5 SOLUÇÃO DA EQUAÇÃO DE SCHRÖDINGER PARA DIVERSOS
PROBLEMAS
À título de ilustração a equação de Schrödinger será resolvida para diversos tipos de forças atuando sobre
uma partícula.
5.1 POÇO DE POTENCIAL
Uma partícula é dita livre quando sobre ela não existe nenhuma influência, nenhuma ação. De outro modo, se
numa certa região do espaço existir um campo de forças ele influirá sobre os corpos que possuem a
propriedade suscetível à sua ação. Por exemplo o campo gravitacional atua sobre os corpos que tem massa, o
campo elétrico sobre as partículas que tem carga e o campo magnético sobre os ímãs.
A idéia do efeito, criado por um campo, pode ser melhor visualizada através da seguinte imagem: tem-se um
colchão plano horizontal, uma bolinha de gude colocada em qualquer ponto de sua superfície aí
permanecerá, se porém antes de realizar esta experiência tiver sido colocada sobre o colchão uma grande
bola de boliche, a bolinha não permanecerá no ponto em que ela for deixada mas tenderá a descer para o
buraco formado pela pesada bola. Esse exemplo evidencia a influência que um corpo, no caso a bola de
boliche, pode exercer à sua volta e portanto o campo que ele pode criar.
Um campo é considerado conservativo quando a energia da partícula presente só depende da sua posição na
região em que o campo atua, e nesse caso a energia é uma função da posição. Isso quer dizer que, ao realizar
um caminho fechado dentro do campo, a partícula volta à sua energia inicial, ou seja, ela não perde energia
num circuito fechado, daí o nome de campo conservativo.
Para os campos conservativos é definida a grandeza física “potencial”, V(r) , que é função só da posição e
que está relacionada à força que atua sobre a partícula através da seguinte expressão:
∂V ( r )
(5.1)
∂r
Essa expressão será usada sempre que se desejar conhecer o potencial, ao qual está submetida uma partícula,
a partir da força que atua sobre ela e vice versa.
F=−
5.2 PARTÍCULA LIVRE
Partícula livre é aquela que não está submetida a nenhuma força. Fazendo F=0 na expressão (5.1) obtém-se
que V(r) deve ser constante. No nosso caso, para simplificar a solução, escolheremos essa constante igual a
zero, o que não altera as soluções do problema.
Considerando-se o movimento da partícula como unidimensional, ou seja, tendo-se somente x como variável,
as derivadas parciais transformam-se em derivadas totais. Assim, substituindo-se V = 0 na equação de
Schrödinger (4.25) obtém-se:
2 2
− h d Ψ = EΨ
2m dx 2
52
e introduzindo-se a constante
k = 2mE
h2
a equação anterior pode ser rescrita na seguinte forma:
d 2Ψ = k 2 Ψ
dx 2
cujas soluções podem ser :
Ψ = A sen kx
(5.2)
(5.3)
Ψ = A cos kx
(5.4)
ou uma combinação linear dessas expressões que corresponde a uma solução mais geral. Assim :
Ψ = A sen kx + B cos kx
(5.5)
é uma solução que contem quantidades imaginárias ou complexas.
Se lembrarmos que e ikx = cos kx + sen kx
apresentada na seguinte forma:
e
e − ikx = cos kx − sen kx
a expressão (5.4) pode ser
Ψ = A , eikx + B , e − ikx
(5.6)
Na verdade esta solução é somente uma parte da solução, é a parte espacial. Se lembrarmos que toda onda
tem uma freqüência ν , podemos acrescentar um termo de variação temporal multiplicando a expressão
anterior por e −2πiνt e obter uma nova função, agora porém com a seguinte forma:
Ψ = A , e ikx e 2πiνt + B , e − ikx e 2πiνt
substituindo 2πν = ω ela se torna:
Ψ = A ,e
i  ωt + kx 
+ B ,e
i  ωt − kx 
(5.7)
Para se interpretar este resultado, que é a solução do problema proposto, pode-se observar que a equação
(5.7) representa a soma de duas ondas progressivas. Aquela correspondente ao primeiro termo é uma onda
que está se movendo no sentido negativo do eixo x com uma certa amplitude A’ e aquela representada pelo
segundo termo refere-se a outra onda com amplitude B’ movendo-se no sentido positivo. Esta soma
representa uma onda estacionária cuja amplitude depende das amplitudes A’ e B’.
É importante agora determinar-se a energia da partícula livre. Lembrando que o número de onda k vale 2π
/λ e comparando com o valor de k obtido da equação (5.2) obtém-se a seguinte igualdade:
2π =
λ
2mE
h2
que implica em
53
2
E= h
2mλ2
ou
E=
p2
2m
(5.8)
onde p é o momento linear de uma partícula.
Pode-se perceber que não existe nenhuma restrição aos valores de p e portanto aos da energia E. Isso é
conseqüência do fato de não ter sido imposta nenhuma condição de contorno já que o potencial era nulo em
todo o espaço.
2
Classicamente a energia de uma partícula livre é sua própria energia cinética E = mv que pode ser escrita
2
da mesma forma que a expressão quântica (5.8). O gráfico de E em função do momento linear está
representado por uma linha contínua na figura 5.1.
Fig. 5.1 -Energia de uma partícula em função de seu momento linear para uma partícula livre (---) e para uma
partícula numa caixa ( ⊕ ).
5.3 POÇO DE POTENCIAL INFINITO
O poço de potencial infinito é um problema bastante simples mas de grande significado que pode ser
resolvido utilizando-se a equação de Schrödinger .
Na prática esse tipo de potencial não existe mas ele pode ser utilizado para tratar partículas fortemente
ligadas, ou seja, partículas que precisariam receber uma grande energia para se desligar, pois nesse caso o
poço infinito é uma boa aproximação.
Esse potencial pode ser representado pela figura 5.2, ao lado onde :
para x < 0 e x > L V = ∞
e para 0 < x < L V = 0
Pode-se tentar agora encontrar a função de onda que descreve o comportamento de uma partícula submetida
a esse potencial a partir da equação de Schrödinger, substituindo o valor de V.
Fig. 5.2 – Potencial de uma partícula presa numa caixa de largura L e altura infinita
54
2  d 2 Ψ( x ) 
h

 + V ( x )Ψ( x ) = EΨ( x )
−
2m  dx 2 


Analisando o problema nas diferentes regiões:
para x < 0 e x > L a função deve ser nula porque a partícula não pode estar nessa região, então a solução é
Ψ1 = 0 ;
2
para 0 < x < L a equação é igual a de uma partícula livre d Ψ = k 2 Ψ cujas soluções possíveis são:
dx 2
Ψ2 ( x ) = A sen kx
Ψ2 ( x ) = A cos kx
(5.4)
Chegado a esse ponto é necessário impor as condições de continuidade nas fronteiras do poço. Essas
condições impõe que a função de onda válida à esquerda do ponto zero apresente o mesmo valor que a
função de onda válida direta para x = 0; essa mesma condição deve valer no ponto x = L que é uma outra
fronteira, assim como para as derivadas das funções de onda. Essas condições implicam que na fronteira não
pode haver nem descontinuidade na função de onda nem mudança brusca na sua inclinação.
Desse modo a continuidade da função de onda implica em:
Ψ1( x ) = Ψ2 ( x )
tanto para x = 0
⇒
Ψ1( 0) = Ψ2 ( 0)
como para x = L
⇒
Ψ1( L) = Ψ2 ( L)
que por sua vez implica em :
0 = Asen(k.0)
e
0 = Bcos(k.0)
dessas duas condições só a primeira é possível para valores de A não nulos, então consideraremos como
válida a solução
Ψ2 ( x ) = A sen kx
Impondo-se a essa função a condição de continuidade em L obtém-se:
Ψ1( L) = Ψ2 ( L) ⇒ 0 = A sen (kL) ⇒
kL = n π ⇒
k n = nπ
L
com
n= 1,2,3....
(5.9)
Isso quer dizer que só alguns valores de número de onda, k, são aceitáveis, os que obedecem às condições de
contorno. Assim nossa função de onda solução do problema dentro do poço é:
Ψ( x ) n = A sen k n x
(5.10)
Para determinar o valor de A é preciso impor a condição de normalização (4.27), qual seja, a integral da
densidade de probabilidade da função de onda sobre todo o eixo x deve ser igual a um. o significado da
normalização é que afirma-se que a probabilidade da partícula estar em algum
55
ponto do eixo é 1, ou seja, seguramente a partícula está em algum ponto do espaço.
L
L
∞
∗
2
2
∫0 PdV = ∫ ΨΨ dV = ∫ A sen ( k n x )dx =1
0
0
L
L
2
2
1
L
pode-se provar que
∫ sen ( k n x)dx = A 2
∫ sen ( k n x )dx = 2
0
0
donde se obtém, como resultado da normalização: A =
2
L
Portanto a solução para o poço infinito é:
Ψn ( x ) =
nπ
2
sen(
x)
L
L
onde
n = 1,2,3.....
(5.11)
determinando-se a energia correspondente utilizando-se as equações (5.2) e (5.9) chega-se a:
2 2
E = h n2
8mL
onde
n = 1,2,3.....
(5.12)
Esta expressão (idêntica à 3.51) significa que a energia de uma partícula num poço de potencial infinito é
quantizada e seu valor no estado fundamental (para n = 1) não é nula, ou seja, a energia mínima não é zero.
Isto está coerente com o princípio de incerteza que diz que se fosse possível determinar o momento, e
portanto a energia, com incerteza zero, E poderia ser nula, e a incerteza na posição deveria ser infinita.
Estes valores colocados num gráfico de E em função de p (momento linear) correspondem aos pontos na
figura 5.1. O fato dos pontos caírem exatamente sobre a curva traçada para uma partícula livre significa que
os valores de energia que uma partícula numa caixa de paredes infinitas pode ter são os mesmos que os de
uma partícula livre, com a diferença que nem todos são permitidos.
Também podem ser obtidos os gráficos da função de onda (equação 5.11) e da densidade de probabilidade
(equação 4.26) para diversos valores de n, figura 5.3.
Não é possível obter significado físico do gráfico de Ψ pois pode ser uma função imaginária, porém a curva
que representa a densidade de probabilidade P = ΨΨ ∗ indica para cada valor de x a densidade de
probabilidade da partícula estar naquele ponto. O valor de n está associado ao estado, assim n = 1 indica o
estado 1 cuja energia é E1 e cuja função de onda é Ψ1 e assim sucessivamente. Como pode ser observado,
para uma partícula dentro de um poço de potencial infinito a probabilidade dela estar fora da caixa é zero.
56
Fig. 5.3 - Função de onda e densidade de probabilidade para uma partícula num poço de potencial infinito
para os valores de n =1 curva (a), n =2 (curva b) e n =3 curva (c)
5.4 POÇO DE POTENCIAL FINITO
Tornando mais realístico o modelo de uma partícula num poço de potencial o suporemos de valor finito, ou
seja, como se as paredes da caixa não fossem perfeitamente rígidas.
Fig. 5.4. - Potencial para um poço finito de largura L
A formulação é basicamente a mesma que no caso anterior, só que agora o potencial não é infinito, mas sim
V0, então a função de onda fora do poço não é nula. Impondo esse valor à equação de Schrödinger chegamos
à diferentes tipos de equações e, portanto, diferentes soluções em cada região.
57
d 2 Ψ ( x ) V0 2m
− 2mE
−
Ψ (x ) =
EΨ ( x )
2
2
2
h
dx
h
Para x < 0 e x > L V =V0
d 2 Ψ( x )
− α 2 Ψ( x ) = 0
2
dx
e para 0 < x < L
V=0
α=
onde
d 2 Ψ( x )
+ k 2 Ψ( x ) = 0
dx 2
ou
2m(V0 − E )
h2
onde k = 2mE
h2
Escrevendo as soluções em cada região obtém-se:
para x < 0
Ψ− = A− e αx + B− e − αx
(5.13)
para 0 < x < L
Ψ0 = A0 sen kx + B 0 cos kx
(5.14)
para x > L
Ψ+ = A+ e αx + B + e − αx
(5.15)
Para determinar os valores das diferentes constantes A- , B- , A+ , B+ , A0 e B0 , é preciso impor as condições
de contorno à essas soluções, que, no caso, são a exigência de continuidade da função de onda e de sua
derivada nos pontos x = 0 e x =L , ou seja, a solução pela esquerda deve coincidir com a solução pela
direita nesses pontos, o mesmo devendo ser imposto à derivada da função de onda. Isso pode ser escrito da
seguintes forma:
Ψ− ( x = 0) = Ψ0 ( x = 0)
dΨ−
dx
=
( x = 0)
dΨ0
dx
e
Ψ0 ( x = L) = Ψ+ ( x = L)
e
dΨ0
( x = 0)
dx
=
( x = L)
dΨ+
dx
( x = L)
É preciso impor também que, para x tendendo a infinito, a função de onda tende a zero, o que significa que a
probabilidade de se encontrar a partícula num ponto distante da caixa diminui a medida que esse ponto se
afasta da caixa. Isto pode ser escrito como:
Ψ− ( −∞) = 0
Ψ+ ( +∞) = 0
o que implica em que B = 0
−
o que implica em que A = 0
+
Impondo as condições de contorno às soluções obtém-se:
A sen kL + B cos kL = B e -aL
0
0
+
A =B
−
0
αA = kA
−
0
kA cos kL - kB sen kL = - αB e - aL
0
0
+
58
substituindo
B = A = k A e dividindo toda a expressão por -α obtém-se:
0
− α 0
A sen kL + k A cos kL = B e -aL
0
+
α 0
k 2 A sen kL - k A cos kL = B e -aL
0
+
α 0
α2
Igualando os primeiros termos dessas equações chega-se a:


2
A  1 - k  sen kL + 2 k cos kL = 0
0 
α
α2 


Como A0 não pode ser nula senão A0 e B0 também seriam nulos, a expressão entre colchetes deve ser igual a
zero:
 α 2 - k 2  sen kL = - 2 kα cos kL que implica em



Fazendo uma mudança de variáveis :
pode-se escrever:
α = α0 1− ξ
α0 =
tg kL =
2mV0
h2
2kα
k 2 − α2
e
ξ= E
V
0
k = α0 ξ
donde se obtém:
(
)
tg α 0 L ξ =
2α 2 0 ξ (1 − ξ )
α 02 (ξ − 1 + ξ )
=
2 ξ (1 − ξ )
2ξ − 1
esta equação tem solução numérica porém pode ser resolvida através de solução gráfica como será mostrado
a seguir.
Chamando-se os dois termos da equação acima de f(ξ) chega-se a:
(
)
tg α L ξ = f ( ξ)
0
2 ξ(1 − ξ)
(5.16)
2ξ − 1
= f (ξ)
(5.17)
o gráfico de f(ξ) em função de ξ (figura 5.5) fornece duas curvas, uma para cada função. A solução deste
problema é dada pelos valores de ξ e de f(ξ) correspondentes aos pontos comuns às duas curvas, ou seja,
aos pontos de intercessão que são os valores que satisfazem simultaneamente as duas funções.
A solução pode ser analisada para diversos valores de V0.
Se V0 for pequeno o poço é raso e nesse caso pode-se supor que
59
2 2
V < h π o que implica
0 2mL2
que
2mV L < π
h2
A título de exemplo suporemos
(
π/4 e a tg α 0 L ξ
)
α0L < π.
ou seja
α L= π
0
4
e nesse caso se ξ variar de 0 a 1 , α 0 L ξ variará de zero a
variará de zero a tg (π/4) que é igual a 1. Na figura 5.5 o gráfico de f(ξ) em função de
ξ de acordo com a equação (5.16) é representado pela linha tracejada e de acordo com a equação (5.17) pela
linha contínua. Essa última apresenta uma descontinuidade no ponto ξ = 0,5. Nesse caso há somente uma
solução, aquela correspondente ao ponto de cruzamento duas linhas, que acontece para ξ = 0,87, ou seja E =
0,87V0.
Fig. 5.5 - Gráfico de f(ξ) em função de ξ de acordo com as equações (5.16) e (5.17)
Se for considerado um poço de potencial mais profundo, sendo a tangente uma função cíclica de seu
argumento haverá mais pontos de intercessão entre as duas curvas o que dará origem a um maior número de
soluções, ou seja , a um número maior de energias permitidas à partícula que está dentro da caixa de paredes
não rígidas.
Esquematicamente a solução do problema pode ser apresentada como no diagrama da figura 5.6, quanto mais
profundo o poço mais níveis permitidos tem a partícula que está dentro dele. Os valores de V0 usados em
cada caso são:
a) poço raso
α L= π
0
4
2 2
V =h π
0 2mL2
60
b) poço com profundidade maior
2 2
V = 169h π
0
2mL2
α L = 13π
0
4
c) poço ainda mais profundo α L = 33π
0
4
2 2
V = 1089h π
0
2mL2
Fig. 5.6 - Diagrama dos níveis de energias permitidos à uma partícula dentro de uma caixa de paredes não
rígidas
Comparando estes resultados com aqueles obtidos para o poço infinito (figura 5.3) encontram-se algumas
diferenças fundamentais nas funções de onda e nas densidades de probabilidade, no poço infinito as duas se
anulam fora do poço (figura 5.3) enquanto no poço finito (figura 5.7) tendem a zero suavemente fora do
poço, o que significa que a probabilidade de encontrar a partícula fora do poço pode não ser nula, como
descrito na mecânica clássica.
Fig. 5.7 - Função de onda e densidade de probabilidade para uma partícula num poço de potencial finito para
os valores de n =1 curva (a), n =2 (curva b) e n =3 curva (c)
61
5.5 DIVERSOS TIPOS DE POTENCIAL
No caso estudado na seção anterior a energia da partícula era inferior a V0, ou seja, a partícula estava presa
dentro do poço de potencial. Agora será considerado o caso de E > V0,, ou seja, partícula livre.
Um elétron livre movendo-se próximo a uma região onde há um poço de potencial pode ser encarado como
uma onda deslocando-se e encontrando esse poço em seu caminho. O formato desse potencial é muito
variável, podendo até se constituir numa barreira.
5.5.1 - Poço de potencial
Classicamente se a energia da partícula é inferior a profundidade do poço, E < V0, ela está presa dentro dele
e se for superior, E > V0,, estará livre, mas em ambos os casos ela poderá ter qualquer valor de energia.
Quanticamente as coisas se passam de outro modo, já foi visto que quando E < V0 os valores de energia da
partícula são quantizados ou seja, nem todos os valores são permitidos. Quando E > V0 o poço de potencial
influi no comportamento da partícula ainda que ela seja livre.
A óptica ensina que, quando o comprimento de onda muda repentinamente (numa pequena distância
comparada com o comprimento de onda), parte da onda é refletida e parte é transmitida. Esse
fenômeno acontece com a função de onda quando ela encontra a fronteira do poço de potencial
porque aí sua energia é alterada. Nesse caso as funções de onda serão influenciadas pela presença do poço
fazendo com que haja reflexão de parte dela em cada fronteira do poço como mostra a figura 5.8.
Fig. 5.8 - Onda aproximando-se de um poço de potencial : (a) onda (b) função de onda
62
5.5.2 - Potencial degrau
Um elétron ao se deslocar ao longo do eixo x encontra à sua frente um potencial com o formato
indicado na figura 5.9, esse problema é estudado tanto pela mecânica clássica quanto pela mecânica
quântica.
Fig. 5.9 - Elétron aproximando-se
potencial degrau
Fig. 5.10 - Função de onda com energia de um
E < V0 penetrando na barreira
Classicamente uma partícula com energia E ao se aproximar de uma barreira de potencial V0
a
ultrapassará se E > V0 ficando com uma energia (E - V0) e retornará se tiver uma energia E < V0.
Para visualizar isso imaginemos a barreira com o formato de uma colina, se a energia da partícula
for menor que a da barreira, a partícula diminui sua velocidade até parar sem chegar ao topo
retornando em seguida.
Quanticamente pode-se fazer a imagem de uma onda com uma energia E aproximando-se da
barreira. Se E < V0 a função de onda tende a zero além da barreira havendo uma probabilidade não
nula da partícula se encontrar aí, como no caso do poço finito (figura 5.10). Se E > V0 o
comportamento clássico é diferente do quântico, em x = 0 o comprimento de onda muda
h
h
1
1 para λ = h =
abruptamente de λ 1 = h =
porque a energia de onda muda de
2
p
p
2 mE
2 m( E − V 0 )
2
1
E para E - V0.
A probabilidade da reflexão e a amplitude das ondas refletidas e transmitidas podem ser obtidas
através da equação de Schrödinger. Isto, porém, não será feito aqui por fugir do escopo deste livro,
que simplesmente deseja mostrar que tipo de resultados podem ser obtidos a partir da equação de
Schrödinger. A figura 5.11 mostra como se comporta a função de onda de uma partícula com energia
superior à barreira ao tentar ultrapassá-la.
Fig. 5.11 - Função de onda com energia E >V0 chegando a uma barreira
63
5.5.3 Barreiras de potencial
Este problema é semelhante ao degrau de potencial com a diferença que a largura do degrau é finita.
Se E < V0 , classicamente a partícula não tem condições de atravessar a barreira mas quanticamente a
probabilidade que isso aconteça não é nula, ou seja a partícula pode atravessar uma barreira ainda que sua
energia seja inferior. Este fenômeno é chamado tunelamento e é aproveitado na construção dos diodos de
tunelamento. Isto ocorre porque se a barreira não for infinita existe uma probabilidade que a partícula a
penetre.
Fig. 5.12 - Potencial degrau (a); função de onda de uma partícula que o atravessa (b)
5.6 OSCILADOR HARMÔNICO
Ao se considerar, classicamente, uma partícula presa a uma mola dizemos que a força que atua sobre ela é do
2
tipo F = kx e o potencial a que está submetida é V = ∫ Fdx = kx .
2
O gráfico da distribuição da probabilidade de encontrar essa partícula ao longo de seu percurso é
inversamente proporcional a sua velocidade dando uma curva do tipo dada abaixo.
Fig. 5.13 – Probabilidade de encontrar a
partícula, presa a uma mola, na posição x.
Ainda classicamente pode-se dizer que o espectro das energias possíveis é contínuo variando de
2
zero a kL .
2
Quanticamente esses dados podem ser obtidos através da equação de Schröedinger:
2 d 2 Ψ ( x ) kx 2
−h
+
Ψ ( x ) = EΨ ( x )
2m dx 2
2
64
2
d 2 Ψ( x ) 2 m 
 E − kx  Ψ( x ) = 0
+
2 
h2 
dx 2
que rescrita dá:
fazendo-se α 2 = 2m E
h2
e y 2 = mk x 2
h2
d 2 Ψ( x)  2
+  α − y 2  Ψ( x) = 0
dx 2
obtém-se:
As soluções desse tipo de equação diferencial baseiam-se nos polinômios de Hermite e são soluções que
podem ser encontradas tabeladas. São do tipo:
y2
Ψn =  2mν  4  2 n n ! H n ( y ) e 2
h
−
1
(5.18)
A título de exemplo daremos abaixo os seis primeiros polinômios de Hermite e algumas das funções de
onda:
TABELA 5.1. - OS SEIS PRIMEIROS POLINÔMIOS DE HERMITE QUE SÃO PARTE DAS FUNÇÕES
DE ONDA DO OSCILADOR HARMÔNICO
N
0
Hn(y)
1
αν2
1
En
hν/2
1
2y
3
3hν/2
2
4y - 2
5
5hν/2
3
8y3 - 12y
7
7hν/2
16y4 -48y2 +12
32y5 - 16y3 +120y
9
11
2
1 −y
Ψ0 = 2mν 4 e 2
h
( )
( )
Ψ1 = 2mν
h
2
4
5
Ψn
1
4
y2
4 ye 2
−
y2
1
−
4
2
Ψ2 = 2mν
8 4y − 2 e 2
h
( ) (
( ) (
Ψ3 = 2mν
h
1
4
)
)
48 8 y 3 − 12 y e
−
y2
2
9hν/2
11hν/2
Abaixo nas figuras 5.14 e 5.15 estão esboçadas as funções de onda e a probabilidade clássica e quântica de
encontrar uma partícula na posição x para diversos valores de n.
Fig. 5.14 - Funções de onda para n = 0 (a); n =1 (b) e n = 10 (c )
65
Fig. 5.15. - Probabilidade quântica (
10 de um oscilador harmônico.
) e probabilidade clássica ( - ) para os estados n =0 e n =1 e n =
Pode-se observar que, à medida que o número quântico aumenta, a probabilidade quântica se aproxima da
probabilidade clássica.
Os níveis de energia permitidos são dados por
E n =  n + 1  hν
2
onde n = 0,1,2,3....
(5.19)
O menor valor de energia de uma partícula presa nesse tipo de poço de potencial pode ter é E = hν , o que
o
2
significa que a partícula não pode ter energia nula, contrariamente ao que tinha sido encontrado
classicamente.
Outra diferença é que os valores possíveis de energia não são contínuos mas sim discretos e eqüidistantes de
hν/2 . Lembrando que a freqüência de oscilação de um sistema massa-mola depende diretamente do valor da
constante da mola, k, e indiretamente da massa, m pode-se notar que os valores dos níveis de energia
permitidos e o seu número depende da relação k/m, da profundidade e da largura do poço. Isto pode ser
notado se for lembrado que a profundidade do poço é dada pela energia total do sistema que é sua energia
kL2 , que por sua vez depende do valor a largura do
potencial máxima,
2
poço.
O diagrama da figura 5.16, abaixo, apresenta os níveis de energia permitidos . Note-se a diferença entre esse
diagrama e o correspondente para o poço de potencial finito.
Fig. 5.16 – Diagrama de energias possíveis para um oscilador
harmônico.
E n − E n −1 = hv
66
5.7 ÁTOMO DE HIDROGÊNIO
A primeira descrição do modo de funcionamento de um átomo de hidrogênio foi feita por Bohr de forma
empírica e intuitiva. Aqui, agora, será feita uma outra descrição, a partir da equação de Schrödinger que já é
bem conhecida de todos.
5.7.1 Solução da Equação de Schrödinger
O primeiro passo para encontrar a função de onda que descreve o comportamento do elétron é determinar a
que potencial ele está submetido. O elétron está no campo elétrico criado pelo próton e portanto o potencial
ao qual ele está submetido é:
V =−
e = − Ke
4 πε r
r
0
(5.20)
Esse potencial tem simetria esférica sendo, portanto, conveniente escrever a equação de Schrödinger em
coordenadas esféricas.
Até aqui utilizou-se a equação simplificada para problemas unidimensionais mas o átomo de hidrogênio será
tratado tridimensionalmente o que obriga que ela seja escrita da seguinte forma:
2
− h ∇ 2 Ψ + (V − E ) Ψ = 0
5.21)
2m
onde ∇ 2 Ψ é o laplaciano da função Ψ. O laplaciano em coordenadas cartesianas e esféricas polares é
respectivamente:
 2
2
2 
∇ 2 Ψ( x , y , z ) =  ∂ + ∂ + ∂  Ψ ( x , y , z )
 ∂x 2 ∂y 2 ∂z 2 


∂2 +
∂  sen θ ∂   Ψ r , θ, ϕ
1
1
∇ 2 Ψ( r , θ, ϕ) =  1 ∂  r 2 ∂  +
(
)

∂r
∂θ  
 r 2 ∂r
r 2 sen 2 θ ∂ϕ 2 r 2 sen θ ∂θ

(5.22)
(5.23)
No caso unidimensional a equação (5.21) transforma-se na equação (4.25) já conhecida.
Como o átomo de hidrogênio tem simetria esférica pode-se pensar que cada variável é independente e
portanto a função de onda genérica seria formada pelo produto de funções, cada uma delas dependente só de
uma das variáveis, como a seguir:
Ψ(r , θ, φ) = Φ( φ)Θ(θ) R( r )
(5.24)
Esse tipo de função permite que se encontre a solução da equação de Schrödinger pelo método das variáveis
separáveis, com relativa facilidade, como pode ser visto no apêndice A. Após o citado desenvolvimento
chega-se a:
67
Φ
Θ
l, m
m
(φ) = eimφ
(θ) = (sen θ) m F
lm
m = 0,1,2,3....
onde
(cos θ)
(5.25)
(5.26)
são as funções
onde l deve obedecer à seguinte condição: l = m , m + 1, m + 2, m + 3..... e onde F
lm
associadas de Legendre apresentadas no apêndice B.
− Zr



na 
o  2 Zr  L  2 Zr 
(5.27)
R (r ) = e
 na  nl  na 
n, l
 o
 o
onde L são os polinomiais de Laguerre, também apresentados no apêndice B, e ao é o primeiro raio de
nl
Bohr igual a
4πε h 2
0
a =
0
µe 2
Substituindo-se todas essas expressões na equação (5.24) obtém-se a solução geral para o átomo de
hidrogênio:
− Zr
na 



o  2 Zr  L  2 Zr  ( sen θ) m F
Ψ( r , θ, ϕ ) = e
(cos θ)e imφ
 na  nl  na 
lm
 o
 o
(5.28)
Com as restrições que n, l e m são inteiros sendo n e l sempre positivos, com l variando de zero a (n -1)
e m variando de - l a l , o que pode ser representado esquematicamente por:
número quântico principal n = 1,2,3....
número quântico azimutal l = 0,1,2,......(n-1)
número quântico magnético m = - l , - l +1, - l +2, .....,0,..... l +2, l +1, l
A título de curiosidade no apêndice B estão as expressões que permitem determinar algumas das funções
polinomiais de Legendre e de Laguerre.
5.7.2 Energia do elétron
O elétron vai ter um valor de energia diferente em cada órbita. Para se determinar esse valor deve-se voltar à
equação de Schrödinger substituindo a função de onda solução e determinando o valor de E. A título de
exemplo consideremos o elétron que tem o seguinte conjunto de números quânticos: n = 2; l = 1; m = 1, ou
seja cuja função de onda é
Ψ
(r , θ, φ) = R2,1 (r )Θ1,1 (θ)Φ1 (φ)
2,1,1
ou
68
3
− Zr
  2
2a  
o  Zr  1  Z  (sen θ)e iφ
Ψ
r , θ, ϕ ) = e
(
a  8 π a 
2,1,1
 o
 o
determinando-se todas as derivadas de Ψ e substituindo-se na equação 5.23 e depois na 5.21 chega-se a
 


2   1


h
2
1
1
−
−
+
−
Ψ + VΨ = EΨ
2


2µ  r 2 ra
2  r2 
a
8
 

0
0



2 1
h
1


E =V +
−
que nos permite deduzir que
µa  r 8a 
o
o
e lembrando-se do valor de V da equação 5.20 chega-se ao valor da energia do elétron com número atômico
principal n =2:
µe 4
E =−
2
2
8 4πε  h 2

o
uma generalização dessa expressão para qualquer valor de n permite chegar a:
µZ 2 e 4
E =−
2
n
 4πε  2h 2 n 2

o
(5.29)
Analisando-se essa expressão conclui-se que:
• nem todos os valores de E são permitidos, portanto, a energia do elétron é quantizada;
• o sinal negativo indica que se trata de estados ligados;
• a energia do elétron depende unicamente do número principal, e não dos outros números quânticos.
Esses resultados são semelhantes aos de Bohr e Sommerfeld com a vantagem que esta dedução foi feita
usando-se o formalismo da mecânica quântica e não hipóteses ou postulados casuais.
5.7.3 - Densidade de probabilidade
Informações sobre a posição do elétron podem ser obtidas a partir da densidade de probabilidade P = Ψ Ψ*,
que é uma função de três variáveis, r,θ e φ, e que depende de três números quânticos, n, l e m. A título de
ilustração estão abaixo (figura 5.17) diagramas polares da dependência direcional das densidades de
probabilidades do átomo de hidrogênio para alguns valores de l e m . Esses diagramas foram obtidos
analisando-se o comportamento da parte angular da função Ψ, ou seja, analisando-se como Θ(θ) se
comporta a medida que θ varia.
Também estão apresentados abaixo (figura 5.18) diagramas espaciais da distribuição de probabilidade do
elétron que, em última análise, é a representação da distribuição do elétron em torno do núcleo. Essa imagens
não são exatamente iguais àquelas concebidas por Bohr, que previu órbitas circulares, provavelmente todas
num mesmo plano perpendicular ao eixo z, ou
69
aquelas encontradas por Sommerfeld para órbitas elípticas. O que se vê aqui é muito mais complexo, com
órbitas com diferentes formatos e em diferentes planos para o mesmo valor de n. Segundo os resultados
obtidos com a equação de Schrödinger o formato da distribuição (formato da órbita) e sua localização
(inclinação da orbita) dependem dos outros seguintes números quânticos: l (já deduzido por Sommerfeld)
e m.
Fig. 5.17 - Diagramas polares da dependência direcional das densidades de probabilidade do átomo de
hidrogênio
Fig. 5.18 - Diagramas espaciais da distribuição de probabilidade do elétron no átomo de hidrogênio
70
5.7.4 - Momento angular orbital
Na seção 5.7.2 afirmou-se que a energia está associada ao número quântico principal, n, o que pode ser
observado pela expressão (5.29). Aqui se falará do significado dos outros números quânticos.
O elétron tem associado a seu movimento um momento angular orbital L que tem o seguinte valor:
L = l( l + 1)h
(5.30)
Para um certo valor de n existem (n-1) valores possíveis de l . Todos esses estados correspondem a um
mesmo valor de energia mas a diferentes valores de momento angular.
A excentricidade da órbita é a relação entre seu raio maior a e seu raio menor b podendo ser determinada a
partir da relação entre os números quânticos principal, n, e azimutal, l , através da seguinte expressão:
a=n
b l
(5.31)
idêntica à expressão de b na equação 3.53.
Ao maior valor de l , que é n-1, corresponde uma órbita quase circular, e à medida que l diminui a
excentricidade da órbita aumenta mantendo num eixo o raio a da órbita e no outro o valor de b cada vez
menor . Ao momento angular nulo corresponde uma oscilação através do centro do átomo, o que é muito
difícil de visualizar ou imaginar. A figura 5.19 mostra os diferentes tipos de órbitas possíveis para n =3.
Fig. 5.19 - Possíveis órbitas do elétron do átomo de hidrogênio para n = 3
5.7.5 - Projeção do momento angular orbital do elétron sobre o eixo z
A projeção do momento angular L sobre o eixo z é dada por:
L = mh
z
71
(5.32)
Essa expressões permitem interpretar o significado dos números quânticos l e m. Como esses números são
discretos, o momento angular L e de sua projeção sobre o eixo z, Lz , também o serão.
Afim de esclarecer melhor o significado do que foi dito considere-se, por exemplo, l = 2, e nesse caso:
L = 2( 2 + 1)h = 6h
L = −2 h,−1h,0,1h,2h
z
ou seja, para um valor do momento angular total L há 5 possíveis valores de sua projeção sobre o eixo z, Lz.
A figura 5.20 ilustra bem esse fato.
e
Fig. 5.20 - Visão vetorial ilustrando os possíveis valores da componente z do momento angular para o caso
de l = 2
Pensando-se num modelo vetorial pode-se dizer que o vetor momento angular é perpendicular ao plano em
que ocorre o movimento de rotação; se o mesmo movimento é executado em planos com diferentes
inclinações o momento angular orbital é o mesmo para todas elas mas sua projeção no eixo z é diferente para
cada inclinação.
Para o valor de l = 2 tem-se o momento angular L = 6h que corresponde a órbitas de mesmo raio porém
executadas em planos com cinco diferentes possíveis inclinações, uma para cada valor de m, o que determina
que a projeção Lz tem diferentes possíveis valores para o mesmo L, como evidencia a figura 5.20.
5.7.6 - Spin do elétron
O spin do elétron é um parâmetro associado ao momento angular do elétron gerado pelo seu movimento de
rotação em torno de seu próprio eixo. O momento angular de spin S é obtido a partir da seguinte expressão:
S = h s ( s + 1)
72
(5.33)
onde o número quântico de spin s vale s = 1 .
2
A projeção do momento angular de spin, analogamente à projeção do momento angular orbital, sobre o eixo
z é dada por :
S =± 1 h
(5.34)
2
z
( )
O fato de haver dois possíveis valores para Sz significa que há dois possíveis sentidos para a rotação do
elétron em torno de seu eixo, horário e anti-horário.
TABELA 5.2 - RESUMO DAS CARATERÍSTICAS DAS ÓRBITAS
Número Quântico
principal (n)
azimutal (l)
magnético (m)
Grandeza Física
Energia
momento angular orbital
projeção do momento
orbital no eixo z
momento angular de spin
spin (s)
Caraterística da Órbita
raio
excentricidade
inclinação
angular
sentido de rotação do elétron em
torno de seu próprio eixo
5.8 UM ELÉTRON NUM CRISTAL
5.8.1 Teorema de Bloch
Este teorema foi criado para ser aplicado ao estudo de potenciais periódicos tendo como resultado a
simplificação da manipulação matemática. Ele será apresentado aqui com o objetivo de usá-lo nos cálculos
de partículas em redes cristalinas.
Considere uma rede cristalina unidimensional na direção x com um parâmetro de rede igual a a, ou seja,
formada de células de lado a, que se repetem seqüencialmente, como na figura 5.21.
1
•
0
2 3
• •
a 2a
4
5
•
•
3a....
6 ....
•
N-2
•
N-1 N
•
•
Na
Fig. 5.21 - Rede cristalina unidimensional formada de N átomos eqüidistantes de a
A função que descreve o potencial sentido por uma partícula nessa rede é periódica de período a. O teorema
de Bloch diz que a função de onda de uma partícula nesse potencial periódico tem a seguinte propriedade:
Ψ( x + a ) = e ika Ψ( x)
ou
Ψ( x) = e ikx u( x)
onde u(x) é a função de onda dentro da célula e tem a mesma periodicidade que o potencial, ou seja, a.
73
(5.35)
A primeira expressão pode ser demonstrada a partir da segunda. Aplicando-se a expressão (5.35) para x + a
obtém-se:
ik ( x + a )
Ψ( x + a ) = e
u( x + a )
mas como u é periódica pode-se dizer que u( x + a ) = u( x)
o que implica em
Ψ( x + a ) = e ika e ikx u( x) = e ika Ψ( x)
como queríamos mostrar.
Deve-se usar uma condição de contorno que impõe que a função de onda na extremidade direita (após N
átomos) deve ter o mesmo valor que na extremidade esquerda, onde está o primeiro átomo, pois as bordas da
rede devem ser equivalentes.
Ψ( x) = Ψ( x + Na) = e ikNa Ψ( x)
portanto e ikNa = 1. Lembrando que e is = cos( s) + i sen( s) essa condição pode ser escrita como:
kNa = n 2π com n = 0,±1,±2 ,±3......± N
2
donde obtém-se os valores possíveis para k como:
k = 2π n
com n = 0,±1,±2 ,±3......± N
Na
2
(5.36)
esta expressão indica que para um valor grande de N os valores de k estão muito próximos, chegando quase a
constituírem um conjunto contínuo de valores.
5.8.2 Teoria de bandas de energia
Foi visto nas seções anteriores que uma partícula num poço de potencial tem sua energia quantizada, ou seja,
somente alguns valores são possíveis, ver-se-á nesta qual é o comportamento de uma partícula numa rede
cristalina.
Uma rede pode ser considerada como uma seqüência ordenada de átomos que, por razões de simplificação,
suporemos unidimensional. Observando a figura 5.22 vê-se que o potencial associado a um átomo é
semelhante ao potencial elétrico que uma partícula carregada cria em torno de si. O potencial criado por uma
rede de átomos pode ser obtido pela justaposição dos potenciais criados pelos diferentes átomos que a
formam, como vê-se na figura 5.23 (b). Afim de tornar os cálculos mais simples é conveniente substituir o
potencial real por outro, mais simples, formado por uma série de poços quadrados como indicado na figura
5.23 (c). Esse modelo recebeu o nome de Krönig e Penney, que é são os nomes dos cientistas que o criaram.
.
Fig. 5.22 – Potencial criado por um átomo.
74
Fig. 5.23 - (a) Rede cristalina; (b) Potencial real de uma rede cristalina ; (c ) Potencial de Krönig-Penney
Uma vez definido o potencial ao qual um elétron, numa rede, está submetido, escreve-se a equação de
Shrödinger e procura-se sua solução.
5.8.3 Modelo de Krönig-Penney
Para descrever o comportamento de um elétron numa rede cristalina usa-se o modelo que Krönig-Penney
criaram em que se supõe um potencial periódico mais simples que o real, formado de uma seqüência de
poços de potencial finitos e quadrados.
Considere-se o potencial de período espacial a + b esboçado na figura 5.24
Fig. 5.24 - Potencial de Krönig-Penney para uma rede de período espacial a + b .
A equação será:
2 2
− h d Ψ = EΨ
2 m dx 2 a
a
p/
−b < x < 0
(5.37)
p/
0< x<a
(5.38)
e
2 2
− h d Ψ + V Ψ = EΨ
2m dx 2 b
b
0 b
75
Para resolver a equação (5.37) faz-se a substituição α = 2 m E / h 2 o que reduz a equação a:
d 2 Ψ + α 2Ψ = 0
cuja solução é do tipo:
2
a
a
dx
Ψ ( x ) = A sen αx + B cos αx
a
a
a
Para resolver a equação (5.38) fazem-se as substituições
− 2 m (V
0
h2
β=
β=
− E)
= iβ
−
2m( E − V )
0 =β
2
+
h
2 m (V
ou
β
ou
β
−
+
− E)
=
0
h2
=
2m ( E − V )
0
2
h
para
0 < E < V0
para
E >V
0
onde E é a energia do elétron
A solução nesse caso é:
Ψ ( x ) = A sen βx + B cos β x
b
b
b
No caso em que β = iβ
−
o seno e o coseno serão transformados automaticamente em funções hiperbólicas
(senh e cosh)
Agora passemos para as condições de contorno:
d Ψ
= d Ψ
dx a 0 dx b 0
Ψ (0) = Ψ (0)
a
b
Ψ ( a) = e
a
ik ( a + b)
Ψ ( − b)
b
condições de continuidade
ik ( a + b)
d Ψ
= d Ψ
⋅e
condições de periodicidade
dx a a dx b −b
As conseqüências dessas equações são:
B =B
a
b
αA = βA
a
b
ik ( a + b) 
A sen αa + B cos αa = e
− A sen β b + B cos βb
 b

a
a
b
ik ( a + b) 
αA cos αa − αB sen αa = e
β A cos βb + β B sen βb
a
a
b
 b

A solução desse conjunto de equações para encontrar os valores de Aa, Ba, Ab e Bb. leva à uma expressão que
permite analisar os possíveis valores de energia para um elétron numa rede cristalina.
76
Esse cálculo pode ser encontrado em detalhe no apêndice C. O resultado a que se chega é:
 β2 + α2 
 sen βb sen αa + cos βb cos αa = cos k (a + b )
−
 2αβ 


(5.39)
O lado esquerdo da equação só depende da energia (lembrando que α e β dependem de E e de Vo) enquanto o
lado direito depende só de k. Desse modo a última equação relaciona os valores permitidos de E aos
correspondentes valores de k. Para analisar essa correspondência podem ser utilizados métodos gráficos após
a simplificação da equação anterior através de algumas hipóteses aceitáveis:
a tende a zero e Vo tende a infinito de modo que o produto aVo se mantenha finito.
Rescrevendo:
aβ 2 b sen β b sen αa α 2 ab sen β b sen αa
−
+ cos β b cos αa = cos k (a + b)
2
2
βb
αa
βb
αa
Lembrando que para as hipóteses feitas acima valem:
2 m (V − E )
sen βb
0
⇒1
cos βb ⇒ 1
( a + b) ⇒ a
β 2b =
b ⇒ valorfinito
βb
h
e
α 2 b = 2 mE b ⇒ zero
pode-se determinar o limite da expressão (5.40) que é :
h
−
ρ sen αa + cos αa = cos ka
αa
ρ=
onde
(5.40)
abβ 2
2
Os dois termos da equação anterior podem ser considerados como uma função de αa, o que permite escrever
as duas seguintes expressões:
ρ sen αa + cos αa = f (αa )
αa
cos ka = f (αa )
Fig. 5.25 - Gráfico da equações (5.41) em função de αa; ---- limite dos valores da função coseno
77
(5.41)
(5.42)
O gráfico sendo a representação da expressão (5.41) permitirá determinar que valores de αa são válidos.
Como o coseno é uma função limitada entre -1 e +1 nem todos os valores de αa gerarão valores de f(αa) que
corresponderão a valores permitidos para a função coseno. Os valores de αa que tornam f(αa) maiores que
+1 ou menores que -1, como por exemplo, os valores entre os pontos A e A’, ou entre B e C ou ainda entre D
e E, não são aceitáveis, pois nesses intervalos, f(αa) é superior a 1 e portanto cos (ka) também deveria ser.
Pode-se afirmar que os valores de αa dos intervalos AA’, BC e DE correspondem a faixas proibidas de
f(αa).
A figura 5.26 mostra o gráfico de E em função de ka, para um elétron numa rede cristalina. Ele foi obtido
usando a relação entre a energia e ka. O gráfico também mostra para ilustrar a comparação o gráfico de E
para um elétron livre.
Os intervalos de energia entre AA’, BC e DE correspondem às chamadas bandas proibidas.
A largura dessas bandas e a quantidade de estados ocupados em cada banda varia de material para material.
São esses parâmetros que determinam o comportamento em termos de condutibilidade elétrica do sólido.
Dependendo da largura da banda proibida e da sua ocupação o material pode ser condutor, isolante ou
semicondutor.
Fig. 5.26 - Gráfico da energia de um elétron numa rede cristalina (---) e de um elétron livre (
)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
R.B. Leighton, Principles of Modern Physics, New York: McGraw- Hill Book Company, 1959.
P.A.Tipler, Física Moderna, Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1981.
Beiser, Física Moderna,
D. Halliday, R. Resnick , Fundamentos de Física Vol 4 , São Paulo: Livros Técnicos e Científicos, 1994.
R.Eisenberg, R. Resnick, Física Quântica - Átomos, moléculas, sólidos, núcleos e partículas, São Paulo:
Editora Campus, 1994.
H. Pohl - Introdução à Física Quântica, São Paulo: Editora Edgard Blücher Ltda, 1973.
S.Datta - Quantum Phenomena in Modern Solid State , Modular Series on Solid State Device, vol IX,
EUA: Addison-Wesley Publishing Company 1989
L.Landau , E. Lifchitz - Mecanique Quantique , Moscou : Editions de Moscou 1966
78
PROBLEMAS
5.1. Explicar o que é a teoria quântica. Descrever a importância da equação de Schöredinger e explicar como
ela é utilizada para se estudar um problema.
5.2. Dada a equação de Schrödinger unidimensional, independente do tempo:
2 2
− h d Ψ + (V − E ) Ψ = 0
2m dx 2
(a) mostrar que, considerando V = 0, Ψ(x,t) = exp [i(kx - ωt)] é solução da equação onde k = 2mE
e
h2
ϖ= E
h
(b) mostrar que Ψ *(x,t) . Ψ (x,t) é constante para a função do ítem (a)
(c ) dar o significado de Ψ *(x,t) . Ψ (x,t) ser constante e independente de x;
(d) mostrar que Ψ (x,t) = A exp (ikx) + B exp (-ikx) também é solução da equação de Schrödinger para V(x) =
0;
5.3. Explicar as condições de contorno que devem ser obedecidas pelas funções de onda, soluções da
Equação de Schrödinger, e o que geralmente sua aplicação acarreta.
5.4. Em um certo instante, uma função de onda depende da posição conforme está mostrado na figura. Se
fosse feita uma medida que possa localizar a partícula associada a um elemento dx do eixo x nesse instante :
(a) onde estaria a maior probabilidade de encontrá-la? (b) onde estaria a menor? (c ) as chances de que ela
seja encontrada em qualquer valor positivo do eixo x seriam maiores do que as chances de que seja
encontrada em qualquer valor negativo?
5.5. A solução da equação de Schöredinger para uma partícula que se move livremente na região
< a/2, mas está confinada a ela é:
ψ = A sen( 2aπx ) e − iEt / h para -a/2 < x < a/2 e ψ = 0 para x <-a/2 ou x > a
2
-a/2 < x
Dar a solução normalizada ajustando o valor da constante de forma que a probabilidade total de encontrar a
partícula associada a algum ponto da região seja um.
5.6. Sabendo que a solução da equação de Shrödinger para uma partícula numa caixa de largura a é:
Ψ ( x) = B cos k x
onde k = ( nπ ) a
n
n
n
n
determinar a constante Bn para o nível 3 aplicando a condição de normalização.
5.7. Considerar uma partícula numa caixa infinita e esquematizar a função probabilidade e interpretá-la
apresentando todas as informações possíveis de serem obtidas. Mostre, através de um esquema, como esses
gráficos seriam alterados se a caixa fosse finita.
5.8. Esquematizar a função de onda e a função de probabilidade para o terceiro estado de uma partícula numa
caixa de paredes finitas. Dar a interpretação desse esquema.
79
5.9. Esquematizar a densidade de probabilidade quântica e clássica para a décima primeira energia possível
do oscilador harmônico.
5.10. A energia de ponto zero é a menor energia total possível que uma partícula ode ter se ela estiver
confinada numa região de largura L por um poço de potencial quadrado infinito. Fazer uma estimativa da
energia de ponto zero de um nêutron em um núcleo, tratando-o como se ele estivesse em um poço quadrado
infinito de largura igual ao diâmetro nuclear de 10-14 m.
5.11 - Um átomo de hidrogênio com energia de ligação (a energia necessária para remover um elétron) de
0,85 eV sofre uma transição para um estado com energia de excitação ( a diferença de energia entre esse
estado e o fundamental)de 10,2 eV. (a) Achar a energia do fóton emitido; (b) Mostrar essa transição em um
diagrama de níveis de energia para o hidrogênio, designando os números quânticos apropriados.
5.12. Um elétron em movimento, ao encontrar uma barreira de potencial, pode sofrer tunelamento. Explicar
como a mecânica quântica descreve esse fenômeno.
5.13. Esquematizar as órbitas possíveis para um elétron num átomo com número principal n = 4. Indicar os
valores de n para cada órbita e os valores de números quânticos para cada elétron.
5.14. Explicar de que modo os números quânticos de um elétron de um átomo de hidrogênio determinam
suas grandezas físicas e as caraterísticas de seu movimento.
5.16. Explicar o modelo de Krönig-Penney.
5.17. Através do modelo de Krönig-Penney demonstre matematicamente que os valores permitidos da
energia E são dados para os intervalos de k = 2mE para os quais a função se situa entre +1 e -1.
h2
5.18. Explicar porque surgem as bandas proibidas nos sólidos.
5.19 Considerando a dedução da estrutura de bandas, traçar o gráfico de
ρ sen αa + cos αa = f (αa )
αa
em função de αa para ρ = 3π/2. Em seguida, usar o gráfico para obter os valores de ka para vários valores
de αa. Usar os valores de ka e αa para traçar o gráfico de E = αa2/π2 em função de ka (lembrar que f (αa) =
cos ka).
5.20. Explicar a diferença entre os níveis de energia permitidos para um elétron num átomo e um elétron num
cristal.
5.21. Fazer um resumo, apresentando (a) a função de onda e seu gráfico (b) a densidade de probabilidade e
seu gráfico e (c) os níveis permitidos de energia, para os seguintes tipos de potencial : (I) partícula livre; (II)
poço quadrado infinito; (III) poço quadrado finito, para energia E>V e E < V ; (IV) oscilador harmônico
simples; (V) potencial degrau; (VI) barreira da potencial.
80
6 ESTATÍSTICA FÍSICA
6.1 INTRODUÇÃO
Como foi citado no capítulo anterior, o comportamento elétrico de um material depende muito fortemente da
largura da banda proibida, da quantidade de estados que os elétrons tem a sua disposição, dentro do material,
e da fração de estados que estão ocupados. Sem grandes esforços é possível perceber que, para estudar esse
problema, tem que se equacionar as formas de interação entre um número imenso de corpos (todos os
elétrons e átomos de uma rede cristalina) diferentemente do que foi feito no estudo do átomo de hidrogênio,
para o qual foi considerada somente a interação entre duas partículas: um próton e um elétron.
Intuitivamente é possível imaginar que o estudo do comportamento dos elétrons numa rede cristalina deva,
então, ter outra abordagem e, de fato, é preciso apelar para a estatística. Essa ciência ao lidar com grande
número de eventos, substitui as certezas de previsão dos fatos da ciência determinística por simples
probabilidades de ocorrência desses fatos.
Levando em conta essas idéias é possível aprofundar a análise dos valores de energia permitidos aos elétrons
livres presentes numa estrutura cristalina.
6.2 CONCEITO DE ESTADO DE UM SISTEMA
O estado de uma partícula é definido através de alguns parâmetros relativamente arbitrários, no caso de um
elétron no átomo.
Se os elétrons tivessem o mesmo comportamento que as moléculas de um gás ser-lhe-iam permitidos todos
os valores de energia assim como também seria permitido haver dois elétrons no mesmo estado. Porém, para
os elétrons, valendo o princípio de exclusão do Pauli, que afirma não poder haver mais que um elétron em
cada estado, não é permitido a dois elétrons no mesmo átomo terem o mesmo conjunto de números
quânticos: n , l , m, s .
Se em vez de uma só partícula, se tiver um conjunto de partículas que formam um sistema, seu estado é
caracterizado pelo conjunto de valores de energia, momento etc. que todas as partículas tem. Outro modo de
caracterizar o estado de um sistema é através do conjunto de valores assumidos pelos números quânticos
n , l , m, s . Se se lembrar que há dois valores diferentes para s:
½ e -½, o número total de estados é o dobro daquele determinado se forem considerados só os três primeiros
números quânticos.
6.3 DISTRIBUIÇÕES ESTATÍSTICAS
Um gás ou um cristal são formados por um número muito grande de elementos, então seu comportamento
deverá ser descrito através de estatísticas capazes de prever a configuração mais provável de ocorrer, pois é
isso que possibilita o cálculo de valores médios das grandezas físicas observadas.
*esses parâmetros são seus quatro números quânticos cujos valores determinam seu estado.
81
No caso de um gás de moléculas, ao se determinar a distribuição das velocidades, pode-se obter a
velocidade média, a partir desse valor pode-se conhecer as variações médias do momento linear, nas colisões
das moléculas com a parede, e, em seguida, as informações sobre a pressão do gás, que é uma grandeza
macroscópica. Do mesmo modo o estudo da distribuição das velocidade das moléculas permite inferir a
velocidade quadrática média, a energia média e em seguida a temperatura do gás. Essas informações podem
ser representadas esquematicamente:
distrib. de veloc.⇒ velocidade média ⇒ variações médias do momento linear ⇒ pressão do gás
velocidades das moléculas ⇒ velocidade quadrática média ⇒ energia média ⇒ temperatura
Percebe-se então que uma análise estatística de grandezas microscópicas permite inferir sobre o
comportamento de grandezas macroscópicas observáveis.
Para esclarecer os conceitos de partículas distinguíveis e indistinguíveis e de probabilidade, a serem
utilizados em seguida, imaginemos as seguintes situações práticas:
a) tem-se três moedas iguais, porém distinguíveis porque foram marcadas respectivamente com as letras A, B
e C. Se essas moedas forem lançadas e se anotarem todas as possíveis formas de se obter 3, 2, uma e
nenhuma cara, geram-se os seguintes resultados:
Cara
ABC
AB
AC
BC
A
B
C
-
Coroa
C
B
A
BC
AC
AB
ABC
Nesse caso o espaço amostral é de 8 possibilidades, a probabilidade de obter duas caras é 3/8 e a
probabilidade de obter três coroas é 1/8.
b) tem-se três moedas idênticas e indistinguíveis (sem marcas), fazem-se os mesmos lançamentos que geram
as seguintes possibilidades:
Cara
Coroa
ooo
oo
o
o
oo
ooo
Nota-se que nesse caso o espaço amostral é de 4 possibilidades e a probabilidade de obter duas caras ou duas
coroas é 1/4. Percebe-se desse modo que a probabilidade de um evento depende do fato da partícula ser
distinguível ou não pois isto altera o espaço amostral.
A seguir daremos resumidamente as deduções de três tipos de estatísticas: Boltzmann, Bose-Einstein e
Fermi-Dirac. Um estudo mais detalhado pode ser encontrado no livro "Statistical Thermodynamics" de J.F.
Lee, F.W. Sears e D.L.Turcotte.
82
6.3.1 Distribuição de Boltzmann
Vale para sistemas de partículas que não obedecem ao Princípio de Exclusão de Pauli, sendo possível muitas
partículas estarem no mesmo estado o que gera como conseqüência que o número de estados disponíveis é
muito maior que o número de partículas, por isso esse tipo de sistema é denominado sistema diluído. Essa
estatística é a formulação quântica da estatística clássica estabelecida por Maxwell por isso, às vêzes, recebe
o nome de Maxwell-Boltzmann.
Parte-se das seguintes hipóteses:
• a partículas são distinguíveis;
• o número total de partículas é conservado;
• a energia total é conservada;
• não vale o princípio de exclusão de Pauli.
A termodinâmica afirma que a distribuição mais provável, ou seja, a que tem a maior probabilidade de
ocorrer é aquela que quando o sistema está em equilíbrio. Assim, para determinar a distribuição de um
sistema em equilíbrio, deve-se determinar o número de possíveis distribuições das partículas nos diferentes
estados, W, e descobrir qual é a distribuição que torna W máximo; essa distribuição é considerada a
distribuição do sistema em equilíbrio. Na verdade essa distribuição é só a mais provável, mas será suposto
que o sistema que está em equilíbrio realmente tem essa distribuição.
Considere-se que cada uma das distribuições seja a forma na qual deve-se distribuir n partículas em N
estados. Desse modo pode-se perceber que o problema transforma-se na determinação de quantas maneiras
pode-se distribuir n partículas em N caixas . Escolhe-se o número de partículas em cada estado:
n1 partículas no estado N1; n2 partículas no estado N2; n3 partículas no estado N3; e assim por diante.
Relembrando n1 + n2 + n3 + n4 + ......nN = n.
O número de maneiras pelas quais pode-se colocar n1 partículas no estado N1 é dado pela combinação de n
n
partículas n1 a n1: C 1
n
Feitas essas combinações restam n - n1 partículas a serem distribuídas nos N2 estados, o que será dado pela
n
combinação: C 2
n − n1
e assim sucessivamente.
O número total de possibilidades de distribuições é dado pelo produto dessas combinações:
n
n
n
n
W = C 1 .C 2
.C 3
.C 4
.......
n
n−n
n−n −n
n−n −n −n
1
1
2
1
2
3
Substituindo os respectivos valores das combinações obtém-se:




 n − n − n !
 n − n !
n!


1 2
1
n!
.
W =
=
.

 n1! n2!...nn !




n ! n − n ! n ! n − n − n ! n ! n − n − n − n !
1 2 3 
1
1 2 
1 2
3
(6.1)
O que se está procurando é a distribuição que torna W máximo, ou seja, a distribuição que ocorre mais vêzes.
O resultado da maximização de W, nesse caso, dá origem à seguinte expressão, chamada distribuição de
Boltzmann:
83
f = Ae
βE
onde A é uma constante relacionada ao número n de partículas do sistema, β uma constante, obtida a partir
da termodinâmica, que vale − 1 kT , em que k é a constante de Boltzmann e T a temperatura absoluta, e E é a
energia do estado considerado. f é a fração de partículas que estão no estado com energia E.
Fazendo-se A = e α obtém-se:
f = eα e
βE
(6.2)
que expressa a estatística de Boltzmann, válida para o conjunto de moléculas de um gás. A dedução
detalhada da determinação de W máximo pode ser encontrada no livro : “Introdução à Física dos
Semicondutores” de H. A. de Mello & R. S. de Biasi.
Essa estatística caracteriza-se pelo fato de partículas já existentes num certo estado não alterarem
probabilidade de outra partícula ocupar também esse estado.
a
6.3.2 Estatística de Bose-Einstein
Esta estatística é válida para partículas não distinguíveis, portanto para trabalhar com ela parte-se das
mesmas hipóteses que na estatística anterior a menos da primeira, a saber:
•
•
•
•
a partículas são indistinguíveis;
o número total de partículas é conservado;
a energia total é conservada;
não vale o princípio de exclusão de Pauli.
Nesse caso deve-se colocar n partículas em N estados, mas como as partículas são indistinguíveis todos os
estados quânticos tem as mesmas probabilidade a priori. Para se obter W deve-se determinar de quantos
modos ni partículas indistinguíveis podem ser distribuídos em Ni estados.
Imagine-se que se tem Ni caixas dentro das quais deve-se colocar ni partículas não importando quantas
partículas em cada caixa e sabendo que uma permuta entre as partículas não altera a distribuição, porque elas
são indistinguíveis. Pode-se deduzir a expressão da estatística de Bose-Einstein partindo da representação da
distribuição de partículas nas diferentes caixas através de um desenho.
I **** I ******** I ** I
onde I I indicam os limites das caixas e *** indicam as ni partículas colocadas na caixa i. O desenho
acima representa 4 partículas na caixa 1, 8 partículas na caixa 2 e 2 partículas na caixa 3.
Este problema pode ser interpretado como a procura do número de modos que os asteriscos e as barras
podem ser permutados entre si conjuntamente, subtraindo-se, porém, as permutações feitas entre si pelas
barras e pelos asteriscos, porque essas permutações levam a distribuições equivalentes. O produto de todas
essas possibilidades leva à obtenção do número total de possibilidades, W:
84
W =π
(ni + N i − 1)!
n ! (N − 1)!
i
i
(6.3)
foi utilizado (Ni - 1) em vez de Ni porque se houver Ni barras haverá (Ni - 1) caixas.
A maximização de W leva à seguinte expressão para f
f =
1
βE
α
e e
−1
(6.4)
onde
e
α
= ( kT 2 πm)
−3 2  Nh 3 


 V 
(6.5)
sendo:
N o número total de partículas; V o volume ocupado pelo sistema; T sua temperatura absoluta; m a massa das
partículas, h a constante de Planck e β = - l / kT .
Essa estatística caracteriza-se pelo fato de partículas já existentes num certo estado alterarem a probabilidade
de outra partícula ocupar também esse estado. Se já houver n partículas num certo estado a probabilidade de
outra partícula ocupar também esse estado é aumentada de um fator (1+n) em relação a probabilidade que
existiria se as partículas fossem distinguíveis.
6.3.3 Estatística de Fermi-Dirac
As partículas que obedecem a esta estatística chamam-se férmions. Como os férmions são partículas que
obedecem ao princípio de exclusão de Pauli, os postulados dos quais se parte são novamente alterados, em
relação aos das outras estatísticas, tornando-se:
•
•
•
•
a partículas são indistinguíveis;
o número total de partículas é conservado;
a energia total é conservada;
vale o princípio de exclusão de Pauli.
Esse fato implica que agora teremos que distribuir ni partículas indistinguíveis em Ni estados permitidos com
energia Ei. Em cada um dos estados Ni só pode haver uma das partículas de ni. Assim nosso problema se
reduz a descobrir de quantos modos pode-se colocar ni partículas em Ni estados. Dito de outro modo teremos:
n1 partículas nos N 1 estados com energia E1 ;
n2 partículas nos N 2 estados com energia E2 ;
n3 partículas nos N 3 estados com energia E3 ..... e assim por diante.
N !
n
i
W=C i =
N
n ! N −n !
i
i
i
i
(
)
Ao maximizar W obtém-se que a probabilidade de ocupação de um estado com energia E é:
85
(6.6)
f =
1
βE
α
e e
+1
(6.7)
onde e α é dada pela expressão (6.5).
Se a energia de Fermi for definida tal que EF = - α kT pode-se escrever a expressão de f do seguinte modo:
1
f =
(6.8)
e(
E−E
F
) kT + 1
Essa estatística caracteriza-se pelo fato de partículas já existentes num certo estado diminuírem a
probabilidade de outra partícula ocupar esse mesmo estado de um fator (1 - n) em relação à probabilidade
que existiria se as partículas não fossem indistinguíveis. Se o estado já estiver ocupado n é 1, então a
probabilidade de outra partícula ocupar esse estado é zero.
6.3.3.1 Nível de Fermi
Considere-se uma rede cristalina metálica unidimensional formada de N átomos e imagine-se que cada um
desses átomos deu origem a um elétron livre, havendo portanto N elétrons livres na rede. Para estudar que
energias esses elétrons podem assumir considere-se que se trata do problema de partículas numa caixa de
dimensão L. A solução desse problema já foi vista para uma partícula e, nesse caso, as energias permitidas
encontradas foram :
E = n2 E
n
1
(6.9)
onde E é a energia do primeiro nível e vale:
1
E =
1
h
2
(6.10)
2
8mL
essa expressão também permite perceber que, como a caixa é finita, a incerteza de E não pode ser nula e
1
portanto o menor valor da energia não pode ser zero.
Relembrando: tem-se N elétrons que devem ocupar n = N/2 estados pois há dois elétrons com spins
diferentes em cada estado. Na temperatura de zero absoluto todos os elétrons devem estar nos níveis mais
baixos, assim a energia do estado mais energético nessa temperatura é:
2
 N
E
=  E =
N 2  2
1
A título de ilustração calcularemos o valor de E
h
2
8m L
e
N 2
2
2
 N
 N
  = h  


2 2
32 m  2 
2
(6.11)
e
para o cobre. O número de átomos por unidade de
comprimento, (N/L), pode ser obtido a partir da densidade atômica volumétrica :
86
(
N L = 8,49.10
22
atomos / cm
)
3 13
7
= 4 ,4.10 atomos / cm = 0,44atomos / A
(6.12)
substituindo esse valor na expressão de E obtém-se E
= 1,82eV que é chamada energia de Fermi, E F .
n
N 2
Isso significa que, se uma amostra de cobre está na temperatura de 0 K, todos os elétrons livres dentro de sua
rede estão ocupando os níveis energéticos mais baixos e o último nível a estar ocupado é o de energia 1,82
eV. Esse nível é chamado de nível de Fermi e é definido como o nível cuja probabilidade de estar ocupado é
1/2. Adota-se essa definição para englobar o comportamento à temperatura mais altas, que será explicado
posteriormente.
Para uma amostra na temperatura de zero grau absoluto todos os estados com energia inferior a E F estão
ocupados enquanto aqueles com energia superior estão vazios, isso pode ser formalizado afirmando que o
fator de ocupação é 1 para E < E F e zero para E < E F . O gráfico representando essas informações é :
f
1
0
EF
energia
Fig.6.1 - Gráfico do índice de ocupação em função da energia para a distribuição de Fermi -Dirac
A generalização, para três dimensões, da fórmula da Energia de Fermi (6.5), dá:
E
F
=
h
2
8m
( )
2 3
3N
(6.13)
πV
e
onde N/V é a densidade volumétrica de elétrons livres do metal, valor esse que se encontra tabelado.
6.4 COMPARAÇÃO ENTRE AS ESTATÍSTICAS
Resumindo-se as equações que descrevem as três estatísticas aqui explicadas temos, os índices de ocupação
ou funções de distribuição:
− E kT
f = e −α e
(6.14)
Maxwell - Boltzmann
Bose-Einstein
f =
Fermi-Dirac
f =
87
1
+ E kT
eα e
−1
1
− E kT
eα e
+1
(6.15)
(6.16)
Apresentamos abaixo o gráfico dessas três distribuições para valores de α = - 1,0
Fig. 6.2 - Funções de distribuição de Bose, Boltzmann e Fermi em função de E/kT para dois valores de α.
Podem ser observados diferentes fatos:
a) para altas energias (E/kT > 3) fFermi = fBoltz = fBose, o que também pode ser percebido a partir das
expressões acima verificando-se que o termo 1 é desprezível nesse caso;
b) para baixas energias fFermi < fBoltz < fBose, o que é coerente com o fato de haver aumento da probabilidade
de ocupação no caso de bósons e diminuição no caso de férmions;
c) o fator de ocupação para férmions é menor que 1;
d) em temperatura baixas, para energias inferiores a EF, fFermi tende a um e para energias superiores a EF,
fFermi tende a zero como pode ser deduzido da expressão (6.16) e visto na figura 6.2;
e) em temperaturas altas a distribuição de Fermi-Dirac vai se modificando havendo uma diminuição do
número de estados com energia menor que EF ocupados e um aumento da ocupação de estados com energia
superior a EF (linha tracejada na figura 6.1).
6.5 SIMETRIA DAS FUNÇÕES DE ONDA
Semelhantemente à separação de variáveis (r, θ , φ) feita com a função de onda do átomo de hidrogênio,
pode-se separar a solução para um problema de muitas partículas nas soluções independentes de cada uma
das partículas e fazer seu produto.
Assim :
ψ = ψ(1) . ψ(2) . ψ(3) .....
esse resultado será utilizado para analisar as relações de simetria das funções de onda que descrevem
partículas indistinguíveis.
Imaginemos dois estados a e b e duas partículas 1 e 2, como as partículas são indistinguíveis as
probabilidades delas ocuparem esses dois estados é a mesma :
ψ 2 (1,2) = ψ 2 (2,1)
donde se obtém:
ψ(1,2) = ψ(2,1) função de onda simétrica para um troca de índices de partículas
ψ(1,2) = - ψ(2,1) função de onda antissimétrica para um troca de índices de partículas
88
Utilizando o conceito dado inicialmente podemos separar a função de onda total no produto de funções de
onda de cada partícula, assim se considerarmos a partícula 1 no estado a e a partícula 2 no estado b podemos
escrever as seguintes funções de onda:
ψΙ = ψa(1) ψb(2)
ψΙΙ = ψa(2) ψb(1)
Essas duas funções são igualmente corretas assim como também qualquer combinação linear delas, como por
exemplo as seguintes:
ψS = (1/ 2) [ ψa(1) ψb(2) + ψa(2) ψb(1) ]
ψA = (1/ 2) [ ψa(1) ψb(2) - ψa(2) ψb(1) ]
Se a partícula 1 puder existir simultaneamente que a partícula 2 no mesmo estado a = b obtém-se:
ψS = (2/2) ψa(1) ψa(2)
ψA = 0
isto significa que quando é possível ter duas partículas no mesmo estado a função é simétrica, que é o caso
dos bósons e quando não é possível ter duas partículas no mesmo estado a função é antissimétrica, que é o
caso dos férmions.
6.6 PROPRIEDADES DAS PARTÍCULAS
I) Partículas distinguíveis • o número de estados é muito maior que o número de partículas;
• a função de distribuição é do tipo exponencial;
• exemplo: as moléculas de um gás
• a função de onda da partícula não tem simetria especial.
II) Bósons
• um estado ocupado tem mais probabilidade de ter sua ocupação aumentada do que se as partículas fossem
distinguíveis;
• a distribuição tem comportamento exponencial para altas energias;
• são partículas idênticas de spin zero ou inteiro; exemplos são os átomos de hélio líqüido, as partículas
alfa (s = 0), os dêuterons (s = 1) e os fótons (s = 1).
• a função de onda é simétrica numa troca de índices de partículas.
III) Férmions
• um estado ocupado tem probabilidade zero de ser ocupado por outro férmion;
• a distribuição tem comportamento exponencial para altas energias;
• são partículas idênticas de spin semi-inteiro como os elétrons dento de um metal ou semicondutor;
• a função de onda é antissimétrica numa troca de índices de partículas.
89
6.7 APLICAÇÕES DA ESTATÍSTICA
6.7.1 LASER
O LASER é um aparelho formado de um material especial no qual injeta-se radiação luminosa comum e
obtém-se um feixe de radiação intensificado, coerente (os raios luminosos estão em fase) e muito bem
direcionado. Antes de explicar o funcionamento desse dispositivo explicar-se-á a ocupação dos estados de
um sistema de partículas.
Considere-se as partículas de um gás, em equilíbrio numa temperatura T. Se as energias envolvidas forem
maiores, de alguns kT, que o nível fundamental os estados serão esparsamente ocupados e a distribuição de
ocupação, f , será muito menor que 1. Aqui será examinado o comportamento dos fótons, que são bósons,
então deveria ser usada a estatística de Bose-Einstein. Como, porém, número médio de partículas por estado
quântico é muito menor que 1 já que f é menor que 1, a estatísticas de Boltzmann e de Bose-Einstein
apresentam resultados semelhantes, o que justifica o uso da estatística de Boltzmann, que é mais facilmente
manipulável.
A relação entre as populações de dois estados quânticos com energias E1 e E2, o chamado fator de
Boltzmann, pode ser obtido a partir da razão entre os fatores de ocupação, fBoltz, desses dois estados.


f
E 
Boltz  2 
f


 E 

Boltz 1 
[(
) ]
= exp − E − E / kT
2
1
(6.17)
A intensidade das linhas espectrais depende da população dos estados entre os quais ocorrem as transições.
Desse modo, o fator de Boltzmann permite prever tanto a intensidade das raias originadas de um certo gás,
em equilíbrio numa certa temperatura, como a temperatura de um gás, a partir da intensidade das linhas
espectrais emitidas por ele. Este último método é usado para determinar a temperatura de estrelas distantes.
O LASER, cujo nome foi formado com as iniciais da seguinte expressão: “Light Amplification by
Estimulated Emmisions of Radiation” - Amplificação da Luz por Emissão Estimulada da Radiação - é um
dispositivo que utiliza o conceito apresentado acima. Para entender o funcionamento do laser é preciso
analisar as diferentes formas de transição entre dois níveis energéticos de um átomo (na presença de um
campo magnético).
Existem transações entre níveis energéticos que podem ser espontâneas ou estimuladas. Examinem-se três
casos:
a) “absorção estimulada” - o elétron passa de um nível de energia E1 para um nível de energia E3 (E3 > E1)
(
estimulado pela incidência de um fóton com freqüência ν = E − E
3
)
1
h
b) “emissão espontânea” - um elétron passa do nível mais alto, E3, para um mais baixo, E2, espontaneamente
emitindo um fóton
c) “emissão estimulada” - a passagem do elétron do nível mais alto, E2, para um mais baixo, E1, é estimulada
pela incidência de um fóton, resultando na emissão de dois fótons de mesma freqüência: o incidente e o
gerado.
O dispositivo que produz a radiação LASER envolve estes três processos, de acordo com a figura
6.3.
90
Fig. 6.3. Representação dos tipos de processos que ocorrem para a produção do laser: (a) absorção
estimulada; (b) emissão espontânea; (c) emissão estimulada.
O tempo médio de um elétron num estado é da ordem de 10-8 s, porém existem estados, chamado
metaestáveis, cujo tempo médio de vida é da ordem de 10-3 s. O nível E2 é metaestável.
Pelo princípio de incerteza tem-se:
∆t ⋅ ∆E ≥ h / 2
No estados metaestáveis ∆t é bem maior que nos estados comuns então ∆E será bem menor. Isso implica
que os elétrons que estão no estado metaestável tem energia muito mais bem definida, praticamente
monocromática, pois ∆E é da ordem de 10-30 J. Assim os fótons emitidos pelos elétrons provenientes do
estado metaestável dos diferentes átomos tem todos a mesma energia.
Considerados dois estados, E1 e E2, pode haver transição do primeiro para o segundo, nesse caso trata-se de
uma absorção, ou do segundo para o primeiro e então estará ocorrendo emissão. É possível provar que a
razão entre a taxa de emissão e a taxa de absorção é proporcional à razão entre a população dos estados 2 e 1:
n
taxa ⋅ de ⋅ emissão = 2
taxa ⋅ de ⋅ absorção n
1
(6.18)
Esse fato é o conceito fundamental para o laser, pois se for possível conseguir “inversão de população”, ou
seja, n2 maior que n1, será possível conseguir maior emissão que absorção, isto é, uma amplificação da
radiação aplicada. Na prática isso só é possível se a população do estado 2 puder ser mantida num valor alto,
o que é factível através de outro procedimento chamado bombeamento óptico, que eleva os elétrons do
estado 1 ao estado 3, de onde eles decaem num tempo da ordem de 10-8 s para o estado 2.
91
Um laser de cristal de rubi é um bastão de Al2O3 no qual alguns átomos de alumínio foram substituídos por
uma impureza: átomos de cromo. Os níveis E1, E2 e E3 são níveis de energia assumidos pelos elétrons
presentes no cristal de rubi. O estado fundamental é E1. Se o cristal for iluminado com luz de comprimento
de onda de 5500 A os elétrons dos átomos de cromo absorverão essa radiação e passarão para o nível E3 que
é instável decaindo em seguida para o nível E2. Como o tempo de vida em E2 é maior que em E3 a população
n2 ficará maior que a de , o que provocará uma emissão bem maior que a absorção, ou seja, uma emissão
amplificada. Esse comportamento explica o fato da intensidade da radiação emitida, ou seja dos raios laser,
ser muito maior que a intensidade da luz incidente.
Examinar-se-á agora como se obtém a coerência dos raios laser, ou seja, como se consegue que os raios
emitidos simultaneamente estejam em fase. Nas fontes comuns de luz os fótons emitidos pelos diferentes
átomos não tem nenhuma relação entre si então não se apresentam em fase. No caso do laser a excitação dos
elétrons do nível 1 para o nível 3 é causada pela incidência de luz sobre todos os átomos simultaneamente,
ou seja, em fase, assim a radiação emitida é coerente.
Os fótons gerados pela transição dos elétrons do nível 2 para o nível 1 estarão “amplificados”, ou seja, em
maior número, além de estarem em fase. Esses fótons ficam dentro do cristal que tem um tamanho e um
formato adequado para funcionar como uma caixa ressonante. Uma das extremidades do cristal é refletora e
a outra é parcialmente refletora. Os raios laser que se movem dentro do cristal numa direção diferente da do
eixo atravessam as paredes laterais sendo emitidos para fora. Aqueles que se movem exatamente na direção
do eixo são refletidos diversas vêzes pelas extremidades e nesse percurso atuam como fótons estimuladores
das transações do estado 2 para o estado 1. Os raios que ultrapassam a superfície, parcialmente refletora,
formam o feixe emergente do dispositivo, que se constituirá numa radiação luminosa perfeitamente
colimada, coerente, de grande intensidade e de comprimento de onda altamente definido, 6943 A no caso
do rubi. A figura 6.4. mostra um esquema simplificado do dispositivo de produção de laser.
Fig. 6.4 - Esquema do dispositivo de rubi mostrando a lâmpada de bombeamento ótico, a haste de rubi, suas
faces espelhadas e o feixe emergente.
Se o rubi for substituído por outro material, que pode ser sólido, líquido ou gasoso, é possível conseguir
lasers com comprimentos de onda em outras faixas do espectro eletromagnético, como os masers, por
exemplo, que atuam na faixa das microondas, e com potências muito variadas. As caraterísticas do
dispositivo são escolhidas de acordo com aplicações nas quais os lasers serão utilizados: radioastronomia,
medicina, fotografia, comunicações ou espectroscopia.
Os resultados aqui mostrados evidenciam o comportamento dos bósons, no caso os fótons, citado na seção
6.6. Estados ocupados por n partículas tem a probabilidade de serem ocupados por outra partícula reforçada
por fator (n + 1)/n, ou seja, quanto maior o número de fótons no estado 2 maior a probabilidade que novos
fótons ocupem esse estado.
92
6.7.2 Fótons
Lembrando que os fótons são bósons, pode-se considerar que uma aplicação da estatística de Bose é o
estudo da cavidade de um corpo negro na qual a radiação é formada por um conjunto de partículas
indistinguíveis, os fótons.
Na estatística de Bose a distribuição de partículas por estado é dada pela expressão:
f =
1
− E kT
α
e e
−1
onde o parâmetro α é definido pelo número total de partículas. No caso da cavidade, porém, um fóton pode
ser totalmente absorvido pela parede interna ou emitido por ela, quando esta estiver aquecida. Desse modo a
expressão de f não pode depender de α, que é variável. Logo, α deve ser zero, assim e α = 1 e a expressão
de f torna-se:
f =
e
1
− E kT
(6.19)
−1
Usando-se essa expressão para calcular a distribuição de energia em função do comprimento de onda
associado ao fóton chega-se a uma expressão idêntica a (3.4), reapresentada abaixo:
R(λ ) =
2 πhc 2 λ−5
e hc λkT − 1
(3.4)
O cálculo de Planck, apresentado no capítulo 3, considerou a radiação dentro da cavidade como formada de
ondas eletromagnéticas estacionárias. A dedução feita nesta seção tratou a radiação dentro da cavidade como
formada por partículas, os fótons. Ambas abordagens chegaram um resultado idêntico, isso comprova a
validade da estatística de Bose para os fótons.
6.7.3 Calor específico num sólido cristalino
Outro conceito que envolve a estatística de Boltzmann aplicada a sistemas quânticos é o calor específico
num sólido cristalino. Recordando, o calor específico molar, a volume constante, é a quantidade de calor que
deve ser fornecida a um mol de moléculas para aumentar sua temperatura de um grau. Como essa grandeza
não é constante deve ser escrita como:
( )
dU
c =
V
dT V
(6.20)
Em 1819, Dulong e Petit observaram experimentalmente que cV era praticamente da ordem de 6.cal/K.mol
para todos materiais independentemente da sua composição química. Esse resultado foi deduzido
teoricamente considerando que a energia interna de um sólido corresponde à energia vibracional (cinética e
potencial) das moléculas em torno de sua posição de equilíbrio. Esses cientistas consideraram três graus de
liberdade para a molécula e uma energia média de kT por grau de liberdade, expressão (2.8). Assim puderam
deduzir que, para um mol, vale:
U = 3⋅ N
A
⋅
E = 3 ⋅ kT ⋅ N
93
A
(6.21)
onde N é o número de Avogadro.
A
Derivando obtém-se:
dU = 3 ⋅ k ⋅ N
A
dT
que permite chegar à expressão do calor específico:
c = 3 ⋅ k ⋅ N = 3 ⋅ R ≅ 6. cal / mol . K
V
A
(6.22)
onde R é a constante universal dos gases.
Esse resultado, conhecido como a lei de Dulong-Petit, é bastante bem obedecido por gases monoatômicos,
como o argônio e o hélio. Para outros gases, o calor específico molar medido é maior que esse valor,
indicando que uma parte do calor que chega é transformada em outra forma de energia interna que não a
energia cinética translacional, como por exemplo, a energia de rotação ou energia de vibração.
Einstein, ao estudar o conceito de calor específico, fez uma abordagem diferente para obter a energia interna
de um sólido. Como Planck, que considerou a energia de uma cavidade de corpo negro limitada a valores
discretos, Einstein também supôs que os átomos e moléculas de um sólido só poderiam vibrar com certas
freqüências múltiplas de uma freqüência mínima. Do mesmo modo que Planck, ele estabeleceu a quantização
da energia das moléculas, que também podem ser consideradas como osciladores. Einstein equacionou estas
idéias dizendo que cada oscilador só poderia assumir valores de energia determinados pela expressão:
E = nε = nhν
n
(6.23)
onde h é a constante de Planck e n só pode assumir valores inteiros positivos . Ele considerou que todas as
moléculas vibrariam com a mesma freqüência.
Em vez de considerar a energia média por grau de liberdade igual a kT ele a calculou através da expressão
(3.2) usada por Planck:
_
∞
∞
E = ∑ E n f n = ∑ E n C .e
n=0
− En
kT
(3.2)
n= 0
onde fn é o fator de ocupação da distribuição de Boltzmann e C a constante de normalização obtida a partir da
condição:
∞
∑ f =1
n
n=0
Do mesmo modo que Planck, Einstein obteve a seguinte energia média para o oscilador harmônico:
E=
que substituída na expressão de (6.21) de U dá:
hν
e hν kT − 1
U=
(3.3)
3N hν
A
e hν kT − 1
94
cuja derivada permite obter a expressão do calor específico molar:
( )
c = 3N k . hν
V
A
kT
e hν kT
2
 ehν kT − 1
2
(6.24)


Essa expressão fornece a dependência de c em função da temperatura. Pode-se observar que para
T⇒∞
cV ⇒ 3. N A k = 3. R
cV ⇒ 0 .
e para T ⇒ 0
A figura abaixo mostra que a expressão deduzida por Einstein se ajusta bem aos valores experimentais
mesmo em temperaturas muito baixas quando os valores teóricos são um pouco superiores aos
experimentais. Essa discrepância deu-se por causa da simplicidade do modelo proposto por Einstein. Ele foi
aprimorado por Debey que, em 1912, fez um dedução para a energia média considerando, para átomos
distintos, freqüências diferentes porém relacionadas por causa do forte acoplamento existente entre os
átomos. Em resumo, tratou o sólido como um sistema de osciladores acoplados. O ajuste entre seus
resultados e os resultados experimentais foi muito bom, inclusive para temperaturas muito baixas.
É ilustrativo fazer aqui uma comparação entre o resultado de Dulong-Petit e de Einstein, para determinar
em que regiões de temperatura essas teorias são adequadas. Define-se a temperatura de Einstein, TE, como a
temperatura crítica acima da qual a teoria clássica é adequada:
TE = hν / k
Substituindo-se na expressão (6.14) de fn obtém-se:
f
E = Ce
n( )
( )T
(6.25)
− nT
E
(6.26)
Examinado essa expressão observa-se que p/ T >> TE a variação de n altera pouco o valor de fn pois
f (E) ≈ f
E
o que implica que E é praticamente uma variável contínua e portanto pode-se usar a
n
n + 1( )
integral para calcular o valor médio de E, ou seja, vale a abordagem clássica.
Para T << TE a variação de n de uma unidade implica em grandes descontinuidades nos valores da energia
o que invalida a teoria clássica e exige o uso da teoria de Einstein.
Metais duros tem forças de ligação mais intensas que metais moles e por conseqüência suas freqüências
moleculares e temperaturas de Einstein também maiores. Desse modo, uma determinada temperatura pode
ser superior à temperatura de Einstein de um metal mole, mas ser inferior à temperatura de Einstein de um
metal duro. Analisando um caso prático: para o chumbo e para o ouro TE é da ordem de 100K, para o
diamante TE é superior a 1000K; desse modo a temperatura ambiente, da ordem de 300K, é “alta” para o
chumbo e ouro e é “baixa” para o diamante. Na temperatura ambiente o ouro obedece à lei clássica de
Dulong-Petit e o diamante não, ou seja, seu cV, bem menor que 3R, deve ser calculado pela expressão geral
(6.24).
95
6.7.3 Fônons
A energia vibracional dos átomos e moléculas formadoras de um sólido foi tratada por Einstein como uma
grandeza quantizada. As vibrações elásticas excitadas termicamente num sólido podem ser consideradas
como processos que envolvem a emissão ou absorção de “energia acústica”, termo que aqui significa energia
mecânica.
Fazendo uma analogia com a radiação eletromagnética associada a um corpo negro, em forma de cavidade,
pode-se falar em radiação acústica associada a um sólido. Essa analogia pode ser resumida na forma de
diversos paralelos que estão na tabela que segue.
TABELA 6.1 COMPARAÇÃO ENTRE A RADIAÇÃO ELETROMAGNÉTICA E A ACÚSTICA
Radiação eletromagnética
Dualidade onda-partícula para radiação
eletromagnética
fótons = “quanta” de energia eletromagnética
os fótons são absorvidos e emitidos pela
parede da cavidade
a emissão e a absorção da energia
eletromagnética é quantizada em fótons
a energia mínima transferida pelos fótons é =
hν onde ν é a freqüência das ondas
eletromagnéticas
a estatística que vale é a de Bose com α = 0
número total de fótons não é fixo
a cavidade tem um gás de fótons
os fótons se propagam no vácuo
Radiação acústica
dualidade onda-partícula para radiação
acústica
fônons = “quanta” de energia acústica
o fônons são absorvidos e emitidos por
moléculas e átomos do sólido que vibram
em torno de sua posição de equilíbrio
a emissão e a absorção da energia acústica é
quantizada em fônons
a energia mínima transferida pelos fônons é
= hν onde ν é a freqüência de vibração da
rede
a estatística que vale é a de Bose com α = 0
número total de fônons não é fixo
o sólido contém um gás de fônons
os fônons se propagam no material
Dito de outra forma pode-se considerar que as moléculas e átomos não podem vibrar com qualquer
freqüência em torno de sua posição de equilíbrio mas somente em certas freqüências quantizadas. Quando
um átomo altera sua energia de vibração a alteração ocorre em quantidades equivalentes a energia de um ou
mais fônons.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
R.B. Leighton, Principles of Modern Physics, New York: McGraw- Hill Book Company, 1959.
P.A.Tipler, Física Moderna, Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1981.
R.Eisenberg, R. Resnick, Física Quântica - Átomos, moléculas, sólidos, núcleos e partículas, São Paulo: Editora Campus, 1994.
H. Pohl - Introdução à Física Quântica, São Paulo: Editora Edgard Blücher Ltda, 1973.
S.Datta - Quantum Phenomena in Modern Solid State , Modular Series on Solid State Device, vol IX, EUA: AddisonWesley Publishing Company 1989
L.Landau , E. Lifchitz - Mecanique Quantique , Moscou : Editions de Moscou 1966
H.A. Mello, R.S. Biasi - Introdução à Física dos Semicondutores, São Paulo: Editora Blucher Ltda - 1975
96
J.F. Lee, F.W. Sears e D.L.Turcotte - Statistical Thermodynamics , EUA: Reading, Mass.: Addison-Wesley Publishing Co. Inc.
1963.
PROBLEMAS
6.1. - Em que sistemas físicos e em que condições podemos aplicar a "Estatística Quântica" para descrevelos.
6.2. - Explicar o que a função de distribuição de Fermi-Dirac descreve, como ela varia com a temperatura e
para que tipo de partículas se aplica.
6.3. - Considerando-se os elétrons de uma barra de metal de sódio, na temperatura ambiente (kT=0,026 eV),
e sabendo-se que EF = 2 eV , determinar a probabilidade do nível E = 2,8 eV estar ocupado. essa
probabilidade depende de nível estar ou não no gap proibido?
6.4. - Sabendo que a intensidade relativa das linhas espectrais provenientes da transição de átomos de um gás
de um estado a outro depende do número relativo de átomos nos dois estados quânticos determinar a razão
entre os índices de ocupação u1 e u2 de um gás que está na temperatura de 300oC sabendo que a energia
do estado 1 é 5 eV e do estado 2 é de 2 eV;
6.5. - Traçar o gráfico do índice de ocupação, em função da energia, de um conjunto de partículas idênticas
que não obedecem ao princípio de exclusão de Pauli considerando-se α = 0,69 e a temperatura de 10 000 K.
6.6 - Determinar o fator de ocupação, na temperatura de 300K para os seguintes materiais, que tem o nível de
Fermi no meio da banda proibida. Germânio - Eg = 0,07 eV ; Carbono - Eg = 7,0 eV
Explicar o significado dos resultados encontrados.
6.7. - Fazer o gráfico do índice de ocupação em função da energia de um conjunto de partículas idênticas a
temperatura de 8 000 K que não obedecem o princípio de exclusão de Pauli e que tem α=0,5.
6.9. - Dar cinco caraterísticas dos férmions.
6.10. - Explicar o que é nível de Fermi e calculá-lo para um conjunto de férmions no ouro.
6.11. - Considerando-se os elétrons de uma barra de metal de sódio, na temperatura ambiente (kT=0,026 eV),
e sabendo-se que EF = 2 eV , determinar a probabilidade do nível E = 3,2 eV estar ocupado.
6.12. - Explicar o que são férmions e bósons.
6.13. - Explicar em que casos se usam cada uma das seguintes estatísticas: Boltzmann, Fermi-Dirac e BoseEinstein e por que elas foram criadas.
6.14. - Dar as principais diferenças entre as funções de Boltzmann e de Fermi-Dirac.
6.15 - Explicar quantas freqüências de emissão caraterísticas o átomo pode ter no modelo de Thomson. Dar a
mesma informação para o modelo de Bohr.
97
Download

Parte II - Filofima