A Inadimplência nas Instituições de Ensino Superior
Privadas: Causas Financeiras ou Sociais?
Ari Holanda Júnior
Faculdade Lourenço Filho (FLF)
Heber José de Mora
Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
Resumo:
A nova Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Brasileira proporcionou uma expansão sem igual
na quantidade de IES, proporcionando uma oportunidade para milhares de brasileiros terem acesso ao
ensino superior, mas em contrapartida, surgiu um fenômeno de proporções até então nunca vista: a
inadimplência estudantil. Com o objetivo de estudar quais os fatores que condicionam o fenômeno,
elaborou-se este estudo em uma IES privada na cidade de Fortaleza-CE. Constatou-se que a produção
acadêmica sobre o tema no Brasil é escassa. Assim utilizaram-se, como referencial teórico, várias
pesquisas realizadas em outros países, que abordaram o assunto. Através de análise estatística, com a
utilização de Análise Discriminante com validação cruzada, para a determinação dos principais fatores
condicionantes, verificou-se na amostra estudada que a inadimplência tem relação com fatores pessoais,
sócio-econômicos, acadêmicos e institucionais, portanto gerenciáveis. O pressuposto de que a
inadimplência estudantil está relacionada somente com fatores financeiros não se confirmou..
Palavras-chave: Educação Brasileira, Ensino superior, Inadimplência escolar.
1 INTRODUÇÃO
O tema associado aos fatores que condicionam a inadimplência em instituições
particulares de ensino superior se refere à análise do perfil dos alunos inadimplentes e
adimplentes, segundo suas características sócio-econômicas, relacionamento acadêmico, e
características de uma instituição de ensino superior privada, localizada na cidade de FortalezaCE. Esta análise se fez necessária tendo em vista a expansão do mercado de ensino superior,
tanto em nível Brasil quanto em nível local, e os alarmantes índices de inadimplência
registrados pelas instituições de ensino superior privadas, que já experimentam um ambiente
cada vez mais competitivo na busca da sobrevivência e da sedimentação no mercado de ensino
superior. Segundo a Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação (MEC),
somente em Fortaleza, existem trinta e uma Instituições de Ensino Superior (IES) privadas e
três públicas.
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Constata-se no Brasil, entre 1997 e 2003, uma evolução radical no número de
instituições de ensino superior (IES). Ao cenário apresentado, é razoável supor que o
incremento no número de IES, e a conseqüente oferta de vagas, resultaram em modificação no
comportamento da demanda (representada por aqueles que se inscrevem para a seleção),
concernente à tomada de decisão do consumidor por uma ou outra IES.
Este contexto irá requerer uma melhor compreensão deste ambiente, um conhecimento
mais acurado do mercado, da inadimplência nas IES e as possíveis características dos alunos, e
também, da instituição, face à possibilidade de existência de diferenças significativas entre
aqueles que honram suas responsabilidades financeiras assumidas, referentes à prestação de
serviços educacionais no ensino de graduação, e aqueles que alimentam as estatísticas da
inadimplência escolar.
Assim, se pretende contribuir com a elaboração de novos conhecimentos, demonstrando
quais os elementos ou fatores que condicionam o fenômeno da inadimplência, possibilitando,
assim, às instituições de ensino superior procederem à formulação de suas estratégias,
direcionando-as à prevenção, ou à redução dos índices que consideram significativos.
No Brasil, uma das especificidades das instituições de ensino superior é a origem de
seus recursos financeiros. Sob este aspecto têm-se dois tipos de instituições: a) as que são
mantidas pelo Poder Público - instituições públicas e b) as que se mantém com recursos
próprios – instituições privadas.
Esta distinção jurídica resulta numa segmentação de mercado. Para efeito deste estudo,
o mercado de ensino superior é entendido como um conjunto, do qual fazem parte: a) os
consumidores dos serviços de ensino superior (aqueles que já estão matriculados); b) os agentes
potenciais para o ingresso no ensino superior (aqueles que concorrem a uma vaga nas IES); c)
as instituições que ofertam ensino superior.
A caracterização da segmentação se observa com os números das matrículas no ensino
público e no ensino privado. Segundo o INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais, em CENSO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR DE 2003, em 2004, o Brasil já
apresentava 1.137.119 matrículas no ensino público e 2.750.652 matrículas no ensino privado.
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Estes dados mostram que o ensino público detém 29,2% das matrículas enquanto que o ensino
privado detém 70,8%.
Evidentemente, a expansão já vinha se dando ao longo do tempo. Porém, se verifica a
maior variação no período 1996 – 2000, justamente quando passou a vigorar a nova Lei de
Diretrizes e Bases para a Educação (LDB) e o surgimento das novas IES.
Vários efeitos desta expansão já se fazem sentir: aumento da oferta de cursos, da oferta
de vagas, da competição entre as IES, redução no valor das mensalidades, redução da qualidade
do ensino, aumento da evasão de alunos e da inadimplência das mensalidades escolares.
Cabem, portanto, as seguintes interrogações:
•
Quais as características que diferenciam os estudantes inadimplentes daqueles
adimplentes em uma instituição de ensino superior?
•
perfil do novo universitário, e seu desempenho acadêmico estão relacionados à taxa
de inadimplência escolar?
•
valor da mensalidade cobrada influi na taxa de inadimplência?
•
grau de satisfação do aluno influi na taxa de inadimplência?
•
Existem características relacionadas à instituição que influenciem na taxa de
inadimplência?
•
Caso positivo, que instrumentos apoiariam os gestores das IES na prevenção da
inadimplência?
As respostas a estas indagações requerem um estudo aprofundado destas organizações
acadêmicas, do ambiente em que estão inseridas e, sem dúvida, do perfil de seus alunos.
Agrava-se a questão, pois, se uma instituição de ensino superior se reorganiza e
aumenta sua estrutura para satisfazer a maior diversificação de suas atividades acadêmicas, e
continua se financiando, praticamente, apenas com o ensino de graduação, então poderá passar
por problemas financeiros graves advindos de altos custos operacionais. Isto poderá se traduzir,
ao seu tempo, em desvantagem competitiva com riscos acentuados de redução de demanda,
aumento no valor das mensalidades, aumento da inadimplência, aumento da evasão escolar por
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desistências, redução significativa dos resultados financeiros da instituição, redução do nível de
investimentos, sucateamento institucional e, até mesmo, a paralisação de suas atividades.
Uma argumentação sempre presente é a de que, cientes que a Lei proíbe o
constrangimento de quem deve para instituições de ensino, os responsáveis financeiros
postergam o pagamento das mensalidades escolares. Desta forma, o ensino superior particular
ganha uma nova barreira à sua sustentabilidade, além da concorrência já existente. Sendo,
portanto, necessário o emprego de estratégias alternativas para garantir a viabilidade financeira.
Considerando-se que ao aluno optar por cursar o ensino superior em uma instituição
privada, estará fazendo um investimento em capital intangível, cujo retorno somente se dará
após a conclusão dos estudos. Este investimento se dará sob a forma de mensalidades escolares,
custos com aquisição de livros e materiais escolares, além de custos de manutenção do aluno,
como aluguel, transportes e outras despesas.
A partir da experiência vivida pelo setor financeiro, tende-se a supor que a causa da
inadimplência está relacionada com o perfil econômico e a capacidade de pagamento do aluno.
Entretanto, no caso do setor educacional, não é difícil também supor que, o mesmo aluno
inadimplente apresenta características sociais e comportamentais que podem contribuir para o
problema.
Existindo uma grande oferta de prestadores de serviço de educação, aliada a uma
legislação que impede uma punição aos inadimplentes, leva-se a crer que diversos outros
fatores além do financeiro estão relacionados à inadimplência educacional.
Isto posto, apresenta-se a hipótese de que o fenômeno da inadimplência no ensino
superior privado é função da realidade sócio-econômica de cada aluno, do seu grau de
comprometimento e desempenho acadêmico, do conceito do curso e do nível dos serviços
prestados pela instituição, os quais têm influência na predisposição do responsável financeiro
pelas mensalidades, em honrar ou não o compromisso assumido perante a Instituição de Ensino
Superior.
Os objetivos desta pesquisa convergem para o conhecimento mais acurado entre o
perfil sócio-econômico dos alunos, sua predisposição para a inadimplência, as características e
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práticas da IES e o conseqüente índice real de não recebimentos pertinentes ao serviço de
educação superior numa instituição privada. Assim, determinar fatores que expliquem a
inadimplência em uma IES privada (fatores estes gerenciáveis pelos alunos e pela instituição),
encontrar a relação entre o perfil sócio-econômico do aluno de nível superior e a inadimplência
e verificar relação entre as características da instituição de ensino superior estudada e o índice
de inadimplência, é o que se propõe o trabalho.
2 A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
O Relatório do Censo da Educação no Brasil, elaborado pelo MEC – Ministério da
Educação em 2003 e divulgado no segundo semestre de 2004, relata que o ensino superior
brasileiro teve nos últimos anos crescimento recorde no número de instituições privadas. No
período, a média foi de quase um estabelecimento particular novo a cada dia. Segundo o MEC,
somente de 31 de outubro de 2001 até 30 de julho de 2003, as instituições privadas aumentaram
45% - 544 foram autorizadas a funcionar, ou seja, um estabelecimento a cada 1,2 dia. Entre
1998 e 2001, essa média era de uma instituição privada a cada 2,5 dias. De 1995 a 1998, ficava
em uma a cada 13,7 dias. Em 31 de outubro de 2001, data de início da coleta do Censo da
Educação Superior, o MEC indicava a existência de 1.392 instituições, sendo 1.208 privadas
(86,8% do total). No resultado do Censo de 2003 o cadastro do ministério indica que o total
chegou a 1.859, sendo 1.652 particulares (88,9%).
O número de instituições públicas também aumentou de 2001 até julho de 2003: de 183
para 207, ou uma a cada 25 dias. Toda essa expansão, no entanto, não elevou significativamente
o número de alunos de classes mais baixas na Escola. O país também está ainda muito longe da
meta estipulada no PNE (Plano Nacional de Educação).
O aumento da concorrência entre instituições, a queda na renda média do brasileiro e a
necessidade de expandir o sistema incluindo um estudante de perfil mais carente estão
obrigando os estabelecimentos privados de ensino superior a mudar o seu perfil. Um estudo
feito pela consultoria Hoper mostra que, de 1997 a 2002, o preço médio da mensalidade de 208
cursos de administração das regiões Sul e Sudeste caiu 22%, de R$ 498 para R$ 387.
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Um dos autores do estudo, o consultor de marketing educacional Ryon Braga, afirma
que essa redução se deve, principalmente, à oferta de novos cursos de administração, que
chegam ao mercado oferecendo uma mensalidade menor do que a das instituições já
estabelecidas. Braga diz que a expansão do ensino superior, antes restrita às classes A e B, já
chegou à classe C. “Na década de 90, havia uma demanda bastante reprimida nas classes A e B.
A partir de 2000, essa demanda já foi atendida, e as projeções indicam que, a partir de agora, o
crescimento do ensino superior acontecerá apenas nas classes C e D”, diz Braga. Para isso, o
consultor afirma que as instituições de ensino superior terão de encontrar uma maneira de
oferecer cursos com mensalidades mais baratas, sem perda da qualidade. “Acabou a fartura”.
Apesar do crescimento significativo das matrículas nos últimos anos, a realidade do ensino
superior não é mais aquela que as pessoas imaginam.
As instituições hoje são preparadas para atender apenas as classes A e B. O valor das
mensalidades não é compatível com o que pode pagar a classe C, onde crescerá a demanda. No
estudo, Hoper leva em conta que uma família brasileira consegue comprometer até 25% de sua
renda com o pagamento de mensalidades escolares. Como o estudo considerou como sendo de
classe C um brasileiro com renda familiar de R$ 844, o máximo que essa família poderia gastar
com educação seria R$ 211,00. Para o ex-ministro da educação Paulo Renato Souza a classe C
representará 60% dos estudantes de ensino superior até o ano de 2008.
3 O FINANCIAMENTO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO
O financiamento estudantil pode ser analisado sob a perspectiva da teoria do capital
humano (SCHWARTZMAN, 2003). Da mesma forma que uma organização empresarial busca
financiamento para capital físico, no sistema bancário, o mesmo poderá ser feito para o capital
humano. Em ambos o caso, se espera que os recursos despendidos na aquisição do capital
(físico ou intangível) sejam recuperados, no futuro, acrescidos de um rendimento (incluindo-se
o custo de oportunidade dos recursos empregados). Para o investimento em capital físico, é
possível para os investidores a análise da perspectiva do negócio, tendo em vista as garantias
reais existentes: o próprio bem físico ou garantias reais. Para o investimento em capital
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humano, torna-se difícil a obtenção de uma garantia real, pois via de regra trata-se de pessoas
que buscam uma escolaridade superior, sem muitas garantias a oferecer, perspectivas incertas
no mercado de trabalho futuro, tanto em termos de prazo, quanto de remuneração e, certamente
será muito difícil encontrar avalistas aceitáveis, ou seja, seu único ativo é a possibilidade de
renda futura.
Neste cenário, é normal se esperar que não exista muito interesse do setor privado de
mercado de capitais, em realizar esse tipo de empréstimo ou, fazê-lo a taxas de juros elevadas,
em função do alto risco e da falta de garantias reais. Some-se a isto a falta de tradição na
concessão de crédito pessoal de longo prazo, em vários países. Segundo Johnstone (2000), os
programas de financiamentos estudantis estão entre os mais complexos, controversos,
freqüentemente mal compreendidos, e potencialmente importantes elementos que constituem as
finanças da educação superior. A importância dos programas tem raiz na crescente necessidade
da divisão de custos – significando que ao menos uma parte dos custos da educação superior
deverá ser passada dos governos e contribuintes aos pais e alunos – existente nas agendas de
políticas públicas para a educação superior na maioria dos países.
4 O FINANCIAMENTO ESTUDANTIL NO BRASIL E EM OUTROS PAÍSES
As instituições de ensino superior privadas brasileiras, além da concorrência oriunda do
salto no número de instituições existentes, têm um fator limitador no que se refere ao
financiamento. A alocação de recursos públicos às instituições privadas é vedada pelo artigo
213 da Constituição Federal, que abre exceção apenas às instituições confessionais,
comunitárias ou filantrópicas, além de permitir a destinação de recursos à pesquisa científica.
Como as instituições privadas estão mais voltadas para o ensino de graduação, a principal
forma de financiamento se dá através da cobrança de mensalidades.
Segundo Schwartzman (2003), a experiência internacional mostra que dificilmente uma
universidade que tenha padrão de qualidade na graduação, pesquisa, pós-graduação “strictosensu” e extensão, pode se custear apenas com a cobrança de mensalidades, e o Brasil não se
configura numa exceção. A solução, portanto, é utilizar alguns poucos recursos públicos e de
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outras fontes privadas para complementar os recursos necessários à manutenção de um corpo
docente titulado exclusivo, assim como um quadro de funcionários preparados.
As outras formas de organização do ensino superior: Centros Universitários,
Faculdades Integradas e Faculdades Isoladas, por estarem voltadas predominantemente para o
ensino da graduação, tendem a ser custeadas basicamente pela cobrança de mensalidades.
Contudo, o fazem aparentemente com padrão de qualidade inferior ao das universidades, que
atendem ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, previsto no artigo
207 da nova LDB. A qualidade inferior no ensino reflete-se no valor das mensalidades, que
não permitem remuneração condigna aos docentes e nem o investimento em instalações
adequadas, tais como laboratórios e bibliotecas (SCHWARTZMAN, 2003).
O setor privado de ensino superior no Brasil atingiu dimensão respeitável em termos de
movimentação de recursos financeiros, segundo Schwartzman (2004), essa dimensão alcança a
cifras entre de 4,5 e 5 bilhões de dólares ao ano.
O financiamento destes recursos baseia-se, fortemente, na cobrança de mensalidades,
incluindo os cursos de pós-graduação “lato sensu”, situando-se entre 95 e 100% dos recursos
captados, com exceção de algumas instituições confessionais que conseguem algum
financiamento público.
Com a expansão do ensino superior e uma participação cada vez maior de estudantes
oriundos de classes de renda mais baixa criou-se uma enorme capacidade ociosa, em função da
elevação da evasão escolar. Estima-se que tal evasão seja fruto do fato de que o ingresso e a
permanência dos estudantes de baixa renda no ensino superior dependem de sua capacidade de
pagamento, da existência de crédito educativo e da concessão de bolsas e da sua convicção, ao
longo do curso, em relação à efetivação do retorno do investimento que vem sendo realizado
(SCHWARTZMAN, 2004).
As tendências para o setor privado são de agravamento da situação no futuro: não
preenchimento das vagas oferecidas para ingresso, elevados índices de evasão ao longo do
curso, crescente inadimplência dos alunos e participação ainda maior de estudantes oriundos de
classes de renda mais baixa, o que gera uma capacidade de pagamento marginal decrescente.
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A reação das entidades privadas tem sido acirrar a concorrência entre elas, o que pode
ser observado através das agressivas campanhas de marketing, redução do valor das
mensalidades, localização das unidades de ensino em locais próximos ao trabalho ou residência
dos alunos, processos seletivos mais fáceis e, em alguns casos, a busca de uma diferenciação
através de uma elevada qualidade de ensino. Isto leva a crer que o sistema passará por um
período de ajustes, com fusões, vendas e desativação de cursos e programas.
O mecanismo potencialmente fundamental para a sobrevivência de parte significativa
do setor privado é o FIES – Financiamento ao Estudante, programa de financiamento estudantil
do Governo Federal, que financia até 70% do valor das mensalidades escolares. A manutenção
de alunos mais carentes nas escolas de nível superior não importa somente para as IES
privadas, mas também, para o cumprimento das metas do PNE - Plano Nacional de Educação,
que propõe uma taxa de 30% de escolarização da população entre 19-24 anos até 2010, e que
hoje se situa em menos de 12%. É importante frisar que o PNE menciona que o setor privado
tem um importante papel no processo, contudo, não detalha os meios para se chegar aos
resultados (SCHWARTZMAN, 2004).
Apesar de sua importância, o FIES está longe de atender as necessidades atuais e muito
menos ao crescimento da demanda que já se verifica. Os recursos do orçamento anual do FIES
são provenientes, em sua grande parte, da arrecadação dos concursos de prognósticos (Loterias)
administrados pela CEF – Caixa Econômica Federal e do orçamento do MEC, não sendo ainda
relevante o reembolso dos empréstimos já realizados. Entretanto os recursos têm se
demonstrado insuficientes, face a crescente demanda de alunos carentes, o que força o MEC a
se provir de outras fontes, que estão em cogitação, entre as quais: a utilização de parte dos
recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, dos depósitos compulsórios dos bancos,
de parte das isenções das entidades de caráter filantrópico e a entrada das próprias IES
privadas, complementando os recursos atuais. Os empréstimos do FIES estão sujeitos a uma
taxa de juros determinada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), sendo exigida a
apresentação de um fiador com idoneidade cadastral e renda comprovada de, no mínimo, o
dobro da mensalidade integral do curso financiado. O prazo para pagamento do FIES estende-se
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até uma vez e meia o período de utilização do financiamento, sendo o valor das prestações
calculado pela Tabela Price.
O Governo Federal também instituiu em 2004 o programa PROUNI – Universidade
para todos. Destinado à concessão de bolsas de estudo integrais e bolsas de estudo parciais
(meia-bolsa) para cursos de graduação e seqüenciais de formação específica, em instituições
privadas de ensino superior, com ou sem fins lucrativos.
O PROUNI compra vagas, em instituições privadas que aderirem ao programa, para
alunos carentes e de minorias. A instituição de ensino privada, com ou sem fins lucrativos, que
aderir ao programa ficará isenta dos seguintes impostos: a) Imposto de Renda das Pessoas
Jurídicas, b) Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, c) Contribuição Social para
Financiamento da Seguridade Social e, d) Contribuição para o Programa de Integração Social.
Uma outra forma de financiamento estudantil, só recentemente posta em prática no
Brasil, partiu da iniciativa privada, quando foi fundada uma empresa especificamente para
desenvolver soluções financeiras exclusivamente para o mercado educacional, funcionando
como uma ponte entre investidores, instituições e estudantes. A estratégia é reunir investidores
qualificados, dispostos a aplicar recursos e a buscar a remuneração de seu capital no setor
educacional brasileiro. A taxa de juros aplicada aos financiamentos estudantis situa-se bem
abaixo dos percentuais praticados pelo mercado financeiro brasileiro.
Outra atuação da empresa é na assessoria às instituições de ensino, através da
recuperação de débitos inadimplentes, financiamento para expansões e melhorias ou quitação
de empréstimos. Até meados de 2005, 85 instituições de ensino, de todas as regiões do Brasil,
contavam com os benefícios deste tipo de programa.
No âmbito internacional, o financiamento estudantil pode assumir diferentes formas,
porém todas as formas têm em comum a cobertura de uma parte dos custos da educação
superior – custos de instrução (mensalidades), outros custos educacionais (livros e materiais
escolares), ou custos de manutenção do aluno (aluguel, transportes, e outras despesas) previstas para serem pagas no futuro. Assim, o investidor, quer seja a própria IES, o governo,
um banco ou qualquer outro ator financeiro, arca com estes custos no presente, mas será
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reembolsado com juros, pelo estudante (talvez com auxílio do governo) como o beneficiário do
financiamento (JOHNSTONE, 2000).
Segundo Johnstone (2000), o empréstimo estudantil poderá assumir duas formas
básicas, com inúmeras variações cada, sendo possível também uma forma híbrida de ambas:
Empréstimo Convencional - Esta modalidade de financiamento apresenta uma taxa de
juros expressa em percentuais anuais sobre o valor financiado, um período para amortização, ou
o tempo que o aluno terá para reembolsar o empréstimo tomado. Apresenta ainda, os termos da
amortização tais como: se os pagamentos deverão ser mensais e de igual valor, ou se os
pagamentos deverão iniciar com pequenos valores e aumentarão com o tempo, ou qualquer
outro termo que crie um fluxo de pagamentos suficiente para amortizar o empréstimo nas taxas
de juros contratadas.
Empréstimo Com Renda Contigenciada - O empréstimo com renda contigenciada (ou
“pagamento contigenciado”) apresenta uma obrigação contratual de reembolsar um percentual
sobre a renda futura, geralmente até o empréstimo ter sido quitado com a taxa de juros
contratada, ou até o aluno ter pago um “valor máximo” pré-definido, ou por um determinado
número de anos. Este tipo de empréstimo é, equivocadamente, tido como sempre o de menor
custo financeiro para os estudantes que sejam incapazes de conseguir uma renda razoável, no
futuro. Contudo isto só é verdade para aqueles empréstimos que tenha uma fonte de alternativa
de subsídios que complemente o fluxo de pagamentos dos estudantes com baixa renda, que
nunca pagam o custo total do dinheiro.
Uma variante do empréstimo com renda contigenciada é o “Imposto de Graduado”,
onde o estudante, após o término do curso, em retorno aos subsídios obtidos do governo tornase obrigado a pagar um imposto adicional sobre sua renda, em geral pelo resto de sua vida
profissional. Esta modalidade tem uma falha conceitual grave: sendo considerada como um
imposto e não como o pagamento de um empréstimo, diferentemente de contratos que têm que
ser pagos, poderá ser abandonada por um outro governo. Esta falha talvez explique a razão pela
qual a modalidade seja tão pouco utilizada nos países desenvolvidos.
Johnstone (2000) apresentou alguns programas de financiamento estudantil, aplicados
no período 1999-2000 em alguns países como: Estados Unidos, Escandinávia, Alemanha,
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Países Baixos, Reino Unido, África do Sul, Austrália, Quênia e China que utilizam os modelos
conceituais descritos acima.
Qualquer que seja a modalidade praticada para financiar o ensino superior, a eficiência
do programa está condicionada à recuperação dos custos envolvidos. Johnstone (2000) aponta
que o problema com os financiamentos estudantis, especialmente nos países em
desenvolvimento, é a existência significante de fontes de perda, ou “vazamentos” de difícil
reparo, na recuperação dos custos na maioria dos programas. O primeiro destes “vazamentos” é
a inadimplência. A ocorrência de altas taxas representa um perigo “real e imediato” à saúde dos
programas e coloca em risco a própria sobrevivência do ensino superior privado. Estudos
realizados apontam que o problema se agrava nos países ditos em desenvolvimento ou em
transição, e apontam que os parcos dados existentes são inconsistentes e não confiáveis.
A Inadimplência Educacional
No âmbito educacional, se configura a inadimplência pela falta de pagamento, em dia,
de uma ou mais mensalidades, por parte do contratante dos serviços educacionais em que ele ou
seus dependentes são beneficiados.
Segundo Braga (2004), a inadimplência deve ser dividida em três grupos: a
inadimplência do dia seguinte ao vencimento; após 30 dias do vencimento e a inadimplência na
re-matrícula. O Quadro 1 demonstra a média da inadimplência nacional nas instituições de
ensino.
Quadro 1 – Inadimplência Média no Brasil
Período
Taxa de
Inadimplência
Dia seguinte ao vencimento
50 a 60 %
Após 30 dias do vencimento
25 a 30 %
Após a rematrícula
5a7%
Fonte: Braga (2004).
A legislação em vigor veda, à instituição de ensino, de impedir que os alunos
inadimplentes assistam às aulas ou deixem de prestar exames. Ademais, a IES não pode negar
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aos alunos em atraso os documentos necessários à sua transferência ao final do período letivo, o
que implica na possibilidade de sua saída sem a quitação da dívida. O principal recurso legal
que resta, à instituição, é o de não recontratar com o aluno inadimplente no semestre seguinte e
cobrar a dívida na justiça. Poderá, também, inscrever o devedor nos cadastros dos serviços de
proteção ao crédito. Porém, várias são as instituições que preferem negociar com seus alunos
em dificuldades, com a finalidade de mantê-los na escola e não agravar os índices de evasão.
De todo modo, os custos da inadimplência são reais, sejam por atrasos ou falta de pagamento e,
cada vez mais, têm sido um item importante na determinação dos resultados de uma empresa
educacional (SCHWARTZMAN, 2004).
Como forma de obter melhores resultados na recuperação de créditos, Rodrigues (2004)
apresenta as seguintes sugestões:
1.
2.
3.
4.
Identificar claramente o contexto econômico em que a IES está inserida;
Medir os índices sistematicamente;
Identificar as causas da inadimplência, e
Trabalhar com profissionais e empresas especializadas.
Rodrigues (2004) afirma que a inadimplência educacional se distingue completamente
daquela enfrentada pelas organizações dos setores financeiro, comercial ou industrial. Isto
ocorre porque a educação é a concessão de um serviço público, essencial para o
desenvolvimento do país. Aqueles que buscam uma educação superior, o fazem com intuito de
uma ascensão cultural e talvez financeira e não por status material. A inadimplência comercial,
financeira e industrial é mais perniciosa, pois o devedor muitas vezes age com má fé, sabendo o
que está fazendo.
60
Desemprego
54
50
Endividamento
40
Fiança ou Aval
30
20
10
0
17
15
8
6
Empréstimos e
Documentos
Saúde e Outros
Figura 1 – Causas da Inadimplência - Fonte: Rodrigues (2004)
62
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Sendo a inadimplência educacional diferente da inadimplência comercial, financeira e
industrial, quais são as suas causas? Porque os contratantes não pagam as mensalidades em dia?
Quais problemas os contratantes podem enfrentar? Existe a pré-disposição em dar um “calote”
na escola? O contratante é realmente um mal pagador? O contratante está buscando solucionar
seu problema?
Entender as causas que levam à inadimplência é importante para não haver préjulgamentos, e para definir uma estratégia mais apropriada à realidade. A Associação
Comercial de São Paulo (ACSP) elaborou um estudo (GRÁFICO 1) em que procurou expor
percentualmente as principais causas e motivos da inadimplência.
Para Rodrigues (2004), o inadimplente educacional é basicamente aquela pessoa que
está passando por um mau momento, desta forma é obrigado a escolher quais os compromissos
serão cumpridos ou adiados, determinando suas prioridades.
Infelizmente a falta de conscientização do brasileiro leva a uma lista de prioridades que
não se alinha com aquelas que as instituições de ensino adotariam ou que buscam repassar aos
seus alunos. Segundo Rodrigues (2004), as prioridades dos brasileiros por grau de importância,
ou as que deveriam ser primeiramente honradas são: 1-Financiamento de Imóvel, 2Financiamento de Automóvel, 3-Despesas Básicas, 4-Cartão de Crédito e Comércio, 5-Saúde e
6-Educação.
Percebe-se que a educação não é a prioridade para os brasileiros. O cenário indica uma
maior preocupação com o status social aparente. Suspeita-se, também, que a atual legislação
esteja contribuindo para os atuais índices de inadimplência educacional.
Ao passo que vários estudos prévios, realizados nos Estados Unidos, avaliaram uma
associação entre as características dos alunos ou da instituição e o comportamento da
inadimplência, o pensamento geral da maioria dos pesquisadores atualmente é que o sucesso
acadêmico tem um papel maior na previsão de quem ficará inadimplente, do que o histórico
(financeiro) do aluno e o tipo de instituição freqüentada. Caso tudo o mais seja igual, alunos
que tenham um bom desempenho escolar tendem a ter um taxa de inadimplência menor do que
aqueles com baixo desempenho. Isto é uma conclusão esperançosa, no sentido em que o
pagamento das mensalidades escolares ou do financiamento estudantil aparenta estar ligado a
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
63
fatores que estão pelo menos parcialmente sob o controle do aluno, da escola, ou de ambos. A
revisão da literatura americana, cobre uma variedade de fatores que podem ter um papel
importante na inadimplência.
Analisando as modelagens e a seleção de variáveis, na literatura pesquisada, verifica-se
a incorporação de cinco perspectivas diferentes, corroborando a pesquisa de Volkwein et al.
(1998). Tomando-se por base o comportamento econômico, demonstrado na literatura, as três
primeiras perspectivas estão relacionadas à teoria do capital humano, ao subsídio público, e a
habilidade do tomador de pagar o empréstimo; a quarta perspectiva está fundamentada na
abordagem organizacional e estruturalista-funcional; e a quinta incorpora a adaptação dos
estudantes ao sistema acadêmico superior.
A Teoria do capital humano enfatiza as variáveis que refletem o desejo do aluno em
investir em educação e treinamento de modo a obter um maior retorno ou compensação
financeira no futuro (BECKER, 1964; FREEMAN, 1983 apud VOLKWEIN et al., 1998),
quando os benefícios são maiores que os custos. Os benefícios incluem o aperfeiçoamento das
habilidades e potencial de obtenção de melhores salários. Os custos envolvem não apenas as
mensalidades escolares e despesas de manutenção, como também custos indiretos por não
trabalhar. Ao passo que os custos devem ser pagos no presente, os benefícios podem ser
usufruídos apenas no futuro. Devido ao fato de que os benefícios econômicos da educação
variam conforme o nível de treinamento e a carreira escolhida, supõe-se que o comportamento
da inadimplência varie de acordo com a titulação obtida e a área de conhecimento estudada
(COHEN & GESKE, 1990).
O primeiro estudo estatístico sobre os padrões da inadimplência escolar com uma
ampla leitura acadêmica foi o artigo intitulado “Whose Fault is Default?”, que resumiu a
agenda de pesquisa da maior literatura do campo de estudo (WILMS et al., 1987 Apud
MONTEVERDE, 2000). O estudo pretendia investigar as características e práticas das
instituições de ensino superior, que tinham taxas de inadimplência “excessivamente altas”
(15% ou maior). Suas conclusões enfatizaram os preditores, predeterminados e não
institucionais,
da
inadimplência
nacionalidade/naturalidade
e
o
escolar
programa
como
sendo
a
etnia,
a
renda
familiar,
acadêmico escolhido. Estudos posteriores
64
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
confirmaram a principal conclusão de Wilms et al. - que as características dos estudantes, muito
mais do que as características institucionais, eram melhores preditores para a inadimplência.
Utilizando como fonte dados, mais ampla, a publicação patrocinada pelo governo
americano, conhecida como “NPSAS”, edição de 1987, Flint (1997) utilizou a análise
discriminante, de forma similar ao estudo de Wilms et al., para analisar blocos de possíveis
preditores. Concluiu que apesar das características pessoais dos estudantes estarem fortemente
ligadas à inadimplência, existe uma contribuição muito pequena dos blocos de variáveis
analisados após as características pessoais dos estudantes.
Através de uma metodologia diferente, Knapp e Seaks (1992) analisaram alunos, de
cursos com duração entre dois e quatro anos, de instituições tradicionais do estado da
Pennsylvania-USA, e que eram beneficiários de financiamentos governamentais. Utilizando a
regressão probabilística, os autores concluíram que as seguintes características pessoais tinham
uma associação estatística significante com uma menor probabilidade de inadimplência: (1)
Renda familiar, (2) Presença dos pais no lar, (3) Sucesso acadêmico e (4) Etnia (taxa de
inadimplência maior entre negros). As variáveis consideradas mais importantes foram: o
sucesso acadêmico e a etnia.
Utilizando como fonte de informação o NPSAS de 1987, Volkwein e Szelest (1995)
apresentaram dois modelos para possibilitar a previsão da inadimplência. No primeiro modelo,
as características pessoais dos estudantes foram analisadas para verificar a associação com a
inadimplência, conjuntamente com um grupo de variáveis utilizadas na tentativa de encontrar
alguma associação do tipo de instituição com a inadimplência. O teste realizado com a
categorização do tipo de instituição freqüentada como sendo universidade ou, faculdade
integrada com cursos 4 anos, faculdade integrada com cursos de 2 anos ou ainda escola
vocacional de nível superior (Proprietary School). Várias características pessoais –
considerando todos os tipos de estudantes – foram definidas como de alto poder de previsão do
risco de inadimplência (etnia, estado civil, quantidade de filhos, titulação obtida, desempenho
acadêmico, suporte familiar e renda atual).
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
65
O segundo modelo, devido à limitação dos dados, excluiu as escolas vocacionais, e um
conjunto mais exaustivo de descritores da instituição foi testado para verificar a associação com
o risco de inadimplência. Apesar de dois fatores terem demonstrado ser estatisticamente
significantes, os autores concluíram que existia pequena evidência de que as características
institucionais impactavam na inadimplência.
Baseado nas evidências estatísticas disponíveis, Monteverde (200) considera haver um
consenso, entre os pesquisadores, de que os determinantes da inadimplência educacional estão,
antes de tudo, relacionados às características dos alunos, do que tendo alguma relação com a
instituição freqüentada. Onde exista uma relação detectada entre um tipo de instituição de
ensino e os altos índices de inadimplência, o fato não é causado pelas características da
instituição. Instituições que têm altos índices de inadimplência são aquelas que atraem
estudantes com alta probabilidade de risco de inadimplência. A tendência de inadimplência é
uma condição pré-existente.
5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A população objeto deste estudo consistiu dos alunos de uma Instituição de Ensino
Superior Privada, localizada em Fortaleza-CE, que oferta cursos de graduação em nível de
bacharelado, licenciatura, e graduação tecnológica. Os dados foram obtidos a partir de
relatórios gerenciais, fornecidos pela IES pesquisada, referentes ao segundo semestre letivo de
2004 e ao primeiro semestre letivo de 2005.
O discurso da instituição ressalta uma preocupação com a qualidade e com o
posicionamento no mercado da educação superior. Sua estratégia de captação de alunos é
reforçada por ações concretas, desenvolvidas através de importantes programas de
Responsabilidade Social. Como estratégia de combate à inadimplência a instituição pratica
descontos diferenciados para aqueles alunos que pagarem suas mensalidades de forma
antecipada ou no vencimento.
Os alunos foram divididos em dois grupos, distintos entre si pela característica objeto
desta análise: estarem ou não inadimplentes com suas mensalidades escolares. Como definição
66
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
para o estudo se considerou como inadimplente aqueles alunos que não honraram os
pagamentos de três ou mais mensalidades escolares durante o segundo semestre letivo do ano
de 2004. Tendo em vista que a aplicação do questionário estruturado, seria efetuada durante o
primeiro semestre letivo do ano de 2005, excluiu-se aqueles alunos que não renovaram sua
matrícula ao final do ano de 2004. Para compor os grupos, em função do alto índice de recusa
em participar da pesquisa, foi retirada uma amostra não probabilística, por conveniência, de
igual tamanho para o grupo de inadimplentes e adimplentes, estratificada por curso.
Os alunos inadimplentes foram escolhidos, em número de 200, aleatoriamente, dentre
os 3257 alunos considerados inadimplentes no período acima definido. Desta forma, fez-se
necessário a aplicação de 400 questionários, sendo 200 para os alunos considerados
inadimplentes e 200 para aqueles adimplentes.
Em face da falta de uma teoria consolidada, no cenário brasileiro, que forneça o
completo embasamento do problema e a conseqüente escolha das melhores variáveis para o
estudo da inadimplência, foram utilizadas inicialmente como variáveis independentes ou
preditoras aquelas mais comuns nos estudos, realizados nos estados Unidos, que precederam a
este.
Foi adotado o questionário estruturado, por tratar-se de uma pesquisa descritiva.
Possibilitando descrever o fenômeno estudado, e verificar a correlação entre as variáveis,
permitindo se chegar a respostas do problema e alcançar os objetivos propostos.
As variáveis utilizadas neste estudo foram definidas a partir dos trabalhos de Rodrigues
(2004), Steiner e Teszler (2003), Volkwein et al. (1998), Volkwein e Cabrera (1998), Volkwein
e Szelest (1995), Flint (1997), Dynarski (1994) e Monteverde (2000). As variáveis são
concernentes ao fenômeno da inadimplência, a fatores pessoais e sócio-econômicos do aluno, a
fatores acadêmicos, e às características e práticas da instituição de ensino. Foram codificadas
em escala de Likert, para medir os itens relacionados aos grupos de fatores considerados. A
variável dependente é a medida dicotômica de “inadimplência ou adimplência”, as variáveis
independentes ou preditoras foram divididas em 4 grupos: Fatores pessoais, fatores
econômicos, fatores acadêmicos e fatores institucionais (QUADRO 2).
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
67
Variáveis relacionadas a Fatores Pessoais são variáveis que compõem o grupo dos
indicadores dos fatores pessoais e objetivam caracterizar o perfil pessoal e social do aluno;
Variáveis relacionadas a Fatores Econômicos são variáveis que compõem o grupo dos
indicadores dos fatores econômicos e objetivam caracterizar o perfil econômico e situação
financeira do aluno; variáveis relacionadas a Fatores Acadêmicos são variáveis que compõem o
grupo dos indicadores dos fatores acadêmicos que objetivam caracterizar os fatores
relacionados com a vida acadêmica que possam influenciar no comportamento do aluno; e
Variáveis relacionadas a Fatores Institucionais são variáveis que compõem o grupo dos
indicadores dos fatores institucionais que objetivam caracterizar os fatores relacionados com a
IES que possam influenciar no comportamento do aluno, são fatores gerenciáveis por parte da
IES.
Quadro 2 – Variáveis Independentes da Pesquisa
Fatores
Acadêmi
cos
Fatores Econômicos
Fatores Pessoais
Fator
Ref
X01
X02
X03
X04
X05
X06
X07
X08
X09
X10
X11
X12
X13
X14
X15
X16
X17
X18
X19
X20
X21
X22
X23
X24
X25
X26
X27
Variável
Idade
Sexo
Raça
Estado Civil
Qtd de Filhos
Ocupação
Ensino Médio
Ingresso
Motivação p/ pagar
Incentivo familiar
Renda Própria
Renda Familiar
Responsável Financeiro
Celular
Cartão de Credito
Veículo Próprio
Residência
Padrão do Imóvel
Tempo de Residência
Referência Bancária
Membros no Ensino
Membros no Ensino
Tipo de Curso
Área de Conhecimento
Duração do Curso
Importância do
Contribuição do Curso
Especificação
Faixa etária em que situa o aluno
Gênero dos alunos
Grupo racial a que pertence o
Situação conjugal do aluno
Número de filhos sob a guarda do
Tipo de emprego do aluno
Tipo de escola onde cursou ensino
Forma de ingresso no ensino
Grau de motivação para pagar as
Incentivo da família para a
Faixa de renda pessoal do aluno
Faixa de renda familiar do aluno
Quem responde pelo pagamento
Tipo de linha celular que utiliza
Limite do cartão de crédito
Veículo próprio e se existe ônus
Imóvel próprio e se existe ônus
Padrão do imóvel em reside
Tempo que mora na atual
Existência de referências
Qtd de membros da família em
Qtd de membros da família em
Tipo de curso freqüentado
Área de conhecimento do curso
Tempo normal de conclusão do
Importância do conhecimento
Contribuição do curso para
Valores
1–5
1–2
1–5
1–5
0–4
1–5
1–3
1–3
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–4
1–5
1–5
1–5
0–4
0–4
1–2
1–4
1–4
1–5
1–5
68
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
Fatores Institucionais
X28
Tempo de Estudo
X29
Estímulo Intelectual
X30
Satisfação em Sala
X31
Satisfação no Campus
X32
Novos Conhecimentos
X33
Atividades
X34
Preparação das aulas
X35
Comunicação Docente
X36
Desempenho
X48
Freqüência Semestral
X37
Escolha da IES
X38
Reputação da IES
X39
Satisfação com a IES
X40
Qualidade do Corpo
X41
Qualidade do Programa
X42
Estrutura da IES
X43
Qualidade dos Serviços
X44
Respeito
X45
Acompanhamento
X46
Controle Financeiro
X47
Mensalidade
Fonte: Elaborado pelos Autores.
Tempo dedicado aos estudos
Freqüência de estimulação
Freqüência de satisfação com as
Freqüência de satisfação no
Freqüência de aquisição de novos
Freqüência de participação
Freqüência de percepção de aulas
Freqüência de percepção de boa
Desempenho acadêmico no
Percentual de Freqüência às aulas
O que influenciou na escolha da
Reputação da IES na sociedade
Grau de satisfação para com a IES
Percepção da qualidade do corpo
Percepção da qualidade do
Qualidade da estrutura física da
Qualidade dos serviços prestados
Percepção do respeito da IES ao
Percepção do acompanhamento
Percepção do nível de controle
Valor da mensalidade cobrada
1–4
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
1–5
Tendo em vista a natureza da pesquisa e os objetivos já descritos, a análise de dados
será efetuada em duas etapas: 1) Análise estatística descritiva, comparando os resultados com
os discutidos no referencial teórico, e 2) Análise multivariada de dados, utilizando-se a análise
discriminante, para definição das variáveis com maior poder de discriminação entre os alunos
adimplentes e inadimplentes.
6 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Foram aplicados 400 questionários, sendo 200 para alunos considerados inadimplentes
(mais de 90 dias de atraso) e 200 para alunos considerados adimplentes, constituindo uma
amostragem não probabilística. Dentre alunos inadimplentes 43 recusaram-se a responder à
pesquisa e 57 preencheram o questionário de forma incorreta ou incompleta, inviabilizando sua
utilização; no grupo de alunos adimplentes, 12 recusaram-se a participar e 26 preencheram o
questionário de forma incorreta ou incompleta. Assim, o número de questionários utilizados na
tabulação e análise foi de 262, sendo 162 questionários referentes aos alunos adimplentes e 100
questionários de alunos inadimplentes. Dentre os alunos pesquisados observaram-se fatos que
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
69
corroboraram as pesquisas descritas no referencial teórico deste trabalho; outros fatos
contrapuseram-se.
A distribuição de freqüência com relação ao sexo dos alunos pesquisados apresentou
normalidade, com participações aproximadamente iguais, com 49,2% dos respondentes sendo
do sexo masculino e 50,8% do sexo feminino. Os respondentes do sexo feminino representaram
56% do total de inadimplentes, indicando uma ligeira propensão do sexo feminino à
inadimplência. Um contraponto às conclusões de Woo (2002), Podgursky et al. (2002) e Flint
(2002) que detectaram que o sexo feminino seria menos propenso à inadimplência.
Esta propensão se refletiu em todas as faixas etárias estudadas. Volkwein e Szelest
(1995) e Knapp e Seaks (1992) não encontraram, em suas pesquisas, evidências significativas
entre os sexos nas taxas de inadimplência.
Volkwein et al. (1998) relacionaram a raça e o estado civil às taxas de inadimplência.
Na presente pesquisa esta relação não ficou evidenciada.
Através de uma tabulação cruzada entre a condição de inadimplência e o número de
filhos, verificou-se que 71% dos inadimplentes não tinham filhos. A análise da amostra
estudada sugere que a inadimplência não está relacionada ao fato de ter ou ao número de filhos,
tendo em vista que o percentual de inadimplentes com filhos permaneceu praticamente
imutável, independente da quantidade de filhos.
Rodrigues (2004) afirmou que, segundo a ACSP, o desemprego e a baixa renda são as
maiores causas da inadimplência. Esta afirmação não é corroborada pela presente pesquisa.
Verificou-se que 85,5% dos alunos respondentes, e que estavam inadimplentes, têm uma renda
familiar superior à R$ 1.000 e, somente, pouco mais de 2% da inadimplência correspondeu a
alunos com renda familiar até R$ 500. Observando que daqueles com renda familiar até R$
500, apenas 22,2% eram inadimplindentes, contra 47,6% de inadimplentes entre os alunos com
renda familiar da faixa de R$ 2001 a R$ 3000. Percebeu-se, assim, que o percentual de
inadimplentes, dentro de cada faixa de renda familiar, cresceu com o aumento da renda,
sugerindo que o risco de inadimplência é maior entre aqueles com um maior poder aquisitivo.
Rodrigues (2004) também afirmou que a maior da causa da inadimplência é o
desemprego, o que não foi corroborado pela presente pesquisa. Dentre os alunos sem ocupação
70
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
profissional 31,1% estavam entre os inadimplentes, participação bem inferior às demais classes,
destacando-se que, dentre os alunos da Classe Empresário 64% estavam no grupo dos
inadimplentes.
Podgursky et al. (2002) verificaram em seu estudo que estudantes mais velhos eram
mais propensos a inadimplir. Esta tendência foi corroborada pela presente pesquisa, onde se
verificou um aumento do percentual de alunos inadimplentes para faixas etárias mais altas,
34,6% para alunos até 21 anos contra 55% para alunos com mais de 40 anos.
Dos alunos respondentes oriundos do ensino supletivo 33,3% fazem parte do grupo de
inadimplentes nos cursos até 2,5 anos de duração. Este percentual salta para 75% nos cursos de
3 anos e 40% nos cursos de 4 anos ou mais. Dentre os alunos oriundos da escola pública este
percentual foi de 28,2% em cursos de 2,5 anos e 36,8% nos cursos de 4 anos ou mais. De uma
forma geral, verificou-se que quanto maior a duração do curso, maior será o percentual de
alunos inadimplentes, salvo para o curso da área de saúde com duração maior que 4 anos, que
apresentou uma inadimplência menor.
Monteverde (2000) e Christman (2000) relataram correlações entre a inadimplência e a
atitude do estudante perante o débito. O presente estudo demonstrou que 7% dos inadimplentes
têm conhecimento dos benefícios da “Lei do Calote”, 58,6% dos inadimplentes afirmaram que
“atrasam somente se necessário”, um viés em relação às respostas: 32,4% dos inadimplentes
afirmaram que nunca atrasam as mensalidades ou sempre as pagam de forma antecipada ao
vencimento e 2% atrasam em até 15 dias. Este viés, contudo, não invalida as suposições
decorrentes, de que os atrasos estão relacionados a uma momentânea dificuldade financeira.
Desta forma, se a inadimplência é maior entre os estudantes pertencentes às famílias
com rendas mais altas, é lógico supor que a momentânea dificuldade financeira seja oriunda
dos gastos realizados com outras contas consideradas mais importantes pelos estudantes e/ou
suas famílias. O estudo, contudo apresentou um fato paradoxal: as famílias de inadimplentes
com rendas mais altas não apresentaram endividamento ou ônus financeiros sobre automóveis
ou moradia.
Segundo Rodrigues (2004), despesas com financiamentos de imóvel, financiamento de
automóvel, despesas básicas (telefone, água, luz etc.) e despesas com cartão de crédito são
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
71
prioritárias em relação à educação. O resultado da pesquisa apontou que para aqueles alunos
com limites de cartão de crédito mais elevados, portanto com um maior potencial de dívida,
existe uma menor propensão à inadimplência.
Analisando as variáveis que correspondem aos fatores geradores de dívidas, verificouse um paradoxo: alunos com menores dívidas e maiores rendas estão mais propensos à
inadimplência, quando o oposto faria mais sentido, segundo Woo (2002). Desta forma, a
afirmativa de Rodrigues (2004), em que a educação teria menor prioridade, fica contestada por
este estudo, considerando que aqueles com menor renda, mesmo tendo financiamentos e/ou
aluguel para pagar ficam inadimplentes em menor número.
Segundo Steiner e Teszler (2003), Woo (2002), Christman (2000), Flint (1997) e
Volkwein e Szelest (1995), o desempenho acadêmico estaria relacionado com a inadimplência.
A presente pesquisa parece corroborar com os citados autores, tendo em vista que a taxa de
inadimplência sofre reduções significativas à medida que um melhor desempenho acadêmico é
obtido, o número de inadimplentes é bem maior para alunos com baixo rendimento acadêmico.
Verificou-se, desta forma, que o sucesso acadêmico tem relação com a inadimplência:
daqueles alunos que obtiveram desempenho acadêmico inferior à média mínima exigida para
dispensa do exame final em cada disciplina 50% estavam inadimplentes, contra 25% dos alunos
com notas consideradas excelentes. Vale observar que « Segundo o regimento interno da IES
pesquisada, os alunos que obtiverem desempenho acadêmico semestral, por disciplina, igual ou superior a
sete, considerando as notas parciais, ficam dispensados de se submeterem à prova final para obter a
aprovação na disciplina ».
Steiner e Teszler (2003) também apontaram para um papel moderado da área de
conhecimento do curso e o caráter dos cursos nos índices de inadimplência. Tal observação foi
constatada, os alunos matriculados nos cursos da área de ciências sociais aplicadas apresentam
uma maior propensão para inadimplir, enquanto que a área de ciências humanas tem uma menor
propensão; as áreas de tecnologia e saúde apresentaram resultados semelhantes entre si.
Com referência ao tipo de curso, observou-se que os cursos de Graduação Tecnológica
apresentaram uma menor propensão à inadimplência com 28,8% dos alunos, desta modalidade,
entrevistados considerados inadimplentes. Dentre os cursos de Bacharelado e Licenciatura,
72
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
onde se encontram os cursos de ciências sociais aplicadas, a participação dos inadimplentes foi
de 45%.
Verificou-se também que a taxa de inadimplência era maior entre aqueles alunos com
uma menor dedicação aos estudos, ou seja, alunos com menor quantidade de horas semanais
dedicadas ao estudo tiveram uma maior propensão à inadimplência.
A correlação entre a dedicação ao estudo e a inadimplência é comprovada ao verificarse que a participação de alunos inadimplentes é reduzida à medida que a freqüência às aulas
aumenta: 57% entre os alunos na faixa de 75-80% de freqüência, contra 18,5% entre os alunos
com mais de 95% de freqüência.
Outros fatores relacionados com aspectos acadêmicos, como estimulação intelectual
com o conteúdo ministrado durante as aulas, grau de satisfação com experiências adquiridas no
meio
acadêmico,
aquisição
de
novos
conhecimentos,
participação
em
atividades
extracurriculares, percepção do nível de preparo das aulas e comunicação com os docentes, não
apresentaram resultados conclusivos sobre alguma correlação direta com a inadimplência.
Contudo verificou-se uma correlação entre a freqüência às aulas e a estimulação intelectual
com o conteúdo ministrado: 85% dos alunos que compareceram a mais de 82% das aulas,
responderam que “sempre” ficavam estimulados com o conteúdo ministrado.
O resultado da pesquisa apresentou um fato curioso, porém já esperado, dentre os
alunos inadimplentes: a taxa de inadimplência decresce com o aumento do valor das
mensalidades. Isto sugere que mensalidades mais baratas atrairiam alunos com um menor poder
aquisitivo, portanto, com um maior risco para a inadimplência em função da renda.
Entretanto, apresentou-se um outro paradoxo: 71,7 % dos alunos com mensalidades até
R$ 300 pertencem a famílias com renda superior à R$ 1.000, e conforme já comentado, 85,5%
dos inadimplentes pertencem à mesma faixa de renda, contrariando a hipótese de que
mensalidades menores atraem alunos com rendas familiares menores.
Dentro dos fatores institucionais, as variáveis relativas à escolha pela instituição e grau
de satisfação percebido não apresentaram indícios de contribuir para a inadimplência. A
opinião dos alunos sobre a reputação da instituição perante a sociedade apresentou algum
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
73
indício de influir na inadimplência apenas entre aqueles que opinaram que a sociedade percebe
a IES como de “péssima” reputação; dentre estes alunos, 60% ficaram inadimplentes.
A opinião dos alunos sobre o programa de seus respectivos cursos apresentou alguns
indícios de influência na inadimplência. Alunos que classificaram os programas de seus cursos
como péssimo, fraco ou regular apresentaram maiores percentuais de inadimplência, ao passo
que os alunos que classificaram os programas dos cursos como bom ou excelente apresentaram
menores percentuais de inadimplência.
A opinião dos alunos sobre a qualidade do corpo docente e a estrutura física da IES
teve resultados semelhantes; entre 67% e 70% dos alunos que consideraram estas variáveis
como desempenho “Fraco”, situaram-se no grupo dos inadimplentes, entretanto, a participação
desses alunos, entre os inadimplentes, é mínima.
Os serviços de apoio aos alunos, prestados pela IES, o nível de respeito da IES para
com os alunos, segundo suas percepções, e a atitude da IES em relação ao aprendizado dos
alunos não apresentaram indícios de influir na inadimplência.
Quando solicitada a opinião dos alunos sobre a atitude da IES quanto ao controle
financeiro das mensalidades, a resposta surpreendeu: 82% dos alunos inadimplentes
consideraram a atitude da IES como “BOA” ou ‘EXCELENTE”, destacando que 52,9% dos
alunos que opinaram a atitude da IES como “BOA” situaram-se no grupo dos inadimplentes.
Este resultado levar a crer que falta de cobrança ou até mesmo a “Lei do Calote” têm pouca
influência na inadimplência, o oposto do que se esperava.
Observou-se que vários fatores, quando analisados de forma individual, demonstraram
ter alguma influência na inadimplência registrada na IES pesquisada. Contudo tais observações
não são suficientes para afirmar se estes fatores, quando combinados, realmente têm influência
no fenômeno da inadimplência.
Com o objetivo de determinar quais variáveis dependentes, analisadas em conjunto,
melhor diferenciam ou discriminam os alunos adimplentes dos inadimplentes, aplicou-se uma
análise discriminante com abordagem de validação cruzada. Como corolário de tal análise
obteve-se um modelo matemático que classifica o aluno como adimplente ou inadimplente, com
uma taxa de acerto de 73%, utilizando as variáveis consideradas mais importantes. Vale
74
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
salientar que os modelos utilizados por especialistas do sistema financeiro, para concessão de
crédito, apresentam taxa de acerto da ordem de 70%. Desta forma, a taxa de acertos obtida
neste trabalho credencia o modelo obtido como aceitável, porém sugere-se cautela em sua
utilização.
De acordo com o modelo discriminante obtido, de uma forma geral, os alunos
classificados como inadimplentes são aqueles que:
•
Não estão motivados a manter as mensalidades em dia;
•
Estudam em cursos não condizentes com suas aspirações profissionais;
•
Estudam em cursos diferentes de suas vocações;
•
Têm pouco incentivo da família; e
•
Têm pouca participação em atividades extracurriculares da instituição.
Assim, verificou-se que os fatores sócio-econômicos, quando combinados com fatores
sociais, acadêmicos e institucionais têm pouca importância no fenômeno da inadimplência do
ensino superior privado. Fatores institucionais, como estrutura física da instituição e qualidade
do corpo docente, também apresentaram pouca importância. Os principais fatores
condicionantes da inadimplência na instituição pesquisada apresentaram-se como sendo fatores
pessoais e acadêmicos, estando relacionados com o compromisso e o incentivo dado ao aluno
na busca da melhoria da qualidade de vida.
O resultado da pesquisa aponta para a Teoria do capital humano, como já exposto por
Volkwein et al. (1998), que enfatizaram as variáveis que refletem o desejo do aluno em investir
em educação como forma de obter um maior retorno financeiro no futuro.
O resultado, também, corrobora o trabalho de Flint (1997), quando detectou que quanto
maior a incongruência entre a área de conhecimento e o trabalho atual, maior o risco de
inadimplência.
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CONCLUSÃO
Utilizando uma metodologia quantitativa e qualitativa, por meio de análise estatística o
objetivo do trabalho foi atingido. Contudo, os resultados obtidos, resultantes de indicadores
oriundos da instituição pesquisada, deverão ser utilizados com cautela em outras IES, dado que
o cenário gerador dos indicadores poderá ser completamente diferente.
Os fatores mais importantes, que puderam ser inferidos, foram:
A motivação do aluno com respeito ao ato de pagar a mensalidade escolar;
O tipo de curso escolhido pelo aluno;
A área do conhecimento na qual deverão empreender seus estudos;
O grau de incentivo proporcionado pela família do aluno, com respeito ao
estudo de nível superior; e
A freqüência das participações do aluno em atividades extracurriculares
proporcionadas pela IES.
Outras conclusões também puderam ser inferidas:
A relação entre o perfil sócio-econômico e acadêmico dos alunos da instituição
pesquisada não apresentou grande importância na inadimplência ocorrida na instituição,
embora conclusões interessantes possam tiradas, analisando-se individualmente os fatores;
A relação entre as características, percebidas pelos alunos, da instituição de
ensino superior estudada e a inadimplência, não demonstrou ser relevante, ou seja, a percepção
da qualidade estrutural da instituição não demonstrou influenciar a inadimplência;
O fato dos alunos não estarem motivados a manter suas mensalidades em dia não
significa necessariamente que a IES não os incentive a pagar suas mensalidades. O resultado da
pesquisa leva a crer que a estratégia utilizada pela IES não está sendo eficazmente absorvida
pelos alunos. A própria análise estatística descritiva já apontara um viés na avaliação dos
alunos, quando vários daqueles que alegaram o pagamento em dia ou antecipado, estavam
incluídos no rol dos inadimplentes. Este fator é plenamente gerenciável pela IES.
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Os fatores Tipo de Curso e Área de Conhecimento também são gerenciáveis. A título
de orientação vocacional, a IES pode, sob pena de comprometer seu negócio, participar na
decisão do aluno sob qual tipo de curso (Tecnológico ou Graduação) deverá ser cursado e em
que área do conhecimento deverá realizar seus estudos. Desta forma, é possível realizar um
acompanhamento mais minucioso dos alunos, de forma estratificada, por tipo de curso e área do
conhecimento, dando uma maior ênfase naqueles grupos estatisticamente mais problemáticos.
Com respeito à falta de incentivo da família, suspeita-se da baixa prioridade dada, pela
família do aluno, à educação superior. Talvez, não sendo a educação percebida como um
instrumento de melhoria da qualidade de vida, não dando a devida importância no rol dos
investimentos ou das despesas prioritárias, consistindo um fator que pode ser trabalhado pela
instituição.
A pouca participação do aluno nas atividades extracurriculares sugere uma falta de
compromisso com os seus estudos, o que pode levá-lo a não priorizar a educação no rol dos
seus gastos ou investimentos.
Fatores como renda familiar, sexo, idade, tempo de residência e existência de outros
financiamentos, que normalmente são utilizados nas composições de credit scoring do sistema
de financeiro, podem apresentar correlações, algumas até surpreendentes, com a inadimplência,
quando analisados de forma individual. .
O resultado da pesquisa apresenta uma conotação social que sugere que o grau de
comprometimento do aluno é função do valor percebido da educação superior, que por sua
feita, seria determinada pelo convívio na sociedade pós-moderna. Ou seja, os alunos
inadimplentes dão prioridade aos valores mais perceptíveis pela sociedade de consumo,
comprovando o paradigma pós-moderno: “Ter para Ser, e não, Ser para Ter”.
Assim, a hipótese de que a inadimplência no ensino superior privado é função da
realidade sócio-econômica de cada aluno, do seu grau de comprometimento e desempenho
acadêmico, do conceito do curso e do nível dos serviços prestados pela instituição, os quais têm
influência junto ao responsável financeiro pelas mensalidades, para honrar ou não o
compromisso assumido, foi comprovada somente no que diz respeito a aspectos sociais e grau
de comprometimento do aluno, os demais fatores componentes da hipótese não foram
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comprovados, havendo uma quebra no paradigma de que a inadimplência no ensino superior é
fruto apenas das realidades econômica e financeira do aluno.
Dada a limitação do estudo de caso, sugere-se a realização do estudo em outras
instituições congêneres, a fim de verificar se os fatores condicionantes aqui demonstrados têm
o mesmo papel nestas outras instituições.
Sugere-se também a elaboração de um modelo estatístico de previsão com a utilização
somente de fatores sociais, que possam ser coletados no ato da matrícula do aluno. Este modelo
seria útil para identificar quais alunos teriam uma maior probabilidade de inadimplir durante o
semestre a iniciar, possibilitando à instituição elaborar alternativas e trabalhar os principais
fatores junto aos alunos no decorrer do período letivo.
Ainda como sugestão a futuras pesquisas e complementação do presente estudo,
propõe-se uma investigação dos aspectos antropológicos, sociológicos e psicológicos que
determinam a baixa prioridade dada à educação em favorecimento de outros valores.
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The Default on Private Higher Education Institutions:
Financial or social causes?
Abstract
The new “Law of Guidelines for the Brazilian Education” has promoted a unique expansion in the
amount of Higher Education Institutions (HEI), providing an opportunity for thousand of Brazilians to
have access to higher education, but on the other hand, a phenomenon of unseen proportions has risen:
student default. This research aims to verify which factors have conditioned the phenomenon in a private
HEI at the city of Fortaleza-CE. It was verified that academic literature on the theme in Brazil is scarce.
Therefore, for theoretical background, several researches accomplished at other countries, and that
approached the theme, were considered. Through statistical analysis, using Discriminant Analysis with
cross validation, it was verified in the studied sample that student default was related to students’ personal
and social-economical profiles, academic and institutional factors, therefore,
manageable. The
presupposition that student default is only related with financial factors was not confirmed.
Keywords: Brazilian education, Higher education, Student default.
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Ari Holanda Júnior
Mestre em Administração de Empresas - UNIFOR
Especialista em Gerência da Produção - UNIFOR
Bacharel em Engenharia Civil
Professor da Faculdade Lourenço Filho - FLF
Coord. Núcleo de Desenvolvimento Profissional e Estágios da Faculdade Lourenço Filho
e-mail: [email protected]
Heber José de Moura
Doutor em Administração de Empresas – FGF-SP
Mestre em Análise de Sistemas - INPE
Bacharel em Estatística
Professor Titular do Curso de Mestrado em Administração de Empresas da Universidade de
Fortaleza – UNIFOR
e-mail: [email protected]
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A Inadimplência nas Instituições de Ensino Superior Privadas