Princípio da proporcionalidade: a ponderação dos direitos fundamentais Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Helena Nunes Campos Aluna do Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie RESUMO Sabe-se que uma das características dos direitos fundamentais é o seu aspecto de não ser absoluto e ilimitado; podendo, por isso, ocorrer colisões ou relativas contradições entre tais direitos. Desta forma, imperiosa será a utilização do princípio da proporcionalidade para uma necessária ponderação entre os mesmos perante o caso concreto. Atualmente, esse é um princípio com status constitucional que busca ponderar direitos fundamentais que se conflitam através da devida adequação dos mesmos, ao caso concreto com o binômio meio-fim. Palavras-chave: Princípio da proporcionalidade. Direitos fundamentais. 1 INTRODUÇÃO A República Federativa do Brasil adotou, de forma expressa, em sua Constituição, em seu preâmbulo constitucional bem como em seu artigo 1o, a política do Estado Democrático de Direito. Sendo assim, a proteção e garantia dos direitos fundamentais tornou-se questão primordial, como meio de proteção e respeito ao cidadão. Tem-se que uma das formas de proteção a estes direitos e, por via oblíqua, ao Estado acima mencionado é a utilização do princípio da proporcionalidade. Um princípio trazido do direito alemão e incorporado ao direito brasileiro, mas não de forma MACKENZIE 23 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico expressa e sim, como norma esparsa dentro do texto constitucional, e que largamente vem sendo utilizado pela jurisprudência e doutrina pátrias. Bonavides (2002, p. 356) indaga “que é a proporcionalidade e que importância tem ela no direito constitucional contemporâneo em face de seus mais recentes progressos doutrinários?”. As bases deste princípio estão contidas no binômio meio/fim, onde se busca controlar os excessos e deixar que os direitos fundamentais alcancem a todos os cidadãos. Sendo assim, o presente artigo procura, como objetivo central e básico, analisar a aplicação deste princípio no direito brasileiro. Verificando quando da existência de colisão de direitos fundamentais dos indivíduos, analisando como hipótese de confirmação e solução deste problema à utilização do princípio da proporcionalidade quando desta colisão. Afinal, a Constituição não pode conter normas constitucionais que se contrariem. Como de fato não contém. No caso dos direitos fundamentais, poderá haver uma aparente contradição entre os mesmos, onde, então, utilizar-se-á da aplicação do princípio constitucional fundamental da proporcionalidade, que concederá ao caso concreto uma aplicação coerente e segura da norma constitucional. Pois, sabe-se, que os direitos fundamentais não são absolutos e ilimitados, encontrando seus limites em outros direitos fundamentais, também consagrados pela Magna Carta. Nota-se então, que este é um princípio que envolve a todos os cidadãos, por funcionar como critério para solução de conflitos de direitos fundamentais, através de juízos comparativos de ponderação dos interesses envolvidos no caso concreto. Ressalta-se que essa limitação ocorre com freqüência no direito brasileiro, através de um trabalho jurisprudencial do nosso Pretório Excelso, e, que é aplicado continuamente. Contudo, tal princípio não se mostra inerte as críticas formuladas pela doutrina, estrangeira e pátria, que vê em seu conteúdo aspectos de vulnerabilidade, tais como a ameaça à separação de poderes e a segurança jurídica. 2 PRINCÍPIOS E REGRAS O ordenamento jurídico, de acordo com a clássica formulação de Kelsen (2002) é um sistema hierárquico de normas. Isto significa dizer que uma norma para ser válida é necessária que busque seu fundamento de validade em uma norma superior, de maneira que todas as normas retirem sua validade de uma mesma norma fundamental. MACKENZIE Por tal razão, é a Constituição, como fonte de validade de todas as normas, que confere a necessária coesão ao ordenamento. 24 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. É também a Constituição que contém um sistema aberto de princípios e regras que vão orientar todo um sistema. Neste ponto, é interessante analisar a distinção doutrinária existente entre princípios e regras. Afinal, quando nos deparamos com duas regras que aparentemente incidem sobre uma determinada hipótese fática, contrariando-se – a chamada antinomia – a questão é solucionada pelos três critérios clássicos apontados por Bobbio e aceitos quase universalmente, ou seja, o critério cronológico, o critério hierárquico e o critério da especialidade. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Deste modo, no caso de duas regras em conflito, aplica-se um desses três critérios, na forma do “tudo ou nada” como ensina Canotilho (1992, p. 642). No caso de colisão de princípios constitucionais, porém, não se trata de antinomia, vez que não se pode simplesmente e aleatoriamente afastar a aplicação de um deles. Pois do ponto de vista jurídico, é forçoso admitir que não há hierarquia entre os princípios constitucionais, isto é, todas as normas têm igual dignidade. E isto decorre do princípio da unidade da Constituição que tem como impossível a existência de normas constitucionais antinômicas. De sorte que, não há que se falar em aplicação destes critérios para solucionar possíveis colisões de princípios constitucionais. Afinal, devido à carga valorativa inserta em nossa Constituição, que tem uma pluralidade de concepções, mormente dizer, típicas de um Estado Democrático de Direito, é certo que normalmente haja uma tensão permanente entre alguns princípios. Pois, sem dúvida, pode parecer a prima facie, inconciliáveis, o princípio da liberdade de expressão e o direito à intimidade, a privacidade e a vida privada, ambos expressos como garantias e direitos individuais. Ou até mesmo o direito à propriedade com o princípio da função social da terra. Então, partindo-se dessa constatação de que não existe hierarquia entre os princípios constitucionais, surge um problema a ser resolvido: o que fazer quando dois ou mais princípios constitucionais ou direitos fundamentais entram em colisão? Como dizer qual será o utilizado ou qual será o mais correto? É certo que a colisão entre princípios não se desenrola no campo da validade, mas sim na dimensão do peso. Pois, quando dois princípios constitucionais ou direitos fundamentais entram em colisão, não significa que um deva ser desprezado. O que ocorrerá é que devido a certas circunstâncias um prevalecerá sobre o outro, terá precedência, naquele caso, mas sempre se buscando a concordância de ambos de uma maneira harmônica e equilibrada. A par dessas considerações e inquietudes, a doutrina estrangeira seguida por doutrinadores pátrios procurou resolver o problema com a utilização do chamado princípio da proporcionalidade. MACKENZIE 25 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Tal princípio é tido como “meta-princípio”, isto é, o “princípio dos princípios”, visando, da melhor forma, preservar os princípios constitucionais em jogo. Afinal, o princípio da proporcionalidade utiliza-se da ponderação de bens como método de adotar uma decisão de preferência entre direitos ou bens em conflito. 3 ORIGEM DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE O princípio da proporcionalidade acompanha toda a história e evolução dos direitos humanos e do Estado de Direito. O seu nascedouro está intimamente ligado ao Direito Administrativo e a idéia de que os atos do Poder Público devem ser adequados e proporcionais em relação aos seus súditos. Conforme Barros ( 2000, p. 35) “o germe do princípio da proporcionalidade, pois, foi a idéia de dar garantia à liberdade individual em face dos interesses da administração”. Inicialmente, a idéia de proporcionalidade estava ligada tão somente ao Direito Penal, com o pensamento de Beccaria, que entendia que as sanções criminais deviam ser proporcionais à gravidade dos delitos praticados. Desta maneira, no século XIX, este princípio alcança o Direito Administrativo. Sua trajetória inicia-se na França, mais ainda tão somente como princípio do Direito Administrativo, haja vista que a inexistência de um controle de constitucionalidade repressivo, ou seja, posterior neste país impossibilitou o desenvolvimento da discussão do princípio em sede constitucional. A sua constitucionalização somente se deu com o fim da Segunda Guerra Mundial, na Alemanha. A preocupação da Corte Constitucional germânica com a proteção dos direitos fundamentais diante dos possíveis abusos do legislador, levou-a transplantar para o direito constitucional daquele país o princípio da proporcionalidade. Para Steinmetz (2001, p. 146), “rapidamente, essa nova leitura do princípio da proporcionalidade cruzará a fronteira tedesca, sendo incorporada pela jurisprudência constitucional de inúmeros países e pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos”. Desta maneira, sob a égide influência do direito alemão, outros países europeus, começaram a acolher, em sede constitucional, o princípio da proporcionalidade. Sendo também transportada para o direito americano, que no caso dos Estados Unidos, tal princípio recebeu o nome de princípio da razoabilidade a partir da interpretação evolutiva da cláusula do devido processo legal. Atualmente, o princípio constitucional da proporcionalidade é um princípio universal no âmbito de vigência das constituições dos Estados democráticos de Direito. No Brasil, o princípio da proporcionalidade vem percorrendo uma trajetória mais modesta. Não está explicitado em nossa atual Magna Carta, e durante muito MACKENZIE 26 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. tempo chegou até a ser negado pelos doutrinadores pátrios, tendo sido questionado pela primeira vez, em obra pioneira por San Tiago Dantas, em 1948. É certo que anteriormente a constituinte de 1988, jurisprudências esparsas, sem a invocação explícita do mesmo, o utilizavam como critério para valoração da constitucionalidade de algumas leis. Precedente histórico importante encontra-se no julgado do Recurso Especial no 18.331, relatado pelo Ministro Orozimbo Nonato em 1953. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Após tal acórdão, outros se sucederam nesta mesma linha, ou seja, de uma acolhida indireta deste princípio, até então sem status constitucional. A jurisprudência do Pretório Excelso só chegou a reconhecer expressamente tal princípio, em decisão de uma ação direita de inconstitucionalidade (ADIN no 8552), onde se discutia a constitucionalidade da Lei do Estado do Paraná, no ano de 1993. Seguiu-se assim um sem números de decisões deste tribunal com a acolhida expressa do princípio da proporcionalidade. Sendo assim, este princípio, que anteriormente a Constituição de 1988 não era utilizado, por vezes repudiado, veio a ser reconhecido expressamente pelo STF, tendo então, agora, status constitucional. 4 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE: BUSCA DO EQUILÍBRIO Ao analisarmos a palavra proporcional no dicionário (HOUSSAIS, 2001, p. 2313) encontramos a seguinte definição: em que há proporção correta, equilíbrio, harmonia. E é neste sentido que utilizamos o princípio constitucional da proporcionalidade, ou seja, como uma ponderação correta e harmoniosa entre dois interesse que esteja em conflito perante um caso concreto, em uma hipótese real e fática. O princípio da proporcionalidade ordena que a relação entre o fim que se busca e o meio utilizado deva ser proporcional, não-excessiva. Deve haver uma relação adequada entre eles. Pois o princípio da proporcionalidade é utilizado quando há colisão de direitos fundamentais, sejam eles de 1a, 2a ou 3a geração, individuais ou coletivos. Afinal, sabe-se que os direitos fundamentais não são ilimitados ou absolutos. Encontram seus limites em outros direitos, também fundamentais. Mas para que possam ter efetivação, isto é aplicabilidade, devem ser ponderados quando estiverem em choque, colisão. Mas como e quando ponderar estes direitos? Somente diante de um caso concreto, quando haja um aparente conflito entre normas, ou melhor, entre direitos. Afinal, se há uma aparente colisão entre princípios de mesma hierarquia, poderíamos dizer, conflitos entre direitos fundamentais que a própria Magna Carta esten- MACKENZIE 27 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico deu a todos, deve-se aplicar o princípio constitucional fundamental da proporcionalidade que concederá ao caso concreto uma aplicação coerente e segura da norma constitucional, pesando a incidência que cada um deve ter, e, preservando-se assim, o máximo dos direitos e garantias fundamentais consagrados constitucionalmente. Stinmetz (2001, p. 142-143) diz que para a realização da ponderação de bens requer-se o atendimento de alguns pressupostos básicos: a colisão de direitos fundamentais e bens constitucionalmente protegidos, na qual a realização ou otimização de um implica a afetação, a restrição ou até mesmo a não-realização do outro, a inexistência de uma hierarquia abstrata entre direitos em colisão, isto é, a impossibilidade de construção de uma regra de prevalência definitiva. A ponderação de bens, no caso concreto, segundo Karl Larenz (1997, p. 587), “é um método de desenvolvimento do Direito que se presta a solucionar colisões de normas, bem como para delimitar as esferas de aplicação das normas que se entrecruzam e, com isso, concretizar direitos cujo âmbito ficou aberto”, estabalecendose uma clara prevalência valorativa dos bens tutelados pela Constituição Federal. Afinal, a ponderação de interesses só se torna necessária quando de fato estiver caracterizada a colisão de princípios constitucionais em um caso concreto. Mas isto não torna um direito mais importante ou mais fundamental que outro. O que acontecerá é que diante de uma situação específica e bem determinada um direito será preterido em relação ao outro, pela sua importância naquele caso em questão. Assim, tem-se que é o princípio da proporcionalidade que se permite fazer o sopesamento dos princípios e direitos fundamentais, bem como dos interesses e bens jurídicos em que se expressam, quando se encontrem em estado de contradição, solucionando-a de forma que maximize o respeito de todos os envolvidos no conflito. Afinal, quando se tem direitos fundamentais em conflito perante um caso concreto, é necessário que sofram eles uma ponderação em razão do bem ou do valor que se pretende tutelar naquele caso específico. É necessária a constante busca da harmonia entre direitos, para que, conforme já fora dito, não se tornem os mesmos sem efetivação e aplicabilidade. Pois, de acordo como o princípio da proporcionalidade, sempre que houver direitos colidindo-se será necessário utilizar-se de tal princípio, como o princípio da justa-medida. Afinal, poderá em certos casos ter maior peso a honra e a vida privada e, em outros a liberdade de expressão. Como saber? Não há. Porque somente diante de um caso concreto, de uma hipótese fática e real é que se poderá dizer qual prevalecerá. O princípio da proporcionalidade traduz a busca do equilíbrio e harmonia, da ponderação de direitos e interesses à luz do caso concreto como melhor forma de aplicação e efetivação destes mesmos direitos. MACKENZIE 28 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. 5 OS ELEMENTOS PARCIAIS DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Para que se possa ter um entendimento mais completo sobre o princípio da proporcionalidade é necessário à identificação e compreensão do que a doutrina pátria, seguidora da doutrina alemã, chama de subprincípios ou princípios parciais do princípio da proporcionalidade. A doutrina mais recente constatou e subdividiu este princípio em três outros princípios, quais sejam: o princípio da adequação, o princípio da necessidade e o princípio da proporcionalidade em sentido estrito. Com relação ao subprincípio da adequação, que muitas vezes também é denominado de princípio da idoneidade ou princípio da conformidade, este traduz a idéia de que qualquer medida restritiva deve ser idônea à consecução da finalidade pretendida. Isto é, deve haver a existência de relação adequada entre um ou vários fins determinados e os meios com que são determinados. Já com relação ao subprincípio da necessidade, ou princípio da exigibilidade, busca-se que a medida restritiva seja realmente indispensável para a conservação do direito fundamental e, que não possa ser substituída por outra de igual eficácia e, até menos gravosa. Desta forma, de acordo com este subprincípio, se há varias formas de se obter aquele resultado, impõe que se opte por aquela que irar afetar com menor intensidade os direitos envolvidos na questão. Por fim, como o terceiro elemento caracterizador do princípio da proporcionalidade, encontra-se o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito. Este terceiro princípio parcial caracteriza-se pela idéia de que os meios eleitos devem manter-se razoáveis com o resultado perseguido. Isto quer dizer que o ônus imposto pela norma deve ser inferior ao benefício por ela engendrado. Trata-se da verificação da relação custo-benefício da medida, isto é, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos. Desta forma, este subprincípio exige uma equânime distribuição de ônus, com a utilização da técnica de ponderação de bens ao caso concreto. Sendo assim, tem-se que é a partir desta tríplice dimensão que se utiliza o princípio da proporcionalidade, isto é, através de um juízo de adequação da medida adotada, para que esta possa alcançar o fim proposto; através de uma reduzida interferência sobre direitos fundamentais individuais, limitando-se ao estritamente necessário para atingir a finalidade que a justifica; e, através de uma justa medida de ponderação de interesses ao caso concreto. MACKENZIE 29 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico 6 IDENTIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE Outorgar dignidade constitucional a um princípio exige de qualquer estudioso não só sua conceituação, mas também o questionamento acerca dos preceitos constitucionais que lhe dão sustentação e lhe garantem tal categoria. Na doutrina brasileira, conquanto haja concordância a respeito da presença da idéia de proporcionalidade em nossa Constituição, divergem vários autores quanto a identificação do seu lugar no Texto Constitucional, havendo quem o identifique com a cláusula do devido processo legal, como por exemplo, Luiz Roberto Barroso; outros como, por exemplo, Gilmar Ferreira Mendes, o identifica com o princípio do Estado Democrático de Direito, com o princípio da legalidade; e, ainda há aqueles como Paulo Bonavides que entendem ser desnecessário buscar filiações da proporcionalidade com outro qualquer princípio explícito da Constituição. Interessante opinião é aquela que diz: que a existência do princípio da proporcionalidade no nosso sistema não depende, assim, de estar contido em uma formulação textual na Constituição. Desde que seja possível haurí-lo de outros princípios constitucionais, estará caracterizado e, de resto, sua aplicação será obra dos Tribunais (BARROS, 2000, p. 91). O certo é que justamente por ter o Brasil feito a escolha política pelo Estado Democrático de Direito, em seu preâmbulo constitucional bem como em seu art.1º, onde, por isso, a proteção dos direitos fundamentais se desloca para o centro da gravidade da ordem jurídica, que se faz presente entre nós, e com status constitucional, o princípio da proporcionalidade. Sendo assim, resta claro que o princípio em estudo decorre basicamente do Estado de Direito e, da idéia deste da proteção aos direitos fundamentais. As demais discussões sobre o mesmo ter seu fundo no princípio da dignidade da pessoa humana ou no princípio da legalidade, são nada mais do que conseqüências da adoção feita pelo Brasil do Estado Democrático de Direito. 7 CONCLUSÃO O princípio da proporcionalidade, fruto da inspiração germânica, tem se tornado mais presente em nosso ordenamento jurídico, isto graças à doutrina e jurisprudência constitucional brasileira. Este princípio, conforme já assinalado, tem a função primária de preservar os direitos fundamentais. MACKENZIE Afinal, devido à carga axiológica existente nestes, os mesmos vivem em uma constante tensão, em conseqüência disto, não há que se cogitar, num sistema constitucional democrático, a existência de direitos fundamentais absolutos, isto é, direitos que 30 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. sempre prevaleceram em detrimento de outros. Então será neste aspecto que se insere o princípio da proporcionalidade, ou seja, como um instrumento que limitará estes direitos, ponderando-os, ao caso concreto, quando de fato haja uma colisão, uma tensão. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico Se há um aparente conflito entre princípios constitucionais, ou entre direitos fundamentais, deve-se aplicar o princípio fundamental da proporcionalidade, que concederá ao caso concreto uma aplicação coerente e segura da norma constitucional, pesando a incidência que cada um deve ter, e, preservando-se assim, o máximo dos direitos e garantias consagrados constitucionalmente. Quando dois princípios jurídicos entram em colisão irreversível, um deles obrigatoriamente tem que ceder diante do outro, o que, porém, não significa que haja a necessidade de ser declarada a invalidade de um dos princípios, senão que, sob determinadas condições, um princípio tem mais peso ou importância do que outro e, em outras circunstâncias, poderá suceder o inverso (SCHAFFER, 2001, p. 62). Em análise final, tem-se que a utilização do princípio da proporcionalidade com a ponderação dos direitos fundamentais ou princípios constitucionais, deve ser feita à luz do caso concreto quando, de fato, haja uma colisão entre os mesmos, sem a necessária concordância entre ambos. Bonavides (2002, p. 397) conclui que “poderse-á enfim dizer, a esta altura, que o princípio da proporcionalidade é hoje axioma do Direito Constitucional, corolário da constitucionalidade e cânone do Estado de Direito”. Principle of proportional: the mediation of fundamental rights ABSTRACT People know that one of the characteristics of fundamental rights is their aspect of not being absolute and not being unlimited. Because of this, it would be collisions or relatives contradictions between those rights. In that way, it’s important the use of principle of proportional for a necessary mediation between then in the presence of concrete case. Nowadays, this is a principle with a constitutional status that search for ponder fundamental rights that conflict theirself across a proper adequacy of them to a concrete case with the rule of middle-end. Keywords: Principle of proportional. Fundamental rights. REFERÊNCIAS BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 2. ed. Brasília, DF: Brasília Jurídica, 2000. MACKENZIE 31 Cad. de Pós-Graduação em Dir. Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004. Cadernos de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico BOBBIO, Noberto. Teoria do ordenamento jurídico. 7. ed. Tradução Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. Brasília, DF: Unb, 1996. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Ed. Coimbra, 1992. GUERRA FILHO, Willis Santiago. 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Político e Econômico São Paulo, v. 4, n. 1, p. 23-32, 2004.