BIODIVERSIDADE
Autores: Juliano Bonfim Carregaro e Carolina Tavares da Silva
Bernardo
Sumário
I. Introdução
II. O que é Biodiversidade?
III. Como medimos a Biodiversidade?
IV. Conclusão
V. Referências
1
I. Introdução
Antes de começarmos esta unidade, podemos fazer a seguinte
pergunta: O número de espécies cresce infinitamente, ou há
alguma condição que reduza esse crescimento?
Para responder a essa pergunta, temos que considerar
alguns fatores ambientais que influenciam os padrões de
ocorrência das espécies encontrados atualmente na natureza.
Como veremos nas próximas unidades, o tamanho do habitat,
como uma possível diferença entre terras continentais e
insulares, interfere na quantidade de espécies que lá habitam,
sugerindo que ocorra a regulação da diversidade pelo espaço
disponível. Pesquisas evidenciam que áreas maiores suportam
mais organismos, por possuírem mais recursos disponíveis,
possibilitando a presença de diferentes espécies no local. Outro
exemplo de regulação é o conjunto de variáveis ambientais
locais, que são bem diferentes se compararmos regiões distantes
no globo (Ex: Trópicos e Pólos), pois essas exercem influência
sobre a sobrevivência das espécies, o que resulta em diferentes
distribuições geográficas dos organismos. Em vários estudos
ecólogos verificaram que existem mais e/ou diferentes
organismos nos trópicos quando comparados com regiões, de
tamanhos equivalentes, nos pólos, registrando que há um
padrão de maior diversidade em ecossistemas tropicais no
mundo.
Desde as explorações ocorridas no século XIX, de
cientistas como Charles Darwin, Henry Walter Bates e Alfred
Russel Wallace, foi observado que os trópicos apresentam uma
biodiversidade diferenciada e exuberante, quando comparados
a outras regiões do mundo. Atualmente, os taxonomistas já
catalogaram em torno de dois milhões de espécies no planeta,
mas as estimativas atuais de riqueza total podem mudar
dependo do pesquisador, variando entre autores mais
conservadores com estimativas de 8 milhões de espécies no
total ou chegando a estimativas de que existam na Terra cerca
de 30 milhões de espécies.
Podemos nos perguntar, então, “Por que essa diferença
no padrão de ocorrência dos indivíduos entre os trópicos
e as outras regiões?”. A resposta dessa e de outras
questões será vista ao longo desta unidade.
II. O que é Biodiversidade?
O termo “biodiversidade” é uma contração de “diversidade
biológica” e foi popularizado pelo simpósio, seguido da
2
publicação do livro de mesmo título, “Biodiversity” de Edward
Osborne Wilson (1986).
Biodiversidade ou somente diversidade é “o número de
taxa numa área local (diversidade alfa) ou região (diversidade
gama). Também, uma medida da variedade de taxa numa
comunidade que leva em consideração a riqueza (número de
espécies) e a abundância relativa (número de indivíduos em
cada espécie)” (Ricklefs, 2003). Em outras palavras,
biodiversidade se refere à variedade e à riqueza de vida na
Terra, como de animais, plantas e microorganismos, por
exemplo.
Visto sua ampla definição, podemos dividir a
biodiversidade em três níveis: diversidade genética,
diversidade de espécies ou diversidade de comunidades.
Saiba mais:
Taxa é o
plural de
táxon e
significa
qualquer nível
de sistema de
organização.
Pode ser um
reino, um filo,
uma classe,
uma ordem ,
uma família,
um gênero,
uma espécie
ou mesmo um
organismo.
Biodiversidade em 3 níveis: (a) variação genética dentro de cada espécie; (b) composição de espécies em
um habitat; (c) variação de habitats em uma região.
Para definirmos o primeiro nível, precisamos definir o que
é espécie. Esse é um trabalho difícil, pois pode levar a diferentes
interpretações de acordo com a sua área de trabalho dentro da
Biologia. Uma espécie pode ser definida como um grupo de
indivíduos
que
é
morfológica,
fisiológica
e/ou
bioquimicamente distinta de outros grupos (definição
3
morfológica de espécie). Ou espécie pode ser um grupo de
indivíduos que cruzam entre si e produzem descendentes
férteis, mas não o fazem com indivíduos de outros grupos
(definição biológica de espécie).
No campo da taxonomia, a primeira definição de espécie
foi muito utilizada, pois os taxonomistas precisam diferenciar
espécies visualmente quando coletadas no campo, para
realizarem sua identificação. Atualmente, com as descobertas
de técnicas avançadas de seqüenciamento de DNA (ácido
desoxirribonucleico) e marcadores moleculares, tanto os
taxonomistas quanto os evolucionistas, utilizam a segunda
definição, que é mais divulgada e aceita. Esta definição, mesmo
que simplificada, representa bem as relações parentais entre os
indivíduos, e os dados genéticos podem nos conduzir a um
conhecimento mais aprimorado das relações entre as espécies,
para defini-las com maior precisão.
Contudo, os problemas para identificar espécies são mais
comuns do que se imagina: (1º) uma única espécie pode ter
algumas variedades, em que pode se observar grandes
diferenças morfológicas, (2º) enquanto que membros de duas
espécies podem ser tão semelhantes e considerados membros
de uma única espécie.
Um exemplo do primeiro caso é a existência de diversas
raças de cachorros, como pastor alemão, fila e beagle, que são
diferentes morfologicamente entre si, mas pertencem a uma
mesma espécie (Canis lupus familiaris) e, portanto, podem cruzar
entre si. Por outro lado, têm-se espécies que são semelhantes
fisicamente, cruzam entre si e produzem híbridos, que não são
sexualmente viáveis, como é o caso da mula, produzida do
cruzamento de um jumento (Equus asinus) com uma égua
(Equus caballus). Já um bom exemplo para a segunda situação
descrita acima, seria a presença de cobras não-peçonhentas que
mimetizam cobras peçonhentas, como encontrado entre a cobra
coral falsa (Oxyrhopus trigeminus) e a cobra coral verdadeira
(Micrurus corallinus), duas espécies diferentes, mas com
4
aspectos morfológicos praticamente indistinguíveis para um
leigo (Figura 1).
+
Equus caballus
Equus asinus
Mula (Híbrido)
Oxyrhopus trigeminus
Micrurus corallinus
Figura 1: Híbrido (mula) formado entre o cruzamento do jumento (Equus asinos) com a égua
(Equus caballus), e a diferença entre a cobra coral verdadeira (Micrurus corallinus) e seu mímico, a
coral falsa (Oxyrhopus trigeminus).
A
diversidade
genética
é
conseqüência
do
comportamento reprodutivo dos indivíduos dentro de uma
população. Os indivíduos são geneticamente diferentes entre si,
ou seja, seus “pools” gênicos são diferentes, graças à mutação e à
reprodução sexuada. Relembrando que nesse tipo de
reprodução ocorre recombinação genética, devido ao processo
Saiba mais:
Para relembrar
os processos
de meiose e
mitose,
retorne à
Unidade 1, do
Eixo Biológico
do módulo IV.
5
de meiose na formação dos gametas masculinos e femininos,
que produzem gametas geneticamente diferentes dos parentais.
Durante a reprodução sexual, os gametas se fundem,
originando um indivíduo geneticamente único. Além da
reprodução sexuada, as mutações genéticas que ocorrem
durante esse e outros processos, podem também resultar em
maior variabilidade genética dentro de uma população.
A variabilidade genética permite aos indivíduos
responderem de forma mais versátil a um ambiente instável e
assim sofrerem menos pressões de pequenas mudanças
ambientais. As espécies consideradas raras têm menos variação
genética do que espécies que são mais comuns e abundantes,
pois apresentam populações com baixo número de indivíduos,
o que representa um pequeno “pool” gênico e,
conseqüentemente, são mais vulneráveis às modificações
ambientais.
O terceiro nível em que podemos utilizar a definição de
biodiversidade é o de comunidade. Uma comunidade é
definida pelas populações de diferentes espécies que
coexistem em uma determinada região, interagindo direta ou
indiretamente umas com as outras. A comunidade em interação
com os fatores abióticos, como o clima, o solo, pode ser
chamada de ecossistema. Dentro de um ecossistema há o
ambiente físico - solo, clima, temperatura, umidade,
precipitação - que afeta as características e estruturas de uma
comunidade, mas que também pode ser alterados por ela. Uma
floresta, com vegetação alta, por exemplo, produz sombra e
deixa o ambiente mais úmido do que seria sem sua presença,
alterando assim o ambiente físico de uma região.
Dentro de um ecossistema, tem-se uma grande variedade
de recursos que são utilizados pelos organismos vivos
presentes nele. Cada organismo de uma determinada espécie
utiliza um conjunto de recursos que são imprescindíveis a sua
sobrevivência e reprodução, o que compõe o seu nicho. O nicho
de uma planta, por exemplo, pode ser o tipo de solo sobre o
qual ela cresce, a quantidade de luz de sol que ela necessita
para realizar a fotossíntese, o seu tipo de sistema de
polinização, o seu mecanismo de dispersão de sementes, etc.
Se adotarmos como exemplo um animal, o seu nicho pode
incluir o tipo de habitat onde ele é encontrado, a sua tolerância
térmica, suas exigências alimentares, seu hábito (diurno ou
noturno), etc. Qualquer um desses recursos que fazem parte do
nicho de uma espécie passa a ser limitante do tamanho de sua
população. O Lobo-Guará, por exemplo, teve sua população
diminuída pela redução de seu habitat nativo. Esse animal evita
locais ocupados por humanos e, por isso, teve sua área de
Saiba mais:
Pool gênico é
conjunto total
de alelos que
podem ser
localizados no
DNA dos
indivíduos de
uma
determinada
espécie ou
população.
Saiba mais
Ecologicamente
falando, nicho é
toda a relação do
indivíduo ou de
uma população
com todos os
aspectos do
ambiente onde
está inserido, ou
seja, é o papel
ecológico das
espécies dentro de
uma comunidade.
6
ocorrência restringida devido à ocupação humana dentro da
Caatinga e do Cerrado.
Dinâmica da Comunidade
Para entendermos melhor os padrões de diversidade
encontrados em determinadas regiões, é preciso conhecer a
dinâmica de uma comunidade. Dentro de uma comunidade
ocorre o que chamamos de sucessão ecológica, que é um
processo gradual de mudança na composição de espécies, na
estrutura da comunidade e nas características físicas que
ocorrem dentro do ambiente, em resposta a distúrbios naturais
ou antrópicos (causados pelo homem). Existem dois tipos de
sucessões ecológicas: (a) Primária, quando envolve o
estabelecimento gradual das comunidades bióticas em locais
virgens, ou seja, locais que não foram anteriormente habitados,
como ocorre em rochas e dunas (Figura 2.1); (b) Secundária,
quando ocorre o restabelecimento de comunidades em áreas
anteriormente habitadas, ou seja, em áreas que foram
perturbadas e que apresentavam uma comunidade
preexistente, como ocorre quando há a formação de uma
clareira dentro de uma floresta, por exemplo (Figura 2.2).
Saiba mais
Para relembrar
os processos
que ocorrem
dentro de uma
comunidade,
retorne às
Unidades 7 e 8
do eixo
Biológico do
módulo VI.
Figura 2.1: Sucessão primária. (A) Organismos pioneiros (liquens, microorganismos e fungos)
colonizam rochas nuas, que se transformam em solos férteis; (B) Solo formado que permite
colonização de vegetação rasteira; (C) e (D) se o ambiente permanecer intocável, sem
perturbação, ocorrerá uma sucessiva troca de formas vegetais até a comunidade atingir sua
estabilidade
com
a
comunidade
clímax
(E).
(Fonte:
http://www.ib.usp.br/~delitti/projeto/ricardo/sucessao_primaria.htm).
7
Figura 2.2: Sucessão secundária. (A) ambiente com solo já formado, mas perturbado, onde
começa ocorrer uma nova colonização; (B), (C) e (D) sucessão natural de espécies dentro da
comunidade, caso não haja nova perturbação; (E) comunidade clímax. (Fonte:
http://www.ib.usp.br/~delitti/projeto/ricardo/sucessao_secundaria.htm)
Internet
Para saber sobre a aplicação do estudo da biodiversidade, dos seus índices
quantitativos num estudo de sucessão ecológica, acesse o link a seguir:
http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/html/534/53414104/53414104.html
Algumas espécies estão diretamente
associadas a um determinado estágio de
sucessão, como é o caso de plantas pioneiras,
como as embaúbas (Cecropia sp.) que são as
primeiras a aparecerem quando se abre uma
clareira na floresta. Outros exemplos são
aquelas espécies de sombra de uma floresta,
que só são encontradas nas florestas em
estágios avançados de sucessão, chamado de
estado clímax. Quando a perturbação é
causada pelo homem, como a criação de um
pasto, por exemplo, o desequilíbrio pode ser
tão grande que impossibilita a recuperação
da floresta ao seu estágio original. Esse dano,
portanto, é irreparável e provoca grave perda
da diversidade que se encontrava naquela
comunidade, que estava em estágio
avançado de sucessão.
Cecropia sp.
8
Atividade Complementar 1
Identifique em sua região o provável estágio de sucessão de uma
floresta próxima ao local de estudo, trabalho ou de casa. Peça ajuda
aos seus professores para identificar espécies vegetais dessa
comunidade indicadoras desses estágios e faça um relatório sobre a
situação dessa floresta.
Além da sucessão, vários tipos de interações ecológicas
podem afetar a formação de uma comunidade e,
conseqüentemente, a diversidade biológica local. Interações
desarmônicas, como a competição e a predação são exemplos
dessa interferência sobre a biodiversidade. Os predadores
podem reduzir, eliminar ou aumentar, indiretamente, a
diversidade biológica. A presença do predador pode aumentar
a diversidade local quando esses mantêm a densidade de
algumas espécies de presas baixa, o que limita a competição por
recurso, permitindo a coexistência de todas elas. Mas, se o
predador for retirado da comunidade, existe a possibilidade de
que as populações de presas aumentem e extrapolem a
capacidade suporte do ambiente, onde os recursos se tornam
insuficientes para tolerar tais populações, acarretando em um
desequilíbrio ambiental grave, podendo levar a população à
extinção (Figura 3).
Figura 3: Dois exemplos de alteração na comunidade pela presença (a, b, c, d, e) ou
ausência (f, g) do predador.
Outros tipos de relações entre espécies, como as
harmônicas, um bom exemplo seria o mutualismo, também
alteram a composição de uma comunidade, pois várias destas
9
relações são importantes para a existência dos organismos
envolvidos. Algumas orquídeas apresentam alta dependência
por seu agente polinizador (insetos), pois para alguns grupos
(Ex: gênero Ophrys) existe apenas uma espécie de agente
polinizador, ou seja, se este agente acabar sendo eliminado do
meio a planta vai, provavelmente, ser também eliminada por
não conseguir mais completar seu ciclo reprodutivo, mostrando
que relações mutualísticas (neste caso a polinização) são
extremamente
importantes
para
a
manutenção
da
biodiversidade.
Dessa forma, é importante conhecer todos os níveis
tróficos de uma comunidade e saber a relação entre eles, tanto
desarmônicas como harmônicas, para podermos extrapolar o
conhecimento em biodiversidade.
Internet
Para saber sobre o estudo de relações harmônicas entre espécies e sua relação com a
biodiversidade de uma comunidade acesse o link a seguir:
http://www2.ib.unicamp.br/profs/thomas/arch/arch00208/seminarios%20ECE%202008/%5bECE%202008%20Seminario%5d%20Intera%e7%f5es
%20Micr%f3bio-Planta%20e%20Processos%20Ecossist%eamicos.pdf
Já vimos, em outras unidades, que temos os seguintes
níveis tróficos dentro de uma comunidade: produtores
primários (espécies fotossintetizantes ou quimiossintetizantes),
consumidores, que podem ser primários (herbívoros) ou
secundários, terciários e quaternários (predadores e parasitas), e
decompositores (detritívoros). Uma forma de representar estas
relações é chamada de cadeia alimentar, onde temos um
encadeamento unidirecional dos organismos envolvidos (Figura
4), mas quando reunimos um conjunto de cadeias, passamos a
visualizar outra forma representativa, agora multidirecional,
chamada de teia alimentar (Figura 5).
Internet
Para saber sobre
o estudo de
consumidores e
seu papel no
manejo e
conservação
florestal acesse o
link a seguir:
http://www.ipe
f.br/publicacoes
/scientia/nr35/c
ap04.pdf
10
Figura 4: Exemplo de cadeia alimentar em uma lagoa. (Modificado de Sônia Lopes,
2006)
Em qualquer comunidade terrestre analisada, é mais
provável que encontremos o número de produtores primários
alto, e possivelmente maior que de indivíduos herbívoros e
esses maiores que de organismos carnívoros primários e assim
por diante, mas também existem cadeias alimentares
suportadas por poucos produtores (Figura 6). Além disso, uma
situação comum encontrada em muitas comunidades biológicas
é a de que uma espécie que se alimenta de vários organismos de
níveis tróficos inferiores, pode competir pela comida com
outras espécies de mesmo nível trófico e, por conseguinte,
torna-se presa de outras espécies de nível trófico superior.
Chamando a atenção para o fato de que uma espécie pode
ocupar mais de um nível trófico dentro da mesma teia trófica
(Figura 5).
Figura 5: Exemplo de teia alimentar em uma lagoa. (Modificado de Sônia Lopes,
2006)
11
Figura 6. Exemplo de pirâmides ecológicas em ecossistemas terrestres. P = produtor;
C1 = Consumidor primário e C2 = Consumidor secundário. (fonte: Amabis e Martho,
2006)
Analisando essas relações complexas entre as espécies
dentro de uma comunidade, vemos que existem espécies que
são mais relevantes que outras na manutenção desta
comunidade. É o que chamamos de espécies-chave. Essas
espécies são prioritárias na conservação e determinantes na
medida de esforços para a proteção de uma determinada área.
Os predadores, topos de cadeia, estão entre as espécies-chave
mais conhecidas, pois eles são importantes para controlar a
população de presas (Ex: herbívoros), mais abundantes. Mesmo
as espécies de predadores existindo em menor número e
constituindo uma pequena porção da biomassa de uma
comunidade, quando eliminamos uma parte de seus
indivíduos, mudanças drásticas podem ocorrer na vegetação e
resultar em uma grande perda da diversidade biológica local.
Para entendermos melhor
essa situação, tomemos como
exemplo o peixe-boi. A redução da
população de peixe-boi nos rios da
região Norte, devido à caça, causou
uma reação em cadeia dentro da
comunidade:
houve
um
12
crescimento exagerado de biomassa vegetal e conseqüente
redução da fertilização da água devido ao acúmulo de matéria
orgânica e diminuição do oxigênio dissolvido; que resultou na
diminuição da população de peixes dessa região. Por isso as
espécies-chave são prioritárias para a conservação, pois sua
eliminação pode ocasionar uma série de extinções, conhecidas
como extinção em cascata, que resultará na degradação do
ecossistema e na perda de diversidade biológica em todos os
níveis tróficos subseqüentes.
Além das espécies-chave, temos também os chamados
recursos-chave que podem ocupar uma pequena área dentro de
um ecossistema, mas ser necessário à vida de muitas espécies.
No Cerrado, por exemplo, a área de Veredas, que são áreas
alagadas e junto com riachos formam as únicas fontes de água
superficial nesse ecossistema, sendo consideradas recursoschaves e, portanto, prioritárias para a conservação.
Saiba mais
Veredas são regiões
dentro do bioma
Cerrado
caracterizadas por
solos rebaixados
onde há o
afloramento de
águas subterrâneas.
Nesse tipo de
vegetação é comum
a ocorrência da
palmeira Buriti.
Dessa forma, o conhecimento integrado de um
ecossistema e a relação dos fatores abióticos com os organismos
(componente biótico) encontrados em uma região, fornece
subsídios para o entendimento da dinâmica de uma
comunidade, sua diversidade biológica, sendo o passo inicial
para a conservação dessa biodiversidade. Os principais fatores
abióticos que afetam os padrões de ocorrência de espécies em
ecossistemas terrestres e aquáticos são a luz e a temperatura,
sendo que tais fatores exercem grande influência na
biodiversidade de tais regiões. A luz determina a distribuição
de organismos aquáticos, pois ela se restringe a no máximo 200
metros de profundidade em ambientes pouco turvos (Ex:
Oceanos), fazendo com que essa camada superficial apresente a
maior parte produtora (fotossintetizante) da cadeia alimentar e,
consequentemente, afeta a distribuição dos consumidores deste
ecossistema. Por isso, é bastante grave qualquer tipo de
poluição que impeça a penetração da luz em ambientes
aquáticos (Ex: vazamento de petróleo), pois acaba por restringir
a camada fotossintetizante e, por conseguinte a disponibilidade
13
de recursos no meio, o que pode gerar extinção em larga escala,
diminuindo a biodiversidade local.
III. Como medimos a Biodiversidade?
Antes de começarmos este tópico, temos que ter bem claro em
nossas mentes os conceitos que estão relacionados ao conceito
de biodiversidade e que, ás vezes, são apresentados como
sinônimos deste.
O primeiro deles é o de riqueza, que é definida como o
número de espécies encontrado em uma comunidade. O outro
conceito é o de abundância, que é o número total de
indivíduos encontrados em cada espécie. Quando
consideramos estes dois conceitos (riqueza e abundância) em
uma comunidade, juntamente com a uniformidade dos valores
atribuídos,
temos
uma
medida
conhecida
como
Biodiversidade, sendo que tal medida alcança maior valor
conforme a comunidade apresenta-se mais uniformemente
distribuída. Por exemplo, se há 10 espécies de peixes numa
comunidade com 600 indivíduos, podemos pensar em duas
possibilidades (Tabela1): (a) abundância uniformemente
distribuída, como na comunidade 1, sem nenhuma espécie
dominante, ou seja, 60 indivíduos para cada, apresentando
assim o maior valor de biodiversidade possível para este
exemplo, utilizando o índice de Shannon-Weaver (H’) que leva
em consideração a riqueza e a abundância para gerar um valor
de diversidade, conclui-se que o valor para a biodiversidade
local é igual a 1; ou (b) a abundância desigualmente distribuída,
como na comunidade 2, onde há grande diferença entre as
espécies, possuindo uma dominante dentro da comunidade
(espécie com maior abundância = sp.1), resultando em um
menor valor para biodiversidade local (H’ = 0,31).
Internet
Saiba mais
sobre riqueza,
abundância e
diversidade
acessando o
link a seguir:
http://www.s
cielo.br/pdf/r
bzool/v22n2/
25131.pdf
Tabela 1: Exemplo para o cálculo de biodiversidade.
Abundância para sp1
Abundância para sp2
Abundância para sp3
Abundância para sp4
Abundância para sp5
Abundância para sp6
Abundância para sp7
Abundância para sp8
Abundância para sp9
Abundância para sp10
Abundância total
Comunidade 1
60
60
60
60
60
60
60
60
60
60
600
Comunidade 2
500
50
10
10
10
5
5
5
4
1
600
14
Riqueza (nº de spp)
H'
10
1,00
10
0,31
Dentro de uma comunidade a abundância dentro de
cada espécie pode refletir a variedade e a abundância dos
recursos disponíveis para cada população bem como a
influência de outros fatores que regulam o número de espécies,
como a pressão exercida por predadores e competidores. Dessa
forma, a abundância de uma espécie pode indicar o equilíbrio
entre diversos fatores e processos dentro de uma população, e
variações desses fatores podem aumentar ou diminuir a
abundância.
Quando quantificamos a biodiversidade, utilizamos os
conceitos apresentados nos parágrafos anteriores. Para isso,
foram desenvolvidos diversos métodos matemáticos de
biodiversidade (Ex: índice de Shannon-Weaver), que descrevem
o que ocorre com os padrões geográficos de biodiversidade.
Alguns índices mais simples e práticos são os conhecidos alfa,
gama e beta, que descrevem bem a diversidade local e regional.
Chamamos de diversidade alfa ou local (α), o número de
espécies encontrado em um habitat uniformemente distribuído
dentro de uma região (Ex: diversidade em um campo sujo ou
uma mata de galeria). Esse é o índice utilizado para comparar o
número de espécies em diferentes ecossistemas. A diversidade
gama ou regional (γ), se refere ao número de espécies
encontradas em todos os habitats de uma determinada região
(Ex: diversidade no Cerrado). E ainda há a diversidade Beta (β)
que está relacionada à mudança das espécies de acordo com
uma variação ambiental, ou seja, refere-se à substituição de
espécies de um habitat para outro dentro da mesma região (Ex:
Diferença de espécies entre campo sujo e mata de galeria). A
diversidade Beta é calculada através dos índices alfa e gama
(Equação: β = γ / α), alcançando maior valor conforme as áreas
apresentem diferenças na composição de espécies. Perceba que
os índices variam de acordo com a composição dos diferentes
habitats (Tabela2).
Internet
Saiba mais
sobre os
índices de
diversidade
alfa e beta
acessando o
link a seguir:
http://www.s
cielo.br/pdf/a
bb/v15n2/682
8.pdf
Tabela 2: Exemplo para o calculo de diversidade (α, γ e β) entre quatro regiões com a presença
de possíveis 5 espécies (a, b, c, d, e).
Habitat 1
Habitat 2
Habitat 3
Habitat 4
Alfa (α)
Gama (γ)
Beta (β)
Região 1
a
a
b
b
1
2
2
Região 2
ab
ab
ab
ab
2
2
1
Região 3
ab
c
d
e
1,25
5
4
Região 4
abc
abc
abc
abc
3
3
1
15
*Obs: Como Alfa representa o índice LOCAL, para este exemplo onde utilizamos
quatro habitats, temos que dividir o valor de Alfa por 4, para obter o alfa médio por
habitat.
Índices de biodiversidade
As diferenças de abundância dentro de uma comunidade
trazem alguns problemas práticos para os ecólogos. Quando
queremos comparar a diversidade em duas comunidades, por
exemplo, o esforço de amostragem de indivíduos, deve ser o
mesmo, pois o número de espécies contabilizadas pode variar
de acordo com o tamanho amostral obtido. Quanto mais
indivíduos capturados em uma região, maior a probabilidade
de encontrar espécies raras, ou seja, espécies com baixa
abundância. Assim, não se deve comparar a diversidade entre
duas áreas que tiveram esforços de amostragem diferentes.
O outro problema é que nem todas as espécies devem
contribuir da mesma forma para a estimativa da diversidade, já
que cada espécie desempenha um papel diferente na
comunidade, variando com a abundância total (Tabela 3). Na
tabela 3, podemos observar que nos locais onde ocorrem menos
espécies, cada uma delas é mais abundante, relativamente, e
deve ocupar um maior número de habitats (localidade 7 – Tabela
3), quando comparado com locais que tem mais espécies. Isso
demonstra que uma espécie encontrada em um local com maior
número de habitats, contribui menos para a abundância relativa,
contribuindo de maneira diferente para a diversidade quando
comparada a um local com menor número de habitats.
Internet
Para se
aprofundar
mais sobre os
índices de
biodiversidade
utilizado em
ecologia acesse
o link a seguir:
http://www2.
ib.unicamp.br
/profs/fsantos
/refer/Holos1999-1-236.pdf
Tabela 3: Distribuição de habitats e abundância relativa de espécies de aves em sete localidades
da região tropical*.
Número
Número de
Abundância
médio de
Abundância
espécies
Habitats relativa por Abundância
espécies
relativa de
Localidade observadas
por
espécie e relativa por
por habitat
todas as
(densidade
espécie
habitat
espécie
(diversidade
espécies
regional)
(densidade)
local)
1
135
30,2
2,01
2,95
5,93
800
2
106
28,2
2,35
3,31
7,78
840
3
56
21,4
3,43
4,97
17,05
955
4
53
21,4
3,63
4,71
17,1
906
5
33
15,2
4,15
5,77
23,95
790
6
30
15,5
4,63
5,36
24,82
745
7
20
11,9
5,35
5,88
31,45
629
* Baseado em 10 amostragens em cada um dos 9 habitats de cada localidade. A abundância
relativa por espécie e habitat corresponde ao número de períodos de contagem nos quais as
espécies foram vistas (máximo 10); esse dado vezes o n° de habitats corresponde a abundância
relativa por espécie; e esse valor vezes o n° de espécies fornece a abundância relativa de todas
as espécies (Fonte: Ricklefs, 2003).
16
O primeiro problema deve ser resolvido com um bom
desenho experimental e uma metodologia condizente com o
tipo de estudo que deseja. O segundo problema foi solucionado
pelos ecólogos com a formulação dos índices de
biodiversidade, nos quais a contribuição de cada espécie para a
formulação do índice varia de acordo com sua abundância
relativa, ou seja, são atribuídos diferentes pesos para cada
espécie. Dessa forma, cada espécie recebe o peso adequado por
influenciar a diversidade de uma comunidade.
Existem vários modelos para calcular a diversidade em
Ecologia, porém dois desses índices são muito utilizados: o
índice de Simpson e o índice de Shannon-Weaver. Nesses dois
casos, o cálculo do índice é feito a partir da proporção (pi) das
espécies (i) na amostra total de indivíduos (Ricklefs, 2003). A
proporção das espécies pode ser determinada pela seguinte
equação:
pi = ni
N
Onde, ni é o número amostrado para a espécie i e N é o número
total de espécies amostradas.
O índice de Simpson (D) pode ser obtido pela seguinte fórmula:
D= 1
∑ pi2
Onde ∑ significa somatório. No caso acima é o somatório da
proporção das espécies elevada ao quadrado.
Esse índice leva em consideração a regularidade das
abundâncias das espécies e, por isso, o valor de D pode variar
de 1 a S, onde S é o número total de espécies numa amostra. Por
exemplo, quando 5 espécies amostradas têm igual abundância,
o valor de cada pi é 0,20, logo pi2 = 0,04 e o seu somatório é 0,20.
Colocando esses dados na fórmula, teremos que o valor de D é
o mesmo do número de espécies amostradas, 5.
O índice de Shannon-Weaver (H’) pode ser calculado pela
fórmula:
H’ = - ∑pi loge pi
Onde, pi é a proporção das espécies na amostra total e loge
pi é o logarítimo neperiano da proporção das espécies. Na tabela
1, podemos ver um exemplo do índice de Shannon-Weaver
para cálculo da biodiversidade.
Saiba mais
Para aprimorar
o conhecimento
desses índices e
sua utilização
em ecologia não
deixe de ler os
artigos
recomendados,
apresentados ao
longo do texto e
na lista
apresentada ao
final desta
unidade.
Atividade Complementar 2
Com a ajuda de seus professores, faça uma amostragem de artrópodes
em duas regiões que possua diferentes tipos de vegetação, com o
17
mesmo esforço amostral, e estime para as duas áreas os índices de
biodiversidade citados anteriormente. Discuta as diferenças e
semelhanças encontradas num contexto ecológico.
IV. Conclusão
Ao longo desse módulo, você irá se deparar com várias
aplicações do estudo da biodiversidade, como na biogeografia
de ilhas, na conservação da biodiversidade, na unidade de
extinção, dentre outras. Todas elas demonstram relação direta
com o uso da biodiversidade e seu papel dentro da ecologia.
Por isso, não iremos nos alongar no assunto da aplicabilidade
do estudo da biodiversidade. Essa é uma das áreas mais amplas
e que está chamando atenção dos pesquisadores nos últimos
anos, devido a sua relação com todas as disciplinas da ecologia
e à alteração dos processos ambientais que a Terra vem
passando, como o aquecimento global. Os estudos de
biodiversidade indicam regiões prioritárias para conservação,
indicam espécies que estão sendo e que podem ser extintas
devido a processos diversos (que você verá logo a seguir ainda
neste módulo) e explicam o porquê do padrão de distribuição
de espécies dentro das regiões existentes na Terra (que você já
deve ter visto no módulo VI e verá nas unidades a seguir).
Esse ano (2010) é comemorado o ano da Biodiversidade,
mas apesar dos esforços de vários pesquisadores do país, muito
ainda pode ser feito para a conservação da flora e fauna
brasileira. Existem poucas pessoas estudando filos mais
simples, como os de artrópodes, nematóides, anelídeos, que
existem em grande abundância e podem ser bons
bioindicadores às perturbações que ocorrem no ecossistema no
qual se encontram. Além disso, pouco se sabe sobre os
organismos planctônicos de águas continentais e sobre os
microorganismos presentes no solo, porém esses dois
ecossistemas apresentam também alta biodiversidade, mas são
constantemente agredidos por poluição, desmatamento, dentre
outros fatores.
Acreditamos que com a leitura dessa unidade, juntamente
com os artigos sugeridos a seguir, você conseguirá entender
que a palavra biodiversidade abrange, praticamente, todos os
processos abordados em ecologia, por isso é importante
entendermos os principais conceitos que estão inseridos neste
tema e suas possíveis aplicações.
Internet
Para saber mais
sobre a
aplicação do
estudo da
biodiversidade
para a
conservação de
espécies acesse
o link a seguir:
http://www.co
nservacaointern
acional.org.br/p
ublicacoes/files
/11_Agostinho_
et_al.pdf
Internet
Para saber mais
sobre o ano da
biodiversidade
acesse os links a
seguir:
http://2010aib.
blogspot.com/2
010/02/2010anointernacionalda.html
http://www.w
wf.org.br/?2370
0/2010-Ano-daBiodiversidade
18
V. Referências
Amabis, J.M. & Martho, G.R. 2006. Fundamentos da biologia
moderna. 4ª edição. Editora Moderna.São Paulo.
Begon, M.; Harper, J.L. & Townsend, C.R. 1996. Ecology:
individuals, populations and communities. 3rd edição.
Oxford, Blackwell
Primack, R.B. & Rodrigues, E. 2001. Biologia da Conservação.
Editora Planta.
Ricklefs, R.E. 2003. A Economia da Natureza. 5ª edição. Editora
Guanabara Koogan, Rio de Janeiro.
Lopes, S. 2006. Bio: Volume 3. 1ª edição. Editora Saraiva. São
Paulo.
Artigos recomendados:
Almeida, M.V.R.; Oliveira, T.S. & Bezerra, A.M.E. 2009.
Biodiversidade em sistemas agroecológicos no município de
Choró, CE, Brasil. Ciência Rural. 39(4): 1080-1087.
Cassia, H.; Kenya, S.; Erica, M.; Paulo, Q.; Luzia, L. & Rose, M.
2009. Variabilidade genética em populações de Aedes aegypti
(L.) (Diptera: Culicidae) utilizando marcadores de RAPD.
Neotropical Entomology. 38(4): 542-547.
Ganho, N.G. & Marinoni, R.C. 2006. A variabilidade espacial
das famílias de Coleoptera (Insecta) entre fragmentos de
Floresta Ombrófila Mista Montana (Bioma Araucária) e
plantação de Pinus elliottii Engelmann, no Parque Ecológico
Vivat Floresta, Tijucas do Sul, Paraná, Brasil. Revista Brasileira
de Zoologia. 23(4): 1159-1167.
Gottlieb, O.R.; Borin, M.R.M. B.; Pagotto, C.L.A.C. & Zocher,
D.H. T. 1998. Biodiversidade: o enfoque interdisciplinar
brasileiro. Ciência & Saúde Coletiva. 3(2): 97-102.
Mangussen, S. & Boyle, T.J.B. 1995. Estimating sample size for
inference about the Shannon-Weaver and the Simpson
indices of species diversity. Forest Ecology and Management,
78: 71 – 84.
19
Mouillot, D. & Deprêt, A. 1999. A comparison of species
diversity estimators. Population Ecology, 41: 203 – 215.
Neumann, M. & Starlinger, F. 2001. The significance of different
indices for stand structure and diversity in forests. Forest
Ecology and Management, 145: 91 – 106.
Peet, R.K. 1974. The Measurement of species diversity. Annual
Review of Ecology and Systematics, 5: 285-307.
Yoccoz, N.G.; Nichols, J.D. & Boulinier, T. 2001. Monitoring of
biological diversity in space and time. Trends in Ecology &
Evolution, 16: 446 – 453.
20
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