PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRT DA 12ª REGIÃO
6ª VARA DO TRABALHO DE FLORIANÓPOLIS - SC
S E N T E N Ç A (RITO ORDINÁRIO)
Reclamante: DÉBORA PATRÍCIA ALVES
Reclamado: GFK INDICATOR LTDA.
Processo nº RT 06919-2009-036-12-00-7
Vistos etc.
DÉBORA PATRÍCIA ALVES, qualificada na petição inicial, propõe
ação trabalhista em face de GFK INDICATOR LTDA., igualmente qualificada,
alegando e postulando tudo quanto constante na exordial, relativamente ao
alegado contrato de trabalho de 01.06.2005 a 26.07.2007, exercendo funções de
pesquisadora. Em decorrência dos fatos expostos na exordial, vindica o
reconhecimento do vínculo de emprego no período sobredito, com o conseqüente
registro na CTPS, e o pagamento de todas as verbas/parcelas descritas às fls.
09-10 dos autos. Atribui à causa o valor de R$ 17.000,00.
Sem sucesso a primeira proposta de acordo (fl. 35), a reclamada
apresenta defesa escrita às fls. 50-71 dos autos, com manifestação autoral às fls.
87-99.
No curso da instrução processual, juntam-se documentos, e ouvemse as partes e testemunhas (fls. 100-2 e verso).
Razões finais remissivas, com os acréscimos constantes na ata de
fl. 102.
Inexitosa a derradeira proposta de conciliação.
Sentença de fls. 105-7 e decisão de embargos de declaração de fls.
110 e verso.
O e. TRT, consoante acórdão de fls. 136-7, anula a sentença, por
cerceamento do direito de defesa, e determina o retorno dos autos à Vara do
Trabalho de origem para oitiva da testemunha dispensada na audiência de
instrução.
Testemunha ouvida às fls. 140 e verso.
Autos conclusos para novo julgamento.
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É o relatório.
DA FUNDAMENTAÇÃO:
I - PRELIMINARMENTE:
DA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. DA CARÊNCIA DE
AÇÃO.
Suscita, a demandada, sua ilegitimidade para figurar no pólo passivo
da relação processual, eis que não manteve relação de emprego com a
demandante. Em razão desse fato, argui, também, a falta de interesse processual
da autora.
O interesse de agir em Juízo, segundo Liebman, surge da
necessidade de obter através do processo a proteção ao interesse substancial ou
primário.
Na espécie, nítida a necessidade do(a) reclamante de utilizar o
processo para ver satisfeito o seu pedido mediato.
A legitimidade das partes, usualmente denominada legitimação para
a causa ou “legitimatio ad causam”, nos dizeres de Alfredo Buzaid, “é a
pertinência subjetiva da ação”. Legitimados ao processo são os sujeitos da lide,
isto é, os titulares dos interesses em conflito. Segundo as lições de Moacyr
Amaral Santos, via de regra, a legitimação ativa caberá ao titular do interesse
afirmado na pretensão, e a passiva ao titular do interesse que se opõe ou resiste
à pretensão.
No caso dos autos, a reclamante é a titular do interesse afirmado na
pretensão e a reclamada é a titular do interesse que se opõe a essa pretensão,
restando configuradas as identidades dos sujeitos da relação processual com os
titulares dos interesses em conflito.
REJEITO.
II - NO MÉRITO:
DO VÍNCULO DE EMPREGO. DA ANOTAÇÃO NA CTPS E DOS
CONSECTÁRIOS LEGAIS.
Pretende, a reclamante, o reconhecimento do vínculo de emprego
com a reclamada. Para tanto, afirma que trabalhou de 01.06.2005 a 26.07.2007,
na função de pesquisadora, fazendo pesquisas de mercado de produtos e
marcas das mais diversas, em estabelecimentos comerciais de Florianópolis,
recebendo ordens da reclamada, mediante retribuição mensal, sem que, no
entanto, fosse procedido o devido registro em sua CTPS.
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Assevera, ainda, que tinha seus horários e tarefas diárias
controladas pela requerida.
Pelo que, com base no exposto, afirmando presentes os
pressupostos insculpidos no art. 3º da CLT, o que aponta para uma verdadeira
relação laboral, pugna pela procedência do pedido, com o pagamento dos
consectários legais, considerando ainda, o labor diário de 13 horas, sem intervalo
intrajornada, tampouco pagamento das horas extras.
A reclamada nega o vínculo de emprego. Informa que a
demandante procedia a análises e cruzamento de dados coletados por outras
empresas, jamais mantendo relação jurídica laboral com a ré.
Noticia ter havido apenas verdadeiro contrato de prestação de
serviços autônomos, destacando que a reclamante exercia tais atividades de
acordo com seu interesse, inexistindo fiscalização quanto a dias e horários em
que laborava, bem como, qualquer dos elementos caracterizadores de uma
relação de emprego.
Por fim, destaca que a empresa sequer possui filial ou agência, ou
ainda preposto em Florianópolis, tendo sua sede fixada na cidade de São Paulo.
Observo que a documentação acostada às fls. 72-82, dá conta de
pagamento feito a autônomo, por serviços prestados, não se constituindo,
referidos documentos, suficientes para provar a tese autoral.
Ao contrário, de acordo com a alegação exordial, o salário era de
R$ 1.300,00 (R$600,00 de salário e R$700,00 de ajuda de custo), não havendo
prova segura de que a reclamante recebesse esse montante mensalmente.
Destaco que também a relação colacionada à manifestação de fls.
88-92, só indica ter havido alguma prestação de serviços pura e simplesmente,
não havendo indicação sequer das empresas relacionadas a tais serviços e,
principalmente, para quem foram prestados.
Firmo convencimento, também, de que inverídicas as alegações da
autora, constantes de seu depoimento à fl. 100, de que procedia de 18 a 20
visitas a supermercados diferentes diariamente, eis que a testemunha ouvida no
interessa da reclamante, afirma à fl. 101:
“[...]nas reuniões, a ré cobrava que a reclamante fizesse pelo menos
uma média de 18 lojas por dia;[...]em média, a reclamante levava,
no mínimo, 45 a 50min para fazer a pesquisa em uma loja, porque
ela preenchia muitos itens; em um supermercado grande, a autora
levaria mais de 2h para executar a pesquisa;[...]”
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Ora, traçando uma média de tempo para cada visita, considerandose as informações da testemunha da autora (de 45 minutos a duas horas para
executar uma pesquisa), tenho que a autora não levava menos de 1 hora/1hora e
vinte minutos em cada visita.
Pois bem, considerando que a demandante fosse cobrada para
fazer as 18 visitas por dia, conforme informado por sua testemunha e afirmado
em seu depoimento pessoal, e, levando cada visita em torno de 1 hora a 1 hora
e vinte minutos, a autora trabalharia, por dia, no mínimo, 18 horas e não as 13
noticiadas à peça inicial. Saliento que essa média não considera o tempo de
locomoção de um para outro local, tampouco as duas horas nos clientes maiores
(fl. 101), o que aumentaria, em muito, a jornada de trabalho.
Também é de se ver que, no mínimo, contestáveis as informações,
no que toca ao cumprimento de horário e fruição de intervalo intrajornada,
conforme se depreende do depoimento pessoal da reclamante, à fl. 100, in
verbis:
“[...]geralmente trabalhava das 8h às 20h, de segunda-feira a sextafeira, com 15min de intervalo intrajornada, no próprio local de
trabalho, e sábados 6h diárias;[...]”(grifei)
Pergunto: Qual era o local de trabalho? Se a autora prestava
serviços externos, se a empresa não possuía agência ou sede em Florianópolis,
se as orientações eram recebidas via “palm”, tenho que não havia um local de
trabalho, o que aponta para outra informação equivocada.
Caso isso não bastasse, resta claro que não havia controle de
horário de trabalho.
O testemunho da Sra. Magali, constante à fl. 101-verso, esclarece
tal fato:
“[...]a ré não tem controle das atividades diárias dos pesquisadores,
normalmente envia os dados através do ‘palm’ e o pesquisador
realiza a coleta de dados e envia o resultado para a reclamada, pelo
sistema; [...] a ajuda de custo era paga mediante a comprovação de
despesas; [...] a empresa não tinha controle da jornada de trabalho
dos pesquisadores porque era por volume de tarefas; a empresa
não fiscalizava se o pesquisador trabalhava todos os dias; se o
pesquisador não pudesse fazer a coleta de dados, o pesquisador
poderia indicar outra pessoa para fazer o serviço; a reclamada não
proibia o pesquisador de realizar serviços para outra empresa
concorrente;[...]”
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Tal testemunho, serve para arrematar os fatos já demonstrados,
restando evidente que não havia sujeição da reclamante a horário de trabalho
determinado pela reclamada e, portanto, inexistente a subordinação jurídica.
Oportuno referir que de nenhuma credibilidade o testemunho da
Sra. Ana Carolina, às fls. 140 e verso. A testemunha em questão afirmou que a
reclamante começou a trabalhar em junho de 2005 e parou em julho de 2007; no
entanto, quando indagada a respeito da data da sua admissão,
surpreendentemente, ela não recordou o mês em que começou a trabalhar,
apenas lembrou ter deixado de trabalhar em junho de 2007.
Ora, como pode a testemunha não lembrar quando foi admitida pela
reclamada e, no entanto, curiosamente, recordar quando a reclamante foi
admitida e dispensada?
A testemunha demonstra conhecer mais os fatos relacionados à
suposta relação de emprego da autora do que da sua própria relação de
emprego.
Essa conduta da testemunha evidencia que suas declarações são
falaciosas e, portanto, imprestáveis como meio de prova.
Assim, difícil crer verazes as alegações da autora, bem como as da
última testemunha ouvida.
Dessarte, não resta configurada a subordinação jurídica, traço
marcante da relação de emprego (art. 3º da CLT).
INDEFIRO, portanto, o pleito pelo reconhecimento de vínculo
laboral, e, por acessórias, as demais pretensões relativas aos itens “c” a “h.7” e
“i”.
DA INDENIZAÇÃO POR DANOS CONFORME ARTIGOS 186 E
927 DO CÓDIGO CIVIL.
Não há qualquer indício de dano causado à autora pela reclamada.
Assim, ausentes os pressupostos insculpidos nos dispositivos
referidos pela autora, INDEFIRO a pretensão.
DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA.
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Em razão da declaração de miserabilidade, constante à fl. 12,
DEFIRO à reclamante os benefícios da Justiça gratuita, com fundamento no
parágrafo terceiro do artigo 790 da CLT, razão pela qual fica dispensada do
pagamento das custas processuais.
DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
INDEFIRO o pedido de pagamento dos honorários advocatícios,
porquanto, no processo trabalhista, estes são devidos apenas nas hipóteses
previstas nas Leis 1.060/50 e 5.584/70, sob a forma de honorários de assistência
judiciária, quando apresentada credencial outorgada pelo Sindicato da categoria
profissional ao advogado do trabalhador, o que não ocorreu no caso dos autos.
Ademais, o artigo 133 da Constituição Federal recepcionou o art.
791 da CLT, que consagra o “jus postulandi” das partes, não sendo, portanto,
obrigatória a presença do advogado em sede trabalhista (vide súmulas 219 e 329
do C. TST).
Finalmente, na situação específica dos autos, de qualquer sorte, os
honorários advocatícios seriam indevidos, visto haverem sido indeferidos os
pleitos formulados pela autora.
ANTE O EXPOSTO, DECIDO, nos termos da fundamentação, a
qual passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse transcrita,
REJEITAR a preliminar arguida, e, NO MÉRITO, JULGAR PROCEDENTES, EM
PARTE, os pedidos referentes à ação trabalhista proposta por DÉBORA
PATRÍCIA ALVES contra GFK INDICATOR LTDA., para tão somente conceder à
reclamante os benefícios da Justiça Gratuita. Custas, pela reclamante, de R$
340,00 fixadas com base no valor atribuído à causa na petição inicial (R$
17.000,00), e dispensadas. Após o trânsito em julgado, devolvam-se os
documentos e arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Nada
mais.
JULIETA ELIZABETH CORREIA DE MALFUSSI
Juíza do Trabalho
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