UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
Instituto de Química
Relatório referente á prática de condutividade de eletrólitos
Márcio Ferreira
Porto Alegre, de março de 2001
Sumário: O estudo apresentado a seguir teve por finalidade a determinação da
condutância equivalente de soluções de um eletrólito forte (KCl) e de um eletrólito fraco
(CH3COOH) a diversas concentrações. Foi objetivo de trabalho, também, a determinação da
condutância equivalente limite (Lo) do KCl, através da extrapolação do gráficos L x Ce e L x
Ce1/2, e a verificação da validade da equação de Kohlrausch. Os valores encontrados para a
condutância equivalente à diluição infinita do KCl foram: 140,63 cm2. ?-1. mol-1, e 148,23
cm2. ?-1. mol-1, respectivamente, implicados de erros experimentais relativos de 6,12 % e 1,04
%, comparados à literatura8.
Introdução
A resistência de um condutor, para determinadas condições de temperatura e pressão,
é definida pela razão entre a tensão aplicada (E) e a corrente produzida (i).
R=
E
i
(1)
Onde R é dado em ohms (W), E em volts e i em ampères. Esta equação é chamada lei
de Ohm, e os condutores que seguem esta lei são denominados condutores ôhmicos6.
É conhecido também1 que a resistência é diretamente proporcional ao comprimento
do condutor (l), dado em cm, e à resistividade específica, chamada somente por resistividade
(r) e inversamente proporcional à área da seção (A), em cm2, conforme a equação abaixo:
R = r×
l
A
(2)
A resistividade depende da natureza (características físicas e químicas) do condutor,
e seu valor é igual ao da resistência de uma amostra do condutor de 1 cm de comprimento e 1
cm2 de seção. Sua unidade é W.cm. 7
No caso de condutores eletrolíticos, a resistividade refere-se a resistência de um
volume correspondente à 1 cm3 de solução contida entre eletrodos afastados de 1 cm.
A condutância de um condutor é o inverso da sua resistência, isto é:
C=
1
R
(3)
Mas, em virtude da equação (1),
C=
i
E
(4)
Então quando a tensão aplicada (E) é igual a 1 volt, a corrente é numericamente igual
à condutância7.
A partir da equação (2), tem-se para a condutância:
2
C =
A
r×l
(5)
Substituindo 1/r por k na equação (5) , temos:
C =k ×
A
l
(6)
Equacionando a condutividade em função da resistência do condutor, chega-se a:
k=
l
R× A
(7)
A unidade da condutividade é W-1.cm-1.
Para o caso da condução em soluções eletrolíticas, primeiro é necessário que se
defina o mecanismo da condução de carga. A partir de 1887 quando Arrhenius lançou a teoria
da Dissociação Eletrolítica, começou a evoluir o estudo neste sentido. A hipótese admitia que
quando se dissolvem, sais, ácidos ou bases em água, uma parte considerável destes se
dissociava espontaneamente em íons positivos e negativos. Estes íons podem mover-se
independentemente, e são guiados por um campo elétrico aplicado6.
Se considerou que o grau de dissociação, isto é, a fração das moléculas que se
dissociam em íons, varia com a concentração. Em menores concentrações, ocorre uma maior
dissociação; quando a concentração tende a zero (diluição infinita), o composto tende a se
ionizar completamente6.
Outro fator que influi na dissociação é o solvente, é sua natureza dielétrica. A
constante dielétrica do solvente mede a capacidade deste solvator os íons. Quanto maior for o
seu valor, mais solvatados e ionizados os íons estarão. Quanto menor o seu valor, menos
ionizados eles estarão, pois haverá a tendência a formar pares iônicos. Ainda com um
aumento maior de concentração, estes pares iônicos podem agregar mais um íon e formar um
íon triplo5,7.
A condução de carga em soluções eletrolíticas envolve migração de íons, sejam
positivos ou negativos, guiados por um campo elétrico, em direção ao eletrodo de sinal
contrário. Esta migração envolve não somente uma condução de carga de um local para outro,
como também uma transferência de matéria, de uma parte do condutor a outra, o fluxo de
carga nos eletrodos, que é característica do eletrólito e da matéria que compõe o eletrodo.
Soluções de substâncias que são boas condutoras, indicando um alto grau de
dissociação são denominados eletrólitos fortes. Por outro lado eletrólitos menos condutores,
com poucas moléculas ionizadas são chamados de eletrólitos fracos.
É fundamental, para a teoria dos eletrólitos, verificar-se a influência na variação de
condutância de uma certa massa de eletrólito com a diluição, isto é, o volume de solução em
que esta massa está contida, adotando-se então, como massa fixa de soluto o equivalentegrama para todos os eletrólitos, porque o número máximo de cargas positivas e negativas que
pode resultar de ionização de um equivalente-grama, para todos os eletrólitos é o mesmo, o
número de Avogrado.
A condutância equivalente (L) de um eletrólito é então definida como a condutância
de um equivalente-grama do eletrólito, dissolvido num volume variável de solução que
contenha esta massa. Este volume é denominado volume equivalente (ve) e varia com a
3
diluição da solução. O ve em que se encontra dissolvido o equivalente-grama de eletrodo deve
estar contido entre duas placas planas, distanciadas de 1 cm.7
Pode-se equacionar esta relação por7:
L = ve . k
(8)
Onde L é expressa em W-1.m2, ve em m3 e k em W-1.m-1. Se o volume for expresso
em litros, então a equação (8) torna a forma:
L = 1000 ve . k
(9)
Como em ve litros está contido 1 equivalente-grama do eletrólito:
Ce =
1
ve
(10)
Sendo Ce a normalidade equivalente, a equação (9) fica:
L = 1000 k / Ce
(11)
Em soluções eletrolíticas a condutividade aumenta com o aumento da concentração,
pois aumenta o número de portadores de carga (íons), transportando então uma carga maior.
Já a condutância (L), que possui um número máximo fixo de condutores de carga (1 mol de
positivos e 1 mol de negativos), aumenta com a diluição. O fator que varia neste caso é a
mobilidade iônica. Quanto mais diluída a solução, mais móveis estão os elétrons e maior será
a condutância equivalente.
O modo de variação da condutância de eletrólitos fortes e fracos perto das regiões de
alta diluição é característico, conforme Figura 1.
Figura 1: Variação da condutância equivalente com a concentração para um
eletrólito fraco (CH3COOH), dois eletrólitos fortes univalentes (HCl, KCl), e
um bivalente (ZnSO4).
4
A condutância equivalente aumenta com a diluição, variando regularmente para
eletrólitos fortes, quase que linearmente, de modo que se pode extrapolar a curva até a
diluição infinita, chamada também condutância equivalente limite (Lo). Nos eletrólitos fracos
a condutância aumenta, também, regularmente com a diluição, mas cresce tão bruscamente a
grandes diluições que se torna impraticável a extrapolação e a determinação da condutância
equivalente limite7. Isto acontece porque a grandes diluições, mesmo os eletrólitos fracos se
dissociam completamente, e abaixo de 0.0001N, fica inviável medir a condutância dos
eletrólitos, pois a condutância da água começa a ter uma influência considerável.
A variação linear da condutância equivalente de um eletrólito forte pode ser
equacionada por4:
L = Lo - b . Ce1/2
(12)
Onde Lo é a ordenada de origem e -b é o coeficiente angular da reta.
O valor de Lo também é dado pela equação abaixo:
Lo = ?+ + ?????????????????????
Segundo essa equação3, o valor da condutância equivalente a diluição infinita é o
resultado das contribuições do cátion e do ânion, ou seja é dado pela soma das condutâncias
iônicas molares do cátion K+ e do ânion Cl- encontrados na literatura8.
Sais bivalentes como o ZnSO4 têm comportamento intermediário e não podem ser
previstos pela equação (12), porque nestas soluções as atrações interiônicas são consideráveis.
A equação (12), é chamada de equação de Kohlrausch, e o coeficiente da reta
depende da temperatura e da natureza do solvente. Estes fatores influenciam diretamente na
viscosidade das soluções, que, junto com a força iônica, define a mobilidade iônica, e por
conseguinte, da condutância equivalente7.
Parte Experimental
O experimento realizado para a determinação da condutividade de eletrólitos consiste
basicamente em duas partes: a primeira, na preparação das amostras em variadas
concentrações de ácido acético (CH3COOH) e cloreto de potássio (KCl), que são, eletrólito
fraco e forte, (respectivamente); a segunda, a determinação da condutividade propriamente
dita.
Para a preparação das soluções de eletrólitos, primeiramente ambientou-se duas
vezes uma bureta de 50 mL, com uma solução de ácido acético 1 N. Esta foi utilizada na
medição de volume para preparação das amostras. Após a ambientação da bureta, coletou-se
em balões volumétricos de 100 mL, 7 amostras para a elaboração de soluções. Foram
preparadas soluções de CH3COOH à 0,50; 0,30; 0,20; 0,15; 0,10; 0,05 e 0,025 N conforme
consta na Tabela 1.
Tabela 1: Volumes de CH3COOH (1 N) e H2O destilada utilizada na preparação das
amostras a diferentes concentrações.
Concentrações (N)
0,50
0,30
0,20
0,15
0,10
0,05
0,025
5
Vol. CH3COOH (mL) 50
Vol. H2O (mL)
50
30
70
20
80
15
85
10
90
5
95
2,5
97,5
Repetiu-se o mesmo procedimento para a elaboração de soluções de KCl, conforme
vemos na Tabela 2.
Tabela 2: Volumes de KCl (1 N) e H2O destilada utilizados na preparação das
diferentes concentrações.
Concentrações (N)
0,50
0,30
0,20
0,15
0,10
0,05
Vol. KCl (mL)
50
30
20
15
10
5
Vol. H2O (mL)
50
70
80
85
90
95
amostras a
0,025
2,5
97,5
Depois de preparadas a solução, iniciou-se a medição da condutividade destas
soluções utilizando o aparato descrito na Figura 2:
Figura 2: Esquema dos aparelhos usados na determinação de condutividade de
eletrólitos: 1) Banho Termostático. 2) Soluções. 3) Célula de Condutância por
Imersão 4) Estabilizador de Corrente. 5) Ponte de Impedância.
Para a medida de condutividade das soluções problemas, lavou-se duas vezes cada
tubo de ensaio com as soluções a serem analisadas. Após esta, colocou-se cada tubo de ensaio
semi-imerso em um banho termostático marca Ética mod. 521, estando este à temperatura de
25ºC. Aguardou-se 2 minutos para a solução a ser analisada entrar em equilíbrio com a
temperatura do banho.
Utilizando uma célula de condutância de imersão, mediu-se a resistência de cada
solução, realizando primeiramente as medidas das soluções mais diluídas, para minimizar
efeitos de um eventual resíduo da solução anteriormente medida no eletrodo. Após cada
medida, o eletrodo era imerso em um tubo plástico com água destilada.
A medida da resistência foi realizada numa Ponte de Impedância Universal (Marca
HP, modelo 4265B). Para elucidar melhor o que foi feito no experimento, mostramos na
Figura 2 uma ponte de Wheatstone, cujo princípio de funcionamento é semelhante ao do
aparato utilizado (ponte de Kohlrausch)2.
6
Figura 3: Desenho esquemático da ponte de Wheatstone empregada em medições
de condutividade. Obtém-se a resistência da solução eletrolítica em C ajustando o
potenciômetro que atua sobre R3.
A medida tem duas etapas: regulagem do multiplicador (escala) e do valor da
resistência naquela escala. O acerto de cada casa do valor da resistência, bem como do
multiplicador se dá buscando-se o nível mínimo de ruído (corrente) no mostrador analógico
do aparelho. A precisão da medida da resistência propiciada pelo instrumento seria de 4 casas
decimais, porém o aparelho mostrou-se insensível às últimas casas, sendo possível uma
precisão máxima de 2 casas decimais.
O procedimento experimental foi feito para as solução de CH3COOH, inicialmente e
após, para as soluções de KCl.
Resultados
Com os dados das soluções de ácido acético obtidos na Parte Experimental,
construiu-se a Tabela 3, abaixo:
Tabela 3: Dados experimentais da resistência medida das soluções de ácido acético a
diferentes concentrações e seus respectivos valores calculados de condutividade e condutância
equivalente.
Ce (N)
Ce1/2 (N1/2)
RX (W)
k (cm-1. W-1)
L (cm2. W-1.mol-1)
0,025
0,158114
5910
0,0001963
7,85109983
0,05
0,223607
3540
0,0003277
6,55367232
0,10
0,316228
2550
0,0004549
4,54901961
0,15
0,387298
2030
0,0005714
3,80952381
0,20
0,447214
1670
0,0006946
3,47305389
0,30
0,547723
1410
0,0008227
2,74231678
0,50
0,707107
1220
0,0009508
1,90163934
7
Com os dados da Tabela 3, construiu-se o Gráfico 1, abaixo:
9
8
2
-1
-1
Condutância Equivalente (cm .W .mol )
10
7
6
5
4
3
2
1
0 ,0
0 ,1
0 ,2
0 ,3
0 ,4
C o n c e n tra ç ã o (N )
0 ,5
0 ,6
Gráfico 1: Dados experimentais da condutância equivalente do ácido acético em
função da sua concentração.
Após isso, utilizando os dados das soluções de KCl obtidos na Parte Experimental, construiuse a Tabela 4, abaixo:
Tabela 4: Dados experimentais da resistência medida das soluções de KCl a diferentes
concentrações e seus respectivos valores calculados de condutividade e condutância
equivalente.
Ce (N)
Ce1/2 (N1/2)
RX (W)
k (cm-1. W-1)
L (cm2. W-1.mol-1)
0,025
0,158114
337
0,0034421
137,68546
0,05
0,223607
174
0,0066667
133,33333
0,10
0,316228
92
0,0126087
126,08696
0,15
0,387298
63
0,0184127
122,75132
0,20
0,447214
49
0,0236735
118,36735
0,30
0,547723
35
0,0331429
110,47619
0,50
0,707107
23
0,0504348
100,86957
Com os dados da Tabela 4, construiu-se o Gráfico 2, abaixo:
8
135
-1
-1
Condutância Equivalente (cm . W . mol )
140
2
130
125
120
115
110
105
100
0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
Concentração (N)
0,6
Gráfico 2: Dados experimentais da condutância equivalente do KCl em função da
sua concentração.
Para se obter o valor da condutância equivalente limite (Lo) da solução de KCl,
utilizou-se o Gráfico 2 fazendo a extrapolação aproximada para Ce igual a zero. Com isso,
obteve-se o valor de 140,63 cm2. ?-1. mol-1 .
Para se ter uma melhor aproximação para o valor exato de Lo faz-se uso da equação
de Kohlrausch, equação (12). Assim, plota-se novo gráfico de abcissa raíz quadrada da
concentração, o que deverá ser uma reta, conforme vemos abaixo:
2
-1
-1
Condutância Equivalente (cm . W . mol )
150
145
140
135
130
125
120
115
110
105
100
0 ,0
0 ,1
0 ,2
0 ,3
0 ,4
0 ,5
0 ,6
R aíz Q u ad rad a d a C o n cen tração (N
0 ,7
1/2
0 ,8
)
Gráfico 3: Dados experimentais da condutância equivalente do KCl em função da
raíz quadrada da sua concentração.
Através do software Microcal Origin 5.0, fizemos a regressão linear da reta, dada
por: L = A + B . Ce1/2, com:
A = 148,23 (± 0,59)
9
B = -67,47
(± 1,36)
A correlação foi de -0,99899 e o desvio padrão de 0,63.
Comparando, portanto com a equação (12), temos que:
Lo = 148,23 cm2. W-1. mol-1
Discussão
O experimento resultou na obtenção dos valores da condutância equivalente das
soluções de KCl e de ácido acético à diversas concentrações e da condutância equivalente
limite (Lo) do KCl por dois métodos. Através da extrapolação do gráfico L x Ce obteve-se
Lo = 140,63 cm2.??-1. mol-1 e utilizando-se uma regressão linear no gráfico L x Ce1/2, obtevese Lo = 148,23 cm2. ?-1. mol-1.
O valor de Lo encontrado na literatura8 é 149,79 cm2. ?-1. mol-1. Tem-se, portanto,
erros experimentais relativos de 6,12 % e 1,04 %, respectivamente.
Consideramos que por dar um valor mais aproximado da realidade a equação de
Kohlrausch é bastante efetiva, além de ser bastante prática, pois no método da extrapolação a
imprecisão é maior e não podemos garantir a fidelidade do valor encontrado.
O grande responsável pelos erros encontrados, na interpretação do grupo, foi a ponte
de impedância utilizada. O aparelho está velho e obsoleto, com sensibilidade muito reduzida,
sendo que das 4 casas decimais de precisão que oferece, era possível a leitura de no máximo 2
casas. Muitas vezes houve dúvida na leitura do valor, pois o indicador de ruído não
permanecia constante.
Apesar dos problemas enfrentados com a ponte de impedância, da série de
imprecisões que podem ocorrer, citadas no procedimento experimental obteve-se valores
coerentes para a condutância equivalente limite do KCl e construiu-se uma curva L x Ce
bastante representativa para o CH3COOH, o que permite a conclusão da validade do método
na determinação de condutância de soluções de eletrólitos.
Bibliografia
1. Daniels, F.; Williams, J. K.; Bender, P.; Alberty, R. A.; Cornwell, C. D.;
Harriman, J. E., Experimental Physical Chemistry, 7ª ed., 167-177 (1970).
2. Findlay, A.; Kitchener, J. A., Practical Physical Chemistry, 8ª ed., 199-213
(1954).
3. Bueno, W. A.; Degrève, L., Manual de Laboratório de Físico-Química, 219-222.
4. Wilson, J. M.; Newcombe, R. J.; Denaro, A. R.; Rickett, R. M. W., Experiments
in Physical Chemistry, 2ª ed., 88-90 (1968).
5. Burmístrova, O. A.; Karapetiants, M. J.; Karétnikov, G. S.; Kudriashov, I. V.;
Kiseliova, E. V.; Starostenko, E. P.; Jachaturián, O. V., Practicas de Quimica Fisica, 289-304
(1977).
10
6. Glasstone, S. Tratado de Química Física, 4ª edição, 796-801 (1961).
7. Pilla, L. Físico-Química, 2, 1ª edição, 752-782 (1980).
8. Weast, R. C.; Lide, D. R., CRC. Handbook of Chemistry and Physics, 70th ed.,
secção D, 169-170 (1989-90).
11
Download

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Instituto de