Exame de Aptidão Médico
Desportivo em Portugal
» Rev Medic Desp in forma, 1 (4), pp.16-18, 2010
Doutor José J. Ramos
tema
3
Médico especialista em Medicina Desportiva
abstract
O exame médico desportivo é obrigatório em Portugal. Embora as recomendações do COI
sejam de que este exame deve ser realizado por médicos treinados em Medicina Desportiva, esta situação nem sempre acontece. Em Portugal este exame é realizado em impresso
próprio composto por 13 items. A validade do exame é de um ano. De uma forma básica e
simplista procuramos orientar o médico não especialista para a estratégia a seguir para o
preenchimento do impresso obrigatório
The preparticipation physical evaluation is mandatory in Portugal. Although the IOC
recomendations are that this exam should be conducted by Sports Medicine trained
physicians, this is normally not the case. In Portugal this exam is performed by filling a 13
items form. It is valid for one year. The mentioned form serves the purpose of guiding the
non-expert physician.
palavras-chave
Aptidão médico desportiva; Exame médico-desportivo
(Preparticipation examination (PPE); preparticipation screening)
keywords
Em Portugal o acesso à prática desportiva,
rio que o mesmo seja realizado em ficha
dos atletas e árbitros no âmbito das federa-
própria publicada em Diário da Repúbli-
ções desportivas, depende de prova bastante
ca (Despacho n.º 25 357/2006, de 28 de
da aptidão física do praticante, a certificar
Novembro de 2006). A ficha é constituí-
através de exame médico que declare a ine-
da por 13 items (Declarações pessoais do
xistência de quaisquer contra-indicações
atleta, Antecedentes familiares, pessoais e
(Lei de Bases da Actividade Física e do Des-
desportivos, Exame biométrico, ectoscó-
porto - Lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro).
pio, oftalmológico, ORL, estomatológico,
Até 1988 os exames de aptidão médico-
abdomen, genito-urinário, cardiocircula-
desportivos (EAMD) eram realizados em
tório , respiratório e exames complemen-
Centros de Medicina Desportivos, pro-
tares de diagnóstico).
priedade do estado, que existiam em todas
as capitais de distrito e em alguns conce-
Objectivos do exame
lhos que o justificassem. A partir desta
O principal objectivo do EAMD é detectar
data qualquer médico pode realizar os
doenças ou condições em que a prática do
referidos exames desde que se sinta habi-
desporto pretendido possa pôr em risco a
litado para tal (Consenso entre os colégios
saúde do atleta ou a de terceiros.
de especialidade de Medicina Desportiva
As condições cardiovasculares são as mais
e Medicina Geral e Familiar). Pela espe-
valorizadas, na maior parte dos estudos,
cificidade do exame e com o objectivo de
particularmente a morte súbita, pela tra-
proteger a saúde do atleta o Comité Olím-
gédia e mediatização que lhe é associada.
pico Internacional publicou um consenso
No entanto o EAMD deve ter uma inter-
em que recomenda que os EAMD devem
venção mais vasta, como seja: a prevenção
ser realizados por médicos treinados em
de lesões, orientação do atleta em função
medicina desportiva .
do desporto que pratica, introdução de
Para que o exame seja válido é necessá-
medidas preventivas enquadradas numa
(1)
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Julho 2010 * www.revdesportiva.pt
ca ouve-se melhor na posição de sentado
moção da comunicação e confiança do
- As fracturas ósseas e outras lesões do apa-
e aumenta de intensidade com a manobra
atleta para abordagem de temas importan-
relho musculo esquelético que vão orientar
de valsalva enquanto o sopro sistólico pro-
tes na adolescência como a SIDA, drogas,
o exame objectivo para eventuais desequilí-
duzido pela estenose aórtica diminui com a
doping. Na fase da adolescência em que o
brios provocados por essas lesões.
manobra de valsalva. Os sopros inocentes
jovem desenvolve actividades desportivas
- A medicação que usa correntemente
ou funcionais que são muito comuns em
o EAMD é frequentemente, o único mo-
para além de nos orientar para eventuais
atletas também diminuem com a manobra
mento em que o atleta está em contacto
patologias do atleta, introduz a possibili-
de valsalva mas distinguem-se dos produ-
com um médico, que deve ser aproveitado
dade de orientar o atleta para eventuais
zidos pela estenose aórtica pela intensida-
para implementar as medidas referidas.
suplementações ou drogas que poderão
de, duração, localização e irradiação. Os
conter substâncias dopantes.
sopros sistólicos maiores que 2/6, todos os
- As vacinas que devem estar actualizadas.
sopros diastólicos, desdobramentos fixos
Declarações Pessoais
A declaração engloba as patologias mais im-
3
colisão e combate
tema
estratégia nacional de saúde pública, pro-
do segundo som, e clicks meso ou telessis-
portantes. Uma resposta positiva orienta o
Exame físico
tólicos devem ser referidos ao cardiologista
médico para uma exploração desse sistema
No exame objectivo é fundamental ter uma
para investigação. As arritmias devem ser
quando explorar os antecedentes pessoais.
estratégia para procurar os sinais que po-
investigadas por exames complementares
dem indiciar a presença de doença limitativa
de diagnóstico como o ECG e holter. Se
História familiar
ou impeditiva da prática de determinada
a tensão arterial estiver elevada a sua me-
A morte prematura <50 anos ou história
modalidade desportiva e também alterações
dição deve ser repetida e o atleta deve ser
de doença cardíaca como cardiomiopatia,
que podem vir a ser causadoras de lesão. A
questionado acerca do uso de estimulantes
sindrome de Marfan ou QT longo, impli-
inspecção da coluna vertebral e membros
(cafeína, efedrina, nicotina...). Perante uma
cam sempre investigação dessas patolo-
quer estática quer dinâmica permite-nos
hipertensão depois de investigada a causa e
gias ou condições, particularmente nos
diagnosticar curvaturas anormais, altera-
tratada, não constitui contraindicação para
últimos anos da adolescência. Outras con-
ções da flexibilidade e amplitudes articulares
a prática desportiva, devendo no entanto
dições como diabetes, epilepsia ou asma
reduzidas ou laxas, atrofias musculares.(6)
ser evitados os exercícios isométricos.
pelo seu carácter hereditário orientam-
A pesquisa de organomegalias e pontos
nos para a investigação das mesmas.
heniários pela palpação poderá levar a
Exames Subsidiários
inaptidão em desportos de combate e co-
É consensual na Europa
História Pessoal
lisão no primeiro caso ou a limitação da
deve ser parte integrante do exame de apti-
Uma história pessoal completa mostrou ser
actividade no segundo se não houver cor-
dão médico desportivo. Alterações no ECG
capaz de identificar 75% dos problemas que
recção cirúrgica. A palpação dos pulsos
são comuns no atleta e reflectem adapta-
podem impedir a participação do atleta.(2)
periféricos é importante nomeadamente
ções do coração ao treino regular. Conside-
os pulsos femurais cuja ausência ou atraso
ra-se que o ECG é positivo e que exige uma
Devem ser investigadas:
poderá estar correlacionada com a coarc-
investigação as seguintes alterações:
- A dor torácica, palpitações, dispneia e lipo-
tação da aorta. A avaliação da força dos
timia pela associação a patologia cardíaca.
principais grupos musculares dá-nos a
Onda P
- A Hipertensão particularmente em despor-
percepção, embora não fiável, de eventu-
Hipertrofia auricular esquerda – Com-
tos com componente isométrica importante.
ais desequilíbrios a confirmar por dinamo-
ponente de P negativa em V1≥ 0,1 mV em
- A asma brônquica, alergias e o broncoes-
metria isocinética ou outra. A estabilidade
profundidade e ≥0,04 seg. em duração
pasmo induzido pelo exercício
ligamentar das principais articulações
Hipertrofia auricular direita – Pico da
- A história de epilepsia pelo risco para o
nomeadamente ombro, joelho e tornozelo
onda P em DII e DIII ou V1 ≥0,25 mV
próprio e para terceiros deve ser monito-
permite-nos diagnosticar algumas lesões
em amplitude
rizada particularmente em modalidades
características destes segmentos ou orien-
como a natação, automobilismo, ciclismo,
tar para a prevenção de lesões através do
QRS
remo, canoagem e de combate.
trabalho proprioceptivo, de flexibilidade e
Desvio do eixo - ≥+120º ou esquerdo
- A diabetes pelo aconselhamento que exi-
reforço musculo-tendinoso e ligamentar.
– 30º a -90º
ge para a prática do exercício.
A auscultação cardíaca deve ser realizada
Aumento de voltagem – amplitude de R
- Traumatismo craniano pelas implicações
na posição de deitado e sentado, o sopro
ou S nas derivações standard ≥2 mV, S em
que tem particularmente nos desportos de
provocado pela miocardiopatia hipertrófi-
V1 ou V2 ≥3 mV ou R em V5 ou V6 ≥3 mV
(1,3,5)
Revista de Medicina Desportiva in forma * Julho 2010
que o ECG
17
Anormalidade das ondas Q ≥ 0,04 seg
2009. Br. J. Sports Med. 2009;43;631-643
em duração ou ≥ 25 % da altura da R
2-Domhnall MacAuley, Thomas Best; Eviden-
que se lhe segue ou QS em 2 ou mais
ce-based Sports Medicine; BMJ Books, Bla-
derivações
ckwell Publishing; 2008.
tema
3
3-Corrado D, Pelliccia A, Bjørnstad H, et al;
Segmento ST, ondas T e intervalo QT
Study Group of Sport Cardiology of the Working
Depressão do segmento ST ondas T pla-
Group of Cardiac Rehabilitation and Exercise
nas ou inversão em 2 ou mais derivações
Physiology and the Working Group of Myocar-
Prolongamento do intervalo QT corrigi-
dial and Pericardial Diseases of the European
do à frequência cardíaca > 0,44 seg
Society of Cardiology. Cardiovascular pre-participation screening of young competitive ath-
Alterações do ritmo e condução
letes for prevention of sudden death: proposal
Extrasistoles ou arritmias ventricula-
for a common European protocol. Consensus
res mais severas
Statement of the Study Group of Sport Cardio-
Taquicardia supraventricular, flutter
logy of the Working Group of Cardiac Rehabili-
auricular ou fibrilação auricular
tation and Exercise Physiology and the Working
PR curto (<0,12 seg.) com ou sem onda
Group of Myocardial and Pericardial Diseases
delta
of the European Society of Cardiology. Eur He-
Bradicardia sinusal com frequência
art J. 2005;26(5):516–524.
cardíaca em repouso ≤ 40bpm. Ou au-
4- Maron BJ, Thompson PD, Ackerman MJ, et
mento até as <100bpm durante teste de
al; American Heart Association Council on
exercício limitado
Nutrition, Physical Activity, and Metabolism.
BAV 1º grau (PR≥0,21 seg. que não dimi-
Recommendations and considerations related
nui com a hiperventilação ou teste limi-
to preparticipation screening for cardiovascu-
tado de exercício) BAV de 2º e 3º grau.
lar abnormalities in competitive athletes: 2007
update: a scientific statement from the Ame-
Decisão
rican Heart Association Council on Nutrition,
Após a realização do exame e depois
Physical Activity, and Metabolism: endorsed by
de analisar os dados do atleta observa-
the American College of Cardiology Founda-
do teremos de concluir se as condições
tion. Circulation. 2007;115(12):1643–1655.
encontradas põem em risco a sua par-
5- Pelliccia A, Fagard R, Bjørnstad H, et al. Re-
ticipação ou de terceiros o que implica
commendations for competitive sports partici-
a contraindicação ou não para a prática
pation in athletes with cardiovascular disease:
de determinada modalidade. Existem
a consensus document from the Study Group of
diversos consensos que vão ajudar nesta
Sports Cardiology of the Working Group of Car-
decisão.(1,3,4,5,6)
diac Rehabilitation and Exercise Physiology, and
the Working Group of Myocardial and Pericar-
18
Julho 2010 * www.revdesportiva.pt
Bibliografia
dial diseases of the European Society of Cardio-
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Robert Maloley, Gordon Matheson, Willem
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Meeuwisse, Erik Meijboom, Margo Mountjoy,
(ACSM),American Medical Society for Sports
Antonio Pelliccia, Martin Schwellnus, Domini-
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Committee (IOC) Consensus Statement on pe-
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