II Seminário de Pesquisa: Educação e Diversidade Cultural
Métodos visuais em sociologia da infância e da educação
Manuel Jacinto Sarmento (Universidade do Minho)
Apesar de um uso que remonta há décadas na sociologia e na antropologia, os métodos visuais apenas
recentemente ganharam reconhecimento no campo da sociologia da infância e na sociologia da educação. Não
porque “a imagem valha mais que mil palavras”, como o paradigma positivista, em consonância com o senso
comum, tem afirmado. Mas, justamente, porque as imagens desafiam as palavras a falar de modo mais
questionador e desafiante dos quotidianos das crianças e das escolas, na procura incessante de dar a ver o que se
encontra irrevelado e oculto. Mas também porque as culturas infantis – designadamente das crianças mais
pequenas – se exprimem predominantemente em formas não verbais, pelo corpo, pelo desenho e pelo gesto, o que
torna os métodos visuais especialmente propícios para dar conta dos mundos sociais e culturais da infância.
A partir de experiências de pesquisa, interrogar-se-ão as metodologias visuais e indicar-se-ão alguns dos caminhos
de um percurso epistemo-metodológico a desenvolver.
Relações de gênero e a produção cultural da infância: como as professoras avaliam meninos e meninas
Marília Pinto de Carvalho (FE-USP)
Apresento aqui alguns dos resultados de pesquisa qualitativa que pretendeu avaliar se a definição de objetivos
pedagógicos claros e a consequente adoção de critérios de avaliação de aprendizagem bem delimitados poderiam
minimizar os desequilíbrios socioeconômicos, de sexo e de raça evidenciados no interior do grupo de alunos
indicados para atividades de reforço por nove professoras alfabetizadoras de diferentes escolas públicas de São
Paulo. Foram realizadas observações, entrevistas com as educadoras e questionários de caracterização
socioeconômica. Em especial com relação às diferenças entre meninos e meninas, verificou-se nítido equilíbrio em
sua indicação ao reforço quando era avaliada a aprendizagem e não o comportamento, levando-nos a refletir sobre
as feminilidades e masculinidades em construção na escola.
Entre a aldeia e a cidade: a presença indígena na Amazônia Urbana.
José Guilherme Cantor Magnani (NAU/USP – Núcleo de Antropologia Urbana)
De acordo com resultados do censo de 2010 sobre a população indígena no Brasil, de um total de 896.900 pessoas,
315.180 vivem em cidades. Esta realidade, em vez de ser analisada sob o habitual prisma das precárias condições de
vida em ambientes de exclusão social, nas periferias urbanas, pode suscitar outras questões: que é cidade, para os
coletivos indígenas que nela habitam? Como estabelecem, aí, seus vínculos e alianças? Quais são seus trajetos no
tecido urbano e que instituições acionam, na busca de manutenção de um modo de vida diferenciado?Ainda que
haja diferenças entre suas estratégias de inserção em Manaus, por exemplo, todos apresentam um notável fluxo de
pessoas entre as terras indígenas no interior e as residências na cidade: a circulação de parentes é constante para
visitas, tratamento médico, compras, estudos, com períodos variáveis de permanência. No caso dos Sateré-Mawé, é
possível identificar umcircuito, constituído por núcleos em contínuo contato ao longo do qual transitam não apenas
humanos (parentes, lideranças, xamãs, estudantes), mas sementes e formigas – aquelas para o artesanato e estas
para o ritual da Tucandeira, entre outros “não-humanos”. Esse trânsito de certa forma dissolve a conhecida oposição
floresta vs. cidade, aquela tida como o espaço canônico do assentamento indígena na forma da aldeia, e esta, a
cidade, como lugar de passagem ou, se permanente, da perda ou diluição das tradições.
Educação e Diversidade Cultural: dilemas e desafios
Marcio Ferreira da Silva (FFLCH USP)
Uma das reivindicações mais insistentes do movimento indígena no Brasil, nos últimos vinte cinco anos, tem sido
aquela que visa assegurar aos povos indígenas a oportunidade de aquisição de educação formal, em pé de igualdade
com o resto da comunidade nacional e sensível à diversidade cultural e à heterogeneidade de situações que se
manifestam em suas fronteiras interétnicas. Referenciais jurídicos têm refletido fielmente essa reivindicação, como
não deixam dúvidas o Artigo 210 da Constituição de 88, a Lei 9394, de 1996, e a Convenção 169 da OIT, em vigor no
Brasil a partir de 2003. Apesar disso, o quadro atual das escolas indígenas ainda é desanimador. Esta comunicação
visa focalizar alguns aspectos desse quadro de grande complexidade.
Sobre raça, racismo, negritude e embelezamento: o que tem a nos dizer as crianças da Educação Infantil?
Leni Vieira Dornelles (UFRGS)
A pesquisa a ser apresentada analisa o como se produz entre crianças de cinco anos, de uma Escola Infantil de Porto
Alegre e da cidade vizinha de Portão, o conceito de raça e racialidade. Discute sobre os modos como a negritude
vem sendo construída, a partir da introdução de bonecos negros e livros de literatura infantil, cujos personagens
protagonistas são negros positivados. Buscou-se entender como tais conceitos operam na produção de sujeitos
racializados, como estes estão atravessados por relações de poder e, como à medida que tais personagens foram
estetizados/embelezados em sua materialidade isso interferiu nas relações entre as crianças e professoras, afetando
assim suas brincadeiras e interações com aquele que é diferente de si. O estudo reforça, ainda, a importância da
educação antiracista no cotidiano da Educação Infantil.
Lá do leste – as artes nas bordas da cidade
Rose Satiko Gitirana Hikiji (Departamento de Antropologia – USP)
Apresento processos e resultados de pesquisa iniciada em 2009 com artistas de Cidade Tiradentes, o maior conjunto
habitacional popular da América Latina, na Zona Leste de São Paulo. A primeira etapa da pesquisa foi a produção da
cartovideografia Mapa das Artes de Cidade Tiradentes, site georeferenciado construído com pesquisadoresmoradores da localidade, a partir de metodologia audiovisual participativa. Dois filmes etnográficos foram realizados
com alguns dos artistas mapeados, sobretudo aqueles ligados à arte de rua. Um livro e um webdocumentário
sintetizam as experiências. Discuto ainda os potenciais de um projeto de antropologia visual compartilhada para o
diálogo entre universidade, comunidade, poder público e terceiro setor.