Estado de conservação de Auto-retrato, Busto de António Soller e
Camponesa da Murtosa
Resumo
O presente estudo tem como objectivo a caracterização do estado de conservação de três
pinturas a óleo sobre Folha-de-Flandres, do pintor portuense Francisco José Resende (18251893). Para tal são descritos, isoladamente, os fenómenos de degradação presentes no
suporte, camadas pictóricas e protectoras de cada pintura, que apresentam problemáticas
de conservação distintas. Assim, Auto-retrato encontra-se em óptimo estado de conservação,
Busto de António Soller apresenta problemas de destacamento de camadas pictóricas em zonas
específicas. Já em Camponesa da Murtosa está presente uma falta de adesão generalizada da
camada pictórica e um processo de corrosão localizada do suporte metálico.
As três pinturas foram realizadas sobre Folha-de-Flandres, um suporte de ferro revestido por
estanho de ambos os lados. Ainda que, no século XIX, não fosse muito comum a utilização
de suportes metálicos para pintar, Francisco José Resende adoptou este material em várias
ocasiões. No caso destas três pinturas, sobre metal, podemos perceber como as problemáticas
de deterioração diferem se comparadas com as de um suporte têxtil ou de madeira.
Levantamento do estado de conservação da pintura Auto-retrato
Suporte metálico
O suporte metálico parece encontrar-se estável, sendo que a deterioração mais evidente
é relativa à existência de deformações topográficas. De facto, o suporte não se encontra
perfeitamente plano, apresentando deformações que tendem a acentuar-se quando este
se encontra sem tensão, como foi possível constatar aquando da separação da pintura da
respectiva moldura. Para tal, contribui, provavelmente, o facto de se tratar de um suporte de
espessura relativamente fina.
São perceptíveis deformações pontuais perto dos limites do suporte, causadas por uma
pressão excessiva dos pregos que prendem a pintura à moldura. Estas deformações, causadas
a partir do reverso, manifestam-se na parte frontal da pintura sob a forma de pequenas marcas
convexas. No canto superior direito existe uma deformação acentuada, causada possivelmente
por um impacto mecânico.
As áreas de acesso à superfície do metal são bastante reduzidas, já que pelo anverso se encontra
a pintura e pelo reverso uma camada pictórica monocromática, em toda a sua extensão.
Deste modo, apenas é possível observar, directamente, o suporte através de pequenas
lacunas de camada pictórica, que revelam a superfície do estanho. A lacuna da parte frontal,
provavelmente, recente revela uma superfície de aspecto brilhante, com um tom cinzento
claro. Já as lacunas do reverso apresentam uma coloração, ligeiramente, mais escura e mate,
possivelmente, devido à formação de uma fina camada de produtos de alteração do estanho.
Na lacuna da camada pictórica frontal é ainda possível observar um pequeno ponto de cor
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escura sobre o suporte, podendo tratar-se de um início de corrosão localizada do substrato
(Fig. 1d). Além deste ponto, é possível observar manifestações semelhantes em várias zonas
onde a camada pictórica é fina e bastante transparente (pela aplicação de pouco pigmento)
, como na zona dos olhos e barba. Julgamos ser possível deduzir que estes pontos escuros
possam estar presentes em mais zonas da pintura por baixo da camada pictórica (Fig. 1b).
Figura 1a - Fotografia geral com luz rasante esquerda, de
Auto-retrato. É possível observar as deformações convexas
no perímetro da pintura, resultantes da presença de pregos
pelo reverso, e a deformação no canto superior direito
Figura 1b - Fotografia de pormenor, Autoretrato. Nas zonas mais transparentes da
pintura podem-se observar pequenos pontos
escuros, do suporte. Ainda como, numa
intervenção anterior se tentou retocar alguns
desses pontos escuros, de forma a torná-los
menos visíveis.
As áreas de acesso à superfície do metal são bastante reduzidas, já que pelo anverso se encontra
a pintura e pelo reverso uma camada pictórica monocromática, em toda a sua extensão.
Deste modo, apenas é possível observar, directamente, o suporte através de pequenas
lacunas de camada pictórica, que revelam a superfície do estanho. A lacuna da parte frontal,
provavelmente, recente revela uma superfície de aspecto brilhante, com um tom cinzento
claro. Já as lacunas do reverso apresentam uma coloração, ligeiramente, mais escura e mate,
possivelmente, devido à formação de uma fina camada de produtos de alteração do estanho.
Na lacuna da camada pictórica frontal é ainda possível observar um pequeno ponto de cor
escura sobre o suporte, podendo tratar-se de um início de corrosão localizada do substrato
(Fig. 1d). Além deste ponto, é possível observar manifestações semelhantes em várias zonas
onde a camada pictórica é fina e bastante transparente (pela aplicação de pouco pigmento)1,
1 Além de visíveis com vista desarmada, estes pontos aparecem sob uma coloração escura na fotografia de fluorescência de
ultra-violeta e de infra-vermelho, o que auxilia na sua localização.
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como na zona dos olhos e barba. Julgamos ser possível deduzir que estes pontos escuros
possam estar presentes em mais zonas da pintura por baixo da camada pictórica (Fig. 1b).
Camada pictórica
A camada pictórica encontra-se em bom estado de conservação e com uma boa adesão,
relativamente, ao respectivo suporte metálico. Existe apenas uma lacuna de camada pictórica
situada na margem inferior, que fica encoberta pela moldura (Fig. 1d). A pintura apresenta
abrasões em várias zonas, ao longo de todo o seu perímetro, particularmente, na zona onde
a moldura se encosta à camada pictórica, sendo que algumas das referidas abrasões estão
cobertas por repintes.
Encontram-se ainda repintes pontuais executados por cima da camada pictórica. Estes
localizam-se especialmente no rosto, alguns parecem ter sido realizados para disfarçar os
pontos escuros do suporte. Estes repintes tornam-se mais facilmente perceptíveis através de
fotografia de fluorescência de ultra-violeta, revelando-se sob uma coloração escura.
Camada de revestimento do reverso
O reverso da obra apresenta uma camada pictórica de cor avermelhada que cobre todo o
suporte metálico. Trata-se de uma camada bastante espessa, que manifesta estalados
prematuros por toda a superfície, aparentemente pelo uso excessivo de agentes secativos,
não sendo de excluir, também, um possível excesso de óleo. Tal deverá ter servido o propósito
de permitir uma secagem mais rápida da camada, para que o autor pudesse, então, realizar a
inscrição.
Como referido, anteriormente, e tendo em conta que esta camada cobre todo o reverso,
constatamos existirem pequenas áreas nos extremos do painel onde a camada pictórica não
foi aplicada (Fig. 1c).
Camada de protecção
O verniz presente aparenta encontrar-se em bom estado, pouco amarelecido, apenas com
algumas sujidades pontuais por cima deste.
Figura 1c – Fotografia de pormenor do reverso.
Auto-retrato. São visíveis os estalados prematuros
da camada pictórica, zonas com grandes
empastamentos, e como a camada de tinta não foi
aplicada até ao limite do suporte, expondo assim a
superfície metálica.
Figura 1d – Microfotografia, ampliação de 3X,
margem inferior de Auto-retrato. Pormenor de lacuna
de camada pictórica, resultando no suporte à vista. É
possível observar a presença de um ponto escuro do
suporte, à semelhança dos que são visíveis nas zonas
de camada pictórica mais transparente.
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Levantamento do estado de conservação de Busto de António Soller
Suporte metálico
O suporte apresenta uma ligeira deformação côncava a meio da sua altura, perceptível
principalmente com luz rasante (Fig. 2b).
Figura 2b – Fotografia geral com luz rasante
esquerda, Busto de António Soller. A fotografia de
luz rasante salienta as zonas em destacamento de
camada pictórica e a leve deformação côncava do
suporte metálico.
Figura 2c – Fotografia de pormenor, margem direita
de Busto de António Soller. Lacunas de camada
pictórica, deixando á vista uma camada branca
preparatória. Na lacuna mais á direita é possível ver
pontos mais escuros, tratando-se do próprio suporte
metálico a vista.
Através das lacunas de camada pictórica é possível observar a superfície do estanho, de aspecto
cinzento e mate, que através de visualização com microscópio revela ainda uma aparência
pulverulenta (Fig. 2d). O aspecto mate resultará da formação de uma fina camada de produtos
de alteração do metal, após exposição deste ao meio envolvente.
Tal como em Auto-retrato, é perceptível a presença de alguns pontos escuros que parecem
manifestar-se a partir do próprio suporte, e não através da camada pictórica. São observáveis
a olho desarmado nas zonas de camada pictórica mais transparente, sendo que através de
fotografia de infra-vermelho se destacam por aparecerem sob uma tonalidade mais escura. Tal
como referido anteriormente, poderá tratar-se do início de um processo de corrosão localizada.
Pelo reverso é visível uma superfície de cor acinzentada clara, mate, de aspecto pouco
homogéneo, resultante de um processo de oxidação e formação de produtos de alteração. As
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incisões feitas pelo autor para a realização da inscrição parecem ter removido uma primeira
camada de óxidos do suporte ou quebrado o revestimento de estanho, pelo que é possível ver
produtos de corrosão alaranjados, provenientes do ferro do núcleo metálico (Fig. 2e).
Figura 2d – Microfotografia de pormenor de lacuna
pictórica, na veste negra, ampliação de 3,5X. Busto de
António Soller. A zona a preto corresponde a camada
pictórica, e a cinzenta ao suporte á vista
Figura 2e – Microfotografia de pormenor da
inscrição do reverso, letra “P”, do reverso da pintura.
Ampliação de 4X. Busto de António Soller.
Camadas pictóricas
Em cinco zonas distintas da pintura, localizadas nas representações do rosto e fundo, estão
presentes lacunas de camada pictórica, através das quais é visível uma camada preparatória
branca por baixo. Também nalguns pontos ao longo da margem (resultantes da zona de
contacto com a moldura) é possível ver indícios dessa preparação.
Já na zona das vestes e nos olhos, as lacunas de camada pictórica relevam apenas o suporte
metálico que se encontra por baixo, não parecendo estar presente nenhuma camada branca
subjacente2.
Em várias zonas a camada pictórica evidencia um processo de empolamento e destacamento
(Fig. 2d), problemáticas que parecem estar associadas à utilização de pigmentos negros e
castanho-escuro específicos. Nas restantes cores, incluindo outros castanhos mais claros e
outras zonas negras/acinzentadas, a camada pictórica revela uma boa adesão em relação ao
suporte metálico.
As zonas em destacamento situam-se no interior dos olhos, uma parte do bigode e barba e
várias zonas do casaco. Neste, os destacamentos sucedem em localizações específicas, como
linhas de contorno, parecendo estar presente, perceptível pela cor, um pigmento ou mistura
de pigmentos diferente das restantes zonas do casaco que se encontram em bom estado de
conservação. Também nos olhos se apreende que estão presentes dois pigmentos castanhos
distintos (ou talvez um castanho com pigmentos pretos), não só pela coloração visível, mas
2 Na fotografia de fluorescência de U.V. as lacunas de camada pictórica onde é possível ver o suporte apresentam-se num tom
muito escuro. Já as lacunas de camada pictórica onde é visível uma camada preparatória por baixo das mesmas, apresentam
uma fluorescência amarelada devido à presença de pigmento branco
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também porque fluorescem de forma distinta perante radiação ultra-violeta e absorvem
diferentemente a radiação infra-vermelha (Figs. 2f, 2g, 2h). Na fotografia de infravermelho
percebemos que nas zonas em destacamento surgem ainda pequenos pontos brilhantes, não
perceptíveis com luz visível, em zonas onde a camada pictórica se está a destacar3.
Existe ainda um repinte, imediatamente, acima da zona da cabeça, sobre o fundo verde, que
se apresenta numa coloração mais escura sob radiação ultra-violeta.
Figuras 2f – Fotografia de
pormenor de luz rasante direita;
Busto de António Soller.
Figuras 2g – Fotografia de
pormenor de infra-vermelho;
Busto de António Soller.
Figuras 2h – Fotografia de
pormenor da fluorescência de
ultra-violeta. Busto de António
Soller.
Camada de protecção
Está presente um verniz muito brilhante e espesso que, provavelmente, não terá sido aplicado
originalmente pelo autor dada a forma descuidada e heterogénea com que se apresenta,
tendo sido também deixados muitos pêlos da trincha de aplicação.
Levantamento do estado de conservação da pintura Camponesa da Murtosa
Suporte metálico
À semelhança dos suportes metálicos das duas outras pinturas, Camponesa da Murtosa foi
realizada sobre Folha-de-Flandres, uma placa de ferro revestida por estanho. No entanto, dos
três suportes este é aquele que apresenta maiores problemáticas de deterioração, visto ser
patente, no mesmo, um processo de corrosão pontual.
O suporte evidencia algumas deformações topográficas, uma delas localizada no canto
superior direito e as outras duas, sensivelmente paralelas, na metade esquerda da margem
superior (Fig. 3b). Quando não se encontra sob tensão, ou seja preso na moldura, o substrato
revela uma ligeira deformação côncava.
Pelo reverso apreciam-se, claramente, problemas de corrosão do suporte, perceptíveis através
da presença de produtos de alteração presentes de cor alaranjada provenientes do ferro do
3 Torna-se difícil interpretar se estes pontos brilhantes que aparecem na fotografia de infra-vermelho se manifestam a partir
do suporte, em zonas onde o metal poderá ainda ter uma camada de estanho brilhante e reflectora, passando a radiação
infra-vermelha através de pontos de quebra da camada pictórica, que se encontra em destacamento. De facto, estes pontos
brilhantes não se manifestam nas lacunas de camada pictórica onde se vê directamente o suporte. Pode-se também levantar
a hipótese de estes pontos brilhantes aparecerem assim devido a algum composto no pigmento responsável pela degradação
presente nessa zona dos olhos, já que se delimita mais ou menos com a zona degradada.
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suporte metálico, parecendo ter-se estabelecido um processo de corrosão pontual4 (Fig. 3c).
Pela parte frontal o mesmo problema não é visível de forma tão acentuada, possivelmente
devido ao facto de as camadas pictóricas fornecerem alguma protecção contra a humidade.
Assim, através das várias lacunas de camada pictórica é visível o suporte cinzento-escuro de
aspecto mate, correspondente ao revestimento de estanho com uma fina camada de produtos
de alteração. Nalgumas lacunas é perceptível um tom alaranjado/acastanhado, resultante de
produtos de oxidação do ferro. Inclusivamente em algumas zonas cromáticas, especialmente
as mais claras, como no céu, nota-se um tom alaranjado derivado muito provavelmente
da migração de produtos de alteração do ferro através das camadas pictóricas. Facto este
que, como veremos de seguida, poderá estar a contribuir para os destacamentos de camada
pictórica.
Figura 3b - Fotografia de luz rasante direita.
Camponesa da Murtosa. São visíveis deformações
topográficas do suporte, localizadas na margem
superior. Com luz rasante são também notórias
as zonas de camada pictórica em bolha ou em
destacamento.
Figura 3c - Pormenor do reverso da Camponesa da
Murtosa, evidenciando um processo de corrosão
localizada.
4 Num sistema como a Folha-de-Flandres, o metal aplicado externamente, o estanho, serve como protector ou barreira
física do metal que se encontra no interior, ferro, passível de sofrer mais facilmente um processo de corrosão. No entanto, se
houver alguma falha na continuidade do metal externo, pode começar a iniciar-se um processo de corrosão galvânica. Formase deste modo uma célula electroquímica, existindo zonas anódicas e catódicas em contacto com o mesmo electrólito (água).
O metal mais activo, o ferro, torna-se o ânodo, no qual ocorre perda de electrões e oxidação. O cátodo é o metal menos activo
(mais nobre), neste caso o estanho, onde ocorre um ganho de electrões e um processo de redução.
A corrosão electrolítica pode iniciar-se com a presença de humidade pelo reverso do suporte de metal, ou na interface com a
pintura, podendo a humidade depositar-se nos vazios presentes nessa interface.
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Camadas pictóricas
A pintura evidencia um grave problema de destacamento das camadas pictóricas, notório em
praticamente toda a superfície da obra, devido a uma falta de adesão generalizada entre o
suporte e as camadas de pintura. As únicas zonas que não aparentam ter esta problemática
são as partes brancas da veste, áreas do céu perto da linha do horizonte e algumas porções
do rosto e do chapéu vermelho. Tal poderá ser fruto da presença de branco de chumbo e de
camadas com maior poder de cobertura e impermeabilização face à penetração de humidade
e oxigénio. É ainda visível como, em todo o perímetro da pintura, as camadas evidenciam uma
melhor adesão ao suporte. Tal deve-se, provavelmente, ao facto de nessas zonas as camadas
pictóricas estarem protegidas pela moldura (retirada para fotografar), não se encontrando
assim tão sujeitas a variações de humidade, ou estas variações terem sido absorvidas pela
própria moldura.
Conforme também sucede em Busto de António Soller, a camada pictórica parece formar
bolhas, ou seja, retrair-se, mudando de aspecto e textura, e separar-se da zona de contacto
com o suporte. De seguida, poderá fissurar e destacar-se completamente (Fig. 3d).
Em várias zonas a camada pictórica já se destacou do suporte metálico, originando assim várias
lacunas através das quais o suporte metálico se encontra exposto.
Figura 3d – Fotografia de pormenor do céu em Camponesa da Murtosa, sendo visíveis zonas em
destacamento e lacunas de camada pictórica.
Camada de protecção
Observando a pintura através de luz visível, esta não parece possuir uma camada de protecção,
sendo que através de fluorescência de ultra-violeta se torna também complicado comprovar
a sua existência, já que não parece haver uma fluorescência geral. No entanto, caso exista um
verniz, este não estará a cumprir a sua função protectora já que se encontrará com muitas
falhas de continuidade, e ter-se-á destacado também nas lacunas de camada pictórica.
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Conclusão
As três pinturas, todas elas realizadas a óleo sobre Folha-de-Flandres e de execução temporal
próxima, apresentam problemáticas de conservação distintas, relativamente, ao suporte e
camadas pictóricas, sendo que a que se encontra em melhor estado é a do Auto-retrato.
Em Busto de António Soller e Camponesa da Murtosa as camadas pictóricas apresentam um
grave problema de formação de bolhas e destacamentos, ainda que na pintura referida em
primeiro lugar este processo seja pontual e, presumivelmente, associado a um pigmento,
enquanto em Camponesa da Murtosa está presente uma falta de adesão geral. Um facto
curioso, comparando estas pinturas sobre metal com outras sobre suportes de tela ou madeira,
é a ausência de estalados de envelhecimento natural naquelas, devido ao suporte metálico
não se movimentar, particularmente, com diferenças de valores de humidade e temperatura.
Para a degradação destas pinturas poderão ter influído factores de origem intrínseca,
relacionados com os materiais presentes e processo de execução, e também factores
extrínsecos, derivados de exposição a agentes externos.
Nos primeiros podemos considerar factores como a uniformidade e processo de polimerização
do aglutinante, contacto deficiente aquando da aplicação das camadas pictóricas devido a
elevada tensão superficial, ou presença de impurezas. É conveniente reflectir no facto de
alguns pigmentos, como branco de chumbo, poderem permitir a formação de um filme com
maior poder de cobertura e menor permeabilidade do que outros, nomeadamente, pelo
diferente índice de absorção de aglutinante.
Relativamente aos factores extrínsecos, é importante considerar o papel do meio envolvente,
nomeadamente no que concerne o contacto com oxigénio, poluentes e humidade, pois a
penetração desta através da camada pictórica e deposição na interface entre suporte metálico/
camadas pictóricas poderá propiciar uma diminuição da falta de adesão. Inclusivamente, em
Camponesa da Murtosa parece estar a acontecer uma formação de produtos de alteração do
ferro, que poderão vir a propiciar a referida falta de adesão.
Após a exposição dos problemas concretos de conservação presentes nestas pinturas, iremos,
em estudo posterior, analisar de forma mais detalhada os fundamentos da problemática da
degradação de pinturas a óleo sobre suportes metálicos, com vista à sua melhor compreensão.
Referências
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pictórico. 2ª ed. San Sebastián: Nerea, 2008.
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PAVLOPOULOU, Lydia-Chara – Oil Paint on Copper: a study of decay mechanisms. MSc Thesis.
2004. Acessível em University of Wales College, Cardiff.
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REVIE, R. Winston (ed.) – Uhlig’s Corrosion Handbook. Electrochemical Society Series. 2ª ed.
New York:John Wiley & Sons, 2000.
SELWYN, Lyndsie – Metals and Corrosion, a handbook for the Conservation Professional.
Canada: Institut Canadien de Conservation, 2004.
VOLFOUSKY, Claude (ed.) – La Conservatión des Metaux. Paris: CNRS Éditions, 2001.
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