Matematicamente pensando: Conta Poupança Futuro
Carlos Morais
Uma das medidas publicitadas pelo Governo, salientadas nas Grandes Opções do
Plano 2010-2013, é a criação de uma conta Poupança Futuro para cada criança que
nasça em Portugal, tendo como objectivo o apoio à família e à natalidade.
Esta medida destina-se a estimular a natalidade, incentivar hábitos de poupança
e a continuação dos estudos. Poderá consistir num depósito bancário de 200 euros, que
só poderão ser mobilizados quando a criança atingir os 18 anos.
Estimular a natalidade, incentivar hábitos de poupança e a continuação dos
estudos são intenções com as quais facilmente se está de acordo. A forma como se
esperam concretizar estes objectivos, poderão passar por outros caminhos que não
tenham à partida incentivos que me parecem pouco dinâmicos e que talvez possam ter
resultados contrários aos esperados.
Estimando o número de nascimentos em Portugal, por ano, em 100 000 crianças,
podemos deduzir que aos muitos compromissos que o país já tem, acrescenta-se mais
um de 20 milhões de euros. Embora 20 milhões de euros correspondam a mais de 40
000 ordenados mínimos, é uma importância insignificante comparando-a com os
milhões que têm sido injectados em Bancos com dificuldades financeiras. O problema
não está no que se gasta, está essencialmente na forma como se gasta, nas prioridades
dos investimentos e na relação entre o que se gasta e o que se pode gastar.
As mais altas individualidades nacionais têm insistido no apelo à unidade
nacional. Ora essa unidade deve ser orientada para que a adesão tenha significado.
Orientada para responder às necessidades e aspirações dos que já nasceram, pois se os
que têm idade adulta conseguirem ter condições para serem homens e mulheres livres,
naturalmente, estão incentivados a terem filhos e a desejarem para estes o melhor.
Como se sentirão os pais de uma criança, aos quais falte quase tudo para
responderem às necessidades básicas da criança, sabendo que a criança tem 200 euros
no banco que só pode gastar quando tiver 18 anos?
Mais do que nunca o presente já tem mais força no futuro do que no passado. Já
não são as economias que os pais amealharam que garantem uma vida melhor para os
filhos, já não é a empresa que os pais criaram que garante o sucesso dos filhos, já não é
a alta formação científica ou tecnológica dos pais que garantem ou influenciam de
forma decisiva a profissão dos filhos, quando muito o que os pais são ou conseguiram
pode ajudar os filhos a ver mais longe ou a abrir caminhos a que estes, com muito
esforço, empenho e conhecimento poderão aceder ou percorrer.
Ensinar as crianças a tomarem opções, a perceberem que o dinheiro só é útil
quando ajuda a satisfazer necessidades ou a concretizar projectos é muito mais
importante do que ensinar a ter contas paradas que parecem de grande valor enquanto a
criança não tem a percepção do valor do dinheiro, ao mesmo tempo que são
completamente desprezíveis quando comparadas com as necessidades e aspirações de
um jovem de 18 anos.
Quando aceitamos que é fundamental educar as crianças para não termos
problemas com os adultos, penso que esta educação também deve integrar a educação
financeira. Não me parece que garantir duzentos euros às pessoas que estejam em
condições físicas para terem filhos possa ter alguma influência nos seus projectos de
vida, nem no das crianças que venham a utilizar tais benefícios.
Incentivem-se os jovens ao desenvolvimento da sua autonomia, financiando a
criação do seu próprio emprego, da sua própria empresa e abandonem-se as propostas
demagógicas, acerca das quais, penso que, nem quem as propõe acredita.
Morais, C. (2010). Matematicamente pensando: Conta poupança futuro. Mensageiro
Notícias, 11 de Fevereiro de 2010, p. 8.
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Morais, C. (2010). Matematicamente pensando: Conta poupança