Sérgio Ricardo da Mata, Helena Miranda Mollo e Flávia Florentino Varella (orgs.). Anais do 3º.
Seminário Nacional de História da Historiografia: aprender com a história? Ouro Preto: Edufop,
2009. ISBN: 978-85-288-0061-6
A escrita da história das missões católicas no Oriente
Patricia Souza de Faria 1
A análise da produção historiográfica sobre a história da Companhia de Jesus
revela como a atividade missionária jesuítica no Oriente, nos Tempos Modernos,
consiste em um campo que merece mais estudos. Apesar da história das missões
católicas no Oriente ainda ser um campo de investigação que pode ser explorado com
mais intensidade, os jesuítas foram os missionários mais contemplados pela
historiografia das missões na Ásia, conforme a afirmação de uma das mais notórias
especialistas contemporâneas desta temática, Inêz Županov (2005).
Uma das razões para que exista o predomínio de estudos sobre os jesuítas no
Oriente – além da própria atividade efetiva da Companhia de Jesus, cujo primeiro
missionário, Francisco Xavier, aportou na Índia em 1542 – consiste na profusão de
fontes produzidas pelos próprios inacianos.
A produção de fontes sobre a ação jesuítica no Oriente e sua sistematização foi
uma iniciativa coetânea, acompanhou as primeiras investidas jesuíticas na Ásia. A
prática regular de produzir escritos sobre a atividade jesuítica favoreceu a construção de
uma memória singular sobre a Companhia de Jesus no Oriente, ao projetar os inacianos
como os mais ativos e dinâmicos missionários dos Tempos Modernos. O objetivo deste
artigo é apresentar os escritos jesuíticos produzidos nos séculos XVI e XVII que
trataram da história da Companhia de Jesus na Índia ou os textos que registraram uma
apropriação peculiar dos jesuítas a respeito dos costumes e das crenças dos povos
indianos que buscavam converter ao catolicismo. Mencionaremos apenas as crônicas
jesuíticas e os tratados sobre costumes e crenças que se referiram à atuação dos jesuítas
no Decão e na Costa do Malabar, em regiões localizadas na costa ocidental da Índia.
As missões jesuíticas no Oriente e a historiografia contemporânea
Além das crônicas jesuíticas e dos tratados produzidos por jesuítas nos séculos
XVI e XVII, a historiografia recente que contempla a atividade missionária jesuítica no
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Universidade Federal de Viçosa. Doutora em História (UFF).
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Oriente foi favorecida pela intensa compilação de fontes, de impressão de manuscritos
jesuíticos ocorrida no século XX.
Na passagem do século XIX para a primeira metade do século XX, os esforços
de compilação de documentos, publicados em coleções monumentais, tornaram-se uma
prática recorrente em ambientes eruditos laicos e religiosos. Cita-se como exemplo, o
esforço da Companhia de Jesus por ter investido maciçamente na impressão de
documentos sobre as missões no Oriente, mediante o esforço do padre Joseph Wicki, o
qual compilou os dezoito volumes da Documenta Indica (1948-1988), composta por
documentos jesuíticos do século XVI. A atividade do padre Wicki assemelha-se ao
empenho de Serafim Leite (1938-1950), jesuíta dedicado à história dos jesuítas no
Brasil. Cabe destacar os volumes de História da Companhia de Jesus na Assistência de
Portugal de Francisco Rodrigues (1931-1950).
Porém, a disponibilidade no século XX de fontes sobre a história da Companhia
de Jesus nos espaços missionários extra-europeus não serviu apenas para fins
apologéticos, pois historiadores vinculados à Companhia de Jesus e historiadores leigos,
acadêmicos, propiciaram o surgimento de estudos inovadores sobre os jesuítas na Ásia.
Faz-se necessário destacar as considerações gerais, mais inspiradoras, de Charles
Boxer, em obra sobre o império português (1977), onde mencionou a confluência de
motivações espirituais e materiais na expansão portuguesa, ainda que mereça ser
ponderada a sua afirmação sobre a associação “estreita” e “indissolúvel” entre o poder
eclesiástico e o civil, da Cruz e a Coroa. Boxer reiterou a sua assertiva a partir da
afirmação do jesuíta Antônio Vieira:
Se não houvesse mercadores que fossem procurar os tesouros da Terra no
Oriente e nas Índias Ocidentais, quem transportaria para lá os pregadores
que levam os tesouros celestes? Os pregadores levam o Evangelho e os
mercadores levam os pregadores.2
Boxer (1989) fez referências às missões jesuíticas no Oriente em A Igreja e a
expansão ibérica, onde apresentou um levantamento sobre os catecismos escritos em
línguas nativas, os tratados sobre costumes locais produzidos pelos jesuítas.
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Apud C. R. Boxer. O Império Colonial Português. Lisboa: Edições 70, 1977, p.87.
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Dauril Alden (1996) revela a importância de Boxer, Wicki, Serafim Leite em seu
trabalho, como é perceptível na dedicatória de sua obra, The Making of An Enterprise.
The Society of Jesus in Portugal, its Empire and beyond, 1540-1750. Alden demonstrou
a preocupação com a organização da Assistência Portuguesa, um amplo complexo de
unidades administrativas que geriam a atividade da Companhia de Jesus em Portugal e
em domínios coloniais, assim como atentou para aspectos econômicos associados à
atividade jesuítica – como os inacianos tiveram a sua atividade missionária financiada,
por exemplo.
Alden perscrutou a relação entre jesuítas e governantes, entre a Coroa
portuguesa e a Companhia de Jesus, o que evidencia como a historiografia recente
esquiva-se de uma postura apologética acerca da Companhia de Jesus, ainda que o uso
de fontes jesuíticas seja marcante. Todavia, o desafio da historiografia é não incorporar,
igualmente, uma visão anti-jesuítica ou reproduzir outro “mito historiográfico” que
tratava os jesuítas como conspiradores, concorrentes dos poderes estatais e coniventes
com as agruras cometidas pelos tribunais inquisitoriais – noção que se cristalizou nos
tempos da Ilustração. (FRANCO & TAVARES, 2007). No século seguinte, Antero de
Quental – o mais ilustre pensador da geração de 1870 – considerava que o genuíno
substrato da tradição portuguesa havia se esgotado no século XVI e, após esse período,
a Península registrou apenas decadência em virtude da expansão colonial (onde os
jesuítas obtiveram notoriedade) e das transformações da religiosidade posterior ao
Concílio de Trento – que associou à postura rígida dos inacianos e da Inquisição.
Porém, o enfoque deste artigo não consiste nos escritos anti-jesuíticos – que
exigiriam estudos à parte – mas nos trabalhos sobre as missões cristãs no Oriente, mas
cabe a menção ao estudo de Célia Cristina da Silva Tavares (2004) que contribui com a
historiografia das missões jesuíticas no Oriente ao mesmo tempo em que matiza a visão
a respeito da completa identificação de interesses entre Inquisição e jesuítas, ao estudar
a pluralidade de posições adotadas pelos membros da Companhia de Jesus que atuavam
em Goa.
Ângela Barreto Xavier (2003) analisou a ação missionária jesuítica como parte
de um processo mais amplo de conversão dos habitantes de Goa. Maria de Deus Bentes
Manso investigou a atividade dos inacianos em regiões como Cochim e Maduré.
Destaca-se a produção historiográfica de jesuítas nascidos no Oriente, como a vasta
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obra de Teotônio de Souza (1982) e os trabalhos disponíveis na edição do colóquio
intitulado A Companhia de Jesus e a Missionação no Oriente (2000).
Estudos recentes têm demonstrado a presença jesuítica em diversas regiões do
Oriente, os quais evidenciaram as estratégias de penetração dos inacianos em sociedades
tão peculiares, como a China Ming quinhentista, onde o jesuíta italiano, Matteo Ricci,
utilizou suas habilidades mnemônicas e ofertou presentes a fim de adquirir a simpatia
das elites chinesas e propagar o Evangelho, como aparece na narrativa de Jonathan
Spence (1986). Na corte do imperador mogol, Akbar, jesuítas submeteram-se a diálogos
que cotejaram o imaginário cristão com as crenças islâmicas e forneceram imagens
européias de Nossa Senhora e de Jesus Cristo que foram copiadas por artesões do norte
da Índia ao gosto da arte mogol, como atestou Gauvin Bailey (1999). Inês Županov
(1999) tratou das controvérsias a respeito dos métodos missionários adotados pelo
jesuíta Roberto de Nobili, que se trajava como um sacerdote indiano no sul da Índia e
escrevia diálogos na língua nativa para convencer os indianos sobre as verdades da fé
cristã.
Não pretendemos apresentar um levantamento exaustivo da produção
historiográfica recente sobre os jesuítas na Ásia, mas apontar a fecundidade dos estudos
contemporâneos sobre a temática.
Os jesuítas na Índia nos séculos XVI e XVII: história e memória
Apresentaremos uma síntese das crônicas jesuíticas que narraram a atividade da
Companhia de Jesus nas missões católicas no Oriente ocorridas na Era Moderna, que
proporcionou experiências históricas singulares, estimuladas pelos encontros e
confrontos entre os evangelizadores oriundos do Velho Mundo e os povos que
habitavam as terras asiáticas. Os esforços de tradução das culturas locais para o leitor
europeu e as primeiras tentativas de divulgação dos feitos perpetrados pelos
missionários no Oriente ocorreram desde as décadas iniciais da presença das ordens
religiosas na Ásia no contexto da expansão européia – e, sobretudo, ibérica – na região.
Os dois séculos iniciais da presença jesuítica no Oriente foram bastante
profícuos no que tange à escrita da história das missões jesuíticas e à elaboração de
tratados sobre as crenças e os costumes dos povos nativos.
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A produção de escritos sobre a própria Companhia de Jesus teria sido estimulada
desde os primórdios da existência da instituição. Inácio de Loyola e seus companheiros
reconheceram que a comunicação dos ideais e das metas da Companhia de Jesus não
ocorreria automaticamente, pois deveria seria ser amparada em uma base consistente e
contínua: estimulava-se a escrita dos reitores ao provincial e dos provinciais ao Geral da
Companhia de Jesus, até uma vez por semana; o Geral deveria responder pelo menos
uma vez ao mês aos provinciais, os quais se comunicariam por escrito com os reitores
com a mesma freqüência mencionada. Era estabelecido um ideal de comunicação
regular e freqüente, que propiciou a criação de uma massa documental considerável
sobre a ação jesuítica (O’MALLEY, 2004).
Marina Massimi (2002) analisou um corpo documental específico, a
correspondência epistolar jesuítica chamada Indipetae – que significa um pedido para o
envio às Índias, compreendida genericamente como todos os espaços das missões
ultramarinas. Estas cartas revelam um incendido “desejo das Índias”, foram redigidas
por religiosos que solicitavam ao padre geral da Companhia de Jesus o envio às terras
de missões e formam um conjunto de mais de quatorze mil cartas, escritas entre os
séculos XVI e XVII.
Alcir Pécora (1999) considera que as Indipetae seguem os modelos clássicos de
redação de epístolas, que remontam tanto a ars dictaminis medieval quanto aos moldes
renascentistas de escrita, com nuances de inspiração ciceroniana – de acordo com as
normas da oratio de Cícero. Estas correspondências são estruturadas, do ponto de vista
formal, em cinco partes: a salutatio (expressão de sentimento em relação ao
destinatário, que poderia ser a reverência, o respeito); a benevolentiae captatio
(ordenação das palavras para influir no sentido da recepção do conteúdo do texto); a
narratio (o tema da carta); a petitio (o pedido em questão) e a conclusio (com resumo
dos argumentos e o reforço da súplica).
Além da obrigatoriedade institucional de escrever cartas, estas eram reguladas
através de prescrições rígidas de acordo com o conteúdo ou os destinatários. Desde
1541, Inácio de Loyola instituiu a segunda carta, a hijuela, de circulação restrita, onde
os membros da Companhia de Jesus forneceriam informações administrativas e
institucionais, que seriam anexadas à carta principal. Existiam as cartas edificantes
(relações ou cartas ânuas), que ao contrário das hijuelas destinadas a assuntos internos,
prestavam-se à leitura pública nas sedes e casas jesuíticas e poderiam ser impressa.
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Diogo Ramada Curto (1998) apresentou uma síntese da produção de escritos
sobre as missões cristãs no Oriente. Destacou como os circuitos de comunicação e de
propaganda realizada pelos jesuítas estavam pautados na compilação de cartas e de sua
difusão através de cópias manuscritas e impressas, as quais davam origem a histórias da
Companhia de Jesus ou obras de cunho hagiográfico. Em 1589, foi publicada Le storie
delle Indie Orientali de autoria do jesuíta Giovanni Pietro Maffei – um ano após a
edição em latim.
As várias iniciativas editoriais dos jesuítas – com obras dos
portugueses João de Lucena, Manuel da Costa, Manuel Teixeira e dos italianos
Alessandro Valignano e Orazio Torsellini – favoreceram a mobilização dos processos
que conduziram à canonização do jesuíta São Francisco Xavier (o “Apóstolo das
Índias”) em 1622.
Em espanhol, foram publicados em Alcalá, em 1601, os dois
volumes de Historia de las Missiones que han hecho los religiosos de la Compañia de
Jesus [...] em la India Oriental, y em los Reynos de la China y Japon, de autoria de Luis
de Guzmán. Esta produção foi continuada em português por Fernão Guerreiro, que
compilou as relações anuais produzidas pelos jesuítas e teve cinco volumes impressos
entre 1603 e 1611.
A História dos religiosos da Companhia de Jesus, escrita por Sebastião
Gonçalves, tipifica a escrita da história das missões jesuíticas combinada com a
narrativa de cunho hagiográfico. Constata-se o caráter apologético, pois os cinco
primeiros capítulos de sua obra trataram da vida de São Francisco Xavier, o que a insere
no âmbito dos esforços de redação de biografias para promover a sua canonização. Esta
primeira geração de “historiadores” jesuítas narraram de forma otimista e confiante os
progressos da cristianização na Índia, destacaram as conquistas em detrimento dos
fracassos, além de conferir à Companhia de Jesus a hegemonia nas missões asiáticas. As
histórias narradas pelos jesuítas combinaram informação geográfica e etnográfica,
citações das “fontes” (cartas, bulas papais, documentos régios), apresentação de dados
cronológicos e biográficos relativos a cada missionário enviado à Índia (Županov,
1995).
Sebastião Gonçalves, um jesuíta português, escreveu para dois públicos leitores:
portugueses e romanos. São Francisco Xavier adquiriu poderes miraculosos na escrita
de Sebastião Gonçalves, o que agradava ao seu público romano, pois os seus superiores
de Roma convocavam o trabalho de historiadores na promoção do culto e da
canonização de Francisco Xavier. Como Sebastião Gonçalves poderia trazer
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contentamento ao público leitor português ao exaltar um missionário espanhol durante a
primeira metade do século XVII, isto é, após a anexação do reino de Portugal pela
Espanha? O jesuíta convergiu os interesses dos leitores de Portugal e de Roma ao
apresentar Francisco Xavier como responsável pela concretização dos projetos
portugueses na Ásia. Os poderes atribuídos a São Francisco Xavier – milagres,
clarividência, vaticínios – seriam utilizados para consolidar as aspirações espirituais e
políticas dos portugueses no Estado da Índia (ŽUPANOV, 1995).
A coleção de memórias biográficas favoreceu a produção social da santidade de
Francisco Xavier, iniciada no último quartel do século XVI, estimulada pelas
orientações tridentinas, que reiterou o culto a santos e relíquias (GUIMARÃES, 2007),
valorizou um modelo específico de “santo” da Contra-Reforma (HSIA, 1998). Após a
morte de Ignácio de Loyola (1556), o secretário da Companhia de Jesus, organizou
comemorações para celebrar a memória de Loyola. Em 1572, o Geral dos jesuítas,
Bórgia, encomendou a primeira biografia de Loyola, escrita pelo jesuíta Pedro de
Ribadeneyra. A propaganda em favor da canonização de Loyola e de Francisco Xavier
foi onerosa, gastou-se com impressão de biografias, pinturas, gravuras, mas em 12 de
março de 1622 os dois jesuítas foram canonizados.
Na obra sobre Francisco Xavier escrita pelo padre João de Lucena, o ano de
nascimento de Xavier coincide (de forma arranjada e equivocada) com a partida da
armada de Vasco da Gama em direção à Índia, com a associação do jesuíta de Navarra
ao empreendimento expansionista português, como se Deus tivesse o “predestinado para
levar o Evangelho, & semear a fé naquelas vastíssimas região” (apud GUIMARÃES,
2007).
No século XVII, relatórios e tratados de missionários foram produzidos a fim de
transportar a imaginação européia para o culturalmente “rústico”, esteticamente
“medonho” e “moralmente deficiente” mundo dos indianos (na concepção dos
missionários), em nome dos interesses científicos, da informação verdadeira e da
comparação etnográfica. Nesse período foram profusas as publicações de textos, às
vezes acompanhados de gravuras, sobre as crenças indianas. O jesuíta Manuel Barradas
escreveu o Tratado dos deuses gentílicos de todo o Oriente e dos ritos e cerimônias que
usam os Malabares (1618) que é uma adaptação do Livro da seita dos índios orientais
(1608) escrita por Jácome Fenício, incluindo também partes da História do Malavar de
Diogo Gonçalves, que dedicou três capítulos à descrição das crenças e práticas
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religiosas indianas (ŽUPANOV, 2005). O Tratado sobre o hinduísmo (1616) de
Gonçalo Fernandes Trancoso foi redigido no contexto missionário controverso em que
outro jesuíta, Roberto de Nobili,
optava pela conversão inicial das castas mais
valorizadas e autorizava o uso dos sinais indicativos da casta.
Em linhas gerais, as crônicas escritas pelos jesuítas favoreciam a
divulgação dos feitos da Companhia de Jesus no Oriente, os supostos êxitos da
evangelização de povos afastados da verdadeira fé. Apesar de se tratar de um outro
gênero de escrita, os tratados sobre as crenças e costumes dos povos indianos também
favoreceram uma construção peculiar da imagem da Companhia de Jesus, que tende a
permanecer mesmo na historiografia recente: a idéia de que os jesuítas foram os
missionários mais dinâmicos, mas inovadores e mais dedicados ao conhecimento da
cultura dos povos asiáticos (STRATHERN, 2004). Deste modo, a análise atenta destas
fontes jesuíticas do século XVI e XVII precisa ser feita, a fim de evitar que a imagem
produzida pelos inacianos sobre o desempenho da Companhia de Jesus não seja
reproduzida, sem cautela, nos estudos coetâneos.
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