AS AÇÕES JUDICIAIS MOVIDAS CONTRA O PODER PÚBLICO
PLEITEANDO A CORREÇÃO DE URV. PRESCRIÇÃO.
IMPROCEDÊNCIA.
Gina Copola
(outubro/2.014)
I – Alguns entes públicos têm sido surpreendidos
recentemente com ações judiciais cujo objeto é a correção de URV instituída em
1.994. O pleito formulado é o de pagamento das correções de URV mês a mês
até a presente data.
Olvidam-se os autores de tais ações, assim como seus
nobres causídicos, que vivemos em um Estado Democrático de Direito cujos pilares
são a supremacia da Constituição Federal, a separação dos Poderes, e a Garantia
aos Direitos Individuais, dentre os quais figura a segurança jurídica, com a
consequente observância do prazo prescricional estabelecido em lei.
E, assim, o direito subjetivo de argüir e fundamentar
deve respeitar o lapso temporal determinado pela legislação aplicável, sendo
certo, portanto, que se revelam absolutamente prescritas tais referidas ações
judiciais pleiteando o correção de URV ocorrida em 1.994.
Isso porque no caso em tela opera a prescrição quinquenal
preconizada pelo art. 1º, do Decreto federal nº 20.910/32, assaz de vezes
suscitado em Juízo em ações movidas contra o Poder Público.

Advogada militante em Direito Administrativo. Pós-graduada em Direito Administrativo pela FMU.
Ex-Professora de Direito Administrativo na FMU. Autora dos livros Elementos de Direito Ambiental, Rio
de Janeiro: Temas e Idéias, 2.003; Desestatização e terceirização, São Paulo: NDJ – Nova Dimensão
Jurídica, 2.006; A lei dos crimes ambientais comentada artigo por artigo, Minas Gerais: Editora Fórum, 2.008, e
2ª edição em 2.012, e A improbidade administrativa no Direito Brasileiro, Minas Gerais: Editora Fórum,
2.011, e, ainda, autora de diversos artigos sobre temas de direito administrativo e ambiental, todos
publicados em periódicos especializados.
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II - Com efeito, a conversão da moeda em URV não se
refere a prestações sucessivas ou continuadas, uma vez que ocorreu em ato
único, em 1.994, tornando-se de efeitos concretos, conforme já decidiu o e.
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da Apelação Cível nº
937.228-5/6-00, relator Des. RICARDO DIP, 11ª Câmara de Direito Público,
julgado em 10/09/2009, com o seguinte voto relator:
“A aludida conversão emergiu em ato
único, em 1994, e, a meu ver, esse ato tornou-se de efeitos
concretos, ao par de definir os critérios que, na sequencia,
repercutiram nas prestações remuneratórias continuadas. Faz já
15 anos que esses critérios se definiram. Servidores que estavam,
então, em atividade, e, até mesmo, outros que acederam
posteriormente ao serviço público, reclamam de supostos erros
de definição. É caricatural, mas, coerentemente, seria então
possível discutir sobre os critérios usados para calcular nossos
reais convertidos em cruzeiros, no ano de 1942, ou o corte de
centavos, em 1964, a passagem a cruzeiros novos (1965), o
regresso a cruzeiros (em 1970), a nova supressão de centavos (em
1984), a chegada dos cruzados (1986), que se mudaram em novos
(1989), tornaram a ser cruzeiros (1990), fizeram-se cruzeiros
reais( 1993), até chegarem à versada conversão em reais (1994).
De fato, se não houver prescrição do fundo de direito quando à
conversão dos cruzeiros em reais, por que haveríamos de
reconhecer símile prescrição nas demais conversões? Já nos
veríamos a discutir se as velhas patacas foram bem convertidas
em cruzeiros, na primeira metade do nosso Século XX. 4. Ora,
quando o Poder Público, de modo expresso, define a situação
jurídica frontal de que emergem as prestações remuneratórias, é
da definição administrativa inaugural que nasce a pretensão, e é
dela que tem curso o prazo prescricional, valendo aqui lembrar o
paradigmático voto do Ministro Moreira Alves , do egrégio
Supremo Tribunal Federal, no RE 110.419 (rel. Ministro Octavio
Gallotti): “Fundo de direito é a expressão utilizada para significar
o direito de ser funcionário (situação jurídica fundamental) ou os
direitos a modificações que se admitem com relação a esta
situação
jurídica
fundamental,
como
reclassificações,
reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço,
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direito a gratificação por prestação de serviço especial, etc. A
pretensão do fundo de direito prescreve, em direito
administrativo, em cinco anos a partir da data da violação dele,
pelo seu não reconhecimento inequívoco.”
No mesmo diapasão, o e. Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo proferiu o recentíssimo venerando acórdão na Apelação nº
0019139-22.2013.8.26.0053, relator Des. AROLDO VIOTTI, 11ª Câmara de Direito
Público, julgado em 7 de outubro de 2.014, que se valeu do venerando voto do
eminente Des. RICARDO DIP acima transcrito como razões de decidir.
Salta aos olhos, portanto, que o direito subjetivo de
arguir e fundamentar em ações propostas contra o Poder Público pleiteando a
correção de URV de 1.994 está prescrito, porque se passaram mais de cinco
anos do ato impugnado, conforme tem entendido a mais recente jurisprudência.
III – Mas não é só.
Quanto ao mérito propriamente dito, via de regra tais
ações também restam absolutamente improcedentes.
Isso porque seus respectivos autores não logram êxito
em demonstrar o prejuízo efetivamente sofrido.
Além disso, tem-se que os autores utilizam como
fundamento da ação a Lei federal nº 8.880, de 1.994, que, conforme a
jurisprudência tem decidido é aplicável somente à União Federal, e aos
particulares, e, portanto, estão excluídos os demais entes da Federação.
O e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em
recentíssimo r. acórdão proferido nos autos da Apelação nº 301264136.2013.8.26.0576, relator Des. SIDNEY ROMANO DOS REIS, 6ª Câmara de
Direito Público, julgado em 13 de outubro de 2.014, decidiu com a seguinte
ementa:
“Apelação Cível – Servidor Público do
Estado – Diferença de vencimentos – Conversão em URV –
Ação julgada procedente – Reexame Necessário e recurso
voluntário da SPPREV – Provimento de rigor. (....)
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2. Do mérito – Efetivamente
inadmissível o pagamento da diferença almejada pelo autor –
Primeiro porque no caso da conversão em URV (Lei Federal
8.880/94) a determinação se aplica à área federal e aos
trabalhadores da iniciativa privada, não podendo ser aplicada aos
servidores públicos estaduais, sob pena de ingerência de um ente
Estatal em outro além do que, não cabe ao Poder Judiciário
promover a adequação de vencimentos usurpando a função
legislativa – Afora isto, não lograra o autor em demonstrar o
efetivo prejuízo alegadamente suportado quando da conversão
da URV e, portanto, desarrazoada a pretensão formulada –
Precedentes da Corte – Sentença reformada – Demanda julgada
improcedente.”
O r. acórdão que cita precedentes do e. TJSP é
enfático em decretar que o autor não lograra êxito em demonstrar o efetivo
prejuízo.
IV – E no mesmo diapasão, é o outro r. acórdão do e.
TJSP proferido na mesma data do anterior – 13 de outubro de 2.014 – também
pela 6ª Câmara de Direito Público, relator Des. SIDNEY ROMANO DOS REIS, é no
mesmo diapasão.
Vejamos:
“Apelação Cível – Servidor Público
Estadual – Conversão em URV – Ação julgada procedente –
Reexame necessário e Recurso voluntário da FESP. (...)
2. No mais, inadmissível o pagamento
da diferença almejada pelo autor – Primeiro porque no caso da
conversão em URV (Lei Federal 8.880/94) a determinação se
aplica à área federal e aos trabalhadores da iniciativa privada, não
podendo ser aplicada aos servidores públicos estaduais, sob pena
de ingerência de um ente Estatal em outro além do que, não cabe
ao Poder Judiciário promover a adequação de vencimentos
usurpando função legislativa – Afora isto, não logrou o autor em
demonstrar o efetivo prejuízo alegadamente suportado quando
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da conversão da URV e, portanto, desarrazoada a pretensão
formulada – Precedentes da Corte.”
E mais uma vez o e. Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, com a citação de precedentes no mesmo sentido, decretou a
improcedência de ações como a aqui comentada.
V – E também no mesmo sentido, já decidiu o egrégio
Supremo Tribunal Federal, em Embargos de Declaração em Agravo de
Instrumento nº 856773/MG, tel. Ministro LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado
em 05/02/2013, com a seguinte ementa:
“Ementa:
EMBARGOS
DE
DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
OPOSTOS DE DECISÃO DO RELATOR. CONVERSÃO
EM AGRAVO REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. URV.
CONVERSÃO. AUSÊNCIA DA PRELIMINAR DE
REPERCUSSÃO GERAL. ARTIGO 543-A, § 2º, DO CPC.
C/C ARTIGO 327, § 1º, DO RISTF. 1. Os embargos de
declaração opostos objetivando reforma da decisão do relator,
com caráter infringente, devem ser convertidos em agravo
regimental, que é o recurso cabível, por força do princípio da
fungibilidade. (Precedentes: Pet 4.837-ED, rel. Min. CÁRMEN
LÚCIA, Tribunal Pleno, DJ 14.3.2011; Rcl 11.022-ED, rel. Min.
CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJ 7.4.2011; AI 547.827ED, rel. Min. DIAS TOFFOLI, 1ª Turma, DJ 9.3.2011; RE
546.525-ED, rel. Min. ELLEN GRACIE, 2ª Turma, DJ
5.4.2011). 2. A repercussão geral, como novel requisito
constitucional de admissibilidade do recurso extraordinário,
demanda que o recorrente demonstre, fundamentadamente, que
a irresignação extrema encarta questões relevantes do ponto de
vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os
interesses subjetivos da causa, conforme disposto no artigo 543A, § 2º, do Código de Processo Civil, introduzido pela Lei n.
11.418/06, verbis: O recorrente deverá demonstrar, em
preliminar do recurso, para apreciação exclusiva do Supremo
Tribunal Federal, a existência de repercussão geral. 3. Esse
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entendimento restou confirmado por esta Corte no julgamento
do AI n. 797.515-AgR, Relator o Ministro Joaquim Barbosa,
Segunda Turma, Dje de 28.02.11. 4. In casu, o acórdão recorrido
assentou: “DIREITO ADMINISTRATIVO - SALÁRIO CONVERSÃO - URV - AUTORA - PREJUÍZO COMPROVAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO EM
PERÍCIA EM RELAÇÃO À AUTORA - RECOMPOSIÇÃO
NÃO DEVIDA À MESMA. Comprovado nos autos através
de perícia que a autora, servidora do executivo, não teve
prejuízo na conversão de seu salário em URV, através da
utilização da lei estadual em detrimento da lei federal, em
favor dessa servidora não cabe a recomposição salarial
pretendida.” 5. Agravo regimental a que se nega
provimento.” (Grifamos).
Salta aos olhos, portanto, que as ações que pleiteiam as
correções de URV precisam ser fundamentas em vasta comprovação do prejuízo
sofrido por seus autores.
O ônus da prova é de quem alega.
VI – Em breve conclusão, portanto, tem-se que:
a) as ações que pleiteiam a correção de URV de 1.994
movidas contra o Poder Público estão prescritas por força do disposto no
vetusto Decreto 20.910/32;
b) e, mesmo que assim não fosse, quanto ao mérito
propriamente dito, tais ações em geral são improcedentes, uma vez que recebem
fundamento errado já que a Lei federal n 8.880/94 não é aplicável aos Estados e
Municípios, sendo aplicável somente à União Federal e aos particulares;
c) além disso, tais ações em regra revelam-se improcedentes
porque seus autores não demonstram o efetivo prejuízo sofrido.
É nosso entendimento, alicerçado em jurisprudência.
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