INFLUÊNCIA DO TEMPO E DA TEMPERATURA DE VAZAMENTO
SOBRE A ESTRUTURA DOS NÓDULOS E PROPRIEDADES MECÂNICAS
DE UM FERRO FUNDIDO NODULAR NO ESTADO BRUTO DE
FUNDIÇÃO
Douglas F. Vidal¹* (D), Lioudmila A. Matlakhova¹, Dilmar C. Finamore²
1- Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – UENF, Campos - RJ, [email protected]
2- PAM Saint-Gobain Canalização
Resumo:
Este trabalho mostra a influência do tempo e da temperatura de vazamento na formação dos nódulos e nas propriedades
mecânicas de um ferro fundido nodular. Estudou-se oito ligas da mesma panela, tratada com Fe-Si 75% e Mg, que se
diferenciaram em tempos e temperaturas de vazamento, durante a fundição em moldes de areia e resfriamento lento.
Foram feitas avaliações qualitativas e quantitativas da estrutura com técnicas de microscopia ótica. As propriedades
mecânicas foram caracterizadas por ensaio de tração em corpos de prova padronizados. Observou-se a presença de
nódulos regulares e irregulares na matriz de ferrita/perlita e variação do tamanho médio dos nódulos. Os nódulos
irregulares se formam por aglomeração de partículas de C, que se intensifica com o aumento do tempo e redução da
temperatura de vazamento. Notou-se também um aumento na quantidade de cementita livre (Fe3C) nas ligas vazadas em
maiores tempos e menores temperaturas. A formação dos nódulos irregulares e a presença de Fe3C conduziram a
redução da resistência mecânica e do alongamento das ligas.
Palavras - chave: Grafita nodular, ferro fundido nodular, tempo e temperatura de vazamento, propriedades
mecânicas, analise estrutural.
INFLUENCE OF TIME AND TEMPERATURE IN NODULAR GRAPHITE STRUCTURE
AND MECHANICAL PROPERTIES TO A CAST DUCTILE IRON IN MOLTEN CONDITION
Abstract:
This work shows the influence of time and pouring temperature in the formation of nodules and mechanical properties
of a nodular cast iron. Eight alloys from a single pot, treated with 75% FeSi and Mg were studied. The alloys were cast
at different times and temperatures in sand molds and cooled slowly. Qualitative and quantitative assessments of the
structure, using optical microscopy techniques, were made. The mechanical properties were characterized by tensile
testing on standardized test specimens. It was observed the presence of regular and irregular nodules and variation of
the average size of the nodules. The irregular nodules are formed by agglomeration of carbon particles. That intensifies
with time increasing and temperature reduction. It is also noted an increase in the amount of Fe3C in the alloy castings
in longer times and lower temperatures. The formation of irregular nodules and the presence of Fe3C led to reduced
mechanical strength and elongation of nodular cast iron.
Keywords: nodular graphite, ductile iron, time and temperature, mechanical properties, structural analysis
Introdução
O ferro fundido nodular consiste numa liga ternária de Fe - C - Si, que se diferencia dos demais
tipos de ferro fundido devido à grafita se apresentar na forma de nódulos esféricos, distribuídos
sobre a matriz (de ferrita, perlita ou de ferrita/perlita), promovendo sua continuidade por toda a
estrutura do material. Essa característica peculiar da grafita, associada à matriz, confere valores de
alongamento relativo (AR) na faixa de 2% a 22%, associados a valores de limite de resistência à
tração (LRT) entre 900 MPa e 380 MPa [6].
A grafita nodular é formada pelos tratamentos de inoculação (adição de Fe-Si) e nodulização
(adição de Mg) [1-4]. Após os tratamentos, o metal é vazado em moldes, iniciando a solidificação
da peça. O aumento do tempo e a redução da temperatura de vazamento do metal tratado favorecem
a mudança na forma da grafita. Nota-se a redução da regularidade dos nódulos, pela crescente
presença de nódulos incertos do tipo V, além dos nódulos regulares do tipo VI (ISO 945/1975).
Outro fator observado é a variação do tamanho médio dos nódulos [5].
O presente trabalho tem como objetivo demonstrar as alterações na estrutura dos nódulos de
grafita provocadas pela variação do tempo e da temperatura de vazamento de um ferro fundido
nodular no estado bruto de fundição, e seus efeitos sobre as propriedades mecânicas.
Experimental
Para a realização deste trabalho, foi empregado um ferro fundido nodular, produzido na
Empresa Pam Saint-Gobain Canalização. O metal base com a composição inicial mostrada na tabela
1 passou pelo tratamento de inoculação com Fe-Si 75% e nodulização com Mg. Foram obtidas oito
ligas em estado bruto de fundição, vazadas em diferentes tempos e temperaturas computados a
partir do término da inoculação e da nodulização. Depois de vazadas, as ligas foram submetidas à
análise química. Os parâmetros de vazamento e a composição química das ligas tratadas estão
apresentados na tabela 2.
Tabela 1: Composição química
de metal-base.
Tabela 2: Parâmetros de vazamento e composição
química de metal tratado.
As ligas depois de solidificadas foram usinadas para a produção dos corpos de prova
indicados para ensaio mecânico de tração. Após a realização dos ensaios, as ligas foram
seccionadas, preparadas metalograficamente e submetidas à observação em microscópio ótico para
a caracterização microestrutural. Foram obtidas micrografias antes e após o ataque químico em
regimes de campo claro e campo escuro, com o uso de câmera acoplada ao microscópio Neophot-32
e software Intervideo WinDVR. A observação das superfícies em estado quimicamente não atacado
permitiu a quantificação dos nódulos através da técnica do padrão linear (método de Rossival). O
padrão linear foi calibrado para um aumento de 80X e aplicado 25 vezes em cada liga para a
quantificação dos nódulos. Os dados obtidos foram tratados estatisticamente, permitindo a obtenção
de tamanho médio dos nódulos em cada liga. Os ensaios de tração para caracterização das
propriedades mecânicas foram realizados na máquina Kratos, com velocidade de deformação de 0,1
mm/s e célula de carga de 30000kgf.
Resultados e Discussão
A análise qualitativa das micrografias das ligas, observadas em estado quimicamente não
atacado, sob regime de campo claro (CC), demonstrada na fig. 1 permitiu observar a distribuição
homogênea dos nódulos de grafita na matriz metálica por toda a extensão das amostras para os
diferentes tempos e temperaturas de vazamento. A microestrutura das ligas, vazadas entre 1361ºC
(T1/10 min.) e 1286ºC (T4/25 min.), apresentam em sua maioria nódulos de grafita do tipo VI
distribuídos uniformemente na matriz metálica. As ligas vazadas entre 1261ºC (T5/30 min.) e
1222ºC (T8/45 min.), além dos nódulos do tipo VI, apresentam também a presença de nódulos do
tipo V, indicando que a redução da temperatura e o aumento do tempo de vazamento são fatores que
comprometem a nodulização da grafita.
Figura 1: Micrografias de ferros fundidos nodulares para diferentes tempos e temperaturas de vazamento
após os tratamentos de inoculação e nodulização. Sem ataque. Neophot 32. Aumento 50 X, CC : a) T1, b)
T2, c) T3, d) T4, e) T5, f) T6, g) T7 e h) T8.
A observação das ligas em estado quimicamente não atacado sob regime de campo escuro CE (fig.2), demonstra além dos nódulos tipo V e VI, a presença de pequenas partículas de grafita
distribuídas pela matriz para todos os tempos e temperaturas de vazamento. Tal fato fica mais
visível na liga T3 (1310ºC\20 min.). Nota-se que as partículas se aglomeram aumentando de
tamanho, de modo mais evidente na liga T5 (30 min. / 1261ºC). Essa aglomeração dá origem a
novos nódulos (tipo V) que possuem menor tamanho, quando comparados aos nódulos do tipo VI.
Figura 2: Distribuição e aglomeração de pequenas partículas de C. Micrografias sem ataque; Neophot-32.
Aumento 50X, CE : a) T1, b) T2, c) T3, d) T4, e) T5, f) T6, g) T7 e h) T8.
A fig. 3 mostra a variação do tamanho médio dos nódulos de grafita em função do tempo e
da temperatura de vazamento. Essa variação pode ser explicada da seguinte forma:
- Diminuição do tamanho médio entre T1 (1361ºC/10min.) e T2 (1324ºC/15min.): Com a
diminuição da temperatura ainda no campo bifásico (líquido + grafita), o fator termodinâmico
favorece o crescimento de nódulos já existentes, bem como a formação de pequenos núcleos de
grafita.
- Aumento do tamanho médio entre T2 (1324ºC/15min.) e T3 (1310ºC/20min): Seguindo com a
redução da temperatura, o líquido se empobrece em carbono (C), que é difundido para os núcleos
anteriormente formados, aumentando assim o tamanho médio dos nódulos.
- Estabilização do tamanho médio, entre T3 (1310ºC/20min.) e T6 (1251ºC/35min.): Com o
resfriamento a temperaturas ainda mais baixas, a solidificação passa a ser influenciada pelo
mecanismo metaestável (Fe + Fe3C), onde uma parte do C presente no líquido passa a ser
consumido para a formação de Fe3C (fig. 5).
- Redução do tamanho médio entre T6 (1251ºC/35min.) e T8 (1222ºC/45min.): Com o resfriamento
a temperaturas ainda menores, a influência do mecanismo metaestável passa a ser mais intensa, e,
conseqüentemente, uma maior quantidade de C presente no líquido é consumido na formação de
Fe3C (Fig. (4).
Tamanho médio de nódulos de grafita (µm)
10
T1
15
20
25
30
35
40
T2
T3
T4
T5
T6
T7
45 (min.)
T8
36
32
28
24
20
1360
1340
1320
1300
1280
1260
1240
1220
Temperatura de vazamento (oC)
Figura 3: Variação do tamanho médio dos nódulos em função do tempo e da temperatura de vazamento.
Figura 4: Pequenos nódulos de carbono (a-h) e nódulos de grafita (e,f,g) distribuídos sobre as regiões de
perlita e ferrita, e cementita (d,f,h). Aumento: 400X, CC. a) T1, b) T2, c) T3, d) T4, e) T5, f) T6, g) T7 e h)
T8.
Após a quantificação dos nódulos, as ligas sofreram ataque químico, revelando uma matriz
ferritica/perlitica com predominância de ferrita. Observou-se a presença de pequenos nódulos de
grafita junto à região perlitica para todos os tempos e temperaturas. Notou-se ainda a existência da
cementita livre para as menores temperaturas de vazamento entre T4 (1286ºC /25min.) e T8
(1222ºC/45min.).
A fig. 5 demonstra uma tendência da variação das propriedades mecânicas em função do
tempo e da temperatura de vazamento. A forma da grafita, o processo de aglomeração com
formação de nódulos tipo V, e a presença de Fe3C influenciam no limite de resistência e no
alongamento. As ligas vazadas com maiores temperaturas e menores tempos (T1 a T3) apresentam
os maiores valores de resistência à tração e de alongamento relativo, o que está relacionado com a
presença dos nódulos regulares (tipo VI) na estrutura. A partir de T3 observa-se uma redução do
limite de resistência (de T3 a T5) e do alongamento relativo (de T3 a T4). Isso ocorre em função do
processo de aglomeração de partículas de carbono e formação de maior quantidade de nódulos
incertos (tipo V). Alem disso, as temperaturas mais baixas a partir de T4 aumentam a tendência de
formação de Fe3C, influenciando também na redução do limite de resistência e no alongamento
observado nos maiores tempos e menores temperaturas de vazamento, até T8.
Figura 5: Variação do tempo e da temperatura de vazamento sobre as propriedades mecânicas dos ferros
fundidos nodulares.
Conclusões
Após a analisar os resultados, pode-se afirmar que o tempo e a temperatura de vazamento
influenciam na estrutura da grafita nodular, de modo que para os primeiros tempos de vazamento,
nas temperaturas mais elevadas formam-se nódulos de grafita regular (tipo VI), com tamanho médio
variando entre 29,7µm e 33,3µm. Com a redução da temperatura (até 1222o C) e aumento do tempo
de vazamento (45min), formam-se nódulos incertos, do tipo V, resultantes do processo de
aglomeração das partículas de grafita.
A partir de T4 (1286ºC/25min.), o processo passa a sofrer influência do sistema metaestável
de resfriamento, resultando no aparecimento de Fe3C. A cementita inicialmente impede o aumento
do tamanho médio dos nódulos, mantendo-os entre 32,18µm e 33,3µm. A partir de T5 (30min
/1261ºC), o processo de aglomeração torna-se dificultado em função do aumento da influência do
sistema metaestável. Tem-se um aumento da quantidade de Fe3C e uma redução do tamanho médio
dos nódulos de grafita.
Com a formação dos nódulos incertos e presença crescente de Fe3C na matriz, ocorre
redução dos valores de resistência a partir de T3, para todas as amostras, quando comparados com
os valores obtidos em T1, T2 e T3. O alongamento se mostra bastante influenciado pelos mesmos
fatores no 1º ensaio.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao apoio financeiro da CNPq e CAPES. Agradecem a Empresa PAM
Saint-Gobain Canalização, por ceder do material estudado, e pelo apoio na realização de análises
químicas.
Referências Bibliográficas
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COLE, G.S. “Solidification of ductile iron”, AFS Transactions of the American Foundrymen’s
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FERNANDES JUNIOR, L. Produção de ferros fundidos cinzentos, nodular e aços em fornos
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GOMES, O de F. M. & PACIORNIK, S. Automatic classification of graphite in ast iron. Microscopy and
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6.
GUESSER, W L. Propriedades mecânicas dos ferros fundidos, 1ª edição, São Paulo, Blucher,
2009
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