Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais
Núcleo de Estudos Constitucionais
O PORVIR DOS
GUSTAVO RABAY GUERRA
<[email protected]>
BRASÍLIA-DF
Julho-2005
Núcleo de Estudos Constitucionais
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais
Traço Evolutivo das Gerações/Dimensões de Direitos Fundamentais
1a Dimensão
Liberdade
Direitos negativos (não
agir)
Direitos civis e
políticos: liberdade
política, de expressão,
religiosa, comercial
Direitos individuais
Estado Liberal
2a Dimensão
Igualdade
3a Dimensão
4a Dimensão
Fraternidade
Democracia (direta)
Direito ao
desenvolvimento, ao
meio-ambiente
sadio, direito à paz
Direito à informação,
à democracia direta
e ao pluralismo
Direitos a
prestações
Direitos sociais,
econômicos e
culturais
Direitos de uma
coletividade
Direitos de toda a Humanidade
Estado social e Estado democrático e social
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OS DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO PRINCÍPIOS
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Princípios contêm, normalmente, uma maior carga valorativa, um
fundamento ético, uma decisão política relevante, e indicam uma
determinada direção a seguir. Ocorre que, em uma ordem pluralista,
existem outros princípios que abrigam decisões, valores ou
fundamentos diversos, por vezes contrapostos.
A colisão de princípios, portanto, não só é possível, como faz parte da
lógica do sistema, que é dialético. Por isso a sua incidência não pode
ser posta em termos de tudo ou nada, de validade ou invalidade.
Deve-se reconhecer aos princípios uma dimensão de peso ou
importância.
À vista dos elementos do caso concreto, o intérprete deverá fazer
escolhas fundamentadas, quando se defronte com antagonismos
inevitáveis, como os que existem entre a liberdade de expressão e o
direito de privacidade, a livre iniciativa e a intervenção estatal, o
direito de propriedade e a sua função social.
A aplicação dos princípios se dá, predominantemente, mediante
ponderação.
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O Princípio da dignidade humana
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Aos poucos se vai formando uma massa crítica de jurisprudência
acerca do princípio da dignidade da pessoa humana tendo como
referência emblemática a decisão do Conselho de Estado francês,
no curioso caso Morsang-sur-Orge.
No Brasil, o princípio tem sido fundamento de decisões
importantes, superadoras do legalismo estrito, como a proferida
pelo Superior Tribunal de Justiça ao autorizar o levantamento do
FGTS por mãe de pessoa portadora do vírus da AIDS, para ajudá-la
no tratamento da doença, independentemente do fato de esta
hipótese estar ou não tipificada na lei como causa para o saque do
fundo.
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O Princípio da dignidade humana
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Em outro acórdão, de elevada inspiração, o Tribunal deferiu habeas
corpus em caso de prisão civil em alienação fiduciária, após constatar,
dentre outros fatores, que o aumento absurdo da dívida por força de
juros altíssimos comprometia a sobrevida digna do impetrante.
STJ, HC 12.547-DF, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJU 12.02.2001,
onde se consignou: “A decisão judicial que atende a contrato de
financiamento bancário com alienação fiduciária em garantia e ordena a
prisão de devedora por dívida que se elevou, após alguns meses, de R$
18.700,00 para 86.858,24, fere o princípio da dignidade da pessoa
humana, dá validade a uma relação negocial sem nenhuma
equivalência, priva por quatro meses o devedor de seu maior valor, que
é a liberdade, consagra o abuso de uma exigência que submete uma
das partes a perder o resto provável de vida que não seja o de cumprir
com a exigência do credor. Houve ali ofensa ao princípio da dignidade
da pessoa, que pode ser aplicado diretamente para o reconhecimento
da invalidade do decreto de prisão”.
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O Princípio da dignidade humana
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No Supremo Tribunal Federal, a preservação da dignidade da pessoa
humana foi um dos fundamentos invocados para liberar réu em ação de
investigação de paternidade da condução forçada para submeter-se a
exame de DNA
STF, RTJ 165/902, HC 71.373–RS, Tribunal Pleno, rel. Min. Marco Aurélio, j.
10.11.94: “Investigação de paternidade – Exame DNA – Condução do réu
‘debaixo de vara’. Discrepa, a mais não poder, de garantias constitucionais
implícitas – preservação da dignidade humana, da intimidade, da
intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução
específica e direta de obrigação de fazer – provimento judicial que, em ação
civil de investigação de paternidade, implique determinação no sentido de o
réu ser conduzido ao laboratório, ‘debaixo de vara’, para coleta do material
indispensável à feitura do exame DNA. A recusa resolve-se no plano
jurídico-instrumental, consideradas a dogmática, a doutrina e a
jurisprudência, no que voltadas ao deslinde das questões ligadas à prova
dos fatos”. Ficaram vencidos os Ministros Francisco Rezek, Ilmar Galvão,
Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence.
Ainda uma vez os princípios...
... contra a “dogmática do grito!”
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A “euforia do Estado Principiológico”
“Estado principialista” (Paulo Bonavides)
“Hermenêutica de Princípios” (Inocêncio Mártires Coelho)
Compreensão principial da Constituição” (Canotilho)
“Principiologia jurídico-constitucional” (Willis Santiago)
“Dogmática principialista” (Clèmerson Merlin Clève)
“Jurisprudência de princípios” (García de Enterría)
O Ambiente filosófico-dogmático
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Os Princípios Gerais do Direito
Do Jusnaturalismo ao Positivismo normativista
A insuficiência da argumentação subsunção e o
ataque geral à neutralidade
Uma nova etapa da dogmática jurídica: Teorias
críticas, o resgate da retórica, a concretização
normativa e a efetivação dos direitos fundamentais.
O deslinde da indiferenciação entre texto normativo
e norma jurídica
O constitucionalismo na centralidade do discurso
jurídico e a Constituição como um sistema aberto
de regras e princípios.
Os princípios e as regras como
Espécies normativas
A normatividade dos princípios: O modelo dicotômico tradicional
(Ronald Dworkin e Robert Alexy)
 Os princípios como normas jurídicas, cujas notas distintivas são:

(I) o alto grau de abstração;
(II) dever de otimização dos casos;
(III) ponderação de valores.
Regras são proposições normativas aplicáveis sob a forma de
tudo ou nada (“all or nothing”). Ex: a norma constitucional que
estabelece a aposentadoria compulsória por idade é uma regra.
 Princípios apresentam alta densidade axiológica/deontológica e
indicam uma determinada direção a seguir (O Estado ideal de
coisas). À vista de valores antagônicos, A aplicação dos princípios
se dá, predominantemente, mediante ponderação.

A aplicabilidade dos princípios:
Alguns casos paradigmáticos
A Decisão do Conselho de Estado Francês em Morsang-surOrge (O caso ‘lancer de nain´)
 No Brasil, o princípio da dignidade humana tem sido
fundamento de decisões importantes, como a proferida pelo
Superior Tribunal de Justiça ao autorizar o levantamento do
FGTS por mãe de pessoa portadora do vírus da AIDS, para
ajudá-la no tratamento da doença, independentemente do fato
de esta hipótese estar ou não tipificada na lei como causa para o
saque do fundo

FGTS. LEVANTAMENTO, TRATAMENTODE FAMILIAR PORTADOR DO
VÍRUS HIV. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. É
possível o levantamento do FGTS para fins de tratamento de portador do
vírus HIV, ainda que tal moléstia não se encontre elencada no art. 20, XI, da
Lei 8036/90, pois não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e
sim considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do
legislador, mormente perante o preceito maior insculpido na Constituição
Federal garantidor do direito à saúde, à vida e a dignidade humana e,
levando-se em conta o caráter social do Fundo, que é, justamente,
assegurar ao trabalhador o atendimento de suas necessidades básicas e
de seus familiares”. (STJ, REsp. 249026/PR, Rel. Min. José Delgado, DJU 26.06.2000, p. 138)

A Superação da Teoria Padrão
Diretrizes para a análise dos princípios
a) Análise da extensão da carga axiológica dos princípios e
interpenetração da moralidade;
b) Realinhamento do perfil dos princípios na quadra geral da
Teoria Jurídica contemporânea, desfazendo equívocos
quanto à função por eles desempenhada (planos
deontológico, axiológico e hermenêutico);
c) Reformulação de sua estrutura lógica, especialmente face
às regras, de modo a permitir maior precisão conceitual e
taxionomia normativa;
d) Especificação de conteúdo dos princípios, com vistas a
uma melhor aplicação;
e) Peculiaridades de aplicação, com atenção à racionalidade
argumentativa do Direito.
• O contexto da investigação: A compreensão da estrutura
lógica e a aplicabilidade dos princípios.
• A crítica aos critérios distintivos entre regras e
princípios:
(I) o critério do “caráter hipotético-condicional”;
(II) o do “modo final de aplicação”; e
(III) o do “conflito normativo”
• A distinção heurística que toma em consideração que as
normas são construídas pelo intérprete a partir dos
dispositivos e do seu significado usual.
• A dissociação em alternativas inclusivas admite a
coexistência das espécies normativas em razão de um
mesmo dispositivo (regra, princípio e postulado)
• A inserção dos postulados normativos aplicativos
Síntese Crítica à Principiologia
A insuficiência da concepção de mandados de otimização (Alexy):
normas principiológicas são deveres de otimização
 Entender seu uma norma é um princípio ou regra “depende do
uso argumentativo, e não da estrutura hipotética”, posto que tratase de formulação lingüística
 O princípio pode apresentar vinculação a uma hipótese fática,
mediante concretização pelo intérprete:
a) A razão (fim, tarefa) à qual o princípio se refere deve
ser julgada relevante diante do caso concreto; e
b) O comportamento necessário para a realização ou
preservação de determinado estado ideal de coisas
(Idealzustand) deve ser adotado.
 Assim, os princípios são espécies normativas que geram, para a
argumentação, razões substanciais (substantive reasons) ou razões
finalísticas (goal reasons); De modo contrário, as regras poderiam
ser entendidas como espécies normativas que geram, para a
argumentação, razões de correção (rightness reasons) ou razões
autoritativas (authority reasons).

Síntese Crítica à Principiologia
O modo final de aplicação nada diz respeito à espécie
normativa: “a conseqüência estabelecida prima facie pela
norma pode deixar de ser aplicada em face de razões
substanciais consideradas pelo aplicador, mediante
condizente fundamentação, como superiores àquelas que
justificam a própria regra”(Ávila).
 Em realidade, sucede ter-se possível o exame da razão que
fundamenta a própria regra (rule´s purpose), para a
individuação da hipótese, ou, se recorre a outras razões,
baseadas em outras normas, para justificar o
descumprimento daquela regra (overruling).
 A escolha de um comportamento e/ou conseqüência
diversas daquelas radicadas no dispositivo poderá ser
operada argumentativamente, desde que a justificação lógicolegitimante seja devidamente operada (o problema do “ônus
da argumentação”).

Síntese Crítica à Principiologia
Outra objeção pertinente de Ávila é a de que a ponderação
não é método exclusivo de aplicação dos princípios: as
regras também estão sujeitas ao crivo do intérprete, na
interface fático-jurídica peculiar a cada situação concreta, de
forma a tornar-se imperioso o sopesamento ou
balanceamento (Abwägung) de razões que justifiquem ou
contrariem o prévio acoplamento lingüístico do dispositivo
diante da hipótese ocorrida
 A dimensão axiológica não é privativa dos princípios, nos
diz Ávila, mas elemento integrante de qualquer norma
jurídica. Em última análise, a dimensão de peso, propõe o
autor, não é sequer relativa à norma, mas ao aplicador e ao
caso.

O papel da jurisdição: um caso
paradigmático
O STF concedeu ordem de habeas corpus, por maioria de votos,
que resultou a absolvição de paciente acusado pela prática de
estupro com presunção da violência (arts. 213 e 214 do Código
Penal), provado o fato de ter o mesmo mantido relações sexuais
com uma jovem de 12 anos. O dispositivo aplicável (art. 224 do
Código Penal), prevê a presunção incondicional da conjunção
carnal violenta cometida contra menor de 14 anos, de sorte que,
se praticada a relação sexual, então deve ser presumida a
violência por parte do agente do delito. A regra não prevê
qualquer exceção. No entanto, na decisão acima referida, o STF
reputou de grande relevância algumas “circunstâncias
particulares não previstas pela norma”, como a aquiescência da
vítima ou a aparência física e mental de pessoa mais velha, por
conseguinte influenciadoras do discernimento e conduta do
agente. Assim, firmou-se o entendimento de que o tipo não se
configurava na hipótese entelada, apesar dos requisitos
normativos expressos estarem presentes.
A tese dos postulados normativos
O viés argumentativo apontado por Ávila conduz
a adoção de uma nova dimensão normativa: Os
postulados normativos aplicativos. São normas
estruturantes da aplicação de regras e
princípios.
A sua formulação oportuniza a identificação de três modos de
aplicabilidade aos quais estaria uma norma jurídica sujeita:
(I) a regra, que especifica um comportamento imediato
(II) o princípio, que se revela como um fim adequado à
situação jurídica; e
(III) o postulado normativo, enquanto método para a
aplicação das espécies normativas em prospecção.
 O princípio da proporcionalidade não consiste num princípio, mas num
postulado normativo aplicativo: em sua aplicação, o dever de proporcionalidade indica qual norma deverá prevalecer, a independer da situação
concreta se houve ou não violação do conteúdo que representa a noção
de proporcionalidade, como no caso do exame de DNA em investigação
de paternidade

Em busca de um estado ideal
de coisas: um ponto final?
Para a correta compreensão da estrutura lógica das normas
jurídicas e da especificação de conteúdo das espécies
normativas, é preciso elencar:
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Diretrizes para o estudo dos princípios
Diretrizes para o estudo dos postulados normativos
Critérios distintivos heurísticos
A aplicação dos princípios e postulados pressupõe:
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A argumentação jurídica
A construção progressiva da norma por parte do intérprete
A jurisdição lógico-legitimante
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Apresentação do prof. Gustavo Rabay sobre