revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais
outubro | novembro | dezembro 2011 | v. 81 — n. 4 — ano XXIX
As facetas do processo decisório e o
direito à saúde
Gabrielle Kölling
Mestranda em Direito Público (Unisinos). Pós-graduanda em
Direito Sanitário pela Unisinos, UniRoma3 (Itália) e Escola de
Saúde Pública do Rio Grande do Sul. Bacharela em Direito
pela Unisinos. Membro da Rede em Defesa da Saúde (Reds/
USP)
Guilherme Camargo Massaú
Doutor em Direito Público (Unisinos). Mestre em Ciências
Jurídico-Filosóficas (Universidade de Coimbra).
Resumo: O presente artigo pretende analisar o positivismo no contexto do seu surgimento,
com o intuito de estabelecer um panorama da situação desse modelo no Brasil, bem como a
não aceitação da superação do esquema sujeito-objeto e a invasão da linguagem na filosofia. A
pretensão consiste ainda em analisar, de modo empírico, uma decisão judicial e os seus efeitos
dentro desse contexto de crise do positivismo jurídico. Nessa decisão, o foco de observação
será o direito fundamental à saúde. Levar-se-ão em consideração aspectos atinentes à
fundamentação, à teoria da decisão, considerando as “peculiaridades” da interpretação e da
tomada de decisão.
Palavras-chave: Positivismo jurídico. Decisão. Fundamentação. Saúde.
1 Introdução
Sabe-se que o problema que circunda o Estado é justamente o fato de ser um Estado de
modernidade tardia (STRECK, 2002), que não consegue realizar as promessas da modernidade,
dentre as quais pode-se destacar a concretização dos direitos fundamentais. Assim,
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interessa-nos estabelecer uma reflexão acerca do direito à saúde tendo como paradigma a
análise de uma decisão de primeira instância que chegou ao Tribunal Regional Federal e, depois,
ao Supremo Tribunal Federal. Tais decisões demonstram, claramente, a crise do positivismo
jurídico. A pretensão desse artigo é traçar um panorama acerca do surgimento do positivismo,
trazendo assim, algumas considerações preliminares, a fim de estabelecer o contexto do seu
surgimento para embasar a sua compreensão e discussão.
Doutrina
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Num segundo momento, objetiva-se traçar um panorama da situação atual do Brasil no cenário
do positivismo jurídico, para então enfrentar a análise da decisão proposta, com base no
referencial teórico do professor Lenio Streck. Assumir esse referencial teórico, nesse momento,
implica abdicar de outros. Essa escolha justifica-se, dentre outras coisas, pela proximidade do
jurista com a realidade brasileira. Se a pretensão é analisar o cenário nacional sob a perspectiva
de uma crítica ao positivismo, nada mais “racional” do que escolher um autor que observa e
reflete sobre essa realidade com certa proximidade.
2 Considerações preliminares acerca do positivismo
A codificação teve uma grande contribuição na abordagem histórica do positivismo jurídico
na Alemanha. Assim, pode-se destacar, como sendo um marco relevante para o positivismo, o
movimento de codificação que foi marcante na França (século XIX), e se espalhou pelo mundo
jurídico até atingir a Alemanha. É por isso que esses aportes debruçar-se-ão sobre as origens do
positivismo na perspectiva alemã, até porque seria impossível abarcar outros aspectos históricos
do positivismo nesse ensaio.
No cenário desse ideário francês, destacam-se dois grandes nomes: Montesquieu (KAUFMANN,
2002. p. 116) e Rousseau (THONNARD, 1953. p. 707-719), que figuraram no rol das influências
político-sociojurídicas do pensamento revolucionário francês. Eles trataram de estabelecer
concepções de governo inclusivas da visão exsurgente na época em que potencializaram,
por meio da ideia de estado de natureza humana, a igualdade e a liberdade. Sobre essas
duas ideias, construíram as suas concepções, calcadas na racionalidade do agir humano ao
instituírem o seu estado civil. Sendo assim, em Montesquieu temos a figura do juiz como
boca da lei e, em Rousseau, como a vontade geral, que objetivavam manter a liberdade e a
igualdade de cada pessoa.
É nesse contexto intelectual que surge todo o alicerce de desenvolvimento da modernidade
e é aqui que se encaixam os requisitos, que de certo modo são favoráveis ao positivismo.
O Estado, como poder, acaba sendo o cerne do Direito; a sua função principal constitui
proteger a individualidade de cada um e resolver os conflitos. Assim, para o reconhecimento
desses valores subjetivos, o Estado precisou contornar a problemática da pluralidade de
valores para evitar a dissolução social e, desse modo, a lei deveria se apresentar como um
valor objetivo que transmitisse segurança. O modelo estatal sofreu modificações, mas a lei
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continua mantendo sua validade no poder soberano; o Estado é limitado pela Lei Magna ou
Fundamental, que vincula a validade e a legitimidade das normas inferiores e das ações
estatais (BARZOTTO, 2007. p. 13-16).
A validade da lei é dada pela sua origem e não pelo seu conteúdo, em função da sua objetividade
e segurança. Nota-se que não importa a sua qualidade de ser justa ou injusta, mas sim o seu
vínculo com o comando soberano, que é o que dá a sua validade. Ele estabelece, em última
análise, o próprio critério do positivismo; a validade não é a justiça, pois esta pode conter
incertezas oriundas da pluralidade dos subjetivismos, tampouco é a eficácia, já que essa gera
muita insegurança no surgimento do arbítrio. A doutrina só admite um único Direito, que é o
positivo. Ele se autodetermina, esquematiza-se, no tocante à produção normativa e mantém
uma certa autonomia, que pode ser traduzida pela própria validade. Dito de outro modo: a
norma positivista é considerada jurídica por pertencer ao ordenamento jurídico, visto que sua
origem advém do próprio processo produtivo do sistema positivo. Esse modo de fazer norma
positivista consegue provocar uma cisão entre moral (justiça) e política (eficácia), pois ele isola
o fenômeno jurídico (BARZOTTO, 2007. p. 17-20).
O positivismo foi assentado, em síntese, nessa nova concepção de homem que permeou as
ideias do pensamento revolucionário francês, ou seja, passou-se a buscar uma explicação
racional para os fenômenos. Nesse sentido, pode-se dizer que o positivismo destacou-se por
alguns aspectos, como o de ter um método legítimo, que é o das ciências naturais. De acordo
com esse modo de pensar, o conhecimento é fornecido pela ciência!
Com isso, combate-se a mentalidade metafísica dos idealistas e espiritualistas da realidade e
deposita-se confiança na ciência e na sua racionalidade (REALE, 2005, p. 297-298). Isso fica muito
claro quando Comte (positivista francês)1 dizia que o conhecimento científico deveria servir
para conhecer os fenômenos e, assim, prevê-los, para antever seus resultados e revertê-los em
benefício da humanidade.
Pode-se dizer que a filosofia positiva de Comte visa designar conhecimentos sistematizados,
científicos e universais, sendo científicas aquelas respostas que possam ser empiricamente
comprovadas, demonstradas. Dito de outro modo: só é possível conhecer os fenômenos sensíveis
com suas leis, e a hipótese serve para descobrir as leis, coordená-las, conciliá-las e unificá-las
organicamente (THONNARD, 1953, p. 725, 740-741; DEL VECCHIO, 1979, p. 217-220).
No entanto, interessa destacar outras influências relevantes de Comte no pensamento
ocidental: o progresso da humanidade pelo viés científico; a crítica à metafísica; a autonomia
da sociologia como ciência; o destaque da tradição; os fatos humanos e a ciência considerados
históricos; a unicidade do método (REALE, 2005, p. 305). Pode-se classificar o positivismo do
século XIX em três correntes diversas: a científica, a psicológica e a sociológica. No entanto,
1
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Esse autor funda a filosofia positivista, tendo na tarefa filosófica a coordenação dos fatos observáveis, no sentido de observar
todos os fenômenos invariavelmente submetidos às leis da natureza, com o objetivo de descobrir a lei que rege o fenômeno.
Assim o positivismo faz do Direito uma manifestação social e um objeto de explicação causal. (COMTE, 1990, p. 11.)
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essas correntes não serão objeto do presente estudo. Tais correntes identificam-se de acordo
com as concepções dos pensadores. Logo, o positivismo não se restringe, tão somente, aos
franceses, pois na Inglaterra, em meados do século XIX, surge o utilitarismo baseado nas teses
dos iluministas (REALE, 2005, p. 309-310). O empirismo insere as primeiras manifestações do
positivismo social na Inglaterra (REALE, 2005, p. 310-332).
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O positivismo jurídico, embora em crise latente, consiste, conceitualmente ainda, em uma
teoria relevante ao estudo do Direito e sua filosofia. Mesmo com todas as consequências
advindas da Segunda Guerra Mundial (SALDANHA, 1998, p. 182), o positivismo permanece no
centro de muitas discussões, especialmente, quando é defrontado com uma pressuposta noção
de direito natural, que reduz a validade à justiça. Em outra perspectiva encontra-se o realismo
que vincula a validade à eficácia. Na busca de uma via entre o direito natural e o positivo, esse
último, com suas inúmeras variantes, encontra-se fortemente atuante no seio do pensamento
jurídico, principalmente como direito vigente ordenador de uma realidade social (SALDANHA,
1998, p. 178) e ainda como linha orientadora para novas ideias que buscam manter distinções
entre justiça, validade e eficácia (REALE, 2005, p. 909).
Essas correntes revelam a riqueza de pensamento produzida pela concepção geral positivista,
além de denunciar a impossibilidade de reduzir o positivismo jurídico a uma única forma de
manifestação; todavia, há que se destacar que a opção desse breve resgate é dar ênfase para
o positivismo e suas origens na Alemanha.
Na Alemanha, o movimento precursor do aflorar jurídico positivo foi a denominada Escola
Histórica do Direito (surge no fim do século XVIII e no começo do século XIX). Porém,
ela não se confunde com o positivismo jurídico, apenas prepara a estrutura teórica para
o aporte definitivo do positivismo. Ela não nasce do vazio crítico, ao contrário, a crítica
contra a filosofia jusnaturalista assumiu fortes contornos corrosivos a ponto de estabelecer
controvérsias antirracionalistas, com a finalidade de enfraquecer o aspecto de “sacralidade”
do Direito natural. Essa atitude foi oriunda do historicismo da primeira parte do século XIX,
sob as influências do romantismo. A virada teórica é radical (ou seja, percebeu-se que só o
direito natural já não dava mais conta, era preciso o direito positivo) quando ele considera
o direito natural como filosofia do positivo e quando ele elabora conceitos jurídicos gerais
calcados no direito positivo, possíveis de serem encontrados em qualquer Estado, pois para
ele o direito positivo possui sua origem no ente estatal (BOBBIO, 1995. p. 45-46).
O historicismo concentra-se na individualidade do Homem e em tudo produzido por ele;
isso implica considerar o Homem em concreto, distinguindo-o da forma abstrata visualizada
pelo racionalismo. Portanto, o historicismo, inegavelmente, tem características próprias. As
variações da História e do Homem fornecem o matiz das diversas modificações ocorridas no
tempo, além de pôr em evidência a variabilidade do ser humano em relação aos seus diversos
aspectos (nacionalidades, etnias…).
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A Escola Histórica do Direito (do expoente Savigny) pode ser compreendida por meio dos
aspectos gerais do historicismo; assim, o Direito é produto da História, por isso, não existe um
único Direito no espaço e no tempo. O Direito é originado pelo sentimento do justo e do injusto,
pertencentes a cada indivíduo, expressos em formas jurídicas populares, sob o artificial Direito
criado pelo Estado moderno. Além do mais, a descrença antropológica impinge a desconfiança
em novas instituições jurídicas, na crença de estabelecerem inovações nocivas; por conseguinte,
as instituições consolidadas pela História são as melhores. Outro ponto característico, o apego
ao passado, foi uma tentativa de resgatar antigos direitos como o romano e o germânico. Em
face da tradição, os costumes são considerados a expressão da tradição, por consequência,
eles significam a expressão do Volksgeist. São formados e consolidados lentamente, assim se
transformando em fonte do Direito. Portanto, o caráter precursor do positivismo está localizado,
apenas, na crítica ao direito natural (BOBBIO, 1995, p. 51-53 e MONCADA, 2006, p. 402).
O positivismo assume relevância diante do fato histórico da codificação (entre os séculos XVIII
e XIX), quando o legislador se apresenta onipotente. Esse fato é oriundo de um movimento
político-cultural expresso na positivação do Direito Natural. Nesse sentido, ao mesmo tempo,
agem a autoridade e a razão ao estruturar o Direito. Está-se diante da autoridade que torna o
Direito eficaz, e da razão que evita a arbitrariedade do Estado. Naturalmente, os iluministas
contra-atacaram os historicistas, a fim de desprestigiar os seus postulados; logo, o direito
consuetudinário foi alvo de inúmeros ataques, sendo considerado expressão da irracional
tradição. O direito consuetudinário, com seu acúmulo de normas, na visão iluminista, precisava
ser transformado em um conjunto sistemático de normas jurídicas (Código). O Código deve
ser posto pelo Estado, baseado no esforço de racionalização das regras transformadas em leis.
Aqui existe duplo apelo: para a razão e para a autoridade do Estado. A razão iluminista deve
“descobrir” o Direito natural-universal e o Código, fruto dessa razão, seria o Direito imutável e
absoluto. Na invasão da Alemanha pela França revolucionária difundiu-se o Código de Napoleão,
provocando um impacto considerável num território ainda semifeudal, a ponto de estimular a
criação de único e codificado Direito para toda a Alemanha, pois esse território era assolado
pela diversidade e fracionamento da prática jurídica (BOBBIO, 1995, p. 53-56).
Quando se fala de positivismo, é impossível não se falar do Círculo de Viena. A Universidade
de Viena, no período entre as duas grandes guerras, constituiu o centro mais importante da
filosofia científica e, por isso, o método científico acabou por ser destacado. Foi justamente
nesse cenário que se uniram um grupo de filósofos e cientistas de atitude antimetafísica,
concentrados na análise da linguagem, da estrutura e do método das ciências naturais, sem
desprezar a matemática. O ambiente vienense era propício na metade do século XIX, em
decorrência da predominância do liberalismo conjuntamente com seu aporte de concepções
oriundas do iluminismo, do empirismo e do utilitarismo. O principal aspecto dessa filosofia era
a verificação, pois somente se atribuía sentido às proposições verificáveis empiricamente, por
meio dos fatos da experiência. Em consequência desse princípio pode-se afirmar a incongruência
de proposições metafísicas e teológicas. Diante disso, a produção intelectual (o pensamento)
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desse grupo foi denominada de positivismo lógico ou neopositivismo (REALE, 2005, p. 990-995;
REALE, 1998, p. 153; KAUFMANN, 2002, p. 178).
Porém, as condições ideais para o desenvolvimento neopositivista deram-se por meio da
conservação dos quadros mentais da escolástica, sob os auspícios da grande influência da
Igreja Católica. Com isso, o pensamento escolástico estruturou as bases do pensamento lógico
e manteve afastado o idealismo das universidades alemãs. O Wiener Kreis (1922) surge em um
café da “velha” Viena, nas noites de sextas-feiras. Nessa ocasião, um grupo de doutores em
filosofia, mas estudantes de outras áreas (física, matemática, ciências sociais…) reuniam-se
para discutir sobre a filosofia da ciência, tendo como base o positivismo de Ernst Mach. Mas só
em 1924 inicia-se, de fato, o Kreis, com a formação de um grande grupo de discussão, também
às sextas-feiras à noite. A partir de então, os colóquios contaram com inúmeros nomes de
diversas áreas do conhecimento (REALE, 2005, p. 990-995).
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O fim do Wiener Kreis ocorreu com a chegada de Hitler ao poder. Esse fato provocou a emigração
de alguns membros para os Estados Unidos da América. Por conseguinte, o pensamento
vienense misturou-se com as correntes filosóficas norte-americanas (empírico-pragmáticas).
A fusão desses dois horizontes abriu a perspectiva em direção à semântica pragmática, além
de outras consequências como as introduzidas por Wittgenstein, com os jogos-de-linguagem;
por Popper, com a desmistificação da linguagem não-científica, etc. (REALE, 2005, p. 990-995;
KAUFMANN, 2002, p. 178).
3 O exemplo privilegiado do direito à saúde e o Poder Judiciário
Sabe-se que o modelo de direito sustentado em regras está superado. O discurso exegéticopositivista representa um retrocesso, pois de um lado, continua a sustentar discursos objetivistas
identificando o texto e o seu sentido, e de outro lado, busca nas diversas teorias subjetivistas
uma axiologia que dê conta de submeter o texto à subjetividade assujeitadora do intérprete
(esquema sujeito-objeto), transformando o processo interpretativo num processo de mera
subsunção dualística do fato à norma, como se fato e direito fossem coisas cindíveis entre si e
os textos fossem meros enunciados linguísticos (STRECK, 2009. p. 337).
Está-se, de fato, diante de uma efetiva tensão que contempla o binômio texto/sentido. O
resultado disso são as duas possibilidades de caminho que a hermenêutica tem: uma teoria
geral da interpretação ou reconhecer a cisão entre o ato do conhecimento do sentido de
um texto e a sua aplicação a um determinado caso concreto que não são de fato separados.
Ou seja, ou colocamos o problema hermenêutico no viés da subjetividade do intérprete ou
no viés da objetividade do texto. Entretanto, isso nos remete ao velho esquema sujeitoobjeto. Estamos diante da impossibilidade da referida cisão, diz Streck, pois essa implica
a impossibilidade de o intérprete retirar do texto algo que o texto possui em si mesmo
(STRECK, 2008, p. 98-99).
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É interessante destacar que tivemos uma mudança no campo filosófico, pois a filosofia da
linguagem invadiu-o e isso ocasionou um novo modo de ver o mundo. Esse foi um passo para a
superação da metafísica, cujo paradigma estava assentado na ideia de que os sentidos estavam
nas coisas e na metafísica moderna; o sentido estava na mente. Essa invasão da filosofia da
linguagem rompe com isso (STRECK, 2009, p. 331). Entretanto, na aplicabilidade do direito, em
inúmeras decisões judiciais, nota-se que o decididor ainda está preso ao paradigma metafísico,
pois o sentido dado à norma é calcado na coisa em si ou na mente. Eis o caos.
Isso que aqui chamo de caos, pode ser relacionado com a decisão analisada neste artigo,
decisão essa que não foi efetivamente fundamentada. O problema da fundamentação,
segundo leciona Streck (2009, p. 331e 333), é o problema do início do século XX. Dentro desse
panorama de mudança e “invasão” (linguistc turn), é necessário pensarmos que o direito
não está imune às transformações ocorridas na filosofia. Se o método colocava a linguagem
num plano secundário (uma terceira coisa entre o sujeito e o objeto) (STRECK, 2009, p. 371),
manipulável pelo sujeito solipsista, a intersubjetividade que se instaura com o giro linguístico
exige, no interior da própria linguagem, um controle hermenêutico, ou seja, levar-se o texto
a sério (STRECK, 2010. p. 17). O grande drama do direito é não levar o texto a sério e não
superar o esquema sujeito-objeto.
O grande problema, que parece não ter sido observado pelos juristas brasileiros integrantes
da patuleia jurídica nacional, é que não cabe ao intérprete escolher o sentido que melhor lhe
convier diante da regra jurídica usada no caso concreto. A interpretação não é nem pode ser
resultado de convencionalismos ou de escolhas majoritárias. Em última análise: o sentido não
está na coisa em si, tampouco na “consciência em si do pensamento pensante”. A produção do
sentido se dá de modo intersubjetivo, que se dá pela linguagem, que rompe com o esquema
sujeito-objeto. Assim, não há espaço para a arbitrariedade (STRECK, 2006, p. 203).
Resta, como condição, o avanço para os juristas compreenderem a Constituição como Constituição
efetivamente. Mas caso não haja isso, teremos aquilo que Streck (2006, p. 208- 209) chama de
baixa compreensão, que implica a baixa aplicação dela no Estado Democrático de Direito, o que
gera um expressivo prejuízo na concretização dos direitos fundamentais. Isso é bem claro na
decisão analisada neste artigo, uma vez que não foi compreendido o sentido do direito à saúde
na Constituição, de modo que foi somente compreendido o “sentido do inexistente”: o sentido
do “interesse” em detrimento do direito.
Hodiernamente, pode-se dizer que a tendência brasileira é, conforme bem leciona o
professor Lenio Streck, o protagonismo judicial como sendo o “super homem” concretizador
de direitos. Isso advém de uma leitura errada da denominada “Jurisprudência dos Valores”.2
O autor adverte-nos, ainda, sobre a relação dos ativismos judiciais, a consagração da efetiva
jurisdição constitucional e a relação disso com os avanços da democracia, que ficam adstritos
2
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Vale dizer que sobre a Jurisprudência de Valores o fundamental é que ela foi recepcionada pelos juristas brasileiros de modo
errôneo, pois o seu contexto de surgimento é totalmente distinto do contexto brasileiro. Para maiores esclarecimentos, consultar:
STRECK, Lenio Luiz. O que é isto — decido conforme minha consciência? Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 20-21.
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às posições individuais das cortes (STRECK, 2010, p. 23). No caso brasileiro, isso é bem claro,
especialmente no Supremo Tribunal Federal quando esse aprecia questões atinentes à saúde,
como se verá à frente.
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A ideia de Estado Democrático de Direito está fortemente ligada à realização dos direitos
fundamentais, o que é um “plus normativo” ao próprio Estado Democrático de Direito. Esse
Estado possibilita, por meio da síntese dos modelos anteriores que ele representa, resgatar,
de certo modo, as promessas da modernidade. Atrelado a essa noção de Estado, temos a
Constituição, que apresenta um “ideal” de mudança no status quo da sociedade. Assim, no
Estado Democrático de Direito, a lei (Constituição) passa a ser uma forma privilegiada de
instrumentalizar a ação do Estado na busca do desiderato apontado pelo texto constitucional
(STRECK, 2010, p. 37). O caso dos direitos fundamentais, em especial a saúde, parece ser um
exemplo concreto disso.
No minúsculo município de Giruá, no interior do estado do Rio Grande do Sul, temos uma das
decisões mais complexas no sentido do retrocesso do SUS; é o caso do “pagar a diferença”. O
caso trata, pois, de uma ação ajuizada pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio
Grande do Sul em desfavor do Município de Giruá. O Conselho de Medicina ajuizou uma ação
civil pública com o objetivo de discutir a necessidade de triagem dos pacientes internados pelo
SUS e a possibilidade de que sejam assistidos, nas internações, por médicos de sua livre escolha.
O relator da apelação no Tribunal Regional Federal da 4ª Região foi o Des. Carlos Eduardo
Thompson Flores Lenz, que fez o seu relatório do caso apenas copiando, literalmente, o parecer
do Ministério Público Federal. Como se isso não bastasse, no voto repetiu-se a situação, só o
que mudou foi a página da cópia do parecer do Ministério Público Federal. O voto divergente
foi vencido. Eis o “conteúdo” do voto (ou melhor, o “não conteúdo” do voto):
NO MÉRITO
Divirjo do ilustre Relator levada pela certeza de que estamos aqui justamente
procurando fazer cumprir o que está escrito na Constituição. E o Judiciário
tem de procurar interpretá-la buscando aquilo que o espírito do constituinte
idealizou.
Sabemos que Constituição Federal contém regras que não estão sendo cumpridas
pelo Estado. O sistema de saúde no Brasil é uma vergonha, pessoas morrem
aguardando a data para fazer um exame. É certo que há os planos de saúde,
que proporcionam atendimento mais rápido, só que, pela atual conjuntura
econômica do País, verificamos que a grande maioria da população não tem
hoje condições de pagar um plano de saúde nos moldes em que estão sendo
oferecidos.
De um lado, temos a realidade econômica do País, que leva as pessoas a fugir
de um plano de saúde porque não têm condições financeiras. De outro lado, o
sistema público, que é caótico e tem sérias dificuldades, porque a massa da
população é muito grande, e o empobrecimento está aumentando de tal forma
que tem sobrecarregado a Previdência Social.
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Os médicos têm feito milagres para poder atender. Então, a bem de garantir
aquilo que a Constituição assegura, que é a saúde como um direito de todos, se
pudermos, devemos minorar as consequências do descaso do Poder Público com
a saúde pública e evitar até que médicos respondam, quando, na realidade, não
lhe deram condições para prestar atendimento.
Não vejo a quebra de isonomia pelo fato de a pessoa que tem um pouco mais
de condições ter a possibilidade de pagar pela acomodação separada e pela
assistência de seu médico.
Conclui-se, portanto, que o Conselho Regional de Medicina está procurando não
só estabelecer uma sistemática que permita um atendimento para quem não
tem um plano de saúde, como também para quem não pode esperar por um
atendimento que irá demorar.
Ressalto que o Governo não terá prejuízo algum com adoção da modalidade
“diferença de classe”, pelo contrário, cobrando por esse serviço, os hospitais
conseguirão arrecadar algum valor.
Com relação à obrigatoriedade de prévia triagem nos postos de saúde, entendo
ser uma sistemática cruel, porque faz com que as pessoas tenham que percorrer
uma “via-sacra” até chegar ao atendimento, e a saúde não pode esperar. Nesse
contexto, entendo que as medidas paliativas que não atentem contra a própria
instituição da saúde pública devem ser adotadas.
Por esses fundamentos, deve ser reformada a sentença, para que seja reconhecido
o direito dos pacientes e dos médicos à internação hospitalar na modalidade
“diferença de classe”, permitindo o pagamento pelo uso de acomodações e de
serviços não custeados pelo SUS, bem como para que o município se abstenha
de exigir que a internação se dê somente após exame do paciente em posto de
saúde, e se abstenha de impedir a assistência pelo médico do paciente.
Em face do exposto, dou provimento à apelação e nego provimento à
remessa oficial.
É o voto. Des. Federal Silvia Goraieb (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª
Região. Apelação cível n. 2003.71.05.005440-0).
A desembargadora do Tribunal Regional Federal sustentou o seu voto em argumentos que de
fato não se apresentam como tais, na medida em que se preocupou com a realidade econômica
do país e de outro lado estava tentando, quase que num processo de adivinhação, alcançar
o espírito do constituinte. O princípio da isonomia foi terminantemente ignorado, pois se
tem um sistema de saúde com a pretensão de universalidade. Entretanto, se admitirmos o
“pagar a diferença”, estamos rompendo com a universalidade insculpida na criação desse
sistema de saúde. De fato, a Constituição não foi observada em tal fundamentação, isso
sequer foi concretizado.
O espetáculo da temeridade não para aqui. Como se não bastasse, alude, ainda, que o Governo
não terá prejuízo algum com a adoção da modalidade “diferença de classe”, pelo contrário,
cobrando por esse serviço, os hospitais conseguirão arrecadar algum valor. Ou seja, a lógica
do direito é invertida. A preocupação não é com a concretização de direitos fundamentais em
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países de modernidade tardia, mas é sim o ganho do governo, a privatização do público. A
fundamentação jurídica, nesse caso, perde espaço para qualquer outra racionalidade, menos
a jurídica. Nessa situação, pode-se até dizer que o direito não está operando mais com o seu
código; está-se à beira da corrupção do sistema.
Doutrina
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Após a apreciação da apelação, o Juiz Federal Substituto Laudemiro Dors Filho (BRASIL.
Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Execução de sentença contra Fazenda Pública n.
2003.71.05.005440-0/RS), no dia 13 de maio de 2010, intimou o município de Giruá para que:
[...] permita o acesso do paciente à internação pelo SUS e o pagamento da
chamada diferença de classe, para obter melhores acomodações, pagando a
quantia respectiva, quer ao hospital, quer ao médico;
abstenha-se de exigir que a internação só se dê após exame do paciente em
posto de saúde (outro médico que não o atendeu), e de impedir a assistência
pelo médico do paciente, impondo-lhe outro profissional.
Tal decisão refere-se ao “pagar a diferença”, mas não é uma demanda isolada, é apenas uma
decisão dentro do Poder Judiciário, o Supremo ainda está analisando tais demandas. Vale dizer
que se está diante de uma verdadeira “enxurrada” de litígios como esse. O trecho da decisão
supracitada refere-se à apelação cível n. 2003.71.05.005440-0, que tramitou no Tribunal
Regional Federal da 4ª Região, onde o Cremers (Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do
Sul) pleiteou o pagamento da diferença de classe dentro do Sistema Único de Saúde; o apelado
foi o Município de Giruá. Há que se destacar que o Supremo ainda está julgando inúmeras
demandas dessa natureza.
Qualquer pessoa, jurista ou não, que leia a decisão e que tenha uma pré-compreensão
constitucional, visualiza que a decisão não tem fundamentação constitucional, apesar de
tocar (no plano extremamente prático) num ponto relevantíssimo: o direito à saúde e o
sistema único de saúde.
É interessante observar que num dos votos do acórdão (decisão que “analisou” o recurso de
apelação), o desembargador cita, na fundamentação do seu voto, um trecho do parecer do
Ministério Público Federal acerca do tema:
VOTO
Em seu parecer, a fls. 237-240, anotou o douto MPF, verbis:
[...] A pretensão (i) supostamente atende aos interesses dos usuários do SUS,
dos prestadores de serviços de saúde e dos profissionais médicos. Os pacientes
podem ter interesse em obter internação em acomodações privativas ou
semi-privativas, mesmo que tenham que pagar por isso [...] (BRASIL. Tribunal
Regional Federal da 4ª Região. Apelação cível n. 2003.71.05.005440-0).
Veja-se o quão interessante é a fundamentação, atente-se para o destacado na decisão: “Os
pacientes podem ter interesse”. Quando um magistrado fundamenta uma decisão dizendo que
os pacientes podem ter interesse, ele está, na verdade, dizendo aquilo que ele (intérprete)
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quer que efetivamente seja. Essa é uma das críticas preliminares que Streck (2010, p. 25)
faz. O direito, por assim dizer, não é aquilo que o Tribunal arbitrariamente, sem critério
algum, diz que é. Se assim fosse, fica a indagação feita por Streck: o que faríamos com a
Constituição? Com as leis das leis?
Nota-se que interesse (a que não faz alusão alguma na Constituição), nessa perspectiva, recebe
o status de direito. Não há a necessidade de ser operador do sistema jurídico para saber que
interesse é algo distinto de direito. Ora, interesse pode ser quase tudo, menos direito! A
Constituição alude ao direito à saúde, e não ao interesse pessoal de cada um. Se a lógica do
interesse vai permear o sistema, então o fim está próximo, pois essa lógica liberal do interesse
aniquila o caráter universalista do sistema único de saúde, visto que só quem poderá pagar é
que terá um serviço mais digno. Acaba, também, com o aspecto igualitário do sistema de saúde,
pois será uma luta de classes: quem pode pagar vs. quem não pode pagar. Esse tipo de situação
aniquila por completo a saúde pública.
Há de se destacar que esse tipo de decisão corrobora a ideia de que se o serviço público é
ineficiente ou pouco digno, o cidadão deve pagar para receber um atendimento adequado, mas
o serviço prestado não deveria ser no mínimo digno? Então, se o Estado não pode prestar tal
serviço de modo digno está tudo bem, pois quem pode pagar paga e está tudo resolvido? É, parece
que a resposta para isso, mediante tal decisão, é, no mínimo, insatisfatória e preocupante.
O que causa maior preocupação ainda é que essa não é uma decisão única. Que o Supremo
Tribunal Federal tem decidido inúmeros recursos extraordinários com esse tema, oriundos de
diferentes Estados da Federação é de simples constatação: basta acessar o site do Supremo.
Frente a essas várias decisões, cumpre salientar uma delas, que por acaso foi usada na decisão
supracitada como um pretenso fundamento, pois foi o decidido por quem diz o que é o direito
em última análise, ou seja, o Supremo Tribunal Federal:
DIREITO À SAÚDE. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ACÓRDÃO RECORRIDO
QUE PERMITIU A INTERNAÇÃO HOSPITALAR NA MODALIDADE “DIFERENÇA DE
CLASSE”, EM RAZÃO DAS CONDIÇÕES PESSOAIS DO DOENTE, QUE NECESSITAVA
DE QUARTO PRIVATIVO. PAGAMENTO POR ELE DA DIFERENÇA DE CUSTO DOS
SERVIÇOS. RESOLUÇÃO N. 283/91 DO EXTINTO INAMPS.
O art. 196 da Constituição Federal estabelece como dever do Estado a prestação
de assistência à saúde e garante o acesso universal e igualitário do cidadão
aos serviços e ações para sua promoção, proteção e recuperação. O direito à
saúde, como está assegurado na Carta, não deve sofrer embaraços impostos por
autoridades administrativas, no sentido de reduzi-lo ou de dificultar o acesso a
ele. O acórdão recorrido, ao afastar a limitação da citada Resolução n. 283/91
do INAMPS, que veda a complementaridade a qualquer título, atentou para o
objetivo maior do próprio Estado, ou seja, o de assistência à saúde. Refoge
ao âmbito do apelo excepcional o exame da legalidade da citada resolução.
Inocorrência de quebra da isonomia: não se estabeleceu tratamento desigual
entre pessoas numa mesma situação, mas apenas facultou-se atendimento
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diferenciado em situação diferenciada, sem ampliar direito previsto na Carta e
sem nenhum ônus extra para o sistema público. Recurso não conhecido (BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 226.835/RS).
Doutrina
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Se o Supremo (nossa corte máxima, que diz o que é o direito em última análise) está decidindo
assim, então a tendência é a aniquilação e o enfraquecimento do sistema de saúde! Esse tipo de
decisão mostra a privatização do público. É um retrocesso, pois se, no período pré-constituinte,
lutou-se para reverter esse quadro de privatização, hoje, mais de vinte anos depois, vive-se o
inverso, nota-se o paradoxo: no passado lutamos contra a privatização e atualmente estamos
“privilegiando” a privatização. Esse tipo de decisão possui efeito inter partes (ou seja, atinge
tão somente os envolvidos na demanda). Todavia, essa decisão, bem como as demais, serão
utilizadas nas demandas de 1º grau como precedentes, ou seja, como jurisprudência e isso
servirá de base para outros litígios, ou seja, atinge-se o efeito erga omnes, pela via indireta.
Além de ser uma decisão extremamente
de se destacar que essa situação vivida,
negativo) nos faz perceber o quão frágil
democráticos, pois o nosso Congresso e
manifestaram em relação a essa decisão.
questionável, do ponto de vista técnico-jurídico, há
que ousamos chamar de um novo paradigma (muito
é a nossa democracia, bem como os nossos espaços
os nossos agentes políticos, de modo geral, não se
Se não conseguimos concretizar direitos mínimos, fundamentais, se não conseguimos concretizar
espaços democráticos para um debate que é público, então a nossa democracia está mais frágil
do que se pensa, e a nossa cidadania também.
Nesse sentido, são oportunas as observações a respeito da relação entre direito, direito à saúde
e cidadania de Costa (2008, p. 33):
[...] o direito à saúde é um direito intimamente vinculadao à solidariedade
estatal, e, para além do vínculo, um direito profundamente ligado à cidadania.
Cada indivíduo, vivendo no território de um Estado, é cidadão deste Estado
e tem direito à saúde. Esta concepção do direito à saúde é consequência da
evolução do próprio conceito de direito, pois como o direito de votar ou ser
eleito, o direito à saúde foi progressivamente estendido para toda a sociedade
civil, produzindo todos os efeitos vinculados à cidadania.
Parece-nos oportuno dizer que se concretizar o direito à saúde é dar concretude, também, à
cidadania. Se o direito à saúde foi progressivamente estendido a toda a sociedade, então seria
um retrocesso segregar aqueles que podem pagar daqueles que não podem, no que tange ao
acesso do sistema único de saúde, na perpectiva de um serviço eficiente e digno.
É inegável que a crise que permeia a hermenêutica jurídica tem fortes contornos de uma
discussão de fundamentação, que é, em última análise, a marca da crise do conhecimento
que se sobressai no século XX (STRECK, 2008, p. 98). Esse problema de fundamentação ainda é
presente hodiernamente e nada melhor do que as decisões dos tribunais para tornar ainda mais
palpável tal problema.
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A fundamentação da decisão é deficiente, está calcada na pretensa inexistência de ofensa
à isonomia, ou seja, fundamentação zero na decisão. Não há um enfrentamento do direito
à saúde e da igualdade na decisão. Conforme adverte Streck (2006, p. 282-283), além de a
decisão ser fundamentada, ela deve ser, antes de mais nada, justificada, ou seja, explicitar
o que serviu de fundamento para a tomada de decisão. Trata-se, pois, de fundamentar a
fundamentação. É a justificação da decisão. Essa é uma exigência que se tem, já que temos
uma Constituição que contempla promessas de uma vida boa, de uma sociedade solidária, ou
seja, uma Carta que contempla todas aquelas promessas da modernidade. Isso demanda que o
juiz (intérprete) não possa impor conteúdos de natureza moral, atemporal e a-histórica na sua
atividade de intérprete. O art. 93 de Constituição, inciso IX, que exige a fundamentação das
decisões, é uma das consequências do constitucionalismo do século XX e da invasão da filosofia
pela linguagem, que contribuem para o desmoronamento do esquema sujeito-objeto. Sendo
assim, a fundamentação das decisões passa a ser um direito fundamental do cidadão, pois
integra o patrimônio do próprio Estado Democrático de Direito. No caso em tela, nota-se que
efetivamente não há, por parte da corte máxima do País, a explicitação da resposta sustentada
em consistente justificação.
Ainda sobre a fundamentação, cabe destacar o vergonhoso trecho da “fundamentação” do
Supremo:
[...] 4. A matéria foi objeto de julgados do Supremo Tribunal, que concluiu pela
prevalência da tese defendida pela Recorrente. Por isso a ele assiste razão,
na forma do direito vigente. 5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
firmou-se no sentido da possibilidade da internação hospitalar na modalidade
“diferença de classe” sem ônus para o Estado. Essa faculdade conferida ao
paciente atende ao mandamento constitucional que estabelece a saúde como
direito de todos e dever do Estado. Inocorrência de quebra da isonomia: não
se estabeleceu tratamento desigual entre pessoas numa mesma situação, mas
apenas facultou-se atendimento diferenciado em situação diferenciada, sem
ampliar direito previsto na Carta e sem nenhum ônus extra para o sistema
público. Recurso não conhecido (RE n. 226.835 , Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira
Turma, DJ 10/03/2000).
EMENTA: — Direito à saúde. “Diferença de classe” sem ônus para o SUS. Resolução
n. 283 do extinto INAMPS. Art. 196 da Constituição Federal. — Competência da
Justiça Estadual, porque a direção do SUS, sendo única e descentralizada em
cada esfera de governo (art. 198, I, da Constituição), cabe, no âmbito dos
Estados, às respectivas Secretarias de Saúde ou órgão equivalente. — O direito
à saúde, como está assegurado no art. 196 da Constituição, não deve sofrer
embaraços impostos por autoridades administrativas no sentido de reduzi-lo
ou de dificultar o acesso a ele. Inexistência, no caso, de ofensa à isonomia.
Recurso extraordinário não conhecido (RE n. 261.268. Rel. Min. Moreira Alves,
Primeira Turma, DJ 05/10/2001). E, ainda, as seguintes decisões monocráticas:
RE n. 601.712, Rel. Min. Carlos Britto, DJe 04/09/2009; RE n. 496.244, Rel.
Min. Eros Grau, DJe 12/05/2008; RE n. 228.750, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
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DJ 19/04/2007; RE n. 254.245, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 23/06/2005, RE
n. 428.648, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 05/10/2004; e RE n. 363.062, Rel. Min.
Maurício Corrêa, DJ 09/05/2003. 6 . Dessa orientação jurisprudencial divergiu
o julgado recorrido. 7. Pelo exposto, dou provimento ao recurso extraordinário
(art. 557, 1º — A, do Código de Processo Civil e art. 21, § 2º, do Regimento Interno
do Supremo Tribunal Federal), para autorizar o tratamento médico-hospitalar
na modalidade “diferença de classe”, nos termos da jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal. Ônus de sucumbência conforme decisão de primeiro grau.
Publique-se. Brasília, 9 de novembro de 2009. Ministra Cármen Lúcia Relatora.
[...] (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 226.835/RS).
Doutrina
revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais
Além de carecer de justificação, a decisão ainda alude a julgados do próprio tribunal, mas
de modo totalmente descontextualizado, a-histórico. É um mero ato de “copiar e colar” as
ementas dos acórdãos para corroborar uma decisão. Nesses casos, o juiz decide e depois
fundamenta, quando na verdade, deveria primeiro decidir porque já encontrou, na antecipação
de sentido, o fundamento (STRECK, 2006, p. 286). Esse tipo de decisão que não nos diz “porque
se decidiu” daquele modo é a típica decisão que não leva em consideração o próprio direito
à fundamentação, além do que, não leva em consideração que para interpretar é necessário
compreender, e para isso precisamos ter uma “pré-compreensão”, que é constituída de estrutura
prévia de sentido, que vai se fundar numa visão prévia, concepção prévia, já que isso une todas
as partes do sistema (STRECK, 2008, p. 100).
4 Considerações finais
Analisando o sentido do direito hoje, Castanheira Neves (2002, p. 26) observa que na esteira
do jusnaturalismo formal iluminista e da teoria pura do direito, o neopositivismo jurídico
contemporâneo continua reafirmando o direito como um platonismo de normas, identificando
a plenitude do seu sentido na identidade abstrata do sistema normativo. Em sintonia com esta
concepção da juridicidade, a aplicação do direito se reduz a uma operação silogística que
procura subsumir o caso, decidindo o sentido já a priori definido na norma, com a finalidade
de garantir a sua concretização, por meio de procedimentos lógico-dedutivos. Mas isso não
responde de modo efetivo às demandas atuais do direito.
A grande e fundamental discussão é: como se interpreta, como se aplica e se é possível alcançar
condições interpretativas capazes de garantir uma resposta correta (constitucionalmente
correta) (STRECK, 2009, p. 340). Parece mais do que oportuno resgatar o que o autor há muito
já disse: levemos o texto a sério (STRECK, 2006, p. 140). Ocorre, pois, que diante da análise que
foi realizada acerca do contexto do positivismo jurídico, bem como da sua superação, note-se
que no caso apresentado e estudado, os tribunais (leia-se: Tribunal Regional Federal e o Supremo
Tribunal Federal) não levaram o texto a sério efetivamente, pois do modo como foi decidido, o
texto foi considerado apenas um mero enunciado linguístico, a Constituição é quase “rasgada”
nessas situações. Querer aplicá-la, nesse contexto de caos jurídico, é definitivamente, esperar
muito dos tribunais.
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Nota-se, também, que os princípios constitucionais, que deveriam dar espaço para elidir a
discricionariedade acabam virando regras e são anulados por conceitualizações (STRECK, 2006,
p. 143). Foi o que se constatou na decisão do “pagar a diferença”. O princípio da isonomia foi
utilizado de modo “conceitualizado”, e o mais assustador e temerário, é que essa conceitualização
deu-se por meio de invocação de ementa de julgados. Julgados esses totalmente jogados
no contexto da decisão e da fundamentação, sem sequer serem contextualizados, ou seja,
a-históricos e desconexos com a situação.
Infelizmente o pior ainda está por vir, pois só nos restam o estarrecimento e o pessimismo
quando lemos decisões, por exemplo, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que, no
decorrer da sua fundamentação, aludem à moderna hermenêutica constitucional, entretanto,
não dizem do que se trata, tampouco quem é o “pai” de tamanha proeza, e para causar maior
angústia, a pretensa fonte dessa façanha são verbetes jurisprudenciais do próprio relator do
acórdão, veja-se o exemplo de mais uma temeridade:
Na verdade, da mesma maneira que a previsão legislativa de prisão obrigatória,
também a proibição ope legis da liberdade provisória a determinados tipos
de crimes se afigura inconstitucional por ofensa ao sistema de direitos
fundamentais, isto é, violação dos princípios da presunção de inocência,
do devido processo legal e do princípio da proporcionalidade, conforme
fundamentos baseados na moderna hermenêutica constitucional (SANGUINÉ,
Odone: “Inconstitucionalidade da proibição de liberdade provisória do inciso
II do artigo 2° da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990”, op. cit., p. 254-255;
ID.: “Prisão provisória e princípios constitucionais”, op. cit., p. 102 e 123
ss). A doutrina — que se tornou hoje predominante — acolhe essa opinião,
destacando-se SILVA FRANCO, Alberto: Crimes Hediondos, op.cit., p. 95 e ss.;
recentemente, também se manifesta contrariamente à proibição legislativa de
concessão de liberdade provisória com fundamento na presunção de inocência,
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal, op.
cit., p. 637-639. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Habeas
Corpus n. 70037650009).
Eis o triunfo dos manuais que formam operadores tecnicistas do direito e do caos jurídico
instaurado, especialmente, nos Tribunais! Esses são pequenos exemplos dos resquícios do
fracasso do positivismo que delegou aos magistrados a discricionariedade nos hard cases e nos
easy cases, a persistência do esquema sujeito-objeto que faz com que os casos sejam resolvidos
com a mera subsunção do fato à norma.
Na decisão, objeto da análise, “pagar a diferença”, nota-se a inconsistência da fundamentação,
há uma total inobservância do art. 93, IX, da Constituição (direito fundamental do cidadão à
fundamentação). Desde a apreciação do caso em primeiro grau, não houve uma integração e
quiçá uma reconstrução do próprio direito para tentar apontar a resposta correta. No Tribunal
Regional Federal e no Supremo Tribunal Federal a cena repetiu-se. Estamos em meio à cegueira,
à escuridão.
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outubro | novembro | dezembro 2011 | v. 81 — n. 4 — ano XXIX
Em síntese, pressupondo a superação do paradigma objetificante e a representação
contemplativa de uma subjetividade logicamente alienada do real, constrói-se em
imanência histórica com o mundo da vida e a concretude existencial dos fatos (casos
jurídicos concretos, como, por exemplo, o “pagar a diferença”), a linguagem deixa de ser
uma terceira coisa interposta entre sujeito e objeto, passando a assumir uma condição de
possibilidade, em que a interpretação, revestindo-se de um cariz produtivo, deixa de ser
simplesmente reprodutiva (STRECK, 2002, p. 197 e ss). Assim, a aplicação do direito, sob
a orientação da ontologia heideggeriana, realça que toda a compreensão remete para uma
síntese hermenêutica, na qual a universalidade se unifica com a contingência relativa da
singularidade.
Doutrina
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Socorremo-nos de Streck (2008, p. 107) para dizer que o cerne da questão não é a “resposta
correta” em si, mas o modo como essa é dada. Essa resposta deve ser fruto de uma relação
do esquema juiz/intérprete da relação de compreensão baseada na intersubjetividade
sujeito-sujeito. E é justamente isso que está ausente na decisão que foi analisada, “o pagar a
diferença”. A questão não é a “resposta correta”, mas sim o modo de produção dessa decisão,
ou seja, o paradigma sobre o qual ela está assentada: sujeito-objeto. Decisões arraigadas nesse
paradigma (que insistentemente e com razão tenta-se superar) já não dão mais conta de um
sistema jurídico como o contemporâneo, e a situação se agrava quando não há um olhar crítico
ao direito, ou seja, manter esse paradigma é manter o ultrapassado. O que nos resta é a
esperança de, por exemplo, quiçá um dia os nossos “aplicadores do direito” alcançarem o real
significado da metáfora da resposta correta.
Há esperanças que é loucura ter. Pois eu te digo que se não fossem essas, já eu teria desistido
da vida (SARAMAGO, 1995), e nós do Direito.
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revista do tribunal de contas DO ESTADO de minas gerais
Abstract
This article analyzes the positivism in the context of its birth, in order to establish
the present situation of this model in Brazil, as well as non-acceptance of overcoming
the subject-object schema and the invasion of language in philosophy. It is also the
intention of this work to examine empirically a court decision and its effects in this
context of crisis of legal positivism. In that decision, the focus is on the basic right
to health. It will take into account aspects relating to the reasons, the decision
theory, considering the “peculiarities” of the interpretation and decision-making.
Keywords: Legal positivism. Decision. Reasoning. Health.
Data de recebimento: 27 jun. 2011
Data de aceite para publicação: 22 set. 2011
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As facetas do processo decisório e o direito à saúde