Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Gabinete do Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
ACR 5859-PE 2004.83.00.010442-0
APTE
: ANTONIO MEDEIROS DE ARAUJO
ADV/PROC : LAERCIO DE SOUZA RIBEIRO NETO
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM :24ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (COMPETENTE
EXECUÇÕES PENAIS)
JUÍZA FEDERAL AMANDA TORRES DE LUCENA DINIZ ARAÚJO
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
P/
RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo acusado
ANTONINO MEDEIROS DE ARAÚJO (fls.407/415) contra sentença (fls.336/350) da
lavra da Exma. Sra. Juíza Federal AMANDA TORRES DE LUCENA DINIZ ARAÚJO,
à época na titularidade da 24ª Vara Federal/PE (Caruaru), que julgou procedente em
parte a denúncia e condenou o acusado Antonino Medeiros de Araújo pela prática
do crime de concussão, previsto no Artigo 316 do Código Penal, e absolveu o
acusado Josenildo Reis de Sousa da imputação do crime de falso testemunho (CP,
Art.342), com arrimo no Artigo 386, VI, do Código de Processo Penal, na sua
anterior redação.
Em relação ao acusado Antonino Medeiros de Araújo foi
aplicada pena de 3 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e 75 (setenta e cinco)
dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por restritivas de direito,
consistentes em prestação de serviço à comunidade e doação de cesta básica.
Não houve recurso de apelação manejado pela Acusação em
relação à parte absolutória da sentença.
Segundo a denúncia, no dia 10 de março de 2001, por volta
das 17:30 horas, o Policial Rodoviário Federal, ANTONINO, exigiu no exercício de
suas funções, o pagamento de R$ 20,00 (vinte reais) de um grupo de quatro
pessoas que se dirigiam em um veículo de marca CELTA, placa KLO 7650, no
sentido Pesqueira-Arcoverde, ao pretenso argumento de que o verdadeiro motorista
condutor do carro era pessoa que não possuía habilitação para dirigir, que houvera
trocado de posição com o outro motorista que estava no volante no momento em
que o automóvel foi parado.
Giza a denúncia que as pessoas que estavam no veículo foram
ERIVELTON CARLOS ALVES DE OLIVEIRA (verdadeiro condutor), ELIANE DOS
WJOT: E:\acordaos\200483000104420_20101216_2700263.doc
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SANTOS CAVALCANTI, MÉRCIO JOSÉ TENÓRIO PEREIRA E FERNANDA
CARLA ALVES DE OLIVEIRA.
Relata a denúncia que JOSENILDO faltou com a verdade, ao
ser inquirido no processo administrativo instaurado pela Polícia Rodoviária Federal,
ao negar que acompanhara o grupo até o local da abordagem policial e presenciara
quando ERIVELTON entregou ao denunciado ANTONINO a propina exigida.
Diversamente do que JOSENILDO afirmara, os quatro integrantes do grupo
sustentam, segundo a denúncia, que após a exigência feita por ANTONINO, como
não dispunham do valor exigido, eles retornaram à cidade de Pesqueira, onde
encontraram com JOSENILDO e lhe pediram emprestado a quantia da propina,
dizendo-lhe a que serviria, tendo o próprio se oferecido para acompanhar o grupo
até o local e presenciado o momento em que o pagamento foi entregue ao primeiro
denunciado.
A defesa pleiteia a absolvição do acusado ANTONINO
MEDEIROS DE ARAÚJO, alegando, em síntese, insuficiência de provas a respaldar
o decreto condenatório, o que autoriza a aplicação do princípio do ‘in dubio pro reo’.
Alternativamente, requer a redução da pena-base para o
mínimo legal, a teor do Artigo 59 do Código Penal.
Contrarrazões pela acusação (fls.417/425).
No Parecer Ministerial (fls.427/433), o Exmo. Sr. Procurador
Regional da República, Dr. Luciano Mariz Maia, opinou pelo provimento do recurso
do acusado para absolvê-lo da imputação do crime previsto no Artigo 316 do Código
Penal , considerando a incerteza quanto ao comportamento punível e a dúvida
acerca da realidade fática passível de enquadrar a conduta do policial rodoviário
federal no crime de concussão.
É o que havia de relevante para relatar.
Encaminhem-se os autos ao Eminente Desembargador Federal
revisor, nos termos Regimentais.
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ADV/PROC : LAERCIO DE SOUZA RIBEIRO NETO
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM : 24ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (COMPETENTE P/
EXECUÇÕES PENAIS)
JUÍZA FEDERAL AMANDA TORRES DE LUCENA DINIZ ARAÚJO
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
VOTO
ANTONINO MEDEIROS DE ARAÚJO foi condenado pelo Juízo
Federal da 24ª Vara Federal/PE (Caruaru) pela prática do concussão, previsto no
Artigo 316 do Código Penal, à pena de 3 (três) anos de reclusão, em regime aberto,
e 75 (setenta e cinco) dias-multa.
A pena privativa de liberdade foi substituída por restritivas de
direito, consistentes em prestação de serviço à comunidade e doação de cesta
básica.
A defesa pleiteia a absolvição do acusado ANTONINO
MEDEIROS DE ARAÚJO, alegando, em síntese, insuficiência de provas a respaldar
o decreto condenatório, o que autoriza a aplicação do princípio ‘in dubio pro reo’.
Alternativamente, requer a redução da pena-base para o
mínimo legal, a teor do Artigo 59 do Código Penal.
Passo à análise.
Segundo a denúncia, no dia 10 de março de 2001, por volta
das 17:30 horas, o Policial Rodoviário Federal, ANTONINO, exigiu no exercício de
suas funções, o pagamento de R$ 20,00 (vinte reais) de um grupo de quatro
pessoas que se dirigiam em um veículo de marca CELTA, placa KLO 7650, no
sentido Pesqueira-Arcoverde, ao pretenso argumento de que o verdadeiro motorista
condutor do carro era pessoa que não possuía habilitação para dirigir, que houvera
trocado de posição com o outro motorista que estava no volante no momento em
que o automóvel foi parado.
Giza a denúncia que as pessoas que estavam no veículo foram
ERIVELTON CARLOS ALVES DE OLIVEIRA (verdadeiro condutor), ELIANE DOS
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CARLA ALVES DE OLIVEIRA.
Relata a denúncia que JOSENILDO faltou com a verdade, ao
ser inquirido no processo administrativo instaurado pela Polícia Rodoviária Federal,
ao negar que acompanhara o grupo até o local da abordagem policial e presenciara
quando ERIVELTON entregou ao denunciado ANTONINO a propina exigida.
Diversamente do que JOSENILDO afirmara, os quatro integrantes do grupo
sustentam, segundo a denúncia, que após a exigência feita por ANTONINO, como
não dispunham do valor exigido, eles retornaram à cidade de Pesqueira, onde
encontraram com JOSENILDO e lhe pediram emprestado a quantia da propina,
dizendo-lhe a que serviria, tendo o próprio se oferecido para acompanhar o grupo
até o local e presenciado o momento em que o pagamento foi entregue ao primeiro
denunciado.
Como pormenorizado na exordial, imputou-se ao apelante a
prática de crime de concussão (extorsão praticada por funcionário público), com a
violação de seu dever para com a Administração Pública em geral, de tipificação
concebida no Artigo 316 do Código Penal:
“Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la,
mas em razão dela, vantagem indevida:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.”
Anteriormente à análise do mérito do recurso interposto,
impõem-se algumas breves considerações sobre o delito de concussão, previsto no
Código Penal no seu artigo 316.
Evidenciando o núcleo do tipo penal no verbo ‘exigir’, o seu
estudo enseja a oportunidade de recordar a lição memorável de NÉLSON
HUNGRIA, em seus “Comentários ao Código Penal” – volume IX, Forense, 1959:
“No seu tipo fundamental, a concussão consiste no fato de o
funcionário público “exigir”, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas
em razão dela, vantagem indevida”... Exigir é impor como obrigação
ou reclamar imperiosamente. A exigência pode ser formulada
diretamente, a viso aperto ou facie ad faciem, sob ameaça explícita
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ou implícita de represálias (imediatas ou futuras), ou indiretamente,
servindo-se o agente de interposta pessoa, ou de velada pressão, ou
fazendo supor, com maliciosas ou falsas interpretações, ou capciosas
sugestões, a legitimidade da exigência. Não se faz mister a promessa
de infligir um mal determinado: basta o temor genérico que a
autoridade inspira. Segundo advertia CARRARA, sempre concorre a
influir sobre a vítima o metus publicae potestatis. Para que o receio
seja incutido, não é necessário que o agente se ache na atualidade
de exercício de função: não deixará de ocorrer ainda quando o
agente se encontre licenciado ou até mesmo quando, embora já
nomeado, ainda não haja assumido a função ou tomado posse de
cargo. O que se faz indispensável é que a exigência se formule em
razão da função. Cumpre que o agente proceda, franca ou
tacitamente, em função de autoridade, invocando ou insinuando a sua
qualidade.
A vantagem exigida, para ser prestada de imediato ou de futuro, em
favor do próprio agente ou de terceiro, há de ser indevida, isto é, não
correspondente, no todo ou em parte, a dispositivo legal. Entende-se
que a vantagem é de natureza econômica. A concussão não é mais
que a exigência de um pagamento indébito ou do reconhecimento de
uma inexistente obrigação (no sentido jurídico).
Trata-se de crime eminentemente formal: consuma-se com o simples
fato da exigência de indébita vantagem. Se sobrevém a efetiva
percepção desta, o que ocorre é apenas o exaurimento do crime (a
que a lei, na espécie, não condiciona qualquer majoração da pena).
Não é admissível a tentativa: ou é feita a exigência e o crime se
consuma; ou deixa de ser feita, e nada mais poderá haver que uma
intenção não exteriorizada.
O elemento subjetivo é o dolo genérico: vontade livremente dirigida à
exigência da vantagem, sabendo o agente que esta é indevida...”
Conclui-se que o delito de concussão é formal, consuma-se
antecipadamente, com a mera imposição de indevido pagamento: não exige a
anuência da pessoa que sofre a ameaça e, sequer, o resultado visado pelo agente.
Nessa mesma linha, firmou-se o consenso da jurisprudência,
sendo ilustrativo o exemplo:
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“Crime de concussão: é crime formal, que se consuma com a
exigência. Irrelevância no fato do não recebimento da
vantagem indevida.”
(STF – 2ª Turma – HC Nº 74.009/MS; Rel. MIN. CARLOS
VELLOSO – DJU 14/03/97)
Tal é o enunciado da Súmula nº 96 do Superior Tribunal de
Justiça:
“O crime de extorsão consuma-se independentemente da
obtenção da vantagem indevida.”
Conforme já frisei anteriormente, o acusado pugna por sua
absolvição ao argumento de que as provas coligidas são insuficientes a respaldar o
decreto condenatório.
Na mesma senda, foi o opinativo ministerial (fls.417/433), que
ressalvou a incerteza do comportamento punível e a dúvida acerca da realidade
fática passível de enquadrar a conduta do policial rodoviário federal no crime de
concussão.
É o tipo de ação penal que urge pela valoração da prova oral,
consubstanciada no interrogatório do acusado e nos depoimentos das testemunhas,
que se revestem de exacerbado valor quando uníssonos e coesos.
No caso concreto, o cenário que se apresenta nos autos
revela:
1) condutor e passageiros do veículo celta parado pelo patrulheiro rodoviário
federal (ora apelante), que lhe imputa o fato de ter exigido a quantia
(propina) de vinte reais do condutor do veículo com o fim de não multar, em
virtude de o veículo está sendo conduzido por pessoa não habilitada;
2) o apelante (patrulheiro rodoviário federal) que afirma que aplicou
regularmente a multa ao condutor do veículo celta, em face de ter realizado
ultrapassagem irregular em faixa contínua, que proíbe referida manobra.
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A acusação se baseia nos depoimentos das testemunhas:
condutor do veículo e os outros passageiros (irmã, noiva do condutor do veiculo) e
outras pessoas vinculadas por laço de amizade.
A defesa afirma que referidas testemunhas: o condutor
(Erivelton), sua irmã (Fernanda), sua noiva (Eliane) e seu amigo (Marcos ou Márcio),
passageiros no veículo conduzido, teriam criado a narrativa da denúncia com o
objetivo de retaliar o patrulheiro rodoviário federal, em face da imposição da multa.
No seu interrogatório, em juízo (fls.17/18), o acusado
ANTONINO MEDEIROS DE ARAÚJO, afirmou que:
“(...)que é Policial Rodoviário Federal e recorda quando abordou o veículo mencionado
na denúncia na BR-232, próximo à entrada de ALAGOINHA/PE, local onde é comum
acontecerem acidentes; que o mencionado veículo havia realizado uma ultrapassagem
em faixa dupla contínua amarela, razão pela qual foi interceptado; que o veículo foi
autuado em face da ultrapassagem muito embora os documentos do condutor
estivessem regulares; que apenas manteve contato com o condutor e a sua irmã, que
permanecia no banco do carona; que não conhece o corréu JOSENILDO; que não se
recorda o nome do condutor do veículo; que o condutor não retornou ao local após
autuação, ao menos enquanto o interrogando lá se encontrava; que se recorda apenas
que o condutor lhe pediu para não autuá-lo, caso contrário receberia represália de seu
pai; que no local do fato existia apenas um outro policial rodoviário federal de nome
AMARAL PINHEIRO, que estava fiscalizando outro carro, não havendo presenciado o
fato em questão.(...)”
Quanto à notificação do condutor do veículo, consta nos autos
lavratura de auto de infração em razão de ultrapassagem irregular quando presente
faixa contínua, proibitiva daquela manobra.
Consta, ainda, laudo documentoscópico (fls.46/52) que atestou
a autenticidade da assinatura do condutor do veículo, Sr. ERIVELTON, na
oportunidade da lavratura do auto de infração.
Ocorre que, o condutor do veículo e seus colegas deram outra
versão, diferente do que teria ensejado o auto de infração. Afirmaram que foram
ameaçados de ser autuado por ANTONINO por pretensa troca de motoristas.
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Nesse aspecto, o condutor do veículo (ERIVELTON CARLOS
ALVES DE OLIVEIRA), sua irmã FERNANDA CARLA ALVES DE OLIVEIRA, e
ELIANA DOS SANTOS (noiva do condutor do veículo) afirmaram (fls.154/157):
Depoimento da testemunha arrolada pela acusação ERIVELTON CARLOS
ALVES DE OLIVEIRA (condutor do veículo) fls.154/155:
“(...) que o acusado ANTONINO após verificar a documentação, prendeu a habilitação
e a identidade do depoente e exigiu que lhe desse a importância de R$20,00; que na
oportunidade o depoente só tinha R$ 10,00 e combinou com o primeiro acusado para
retornar a cidade de Pesqueira para tentar arrumar dinheiro com alguém, que a única
pessoa que o depoente conhecia em Pesqueira era o acusado Josenildo que estava
no parque aquático, pessoa que já conhecia desde a infância, a quem o depoente
solicitou o empréstimo de R$ 10,00 para completar o que fora solicitado pelo primeiro
acusado; (...); que o depoente ao retornar para o local da abordagem entregou o
dinheiro ao policial (...)”
Depoimento da testemunha arrolada pela acusação FERNANDA CARLA
ALVES DE OLIVEIRA (irmã de ERIVELTON–condutor do veículo) fls.156
“(...) que o acusado Antonino ao abordar o carro por volta das 17:30 horas perto de
Pesqueira numa ocasião em que a depoente e os demais ocupantes do celta, vinham,
de Pesqueira com destino a Arcoverde; que o veículo era dirigido por Erivelton, que
pós a abordagem ao ter solicitado os documentos do carro e a habilitação de Erivelton
o acusado Antonino exigiu R$ 20,00, tendo Erivelton dito que só tinha R$ 10,00 na
ocasião e o acusado respondeu: “SE VIRE”; que o guarda ficou com o documento do
carro e a habilitação de Erivelton enquanto que a depoente e os demais ocupantes
voltaram para Pesqueira e foram procurar Josenildo para lhe pedir dinheiro
emprestado; que Josenildo veio para Pesqueira até o local do fato; (...); que quando
chegaram de Pesqueira com a quantia solicitada todos desceram do celta e se
dirigiram ao guarda Antonino para fazer a entrega do dinheiro, ou seja, o depoente
Márcio, Erivelton, Eliane e o acusado Josenildo; que o acusado exigiu o dinheiro sob a
alegação de quem vinha conduzindo o veículo não era Erivelton e sim outra pessoa
apontando para Márcio que vinha no banco traseiro do veículo ao lado da
depoente(...)”
Depoimento da testemunha arrolada pela acusação ELIANA DOS SANTOS
CAVALCANTE (noiva de ERIVELTON–condutor do veículo) fls.156/157
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“(...) que a depoente presenciou o acusado Antonino exigir R$20,00, sob a alegação
de que o veículo não estava sendo guiado por Erivelton o único que tinha habilitação e
sim por Marcos que vinha no Banco traseiro; que os componentes do celta retornaram
a Pesqueira onde foram pegar dinheiro emprestado com Josenildo e este veio até o
local em companhia da depoente e os demais para entregar o dinheiro ao guarda; que
o dinheiro foi entregue ao guarda fora do veículo na presença de todos(...)”
Conclui-se que as versões são contraditórias. A própria
sentença reconheceu tal fato. Nesse sentido, destaque-se excerto da sentença
recorrida (fls.342/343):
“(...) É bem verdade que a versão apresentada pelo réu ANTONINO sobre o fato em
comento é bem diversa: aduz ele que abordou o veículo CELTA porquanto realizava
uma ultrapassagem irregular, vindo o condutor ERIVELTON a assinar o auto de
infração em que se relatou essa irregularidade.
Para confirmar a versão da defesa, ademais, existe o laudo pericial de fls.46/48, que
realmente comprova haver ERIVELTON assinado o auto de infração em que consta
como justificativa para imposição da penalidade o fato de o veículo por ele conduzido
ter realizado uma ultrapassagem irregular (diferentemente do que ERIVELTON e seus
colegas afirmam: que foram ameaçados de ser autuados por ANTONINO por pretensa
troca de motoristas).
A que versão se deve dar credibilidade?
Os integrantes do automóvel negam ter ERIVELTON assinado qualquer auto de
infração (fls.50/51, 54/55 e 58/59 do apenso), mas a prova técnica atesta que ele o
assinara e consta do referido documento, como motivação da penalidade, exatamente
aquela mencionada pelo réu ANTONINO.
Está-se diante, pois, de versões contraditórias, mas há elementos nos autos a indicar a
prevalência segura de uma delas.(...)”
A despeito de a Magistrada de origem ter concluído que se
estava diante de versões contraditórias e que havia elemento a indicar a prevalência
segura de pelo menos uma das provas colhidas, vê-se, na própria sentença, na
parte que absolveu o corréu JOSENILDO da imputação do crime de falso
testemunho, que foi consignado o seguinte (fls.344):
“(...)Como se vê, há mais de um depoimento, num e outro sentido, não existindo
certeza sobre qual versão deve prevalecer. É razoável admitir, até mesmo, como
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verdadeira a explicação dada pelo réu JOSENILDO, de que ERIVELTON somente
disse que ele presenciara a entrega da propina ao policial porque precisava de três
testemunhas do fato, e, das três testemunhas oculares, uma era sua irmã, não
podendo, pois, ser arrolada como tal.
Não havendo a certeza probatória quanto a qual das versões deve prevalecer, não se
tem como reconhecer como provada suficientemente a ocorrência do fato descrito
como falso testemunho na peça acusatória(...)”
Como destacado acima, a análise da prova testemunhal nos
crimes de concussão se mostra e se reveste de alto valor, sobretudo quando os
depoimentos são uníssonos, hipótese inocorrente no caso em concreto. Ademais,
observa-se que as testemunhas possuem estreito elo de ligação afetiva (irmã, noiva,
amiga do condutor do veículos), o que poderia viciar a validade de tal prova.
As contradições existentes nos depoimentos tidos pelo autor
público como fundamentais a ensejar a condenação, foram realçadas, não somente
na própria sentença recorrida, como no Parecer Ministerial opinativo pela absolvição.
A dúvida, no caso em exame, sobretudo no real motivo da
exigência indevida pelo Policial Rodoviário Federal, haja vista o teor da infração
cometida por ERIVELTON no auto de infração, com a que foi relatada pelas
testemunhas arroladas pela acusação, é solucionada pela absolvição do réu.
Nessa senda, valem as transcrições finais do Parecer
Ministerial, que opinou pela absolvição do apelante (fls.431/433):
“(...)Reconhece-se que o delito de concussão, por se tratar de um crime realizado
comumente de forma clandestina, a prova testemunhal se reveste de exacerbado
valor, mormente quando observados depoimentos coesos e harmônicos.
No entanto, imperioso frisar, no caso vertente, o estreito laço de ligação entre as
testemunhas de acusação, o que por sua vez, representa um velado indício
comprometedor da isenta narrativa dos fatos.
As testemunhas de acusação têm todas estreito interesse na punição, uma delas, em
verdade, pretensa vítima da concussão, e, ao mesmo tempo condutor que sofreu auto
de infração por violação a norma de trânsito.
Argumenta o réu apelante que as testemunhas não conseguiram deixar de esconder
seu interesse na reprimenda ao funcionário público, visto a insatisfação explícita
causado pelo recebimento da multa. Ademais, verifica-se que a notitia criminis só foi
realizada após o conhecimento do documento que atesta a infração.
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De outra banda, também foi colacionado aos autos o resultado do exame
documentoscópico (fls.46/52), o qual constatou a autenticidade da assinatura do Sr.
Erivelton existente no auto de infração lavrado à data do fato.
Observa-se, inicialmente, uma discrepância entre a infração descrita no auto, qual
seja, “ultrapassar outro veículo em faixa dupla contínua”, com a aquela relatada pelas
testemunhas de acusação, como sendo o motivo da exigência indevida, o que implica
observar o cumprimento da obrigação legal pelo funcionário público.
Ademais, cumpre acentuar a afirmação da testemunha Fernanda Carla, fls.156, irmã
do condutor:
“[...]que na ocasião o patrulheiro expediu uma multa no valor aproximadamente de
R$ 180,00, a qual não foi assinada por Erivelton[...]”
Tem-se na hipótese dos autos, duas teses consistentes, embasadas em provas
relevantes que se anulam mutuamente. Paira, assim, dúvida acerca da realidade fática
passível de enquadrar a conduta do policial rodoviário federal no crime tipificado no art.
316 do CPB.(...)” (negritado no original)
Ante o exposto, sobressaindo a contradição da prova
testemunhal, a ensejar a dúvida acerca de um juízo condenatório, a aplicação do
princípio ‘in dubio pro reo’ impõe-se, no caso concreto, pelo que acolho o recurso de
apelação interposto, bem como o Parecer Ministerial, para absolver o acusado, ora
apelante, com arrimo no Artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
Ex Positis, DOU PROVIMENTO ao recurso interposto pelo
acusado.
É como voto.
Recife, 09.12.2010.
Des. Federal ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
Relator
WJOT: E:\acordaos\200483000104420_20101216_2700263.doc
p. 11/13
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: ANTONIO MEDEIROS DE ARAUJO
ADV/PROC : LAERCIO DE SOUZA RIBEIRO NETO
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
ORIGEM
: 24ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (COMPETENTE P/
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JUÍZA FEDERAL AMANDA TORRES DE LUCENA DINIZ ARAÚJO
EMENTA
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL.
CRIME DE CONCUSSÃO (CP, ART. 316). FUNCIONÁRIO
PÚBLICO FEDERAL (POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL).
PROVA TESTEMUNHAL. CONTRADIÇÃO. FRAGILIDADE.
PROVA JUDICIAL ISOLADA. (DEPOIMENTO DO CORRÉU
QUE FOI ABSOLVIDO DO CRIME DE FALSO TESTEMUNHO)
INSUFICIENTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO
ACUSADO. ABSOLVIÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO ‘IN
DUBIO PRO REO’.
1- Imputou-se ao apelante, policial rodoviário federal, a prática
de crime de concussão, pois teria exigido a quantia (propina)
de vinte reais do condutor do veículo com o fim de não multar,
em virtude de o veículo está sendo conduzido por pessoa não
habilitada. O apelante, por seu turno, afirma que aplicou
regularmente a multa ao condutor do veículo celta, em face de
ter realizado ultrapassagem irregular em faixa contínua, que
proíbe referida manobra.
2-A acusação baseia-se nos depoimentos das testemunhas:
condutor do veículo e os outros passageiros (irmã, noiva do
condutor do veiculo) e outras pessoas vinculadas por laço de
amizade.
3-A defesa afirma que referidas testemunhas: o condutor
(Erivelton), sua irmã (Fernanda), sua noiva (Eliane) e seu
amigo (Marcos ou Márcio), passageiros no veículo conduzido,
teriam criado a narrativa da denúncia com o objetivo de retaliar
o patrulheiro rodoviário federal, em face da imposição da multa.
WJOT: E:\acordaos\200483000104420_20101216_2700263.doc
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Gabinete do Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira
ACR 5859-PE 2004.83.00.010442-0
4-Em face das contradições da prova testemunhal e a incerteza
quanto ao comportamento do policial rodoviário federal a
tipificar a conduta prevista no Artigo 316 do Código Penal,
impõe-se a absolvição.
5-Acolhe-se o recurso interposto, bem como o Parecer
Ministerial para reformar a sentença e absolver o acusado, nos
termos do Artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
ACÓRDÃO
Vistos, etc.
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região,
à unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação do acusado, nos termos do voto do
relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Recife, 09.12.2010.
Des. Federal ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
Relator
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RELATÓRIO - Tribunal Regional Federal da 5ª Região