknown and questionable use of hydroxyurea is becoming in creasingly frequent,
because the highrate of adherence to treatment and the great affectveness of this drug justify
its use.
Key Words: Sickle Cell Disease, Hydroxyurea
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................11
2. METODOLOGIA........................................................................................................12
3. HISTÓRICO DA ANEMIA FALCIFORME............................................................12
4. ANEMIA FALCIFORME: UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA..................16
5. A ANEMIA FALCIFORME NO CONTEXTO DA ‘ POLÍTICA RACIAL’........17
6.
POLIMERIZAÇÃO DA HEMOGLOBINA S........................................................19
7. A HEMOGLOBINA FETAL NA ANEMIA FALIFORME....................................21
8. A ANEMIA FALCIFORME.......................................................................................22
8.1 OS HAPLÓTIPOS DA ANEMIA FALCIFORME................................................22
8.2 A ANEMIA FALCIFORME E A MALÁRIA.......................................................23
9. ACONSELHAMENTO GENÉTICO.........................................................................24
10. DIAGNÓSTICO...........................................................................................................26
10.1
TESTE DE SOLUBILIDADE..........................................................................27
10.2
ELETROFORESE DE HEMOGLOBINA........................................................28
11. QUADRO CLÍNICO....................................................................................................29
11.1
AS CRISES DE DOR........................................................................................30
11.2
FALENCIA DE MULTIPLOS ORGÃOS........................................................32
11.3
INFECÇÕES.....................................................................................................33
11.4
IMUNIZAÇÕES................................................................................................34
12. TRATAMENTOS.........................................................................................................35
13. HIDROXIURÉIA.........................................................................................................36
14. O USO DA HIDROXIURÉIA EM FALCÊMICOS.................................................37
14.1
CRITÉRIOS DE INCLUSÃO..........................................................................38
14.1.1 CRITÉRIOS CLÍNICOS DE INCLUSÃO..................................................38
14.2
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO..........................................................................39
14.3
CUIDADOS E PRECAUÇÕES, SITUAÇÕES ESPECIAIS...........................39
15. EFICÁCIA DA HIDOXIURÉIA................................................................................39
16. TOXICIDADE DA HIDROXIURÉIA.......................................................................40
17. TRATAMENTOS FUTUROS PARA ANEMIA FALCIFORME..........................41
18. CONCLUSÃO..............................................................................................................43
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................44
1. INTRODUÇÃO
A anemia falciforme (AF) é a doença hereditária monogênica mais comum no Brasil.
A causa da doença é uma mutação de ponto (GAG->GTG) no gene da globina beta da
hemoglobina, que origina uma hemoglobina anormal, denominada hemoglobina S (HbS), ao
invés da hemoglobina normal, denominada hemoglobina A (HbA). Esta mutação leva à
substituição de um ácido glutâmico por uma valina na posição 6 da cadeia beta, com
conseqüente modificação físico-química na molécula da hemoglobina. Em determinadas
situações, estas moléculas podem sofrer polimerização, com falcização das hemácias,
ocasionando encurtamento da vida média dos glóbulos vermelhos, fenômenos de vasooclusão, episódios de dor e lesão de órgãos (CANÇADO, et al; 2009).
As manifestações clínicas da anemia falciforme variam acentuadamente entre os
genótipos da doença. Mesmo no genótipo mais grave é possível detectar casualmente
pacientes assintomáticos, enquanto outros sofrem incapacitação em conseqüência das
complicações da doença. A maioria dos sistemas orgânicos está sujeita ao processo de vasooclusão, resultando na falência multissistêmica característica, tanto aguda quanto crônica
(PERIN, et al; 2000).
A doença originou-se na África e foi trazida às Américas pela imigração forçada dos
escravos. No Brasil, distribui-se heterogeneamente, sendo mais freqüente onde a proporção de
antepassados negros da população é maior (nordeste). Além da África e Américas, é hoje
encontrada em toda a Europa e em grandes regiões da Ásia. No Brasil, a doença é
predominante entre negros e pardos, também ocorrendo entre brancos (PERIN, et al; 2000).
A Anemia Falciforme foi descoberta em 1904, por um médico de Chicago. James
Herrick observou um estudante universitário negro, de 20 anos de idade, que tinha sido
admitido no hospital, por causa de febre e tosse. O exame mostrou que o paciente estava
acentuadamente anêmico. O número de hemácias era metade do normal (PERIN, et al; 2000).
A Hemoblobina Fetal (Hb F) é produzida pelos genes da globina γ e está restrita a um
pequeno contingente de eritrócitos, cujo número é determinado geneticamente. Nos pacientes
com AF contêm cerca de 20% de HbF e 80% de HbS, enquanto os outros eritrócitos contêm
somente HbS. Sabe-se hoje que a presença de HbF pode alterar os sítios de contato entre as
moléculas de HbS de tal maneira que a formação do polímero fica prejudicada, com
conseqüente redução no processo de falcização (FIGUEIREDO; 2007).
11
Em 1994, foi iniciado nos Estados Unidos e Canadá um estudo multicêntrico, duplo
cego, na tentativa de analisar a eficácia da Hidroxiuréia (HU) como agente terapêutico na AF.
Charache em 1995 publicou resultados preliminares deste estudo, concluindo que a HU não
só diminuiu a freqüência das crises de falcização, como também elevou os níveis de
hemoglobina, hematócrito e HbF.
O presente trabalho tem como objetivo enfatizar a necessidade de um diagnóstico
precoce da doença para que se possa ter o manejo adequado da AF, mas principalmente um
tratamento contínuo e cauteloso com a administração da HU para que se possa alcançar de
fato uma melhor qualidade de vida para esses pacientes.
12
2. METODOLOGIA
Realizou-se um trabalho de revisão bibliográfica abordando o tratamento com a HU e
de outros aspectos que contribuem para a melhora na qualidade de vida dos falcêmicos. Para
tanto, buscou-se dados de artigos indexados no Scielo, Bireme, além de publicações da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, BRASIL) e Organização Mundial de
Saúde (OMS), no período de 1993 à 2010.
3. HISTÓRICO DA ANEMIA FALCIFORME
Em 1910, o médico James Herrick observou que um dos seus pacientes que era um
jovem negro que havia emigrado para Chigado, apresentou um quadro de anemia severa
seguida de icterícia, mas o pesquisador associou estes sinais e sintomas com o diagnóstico de
anemia hemolítca, o fator que a diferenciava em seu relato era a alteração da forma dos
eritrócitos (NAOUM, 2000).
Em 1927, Hanh e Gillepsie descobriram que a falcização dos eritrócitos ocorria como
conseqüência da exposição das células a uma baixa tensão de O2 (NETO, PITOMBEIRA;
2003).
Em 1947, o estudante brasileiro de medicina Jessé Accioly descobriu o mecanismo de
herança da AF, baseando-se nos mecanismos de herança descritos por Mendel (NETO, 2010).
Com seus conhecimentos debruçou-se sobre as anotações da distribuição de casos dentro de
famílias, e descreveu assim:
“... ficamos a imaginar o que aconteceria a um indivíduo, filho de dois
outros sickle cell trait, e que herdasse de ambos os progenitores o gen
responsável pelo estigma falciforme, isso é, que fosse homozigoto. Daí
nasceu uma hipótese que apresentei em nota prévia em uma das sessões
realizadas por ocasião da inauguração do Instituto Brasileiro para
Investigação da Tuberculose...” (NETO, p.p; 2010)
Com essa hipótese em mente, Jessé Accioly esboçou um heredograma modelo de
herança tipo autossômica recessiva (NETO, 2010).
13
Em 1949, Linus Pauling demonstrou que havia uma diferente migração eletroforética
da hemoglobina de pacientes com anemia falciforme quando em comparação com a
hemoglobina de indivíduos normais (NETO, PITOMBEIRA; 2003).
A hemoglobina humana consiste de quatro cadeias polipeptídicas que se combinam
tetramericamente. A ocorrência de mutações nos genes responsáveis pelo seqüenciamento e
estrutura de cada tipo de cadeia provoca uma troca de aminoácidos resultando na formação de
hemoglobinas anormais, das quais as hemoglobinas S e C são as mais comuns. Figura 1
(LIMA, et al; 2006)
Figura 1: Cadeias polipeptídicas da hemoglobina humana
As várias formas de apresentação clínica dos pacientes portadores de AF, em
diferentes localidades do mundo, variando de formas leves, quase assintomáticas, a formas
incapacitantes ou com alta taxa de mortalidade, têm sido fonte de inúmeras pesquisas ao
longo tempo. A substituição da base nitrogenada timina (T) por adenina (A), ocasionando a
substituição do aminoácido ácido glutâmico por valina, na posição 6 da cadeia β, é a mesma
para todo paciente (Figura 2). A polimerização da HbS e a falcização das hemácias são
extremamente bem conhecidas. As variações das condições climáticas, sociais, econômicas e
de cuidados médicos contribuem para esta diversidade, mas não explicam todo o seu contexto
(NETO, PITOMBEIRA; 2003).
14
Figura 2: Substituição da base nitrogenada
O traço falciforme é umas das condições genéticas mais freqüentes nas populações
brasileiras, afetando de 6 a 10% dos negróides e cerca de 1% na população geral. Esse caráter
falciforme, resultante da heterozigose para o gen da Hb S, apresenta um gen normal (β A) e um
afetado (βS) da cadeia beta e produz cerca de 60% de Hb A e 40% de Hb S. O fato da Hb A
está presente em uma maior porcentagem justifica a ausência de sintomas no portador dessa
anormalidade genética (LIMA, et al; 2006).
A denominação “anemia falciforme” corresponde à homozigose para o gene βs (Hb
SS), em geral resultante da herança de um gene anormal do pai e um da mãe. Corresponde à
forma mais grave das síndromes falciformes (LIMA, et al; 2006).
A introdução da Hb S no Brasil, responsável pela AF, deu-se através do tráfico de
escravos de inúmeras tribos africanas, tráfico este iniciado em 1550 e suspenso oficialmente
em 1850, a partir da abolição da escravatura. O fluxo migratório se expandiu para várias
regiões do país e iniciou-se um processo de miscigenação racial, que hoje é uma característica
do nosso país (RUIZ, 2007). Sendo assim, a anemia falciforme distribuiu-se de maneira
heterogênea, sendo mais freqüente onde a proporção de antepassados negros é maior. Além da
África e America, a AF é hoje encontrada em toda a Europa e em grandes regiões da Ásia
(ANVISA, 2005).
Atualmente, já foram descritas mais de 1.200 mutações nos genes das cadeias
globínicas. No entanto, as mais freqüentes e clinicamente significantes são as variantes
estruturais para hemoglobinas S e C (Hb S e Hb C) (SOMER, et al; 2006). Estima-se que hoje
tenhamos de 20 a 30 mil brasileiros portadores da doença falciforme (CANÇADO, et al;
2009).
15
Como já foi dito, a denominação “anemia falciforme” é reservada para a forma da
doença que ocorre nesses homozigotos SS, porém o gene da HbS pode combinar-se com
outras anormalidades hereditárias das hemoglobinas, como hemoglobina C (HbC),
hemoglobina D (HbD), beta-talassemia, entre outros, gerando combinações que também são
sintomáticas, denominadas, respectivamente, hemoglobinopatia SC, hemoblobinopatia SD,
S/beta-talassemia. No conjunto, todas essas formas sintomáticas do gene da HbS, em
homozigose
ou
em
combinação,
são
conhecidas
como
doenças
falciformes
(DF)(ANVISA,2002).
A AF caracteriza como quadro hemolítico hereditário que evolui cronicamente,
causando danos físicos e emocionais às pessoas acometidas. No mundo, cerca de 270 milhões
de pessoas possuem genes que determinam hemoglobinas anormais, e 300 a 400 mil crianças
nascidas vivas apresentam anemia falciforme ou alguma forma de talassemia grave
(BANDEIRA; et al, 2008).
A proteína S é uma proteína mutante, cuja principal característica é a de sofrer
polimerização sob baixas tensões de oxigênio. A hemoglobina S, polimerizando-se dentro dos
eritrócitos, deforma-os, fazendo com que os mesmos assumam forma de foice (ZANETTE,
2007).
Os glóbulos vermelhos em forma de foice não circulam adequadamente na
microcirculação, resultando tanto em obstrução do fluxo sangüíneo capilar como em sua
própria destruição precoce. Este mecanismo fisiopatológico acarreta graves manifestações
clínicas, com maior freqüência após os 3 meses de idade. Durante os 6 primeiros meses de
vida, esses indivíduos são geralmente assintomáticos devido aos altos níveis de hemoglobina
F (NUZZO, 2004).
A AF, doença genética que levou ao conceito de doença molecular, é caracterizada por
anemia hemolítica crônica e fenômenos vasooclusivos que levam a crises dolorosas agudas e
à lesão tecidual e orgânica crônica e progressiva (ANVISA, 2002).
No Brasil, a AF é questão de saúde pública, com importância epidemiológica em
virtude da prevalência. Esta tem variado de 0,1% a 0,3%, dependendo do grupo e da região
estudados e da morbimortalidade. Quanto ao traço falciforme, a prevalência tem variado de
2,7% a 6%. As regiões onde a condição tanto de portador quanto de doente é mais prevalente
são Sudeste e Nordeste. A AF predomina na população negróide, com tendência a atingir
parcela cada vez maior da população devido ao alto grau de miscigenação no Brasil
(BANDEIRA; et al, 2008).
16
A atual expectativa de vida para a população americana com AF é de 42 anos para
homens e 48 anos para mulheres, embora esteja muito superior aos 14,3 anos de 3 décadas
atrás, esta ainda se encontra muito aquém da expectativa de vida para a população geral, o que
evidencia a necessidade de maiores investimentos e progressos no tratamento desses pacientes
(NUZZO, 2004).
4. ANEMIA FALCIFORME: UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 270 milhões de pessoas
carregam genes que determinam a presença de hemoglobinas anormais e estudos realizados
em populações brasileiras revelaram a possibilidade de que existam hoje no Brasil
aproximadamente 10 milhões de pessoas portadoras de hemoglobinas anormais, e que
anualmente nasçam cerca de 3 mil pessoas com a forma homozigota. Desta forma, as
hemoglobinopatias representam um problema de saúde pública no nosso país e como medida
de prevenção e controle das hemoglobinopatias no Brasil, o ministério da Saúde instituiu a
Portaria 822/01, de 06 de junho de 2001, que incluiu a triagem de hemoglobinopatias no
Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN). Esse programa inclui o tratamento
paliativo e preventivo, o encaminhamento de pacientes, o aconselhamento genético e a
triagem de heterozigotos (GARANITO, 2008).
A triagem neonatal é uma ação preventiva que permite fazer o diagnóstico de diversas
doenças congênitas ou infecciosas, assintomáticas no período neonatal, a tempo de se
interferir no curso da doença, permitindo, desta forma, a instituição do tratamento precoce
específico e a diminuição ou eliminação das seqüelas associadas a cada doença (ANVISA,
2001).
Embora tratáveis, as hemoglobinopatias ainda são incuráveis o tratamento precoce
comprovadamente aumenta a sobrevivência dos afetados e melhora a sua qualidade de vida,
mas não possibilita a sua cura clínica. Tais indivíduos deverão ser seguidos regularmente em
um serviço especializado por toda a sua vida, com avaliações clínicas periódicas e internações
hospitalares em situações de risco. Sem o acompanhamento clínico especializado, os
benefícios obtidos pelo tratamento precoce não serão consolidados (RAMALHO, MAGNA,
PAIVA; 2003)
As hemoglobinopatias são anemias hemolíticas crônicas, dependentes, em grande
parte, dos procedimentos especializados de hemoterapia. Por essa razão, muitas vezes a
17
triagem neonatal e o tratamento dos afetados não são feitos nas mesmas instituições. Torna-se
necessária, portanto, a esquematização de um sistema ágil de encaminhamento de pacientes,
para atenuar os eventuais efeitos nocivos da dicotomia local de diagnóstico/local de
tratamento (RAMALHO, MAGDA, PAIVA; 2003).
A importância do diagnóstico é o aconselhamento genético, pois do casamento ao
acaso desses tipos de heterozigotos, podem nascer pacientes portadores de anemias
hemolíticas crônicas, muitas vezes fatais na infância (GARANITO, 2008)
O aconselhamento genético é um caso singular para a análise da composição de um
campo como proposta na teoria social de Pierre Bourdieu. É por meio do aconselhamento
genético que o avanço das descobertas no campo da genética, como é o caso do Projeto
Genoma Humano, tem chegado ao alcance de um número cada vez maior de pessoas que são
informadas sobre riscos de doenças ou mesmo cuidados a serem adotados com relação a uma
doença ou traço genéticos identificados (SOUZA, 2006).
A importância do programa de triagem neonatal é indiscutível e a correta interpretação
do resultado do “teste do pezinho” é fundamental para o diagnóstico e a orientação inicial do
paciente. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado reduzem expressivamente a
morbidade e a mortalidade (GARANITO, 2008).
5. A ANEMIA FALCIFORME NO CONTEXTO DA POLÍTICA RACIAL
As idéias de que a raça é primariamente uma categoria biológica e de que as diferenças
na saúde são geneticamente determinadas continuam a exercer forte influência no pensamento
epidemiológico e da saúde pública (LAGUARDIA, 2002).
O antropólogo norte-americano Melbourne Tapper argumenta que desde a sua
descoberta, a AF vem sendo tratada como uma doença específica do corpo negro.
Contextualizando esta formulação, o autor se utiliza dos estudos do historiador David
McBride, segundo o qual, na primeira métade do século XX a medicina era agenciada
segundo um paradigma denominado sociomedical racialism, que se baseava na noção de que
doenças e outras anormalidades poderiam ser entendidas em termos anatômicos e raciais.
(PENA, 2008)
Ao longo das décadas de 1950, 1960 e 1970, foi criado um discurso em torno da AF
que foi enfatizado cada vez mais a questão da responsabilidade do individuo perante a
síndrome. Com isso houve uma espécie de cuidados intensivos do self e, por extensão, da
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raça. A partir disso, criou as condições para a formulação de políticas públicas, em particular,
o National Sickle Cell Anemia Control Act, logo modificada para “National Sickle Cell
Anemia Prevention Act” (FRY, 2005).
Essa legislação relacionada à anemia falciforme teve como efeito a construção de uma
‘comunidade’ real e responsável. Por todo o país, negros se organizaram para passarem por
testes e para encorajar os outros a se testarem também, buscando averiguar se seriam ou não
portadores do gene (ZAGO, 2007).
Em pouco tempo, alguns estados passaram a introduzir testes compulsórios para
cidadãos negros e, em alguns casos, portadores do traço perderam a chance de emprego em
algumas profissões (aeromoça, por exemplo) ou de ingressar em academias militares e da
aeronáutica (PENA, 2009).
No entanto a idéia de envolver a comunidade negra na responsabilidade social com a
doença enfureceu alguns negros que viram a gestão da anemia falciforme como uma
conspiração, uma forma insidiosa de discriminação, e até genocídio (NAOUM, 2000).
Na década de 1970, a conexão entre a doença e a raça, foi adotada paradigmaticamente
pelo movimento negro americano, em especial pelo cardiologista Richard Williams no seu
livro Textbook of black-related disease (PENA, 2009).
Em 1949 após a descoberta da lógica mendeliana da transmissão da doença, os
pesquisadores podem supor que o discurso sobre a relação entre raça e a AF perdesse sua
força. Era esperado que termos como raça, negro, pessoas de cor; tivessem se tornado sem
sentido (FRY, 2005).
A AF apresenta um importante papel na gênese do conceito de doença molecular e na
evolução da medicina genômica. Mas é necessário questionar a conceituação da anemia
falciforme como “doença racial” e apresentá-la como uma “doença geográfica”, sendo assim
uma visão mais moderna e correta (PENA, 2009).
A distribuição populacional da AF e especialmente a sua maior prevalência em
indivíduos negros não tem nada a ver com raça, mas sim com geografia (NAOUM, 2000).
O grande geneticista, bioquímico, fisiologista e ativista político inglês J.B.S. Haldane
(1892-1964), é um dos pais da nova síntese evolucionária, que compatibilizou a teoria de
Darwin e Mendel que ocorreu na primeira metade do século XX (PENA, 2009).
Em 1949, Haldane proferiu uma conferência na Itália e realçou, aparentemente pela
primeira vez, o fato de que as doenças infecciosas têm um papel evolucionário
importantíssimo como agentes seletivos (PENA, 2009).
19
Em 1954, o médico inglês Anthony C. Allison publicou resultados de sua pesquisa
sobre malária e anemia falciforme em Uganda. Ele observou que, em crianças pequenas com
malária, as densidades do parasita Plasmodium falciparum no sangue eram quatro vezes
menores em heterozigotos AS do que em homozigotos normais AA. Ele calculou que as
crianças AS tenham uma chance 76% maior de sobreviver ao primeiro ataque de malária do
que crianças AA (FRY, 2005).
Por exemplo, o gene está ausente nas populações das regiões altas da Etiópia (Tigre,
Falasha, Amhara e Galla), nos Masai, Kamba e Chaga do Quênia e da Tanzânia, nos
bosquímanos e hotentotes da parte sul da África e nos Shona, uma população de língua banto
do Zimbábue. Em outras palavras: a presença do gene não tem nada a ver com cor ou raça,
mas com geografia (ORLANDO, et al; 2000).
Por mais que a sociedade insiste em enfatizar a relação entre a doença e a população
afro-descendente, as práticas de detecção, calçadas no discurso da ciência genética, tratam,
felizmente, essa moléstia como uma doença que é potencialmente de todos (FRY, 2005).
6. POLIMERIZAÇÃO DA HEMOBLOBINA S
A polimerização da Hb S ocorre sequencialmente em três níveis: molecular, celular e
circulatório. No nível molecular o desenvolvimento do processo da falcização se dá a partir do
momento em que a oxi-Hb S perde o oxigênio e se torna deoxi-Hb S. A deoxi-Hb S promove
a formação de pontes de hidrogênio entre os aminoácidos valina da posição número 1 da
globina beta S, que é normalmente sintetizada para esta posição, e a valina mutante que
substituiu o ácido glutâmico na posição 6 da mesma globina. A formação dessas pontes de
hidrogênio modifica a estrutura espacial da molécula de Hb S e promove contatos
intermoleculares com outros aminoácidos da globina beta S que participam da formação do
tetrâmero. Os principais aminoácidos envolvidos são a fenilalanina da posição 85 e a leucina
da posição 88. Como consequência, formam-se agregados desses filamentos que se
polimerizam e alteram a estrutura globular das moléculas de Hb S, modificando também a
morfologia discóide do eritrócito para formas bizarras, das quais a mais conhecida é o
afoiçamento (Figura 4). As variáveis que interferem na formação e na cinética da
polimerização da Hb S são o oxigênio, a concentração da Hb S corpuscular média C[Hb S]
CM, a temperatura e outras hemoglobinas normais e variantes. O oxigênio é o elemento mais
20
importante, pois somente a deoxi-Hb S se polimeriza, e qualquer fator que o estabilize (ex.: a
queda do pH sanguíneo e o aumento da concentração do 2,3 di-fosfoglicerato) reduzirá a
afinidade pelo oxigênio, perpetuando o estado desoxigenado da Hb S e a sua polimerização. A
C[Hb S] CM é normalmente superior ao limite da solubilidade da Hb S em condições
experimentais, fato que pode explicar sua facilidade em cristalizar-se e formar polímeros. A
redução da temperatura desfaz a polimerização em condições experimentais. As
hemoglobinas normais, principalmente a Hb A, seguida da Hb Fetal, tem um maior efeito
inibidor da polimerização que outras hemoglobinas variantes. As Hb variantes que melhor se
copolimerizam com a Hb S são as seguintes, em ordem decrescente: C, D, O Arábia e J
(NAOUM, 2003).
No nível celular, os homozigotos para Hb S (ou Hb SS) conservam seus eritrócitos
com a forma bicôncava se o nível de saturação de oxigênio da Hb S estiver acima de 65%,
porém acumulam-se gradativamente produtos de degradação celular provenientes da falência
parcial das bombas de sódio, potássio, cálcio e ATPase. Com a perda de potássio e da água a
C[Hb S] CM se eleva e favorece a polimerização, que se intensifica com a falência da bomba
de cálcio/ ATPase, alterando a permeabilidade da membrana eritrocitária. Esse processo
deletério é a principal causa dos eritrócitos que se tornam irreversivelmente falcizados. Figura
3. A membrana eritrocitária é muito afetada durante a falcização, caracterizada por
desarranjos das proteínas espectrina-actina, diminuição das glicoproteinas, geração de radicais
livres oxidantes e orientação anormal dos fosfolipídeos, apresentando deformações sob forma
de escavações na membrana dos eritrócitos (NAOUM; 2003).
No nível circulatório, a alteração da plasticidade normal dos eritrócitos desencadeada
pelos efeitos polimerizantes da Hb S tornam os eritrócitos falcêmicos com maior
possibilidade de aderirem ao endotélio vascular. Esta aderência decorre de interações entre as
células endoteliais e os eritrócitos falcêmicos, com a participação de antígenos de superfície
celular (CD36 e CD44) e integrinas, que independente do genótipo e de sua concentração, é
suficiente para produzir a meta hemoglobinização desta hemoglobina. Figura 4 (ZAGO,
PINTO; 2007)
21
Figura 3: Microscopia eletrônica de eritrócitos com oxiHb S
Figura 4: Microscopia eletrônica da célula falciforme
7.
A HEMOGLOBINA FETAL NA ANEMIA FALIFORME
O número de Hb F de um indivíduo está sob controle genético, embora não se saiba se
esse controle seja do tipo monogênico ou poligênico. Algumas alterações hereditárias fazem
com que a Hb F permaneça em níveis mais elevados, é o que ocorre principalmente nas
talassemias beta (RIBEIRO, 2008).
A Hb F é formada por duas cadeias gama e duas cadeias alfa, característica do período
fetal do desenvolvimento, tendo sua síntese diminuída no período pós-natal. Em algumas
alterações hereditárias, a Hb F permanece aumentada, como nas delta-beta talassemia, beta
talassemia, e a persistência hereditária de hemoglobina fetal (PHHF). A síntese da globina
22
gama, também pode ser estimulada por fatores externos como leucemias, transplantes de
medula óssea, induções químicas, dentre outros (ZAMARO, 2002).
Um dos principais interferentes na clínica da AF é a taxa da HbF presente no
indivíduo com a doença. Aqui, torna-se importante ressaltar que os níveis de HbF variam
entre pacientes com HbS (RIBEIRO, 2008).
A HbF é produzida pelos genes da globina γ e está restrita a um pequeno contingente
de eritrócitos, cujo número é determinado geneticamente. Nos pacientes com AF, as células F
contêm cerca de 20% de HbF e 80% de HbS, enquanto os outros eritrócitos contêm somente
HbS. Sabe-se hoje que a presença de HbF pode alterar os sítios de contato entre as moléculas
de HbS de tal maneira que a formação do polímero fica prejudicada, consequente há uma
redução no processo de falcização (FIGUEIREDO, 2007).
O aumento dos níveis de HbF está associado à redução da morbidade e mortalidade da
doença. Atualmente, diversos agentes citotóxicos (hidroxiureia e 5-azacitidina), fatores
de crescimento hematopoético (eritropoetina) e ácidos graxos de cadeia curta (butirato e
derivados) têm sido utilizados e amplamente estudados no tratamento da anemia falciforme,
pois estimulam a síntese de HbF (SILVA, GONÇALVES, MARTINS; 2009).
8. A ANEMIA FALCIFORME
8.1 OS HAPLÓTIPOS DA ANEMIA FALCIFORME
Os últimos fatores moduladores conhecidos atualmente são os haplótipos da Hb S, que
podem ser descritos como sítios polimórficos de endonucleases de restrição, localizados no
interior e ao redor do gene da cadeia beta mutante (PERIN, et al; 2000)
Apesar de possuírem identificação numérica, eles são mais comumente designados de
acordo com a área geográfica onde foram primeiramente identificados: Senegal, Benin, CAR
("Central Africa Republic" ou Bantu) e Asiático (Indu Arábico). Foi descrito também o
haplótipo Cameroon, localizado apenas em um único grupo étnico na República dos
Camarões (PERIN, et al; 2000)
Desde os anos 50 muitos estudos têm sido realizados em diferentes partes do mundo
com o objetivo, inicialmente de se conhecer a prevalência e medidas preventivas, e mais
recentes para o conhecimento dos haplótipos (NAOUM, 2000).
23
Na América, os haplótipos mais comuns são: Senegal, Benin e CAR. No Brasil os
haplótipos mais freqüentes encontrados foram Banto (77%), Benin (30%) e Senegal (3%)
(PERIN, et al; 2000).
Os haplótipos do tipo Senegal e Saudita estão comumente associados à níveis mais
altos de hemoglobina fetal (acima de 15%) e a um curso clínico mais brando. No haplótipo do
tipo Benin, os níveis de hemoglobina fetal são intermediários (de 5 a 15%) e os benefícios
quanto ao curso clínico são menos marcantes. O haplótipo do tipo CAR, por sua vez,
apresenta níveis mais baixos de hemoglobina fetal (abaixo de 5%) e o curso clínico mais
grave (FLEURY, 2007).
A concentração de HbF está aumentada nos haplótipos Senegal e asiático (árabe) e
decresce nos haplótipos CAR e Benin, devido a uma taxa de translação no sentido 5’ → 3’ e à
substituição da HbF por HbS mais lenta nos dois primeiros do que nos dois últimos haplótipos
(NETO, PITOMBEIRA; 2007).
A anemia falciforme, por ser uma doença genética de grande destaque no cenário
epidemiológico brasileiro, tem recebido atenção especial de inúmeros especialistas, pesquisas,
movimentos sociais e do governo (GUIMARÃES, COELHO; 2010).
8.2 A ANEMIA FALCIFORME E A MALÁRIA
Em 1949, Haldane disse pela primeira vez que as doenças infecciosas têm um papel
evolucionário importantíssimo como agentes seletivos e descreveu assim:
“Provavelmente uma alteração bioquímica muito pequena pode conferir a uma espécie
hospedeira um grau substancial de resistência a um parasito bem adaptado. Isto tem
um importante efeito evolucionário. E significa que é vantajoso para o individuo
possuir um fenótipo bioquímico raro.” (PENA, 2009).
Em um artigo publicado por Giuseppe Montalenti em 1949, ele, informado da alta
freqüência de heterozigotos da talassemia em regiões endêmicas de malária no sul da Itália,
propôs que, como as hemácias dos heterozigotos para a talassemia eram menores, esse fato os
tornariam mais resistentes à parasitose. Nascia assim a “hipótese da malária”, cuja primeira
confirmação foi feita não em estudos de talassemia, mas da própria anemia falciforme (PENA
2007).
24
Alguns estudos demonstram que a AF surgiu como uma resposta da natureza para
evitar que a malária destruísse a população da África. Em algum momento houve uma
alteração genética que chamamos de mutação, alterando a informação que vem no gene
(DNA). Com a alteração, essas pessoas passaram a produzir a hemoglobina S, em vez da
hemoglobina. Assim, quem tivesse na hemácia a HbS não seria infectado pela malária.
No Brasil, pelo fato de o país ter recebido uma grande população de escravos e por apresentar
alto grau de mistura de raças, existem muitas pessoas portadoras da anemia falciforme,
principalmente os afro descendentes (BANDEIRA, 2004).
O parasita da malária utiliza moléculas presentes na superfície de células vermelhas
não infectadas para a invasão das hemácias e a formação das células em roseta. A invasão das
células vermelhas pelo P. falciparum depende de múltiplas interações moleculares entre os
receptores eritrocitários e os receptores de membrana do parasita (TORRES, DOMINGOS,
2005).
A célula infectada por Plasmodium falciparum, desenvolve saliências em sua
superfície que provocam sua aderência ao endotélio de pequenos vasos sangüíneos. Nesta
situação há menor quantidade de oxigênio, o que favorece o fenômeno do afoiçamento. Como
resultado disto, haverá perfuração das membranas do parasita e depleção de potássio celular
impedindo a multiplicação dos parasitas. Além disso, a destruição prematura dos eritrócitos
parasitados com caráter falciforme e a nutrição deficiente dos parasitas pela HbS são fatores
que impedem a sobrevivência destes parasitas (PENA, 2009).
9. ACONSELHAMENTO GENÉTICO
A AF é a doença hereditária mais comum no mundo e no nosso país. Todas as
características do nosso corpo são feitas por informações que recebemos dos nossos pais por
meio dos genes, que vêm no espermatozóide do pai e no óvulo da mãe. Os genes determinam,
nas pessoas, a cor dos olhos, dos cabelos, da pele, a altura. Com a hemoglobina não é
diferente. Se uma pessoa receber, do pai, um alelo com mutação para produzir a hemoglobina
S e, da mãe, outro alelo com a mesma característica, tal pessoa nascerá com um par de genes
com a mutação e, assim, será portadora de AF (BANDEIRA, et al; 2008).
O Brasil possui registros de programas de aconselhamento genético desde a década de
1950, mas são raras as análises bioéticas sobre essas experiências, sendo possível afirmar que
25
o aconselhamento genético no Brasil é ainda um universo desconhecido (DINIZ, GUEDES;
2003).
A hereditariedade é a questão primordial dessa patologia, por isso o aconselhamento
genético possui importância fundamental, pois tem o intuito de orientar os pacientes
portadores do traço falciforme sobre a tomada de decisões em relação à reprodutividade e
ajudar a compreender outros aspectos da doença, como o sofrimento, tratamento e
prognóstico (GUIMARÃES, COELHO; 2010).
No caso AF, para que o atendimento precoce ocorra, é preciso que as pessoas estejam
informadas sobre a existência da doença e consigam identificá-la. Além da crescente difusão
do aconselhamento genético, o governo federal empenhou-se também em políticas nacionais
educativas e, nos anos 90, na formação de um grupo de trabalho para a elaboração do
Programa Anemia Falciforme (PAF) (DINIZ, GUEDES; 2003).
Os dois pais são portadores de hemoglobina A, portanto não apresentam o alelo com a
mutação para produzir a hemoglobina S, sendo assim não apresentarão a doença.
Os dois pais são portadores do alelo com a mutação para produzir a HbS, portanto seus
descendentes terão AF. Caso uma pessoa receber somente um alelo com a mutação, seja do
pai ou da mãe, e o outro alelo sem a mutação, ela nascerá somente com o traço falciforme. O
portador de traço falciforme não tem doença e não precisa de tratamento especializado. Ele
deve ser bem informado sobre isso e saber que, se tiver filho com outro portador de traço
falciforme, poderá gerar uma criança com AF ou com traço ou sem nada. Figura 5 (ANVISA,
2002).
Figura 5: 100% de Hb S
Os dois pais são portadores de traço falciforme a probabilidade é que 25% de seus
filhos nasçam com a doença, 50% com traço falciforme e 25% sem a doença. Figura 6.
26
Figura 6: 50% de traço falciforme, 25% de Hb A e 25% de Hb S
A transferência dessas informações para o paciente apresenta vários aspectos que
devem ser levados em consideração, incluindo-se a receptividade, tanto emocional quanto
intelectual, dos indivíduos orientados (GUIMARÃES, COELHO; 2010).
No caso da AF, para que o atendimento precoce ocorra, é preciso que as pessoas
estejam informadas sobre a existência da doença e consigam identificá-la (DINIZ, GUEDES;
2003).
Com tudo, fica claro que por meio do aconselhamento genético, o avanço das
descobertas no campo da genética tem chegado ao alcance de um número cada vez maior de
pessoas que são informadas sobre riscos de doenças ou mesmo cuidados a serem adotados
com relação a uma doença ou traço genéticos identificados (SOUZA; 2006).
10. DIAGNÓSTICO
O diagnóstico está estreitamente ligado ao aconselhamento genético, pois do
casamento ao acaso desses tipos de heterozigotos, podem nascer pacientes portadores de
anemias hemolíticas crônicas, muitas vezes fatais na infância (GARANITO; 2008).
O diagnóstico da AF e das demais DF é feito através do diagnóstico laboratorial, que
pode ser feito no período neonatal, no ato do nascimento pelo teste do pezinho ou após o
sexto mês de vida (ANVISA, 2002)
A detecção de HbS durante o período neonatal constitui um marcador para um grupo
de risco genético. A triagem neonatal de hemoglobinopatias tem sido essencial ao diagnóstico
precoce e à instituição de medidas preventivas e promotoras de saúde, principalmente à AF
(BANDEIRA, ET AL; 2008).
27
O PNTN propõe o exame dos pais a partir da identificação de heterozigotos não sendo
recomendando a ampliação da triagem para outros familiares (BANDEIRA, ET AL; 2008).
O exame confirmatório da AF é conhecido como eletroforese de hemoglobina, que em
2005 passou a ser feito nos recém-nascidos durante o "teste do pezinho". Assim foi previsto
pela portaria assinada em 16 de agosto de 2005 pelo ministro da Saúde, Saraiva Felipe
(ANVISA, 2005).
O diagnóstico laboratorial da AF ao nascimento deve ser feito, de preferência, por
técnicas sensíveis de eletroforese de hemoglobinas devido à presença, nessa época da vida, de
alta percentagem de hemoglobina fetal no sangue. No entanto, solução prática e econômica
que vem sendo apontada, desde a década de 70, é a inclusão da pesquisa da hemoglobina S
dentre os exames de rotina das gestantes brasileiras, o que pode ser feito por testes de
solubilidade, que são exames simples que utilizam reagentes baratos e não exigem qualquer
aparelhagem especializada. Dessa forma, o exame eletroforético do sangue do recém-nascido,
que pode inclusive ser feito com amostra de sangue do cordão umbilical, ficará restringido aos
filhos das heterozigotas (ANVISA, 2002).
A detecção efetiva das diversas formas de DF requer diagnóstico preciso, baseado
principalmente em técnicas eletroforéticas, hemograma e dosagens da Hb F. Nos casos de
associação da HbS com variantes de hemoglobinas, como por exemplo, a Hb C, a associação
de técnicas eletroforéticas alcalina e ácida é decisiva para o correto diagnóstico (ANVISA,
2002).
A OMS recomenda a implantação de programas para prevenção e controle de
hemoglobinopatias na América Latina, especialmente no Brasil. A organização de um
programa preventivo requer suporte dos órgãos oficiais de saúde, treinamento de pessoal
capacitado para diagnóstico, aconselhamento genético e clínico dos pacientes (ORLANDO, et
al; 2000).
Para o diagnóstico de DF é indicado os exames de eletroforese alcalina em acetato de
celulose, eletroforese ácida em agar ou agarose, teste de solubilidade, focalização isoelétrica,
dosagem de hemoglobina fetal, dosagem de hemoglobina A2, hemograma completo
(ANVISA, 2005).
10.1
TESTE DE SOLUBILIDADE
28
O teste de solubilidade também conhecido como teste da mancha, tem como princípio
reduzir a Hb S, que é relativamente insolúvel no tampão inorgânico, enquanto outras
hemoglobinas são solúveis (PRUDENCIO, COVAS, DOMINGOS, 2000).
Os testes de solubilidade são rápidos e fáceis de realizar, são usados como um rápido
teste de triagem, em emergências ou como um teste confirmatório para Hb S após eletroforese
em acetato de celulose. Esse teste é baseado na insolubilidade da desoxihemoglobina S. Teste
positivo é indicado com turbidez da solução. Preparações comerciais desse tipo de teste
(como por exemplo o teste Sickledex) são largamente difundidas entre os laboratórios clínicos
e, como há grandes variações em especificidade e sensibilidade, considerações cuidadosas
devem ser feitas na interpretação dos resultados. Figura 7 (PERIN, et al; 2000)
Figura 7: Teste de solubilidade
O teste de solubilidade não apresenta boa sensibilidade para detecção da presença de
Hb S no período neonatal, especialmente nos RN prematuros, uma vez que neste período
ainda não houve a transição de Hb F para hemoglobina do adulto. Nessa faixa etária até mais
ou menos os seis meses de idade, um teste de solubilidade negativo deve ser interpretado com
cautela, principalmente se feito por ocasião de uma situação de emergência (BANDEIRA,
2003).
10.2
ELETROFORESE DE HEMOGLOBINA
A inclusão da eletroforese de hemoglobina nos testes de triagem neonatal aconteceu
mediante a Portaria nº 822/01 do Ministério da Saúde, incluindo a triagem para as
29
hemoglobinopatias.
Esse
fato
representou
o
reconhecimento
da
relevância
das
hemoglobinopatias como problema de saúde pública no Brasil (CANÇADO, 2007).
Devido à necessidade de maior rapidez e manutenção da eficácia, os programas de
triagem neonatal vêm utilizando eletroforese através da focalização isoelétrica (FIE) e
cromatografia líquida de alta eficiencia (CLAE) (BANDEIRA; 2003).
A hemoglobina é uma proteína carregada negativamente e a eletroforese de
hemoglobina em pH alcalino parte desse princípio, uma vez que durante a corrida
eletroforética essas proteínas migram para o pólo positivo. As hemoglobinas com defeitos
estruturais causados por substituições de aminoácidos de diferentes pontos isoelétricos vão
apresentar mudanças em suas cargas elétricas, resultando na ocorrência de diferentes
mobilidades (BANDEIRA; 2003).
O diagnóstico de HbS no período neonatal é dificultado pela presença de grande
quantidade de hemoglobina fetal (Hb F) quando utilizada a eletroforese em pH alcalino. O
emprego de eletroforese em pH ácido visa a reduzir esse problema, pois melhora a condição
de separação das frações de hemoglobina, além de separar a fração S da D, e a C da E, que
correm na mesma faixa na eletroforese em pH alcalino (BANDEIRA, 2003).
11. QUADRO CLÍNICO
As manifestações clínicas da doença costumam ocorrer a partir dos primeiros seis
meses e estendem-se durante toda a vida do paciente, apresentando grande variabilidade
(RIBEIRO, et al; 2008).
As manifestações clínicas das DF derivam diretamente da anormalidade molecular
representada pela presença da HbS. As HbA e HbF, mesmo em concentrações elevadas, não
formam estruturas organizadas dentro das hemácias, quer quando oxigenadas ou
desoxigenadas. As moléculas de HbS, por outro lado, quando desoxigenadas, se organizam
em longos polímeros de filamentos duplos, que por sua vez se associam em feixes com um
duplo filamento central rodeado de seis filamentos duplos de polímeros (ZAGO, PINTO;
2007)
A AF apresenta gravidade clínica variável, uma vez que está sujeita os moduladores de
gravidade de origem genética e ambiental. Muitas vezes, no entanto, ela pode ser fatal na
infância. As síndromes falciformes (SS, SC, ST), caracterizadas pelo fenômeno da falcização
30
das hemácias, são acompanhadas de fenômenos vasooclusivos, com isquemia, dor, infarto,
hepatoesplenomegalia e necrose em vários órgãos. Tabela 1 (RAMALHO, MAGNA, PAIVA;
2003).
Tabela 1: Manisfestações Clínicas da Anemia
Falciforme
Vasooclusão
Necrose avascular da medula óssea
Filtração esplênica alterada
Fibrose esplênica progressiva.
Osteomielite
Síndrome torácica aguda
Crise de aplasia induzida pelo parvovírus humano B19
Expansão da medula óssea
Hiperbilirrubinemia, icterícia e pigmento biliar
Anemia (Hb entre 6 e 9 g/100 ml)
Hemólise
Vasculopatia cutânea
Seqüestro de glóbulos vermelhos
Acometimento renal
Acidente vascular encefálico
Síndrome torácica aguda
11.1
AS CRISES DE DOR
As características da dor aguda, ou da crise vasooclusiva, são de início súbito, sem
explicação, intensidade variável duração de horas ou dias, caráter persistente ou recorrente e
migração de um local para outro do corpo. Pacientes com crises freqüentes são candidatos ao
uso de HU (ÂNGULO, 2003).
Os eritrócitos falciformes expressam maior número de moléculas de adesão (PS,
CD36, CD47, CD49d e BCAM/LU) na superfície externa da membrana celular do que
eritrócitos normais. Essas moléculas favorecem a interação com o endotélio e com outras
células, propagando o processo de vasooclusão (ZAGO, PINTO; 2007).
31
As crises vasooclusivas iniciam-se na microcirculação venular, com o aprisionamento
das células falcêmicas. Os eventos primários cruciais para vaso-oclusão incluem adesão de
eritrócitos (reticulócitos e células densas deformadas) ao endotélio venular. A adesão de
leucócitos ao endotélio com formação de agregados heterocelulares também contribuem para
a obstrução, resultando em hipóxia local, aumento da formação de polímeros de Hb S, e
propagação da oclusão da vasculatura adjacente (SANTOS, 2007).
Grande parte da dor gerada nos episódios agudos é nociceptiva e resulta de estímulos
somáticos ou viscerais. A dor somática é mais comum, geralmente intensa, localizada e
lancinante, envolve inicialmente estruturas profundas como periósteo, medula óssea,
articulações, músculos, tendões, ligamentos e artérias. Esta modalidade de dor, que pode ser
focal ou referida, é transmitida por meio de fibras nervosas mielinizadas de condução rápida,
principalmente das fibras, as quais têm um limiar mais alto e por isso precisa de um estímulo
forte, geralmente mecânico (NAOUM, 2006).
A oclusão microvascular acarreta lesão tecidual, e esta, por sua vez, desencadeia uma
resposta inflamatória com conseqüente liberação de citoquinas (interleucina-1) e outros
mediadores inflamatórios. A interleucina-1 é um pirógeno endógeno com a capacidade de
ativar o gene da ciclo-oxigenase para a produção de prostaglandina E 2 e I2, as quais sintetizam
terminações nervosas e facilitam a transmissão do estímulo doloroso ao córtex cerebral
através da medula espinhal e do tálamo. Outros mediadores como bradicinina, histamina, K+ e
H+ ativam as fibras nervosas aferentes nociceptores provocando a resposta dolorosa. Além
disso, os nociceptores ativados liberam substância P, que também facilita a propagação do
estímulo doloroso e, juntamente com a bradicinina, causa vasodilatação e extravazamento de
líquidos resultando em edema e dor local. Inibidores da dor como serotonina, encefalina, bendorfina e dinorfina também interferem na percepção do estímulo doloroso. Deste modo, a
intensidade da dor que o paciente sente é dependente da extensão da lesão e do equilíbrio
entre seus ativadores e inibidores. Figura 8 (NAOUM, 2008).
32
Figura 8: Fatores que causam as crises dolorosas
11.2 FALENCIA DE MULTIPLOS ORGÃOS
Como já foi dito, os ertrócitos falciformes expressam maior número de moléculas de
adesão, que futuramente irá gerar o processo de vasooclusão e com isso favorecem a interação
com o endotélio e com outras células (NAOUM, 2008).
O acidente vascular cerebral (AVC) é uma complicação catastrófica da DF, e uma das
maiores causas de morte em crianças e adultos (NAOUM, 2008).
Os pacientes com DF que apresentam um episódio de AVC têm um alto índice de
recorrência, a qual pode ser diminuída, mas não abolida, com um programa de transfusão
33
crônica. Cerca de dois terços das crianças com AVC isquêmico (AVCI), que não são
transfundidas, podem apresentar um novo episódio dentro de três anos (NAOUM, 2008).
A AF é um dos mais importantes fatores de risco para AVC isquêmico agudo, com a
taxa de incidência variando de acordo com a idade. A incidência é de 0,13% em bebês
menores de 2 anos, aumentando para 1% de casos entre 2-5 anos e para 0,79% entre 6 e 9
anos (FILHO, CARVALHO; 2009).
Nefropatia é complicação comum da AF e acomete 1/3 dos adolescentes e adultos
jovens, sendo causa importante de mortalidade em adultos (MAGALHÃES; 2007).
As alterações estruturais podem ser glomerulares e medulares. Dentre as alterações
glomerulares observa-se, principalmente, a dilatação dos glomérulos com hipercelularidade e
lobulação dos tufos glomerulares, semelhante ao observado nas glomerulonefrites
proliferativas (ANVISA; 2002).
As alterações funcionais como as disfunções hemodinâmicas, hipostenúria,
proteinúria, e alteração da síntese dos hormônios renais (eritropoetina, renina e
prostaglandina) são frequentemente observada na AF. As alterações hemodinâmicas se
relacionam ao grau de anemia e variam com a idade. Em crianças e adultos jovens observa-se
aumento da taxa de filtração glomerular (GFR) e dos fluxos sanguíneo e plasmático renais
efetivos (ERBF, ERPF), mas a fração de filtração encontra-se reduzida. A anemia, assim
como a produção aumentada de prostaglandinas pela medula renal, contribui para o aumento
da GFR e ERPF. Com a idade, há redução progressiva da GFR, ERBF e ERPF. A falência
renal é causa frequente de óbito em pacientes acima de 40 anos. Proteinúria ocorre em 30 a
50% dos pacientes, nunca abaixo dos 10 anos de idade (ANVISA; 2002).
11.3 INFECÇÕES
As infecções são as complicações mais freqüentes nos indivíduos com anemia
falciforme (NUZZO, FONSECA; 2004).
As infecções estão entre as principais causas de morte em crianças falciformes; os
agentes etiológicos envolvidos são patógenos habituais, porém causam infecções mais
freqüentes e graves que na população geral (BRAGA, 2007).
Os doentes falciforme são mais propensos à infecção, principalmente os menores de 5
anos. Estas crianças têm o baço, órgão responsável pelas nossas defesas, hipofuncionante
pelos inúmeros infartos sofridos. Isto obriga as crianças, nos primeiros 5 anos, a fazer uso de
34
penicilina profilática e vacinas especiais (Anti hemophilus e antipneumocóccica). A febre em
doente falciforme requer investigação médica minuciosa, podendo desenvolver infecção
generalizada em menos de 24 horas. A infecção deve sempre ser investigada e acompanhada
com muito zelo pela equipe de saúde, pois ela é responsável pela primeira causa de
mortalidade nesta doença. Outros sinais de infecção sem febre, como diarréia, vômitos e tosse
com secreção e falta de ar também são observados (BRASIL, 2001).
Os pacientes falcêmicos são susceptíveis às infecções, uma vez que a função esplênica
é perdida devido ao progressivo infarto no baço. Estudo realizado demonstrou que a
proporção de crianças com anemia falciforme (HbSS) com asplenia funcional é de 14% aos 6
meses de idade, 28% no primeiro ano de vida, 58% aos 2 anos, 78% aos 3 anos e 94% aos 5
anos de idade, confirmando o elevado risco de sepsis fulminante no paciente falcêmico já nos
primeiros anos de vida (BRAGA, 2007).
Graças ao diagnóstico precoce realizado através do PNTN, é possível introduzir
precocemente a profilaxia com a penicilina e essa é a mais importante intervenção no manejo
da criança com doença falciforme para prevenção da infecção pneumocócica (ANVISA,
2005).
Também pode ocorrer infecção viral nesses pacientes, alguns tipos de vírus estão
associados à crise aplástica transitória em pacientes com AF com especial ênfase, o
parvovírus que promove uma destruição das células eritróides imaturas, com conseqüente
parada da produção de glóbulos vermelhos, levando a uma acentuação da anemia já existente,
seu principal alvo é a célula eritróide imatura (NUZZO, FONSECA; 2004).
11.4 IMUNIZAÇÕES
A imunização deve ser realizada como em qualquer outra criança, lembrando que
septicemia por Pneumococo e H. influenzae tipo B são freqüentes na doença falciforme, com
isso a imunização deve ser precoce (ANVISA, 2005).
A criança com DF, além de receber todas as vacinas recomendadas no calendário de
vacinação, requer outras adicionais, como a vacina contra o pneumococo, meningite e vírus
influenza. As vacinas anti-hemófilus e hepatite B fazem parte do esquema vacinal habitual no
primeiro ano de vida, devendo ser verificado através da consulta à carteira de vacinação, se a
criança recebeu o esquema completo (BRAGA, 2007).
35
A vacina antipneumocócica, atualmente no mercado, não é imunogênica antes de dois
anos de idade, pois não apresenta boa resposta com baixa produção de anticorpos, queda
rápida dos níveis séricos e ausência de resposta imunológica (NUZZO, FONSECA; 2004).
A profilaxia antipneumocócica é de suma importância contra processos infecciosos
graves, pois quando iniciada precocemente, tem reduzido significativamente a incidência de
bacteremia pelo pneumococo. Alguns estudos relatam 84% de redução de sepses pelo
pneumococo em crianças que faziam correta profilaxia com penicilina (NUZZO, FONSECA;
2004).
Para os pacientes portadores da AF existe um quadro de vacinação para essa
determinada profilaxia. A Penicilina V deve ser administrada 125mg VO (2 vezes ao dia) para
crianças até 3 anos de idade ou 15kg; 250mg VO (2 vezes ao dia) para crianças de 3 a 6anos
de idade ou com 15 a 25kg; 500mg VO (2 vezes ao dia) para crianças com mais de 25 kg. A
Penicilina benzatina deve ser administrar intra muscular a cada 21 dias, 300 000U para
crianças até 10kg; 600 000U para crianças de 10 a 25kg; 1 200 000U para indivíduos com
mais de 25kg. Em casos de alergia à penicilina, administrar 20mg/kg de eritromicina
etilsuccinato via oral, 2 vezes ao dia (ANVISA; 2002).
A vacina contra hepatite B pode ser realizada ao nascimento e deve ser administrada
em 3 doses de 1 ml (20μg/dose) ao nascimento,1 mês e 6 meses de vida. Os reforços podem
ser feitos a cada 5 anos após término do esquema ou quando os títulos estiverem abaixo do
nível de proteção. A vacinação pode ser iniciada em qualquer idade, nos intervalos acima
citados. Em adultos, administrar apenas nos indivíduos com anticorpos negativos para o vírus
da hepatite B (ANVISA; 2002).
Apesar de todo esse processo profilático, embora necessário, pode não ser suficiente
para evitar a ocorrência de infecções graves conseqüentes à falta de adesão ao tratamento,
então é importante orientar pacientes e mães da necessidade de procurar tratamento médico
sempre que ocorrer febre persistente acima de 38,3ºC; dor torácica e dispnéia; dor abdominal,
náuseas e vômito; cefaléia persistente, letargia ou alteração de comportamento; aumento
súbito do volume do baço; priapismo (NUZZO, FONSECA; 2004).
12 TRATAMENTOS
36
A anemia falciforme é uma doença para a vida toda, mas é possível administrar os
sintomas e complicações. Essa patologia deixa o paciente susceptível a diversas infecções,
sendo assim, se torna necessário que a cada 21 dias seja administrado uma dose diária de
penicilina. Os médicos também receitam suplementação de ácido fólico para ajudar na
produção de sangue (NUZZO, FONSECA; 2004).
Em se tratando de crises de dor, é possível aliviar a dor com medidas simples como
compressas mornas. Analgésicos costumam ser usados, e o médico pode receitar
medicamentos mais fortes (ZAGO, PINTO; 2007).
A transfusão sanguínea é utilizada para maior fluidez do sangue e para controlar crises
dolorosas persistentes. Apesar de todas essas medidas para se ter um bom controle dessa
doença, nenhum medicamento foi tão eficaz como a HU, gerando resultados bastante
animadores, no que se diz respeito a uma melhor qualidade de vida desses pacientes
(FIGUEIREDO, 2007).
13
HIDROXIURÉIA
A HU é o primeiro agente amplamente disponível e acessível, que parece ter um
impacto real sobre o curso da doença falciforme. Seu mecanismo de ação exato é
desconhecido, mas que provoca um aumento das concentrações Hb F na maioria dos
indivíduos, que, fisicamente interfere com o processo de polimerização de deoxihemoglobina
S (OLUJOHUNGBE, CINKOTAI, YARDUMIAN; 1998).
A HU foi sintetizada, pela primeira vez, na Alemanha, por Dressler e Stein, em 1869
Somente um século depois, mais especificamente em 1967, este medicamento foi aprovado
pelo FDA norte-americano para tratamento de doenças neoplásicas e, nos anos subsequentes,
para o tratamento de pacientes com leucemia mieloide crônica, psoríase e policitemia severa
(CANÇADO, et al;2009).
A HU é o único medicamento que contribui para a melhora das manifestações clínicas
da AF. Essa substância estimula a produção de óxido nítrico, aumentando os níveis de Hb F,
uma proteína geneticamente distinta que diminui a incidência da hemoglobina S (HYDREA,
2010).
A HU inibe a síntese de DNA, através de bloqueio da enzima ribonucleosideo redutase,
sem interferir na síntese do ácido ribonucléico (RNA) ou da proteína (HYDREA, 2010).
37
O efeito terapêutico da HU provavelmente compreenda outros fenômenos, além do
aumento de Hb F, como a modificação das moléculas de adesão de hemácias, granulócitos e
plaquetas, e a redução da produção de granulócitos, participantes diretos dos fenômenos
inflamatórios da doença, seu efeito elevando a HbF é muito consistente (ZAGO, 2007).
A mielossupressão é o efeito colateral mais preocupante, onde neutropenia e anemia
são capazes de interromper a terapia. O monitoramento deste efeito, nos dois primeiros meses,
exige hemogramas quinzenais (BITTENCOURT, 2010).
14 O USO DA HIDROXIURÉIA EM FALCEMICOS
A idéia de que o aumento da HbF teria um efeito protetor sobre as conseqüências
adversas da AF foi sugerido em 1989 por Powars, sendo mais tarde confirmado por estudos
bioquímicos e clínicos (FIGUEIREDO, 2004).
O uso de HU promove a elevação dos níveis de hemoglobina fetal (HbF) em pacientes
portadores de síndromes falciformes (SF). O medicamento vem sendo estudado em vários
grupos de pacientes, incluindo adultos e crianças (BANDEIRA, 2004).
Embora os estudos só tenham começado na década de 90, anos atrás já se viam relatos
que demonstraram que a HbF possui a capacidade de inibir a polimerização da HbS e reduzir
a falcização (DUARTE, 2002).
No final da década de 70 foi evidenciado que pacientes com AF da Arábia Saudita
apresentavam maiores níveis de HbF e manifestações clínicas mais brandas, a idéia de que o
aumento da HbF teria um efeito protetor sobre as conseqüências adversas da AF foi sugerido
em 1989, sendo mais tarde confirmado por estudos bioquímicos e clínicos (FIGUEIREDO,
2007).
Em 1994, foi iniciado, nos Estados Unidos e Canadá, estudo multicêntrico, duplo
cego, na tentativa de analisar a eficácia da HU como agente terapêutico na AF (BANDEIRA,
2004).
O uso da HU nos protocolos de tratamento da AF começou primeiramente nos
pacientes adultos, sendo o seu uso posteriormente autorizado em crianças. Ao longo dos anos,
estudos em crianças têm demonstrado igual eficácia de HU sem grandes efeitos colaterais
(BANDEIRA, et al, 2004).
38
No Brasil, a portaria de nº 872 do Ministério da Saúde, de 6 de novembro de 2002,
aprovou o uso de HU para pacientes com DF. Nesta portaria, a dispensa desse medicamento
passou a ser de incumbência das Secretarias de Saúde dos Estados da União e Distrito Federal
(ANVISA, 2002).
A HU está disponível em cápsulas de gel sólido contendo 500 mg do princípio ativo.
Recomenda-se dose inicial de 15 mg/kg/dia, uma única vez ao dia, e monitoramento da
contagem do número de leucócitos e plaquetas (hemograma completo) a cada duas semanas.
Deve-se considerar o peso real ou ideal, o que for menor. Para crianças, recomenda-se
dissolver a cápsula de 500 mg de HU em água destilada, obtendo a concentração de
50 mg/mL, o que facilita a administração da dose correta por kilograma de peso
(ANVISA,2005).
14.1 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
Os parâmetros estabelecidos para o uso da HU baseiam-se no Protocolo clínico e
diretrizes terapêuticas para uso de HU na anemia falciforme. Poderão ser incluídos no
Protocolo de Tratamento pacientes que preencham todos os critérios abaixo: Diagnóstico
laboratorial de doença falciforme (HbSS, S/ß Talassemia, HbSC, Hb SD); idade superior a 3
anos; condições de comparecer às consultas e realizar exames laboratoriais periódicos; teste
de gravidez (ß-HCG sérico) negativo para mulheres sexualmente ativas, lembrando que a
anticoncepção é obrigatória enquanto a paciente estiver fazendo uso da HU (ANVISA,2005).
14.1.1 CRITÉRIOS CLÍNICOS DE INCLUSÃO
Segue abaixo os critérios clínicos para o uso da HU:
• Três ou mais episódios de crises de dor com necessidade de atendimento médico hospitalar.
• Síndrome torácica aguda (definida como dor torácica aguda com infiltrado pulmonar
"novo", febre (temperatura > 38,5°C), taquipnéia, tosse, sibilos pulmonares): dois ou mais
eventos (leve a moderado)/ano ou um evento grave.
• Hipoxemia crônica: saturação de oxigênio persistentemente menor que 94%.
• Déficit pôndero-estatural: peso e crescimento observados menores que 5% a 10% do
esperado para a idade.
39
• Outras situações em que haja comprovação de lesão crônica de órgão (priapismo, necrose
óssea, retinopatia proliferativa).
14.2 CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
Não
deverão
ser
incluídos no
Protocolo de Tratamento
pacientes com:
hipersensibilidade à HU; presença de pelo menos um dos seguintes itens relacionados à
disfunção da medula óssea: neutrófilos < 2.5 x 109/L, plaquetas < 95 x 109/L concentração de
Hb < 4,5 g/dL ou contagem de reticulócitos < 95 x 109/L; gestação; e em indivíduos
infectados pelo vírus HIV (ANVISA, 2005).
14.3 CUIDADOS E PRECAUÇÕES, SITUAÇÕES ESPECIAIS
Devido aos possíveis efeitos adversos da droga, a relação entre risco e o benefício
deve ser cuidadosamente avaliada nos seguintes casos: amamentação: sabe-se que o fármaco é
excretado pelo leite. Não há estudos suficientes para determinar seus efeitos sobre o lactente.
Seu uso deve ser evitado ou descontinuado durante a amamentação. Uricosúria: o uso de HU
pode aumentar os níveis séricos de ácido úrico. Em pacientes com níveis basais acima do
limite normal, estes valores devem ser monitorados mensalmente. Ácido fólico: o uso de HU
produz macrocitose, que dificulta o reconhecimento da deficiência de ácido fólico. Desta
forma, é recomendado o emprego profilático concomitante de 5 mg/dia de ácido fólico, três
vezes por semana (ANVISA, 2005).
É obrigatório que o paciente e/ou seu responsável legal estejam cientes dos potenciais
riscos e efeitos colaterais relacionados ao uso da HU preconizado no Protocolo. Para tanto, o
consentimento de participação do protocolo deverá ser formalizado por meio da assinatura do
Termo de Consentimento Informado (ANVISA, 2002).
15 EFICÁCIA DA HIDROXIURÉIA
A terapia tem garantido eficácia clínica durante alguns anos de tratamento em
população pediátrica, reduzindo o número de internações e dias de hospitalização (SILVA,
40
SHIMAUTI; 2006). O Grupo Multicêntrico de Estudo da Hidroxiuréia na Anemia Falciforme,
que analisaram durante nove anos o uso da HU em pacientes com AF, estimaram que a
mortalidade foi reduzida em 40% nestes pacientes. Foi observado também, que a HU esteve
associada ao aumento da HbF e redução na incidência de episódios de síndrome torácica
aguda e de crises álgicas (FIGUEIREDO, 2007).
Outra resposta favorável deste agente terapêutico tem sido a diminuição da expressão
de moléculas de adesão, tais como fosfatidilserina da superfície eritrocitária e plaquetária, a
anexina V, bem como a diminuição das proteínas receptoras localizadas em células
endoteliais, contribuindo desse modo para a redução das crises vaso-oclusivas (SILVA,
SHIMAUTI; 2006).
Além da redução do número de crises vaso-oclusivas, o uso crônico de HU teve
impacto positivo na qualidade de sobrevida dos pacientes com AF, com redução do número
de ocorrência de síndrome torácica aguda e menor necessidade de transfusão de hemácias
(CANÇADO, et al, 2009).
16
TOXICIDADE DA HIDROXIUREIA
A introdução da HU no tratamento da anemia falciforme trouxe uma mudança
significativa na evolução especialmente das crises vaso-oclusivas. Recentemente houve uma
avaliação da eficácia da HU no tratamento da anemia falciforme que apontou para algumas
situações que ainda requerem atenção especial, tendo em vista que a resposta ao tratamento
com hidroxiureia é questionável (SIMOES, et al; 2010).
As reações adversas causadas pela HU incluem mielossupressão, perturbação
gastrointestinal, erupção cutânea, enxaqueca, potencial teratogênico e possível carcinogênese
(SILVA, SHIMAUTI; 2006).
Mielossupressão é o efeito colateral mais freqüente e conhecido. Dentre os efeitos
cutâneos, foram observados: hiperpigmentação de unhas, palmas e planta dos pés, além
de desenvolvimento de úlceras em membros inferiores em pacientes com síndromes
mieloproliferativas. Náuseas e sintomas gastrointestinais têm sido associados ao uso de HU.
Deve-se levar em consideração que a HU apresenta excreção renal, sendo assim, há
necessidade de redução de dose em pacientes com insuficiência renal (FIGUEIREDO, 2007).
41
17 TRATAMENTOS FUTUROS PARA A ANEMIA FALCIFORME
A AF há algum tempo vem despertando a curiosidade de pesquisadores na busca de
novas substâncias que possa obter um tratamento mais eficaz e seguro. Um estudo
desenvolvido pela UNICAMP abre perspectivas para novas formas de tratamento da anemia
falciforme (NASCIMENTO, 2004).
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), identificou a
existência de um mecanismo nos glóbulos vermelhos de pacientes falciformes que pode ser
responsável pelo aumento da hemoglobina fetal, substância capaz de impedir a deformação
das hemácias, fenômeno fundamental na fisiopatologia da doença (NASCIMENTO, 2004).
A pesquisadora Nicola Conran Zorzetto comparou os níveis de uma molécula
denominada GMP cíclico (guanosina monofosfato cíclica ou GMPc) nas células vermelhas de
um grupo controle formado por três diferentes categorias de pessoas: 17 eram sadias, 22
pacientes falciformes e 11 doentes medicados com HU. Nos integrantes da segunda categoria
ela encontrou níveis de GMPc cinco vezes superiores aos da primeira e maiores ainda entre
aqueles que tomavam a droga. O aumento do nível de GMPc ocorre quando uma substância
chamada óxido nítrico ativa a enzima guanilato ciclase (GC) no interior das células
(NASCIMENTO, 2004).
O aumento do nível de GMPc ocorre quando uma substância chamada óxido nítrico
ativa a enzima guanilato ciclase (GC) no interior das células. Esse processo também poderia
contribuir para a maior produção da hemoglobina fetal, conforme resultados de um estudo in
vitro de linhagens de células divulgados em 2001 por um grupo de Boston (EUA) que
apontavam para essa hipótese. Ela sugere que o aumento de níveis de GMPc nas células
eritrócitas pode se constituir em um mecanismo para indução de hemoglobina fetal e
representar
um
recurso
terapêutico
alternativo
a
hidroxiuréia
para
falcêmicos
(NASCIMENTO, 2004).
A bióloga molecular da Escola de Medicina e Pós-Graduação Dorothy YH Tuan, é a
autora de mais um estudo promissor na busca de novos tratamento para a hidroxiureia. E pois
de eliminar o modulador, ERV-9, em ratos de laboratório que expressam a hemoglobina
humana, os pesquisadores descobriram que células vermelhas do sangue começaram a
produzir mais a hemoglobina fetal, o que seria ideal para pacientes com anemia falciforme
(TUAN, 2010).
42
É uma mudança dramática, perto de 100%, quando os pesquisadores tentam aumentar o
nível de qualquer tipo de hemoglobina e o tipo de outro desce, que Tuan descreveu assim:
"É sempre um ioiô. Devem estar competindo por alguma coisa.”
(TUAN, 2010).
Ela acredita que o concurso é para fatores de transcrição NF-Y e GATA-2, proteínas
que se ligam e ativam os genes da globina fetal e adulta (TUAN, 2010).
Tuan tem evidências de que ERV-9, atualmente visto como DNA lixo no corpo
desempenha uma função crítica no sentido de garantir a produção de hemoglobina adulta.
Sem ERV-9, o gene da hemoglobina do adulto não é tão competitivo para os fatores de
transcrição NF-Y e GATA-2 que precisa ser altamente expressa. Se for possível aumentar a
NF-Y e GATA-2, talvez ambos os genes beta e gama serão ativados sem suprimir um do
outro (TUAN, 2010).
43
18 CONCLUSÃO
As hemoglobinopatias são alterações genéticas com alta freqüência populacional e
representam um problema de saúde pública em nosso país. Com isso o programa de triagem
neonatal tem uma importância indiscutível e a correta interpretação do resultado do “teste do
pezinho” é fundamental para o diagnóstico e a orientação inicial do paciente.
Apesar de as alterações genéticas e dos mecanismos da biologia molecular da
hemoglobina terem sido descobertos e elucidados há mais de 50 anos, essa doença continua
com uma terapêutica limitada, só tendo a HU como um tratamento que pode levar a uma
melhora considerável das manifestações clínicas da doença.
O uso de HU em crianças e adultos portadores de AF parece ser seguro e eficaz e
ainda pode promover a melhora na qualidade de vida destes pacientes, benefícios a seus
familiares, principalmente em regiões como o Nordeste do Brasil, carente de leitos e de
pessoal especializado para seguimento dos mesmos.
Apesar de todos os benefícios comprovados com o uso da Hidroxiureia, o seu uso
exige cautela e acompanhamento, pois o risco de toxicidade existe e por mais que o risco beneficio favoreça sua administração, o risco não deixa de existir.
A HUcom toda sua eficácia não pode ser uma barreira para a busca de novos fármacos
e sim uma porta de entrada para novas fontes de pesquisa em busca de um tratamento mais
eficaz e mais segura para os pacientes com anemia falciforme.
44
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Hemoter., vol.29, n.3, pp. 309-312, 2007.
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