Mesas
Multiplataforma: Tempo e Formatos.
para Conteúdos de Curta Duração
Políticas Públicas e o Mercado do Curta no Século XXI
Conhecendo as demandas
Aletéia Selonk
Doutora em Comunicação Social, produtora da Okna Produções
e integrante da diretoria da ABD-N.
A
primeira mesa do Seminário Curta e Mercado, intitulada Multiplataforma: Tempo e Formatos para Conteúdo de Curta Duração,
tinha como objetivo apresentar experiências do mercado voltadas
à difusão, distribuição e exibição de produtos audiovisuais de curta duração. Assim, formou-se um painel de informações sobre o perfil desses cases,
as características dos produtos a serem comercializados e as oportunidades
existentes.
Defendo a ideia de que o audiovisual de curta duração pode ser um
protagonista do mercado atual. Isto ao considerar as suas características e
possibilidades de distribuição em todas as janelas de exibição. No entanto,
conhecer iniciativas em andamento e obter informações sobre o mercado é
sempre um passo fundamental para compreendermos o nosso ambiente e
sermos capazes de gerar novas estratégias para as nossas produções e para
todo o segmento audiovisual. Esse estudo favorece o desenvolvimento de
novos modelos de negócios por parte dos realizadores e produtores. Essa foi
a proposta que norteou toda a primeira mesa do Seminário.
Douglas Silveira foi o primeiro convidado a falar. Ele coordena o
Núcleo de Comunicação da TV Escola, um canal do Ministério da Educação
que entrou em operação em 1996. A TV Escola é exibida por meio de antena parabólica analógica e digital, por algumas operadoras a cabo do Brasil
e pela internet. Silveira explicou que a emissora tem a sua programação
composta por documentários e programas educativos voltados ao público
infantil. Além do uso em sala de aula, feito por professores e educadores de
escolas que dispõem de kits tecnológicos — TV, DVD e antena parabólica —
a grade também atende ao público em geral, às famílias brasileiras.
Entre 60 e 70% da programação é adquirida de empresas educativas
internacionais, a maioria proveniente da Holanda, França, Canadá, Coréia e
Inglaterra. O restante é produzido aqui mesmo, no Brasil.
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
Os conteúdos adquiridos são, normalmente, aqueles que não são encontrados no mercado brasileiro. E a produção pela emissora segue regras rígidas de licitação, o que pode causar uma lentidão nos processos, o que não se
adéqua ao ritmo acelerado da montagem de uma grade de TV. Assim, como
é difícil encontrar produtos prontos que abordem, de maneira educativa, a
língua portuguesa ou a história do Brasil, por exemplo, a tendência é que
estas demandas sejam atendidas por produções internas. Silveira salientou
que a principal vantagem dessas licitações é a possibilidade de contratos de
trabalho com produtoras de todo o Brasil.
João Garção Borges apresentou a todos o case do programa Onda Curta – um espaço para exibição de curtas-metragens na RTP – Rádio e Televisão de Portugal – da qual ele é criador e programador. O programa de Garção
Borges é exibido no canal RTP2, que tem perfil cultural. No Brasil, a TV
Brasil se assemelha a ele.
Importante destacar que o curta-metragem sempre foi exibido nas televisões portuguesas. O Onda Curta vai ao ar em horário nobre, às 21 horas,
e tem uma hora de duração, agrupando vários filmes. O programa exibe,
especialmente, filmes de criação, de autor. Mas, todos os gêneros são aceitos — ficção, documentário, experimental, animação. A seleção do que vai
ar é feita pelo próprio Garção, que programa os filmes de melhor qualidade
segundo a sua opinião. Ele acredita que cada filme tem seu público específico e, dessa forma, mantém-se firme aos seus próprios critérios na hora de
fazer a seleção.
Todos os filmes exibidos são remunerados a partir de uma mesma
média de preço, hoje estimada em 65 euros por minuto, para duas exibições,
sem exclusividade. Como seu trabalho já está consolidado, o Onda Curta
também possui importantes parcerias com eventos internacionais, como o
prêmio de aquisição do Festival Curta Cinema, do Rio de Janeiro.
O terceiro participante da mesa, Carlos Dowling — coordenador de
programação da TV da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) — apresentou o trabalho da Rede Nordestina do Audiovisual (RNA), projeto que ele
também coordena. A RNA é um “pontão de cultura”, iniciado em 2007, que
tem como objetivo promover a articulação e o intercâmbio das experiências
do “fazer audiovisual” na região Nordeste. Mas, além de encontros presenciais, ela cria novos mecanismos para viabilizar essa troca de experiências.
O principal deles é o portal Rede Nordestina do Audiovisual – um espaço na internet que possibilita o compartilhamento de conteúdo audiovisual,
especialmente de filmes de curta duração. Realizadores podem disponibilizar seus filmes para que sejam assistidos através do portal além de possibi138
seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
litar a troca de informações através de listas de conteúdo. Ainda em teste de
usabilidade, o portal já conta com uma parceria com o programa XPTO.Lab,
para trabalhar com a capacitação para o uso de tecnologias interativas para
a TV Digital, aproximando programadores de tecnologia da informação e
produtores de conteúdo. As exibições dos filmes através do portal não têm
fins lucrativos, mas modelos de comercialização são possíveis dentro desta
estrutura e serão pensados nas fases posteriores do projeto.
O funcionamento da Programadora Brasil – um programa da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, desenvolvido pela Cinemateca
Brasileira através da Sociedade Amigos da Cinemateca, desde 2006 — foi
apresentado por sua coordenadora, a produtora Moema Müller. O objetivo principal da iniciativa é promover o encontro do público com o cinema
brasileiro através de uma ação que visa a formação de público, o fomento
ao pensamento crítico em torno da produção nacional e o fortalecimento de
iniciativas de difusão cultural. Isso se dá pela organização de programas de
filmes brasileiros, disponibilizados em DVD, e autorizados a serem exibidos
em pontos associados ao programa, que hoje já são mais de 1.400 – normalmente, espaços de exibição sem fins comerciais tais como cineclubes,
centro culturais, pontos de cultura, escolas, bibliotecas, museus, são alguns
exemplos de associados.
Com mais de 700 filmes disponíveis, sendo que a maioria deles, 78%,
tem menos de 30 minutos de duração, a Programadora Brasil oferece 214
DVDs. Cada DVD é um programa que, na prática, funciona como uma sugestão de programação, organizada por um rigoroso trabalho de curadoria que
disponibiliza curtas-metragens, curtas e longas-metragens ou apenas longasmetragens.
Todos os filmes recebem remuneração e são escolhidos entre as produções nacionais e os inscritos no edital de seleção da Programadora. A única
exigência é que os títulos possuam CPB – Certificado de Produto Brasileiro,
expedido pela Ancine.
Sabrina Nudeliman fechou a mesa e focou-se no tema da distribuição.
Ela é co-fundadora e diretora da distribuidora Elo Company – uma distribuidora de conteúdo audiovisual. A empresa trabalha com distribuição tradicional e, em seu catálogo, estão filmes de todos os formatos, duração e gêneros.
Sabrina explicou também que, além de comercializar os títulos no Brasil —
para televisões, linhas aéreas —, a Elo possui um forte trabalho de colocação
do produto brasileiro no mercado internacional. E a área de mídias digitais
vem ganhando espaço em virtude de um aumento na demanda. A própria
Elo criou canais na internet que disponibilizam conteúdo sob demanda, de
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
modo segmentado, ou seja, um canal para documentários, outro para animação, e assim por diante.
Ainda sobre as mídias digitais, Sabrina defendeu a tese de que quanto
mais perto dos olhos, menor a tela — por exemplo, a tela do celular — e,
portanto, menor duração deve ter o conteúdo. Além disso, a ordem das janelas começa a se alterar e disponibilizar os filmes na internet já não impede a
exibição ou comercialização em festivais e televisões, segundo ela.
Durante a apresentação, Sabrina condensou dicas sobre a comercialização de conteúdo. Elas são úteis, pois apontam cuidados que realizadores
devem ter desde a concepção do projeto. Os principais tópicos abordados
foram: o produtor deve se responsabilizar e ter todos os contratos de liberação de direitos de obras literárias adaptadas e trilhas sonoras; ao criar um
produto audiovisual deve-se pensar no seu público, direcionando-o para
algumas das fatias, pois assim, evita-se trabalhos muito abertos, que tentam
dialogar com todas as audiências, o que é muito difícil; produzir materiais
extras — vídeos, fotos, releases — para serem usados na divulgação; selecionar os festivais e pensar na distribuição, desde o início do projeto.
O que fica claro aqui é que os realizadores precisam definir as suas
intenções de distribuição, bem como o perfil dos produtos que estão sendo
criados. Quando estas questões são levadas em consideração desde a concepção dos projetos, os resultados podem ser mais efetivos. Já para as produções
concluídas, é necessário adaptar-se aos perfis de cada oportunidade e colocar
a “cara na rua”, ou seja, oferecer as produções audiovisuais para distribuidores, programadores e exibidores.
As chances de uma boa remuneração são maiores se considerarmos
modelos de negócio que possam ser explorados a médio e longo prazo, acumulando remunerações advindas de diversos contratos. Ou então, produzir
de modo a atender uma real demanda do mercado. Mesmo assim, não podemos desconsiderar, neste momento, a importância da difusão do produto
nacional, mesmo que isso não se reverta em remuneração. A oferta do filme
de curta duração pode ser encarada como uma estratégia para o aumento
da demanda já existente, para a consolidação das cinematografias regionais
e para o estímulo às iniciativas em funcionamento. Afinal, bons resultados
geram novas demandas e novas demandas impulsionam o mercado para
modelos de negócios capazes de gerar benefícios financeiros para todos os
agentes envolvidos. E essa é a nossa meta.
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Interlocução com o Poder Público
resumo elaborado por Lizandra Magon de Almeida,
editora do material impresso do Festival Internacional
de Curtas-metragens e desta publicação.
P
ara encerrar o Seminário Curta & Mercado, foram reunidos alguns
representantes das instâncias de governo ligadas ao audiovisual, sob
a coordenação da presidente da ABD-N, Solange Lima. Também compareceu o presidente da Fundacine e diretor executivo do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), Cícero Aragon, convidado a falar sobre a realização
do Congresso que aconteceria alguns dias depois, de 12 a 15 de setembro,
em Porto Alegre.
André Sturm, coordenador da Unidade de Fomento e Difusão de Produção Cultural (UFDPC) da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, e
personalidade importante na história recente do curta-metragem brasileiro
abriu os trabalhos. Sturm foi diretor do Cineclube da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo, um dos pontos de exibição mais efervescentes do final da
década de 1980, quando o curta-metragem começou a retomar seu prestígio
perante o público e quando surgiram diversas iniciativas para promovê-lo.
Ele falou sobre esse período e também apresentou um projeto que está
sendo desenvolvido pela Secretaria da Cultura para levar o cinema brasileiro de curta-metragem a cidades do interior paulista que não contam com
salas de exibição. Segundo Sturm, foi feito um mapeamento das cidades
onde havia auditório ou biblioteca e foram doados projetores digitais com
a condição de que fossem criados cineclubes. Ao todo, 50 municípios foram
contemplados. A Secretaria também está fazendo uma compilação de curtasmetragens produzidos com recursos do Prêmio Estímulo, que completa 30
anos, para doar para essas cidades.
Em seguida, apresentou-se o secretário do Audiovisual do Ministério
da Cultura, Newton Cannito. “Sentimos que estamos em um momento de
inovação, e dentro desse momento queremos apoiar a distribuição”, afirmou
ao começar. Cannito comentou a necessidade de se fomentar o debate a respeito do produto audiovisual brasileiro. “Debate e comercialização são duas
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
coisas muito próximas, pois os filmes discutem a sociedade brasileira e isso
impulsiona a campanha do filme. Muita gente fica pensando na publicidade
do filme, mas esse conceito é antigo. É preciso haver um posicionamento no
campo das ideias, divulgar ideias e conceitos para que o filme tenha repercussão.”
Nesse sentido, Cannito propôs uma valorização dos críticos e curadores. “O mundo digital valoriza os curadores, que são agregadores independentes de conteúdo. São pessoas, não empresas, e eles têm prestígio junto às
comunidades. Estamos sempre desprestigiando o campo intelectual e isso
acaba tendo repercussões na economia. Dentro das políticas de distribuição de curtas-metragens, existem pessoas importantíssimas que funcionam
como agentes.”
Outra questão levantada por Cannito foi a importância dos festivais
para agregar valor aos filmes. Segundo o secretário, é muito importante
haver tantos festivais, mas seria fundamental investir para tornar suas marcas mais fortes e com isso alavancar a exibição e comercialização dos filmes.
“Falamos em mercado como se fosse uma coisa só, mas são vários segmentos. Os festivais precisam refletir essa variedade, e não o contrário. Muita
gente acaba tentando fazer filmes que são o estilo deste ou daquele festival.”
Em relação ao mundo digital, Cannito disse que é preciso saber que a
Internet tem uma vocação para o gratuito, que é realmente difícil conseguir
remuneração nessa mídia. Mas que justamente não se pode mais pensar
em segmentação por mídias. “O raciocínio digital é transmidiático, então a
estratégia precisa ser pensada para o conteúdo. Hoje existem séries de TV
que ganham dinheiro vendendo música para IPhone, outras vendem brinquedos, outras vendem DVDs. São várias ações em paralelo, de acordo com o
conteúdo, que já precisa ser pensado nesse sentido.” Outra forma é por tipos
de público, completou. “Estamos pensando em financiar pesquisas sobre a
tendência do gosto do consumidor.”
O convidado seguinte foi Manoel Rangel, diretor da Ancine. Ele destacou a importância da convergência digital, citando o Plano Nacional para
Banda Larga, do Governo Federal, que pretende levar o acesso à banda larga
para toda a população do país. “O cenário projetado para o futuro aponta para
a perspectiva de que o cidadão vai estar diante de uma tela, qualquer tela, e
vai receber conteúdo audiovisual. Precisamos estar preparados para isso.”
Rangel também destacou a importância da existência de projetos propostos pelos próprios realizadores audiovisuais, como uma maneira consistente de avançar nas discussões. Nesse sentido, aposta no projeto Curta em
Todas as Telas (veja no final desta publicação). Ele alertou os realizadores
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
sobre a demanda futura por obras audiovisuais que deve surgir com a aprovação do PL 29/PLC 116. “Vejo este como um momento que pode marcar
uma geração de realizadores.”
Antes de abrir para as perguntas da plateia, Solange Lima afirmou
que um dos maiores desafios dos realizadores brasileiros, diante de tantas
mudanças no cenário do audiovisual, é a profissionalização do setor. Questões de direitos autorais e documentação são algumas das preocupações que
precisam estar na mente dos realizadores, tema que também foi comentado
por Paulo Alcoforado, da Ancine, que afirmou que é preciso avançar a discussão nesse sentido, pois o pagamento de direitos está diretamente ligado
à geração de negócios. “A organização dos direitos morais e patrimoniais
decorrentes da autoria resolve muitas dificuldades, mas exige uma capacitação que ainda não existe da produção executiva”, afirmou. “No âmbito do
audiovisual, a Ancine é a agência responsável por isso, para ajudar nessa
capacitação.”
Caio Plessman, da ABD-SP, comentou sobre a questão dos festivais
levantada por Cannito. Segundo Plessman, hoje os festivais não agregam
mais valor no sentido de levar público às salas de cinema, pois a lógica do
mercado atual é diferente. Entretanto, os festivais agregam no sentido cultural, o que em última análise pode ajudar na carreira do filme. Plessman
também afirmou que existem mais de 220 festivais cadastrados pelo Forum
de Festivais e que existe uma diversificação na temática.
Em seguida, Paulo Alcoforado se manifestou sobre o assunto, dizendo
que os festivais poderiam articular lançamentos de filmes brasileiros visando ocupar as salas de cinema. Também informou que está sendo criado o
Programa Banco de Conteúdos Audiovisuais Brasileiros, uma central de produções brasileiras de audiovisual. A Cinemateca Brasileira será a responsável pelo projeto, mantendo as atividades de preservação e restauro que já
desenvolve e passando também a digitalizar esses conteúdos para disponibilizar para o licenciamento a outras instituições e distribuição em banda larga. A Cinemateca já está conectada ao backbone da Rede Nacional de Ensino
e Pesquisa (RNP) e fará parte do Plano Nacional de Banda Larga.
Cannito respondeu aos comentários dizendo que é preciso ir além das
avaliações feitas até o momento, com abordagens mais críticas e menos
defensivas. “Temos muitas coisas para abordar, podemos falar em lançar
melhor os filmes, em reserva de mercado, em ações regulatórias, mas também temos de atacar por outro lado. Não podemos ficar tentando encontrar
culpados, como o cinema americano. Nós precisamos bolar outra estratégia,
ir além, atacar os nichos.”
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
Solange lançou uma provocação a Manoel Rangel, de que faltou abordar a questão das salas de cinema. Para Rangel, a exibição em salas hoje não
é tão prioritária para o filme de curta-metragem, diante da multiplicidade de
formatos digitais e novas mídias. “Respeito o direito desse formato estar na
sala de cinema e acho que deve estar, mas não acho que esse seja o problema
mais importante da comercialização. É uma ponta, mas o centro é a demanda em larga escala, o que pode gerar uma demanda econômica efetiva.” Para
Rangel, o mundo convergente impôs outro ritmo à cena do audiovisual. “A
sala de cinema é uma vitrine, e eu admito que é preciso ter vitrine quando
se trata de um produto audiovisual, mas para se ter resultado econômico é
necessário pensar em todas as plataformas.”
Sobre a questão dos direitos autorais, Rangel explicou que a Ancine
não tem atribuições nesse sentido, mas que o tema precisa ser acompanhado na discussão da nova lei de direitos do autor. Para Cannito, a ideia é que
exista uma arrecadadora privada ligada às associações de autores.
Cícero Aragon interveio para propor uma reflexão sobre o papel estatal
na organização do banco de conteúdos brasileiros, que está sendo desenvolvido pela Cinemateca Brasileira. Segundo ele, é necessário que o governo dê
suporte às iniciativas privadas e que evite uma concorrência entre os negócios já existentes e os projetos governamentais. Rangel respondeu dizendo
que o banco de conteúdos apenas organiza os materiais, mas que não tem o
propósito de ofertá-los ao usuário.
O cineasta Geraldo Moraes comentou a importância dos festivais de
cinema no sentido de desenvolver novos públicos e de promover a inclusão audiovisual. “Antes alguns festivais se preocupavam em levar estrelas e
isso realmente gerava mídia, mas hoje esse aspecto festivo foi substituído
por outro que me parece mais importante, que é levar os filmes ao grande
público.” Rangel complementou afirmando que deveria haver mais apoio do
Estado a iniciativas que abram esse tipo de possibilidade.
Em seguida, todos os demais inscritos fizeram suas perguntas para
Newton Cannito e Manuel Rangel. Cynthia Alario, da Rede Brazucah, remeteu-se à palestra de Ana Carla Fonseca (veja na página 25), que falou sobre o
desenvolvimento de uma indústria criativa com a participação do governo, e
perguntou como os representantes da SAv e da Ancine veem o audiovisual
de curta duração dentro da indústria criativa. Talitha Dalacosta, da M1ND
Tecnologia, lembrou que a empresa desenvolveu ferramentas para mensurar
o desempenho da produção audiovisual em meios como o telefone celular,
e se colocou à disposição para eventuais estudos que o governo quisesse
desenvolver.
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
Retomando o comentário de Manuel Rangel sobre a exibição dos
curtas-metragens em sala de cinema, Jaime Lerner, da APTC-RS, lembrou
que projetos citados por Rangel como bem-sucedidos — caso do Curta nas
Telas, do Rio Grande do Sul — não foram reproduzidos em outros estados.
“O que se poderia levar para o âmbito nacional de iniciativas como essa?”,
perguntou.
Silvio Da-Rin, da EBC/TV Brasil, se pronunciou a seguir fazendo um
apanhado histórico da Lei do Curta e, apesar de concordar com a afirmação de Rangel de que a exibição em salas não é mais a questão central do
curta-metragem, cobrou um posicionamento no sentido de substituir essa
legislação por outra mais adequada ao momento atual. “Essa é uma questão chata, um cadáver que ficou insepulto em minha gestão na Secretaria
do Audiovisual, mas é uma janela que não pode ser desprezada. Acho que
é preciso que o setor se posicione claramente em relação a isso, para que
não continuemos sendo admoestados pelos jurássicos nostálgicos que consideram falta de vontade política a regulamentação de um dispositivo que é
anacrônico, limitadíssimo.”
A produtora Paula Pripas comentou que a participação de curtas em
festivais internacionais é uma boa oportunidade de comercialização, seja
dos direitos, seja de cópias em DVD ou até de coletâneas e outros produtos
semelhantes. Ela perguntou se existe a possibilidade de que o produtor seja
o próprio distribuidor das obras de curta duração, já que tem sido difícil conseguir que uma distribuidora comercial lance filmes desse formato.
Aletéia Selonk, da diretoria da ABD-N, abriu o Seminário coordenando
a primeira mesa e foi a última inscrita para perguntas. Ela fez um breve
apanhado do processo de criação do Seminário, dizendo que se no início da
discussão, há cerca de um ano, a ideia da Lei do Curta ainda estava muito
presente, ao longo do tempo foi sendo esquecida, já que as ideias foram
atualizadas, avançaram e devem continuar avançando já que existe a expectativa de que o assunto continue a ser fomentado no blog do Seminário até
a próxima edição do evento, prevista para 2011 no Festival Internacional de
Curtas-metragens de São Paulo.
Manuel Rangel começou então a responder às perguntas, fazendo um
apanhado da ação da Ancine nos últimos dez anos. “Toda a operação que se
conduziu ao longo dos últimos dez anos de ação do Estado brasileiro representa um esforço de construção de uma economia do audiovisual robusta, na
qual o produto audiovisual brasileiro e as empresas brasileiras estejam no
centro da ocupação do mercado interno. Digamos que as condições oferecidas
nunca foram tão expressivas como são hoje, as condições de financiamento,
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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração
a quantidade de novos que entraram na cena, a construção de laços com a
rede de TVs públicas.”
Em resposta ao questionamento de Jaime Lerner, Rangel inverteu as
perguntas: “Como vocês farão com que os projetos de vocês se materializem?
Que iniciativas estão sendo pensadas de articulação com empresas do setor?
E com distribuidores, exibidores, programadores? Que visitas estão sendo
programadas às televisões abertas para oferecer parcerias? Que estratégia as
ABDs construíram para que seu projeto tenha continuidade?”.
Rangel se referia ao projeto “Curta em Todas as Telas”, e afirmou que
fez essa “provocação” sentindo-se em casa, já que também fez parte da ABD.
“Sempre é bom lembrar que não se espere uma iniciativa redentora do Estado. Esse é um processo de construção articulada.” Para o diretor da Ancine,
“o documento da ABD constitui uma belíssima plataforma de diálogo com
o poder público, mas sobretudo com os outros parceiros do mercado. É preciso pensar no agregador, no agente de vendas, em quem vai abrir mão de
seu impulso criativo, de autor, para se dedicar ao negócio, porque é preciso
pensar sob esse ponto de vista — poucas pessoas estão dispostas a cumprir
esse papel.”
O secretário do Audiovisual então fez seu pronunciamento final, retomando a ideia da indústria criativa e a necessidade de valorizar o autor e
todos os elos da cadeia. “Sempre insisto que ninguém deve trabalhar de graça, isso é antiético, é errado. O audiovisual é uma indústria que tem um processo de feitura artesanal e uma distribuição industrial. Não é um processo
fordista, isso nunca funcionou na arte. Mas precisamos ver o cidadão como
um consumidor, consumir é um processo político. É uma mudança de raciocínio que precisamos ter, de que o processo tem de ser pensado para que
todos ganhem e nem sempre o financiamento fique só a cargo do Estado.”
A coordenadora da mesa, Solange Lima, agradeceu a todos os organizadores e participantes, e encerrou dizendo que a nova geração que hoje está
pensando em fazer cinema “dialoga, cobra e também propõe, porque é só
assim que se avança. Acho que essa foi uma grande mudança, que pudemos
ver aqui neste Seminário”.
A partir das discussões elaboradas durante os três dias de evento, o
documento “Curta em Todas as Telas” foi atualizado e sua nova versão está
disponível nas páginas seguintes.
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