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V Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação
Política de Atendimento à Primeira Infância:
formação e desempenho do Visitador no
Programa Primeira Infância Melhor
Carolina de Vasconcellos Drügg, Marta Luz Sisson de Castro (orientador).
Faculdade de Educação, Programa de Pós Graduação em Educação, PUCRS.
Resumo
A presente investigação está inserida na linha de pesquisa Fundamentos, Políticas e
Práticas da Educação Brasileira (FPPE) e é orientada pela Professora Marta Sisson de Castro.
De natureza quali-quantitativa, esta pesquisa tem como objetivo investigar as necessidades de
formação inicial e continuada do Visitador do Programa Primeira Infância Melhor (PIM),
considerando o objetivo de promover o protagonismo das famílias e comunidades nos
cuidados e educação de suas crianças na faixa etária de zero até seis anos de idade. O método
utilizado será o estudo de caso exploratório e descritivo (conforme Yin, 2005) auxiliado por
um levantamento de dados por amostragem através da aplicação, junto aos Visitadores, de
questionário com perguntas fechadas (conforme proposta de Günther, 2003). O estudo de caso
ocorrerá no Município de Santa Cruz do Sul, onde será investigado o desempenho e as
vivências dos Visitadores, através da observação de suas práticas junto às famílias e da
aplicação, junto aos Visitadores e as famílias sob sua responsabilidade, de questionários com
questões abertas objetivando identificar a percepção de ambos sobre o desempenho dos
primeiros, num exercício reflexivo. A análise dos dados seguirá a teoria da análise de
conteúdo de Bardin (2002) e pretende responder às seguintes questões: Que habilidades e
conhecimentos são necessários para promover uma boa prática sócio educativa junto às
famílias atendidas pelo Programa? Quais são as necessidades de formação inicial e continuada
do Visitador frente ao objetivo de promover o protagonismo das famílias e comunidades nos
cuidados e educação de suas crianças?
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Introdução
O investimento em políticas voltadas à primeira infância tem nos recentes estudos das
neurociências sua principal justificativa. Estes estudos apontam o período que vai da
concepção aos seis anos como a etapa determinante para o desenvolvimento integral das
potencialidades humanas, quando a qualidade dos estímulos recebidos do meio sócio-afetivo é
decisiva para a construção das conexões cerebrais. A constatação de que as habilidades e
competências humanas têm seu alicerce cerebral organizado nos primeiros anos de vida, a
partir das experiências sociais e exploratórias da criança, encaminha gestores, educadores e
sociedade em geral a repensar os cuidados com a primeira infância.
Conforme publicação da UNICEF (2006), os cuidados e a educação nesta etapa são
um direito reconhecido pela Convenção sobre os Direitos da Criança - instrumento único de
proteção dos direitos da criança à sobrevivência - e sua importância está expressa no primeiro
dos seis objetivos da Educação para Todos – EPT, pactuados no Fórum Mundial de Educação
de Dacar, em 2000, onde ilustra, com destaque, o conjunto de ações adotadas por 164 países.
A primeira infância é um período altamente sensível, marcado por rápidas
transformações no desenvolvimento físico, cognitivo, social e emocional. A
subnutrição, carência de cuidados e tratamento inadequado são profundamente
prejudiciais às crianças pequenas, com repercussões freqüentemente sentidas nos
futuros anos de vida adulta. Uma criança que recebe cuidados extremamente
insuficientes [...] provavelmente sofrerá atrasos em seu desenvolvimento, os quais
dificilmente serão recobrados mais tarde. Programas adequados podem
incrementar significativamente o bem-estar das crianças pequenas durante os anos
de formação, além de complementar o cuidado recebido no lar. (UNESCO, p. 23,
2007)
A idéia de promover programas de complementação dos cuidados recebidos no lar
induziu as políticas educacionais a focar suas ações na escola, ampliando o atendimento na
Educação Infantil e lhe garantindo espaço na legislação. Porém, dados do Censo Escolar
realizado em 2006 no Rio Grande do Sul evidenciam que grande parte da população infantil
ainda não está incorporada no sistema de creches e pré-escolas. Segundo o Censo, o número
de crianças de zero a seis anos matriculadas em escolas de educação infantil foi de apenas
264.225. Destas, 75.218 crianças estavam matriculadas em creches, e 189.007 na pré-escola.
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Da população total de 1.069.000 crianças de zero a seis anos (IBGE, 2007), estima-se que
804.775 não freqüentem as classes de educação infantil. Este número representa 75,28% da
população infantil de zero a seis anos sem o atendimento institucional necessário, o que
justifica pensar em um novo posicionamento de gestão pública municipal e estadual que
incorpore a família e a comunidade como espaços prioritários e possíveis para a promoção de
políticas voltadas à primeira infância.
Neste sentido, foi implantado no Rio Grande do Sul em 2003, o Programa Primeira
Infância Melhor (PIM), – política pública do Governo Estadual, em parceria com as
Prefeituras Municipais, que visa o atendimento por visitação domiciliar e comunitária às
famílias com gestantes e crianças na faixa etária de zero até seis anos. Seu objetivo é orientar
estas famílias (em especial aquelas em situação de vulnerabilidade e risco social e sem
atendimento nas vias de educação formal) para o exercício de suas competências e na
superação de suas dificuldades, proporcionando mudanças na tomada de consciência dos
pais/cuidadores/gestantes e da comunidade, com vistas à melhoria desses contextos, enquanto
espaços promotores de qualidade de vida na primeira infância.
Num país com problemas tão graves como o Brasil, de desigualdades
sociais extremas, violência, falta de segurança e desrespeito aos direitos
humanos mais elementares, investir na primeira infância constitui-se numa
estratégia política da mais alta relevância. Seus resultados, em curto, médio
e longo prazo, para além da história individual de cada criança, contribuem
para mudar os rumos do país (SCHNEIDER; RAMIRES, 2008, p.15).
A proposta do Programa Primeira Infância Melhor vem ao encontro de uma tendência
que interpreta a ação sócio educativa como uma alternativa de prevenção aos problemas
sociais evidentes em espaços de vulnerabilidade e busca trabalhar os conhecimentos
necessários à retomada do protagonismo das famílias e comunidades na educação de suas
crianças. Para tanto, prevê uma forma diferente de pensar e praticar a educação – fora dos
bancos escolares, articulada a ações e profissionais de outras áreas do conhecimento e
aplicada em contextos culturais, sociais, políticos e econômicos distintos. Evidente que esta
forma de abordar a prática educativa demanda diferentes posturas dos profissionais da
educação que nela atuam e novos olhares sobre a organização das propostas educativas.
Reconhecida a relevância da implantação de políticas voltadas especificamente para a
infância no âmbito da família e da comunidade, surgem questões relacionadas à qualidade do
Programa e a sustentabilidade de suas propostas, ou seja, a sua “capacidade de gerar impactos
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duradouros em relação à situação dos grupos sociais beneficiários, mesmo após sua saída do
Programa” (KLAUS, 2000, p.8). Entre os fatores de sustentabilidade está a qualidade das
equipes - o que perpassa por questões como o perfil dos profissionais e a metodologia de
capacitação inicial e continuada – elementos de indiscutível influência na capacidade dos
sujeitos de inovar, aprender com a experiência e alcançar seus objetivos.
Considerando as descobertas do campo científico, as demandas sociais, culturais e
econômicas atuais e a relevância do objetivo do Programa, entende-se que a atuação do
profissional responsável pela orientação das famílias (Visitador) deve ser contemplada de
forma criteriosa, na intenção de identificar e analisar os fatores que possam comprometer os
benefícios pretendidos pelo Programa e, desta forma, propor alternativas que contribuam com
seu êxito. Neste sentido, a proposta de estudo desta pesquisa pretende identificar as
necessidades de formação deste profissional, a partir da análise de seu desempenho e
vivências, tendo como foco uma das principais dimensões de sua prática: a abordagem às
famílias.
Metodologia
A pesquisa compreenderá basicamente três momentos. O primeiro momento
corresponde ao levantamento de dados por amostragem através da aplicação de questionário
com perguntas fechadas. Este questionário será encaminhado por e-mail a 400 Visitadores do
Programa. O modo eleito para a aplicação do instrumento demanda maior cuidado na sua
elaboração, de forma a garantir o interesse do respondente em preenchê-lo até o final.
Conforme Günther (2003), a organização de um questionário deve responder a determinados
princípios que reduzam o esforço mental do respondente. Para tanto, deve obedecer a uma
estrutura e seqüência lógicas que organize as questões por temáticas.
O instrumento ainda está em fase de elaboração. Seguindo a sugestão do autor citado,
este contará com cabeçalho onde será possível identificar a idade, a formação e o tempo de
serviço no PIM e questões organizadas por grau de complexibilidade, onde as questões gerais
serão realizadas antes das específicas e introduzidas por textos explicativos. A opção por
perguntas fechadas se justifica pelo elevado número de entrevistados, pela facilidade na
análise dos dados e pelo tempo disponível para a pesquisa. Sua aplicação ocorrerá em julho de
2010 e espera ter retorno de, pelo menos, 200 questionários respondidos.
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O objetivo deste instrumento é identificar e analisar o entendimento do Visitador sobre
sua prática e desempenho no Programa. Para tanto, serão questões baseadas em duas
dimensões (selecionadas previamente) referentes à prática do Visitador. São elas:
•
Perfil profissional: escolaridade, identificação com o objetivo do Programa,
experiência em trabalho comunitário com crianças e/ ou famílias, capacidade de
organização e planejamento, facilidade de estabelecer relações, capacidade de
trabalhar em equipe, adoção de postura ética e capacidade de multiplicar
conhecimento.
•
Abordagem à família: sensibilização para o objetivo do Programa, motivação para a
realização das atividades propostas, responsabilidade e compromisso com as
aprendizagens familiares, respeito às diferenças sociais e culturais, estabelecimento de
relação de afeto, respeito e comprometimento.
Em um primeiro momento, a opção é organizar as questões segundo o tipo-Lickert 5,
variando de ‘discordo totalmente’ até ‘concordo totalmente’. A análise dos dados resultantes
deste primeiro momento se dará de forma quantitativa devendo fundamentar a execução do
segundo momento da pesquisa quando se dará o estudo de caso.
O segundo momento corresponde ao estudo de caso. Sua execução contempla três
etapas: seleção do Município e dos Visitadores para aplicação do estudo, aplicação do 2º
questionário junto aos Visitadores selecionados e as famílias sob sua responsabilidade e a
observação destes na sua prática junto às famílias.
A seleção do Município de Santa Cruz do Sul respondeu, inicialmente, a dois critérios:
estar executando o Programa há pelo menos dois anos e não contar com a assessoria técnica
da pesquisadora. O Município selecionado atua no Programa há X anos e conta com X
Visitadores, dois quais 04 participarão do estudo. Serão escolhidos aqueles Visitadores que
atuam no Programa a pelo menos 01 ano.
Para esta etapa será elaborado um questionário com até seis perguntas abertas. Esta
opção se dá pelo fato de que respostas discursivas permitem identificar mais claramente o
entendimento do Visitador sobre sua prática e desempenho na abordagem às famílias e
desenvolver uma análise mais profunda do que eles realmente pensam sobre o assunto.
Segundo Günther (2003), as perguntas abertas servem para capturar justamente aquelas
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questões não cobertas pelos itens fechados. Desta forma, é possível elucidar ainda mais a
intenção da pesquisa.
O acompanhamento do trabalho dos Visitadores na prática corresponde ao momento
de confrontar a análise dos dados obtidos nos questionários com a realidade efetiva da prática
sócio educativa exercida pelos Visitadores junto às famílias atendidas pelo Programa. Este
momento deve contar com roteiro prévio planejado com o intuito de observar questões como:
•
Como o Visitador inseriu a família em seu planejamento?
•
Qual a relevância da participação da família nas práticas propostas pelo Visitador?
•
Como o Visitador envolve a família nas práticas propostas?
•
Qual a relação do Visitador com os saberes prévios das famílias? Como ele lida com o
contexto cultural onde a família está inserida?
•
Como é a postura do Visitador diante de sua tarefa de ‘ensinar’, tendo em vista a idéia
de criação de possibilidades para produção e construção do conhecimento?
O terceiro momento corresponde à análise dos dados, com base na teoria da análise de
conteúdo de Bardin (2002). Será o momento de confrontar os dados obtidos nos dois
momentos anteriores e, desta forma, procurar responder ao problema ao qual se dispõe a
pesquisa. Bardin (2002) afirma que esta análise deve basear-se em operações de
desmembramento do texto em unidades, ou seja, descobrir os diferentes núcleos de sentido
que constituem a comunicação, e posteriormente, realizar o seu reagrupamento em classes ou
categorias.
A presente pesquisa pretende desvendar os significados dos dados levantados,
baseando-se nas questões que norteiam o estudo e respeitando critérios como a freqüência
com que surgem os dados, as estruturas temáticas eleitas, entre outros.
Resultados (ou Resultados e Discussão)
A pesquisa se encontra em fase de aprovação do primeiro questionário pela equipe de
Coordenação do Programa e pela equipe do Centro de Referência Latino America para a
Educação Pré Escolar (CELEP) de Cuba, responsáveis pela implantação, monitoramento e
avaliação do Programa Primeira Infância Melhor no Rio Grande do Sul. Portanto, não é
possível descrever os resultados obtidos pela pesquisa.
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Conclusão
A pesquisa está em fase de execução não sendo possível descrever suas conclusões.
Referências
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70,
2002.
GÜNTER, H. Como Elaborar um Questionário. Brasília, DF: UnB, Laboratório de Psicologia Ambiental,
2003.
IBGE. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2007. Rio
de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2007.
KLAUS, Frey. Políticas Públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de
políticas públicas no Brasil. Revista de Planejamento e Políticas Públicas, Curitiba, 2000.
SCHNEIDER, Alessandra; RAMIRES, Vera. Primeira Infância Melhor: uma inovação em política pública.
Brasília: UNESCO, Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, 2007.
UNESCO. Bases sólidas: educação e cuidados na primeira infância; relatório de monitoramento global de
educação para todos – EPT, 2007. Brasília: UNESCO, 2007.
_____. Educação para todos: o compromisso de Dakar. Brasília: UNESCO, CONSED, Ação Educativa,
2001. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001275/127509porb.pdf>.
UNICEF. Crianças de até 6 anos: o direito à sobrevivência e ao desenvolvimento. Brasília, 2006.
YIN, Robert K. Estudo de Caso: planejamento e métodos. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.
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Política de Atendimento à Primeira Infância: formação e