ODEITE G. L. ALTMANN DE SOUZA CAMPOS
MARILA CUNHA DA SILVA
SANDRA REGINA DE ANDRADE
(UNESP)
ABSTRACT: In this paper we propose to study two tenses 0/ portuguese, the "preterito
perjeito "and the "preterito imperjeito", relating their use to parameters o/transitivity
(Hopper and Thompson, 1980) in order to see if and to what exrent the difference
between the two tenses is correlated with transitivity.
Key Words: Perfeito, Imperfeito, Parametros de transitividade, valor semfultico.
E comum, em nossa tradi~ao gramatical, analisar os tempos verbais em si,
simplesmente como elementos que remetem a fatos presentes, passados ou futuros,
considerados, de modo geral, como elementos absolutos, sem rel~ao com elementos do
enunciado e da enuncia~ao.
Assim 0 faz Tlaskal (1984: 250), cujo estudo acerca dos verbos portugueses
segue, em linhas gerais, 0 modelo de Comrie, apontando 0 valor central dos tempos e
sens respectivos valores perifericos.
Pretendemos, neste trabalho, mostrar que os conteudos centrais e perifericos,
como os defmem esses dois estudiosos, nao constituem expressoes independentes e
absolutas, mas se vinculam a elementos de natureza frasal e discursiva. Para alcan~ar
esse objetivo, decidimos seguir, na medida do possivel, 0 modelo funcionalista de
Hopper e Thompson (1980).
Estes ultimos estabelecem dez parametros que compoem a Transitividade,
nl1mero de participantes, "kinesis", aspecto, pontualidade, voli~ao, polaridade, modo,
agentividade, afetamento e individua~ao de O.
De acordo com esta proposta, a transitividade nao se mede por urn tra~o
l1nico, mas e constituida por uma serie de parametros, de modo que se pode estabelecer
uma gradi~ncia, desde 0 mais transitivo, que apresenta 0 maior nl1mero de propriedades
ate 0 que possui em propor~oes menares, sendo, portanto, classificado como menos
transitivo.
Pretendemos verificar ate que ponto 0 uso do perfeito e do imperfeito se ligam
a parametros de alta ou de baixa transitividade.
Hopper e Thompson propuseram uma vincul~1o entre alta transitividade e
primeiro plano do discurso e baixa transitividade e segundo plano, pois constataram que
propriedades sem!nticas e gramaticais relevantes para 0 primeiro plano tamMm sac
relevantes para a transitividade, evice-versa (Hopper e Thompson,1980,p.294).
Entre os parlmetros apontados pOl Hopper e Thompson, decidimos analisar,
no presente momento, 0 nUmero de argumentos, 0 valor semAntico do argumento 1
(AI), 0 maior ou menor afetamento do argurnento 2 (A2) e a maior ou menor
individua~ao do argumento 2 (A2) , que sao tra~os considerados como tfpicos para
caracterizar a transitividade, para verificar como estes se relacionam com 0 uso
do
preterito perfeito ou imperfeito da Hnguaportuguesa.
o corpus deste trabalho e constitufdo pOl seis inqueritos do Projeto NURC:
tr~s de SlloPaulo e tr~ do Rio de Janeiro, a saber: os de n° 234, 404 e 360 (NURC/SP)
e 355, 379 e 328 (NURCIRJ), compreendendo os tr~ tipos de inqueritos modalidades:
eloculrOes formais (EFs), diaIogos entre dois informantes (02) e dialogos entre
informante e documentador (Dills). De cada inquerito foi tomada uma amostra de
trinta minutos de gravalrao,perfazendo, portanto, urn total de cento e oitenta minutos.
NodeARG.
1
2
3
0
TOTAlS
PERFEITO
56% 143/254
75% 300/400
67% 16/24
75% 3/4
68% 464/684
IMPERFElTO
44% 111/254
25% 100/400
33% 8/24
25% 1/4
32% 220/684
-
TOTAlS
37,13% 254/684
58,77% 402/684
3,51%
24/684
0,58%
4/684
684
Consideramos predic~Oes com 1, 2, 3 e 0 argumentos. Dessas, as de 0
argumentos, construlroes com verbos impessoais e com expressoes de tempo, t!m
ocorrencia muito restrita no c6rpus, razao pela qual .nao e pertinente analisar a
maior/menor ocorrencia dos dois preteritos.
Observamos, atraves dos dados da Tabela 1, que 0 uso do preterito perfeito
predomina sobre 0 do imperfeito com 1, 2 e 3 argumentos, embora se note urna
diferenlra de proporlrOesem que este fato ocorre. Esta diferenlra se revela da seguinte
maneira: 0 predomfnio do perfeito e mais acentuado com 2 e 3 argumentos, diminuindo
seu uso a favor do imperfeito, nas situ~oes em que M urn Unico argumento.
Constatamos, portanto, haver urna relalrao entre 0 uso desses dois tempos verbais e a
presen~a de urn, dois ou tr~ argumentos, que, por sua vez, se liga a transitividade, pois
predica~l\es com um argumento se definem como de baixa transitividade e com dois ou
tres,
de
alta.
No que diz respeito a caracteriza~ao do argumento I, que, na proposta de
Hopper e Thompson, e definido como + - agentivo, optamos pela classifica~ao de
papeis temAticos de Chafe (1975), com algumas modifica~oes, tal como se encontra em
Borba et alii (1990). Dessa forma, identificam-se os seguintes tipos de argumento 1:
agente, causativo, paciente, experimentador, beneficiario, instrumento e inativo. 0 que
define cada um dos tipos e sua rela~ao sem1lntica com 0 even to ou a acao expressa pelo
verbo. Essa classifica~ao e mais ampla do que a de Hopper e Thompson , porque em
uma l1nica denomin~llo abrange 0 agentivo, a "kinesis" e a voli~ao
de Hopper e
Thompson.
TABELA2
VALOR SEMANTICO
VAL. SEM. Al
I
A
P
E
B
C
TOTAlS
PERFEITO
37%
72/194
77%
2311300
89%
56/63
81%
47/58
80%
8110
85%
17/20
4311645
67%
DO Al
IMPERFEITO
63%
122/194
23%
69/300
11% 7/63
19%
11158
20%
2110
15% 3/20
33%
214/645
TOTAlS
30,07%
194/645
46,51%
300/645
9,77%
63/645
8,99%
58/645
1,55%
10/645
3,10%
20/645
645
Os dados nos mostram aqui tambem que M liga~llo entre 0 valor semantico do
Ale 0 usa desses dois tempos verbais. De fato, emprega-se mais 0 perfeito com 0 Al
agente, paciente, experimentador, beneficiario e causativo, valores em que M certo
envolvimento entre 0 Al e a predica~ao, a que Dowty denominou de proto-agentes e,
por outro lado, 0 imperfeito, com 0 Al inativo, em que nao M ess~ envolvimento,
motivo pelo qual recebeu 0 nome de proto-paciente
( Dowty, 1991). Esse
relacionamento e previsto, de certo modo, pela hip6tese de transitividade de Hopper e
Thompson, que colocam 0 Al + agentivo entre os parftmetros de alta transitividade,
juntamente com 0 + perfectivo.
No que diz respeito ao relacionamento entre maior ou men or afetamento do A2
e 0 uso do preterito perfeito e imperfeito, exclufmos da anAlise os casos de
complemento adverbial, bem como os de complemento oracional, porque nesses dois
casos nao t possIvel medir 0 grau de afetamento do A2.
GRAUDE
AFETAMENTO
0
1
TOTAL
PERFEITO
70%
78%
73%
117/167
68187
185/254
IMPERFEITO
30%
22%
27%
50/167
19/87
69/254
TOTAlS
(i6%
34%
254
167/254
87/254
Atravts da Tabela 3, podemos constatar os seguintes fatos:
a- analisando 0 usa desses dois tempos verbais, sao mais freqiientes, no corpus
analisado, os casos de menor afetamento (66% );
b- tanto com maior como com menor afetamento predomina 0 usa do perfeito
(78% e 70% respectivamente);
c- embora nao se observe uma tendfulcia nftida de maior/menor uso do
prettrito perfeito condicionada pelo grau de afetamento, nas ocorrfulcias de men or
afetamento M urn aurnento de uso de formas de prettrito imperfeito, portm,
em
propor~oes pouco significativas (30%).
d- 0 fator grau de afetamento do A2 nao se mostrou, no c6rpus analisado,
como urn fator significativo para 0 usa desses dois tempos verbais em estudo.
GRAUDE
INDIVIDUACAo
0
1
TOTAL
PERFEITO
IMPERFEITO
TOTAlS
68%
82%
73%
32%
18%
27%
67%
33%
254
117/171
68/83
185/254
54/171
15/83
69/254
171/254
83/254
Observando a Tabela 4 verificamos que, analisando 0 use desses dois tempos
verbais, M predominllncia da menor individua~ao (67% : 171/254) sobre a maior (33%
: 83/254).
Considerando os dados de maior individua~ao em rel~ao ao use dos dois
tempos verbais, notamos que 0 percentual de forma:s de perfeito (82% : 68/83) e
consideravelmente mais elevado que de imperfeito (18% : 15/83).
Entretanto, essa diferen~a e menor quando comparamos a menor individu~ao
pois, no perfeito encontramos 68% : 117/171 e no imperfeito 32% : 54/171. A
diminui~ao da diferen~a da-se devido ao aumento de percentual de formas de
imperfeito com men or individua~ao .
Por meio destes dados numeric os podemos observar que:
1-) a maior individua~ao favorece nitidamente 0 uso de formas de perfeito;
2-) com rela~ao a menor individua~ao, a diminui~ao da diferenya de percentual
entre a freqiiencia de uso de formas de perfeito e de imperfeito
revela certo
favorecimento da menor individuayao para 0 imperfeito;
A relayao observada entre os tr~os maior individuayao e perfectivo e menor
individua~ao e imperfectivo confrrma a hip6tese de Hopper e Thompson, pois os dois
primeiros se ligam a alta transitividade e os dois Ultimos a baixa.
Pelas observa~oes acima, constatamos que 0 uso do preterito perfeito e do
imperfeito se explica pelo contexto em que estao inseridos. 0 preterite perfeito , com
seu valor semAntico nuclear de a~ao perfectiva, se usa preferencialmente, no c6rpus
analisado, com dois ou tres argumentos, com 0 Al proto-agente e com 0 A2 + afetado e
+ individuado, parAmetros estes de alta transitividade. Por outro lado, 0 imperfeito, com
seu valor imperfectivo, encontra-se no conjunto que compoe a baixa transitividade.
Nao e nossa inten~ao apresentar esta analise como uma maneira alternativa a
apresentada por Comrie, Tlaskal, nari e outros, que se baseiam nos valores centrais e
perifericos das formas verbais, apenas como uma sugestlio para melhor compreender 0
use desses dois tempos tao discutido na literatura lingilistica.
BORBA, F.S.(coord.) Diciondrio gramatical de verbos do portuguls
Editora da Universidade Estadual Paulista,1990,2'ed.
contemporlJneo
do Brasil, Siio Paulo,
HOPPER, P.J. and THOMPSON,s.A. Truuitivity in
(1910):251·299.
OrlllDllW
and Discourse
Language
vol:56.nOZ
n.ASKAL, J. 0bIerv~
,olre tempoa e modal em portugu8JIn: J.G. HERCULANO DE CARVALBa, e
J. SCHMIDT·RADBFBLD. (orl'.) &tIUlos de liltgilfstica porlUguua. Coimbn,Coimbra Editora, 1984.
r'f~n\fiAr~n\~.
~I:l
\;":;i'
j,;'
Jrt~ rj
b
';f~f
t
h.;'
l;·b:u'J(ii.
Download

ODEITE G. L. ALTMANN DE SOUZA CAMPOS MARILA