Risco de Mercado: o Método Simulação Histórica (Historical Simulation Method)
Aplicado ao IBOVESPA
André Accorsi *
Flávio Panhoni**
Resumo
Instituições financeiras, empresas e órgãos
reguladores estão usando a metodologia VAR (Value-atRisk) para administrar o risco de mercado. O artigo
discute, inicialmente, a evolução do risco de mercado e a
metodologia VAR para, então, apresentar um dos modelos
de VAR, o método Simulação Histórica (Historical
Simulation Method), aplicado ao IBOVESPA. As
principais conclusões do artigo são: 1) os riscos podem ser
administrados mas não eliminados; 2) a eficiência das
ferramentas que mensuram risco de mercado deve ser
monitorada e controlada; 3) o método Simulação Histórica
pode ser aplicado a qualquer distribuição de retornos, é
compreensível para aqueles que tomam decisões e não
exige sofisticados recursos; 4) o método deve ser testado,
ainda, para outros tipos de derivativos.
Palavras-chaves: Risco de Mercado, Método Simulação
Histórica, VAR, IBOVESPA.
* Doutor em economia pela
FEA/USP
** Master in Business Administration (MBA) pela New
York University
Abstract
Financial institutions, companies and banking regulators
are using the methodology VAR (Value-at-Risk) to
administer the market risk. The article discusses, initially,
the evolution of the market risk and, then, presents one of
VAR’s models, the Historical Simulation Method, applied
to the IBOVESPA. The main conclusions of the article are:
1) the risks can be administered but not eliminated; 2) the
efficiency of the tools that measure market risk should be
monitored and controlled; 3) the Historical Simulation
Method can be applied to any distribution of returns, it is
comprehensible for decision-makers and it doesn’t
demand sophisticated resources; 4) the method should be
tested, still, for other types of derivative.
Key-words: Market Risk, Historical Simulation Method,
VAR, IBOVESPA.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
André Accorsi - Flávio Panhoni
1. INTRODUÇÃO
As recentes crises econômicas mundiais, com efeitos perversos em quase todos os
países que se inserem no chamado mundo globalizado, têm alertado, principalmente às
instituições financeiras e grandes investidores do mercado financeiro, que não há como
ignorar a necessidade de administrar riscos financeiros. A preocupação é reforçada, também,
pelas pressões de órgãos reguladores em todo o mundo.
A ênfase é no risco associado ao descontrole interno, desconhecimento do tipo de
operação, falha administrativa, obsolescência de equipamentos, falta de treinamento de
pessoal e/ou profissional especializado, entre outros. O objetivo da administração de risco
não é anular o risco, mas monitorá-lo, adequando-o a potenciais retornos.
A necessidade crescente de administração dos riscos e a evolução da informática
impelem o desenvolvimento de técnicas e modelos de gestão, especialmente orientadas para
os riscos de mercado e de crédito. Não há um único método correto para administração do
risco; o essencial é que o método seja adequado aos objetivos da empresa, aos negócios
realizados, ao que acontece no mundo e ao interesse dos proprietários e/ou acionistas.
Visando orientar e apoiar a decisão daqueles que gerenciam riscos, o artigo apresenta
e discute um dos principais métodos de mensuração de risco de mercado: o Método
Simulação Histórica (Historical Simulation Method). Apresenta, também, uma aplicação
prática desta metodologia para o IBOVESPA.
2. A EVOLUÇÃO DA ANÁLISE DE RISCO DE MERCADO
O risco pode ser definido como a probabilidade de perda, podendo, assim, ser
mensurado. Por sua vez, o risco financeiro é o potencial de perda no mercado financeiro, caso
ocorram oscilações adversas entre o instante atual e algum ponto no futuro. Entre os tipos
mais conhecidos de risco financeiro podem-se citar: risco de mercado, risco de crédito, risco
operacional, risco de liquidez e risco legal. O risco de mercado provém das oscilações de
preços (volatilidade) dos ativos ou passivos financeiros, as quais são medidas em função da
mudança do valor de mercado de um determinado portfólio.
Os aspectos que mais influenciam e contribuem, no período recente, para a crescente
preocupação com o risco financeiro, em particular o risco de mercado, são:
• a globalização dos mercados, associada ao acirramento da concorrência e ao intenso grau
de inter-relação entre os diversos mercados financeiros;
• a evolução contínua das tecnologias de comunicação e informática;
• a inovação e a complexidade dos instrumentos financeiros, com os chamados instrumentos
derivativos e o crescimento de negócios (trading) nos mercados financeiros. Os derivativos
foram desenvolvidos, inicialmente, para proteção contra o risco (hedge). Entretanto, têm
sido utilizados, principalmente, por especuladores na busca de maiores ganhos. Futuros,
Swaps e Opções são exemplos de instrumentos derivativos;
• o maior rigor na regulamentação dos mercados financeiros, com enfoque na exposição a
riscos financeiros. O Bank for International Settlements (BIS) definiu normativo sobre
risco de crédito em 1988 e sobre risco de mercado em 1996; o Banco Central do Brasil
• editou a circular 2972, em fevereiro de 2000, tratando do risco de mercado de taxa de juros
prefixada.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
2
André Accorsi - Flávio Panhoni
• a instabilidade de preços (volatilidade) dos ativos financeiros ocasionadas por crises
financeiras como a do México (dezembro de 1994); a da Ásia (outubro de 1997); a da
Rússia (agosto de 1998); a do Brasil (janeiro 1999) e, a da Argentina (julho de 2001);
O risco de mercado, recentemente, além da atenção das autoridades reguladoras, tem sido
objeto de estudos na área acadêmica e de negócios, envolvendo, por exemplo, traders de
mesa de operações de instituições financeiras, analistas de tesouraria das empresas do setor
industrial e administradores de fundos de investimento. Estes estudos resultaram no
desenvolvimento de ferramentas capazes de mensurar e monitorar o risco de mercado,
criando-se um novo conceito, chamado de Value-at-Risk (VAR).
Outra enorme contribuição na administração de risco de mercado, também desenvolvida
ao longo da década de 90, são os modelos matemáticos e estatísticos de mensuração de risco
de mercado, destacando-se:
•
•
•
Método Variância/Covariância (Delta-Normal Method) ;
Método Simulação Histórica (Historical Simulation Method);
Método Simulação Monte Carlo (Structured Monte Carlo Simulation Method).
2.1 Value-at-Risk (VAR)
O VAR é uma ferramenta muito poderosa para mensurar o risco de mercado,
ganhando cada vez mais adeptos internacionalmente. O VAR é o valor máximo esperado das
eventuais perdas, sob circunstâncias normais, durante um horizonte de tempo determinado e
dado um certo grau de confiabilidade. A mensuração do VAR, portanto, implica na
determinação da distribuição de probabilidades dos retornos, no intervalo de tempo a ser
definido pelo usuário.. O retorno é o total de ganho ou perda obtido de um investimento em
ativos financeiros por um específico período de tempo. O retorno é função das oscilações de
preço de mercado dos ativos financeiros.
A medida de risco de mercado das oscilações de preço de mercado é a chamada
volatilidade. Essa medida de risco está assentada no ajuste a uma distribuição estatística das
oscilações de preços. De uma forma geral, o VAR leva em consideração a distribuição de
probabilidade dos retornos dos diversos ativos que constituem um determinado portfólio. A
Figura 1 ilustra uma hipotética distribuição de probabilidade de retornos, assim como, o VAR
para 95% de confiança.
Figura 1: Distribuição de Probabilidade dos Retornos e o VAR
Nível
de
Confiança
95 %
VAR = - $ 235
$ 400
Retornos Diários
Observa-se, na Figura 1, que a média dos retornos se apresenta com valor de $400 e o
VAR, com 95% de confiança, é de -$235. O horizonte temporal assumido é de um dia
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
3
André Accorsi - Flávio Panhoni
(retorno diário). Pode-se afirmar que há uma probabilidade igual a 5% de que o portfólio em
questão tenha uma perda, em seu valor de mercado, maior do que $ 235 nas próximas 24
horas. Se este valor for significativo, comparando-se, por exemplo, com o patrimônio líquido
da instituição que retém a posição, deve-se tomar uma decisão imediata a fim de reduzir o
risco a níveis aceitáveis.
2.2 O Método Simulação Histórica
Um dos métodos para a mensuração do VAR é o chamado Método Simulação
Histórica.
Uma distribuição de retornos de ativos financeiros constitui uma série histórica das
oscilações de preços de mercado desses ativos, para um intervalo de tempo predeterminado. O
preço de mercado de um ativo financeiro é apurado no instante da negociação. Dependendo
do tipo de ativo financeiro poderão ocorrer muitos, poucos ou, até mesmo, nenhum negócio
durante o decorrer de um dia. Assim, é comum estabelecer que o valor médio ponderado de
todos os negócios, ou o valor ponderado dos últimos negócios de um dia, define o preço de
mercado de um determinado ativo financeiro, o qual será denotado por Pt, onde t representa o
dia do respectivo negócio.
A oscilação do preço de mercado será a diferença entre o preço de mercado em um
determinado instante t, ou Pt, e o preço de mercado para um instante no tempo anterior t-i, ou
Pt-i , sendo que i pode variar de 1 a n dias. Essa diferença será representada por Pt - Pt-i.
Para ilustração do método de mensuração de risco, baseado no Método Simulação
Histórica, será fixado o intervalo de tempo de um dia (i = 1), isto é, a diferença do preço de
mercado de hoje menos o preço de mercado do dia imediatamente anterior, ou Pt-Pt-1. Em
outras palavras, a mensuração de risco de mercado estará avaliando a possibilidade de perda
da posição financeira para as próximas 24 horas .
O VAR para um dia é chamado de DEAR (Daily-Earnings-at-Risk). O DEAR,
geralmente, é a medida de risco de mercado calculada e utilizada pelos administradores de
risco, uma vez que suas decisões e operações são freqüentes, modificando-se, assim,
diariamente, sua posição de ativos financeiros.
A série histórica das oscilações diárias de preços de mercado será denotada por ∆Pi ,
onde i varia de 1 a n, sendo n a quantidade total de observações da série.
De posse da série histórica de preços, calcula-se o retorno histórico diário para cada um dos
instrumentos financeiros e respectivos fatores de risco do portfólio. O fator de risco é o
parâmetro que afeta diretamente o preço de mercado de um determinado ativo financeiro.
Como fatores de risco têm-se: taxas de juros, taxas de câmbio (moeda), ações e commodities.
Assume-se que o portfólio atual permanece exatamente o mesmo durante um certo
período de tempo, n, limitado à disponibilidade da série histórica. Ressalta-se que, caso o
portfólio tenha mais do que um instrumento financeiro e/ou fator de risco, deve-se adicionar
os retornos diários individualmente calculados, a fim de obter-se a série histórica de retornos
diários do portfólio.
Com relação à extensão da série histórica, Satyajit (1998: 597), sugere que se utilize
entre 60 e 500 dias úteis (3 a 24 meses corridos). A escolha depende, particularmente, dos
tipos de fatores de risco que compõem o portfólio. Um portfólio composto por fatores de risco
recentes restringe o uso da base de dados histórica e, consequentemente, o valor de n será
menor.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
4
André Accorsi - Flávio Panhoni
O próximo passo é ordenar, no sentido decrescente, os retornos diários históricos encontrados
no portfólio em questão. Essa série ordenada será denotada por R1 , R2, ... , Rn-1, sendo n-1 o
número de observações históricas obtidas.
Em seguida, define-se o grau de confiabilidade, α, por exemplo, 95%, e calcula-se o VAR da
seguinte forma:
VARportfólio = R p ,
(1)
p = (n –1 ) × (1 - α)
(2)
sendo que,
Caso o valor de p, obtido originalmente pela equação 2, não seja inteiro, adota-se o p
mais próximo do número inteiro imediatamente posterior ou anterior
As equações 1 e 2 foram desenvolvidas com base no Percentile Ranking Method, cuja teoria
encontra-se no livro de Satyajit (1998: 599).
Figura 2: Fluxograma do Método Simulação Histórica
Dados
Históricos
Distribuiçãod
os Retornos
Portfólio
Cálculo
do
VAR
Fonte: Adaptado de Jorion (1997: 194)
Como se pode perceber, a metodologia envolve intenso cálculo numérico. Esse aspecto, no
entanto, não representa um problema devido à evolução constante da performance da
tecnologia de processamento de dados.
De uma forma geral, o método é simples e intuitivo, conforme se verifica pelo fluxograma
apresentado na Figura 2.
3. APLICAÇÃO DO MÉTODO SIMULAÇÃO HISTÓRICA AO IBOVESPA MÉDIO
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
5
André Accorsi - Flávio Panhoni
A fim de exemplificar a simulação de VAR, pelo Método Simulação Histórica, será
apresentado a seguir uma aplicação prática utilizando-se o IBOVESPA (Índice BOVESPA)
Médio.
O Índice BOVESPA - Bolsa de Valores de São Paulo - é o valor atual, em moeda
corrente, de uma carteira teórica de ações, a partir de uma aplicação hipotética. Extremamente
confiável, e com uma metodologia de fácil acompanhamento pelo mercado, o IBOVESPA,
representa, fielmente, não só o comportamento médio dos preços das principais ações, como
também, o perfil das negociações a vista observadas nos pregões da BOVESPA. Sua
finalidade básica é servir como indicador médio do comportamento do mercado. Para tanto,
sua composição procura aproximar-se, o melhor possível, da real configuração das
negociações a vista (lote-padrão) na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA).
A série histórica de retornos diários do IBOVESPA Médio abrangerá o período de
29/05/1998 a 07/06/2000, conforme é representado, graficamente, na Figura 3. Para o cálculo
dos retornos diários assumiu-se, hipoteticamente, um portfólio no valor de um milhão de
reais, e como único fator de risco, o IBOVESPA Médio.
O retorno diário mostrado, na Figura 3, é calculado pela multiplicação do valor de
mercado do portfólio, no caso R$ 1 milhão, pela variação percentual diária do IBOVESPA
Médio.
Figura 3 – Série Histórica de Retornos Diários do IBOVESPA Médio 29/05/98 a 07/06/00
Retornos Diários (R$ Milhares)
150
100
50
0
-5 0
-1 0 0
01/06/00
01/04/00
01/02/00
01/12/99
01/10/99
01/08/99
01/06/99
01/04/99
01/02/99
01/12/98
01/10/98
01/08/98
01/06/98
-1 5 0
Fonte: Site www.patagon.com.br
O período histórico selecionado compreende um total de 500 dias úteis. Esta série de
observações históricas é considerada apropriada para estimativa do VAR pelo Método
Simulação Histórica. Salienta-se que a estimativa do VAR, a partir do Método Simulação
Histórica, para uma determinada data, estará sempre utilizando as últimas 500 observações. A
estimativa do VAR posterior à data inicial de 08/06/2000, portanto, estará sempre eliminando
a última variação da série histórica (ou a mais antiga) e incorporando a variação do dia
anterior ao da simulação (ou a mais recente), permanecendo, assim, uma série histórica dos
últimos 500 dias úteis. Será adotado, para o portfólio em estudo, uma simulação para 250 dias
úteis, isto é, o período compreendido entre 08/06/2000 e 11/06/2001.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
6
André Accorsi - Flávio Panhoni
Com a finalidade de avaliar a qualidade técnica do Método Simulação Histórica será
utilizado o Método Back-Test e o Teste Estatístico das Proporções. Outro parâmetro essencial,
para a elaboração da estimativa do VAR, e do Back-Test, é a adoção do nível de confiança,
estabelecido, no exemplo, em 95%.
O Método Back-Test é bastante simples. Este teste investiga a quantidade de retornos
obtidos de valores inferiores ao VAR estimado. Deve-se relembrar que o VAR mede a perda
máxima de retornos, portanto, é um número negativo. Primeiramente, são realiza-das uma
série de estimativas do VAR, ou N estimativas, e compara-se estes resultados com cada
retorno realmente obtido. Apura-se a quantidade de observações cujos retornos foram
inferiores à respectiva estimativa do VAR, a qual será representada por n. Em seguida,
mensura-se a proporção, p, destas observações em relação ao total de estimativas, ou p = n ÷
N. De forma prática, se a quantidade de estimativas do VAR for 200 e o nível de confiança
95%, espera-se que 10 (ou p = 5%) retornos sejam inferiores ao VAR estimado. Porém,
deve-se ressaltar, que p é uma estimativa, e portanto, possui margem de erro.
Figura 4 – Estimativa do VAR do IBOVESPA Médio 08/06/2000 a 11/06/2001
Retornos Diários
VAR (95%)
40
20
0
-20
8/6/2001
8/5/2001
8/4/2001
8/3/2001
8/2/2001
8/1/2001
8/12/2000
8/9/2000
8/8/2000
8/7/2000
8/6/2000
-60
8/11/2000
-40
8/10/2000
Retornos Diários (R$ Milhares)
60
Para validar-se, estatisticamente, uma determinada proporção obtida com a desejada,
utilizar-se-á, o Teste Estatístico das Proporções, cuja teoria pode ser encontrada em Siegel
(1975: 44-45) e Costa Neto (1977: 06-107). Com base neste teste, será avaliada a
aceitabilidade do Método Simulação Histórica. Fornecido um determinado grau de
significância (β) desejado, testa-se a hipótese H0: p = 1 - α versus H1: p ≠ 1 - α. Caso H0 seja
aceita estatisticamente, o Método Simulação Histórica será considerado adequado, caso
contrário será rejeitado.
No caso do estudo do IBOVESPA Médio, tem-se N = 250, e será adotado o nível de
significância de 5%. Com estes parâmetros, a decisão se resume a calcular n: se n estiver entre
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
7
André Accorsi - Flávio Panhoni
6 e 19 observações (ou 2,4% < p < 7,6%), para um VAR estimado com 95% (α) de grau de
confiança, o Método Simulação Histórica será considerado adequado.
Definidos os parâmetros e a série histórica de retornos, para o portfólio do IBOVESPA
Médio, realizou-se a estimativa do VAR, pelas equações 1 e 2, interativamente, para os
próximos 250 dias úteis, isto é, de 08/06/2000 a 11/06/2001. As estimativas do VAR e os
retornos diários do período simulado, podem ser apreciados, graficamente, na Figura 4.
Tabela 1 – Tabela de Retornos e Estimativas do VAR do IBOVESPA Médio
Método Simulação Histórica
Simulação VAR : IBOVESPA Médio
Data
8/6/2000
9/6/2000
12/6/2000
13/6/2000
14/6/2000
15/6/2000
16/6/2000
19/6/2000
20/6/2000
21/6/2000
23/6/2000
26/6/2000
27/6/2000
28/6/2000
29/6/2000
30/6/2000
3/7/2000
4/7/2000
5/7/2000
6/7/2000
7/7/2000
10/7/2000
11/7/2000
12/7/2000
Retorno
Diário
27,54
-4,33
-8,17
1,11
8,77
6,63
1,52
4,83
13,23
23,63
-8,64
-14,46
-12,87
15,48
-21,34
8,75
18,21
18,29
-0,75
-2,03
22,96
-2,56
-27,57
-9,34
VAR
95%
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-46,5
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
Data
5/9/2000
6/9/2000
8/9/2000
11/9/2000
12/9/2000
13/9/2000
14/9/2000
15/9/2000
18/9/2000
19/9/2000
20/9/2000
21/9/2000
22/9/2000
25/9/2000
26/9/2000
27/9/2000
28/9/2000
29/9/2000
2/10/2000
3/10/2000
4/10/2000
5/10/2000
6/10/2000
9/10/2000
Retorno
Diário
-9,22
5,47
-5,19
-8,27
-15,22
-5,87
-2,36
-19,18
-28,25
-10,20
1,00
1,93
-7,38
30,36
-6,29
-11,84
-12,55
5,89
-13,26
-2,22
0,32
24,98
-8,26
-15,20
VAR
95%
-38,4
-38,4
-38,4
-38,4
-38,4
-36,2
-35,9
-35,9
-35,9
-35,8
-35,8
-35,8
-35,8
-35,8
-34,4
-34,4
-34,4
-34,4
-34,4
-34,4
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
Data
6/12/2000
7/12/2000
8/12/2000
11/12/2000
12/12/2000
13/12/2000
14/12/2000
15/12/2000
18/12/2000
19/12/2000
20/12/2000
21/12/2000
22/12/2000
26/12/2000
27/12/2000
28/12/2000
2/1/2001
3/1/2001
4/1/2001
5/1/2001
8/1/2001
9/1/2001
10/1/2001
11/1/2001
Retorno
Diário
16,03
-2,34
51,78
21,70
-10,59
2,86
9,31
-13,57
10,28
4,34
-21,64
-13,99
-2,66
5,31
20,16
11,70
19,66
13,76
64,98
-12,23
-10,55
31,09
-2,48
1,95
VAR
95%
-30,7
-30,7
-30,7
-29,7
-29,7
-29,5
-29,5
-29,5
-29,5
-28,8
-28,8
-28,6
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,3
-28,2
-28,2
-28,2
Data
12/3/2001
13/3/2001
14/3/2001
15/3/2001
16/3/2001
19/3/2001
20/3/2001
21/3/2001
22/3/2001
23/3/2001
26/3/2001
27/3/2001
28/3/2001
29/3/2001
30/3/2001
2/4/2001
3/4/2001
4/4/2001
5/4/2001
6/4/2001
9/4/2001
10/4/2001
11/4/2001
12/4/2001
Retorno
Diário
-13,13
-19,32
-22,45
1,84
-5,52
-14,46
1,80
-3,81
-53,86
-2,33
45,62
3,58
-12,69
-6,17
-29,85
6,00
-31,96
12,99
23,88
15,50
4,61
28,69
-5,75
-15,82
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
VAR
95%
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-26,9
-26,9
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-26,9
-26,9
-27,1
-27,1
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
8
André Accorsi - Flávio Panhoni
..continuação da Tabela 1.
Data
18/07/00
19/07/00
20/07/00
21/07/00
24/07/00
25/07/00
26/07/00
27/07/00
28/07/00
31/07/00
01/08/00
02/08/00
03/08/00
04/08/00
07/08/00
08/08/00
09/08/00
10/08/00
11/08/00
14/08/00
15/08/00
16/08/00
17/08/00
18/08/00
21/08/00
22/08/00
23/08/00
24/08/00
25/08/00
28/08/00
29/08/00
30/08/00
31/08/00
01/09/00
04/09/00
Retorno
Diário
9,40
-22,76
11,68
1,22
12,79
-11,57
-16,35
2,70
-22,74
-0,90
-13,80
-3,17
0,98
25,92
5,52
2,54
-13,67
4,54
9,01
41,69
8,35
-17,51
10,12
-12,75
-11,99
5,67
-1,96
-2,60
18,14
-0,17
-10,18
3,04
-0,46
4,52
7,22
VAR
95%
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-45,4
-44,0
-42,4
-42,4
-42,4
-38,9
Data
16/10/00
17/10/00
18/10/00
19/10/00
20/10/00
23/10/00
24/10/00
25/10/00
26/10/00
27/10/00
30/10/00
31/10/00
01/11/00
03/11/00
06/11/00
07/11/00
08/11/00
09/11/00
10/11/00
13/11/00
14/11/00
16/11/00
17/11/00
20/11/00
21/11/00
22/11/00
23/11/00
24/11/00
27/11/00
28/11/00
29/11/00
30/11/00
01/12/00
04/12/00
05/12/00
Retorno
Diário
7,45
-19,98
-43,43
21,61
-1,97
-29,47
-24,10
-13,14
4,86
46,98
12,76
21,50
-21,23
0,07
1,23
6,71
8,28
-20,72
-0,34
-16,91
11,56
-0,83
-18,49
3,78
23,76
0,96
-20,95
-4,96
-1,47
-28,58
2,45
-27,05
-7,27
-4,03
39,72
VAR
95%
-34,0
-34,0
-31,7
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-34,0
-31,7
-31,7
-31,7
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,8
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
-30,7
Data
17/01/01
18/01/01
19/01/01
22/01/01
23/01/01
24/01/01
26/01/01
29/01/01
30/01/01
31/01/01
01/02/01
02/02/01
05/02/01
06/02/01
07/02/01
08/02/01
09/02/01
12/02/01
13/02/01
14/02/01
15/02/01
16/02/01
19/02/01
20/02/01
21/02/01
22/02/01
23/02/01
28/02/01
01/03/01
02/03/01
05/03/01
06/03/01
07/03/01
08/03/01
09/03/01
Retorno
Diário
12,80
17,31
14,29
-12,51
15,01
10,09
-6,07
9,88
-6,95
1,52
-30,27
-18,81
-14,26
11,54
-10,10
21,10
3,68
-3,85
-2,69
2,75
0,29
-34,09
-22,58
-10,45
-17,54
0,51
13,65
3,07
9,34
20,98
6,17
4,09
-18,68
2,32
-17,18
VAR
95%
-28,0
-27,6
-27,4
-27,2
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-26,9
-26,3
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-26,9
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
Data
19/04/01
20/04/01
23/04/01
24/04/01
25/04/01
26/04/01
27/04/01
30/04/01
02/05/01
03/05/01
04/05/01
07/05/01
08/05/01
09/05/01
10/05/01
11/05/01
14/05/01
15/05/01
16/05/01
17/05/01
18/05/01
21/05/01
22/05/01
23/05/01
24/05/01
25/05/01
28/05/01
29/05/01
30/05/01
31/05/01
01/06/01
04/06/01
05/06/01
06/06/01
07/06/01
08/06/01
11/06/01
Retorno
Diário
-9,68
-63,66
-13,65
33,10
1,21
34,26
27,34
2,53
-15,77
9,43
18,65
-11,58
-17,59
-2,51
19,23
-24,67
-30,84
3,16
21,04
20,34
1,48
8,83
5,58
-21,50
-14,46
-13,83
-11,98
16,15
2,98
11,96
13,57
13,92
23,07
-1,56
3,51
7,24
-12,04
VAR
95%
-27,4
-27,4
-27,6
-27,6
-27,6
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,4
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,6
-27,4
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,1
-27,2
-27,2
-27,2
Na Figura 4, de uma forma visual, observa-se que em certas datas os valores de
determinados retornos diários apresentam-se inferiores ao respectivo VAR estimado. As datas
destas ocorrências, os valores do VAR e retornos diários, estão devidamente identificados,
através do campo hachurado, na Tabela 1.
Para validar o Método de Simulação Histórica, no caso do IBOVESPA Médio,
prossegue-se com o Back-Test e o Teste Estatístico das Proporções. Assim, deve-se apurar a
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
9
André Accorsi - Flávio Panhoni
quantidade de retornos inferiores ao VAR estimado, com 95% de confiança. Nota-se, na
Tabela 1, que n é igual a 8 observações, ou p = 3,2%. Conforme, os parâmetros de decisão do
teste estatístico das proporções, citado anteriormente, o valor de n (ou p) encontrado está
dentro do intervalo de aceitação. Pode-se afirmar , portanto, pelo resultado do teste, e
observando-se o grau de significância de 5%, que o Método Simulação Histórica para
estimativa do VAR (95%), do fator de risco de mercado IBOVESPA Médio é uma
metodologia adequada.
Conclusão
Após a apresentação da evolução e necessidade de administrar-se riscos, particularmente,
risco de mercado; o conceito que envolve VAR; uma metodologia de mensuração de risco de
mercado, o Método Simulação Histórica; e o estudo de um portfólio, com o fator de risco de
mercado IBOVESPA Médio, de forma sucinta, destacam-se os seguintes aspectos:
• Pode-se administrar riscos mas não eliminá-los. Risco é inevitável, o importante é
identificá-los e monitorá-los. Quando da ocorrência de perdas, deve-se aprender com elas,
criando-se metodologias, ou práticas administrativas, para evitá-las, ou ao menos,
minimizá-las no futuro;
• VAR é uma metodologia que mensura risco de mercado, mas não deve ser encarado como
uma solução. Além de mensurar, é preciso monitorar e controlar a eficiência das
ferramentas, assim como administrar outros riscos, tais como: risco de crédito e risco
operacional;
• O Método Simulação Histórica pode ser aplicado a qualquer tipo de distribuição de
retornos, ou distribuições não-paramétricas. Outras metodologias de mensuração do VAR,
como o Método Variância-Covariância, exigem uma distribuição de retornos aderente à
curva normal, o que nem sempre é observado para os diversos fatores de risco presentes
no mercado financeiro;
• O Método Simulação Histórica é compreensível e comunicável, e sua simplicidade
permite aplicá-lo, mesmo no caso de indivíduos com mínimos conhecimentos
quantitativos. Este aspecto é importante, pois nem sempre os responsáveis pela tomada de
decisão possuem grande habilidade quantitativa;
• O Método Simulação Histórica é de fácil implementação, pois não exige complexas
plataformas computacionais (software e hardware);
• O Método Simulação Histórico apesar de apresentar resultados satisfatórios para o fator de
risco estudado, IBOVESPA Médio, deve ser testado para outros instrumentos, tais como
os chamados derivativos;
• A série histórica de preços do IBOVESPA Médio, particularmente, apresenta um vasto
período histórico e de fácil acesso. Além disso, não necessitou de nenhum tratamento
matemático e/ou estatístico para a elaboração dos retornos. Quando de portfólios com
outros fatores de risco e/ou instrumentos financeiros, poderá haver limitações, tais como:
tamanho da série histórica de preços, ausência de informações (missing data) e escassez de
negócios para apuração de preços;
• Outro aspecto a atentar é quanto ao problema de calendário. Isto ocorre, quando o
portfólio compõem-se de instrumentos financeiros oriundos de países diferentes. Nestas
situações, será necessário adotar metodologias estatísticas ou de julgamento, a fim de
eliminar a incompatibilidade dos respectivos calendários e possibilitar, assim, o cálculo
do VAR.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
10
André Accorsi - Flávio Panhoni
Bibliografia
1. BANCO CENTRAL DO BRASIL. Circular n º 2972, 23/03/2000.
2. COSTA NETO, P. L. O. Estatística. São Paulo: Edgar Blucher Ltda, 1977.
3. DANIELSSON, J.; VRIES, C. G.; JORGENSEN, B. N. The value of value at risk:
statistical, financial, and regulatory consideration. Federal Reserve Bank of New York
Economic Policy Review, v.4, n.3, , p. 107(2), october 1998.
4. FOLHA DE SÃO PAULO. Entenda o que está sendo investigado no sistema financeiro.
São Paulo, 24/04/1999, Caderno B, p. 3.
5. FOLHA DE SÃO PAULO. Livro relata irracionalidade do mercado financeiro (do New
York Times). São Paulo, 11/09/2000, Caderno B, p. 2.
6. GOMES, F. C. Risco de mercado: seleção de metodologias e implementação de
sistemas no Brasil. In: SEMINÁRIO SOBRE GERENCIAMENTO DE RISCO. São Paulo,
dezembro 1996.
7. JORION, P. Value at risk: the new benchmark for controlling market risk. Chicago:
IRWIN Professional Publishing, 1997.
8. LEONG, K. The right approach. Value At Risk Supplement, p. 9-16, june 1996.
9. LEON, M. Managing and measuring market risk. Trusts & States. Chicago, v.138,
i11, p. 28(2), october 1999.
10. LESLIE, R.; ESSEGHAIER, Z. Measuring financial risk in the 21st century. Bank
Accounting & Finance, v.13, i3, p. 45(10), spring 2000.
11. LOPEZ, J. A.; HIRTLE, B. Methods for evaluating value-at-risk estimates. Federal
Reserve Bank of New York Economic Policy Review., v.4, n.3, p. 119(10), october 1998.
12. MAKAROV, Victor. Value-at-risk: historical simulation. The Journal of Lending
& Credit Risk Management, v.81, i7, p. 37(4), march 1999.
13. RISKMETRICSTM . Technical Document, 3rd Edition, New York, may 1995.
14. SATYAJIT, Das. Risk management and financial derivatives: a guide to the
mathematics . New York: McGraw-Hill, 1998.
15. SECURATO, J. R. et alii. Cálculo financeiro das tesourarias: bancos e empresas. São
Paulo: Saint Paul, 1999.
16. SIEGEL, S. Estatística não-paramétrica. São Paulo: McGraw-Hill, 1975.
17. THE ECONOMIST. A survey of corporate risk management. New York, p. 1-22,
february, 1996.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 1-11, jul./ago./set. 2003
11
AVALIAÇÃO E CONTROLE DA QUALIDADE
EM PLANOS DE SAÚDE ODONTOLÓGICOS
Elisabeth Sekulic *
Socorro Veras **
Silvia Maria Nóbrega-Therrien ***
strengthened through the
participation of all in search
of consent.
Resumo
O objetivo deste trabalho é discutir de que forma
o setor privado de assistência à saúde bucal vem
organizando seus sistemas de avaliação e controle de
qualidade, procurando identificar como se dá a
participação de cada um dos elementos envolvidos no
processo, ou seja, o Estado, as operadoras, os prestadores
de serviço e os usuários. Parte-se de uma revisão da
literatura de onde são retirados os principais elementos
para uma discussão, na qual a premissa básica foi de que
os objetivos e os métodos de controle e avaliação são
específicos para cada uma das partes envolvidas, e estes
que podem se somar ou se contrapor, dependendo de
como o processo é conduzido. Desta forma, chegou-se à
conclusão de que, mesmo nos casos em que os interesses
sejam conflitantes, o processo deve proporcionar meios
para que o problema possa ser compreendido sob
diferentes pontos de vista. Este tipo de abordagem pode
permitir que os mecanismos internos e externos de
controle sejam fortalecidos através da participação de
todos em busca de um consenso.
Palavras-chave: odontologia, avaliação, gerência
Keywords: dentistry, evaluation, management
Abstract
***Enfermeira, Mestre em
Educação pela UFC, Doutora
em Sociologia pela Universidade de Salamanca Espanha, Professora do Curso de
Mestrado em Saúde Pública
The objective of this work is to discuss in what form the
private section of attendance to the oral health is
organizing its evaluation systems and quality control,
trying to identify how is the participation of each one of
the involved elements in the process, in other words, the
State, the operators, the servants and the users. It starts
with a revision of literature from where are taken the
principal elements for a discussion, in which the basic
premise was that the objectives and the methods of
control and evaluation are specific for each one of the
involved parts, and these can be added or be opposed,
depending of how the process is led. This way, it was
reached the conclusion that, even in the cases in that the
interests came into conflicts, the process should provide
means so that the problem can be understood under
different points of view. This approach type can allow
that the internal and external mechanisms of control are
*Odontóloga,
Especialista
em Administração em Saúde
pela PUC/PR, Mestranda em
Saúde Pública pela UECE
**Odontóloga, Especialista e
Mestranda em Saúde Pública
pela UECE
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
Introdução
Para Bordin (1996:15), a avaliação de serviços de saúde pode ser considerada como
parte fundamental no planejamento e gestão de qualquer sistema de saúde em todos os seus
níveis, mas muitas vezes está presente neste processo o pensamento simplista e equivocado,
de que a avaliação significa um controle sobre o desempenho pessoal deste ou daquele
profissional, o que compreensivelmente, acaba gerando resistências e oposição a qualquer
trabalho neste sentido. Na realidade a avaliação fornece subsídios para o controle do sistema
na medida que analisa o desempenho dos serviços, aponta suas deficiências, define metas a
serem alcançadas, mas o controle não deve ser visto como o objetivo final da avaliação.
Donabedian (1990:116), um dos autores mais respeitados pelos seus estudos sobre
avaliação de serviços de saúde, classifica sete diferentes atributos para a avaliação da
qualidade: eficácia, efetividade, eficiência, otimização, aceitabilidade, legitimidade e
eqüidade. Vuori, (1988:19), acrescenta a qualidade técnico-científica, lembrando que , em
primeiro lugar, vem a eficácia, isto é, o serviço deve ser capaz de produzir o efeito desejado e,
logo em seguida, vem a eficiência, ou seja, a relação favorável entre o impacto real e os custos
de produção.
A grande preocupação com a avaliação da eficiência dos serviços está ligada ao
crescente gasto em saúde, verificado tanto no sistema público quanto no sistema privado de
saúde. De acordo com o editorial da revista The Economist (1997: 38-42), até mesmo o
Sistema Nacional de Saúde Inglês, tido como um modelo de eficiência em políticas públicas
de saúde, tem tido grandes dificuldades para tentar conter a expansão destes gastos. Entre as
principais causas da chamada inflação da saúde estão as inovações tecnológicas, os
mecanismos de remuneração dos serviços, a falta de preocupação dos profissionais e usuários
com a redução dos custos, ausência de controles adequados que garantam a eficiência e
qualidade do sistema. A combinação destes fatores faz com que os gastos em saúde cresçam a
uma taxa muito maior do que os níveis de saúde da população assistida.
No Brasil, a questão dos altos custos em saúde no setor público começou a ser
analisada mais detalhadamente na década de oitenta, quando surgiram as primeiras propostas
de mudanças no sistema de pagamento, passando do pagamento por procedimentos para o
pagamento por “pacotes” de serviços, de acordo com cada tipo de intervenção, MCGREEVY
(1988: 51-71).
Hoje, quando se discute o financiamento à saúde, tanto a disponibilidade de recursos
quando a aplicação eficiente dos mesmos é essencial. Isto porque nem sempre um alto
investimento em saúde representa um desempenho adequado do setor. Um dos estudos que
retrata bem esta situação é o de SHABAZ (1993), no qual o autor avalia os efeitos dos recursos
econômicos investidos em saúde nos países industrializados. Os dados utilizados tiveram
origem em relatórios do Banco Mundial de 1960 a 1990. Neste estudo, observa-se que os
EUA apesar de liderarem o ranking dos gastos com a saúde (US$ 2.566 per capita ano, em
1990), situavam-se numa das últimas posições no que se refere ao nível de saúde de sua
população, entre os países desenvolvidos. Em contrapartida, o Japão, que gastou per capita
um pouco mais que a metade do que os EUA, registrou em 1990, o menor índice de
mortalidade infantil (5 por mil nascidos vivos). Os resultados mostram que é primordial que
se racionalize a aplicação de recursos em saúde, pois o simples fato de se investir mais pode
não ser suficiente para que o quadro se modifique.
Mendes (1999:165-176), faz uma análise dos gastos nacionais em saúde, tomando como
base outros países da América Latina com desenvolvimento econômico semelhante. Neste
estudo o autor confronta os gastos em saúde dos países selecionados com cinco indicadores de
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
13
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
níveis de saúde: expectativa de vida ao nascer, taxa de mortalidade infantil, taxa de
mortalidade materna, cobertura vacinal DPT, cobertura da atenção pré-natal. O Brasil
apresentou o pior desempenho em relação aos três primeiros indicadores selecionados e uma
situação muito desfavorável, em relação à maioria dos outros países, no que diz respeito aos
outros dois indicadores.
Médice (1994:149-163), ao analisar o financiamento e o gasto público, observa que o
Brasil só gasta menos como proporção do PIB, que nações muito pobres, como Nicarágua,
Haiti, Honduras, El Salvador e Equador, embora os gasto per capita sejam superiores. No
entanto, muitos destes países, apesar de mais pobres, já apresentam indicadores de saúde
melhores que o Brasil. Segundo o autor o desfio não é gastar mais e sim gastar melhor com
saúde.
Resultados como estes são explicados por Donabedian (1992:18), em texto no qual o
autor discute a importância de se encontrar o ponto de efetividade ótima nos gastos com
saúde. Acima deste ponto, os custos da atenção crescem a uma taxa progressivamente maior
do que o nível de saúde, concluindo que a partir de um determinado nível de gastos os
benefícios agregados já não valem o custo adicional.
A preocupação com a chamada “inflação da saúde” no setor privado teve maior força
nos Estados Unidos a partir das últimas décadas. Na tentativa de conter os altos custos da
saúde nasce a Administração em Saúde e a Economia da Saúde, criando novas formas de
gestão no setor. Os serviços de saúde passaram a buscar maneiras de controlar os custos,
modificando a forma de remuneração dos prestadores de serviço, estabelecendo parâmetros de
saúde, planos de incentivos para a redução de custos, sistemas de auditagem, taxas
moderadoras, franquias, investimento em educação continuada da rede de prestadores de
serviço e em educação para a saúde dos usuários.
As pesquisas na área de saúde passaram a contar com o suporte de tecnologias como a
Medicina Baseada em Evidências, que forneceu subsídios para a formulação de protocolos
clínicos, que foram introduzidos gradativamente em vários serviços de saúde como medida de
racionalização do sistema. A prática da Medicina Baseada em Evidências integra a
competência clínica individual com a melhor evidência clínica externa disponível a partir da
investigação sistemática. Deste modo as ações de saúde podem ser programadas e avaliadas
de acordo com critérios de eficiência e qualidade cientificamente estabelecidos.
As Ciências Atuariais também têm contribuído de maneira extraordinária para o
controle de gastos e estimativas de custos em saúde, através do cálculo de vários indicadores
como o índice de utilização e tábua de vida, entre outros, ambos de vital importância para
administração de sistemas de saúde.
Dentro deste contexto surge o managed care, ou atendimento gerenciado, uma
proposta de gestão em saúde, que abrange conhecimentos em diversas áreas como a
administração, a economia e a estatística, cujas etapas de evolução podem ser mais bem
compreendidas no quadro 1.
1. O prestador de serviço
Zanetti (1988:1), em seu trabalho sobre a crise da odontologia brasileira, conclui que o
mercado de trabalho do cirurgião dentista sofreu uma completa transformação durante a
última década, que se reflete na radical queda tendencial da taxa de lucros, multiplicação dos
arranjos de instrumentos concorrenciais, volatização e incerteza dos rendimentos, o que faz
com que hoje o profissional que pretende atuar nesta área precise ter domínio de
conhecimentos que costumam ir além da formação que lhe foi ofertada em sua graduação. Os
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
14
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
novos sistemas de trabalho, junto aos planos de saúde odontológicos, passam a intermediar a
relação profissional/paciente, modificando a lógica de funcionamento do consultório ao
interferir nas formas de remuneração do profissional, na sua rotina de trabalho e até mesmo
em seu plano de tratamento.
Quadro 1: Evolução do Atendimento Gerenciado
Geração
1
Características
Auditoria pós
Contratos com prestadores preferenciais
Segunda opinião médica
Pouca informação educativa para os usuários
2
Auditoria pré
Transferência de parte dos recursos financeiros captados para alguns prestadores
Uso de generalistas como porta de entrada
Pagamento prospectivo por “pacotes” (grupo de procedimentos relacionados)
3
Gerenciamento de casos de alto custo
Informações sobre o perfil dos prestadores
Protocolos de prática clínica
Complexo de incentivos financeiros aos prestadores
Transferência completa da capitação aos prestadores
4
Avaliação de resultados no atendimento
Desenvolvimento de tábuas de uso e risco dos beneficiários
Integração do sistema de atendimento
Melhoria e monitoração dos sistemas de informação
5
Gerenciamento antecipado do caso
Pesquisa das necessidades existentes na comunidade
Gerenciamento de determinadas doenças e doentes
Integração de vários serviços clínicos
Pagamento baseado em resultados
Consumidores informados
Fonte: FAIRFIELD (1997)
Para reequilibrar um mercado de trabalho que foi estruturado com bases
completamente diferentes, é necessário que o odontólogo aprimore a sua capacidade de
gerenciar o consultório e compreender o funcionamento das empresas para as quais presta
serviço. O primeiro passo neste sentido é conhecer exatamente a composição dos custos dos
serviços oferecidos e a partir daí estabelecer parâmetros de eficiência e qualidade, para saber
onde e quando melhor aplicar os recursos disponíveis, evitando o desperdício com
tecnologias e tratamentos que pouco acrescentarão à sua prática clínica e à saúde do paciente.
Para suprir esta e outras lacunas na formação do odontólogo, é importante que o
profissional busque atualizar-se não apenas no âmbito da odontologia, mas também na esfera
das ciências sociais e humanas. Estas ciências podem trazer subsídios para uma nova
concepção de saúde bucal, que se baseia nas necessidades de saúde do paciente dentro de
uma abordagem social.
Diante do que foi discutido até o momento, pode-se identificar importantes
mecanismos de controle do sistema na conduta de profissionais bem formados, atualizados,
conscientes da sua responsabilidade social e motivados para trabalhar em parceria com as
empresas que o contrataram. Mas, para que o próprio profissional atue como um parceiro do
plano, preocupando-se com o controle de custos e qualidade dos planos odontológicos,
muitos problemas devem ser solucionados, a fim de diminuir o grau de insatisfação que
predomina entre os credenciados de diversas operadoras.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
15
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
1. A operadora
A rigorosa seleção dos profissionais que irão compor a rede de credenciados é o ponto
de partida para o controle da qualidade e dos custos do plano por parte da operadora.
WARSZAWIAK (2000:41-44), destaca que um dos fatores de maior importância para o
sucesso de um plano está na oferta de uma rede própria ou contratada de qualidade,
dimensionada adequadamente em razão de sua carteira de clientes, considerando fatores
como sexo, idade, características epidemiológicas.
Acrescentamos a estes a distribuição geográfica, a facilidade de acesso e os horários
disponíveis para as consultas. SEKULIC (2001:29), observou que o credenciamento de
profissionais ainda não é um processo bem normatizado na maioria das empresas, em muitos
casos, a contratação se dá sem que a empresa solicite qualquer tipo de comprovação a
respeito de sua habilitação como clínico ou especialista, referências pessoais e profissionais,
licença sanitária e alvará de funcionamento do consultório, assim como sobre as condições
de suas instalações.
Estas variáveis devem ser estudadas com bastante critério em processos de avaliação
do sistema, já que os prestadores de serviço é que tomam a linha de frente da assistência
interferindo diretamente na satisfação do usuário, na qualidade e nos dos serviços oferecidos.
2. O usuário
O interesse pela avaliação da satisfação do usuário cresceu juntamente com o
movimento pelos direitos do consumidor na década de 60 nos Estados Unidos e Europa,
sendo que teve especial repercussão no Serviço Nacional de Saúde Inglês, na década de 80,
em que havia uma preocupação tanto gerencial quanto com a qualidade dos serviços
prestados, (OLIVEIRA, 1998:22).
O usuário externo, como consumidor final, é sem dúvida um elemento
importantíssimo em um processo de avaliação e controle. Sua satisfação deve ser um dos
principais objetivos da empresa e prestadores de serviço, visto que já foi possível confirmar
que pacientes satisfeitos têm maior probabilidade de manter-se com o mesmo profissional,
não faltar às consultas, aderir ao tratamento e recomendar os serviços, o que é um ganho
incontestável em termos gerenciais (OLIVEIRA, 1998:22). Por isto mesmo, todo o esforço
deve ser empregado para ouvi-lo, não se restringindo a ouvir apenas aos que levam suas
queixas ou observações ao conhecimento dos responsáveis, mas indo além; mantendo um
canal aberto de comunicação, com estímulos à participação destes na solução dos problemas
do plano.
No setor público de saúde a importância da participação do usuário no controle do
sistema já é reconhecida, o que pode ser verificado pela ênfase que tem sido dada a
necessidade de fortalecimento dos Conselhos Municipais de Saúde. De acordo com a
proposta de Reforma Administrativa do Sistema de Saúde, estes conselhos, com composição
paritária entre representantes do governo (incluindo profissionais de saúde) e da população,
deverão ser responsáveis pelo controle de todas as operações do Sistema Municipal de
Saúde. Desta maneira os usuários podem fiscalizar diretamente todas as ações de saúde, em
conseqüência, os custos de auditoria e controle do sistema tendem a ser reduzidos e a
satisfação dos usuários é mais facilmente alcançada (Bresser Pereira, 1998:11).
Uma questão fundamental, para que o usuário possa dar uma contribuição cada vez
mais efetiva neste processo, é o aumento do seu grau de informação sobre alguns aspectos
básicos como suas condições de saúde bucal, técnicas de tratamento e prevenção disponíveis
e sobre o funcionamento do seu plano de saúde. Quando mais esclarecido estiver o paciente
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
16
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
maior o controle que ele poderá exercer sobre o seu tratamento, sobre o prestador de serviço
e sobre o próprio plano.
5. O Estado
Cabe ainda mencionar, o controle externo exercido pelo Estado sobre as Operadoras.
Com sancionamento da Lei 9656/98, que regulamenta os Planos Privados de Assistência à
Saúde, e com a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), pela Lei
9.961/00, as empresas do setor passam a assumir uma série de obrigações perante a
sociedade, que antes ou não existiam ou não tinham parâmetros definidos (Teixeira,
2002:14). Desta forma a prestação de serviços de saúde pela iniciativa privada tornou-se uma
atividade muito mais complexa, exigindo um alto grau de profissionalismo, o que pressupõe
a utilização de controles cada vez mais eficientes.
Entre as estratégias de controle adotadas pela ANS está a implantação do Sistema de
Informações de Produtos (SIP), instituído pela RDC no. 85 (25 de setembro de 2001), para
monitorar a qualidade da assistência à saúde prestada aos beneficiários. Este sistema deverá
complementar o sistema de controle econômico-financeiro, implementado em janeiro de
2001 através da regulamentação do Documento de Informações Periódicas das Operadoras
(DIOP). De acordo com a ANS, estes sistemas vão gerar indicadores que permitirão que
tanto a ANS quanto as operadoras detectem precocemente eventuais distorções nas carteiras
de produtos e aperfeiçoem medidas que possam prevenir dificuldades futuras.
Além da ANS, as Delegacias de Defesa do Consumidor (DECON), têm tido um
importante papel no controle dos abusos cometidos por algumas operadoras de planos de
saúde. Nas reclamações relativas a operadoras de planos de saúde, por vezes, o tratamento do
Procon1 é diferenciado, na tentativa de dar mais agilidade ao processo. Observa-se que, em
diversas situações, a DECON é o primeiro local procurado pelos usuários que se sentem
prejudicados no cumprimento dos seus contratos com as operadoras (Giovanella, 2002:168).
O trabalho das DECON neste sentido, têm tido o reconhecimento da classe
odontológica, como se pode comprovar pelo recente acordo do Conselho Regional de
Odontologia do Ceará2 com a DECON-CE. Neste acordo se prevê um canal direto de
comunicação entre os dois órgãos para que os problemas levados pelos usuários de planos
odontológicos à DECON-CE, possam ser resolvidos mais rapidamente.
A atuação destas entidades proporciona um maior controle das operadoras de planos,
evitando que entrem ou permaneçam no mercado empresas que não atendam a um padrão
mínimo de cobertura e qualidade na prestação de serviços, e ainda, que os preços dos
produtos sejam reajustados sem qualquer justificativa, como acontecia antes da
regulamentação dos planos.
1. Considerações finais
As inter-relações do processo de avaliação e controle são bastante complexas. Embora
se parta, na maioria das vezes, de um método de trabalho que assume um perfil vertical, no
qual a perspectiva do gerente do serviço é única a ser considerada, cada vez mais são
valorizadas as práticas horizontais de controle e avaliação que nascem de um processo de
negociação entre os diferentes grupos envolvidos em torno do mesmo objetivo: “a melhor
relação custo-efetividade”.
Na maioria das empresas odontológicas o trabalho do auditor se restringe à simples
verificação da conformidade dos procedimentos com a norma. Os usuários (clientes externos)
e prestadores de serviço (clientes internos) dificilmente são sequer consultados em relação à
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
17
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
sua satisfação com a empresa. Poucas empresas se preocupam em implantar uma política de
valorização da rede de credenciados ou mesmo em manter um processo de busca ativa de
reclamações e sugestões dos clientes. As empresas normalmente se limitam a dar resposta às
queixas que lhes são apresentadas diretamente. Será que todos os usuários insatisfeitos
reclamam à empresa? Será que todos os usuários que não fazem reclamações à empresa estão
satisfeitos?
Muitos autores discutem a importância de uma abordagem multidimensional,
incluindo todos os vários atores do processo na avaliação, entre eles Serapioni (1999:81) e
Junqueira & Auge (1995:60) e ainda as diferentes perspectivas de avaliação. Partindo-se deste
referencial, os métodos de trabalho nesta área devem ser adaptados de maneira que possa
ocorrer, além dos sistemas tradicionais de auditoria, um processo de avaliação e controle
difuso e voluntário partindo dos prestadores de serviço, usuários, e funcionários da
administradora de planos. Este tipo alternativo de controle só poderá ser efetivo se houver
espaço e estímulo para que ele se desenvolva no sistema.
Pode-se concluir que esta nova abordagem de auditoria e controle pode representar
uma alternativa viável aos tradicionais métodos de controle centrados apenas na identificação
de erros e fraudes, sem uma preocupação maior com o levantamento das causas primárias da
ineficiência do sistema ou da insatisfação dos usuários. Para que se alcance o máximo retorno
com estas atividades é preciso que o trabalho seja estrategicamente planejado visando
melhorias para o sistema como um todo. Isto pressupõe responsabilidade e participação de
cada um dos envolvidos, ou seja, da operadora, dos prestadores, dos usuários e até mesmo do
Estado, que deve agir como uma espécie de “controle externo” do sistema, garantindo que os
contratos sejam cumpridos e que padrões mínimos de qualidade sejam observados na
prestação de serviços de saúde.
Notas
Denominação genérica dos Programas de Orientação e Defesa do Consumidor e que
integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, podendo ter caráter estadual ou
municipal.
2
Trata-se de um acordo, ainda informal, referido em Boletim Informativo do CRO, no mês de
agosto de 2002.
1
Referências Bibliográficas
1. BORDIN, R. ET. AL. PRÁTICAS DE GESTÃO EM SAÚDE: EM BUSCA DA QUALIDADE. PORTO
ALEGRE: ED. DACASA/UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL, FACULDADE DE
CIÊNCIAS ECONÔMICAS, PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO PDG
SAÚDE, 1996.
2. BRASIL.
LEIS, DECRETOS e RESOLUÇÕES, foram colhidas em publicações
citadas no Diário Oficial da União, ou em publicações específicas do Conselho Federal de
Odontologia.
3. DONABEDIAN, A. Garantía y monitoría de la calidad de la atención médica: un
texto introductório. Morelos: Instituto Nacional de Salud Pública, 1992.
4. DONABEDIAN, A. The seven pillars of quality. Arch Pathol Lab Med: 114: 11151118, 1990.
5. EDITORIAL. AN UNHEALTH SILENCE. The Economist. p. 38-42, mar. , 1997.
6. FAIRFIELD, G. et al. Manage care: origins, principles, and evolution. BMJ. n.314, p.
23-26. 1997.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
18
Elisabeth Sekulic - Socorro Veras - Silvia Maria Nóbrega-Therrien
7. FETHEAZAN, S. Investimentos em saúde: uma perspectiva internacional. Conjuntura
Econômica, out., 1993.
8. GIOVANELLA, L. ;RIBEIRO, J. M.; COSTA, N. R. Defesa dos consumidores e
regulação dos planos de saúde. In: Regulação e Saúde: estrutura, evolução e
perspectivas da assistência médica suplementar. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde,
Agência Nacional de Saúde Suplementar, 2002
9. JUNQUEIRA, L. A. P.; AUGE, A. P. F. Qualidade dos serviços de saúde usuário.
Cadernos FUNDAP, p. 60-76, 1995
10. JUNQUEIRA, L. A. P.; AUGE, A. P. F. Qualidade dos serviços de saúde usuário.
Cadernos FUNDAP, p. 60-76, 1995
11. MCGREEVY, P. W. The high costs of health care in Brazil. Health Economics, p. 5171 , 1988.
12. MÉDICE, A. C. Economia e financiamento do setor saúde no Brasil: balanços e
perspectivas do processo de descentralização. São Paulo: Faculdade de Saúde
Pública/USP, 1994. 216p.
13. MENDES, E. V. Uma agenda para a saúde. 2.ed. São Paulo: Hubitec, 1999.
14. OLIVEIRA, F. J. A. A contribuição da antropologia nos estudos de satisfação e avaliação
dos serviços de saúde no nível de atenção primária à saúde: vale a pena ouvir o que o
paciente tem a dizer? Mom. e Perspec. Saúde. Porto Alegre, V. 11, n. 01, jan/jun, 1998.
15. PEREIRA, L. C. B. A reforma administrativa do sistema de saúde. Cadernos MARE
da Reforma do Estado. Brasília: Ministério de Administração e Reforma do Estado, n.
13, 1998.
16. PEREIRA, L. C. B. A reforma administrativa do sistema de saúde. Cadernos MARE
da Reforma do Estado. Brasília: Ministério de Administração e Reforma do Estado, n.
13, 1998.
17. SEKULIC, E. Planos de Saúde e credenciamentos. Curitiba: Monografia
(Especialização) – Especialização em Administração em Saúde/Sistemas e Planos de
Saúde, PUC/PR, 2001.
18. SERAPIONI, M. Avaliação da qualidade em saúde: a contribuição da sociologia da
saúde para a superação da polarização entre a visão dos usuários e a perspectiva dos
profissionais de saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 23, n. 53, p. 81-92, set/dez.
1999.
19. TEIXEIRA, ª et. al. Nota sobre a regulação dos planos de saúde de empresas no Brasil. In:
Regulação e Saúde: estrutura, evolução e perspectivas da assistência médica
suplementar. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde
Suplementar., 2002.
20. VOURI, H. Education and the quality of health services. Health Policy and Education,
n. 1, p. 67-69,1979.
21. WARSZAWIAK, M. Economia e custos em saúde. Curitiba: Pontifícia Universidade
Católica do Paraná/ISAD, 2000
22. ZANETTI, C. H. G. A crise da odontologia brasileira: as mudanças do Mercado de
serviços e o esgotamento do modo de regulação Curativo de Massa. Brasília: Trabalho
Acadêmico – Departamento de Odontologia, Universidade de Brasília, 1999.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 12-19, jul./ago./set. 2003
19
CULTURA ORGANIZACIONAL E ESTRATÉGIA COMPETITIVA: UM ESTUDO
DE MULTICASOS NAS CONCESSIONÁRIAS DE AUTOMÓVEIS DE SANTA
MARIA (RS)
João Antônio Gomes Pereira*
Rogério da Silva Nunes **
RESUMO
O objetivo do estudo é verificar a relação entre
cultura organizacional e estratégia competitiva na
administração de concessionárias de automóveis de
Santa Maria (RS). As concessionárias de automóveis
inserem-se no grande contexto da indústria
automobilística, que tem sido objeto de vários estudos a
partir das montadoras de automóveis norte-americanas
japonesas e européias, principalmente. Para a realização
do estudo, utilizou-se a pesquisa qualitativa, optando-se
pelo estudo de multicasos e pesquisa descritiva, nãoexperimental. A população da presente pesquisa foi
formada por proprietários, gerentes e funcionários de
cada organização. A pesquisa demonstrou que as
concessionárias usam as mesmas táticas, que no
entendimento dos entrevistados, são estratégias.
Verificou-se a existência predominante de uma cultura
com discurso ideológico acentuado. Quanto às
estratégias competitivas verificou-se a não existência de
uma tendência explícita no tocante a evidências de uma
estratégia competitiva entre as concessionárias
estudadas.
Palavras-chave: cultura organizacional,
competitiva, concessionária de automóveis
ABSTRACT
estratégia
employees
of
each
organization. The results
which were obtained show
that the three concessionary
stores use the same tactics,
which, in the judgement of
the
interviewees,
are
strategies. It may be found
out a pronounced ideological
discourse, with few objective
actions which drive to actual
results. What competitive
strategies, it may there aren’t
explicit tendency abaout
evidencies of a competitive
strategies
betwen
the
concessionary stores that it
were studied.
Keys word: organizational
culture,
competitive
strategies, Car concessionary
* Mestre em Administração
pelo CPGA/UFSC e Professor da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e Missões, URIntiago,e
da Universidade Regional da
Campanha, URCAMP Cam
pus de São Borja. E–mail:
[email protected];
The general aim of this research is to verify the
relationship between organizational culture and
competitive strategy in the management of car
** Professor do curso de
concessionary stores in Santa Maria(RS). Car
Mestrado em Administração
concessionary stores are inserted in the large context of
da FECAP e da UNINOVE.
the automobile industry, which has been object of
[email protected]
several studies as from the North-American and
European automobile factories, mainly. The research
method was predominantly qualitative through the study
of multicases. It was accorded that the research was
descriptive and non-experimental. The population of the
present research is formed by holders, managers and
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
INTRODUÇÃO
As mudanças fazem parte do mundo das pessoas e organizações. Neste ambiente, as
organizações são chamadas a transformações e adaptações, a fim de sobreviverem no
ambiente. Sendo assim, manter-se passivo e só mudar quando os problemas ocorrem é
contribuir para o insucesso nos negócios, através de decisões precipitadas e equivocadas.
O dia-a-dia dos dirigentes das organizações é marcado pela tomada de decisões, que
podem gerar conseqüências diversas conforme o contexto de cada organização. Tais decisões
deveriam partir de uma visão ampla do ambiente, considerando as características sociais,
culturais e políticas deste. Em meio a um ambiente em que a concorrência aumenta e se
qualifica a cada dia, torna-se imprescindível a necessidade de desenvolver empreendimentos
com estratégias competitivas adaptadas às necessidades do mercado.
As concessionárias de automóveis inserem-se no grande contexto da indústria
automobilística. Ela tem sido objeto de vários estudos, a partir das montadoras de automóveis
norte-americanas, japonesas e européias, principalmente. O presente trabalho visa buscar
informações sobre uma realidade ainda pouco conhecida, uma vez que as fábricas de
automóveis são provenientes de outros países com culturas e estratégias diferenciadas.
Assim, há a preocupação em analisar nas empresas da metade sul do Estado do Rio
Grande do Sul, em especial nas concessionárias de automóveis de Santa Maria, a cultura
organizacional que orienta as estratégias explícitas e/ou implícitas nas concessionárias de
automóveis em sua busca por competitividade. A contribuição esperada é a de possibilitar
estabelecer novos rumos no caminho do crescimento das organizações estudadas, bem como
demonstrar o papel significativo da cultura nas estratégias empresariais.
2
CULTURA ORGANIZACIONAL E ESTRATÉGIA COMPETITIVA NAS
ORGANIZAÇÕES
O trabalho está fundamentado na literatura de administração existente sobre as
relações entre cultura organizacional e estratégia competitiva numa gestão sistêmica. A
fundamentação teórica aborda, inicialmente, os principais aspectos relativos a
competitividade, estratégia competitiva e vantagem competitiva, fazendo uma análise a
respeito de estratégia e competitividade.
2.1 Competitividade
O termo competitividade é amplamente empregado nas organizações, requerendo uma
análise sobre o mesmo. Cada autor enfatiza um determinado aspecto, mostrando conceito
singular sobre competitividade. No Chambers English Dictionary apud Barbosa (1999),
competitividade tem relação com/ou caracteriza-se por competição e associa o termo a
rivalidade. Esta definição não caracteriza a abrangência da rivalidade, Barbosa (1999, p.23)
conclui que “uma empresa é competitiva quando ela é capaz de oferecer produtos e serviços
de qualidade maior, custos menores, e tornar os consumidores mais satisfeitos do que quando
servidos por rivais”.
A análise da competitividade implicitamente também supõe o conflito além da
rivalidade. Machado-da-Silva e Fonseca (1999, p.29) dizem que competitividade é definida
pela “habilidade da organização em fabricar produtos melhores do que seus concorrentes, de
acordo com os limites impostos por sua capacitação tecnológica, gerencial, financeira e
comercial”.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
21
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Hamel e Prahalad (1995, p.26) expõem o que é preciso para chegar primeiro ao futuro,
salientando "a compreensão de que a competição pelo futuro é uma competição diferente".
Mencionam, ainda, que “a competição pelo futuro é uma competição pela criação e domínio
das oportunidades emergentes – pela posse do novo espaço competitivo. Criar o futuro é um
desafio maior do que acompanhá-lo, para o qual é preciso criar seu próprio mapa”. Muitas
empresas ficam presas ao imediatismo e deixam de visualizar o futuro, perspectivas de
negócios. Hamel e Prahalad (1995, p.36), afirmam que a competição pelo futuro é uma
competição pela participação nas oportunidades, e não pela participação no mercado, é uma
busca pela maior participação nas oportunidades futuras potencialmente disponíveis à
empresa dentro de uma ampla arena de oportunidades, sejam sistemas de informações a
domicílio, drogas fabricadas, pela engenharia genética, serviços financeiros, materiais,
avançados ou quaisquer outras.
Os estudos de Bucley, Pass e Prescott (1988, p.175) oferecem uma contribuição ao
agrupar em três grandes categorias os elementos-chave em torno de competitividade ao
propor os 3 Ps: performance (desempenho competitivo); potencial competitivo e processo
gerencial. Para os autores, o desempenho competitivo descreve estágios diferentes no
processo competitivo; o potencial delineia as entradas dentro da operação em termos de
tecnologia, produtividade, acesso a recursos, vantagens comparativas e outros; e o processo
gerencial diz respeito a itens como políticas governamentais, comprometimento com negócios
internacionais e educação e treinamento.
2.2 Estratégia Competitiva
A estratégia é um processo combinatório de diversas abordagens, de diferentes escolas
do pensamento ou linhas do pensamento, conforme apresenta Mintzberg (2000, p.13): escola
do Design, do Planejamento, do Posicionamento, a Empreendedora, a Cognitiva, a do
Aprendizado, a do Poder, a Cultural , a do Ambiental e a de Configuração. É através da
estratégia que a empresa irá se posicionar na tomada de decisões, quanto a corporação e a
competitividade, ou seja, como fará o direcionamento da organização, a fim de agir diante das
ameaças da concorrência.
Segundo Porter (1986, p.22), passa primeiramente pela identificação das
características estruturais básicas das indústrias que determinam o conjunto das forças
competitivas e, portanto, a rentabilidade da indústria. O autor relata que são cinco as forças
competitivas que dirigem a concorrência na indústria e determinam a lucratividade da
organização: entrada, ameaça de substituição, poder de negociação dos compradores, poder de
negociação dos fornecedores e rivalidade entre os atuais fornecedores. Estas então são as
forças determinantes em uma concorrência industrial, desta forma verifica-se que a
concorrência não está limitada aos participantes estabelecidos. O estudo destas forças
competitivas facilita a elaboração de uma estratégia competitiva tanto ofensiva como
defensiva dentro de um contexto industrial.
As organizações, de acordo com Porter (1986, p.50), podem contar com três
abordagens estratégicas genéricas para enfrentar as cinco forças competitivas e serem bem
sucedidas. Segundo ele, as três estratégias genéricas são liderança no custo total,
diferenciação e enfoque. No entendimento do autor, a liderança no custo exige a construção
agressiva de instalações em escala eficiente, uma perseguição vigorosa de reduções de custo
pela experiência, um controle rígido do custo e das despesas gerais, que não seja permitida a
formação de contas marginais dos clientes, e a minimização do custo em áreas como pesquisa
e desenvolvimento, assistência, força de vendas, publicidade, etc. Intensa atenção
administrativa ao controle dos custos é necessária para atingir estas metas.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
22
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Porter (1992, p. 23) apresenta como a empresa pode escolher e implementar uma
estratégia genérica, a fim de obter e sustentar uma vantagem competitiva. De acordo com o
autor, “o instrumento básico para diagnosticar a vantagem competitiva e encontrar maneiras
de intensificá-la é a cadeia de valores”. O autor esclarece que “o valor é medido pela receita
total, reflexo de preço que o produto de uma empresa impõe e as unidades que ela pode
vender”. A empresa é rentável quando o valor que ela impõe ultrapassa os custos envolvidos
na criação do produto. A meta da estratégia genérica é criar valor para os compradores que
exceda o custo e o autor afirma que é o valor e não o custo que deve ser usado na análise da
posição competitiva. Na sua proposta, a cadeia de valores exibe o valor total o qual consiste
em margem e atividades de valor.
As atividades da cadeia de valor de Porter (1992, p. 34) compreendem “atividades
física e tecnologicamente distintas, através das quais uma empresa cria um produto valioso
para os seus compradores”. As atividades são divididas em primárias (logística interna,
operações, logística externa, marketing e vendas, serviços) e atividades de apoio (infraestrutura da empresa, recursos humanos, tecnologia, aquisição - função de compra de
insumos). A margem a que se refere o autor consiste na diferença entre o valor total e o custo
coletivo da execução das atividades de valor.
2.3
Cultura organizacional
As organizações estão inseridas dentro de um ambiente e interagem com este ambiente
recebendo influências e influenciando-o. As pessoas que atuam nas organizações são agentes
que contribuem para esse intercâmbio constante. Os valores das pessoas por sua vez
conduzem à formação da cultura da organização. Essa é a raiz das decisões estratégicas de
uma organização. Hall (1982) cita que uma das condições do ambiente externo de importância
vital e mais difícil de medir é a cultura e acrescenta: em seu impacto sobre as organizações, a
cultura não é uma constante, nem mesmo num contexto isolado.
Mintzberg et alii (2000) menciona que a cultura foi descoberta em administração nos
anos 80, graças ao sucesso das corporações japonesas. No entendimento de Schein apud
Fleury et al. (1996, p.20):
“cultura organizacional é o conjunto de pressupostos básicos que um grupo
inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com os
problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem
o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros
como a forma correta de perceber, pensar e sentir, em relação a esses
problemas”.
Para Srour (1998, p.175), nas organizações, a cultura impregna todas as práticas e
constitui um conjunto preciso de representações mentais, um complexo muito definido de
saberes. Srour (1998), aborda que esses são reflexos de representações mentais, cujas
manifestações, na concepção do autor:
“assumem formas variadas: princípios, valores e códigos; conhecimentos,
técnicas e expressões estéticas; tabus, crenças e pré-noções; estilos, juízos
e normas morais; tradições, usos e costumes; convenções sociais,
protocolos e regras de etiqueta; estereótipos, clichês e motes;
preconceitos, dogmas e axiomas; imagens, mitos e lendas; dogmas,
superstições e fetiches”. (p.168)
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
23
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Srour (1998, p.173) identifica quatro campos de saber para análise da cultura nas
organizações:
ƒ
ƒ
ƒ
ƒ
Saber ideológico – evidências doutrinárias, não-demonstráveis, retóricas;
Saber científico – evidências explicativas, demonstráveis, ‘know-why’;
Saber artístico – expressões estéticas;
Saber técnico – procedimentos, regras operatórias, ‘know-how’.
Srour (1998) trata sobre cultura organizacional expressando que:
“a cultura é aprendida, transmitida e partilhada. Não decorre de uma
herança biológica ou genética, porém resulta de uma aprendizagem
socialmente condicionada. A cultura organizacional exprime então a
identidade da organização. É construída ao longo do tempo e serve de
chave para distinguir diferentes coletividades”. (p.174)
Para Daft (1999, p. 244), “a cultura de uma organização geralmente começa com um
fundador ou um líder pioneiro que articula e implanta idéias e valores particulares como
visão, uma filosofia ou uma estratégia comercial”. Além de expor como surge a cultura, Daft
(1999), cita duas funções decisivas da cultura nas organizações: integração interna e
adaptação externa.
A cultura tem papel importante na organização e a questão que Shermerhorn Jr. et alii
(1999, p.198) ajuda a resolver como descobrir a cultura. Eles mostram três níveis de análise
da cultura das organizações: “cultura observável, valores compartilhados e suposições
comuns”.
Para Mintzberg et al. (2000, p.195), a força da cultura na gestão empresarial é clara. A
cultura organizacional passa a ser a mente da organização, as crenças comuns que se refletem
nas tradições e nos hábitos, bem como em manifestações mais tangíveis – histórias, símbolos,
ou mesmo edifícios e produtos; em certo sentido, a cultura representa a força vital da
organização, a alma de seu corpo físico. Para o autor, a força de uma cultura pode ser
proporcional ao grau até o qual ela ilude a consciência.
A cultura organizacional não existiria sem as pessoas. Neste sentido, ao abordar sobre
cultura é válido mencionar como as pessoas estão estruturadas nas organizações. Segundo
Mintzberg (1995, p.20), as cinco partes das organizações seriam: núcleo operacional, cúpula
estratégica, linha intermediária, tecnoestrutura e assessoria de apoio.
Os autores citados apresentaram o significado da cultura presente nas organizações. A
proposta deste trabalho é justamente verificar a cultura organizacional e sua relação com
estratégia nas concessionárias de automóveis de Santa Maria, uma vez que as empresas
possuem uma cultura local forte e há a necessidade de conviver com orientações de culturas
de outros países. Na seqüência, são feitas algumas considerações sobre o setor de serviços
uma vez que as concessionárias participam do canal de distribuição, atuando, também como
prestadoras de serviços em certo sentido.
3
METODOLOGIA
O método predominante no presente trabalho teve o enfoque fenomenológicohermenêutico e o método sistêmico. Neste sentido foram analisados aspectos internos de cada
concessionária estudando e comparando uma concessionária com outra. O presente trabalho
investigou a relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva na administração de
concessionárias de automóveis na busca de competitividade no mercado. Desta forma,
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
24
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
formulou-se a seguinte questão de pesquisa: “Qual a relação entre cultura organizacional e
estratégia competitiva na administração de concessionárias de automóveis de Santa Maria?”
Especificamente, essa pergunta pode ser dividida em qautro questões de pesquisa
conforme relacionado a seguir:
a) Que saberes constituem a cultura organizacional que impregna as práticas das
concessionárias de Santa Maria?
b) Quais são as estratégias competitivas praticadas pelas concessionárias de automóveis de
Santa Maria?
c) Que vantagens competitivas são utilizadas pelas concessionárias de automóveis?
d) Quais forças ou estratégias competitivas dirigem a concorrência entre as concessionárias
de automóveis de Santa Maria?
As concessionárias de automóveis de Santa Maria (RS) foram escolhidas observandose os seguintes critérios: marca, serviços oferecidos, nacionalidade, período de existência,
número de funcionários. Foram alvo da pesquisa as concessionárias com, no mínimo, 10 anos
de atuação no mercado, com registro junto à Fenabrave.
O convite às concessionárias foi feito através de correspondência, endereçada às
concessionárias Superauto, revendedora da marca Ford; Sul Veículos, revendedora da marca
Fiat; Uglione S/A, revendedora GM, e Pampeiro, revendedora da marca Volkswagen. Cabe
destacar que um aspecto que contribuiu para a escolha das concessionárias foi a importância
das mesmas em função da produção de automóveis no Brasil. Dos convidados a participar do
estudo responderam positivamente as concessionárias Superauto com 16 anos de atuação no
mercado; Sul Veículos com 25 anos de atuação e Uglione com 62 anos de mercado.
Foram atribuídos nomes fantasia às concessionárias participantes, a fim de preservar o
sigilo das informações. Assim, as concessionárias citadas foram denominadas, para fins da
presente pesquisa de Kapa, Sigma e Epsilon. Quanto à população, aplicou-se o questionário
de pesquisa ao total de funcionários de cada organização. Na Sigma foram 86 pessoas
entrevistadas, na Kapa 50 e na Epsilon 115 pessoas pesquisadas.
A pesquisa foi predominantemente qualitativa pelo estudo de multicasos, sendo que
alguns dados serão obtidos por métodos quantitativos. Entende-se que a pesquisa será
descritiva e não-experimental. Para Triviños (1987, p.136) “sem necessidade de perseguir
objetivos de natureza comparativa, o pesquisador pode ter a possibilidade de estudar dois ou
mais sujeitos, organizações etc. e trata-se então de estudos de multicasos”. A pesquisa
analisará a evolução das concessionárias, a formação de sua cultura e estratégias adotadas.
Para que os objetivos sejam alcançados, segundo Lakatos (1992), serão utilizadas a
observação direta intensiva e a observação direta extensiva.
O questionário foi composto de dados de identificação, seguido de 39 questões
fechadas e 3 questões abertas. Para responder às questões foi elaborada uma escala que vai de
1 até 5, onde 1 representa a afirmativa discordo totalmente, 2 representa discordo, 3
representa indiferente, 4 representa concordo e 5 representa concordo plenamente.
O propósito era que os integrantes da concessionária manifestassem sua posição com
relação à variável apresentada, a fim de que fosse possível mensurar a intensidade daquela
variável na concessionária, entre todos os integrantes da concessionária. Posteriormente,
realizou-se análise da relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva. Os dados
da pesquisa qualitativa, segundo Triviños (1987, p. 173) serão apoiados por três aspectos
fundamentais: a) nos resultados alcançados no estudo; b) na fundamentação teórica e c) na
experiência pessoal do investigador.
4
ANÁLISE DOS RESULTADOS NA CONCESSIONÁRIA SIGMA
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
25
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
A Sigma está localizada em Santa Maria, Estado do Rio Grande do Sul, atuando no
mercado local e regional. É uma empresa considerada familiar. Segundo sua direção, embora
possua 5 (cinco) áreas básicas: administrativo-financeiro, vendas de veículos novos, vendas
de veículos usados, serviços de oficina e loja de autopeças, está organizada em células. Os
produtos da empresa são: carros novos, carros usados, peças, serviços de oficina e funilaria.
O processo decisório ocorre por meio de reuniões semanais entre direção e
coordenadores das células. Uma outra área que existe na empresa, sediada no mesmo prédio é
o consórcio. Cabe salientar que a empresa no momento da pesquisa não possuía um
departamento de recursos humanos ou pessoa encarregada da função. A Sigma conta com um
quadro de 86 funcionários.
4.1 Perfil do pessoal
A Sigma possui 85,2% de pessoas no Núcleo Operacional, 11,5% na linha
intermediária e apenas 3,3% na Cúpula Estratégica. Desta equipe, 67% possui até 5 anos de
empresa, 15% possui de 11 a 15 anos de empresa e 13% de 6 a 10 anos de empresa. Quanto a
faixa etária 51% possuem acima de 30 anos e 47% estão na faixa de 18 a 30 anos.
Pode-se constatar que a Sigma possui uma equipe na maioria formada por adultos,
com experiência de vida e alocada no núcleo operacional. Existem poucos diretores, gerentes,
supervisores.
4.2 Estratégia competitiva
O Quadro 1 mostra a seguir os principais aspectos relacionados à análise da estratégia
competitiva.
Quadro 1 - Estratégia Competitiva na Concessionária Sigma.
ESTRATÉGIA COMPETITIVA
NR 1 2 3
Metas gerais
02 00 10 03
Orientações transmitidas no trabalho
02 02 07 15
Orientações que circulam no trabalho
02 03 28 26
Objetivos transmitidos
05 03 16 11
Formação dos objetivos
05 02 10 13
Adequação dos objetivos à sociedade
03 02 10 13
Adequação dos objetivos aos interesses da sociedade
- 00 10 16
Objetivos comparados com outras concessionárias
- 00 13 20
Flexibilidade dos objetivos
- 00 03 05
Compreensão dos objetivos pelos funcionários
02 02 30 16
Relacionamento entre linha intermediária e núcleo - 07 21 15
operacional
Capacitação da linha intermediária
- 00 16 07
Existência de objetivos
03 23 33 11
Integração microambiental
- 08 31 23
Integração macro ambiental
- 02 18 21
Informações da concorrência
- 07 18 16
Ameaças e oportunidades
- 03 08 13
Fortes e fracos da concorrência
- 03 13 21
Expectativas anteriores
- 02 15 41
4
57
66
34
54
57
56
67
46
69
38
43
5
28
10
07
10
13
16
07
21
23
13
15
54
25
28
44
46
66
49
39
23
05
10
15
13
10
13
03
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
26
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Escolhas estratégicas
- 05 13 23 51 08
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente;
4, Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos (%).
Pode-se verificar que não estão claras as estratégias implícitas ou explícitas e que
ocorre o predomínio dos interesses individuais aos corporativos. E, ainda verifica-se que as
decisões estratégicas são tomadas com base no que acontece no meio ambiente, possuindo
informações sobre pontos fortes e fracos, limitações e capacidades da concorrência. Porém em
muitos momentos há uma indiferença ao que acontece no ambiente ou se quer é considerado.
Ao referir-se ao atendimento como principal estratégia competitiva da empresa, há
evidências que a estratégia seja de enfoque. No entanto, o atendimento citado deixa de
considerar um alvo determinado e políticas funcionais que levem isso em conta. Uma outra
estratégia mais citada é bons produtos e serviços, o que evidencia a existência de uma
estratégia de diferenciação. Desta forma, a Sigma possui mais de uma estratégia que, segundo
Porter (1986, p.55) caracteriza uma situação estratégica extremamente pobre.
4.3 Vantagem competitiva
As vantagens de uma empresa podem resultar de diversas atividades de valor para a
mesma. A análise das vantagens competitivas foi feita com base nas atividades primárias
(logística interna, operações, logística externa, marketing e vendas, serviços) e atividades de
apoio (infra-estrutura, gerência de recursos humanos, desenvolvimento de tecnologia e
aquisição). Constatou-se assim que, com relação às atividades primárias, a principal vantagem
competitiva da empresa está nas operações de serviço ao consumidor: vendas, consórcio, e
oficina. Após, destacam-se busca de qualidade superior de produtos e serviços e a logística.
Das atividades de apoio para vantagem competitiva, destacam-se busca de custos
competitivos e infra-estrutura, seguidos pela tecnologia. Portanto, pode-se observar no
Quadro 2 que a vantagem competitiva genérica está relacionada a operações, infra-estrutura e
custos competitivos.
Quadro 2 - Vantagem Competitiva na Concessionária Sigma.
2
4
VANTAGEM COMPETITIVA
NR
1
3
5
Logística interna
00
11
13
40
36
Valor das operações de serviços
00
02
02
47
49
Logística externa
00
15
07
51
28
Padrão de qualidade
02
00
03
07
51
38
Formação de preços
02
02
21
21
39
15
Valor agregado
02
15
23
42
18
Custos competitivos
00
08
10
56
26
Desenvolvimento tecnológico
02
13
10
44
31
Desenvolvimento das pessoas
02
16
25
08
34
15
Infra-estrutura
02
02
10
70
16
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente; 4, Concordo e
5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos (%).
4.4 Cultura organizacional
Com relação à cultura organizacional o Quadro 3 mostra os principais aspectos
mencionados pelos entrevistados da Concessionária Sigma.
A análise da cultura organizacional é feita, em sua dimensão simbólica, com base em
quatro campos de saber. São analisados os saberes: ideológico, científico, artístico e técnico.
Verifica-se com relação à cultura organizacional que existe concordância com relação
a missão da empresa, comunicação interna, integração e interação interna. O dia-a-dia dos
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
27
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
funcionários é marcado por reuniões e há uma preocupação em executar as tarefas da melhor
maneira possível. A empresa investe em treinamento e qualificação de pessoal. Os
entrevistados entendem que a empresa não possui liderança autoritária. Porém eles
desconhecem os princípios, valores e códigos da empresa, bem como, dizem que faltam
atividades de lazer e entretenimento, prêmios de incentivo e estímulo à criatividade. Percebese a tendência a estimular o saber ideológico, científico e técnico, e não contemplar o saber
artístico.
Quadro 3 - Cultura Organizacional na Concessionária Sigma.
CULTURA ORGANIZACIONAL
NR
1
2
3
4
5
Missão
02
08
28
10
38
14
Treinamento
03
08
31
13
31
13
Liderança
02
20
10
25
34
10
Responsabilidade pelos resultados
05
11
16
44
23
Comunicação interna
03
31
13
41
11
Lazer e entretenimento
02
05
00
31
48
15
Criatividade
02
38
11
08
26
15
Prêmios
02
23
08
28
30
10
“Know how”
03
15
08
23
38
13
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente; 4,
Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos
(%).
Segundo os entrevistados, reuniões diversas foi citado como fato mais freqüente.
Após, estão falta de peças, treinamento e falta de comunicação interna e em terceiro lugar a
substituição de pessoas antigas e demissões. Quanto à contribuição pessoal para a empresa
crescer no mercado: executar minha responsabilidade da melhor forma possível, vender e
aperfeiçoamento pessoal foram citados como as três maiores contribuições.
4.5 Análise da relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva
Iniciar e manter uma empresa requer a compreensão perfeita de conhecimentos que
capacitem o interessado a obter sucesso. Observa-se que as pessoas têm relativamente pouco
tempo de empresa, a maioria até cinco anos.
As estratégias para a empresa competir no mercado não são bem compreendidas pela
equipe. As atividades na empresa são desenvolvidas de forma empírica embora, exista uma
preocupação através de reuniões em qualificar as pessoas. Pode-se constatar que há falhas em
áreas essenciais da empresa como motivação geral dos funcionários. A integração e interação
que existem é em função dos laços profissionais e obrigações. Predominam superficialidade e
interesses individuais aos interesses corporativos. As intenções e objetivos que existem são
alcançados mediante um clima de constrangimento e ameaça. Há concentração na orientação
para a venda em detrimento da real satisfação dos clientes internos e externos. Predomina a
preocupação com assuntos internos, relacionados ao aproveitamento de oportunidades de
crescimento e melhorias. Internamente, a empresa procura aperfeiçoar-se, porém deixa de
construir um futuro de sucesso.
5 ANÁLISE DOS RESULTADOS NA CONCESSIONÁRIA KAPA
A Concessionária Kapa, localizada em Santa Maria (RS) atua no mercado há mais de 25
anos. O principal mercado da empresa é Santa Maria, tendo em vista que em cidades distantes
150 km já existem concessionárias concorrentes na mesma marca. Salienta-se que, as
informações sobre esta concessionária foram obtidas através de entrevistas com os gerentes da
empresa, através de encaminhamento do diretor geral. Este fato é relatado porque as
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
28
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
entrevistas com a direção da empresa limitaram–se a três, embora tenham respondido
positivamente à realização do trabalho.
É uma empresa considerada familiar, sendo que os principais cargos e decisões da
empresa estão centralizados na própria família. A empresa possui três diretorias:
administrativo, financeiro e compras e cinco gerências: administrativo, financeiro, vendas,
oficina e peças que são organizados em departamentos. Os produtos e serviços da empresa
são: carros novos, carros usados, peças, serviços de oficina e funilaria. O consórcio não é
próprio. A Concessionária Kapa conta com um quadro de 50 funcionários.
5.1 Perfil do pessoal
Na concessionária Kapa 80% está no núcleo operacional, 18% na linha intermediária e
2% na cúpula estratégica. O tempo de empresa das pessoas é de até 5 anos em 50% dos casos,
39% estão na empresa de 6 a 10 anos e 9% há mais de 10 anos. Nesta concessionária, em 50%
dos casos estão pessoas com idade superior a 30 anos e 39% possuem menos de 30 anos.
A maioria está no núcleo operacional e predominam pessoas com maior tempo de
empresa. Isto é, quase a metade da empresa é constituída por pessoas com mais de 10 anos de
vínculo funcional. Supõe-se que este perfil contribua para a concessionária ter uma cultura
forte, que facilita a implementação de estratégias.
5.2 Estratégia competitiva
No Quadro 4 estão os resultados obtidos com o questionário relativo à estratégia
competitiva da Concessionária Kapa.
Quadro 4 - Estratégia Competitiva na Concessionária Kapa.
ESTRATÉGIA COMPETITIVA
NR
Metas gerais
Orientações transmitidas no trabalho
Orientações que circulam no trabalho
Objetivos transmitidos
Formação dos objetivos
02
Adequação dos objetivos à sociedade
Adequação dos objetivos aos interesses da sociedade
02
Objetivos comparados com outras concessionárias
Flexibilidade dos objetivos
02
Compreensão dos objetivos pelos funcionários
Relacionamento entre linha intermediária e núcleo operacional
Capacitação da linha intermediária
Existência de objetivos
02
Integração microambiental
05
Integração macro ambiental
02
Informações da concorrência
02
Ameaças e oportunidades
02
Fortes e fracos da concorrência
02
Expectativas anteriores
02
Escolhas estratégicas
02
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3,
Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos (%).
1
2
02 45
07 18
09 32
07 18
05 16
07 32
05 25
07 34
07 16
09 34
11 23
07 32
20 52
11 39
09 14
02 14
00 14
05 09
09 11
02 14
Indiferente;
3
4
5
07 36 09
14 52 09
11 39 09
20 45 09
14 52 11
16 43 02
30 34 05
14 43 02
11 57 07
09 43 05
14 48 05
07 45 09
14 09 02
18 23 05
25 36 14
20 57 05
18 61 05
14 68 02
43 27 07
27 45 09
4, Concordo e 5,
As metas não são mutuamente alcançáveis e nem as políticas operacionais básicas se
reforçam mutuamente. Não obstante, as políticas operacionais básicas se dirigem às metas.
Esta análise evidencia inconsistência interna, que também foi verificado na Sigma.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
29
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Ao referir-se ao atendimento e promoções como principal estratégia competitiva da
empresa, há evidências que a estratégia seja enfoque e diferenciação. Desta forma, a
Concessionária Kapa possui mais de uma estratégia, que, segundo Porter (1986, p. 55),
caracteriza uma empresa “em uma situação estratégica extremamente pobre”. No entanto, tal
como a Concessionária Sigma, não está explícito o alvo determinado e nem políticas
funcionais.
5.3 Vantagem competitiva
O Quadro 5 mostra os principais aspectos relacionados à vantagem competitiva.
Quadro 5 - Vantagem Competitiva na Concessionária Kapa.
2
4
VANTAGEM COMPETITIVA
NR
1
3
5
Logística interna
02
00
14
09
52
23
Valor das operações de serviços
02
00
05
07
48
39
Logística externa
02
00
07
18
50
23
Padrão de qualidade
02
05
09
20
50
14
Formação de preços
02
05
07
16
57
14
Valor agregado
02
00
07
25
57
09
Custos competitivos
02
02
05
18
57
16
Desenvolvimento tecnológico
02
02
18
07
61
09
Desenvolvimento das pessoas
05
14
27
07
41
07
Infra-estrutura
02
07
14
07
57
14
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente; 4, Concordo e
5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos (%).
As vantagens de uma empresa podem resultar de diversas atividades de valor para a
mesma. A análise das vantagens competitivas da Concessionária Kapa foi feita com base nas
atividades primárias (logística interna, operações, logística externa, marketing e vendas,
serviços) e atividades de apoio (infra-estrutura, gerência de recursos humanos,
desenvolvimento de tecnologia e aquisição).Verifica-se, com relação às atividades primárias,
que as vantagens competitivas com porcentagens altamente significativas são as operações de
serviços e as atividades de logística, seguidos da preocupação em possuir preços baixos e
produtos de qualidade superior.
Comparando estes resultados com a Concessionária Sigma, observa-se que a situação
é semelhante com relação aos itens mencionados, ocorrendo uma diferença com relação ao
valor agregado. Na Kapa, há a preocupação de 66%, em agregar valor, enquanto que na
Sigma, é 60%.
Portanto, com relação às atividades de apoio para vantagem competitiva, destacam-se
a busca de custos competitivos e infra-estrutura, seguidos da tecnologia. A preocupação com
o desenvolvimento de recursos humanos não é destaque. Esta situação é semelhante a da
Sigma, em termos relativos. Isto significa que nas concessionárias citadas, por mais que os
entrevistados citem o atendimento como principal estratégia, elas ainda estão com o olhar
mais para dentro da empresa do que para o ambiente.
5.4 Cultura organizacional
A análise da cultura organizacional é feita, em sua dimensão simbólica, com base em
quatro campos de saber. São analisados: saber ideológico (missão, princípios, valores e
códigos, liderança) saber científico (comunicação interna e treinamento) saber artístico (lazer,
entretenimento, criatividade, prêmios) e saber técnico (fatos e acontecimentos que se repetem,
contribuição pessoal).
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
30
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
No Quadro 6 a seguir apresentam-se os principais aspectos relacionados à análise da
cultura organizacional na concessionária Kapa.
No tocante à cultura organizacional, observa-se que há um estímulo aos saberes
ideológicos quanto aos valores, princípios e códigos, mediante uma liderança autoritária. A
empresa investe em treinamento. Os entrevistados concordam que há uma boa comunicação
interna e integração, embora conflitos internos sejam apontados como um dos fatos que mais
se repetem. Os saberes científicos e técnicos são estimulados, porém os saberes artísticos são
esquecidos ou menos desenvolvidos.
Quadro 6 - Cultura Organizacional na Concessionária Kapa.
CULTURA ORGANIZACIONAL
Missão
Treinamento
Liderança
Responsabilidade pelos resultados
Comunicação interna
Lazer e entretenimento
Criatividade
Prêmios
“Know how”
NR
02
05
02
02
02
02
02
02
02
1
09
07
16
05
09
27
16
23
27
2
32
14
32
14
18
52
41
34
55
3
20
18
23
18
18
11
16
07
05
4
25
43
18
50
45
05
18
32
09
5
11
14
09
11
07
02
07
02
02
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente; 4,
Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos
(%).
Na questão sobre os fatos e acontecimentos que se repetem na empresa
periodicamente, conflitos interno e oscilação nas vendas foram citados como os mais
freqüentes. Após, estão reuniões, falta de peças, pressão interna e externa e o retorno de
veículo na oficina. Quanto à contribuição pessoal para a empresa crescer no mercado, o
aperfeiçoamento no trabalho foi citado como a maior contribuição seguido da disponibilidade
funcional e qualidade. Empatados em terceiro lugar entre as maiores contribuições estão o
trabalho, atendimento, executar minha responsabilidade da melhor forma possível, seriedade e
responsabilidade.
5.5
Análise da relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva.
Observa-se em uma análise geral, que a Concessionária Kapa apresenta evidências de
uma empresa fechada e reservada, com uma liderança autoritária e pouco aberta à
participação. A empresa não possui uma missão definida, havendo desconhecimento quanto
aos rumos futuros da empresa e incertezas. Neste cenário, a empresa faz o necessário para
manter-se no mercado mesmo desconhecendo-o e o ignorando em suas decisões.
Um aspecto que deve ser salientado com relação a Concessionária Kapa refere-se ao
know-how de sua equipe, que não é devidamente aproveitado, pois, segundo os funcionários,
não há concursos de premiações dos melhores. E a predominância de uma liderança
autoritária que inibe e desestimula a criatividade, deixando de haver o desenvolvimento das
pessoas. Por sua vez as estratégias são pobres conforme a análise feita anteriormente com
base em Porter (1986).
Até aqui, os dados permitem crer que a declaração feita na Concessionária Sigma, que
as concessionárias “estão falidas”, tem evidências de ser possível. Os resultados negativos são
possíveis uma vez que as empresas tenham estratégias pobres e uma cultura organizacional
pobre. Na seqüência apresenta-se a análise da pesquisa realizada na Concessionária Épsilon,
seguido de uma comparação das três empresas.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
31
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
6.
ANÁLISE DOS RESULTADOS NA CONCESSIONÁRIA EPSILON
A Concessionária Epsilon está localizada em Santa Maria (RS). É uma empresa
considerada familiar, porém em suas gerências não há predomínio de familiares diretos. Está
estruturada em diretoria administrativa e diretoria comercial. As gerências são de serviços,
financeira, administrativo/contábil, vendas e peças com seus respectivos departamentos. Os
produtos e serviços da empresa são: carros novos, carros usados, peças, serviços de oficina,
funilaria e consórcio. A Concessionária Epsilon conta com um quadro de 115 funcionários.
Na Epsilon, 81% dos funcionários está no núcleo operacional, 18% na linha
intermediária e 1% na cúpula estratégica. O tempo de empresa de 78% das pessoas é de até 5
anos, 12% está na empresa de 6 a 10 anos, e apenas 6% está na empresa mais de 20 anos. A
faixa etária dos funcionários é superior a 30 anos em 51% dos casos, 26% possui de 21 a 25
anos e 18% de 26 a 30 anos.
6.1 Perfil do pessoal
A maioria está no núcleo operacional e existe um número maior de diretores e
gerentes, supervisores em relação às outras concessionárias. A maioria dos funcionários
possui até 5 anos de empresa, tendo a Concessionária Epsilon um número maior de
funcionários novos dentro da empresa em relação às demais. Este fato facilita a
concessionária ter uma cultura organizacional frágil e com dificuldades de implementação de
suas estratégias, o que pode ser amenizado pela suposta maturidade dos mesmos em função da
maioria dos funcionários tem idade superior a 30 anos.
6.2 Estratégia competitiva
Na Concessionária Epsilon, as metas são mutuamente alcançáveis, as políticas
operacionais básicas se reforçam mutuamente e as políticas operacionais básicas se dirigem às
metas. Esta análise evidencia consistência interna na referida empresa, o que não foi
verificado nas outras concessionárias em estudo. Salienta-se também que a consistência pode
ser considerada elevada em relação às demais concessionárias.
Ao referir-se às principais estratégias competitivas da concessionária, o atendimento
ficou em primeiro lugar, satisfação do cliente em segundo lugar e no terceiro lugar foi citado
fidelizar o cliente. Há evidências, como nas demais concessionárias, que a estratégia seja
predominantemente de enfoque. Conseqüentemente, possui tendência à concentração em
apenas uma estratégia, o que pode ser considerado que está em melhores condições quanto a
estratégias competitivas que as demais concessionárias estudadas. No entanto, estas condições
são limitadas pelo desconhecimento, por parte dos entrevistados, das metas da empresa, de
um alvo determinado e políticas funcionais.
No Quadro 7 estão as questões relativas às questões de estratégia competitiva
6.3 Vantagem competitiva
As vantagens de uma empresa podem resultar de diversas atividades de valor para a
mesma. A análise das vantagens competitivas, feita com base nas atividades primárias
(logística interna, operações, logística externa, marketing e vendas, serviços) e atividades de
apoio (infra-estrutura, gerência de recursos humanos, desenvolvimento de tecnologia e
aquisição). Verifica-se com relação às atividades primárias que as vantagens competitivas que
apresentam porcentagens significativas são relacionadas à logística interna, operações de
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
32
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
serviços e produtos e serviços de qualidade superior, seguidos de logística, valor agregado e
preços. O Quadro 8 apresenta os principais resultados sobre a vantagem competitiva.
Esta situação é diferente da que ocorre na Kapa e na Sigma, que possuem semelhanças
quanto às vantagens competitivas. Portanto, com relação às atividades de apoio como
vantagem competitiva, pode-se afirmar que a infra-estrutura e tecnologia destacam-se
seguidos da preocupação com o custo e desenvolvimento de pessoal. O que chama a atenção é
que a principal diferença desta concessionária para com a Kapa e Sigma está na preocupação
de desenvolver seus recursos humanos.
Quadro 7 - Estratégia Competitiva na Concessionária Epsilon.
2
4
ESTRATÉGIA COMPETITIVA
NR 1
3
5
Metas gerais
01 01 03 45 50
Orientações transmitidas no trabalho
- 01 01 03 64 31
Orientações que circulam no trabalho
03 01 12 22 36 26
Objetivos transmitidos
- 01 05 05 55 32
Formação dos objetivos
- 00 04 08 66 22
Adequação dos objetivos à sociedade
- 00 00 07 61 32
Adequação dos objetivos aos interesses da sociedade
04 00 03 07 59 27
Objetivos comparados com outras concessionárias
- 01 01 03 50 45
Flexibilidade dos objetivos
- 00 00 03 50 47
Compreensão dos objetivos pelos funcionários
- 01 01 07 51 40
Relacionamento entre linha intermediária e núcleo - 00 04 09 61 26
operacional
Capacitação da linha intermediária
03 00 04 12 58 23
Existência de objetivos
- 07 28 31 31 03
Integração microambiental
- 04 08 24 54 09
Integração macro ambiental
- 05 03 12 61 19
Informações da concorrência
01 00 08 18 57 16
Ameaças e oportunidades
01 00 05 12 66 15
Fortes e fracos da concorrência
03 00 04 09 58 26
Expectativas anteriores
03 01 08 30 42 16
Escolhas estratégicas
04 00 04 24 57 11
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3, Indiferente; 4,
Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os valores das respostas são relativos
(%).
Quadro 8 - Vantagem Competitiva na Concessionária Epsilon.
2
4
VANTAGEM COMPETITIVA
NR 1
3
5
Logística interna
01 00 00 03 47 49
Valor das operações de serviços
01 00 00 04 35 59
Logística externa
03 00 05 05 45 42
Padrão de qualidade
01 01 01 04 42 50
Formação de preços
01 01 07 28 51 11
Valor agregado
04 00 01 18 54 23
Custos competitivos
01 01 00 06 57 35
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
33
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Desenvolvimento tecnológico
01 00 04 01 47 47
Desenvolvimento das pessoas
01 00 08 16 53 22
Infra-estrutura
03 00 01 05 55 35
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo;
3, Indiferente; 4, Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os
valores das respostas são relativos (%).
6.4 Cultura organizacional
No Quadro 9 estão os principais aspectos relacionados pelos entrevistados da
Concessionária Epsilon sobre cultura organizacional.
Quadro 9 - Cultura Organizacional Concessionária Epsilon.
2
4
CULTURA ORGANIZACIONAL NR 1
3
5
Missão
01 01 03 01 45 49
Treinamento
01 01 04 05 55 34
Liderança
03 30 28 14 20 05
Responsabilidade pelos resultados
01 01 08 03 53 34
Comunicação interna
01 03 07 09 59 20
Lazer e entretenimento
01 07 15 16 41 20
Criatividade
01 01 14 20 49 15
Prêmios
01 11 23 26 28 11
“Know how”
01 27 38 05 23 05
LEGENDA: NR, Não Resposta; 1, Discordo Totalmente; 2, Discordo; 3,
Indiferente; 4, Concordo e 5, Concordo Plenamente. VALORES: Os
valores das respostas são relativos (%).
Pode-se observar que são estimulados todos os saberes em maior ou menor grau,
diferenciando-se assim das demais concessionárias estudadas. Um ponto comum às três
concessionárias estudadas é com relação a prêmios, pois nenhuma delas realiza
periodicamente concursos internos entre os empregados, com entrega de prêmios aos
melhores.
Na questão sobre os fatos e acontecimentos que se repetem na empresa
periodicamente, reuniões foi citado como o mais freqüente, seguido de confraternização de
natal e empatado no terceiro lugar está elogios na parte de serviço e atendimento, reclamação
da cobertura e integração. Quanto à contribuição pessoal para a empresa crescer no mercado,
o trabalho foi citado como a maior contribuição, seguido do atendimento e, em terceiro lugar,
está a busca de satisfação do cliente.
6.5 Análise da relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva
A Concessionária Epsilon diferencia-se das demais por registrar as porcentagens de
concordância mais elevados nas categorias analisadas. A equipe está altamente integrada e
qualificada para implementar as estratégias da empresa, centrada basicamente no
atendimento, segundo os funcionários. As vantagens competitivas são marcadas pela infraestrutura e tecnologia, o que significa dizer que há preocupação da empresa com o ambiente
interno.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
34
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
Algumas peculiaridades merecem destaque, como, por exemplo, o fato de que a
maioria conhece a missão da empresa, porém desconhece seus objetivos, conforme os
funcionários responderam. Outro aspecto, a noção de que a concessionária está se renovando,
sem discriminar as pessoas com mais experiência.
Em comparação com as demais concessionárias estudadas, há evidências de que a
Kapa está num extremo, fechada e reservada, orientada para o produto e venda e a Epsilon no
outro, aberta e orientada para o mercado. Entre elas, a Sigma.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É crescente a quantidade de autores que consideram a cultura como variável
interveniente nas estratégias competitivas das organizações. O trabalho procura discutir junto
às concessionárias de automóveis de Santa Maria (RS) algumas das dimensões desta relação.
Para Mintzberg e Quinn (2001), a estratégia empresarial é um processo organizacional
inseparável da estrutura, do comportamento e da cultura da companhia na qual é realizada.
Outros autores destacam a existência de relação entre estratégia e cultura nas organizações,
bem como, a estrutura e o comportamento, o que foi possível constatar também na realização
desta pesquisa.
É possível afirmar que das três estratégias genéricas de Porter (1986), as três
concessionárias estudadas adotam estratégias pobres. Com relação às estratégias genéricas,
verificou-se que não existe uma tendência explícita, segundo os dados coletados, que
evidencie estratégia competitiva entre as concessionárias citadas.
Apesar da Concessionária Epsilon demonstrar que tem apenas uma estratégia, isto não
está muito claro, porque, estas condições são limitadas ao desconhecimento por parte dos
entrevistados quanto às metas da empresa.
Seguindo o modelo proposto por Srour (1998), as concessionárias também possuem
um saber científico, mediante conhecimentos sobre a realidade natural, social e psicológica.
Estes conhecimentos são adquiridos pelos indivíduos mediante treinamentos nos quais são
explicadas razões de fazer isso ou aquilo na empresa, procedimentos corretos. Isto ocorre, a
fim de que programas de qualidade total em andamento nas concessionárias por necessidade
dos fabricantes possam ser operacionalizados evocando, assim, o saber técnico.
O saber técnico refere-se a “saber fazer as coisas” e aplica conhecimentos científicos
para realizar suas atividades. Foi constatado que em todas as concessionárias os funcionários
participam de algum tipo de treinamento e não trabalham exclusivamente com o
conhecimento empírico. Este fato é mais evidente nos departamentos de oficina mecânica,
pois os mecânicos muitas vezes com primeiro grau incompleto e um deles semi-analfabeto,
mesmo assim fez questão de responder a entrevista.
Finalmente, um quarto campo de estudo está relacionado ao saber artístico englobando
não somente as belas artes, mas também outras manifestações culturais de caráter lúdico
como lazeres, esportes e entretenimento. Neste sentido apenas uma das concessionárias
estimula lazer, entretenimento e criatividade. As atividades de lazer e entretenimento
contribuem para a integração interna e qualidade do relacionamento entre os indivíduos.
Portanto, a relação entre cultura organizacional e estratégia competitiva torna-se cada
vez mais evidente com o presente estudo. Porém as concessionárias de automóveis como
muitas outras organizações realizam administração de custos, atividades de produção,
desenvolvimento de serviços, programas de qualidade, programas de incremento de vendas,
entre outras práticas, com a finalidade de ganhos imediatos, os quais nem sempre ocorrem.
Este fato torna-se evidente quando um dos diretores de concessionárias declara que “todas
estão falidas”. As práticas citadas estão dissociadas de um planejamento estratégico com
estratégias competitivas definidas e que possibilitem um entendimento adequado pelas
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
35
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
pessoas que participam de sua implementação. Isto de forma a demonstrar uma valorização
efetiva das pessoas, a fim de ser construída uma cultura organizacional forte e consistente.
São as pessoas que vão implementar as estratégias e, sem o comprometimento delas, às
organizações deixam de existir e ter sentido.
As concessionárias de automóveis de Santa Maria estão mergulhadas em si mesmas e
querem ser líderes de mercado e as melhores. O detalhe é que são iguais em muitos aspectos
conforme apresentado neste trabalho. O discurso ideológico é um, enquanto que as ações e
procedimentos são outros. E, nesta competição, é importante que as concessionárias venham a
inovar e construir um futuro melhor e adequado à nova realidade de mercado, aberto e global.
Hamel e Prahalad (1999) mencionam que criar o futuro é um desafio maior do que
acompanhá-lo, para o qual é preciso criar seu próprio mapa. Entendendo competitividade
como a habilidade da organização em superar os limites impostos pela concorrência, segundo
Machado-da-Silva e Fonseca (1999), pode-se dizer que as concessionárias de automóveis de
Santa Maria(RS) têm um grande desafio pela frente, superar a si mesmas, para superar a
concorrência. Isto é, modernizar-se e, para concorrer deixando de fazer a mesma coisa,
desenvolvendo suas capacidades e talentos em suas diferentes áreas tecnológica, gerencial,
financeira e comercial. Espera-se que este trabalho venha somar no sentido de mostrar a
importância que a cultura organizacional e estratégias competitivas possuem no sucesso ou
fracasso das organizações.
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. BARBOSA, Francisco Vidal. Competitividade: conceitos gerais. In: RODRIGUES,
Suzana Braga et alii. Competitividade, alianças estratégicas e gerência internacional.
São Paulo, Atlas, 1999. Cap. 1 p.21-40;
2. BUCKLEI, P. J., PASS, C.L., e PRESCOTT, K. Measures of international
competitiveness: A critical survey. Jornoul of Marketing Management, v.4, nº2, p.175200, 1988;
3. DAFT, Richard L Teoria e projeto das organizações. 6.ed., Rio de Janeiro, Livros
Técnicos e Científicos, 1999;
4. FLEURY, Maria Tereza Leme et al. Cultura e poder nas organizações. São Paulo:
Atlas,1996;
5. HALL, Richard H. Organizações: estrutura e processos. Rio de Janeiro: Prentice-Hall
Do Brasil, 1982;
6. HAMEL, G. e PRAHALAD, G. K. Competindo pelo futuro: estratégias para obter o
Controle do seu setor e criar os mercados de amanhã. Rio de Janeiro, Campus, 1995;
7. LAKATOS, Eva Maria e MARCONI, Maria de Andrade. Metodologia de Trabalho
Científico. São Paulo: Atlas, 1992.
8. MINTZBERG, Henry. Criando organizações eficazes: estruturas em cinco configurações.
São Paulo: Atlas, 1995.
9. _____ et al. Safári de Estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico.
Porto Alegre: Bookman, 2000;
10. MINTZBERG, Henry; e QUINN, James Brian O processo da Estratégia 3.ed. Porto
Alegre: Bookman, 2001;
11. PORTER, Michael E. Estratégia competitiva. Rio de Janeira: Ed. Campus, 1986.
12. PORTER, Michael E. Vantagem competitiva: criando e sustentando um desempenho
superior Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1992.
13. SCHERMERHORN, Jr. Jonh R et alii. Fundamentos de comportamento
organizacional. Porto Alegre: Bookman, 1999;
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
36
João Antônio Gomes Pereira - Rogério da Silva Nunes
14. MACHADO-DA-SILVA, Clovis L.; e FONSECA, Valéria Silva da. Competitividade
Organizacional: conciliando padrões concorrênciais e padrões institucionais. In: VIEIRA,
Marcelo Milano Falcão et alii. Administração contemporânea: perspectiva
estratégicas. São Paulo, Atlas, 1999. Cap.1, p.27-39;
15. SROUR, Robert H. Poder, cultura e ética nas organizações. Rio de Janeiro: Campus,
1998;
16. TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a
pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 20-37, jul./ago./set. 2003
37
O IMPACTO DA PARCERIA ESTRATÉGICA COM DISTRIBUIDORES: UM
ESTUDO DE CASO
Nilza A Santos Siqueira*
Prof. Dr. Mauro Neves Garcia**
RESUMO
A reformulação do conceito de logística propiciou uma
nova visão a respeito dos canais de marketing ou
distribuição, que passaram a ser visto como variável
estratégica para as empresas. A escolha do canal de
distribuição resulta da tomada de uma decisão estratégica,
que é influenciada tanto pelo tipo de produto a ser
distribuído como pelo publico alvo a ser atingido.
O presente trabalho está voltado ao estudo dos canais de
marketing como estratégia competitiva sustentável para a
indústria alimentícia brasileira. Destacando-se os
resultados obtidos através da mudança de canal de
distribuição, com substituição da força de venda própria
por distribuidores.
A pesquisa foi de natureza exploratória, com revisão
bibliográfica sobre canais de distribuição, vantagem
competitiva e com base em um estudo de caso em uma
empresa do ramo alimentício. Os dados conclusivos sobre
o estudo de caso foram coletados em relatórios internos da
organização e em entrevistas discursivas realizadas com
funcionários que trabalharam na empresa pesquisada no
período que ocorreram as alterações em seus canais de
distribuição.
* Mestre em Administração de Empresas pela FECAP. Rua Ângela
Natale, 105 – Jd. Guaçã – São Paulo.E-mail:
[email protected]
** Doutor em Administração pela EAESP
/FGV Docente do Mês
trado em Administração da FECAP
[email protected]
Verificou-se que no caso da empresa pesquisada a
substituição da sua força de vendas própria por
distribuidores resultou em aumento da distribuição
numérica, com maior cobertura do mercado, aumento
considerável do volume de vendas e geração de lucros na
venda dos produtos, além de fortalecimento da marca e
valorização da empresa.
Palavras chaves: Canais de distribuição; estratégia;
vantagem competitiva; intermediários.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
A Substituição da força de venda própria por distribuidores
INTRODUÇÃO
O conceito de logística que anteriormente era tido apenas como um conjunto de técnicas
responsáveis pelo fluxo de materiais, diante de mercados cada vez mais globalizados e
dinâmicos, de clientes mais exigentes e na busca da satisfação destes clientes, passou a ser
considerado como fonte de vantagem competitiva para as empresas, através do conceito de
logística integrada, que representa a integração interna de todas as atividades (FIGUEIREDO;
ARKADER, 2000).
No Brasil, em especial, durante a década de 90, ocorreram várias mudanças, tanto em
relação a práticas empresariais, quanto da eficiência, qualidade e disponibilidade da infraestrutura de transportes e comunicações, que são elementos básicos para a existência de uma
logística moderna. Fatores como a estabilização econômica e as privatizações da infraestrutura foram os que mais impulsionaram este processo (FLEURY, 2000).
A reformulação do conceito de logística propiciou uma nova visão a respeito dos canais
de marketing ou distribuição, que passaram a ser visto como variável estratégica para as
empresas. O canal de distribuição, além de suprir produtos e serviços no lugar, na quantidade,
com a qualidade e preços desejados, também passou a assumir o papel de agente estimulador
de demanda (SILVA e ALCÂNTARA, 2001).
Considerados os responsáveis por todo escoamento de produto e serviços que os
consumidores adquirem em todas as partes, os canais de marketing são definidos como um
conjunto de organizações interdependentes envolvidas no processo de disponibilizar um
produto ou serviços para uso ou consumo.
Ao se refletir sobre a importância dos canais de marketing, pode-se associa-los ao um
dos problemas encontrados pelas empresas, que é a tarefa de fazer com que o produto chegue
ao consumidor final, a dificuldade do fabricante para distribuir seus produtos no varejo, tendo
como agravante a extensão do país e as diferenças regionais e culturais encontradas.
Por outro lado, fatores como custo de transporte e de uma estrutura de venda própria,
cobertura de mercado, especialização do trabalho, fortalecimento da marca, entre outros,
também podem dificultar o processo de distribuição. Além de que empresas que conseguem
ampliar sua participação no pequeno varejo, através dos canais de distribuição utilizados,
podem de certa forma, compensar a forte concentração das grandes redes de supermercados.
A abertura de mercado ocorrida no início dos anos 90, também propiciou aumento da
concorrência em vários setores industriais. Além disso, o avanço tecnológico, especialmente
da tecnologia da informação, a variedade de produtos e a necessidade cada vez maior em se
prestar melhores serviços aos consumidores, são fatores que levam a questões concernentes a
escolha dos canais de distribuição, visto que esta escolha pode afetar outras decisões
estratégicas das empresas.
A escolha do canal de distribuição para colocação do produto no mercado de varejo
resulta da tomada de uma decisão estratégica, considerando-se que o tipo de produto a ser
distribuído bem como o publico alvo a ser atingido tem influência na estratégia adotada. O
uso de intermediários pode aumentar a eficiência da distribuição do produto, tornando os bens
amplamente disponíveis e acessíveis ao mercado, muitas vezes com custos menores.
Paralelamente é interessante ressaltar que a parceria poderá proporcionar melhores resultados
ao fabricante tanto em relação aos seus custos de distribuição do produto como em uma
cobertura mais ampla do mercado varejista.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
39
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
No caso de venda de produtos alimentícios o canal, geralmente utilizado, é composto
por lojas de varejo grandes ou pequenas, que também podem ser atendidas através de
distribuidores e atacadistas ou diretamente pelo fabricante.
Dentro deste contexto, objetiva-se neste artigo, destacar os resultados obtido através da
mudança de canal de marketing com substituição da força de venda própria por distribuidores
e da formação de alianças estratégicas firmadas entre a indústria de alimentos e seus
intermediários, para a colocação do produto no mercado de varejo.
Canais de Distribuição
Os canais de distribuição, também chamados canais de marketing são as redes de
distribuição através das quais o produto flui para o mercado de consumo. Pode-se dizer que os
intermediários existentes entre fabricantes e consumidores finais realizam diversas funções,
constituindo estes canais (KOTLER, 2000). Estes canais são formas de desenhar, desenvolver
e manter relacionamentos entre os participantes do canal, objetivando vantagem competitiva
tanto individual como coletiva, através do planejamento, organização e controle das alianças
entre os diversos membros participantes do canal (STERN et. allii., 2002).
Um sistema de distribuição é um recurso externo muito importante, construído em longo
prazo e que não pode ser facilmente modificado. Estabelece um compromisso corporativo
significativo com várias empresas independentes cujo negócio é a distribuição, e também com
os mercados específicos que elas atendem, representando também um conjunto de relações de
longo prazo (COREY, 1991 apud KOTLER, 2000: 510).
Os canais de distribuição preenchem as lacunas de tempo, local e posse, as quais
separam as mercadorias e os serviços daqueles que precisam ou desejam essas mercadorias ou
serviços e, invariavelmente, usam recursos escassos. Geralmente, as funções do canal são
melhor desempenhadas por meio de especialização, e podem ser trocadas entre os membros
do canal. O fabricante ao transferir funções por ele desempenhadas para intermediários poderá
reduzir o custo do produto, entretanto, esta diminuição do custo só causará impacto no preço
do produto ao consumidor final se o intermediário conseguir realizar as mesmas funções, com
custo menor e de forma mais eficiente (KOTLER, 2000).
O desenho da estrutura do canal de distribuição é resultado de um plano conjunto entre
empresas que desejam participar do sistema de canal e, refere-se à organização e ao interrelacionamento das partes do sistema de distribuição (RANGAN et. allii., 1992), resultando
também da negociação e da experiência acumulada em negócios passados (BOWERSOX e
COOPER , 1992).
Para que os canais de distribuição possam disponibilizar os produtos e serviços ao
consumidor final, diversas funções precisam ser desempenhadas pelos participantes destes
canais. As premissas básicas relacionadas a estas funções são que os participantes do canal
podem ser substituídos ou eliminados do mesmo, entretanto, as funções desempenhadas por
eles não podem ser eliminadas e devem ser repassadas para frente ou para trás no sistema de
canal definido pelo fabricante e, assumidas por outros participantes (STERN et. allii., 1996).
Sistemas de distribuição
As funções e ações desempenhadas entre os fabricantes e seus intermediários compõem
o sistema de distribuição. A determinação de sucesso ou não desse sistema está relacionada ao
nível de integração e cooperação das partes envolvidas na distribuição do produto (DIAS,
1993).
No sistema vertical de marketing, fabricantes, atacadistas e varejistas atuam como um
sistema unificado, onde um dos membros do canal pode ser considerado como dono ou
franqueador dos outros membros. Este modelo de canal surgiu como resultado da tentativa
dos membros do canal em controlar o comportamento do canal e eliminar o conflito que
ocorre quando cada um dos membros busca objetivo próprio (KOTLER, 2000).
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
40
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Neste tipo de sistema, o intermediário tem a função de um parceiro comercial que deve,
junto com a empresa fabricante, buscar a satisfação do cliente. O fabricante monitora o
trabalho do intermediário distribuidor, principalmente em relação aos aspectos-chave, tais
como: planejamento de vendas, administração de estoques, treinamento da equipe de vendas,
planos de propaganda e promoção ALMEIDA (1999).
Apesar de apresentar vantagens e desvantagens, a integração vertical pode ser utilizada
pela empresa como fonte de vantagem competitiva sustentável. Um desses benefícios pode ser
a vantagem de custos que, segundo PORTER (1991), é uma das formas de obtenção de
vantagem competitiva pela empresa. As empresas buscam o benefício de maior cobertura de
mercado, redução de custos do canal e venda mais personalizada através da utilização do
sistema de multicanal que consiste na utilização, por parte de uma única empresa, de dois ou
mais canais de marketing para atingir um ou mais segmentos de mercado (KOTLER, 2000).
O esquema de múltiplos canais ocorre quando o fabricante opta por desenvolver canais
mais longos ou mais curtos, dependendo do cliente, sendo que este esquema pode
proporcionar aos fabricantes maior cobertura geográfica, do que com a utilização de um único
canal (SEMENIK e BAMOSSY, 1996). Entretanto, os benefícios gerados pela utilização do
sistema de multicanal podem trazer problemas de conflito, controle e concorrência, pois os
canais utilizados pela empresa podem concorrer entre si na busca dos mesmos clientes. A
empresa pode utilizar diferentes canais de venda para clientes de portes diferenciados,
utilizando venda direta para grandes clientes, os de médio porte poderiam ser atendidos por
um sistema de telemarketing, enquanto que os pequenos poderiam ser atendidos por
distribuidores, o que possibilitaria a empresa atender um maior número de clientes com custo
adequado a cada um.
Gerenciamento do Canal de Distribuição
O gerenciamento do canal de distribuição pode ser definido como um conjunto de
atividades destinadas a assegurar a cooperação dos membros do canal com vistas a atingir os
objetivos de distribuição da empresa. Após a escolha do canal de distribuição e a seleção dos
membros participantes, a cooperação dos membros do canal, pode ser obtida através da
motivação.
Como forma de apoio aos membros do canal estão os arranjos cooperativos onde os
fabricantes e os outros participantes do canal desenvolvem atividades como propaganda
cooperativa, concessões promocionais ou programas de incentivo. Outra forma de motivar os
membros seria a realização de parcerias e alianças estratégicas que se baseiam em
compromissos firmados entre fabricante e membros do canal, na busca de ajuda mútua para
criar um esforço de equipe bem organizado para a distribuição dos produtos
(ROSENBLOOM, 2002).
Em termos de acordo fornecedor-distribuidor, KOTLER (2000) indica como mais
avançado o programa de distribuição, que pode ser definido como a formação de um sistema
de marketing vertical, planejado e gerenciado que busca consenso entre as necessidades do
fabricante e do distribuidor. O fabricante adota uma estrutura interna com departamento, cuja
função é identificar as necessidades dos distribuidores, de forma a ajudá-los a operar de forma
mais eficiente, mostrando aos distribuidores que sua renda é resultante do processo de vendas
e não do seu processo de compras.
Os Intermediários
O processo da escolha de canal deve ser formulado como uma parte integrante da
estratégia competitiva geral da empresa. Inicia-se o processo pelo consumidor final,
analisando-se suas necessidades e preferências, além das vantagens oferecidas a ele pela
concorrência, buscando-se a melhor estrutura de distribuição para atender o consumidor
satisfatoriamente, dando um enfoque diferenciado ao problema da distribuição (NOVAES,
2001).
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
41
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Independente do custo de distribuição, o fabricante deve enxergar o intermediário tanto
como um cliente quanto como um parceiro, procurando compreender suas necessidades,
objetivos e operação. Deve também oferecer apoio que desperte o entusiasmo e a fidelidade
do intermediário, pois, enquanto os ganhos por parte dos mesmos forem relativamente bons,
assim como o relacionamento entre ambos, os intermediários continuarão a vender e a
promover os produtos do fabricante (KOTLER, 1999).
Os intermediários podem ser considerados como empresas independentes que dão
suporte aos produtores e fabricantes no desempenho de tarefas de distribuição do produto,
participando da execução das funções de negociação, propriedade do produto e outras tarefas
de distribuição, operando basicamente no atacado e no varejo (ROSENBLOOM, 2002). São
chamados intermediários por estarem posicionados entre o produtor e o consumidor final
(STERN et. allii., 1996).
Os intermediários disponíveis, sua vontade de representar determinados fabricantes e os
custos relativos ao uso desses intermediários podem estabelecer os canais de distribuição.
Entretanto, a política de distribuição adotada pelo fabricante, a fixação de preços, o esforço
promocional, entre outros, são fatores que também podem influenciar na decisão de se utilizar
intermediários (CUNDIFF et. allii., 1977).
A presença de intermediários para colocação do produto no mercado pode ser justificada
pelo papel que os mesmos desempenham junto aos fabricantes e, a eficiência que
proporcionam ao processo de distribuição. Os intermediários podem desempenhar as tarefas
do canal de forma mais eficiente em função da sua especialização e economia de escala, e da
redução de transações associadas à venda do produto (SEMENIK & BAMOSSY, 1996).
Entretanto, o fabricante é quem decide se o intermediário desempenha as funções do canal
com maior eficiência (KOTLER, 1999).
KOTLER (2000) identifica como vantagem à utilização de intermediários o emprego de
recursos financeiros de terceiros para comercialização de produtos próprios, a
comercialização do produto com outros produtos de outros fabricantes e a disponibilização
dos recursos do fabricante para investimento em seu negócio principal.
Independente do grau de facilidade ou dificuldade que os fabricantes encontrem para
recrutar intermediários, eles devem, no mínimo, determinar as características dos melhores
intermediários, avaliando o modo como trabalham, os produtos que vendem, a situação
financeira e a reputação dos mesmos no mercado. Tais características devem ser avaliadas
pois, quando o fabricante utiliza intermediários para a venda de seus produtos, são eles que
estarão em contato com o consumidor final e que levarão a imagem do produto do fabricante
a estes consumidores (KOTLER, 2000).
Os intermediários, geralmente, atingem maior eficiência quando disponibilizam
mercadorias em larga escala, tornando-as acessíveis aos mercados-alvo. Eles facilitam o fluxo
de mercadorias e serviços, diminuem a distância entre a variedade de mercadorias e serviços
oferecida pelo fabricante e a variedade necessária para atender à demanda do consumidor que
deseja uma quantidade limitada de uma grande variedade de mercadorias, enquanto que os
fabricantes, normalmente, produzem uma grande quantidade de uma variedade limitada de
mercadorias (STERN et. allii., 1996).
O trabalho do distribuidor, geralmente, é monitorado pelo fabricante, principalmente em
aspectos-chave como: planejamento de vendas, administração de estoques, treinamento de
vendedores e planos de propaganda e promoção, sendo que, neste caso, os intermediários
podem ser vistos como parceiros comerciais (ALMEIDA,1999).
Os intermediários podem ser considerados como atacadistas especializados, também
chamados de atacadista mercante ou distribuidor, com base no grau de serviços que oferecem,
e divididos em atacadistas que oferecem serviços completos e os que oferecem serviços
limitados. Os atacadistas que oferecem serviços completos são considerados como atacadistas
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
42
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
distribuidores, que podem ser generalistas e são os que carregam grande variedade dos
produtos requeridos por seus consumidores (BERMAN, 1996).
Os atacadistas de serviço integral executam todas as funções de venda por atacado e
mais algumas funções que seriam de responsabilidade do varejista. Visitam o cliente
regularmente, sendo que nesta visita o vendedor também executa funções como controle de
estoque, disposição adequada dos produtos e verificação dos preços marcados (BOWERSOX
e CLOSS, 2001). Os atacadistas de funções limitadas, embora assumam a posse dos produtos,
não realizam todas as tarefas de distribuição discutidas no quadro 1, como por exemplo os
atacadistas que não têm equipe de vendas própria, atacadista de auto-atendimento como é o
caso do Makro no Brasil (ROSENBLOOM, 2002).
Quadro 1 - Tarefas de distribuição executadas para os fabricantes:
Tarefa
Motivos para a utilização de
Benefícios da utilização de
intermediários
intermediários
Cobertura de
Clientes espalhados por
Propicia maior cobertura do
mercado
grandes áreas geográficas
mercado a um custo razoável
Contato de vendas
Custo de vendas externo
Realizam os contatos com grande
elevado.
número de clientes.
Custos e riscos da manutenção Estocam produtos dos fabricantes
Manutenção de
de estoques
que representam, facilitando o
estoque
planejamento da produção e
disponibilizando os produtos em
pontos geográficos estratégicos.
Processamento de
Clientes que compram
Processam pedidos com maior
pedidos
pequenas quantidades.
eficiência, além de diluírem seus
custos de processamento com
produtos de outros fabricantes.
Distância dos clientes.
Estão mais próximos aos clientes e
Informação de
podem estabelecer contatos mais
mercado
freqüentes e aprenderem sobre as
exigências dos clientes em relação a
produtos e serviços.
Suporte ao cliente
Custos elevados para serviços Realizam troca de produtos, reparos
de pós-venda aos clientes.
ou assistência técnica.
Fonte: elaborado pela autora com base em ROSENBLOOM (2002).
Os intermediários de atacado prestam serviços aos fabricantes, mas também realizam
serviços aos varejistas. No quadro 2, são destacadas as funções executadas pelo atacado para
os clientes.
Quadro 2 - Tarefas de distribuição executadas para os clientes
Tarefa
Descrição
Disponibilidade dos Produtos Capacidade de pronta entrega devido à proximidade
com os clientes e do conhecimento das necessidades
dos mesmos.
Serviço ao Cliente
Prestam serviços de entrega, reparos ou revisões
ligadas à garantia do produto.
Crédito e Assistência Financeira Oferecem crédito e prazo de pagamento, reduzem os
gastos com estoque que os clientes teriam, graças à
sua logística de suprimentos.
Conveniência de Sortimento
Reúnem produtos de variados fabricantes, facilitando
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
43
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
a atividade de compras dos clientes.
Compram grandes quantidades dos fabricantes e
fracionam em lotes menores, permitindo ao cliente a
compra da quantidade que necessita.
Aviso e Suporte Técnico
Informa qual a melhor forma de vender e /ou utilizar
os produtos. Oferecem vários tipos de ajuda tais como:
publicidade, arranjo de loja, etc.
Fonte: elaborado pela autora com base em ROSENBLOOM (2002).
Fragmentação de Volumes
Já DIAS (1993), que considera o atacadista como o “comprador” dos varejistas, cujos
objetivos estão voltados à identificação antecipada das necessidades dos varejistas, facilitando
as tarefas de seleção e compra dos mesmos. Em relação ao atacado distribuidor, coloca que
existem também os distribuidores que operam com linha de produtos reduzida, de forma mais
especializada, porém, não os considera muito significativos individualmente.
Por outro lado, os atacadistas “distribuidores”, considerados especializados ou
exclusivos, além de operarem com linha reduzida de produtos, não trabalham com produtos
concorrentes e têm exclusividade de marca em sua área de atuação. Segundo BRITO (1999),
oferecem como vantagem a oferta de todos os itens do fabricante a preços competitivos;
serviços de promoção e reposição dos produtos; entrega rápida e garantia de qualidade e troca.
Um distribuidor pode oferecer uma infra-estrutura adequada para distribuição do
produto, conhece o mercado e pode realizar as vendas com maior rapidez (BROWN e
HERRING, 1995). No caso brasileiro, o canal de atacado está se ajustando para se
transformar em parte estratégica da distribuição da indústria, sendo que os distribuidores
especializados se apresentam como alternativa (TONIN, 1999).
A caracterização do intermediário chamado de distribuidor é pouco citada na literatura
pesquisada, observando-se que em outros países, o intermediário de atacado executa serviços
tanto para o fabricante como para o varejista, de modo muito mais abrangente, aproximandose mais do que chamamos de distribuidor no Brasil. Entretanto, no caso brasileiro, as
diferenças entre os dois tipos é considerável, principalmente em aspectos relativos à prestação
de serviços.
Em conversas com especialistas da área de distribuição, procurou-se traçar um perfil do
intermediário chamado distribuidor, enfocando-se as principais características do mesmo e as
diferenças básicas entre o distribuidor e o atacado tradicional (balcão, auto-atendimento e
entrega).
Em relação às principais características, pode-se destacar que o distribuidor tem equipe
de vendas própria, atende clientes com freqüência determinada, faz entregas com frota própria
ou de terceiros, trabalha com um número limitado de empresas por equipe de vendas, ou seja,
pode dividir a equipe de vendas por segmento caso os números de fornecedores seja elevado,
não trabalha com produtos concorrentes, tem exclusividade na área de atuação e oferece uma
gama significativa de serviços aos seus clientes e fornecedores.
As principais diferenças consideradas entre o distribuidor e o atacadista tradicional, seja
o de balcão, auto-atendimento ou até mesmos os que realizam entregas, são destacados no
quadro 3, elaborado com base em depoimentos de especialistas da área.
Quadro 3 - Principais diferenças entre distribuidor e atacadistas.
Distribuidor
Atacadista
Presta serviços de venda e pós-venda;
Não presta serviços pós-venda;
Não trabalha com produtos concorrentes;
Não tem fidelidade;
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
44
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Respeita política de preços do fabricante;
Não segue a política de preços do
fabricante;
Troca produtos vencidos;
Não troca produtos;
Vende toda linha de produtos do
fabricante;
Vende somente produtos já consagrados
no mercado;
Atua como parceiro.
Busca vantagens pessoais.
Fonte: Elaborado pela autora
No caso do distribuidor, a questão da prestação de serviços é mais equilibrada, pois os
distribuidores prestam serviços de venda e pós-venda. Vendem o produto, entregam, fazem
serviços de reposição e promoção, acompanham a data de validade dos produtos no ponto de
venda e realizam trocas dos produtos quando necessário. Com relação à marca do fabricante
buscam ajudar no seu fortalecimento, já que vendem novos lançamentos de produtos, não
trabalham com produtos concorrentes e respeitam a política de marketing e de preços do
fabricante. O atacado por sua vez não presta serviços, só vende produtos consagrados e busca
vantagens pessoais.
BARRIZZELLI (1999) reforça esta posição, destacando que o atacado não presta
serviços ao varejista ligados a troca de mercadorias e divulgação de lançamentos. Na verdade,
a maior preocupação do atacado é mostrar que vende pelo menor preço, já que cresceu e se
desenvolveu especulando estoques e concorrendo diretamente com a indústria, não se
posicionando como uma variável estratégica.
Entretanto, não se pode afirmar que o atacado tradicional, de certa forma, também não
atue como um parceiro da indústria, pois, segundo dados de pesquisa da FIA/USP e AC
Nielsen, o atacado no Brasil sempre desempenhou importante função como intermediário no
canal de distribuição, principalmente pelo volume que movimenta e por aspectos relativos a
cobertura de mercado.
Por outro lado, acredita-se que, em função da abertura de mercado e com o avanço da
tecnologia, o canal do atacado deva se ajustar às novas tendências, onde a prestação de
serviços será o foco principal. Segundo BARRIZZELLI (1999), o caminho seria um atacado
com outro formato, outra visão e uma outra cultura, onde o intermediário se posicione como
uma variável estratégica da indústria.
Vantagem Competitiva a alianças estratégicas
O crescente acirramento do nível de concorrência nas últimas décadas, aliado ao avanço
tecnológico, especialmente da tecnologia da informação, além da maior variedade de produtos
em função da globalização de mercados, tem levado as empresas a buscarem estratégias que
possam levar a vantagem competitiva (FLEURY et. allii., 1995). As decisões referentes à
escolha dos canais de marketing para empresa que abrangem o relacionamento entre
fabricantes, intermediários e consumidores finais, passaram a ser consideradas como decisões
estratégicas.
A vantagem competitiva de uma empresa tem origem nas várias atividades
desenvolvidas pela empresa no projeto, na produção, no marketing, na entrega e no suporte de
seus produtos e cada uma dessas atividades, além de contribuir para a posição dos custos
relativos, pode também criar base para diferenciação. Uma empresa consegue obter vantagem
competitiva à medida que executa atividades estrategicamente importantes, com redução de
custo ou de forma mais eficiente que seus concorrentes. A análise sistemática de todas as
atividades executadas por uma empresa e a forma como interagem, pode evidenciar as fontes
de vantagem competitiva (PORTER, 1991).
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
45
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Segundo ROSENBLOOM (2002), os canais de marketing eram tratados há alguns anos
atrás como sendo irrelevantes à estratégia da empresa, quando comparado ao produto, preço e
promoção, os quais foram mais valorizadas pelas empresas por um longo período de tempo.
Entretanto, NARUS e ANDERSON (1996) afirmam que, nos últimos anos as empresas
mostraram maior interesse pela estratégia de canais de marketing, reconhecendo neles novas
oportunidades para a busca de relacionamentos mais cooperativos.
Para que se possa obter vantagem competitiva através da integração, as empresas devem
romper os limites de propriedade e de estrutura organizacionais tradicionais para coordenarem
totalmente a cadeia de suprimentos, à medida que o estoque se movimenta pelo processo de
agregação de valor. A viabilização desta integração ocorre pela combinação de vínculos de
informação e do compartilhamento de recursos humanos (BOWERSOX e CLOSS, 2001).
A integração entre fornecedores de materiais e prestadores de serviços assume caráter
importante para que as empresas possam alcançar vantagens plenas (BOWERSOX e CLOSS,
2001), pois, segundo CHRISTOPHER (1997), quando o relacionamento entre fornecedores e
clientes for do tipo adversário e não cooperativo, certamente a empresa não conseguirá obter
vantagem competitiva.
Dentro de uma aliança estratégica as empresas cooperam entre si, em função das suas
necessidades mútuas e, na busca de objetivos comuns, compartilham riscos. As alianças
estratégicas podem propiciar às empresas a expansão da capacidade da empresa de criar
produtos, incorporar novas tecnologias, adiantar-se aos concorrentes, alcançar escala
necessária à sua sobrevivência em mercados mundiais, produzindo mais recursos para investir
em suas competências básicas (LEWIS, 1992).
A confiança entre empresas parceiras é composta por dois princípios distintos: o
primeiro que se refere à capacidade do parceiro em executar determinada tarefa de modo
eficiente e eficaz e, o segundo diz respeito à transparência de intenções entre as organizações,
considerando-se a velocidade em que ocorrem as mudanças no ambiente externo
(GANESAN, 1994).
A alianças com terceiros que podem aumentar as receitas, reduzir custos, dividir riscos
ou liberarem recursos internos para atividades mais críticas, devem ser consideradas nos
planos das empresas (LEWIS, 1992).
Dentro de uma visão tradicional, as parcerias entre fornecedores e distribuidores podem
ser baseadas na relação preço, volume e desconto. Entretanto, as parcerias tidas como mais
evoluídas estão voltadas ao nível de serviços que podem ser oferecidos, sendo que questões
relativas a preço e prazo passaram a ser secundárias, incorporando-se à prestação de serviços
(SILVA e ALCANTÂRA, 2001).
Segundo LEWIS (1999: 84), “os distribuidores adicionam valor aos produtos de uma
empresa e são uma fonte de informações oportunas sobre o mercado”, sendo que a formação
de parcerias entre fabricantes e distribuidores pode trazer resultados favoráveis a ambos. As
parceiras logísticas, que durante algum tempo eram desconhecidas, passaram a ser vistas
como forma de diminuição de custos operacionais de distribuição e de estocagem
(BOWERSOX, 1998).
Para POIRIER e REITER (1997), as redes de fornecimento podem agregar valores
extras à cadeia de abastecimento. Em um caso analisado por estes autores, uma associação de
fabricantes, que transferia parte significativa de seus produtos através de distribuidores até o
consumidor final, verificou-se que, neste caso, esta prática funcionava bem devido à grande
parte dos fabricantes, nessa rede, serem de pequeno porte, além de produzirem produtos
especializados, que seriam melhor manipulados através de distribuidores, os quais podiam
juntar outros artigos, de outros fabricantes, para distribuição.
A busca de parceria entre os elementos da rede da cadeia de abastecimento pode ser
considerada como parte da solução na busca coletiva de economia e eficiência que possa
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
46
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
beneficiar todos os participantes da cadeia, sendo que o sucesso pode ser mensurado pelos
aperfeiçoamentos desenvolvidos e pelas economias compartilhadas através desses
relacionamentos (POIRIER e REITER, 1997).
O bom desempenho em um relacionamento de aliança estratégica, baseia-se em
confiança, segurança, responsabilidade e habilidades pessoais, e vai resultar da habilidade e
vontade de cada membro participante em desempenhar seu papel e de buscar metas benéficas
para todos (FITES, 1996), sendo que os canais de distribuição passaram a representar uma
oportunidade não explorada para a busca de relacionamentos mais cooperativos (NARUS e
ANDERSON, 1996).
Segundo STERN et. allii. (2002) uma aliança estratégica se inicia quando o fabricante
percebe que pode obter lucros com as muitas vantagens que um distribuidor pode oferecer,
entre elas a de se atingir melhor cobertura a um custo mais baixo. Os fabricantes tendem a
estabelecer uma aliança para motivar os distribuidores a representá-los melhor, nos mercados
que já atuam ou em novos mercados e também no lançamento de novos produtos.
Na busca de diferencial competitivo, os fabricantes podem se associar a empresas que se
encarregam de distribuir o produto no mercado de varejo, contemplando com isso aspectos
relativos à especialização e economia de escala, além de melhor integração ao longo da cadeia
de suprimentos.
METODOLOGIA
O método escolhido para desenvolvimento da pesquisa, neste trabalho, é o método do
estudo de caso que, segundo YIN (2001), representa um modo de se investigar um tópico
empírico, através de um conjunto de procedimentos pré-especificados.
A escolha pelo método do estudo baseia-se, também, no interesse na análise da unidadecaso escolhida, onde os resultados obtidos através da mudança de canais mostraram-se
significativos para um melhor entendimento do tema proposto, além de se observar que outros
estudos similares foram realizados através do estudo de caso.
O estudo de caso desenvolvido neste artigo foi o de caso único e a unidade-caso
escolhida é uma indústria alimentícia, sediada no Estado de São Paulo, cujo nome, por
questões éticas, não foi revelado no decorrer deste trabalho, já que não se obteve permissão da
empresa pesquisada para divulgação do seu nome. Assim, foi tratada no decorrer do estudo
com o nome fictício de empresa “A”.
O canal de distribuição utilizado pela empresa “A” para distribuição de seus produtos no
mercado de varejo, era o canal de venda direta ao varejista, com filiais nas cidades do Rio de
Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Belém, Bauru e Recife, e através de intermediários do tipo
atacadista. Entretanto, a empresa buscava novas formas de penetração no mercado interno,
sendo que sua estrutura para atendimento do varejo nacional estava tornando-se inviável, dado
baixo volume negociado.
A estratégia utilizada pela empresa na mudança de canal de distribuição, com a
substituição da força de venda própria pelo distribuidor, e a obtenção de vantagens
competitivas sustentáveis pela empresa, através da alteração de seus canais e da formação de
alianças estratégicas com seus distribuidores, foram os aspectos analisados no decorrer desta
pesquisa.
Para análise do caso foram coletados dados para interpretação. Na coleta dos dados
primários foi utilizada a técnica da entrevista pessoal não estruturada, realizadas com
funcionários responsáveis pela tomada de decisão no âmbito da mudança dos canais, e por
outros responsáveis pelo desenvolvimento da operação na empresa. Como fonte de dados
secundários, foi realizado o levantamento de documentos da empresa.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
47
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Após a coleta dos dados mencionados, numa segunda fase da pesquisa, foram realizadas
entrevistas com pessoas selecionadas, procurando aprofundar os aspectos encontrados nas
etapas anteriores.
Os dados coletados através de relatórios e as contribuições levantadas nas entrevistas
foram interpretados e avaliados de forma qualitativa, reunindo opiniões e listando fatores que
propiciaram um melhor entendimento sobre canais de distribuição e as vantagens que foram
obtidas através dos mesmos.
A utilização desta metodologia possibilitou o estudo de como esta empresa conseguiu
obter resultados favoráveis com a utilização de intermediários.
Apresentação dos Resultados
Com base nos dados coletados e em depoimentos colhidos com funcionários que faziam
parte da empresa pesquisada no período analisado (1991 a 1997) apurou-se que a estrutura do
canal de distribuição da empresa “A” era o de venda direta ao varejista e também para as lojas
de atacado, através de seu escritório central (Matriz) na cidade de São Paulo e de 06 filiais
que foram abertas no período entre 1976 a 1988 nas cidades do Rio de Janeiro, Porto Alegre,
Curitiba, Belém, Bauru e Recife.
As filiais da empresa “A” eram administradas por um gerente, que contava com uma
equipe de vendedores, promotores que realizavam as funções de reposição e arrumação das
mercadorias nas gôndolas das lojas e frota própria para o transporte. Embora todas as filiais
tivessem um gerente responsável por sua administração, o gerenciamento de todas as filiais da
empresa era realizado por funcionários da matriz em São Paulo.
Com base nas entrevistas e dados coletados, verificou-se que muitos eram os problemas
enfrentados pela empresa “A”, para distribuição dos seus produto no mercado de varejo
brasileiro. O departamento de venda a varejo era totalmente deficitário, desde a fundação da
empresa no país.
Ainda que a empresa “A” fosse conhecida, seus produtos não eram conhecidos no
mercado, eram considerados produtos típicos de consumo da colônia japonesa no país, com
venda restrita para poucas regiões. Buscando uma maior aceitação de seus produtos, a
empresa adaptou seu produto principal – o produto 1 –, lançando o “produto 4” em 1985 e o
“produto 5” em 1987, apostando em uma regionalização do mesmo, mais adequado ao gosto
brasileiro. Cabe dizer que o “produto 5” era novo no mercado brasileiro, sem similar.
Mesmo com o lançamento de novos produtos mais regionais, os mesmos permaneciam
desconhecidos, a estrutura de vendas reduzida, a verba de propaganda muito aquém da
necessária, o atacado não tinha o menor interesse nos produtos da empresa e vendia
quantidades muito pequenas – e apenas do “produto 1” – e em algumas regiões do país. A
cada tentativa de se melhorar a distribuição do produto, novas filiais eram abertas em regiões
diferentes, porém sem resultados positivos.
Ao final da década de 90, baseado no modelo distribuição de uma outra empresa do
grupo, a empresa “A” resolveu utilizar, além das filiais e do atacado, alguns distribuidores
para vender seu produtos no varejo. Contudo, a política de distribuição adotada para
negociação junto a estes distribuidores se mostrou ineficaz. O chamado desconto de canal,
que consistia no valor de desconto no preço de venda para o distribuidor, era considerado
baixo para cobrir os custos que os distribuidores teriam para vender os produtos da empresa.
Por outro lado, a verba de propaganda era pequena em função dos baixos volumes
vendidos e dos prejuízos que a empresa tinha com a venda no mercado interno. Desta forma,
sem uma política bem definida, um desconto de canal considerado baixo e sem propaganda do
produto na mídia, a tentativa inicial com distribuidores também não foi satisfatória.
Em 1991, o departamento comercial passou a ser gerenciado por outro funcionário, que
suspendeu as ações de propaganda nos pontos de venda, durante um período de seis meses.
Com a verba economizada, foi realizado um contrato com a rede de televisão SBT (Sistema
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
48
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Brasileiro de Televisão), para que a propaganda do produto fosse veiculada em nível nacional.
Porém, a propaganda era nacional, mas a distribuição do produto continuava regional, sendo
necessária alguma medida para solucionar tal impasse.
Então, a empresa “A” baseada no modelo de distribuição adotado por outra empresa do
grupo, conforme já mencionado, e levada por fatores como: baixo volume de vendas,
necessidade de melhorar a distribuição numérica (aumentar o número de pontos de venda
atendidos), desenvolver mercado para os produtos da empresa e gerar lucros, resolveu nomear
distribuidores para realizar tarefas de distribuição dos seus produtos em várias regiões do país.
Assim, a idéia da contratação de intermediários que fariam o papel de parceiros
comerciais, ganhou fôlego. Um funcionário foi designado a percorrer vários estados
brasileiros, na busca de distribuidores para desempenharem esse papel.
Todavia, sem uma política de distribuição bem definida, com um percentual de desconto
de canal relativamente baixo, em determinadas regiões, os distribuidores classificados como
ideais à empresa, não tiveram interesse em distribuir os produtos da empresa. Nessas regiões
foram nomeados outros distribuidores, não tão conceituados, porém os resultados foram
insatisfatórios.
Casos como, por exemplo, Rio de Janeiro e Porto Alegre fracassaram. No Rio de Janeiro
foi necessário à volta da equipe de vendas própria para atender o mercado, que só passou a
atuar com distribuidores no ano de 95 e em Porto Alegre contrataram outro distribuidor.
Para melhorar o processo de distribuição através de distribuidores, a empresa passou a
estabelecer uma política de distribuição mais bem definida, oferecendo um desconto de canal
maior e apoio promocional com propaganda do produto na televisão. Também adotou como
medida, a unificação da tabela de preços em todo território nacional, cujas diferenças no preço
do produto se davam apenas em função das diferentes alíquotas de ICMS (imposto de
circulação de mercadorias) nas diferentes regiões do país.
Resumindo, o sistema de distribuição adotado pela empresa, estabelece uma política de
preços bastante uniforme, concede um percentual de desconto no preço de venda do produto
para os distribuidores, considerado atraente pelos mesmos. Realiza também, várias ações de
propaganda cooperativa fortalecendo a idéia de parceiro comercial.
O conceito de intermediário, no caso do distribuidor difere do que se pode chamar de
intermediário atacadista. Enquanto o distribuidor atua como parceiro do fabricante, o
atacadista muitas vezes se torna concorrente da indústria.
Dessa forma, a empresa “A” foi nomeando distribuidores e repassando para os mesmos,
funções dos canais de distribuição tais como: negociação, posse, financiamento, logística,
promoção informações de mercado e pós-venda. Com esta política e com a veiculação da
propaganda em várias regiões do país, alguns intermediários que a princípio não quiseram
distribuir o produto, passaram a procurar a empresa para tornarem-se distribuidores.
A mudança dos canais de distribuição foi acontecendo gradativamente, passando da
venda direta ao varejista, para a venda a um distribuidor que se encarregaria de fazer a
distribuição do produto no varejo e no atacado e assim, as filiais foram sendo fechadas.
Em 1996 a empresa “A” já tinha praticamente, nomeado distribuidores em todas as
regiões do país, restando apenas a as cidades do grande ABCD composta pelas cidades de
Santo André, São Bernardo, São Caetano, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra,
regiões estas que foram passadas para distribuidor em 1997, e a capital paulista que passou
para distribuidores em 2002.
Diante das mudanças realizadas na empresa, o canal de distribuição adotado passou a ser
o de venda através de distribuidores, com exceção da venda realizada para grandes lojas de
varejo como, por exemplo, Carrefour, Pão de Açúcar, entre outras, cujas compras são
centralizadas.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
49
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Com este sistema de canal, a empresa pesquisada adotou o sistema de múltiplos canais e
realiza suas vendas através de distribuidores e da venda direta. Sua distribuição passou a ser
intensiva, com maior cobertura de mercado, e maior exposição do produto.
Os distribuidores vendem para o atacado e para o varejo, e em algumas situações,
vendem para grandes lojas de varejo cujo setor de compras não é centralizado, ou em grandes
lojas de varejo que atuam em uma única região como, por exemplo, a rede de varejo Coop
(Cooperativa de Consumo) que possui aproximadamente 20 lojas na região do grande ABCD
e, é atendida por distribuidor.
Verifica-se através dos dados coletados, que o distribuidor atua como parceiro da
indústria, realiza serviços de reposição e troca de mercadoria, entrega, acompanha validade do
produto, tem fidelidade ao fabricante, trabalha para que lançamentos do fabricante sejam
colocados no mercado e respeita política de marketing da empresa fabricante.
O gerenciamento deste sistema de canal passou a ser realizado por uma equipe de
supervisores da empresa “A”, que criou um departamento específico para acompanhar o
trabalho dos distribuidores. Na criação deste departamento a empresa aproveitou funcionários
das filiais e da equipe de vendas direta da matriz em São Paulo. Com esta forma de
gerenciamento, a empresa continuou a ter, de modo ainda mais preciso, dados sobre o
mercado, em outras palavras, passou a venda de seus produtos para intermediários e
continuou a ter as informações necessárias para não perder o controle do mercado.
Pôde-se observar através das entrevistas, que o custo para manutenção desta equipe é
relativamente baixo, principalmente, pelo volume de produto que a empresa passou a negociar
e considerando-se que a empresa apenas remanejou funcionários para funções diferentes.
Por outro lado, a mudança de canal também propiciou a empresa “A” vantagem
competitiva, já que o distribuidor pode ser visto como uma extensão da empresa e possibilita
a chegada do produto nos pontos de venda antes da concorrência, além de ser mais eficiente
para realização das tarefas de distribuição do produto no varejo. O distribuidor estabelece uma
parceria com a indústria, atuando como uma extensão da mesma, estabelecendo uma aliança
estratégica entre ambos na busca de objetivos comuns.
Com a mudança de canal, a empresa obteve resultados positivos, como aumento
significativo do volume de vendas conforme figura 1, melhorou significativamente sua
distribuição numérica, fortaleceu sua marca e passou a gerar lucros no atendimento do
mercado interno.
Figura 12 – Evolução de vendas.
V E N D AS E M T O N E L AD AS
1 8 .0 0 0 ,0 0
1 6 .0 0 0 ,0 0
1 4 .0 0 0 ,0 0
1 2 .0 0 0 ,0 0
1 0 .0 0 0 ,0 0
8 .0 0 0 ,0 0
6 .0 0 0 ,0 0
4 .0 0 0 ,0 0
2 .0 0 0 ,0 0
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
50
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Fonte: elaborado pela autora com base em relatórios da empresa “A”.
Verifica-se através da figura 1, que o volume de vendas da empresa no período
analisado cresceu significativamente. Constatou-se, com base nos dados coletados e nas
entrevistas realizadas, que três foram os fatores que levaram empresa a atingir tal volume de
vendas: o lançamento de um produto mais regional, uma campanha publicitária adequada e
uma melhor distribuição do produto.
O distribuidor foi considerado, por todos os entrevistados, peça fundamental no
processo de mudança. Já que a empresa tinha o produto e a propaganda e só foi possível
aumentar o volume de vendas quando a parceria com os distribuidores foi estabelecida,
mediante uma política de distribuição definida.
A empresa “A” além de conseguir conquistar mercado para seus produtos, também
conseguiu gerar lucro com a operação de venda a varejo no mercado interno, conforme se
verifica na figura 2.
Figura 13 - Lucro Operacional.
15%
14%
12%
11%
12%
10%
7%
8%
5%
0%
1988
1989
1990
-5%
-10%
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
-5%
-9%
-10%
-14%
-15%
-20%
Fonte: elaborado pela autora com base em relatórios da empresa “A”.
Os resultados até aqui apresentados, demonstram que o distribuidor pode ser
considerado como alternativa para obtenção de vantagem competitiva pelos fabricantes. A
estratégia adotada pela empresa pesquisada, que optou pela utilização do distribuidor em
substituição à força de venda própria, firmando parcerias com os mesmos para distribuição do
produto no mercado de varejo foi bem sucedida, levando a mesma a uma posição de liderança
no segmento de mercado em que atua.
Conclusões Finais.
O desenvolvimento da presente pesquisa demonstrou que, para a empresa “A”, a
mudança de canal de distribuição com substituição da força de venda própria por
distribuidores levou a empresa a obter vantagem competitiva, posicionando a mesma como
líder de mercado no segmento em que atua.
A constatação de que o distribuidor pode ser considerado como fonte de vantagem
competitiva pela empresa fabricante corrobora com a pesquisa de BARRIZZELLI (1999), que
indica o intermediário como uma variável estratégica da indústria e, com as afirmações de
TONIN (1999), coloca o distribuidor como alternativa estratégica para distribuição do
produto.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
51
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
Através das entrevistas realizadas, constatou-se que o distribuidor é fundamental para a
obtenção desta vantagem competitiva, pois pode ser visto como uma extensão da empresa,
possibilitando a chegada do produto nos pontos de venda antes da concorrência, uma vez que
o distribuidor é mais eficiente para realização das tarefas de distribuição do produto no varejo
que a empresa fabricante.
A idéia de eficiência do distribuidor destacada pelos entrevistados vai ao encontro das
afirmações de SEMENIK & BAMOSSY (1996), nas quais os intermediários são considerados
mais eficientes para desempenharem as funções do canal de distribuição em razão de aspectos
como especialização, economia de escala, e redução de custos das transações associadas à
venda do produto.
O estudo empírico realizado junto à empresa “A”, permitiu a visualização dos resultados
que podem ser obtidos através da substituição da força de venda própria por distribuidores, e
da formação de alianças estratégicas entre ambos.
Apurou-se, com base na análise das entrevistas realizadas e em dados coletados, que a
empresa pesquisada utilizava o canal de venda direta ao varejista e de venda para as lojas de
atacado, através de seu escritório central (Matriz) na cidade de São Paulo e de suas filiais
próprias.
Levada por fatores como baixo volume de vendas, necessidade de melhorar a
distribuição numérica, desenvolver mercado para os produtos da empresa e gerar lucros, a
empresa “A” nomeou distribuidores para realizar tarefas de distribuição dos seus produtos em
várias regiões do país. Além destes fatores, a empresa também se baseou no modelo de
distribuição adotado por outra empresa do grupo.
Outros fatores como a realização propaganda na mídia, lançamentos de novos produtos
mais regionais e custo da estrutura de canal anterior, também foram considerados relevantes.
Entretanto, observou-se através da pesquisa realizada que estes fatores não justificariam a
substituição da força de venda própria por distribuidores.
Entretanto, aspectos como a extensão territorial do país e as diferenças regionais e
culturais, contribuíram de forma mais incisiva para a mudança de canal. Assim como o fato
do distribuidor realizar as tarefas de distribuição do produto no varejo com maior eficiência, e
do atacado não realizar as mesmas funções que os distribuidores.
Na transição de canal, os critérios utilizados para contratação dos distribuidores foram:
avaliação de crédito dos distribuidores, linha de produto com que trabalhavam, indicação de
clientes, indicação de outros fabricantes, qualidade dos serviços prestados, a área de atuação e
se tinham características de parceiros da indústria.
Após a contratação dos distribuidores, foram repassadas para os mesmos as funções de
negociação, posse, financiamento, logística, promoção informações de mercado e pós-venda.
Com o repasse das funções de distribuição, para que a empresa “A” não perdesse o controle
do mercado para gerenciamento do sistema de canal adotado, foi criada uma equipe própria de
supervisores para acompanhamento do trabalho dos distribuidores. Verificou-se através da
pesquisa realizada que, a utilização de distribuidores com esta forma de gerenciamento,
permitiu à empresa “A” um maior controle sobre o mercado, com baixo custo operacional.
Os principais resultados obtidos através da mudança de canal, verificados através da
pesquisa, foram o aumento da distribuição numérica, com maior cobertura do mercado,
aumento considerável do volume de vendas e a obtenção de lucros na venda dos produtos,
além de fortalecimento da marca e valorização da empresa pesquisada.
Através da parceria estabelecida com seus distribuidores, a empresa “A” conseguiu ser
melhor representada no mercado em que já atuava, além de conquistar novos mercados para
seus produtos. Resultados estes que se confirmam nas afirmações de STERN et. allii. (2002),
onde um distribuidor pode oferecer melhor cobertura a um custo mais baixo, sendo que os
fabricantes tendem a estabelecer uma aliança com distribuidores, para motivá-los na melhoria
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
52
Nilza A Santos Siqueira - Mauro Neves Garcia
da representação nos mercados que já atuam ou em novos mercados, e também no lançamento
de novos produtos.
Embora outros estudos sobre os canais de distribuição apontem para os intermediários,
que compõem o canal como sendo empresas independentes que buscam maximizar
individualmente seus lucros (ALMEIDA, 1999), no caso da empresa "A", mesmo com os
distribuidores sendo empresas independentes, a parceria estabelecida com os mesmos
propiciou maior cobertura do mercado, com aumento significativo das vendas e redução de
custo, além da empresa manter o controle de mercado, já que fabricante e distribuidor
trabalham como parceiros.
O presente estudo demonstrou que a decisão da empresa em substituir a força de vendas
própria por distribuidores foi correta. Propiciando resultados satisfatórios e colocando a
empresa em situação de destaque no mercado de temperos.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, A.M.P. Sistemas de Canais de Distribuição: Um estudo de Caso na Indústria
Alimentícia Mineira. Caderno de Pesquisas em Administração. São Paulo, v.1, no. 8, 1o.
trim./99.
BERMAN, B. Marketing Channels. John Eilley & Son, 1996.
BOWERSOX, D.J.; CLOSS, D.J. Logística empresarial: o processo de integração da cadeia
de suprimento. São Paulo, Atlas, 2001.
BOWERSOX, D.J.; COOPER,M.B. Logistical management:the integrated suplly chain
process. New York, McGraw-Hill, 1992.
CUNDIF, D.; STILL, H; GOVONI, R. Marketing Básico. São Paulo: Atlas, 1992
DIAS, S.R. Estratégia e canais de distribuição. São Paulo, Atlas, 1993.
FLEURY, P.F.SILVA, C.R.L. O estágio de desenvolvimento da organização logística em
grandes empresas brasileiras. Revista Brasileira de Administração Contemporânea. João
Pessoa, ANPAD, setembro 1995.
HUNT, K. A. The relationship between channel conflict and information processig. Journal of
Retailing, p417-436, 1995.
KOTLER, P. Administração de Marketing. São Paulo, Prentice Hall, 2000.
MCCALLEY, Russell W. Marketing channel management: people, products, programs, and
markets. Wesport, CT:Praeger Publishers, 1996.
MEHTA, R.; LARSEN, T.; ROSENBLOON. The influence of leadership style on
cooperation in channel of distribution. International Journal of Physical Distribution
&logistics Management 26, n6, p.32-59, 1996.
MOHR, J.; NEVIN, J.R. Comunications strategies in marketing channels: a theoretical
perspective. Journal of Marketing, p 36-51, 1990.
MULLEER-HAGEDORN, L. The variety of Distributio Systems. Journal of Institutional and
Theoretical Economics, v. 151, n.1, p187-202, 1995.
NOVACK, R.A .; RINEHART, L.M.; WELLS, M.V. Rethinking concept foundations in
logistics management. Journal of Business Logistics, v.13, n2, p.233-267, 1992.
PORTER, M.E.Vantagem Competitiva. Rio de Janeiro, Campus, 1992.
RANGAN, V.K.; MENEZES, M.A.J.; MAIER, E.P. Channel selection for new industrial
products: a framework, method, and application. Journal of Marketing, v. 56, p.69-82, 1992.
ROSENBLOON, B. Canais de marketing: Uma visão gerencial. São Paulo, Atlas, 2002.
SEMENIK R.J.; BAMOSSY, G. J. Princípios de Marketing: uma perspectiva global. São
Paulo: Makron Books, 1996.
STERN, L.W. ;EL-ANSARY; A. I. COUGHLAN, A. T. Marketing Channel. 5ed. New
Jersey: Prentice Hall , Inc., 1996.
Revista Administração On Line, São Paulo. v. 04, n. 03, p. 38-53, jul./ago./set. 2003
53
Download

Revista Volume 04 Número 03