INFÂNCIA, BRINCADEIRA E
EDUCAÇÃO INFANTIL:
primeiras aproximações
CAEI- CURSO DE APERFEIÇOAMENTO NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: CURRICULO, PLANEJAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO
TRABALHO PEDAGÓGICO.
Disciplina: Infâncias e crianças na cultura contemporânea.
Professores: Rogério Correia da Silva
Sandro Vinicius Sales dos Santos
FaE UFMG
2013
“As crianças, esses seres estranhos dos quais
nada se sabe, esses seres selvagens que não
entendem a nossa língua” (LARROSA, 2010, p.
183).
QUESTÕES INICIAIS
• Quem são, afinal, as crianças?
• O que identifica e distingue este grupo social
internamente e relativamente a outros grupos?
• Que praticas e representações existem relacionadas
com as crianças ?
• As práticas variam segundo posição
social/sexo/lugar/atividades dos pais?
• Como é que as crianças vêem o mundo em que
vivem e como é que vêem a sua condição de
crianças?
QUESTÕES INICIAIS
• Fazer uma reflexão sobre a infância nos
remete a diferentes olhares sobre a criança.
• Esses olhares se entrecruzam e nos fazem
perceber que a infância é plural.
• E deve sempre ser pensada em relação a
outros grupos geracionais.
ALGUNS PRESUPOSTOS FUNDAMENTAIS
Manuel
Sarmento
(2005),
sociólogo
português, elege dois conceitos como
fundamentais para o entendimento da
infância: o primeiro deles é o conceito de
geração e o segundo de alteridade.
ALGUNS PRESUPOSTOS FUNDAMENTAIS
• Geração: constitui-se como um grupo de pessoas
que, ao nascer na mesma época, vive
acontecimentos
sociais
comuns,
partilha
experiências semelhantes, originando uma
consciência comum, que permanece ao longo da
existência do grupo. No entanto, apesar de
partilhar experiências comuns, essas pessoas têm
também suas diferenças de classes sociais, gênero
e etnia. Podemos dizer que cada geração se
constitui a partir de semelhanças e diferenças, ao
mesmo tempo.
ALGUNS PRESUPOSTOS FUNDAMENTAIS
• Alteridade: a idéia de que nos constituímos pelo
olhar do outro. Os adultos, adolescentes e jovens
se contrapõem às crianças, dando-lhes
significados diferentes conforme se relacionam
com elas.
• Por exemplo: para um adulto, a criança pode ser
vista e significada como aquela que necessita
cuidados, orientação e proteção. Os idosos, por
sua vez, podem olhar a criança como portadora
de vida e novidade que já lhes escapam por sua
idade avançada.
ALGUNS PRESUPOSTOS FUNDAMENTAIS
• No entanto, constituindo-se enquanto
alteridade por meio da convivência com
outros grupos geracionais, as crianças têm sua
forma peculiar de ser e estar no mundo que
compartilham com seus pares. Dotadas de
uma linguagem própria, com uma visão de
mundo que lhes é particular, desenvolvem
uma cultura infantil ao mesmo tempo próxima
e distante daquela do adulto.
CULTURA INFANTIL
Disponível em: http://www.territoriodobrincar.com.br/criancas-no-brasil/videos
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
1.
Estas produções possuem uma marca geracional, ou seja,
algo “...distintivo que
se inscreve nos elementos
simbólicos e materiais para além de toda a
heterogeneidade, assinalando o lugar da infância na
produção cultural” (SARMENTO: 2003).
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
2. Constituem-se historicamente e são alteradas
pelo processo histórico de recomposição das
condições sociais em que vivem as crianças e que
regem as possibilidades das interações das
crianças, entre si e com os outros membros da
sociedade.
3. Nas culturas infantis podemos perceber tanto a
forma como as crianças adquirem e aprendem os
códigos que plasmam e configuram o real como a
forma criativa em que fazem uso destes mesmos
códigos.
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
4. As formas culturais produzidas e realizadas pelas
crianças constituem não apenas os jogos infantis,
mas também os modos específicos de
significação e de uso da linguagem, se
desenvolvendo especialmente nas relações entre
os pares, distintamente diferentes dos processos
vividos pelos adultos.
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
5. As produções das crianças não surgem do nada,
muito pelo contrario, estão profundamente
enraizadas na sociedade nos modos de
administração simbólica da infância.
Neste sentido, culturas da infância constituem-se
no mútuo reflexo das produções culturais dos
adultos para as crianças e das produções geradas
pelas crianças nas suas interações entre pares.
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
“As Culturas da infância são, em síntese, resultantes da
convergência desigual de factores que se localizam, numa
primeira instância, nas relações sociais globalmente
consideradas e, numa segunda instância, nas relações inter
e intrageracionais. Esta convergência ocorre na acçao
concreta de cada criança, nas condições sociais (estruturais
e simbólicas) que produzem a possibilidade da sua
constituição como sujeito e actor social. Este processo é
criativo tanto quanto reprodutivo. O desafio hermenéutico
colocado a sociologia da Infância consiste na compreensão
deste processo de “reprodução interpretativa (Corsaro,
1997), constitutivo das identidades individuais de cada
criança e do estatuto social da infância como categoria
geracional”. (SARMENTO, 2003, p. 61).
CULTURAS INFANTIS: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
• Sociedade e a cultura não determinam de forma
absoluta aquilo que a criança vai ser.
• Ao agir, ela reconstrói o mundo em que vive. Através
de sua curiosidade, inventividade e capacidade de
colocar o mundo às avessas, a criança também é
agente de sua própria construção.
• Caráter dialético: ao mesmo tempo em que a cultura
produz a criança, ela, por sua vez, reconstrói a cultura à
sua maneira.
• Ou seja, a criança é, ao mesmo tempo, produto e
produtora de cultura
E COMO AS CRIANÇAS CRIAM ESSAS
CULTURAS?
• Brincando, pois, o brincar é uma das formas
privilegiadas de as crianças se expressarem,
relacionarem-se,
descobrirem,
explorarem,
conhecerem e darem significado ao mundo.
• Brincando
constroem
sua
subjetividade,
constituindo-se como sujeitos humanos em uma
determinada cultura.
• É, portanto, uma das linguagens da criança e,
como as demais, aprendida social e
culturalmente.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BRINCAR
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BRINCAR
• Existem vários estudos em torno do brincar, oriundos de
diversas áreas do conhecimento: da Psicologia, da Sociologia, da
Antropologia, da Filosofia.
•
Cada uma dessas áreas apresenta contribuições importantes
para compreender essa linguagem.
• A idéia do lúdico (derivada de ludere, que tem o sentido de
ilusão, de simulação) perpassa todos esses estudos;
• compreensão do brincar como capacidade do ser humano de
transformar uma coisa em outra, de dar significados diferentes
a um determinado objeto ou ação.
O BRINCAR: O OLHAR DA PSICOLOGIA
• A Psicologia traz importantes contribuições
sobre o brincar e o papel do brinquedo no
desenvolvimento e aprendizagem humanos.
O BRINCAR: O OLHAR DA PSICOLOGIA
• A perspectiva de Piaget:
• Relaciona o brincar ao desenvolvimento das estruturas
cognitivas, propondo três categorias de jogos:
• jogos de exercício: característicos do período sensóriomotor (crianças de 0 à 1 ano e meio/2 anos);
• jogos simbólicos ou jogos de faz-de-conta:
característicos do período pré-operatório (de 1 ano e
meio/2 anos à 5 anos e meio/6 anos);
• jogos de regras: que são desenvolvidos a partir do
período das operações concretas, que se inicia por
volta dos 6 anos.
O BRINCAR: O OLHAR DA PSICOLOGIA
• A perspectiva de Vygotsky:
• A capacidade de brincar se constrói na relação
entre o biológico e o cultural.
• Na tentativa de compreender o mundo adulto,
as crianças buscam imitá-lo por meio do
brincar, do faz-de-conta, atribuindo os
significados desejados aos objetos a que têm
acesso e às situações que organizam.
O BRINCAR: O OLHAR DA PSICOLOGIA
• Vygotsky (1984) analisa que, embora nesse momento,
a criança ainda precise de um objeto que represente a
realidade ausente (por exemplo, ela precisa de um
pedaço de pau, ou de algum outro objeto, para
representar um avião), essa sua ação de desprender-se
do objeto concreto que tem em mãos (o pedaço de
pau), dando-lhe outro significado (a idéia de avião) é
um importante passo no percurso que a levará a
desvincular se totalmente das situações concretas,
conforme acontece no pensamento adulto. Desse
modo, o brincar de faz-de-conta tem um papel
fundamental no desenvolvimento da capacidade de
abstração da criança.
O BRINCAR: O OLHAR DA PSICOLOGIA
• O aprender a lidar com regras e a desenvolver
o autocontrole são também capacidades
propiciadas pelo brincar;
• Segundo Vygotsky, essa é uma atividade
complexa, que contribui para que a criança
compreenda o universo dos papéis que
desempenha, impulsionando o seu
desenvolvimento.
O BRINCAR: A VISÃO DA SOCIOLOGIA
• A Perspectiva da Sociologia da Infância:
• reconhecendo a infância como uma categoria
social, seus pesquisadores têm se debruçado
sobre o brincar como atividade complexa, que
permite às crianças construírem uma ordem
social própria.
• De acordo com Sarmento, embora o brincar não
seja exclusivo das crianças, “a ludicidade constitui
um traço fundamental das culturas infantis”
(1997, p.25, 26). Para esse autor, o brincar é a
condição de aprendizagem da sociabilidade.
O BRINCAR: A VISÃO DA SOCIOLOGIA
• Outro pressuposto do brincar que permite às
crianças a aprendizagem da sociabilidade e a
construção de sua ordem social é a repetição.
• Dessa forma, num contexto mais estável (Instituição
de Educação Infantil), as brincadeiras tendem a se
repetir: repetem-se os temas, os papéis assumidos,
as regras definidas, as tramas.
• Essa repetição das interações, criando padrões de
ação conhecidos para os atores envolvidos, reforça
as relações sociais entre as crianças e possibilita sua
transferência para outros espaços e atividades
(FERREIRA, 1997, p. 92).
O BRINCAR: A VISÃO DA SOCIOLOGIA
• Assim, no brincar, as crianças aprendem como
interagir, a construir e a reconstruir as relações
sociais como sujeitos competentes, membros
participantes e integrados no grupo de crianças.
• A criação de regras, às quais todos devem se
submeter, além de permitir ao grupo se autoestruturar, possibilita a cooperação entre as crianças.
• Como afirma Corsaro (1997), o brincar cria
oportunidades para as crianças se sentirem parte
integrante de um grupo, para fazerem e
encontrarem amigos, conseguindo, assim, participar
de uma cultura de crianças.
O BRINCAR: A VISÃO DA SOCIOLOGIA
Reprodução interpretativa: O termo interpretativa captura os aspectos
inovadores da participação da criança na sociedade, indicando que as crianças
criam e participam de suas culturas de pares singulares por meio da apropriação
de informações do mundo adulto de forma a atender aos seus interesses
próprios enquanto crianças. O termo reprodução significa que as crianças não
apenas internalizam a cultura, mas contribuem ativamente para a produção e a
mudança cultural. Significa também que as crianças são circunscritas pela
reprodução cultural.
Pares: coorte ou grupo de crianças que passam tempo juntas diariamente.
Cultura de pares (peer culture): conjunto estável de atividades ou rotinas,
artefatos, valores e interesses que as crianças produzem e compartilham com
seus pares, primariamente por meio da interação face a face.
O BRINCAR: A VISÃO DA FILOSOFIA
• Johan Huisinga (2000) e Roger Callois (1990):
• Jogo como elemento fundante da cultura;
• Jogo definido como atividade livre, voluntária,
delimitada no tempo e no espaço, regida pela
imaginação e por regras próprias de organização.
• o sentido do brincar é dado pelos sujeitos que brincam,
possibilitando a significação e a re-significação do
mundo por esses sujeitos.
• importante espaço de expressão, de aprendizagem
sobre o mundo natural e social e, ao mesmo tempo,
uma possibilidade de a criança transformar essa
realidade, desenvolvendo a capacidade de imaginativa.
E QUAL É O PAPEL DA INSTITUIÇÃO DE
EDUCAÇÃO INFANTIL EM RELAÇÃO AO
BRINCAR?
• Muitas são as formas de conceber e de trabalhar o brincar nas IEI.
• Alguns professores vêem o brincar em uma instituição educativa
apenas como estratégia para aprender determinados conteúdos.
• Em outras situações, é comum professores deixarem as crianças
livres para brincar, apenas como forma de ocupar o tempo delas na
IEI, ou mesmo para os adultos ficarem livres para conversar,
arrumar o armário, organizar os materiais.
• Ambas as formas de propiciar o brincar na instituição evidenciam o
desconhecimento sobre o sentido do brincar e sobre a importância
de uma ação intencional do professor no desenvolvimento de
atividades com essa linguagem.
E QUAL É O PAPEL DA INSTITUIÇÃO DE
EDUCAÇÃO INFANTIL EM RELAÇÃO
AO BRINCAR?
• Já os professores que concebem o brincar como uma
forma privilegiada de a criança ser e estar no mundo, e
reconhecem a importância de essa linguagem ser
propiciada às crianças, desde muito cedo e de modo
intencional na IEI, permeiam sua prática cotidiana com
uma postura lúdica.
• Nesse sentido, favorecem sempre nas crianças a
capacidade de imaginar, de transformar uma coisa em
outra, de ir além do instituído. Além disso, envolvemse nas brincadeiras das crianças e organizam seu
trabalho levando em conta uma concepção clara e
consistente do brincar.
E QUAL É O PAPEL DA INSTITUIÇÃO DE
EDUCAÇÃO INFANTIL EM RELAÇÃO
AO BRINCAR?
• O
brincar é reconhecido como uma
importante linguagem que permite às crianças
compartilhar os significados da cultura e
construir sua identidade social e pessoal, é
fundamental, numa instituição educativa, que
ele constitua uma das formas de mediação
das relações estabelecidas com as crianças e
delas com outros sujeitos e com os objetos.
E QUAL É O PAPEL DA INSTITUIÇÃO DE
EDUCAÇÃO INFANTIL EM RELAÇÃO
AO BRINCAR?
• Enfim, ao compreender a importância do
brincar para as crianças, o(a) professor(a) de
Educação Infantil tem o importante papel de
favorecer que ele aconteça, de forma bastante
rica, no cotidiano de sua prática pedagógica.
REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS
• CORSARO, Willian. SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA. Porto Alegre:
Artmed, 2011. 384 p.
• FERREIRA, Manuela. Do “Avesso” do Brincar ou...as Relações entre
Pares, as Rotinas da Cultura Infantil e a Construção da(s)
Ordem(ens) Social(ais) Instituinte(s) das Crianças no Jardim-deInfância. In: PINTO, Manuel e SARMENTO, Manuel Jacinto. “As
Crianças: Contextos e Identidades” (Coord). Centro de Estudos da
Criança. Universidade do Minho, 1997.
• HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. São Paulo:Perspectiva, 2000.
• LARROSA, J. Pedagogia Profana: danças, piruetas e mascaradas.
Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
• PIAGET, Jean. O Nascimento da Inteligência na Criança. Trad. Alvaro
Cabral. Rio de Janeiro: Zahar, 1970. 387p.
• VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins
Fontes, 1988.
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infância, brincadeira e educação infantil (2)