1. Limitações ao Poder Constituinte Derivado Decorrente
Os Estados federados (e o DF) recebem diretamente do Poder Constituinte originário a
capacidade de continuar a Constituição dentro de seu território, porém, devem ser
obedecidos os princípios estabelecidos pela Constituição Federal.
Segundo Uadi Lammêgo Bulos, os limites que os Estados se sujeitam pela imposição da
Constituição Federal são chamados de autônomos.
São adjetivados de autônomos porque advieram do próprio constituinte originário. Por isso,
independem de quaisquer providências legislativas ulteriores das Assembléias Legislativas dos
Estados para ser aplicados. [1]
Tais limites autônomos incidem sobre a institucionalização e sobre o processo de
emenda da Carta Estadual. Esses limites são os princípios sensíveis (ou enumerados), os
princípios organizatórios (ou estabelecidos – que podem ser expressos ou implícitos) e
os princípios extensíveis. Segundo Bulos, ainda há outros limites que os Estados se
sujeitam. São os chamados limites heterônomos, porém, essas restrições são criadas na
Constituição Estadual para limitar o poder de emenda estadual.
Raul Machado Horta, por sua vez, esclarece que:
O constituinte do Estado cria ordenamento constitucional autônomo, mas o processo de criação
que ele percorre difere profundamente da originariedade criadora do constituinte federal.
A precedência da Constituição Federal sobre a do Estado-Membro é exigência lógica da
organização federal, e essa precedência, que confere validez ao sistema federal, imprime a força
de matriz originária ao constituinte federal e faz do constituinte estadual um segmento derivado
daquele.[2]
A doutrina e a jurisprudência seguem indicando quais seriam os princípios que os
Estados e o DF deveriam seguir ao utilizar sua capacidade constituinte decorrente[3].
Decisão do STF sobre o tema:
O perfil da federação brasileira, redefinido pela constituição de 1988, embora aclamado por
atribuir maior grau de autonomia dos Estados-membros, e visto com reserva por alguns
doutrinadores, que consideram persistir no Brasil um federalismo ainda afetado por excessiva
centralização espacial do poder em torno da União Federal. Se e certo que a nova carta política
contempla um elenco menos abrangente de princípios constitucionais sensíveis, a denotar, com
isso, a expansão de poderes jurídicos na esfera das coletividades autônomas locais, o mesmo não
se pode afirmar quanto aos princípios federais extensíveis e aos princípios constitucionais
estabelecidos, os quais, embora disseminados pelo texto constitucional, posto que não é tópica a
sua localização, configuram acervo expressivo de limitações dessa autonomia local, cuja
identificação – até mesmo pelos efeitos restritivos que deles decorrem – impõe-se realizar. (grifo
nosso)[4]
1.1. Princípios Sensíveis, Apontados ou Enumerados
São as matérias constantes no art. 34, VII, a a e. São sensíveis por dois motivos, um
porque estão expressos[5] e dois porque ao serem violados podem sujeitar o Ente à
intervenção federal.
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
(...)
VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a
proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e
serviços públicos de saúde.
Não cumprir os princípios sensíveis dá ensejo à representação de inconstitucionalidade
interventiva, nos termos do art. 36, III, a ser proposta pelo Procurador Geral da
República (PGR) e julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
1.2. Princípios Estabelecidos ou Organizatórios[6]
Dividem-se em explícitos, implícitos e decorrentes.
1.2.1. Princípios estabelecidos ou organizatórios explícitos ou expressos
Os princípios estabelecidos explícitos correspondem ao conjunto de matérias às quais os
Estados deveriam observar compulsoriamente (mandatórios) ou dizem respeito às
matérias que os Estados não poderiam tratar (vedatórios) e que a Constituição fez
questão de deixar expressamente consignados.
A. Princípios organizatórios expressos mandatórios
São normas compulsórias ou conhecidas como normas de pré-ordenação dos Estados.
As normas de pré-ordenação constitucional determinam que os Estados deverão
observar diversas normas inseridas em diversos dispositivos constitucionais, seguem-se
exemplos:
• Art. 18, §4°: A criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios é
matéria que o Estado tem que tratar em sua organização.
• Art. 27, §1º, que fixa o mandato dos deputados estaduais em quatro anos.
O STF decidiu que:
Nos expressos termos do § 1º do art. 27 da CF de 1988, ‘será de
quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais’. A Constituição Federal, no
art. 28, fixou em 1º de janeiro a data da posse do Governador e do ViceGovernador eleitos noventa dias antes do término de seus mandatos. Não
marcou data para o início das legislaturas estaduais, mas, no art. 25, atribuiu
aos Estados o poder de se organizarem e se regerem pelas Constituições e leis
que adotarem, observados, porém, os seus próprios princípios (da CF). E o art.
11 do ADCT da CF de 1988 também estabeleceu: ‘cada Assembléia
Legislativa, com poderes constituintes, elaborara a Constituição do Estado, no
prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos
os princípios desta’. Um desses princípios é o que fixa em quatro anos a
duração do mandato dos Deputados Estaduais (§ 1º do art. 27 da CF), que,
consequentemente, não pode ser desobedecido por normas estaduais, como
a Constituição do Estado e o Regimento Interno de sua Assembléia Legislativa.
Não podem tais normas ampliar nem reduzir o prazo de duração dos
mandatos de Deputados Estaduais. (grifo nosso)[7].
• Art. 28, §1º e 2º, que estabelecem normas relacionadas ao subsídio e à posse do
governador em cargo público.
• Art. 31, §1º, que estabelece o controle externo nos Municípios (pela Câmara
Municipal) com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos
Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver. Com a exceção dos
Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro que possuem Tribunais de Contas do
Município, todos os outros Municípios seguem a regra de ter o controle externo
auxiliado pelo Estado-membro.
• Arts. 37 a 42, porque a Constituição Federal diz expressamente se aplicar à
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios os princípios ali elencados.
Segundo o STF:
“(...) o art. 125 da Lei Magna defere aos Estados a competência de
organizar a sua própria Justiça, mas não é menos certo que esse mesmo art.
125, caput, junge essa organização aos princípios "estabelecidos" por ela,
Carta Maior, neles incluídos os constantes do art. 37, cabeça. (grifo
nosso)[8]
• Arts. 92 a 97 estabelecem normas de pré-ordenação do Poder Judiciário tanto da
União quanto dos Estados.
Sobre o tema, o STF decidiu que:
Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigo 85 da Constituição do
Estado de Rondônia, que elevou para treze o número de Desembargadores do
Tribunal de Justiça. Ofensa manifesta ao princípio da iniciativa privativa, para
o assunto, do Tribunal de Justiça, consagrada no art. 96, II, b, da Constituição
Federal, de observância imperiosa pelo poder constituinte derivado
estadual, como previsto no art. 11 do ADCT/88. Procedência da ação, para
declarar inconstitucional a expressão "treze" contida no referido dispositivo.
(grifo nosso)[9].
• Arts. 98, que determina que os Estados instituirão o juizado especial cível e criminal.
• Art. 99, que determina a autonomia dos tribunais (se aplica aos Tribunais de Justiça
dos Estados.
• Art. 125, §2o, que determina expressamente aos Estados estabelecerem a
representação de inconstitucionalidade contra lei ou ato normativo estadual ou
municipal que contrariarem a Constituição Estadual.
• Arts. 127 a 135, especialmente os arts. 132 e 134§2º, que tratam das funções
essenciais à justiça e trazem diversos dispositivos direcionados à pré-ordenação dos
Estados.
• Arts. 144 IV e V §4° ao 7° e vários outros.
Importante salientar que há algumas matérias especiais que o STF entende que não são
princípios organizatórios. Os casos seguintes não são princípios organizatórios
mandatórios, ou seja, são matérias que o constituinte estadual tem liberdade no seu
poder de auto-organização. São exemplos:
• Art. 57, §4o, que dispõe sobre eleição das mesas diretoras das casas legislativas do
Congresso e veda a recondução dentro da mesma legislatura. O STF entendeu que:
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA ESTADUAL: MESA DIRETORA:
RECONDUÇÃO PARA O MESMO CARGO. Constituição do Estado de
Rondônia, art. 29, inc. I, alínea b, com a redação da Emenda Const. Estadual n.
3/92. C.F., art. 57, § 4º. (...) A norma do § 4º do art. 57 da CF que, cuidando
da eleição das Mesas das Casas Legislativas federais, veda a recondução para o
mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente, não é de reprodução
obrigatória nas Constituições dos Estados-membros, porque não se constitui
num princípio constitucional estabelecido. II. - Precedente do STF: Rep
1.245-RN, Oscar Corrêa, RTJ 119/964. (grifo nosso)[10]
• Art. 59, V, 62 e 84 XXVI, que se refere à edição de Medidas Provisórias no plano
federal. A adoção da espécie normativa Medida Provisória é facultativa no plano dos
Estados. Decisão do STF a respeito do Art. 25, §2º[11]:
Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 51 e parágrafos da
Constituição do Estado de Santa Catarina. Adoção de medida provisória por
Estado-membro. Possibilidade. Arts. 62 e 84, XXVI da Constituição
Federal. Emenda constitucional 32, de 11.09.2001, que alterou
substancialmente a redação do art. 62. Revogação parcial do preceito
impugnado por incompatibilidade com o novo texto constitucional.
Subsistência do núcleo essencial do comando examinado, presente em seu
caput. Aplicabilidade, nos Estados-membros, do processo legislativo previsto
na Constituição Federal. Inexistência de vedação expressa quanto às
medidas provisórias. Necessidade de previsão no texto da carta estadual e
da estrita observância dos princípios e limitações impostas pelo modelo
federal. Não obstante a permanência, após o superveniente advento da Emenda
Constitucional 32/2001, do comando que confere ao Chefe do Executivo
Federal o poder de adotar medidas provisórias com força de lei, tornou-se
impossível o cotejo de todo o referido dispositivo da Carta catarinense com o
teor da nova redação do art. 62, parâmetro inafastável de aferição da
inconstitucionalidade argüida. Ação direta prejudicada em parte. No
julgamento da ADI 425,Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 19.12.2003, o Plenário
desta Corte já havia reconhecido, por ampla maioria, a
constitucionalidade da instituição de medida provisória estadual, desde
que, primeiro, esse instrumento esteja expressamente previsto na
Constituição do Estado e, segundo, sejam observados os princípios e as
limitações impostas pelo modelo adotado pela Constituição Federal, tendo
em vista a necessidade da observância simétrica do processo legislativo
federal. Outros precedentes: ADI 691, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ
19.06.1992 e ADI 812-MC, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 14.05.1993.
Entendimento reforçado pela significativa indicação na Constituição Federal,
quanto a essa possibilidade, no capítulo referente à organização e à regência
dos Estados, da competência desses entes da Federação para ‘explorar
diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na
forma da lei, vedada à edição de medida provisória para a sua
regulamentação’[12] (art. 25, § 2º). Ação direta cujo pedido formulado se
julga improcedente.[13] (grifo nosso)
• Art. 128, §3º, que trata da escolha do chefe do Ministério Público Estadual –
Procurador-Geral de Justiça. Será escolhido pelo chefe do Executivo, dentro de
integrantes da carreira, indicados em lista tríplice na forma da lei respectiva, porém,
não passa por sabatina no Poder Legislativo.[14]
• Art. 131, §1o, que dispõe sobre a escolha do Advogado Geral da União, esse no plano
federal, é de livre nomeação e livre exoneração. O STF[15] entendeu que, no plano
estadual, os Estados estão livres para estabelecer na Constituição do Estado que o
Procurador-Geral do Estado seja escolhido dentre membros da carreira, o que cria uma
vinculação diferente quando se compara com a livre escolha do Advogado Geral da
União.
B. Princípios organizatórios expressos vedatórios (proibições)
São os artigos constitucionais que definem, expressamente, o que os Estados não podem
fazer. Vejamos:
• Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:... Traz
um conjunto de matérias vedadas a todos os entes.
• Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios
localizados em Território Federal, exceto quando: (...) também traz uma vedação,
embora não seja absoluta, a vedação está em não intervir nos seus Municípios, exceto
nos casos que a própria CF, no mesmo artigo, elenca.
• Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.
• Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer
diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua
procedência ou destino.
1.2.2. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos
Diz respeito também a um grupo de artigos que, por estabelecerem competências da
União ou dos Municípios, veda, implicitamente, a competência organizatória dos
Estados. Podem ser vedatórios ou mandatórios.
A. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos vedatórios
Correspondem às matérias que foram dadas à União, de forma exclusiva ou privativa,
ou aos Municípios e, por isso, são vedadas, implicitamente, aos Estados, vejamos
exemplos:
• Art. 21 Competência da União, sendo competência da União o artigo veda de forma
implícita a participação do Estado no assunto.
• Art. 22 Competência privativa da União para legislar, novamente a mesma ideia, ao
atribuir a competência para a União, há uma vedação implícita aos Estados.
• Art. 30[16], que estabelece a competência dos Municípios, também veda de forma
implícita a atuação dos Estados na matéria.
• Art. 86, §3º, que atribui imunidade ao Presidente da República em relação às prisões,
só podendo ser preso após sentença condenatória. Segundo o STF, tal norma não pode
ser estendida aos Governadores, porque seria prerrogativa típica de chefe de estado. Não
podem as Constituições estaduais conceder tais imunidades aos Governadores, veja a
decisão do STF:
O Estado-membro, ainda que em norma constante de sua própria
Constituição, não dispõe de competência para outorgar ao Governador a
prerrogativa extraordinária da imunidade à prisão em flagrante, a prisão
preventiva e à prisão temporária, pois a disciplinação dessas modalidades de
prisão cautelar submete-se, com exclusividade, ao poder normativo da União
Federal, por efeito de expressa reserva constitucional de competência definida
pela Carta da República. A norma constante da Constituição estadual — que
impede a prisão do Governador de Estado antes de sua condenação penal
definitiva — não se reveste de validade jurídica e, consequentemente, não
pode subsistir em face de sua evidente incompatibilidade com o texto da
Constituição Federal.[17]
B. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos mandatórios
São matérias que estabelecem implicitamente ao Estado algo que deverão fazer, que
deverão executar, conforme a prescrição constitucional. Exemplos:
• Art. 25. §3° Estabelece que os Estados podem instituir regiões metropolitanas,
aglomerações urbanas e microrregiões, porém, manda, implicitamente que seja
conforme os pressupostos indicados na norma.
• Art. 27 Estabelece a Assembleia legislativa e, implicitamente, determina que seja o
poder legislativo estadual unicameral.
• Art. 28 Estabelece o Governador como o chefe do poder executivo estadual,
estabelece, implicitamente, a necessidade de seguir o presidencialismo no âmbito
estadual, posto que a chefia do executivo tem que ser necessariamente unipessoal.
• Art. 155 Traz a possibilidade de os Estados instituírem impostos, porém,
implicitamente há a necessidade de seguir diversas normas de pré-ordenação.
1.3. Princípios Extensíveis ou da Simetria
Os princípios extensíveis correspondem ao conjunto de matérias que a Suprema Corte
entende que deva ser utilizado no âmbito estadual, copiando-se o modelo federal, por
simetria. Em outras palavras, o princípio da simetria indica matérias que são
estendidas do modelo federal para o modelo de organização estadual.
Os princípios extensíveis são também conhecidos como princípio da simetria (ou da
homogeneidade), porque são declarados como normas que simetricamente, seguindo
o modelo federal, deverão ser adotadas no modelo de organização estadual.
Constituem normas de pré-ordenação dos Estados indicadas, caso a caso, pela
jurisprudência do STF. Pode-se dizer que os princípios extensíveis integram a estrutura
da federação, seriam exemplos:
• Art. 58, §3º no que se refere ao quórum de 1/3 para a criação de comissões
parlamentares de inquérito (CPIs).
• Arts. 61, §1º, que estabelece as iniciativas do Presidente da República deverão ser
respeitadas mutatis mutantis para os Governadores de Estado.
• Art. 83, que estabelece que o Presidente e o Vice-Presidente não poderão sair do País
por período superior a 15 dias sem a anuência do Congresso Nacional, sob pena de
perda do cargo.
• Em geral o Processo Legislativo, principalmente, suas iniciativas reservadas e o poder
de sanção conferido ao governador. Nesse caso, contemplando, inclusive, a proibição ao
Poder Constituinte decorrente de incluir na Constituição do Estado a regulação de
matérias que seriam de iniciativa privativa do Governador.
• Princípio da igualdade dos Entes Federativos.
• Não coação de um Ente sobre os outros.
• Princípio do Estado Democrático de Direito: Os Estados e DF só podem atuar com
respeito à legalidade, moralidade, dignidade da pessoa humana...
• Respeito aos direitos fundamentais e suas garantias.
• Princípios da ordem econômica e social: valorização do trabalho, da justiça social,
saúde e educação como direito de todos e obrigação das entidades estatais.
1.3.2. Decisões do STF sobre o tema da simetria ou homogeneidade
A.
B. ADI 738 (STF)
Afronta os princípios constitucionais da harmonia e independência entre os Poderes e da
liberdade de locomoção norma estadual que exige prévia licença da Assembléia
Legislativa para que o Governador e o Vice-Governador possam ausentar-se do País por
qualquer prazo. Espécie de autorização que, segundo o modelo federal, somente se
justifica quando o afastamento exceder a quinze dias. Aplicação do princípio da
simetria.
C. ADI 425 (STF)
Podem os Estados-Membros editar medidas provisórias em face do princípio da
simetria, obedecidas as regras básicas do processo legislativo no âmbito da União (CF,
artigo 62). Constitui forma de restrição não prevista no vigente sistema constitucional
pátrio (CF, § 1º do artigo 25) qualquer limitação imposta às unidades federadas para a
edição de medidas provisórias. Legitimidade e facultatividade de sua adoção pelos
Estados-Membros, a exemplo da União Federal.
D. ADI 3.619 (STF)
O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido (...) para declarar inconstitucionais o
trecho 'só será submetido à discussão e votação decorridas 24 horas de sua
apresentação, e', constante do § 1º do art. 34, e o inciso I do art. 170, ambos da XII
Consolidação do Regimento Interno da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo
que estabelecem, como requisito à criação de comissão parlamentar de inquérito, a
aprovação do respectivo requerimento em Plenário. (...) asseverou-se que os requisitos
indispensáveis à criação de comissões parlamentares de inquérito encontram-se
dispostos no art. 58, § 3º, da CF, preceito de observância compulsória pelas casas
legislativas estaduais (princípio da simetria). Desse modo, entendeu-se que a criação de
CPI independe de deliberação plenária, sendo bastante a apresentação do requerimento
de 1/3 dos membros da Assembléia Legislativa ao seu Presidente, somada aos demais
requisitos constitucionais.
E. ADI 2.966 (STF)
À luz do princípio da simetria, é de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo
estadual as leis que disciplinem o regime jurídico dos militares (art. 61, § 1º, II, f, da
CF/1988). Matéria restrita à iniciativa do Poder Executivo não pode ser regulada por
emenda constitucional de origem parlamentar. Precedentes."
F. RE 223.037 (STF)
Tribunal de Contas do Estado de Sergipe. Competência para executar suas próprias
decisões: impossibilidade. Norma permissiva contida na Carta estadual.
Inconstitucionalidade. As decisões das Cortes de Contas que impõem condenação
patrimonial aos responsáveis por irregularidades no uso de bens públicos têm eficácia
de título executivo (CF, artigo 71, § 3º). Não podem, contudo, ser executadas por
iniciativa do próprio Tribunal de Contas, seja diretamente ou por meio do Ministério
Público que atua perante ele. Ausência de titularidade, legitimidade e interesse imediato
e concreto. A ação de cobrança somente pode ser proposta pelo ente público
beneficiário da condenação imposta pelo Tribunal de Contas, por intermédio de seus
procuradores que atuam junto ao órgão jurisdicional competente. Norma inserida na
Constituição do Estado de Sergipe, que permite ao Tribunal de Contas local executar
suas próprias decisões (CE, artigo 68, XI). Competência não contemplada no modelo
federal. Declaração de inconstitucionalidade, incidenter tantum, por violação ao
princípio da simetria (CF, artigo 75).
G. ADI 452 (STF)
A escolha do Procurador-Geral da República deve ser aprovada pelo Senado (CF, artigo
128, § 1º). A nomeação do Procurador-Geral de Justiça dos Estados não está sujeita à
aprovação da Assembléia Legislativa. Compete ao Governador nomeá-lo dentre lista
tríplice composta de integrantes da carreira (CF, artigo 128, § 3º). Não-aplicação do
princípio da simetria.
H. ADI 233 (STF)
Ação direta de inconstitucionalidade. Estado do Rio de Janeiro. Art. 29 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, que "anistiou" servidores em geral punidos com pena disciplinar; e
art. 30, que anulou sansões disciplinares aplicadas aos servidores civis. Alegada afronta aos arts.
48, VIII, e 142, c/c o 144, par. 6º, da Constituição Federal. Procedência da increpação. O poder
de elaborar a carta política do estado, conferido pelo art. 11 do ADCT/88, a assembléia
legislativa, não compreende o de inserir no referido diploma normas próprias do poder
legislativo ordinário, exercido pelo referido órgão, não de modo exclusivo, mas com observância
indispensável ao princípio da colaboração dos demais poderes. Configuração, no presente caso,
de flagrante violação ao referido princípio. Procedência da ação.
I. RE 153.968 (STF)
Processamento e julgamento de crime comum, atribuído ao governador. Art. 107 da Constituição
Estadual, que condiciona o respectivo processamento e julgamento a admissão da acusação por
2/3 dos membros da Assembléia Legislativa. Constitucionalidade reconhecida pelo Superior
Tribunal de Justiça. Decisão que teria ofendido os arts. 25; 51, I; 86 e 105, I, da Constituição
Federal. Alegação descabida. A norma do art. 105, I, a, primeira parte, da Constituição Federal,
que prevê a competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar os crimes em
referencia, não pode ser interpretada senão em consonância com o principio da autonomia dos
Estados-Membros, e, portanto, sem contrariedade ao disposto no art. 25, da mesma Carta,
segundo o qual serão eles organizados e regidos pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios estabelecidos no Texto Fundamental Federal, entre os quais figura,
desenganadamente, o de que o julgamento do Chefe do Poder Executivo há de ser precedido de
manifestação política do Poder Legislativo (art. 51, I), que diga da conveniência, ou não, de que
se proceda contra quem exerce a suprema magistratura do Estado, com risco de perda da
liberdade e, pois, de destituição indireta de suas funções.
J. ADI-MC 2361 (STF)
Verificada a reprodução obrigatória pela Carta Estadual (artigos 76, incisos I, II, IV, V e VI) das
disposições constantes dos incisos I, II, IV, V e VI do artigo 71 da Constituição Federal, é do
STF a competência para julgar a ação. Precedentes. 3. O controle externo das contas do Estadomembro é do Tribunal de Contas, como órgão auxiliar da Assembléia Legislativa, na forma do
artigo 71 da Constituição Federal, por força do princípio da simetria.
2. Normas de Reprodução e Normas de Imitação
[18]
2.1. Normas Centrais
Raul Machado Horta utiliza uma nomenclatura própria para definir os princípios que os
Estados se sujeitam na sua auto-organização. Segundo o autor, a Constituição Federal,
por ser anterior e superior, estabelece um conjunto de princípios que seriam “normas
centrais” que os Estados devem seguir.
As normas centrais, na visão do citado autor, seriam:
2.1.1. Princípios sensíveis (Art. 34, VII)
Neste caso não há diferença para o que já foi estudado no tópico 7.1.
2.1.2. Princípios estabelecidos (estão dispersos)
Definem
“a origem, a causa, o começo, o germe, o elemento predominante da Constituição Federal. Os
princípios estabelecidos se alojam nas normas constitucionais federais sobre repartição de
competência, o sistema tributário, a organização dos Poderes, os direitos políticos, a
nacionalidade, os direitos e as garantias individuais, os direitos sociais, a ordem econômica, a
educação, a família e a cultura, afinal, na matéria dispersa no texto constitucional federal”.[19]
2.1.3. Regras de preordenação
Consagram as normas relativas à auto-organização, porém, já dispostas no texto
Constitucional, como por exemplo, normas sobre o Poder Judiciário e sobre o
Ministério Público.
2.2. Normas de Reprodução[20]
As normas centrais seriam, então, “normas de reprodução”, ou seja, seriam normas que
os Estados são obrigados a ter na sua Constituição Estadual pelo fato de já terem sido
adotadas na Constituição Federal.
(...) as normas de reprodução refletem a expansividade do modelo federal, que atraiu para seu
campo matéria anteriormente entregue à revelação originária do constituinte estadual.[21]
O STF já se pronunciou[22] sobre a citada doutrina entendendo, quanto ao Preâmbulo
da Constituição Federal, que:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. CONSTITUIÇÃO: PREÂMBULO. NORMAS CENTRAIS.
Constituição do Acre. I. - Normas centrais da Constituição Federal: essas normas são de
reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro, mesmo porque, reproduzidas, ou
não, incidirão sobre a ordem local. Reclamações 370-MT e 383-SP (RTJ 147/404). II. Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não
se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa.
III. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. (grifo nosso)
2.3. Normas de Imitação
O autor cita ainda que os Estados podem, por opção, copiar outras normas de
organização do modelo federal para a sua realidade, tais normas copiadas por vontade
própria, ou seja, dentro da utilização de sua auto-organização, seriam normas de
imitação.
As normas de imitam exprimem a cópia de técnicas ou de institutos, por influência de sugestão
exercida pelo modelo superior. (...) a norma de imitação traduz a adesão voluntária do
constituinte a uma determinada disposição constitucional.[23] (grifo nosso)
[1]
Uadi Lammêgo Bulos (2007, p. 312).
[2]
Raul Machado Horta (Direito Constitucional, 4ª ed., p. 69).
A maior parte da doutrina utiliza a classificação em Princípios Sensíveis, Princípios
Estabelecidos e Princípios Extensíveis, mas também será descrita a ideia de Raul
[3]
Machado Horta (2003) que fala em Normas Centrais e sua vinculação como Normas de
Repetição.
[4]
ADI-MC 216.
Segundo Bulos (2007, p. 312): “Sensível é aquilo que pode ser captado pela intuição,
causando ao observador sensações externas. Com efeito, princípio constitucional
sensível é o que pode ser facilmente percebido pelos órgãos sensoriais, de modo claro,
evidente, translúcido, visível, manifesto, óbvio”.
[5]
Bulos (2007, p. 313): “O qualificativo ‘estabelecidos’: o qualificativo estabelecido
não é o mais apropriado para adjetivá-los, porque nada revela ou esclarece. Em última
análise, os princípios sensíveis e extensíveis também são estabelecidos, porquanto –
dispostos na Constituição federal – cumprem, em sentido amplo, idênticas tarefas. À luz
disso, preferimos denominar os princípios constitucionais estabelecidos princípios
constitucionais organizatórios, termo que evita maiores deturpações. Todavia, não
devemos abandonar, por completo, o seu uso, nada obstante a impropriedade da
qualificação que os doutores lhe atribuem, porque ele já se encontra consagrado entre os
publicistas, servindo para veicular a idéia nuclear que preside o assunto”.
[6]
[7]
STF, ADI-MC 1162
[8]
STF, ADC 12-MC.
[9]
STF, ADI 142.
[10]
ADI 793 / RO. Rel. Min. Carlos Velloso, 03.04.1997.
[11]
O art. 25, §2º estabelece que:
Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços
locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada à edição de medida provisória
para a sua regulamentação. (Redação da EC n. 05/1995)
Perceba, porém, que houve a vedação quanto à utilização de Medida Provisória para a
regulamentação de tal atividade.
Nesse julgamento o STF deixa claro que os Estados podem adotar Medida
Provisória, porque se o art. 25, §2º veda a adoção pelo Estado de Medida Provisória
para a regulamentação de gás canalizado é porque permite que tal instrumento seja
usado para outras situações.
[12]
ADI 2.391, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 16.08.2006, DJ de 16.03.2007.
No mesmo sentido: ADI 425, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 04.09.2002,
DJ de 19.12.2003.
[13]
Diferentemente do modelo federal em que o Procurador-Geral da República – chefe
do Ministério Público da União é escolhido pelo Presidente dentre integrantes da
carreira, sem qualquer lista, e deve ter seu nome aprovado pelo Senado Federal.
[14]
ADI 2581: Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta
estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da
carreira.
[15]
Cabe excetuar os incisos VI, VII e IX do art. 30, porque nesses incisos há
competências compartilhadas entre Municípios, Estados e União. Portanto, nesses
incisos não está vedado implicitamente a participação absoluta dos Estados na matéria.
[16]
ADI 978, Rel. p/ o ac. Min. Celso de Mello, julgamento em 19.10.1995, DJ de
24.11.1995.
[17]
[18]
Raul Machado Horta (2003, p. 69 a 72).
[19]
Raul Machado Horta (2003, p. 70).
[20]
Também conhecidas como normas de reprodução obrigatória.
[21]
Raul Machado Horta (2003, p. 73)
[22]
ADI 2076 / AC, Rel. Min. Carlos Velloso. Julg. 15.08.2002.
[23]
Raul Machado Horta (2003, p. 73)
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1. Limitações ao Poder Constituinte Derivado