O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ
CARACTERIZAÇÃO E TENDÊNCIAS
Estudo financiado com recursos da Secretaria de
Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior/
Fundo Paraná
CURITIBA
2007
GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ
ROBERTO REQUIÃO - Governador
SECRETARIA DE ESTADO DO PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO GERAL
NESTOR CELSO IMTHON BUENO - Secretário
SECRETARIA DE ESTADO DA AGRICULTURA E DO ABASTECIMENTO
NEWTON POHL RIBAS - Secretário
INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL - IPARDES
JOSÉ MORAES NETO - Diretor-Presidente
NEI CELSO FATUCH - Diretor Administrativo-Financeiro
MARIA LÚCIA DE PAULA URBAN - Diretora do Centro de Pesquisa
SACHIKO ARAKI LIRA - Diretora do Centro Estadual de Estatística
THAÍS KORNIN - Diretora do Centro de Treinamento para o Desenvolvimento
INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ - IAPAR
JOSÉ AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS PICHETH - Diretor-Presidente
ARNALDO COLOZZI FILHO - Diretor Técnico-Científico
ALTAIR SEBASTIÃO DORIGO - Diretor de Administração e Finanças
MARIA LÚCIA CRODREMORE - Diretora de Recursos Humanos
EQUIPE TÉCNICA
Karen Follador Karam (Orientação Técnico-metodológica)
Ivo Barreto Melão - IPARDES (Coordenação)
Anibal Rodrigues - IAPAR
Marina Maruyama Mori - IPARDES
Moacir Roberto Darolt - IAPAR
Sergio Wirbiski - IPARDES
COLABORAÇÃO
Marisela Garcia Hernández (pesquisadora externa)
Gisele de Lorena Diniz Chaves (pesquisadora externa)
EDITORAÇÃO
Maria Laura Zocolotti - Coordenação
Estelita Sandra de Matias (revisão)
Ana Batista Martins, Ana Rita Barzick Nogueira, Léia Rachel Castellar (editoração eletrônica)
Stella Maris Gazziero (tratamento de imagens)
Lucrécia Zaninelli (geoprocessamento)
Maria Dirce Botelho Marés de Souza (normalização bibliográfica)
M553
O mercado de orgânicos no Paraná : caracterização e
tendências / Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico
e Social e Instituto Agronômico do Paraná. – Curitiba : IPARDES,
2007.
188 p. + anexos.
Estudo financiado com recursos da Secretaria de Estado da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior/Fundo Paraná.
1. Produtos orgânicos. 2. Agricultura orgânica. 3. Paraná. I. Instituto
Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. II. Instituto
Agronômico do Paraná.
CDD 631.147(816.2)
2
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS........................................................................................................................
4
LISTA DE TABELAS .........................................................................................................................
6
LISTA DE SIGLAS.............................................................................................................................
7
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................
11
1 PARA PENSAR O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ: ABORDAGEM
TEÓRICO-METODOLÓGICA DO ESTUDO ................................................................................
16
1.1 MARCO TEÓRICO: O MERCADO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL .......................................
16
1.1.1
Os Aportes da Nova Sociologia Econômica..........................................................................
17
1.1.2
A Abordagem Político-Cultural da NSE e o Mercado de Orgânicos .....................................
19
1.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DO ESTUDO DO MERCADO DE
ORGÂNICOS NO PARANÁ .......................................................................................................
22
1.2.1
Coleta Documental ................................................................................................................
22
1.2.2
Preparação da Pesquisa de Campo .....................................................................................
23
1.2.3
Realização da Pesquisa de Campo ......................................................................................
27
2 O MERCADO DE ORGÂNICOS: CONFIGURAÇÃO HISTÓRICO-SOCIAL ..............................
31
2.1 AS RECENTES TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO AGROALIMENTAR E OS
PRODUTOS ORGÂNICOS ........................................................................................................
2.1.1
31
As Mudanças na Sociedade Contemporânea e a Emergência da Agricultura
Orgânica ................................................................................................................................
32
2.2 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA AGRICULTURA ORGÂNICA E A RELAÇÃO COM
OS DIFERENTES MERCADOS DE ORGÂNICOS....................................................................
38
2.2.1
Síntese do Processo de Regulamentação dos Alimentos Orgânicos no Brasil....................
40
2.2.2
A Institucionalização da Agricultura Orgânica no Paraná .....................................................
44
2.2.3
A Certificação e o Mercado de Orgânicos.............................................................................
47
2.3 O SISTEMA DE PRODUÇÃO ORGÂNICO: FATORES TECNOLÓGICOS E A
RELAÇÃO COM OS TIPOS DE MERCADO .............................................................................
2.3.1
A Agricultura Orgânica e as Tecnologias de Processo e de Produto ...................................
2.3.2
A Agricultura Familiar e a Produção Orgânica: Potencialidades e Necessidades
Tecnológicas .........................................................................................................................
51
51
56
2.4 O CONSUMO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: UMA CARACTERIZAÇÃO A PARTIR
DO CONSUMIDOR ....................................................................................................................
62
2.4.1
O Consumidor de Produtos Orgânicos .................................................................................
63
2.4.2
O Consumo Coletivo: o Papel do Mercado Institucional.......................................................
69
3 O MERCADO DE ORGÂNICOS: SITUAÇÃO MUNDIAL E INSERÇÃO DO PARANÁ .............
71
3.1 O PANORAMA DO MERCADO MUNDIAL DE PRODUTOS ORGÂNICOS .............................
71
3
3.2 A INSERÇÃO DO BRASIL NO MERCADO DE PRODUTOS ORGÂNICOS:
PRODUÇÃO E PROGRAMAS INSTITUCIONAIS .....................................................................
78
3.3 A PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ .................................................................................
82
3.3.1
A Regionalização da Produção Orgânica no Paraná............................................................
84
3.3.2
Instituições e Entidades Envolvidas com a Agricultura Orgânica no Paraná .......................
89
4 MERCADOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS
NO PARANÁ................................................................................................................................. 103
4.1 O MERCADO DA VENDA DIRETA: AS FEIRAS....................................................................... 105
4.1.1
Feiras: Um Canal em Expansão ........................................................................................... 105
4.1.2
Algumas Considerações sobre o Mercado da Venda Direta ................................................ 113
4.2 O MERCADO DO VAREJO: OS SUPERMERCADOS E AS LOJAS ........................................ 114
4.2.1
Supermercados e a Comercialização de Produtos Orgânicos ............................................. 115
4.2.2
Lojas: Outro Agente no Mercado Varejista ........................................................................... 121
4.2.3
Algumas Considerações sobre o Mercado do Varejo........................................................... 125
4.3 MERCADO DE TRANSFORMAÇÃO: EMPRESAS E ASSOCIAÇÕES DE
PROCESSAMENTO E BENEFICIAMENTO .............................................................................. 126
4.3.1
Empresas de Processamento ............................................................................................... 132
4.3.2
Empresas de Processamento Mínimo .................................................................................. 137
4.3.3
Empresas de Beneficiamento ............................................................................................... 140
4.3.4
Associações e Cooperativas de Agricultores e a Transformação de Produtos
Orgânicos .............................................................................................................................. 142
4.3.5
Algumas Considerações sobre o Mercado da Transformação ............................................. 144
4.4 O CENÁRIO DO MERCADO EXTERNO: TENDÊNCIAS E PROCESSOS DE
COMERCIALIZAÇÃO COM OS PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES ............................... 145
4.4.1
O Brasil e o Mercado Externo de Produtos Orgânicos ......................................................... 145
4.4.2
Café e Soja Orgânicos – principais produtos exportados ..................................................... 148
4.4.3
Algumas Considerações sobre o Mercado Externo de Produtos Orgânicos........................ 151
4.5 O MERCADO INSTITUCIONAL: A AÇÃO DO ESTADO COMO UM AGENTE NO
MERCADO DE ORGÂNICOS .................................................................................................... 152
4.5.1
Programa de Aquisição de Alimentos - PAA......................................................................... 153
4.5.2
Programa de Alimentação Escolar: a merenda orgânica...................................................... 157
4.5.3
Algumas Considerações sobre o Mercado Institucional ....................................................... 161
4.6 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS AGENTES QUE ATUAM NO MERCADO DE
ORGÂNICOS NO PARANÁ ....................................................................................................... 162
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS – SUGESTÃO DE DIRETRIZES E POLÍTICAS PÚBLICAS .............. 164
REFERÊNCIAS.................................................................................................................................. 179
APÊNDICES E ANEXOS................................................................................................................... 189
4
LISTA DE QUADROS
1.1 - MATRIZ DAS GRANDES REGIÕES PESQUISADAS, SEGUNDO OS PRINCIPAIS
MUNICÍPIOS, GRUPOS DE PRODUTOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO PARANÁ - 2006......................................................................................................................
26
1.2 - PESQUISA DE CAMPO DE ORGÂNICOS, SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES E
OS AGENTES ENTREVISTADOS - PARANÁ - 2006 ...........................................................
27
2.1 - SISTEMAS DE GARANTIA DE QUALIDADE ........................................................................
49
2.2 - ORGANISMOS CERTIFICADORES INTERNACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA
ORGÂNICA NO BRASIL ........................................................................................................
50
2.3 - ORGANISMOS CERTIFICADORES NACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA
ORGÂNICA ............................................................................................................................
50
2.4 - ORGANISMOS CERTIFICADORES ATUANTES NO ESTADO DO PARANÁ - 2006..........
51
2.5 - POTENCIALIDADES
E
NECESSIDADES
DA
AGRICULTURA
FAMILIAR
NO
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA ORGÂNICA - RMC - PARANÁ.........................
2.6 - PRINCIPAIS MOTIVOS PARA A COMPRA DE ORGÂNICOS PELOS CONSUMIDORES
EM PAÍSES DA EUROPA E BRASIL..................................................................................... 63
2.7 - CARACTERÍSTICAS DOS CONSUMIDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO
BRASIL ................................................................................................................................... 64
3.1 - GRANDES REGIÕES, MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS DO PARANÁ E REGIONAIS
DA EMATER-PR .................................................................................................................... 82
3.2 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS FEDERAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO
PARANÁ - 2006...................................................................................................................... 90
3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA
NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 91
3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA
NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 94
3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA
NO PARANÁ - 2006 ............................................................................................................... 96
3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006 .... 101
4.1 - LOCAL, ESTRUTURA, DIA DE FUNCIONAMENTO E DATA DE ABERTURA DAS
FEIRAS ORGÂNICAS EM CURITIBA - PARANÁ - 2006 ...................................................... 106
4.2 - MERCADO DA VENDA DIRETA DE PRODUTOS ORGÂNICOS (FEIRAS, ENTREGA EM
DOMICÍLIO E VENDA NA PROPRIEDADE) - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E
RESTRIÇÕES - PARANÁ -2006 ............................................................................................ 112
4.3 - FORNECEDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS PARA AS LOJAS DE CURITIBA PARANÁ - 2006...................................................................................................................... 121
61
5
4.4 - MERCADO VAREJISTA (LOJAS) DE PRODUTOS ORGÂNICOS - CARACTERÍSTICAS,
OPORTUNIDADES E RESTRIÇÕES - PARANÁ - 2006....................................................... 124
4.5 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DOS PRODUTOS ORGÂNICOS SEGUNDO AS
EMPRESAS, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006 .................... 131
4.6 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS, SEGUNDO AS
ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE PRODUTORES, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS
PRODUTOS - PARANÁ - 2006 .............................................................................................. 143
4.7 - PRINCIPAIS PRODUTOS COMERCIALIZADOS NO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE
ALIMENTOS/COMPRA DIRETA NO PARANÁ - PRIMEIRO SEMESTRE DE 2006 ................... 156
6
LISTA DE TABELAS
3.1 - DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NOS PRINCIPAIS MERCADOS DOS
PAÍSES DE ALTA RENDA .....................................................................................................
74
3.2 - EVOLUÇÃO DA TAXA DE CRESCIMENTO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO
NOS BLOCOS COMERCIAIS - 1999/2003............................................................................
75
3.3 - EVOLUÇÃO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO COM PRODUÇÃO CERTIFICADA
NA AMÉRICA LATINA E CARIBE - 2000/2004 .....................................................................
76
3.4 - PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ - SAFRAS 2003/2004 E 2004/2005.......................
83
3.5 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA
PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO
METROPOLITANA DE CURITIBA E LITORAL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004...............
85
3.6 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA
PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO
OESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004............................................................................
86
3.7 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA
PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO
SUDOESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 ....................................................................
86
3.8 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA
PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO
NORTE E NOROESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004...................................................
87
3.9 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA
PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO
CENTRO-SUL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004 ................................................................
88
7
LISTA DE SIGLAS
ABNT
- Associação Brasileira de Normas Técnicas
ACEMPRE
- Associação Central de Produtores Rurais Ecológicos
ACOPA
- Associação de Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná
ADAO
- Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica
AFRUHCO
- Associação dos Fruticultores e Hortigranjeiros de Cruzeiro D'Oeste
AFRUTA
- Associação dos Produtores Ecológicos de Porto União
AMC
- Agricultura Motivada pelo Consumidor ou Community Supported
Agriculture
AO
- Agricultura Orgânica
AOPA
- Associação para o Desenvolvimento da Agroecologia
APAC
- Associação de Pequenos Agricultores de Colombo
APAVE
- Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê
APEX/BRASIL
- Agência de Promoção de Exportações do Brasil
APMIS
- Associação de Proteção à Maternidade e Infância
APOL
- Associação dos Produtores Orgânicos de Londrina
APOMAR
- Associação de Produtores Orgânicos de Marilândia do Sul
APOMOP
- Associação dos Produtores Orgânicos do Médio Oeste do Paraná ORGANIVIDA
APONG
- Associação de Produtores Orgânicos de Guaíra
APOP
- Associação de Produtores Orgânicos de Pato Bragado
APRAECOL
- Associação dos Produtores Agroecológicos de Barbosa Ferraz
APROAP
- Associação dos Produtores Orgânicos das Águas do Rio Paraná e
Piquiri
APROMEDE
- Associação de Produtores Orgânicos de Medianeira
APROMIS
- Associação de Produtores Orgânicos de Missal
APROSMI
- Associação de Produtores Orgânicos de São Miguel do Iguaçu
APROVIDA
- Associação de Produtores Orgânicos de Pato Branco
ASPTA
- Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Orgânica
ASSESSOAR
- Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural
BIOVALE
- Associação Regional dos Produtores Orgânicos do Vale do Ivaí
BNDES
- Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CAC
- Conselho de Alimentação Escolar
CAE
- Conselho de Alimentação Escolar
CAMEX
- Câmara de Comércio Exterior
CAPA
- Centro Paranaense de Apoio ao Pequeno Agricultor
8
CDEEP
- Coordenadoria de Programas Especiais de Enfrentamento à
Pobreza
CEAO
- Conselho Estadual de Agricultura Orgânica do Paraná
CEASA
- Centrais de Abastecimento do Paraná
CEDRAF
- Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura
Familiar
CEE
- Comunidade Econômica Européia
CEPORG
- Comissão Estadual de Produção Orgânica
CLAF
- Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar
CME
- Campanha de Merenda Escolar
CNME
- Campanha Nacional de Merenda Escolar
CNPORG
- Comissão Nacional da Produção Orgânica
CODAPAR
- Companhia de Desenvolvimento do Paraná
COFAECO
- Cooperativa das Famílias de Produtores Agroecológicos
CONAB
- Companhia Nacional de Abastecimento
CONSEA-PR
- Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional
COOAVI
- Cooperativa Agroecológica do Vale do Ivaí
COOPAFI
- Cooperativa de Comercialização de Agricultores Familiares de
Capanema
COPAVI
- Cooperativa de Produção Agropecuária de Vitória
COREDES
- Conselhos Regionais de Desenvolvimento
CPEEP
- Coordenadoria de Programas Especiais de Enfrentamento à
Pobreza
CPRA
- Centro Paranaense de Referência em Agroecologia
CRESOL
- Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária
CSAO
- Câmara Setorial de Agricultura Orgânica
EBAA
- Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa
ENA
- Encontro Nacional de Agroecologia
FAO
- Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação
FIEP
- Federação das Indústrias do Estado do Paraná
FINAME - AGRÍCOLA
- Agência Especial de Financiamento Industrial
FNDE
- Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FNECDC
- Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor
FUNDEPAR
- Instituto de Desenvolvimento do Paraná
GAO
- Grupo de Agricultura Orgânica
GEAE
- Grupo de Estudos de Agricultura Ecológica
IAF
- Instituto Agroflorestal Bernardo Hakvoort
IAPAR
- Instituto Agronômico do Paraná
9
IAPAR
- Instituto Agronômico do Paraná
IBD
- Instituto Biodinâmico
IBGE
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEC
- Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
IFOAM
- International Federation of Organic Agriculture Movements
(Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica)
INSTITUTO EMATER
- Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural
IPARDES
- Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
IPD
- Instituto Paraná de Desenvolvimento
ISO
- International Organization for Standardization
(Organização Internacional para Padronização)
IVV
- Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural
MAELA
- Movimento Agroecológico para América Latina e Caribe
MAPA
- Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
MDA
- Ministério do Desenvolvimento Agrário
MDIC
- Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
MDS
- Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MOA
- Fundação Mokiti Okada
NAFTA
- Acordo de Livre Comércio da América do Norte
NEAD
- Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural
NSE
- Nova Sociologia Econômica
OCN
- Órgãos Colegiados Nacionais
ONG
- Organização Não-Governamental
OTA
- Organic Trade Association
PAA
- Programa de Aquisição de Alimentos
PEAE
- Programa Estadual de Alimentação Escolar
PFZ
- Programa Fome Zero
PMISA
- Programa de Manejo Integrado de Solos e Águas
PNAE
- Programa Nacional de Alimentação Escolar
POMAR
- Associação de Produtores Orgânicos de Maringá
PROGER
- Programa de Geração de Emprego e Renda
PRONAF
- Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PROSOLO
- Programa de Recuperação de Solos
RMC
- Região Metropolitana de Curitiba
SAF
- Secretaria da Agricultura Familiar
SEAB/PR
- Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento
SEBRAE
- Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SECEX
- Secretaria de Comércio Exterior
10
SEMA
- Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos
SETI
- Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
SETP
- Secretaria Estadual do Trabalho, Emprego e Promoção Social
SGP
- Sistema de Garantia Participativo
SISCOMEX
- Sistema Integrado de Comércio Exterior
SMAB
- Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Curitiba
TECPAR CERT
- Instituto de Tecnologia do Paraná
UEL
- Universidade Estadual de Londrina
UFPR
- Universidade Federal do Paraná
UNCTAD
- United Nations Conference on Trade and Development
(Conferência das Nações Unidas para o Comércio e
Desenvolvimento)
USDA
- United States Department of Agriculture
11
INTRODUÇÃO
O Projeto "O mercado de Orgânicos no Paraná: caracterização e tendências",
desenvolvido no âmbito do Convênio SETI/IPARDES/IAPAR-TC 06/05, iniciado em setembro
de 2005 e concluído em outubro de 2006, tem como objetivo geral identificar e caracterizar o
mercado dos produtos orgânicos no Estado do Paraná e os principais agentes de
comercialização que atuam nesse mercado, bem como subsidiar a formulação de políticas
públicas de ciência e tecnologia para o desenvolvimento do setor.
Esse estudo torna-se oportuno num cenário em que são crescentes a produção, a
comercialização e o consumo de produtos orgânicos não só no Estado do Paraná, mas
também nos âmbitos nacional e mundial. Cada vez mais se confirma que tal expansão não
reflete uma situação conjuntural, mas um quadro com características estruturais, na medida
em que se intensifica a busca por mais qualidade de vida, tanto para os homens como para
o meio ambiente em geral, traduzindo-se, neste caso, na produção e consumo de alimentos
"limpos e saudáveis".
Tal busca vem se intensificando desde os anos 70 do século passado, decorrente
das críticas e inquietações de diferentes segmentos da sociedade contemporânea com
relação ao tipo e ao ritmo de desenvolvimento adotado pelas sociedades capitalistas. Dentre
as principais conseqüências deste desenvolvimento evidenciavam-se a degradação intensa e
acelerada dos recursos naturais, as rápidas transformações técnicas e sociais nos distintos
sistemas produtivos, a ocupação e aglomeração desordenada e precária nas cidades, bem
como um conjunto de mazelas no meio rural. Neste último caso destacavam-se a
concentração fundiária, o êxodo rural, as transformações nos sistemas de produção e de
relações sociais, a massificação e a dependência produtiva de insumos industriais
(maquinários,
sementes,
agroquímicos
em
geral),
bem
como
a
uniformização
e
homogeneização dos processos produtivos de bens alimentares. Em conseqüência,
constatava-se não só a desarticulação sociocultural rural, como também a perda da
diversidade cultural e dos sistemas de cultivo, além do esgotamento e até extinção da
biodiversidade em diversas regiões.
Em decorrência desse cenário tornou-se evidente a emergência da preocupação
pela sustentabilidade ambiental e social por parte da sociedade em geral. No caso específico
do rural, essa condição foi uma das principais alavancas para a ampliação de práticas
agrícolas produtivas com base sustentável, a valorização do conhecimento de populações do
campo – agricultores familiares, populações indígenas e tradicionais –, a busca pelo manejo
produtivo em distintos ecossistemas. Nesse contexto destacam-se diferentes formas de
12
produção já conhecidas, como a agricultura biodinâmica, a orgânica, a biológica, a natural, a
permacultura e a agroecologia,1 sendo que, para efeito deste estudo, será utilizada a
agricultura orgânica para abarcar todas as formas consideradas de agricultura sustentável.
Esse processo encontrou eco no Estado do Paraná, na mesma época em que a
discussão ocorria em nível planetário. Inicialmente como um movimento que propagava a
"agricultura alternativa", organizado a partir de grupos que reuniam agricultores, técnicos de
organizações não-governamentais (ONGs) e de instituições governamentais, entidades de
apoio e organização de agricultores, militantes em geral, consumidores urbanos,
pesquisadores de universidades e de institutos de pesquisa. Era a combinação de fatores
socioeconômicos, tecnológicos, ambientais e políticos o que caracterizava tal movimento,
que desembocava na manifestação e contraposição ao tipo de agricultura praticada e
estimulada pelo modelo tecnológico da Revolução Verde2, grande responsável por inúmeros
processos de degradação ambiental e de desarticulação social, cultural, política e
econômica vivenciados no meio rural.
Esse movimento deixou de ser de poucos e de ser isolado ao longo das três
últimas décadas, de tal forma que na atualidade o Paraná destaca-se como um dos estados
com representatividade nacional no que se refere à produção de orgânicos. Embora as
1 Darolt (2000) define a diferença entre as formas de produção mencionadas. Para situar brevemente: a agricultura
biodinâmica está baseada em princípios da Antroposofia, instituída por Rudolf Steiner, na Alemanha, nos anos
de 1920, que entende a propriedade agrícola como um organismo, integrando produção animal e vegetal à
paisagem natural, orientando-se por um calendário astrológico biodinâmico, que visa reativar as forças vitais da
natureza. A agricultura orgânica nasce em meados de 1920, com o inglês Albert Howard, e se desenvolve nos
Estados Unidos, a partir de 1948, com J. I. Rodale. Está baseada na melhoria da fertilidade do solo por processo
biológico natural, pelo uso de matéria orgânica, sendo totalmente contrária à utilização de adubos químicos
solúveis. A agricultura biológica foi desenvolvida em 1930 pelo suíço Hans Peter Muller. É praticada na França, e
seu princípio é de que a saúde do solo garante um maior valor biológico e a saúde das plantas. A agricultura
natural tem origem no Japão, em 1938, com as idéias de Masanobu Fukuoka, tem vínculo religioso com a Igreja
Messiânica, e seu fundamento é o de que as atividades agrícolas devem respeitar as leis da natureza, sem
revolvimento do solo e sem a utilização de compostos orgânicos com dejetos animais. A permacultura,
desenvolvida pelo australiano Bill Mollison a partir da agricultura natural, tem como princípio alternar cultivo de
gramíneas e leguminosas e manter a palha como cobertura do solo. E, por fim, a agroecologia, desenvolvida nos
anos de 1980 por Miguel Altieri, nos EUA, adquire status de ciência e propõe a compreensão dos
agroecossistemas segundo princípios agronômicos, ecológicos e socioeconômicos.
2 O termo Revolução Verde refere-se ao modelo tecnológico concebido e implementado nos países do norte, a
partir dos anos de 1950, visando à transformação da agricultura a partir das premissas do sistema industrial.
O pacote tecnológico da Revolução Verde foi concebido como de aplicação universal, visando maximizar o
rendimento dos cultivos em situações ecológicas profundamente distintas. Destinou-se a elevar ao máximo a
capacidade dos cultivos a partir da criação artificial de condições consideradas "ideais", utilizando os
agrotóxicos para eliminar competidores e predadores naturais e os fertilizantes sintéticos para fornecer
nutrientes considerados necessários. A utilização desse "pacote" no Brasil, a partir dos anos 60, levou à
homogeneização das práticas produtivas, à simplificação e à artificialização do meio natural, bem como à
desestruturação das relações sociais no campo.
13
estatísticas sejam frágeis e precárias, tanto em termos nacionais como estaduais, acreditase que o Estado congrega o maior número de produtores do País, a maioria pertencente à
agricultura familiar, com expressiva representatividade na produção, tanto em quantidade
quanto em diversidade, segundo as especificidades das regiões do Estado.
Ao longo desse período, grande parte das ações esteve voltada ao processo de
conversão do sistema produtivo para a agricultura orgânica, desenvolvida pelos próprios
agricultores e suas entidades, apoiados principalmente por ONGs da área em atividades de
assistência técnica, planejamento da produção, capacitação, assessoria e organização
social. Foram poucos, e na maior parte das vezes pontuais, as ações e/ou programas
desencadeados pelas instituições públicas no período, predominando nesse sentido o
engajamento pessoal dos técnicos das instituições de pesquisa e extensão rural
identificados com a temática. A combinação das relações entre esses agentes é que
efetivamente permitiu o processo de construção da agricultura orgânica no Paraná.
Se no campo da produção vários passos puderam ser dados, no que se refere ao
ambiente da comercialização dos produtos orgânicos as ações e/ou atividades são pontuais
e pouco conhecidas, indo desde aquelas desencadeadas pelos próprios agricultores e suas
entidades de apoio, até, mais recentemente, o ingresso da iniciativa empresarial neste
campo. O poder público classicamente tem se mantido à distância nesse aspecto, com
intervenções ainda tímidas e incipientes.
Entretanto, é importante destacar que não são poucos os processos de
comercialização que marcam o atual mercado de produtos orgânicos no Paraná. Ilustrativas
da própria diversificação que caracteriza o processo produtivo e seus produtores, as
transações econômicas também apresentam um largo espectro de situações, evidenciando
diferentes tipos de mercado. Dentre eles estão o mercado da venda direta, representado
pelas relações face a face entre o agricultor e o consumidor por meio das feiras, entregas de
sacolas, vendas na propriedade etc.; o mercado do varejo, onde ocorrem as transações
através de equipamentos de comércio varejista, como supermercados, lojas especializadas
etc.; o mercado do beneficiamento e processamento de produtos orgânicos; o mercado
institucional, que inclui os programas de merenda escolar e o de aquisição de alimentos
para programas de abastecimento; e, por fim, há as transações voltadas ao mercado
externo, em que atuam agentes inclusos nos demais mercados mencionados acima.
Este estudo identifica e caracteriza os três principais tipos de mercado de produtos
orgânicos no Estado do Paraná na atualidade: o mercado da venda direta, do varejo e da
transformação, sendo que os dois outros mercados – institucional e externo – são abordados
de maneira mais geral, visando contextualizar a situação no País e no Estado.
Para tanto, assume-se aqui que mercado é uma construção social, constituído a
partir de um conjunto de relações sociais desencadeadas por diferentes agentes. Buscar-se-á
identificar esses diferentes agentes envolvidos e, sempre que possível, destacar o papel que a
14
agricultura familiar desempenha nesse mercado, com o propósito de apontar futuras políticas
públicas destinadas a fortalecer esses agentes. Isso decorre do reconhecimento da condição
histórica e precursora desses agentes no processo da produção propriamente dita, não só no
Estado do Paraná como no próprio País, buscando agora apoiá-los na esfera da
comercialização, a partir dos tipos de mercado existentes.
Os tipos de mercado e as transações neles contidas são o ponto de partida deste
estudo. E é com esta perspectiva que se buscará identificar e caracterizar o atual mercado
de produtos orgânicos no Paraná, a partir dos seguintes objetivos específicos:
a) analisar as restrições e oportunidades ao desenvolvimento do mercado de
produtos orgânicos no Estado, considerando as especificidades das principais
regiões produtoras e consumidoras do Paraná;
b) realizar um estudo prospectivo dos principais produtos orgânicos para o
mercado paranaense, com apreciação sumarizada para os mercados
nacional e internacional;
c)
identificar e caracterizar os principais agentes envolvidos na produção,
comercialização e distribuição, bem como na agroindustrialização e na
demanda de produtos orgânicos no Paraná;
d) apontar o perfil do consumidor de produtos orgânicos no Paraná;
e) identificar e caracterizar os tipos de mercado de produtos orgânicos no Paraná;
f)
caracterizar os principais problemas de funcionamento das entidades de apoio
(públicas, privadas e da sociedade civil) ao desenvolvimento dos mercados de
orgânicos no Paraná;
g) apresentar os resultados do estudo em seminário e debater com interessados as
proposições de ações e políticas públicas ao mercado de orgânicos do Paraná.
Espera-se que tais procedimentos possam resultar na proposição de políticas
públicas voltadas ao mercado de orgânicos do Paraná, destacando-se ações direcionadas à
agricultura familiar, e em subsídios para a tomada de decisão por parte dos distintos agentes
envolvidos nesse mercado. Também se espera estimular e fomentar estudos e projetos, de
caráter científico e/ou tecnológico, em instituições de pesquisa, universidades e outras.
O projeto, em sua concepção original, pretendia também levantar subsídios para a
constituição de uma rede eletrônica de informações que desse suporte e apoio às ações de
comercialização. Entretanto, o estudo constitui um diagnóstico com sistematização de
informações dispersas, tendo, dentre seus resultados, um cadastro dos principais agentes
de comercialização e de apoio que poderá contribuir para a constituição de uma rede
eletrônica de informações.
Os resultados do estudo que se apresentará a seguir decorrem de distintos
procedimentos de pesquisa, tanto na coleta de dados primários como de dados secundários.
15
Destaque-se que este trabalho assume as características de uma pesquisa qualitativa e de
caráter exploratório, decorrente da incipiência e fragilidade dos dados e informações oficiais,
tanto em termos gerais como no caso do Paraná.
Além da presente introdução, o trabalho está estruturado em quatro partes. Na
primeira apresenta-se a abordagem teórico-metodológica que orientou a realização do
estudo. Tem-se como pressuposto que o mercado é uma construção social decorrente dos
agentes e de suas posições e das relações sociais estabelecidas, segundo o entendimento
proposto pela Nova Sociologia Econômica (NSE). Nesta seção também estão indicados os
procedimentos metodológicos adotados no decorrer da pesquisa.
A segunda parte traz alguns elementos que permitem verificar como se tem dado a
configuração histórica e social do mercado de orgânicos, utilizando principalmente
informações da literatura contemporânea. Para tanto, abordam-se as recentes transformações
no mercado agroalimentar e como se processa a inserção dos produtos orgânicos neste
ambiente; em seguida, contextualiza-se o processo de institucionalização da agricultura
orgânica no País e no Paraná e a relação com os diferentes tipos de mercado; também se
apresenta o sistema de produção de orgânicos, procurando distinguir as tecnologias de
processo e de produto que influenciam a concepção e institucionalização; por fim, trata-se da
questão do consumo, considerando, de um lado, o perfil do consumidor individual e, de outro,
o papel do consumo coletivo, que passa pelo mercado institucional.
A terceira parte do estudo contempla informações sobre o atual mercado de
orgânicos, a situação mundial, a nacional e, mais detalhadamente, sobre o Paraná. Ainda,
contextualiza-se o papel da agricultura familiar e a relação desta com a agricultura orgânica.
Os resultados empíricos da pesquisa de campo são apresentados na quarta parte do
trabalho. Destacam-se os cinco tipos de mercado estudados: inicialmente o mercado da venda
direta, em que predominam as feiras; segue-se o mercado varejista, com os supermercados e
lojas; o mercado de transformação de produtos orgânicos, em que se têm as empresas,
associações e cooperativas de agricultores; o mercado institucional, que inclui os programas de
merenda escolar e o de aquisição de alimentos; e, por fim, alguns elementos do mercado
externo. No final desta quarta parte apresenta-se um cadastro, elaborado no decorrer da
pesquisa, sobre os diferentes agentes envolvidos em cada um dos mercados pesquisados.
Finalmente têm-se as considerações finais, bem como algumas proposições
direcionadas a ações, programas e políticas públicas a serem estimulados e desenvolvidos
pelo Estado. Indicam-se também possibilidades de novas pesquisas, estudos e projetos,
sejam eles de caráter científico ou tecnológico, voltados à compreensão e promoção da
agricultura orgânica no Paraná.
16
1
PARA PENSAR O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ: ABORDAGEM
TEÓRICO-METODOLÓGICA DO ESTUDO
Esta primeira parte do trabalho apresenta a abordagem teórico-metodológica que
orientou a realização do estudo. Parte-se do pressuposto de que o mercado é uma
construção social decorrente dos agentes envolvidos e das relações sociais estabelecidas,
segundo o entendimento proposto pela Nova Sociologia Econômica (NSE). Nesta parte
também estão indicados os procedimentos metodológicos adotados para a realização da
pesquisa de campo.
1.1
MARCO TEÓRICO: O MERCADO COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL
Os estudos e investigações relativos ao tema mercado têm sido realizados
fundamentalmente a partir do suporte teórico e metodológico da ciência econômica. A
Economia, em particular a teoria neoclássica, parte do princípio de que há um homo
economicus como ser abstrato e genérico, o qual é dirigido sempre por um mesmo tipo de
comportamento econômico, independentemente de seu lugar no tempo histórico e no
espaço/lugar em que habita.
Tal assertiva está baseada nos pressupostos do individualismo metodológico, em
que o indivíduo (as empresas, as firmas) é o ponto de partida e de chegada da análise, cujo
principal objetivo é a maximização do lucro. Para tanto, pressupõe-se que tal indivíduo atua
sempre segundo a racionalidade econômica, em que suas escolhas resultam de uma
combinação de fatores voltados a otimizar suas ações e, por conseqüência, seu próprio
lucro. O mercado é o locus onde se processam tais escolhas maximizadoras.
Resumidamente, para a economia neoclássica o mercado é entendido e definido
como um mecanismo abstrato e asséptico onde ocorre a determinação dos preços das
transações econômicas, definidas e realizadas livremente pelos indivíduos. A idéia é de que
há um "ambiente" – o mercado – que exerce um papel de coordenação entre oferta e
demanda, ou seja, entre a transferência do direito de propriedade daquele que vende para
aquele que compra, segundo a noção de um tipo de comportamento universal do homo
economicus, baseado na racionalidade econômica.
Tal perspectiva explicativa das transações econômicas predominou como
hegemônica desde o final do século XIX e várias décadas do XX. Nas últimas três décadas,
a partir dos anos 1970, a crítica a tal posição tem resultado em outros marcos analíticos,
tanto na própria economia (como a nova economia institucional) como em outras áreas do
conhecimento, como é o caso da sociologia. É a partir desta última, e da sua vertente
17
conhecida como a Nova Sociologia Econômica, que se estará abordando a concepção
teórica deste projeto, buscando apreender e estudar o mercado de produtos orgânicos no
Paraná como um mercado construído por diferentes atores sociais.
1.1.1
Os Aportes da Nova Sociologia Econômica
No final dos anos 70 e início dos 80, sociólogos dos Estados Unidos e da Europa
recuperaram as idéias, conceitos e métodos de autores clássicos da Sociologia,
particularmente de Max Weber e Karl Polanyi, para fazer a crítica à abordagem da economia
neoclássica sobre a autonomia da esfera econômica no conjunto da sociedade. Tais autores
destacam a centralidade da dimensão socializadora nas relações econômicas, e por
conseguinte nas relações mercantis, em detrimento da perspectiva da relação individual e
intimista. Com eles se restaura a compreensão dos fenômenos econômicos como sociais, e,
em decorrência, o mercado deixa de ser visto como uma "entidade" à parte e abstrata,
passando a ser visto como algo construído socialmente.
Karl Polanyi é um dos autores mais críticos com relação à economia de mercado,
considerada por ele como um sistema institucional único e peculiar que se consolidou no
Ocidente no século XIX, e que resulta em uma crise que assola as primeiras décadas do
século XX. Ao escrever o livro A Grande Transformação (2000), em 1947, sua motivação
estava na busca por uma "orientação em termos de instituições humanas", a fim de
suplantar tal período e descortinar possibilidades vindouras.
Nesse sentido, dedica-se a analisar os sistemas econômicos e as sociedades, e
destaca que "anteriormente a nossa época, nenhuma economia existiu, mesmo em
princípio, que fosse controlada por mercados. Embora a instituição do mercado fosse
bastante comum desde a Idade da Pedra, seu papel era apenas incidental na vida
econômica" (POLANYI, 2000, p.62). E prossegue afirmando que as pesquisas históricas e
antropológicas mais recentes, à sua época, revelam que "a economia do homem, como
regra geral, está submersa em suas relações sociais" (p.65).
Polanyi faz uma crítica contundente das teses formalistas da economia sobre a
visão generalizante do indivíduo como maximizador de lucro, e defende que haja a
superação do naturalismo histórico na apreensão do mercado, uma vez que tanto este como
aquele estão submersos no todo social, do qual fazem parte. Para o autor, a idéia de um
"mercado auto-regulável" é uma utopia elaborada por economistas, pois o mercado só existe
como construção social e está enraizado na vida social a partir de elementos fundamentais
como as regras, as normas e as paixões.
A noção de "enraizamento", apreendida de Polanyi por Granovetter (2003), será
um dos alicerces para os estudos do mercado na atual sociologia econômica. Em 1985,
18
Granovetter publica um artigo no American Journal of Sociology, onde menciona pela
primeira vez o termo Nova Sociologia Econômica.
Embora tal noção tenha sua pertinência e venha contribuindo na orientação de
várias pesquisas, autores como Swedberg (2004) consideram que ainda há que se fazer um
expressivo esforço na fundamentação teórica da nova sociologia econômica. Nesse sentido,
tem-se recorrido com freqüência ao trabalho empreendido por Max Weber em Economia e
Sociedade (1999), publicado pela primeira vez em 1921,3 após a morte do autor,
particularmente quando aborda "as categorias sociológicas da ação econômica".
Em Weber, o homo economicus definido nos termos da economia não existe, dado
seu caráter genérico e abstrato. Para ele o que existe é o ator econômico, produto da história, o
qual, embora atue a partir de uma dada racionalidade econômica, marcadamente a partir do
próprio capitalismo, só pode existir porque é fruto de condições sociais e históricas. Em Weber,
a racionalidade econômica não é um dado e sequer um pressuposto, uma vez que está definida
pelas condições históricas e sociais, mas deve e pode ser objeto de investigação.
Raud (2003), ao analisar as contribuições de Weber para a Nova Sociologia
Econômica, destaca que se na teoria econômica somente se trata da ação econômica racional,
em Weber o que se aborda é "a ação econômica social, ou seja, a ação econômica que leva em
conta o comportamento de terceiros. Neste sentido, a ação econômica sofre a influência das
expectativas relativas ao comportamento dos outros membros da sociedade" (p.11).
É o mercado que representa, para Weber, o arquétipo da ação econômica social.
Nele se exprime fundamentalmente a ação racional, mas não só ela. E a crítica do autor à
economia está em que ela é míope ao enxergar somente a ação racional, desconsiderando
completamente as demais racionalidades existentes, resultantes da cultura, do direito, da
política, da religião, entre outras. É nesse sentido que Weber introduz a idéia de
interesse/interesses que movem o ator social, destacando-os como produto de construção
social e balizado por instituições – como o direito e a política –, responsáveis por
normatizarem os aspectos éticos e morais do processo de "regateio", fenômeno específico
do mercado para o autor.
As formulações de Weber serão importantes dentro da nova sociologia econômica
na medida em que não apenas contribuem com os aspectos já mencionados, mas também
3 Economia e Sociedade é uma obra póstuma – Weber faleceu em 1920 –, organizada por sua viúva Marianne
Weber a partir de manuscritos do autor. A edição brasileira resulta da tradução da quinta edição, que tem
origem na versão padrão da obra. A versão original, de 1921, foi organizada a partir de escritos de períodos
distintos da produção weberiana, ordenada segundo temas. Segundo o revisor da tradução brasileira, "houve
uma tradução dentro da tradução" da terminologia de 1913, quando Weber desenvolveu o quadro conceitual
sobre a "Sociologia Compreensiva", publicado sob o título Economia e Sociedade, para a terminologia de
1918, quando trabalhou os "conceitos sociológicos fundamentais", que constituem o primeiro capítulo do
volume 1 da obra.
19
introduzem a dimensão política à visão do mercado, por meio da noção de luta. O autor
entende que há uma pluralidade de interessados no mercado que competem e que lutam
por oportunidades de troca. Diz ele: "a troca é um compromisso de interesse entre os
participantes pelo qual se entregam bens ou possibilidades como retribuição recíproca. Toda
troca racionalmente orientada é a conclusão mediante um compromisso de uma prévia luta
de interesses aberta ou latente" (RAUD, 2003).
Tal dimensão política inspirou o sociólogo Pierre Bourdieu (2005) na elaboração
da proposta de campo econômico, onde ocorre a ação entre dominados e dominantes,
formulação relevante para a atual sociologia econômica, cuja discussão será retomada mais
adiante, dada a sua importância para este trabalho.4 Outro autor que merece destaque
nesta perspectiva é Neil Fligstein (2003), cuja abordagem se aproxima da de Bourdieu no
que se refere à noção de campo econômico, ao propor que a emergência de mercados
passa pelo entendimento das relações internas e externas às empresas e suas relações
formais com o Estado.
A fim de sintetizar a compreensão da NSE para o estudo de mercados, a qual
balizará este estudo, vale a pena registrar a definição proposta por Swedberg:
A sociologia econômica pode ser definida de modo conciso como a aplicação de
idéias, conceitos e métodos sociológicos aos fenômenos econômicos – mercados,
empresas, lojas, sindicatos, e assim por diante. Apoiando-se no enfoque de Max
Weber, a sociologia econômica estuda tanto o setor econômico na sociedade
("fenômenos econômicos") como a maneira pela qual esses fenômenos influenciam o
resto da sociedade ("fenômenos economicamente condicionados") e o modo pelo qual
o restante da sociedade os influencia ("fenômenos economicamente relevantes")
(SWEDBERG, 2004, p.7).
1.1.2 A Abordagem Político-Cultural da Nova Sociologia Econômica e o Mercado de Orgânicos
Após quase vinte anos de revigoramento da sociologia econômica, alguns
enfoques têm sido contemplados para se estudar o mercado. A teoria do enraizamento
proposta por Granovetter (2003), a partir de Polanyi, precursora neste empreendimento, tem
merecido críticas e já não é mais tão hegemônica como nos primeiros anos. Isso se deve
4 Como a Nova Sociologia Econômica não é ainda um campo teórico unificado, dado seu tempo de existência e
pluralidade de abordagens, cabe mencionar que os estudos sobre o mercado têm sido realizados a partir dos
seguintes enfoques: o estrutural, o cultural, o cognitivo e o político. Sumariamente: o enfoque estrutural define
os intercâmbios econômicos como padrões de relações interpessoais concretas; o enfoque cultural analisa o
papel dos significados coletivos na definição das estratégias econômicas; o enfoque cognitivo está dirigido à
regularidade estrutural dos processos mentais que limitam o exercício da racionalização econômica; e, o
enfoque político privilegia as lutas pelo poder entre instituições sociais e políticas, como o Estado e as classes
sociais. (ver autores como Wanderley (2002), Lopes Junior (2002), Swedberg (2004)).
20
principalmente ao fato de apresentar limites para lidar com outros fatores relevantes, dentre
eles "com a cultura, com as instituições, com os macrofenômenos e com a política – os
quais, tomados em conjunto, constituem uma parte considerável da economia" (SWEDBERG,
2004, p. 25). Dessa forma, outros enfoques têm sido desenvolvidos dentro da NSE.
Para o estudo do mercado de produtos orgânicos no Paraná utilizar-se-á
principalmente a abordagem político-cultural, a partir das reflexões desenvolvidas por Pierre
Bourdieu (2005), fundamentadas na noção de campo econômico.
O mercado de produtos orgânicos no Paraná será pesquisado como um campo
de ação construído por diferentes atores sociais, procurando verificar o papel e o lugar da
agricultura familiar no seu interior. Para tanto, está-se assumindo a proposição de Bourdieu
quando afirma que a idéia de campo é central para delimitar um espaço de ação,
entendendo que são os agentes e suas relações que criam um espaço como produto da
história coletiva, o qual se reproduz nas histórias individuais. É pressuposto para este
projeto que as disposições econômicas dentro de tal campo "não têm nada de natural e de
universal", sendo produto de construção social.
Importa a este estudo conhecer, identificar e caracterizar no campo econômico de
produtos orgânicos no Paraná o peso de cada agente que dele faz parte. Isso se torna
relevante na medida em que, como afirma Bourdieu, é o peso de cada um que vai conferir
uma certa estrutura ao campo – neste caso o mercado de produtos orgânicos – e a força de
cada agente vai depender de seus recursos e do volume e estrutura de capital nas suas
diversas formas5. Tal tarefa é importante na medida em que permite que se conheça, no
interior do campo, aqueles que são os dominantes, e os agentes, que são os dominados.
Condição relevante em tal abordagem, na medida em que se entende que um campo
econômico é também um campo de tensão e de luta permanente, a partir das relações
sociais que o constituem.
A utilização da teoria do campo, proposta em Bourdieu, permite que se estude o
mercado de produtos orgânicos no Paraná como uma estrutura de relação de forças,
entendendo-o não como abstrato ou genérico, estático ou acabado, mas como um campo
econômico dinâmico com permanente ação e embate entre agentes, que visam conservar
ou transformar o campo de forças. Como afirma o autor, é fundamental que se mantenha
claro que "longe de estarem em um espaço sem gravidade e sem pressões – os agentes
estão diante de um espaço de possibilidades que dependem muito estritamente da posição
que ocupam no campo" (BOURDIEU, 2005, p.34).
5 Quando Bourdieu está falando de capital está considerando-o a partir de suas diversas formas: capital
financeiro, cultural, tecnológico, jurídico, organizacional, comercial e simbólico. Para conhecer com maior
detalhe o que o autor entende por cada uma dessas formas, ver Bourdieu, 2005, p.25.
21
Interessa conhecer quais recursos e estratégias estão mobilizados no presente e
quais já foram mobilizados na construção de tal mercado localizado (neste caso no Paraná),
quais possibilitaram e têm possibilitado a introdução de mudanças. Para tanto, lança-se o
olhar não só para dentro do mercado construído no Paraná, mas também para os elementos
que o articulam a macrofenômenos econômicos, políticos e sociais.
Para tanto, assume-se que grande parte das transformações que ocorrem em um
campo econômico "são freqüentemente ligadas a mudanças nas relações de troca com o
exterior do campo", o que Bourdieu denomina transformações a partir de redefinições das
fronteiras (grifo do autor). Ou seja, o campo econômico relaciona-se com suas fronteiras e,
muitas vezes, as trocas com elas são muito mais relevantes em processos de mudança do
que as que ocorrem internamente ao campo econômico.
Dentre as transformações (ou até mesmo revoluções, nas palavras de Bourdieu), o
autor destaca como muito importantes aquelas que decorrem das trocas estabelecidas com o
Estado6, mas também considera como mobilizadoras as que se originam das "transformações
das fontes de abastecimento [...] (das) mudanças determinadas por mudanças na demografia
[...] ou (das) mudanças nos estilos de vida"7. Bourdieu assinala que muitas vezes é a partir
dessas trocas com as fronteiras que os agentes que são dominados dentro de um campo
assumem a posição de "desafiadores", construindo "redutos" e/ou mercados especializados,
os quais podem ser a entrada para o seu próprio desenvolvimento.
Parece muito oportuna a abordagem acima para a reflexão sobre o mercado de
orgânicos. A partir dela se pode trabalhar com a hipótese de que as mudanças nos estilos de
vida das últimas décadas do século passado propiciaram que se gerassem determinadas
6 Vale a pena transcrever a citação a seguir, a qual elucida significativamente a relevância da relação com o
Estado: "A competição entre as empresas assume freqüentemente a forma de uma competição para o poder
sobre o poder do Estado – notadamente sobre o poder de regulamentação e sobre os direitos de propriedade
– e para as vantagens asseguradas pelas diferentes intervenções do estado, tarifas preferenciais, patentes,
regulamentos, créditos para pesquisa-desenvolvimento, compras públicas de equipamento, ajudas para
criação de emprego, inovação, modernização, exportação, habitação etc. Em suas tentativas para modificar a
seu favor as 'regras do jogo' em vigor e valorizar assim algumas de suas propriedades suscetíveis de
funcionar como capital no novo estado do campo, as empresas dominadas podem utilizar seu capital social
para exercer pressões sobre o Estado e obter dele uma modificação do jogo a seu favor. Assim, o que se
chama de mercado é apenas, em última instância, uma construção social, uma estrutura de relações
específicas, para a qual os diferentes agentes engajados no campo contribuem em diversos graus, através de
modificações que eles conseguem lhe impor, usando poderes detidos pelo Estado, que são capazes de
controlar e orientar". (BOURDIEU, 2005, p.40).
7 No primeiro caso o autor cita como exemplo as grandes descobertas petrolíferas do começo do século XX;
com relação à demografia, exemplifica com a queda da natalidade ou o aumento da expectativa de vida; e no
que tange aos estilos de vida, destaca o crescimento do trabalho das mulheres, ocasionando a queda de
produtos e criando outros, como, por exemplo, os dos produtos congelados e dos fornos de microondas etc.
(BOURDIEU, 2005, p.41).
22
condições que levaram a um processo de construção social desse mercado. Nesse sentido o
ponto nevrálgico foi a crise ambiental e, em decorrência, os questionamentos sobre o tipo de
desenvolvimento nas sociedades capitalistas contemporâneas. A constatação da degradação,
da poluição e da finitude dos recursos naturais – água, solo, fauna e flora – expôs os aspectos
negativos dos sistemas produtivos mantenedores dos mercados de produtos agroalimentares.
Em contrapartida há uma mobilização de contracultura que, entre outras tantas coisas, aposta
na produção e no consumo de alimentos "limpos e saudáveis" como uma das possíveis
estratégias para a conservação não só ambiental, mas também de qualidade de vida para os
homens em geral.
Enfim, conhecer o mercado de produtos orgânicos no Paraná coloca-se como um
desafio e também como um aprendizado, segundo a perspectiva ora adotada e apresentada
sumariamente. Trata-se de um percurso que vale a pena iniciar, pois traz o vigor de
desfazer a idéia de autonomia e de auto-regulação do mercado em relação à vida social,
apontando-o como palco de ação e construção, onde agentes sociais, instituições e políticas
públicas têm parte e responsabilidade.
1.2
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DO ESTUDO DO MERCADO DE
ORGÂNICOS NO PARANÁ
Este estudo sobre o mercado de produtos orgânicos no Paraná caracteriza-se
como uma pesquisa qualitativa e de caráter exploratório. Tal caráter advém da incipiência e
fragilidade de dados e informações básicas, seja dos processos de comercialização seja dos
agentes no campo econômico, tanto na situação específica do Paraná como em termos
mais gerais. De outro lado, a abordagem qualitativa permitiu a necessária abertura
metodológica na realização deste estudo, cujos procedimentos e instrumentos eram
construídos à medida que se obtinham dados e informações e que se deparava com as
limitações para obtê-los, tendo sempre presente que o interesse está em conhecer os
processos que apontem para a construção social do mercado, ou seja, sobre quem são os
agentes e como se desenvolvem as transações econômicas entre os mesmos.
A seguir apresentam-se os principais procedimentos que dão origem a este estudo.
1.2.1
Coleta Documental
O procedimento de coleta documental permaneceu constante no transcurso do
projeto, visando identificar elementos na literatura que contribuam na compreensão da
estrutura, do funcionamento e das transformações do mercado de produtos orgânicos,
considerando-o como um campo econômico, segundo a abordagem teórica adotada.
A busca na literatura focou a produção no País e no Paraná, dirigiu-se à temática
geral dos orgânicos, e particularmente àquela que abordasse as questões de mercado e
23
comercialização dos produtos. Em geral o que se verifica é que o estudo da temática é
ainda recente, a maioria da última década, mais precisamente dos últimos cinco anos, fruto
sobretudo de trabalhos acadêmicos, resultante de estudos específicos e localizados,
apresentados em artigos esparsos em revistas científicas ou de divulgação institucional.
Percebe-se que os estudos estão mais direcionados à pesquisa sobre a produção
propriamente dita, o que não implica a utilização da perspectiva de sistema de produção. Muitos
trabalhos estudam culturas ou grupos de culturas específicas, ora salientando a dimensão
agronômica, a ambiental, a econômica, a sócio-organizacional, a político-institucional, entre
outras, sem, contudo, uma efetiva interligação entre tais dimensões. Também se verifica a
existência de trabalhos relativos a certificação, ao perfil de consumidores urbanos de produtos
orgânicos, a programas institucionais, em particular sobre a merenda escolar.
Os estudos que tratam do tema "mercado" em geral o fazem sob distintas
perspectivas. De um lado há os trabalhos genéricos, que mencionam estatísticas nem
sempre comprovadas sobre número de produtores, diversidade e quantidade produzida,
volume comercializado, canais de comercialização e valores nas transações, desde o nível
local ao mercado externo. De outro, há os que descrevem situações particularizadas ou
localizadas, comparando custos e desempenho dos produtos orgânicos com similares da
produção convencional, a maioria abordando os produtos in natura (principalmente as
hortaliças), ou detalhando aspectos de algum canal de comercialização, normalmente as
feiras e/ou supermercados.
Embora se constatem as limitações na literatura e nas fontes de dados oficiais, foi
possível estabelecer, ainda que preliminarmente, os tipos de mercado onde ocorrem as
transações econômicas de comercialização de produtos orgânicos, os quais se buscará
analisar neste estudo. São eles: o mercado das relações face a face, onde ocorrem as
transações econômicas diretas entre produtor e consumidor; o mercado varejista, em que
predominam os supermercados; o mercado de beneficiamento e transformação; o mercado
institucional, decorrente de programas de governo; e, ainda, o mercado externo.
1.2.2
Preparação da Pesquisa de Campo
A partir da literatura e em face da fragilidade da base de dados e informações oficiais,
verificou-se a necessidade de buscar outros dados que contribuíssem para a definição dos
procedimentos a serem adotados para a realização da pesquisa de campo. Dentre eles, foi
fundamental identificar as regiões a serem pesquisadas, os tipos de mercado predominantes ou
existentes, bem como os agentes envolvidos na comercialização. Os itens a seguir mostram os
passos que orientaram a construção do cenário voltado à pesquisa.
24
ƒ
Definição das regiões a serem pesquisadas
Inicialmente recorreu-se aos dados disponibilizados pelo Instituto EMATER, órgão
que, em princípio, reúne e divulga as informações pertinentes à produção e comercialização
de produtos orgânicos no Estado. Constatou-se que os dados disponíveis referiam-se à
produção, indicando genericamente, nas regiões, os principais produtos produzidos, bem
como o número de agricultores envolvidos. Percebeu-se que havia uma incongruência com
relação ao número total de agricultores por região e para o Estado, uma vez que um mesmo
produtor estava contabilizado segundo cada um dos produtos produzidos, o que resultava
em uma sobrecontagem no número de agricultores e, em decorrência, no total apresentado.
Diante dessa situação buscou-se obter uma melhor identificação da realidade
estadual, por meio de um mapeamento sumário da produção e dos produtores de orgânicos
no Estado, considerando os produtos e os canais de comercialização, segundo regiões do
Paraná. Para tanto foram elaboradas questões com a finalidade de levantar dados
específicos sobre orgânicos, as quais passaram a compor o questionário aplicado
anualmente pela coordenação estadual junto aos técnicos das 19 regionais da EMATER.
Esse questionário tem o propósito de coletar informações sobre as atividades
desenvolvidas, tanto no que tange à extensão rural como ao acompanhamento dos
resultados da agricultura orgânica.
As questões referentes aos dados sobre orgânicos foram discutidas e preparadas
em parceria entre a equipe deste projeto e os técnicos da coordenação estadual do Instituto
EMATER e da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (SEAB/PR), e visam
levantar dados sobre: produção; beneficiamento e transformação; número de agricultores;
identificação dos canais, das estratégias, das potencialidades e limites atuais de
comercialização. Os questionários foram encaminhados pelo escritório central do Instituto
EMATER para todas as regionais e escritórios no início de novembro de 2005, retornando
preenchidos no final de dezembro do mesmo ano. Entretanto, a tabulação dos dados sobre
os itens referentes aos orgânicos só foi possível no final de fevereiro de 2006.
Os dados coletados nos questionários frustraram as expectativas, uma vez que
muitas questões não foram respondidas, e outras só o foram parcialmente. De qualquer
maneira, processaram-se os dados disponíveis, os quais, acrescidos de informações de
outras fontes, possibilitaram a elaboração de uma matriz que serviu de referência para a
organização da pesquisa de campo.
A matriz teve como ponto de partida a regionalização das informações segundo as
dez mesorregiões do Paraná, definidas pelo IBGE (1989), procurando compatibilizá-la com a
regionalização dos 19 Escritórios Regionais do Instituto EMATER. Para a elaboração da matriz,
foram consideradas as seguintes variáveis: a) produto orgânico predominante; b) participação
25
do produto no total da produção orgânica do Estado; c) área média em hectare do produto
orgânico; d) número de produtores orgânicos por produto; e) canais de comercialização por
produto orgânico; f) entidades, instituições e organizações com interface na produção e
comercialização de orgânicos; g) principal município produtor do produto orgânico; h)
tipificação do agente de mercado orgânico (quadro A.1.1 do Apêndice 1).
No decorrer da elaboração da matriz verificou-se a insuficiência de dados relativos
às variáveis e à respectiva regionalização. Por esta razão julgou-se pertinente agregar tais
dados não mais por mesorregiões, mas, sim, adotar a noção de grandes regiões, a fim de
tornar factível a operacionalização da pesquisa.
As grandes regiões são as seguintes:
1.
Metropolitana e Litoral - congregam a Mesorregião Geográfica Metropolitana
de Curitiba, abrangendo os Escritórios Regionais do Instituto EMATER de
Curitiba e Paranaguá;
2.
Oeste - congrega a Mesorregião Geográfica Oeste, estando aí contidos os
Escritórios Regionais do Instituto EMATER de Cascavel e Toledo;
3.
Sudoeste - congrega a Mesorregião Geográfica Sudoeste, estando aí
contidos os Escritórios Regionais de Francisco Beltrão e Pato Branco;
4.
Norte e Noroeste - congregam as Mesorregiões Geográficas Norte Central, Norte
Pioneiro, Noroeste e Centro-Ocidental, e nela estão contidos os Escritórios
Regionais do Instituto EMATER de Londrina, Maringá, Ivaiporã, Apucarana,
Campo Mourão, Cornélio Procópio, Jacarezinho, Paranavaí e Umuarama;
5.
Centro-Sul - congrega as Mesorregiões Geográficas Centro-Oriental, CentroSul e Sudeste, e nela estão contidos os Escritórios Regionais de Ponta
Grossa, Guarapuava, União da Vitória e Irati.
O quadro 1.1, a seguir, apresenta as cinco grandes regiões pesquisadas,
destacando-se os principais municípios, grupos de produtos e agentes de comercialização
de orgânicos em cada uma das regiões.
26
QUADRO 1.1 - MATRIZ DAS GRANDES REGIÕES PESQUISADAS, SEGUNDO OS PRINCIPAIS MUNICÍPIOS, GRUPOS
DE PRODUTOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO - PARANÁ - 2006
GRANDES
PRINCIPAIS MUNICÍPIOS
PRINCIPAIS GRUPOS DE
PRINCIPAIS AGENTES DE
REGIÕES
PRODUTORES DE ORGÂNICOS
PRODUTOS ORGÂNICOS
COMERCIALIZAÇÃO
Metropolitana e
Mandirituba, São José dos
Hortaliças, plantas medicinais e
Associações de produtores,
Litoral
Pinhais, Balsa Nova, Colombo,
frutas
varejistas, empresas
Antonina, Morretes, Campo Largo
processadoras e distribuidoras
e Campina Grande do Sul
Oeste
Marechal Cândido Rondon,
Leite, milho, suínos, hortaliças e
Entidades de apoio e
Cascavel e Jesuítas
café
assessoria, e associações de
Francisco Beltrão e Pato Branco
Soja, aves, leite e hortaliças
Entidades de apoio e
produtores
Sudoeste
assessoria, varejistas,
associações de produtores e
empresas
Norte e Noroeste
Londrina, Maringá, Paranacity,
Café, açúcar mascavo, melado,
Processadoras, assentamentos,
Loanda, Cruzeiro do Oeste,
mandioca, frutíferas, soja e
atacadistas, feiras, associações
Campo Mourão e Ivaiporã
hortaliças
de produtores, entidades de
Guarapuava, União da Vitória,
Feijão, plantas medicinais,
Prefeituras, ONGs, empresas
São Mateus do Sul, Irati, Lapa,
mate, mel e hortaliças
distribuidora e processadora, e
apoio e assessoria
Centro-Sul
Turvo, Ponta Grossa e Palmeira
associações de produtores
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
ƒ
Elaboração de formulários e calendário da pesquisa de campo
Considerando os tipos de mercado, foram definidos os agentes envolvidos na
comercialização, alvo, portanto, da presente investigação. São eles: a) associação ou
cooperativa de agricultores orgânicos; b) empresas de beneficiamento e transformação;
c) varejistas; e d) instituições de apoio e extensão: EMATER, ATERs, ONGs e prefeituras.
Em seguida elaborou-se um formulário para a pesquisa, com perguntas abertas,
orientando as principais questões a serem investigadas. Mesmo considerando a
especificidade de cada agente, buscou-se manter uma base comum, havendo variações
segundo a característica do agente. Os formulários estão estruturados em quatro seções:
1) identificação do agente; 2) informações específicas do agente no que se refere à forma
de atuação e aspectos relativos à certificação; 3) informações relativas à comercialização:
produto, número de produtores, canais utilizados, origem e destino, formato da venda,
restrições e oportunidades, perspectivas, sugestões; 4) informações gerais sobre o sistema
de produção (Apêndice 2).
Em março de 2006 foi realizado um pré-teste do instrumento, aplicado junto aos
diferentes agentes de comercialização, o qual foi ajustado em seguida. A partir daí
organizou-se um roteiro e calendário para a realização da pesquisa de campo.
27
1.2.3
Realização da Pesquisa de Campo
A pesquisa de campo ocorreu entre os meses de março a junho de 2006. Foram
realizadas 142 entrevistas em 60 municípios, sendo 32 com associações e/ou cooperativas
de agricultores, 22 com empresas de beneficiamento e processamento, 33 com varejistas
(lojas e supermercados), 5 feiras, 12 organizações de apoio não-governamentais e 38
instituições de governo (quadro 1.2).
QUADRO 1.2 - PESQUISA DE CAMPO DE ORGÂNICOS, SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES E OS AGENTES
ENTREVISTADOS - PARANÁ - 2006
GRANDES REGIÕES
AGENTES
Centro-Sul
Agentes de Apoio
RMC e Litoral
Norte e
Sudoeste
Noroeste
Oeste
TOTAL
12
13
25
12
20
82
Governo
4
8
13
3
10
38
ONGs
4
2
2
2
2
12
Associações e Cooperativas
4
3
10
7
8
32
Agentes de Comercialização
6
25
15
5
9
60
Supermercados
1
11
6
1
5
24
Lojas
-
3
4
1
1
9
Feiras
2
1
2
-
-
5
3
10
3
3
3
22
Total
18
38
40
17
29
142
N.º de Municípios
10
10
17
5
18
60
Empresas de processamento
e beneficiamento
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
O quadro A.3.1 (Apêndice 3) apresenta a pesquisa realizada nas grandes regiões
e respectivos municípios, com a identificação dos agentes entrevistados, tanto os de apoio
como aqueles diretamente envolvidos na comercialização.
O mapa 1, a seguir, mostra as grandes regiões definidas para este estudo, bem
como localiza os municípios visitados durante a realização da pesquisa de campo.
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29
As entrevistas foram realizadas pelos membros da equipe do projeto. Previamente
à saída a campo organizou-se um agendamento de entrevistas com informantes chaves,
contemplando os agentes em cada uma das grandes regiões. A identificação da maioria
deles decorreu da indicação de técnicos atuantes nas regiões, tanto das instituições
governamentais como não-governamentais. Tal situação predominou no caso das
associações e cooperativas de agricultores, bem como entre as instituições e entidades de
apoio e extensão. Contudo, cabe salientar que, ao se tomar contato com a realidade de
comercialização de orgânicos em cada região, naquelas situações em que se identificaram
novos agentes ou outros informantes relevantes, também se buscou entrevistá-los.
Com relação às empresas de beneficiamento e transformação, a partir de um
primeiro contato direto, via telefone, houve a indicação e o agendamento da entrevista,
normalmente realizada com o responsável pela área de comercialização. No caso do
comércio varejista, principalmente o supermercado, ao se chegar em cada região procedeuse à visitação daqueles considerados mais relevantes a fim de confirmar a existência de
produtos orgânicos em comercialização. A partir daí, mas também contando com a
indicação dos informantes chaves, agendava-se uma entrevista, a qual, na maioria dos
casos, ocorria com o responsável pelo setor de FLV – frutas, legumes e verduras.
Aqui cabe uma reflexão e avaliação do instrumento de pesquisa elaborado.
Embora este tenha sido previamente testado, a diversidade de situações encontradas em
campo e a pouca precisão dos dados disponíveis, dada a dinâmica constante no que tange
à produção, produtores e comercialização dos produtos, mostraram que o instrumento
utilizado serviu basicamente como um roteiro de questões. Tal situação ficou mais evidente
a partir do momento em que se passou a tabular os dados coletados, verificando-se que em
grande parte das situações o que se obteve na pesquisa foram relatos gerais, permitindo
uma idéia geral dos processos de comercialização. A fim de organizar os resultados das
entrevistas, estruturou-se uma ficha-síntese de cada uma delas, na qual estavam contidas
as informações resultantes do trabalho de campo.
Com relação à comercialização de produtos orgânicos do Paraná com o mercado
internacional, embora na pesquisa de campo se tenha levantado informações relativas a tais
transações com os diferentes agentes pesquisados, este tópico recebeu um tratamento à
parte, fazendo-se uma investigação direcionada para dois dos produtos, considerados os
mais relevantes nas estatísticas oficiais, o soja e o café. Para tanto, foram realizadas
entrevistas abertas, a partir de um roteiro de questões, com os agentes que transacionam
esses produtos.
Também fez parte da estratégia de levantamento de dados e informações de
campo entrevistas informais com alguns informantes chaves afins ao tema da
comercialização, como a APEX no Paraná (Agência de Promoção de Exportações), a
informantes ligados ao mercado institucional, como os responsáveis pelo programa da
30
merenda orgânica no Estado, e ao Programa de Aquisição de Alimentos, tanto no nível
federal como estadual. Foram informalmente entrevistados, ainda, técnicos de instituições
governamentais, como a SEAB (Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado do
Paraná), do Instituto EMATER (Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão
Rural), IAPAR (Instituto Agronômico do Paraná), TECPAR (Instituto de Tecnologia do
Paraná), bem como do SEBRAE (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas).
Complementarmente, participou-se como observador em alguns eventos relativos
ao tema dos orgânicos, visando perceber o estado da arte no que se refere às questões de
mercado e comercialização de produtos orgânicos. Dentre eles destaca-se o "III Congresso
Brasileiro de Agroecologia", realizado em Florianópolis-SC, em outubro de 2005; o "Seminário
sobre Comercialização de Produtos Orgânicos do Vale do Ivaí", em Ivaiporã-PR, em outubro
de 2005; o "1º Paraná Orgânico", encontro realizado no início de dezembro de 2005, no
Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA), situado na Região Metropolitana
de Curitiba-PR; e a "Oficina de Documentação do PAA - Região Sul", em Quatro
Barras/Curitiba-PR, no Centro de Referência em Agroecologia, de 26 a 28 de abril de 2006.
O evento foi organizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), órgão do
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em parceria com o Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
31
2
O MERCADO DE ORGÂNICOS: CONFIGURAÇÃO HISTÓRICO-SOCIAL
Visando compreender o mercado de orgânicos como um campo econômico,
segundo os pressupostos teóricos orientadores do estudo, apresenta-se sucintamente,
nesta segunda parte, o cenário atual com alguns elementos que permitem sua configuração
histórico-social, segundo reflexões da literatura contemporânea.
Para tanto, apresenta-se, no primeiro item, a constituição do mercado de
orgânicos a partir da discussão das recentes transformações no mercado agroalimentar,
abordando-se, em seguida, a institucionalização da agricultura orgânica e a relação com os
diferentes tipos de mercado, neste caso considerando desde o panorama mundial até a
situação atual no Paraná. O terceiro item discute o sistema de produção da agricultura
orgânica, enfatizando os fatores tecnológicos e suas diferenças quando se adotam
tecnologias de produto e/ou tecnologias de processo, bem como a relação das mesmas com
os tipos de mercado. Por fim, discute-se o papel do consumo na constituição histórica e
social do mercado de orgânico, caracterizando inicialmente o consumidor individual, voltado
a demandar o produto orgânico em si, abordando-se em seguida o consumo coletivo de
orgânicos através do mercado institucional.
2.1
AS RECENTES TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO AGROALIMENTAR E OS
PRODUTOS ORGÂNICOS
O mercado de produtos orgânicos é um campo econômico em construção. Para
apreendê-lo é importante situar o contexto em que ele se insere, ou seja, identificar os
principais elementos que fundamentam a "história social de sua emergência", como destaca
Bourdieu (1989).
Para
tanto,
apresentam-se
alguns
elementos,
ou
pelo
menos
aqueles
considerados mais importantes para este estudo. Parte-se do princípio de que a emergência
do mercado de orgânicos se dá no interior de um campo mais amplo e hegemônico, qual
seja, o do mercado de produtos agroalimentares. Nesse sentido, busca-se percorrer
sumariamente as principais transformações nas últimas décadas que retratam a atualidade
do mercado agroalimentar, destacando as condicionantes macrossocietárias, e, diante
delas, a possibilidade de ver emergir o mercado de produtos orgânicos como um campo
desafiante, para utilizar a expressão de Bourdieu (2005).
32
2.1.1
As Mudanças na Sociedade Contemporânea e a Emergência da Agricultura
Orgânica
Um dos aspectos relevantes para refletir sobre o processo de construção do
mercado de orgânicos situa-se no curso das recentes transformações que marcaram o
campo econômico do mercado de produto agroalimentar. Para a apreensão de tal processo
será feita aqui uma breve reflexão sobre as principais mudanças ocorridas, evidenciando a
relação que se estreita entre a indústria, a agricultura e o comércio varejista.
De um modo geral os estudiosos que analisam as transformações no mercado
agroalimentar destacam o caráter mundializado que o mesmo adquiriu no decorrer da última
metade do século XX nas sociedades de mercado, particularmente nas ocidentais. As
mudanças não ocorreram linearmente nos continentes e países. Os tempos históricos, além
de distintos, são marcados por diferentes condicionantes socioeconômicos e políticos.
Enquanto nos países do hemisfério norte as mudanças foram se delineando no decorrer da
primeira metade do século XX, nos países do sul, e no Brasil em particular, as características
de mundialização ocorreram rapidamente a partir da segunda metade do mesmo século.
As mudanças que caracterizam o mercado agroalimentar, no caso brasileiro,
refletem as mudanças estruturais no conjunto da sociedade. No meio rural os reflexos se
fazem sentir na transformação dos sistemas de produção, seja na base tecnológica seja nas
relações sociais de produção, na estrutura agrária, nos processos de industrialização da
agricultura, bem como nos processos de distribuição e comercialização dos produtos
agrícolas. Acirra-se no período o embate que permanece atual e que tem origens históricas,
expresso no confronto histórico sobre o destino da produção agrícola nacional: de um lado,
produzir para exportar, a fim de garantir divisas para a balança comercial, e, de outro,
produzir para o abastecimento interno, a fim de garantir alimento para a população,
principalmente a urbana.
Como as mudanças são de natureza societária, além dos reflexos no meio rural o
que se verifica é uma nova configuração no padrão urbano-industrial, que contribui na
formatação de novas estruturas no mercado de produto agroalimentar. Se até então o capital
agrário havia tido importância fundamental, rapidamente o predomínio se dá a partir das
relações entre o capital industrial e o comercial, à luz do que já ocorria nos países hegemônicos,
que se articulam para suprir as demandas originadas pela concentração urbana. O
adensamento da população no meio urbano implica mudanças no padrão alimentar, e os
resultados imediatos e mais visíveis se verificam, de um lado, no fortalecimento e intensificação
da industrialização dos alimentos e, de outro, no crescimento e predomínio comercial do setor
varejista, o qual se desvincula cada vez mais do setor atacadista.
Até a década de 1970, o que caracterizava o mercado agroalimentar era a
produção de alimentos em escala. Esta produção decorria da rápida absorção do modelo
33
tecnológico da revolução verde, consolidado e conhecido como "Padrão Técnico Moderno",
em que passou a predominar o estreitamento nas relações entre agricultura e indústria,
fosse pelo uso e consumo intensivo de insumos e maquinaria, por perseguir altos
rendimentos e pela ênfase na quantidade de produção.
O alimento deixa de ter um significado sociocultural e rapidamente passa a
compor o arranjo de produtos agroindustriais, imerso em cadeias de produção globais.
Perde a característica de bem de consumo final e adquire principalmente a condição de
matéria-prima para a indústria de alimentos processados. Tal condição irá garantir o que
Friedman (1993) aponta como os dois princípios da agricultura industrial: durabilidade, o que
permite ao alimento permanecer "bom para o consumo" por longo tempo; e distância, o que
lhe permite chegar a lugares distantes do ambiente da produção da matéria-prima.
Os estudos que abordam os sistemas agroalimentares nesse período se dedicam
mais fortemente a analisar os aspectos referentes à produção propriamente dita. De um modo
geral as análises relativas à distribuição e à comercialização, bem como às relações ali
implicadas, são secundarizadas. Aqueles que tratam do tema destacam principalmente os
serviços de distribuição, mostrando que neles predominava até então o setor atacadista, que
era exigente em capital fixo e estrutura administrativa e funcional, concentrada e extensa.
A consolidação da agricultura industrializada corresponde ao crescimento que se
verifica no setor do varejo. Este se rearranja a partir da relação com a indústria e, em
decorrência, consolida-se uma rápida organização e fortalecimento em grandes estruturas
varejistas, baseadas sobretudo em redes de super e hipermercados.
No decorrer dos anos 70 essa condição imprime uma nova estruturação no
mercado agroalimentar, tanto em nível mundial como no Brasil. A literatura pertinente
aponta vários elementos que contribuíram para que houvesse tal processo, dentre os quais
se destacam: a consolidação da articulação entre a indústria e a agricultura, com a
transformação nos sistemas de produção; a saturação do padrão de consumo alimentar,
impulsionado principalmente pela população dos países centrais, que, ao ampliarem o poder
aquisitivo, passam a incorporar novos hábitos de consumo; a fragilização do papel de
intervenção direta do Estado; a crise do modelo fordista de produção, que se espalha por
todos os setores, exigindo maior flexibilização e diversificação tecnológica.
Os agentes que assumiram papel relevante nesse cenário foram aquelas
empresas que permanecem dominando até hoje o campo econômico do mercado de
produto agroalimentar, lideradas pela indústria de alimentos, que passam a atuar como
holdings transnacionais. Não menos relevante nesse cenário é o papel normativo e
regulatório que o Estado assume, criando condições favoráveis ao ambiente institucional,
por meio da legislação, favorecendo a atuação do setor varejista.
34
As transformações no processo de comercialização dos alimentos, através das
redes varejistas e da industrialização, são concomitantes àquelas ocorridas nos sistemas de
produção agrícola e nas relações sociais de produção. Nesse sentido, o Estado também
desempenhou um papel efetivo no que se convencionou denominar modernização
conservadora da agricultura8 ou expansão do capitalismo no campo, atuando principalmente
por meio das empresas de pesquisa e de extensão rural, na promoção do projeto
modernizador baseado na transferência de tecnologias, com alto consumo de insumos e
especialização da produção.
No que se refere às relações sociais de produção, a modernização conservadora
da agricultura resultou num forte impacto no campo, sendo que um dos mais expressivos
deveu-se à implantação de relações de trabalho assalariado na agricultura, nas grandes e
médias propriedades. Tal condição desarticulou formas anteriormente existentes, como o
colonato e a parceria, em que os trabalhadores, embora não fossem proprietários da terra,
mantinham condições de produzir alimentos para o consumo e, ainda, transacionar
excedentes em mercados locais. Esta reconfiguração implicou o surgimento de uma nova
categoria, a dos trabalhadores rurais conhecidos como bóias-frias, e, sobretudo, resultou no
êxodo rural que marcou profundamente a sociedade brasileira e particularmente a
paranaense. No Paraná, nas décadas de 70 e 80 do século passado, cerca de 1,1 milhão de
pessoas tiveram que sair do meio rural, estimando-se que, em conseqüência,
desapareceram 100 mil estabelecimentos com menos de 20 hectares.
Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que se consolidava o desenvolvimento do
capitalismo agrário no Brasil, como já ocorrido e em curso em outras partes dos países
capitalistas, verificava-se que o peso das unidades produtivas baseadas no trabalho
assalariado e no uso intensivo de capital era relativo. Estudos realizados no final dos anos
80 e início dos 909 passaram a mostrar que em praticamente todos os países do capitalismo
central a base social de desenvolvimento agrícola esteve assentada na unidade familiar de
8 Guilherme Delgado (2001) destaca que "a chamada ‘modernização conservadora' da agricultura nasceu com
a derrota do movimento pela Reforma Agrária [...] foi também uma maneira de responder aos intensos
desafios da industrialização e urbanização, combinados com uma necessária diversificação e elevação das
exportações primárias e agroindustriais do Brasil [...] significou a efetiva integração técnica da indústria com a
agricultura que ocorreu no Brasil nas décadas de 60 e 70, estando apoiada na articulação do Sistema
Nacional de Crédito Rural, a partir de 1965, e no fortalecimento das estruturas fomentadoras da produtividade
e funcionalidade do crescimento capitalista no setor [...] perseguiu-se na política agrícola a concepção de
planejamento induzido dos mercados de produtos rurais [...] estimulou-se a adoção de pacotes tecnológicos
da 'Revolução Verde', então considerados sinônimos de modernidade, e incentivou-se um enorme
aprofundamento das relações de crédito na agricultura mediando a adoção desses pacotes com volumosas
subvenções financeiras".
9 Veiga (1991); Lamarche (1993); Abramovay (1992), para citar alguns.
35
produção, ou seja, na agricultura familiar, conceito que passou a vigorar no decorrer da
década de 90.10
Destacar a agricultura familiar no contexto deste trabalho é importante dadas as três
principais funções que definem sua lógica de atuação diante da unidade produtiva, qual seja, a
inter-relação entre produção, consumo e acumulação do patrimônio. São essas condições,
segundo Lamarche (1993), que permitem a produção/reprodução em cada geração, visando
assegurar um nível de vida estável para o conjunto da família e a reprodução dos meios de
produção. Assim, diferentemente da agricultura industrial/empresarial, a família é o centro da
exploração familiar, seja no que tange à decisão sobre a gestão financeira dos recursos como
do trabalho total disponível. O significado da remuneração não se direciona pelo "lucro puro",
como em uma empresa, mas está relacionado ao projeto familiar que atribui significado à
remuneração do seu capital, da terra e dos meios de produção, o qual vai lhe permitir viver e
dar continuidade à família (CARMO, 1998).
Outro aspecto que distingue a agricultura familiar da empresarial é o fato de ela
não poder ser entendida como homogênea, uma vez que comporta diferentes graus de
relações produtivas que se expressam nas transações econômicas mais ou menos intensas
com os distintos tipos de mercado. Tal condição chama a atenção não só para a diversidade
neste segmento específico, mas também para a observância da diferenciação social
existente na agricultura, e, conseqüentemente, nas relações com os distintos mercados.
A título de ilustração, cabe destacar a importância da agricultura familiar no
ambiente da modernização conservadora da agricultura brasileira. O estudo realizado por
Kageyama e Bergamasco (1989/1990) mostrou que, em 1980, dos 5,1 milhões de
estabelecimentos rurais existentes no País, 70% utilizavam o trabalho da família total ou
parcialmente, quando comparados aos estabelecimentos que empregavam mão-de-obra
assalariada. No que se refere à produção, os dados censitários de 1985 mostraram que
grande parte dos alimentos produzidos para o consumo da população brasileira vinha da
produção da agricultura familiar, por exemplo, 64% do feijão e 86% da mandioca. Cabe
destacar que grande parte dessa produção é realizada por agricultores que não se
incorporaram à modernização conservadora, obtendo sua produção com baixo nível
tecnológico, empregando sementes próprias ou associadas a práticas agronômicas tidas
como inadequadas (CARMO, 1994).
10 Esta constatação tem inúmeras implicações e permanece envolta num debate acadêmico e político-
institucional acirrado. Entretanto, como destaca Abramovay, "esta característica da agricultura, no plano
internacional, contribuiu para ao menos colocar em dúvida a idéia de que, tanto quanto na indústria, as
unidades produtivas fundadas no trabalho familiar estavam, na agricultura, condenadas ao desaparecimento e
só existiam ali onde o capitalismo não se desenvolver no campo" (1996).
36
Contudo, os estudiosos do tema mostram que a agricultura familiar não é
refratária à adoção de tecnologias, como já se mencionou. A verdade é que o pacote do
"Padrão Técnico Moderno" nunca foi adequado à realidade socioeconômica, cultural e
ambiental da maioria dos agricultores familiares. Além disso, afirmam que a modernização
tecnológica promovida desconsiderou, e ainda desconsidera, o fato de os agricultores
familiares não dissociarem a unidade de produção da unidade de consumo, como ocorre na
agricultura empresarial (BRAVO; DORADO; CHIA, 1995).
Com relação às mudanças no sistema de produção reflexas àquelas no mercado
de produtos agroalimentar, um dos aspectos que assumiram grande proporção refere-se
aos impactos negativos da agricultura industrial no meio ambiente. Tais impactos adquiriram
um caráter ampliado, de tal sorte que se tornou a mola propulsora capaz de mobilizar
distintos segmentos da sociedade internacional e nacional.
No final dos anos de 1960 e nos anos 70, em várias partes do mundo, eclodiram
movimentos na sociedade civil para contestar os processos produtivos em vigor na agricultura
industrial, responsabilizando-os por inúmeras das degradações dos recursos naturais. Este
momento ficou conhecido como Pós-produtivista e, a partir dele, emergem as propostas de
desenvolvimento de sistemas de produção agrícola sustentável, com nenhum ou baixo uso de
insumos químicos e industrializados. Em consonância, está na pauta o apelo por alimentos de
qualidade, diversificados em seu estado – alimentos frescos e in natura –, garantidos pela
produção sazonal e regional (FRIEDMAN, 1993).
No Brasil esses "novos ares" não demoram a chegar, sendo que a partir dos anos
70 e ao longo dos 80 são inúmeras as denúncias que se fazem, grande parte delas
apontando o uso intensivo de agrotóxicos, a poluição e contaminação dos solos e das
águas, o desmatamento de vastas áreas em vários ecossistemas brasileiros. Não menos
importantes são as denúncias relativas às seqüelas à saúde da população. Tanto aquela
diretamente atingida, como os agricultores e suas famílias, em que predomina a intoxicação
por uso intenso de agroquímicos, causando inúmeros tipos de cânceres, abortos, suicídios,
problemas neurológicos e psicológicos, nos adultos e nas crianças. As seqüelas sobre a
população urbana associam-se principalmente ao aumento crescente dos tipos de câncer,
atingindo cada vez mais a população mais jovem, e ao aumento nos tipos e intensidade de
alergias. Além disso, há estudos que mencionam seqüelas relacionadas às condições
reprodutivas tanto dos homens como das mulheres (AZEVEDO, 2003).
Todo esse processo é consonante com os questionamentos sobre o tipo de
desenvolvimento urbano-industrial em curso nas sociedades ocidentais, cuja face mais
visível se traduzia na acelerada e intensa degradação ambiental. Ele se inscreve no
37
contexto das discussões sobre o meio ambiente que ocorriam na década de setenta11,
permaneceram nas décadas seguintes e culminaram no evento da Eco-9212, mantendo-se
como questões desafiadoras neste século.
A envergadura que assumiram as questões ambientais pode se associar à idéia
de mudança societária. Esta mudança oportuniza refletir sobre a noção de campo,
trabalhada por Bourdieu (2005), em que as conseqüências ambientais e os debates em
torno dela configuram-se em ameaças às fronteiras do campo hegemônico do mercado
agroalimentar, propiciando a emergência dos alimentos orgânicos no seu interior, e, em
conseqüência, a construção social de um mercado com suas particularidades.
Associando-se às discussões em curso acirra-se o debate que põe em xeque o
modelo de produção de alimentos padronizada. Dentre as questões levantadas está aquela
que evidencia o fato de os alimentos perderem a identidade com seus locais de origem, uma
vez que o lugar da produção é somente uma contingência no elo da cadeia produtiva,
orientada principalmente pelas relações entre a indústria e o varejo. A diversidade alimentar
torna-se reduzida e, dadas as características da produção para a indústria, alimentos que
anteriormente dependiam de condições ambientais específicas e que obedeciam a ciclos de
sazonalidade são produzidos em condições controladas tecnologicamente, definidos como
parte de uma cesta de alimentos padrão. Nessas condições estão incluídos não só os
alimentos destinados ao processamento industrial, mas vários dos alimentos frescos e in
natura, a exemplo do tomate, batata, laranja, manga e uva, entre outras frutas e hortaliças.
Como destaca Khatounian, o "alimento moderno não tem mais identidade, se
internacionalizou [...] não pertence a lugar nenhum, não tem sabor de coisa alguma, enche o
estômago, mas não alimenta a alma no contexto dos aromas, história, de vínculo com o
meio ambiente. Enche o estômago, mas a alma percebe o seu vazio" (2001, p.48).
11 Naquela oportunidade foi promovida pela ONU a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente Humano (1972), conhecida como Conferência de Estocolmo, na cidade de Estocolmo, Suécia. O
evento trouxe ao debate global a discussão do tema da segurança ecológica, acrescentando-o às demais
questões consideradas prioritárias, como a paz, os direitos humanos e o desenvolvimento com igualdade. A
conferência tornou-se um marco de referência para as discussões sobre o que, na seqüência, viria a se
constituir numa das questões mais complexas e mais cruciais da história recente da humanidade, ou seja, a
questão do desenvolvimento sustentável (VOGT, 2003, p.10).
12 A segunda Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUCED), também
conhecida como ECO-92, reuniu representantes de 175 países e de Organizações Não-Governamentais (ONGs),
tendo sido considerada o evento ambiental mais importante do século XX. Foi a primeira grande reunião
internacional realizada após o fim da Guerra Fria e a maior reunião de chefes de Estado da história da humanidade.
Governantes de quase todos os países de todos os continentes encontraram-se para discutir o maior dos desafios
de interesse global: como reverter o atual processo de degradação ambiental – incluindo perda de florestas e
redução da biodiversidade – e de mudanças climáticas globais, garantindo, ao mesmo tempo, um desenvolvimento
que resulte na melhoria da qualidade de vida das populações mais carentes do planeta.
38
É nessa busca por alimentos que possam também "encher a alma" que emerge a
demanda por produtos com sabor e qualidade, ou seja, alimentos produzidos "naturalmente".
Uma das primeiras denominações para este outro sistema de produção era a chamada
agricultura alternativa ou sustentável13, e sob este "guarda-chuva" também estava a
agricultura orgânica14. Cabe destacar, entretanto, que as críticas ao "Padrão Técnico
Moderno" já existiam mesmo antes de sua consolidação e expansão mundial no pós-segunda
guerra. Tanto é assim que a maior parte das correntes que se abrigavam sob aquele "guardachuva" corresponde às primeiras décadas do século XX, à exceção da agroecologia.
Contudo, foi somente com o ambiente histórico das últimas décadas do século
passado que aqueles movimentos puderam emergir, encontrando espaço para se manifestar e
se tornar efetivamente públicos. O conjunto das críticas não se restringia às questões relativas
ao sistema de produção, às relações sociais de produção e às questões ambientais. Também
acompanhava o debate a distinção de formas diferenciadas de comercialização da produção,
enfatizando o estreitamento nas relações entre o agricultor/produtor e o consumidor urbano. Era
a busca pela construção social de um outro tipo de mercado, onde predominassem as relações
do tipo face a face, rompendo a lógica do atual mercado de produtos agroalimentares, baseada
em relações anônimas e impessoais.
Nos itens a seguir situa-se o cenário de construção do mercado de orgânicos. Iniciase abordando o processo de institucionalização da agricultura orgânica e a relação com os tipos
de mercado, apresentando-se, a seguir, alguns elementos que particularizam o sistema
tecnológico da produção orgânica. Por fim, trata-se da situação do consumo de orgânicos,
destacando-se o consumidor individual e um novo consumidor, que é o mercado institucional.
2.2
A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA AGRICULTURA ORGÂNICA E A RELAÇÃO COM OS
DIFERENTES MERCADOS DE ORGÂNICOS
No Brasil, durante quase duas décadas, os alimentos orgânicos prescindiram da
normatização ou institucionalização para serem transacionados comercialmente. A autenticidade e a garantia dos produtos nas relações de comercialização eram asseguradas e
estabelecidas diretamente entre produtores e consumidores, os quais mantinham laços com as
organizações e entidades que, direta e indiretamente, estavam ligadas ao movimento orgânico
13 Sob o guarda-chuva da agricultura alternativa ou sustentável encontravam-se, num primeiro momento, os
vários sistemas de produção conhecidos como: agricultura orgânica, biodinâmica, natural, biológica,
permacultura e agroecologia.
14 A agricultura orgânica é uma das denominações que compõem o chamado movimento da agricultura
sustentável, estando aí inseridas também a agricultura natural, a biodinâmica, a biológica e, recentemente, a
agroecologia. Entretanto, a denominação agricultura orgânica adquiriu um status de maior abrangência
quando, em 1972, foi criada a IFOAM (Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica).
39
e, por conseguinte, àqueles movimentos contestatórios às práticas de produção e consumo da
agricultura industrial. Os produtos orgânicos eram comercializados principalmente através de
canais onde prevaleciam as relações face a face entre o agricultor e o consumidor, como as
feiras e as entregas diretas, baseando-se em relações de conhecimento e confiança.
Essa condição caracterizou o período inicial de construção do mercado de
orgânicos, entre os anos de 1970 até meados da década de 90, tanto no País como no
Estado do Paraná. Entretanto, as preocupações societárias com as questões ambientais e,
em conseqüência, a busca por alimentos "naturais" e com "qualidade", fizeram crescer
rapidamente a procura por alimentos orgânicos. Em consonância, também se expandiram o
número de agricultores produtores, a produção, as entidades e organizações de apoio aos
orgânicos e, ainda, novos tipos de transações comerciais passaram a ocorrer, o que veio
a caracterizar diferentes tipos de mercado e sua relação com os processos de
institucionalização de orgânicos.
Além do mercado das relações face a face, os produtos orgânicos passaram a ser
incorporados no ambiente hegemônico do mercado de produtos agroalimentares, a partir de
meados da década de 90. Nas redes de super e hipermercados o produto orgânico
simboliza o apelo pelo produto natural e com qualidade, por parte do consumidor urbano.
Contudo, pesquisas15 têm mostrado que, para esses agentes comerciais, os produtos se
caracterizam menos por seus atributos socioambientais e mais por oferecerem uma
oportunidade econômica, como parte de um "nicho de mercado"16. Somado à situação
anterior, há o crescimento da procura de alimentos orgânicos pelos países do hemisfério
norte, o que estimulou o desenvolvimento de um outro tipo de mercado, o da exportação de
produtos orgânicos brasileiros.
Como esses mercados caracterizam-se pelo distanciamento na relação entre
quem produz e quem consome, tornam-se necessários outros atributos que possam
substituir o sentimento de confiança implícito nas relações face a face. A "garantia" de que
os alimentos são então "saudáveis, limpos, naturais" será dada por um "selo", originário de
um processo de certificação da originalidade dos produtos orgânicos. E é neste contexto
que se inicia o processo de institucionalização17 dos produtos orgânicos no País.
15 Ver o estudo A dinâmica da comercialização dos produtos orgânicos em Santa Catarina" (ZOLDAN; KARAM,
2004).
16 Weinstein (1995, p.222-223) refere-se ao conceito de nicho de mercado da seguinte forma: "Nichos de
mercado são pequenos segmentos que oferecem oportunidades de negócios incrementais [...] a escolha de
nichos é o processo pelo qual a empresa integra marketing e atividades de planejamento para otimizar sua
competitividade e posição no mercado. Uma estratégia de posicionamento derivada de segmentação para
um consumidor-alvo focalizado é a parte principal da escolha de nichos". [grifo nosso].
17 A discussão sobre a institucionalização de orgânicos no Brasil pode ser melhor conhecida nos trabalhos de
Ormond et al. (2002); Fonseca (2005); Medaets e Fonseca (2005).
40
2.2.1
Síntese do Processo de Regulamentação dos Alimentos Orgânicos no Brasil
Fora do Brasil a institucionalização da agricultura orgânica deu-se no início dos
anos 90, procurando não só regulamentar a atividade produtiva mas também definir
procedimentos para a comercialização nos diferentes tipos de mercado.
Em junho de 1991, o Council Regulation da CEE - Comunidade Econômica
Européia, no documento 2.092/91, instituiu um programa para seus estados-membros que
estabelecia as normas e os padrões de produção, processamento, comercialização e
importação de produtos orgânicos de origem animal e vegetal. Dessa forma, para que os
produtos fossem comercializados nos países da Comunidade Européia era necessário um
selo de garantia, uma certificação, emitida por alguma certificadora credenciada pela
Comissão Européia. A este tipo de certificação, que se denomina "Certificação de Terceira
Parte", as normas e procedimentos verificados pelas certificadoras foram regulamentados
pela norma internacional ISO18/IEC Guide 65/1997, além daquelas já apregoadas e aceitas
pela IFOAM19, as quais formam a base para que organizações certificadoras confiram a
acreditação/certificação20 aos produtos como orgânicos.
As exigências internacionais21 vão estimular os debates, o que resulta na
regulamentação da agricultura orgânica no Brasil. Serão principalmente as entidades e
18 A ISO (International Organization for Standardization) é a confederação internacional de órgãos nacionais de
normalização de todo o mundo. Trata-se de uma entidade não-governamental, criada em 1947, com sede em
Genebra, Suíça. O seu objetivo é promover o desenvolvimento da normalização e de atividades relacionadas,
com a intenção de facilitar o intercâmbio internacional de bens e serviços e desenvolver a cooperação nas
esferas intelectual, científica, tecnológica e de atividade econômica.
19 A IFOAM (International Federation of Organic Agriculture Movements), organização não-governamental criada
em 1972, sediada na França, tem padrões estabelecidos e publicados no Basic Standards for Organic
Production and Processing, os quais, embora privados, têm aceitação pelo movimento orgânico mundial.
Abriga mais de 770 organizações, incluindo certificadoras, processadores, distribuidores e pesquisadores de
mais de 107 países, sendo que os padrões estabelecidos têm servido como referência para as
regulamentações nos diversos países.
20 Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), "a certificação é um conjunto de atividades
desenvolvidas por um organismo independente da relação comercial, e tem como objetivo atestar
publicamente, por escrito, que determinado produto, processo ou serviço está em conformidade com os
requisitos especificados. Estes requisitos podem ser: nacionais ou internacionais. Considera-se que a
certificação não é uma ação isolada e pontual, mas parte de um processo voltado a garantir a qualidade de
um produto, para a manutenção da competitividade e conseqüente permanência no mercado, passando pela
utilização de normas técnicas e pela difusão do conceito de qualidade por todos os setores da organização,
abrangendo seus aspectos operacionais internos e o relacionamento com a sociedade e o ambiente".
21 No âmbito internacional, a publicação das diretrizes pela Comunidade Européia impulsionou outros países à
regulamentação. A Argentina regulamentou em 1994, os EUA iniciaram em 1990 e finalizaram em 2002, o
Canadá publicou em 1999, o Japão regulamentou em 2000, e a Austrália e a Tailândia estão desenvolvendo
normas nacionais. (NEVES, 2003b)
41
organizações ligadas ao movimento orgânico que, ao resistirem à definição de normas por
organismos externos ao País, tornarão este debate mais amplo e público.
Na sua maioria são organizações não-governamentais, entidades assessoras de
associações de agricultores familiares, que se posicionam em defesa da produção orgânica
voltada para qualificar o abastecimento alimentar interno, focada nas características
socioambientais das regiões onde os alimentos são produzidos. Grande parte dos
representantes, nas décadas de 80 e 90, estava na Região Sul do País e mantinha relações
estreitas com os produtores de alimentos orgânicos, majoritariamente agricultores familiares.
Uma das principais preocupações na época, e ainda hoje, é com a possibilidade de
exclusão dos agricultores do processo em curso, tal qual ocorreu nas décadas anteriores
quando da modernização conservadora na agricultura.
Tal preocupação consolidou-se na 9ª Conferência da IFOAM, realizada em São
Paulo, em 1992, quando aquelas entidades marcaram sua posição com relação aos
processos de acreditação/certificação dos produtos orgânicos. Em decorrência da prática em
curso, reivindicavam garantir o processo da certificação participativa, o qual já ocorria nos
estados do sul do Brasil e em outros países latino-americanos. A posição assumida
consolidou-se na criação do MAELA (Movimento Agroecológico para América Latina e Caribe).
Dessa forma, ao longo da década de 90 as organizações e entidades afins ao
movimento orgânico passaram a se articular e a participar ativamente do debate sobre a
institucionalização da agricultura orgânica no Brasil.
O marco oficial desse debate ocorreu em setembro de 1994, quando o Ministério
da Agricultura (MA) reuniu-se com representantes das ONGs, do setor privado e do setor
público, ligados à produção e ao consumo de alimentos orgânicos, visando criar normas
tanto para a produção no País como para a exportação.
Uma das preocupações que se colocava naquele momento, como destacam
Medaets e Fonseca (2005), era o fato de, nos anos de 1995 e 1996, vários organismos
certificadores internacionais terem passado a programar sua vinda para o Brasil, sendo que
os mesmos se norteavam pelas normas empregadas e vigentes principalmente para os
países da Comunidade Européia.
O resultado do processo de discussão iniciado em 1994 culmina em maio de
1999, quando o Ministério da Agricultura e do Abastecimento publicou a Instrução Normativa
nº 007 (IN 007/99), criando um selo de qualidade para os produtos orgânicos brasileiros
(Anexo 1).
Dentre outras definições, a IN 007/99 previa a criação de Órgãos Colegiados
Nacionais (OCN) e Estaduais, com composição paritária entre agentes públicos, privados e
ONGs, e, entre outras atribuições, tinha a função de credenciar instituições certificadoras, que
42
seriam responsáveis pela certificação e controle de qualidade orgânica no Brasil. Cabe destacar,
entretanto, que o foco da IN 007/99 estava no processo de produção e industrialização, e,
quanto à comercialização e/ou distribuição, o aspecto destacado era a certificação.
Nesse sentido, determinava que as entidades certificadoras seriam pessoa
jurídica e sem fins lucrativos, as quais deveriam estar credenciadas junto aos Órgãos
Colegiados Nacionais (OCN). Para que se procedesse à importação de produtos orgânicos,
instruía que estes deveriam ser certificados em seu país de origem, porém condicionados às
leis fitossanitárias do Brasil e com a análise prévia e anuência de uma certificadora
registrada no OCN.
Entretanto, um aspecto que permanece preocupando as entidades, organizações
e agricultores que atuam no movimento orgânico refere-se aos interesses distintos entre
certificadoras, processadores e agricultores familiares. Pois, como o custo da certificação
tem variado de 0,5% a 2,5% do valor da produção orgânica, é praticamente impossível para
pequenos agricultores e pequenas agroindústrias arcarem com tal desembolso, limitando
suas transações comerciais com distintos tipos de mercado ou mesmo inviabilizando-as. Isto
se torna particularmente importante quando se trata da comercialização com os mercados
de circuito longo, como os grandes equipamentos do varejo, e também com o da
exportação, em que a garantia através da certificação por selo evidencia que a relação é
unicamente com o produto.
O que predominava na época, contudo, eram os processos que envolviam a
"certificação participativa", também denominada informal ou local, afinados aos princípios
que orientam a prática orgânica. A Rede Ecovida de Agroecologia é provavelmente a
principal representante desta proposta de certificação. Ela se constituiu em 1998, no Estado
de Santa Catarina, e rapidamente abrangeu os outros dois estados do sul do País, Paraná e
Rio Grande do Sul. O fundamento dos procedimentos está no processo de construção da
certificação segundo seus principais interessados, agricultores e consumidores, respeitando
as características sociais, culturais e ambientais, bem como o contexto político e os tipos de
mercado em que se inserem. Neste caso a certificação não é individual, mas sim para o
grupo organizado em famílias de agricultores, sendo que estes grupos estruturam-se em
núcleos, os quais são filiados à Rede.
A continuidade do processo do marco legal da agricultura orgânica no País se dá
em 2002, com a criação do Grupo de Agricultura Orgânica (GAO), durante a realização do
I Encontro Nacional de Agroecologia (ENA). O grupo foi composto por representantes das
entidades e organizações ligadas ao movimento orgânico de todo o País, e tinha como
principal objetivo acompanhar, debater e influenciar o processo de institucionalização, o qual
tramitava no Congresso Nacional, como Projeto de Lei (1999) para a regulamentação da
agricultura orgânica.
No ano seguinte, em 2003, o GAO propôs mudanças no texto original do projeto de
lei, tanto no que se referia à definição sobre agricultura orgânica como com relação aos critérios
43
de regulamentação e registro de produtores, comercialização e certificação de produtos. As
mudanças foram quase que integralmente acatadas pelo relator do projeto na Câmara dos
Deputados, e em dezembro de 2003 a Lei 10.831 foi promulgada (Anexo 2).
Ainda como decorrência da articulação política do GAO, em 2003, houve a
aprovação no Plano Plurianual 2004-2007 de um pequeno orçamento para o setor de
orgânicos, direcionado a seis ações de fomento nas áreas de transferência de tecnologia,
certificação, capacitação e publicidade específica.
Entretanto, as discussões não se encerraram com a promulgação da lei, uma vez
que esta precisava ser regulamentada. Desse modo, em 2004, o Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (MAPA) criou a Câmara Setorial de Agricultura Orgânica (CSAO),
que se organizou em grupos temáticos para formulação de propostas para regulamentação
da Lei 10.831. Tais grupos respondem pelas seguintes áreas: produção vegetal, produção
animal, processamento da produção, extrativismo sustentável, certificação, comercialização,
estruturas governamentais, justiça social e certificação participativa.
Os dois últimos temas foram abordados no âmbito do GAO e, posteriormente,
discutidos e negociados com representantes dos ministérios envolvidos. Segundo Karam
et al. (2006), a discussão acerca da certificação, que ainda é um ponto bastante polêmico,
ficou dirimida na medida em que houve a admissão legal da não obrigatoriedade da
certificação em caso de venda direta dos produtos orgânicos por agricultores familiares.
Esta condição, ao oficializar as práticas de certificação participativa, viabilizou a abertura de
um novo tipo de mercado para a agricultura orgânica – o mercado institucional –, em que os
agricultores familiares produtores de alimentos orgânicos podem participar dos programas
de compra governamental, como o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), a merenda
escolar, entre outros.
No âmbito da certificação participativa cabe destacar que no mesmo período, em
abril de 2004, representantes de mais de 20 países se reuniram na cidade de Torres, Rio
Grande do Sul, para discutir os sistemas de garantia "alternativos" àqueles propugnados
pela Certificação de Terceira Parte (IFOAM, ISO 65). O Taller de Certificación Alternativa
para la Producción Orgânica, organizado pela IFOAM e MAELA, chegou a um consenso para
abarcar as distintas nomenclaturas utilizadas para a garantia de produtos orgânicos
(participativa, local, informal, apropriada), sob uma única designação: os Sistemas de
Garantia Participativos (SGPs), reconhecendo como SGPs aqueles que incluem a
participação dos agricultores, consumidores, ONGs, agências governamentais etc. na
construção da garantia orgânica.22
22 Sobre o texto que detalha os SGPs, ver Taller... (2004).
44
No ano seguinte, em 2005, a partir do conjunto das propostas trabalhadas nos grupos
temáticos, foi sistematizada uma minuta de regulamentação da lei, para discussão na Câmara
Setorial de Agricultura Orgânica, onde foram votados os principais pontos de desacordo e o
texto final, que seguiram para consulta pública para posterior regulamentação.
Ainda em 2005, o NEAD (Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural),
órgão do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA),voltado para a produção e difusão de
conhecimentos que subsidiem políticas para o desenvolvimento rural, publicou um estudo23
sobre a regulamentação da agricultura orgânica. Com o objetivo de levar informações à
agricultura familiar, público-alvo da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), do Ministério do
Desenvolvimento Agrário, o trabalho sistematiza dados referentes aos procedimentos
regulamentares e o aparato legal sobre a agricultura orgânica no Brasil e no mundo, para
servir de referência para técnicos e lideranças de produtores.
2.2.2
A Institucionalização da Agricultura Orgânica no Paraná
A
institucionalização
da
agricultura
orgânica
no
Paraná
desenrolou-se
concomitantemente aos debates em curso em âmbito nacional. Um dos marcos ocorreu em
1981, em Curitiba, com a realização do Primeiro Encontro Brasileiro de Agricultura
Alternativa (EBAA), estimulado pelas manifestações críticas à modernização da agricultura,
apontadas no 11º Congresso de Agronomia, em 1979, também realizado na cidade.
Ao longo da década de 80 um conjunto de iniciativas foi desencadeado visando
promover o desenvolvimento da agricultura orgânica no Estado. Karam (2001), no seu
estudo sobre a agricultura orgânica como estratégia para novas ruralidades, realizado na
região metropolitana de Curitiba (RMC), mostra que dentre as iniciativas à época destacam-se
tanto algumas da sociedade civil como do próprio governo do Estado. Entre as da sociedade
civil é relevante a fundação do GEAE (Grupo de Estudos de Agricultura Ecológica), em 1981,
por alguns alunos e professores da faculdade de Agronomia da Universidade Federal do
Paraná (UFPR), voltado a promover o debate sobre a temática; como decorrência desta
experiência alguns membros do grupo se envolveram diretamente na produção de alimentos
orgânicos, principalmente hortaliças, os quais eram comercializados por meio da venda
direta de sacolas, da entrega em domicílio e da venda em restaurantes naturais e
vegetarianos; ainda, no período organiza-se uma cooperativa de consumidores de produtos
naturais, a COOPERA (Cooperativa de Consumidores de Produtos Integrais), fundada entre
1983 e 1984, que aproxima consumidores de produtores.
23 Medaets e Fonseca (2005).
45
Do lado das iniciativas governamentais cabe destacar a ação da SEAB (Secretaria
de Agricultura e Abastecimento do Estado do Paraná), do Instituto Agronômico do Paraná
(IAPAR) e do Instituto EMATER. Na segunda metade da década de 80, tais iniciativas se
apresentaram mediante programas de cunho conservacionista, como o PMISA (Programa de
Manejo Integrado de Solos e Águas), desenvolvido pela SEAB, que visava estimular
métodos produtivos com atenção aos recursos naturais, como o solo e a água.
Uma iniciativa governamental voltada especificamente à agricultura sustentável
ocorreu também na primeira metade daquela década, no município de Agudos do Sul,
situado a 60 quilômetros ao sul de Curitiba. Na oportunidade, a EMATER, empresa de
extensão rural, apoiou o trabalho de um técnico local com uma associação de agricultores,
voltado à conversão da produção de olerícolas do sistema convencional ao sistema de
produção biodinâmico. Toda a comercialização da produção se dava por meio da venda
direta de sacolas, entregues principalmente para grupos de consumidores de algumas
instituições públicas, como a própria SEAB, a EMATER e o IPARDES. Esta experiência foi
interrompida com a saída do responsável, em 1986.
O ano de 1989 representou um marco no processo, particularmente na região de
Curitiba, quando, a partir de atores da sociedade civil, iniciou-se naquele ano o que hoje se
conhece como Feira Verde de Produtos Orgânicos. A primeira barraca de venda direta de
produtos orgânicos foi instalada ao lado da Feira de Artesanato de Curitiba, realizada aos
domingos pela manhã, no Largo da Ordem, região central da cidade. Entre 1989 e 1995
vários agricultores juntaram-se à iniciativa, sendo que a feira representava o principal tipo de
mercado para a comercialização dos seus produtos, os quais eram garantidos pela relação
de confiança entre agricultor e consumidor. Cabe destacar que várias propriedades dos
agricultores eram certificadas, na época, pelo Instituto Biodinâmico (IBD).
Em 1991, parte daqueles que participaram da criação do GEAE fundou o IVV Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural, com sede em Curitiba, com dois objetivos
principais: prestar assessoria técnica a projetos em agricultura orgânica no Paraná e
estimular o Estado a desenvolver políticas públicas para tal segmento. Naquele ano iniciouse um processo de articulação e organização em torno da agricultura orgânica na RMC,
quando membros do IVV, os agricultores da Feira Verde e outras pessoas ligadas direta ou
indiretamente, somando mais de 60 pessoas, reuniram-se na prefeitura do município de
Quatro Barras, na RMC, apoiadas pelo técnico24 do escritório local do Instituto EMATER do
município, para discutir propostas e ações.
24 O técnico, Geraldo Deffune, era quem havia desenvolvido o trabalho com os agricultores do município de
Agudos do Sul.
46
Os resultados fizeram-se sentir em 1993, quando a Feira Verde foi oficialmente
criada e obteve o financiamento da SEAB/EMATER para a instalação de oito barracas, que
reuniam quinze famílias de agricultores. Em março de 1995, após várias negociações, a
Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Curitiba (SMAB) destinou à Feira
Verde um dia e local específicos. A feira passou então a funcionar dentro do Passeio Público,
na região central, aos sábados pela manhã. Para lá se transferiram 10 barracas, reunindo a
produção de cerca de 25 famílias de agricultores, de diferentes municípios da RMC.
Ainda como resultado das ações daquele grupo, o Governo do Paraná, através da
SEAB/Instituto EMATER, e o Instituto Verde Vida de Desenvolvimento Rural estabeleceram um
convênio para que se desenvolvessem ações voltadas à produção orgânica, dentro do
Programa Paraná Rural, continuidade do Programa de Manejo Integrado de Solos e Águas
(PMISA). Além da relação com o nível estadual, outros convênios se deram entre o IVV e
algumas prefeituras municipais, tanto na RMC (olerícolas) como na região do norte velho (açúcar
mascavo, maracujá e acerola), no centro (plantas medicinais) e na região sudoeste (soja).
Entre 1997 e 1998, em consonância com o marco oficial de institucionalização da
agricultura orgânica no País, e com a realização do II Seminário Nacional da Agricultura
Orgânica, realizado em Curitiba, foi criado no Paraná o CEAO (Conselho Estadual de
Agricultura Orgânica do Paraná), por iniciativa dos atores da sociedade civil e das instituições
governamentais envolvidos com a temática. A composição desse conselho era paritária,
sendo formado por cinco representantes de instituições governamentais, dentre eles a SEAB,
SEMA, EMATER, IAPAR e ASEMA, e outras cinco entidades não-governamentais: Associação
para o Desenvolvimento da Agroecologia (AOPA), Centro Paranaense de Apoio ao Pequeno
Agricultor (CAPA), Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESSOAR),
Associação dos Produtores Orgânicos de Londrina (APOL) e a empresa Terra Preservada.
O CEAO, visando institucionalizar sua atuação, colaborou na proposição do
Projeto de Lei nº 013/200025,
A criação do Conselho Estadual de Agricultura Orgânica do Estado do Paraná CEAO, órgão normativo, deliberativo e regulador da política agrícola estadual para a
agricultura orgânica, integrante da estrutura organizacional básica da Secretaria de
Estado da Agricultura e do Abastecimento - SEAB.26
25 O Projeto de Lei foi apresentado à Assembléia Legislativa do Paraná pela deputada estadual do Partido dos
Trabalhadores (PT) Luciana Guzella Rafagnin.
26 As atribuições do CEAO estão inscritas na Lei no seu artigo 2º, a saber: I - Definir as políticas públicas e
formular diretrizes de programas e projetos a nível estadual, destinados ao desenvolvimento da agricultura
orgânica; II - acompanhar o processo de definição das diretrizes e normas para a produção orgânica no
Paraná, a serem estabelecidas através do Ministério da Agricultura e do Abastecimento; III - promover
estudos, pesquisas e publicações de temas relativos à produção, à industrialização e à comercialização de
47
Embora a Lei tenha sido debatida e aprovada pela Assembléia Legislativa, foi
vetada pelo governador em exercício, Jaime Lerner.
Em 1999, quando o Ministério da Agricultura instituiu a Instrução Normativa nº
007/99, criou-se o CNPOrg - Órgão Colegiado Nacional e havia a previsão de criação dos
colegiados estaduais (CEPOrg) pelas Delegacias Estaduais do Ministério da Agricultura. No
Paraná o mesmo não teve a necessidade de ser criado, pois à época estava em funcionamento
o CEAO, o qual cumpria as funções previstas pela IN 007/99. O CEPOrg-PR só foi criado
oficialmente no Paraná após a promulgação da Lei 10.831, em 2003, que regulamenta a
agricultura orgânica no País, e o "patrimônio" do CEAO foi incorporado a tal instância.27
O CEPOrg-PR é desde então coordenado pela Superintendência Federal da
Agricultura no Paraná, órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e
conta com a participação de instituições governamentais estaduais e de entidades nãogovernamentais representantes dos agricultores orgânicos do Estado.
2.2.3
A Certificação e o Mercado de Orgânicos
A certificação é uma expressão do processo de institucionalização, catalizadora
de grande parte das discussões que envolvem o marco legal dos orgânicos, uma vez que,
através dela, apregoa-se a garantia de qualidade dos produtos para que estes sejam
comercializados. Para tanto, formalizam-se normas e procedimentos a serem verificados, os
quais devem estar em conformidade e ser reconhecidos pelas partes envolvidas, o que
implica a relação com os diferentes tipos de mercado que se constroem.
Neste item não se fará uma discussão aprofundada sobre a certificação, mas
apresentam-se os sistemas de garantia da qualidade orgânica vigentes no Brasil e como eles
evidenciam os distintos mercados dos produtos orgânicos. Tomar-se-á como base o recente
estudo realizado por Medaets e Fonseca (2005), em que os autores destacam a existência de
dois sistemas de garantia: o de terceira parte, e a certificação participativa ou solidária.
O sistema de garantia de terceira parte é a certificação por auditoria externa.
Neste caso a garantia quanto à qualidade do produto não é dada pelos produtores nem
produtos orgânicos; IV - realizar e/ou apoiar a realização de seminários e outros eventos objetivando a
divulgação, fortalecimento e desenvolvimento da agricultura orgânica; V - cooperar e realizar convênios com
órgãos federais, estaduais, municipais e com instituições da sociedade civil organizada na consecução de
meios para o fortalecimento e desenvolvimento da agricultura orgânica; VI - fomentar intercâmbios com outras
organizações congêneres nacionais e internacionais, e contribuir com iniciativas pertinentes à área da
produção de alimentos orgânicos; VII - manter atualizada a documentação e a legislação pertinente à área da
agricultura orgânica; VIII - instituir o seu regimento interno.
27 As informações sobre o processo de criação do CEAO e sua destituição foram fornecidas em entrevista por
Rogério Rosa, em outubro de 2006, na época presidente da AOPA, entidade não-governamental criada em
1995, na RMC, a qual teve papel ativo durante todo o tempo de vigência do Conselho.
48
tampouco pelo Estado, mas sim por uma terceira parte. Esta parte é representada por
organismos certificadores, que, a partir de inspeção externa feita nas propriedades e de
análises laboratoriais, verificam se a produção está em conformidade com o padrão ISO
definido. Neste caso não é o inspetor quem certifica, mas todos os protocolos são
encaminhados ao organismo certificador, e é ele que atesta por certificado a qualidade.
Nesse sistema de avaliação o que ocorre é "um processo de intermediação da
confiança". Não são os produtores/agricultores que asseguram aos compradores a
qualidade de seus produtos, mas sim um organismo certificador. Este sistema responde de
maneira efetiva à estrutura do hegemônico mercado agroalimentar nacional e internacional.
Distinta da certificação de terceira parte é a certificação participativa. O
fundamento deste sistema está na confiança e participação dos envolvidos no processo
para que haja a garantia da qualidade do produto, desde a produção até o consumo. A este
tipo de garantia se denomina atualmente de "conformidade social", o qual está mais próximo
do mercado das relações diretas, seja na relação com o consumidor final individual ou
coletivo, seja com determinados programas do mercado institucional (merenda escolar,
compra direta de agricultores e associações).
A certificação participativa pode ser melhor conhecida a partir da definição da
Rede Ecovida de Agroecologia, entidade que deu início ao sistema no Brasil, em 1998, no
Estado de Santa Catarina:
A certificação participativa é um sistema solidário de geração de credibilidade, onde
a elaboração e a verificação das normas de produção ecológica são realizadas com
a participação efetiva dos agricultores, consumidores, buscando o aperfeiçoamento
constante e o respeito às características de cada realidade.
O selo Ecovida é obtido após uma série de procedimentos desenvolvidos dentro de
cada núcleo regional. Ali ocorre a filiação à Rede, a troca de experiências e
verificação do Conselho de Ética.
A certificação participativa é uma forma diferente da certificação que, além de
garantir a qualidade do produto ecológico, permite o respeito e a valorização da
cultura local através da aproximação de agricultores e consumidores e da
construção de uma Rede que congrega iniciativas de diferentes regiões (REDE
ECOVIDA DE AGROECOLOGIA, 2006).
Medaets e Fonseca (2005) apresentam o quadro que se segue, em que se
verificam as diferenças entre os dois sistemas:
49
QUADRO 2.1 - SISTEMAS DE GARANTIA DE QUALIDADE
COMPONENTES DO SISTEMA DE
GARANTIA SOLIDÁRIA
GARANTIA DE QUALIDADE
Padrões
GARANTIA DE TERCEIRA PARTE
Construção em processo de revisão
Construção em processo de revisão
periódica.
periódica.
- Inspeção
- Não existe inspetor externo.
- Existe inspetor externo.
- Registros
- Realizados de maneira sistemática.
- Realizados de maneira sistemática.
- Documentação
- Mantida descentralizada.
- Mantida centralizada.
- Integrada
- Separada
- Decisão de certificação
- Descentralizada
- Centralizada
- Técnico
- Residente na comunidade
- Externo
Comunicação de qualidade
Selo, reputação do produtor e da
Selo, reputação do produtor e organismo
assessoria técnica e influência dos
certificador
Meios de verificação
Organismo certificador
- Funções de certificação e assessoria
técnica
componentes de avaliação social
FONTE: Medaets e Fonseca (2005)
Há dados controversos sobre o número e a origem de organismos certificadores em
operação no Brasil. O estudo realizado por Ormond et al. (2002) identificou que havia 19
organismos certificadores – 12 de origem nacional e 7 de origem internacional –, sendo que na
época da pesquisa todos estavam em processo de regularização junto aos colegiados estaduais
e nacionais. O estudo identificou a localização de 17 deles, mostrando que a maioria tinha sede
nos estados do Sul e Sudeste: 11 em São Paulo, 01 no Espírito Santo, 01 em Minas Gerais, 02
no Rio Grande do Sul, 01 em Mato Grosso e 01 em Pernambuco.
Os dados mais atuais referem-se a 2003 e são apresentados no recente estudo
elaborado sobre a regulamentação da agricultura orgânica, de Medaets e Fonseca (2005).
Esse trabalho aponta que, naquele ano, havia 10 organismos certificadores internacionais
operando no País, sendo que 60% deles eram de origem européia, e que, do total, muitos
atuavam sem conhecimento das autoridades brasileiras. Tal situação é bastante
preocupante, segundo os próprios autores, pois a grande maioria não tem qualquer
participação nas discussões com o movimento orgânico brasileiro, tampouco sobre o marco
legal da agricultura orgânica no País. O quadro 2.2 traz os organismos internacionais
mencionados no referido trabalho.
50
QUADRO 2.2 - ORGANISMOS CERTIFICADORES INTERNACIONAIS COM AÇÃO EM
AGRICULTURA ORGÂNICA NO BRASIL
CONTINENTES
PAÍSES DE ORIGEM
Europeu
Norte-americano
ORGANISMOS
CERTIFICADORES
França
Ecocert
Alemanha
Naturland, BCS
Holanda
SKAL
Suécia
KRAV
Suíça
IMO
EUA
FVO
OCIA
Sul-americano
Asiático
Argentina
OIA
Japão
JONA
TOTAL
10
FONTE: Medaets e Fonseca (2005)
Com relação aos organismos certificadores nacionais (quadro 2.3), o referido
estudo identificou que estes, na sua maioria, são originários de associações de produtores
orgânicos e de organizações criadas para a difusão das práticas das diferentes escolas,
como é o caso do IBD (Instituto Biodinâmico)28, ligado à agricultura biodinâmica, e da MOA
(Fundação Mokiti Okada), ligada à agricultura natural.
QUADRO 2.3 - ORGANISMOS CERTIFICADORES NACIONAIS COM AÇÃO EM AGRICULTURA ORGÂNICA
REGIÕES DO PAÍS
ORGANISMOS CERTIFICADORES
ESTADOS (SEDES)
Norte
Associação de Certificação Socioparticipativa Florestal (ACS)
Acre
Nordeste
Cepema
Ceará
Centro-Oeste
Instituto Holístico
Mato Grosso
Sudeste
AAO Certificadora; ANC, APAN; CMO; IBD; OIA Brasil
São Paulo
Chão Vivo
Espírito Santo
Certificadora Sapucaí; Minas Orgânica
Minas Gerais
Abio
Rio de Janeiro
Aprema
Paraná
Ecovida, A Orgânica, Fundagro, Biocert, Ecocert Brasil
Santa Catarina
Certifica RS
Rio Grande do Sul
Sul
TOTAL
20
FONTE: Medaets e Fonseca (2005)
O levantamento realizado para este estudo mostrou que atualmente, no Paraná,
há 10 certificadoras atuantes, das quais somente 4 são nacionais e as outras 6 são
internacionais, como se verifica no quadro 2.4, a seguir.
28 O IBD-Instituto Biodinâmico, empresa brasileira sem fins lucrativos, iniciou seus trabalhos de certificação em
1990 e opera em todo o território brasileiro e em alguns países da América do Sul. Em 1995 obteve o
credenciamento IFOAM; em 1999, o ISO 65 (Alemanha); e em 2002 teve a aprovação do USDA (United
States Department of Agriculture). É a única entidade brasileira habilitada internacionalmente a conceder a
certificação para produtos orgânicos e biodinâmicos. É o representante no Brasil do "Demeter International".
51
QUADRO 2.4 - ORGANISMOS CERTIFICADORES ATUANTES NO ESTADO
DO PARANÁ - 2006
ORIGEM
ORGANISMOS CERTIFICADORES
Nacional
IBD, Rede Ecovida, CMO, TECPAR CERT
Internacional
IMO, OCIA, ECOCERT, SKAL, OIA, BCS
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
A discussão apresentada neste item procurou evidenciar a relação existente entre
o processo de institucionalização da agricultura orgânica e os tipos de mercado. Esta
relação fica mais explícita quando se analisam os sistemas de garantia de qualidade, em
que se verifica que a garantia solidária está voltada muito mais a abranger o processo nas
suas distintas dimensões, enquanto a garantia de terceira parte tem como prioridade o
produto. Na busca de melhor compreender tais diferenças é que se apresenta, a seguir, o
sistema de produção na agricultura orgânica, a partir dos fatores tecnológicos que
distinguem as tecnologias de processo e as de produto.
2.3
O SISTEMA DE PRODUÇÃO ORGÂNICO: FATORES TECNOLÓGICOS E RELAÇÃO
COM OS TIPOS DE MERCADO
Dentre o conjunto de elementos que se interligam no processo de construção do
mercado de orgânicos está a produção dos alimentos propriamente dita, e refletir sobre ela
implica necessariamente considerar os aspectos tecnológicos aí envolvidos.
De um modo geral verifica-se que o processo de produção de alimentos orgânicos
está orientado por duas amplas vertentes que resultam em diferentes encaminhamentos
tecnológicos: a produção orgânica que adota tecnologias de processo e aquela baseada nas
tecnologias de produto. Embora uma situação não exclua a outra, o que se observa é que
tais procedimentos tecnológicos têm uma correspondência com o contexto socioeconômico
e institucional daqueles que os adotam, bem como estão intrinsecamente relacionados aos
objetivos e às relações mercantis envolvidas.
2.3.1
A Agricultura Orgânica e as Tecnologias de Processo e de Produto
Segundo o estudo de Hernández (2005), a produção orgânica que adota
tecnologias de processo caracteriza-se por ser uma inovação de caráter sistêmico, que
afeta todo o sistema de produção e não somente seus elementos. Neste encaminhamento
tecnológico a unidade de produção é vista como um sistema que deve ser analisado e
trabalhado de acordo com o conjunto de suas características, considerando a relação existente
52
entre as partes, ou seja, a compatibilidade e complementaridade das partes integrantes do
conjunto produtivo (agricultura, floresta e animais), permitindo o maior aproveitamento do
potencial da unidade de produção.
Nesse enfoque, a produtividade, a qualidade dos produtos e a sustentabilidade da
agricultura estão diretamente ligadas à qualidade e ao equilíbrio da fertilidade do solo
(manutenção de níveis de matéria orgânica, promoção da atividade biológica, reciclagem de
nutrientes e intervenção controlada sem destruição do recurso natural), que é considerado
como um organismo vivo.
De acordo com Weid (2001), o sistema de produção orgânico baseado em tecnologias
de processo busca explorar a diversidade dos ambientes29, requerendo a procura de desenhos
específicos de sistemas produtivos para a situação específica de cada agroecossistema e
até de cada agricultor, sendo uma abordagem intensiva no uso de conhecimento, ao mesmo
tempo em que é econômica no uso de insumos externos à propriedade. Kathounian (2001)
também destaca tal tipo de encaminhamento tecnológico, ressaltando particularmente que,
além do fato de a produção orgânica utilizar menos insumos materiais que a produção
convencional, ela é resultante do uso de um produto não tangível, o conhecimento.
Dessa forma, as peculiaridades nesse encaminhamento fazem com que o
processo de produção e adoção seja mais complexo, tanto na compreensão do conjunto de
elementos e atributos para além da produção em si como também para aqueles intrínsecos
a ela, como a exigência de maiores conhecimentos técnicos e agroecológicos, seja no
planejamento, avaliação e organização da produção, seja na observação permanente das
plantas, dos animais, das condições do solo e clima durante todo o processo produtivo.30
Diferentemente do encaminhamento tecnológico de processo, a produção orgânica
baseada na adoção de tecnologia de produto caracteriza-se pelo uso de insumos alternativos,
na maioria das vezes externos à propriedade, como adubos orgânicos e defensivos naturais,
cujo objetivo concentra-se na produção de um produto que não contém agrotóxicos. Neste
encaminhamento, a compatibilidade e complementaridade das partes integrantes do conjunto
produtivo (agricultura, floresta e animais), assim como do equilíbrio agroecológico, não
possui um lugar central.
29 Segundo Romeiro (1997, p.64), na natureza, diversidade é sinônimo de estabilidade. Quanto mais um
ecossistema é simplificado, maior a necessidade de transferências exógenas de energia para mantê-lo
equilibrado no curto prazo.
30 De acordo com Darolt (2000), a maioria dos trabalhos de investigação, bem como as orientações técnicas,
são direcionadas a componentes do sistema. Entretanto, as maiores carências estão na compreensão do
sistema no seu conjunto. Cabe salientar que não somente são poucos os técnicos formados para atender às
demandas da agricultura orgânica baseada nas tecnologias de processos, como são ainda em menor número
aqueles preparados para utilizar as abordagens participativas para a geração e difusão de práticas agrícolas
voltadas às especificidades de cada unidade produtiva.
53
Em relação com o paradigma tecnológico "convencional", derivado da Revolução
Verde, este tipo de produção orgânica diferencia-se quase que exclusivamente pelo uso de
insumos "limpos", o que caracteriza este tipo de produção como uma agricultura de substituição
de insumos, pois pouco altera a lógica de produção da agricultura convencional31.
A questão que se coloca, então, é como diferenciar e valorar os distintos
encaminhamentos tecnológicos quando o produto orgânico passa a ser objeto de
transações comerciais. O que tem se verificado em termos gerais é que há a coexistência
de produtos orgânicos derivados desses dois encaminhamentos tecnológicos nos distintos
mercados de orgânicos. Contudo, de um modo geral o que também vem se observando na
atualidade é que há uma tendência a submeter os produtos orgânicos à mesma lógica que
orienta o sistema hegemônico do mercado agroalimentar, qual seja, a lógica baseada nas
tecnologias de produto.
De certa forma o próprio processo de institucionalização da agricultura orgânica
tem contribuído para tal situação. No caso brasileiro esta condição pode ser verificada na
adoção da definição legal de agricultura orgânica, a partir da Lei n.o 10.831, adotada pelo
Ministério de Agricultura e Abastecimento. No mercado mundial essa coexistência está
também relacionada à conceituação dada por organismos reconhecidos internacionalmente
na área da produção orgânica, tais como a Comissão do Codex Alimentarius (FAO) e a
Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (IFOAM).
No Brasil, segundo a Lei n.o 10.831, de 23 de dezembro de 2003, publicada em
24/12/2003, Art. 1.o, a produção orgânica passa a ser definida como:
toda aquela em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso
de recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural
das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica,
a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energias
não-renováveis, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e
mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de
organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do
processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização,
e a proteção do meio ambiente.
Na definição da Comissão do Codex Alimentarius, a agricultura orgânica é:
um sistema global de gestão da produção que fomenta e realça a saúde dos
agroecossistemas, inclusive a diversidade biológica, os ciclos biológicos e a
31 A produção convencional caracteriza-se pela mecanização do processo de produção, monocultura, ocupação de
extensas áreas de produção, utilização de um conjunto homogêneo de práticas tecnológicas, de variedades
vegetais geneticamente melhoradas, muito exigentes em fertilizantes químicos de alta solubilidade, de agrotóxicos
com maior poder biocida, de irrigação e motomecanização. A adoção deste modelo de produção também supõe
a implementação de novos métodos de gestão administrativa, técnica e de apropriação do meio ambiente.
54
atividade biológica do solo. Isto se consegue aplicando, sempre que possível,
métodos agronômicos, biológicos e mecânicos, em contraposição à utilização de
materiais sintéticos, para desempenhar qualquer função específica dentro do
sistema. (CODEX ALIMENTARIUS, 1999, p.9)
Segundo a IFOAM, a agricultura orgânica ou ecológica é definida como:
todos os sistemas agrícolas que promovem a produção sadia e segura de alimentos e
fibras têxteis desde o ponto de vista ambiental, social e econômico. Estes sistemas
partem da fertilidade do solo como base para uma boa produção. Respeitando as
exigências e capacidades naturais das plantas, os animais e a paisagem, procura
otimizar a qualidade da agricultura e do meio ambiente em todos os seus aspectos. A
agricultura orgânica reduz consideravelmente as necessidades de aportes externos ao
não utilizar adubos químicos nem praguicidas ou outros produtos de sínteses. No seu
lugar permite que sejam as poderosas leis da natureza as que incrementem tanto os
rendimentos como a resistência dos cultivos. (INTERNATIONAL FEDERATION OF
ORGANIC AGRICULTURE MOVEMENTS, 1995, p.12)
Como se observa, essas definições permitem contemplar, em maior ou menor
medida, a existência de estabelecimentos de produção orgânica nos quais as práticas
agrícolas visam à substituição de insumos sintéticos, baseando-se nas tecnologias de
produto, através do aporte de insumos alternativos geralmente externos à propriedade, como
adubos orgânicos e defensivos naturais, com produção orgânica inclusive monocultural. Da
mesma forma que se contemplam as tecnologias de processo, em que a agricultura orgânica
tem por objetivo o manejo integral da unidade de produção agrícola, os princípios de
promoção da agrobiodiversidade e os ciclos biológicos visam à sustentabilidade social,
ambiental e econômica da unidade.
Segundo Assis e Romeiro (2002, p.18), citando Fonseca (2000), para os objetivos
gerais relativos ao mercado o que se percebe é que se tem utilizado uma restrita definição de
agricultura orgânica, normatizando os padrões orgânicos na medida em que se estipula a
proibição do uso de alguns insumos e se dita uma gama de práticas a serem seguidas.
Constata-se, assim, uma sobrevalorização do produto em si em detrimento da importância da
forma como este é produzido, o que, em certa medida, implica um reducionismo na visão do
necessário equilíbrio do agroecossistema, em que se passa a enfocar o que é ou não permitido.
Do ponto de vista do processo de difusão tecnológica, o cumprimento das normas
de produção e a consideração das técnicas recomendadas para a produção orgânica com
ênfase no uso de tecnologias de processo estabelecem as necessidades de aprendizado de
técnicas de produção coerentes com esse enfoque produtivo.
Para Weid (2001), dadas as peculiaridades desse enfoque produtivo, particularmente
a necessidade de desenhos específicos de produção para cada situação em particular, os
conhecimentos não podem ser produzidos de forma homogênea para uso massivo pelos
agricultores. Esta peculiaridade é contrária às características dos paradigmas dominantes na
55
pesquisa e na extensão rural, que buscam produzir e disseminar pacotes tecnológicos a
serem aplicados com baixo índice de diferenciação.32
Cabe destacar, também, que a adoção da produção orgânica baseada nas
tecnologias de processo exige pesquisa e, particularmente, experimentação. Segundo Padel
(2001), na implantação do sistema de produção orgânico é essencial a informação e
conhecimento de como usar essa tecnologia, ou seja, o domínio prático dessa tecnologia,
assim como as informações de avaliação do desempenho da inovação.
A aquisição de conhecimentos e habilidades para o desenho desses sistemas é
mais eficiente na medida em que existe tanto uma maior incorporação dos conhecimentos
científicos como uma mobilização de conhecimentos e habilidades dos próprios agricultores.
Nesse sentido, observa-se que os agricultores que já tiveram experiência com práticas nãoconvencionais possuem maior facilidade e demandam menor tempo para o aprendizado e
organização do manejo orgânico, o que facilita em grande medida o processo de conversão.
Por outro lado, segundo Darolt (2000), os agricultores convencionais, que têm
maior contato com o mercado, caracterizam-se por não terem dificuldades de organização e
obtenção de informações técnicas e comerciais. Suas dificuldades estão mais relacionadas
às perdas iniciais de produtividade em face da mudança para a agricultura orgânica.
Embora se saiba das limitações de formação e informação existentes entre os
próprios técnicos que atuam apoiando a produção orgânica, seja no nível governamental
como no não-governamental, Ruault (2002) destaca alguns elementos a serem considerados
quando do processo de conversão da agricultura convencional à orgânica, principalmente
quando se trata das tecnologias de processo:
- necessidade de ações de formação, diante do papel essencial do conhecimento;
- desenvolvimento de formas de trabalho baseadas na troca de experiência entre
agricultores e técnicos;
- multiplicação dos programas de experimentação, com o objetivo de produzir
referências técnico-econômicas, sociais e ambientais.
Cabe destacar ainda um outro fator relevante para abordar o sistema de produção
da agricultura orgânica, que é a inovação tecnológica. Veiga (1996) aborda esta questão
quando discute as possibilidades atuais de os sistemas de produção agrícola passarem por
um processo de transição para uma agricultura com base na sustentabilidade ambiental,
32 As abordagens participativas para a geração e difusão de tecnologias de produção orgânica apostam na
capacidade individual e coletiva dos agricultores de reavaliar os seus conhecimentos herdados, ou próprios, e
de apreender as técnicas de agricultura orgânica, de modo a construírem eles mesmos novos desenhos de
sistemas agrícolas por meio de experimentação e aprimoramento, em permanente processo de socialização
de conhecimentos.
56
denominada pelo autor como a possibilidade da transição. O autor trabalha a idéia de
inovação como estando inserida num quadro onde mudanças tecnológicas são decorrentes
de mudanças socioculturais, ou seja, há nas tecnologias a "marca social" do momento
histórico e dos conflitos presentes.33
Ao tratar da possibilidade da transição agroambiental, por meio da agricultura
orgânica, o autor destaca que foram as exigências sociais relativas às questões ambientais
que impulsionaram os processos de transição em curso. Mais ainda, corroborando outros
autores, menciona que é a agricultura familiar que possui vantagens comparativas nesse
processo de transição, em comparação à agricultura patronal, pois esta última, além de
especializada, tem alta concentração de renda e exclusão social. Quanto à agricultura familiar,
"além das vantagens socioculturais, dado seu perfil distributivo, também sob o prisma da
sustentabilidade (estabilidade, resiliência e eqüidade) são muitas as vantagens apresentadas
desde a diversificação e a maior maleabilidade no seu processo decisório" (VEIGA, 1996).
No item a seguir procura-se identificar quais são as potencialidades e os limites
da agricultura familiar com relação ao sistema de produção da agricultura orgânica.
2.3.2
A Agricultura Familiar e a Produção Orgânica: Potencialidades e Necessidades
Tecnológicas
Antes de abordar as potencialidades e necessidades tecnológicas da agricultura
familiar para desenvolver a agricultura orgânica, é importante explicitar brevemente o que se
entende por agricultura familiar.
A agricultura familiar é tratada na literatura especializada como uma noção em
processo de construção, e seu reconhecimento está baseado em três elementos centrais
que se articulam: a família, o trabalho e a propriedade. A partir de um amplo estudo
realizado em cinco países, Lamarche (1993, p.15) diz que a agricultura familiar
corresponde a uma unidade de produção agrícola onde propriedade e trabalho estão
intimamente ligados à família. A interdependência destes três fatores no funcionamento
da unidade engendra necessariamente noções mais abstratas e complexas, tais como
a transmissão do patrimônio e a reprodução da unidade.
Desde meados dos anos 90 do século passado muitos estudos têm sublinhado o
caráter familiar de inúmeros estabelecimentos agrícolas, tanto no Brasil como em outros
países, o que tem conduzido a um debate que possa caracterizar as diferenças desta forma
33 Tal debate decorre do trabalho de dois autores franceses, Pierre Dockès e Bernard Rosier (1992), apresentados
por José Eli da Veiga (1996, p.7).
57
de produção com relação à forma camponesa à agricultura patronal.34 Um dos aspectos
centrais que diferenciam e dão corpo à noção é o papel que a família ocupa no trabalho da
unidade e como gestora das decisões, da organização e dos rumos do estabelecimento,
nem sempre orientando-se por premissas econômicas, mas reportando-se a outras lógicas
e estratégias.
A partir dos elementos centrais, o que os estudos mostram como essencial é que
não se está diante de uma categoria homogênea, ao contrário, trata-se de uma categoria
que comporta em si mesma a diversidade, resultando em diferentes combinações e formas,
dependendo dos aspectos sociais, históricos e políticos em que se inserem os agricultores.
Para compreender a diversidade, Lamarche (1993) propõe que seja tomado como
eixo orientador o grau de integração das explorações familiares com o mercado, bem como
o grau de dependência do trabalho da família no processo de produção agrícola. Isso
permite evidenciar distintas situações, desde aquelas unidades agrícolas regidas exclusivamente
pela produção para a reprodução da família, até aquelas cuja produção se norteia por uma
racionalidade empresarial capitalista. O autor salienta que se deve considerar que cada
situação desdobra-se "numa determinada relação com a sociedade de consumo, um
determinado modo de vida e de representação" (LAMARCHE, 1993).
Buainan e Pires (2003, p.34), ao analisarem a agricultura familiar no Brasil e
contemplarem o plano técnico-econômico, destacam que a metade dos estabelecimentos de
tipo familiar (49,8%) depende exclusivamente da força física dos seus integrantes para
realizar as tarefas agrícolas necessárias para a produção, como arar, semear, capinar e
colher. Todas essas atividades são realizadas praticamente com o uso de apenas dois
instrumentos – foice e enxada –, acrescido do uso de fogo para queimar e limpar a floresta
ou os pastos, revelando a simplicidade tecnológica no manejo produtivo.
Evidenciando a diversidade nas formas de produção e relação com o mercado,
ressaltam que no caso da Região Sul do País, considerada a principal área de concentração
da agricultura familiar no Brasil, além desses dois instrumentos, outros meios de produção,
como a tração mecânica e animal, são mais usados, sendo que para parcela significativa dos
agricultores familiares a força manual é combinada com o uso de outras tecnologias. Nessa
região a maioria dos agricultores familiares pratica, com distinta intensidade, a policultura, a
complementaridade entre atividades pecuárias e agrícolas, e o uso de insumos próprios durante
o processo de produção. A maioria desses agricultores observa sistemas diversificados que
incluem desde a produção/comercialização de suínos, leite, aves, milho, feijão, até soja e fruta.
34 Ver, para o caso brasileiro, Abramovay (1992) e Wanderley (1996), bem como Lamarche (1993), que coordenou
um estudo sobre o tema em cinco países: Canadá, França, Turquia, Polônia e Brasil.
58
Nesse contexto é que se tem considerado que a agricultura familiar é aquela que
reúne as condições mais favoráveis ao desenvolvimento da produção orgânica35, tanto no
Brasil como nos demais países. Mas é importante ter em mente que também aqui se está
tratando da diversidade, ou seja, os agricultores familiares que praticam a agricultura
orgânica também não são uma categoria homogênea.
Embora não se pretenda aprofundar a discussão sobre as características ou o
perfil do atual agricultor orgânico, o objetivo aqui é destacar a heterogeneidade das formas
presentes, no sentido de estimular o aprofundamento do conhecimento sobre tais agricultores,
não só com relação ao perfil e características, mas principalmente no que tange à relação
com os diversos tipos de mercado.
Embora a literatura não apresente uma tipologia para categorizar os agricultores
familiares que praticam a agricultura orgânica, vai-se partir de estudos realizados no Paraná
com agricultores familiares orgânicos para se sugerir que se está tratando de pelo menos três
grupos distintos36 – agricultores familiares orgânicos tradicionais, neorurais37 e migrantes:
- agricultor familiar orgânico tradicional: é considerado como uma certa 'condição
camponesa', cuja vida se reproduz material, social e culturalmente no meio
rural, o que o diferencia dentre outros segmentos sociais;
- agricultor familiar orgânico neorural38: é aquele que, por livre escolha, bem
precisa e particular, decide não mais morar na cidade e não mais trabalhar em
profissões urbanas, resolvendo mudar para o campo e trabalhar na agricultura ou
criação de animais;
- agricultor familiar orgânico migrante: é aquele que migra para a cidade, vive um
período de experiências urbanas e retorna posteriormente à agricultura.
35 Ver artigo de Carmo (1998) que explora a temática.
36 Esta tipologia é proposta a partir do trabalho de Karam (2001), que, ao estudar os agricultores orgânicos da
região metropolitana de Curitiba, adotou como principal critério para diferenciar os grupos de agricultores que
pesquisaram a trajetória de vida do responsável pela unidade produtiva, diferenciando dois grupos, o dos
agricultores tradicionais e o dos neorurais. Hernández (2005), além de adotar a tipologia, identificou ainda um
terceiro grupo, propondo mais uma categoria, a de agricultores orgânicos migrantes.
37 Karam (2001, p.140-141), para estabelecer a tipologia proposta – agricultor orgânico tradicional e agricultor
orgânico neorural –, estudou 57 famílias da região metropolitana de Curitiba, e construiu um indicador de
diferenciação dos dois grupos a partir de cinco variáveis aplicadas ao responsável pela produção de
orgânicos. São elas: local de nascimento do responsável; tempo na atividade agrícola; história de migração do
responsável; antepassados do responsável na atividade agrícola; e origem da atual propriedade rural.
38 A noção de neorural utilizada é proposta por Giuliani (1990, p.60), a partir de referência a estudos na França.
59
Tal tipologia parece útil para se refletir sobre o perfil e as características dos
agricultores familiares orgânicos do Paraná, bem como sobre as distintas relações que possam
existir entre eles e os tipos de mercado.
Com relação aos mercados é importante considerar a proximidade ou distância
dos agricultores de aglomerações urbanas. Bianchini (2001) chama a atenção para tal condição,
destacando que a proximidade com centros urbanos parece propiciar ao agricultor familiar
mais oportunidades de acesso aos diferentes mercados para produtos; maior disponibilidade
de recursos humanos, em especial de profissionais qualificados em diversas áreas,
inexistentes em municípios mais isolados; facilidades para encaminhar reivindicações e
negociar demandas junto às estruturas regionais do governo estadual, assim como maiores
possibilidades de participar de estruturas sociais de cooperação.
Os elementos apresentados até o momento indicam a potencialidade social da
agricultura familiar à prática da agricultura orgânica. Contudo, é importante refletir sobre tais
potencialidades verificando quais são os elementos facilitadores e quais as necessidades.
Em relação às potencialidades, cabe ressaltar a importância da centralização da
gestão da produção e do trabalho numa mesma figura que possui os mesmos interesses: a
família. Esta característica permite estabelecer uma relação mais estreita entre ambos os
processos, diminuindo o custo de gestão e supervisão de mão-de-obra, necessários ao
controle da qualidade do processo de produção.39
Dado que a propriedade familiar é tanto um espaço de produção como um espaço
de estabelecimento e reprodução da família, isto é, a terra e seus recursos não são apenas
uma fonte objetiva de renda, mas também uma fonte de vida, existe a preocupação pela
preservação dos recursos naturais. Esta preocupação facilita a incorporação dos princípios
ecológicos, fazendo da agricultura familiar o principal veículo de transição para a agricultura
baseada nestes princípios. A vida da família na propriedade também possibilita o conhecimento
detalhado dos diversos ambientes da propriedade, o que, sem dúvida, facilita o desenho
específico de sistemas produtivos.
Uma outra característica da agricultura familiar que se apresenta como um elemento
facilitador na adoção da agricultura orgânica é o tamanho da propriedade familiar. A agricultura
orgânica, que enfatiza o uso de tecnologia de processos, dada a sua complexidade, é dificilmente
adaptável a operações agrícolas de larga escala, já que não admite mecanização pesada e
exige uma gestão do uso do espaço e do tempo bastante elaborada.40
39 Como já se mencionou, a gestão do uso do espaço e do tempo na agricultura orgânica é bastante elaborada e
pouco adaptada ao emprego de mão-de-obra contratada, normalmente despreparada para os cuidados do
manejo ambiental, ou desinteressada por eles.
40 Cabe ressaltar que, segundo Weid (2001, p.63), teoricamente nada impede a adoção da agricultura orgânica
em grandes propriedades, mas a prática mostra que as exigências de conhecimentos no manejo de
ambientes diversificados tornam o uso de assalariados pouco eficiente. Apesar dos limites estruturais para a
60
Outras peculiaridades da produção familiar, como a diversificação da produção, a
integração entre produção animal e vegetal, a cultura de policultivo e utilização de insumos
internos, também facilitam a adoção da visão sistêmica da unidade de produção, a qual,
como já se mencionou, está baseada, entre outros fatores, na integração e diversificação
das atividades produtivas, assim como no uso de insumos internos no processo de produção.
Cabe mencionar também a grande habilidade de observação e de experimentação, e
inclusive de experiência com técnicas de produção orgânica que caracteriza os agricultores
familiares, o que facilita a receptividade, a capacidade de absorção de conhecimento tecnológico
e o domínio prático da tecnologia.
No que diz respeito às necessidades, dentre os fatores limitantes destacam-se o
conhecimento sobre os sistemas de garantia – a certificação –, sejam os participativos ou
por auditagem, o acesso e o aprimoramento de informações e conhecimentos técnicos
relativos ao próprio sistema de produção orgânico baseado em tecnologias de processo.41
Ressalta-se também a necessidade do conhecimento e uso de tecnologias de gestão, em
especial de ferramentas de planejamento estratégico do processo de produção, assim como
dos serviços financeiros disponíveis no mercado para agricultura orgânica42, particularmente
para a conversão tecnológica, pois sabe-se que, à medida que o tempo e a intensidade de
adoção do sistema convencional forem maiores, maiores serão os recursos financeiros
necessários para a conversão.
Destaca-se ainda a necessidade de conhecimento sobre as diferentes possibilidades
de mercados e o funcionamento destes. O agricultor, via de regra, dada a hegemonia do
sistema do mercado agroalimentar, sente-se subordinado e inseguro em estabelecer outras
condições e demandar novas relações, tornando-se um ator relevante no processo de
construção social de mercados, onde as regras não necessariamente estão todas dadas,
havendo as condições para novas negociações e disputas.
plena adoção desta agricultura orgânica nas grandes propriedades, qualquer mudança nos padrões de
produção que represente de fato menos perda de solo, menos desperdício de água, menos consumo de
energia, menos perda de biodiversidade e menor contaminação deve ser considerada positiva no processo de
transição para a produção com maior grau de sustentabilidade.
41 Segundo Padel (2001), o obstáculo maior, do ponto de vista técnico-organizacional, é a falta de informação e
conhecimento tanto no que se refere às normas e técnicas do sistema de produção orgânico – particularmente
ao modo como usar essa tecnologia e ao domínio prático desta – como às tecnologias de gestão, em especial
as ferramentas de planejamento.
42 Cabe mencionar que, apesar do crescimento da produção orgânica, existem poucas linhas de crédito específicas
para esta agricultura. Isto faz com que o agricultor tenha duas dificuldades de distinta ordem: existência limitada
de financiamento e desconhecimento de instrumentos de financiamento.
61
O quadro 2.5, a partir do estudo de Hernández (2005), traz uma síntese das
potencialidades e necessidades da agricultura familiar no desenvolvimento da agricultura orgânica
no que se refere a aspectos socioeconômicos e técnico-organizacionais.
QUADRO 2.5 - POTENCIALIDADES E NECESSIDADES DA AGRICULTURA FAMILIAR NO DESENVOLVIMENTO DA
AGRICULTURA ORGÂNICA - RMC - PARANÁ
ASPECTOS
POTENCIALIDADES
-
A gestão e o trabalho da unidade estão
NECESSIDADES
-
Conhecimento dos serviços financeiros
centralizados numa mesma figura: a família.
disponíveis para a conversão tecnológica. À
Esta característica facilita a qualificação e
medida que o tempo e a intensidade de adoção
Aspectos
ajuste entre a gestão e a realização do
do sistema convencional forem maiores, maiores
socioeconômicos
processo de produção.
serão os recursos financeiros necessários para
A propriedade é uma fonte de renda e de vida, o
a conversão.
-
que facilita sua preservação e seu conhecimento. -
Conhecimento de mercados específicos e de
seu funcionamento.
-
Aspectos técnico-
-
organizacionais
Tamanho da unidade de produção. O pequeno -
Conhecimento e adequação às normas para a
e médio portes das unidades de produção
obtenção do selo orgânico.
familiar facilitam o conhecimento, gestão e uso do espaço, requisitos indispensáveis para o
conhecimentos técnicos adequados ao sistema
desenho específico de sistemas produtivos.
de produção orgânico.
Diversificação da produção, integração entre
-
Acesso e aprimoramento de informações e
Uso de tecnologias de gestão, particularmente
produção animal e vegetal, cultura de policultivo
de ferramentas de planejamento estratégico
e utilização de insumos internos. Esta
do processo de produção.
característica facilita a visão sistêmica da
unidade.
-
Facilidade na aquisição de conhecimentos a
partir da observação e experimentação.
FONTE: Hernández (2005)
É preciso destacar o que menciona Hernández (2005), que toda necessidade de
aprendizado traduz-se em um ponto de ruptura, e que este também advém das necessidades
de des-aprendizado de determinados conceitos, técnicas e práticas culturais, como o uso de
insumos e defensivos agrícolas. Nesse sentido, é fundamental exercitar a capacidade de
desaprender, suplantando o aprendido pela aquisição de novas ferramentas. E, a capacidade
de aprender, por sua vez, é necessária para adquirir novos conhecimentos, para ajustar e
atualizar o conhecimento existente.
As reflexões apresentadas aqui têm um impacto no que se refere aos tipos de
mercado e ao consumo de orgânicos. O item a seguir procura mostrar que a temática relativa ao
consumo tem enfatizado o consumidor individual, o qual se relaciona de forma mais direta com
os produtos orgânicos em si, muitas vezes desconhecedor dos processos que envolvem o
sistema de produção. Ao mesmo tempo destaca-se a emergência de um outro tipo de consumo,
o consumo coletivo, estimulado por ações e programas do poder público, como a merenda
escolar e o programa de aquisição de alimentos, capitaneado pelo mercado institucional.
62
2.4
O CONSUMO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: UMA CARACTERIZAÇÃO A PARTIR
DO CONSUMIDOR
O consumo e o consumidor de alimentos orgânicos constituem mais um dos elementos
relevantes para se conhecer o mercado de orgânicos. Entretanto, grande parte dos estudos
sobre o tema tem sido direcionada apenas ao conhecimento sobre o consumidor individual,
focando as atitudes, motivações e freios para a aquisição dos produtos.
Reconhecidamente o consumidor urbano tem desempenhado um papel relevante na
construção do mercado de orgânicos, particularmente a partir dos anos 70, mobilizado por
inúmeras denúncias sobre os efeitos negativos da agricultura industrial ao meio ambiente.
A atuação de vários movimentos sociais propugnando a necessidade de se apoiar sistemas de
produção agrícola sustentável ambiental e socioeconomicamente contribuiu substantivamente
para o apelo dos consumidores por alimentos de qualidade, benéficos à saúde humana e dos
recursos naturais.
Contudo, embora a maior parte dos movimentos visasse tratar a produção
alimentar sustentável numa perspectiva das tecnologias de processo43, destacando também
a identidade dos alimentos com seus locais de origem, a não padronização alimentar e a
relação entre produção, produtores e consumidores, o que tem se verificado é que o consumidor
permanece fixado no produto orgânico em si. Esta condição se ressalta à medida que se
analisam os estudos relativos ao tema, os quais, em sua maioria, abordam o consumidor no
que tange ao perfil e características, bem como as razões que o estimulam ao consumo dos
produtos orgânicos.
Schmidt (2004), ao estudar o consumidor "entre a intenção e o gesto" de comprar,
menciona que, ainda que as idéias e o discurso sejam importantes, ou seja, as razões de
consumo, é somente pelo ato da compra consciente – informada, refletida – que o consumidor
torna-se, de fato, propulsor do sistema de produção da agricultura orgânica. Nesse sentido, a
autora atenta para o fato de que estudar o consumo de alimentos orgânicos desta perspectiva
é, portanto, uma tarefa complexa e multifacetada.
Apesar de tais limitações, julga-se pertinente, no contexto deste estudo, apresentar
uma breve análise que permita apreender a perspectiva do consumidor de alimentos orgânicos
a partir de alguns estudos já realizados, oferecendo pistas para se pensar em novos estudos
sobre a questão do consumo. Além disso, inclui-se também uma breve reflexão sobre um outro
consumidor, o qual denominou-se consumidor coletivo, isto é, aquele que tem acessado os
produtos orgânicos através de programas pelo mercado institucional, como a merenda escolar
orgânica e o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA (MDS/Programa Fome Zero/CONAB).
43 Ver o item 2.3 deste trabalho, onde se apresenta esta discussão.
63
2.4.1
O Consumidor de Produtos Orgânicos
Nos últimos anos os estudos vêm mostrando interesse crescente pelas atitudes e
preocupações dos consumidores relacionadas aos alimentos orgânicos. Naspetti e Zanoli
(2005) mostraram que existem percepções diferenciadas para a compra, dependendo do
país. O quadro 2.6 resume os três principais motivos para a compra de orgânicos em alguns
países da União Européia, comparados com as tendências no Brasil.
QUADRO 2.6 - PRINCIPAIS MOTIVOS PARA A COMPRA DE ORGÂNICOS PELOS CONSUMIDORES EM PAÍSES DA
EUROPA E BRASIL
PAÍSES
MOTIVOS PARA A COMPRA
Áustria
Saúde
Suíça
Melhor sabor dos alimentos
Responsabilidade com a alimentação
Contribuição para o
das crianças
desenvolvimento regional
Saúde
Preocupação com o meio
ambiente, bem-estar animal,
remuneração dos agricultores
Alemanha
Saúde própria e das crianças
Dinamarca e
Estilo de vida, proteção
Finlândia
ambiental
França e Itália
Saúde
Inglaterra
Saúde
Apoio aos agricultores e às lojas de
Melhor sabor dos alimentos
orgânicos
Saúde própria
Contribuição para um mundo
melhor, consciência, bem-estar
animal
Melhor sabor dos alimentos
Respeito à vida
Apoio à agricultura local e comércio
Proteção ao meio ambiente
justo
Brasil
Saúde própria e da família
Segurança alimentar (menos
Filosofia de vida
agrotóxicos)
FONTES: Sylvander et al. (2005), Darolt (2005)
De forma geral, as pesquisas realizadas em diferentes países44 apresentam
tendências semelhantes, apontando em primeiro lugar preocupação com aspectos relacionados
à própria saúde e à saúde da família e sua ligação com a segurança dos alimentos,
principalmente em relação à saúde contaminação por agrotóxicos e outros agentes químicos.
Em seguida, aspectos como cuidados com o meio ambiente e qualidades organolépticas do
alimento (sabor, cheiro, frescor) são citados como fatores que impulsionam as vendas. O estilo e
filosofia de vida são fatores complementares que motivam a compra de orgânicos.
44 Alemanha e Inglaterra (WOODWARD; MEIER-PLOEGER, 1999 e MAKATOUNI, 2002, respectivamente);
Austrália (PEARSON, 1999); Estados Unidos (HENDERSON, 1999); França (SYLVANDER, 1998;
SYLVANDER et al., 2005); Dinamarca e Noruega (DUBGAARD; HOLST, 1994 e SOGN; PERSILLET;
SYLVANDER, 2002, respectivamente); Polônia (ZAKOWSKA-BIEMANS, 2002); Espanha (SOLER; GIL;
SÁNCHEZ, 2002) e Costa Rica (AGUIRRE; TUMLTY, 2002) e Argentina (RODRIGUEZ; LACAZE, 2005).
64
No Brasil, a principal razão para a compra de alimentos orgânicos também está
ligada à preocupação com a saúde. Uma pesquisa realizada nos estados do Sul e Sudeste
do País mostrou que 53% das pessoas entrevistadas responderam que têm o hábito de consumir
alimentos orgânicos, principalmente aqueles consumidores com maior poder aquisitivo (60%).
Declararam que os principais motivos para o consumo desses alimentos são a preocupação com
a saúde e o receio de consumir produtos com agrotóxicos (DATACENSO, 2002).
Fonseca (2005), em pesquisa realizada com consumidores da Região Sudeste,
confirma o interesse destes quanto à questão da saúde. A autora mostra que, entre as
informações mais procuradas pelos consumidores, estão as referentes à composição e ao
valor nutricional dos alimentos orgânicos, bem como informações sobre o auxílio na
prevenção de doenças. Ainda nessa região, Vilas Boas et al. (2005), ao realizarem uma
pesquisa em feiras orgânicas de Belo Horizonte, identificaram que valores como "viver bem
a vida", "harmonia/equilíbrio", "qualidade de vida" e "longevidade" também fazem parte dos
argumentos dos consumidores para a compra de alimentos orgânicos.
As atitudes dos consumidores de produtos orgânicos, comparadas com as da
população de modo geral, aproximam-se muito das de um consumidor consciente. Segundo
pesquisa do Instituto Akatu (2004), um consumidor consciente apresenta diferença no ato de
ir às compras em relação à maioria da população, mostrando disposição em transformar em
prática os valores com os quais se identifica, tende a se preocupar com a comunidade em
que vive e usa o seu poder de consumidor cidadão.
Numa tentativa de tipificação, pode-se identificar dois tipos de consumidores
orgânicos no Brasil (quadro 2.7). O primeiro é o dos consumidores mais antigos, que são
motivados, bem informados e exigentes em termos de qualidade biológica do produto.
Normalmente são os freqüentadores das feiras e lojas especializadas de orgânicos e têm
maior nível de consciência ambiental em relação à população.
QUADRO 2.7 - CARACTERÍSTICAS DOS CONSUMIDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS NO BRASIL
CARACTERÍSTICAS
Ato de ir à compra de produtos
NOVO CONSUMIDOR
Ocasional
ANTIGO CONSUMIDOR
Regular (fidelidade)
orgânicos
Tempo de consumo
Menos de 5 anos
Mais de 5 anos
Preferência de local de compra
Supermercados
Feiras e lojas
Preço suplementar (disposição para
Até 15%
Até 30%
Saúde e segurança alimentar (menos
Saúde, preocupação com o meio
pagar mais)
Qualidade percebida pelo consumidor
agrotóxicos)
ambiente, qualidade de vida
Limitantes para a compra
Preço, falta de informação
Procedência (origem do produto)
Valores
Comprometido
(1)
Consciente
(2)
FONTE: Darolt (2005)
(1) Trata-se de consumidores preocupados com a coletividade, porém existe uma distância entre seu discurso e sua
prática.
(2) Trata-se de consumidores preocupados com a coletividade e a melhoria da comunidade em que vivem, transformando
discurso em prática.
65
Um segundo tipo, mais recente e ainda pouco estudado, é o consumidor das redes
de supermercados, que, de acordo com os estudos, embora também mencione preocupações
com a questão ambiental, compra mais por impulso e de forma menos regular, comparativamente
com o grupo anterior.
Uma outra pesquisa de opinião pública, desta vez direcionada aos alimentos
orgânicos, foi realizada pelo Instituto Gallup45 no município de São Paulo. Os resultados
mostraram que os compradores de legumes e verduras já têm consciência da toxicidade dos
produtos cultivados com agrotóxicos e da dificuldade de produzi-los sem agrotóxicos. Por
isso, segundo a pesquisa, esses consumidores admitem pagar entre 20% e 30% a mais
pelos produtos orgânicos, desde que devidamente assegurados de que estes são mais
saudáveis que os produtos convencionais.
No que se refere ao perfil dos consumidores de produtos orgânicos, algumas
pesquisas realizadas no sul do Brasil (DAROLT, 2002a; KARAM; ZOLDAN, 2003; e KIRCHNER,
2006) mostraram que o consumidor orgânico é predominantemente do sexo feminino, atua
como profissional liberal ou funcionário público, sua idade varia entre 31 e 50 anos, com
famílias de 3 a 4 membros. Os dados mostram ainda que a maioria é usuária de internet, com
renda entre 9 e 12 salários mínimos, apresentando nível de instrução correspondente ao
ensino superior completo. Com relação aos jovens com menos de 20 anos, os estudos têm
apontado que a presença deles nos locais de vendas de orgânicos é praticamente
insignificante, menos de 2%.
De um modo geral também se aponta como características dos consumidores de
orgânicos o hábito de praticar esportes com freqüência e, mesmo morando na cidade,
procurarem um estilo de vida que permita o contato com a natureza, o que os faz
freqüentadores de áreas verdes urbanas e rurais. Além disso, são pessoas que privilegiam
terapias e medicina alternativas, tanto no tratamento da saúde como na manutenção da
qualidade de vida.
ƒ
Fatores limitantes apontados pelo consumidor de orgânicos
Ao estudar quatro países da Europa (Itália, Inglaterra, França e Alemanha), Sylvander
(1998) mostrou que entre as principais razões para o baixo consumo de produtos orgânicos
estão, em primeiro lugar, os preços, em seguida a oferta insuficiente e, em terceiro, a dúvida
em relação à procedência do produto. A pesquisa indicou ainda a necessidade de maior
sensibilização dos consumidores quanto aos benefícios dos alimentos orgânicos, visto que,
45 A pesquisa, patrocinada pelo Sítio "A Boa Terra", uma empresa agrícola que produz e comercializa hortaliças
orgânicas no município de São Paulo, foi realizada entre novembro e dezembro de 1996, com o objetivo de
conhecer a aceitabilidade dos legumes e verduras orgânicos que estavam sendo comercializados na cidade
de São Paulo.
66
em 72% dos casos, as informações sobre o processo de produção e comercialização eram
insuficientes ou inadequadas. Karam e Zoldan (2003) chegaram a conclusões semelhantes ao
investigarem o consumo de orgânicos na região da grande Florianópolis, no Estado de
Santa Catarina.
Em estudo realizado em Curitiba, Kirchner (2006) mostrou que o problema de
preços altos de produtos orgânicos é verdadeiro quando se comparam redes de supermercados
e feiras orgânicas. Para uma cesta de treze produtos, a diferença de preços chegou a
valores médios superiores de 118% nos supermercados. A média de preços por produto na
feira orgânica é de R$ 1,75, enquanto no supermercado este valor é de R$ 3,82. Por outro
lado, quando se comparam os preços de uma mesma cesta de produtos em feiras orgânica
e convencional, constata-se que não existe diferença significativa entre os preços dos produtos.
No caso dos supermercados, como o sistema de comercialização agroalimentar está
hegemonicamente concentrado nas redes de varejo (super e hipermercados), constituindo o
local predominante de abastecimento alimentar da população urbana, a idéia de que o produto
orgânico é mais caro fica evidente quando este é comparado ao produto convencional.
Entretanto, na maioria das vezes as razões para essa diferença de preços são desconhecidas
pelo consumidor, uma vez que poucos conhecem as relações mercantis46 que se estabelecem
entre os supermercadistas e os comerciantes e/ou produtores de alimentos orgânicos.
Os estudos mostram também que, além do alto preço praticado pelos
supermercados, há o problema da oferta insuficiente, traduzida na falta de produtos em
termos de quantidade e regularidade. Outro ponto a ser considerado refere-se à falta de
informações a respeito dos alimentos orgânicos. Normalmente misturados com produtos
hidropônicos, convencionais higienizados e minimamente processados, os orgânicos
acabam por receber tratamento semelhante ao dos convencionais, gerando confusão e
desconfiança por parte do consumidor.
Ainda com relação à oferta insuficiente dos produtos orgânicos, Darolt (2002a)
aponta que os consumidores mencionam como problema principal a falta de regularidade, a
pouca diversidade e, em seguida, a pouca quantidade. Embora considerem a qualidade de
"boa a excelente", afirmam que a pouca variedade de produtos, sobretudo frutas, cereais e
produtos de origem animal, dificulta a manutenção de uma dieta orgânica no dia-a-dia.
Quanto ao terceiro fator limitante apontado por Silvander (1998), isto é, a dúvida
em relação à procedência do produto, resultados da pesquisa realizada no Brasil pelo
Datacenso (2002) mostraram que, apesar de a maioria das pessoas ser favorável à
certificação, cerca de 54% não se preocupa em comprovar ou não considera relevante o
selo de certificação nos produtos orgânicos. Resultados semelhantes foram encontrados no
estudo conduzido na Região Sudeste do País por Guivant et al. (2003).
46 Ver item 3.3 deste trabalho, que trata da questão.
67
Em face dos aspectos limitantes apontados pelos consumidores, os agricultores
contra-argumentam apresentando os fatores que lhes são impeditivos para atender às
demandas. Dentre estes está a falta de políticas públicas direcionadas ao setor, a falta de
crédito para o período de transição e a ausência continuada de assistência técnica, não só no
planejamento da produção mas também nos processos que envolvem a comercialização.
Mencionam também aspectos relacionados à escala de produção, bem como à logística que
envolve o transporte e a distribuição, como fatores que acabam por onerar o preço dos
produtos orgânicos, principalmente quando estes são destinados aos supermercados.
ƒ
Estratégias de sensibilização para o consumo de orgânicos
Para Fonseca (2005), a demanda por produtos orgânicos acaba por pressionar
diferentes organizações no sentido de sensibilizar, satisfazer e proteger os consumidores,
dando-lhes garantia de que o produto está em conformidade com o que é apresentado. Dadas
as características predominantes do atual mercado agroalimentar, é por meio da certificação, do
selo e da rotulagem que vem se dando a garantia dos produtos orgânicos aos consumidores,
em particular naqueles estabelecimentos do varejo onde esses desconhecem completamente
a origem e o processo de produção.
Outros estudos têm mostrado que a questão da certificação é bastante flexibilizada
naqueles ambientes em que predominam relações características de circuitos locais de
comercialização. Nestes, as estratégias baseiam-se em relações de confiança que,
normalmente, têm raízes em um processo histórico ou de reconhecimento de competência
técnica e reputação em âmbito local, como é o caso das feiras, da distribuição de cestas,
das lojas de produtos naturais e outras redes sociais.
Algumas estratégias de fortalecimento do mercado orgânico local e regional vêm
sendo desencadeadas em vários locais do País, não só nas grandes como nas médias e
pequenas cidades, envolvendo uma rede de atores que abrange produtores, consumidores,
ONGs, iniciativa privada e poder público. A materialização de tais ações se expressa na
comercialização de produtos orgânicos em feiras mistas ou exclusivas, associações de
produtores, organizações de consumidores, restaurantes, lojas e pequeno varejo, bem como
em outras iniciativas de comércio justo e solidário.
Darolt (2005) descreve algumas experiências que estão ocorrendo na RMC47
envolvendo diretamente os consumidores e agricultores. Dentre elas destaca a visita orientada
de consumidores às propriedades orgânicas, ocasião em que é possível informar e dirimir
dúvidas dos consumidores a respeito de diversos aspectos, desde as dificuldades encontradas
pelos agricultores, sistema de produção, beneficiamento, comercialização e certificação. Dentre
47 Tais experiências estão sendo executadas pela Associação dos Consumidores de Produtos Orgânicos do
Paraná (ACOPA). Para mais informações, consultar o sítio www.acopa.org.br
68
os objetivos de ações dessa natureza está o de buscar contribuir para mudanças de atitude do
consumidor, bem como do próprio produtor, por meio do diálogo e do conhecimento.
Também faz parte dessa estratégia possibilitar a relação de comercialização direta na
propriedade, por meio do sistema "colha-e-pague", que permite uma maior aproximação do
consumidor com o alimento. Além disso, no momento da visita valoriza-se a identidade dos
alimentos, que se expressa por meio da culinária, seja mediante um almoço com produtos
orgânicos na propriedade, seja pela degustação nas feiras livres ou em outros estabelecimentos,
situação que ganha significado para além da palavra.
O que tem se verificado em tais situações é que há uma troca de informações
entre as pessoas envolvidas nessa rede. Novos sabores, receitas e alimentos, com funções
de nutrir e curar, transformam-se em uma forma de sensibilização e comunicação,
envolvendo valores e o conjunto dos sentidos – paladar, olfato, tato, visão.
A venda direta na propriedade, face a face, também tem se revelado uma importante
estratégia de comercialização para muitos agricultores, fortalecendo a comunicação entre
estes e os consumidores. O resgate dos costumes e tradições locais na forma de produzir,
complementado com preços compensadores, qualidade biológica do produto, frescor e
sabor são algumas das vantagens desse processo. Contudo, neste caso têm sido essenciais
investimentos em infra-estrutura por parte do agricultor (estacionamento, banheiros, placas
indicativas) para a recepção de pessoas, situação bastante limitante para a maioria dos
agricultores orgânicos.
Nessa direção vêm se verificando também estratégias que visam à integração
das propriedades orgânicas em circuitos de turismo rural, em que aos processos produtivos
agroecológicos soma-se a valorização, pelos consumidores urbanos, da "redescoberta" do meio
rural, em que o ambiente natural, os rios com águas limpas e o ar puro integram a paisagem.
Uma outra estratégia que tem sido desenvolvida é a de motivar pessoas a formar
e participar de organizações de consumidores. Iniciativas têm sido registradas em vários
estados brasileiros, as quais têm se desenvolvido e mantido, seja através da divulgação e
informação sobre os produtos orgânicos, seja através de processos de comercialização. Na
Região Sul a pioneira nesse quadro foi a Cooperativa Ecológica COOLMEIA, fundada em
1978, em Porto Alegre-RS (em 2006 encerrou suas atividades), seguida da COOPET Cooperativa dos Consumidores de Produtos Ecológicos de Três Cachoeiras, fundada em
1999, no município de Três Cachoeiras-RS, e da ACOPA - Associação dos Consumidores de
Produtos Orgânicos do Paraná, fundada em 2000, em Curitiba-PR.
As feiras exclusivamente de produtos orgânicos, bem como as feiras mistas, têm
sido também uma importante estratégia de divulgação e ampliação no consumo de
orgânicos. Grande parte dos estudos que têm abordado a temática mostra que a feira tem
sido um lugar de encontro, de troca, um espaço privilegiado de educação para o consumo e
de ampliação nas relações de confiança para construção do mercado de orgânicos como um
projeto de cunho sustentável, colocando como um desafio a expansão desses espaços
(feiras/mercados fixos) em todas as cidades. Nesse sentido, é importante salientar aqui a
69
escolha do local para as feiras, pois tem-se verificado que aquelas situadas em parques,
praças e bosques têm se mostrado como locais ideais para o sucesso de uma feira de
orgânicos, principalmente nas grandes cidades.
Muitos dos estudiosos que têm trabalhado na perspectiva do consumidor de
orgânicos apontam a necessidade de tornar o consumidor um protagonista e articulador de
mudanças, como a estratégia fundamental para a consolidação do mercado de orgânicos.
Nesse sentido, o conhecimento, a educação para o consumo e a conscientização não só
sobre o produto mas também sobre o processo que envolve a agricultura orgânica torna-se
um dos principais desafios, lembrando-se que um dos maiores obstáculos para uma vida
sustentável é o aumento contínuo do consumo material, segundo tem destacado Capra (2003).
Motivar o consumidor individual a participar de processos organizativos tem sido
uma tarefa de grupos interessados. Contudo, é estratégico também que as políticas públicas
direcionadas ao desenvolvimento da agricultura orgânica contemplem a ação para e com
esses atores, apoiando os grupos já constituídos e estimulando a formação de novos grupos.
A seguir apresenta-se sinteticamente algumas considerações sobre a importância de se
considerar os consumidores de um ponto de vista coletivo, principalmente por meio de iniciativas
que envolvam a ação do Estado como um agente relevante no mercado institucional.
2.4.2
O Consumo Coletivo: o Papel do Mercado Institucional
O consumo coletivo manifesta-se por meio da ação do poder público, na implemen-
tação de programas institucionais, os quais caracterizam o que se denomina mercado institucional.
De maneira ampla está-se considerando aqui como consumidor coletivo aqueles
ambientes onde a ação do poder público destina-se a grandes contingentes de pessoas,
seja através de programas como a alimentação escolar, seja pela aquisição de alimentos
para programas sociais, como o Fome Zero.
Uma das primeiras iniciativas para atender a esse consumidor coletivo ocorreu
recentemente, a partir de iniciativas na Região Sul do País, quando se introduziram na
alimentação escolar os produtos da agricultura orgânica. Tal iniciativa não tem representado
meramente um programa alimentar, mas vem sendo encarada como parte de um amplo
processo educativo, com o objetivo de fazer conhecer o que são esses alimentos que chegam
até os alunos, como são produzidos e quem os produz. O potencial dos produtos orgânicos
com este tipo de consumidor é muito amplo, uma vez que a alimentação escolar48 é
distribuída para cerca de 36,3 milhões de estudantes em todo o País, segundo dados da
48 Segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/Programa Nacional de Alimentação Escolar -
PNAE/MEC, em 2006, no Brasil, foi destinado R$ 1,5 bilhão à merenda escolar de alunos da pré-escola e do
ensino fundamental e de crianças mantidas por entidades filantrópicas com registro no Conselho Nacional de
Ação Social. Para os alunos do ensino fundamental e da pré-escola, o valor da merenda escolar é de R$ 0,22
por aluno/dia.
70
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/Programa Nacional de Alimentação
Escolar (BRASIL, 2006b).
Alimentação mais saudável e nutritiva para as crianças, introdução de novos
hábitos alimentares, educação e proteção ambiental, permanência dos agricultores no
campo, valorização da produção regional e resgate da cultura do meio rural são algumas
das vantagens desses programas que priorizam o alimento orgânico na alimentação escolar.
No Paraná, a FUNDEPAR é o órgão responsável pela operacionalização do
Programa Estadual de Alimentação Escolar (PEAE). Segundo dados da FUNDEPAR (2006), é
possível adquirir alimentos orgânicos perecíveis por meio do Projeto Escola-Cidadã, que
disponibiliza R$ 0,50/aluno/mês para a compra de alimentos. Em 2006 foram repassados
3 milhões de reais, abrangendo 1.830 estabelecimentos em 320 municípios paranaenses,
atendendo cerca de 1 milhão de alunos da rede estadual de ensino (ensino fundamental,
médio e supletivo). A compra no local é realizada pelos diretores das escolas, que devem
ser sensibilizados para a importância do alimento orgânico.
Outros espaços pouco trabalhados que poderiam impulsionar as vendas são
instituições e empresas públicas (hospitais, creches, instituições beneficentes), as quais
apresentam um público cujo perfil é bastante recomendado para a compra de orgânicos.
Ademais, esse tipo de estratégia pode funcionar como uma forma de aproximar o público
que consome e o público que produz, o que conduziria à reflexão conjunta sobre questões
relativas ao consumo, ao meio ambiente, à sustentabilidade em suas diversas dimensões.
As ações desenvolvidas pelo poder público, através do mercado institucional,
podem ser entendidas como estratégias para potencializar o consumo de orgânicos por um
público mais amplo, em que o foco central é a segurança alimentar e nutricional para a
população de menor renda. Precisam ser incentivadas políticas públicas para ampliar o
acesso dos diversos segmentos da população a alimentos de qualidade. Essas políticas
devem assegurar a qualidade e regularidade do abastecimento interno e estimular
processos de transação mercantil que garantam a produção, eliminando ou reduzindo as
formas abusivas de intermediação. Tais iniciativas podem estimular o surgimento de redes
solidárias de produção, processamento, distribuição e consumo, por meio de associações e
cooperativas envolvendo populações rurais e urbanas, produtores e consumidores.
71
3
O MERCADO DE ORGÂNICOS: SITUAÇÃO MUNDIAL E INSERÇÃO DO PARANÁ
Nesta terceira parte do estudo são apresentadas informações relativas ao
mercado de orgânicos no mundo e no Brasil, para, em seguida, contextualizar a produção
de orgânicos no Paraná.
3.1
O PANORAMA DO MERCADO MUNDIAL DE PRODUTOS ORGÂNICOS
Dados confiáveis sobre o comércio internacional de produtos orgânicos são escassos
e pouco consistentes, porém a direção do comércio é bastante clara, destacando-se as
trocas intra-regionais. Os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão e o Reino Unido são pólos
centrais de importação, ressaltando-se a Alemanha, que, embora produza 80% do seu consumo
interno, é um grande país importador, e está se tornando um entreposto de produtos orgânicos
na Europa. O mercado alemão é extremamente exigente, já que eles se interessam tanto
pelos métodos de produção quanto pelos métodos de processamento e embalagem, enfim,
por todo o processo. A Holanda também se destaca como país importador, sendo a maior
porta de entrada dos produtos orgânicos na Europa. Como fornecedores intra-regionais
importantes na União Européia ressaltam-se a Espanha, que exporta 75% de sua produção,
a Itália e a Dinamarca, que exportam 67%, além da Áustria e de Portugal.
Na década de 90 os mercados de produtos orgânicos certificados por auditagem
apresentaram taxas de crescimento elevadas na Europa, nos Estados Unidos e no Japão,
bem como em muitos países de baixa renda. O consumo na França aumenta 15% ao ano,
e na União Européia a taxa média anual de crescimento girou em torno de 25% nos últimos
10 anos.
Com relação à composição por tipo de produto orgânico certificado, a tendência é
crescer a diversidade de produtos ofertados. Dados de Sylvander (1998) sobre a evolução
desse cenário na França, entre os anos de 1994 e 1997, mostram que houve principalmente
um crescimento proporcional do setor de produtos lácteos (10% para 32%), uma queda do
setor FLV (30% para 12%), das carnes (3% para 1%), da soja (7% para 3%) e dos cereais
(50% para 40%). Em 1997, surgiram os setores de café (1%), refeições prontas (2%),
condimentos (6%) e ecoprodutos (4%).
O gráfico 3.1, a seguir, mostra o cenário da área total sob manejo orgânico
certificado no mundo.
72
O Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), firmado em 1995,49 é
composto por países produtores e exportadores de um amplo leque de produtos orgânicos.
O valor estimado do mercado de orgânicos, em 2000, foi da ordem de 10 a 12 bilhões de
dólares, sendo que os EUA saltaram de um mercado de 4,2 bilhões, em 1997, para 6,6
bilhões de dólares em 2000 (WILLER e YUSSEFI, 2001) e para 11,4 bilhões de dólares em
2003 (SAHOTA, 2005, p.20). O Canadá exporta 80% de sua produção, a maior parte para os
Estados Unidos, e o México tem, nos Estados Unidos, seu maior comprador.
Os EUA têm o maior mercado nacional de produtos orgânicos e as maiores taxas
de crescimento, alcançando 20% anualmente. Um terço dos consumidores americanos
compra regularmente produtos orgânicos e o setor representa 2% do mercado de alimentos
(HAUMANN, 2003). O acelerado crescimento da indústria norte-americana de alimentos orgânicos
atraiu investimentos de grandes corporações de alimentos, como Kraft Foods, Pepsi-Cola,
Dean Foods e Danone, que adquiriram agroindústrias orgânicas já existentes.
Os Estados Unidos são um importante exportador de matérias-primas orgânicas
para a Alemanha, que as processam e embalam em suas indústrias. Ali, os principais pontos
de venda desses produtos são as grandes redes de supermercados, que viram nos orgânicos
uma oportunidade de diferenciação no seu mix de produto e de valorização da imagem da
empresa frente ao consumidor. Supermercados como o Wal-Mart, principalmente nos
grandes centros urbanos, foram os primeiros a oferecer os produtos em suas gôndolas,
estimulando um grande número de produtores.
O Japão tem o maior mercado da Ásia, e seus consumidores têm conhecimento
dos produtos orgânicos e de seus métodos de produção. O país produz arroz, chá japonês,
saquê (bebida obtida de arroz fermentado artificialmente), vinagre de arroz, mas é um
grande importador de uma enorme variedade de alimentos orgânicos. É o maior importador
de orgânicos na região, com os preços alcançando entre 20% e 50% a mais que os
49 Este Acordo comercial foi firmado entre Canadá, Estados Unidos e México.
73
convencionais. O país importa principalmente: massa, cereais, café (do Brasil, da América
Latina), chá preto, erva-mate (Paraguai), vinho, cerveja, óleo, presunto, mel, vegetais
congelados (EUA, Nova Zelândia, Austrália, Canadá), nozes secas, frutas secas, frutas
frescas – kiwi, banana (México e Filipinas), laranja, carne bovina e de aves, açúcar, pão,
molhos, grãos e produtos à base de soja (China e EUA), salmão (Noruega).
Os três principais mercados no Japão são: (i) o sistema Teikei50; (ii) supermercados
e restaurantes; e (iii) cesta em domicílio. O sistema Teikei ("caixa") começou em 1971,
coordenado por dois grupos: a Associação Japonesa de AO (JONA51) e a Fundação
Internacional de Pesquisa em Agricultura Natural, baseada numa aliança entre produtores e
consumidores. Dos supermercados que vendem extensa linha de produtos naturais, verdes,
os que têm orgânicos adquirem seus produtos via brokers52 de alimentos, exportadores e
atacadistas. Segundo dados do Ministério da Agricultura Japonês para 2001 (MURAYAMA,
2003, p.25), a participação dos supermercados e restaurantes na comercialização de
produtos orgânicos é quase igual à participação das cooperativas de consumidores mais as
vendas diretas (cerca de 24%). Os outros mercados existentes são: cooperativas agrícolas
(33%), processadores de alimentos (14%), atacadistas (3%) e para consumo próprio (2%).
Nos países de alta renda, os produtos certificados da agricultura orgânica são
transacionados em diferentes mercados, podendo ser encontrados em diversos pontos de
comercialização. Nos grandes centros já existem supermercados só de produtos orgânicos,
como o Biogros, na França, o Bioethic, na Alemanha, a rede Planet Organic, no Reino
Unido, ou a cadeia de supermercados naturais Whole Foods, nos EUA. Cresce também o
mercado da venda direta, com transações entre "produtor-consumidor", como os Farmer
Street Market (Mercado dos Produtores) e CSA53.
Esse tipo de mercado, de venda direta, também tem crescido com as Feiras
Ecológicas nos países da América Latina e Caribe. Nestes países, além dos supermercados
também se identificam outros locais de venda, como as lojas de produtos naturais,
restaurantes, spas, hotéis, empresas aéreas e também o mercado institucional (merenda
escolar, hospitais etc.).
50 Sistema Teikei: distribuição direta, em caixa, do produtor para o consumidor.
51 JONA - sigla em inglês para Associação Japonesa de Agricultura Orgânica.
52 Brokers: sistema que substitui ou incorpora os diversos agentes envolvidos com a distribuição de alimentos,
quais sejam: o representante comercial, o distribuidor e o atacadista. A indústria e o atacado realizam a venda
por meio eletrônico e os fabricantes terceirizam o trabalho de ponto de venda com os brokers, que passam a
administrar as vendas.
53 CSA - Community Supported Agriculture, esquema de cooperação entre pequenos produtores e consumidores
urbanos, em que estes últimos apóiam com recursos financeiros e humanos a produção e distribuição de
seus alimentos.
74
A tabela 3.1 apresenta uma visão dos diferentes tipos de mercado para a
comercialização dos produtos orgânicos certificados nos principais países importadores.
Observa-se que a importância que cada canal representa depende de cada país, de cada
cultura, história de fomento, e está ligada também à estrutura já montada para abastecer
esses locais com produtos convencionais.
TABELA 3.1 - DISTRIBUIÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS NOS PRINCIPAIS MERCADOS DOS PAÍSES
DE ALTA RENDA
MERCADO DO VAREJO
PAÍSES
Supermercados
Convencionais (%)
Lojas de Alimentos Naturais,
Especializadas (%)
MERCADO DA VENDA
DIRETA (E OUTRAS
FORMAS DE VENDA)
(%)
Estados Unidos
31
62
7
Alemanha
26
46
28
Grã-Bretanha
74
15
11
Itália
23
60
17
França
38
46
16
Suíça
57
21
22
2
96
2
90
2
8
Holanda
Dinamarca
FONTE: Willer e Yussefi (2001)
Observa-se, na tabela acima, que na Alemanha, maior país consumidor de produtos
orgânicos entre os europeus, a comercialização através da venda direta e nas pequenas
lojas de varejo representa cerca de dois terços de todo o processo de transação comercial
de produtos orgânicos. Diferentemente, no Reino Unido o principal mercado é o varejo, por
meio das grandes redes. Nos últimos anos, os varejistas deste último país estenderam sua
influência até o produto original, e não apenas ditam as especificações de produção e
qualidade, mas definem também o plantio, a colheita, a embalagem, o transporte e a
entrega dos produtos. Maiores restrições e rigor em relação aos produtos e maior poder de
compra pressionam os seus fornecedores a adotar a mecanização e o sistema "industrial"
de produção. A maioria dos varejistas acredita no potencial dos produtos orgânicos, mas
tem outras preocupações além das normas, em particular a segurança, a continuidade na
oferta e exigências de qualidade e preço.
No Oriente Médio o destaque é para países produtores, como Turquia e Israel
(principalmente de nozes, frutas e vegetais, frescos e secos). Embora tenha cerca de 60%
da população mundial, a Ásia possui o menor mercado de produtos orgânicos, o qual,
entretanto, aponta para um crescimento constante. No Leste da Ásia, destacam-se China,
Índia, República da Coréia e Sri Lanka, que exportam cacau, café, óleos essenciais, ervas,
especiarias, amendoim, arroz, chá e baunilha.
A Oceania compreende quase a metade da área orgânica certificada mundial,
embora o tamanho das transações de mercado seja uma fração do mercado total. As
vendas de alimentos e bebidas orgânicas foram estimadas em cerca de 240 milhões de
dólares em 2003, com a maior parte sendo da Austrália. A indústria de alimentos orgânicos
na Austrália e na Nova Zelândia foi tradicionalmente orientada para a exportação.
75
No norte da África, cresce particularmente o mercado doméstico para produtos
orgânicos certificados no Egito. Na África do Sul, a venda dos orgânicos acontece em lojas
especializadas e supermercados. Na Tunísia, a venda de citrus, vinhos, azeite de oliva e
plantas medicinais para exportação também vem aumentando.
Em relação ao comércio de produtos orgânicos entre os blocos comerciais, podese observar, pela tabela 3.2, que o MERCOSUL tem se destacado pela elevada taxa de
crescimento da área certificada para produtos orgânicos. Contudo, assim como ocorre no
comércio agrícola mundial de commodities, no caso dos produtos orgânicos esses países
são predominantemente exportadores de matéria-prima.
TABELA 3.2 - EVOLUÇÃO DA TAXA DE CRESCIMENTO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO NOS BLOCOS
COMERCIAIS - 1999/2003
TAXA DE CRESCIMENTO (%)
BLOCOS COMERCIAIS
1999
(62 países)
2000
(71 países)
2001
(82 países)
2002
(98 países)
2003
(108 países)
União Européia
100
19,1
33,7
68,8
41,9
NAFTA
100
(39,9)
(32,0)
15,7
(5,3)
MERCOSUL
100
548,3
652,9
866,8
825,5
Oceania
100
337,9
342,5
473,7
546,6
TOTAL
100
113,5
131,6
224,9
257,2
FONTE: Adaptado de Fonseca (2005)
O comércio mundial de produtos orgânicos entre os países do Sul-Norte caracteriza-se
pela predominância do Sul como exportador de matéria-prima orgânica certificada. Por outro
lado, no comércio Norte-Norte são transacionados produtos de maior valor agregado. Dois
fatores podem ter estimulado a concentração da demanda dos consumidores nos países de
alta renda. Primeiro, o prêmio no preço dos produtos orgânicos é menos restritivo de
demanda para países onde os consumidores têm alto poder de compra. Segundo, o maior
acesso à informação pelos consumidores naqueles países em relação às questões ligadas à
produção e comercialização agrícola favorece o maior consumo de produtos orgânicos
devido a fatores como segurança alimentar, preocupações ambientais e razões de saúde
(SAHOTA, 2005, p.22-23).
O crescimento acentuado no volume de área orgânica certificada na Comunidade
Européia a partir de 1991 de mais de 3 milhões de hectares até 2000 coincide com a
implantação de sua regulamentação (EC 2092/91) (WILLER; YUSSEFI, 2002). Embora sejam
muito importantes para explicar esse crescimento, o estabelecimento do marco regulatório e o
apoio à certificação não foram os únicos elementos dinamizadores deste processo, como
será visto mais adiante. Outras políticas (pesquisa, extensão, assistência técnica,
capacitação, comercialização e informação aos consumidores), públicas e privadas, também
explicam o crescimento da produção, da comercialização e do consumo.
Em relação ao cenário e à dinâmica dos mercados de produtos da agricultura
orgânica, incluindo a evolução da produção e dos tipos de produtos certificados, bem como
76
do comércio, verifica-se que existe uma complementaridade de oferta e oportunidades para
os países menos desenvolvidos. Na produção, cada vez mais as grandes áreas certificadas
de pastagens se destacam, o que fez com que, desde 2000, a Austrália e a Argentina
assumissem a liderança no mundo em termos de áreas certificadas (primeiro e segundo
lugares, respectivamente, desde 2001). Mais recentemente, Brasil e Uruguai aumentaram as
áreas dedicadas à produção animal sob manejo orgânico (maioria de pastagens extensivas),
estando hoje entre os 10 países com maior área orgânica certificada no mundo (WILLER e
YUSSEFI, 2005).
Em relação ao tipo de produtor, apesar de ter se iniciado em pequenas unidades de
produção, somente nos sistemas de produção orgânicos da Europa e da Ásia ainda podemos
dizer que é característico da pequena produção, com pouca quantidade média de área por
unidade certificada. Diferentemente, por exemplo, da Argentina, onde 5% dos produtores,
em 2003, detinham 98% das áreas certificadas eram de produção de pecuária extensiva.
Já quanto à área sob manejo orgânico certificada na América Latina e Caribe,
destacam-se, em termos de crescimento, a Argentina, o Brasil, o Uruguai e o Chile, como se
observa na tabela 3.3.
TABELA 3.3 - EVOLUÇÃO DA ÁREA SOB MANEJO ORGÂNICO COM PRODUÇÃO
CERTIFICADA NA AMÉRICA LATINA E CARIBE - 2000/2004
ÁREA COM PRODUÇÃO
PAÍS
CERTIFICADA (ha)
2000
Argentina
CRESCIMENTO (%)
2004
169.200
2.960.000
Belize
-
1.810
1.649
-
Bolívia
35.720
364.100
919
Brasil
50.000
841.769
1.583
Chile
15.450
285.268
1.746
Colômbia
44.583
33.000
(26)
Costa Rica
2.860
13.967
388
Cuba
6.686
10.445
56
República Dominicana
3.910
14.963
283
El Salvador
1.564
4.900
213
Equador
8.129
60.000
638
Guatemala
4.512
14.746
127
Guiana
-
109
-
Honduras
-
1.769
-
Jamaica
-
1.332
-
50.133
215.843
330
Nicarágua
7.384
10.750
46
Panamá
2.135
5.111
139
Paraguai
23.975
91.414
281
Peru
12.000
130.246
985
181
México
Suriname
Trinidad Tobago
Uruguai
Venezuela
TOTAL
89
250
133
-
-
14.824
760.000
4.127
21.870
-
-
475.157
5.821.792
1.125
FONTE: Fonseca (2005), baseada em Willer e Yussefi (2000; 2004)
77
As políticas públicas, principalmente, tiveram um papel decisivo no desenvolvimento
da agricultura orgânica nos países europeu, americano e japonês. Já a iniciativa privada apóia a
produção quando há especificidade e carência da matéria-prima no mercado global, bem como
aos produtores, para cobrir os custos da certificação de um produto específico.
Mesmo com todo esse apoio, tem diminuído o número de unidades de produção
orgânica certificadas em alguns países da União Européia. As razões apresentadas para
isso podem ser de ordem estrutural, em função de o custo da certificação de produtos não ser
compatível com a pequena produção agrícola, ou de ordem social, relacionadas à necessidade
de muitos registros e excesso de burocracia.
A respeito da certificação, Mutersbaugh (2004) observou que evidências estatísticas
e documentais de pesquisa em 29 organizações e 129 vilas engajadas na agricultura orgânica
certificada em Oaxaca, México (1998 a 2003), mostraram que a taxa de saída dos produtores
aumentou de um número insignificante, em 1998, para 12 e 14%, respectivamente, em 1999
e 2000. Entre 2000 e 2002 a situação melhorou, mas em 2002-2003 o número de famílias
que saíram superou de novo a marca dos 10%. Em parte, a situação no México reflete a
combinação de maiores exigências com relação às normas internacionais, o cancelamento
de programas de ONGs que custearam as despesas iniciais e a deterioração da situação
econômica da área rural mexicana.
Em países ainda em fase de estruturação da agricultura orgânica os processos de
regulamentação encontram-se em fase de implantação, pressionados pela necessidade de
cumprir as exigências para exportação, visando aos mercados consumidores já regulados.
Hoje há mais de 60 países no mundo com regulamentos técnicos para agricultura orgânica em
alguma fase de discussão ou implantação. Entretanto, a adoção de normas internacionais não
adaptadas à realidade de cada país (clima, estrutura social e econômica) leva à geração de
barreiras técnicas, pois tais normas prejudicam o desenvolvimento da produção e do mercado
interno nesses países. Vale lembrar que os países de baixa renda participam das negociações
internacionais no âmbito do Codex Alimentarius. Contudo, muitos governantes destes países
consideram ser melhor atender às normas internacionais sem muito questionar, por não
disporem de especialistas no tema ou por considerarem que é melhor, para seus países,
exportar, mesmo que se excluam agricultores não capacitados nesse processo de acesso a
mercados diferenciados como o dos produtos orgânicos (ITC, 2003b).
Em 1996, um relatório da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o
Comércio e Desenvolvimento) reconheceu o papel que a agricultura orgânica pode ter no
comércio, no melhoramento ambiental e no desenvolvimento social dos países de baixa renda,
embora expressasse algumas dúvidas sobre a viabilidade econômica e a exeqüibilidade técnica
(TWAROG; VOSSENAAR, 2003). Os objetivos das agências de desenvolvimento incluem: a
intensificação da segurança alimentar, o aumento da renda dos produtores e a interrupção
(ou reversão) da degradação ambiental, priorizando a maximização do uso dos recursos e
78
conhecimentos locais para atingir esses objetivos. Essas agências têm promovido ações no
sentido de incentivar e garantir o acesso dos agricultores familiares aos mercados locais. A
FAO, em 1999, incluiu a agricultura orgânica no seu programa de agricultura sustentável,
desenvolvendo um plano de médio prazo para traçar o perfil e apoiar o desenvolvimento dos
sistemas de agricultura orgânica (FAO, 2001).
Contudo, preocupações foram expressas pela UNCTAD no sentido de que as altas
taxas de crescimento da demanda por produtos orgânicos não sejam sustentáveis no longo
prazo, e que os objetivos dos governos europeus para o crescimento da produção podem não
ser realistas. Acredita-se que serão necessários maiores subsídios para atingir as metas
ambiciosas da União Européia. Pode haver um risco de saturação do mercado, embora isto
dependa dos preços dos produtos orgânicos certificados nos mercados (VOSSENAAR; JHA;
WYNEN, 2004).
Segundo dados da ITC, o mercado varejista mundial de alimentos e bebidas
orgânicos aumentou de US$ 10 bilhões de dólares, em 1997 (ITC, 1999), para 17,5 bilhões
em 2000, tendo sido estimado para 2003 entre US$ 23 e 25 bilhões, tendo por base a taxa
média de crescimento anual de cerca de 20%. Os mercados que mais cresceram nos dois
últimos anos foram do Reino Unido e dos EUA. Embora o mercado esteja crescendo a taxas
consideráveis (10 a 20% nos países de alta renda), indicando um enorme potencial, ainda é
pequena a fatia que os produtos orgânicos alcançam no market share total de vendas de
alimentos (1 a 3%, com destaque para Suíça e Dinamarca).
3.2
A INSERÇÃO DO BRASIL NO MERCADO DE PRODUTOS ORGÂNICOS: PRODUÇÃO
E PROGRAMAS INSTITUCIONAIS
As informações sobre a produção da agricultura orgânica no Brasil são ainda
relativamente escassas, encontrando-se dispersas nos arquivos de organizações certificadoras,
associações de agricultores e ONGs. Não existe controle sistemático dos dados por parte de
nenhum órgão federal. Em alguns estados esse controle está se iniciando, através das
secretarias estaduais de agricultura, com destaque para o Estado do Paraná, que há seis
anos realiza anualmente esse levantamento, embora, como já se evidenciou, as informações
sejam ainda escassas e necessitem de uma metodologia mais apurada de coleta e tratamento
de dados.
Segundo o IBD (Instituto Biodinâmico), a produção orgânica no Brasil, com um
crescimento estimado em 30% ao ano, ocupa atualmente 6,5 milhões de hectares de terras,
compostas por área de produção agrícola e área de extrativismo, colocando o País na
segunda posição dentre os maiores produtores mundiais de orgânicos. O número de
propriedades orgânicas saltou de 14.866, em 2003, para 19.003, em 2004, sendo que, destas,
pelo menos 80% são de agricultores familiares.
79
O ritmo de crescimento da produção orgânica certificada no Brasil vem sendo
limitado por vários problemas, desde aqueles já mencionados, como a regularidade e disponibilidade na oferta de produtos, como a organização dos diferentes mercados, acrescida da
necessidade de políticas de estímulo à conversão e à produção. Desde as primeiras
experiências de cunho prático com a agricultura orgânica no Brasil, na década de 1970 até
1995, quando os produtos orgânicos, além de estarem no mercado da venda direta,
passaram a entrar no mercado do varejo, principalmente por meio das grandes redes de
supermercados em São Paulo (em 1996 no Rio de Janeiro, e em 1997 em Curitiba), o seu
desenvolvimento ainda se apresenta lento, quando comparado ao dos demais produtos do
mercado agroalimentar (DAROLT, 2000).
A agricultura orgânica, que era praticada quase que exclusivamente por agricultores
familiares, hoje está na pauta, também, da agricultura patronal, em grandes propriedades.
Contudo, como já se evidenciou, a agricultura familiar, além de ter sido pioneira na produção
orgânica, apresenta vantagens em sua adoção, seja pela sua característica de diversificação,
pela gestão dos sistemas produtivos agrícolas e agroflorestais, ou pelo conhecimento
acumulado sobre os ecossistemas onde atua. Um dos fatores que indicam o crescimento do
número de unidades orgânicas no Brasil (cerca de 10 vezes maior), tendo a agricultura familiar
como protagonista, parece ter uma relação direta com a prática da certificação em grupo,
conhecida como participativa, a exemplo daquela desenvolvida pela Rede Ecovida54.
O governo brasileiro tem adotado, muito recentemente, estratégias para promover
a agricultura orgânica, articulando-a a processos de desenvolvimento rural. O Ministério da
Agricultura, junto com governos locais e regionais, ONGs e associações de classe, tem
promovido atividades visando estimular e desenvolver a agricultura orgânica. Dentre tais
iniciativas destaca-se a atuação de alguns estados (Paraná, Rio Grande do Sul, Santa
Catarina e Rio de Janeiro) onde as agências oficiais de extensão rural têm atuado de
maneira mais enfática.
Os recursos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para o setor
de produção de orgânicos atingiram cerca de R$ 2 milhões em 2005. De acordo com o
Plano Agrícola e Pecuário 2006/2007, serão alocados R$ 10 bilhões para a agricultura familiar
na safra de 2006-2007, ante R$ 9 bilhões na safra passada. No entanto, o documento não
especifica quanto será gasto exclusivamente com a agricultura orgânica.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) lançou o Programa Nacional de
Apoio à Agricultura de Base Ecológica nas Unidades Familiares de Produção (Programa
Nacional de Agroecologia) em 2005, cujo objetivo é fortalecer as iniciativas realizadas pela
agricultura familiar, criando condições de estímulo à transição da produção tradicional para
54 Ver item 2.2 deste trabalho.
80
modelos sustentáveis, por meio da implementação de políticas, programas e projetos da
Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), em parceria com os Ministérios do Meio Ambiente,
Agricultura e Ciência e Tecnologia.
Já o Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica – Pró-Orgânico, lançado
em 2004, busca apoiar e fortalecer a produção, o processamento e a comercialização de
produtos orgânicos, bem como estimular o crescimento deste segmento. O Pró-Orgânico é
composto por um conjunto articulado de ações do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, em parceria com entidades do setor público e privado. Essas ações visam
ao desenvolvimento e à capacitação organizacional e tecnológica, ao aprimoramento e
adequação de marcos regulatórios, à promoção e fomento à produção e à comercialização
de produtos orgânicos.
Outro esforço é o Projeto Orgânics Brasil, lançado em julho de 2005, que visa
promover a exportação dos produtos orgânicos e tem um grande potencial para o desenvolvimento
da agricultura orgânica no País. É uma iniciativa da APEX-Brasil (Agência de Promoção de
Exportações do Brasil) e da FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), sendo o
IPD (Instituto Paraná de Desenvolvimento) o órgão proponente e gestor do projeto.
A Embrapa Agrobiologia vem apoiando pesquisas em agricultura orgânica. Sob
sua coordenação, são 135 pesquisadores de 15 centros de pesquisa da Instituição, que se
organizaram num projeto em rede nacional em que parcerias locais e regionais foram
estabelecidas com diversas instituições.
Quanto ao financiamento, vale dizer que o acesso ao crédito oficial está condicionado
à obtenção de certificação orgânica junto a uma certificadora. A Resolução 2.879, de 08/08/01,
do Banco Central do Brasil, determinou o recebimento de tratamento prioritário para o financiamento
de projetos que contemplem a produção agroecológica ou orgânica, conduzidos por produtores
que se enquadrem no grupo C do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF). Este grupo inclui agricultores familiares com renda anual entre R$ 1,5 mil e
R$ 10 mil. O crédito é concedido por três bancos: Banco do Brasil, Banco do Nordeste e BNDES.
O Banco do Brasil utiliza todas as suas linhas de crédito convencional à agricultura
e opera, em especial, um plano denominado programa BB Agricultura Orgânica. Seu plano de
financiamento para a agricultura orgânica foi instituído com base nos recursos do PRONAF e
do Programa de Geração de Emprego e Renda (PROGER). O plano inclui convênios de
integração rural, crédito para a agricultura familiar, cédula de comercialização para o
produtor rural, leilão eletrônico com as bolsas de alimentos do País, e parceiros com
empresas do agronegócio.
O Banco do Nordeste possui dois programas de financiamento para agricultores
orgânicos, o FNE Verde – Financiamento à conservação e controle do meio ambiente, que
utiliza o Fundo Constitucional do Nordeste e impõe limite ao crédito de acordo com o porte do
empreendimento, e o Programa de Desenvolvimento da Agropecuária Orgânica do Nordeste.
81
O BNDES oferece financiamento através de suas linhas tradicionais, como FINAME -
Agrícola (financiamento de máquinas e equipamentos) e BNDES - Automático, além do Prosolo
(Programa de Recuperação de Solos), que financia adubação "verde".
Por meio do Pronaf Agroecologia, o governo fornece pequenos empréstimos para
a agricultura familiar visando facilitar-lhe a conversão da produção convencional para a
orgânica, ou seja, oferece suporte financeiro na fase de transição para a produção
agroecológica. Nesse programa, a mesma unidade de produção pode ter até dois créditos
consecutivos, desde que pelo menos uma prestação tenha sido paga e com laudo de
regularidade. Além disso, o Pronaf prevê o custeio de até R$ 4.500,00 (com juros de 4% ao
ano e desconto de R$ 200,00, para pagamento em dia), desde que a proposta seja para a
produção agroecológica e projetos em transição para a agroecologia.
Porém, diferentemente de outros países, o Brasil não possui nenhum tipo de
subsídio para a atividade. O governo tem assumido basicamente dois papéis no que tange à
agricultura orgânica no País. De um lado, tem atuado na regulamentação do mercado, por
meio da criação de normas específicas a ele aplicadas; de outro, atua no financiamento à
agricultura orgânica através de concessão de linhas de crédito, devendo-se lembrar que
nem sempre os agricultores familiares que já têm história na atividade têm tido oportunidade
de acessar o crédito.
Existem também iniciativas de crédito "informal", ainda raras no Brasil, não
condicionadas a uma instituição financeira propriamente dita, mas originadas em arranjos da
sociedade civil, que tenta contribuir na resolução do problema de financiamento da produção
orgânica, principalmente para a conversão. Um exemplo é a Agricultura Motivada pelo
Consumidor (AMC), ou Community Supported Agriculture, que teve origem na Europa e hoje
se espalha por vários países. No Ceará há o exemplo da ADAO (Associação para o
Desenvolvimento da Agricultura Orgânica), que produz para 330 famílias. Os consumidores
têm participação ativa nesse processo, pois são eles que financiam a produção dos
agricultores e planejam a produção conjuntamente (ALCÂNTARA; SOUZA, 2005).
Na Região Sul do Brasil foi criada, há mais de uma década, a Cooperativa de
Crédito Rural com Interação Solidária (CRESOL), um sistema de crédito desenvolvido de
acordo com a realidade e as necessidades dos agricultores familiares, que apresentam, na
maioria das vezes, dificuldades históricas de acesso ao crédito oficial, devido às exigências
de garantias.55
A CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) executa o PAA (Programa de
Aquisição de Alimentos), como parte do Programa Fome Zero, do Ministério do Desenvolvimento
55 Para maiores informações, ver Conselho Estadual de Agroecologia Orgânica do Paraná (2002).
82
Social. Nele tem sido incentivada a produção de orgânicos por meio da compra de produtos
da agricultura familiar. Para isso, a CONAB possui uma linha especial de compras de produtos
oriundos da agricultura familiar para produtos agroecológicos ou orgânicos, desde que seja
atestada a origem do produto por entidade credenciada ou publicamente aceita como apta.
Aos produtores são pagos até 30% a mais por um produto agroecológico ou orgânico.
O conjunto das informações apresentadas permite afirmar que o Brasil ainda não
dispõe de ações programáticas e ordenadas para a agricultura orgânica. Constata-se isto
quando se verifica que há várias iniciativas que se encontram dispersas em diferentes
programas, desenvolvidas por diferentes ministérios. Tal situação indica a necessidade de
políticas mais contundentes e melhor orquestradas, evitando sobreposições e permitindo
que se vislumbre um efetivo desenvolvimento da agricultura orgânica no País.
3.3
A PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ
As informações relativas à agricultura orgânica no Paraná são provenientes da
consolidação dos dados da safra 2004/2005, que totalizam os números para o Estado a
partir do levantamento elaborado pela SEAB e Instituto EMATER. Entretanto, para poder
apresentar a produção regionalizada, foram utilizados os dados disponíveis, referentes à
safra 2003/2004. Cabe lembrar que este estudo considerou cinco grandes regiões,
agregando as mesorregiões geográficas do IBGE (1989), conforme está detalhado na Parte 1,
item 1.2, deste trabalho, que explicita os procedimentos metodológicos.
O quadro 3.1 mostra as Grandes Regiões, as Mesorregiões Geográficas e as
Regionais do Instituto EMATER consideradas neste estudo.
QUADRO 3.1 - GRANDES REGIÕES, MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS DO PARANÁ E REGIONAIS DA EMATER-PR
GRANDES REGIÕES
(1)
MESORREGIÕES GEOGRÁFICAS
REGIONAIS DA EMATER-PR
Metropolitana e Litoral
Metropolitana de Curitiba
Oeste
Oeste
Cascavel e Toledo
Sudoeste
Sudoeste
Francisco Beltrão e Pato Branco
Norte e Noroeste
Centro-Sul
Curitiba e Paranaguá
Noroeste
Paranavaí e Umuarama
Centro-Ocidental
Campo Mourão
Norte Central
Apucarana, Ivaiporã, Londrina e Maringá
Norte Pioneiro
Cornélio Procópio e Jacarezinho
Centro-Oriental
Ponta Grossa
Centro-Sul
Guarapuava
Sudeste
União da Vitória e Irati
FONTES: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR; IBGE (1989); SEAB/PR
(1) Grandes regiões consideradas neste estudo.
83
Segundo os dados da SEAB/PR e do Instituto EMATER, o Paraná tem
aproximadamente 4 mil produtores envolvidos na produção orgânica.56 Mais de um quarto dos
produtores, cerca de 1.200, tem como principal cultura o grupo das hortaliças; a maioria dos
estabelecimentos é formada por agricultores familiares que cultivam orgânicos em propriedades
cuja área média não ultrapassa três hectares.
No sentido de mostrar os resultados da produção, área e número de produtores
dos principais produtos orgânicos do Paraná, buscaram-se os dados das duas últimas safras
(2003/2004 e 2004/2005), que são apresentados na tabela 3.4.
TABELA 3.4 - PRODUÇÃO ORGÂNICA NO PARANÁ - SAFRAS 2003/2004 E 2004/2005
SAFRA 2003/2004
PRODUTOS
SAFRA 2004/2005
o
o
Área
Produção
N. de
Área
Produção
N. de
(ha)
(t)
Produtores
(ha)
(t)
Produtores
Soja
Milho
4.523
9.295
625
3.586
5.772
500
812
2.848
374
1.229
3.518
308
Trigo
300
494
75
72
103
30
Feijão
521
674
298
343
485
323
Arroz
522
3.072
34
565
2.562
113
Café
983
473
181
1.102
934
164
Mandioca
401
8.721
151
1.105
20.787
376
Frutas
994
7.752
582
940
8.071
647
1.048
12.244
962
1.231
14.633
1.208
Hortaliças
Plantas medicinais
269
419
182
322
609
244
Cana (açúcar mascavo)
471
19.486
217
407
13.095
172
89
-
23
178
6.630
93
248
663
51
372
648
68
Fumo
38
55
22
42
70
24
Girassol
18
30
3
1
1
1
0
1
1
22
28
50
Cana (cachaça)
Erva-mate
Amendoim
Algodão
TOTAL
15
30
8
12
25
10
11.250
66.256
3.789
11.530
77.971
4.331
FONTES: SEAB, EMATER
Os dados da tabela permitem destacar algumas questões com relação aos
produtos que se seguem:
- soja: houve um decréscimo nas três variáveis consideradas, mesmo sendo este
produto bastante procurado no mercado internacional (Estados Unidos, Europa e
Japão), e mesmo com preço 35% a mais que o convencional. A menor produção
56 Os dados referentes ao número de produtores apresentados pela SEAB/PR e EMATER/PR mostram problemas
de consolidação, uma vez que se percebeu, no decorrer da pesquisa de campo, que na maior parte das vezes o
mesmo produtor é contabilizado mais de uma vez, a partir dos diferentes cultivos existentes no estabelecimento.
Desta forma, não é possível considerar o número total de produtores para o Estado, embora se tome como
verossímil a informação relativa ao número de produtores para cada produto, a área e a produção.
84
em relação à safra anterior deve-se principalmente às condições climáticas
desfavoráveis, notadamente a estiagem, nas regiões produtoras;
- café: a produção praticamente dobrou de uma safra para outra, em razão da
qualidade do produto produzido, do preço pago pelos países importadores
(Europa, Estados Unidos e Japão) de até 50% sobre o produto convencional e
por se tratar de um produto diferenciado para os produtores tradicionais, que
buscam novos mercados (em termos de preço, o café é mais estável se
comparado com os grãos convencionais);
- mandioca: foi o produto que mais cresceu em termos de produção (138,0%),
impulsionada também, a exemplo do café e da soja, pela procura do mercado
externo da fécula de mandioca (Estados Unidos, principalmente);
- plantas medicinais: é crescente o número de empresas, no Estado, que vêm
atuando na produção de chás por meio da produção em parceria com
produtores individuais, associações e cooperativas de produtores, com vistas a
atender ao mercado externo;
- açúcar mascavo: embora a área tenha decrescido pouco entre as safras, a
queda da produção foi mais acentuada devido ao longo período de estiagem
nas principais regiões produtoras. Ainda assim, trata-se de um produto bastante
valorizado pelos mercados interno e externo e de conhecimento tecnológico de
produção acessível aos produtores em geral;
- hortaliças: representaram o produto com maior número de produtores envolvidos,
tendo sido crescente em termos de área (19,5%). O mercado interno absorve a
totalidade da produção, seja através da venda in natura diretamente pelos
produtores (feiras) ou por meio de empresas que fazem o processamento
mínimo (supermercados).
No que se refere à quantidade da produção orgânica, os resultados da safra
2004/2005 indicam um total de quase 78 mil toneladas produzidas, numa área total de
11,5 mil hectares.
Com relação à produção animal, os dados da safra 2003/2004 da SEAB e
EMATER/PR destacam como principais produtos a produção de aves (frango de corte), com
31 mil cabeças ou 65 toneladas de carne, 2 milhões de litros de leite e 53 toneladas de
carne de suínos.
3.3.1
A Regionalização da Produção Orgânica no Paraná
A regionalização da produção orgânica no Paraná foi ordenada segundo as cinco
grandes regiões definidas para o trabalho, a partir dos dados da safra 2003/2004, para
produtos de origem vegetal e animal (os dados por Mesorregiões Geográficas e por regional
85
do Instituto EMATER encontram-se no Anexo 3. A caracterização de cada grande região
apresenta os dados segundo a produção dos principais produtos, considerando: número de
produtores, produção, área média, produção do Paraná, participação da grande região na
produção estadual.
Metropolitana de Curitiba e Litoral
Nesta grande região, a principal produção orgânica é a do grupo de hortaliças. As
áreas de cultivo concentram-se nos municípios do entorno de Curitiba, conhecido como
cinturão verde da metrópole. A participação deste grupo representa mais de 60% da
produção estadual e é produzida por mais de 400 agricultores familiares. Do mesmo modo, é
significativa a produção de frutas, a qual, entretanto, está mais concentrada no litoral,
representando 58% do total no Estado, sendo o cultivo da banana a produção de maior
destaque de frutífera. No litoral também é expressiva a produção de arroz, responsável por
1/3 da produção estadual (tabela 3.5).
Praticamente toda a produção da grande região é comercializada na cidade de
Curitiba. O mercado da venda direta é bastante expressivo, principalmente através das feiras
orgânicas, com produtos in natura e alguns produtos beneficiados e minimamente processados.
Há também a comercialização com supermercados, por meio de duas empresas que se
situam na região. E, em menor escala, os produtos são comercializados por meio da venda
direta com entrega de sacolas, abastecimento de algumas lojas e restaurantes.
TABELA 3.5 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA E LITORAL
DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004
PRINCIPAIS
NÚMERO DE
ÁREA MÉDIA
PRODUTOS
PRODUTORES
(ha)
PRODUÇÃO DA
PRODUÇÃO DO
GRANDE REGIÃO (t)
PARANÁ (t)
A
B
PARTICIPAÇÃO
DA GRANDE
REGIÃO/PARANÁ
B/A (%)
Hortaliças
411
1,4
7.844
12.244
Frutas
300
1,3
4.490
7.752
64,0
58,0
Arroz
15
33,3
3.000
9.295
32,2
55
1,0
2.640
19.486
13,5
1.131
1,9
19.377
66.256
29,2
Cana-de-açúcar
(açúcar mascavo)
TOTAL GERAL
FONTES: SEAB, EMATER
NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado.
Oeste
Nesta região a produção orgânica concentra-se em dois pólos situados nas cidades
de Cascavel e Toledo, os quais apresentam diversificação em termos de produtos cultivados,
embora a participação no total do Estado seja de apenas 8,7%. Os principais produtos são o
milho, que tem a maior participação estadual (21%), seguido da cana-de-açúcar, destinada à
86
produção de açúcar mascavo, e da soja (tabela 3.6). Na produção animal a região também se
diversifica, com a produção de aves (frango para corte), suínos, piscicultura e, principalmente,
com a produção de leite, com mais de 1,1 milhão de litros no ano de 2004, metade da produção
do Estado.
A comercialização dos produtos é praticada local e regionalmente, nas feiras e
supermercados.
TABELA 3.6 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO OESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004
PRINCIPAIS
NÚMERO DE
PRODUTOS
PRODUTORES
ÁREA MÉDIA (ha)
PRODUÇÃO DA
PRODUÇÃO
GRANDE REGIÃO (t)
DO PARANÁ (t)
A
B
PARTICIPAÇÃO
DA GRANDE
REGIÃO/PARANÁ
B/A (%)
Cana-de-açúcar
(açúcar mascavo)
32
1,6
2.366
19.486
Soja
66
8,7
1.123
9.295
12,0
Mandioca
18
3,0
904
8.721
10,3
Milho
69
2,3
607
2.848
21,3
Hortaliças
75
0,6
452
12.244
3,7
Frutas
35
0,5
132
7.752
1,7
366
2,8
5.799
66.256
8,7
TOTAL GERAL
12,1
FONTES: SEAB, EMATER
NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado.
Sudoeste
A grande região Sudoeste tem uma produção orgânica agrícola e pecuária bastante
diversificada, com alto grau de organização dos agricultores familiares, sendo que a produção é
comercializada em feiras, em equipamentos varejistas locais e regionais. A região é responsável
por 43% da soja orgânica produzida no Estado, sendo comercializada por empresas processadoras da região ou mesmo de fora, em geral para exportação. Além da soja, a região
participa com 1/5 da produção estadual de mandioca e milho (tabela 3.7).
TABELA 3.7 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO SUDOESTE DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004
PRINCIPAIS
PRODUTOS
Soja
NÚMERO DE
PRODUTORES
ÁREA MÉDIA
(ha)
PRODUÇÃO DA
GRANDE REGIÃO (t)
A
PRODUÇÃO DO
PARANÁ (t)
B
PARTICIPAÇÃO
DA GRANDE
REGIÃO/PARANÁ
B/A (%)
341
6,3
3.979
9.295
42,8
(açúcar mascavo)
46
1,2
2.520
19.486
12,9
Mandioca
38
2,2
1.770
8.721
20,2
Frutas
57
0,7
752
7.752
9,7
Hortaliças
119
0,6
577
12.244
4,7
Milho
107
1,4
551
2.848
19,3
TOTAL GERAL
741
3,6
10.290
66.256
15,5
Cana-de-açúcar
FONTES: SEAB, EMATER
NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado.
87
Quanto à produção animal, a região é a principal responsável pelo frango de
corte, representando 88% da produção estadual. São importantes também as produções de
leite e mel, embora com menor expressão.
Norte e Noroeste
Nesta grande região a cana-de-açúcar destinada à produção de açúcar mascavo
é o principal produto, seguida da mandioca, hortaliças, frutas, soja, milho e café (tabela 3.8).
Com menor expressão aparece a produção de outros grãos (trigo e feijão) e de erva-mate.
Na produção animal destaca-se a do leite, com 347 mil litros, e 145 toneladas de mel no ano
de 2004.
A produção do açúcar mascavo está mais concentrada na região do chamado
norte velho (região de Cornélio Procópio e Jacarezinho). Em geral a transformação ocorre
em grupos de pequenos produtores ou através de suas associações. A produção da mandioca
apresenta uma maior concentração no noroeste do Estado, sendo que o destino são as
fecularias para produção de fécula para atender ao mercado externo. A produção de frutas, por
sua vez, apresenta uma distribuição mais eqüitativa em toda a região, com leve concentração
no noroeste para a produção de acerola. No caso do café, são as regiões do norte velho e
novo as principais produtoras e, em menor proporção, a região do arenito (noroeste).
Pelos dados da tabela observa-se que a região é responsável por mais de 1/3 de
toda a produção orgânica do Estado, com participação expressiva na produção do café,
mandioca e cana-de-açúcar.
TABELA 3.8 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS
PRINCIPAIS PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO NORTE E NOROESTE DO PARANÁ SAFRA 2003/2004
PRINCIPAIS
NÚMERO DE
ÁREA MÉDIA
PRODUTOS
PRODUTORES
(ha)
PRODUÇÃO DA
PRODUÇÃO DO
GRANDE REGIÃO (t)
PARANÁ (t)
A
B
PARTICIPAÇÃO
DA GRANDE
REGIÃO/PARANÁ
B/A (%)
Cana-de-açúcar
(açúcar mascavo)
64
4,4
10.972
19.486
56,3
Mandioca
22
9,0
5.757
8.721
66,0
Hortaliças
227
1,0
2.406
12.244
19,6
Frutas
165
3,1
2.255
7.752
29,0
99
9,3
2.089
9.295
22,4
Milho
26
4,7
472
2.848
16,5
Café
152
6,0
428
473
90,4
TOTAL GERAL
853
4,0
24.826
66.256
37,4
Soja
FONTES: SEAB, EMATER
NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado.
88
Centro-Sul
Embora esta grande região participe com menos de 10% do total da produção
orgânica do Estado, em termos de produtos tem participação importante na produção de
grãos, principalmente do feijão orgânico, nas regiões de Guarapuava e Ponta Grossa, e do
trigo, nesta última região (tabela 3.9). No caso do feijão, é expressivo o número de produtores
da região, representando cerca de 1/3 do total de agricultores familiares do Estado. Do mesmo
modo, também é significativa a produção de erva-mate nas regiões de União da Vitória e
Guarapuava, onde o produto é beneficiado para consumo na forma de chás.
Dentre os produtos de origem animal a produção de mel merece destaque, com
46% da produção do Estado concentrada na região de Irati. Com menor representatividade
seguem as produções de frango para corte, suínos, peixe e leite.
TABELA 3.9 - NÚMERO DE PRODUTORES, PRODUÇÃO, ÁREA MÉDIA E PARTICIPAÇÃO DA PRODUÇÃO DOS PRINCIPAIS
PRODUTOS ORGÂNICOS DA GRANDE REGIÃO CENTRO-SUL DO PARANÁ - SAFRA 2003/2004
PRINCIPAIS
NÚMERO DE
ÁREA MÉDIA
PRODUTOS
PRODUTORES
(ha)
Soja
PRODUÇÃO DA
PRODUÇÃO DO
GRANDE REGIÃO (t)
PARANÁ (t)
A
B
PARTICIPAÇÃO
DA GRANDE
REGIÃO/PARANÁ
B/A (%)
69
11,5
1.954
9.295
21,0
5,0
Cana-de-açúcar
(açúcar mascavo)
20
1,3
988
19.486
Hortaliças
130
0,7
965
12.244
7,8
Milho
112
2,3
748
2.848
26,2
Feijão
72,8
200
2,0
491
674
Erva-mate
19
7,1
268
663
40,4
Trigo
22
5,5
234
494
47,3
698
2,8
6.191
66.256
9,3
TOTAL GERAL
FONTES: SEAB, EMATER
NOTA: Os valores totais referem-se ao total dos produtores da grande região e ao total da produção da grande região e do Estado.
Como se verifica, a produção orgânica do Paraná apresenta-se bastante
diversificada, abrangendo todo o seu território, com destaque para: soja, nas regiões oeste e
sudoeste; hortaliças, na região metropolitana de Curitiba; frutas, no litoral, norte e noroeste;
açúcar mascavo, no norte pioneiro; café, no norte; feijão, milho e plantas medicinais, na
região central; e erva-mate, na região centro-sul.
É expressiva também a produção de origem animal orgânica: na safra 2003/2004
foram mais de 2 milhões de litros de leite, 53 toneladas de carne suína e 65 toneladas de
carne de aves, sendo a região oeste a principal produtora, além do mel na região centro-sul
(União da Vitória). Verifica-se ainda o crescimento no número de produtores e na área de
cultivo a cada nova safra.
89
3.3.2
Instituições e Entidades Envolvidas com a Agricultura Orgânica no Paraná
Um dos propósitos deste item é identificar as instituições governamentais e entidades
não-governamentais que desempenham atividades ligadas ao desenvolvimento da agricultura
orgânica. Com base no levantamento de campo realizado e na coleta de informações por
telefone, internet e pesquisa bibliográfica, são apresentadas, nos quadros 3.2 a 3.6, as
principais entidades que compõem o cenário da agricultura orgânica do Estado.
O objetivo principal da organização desses dados é demonstrar a diversidade de
instituições e entidades envolvidas no processo, a partir das atividades, restrições e
problemas levantados.
Instituições governamentais
Nos últimos anos, o poder público em todos os níveis – federal, estadual e municipal –
tem tido participação importante no desenvolvimento da agricultura orgânica, por meio de
algumas ações, programas e políticas de incentivo ao desenvolvimento da agricultura familiar.
Os quadros 3.2, 3.3 e 3.4, a seguir, destacam essa participação.
Entidades não-governamentais
As entidades não-governamentais historicamente têm atuado de maneira mais
sistemática e direta junto aos agricultores familiares orgânicos do Paraná, conforme já se
registrou na Parte 2, item 2.2, deste trabalho. Os quadros 3.5 e 3.6 destacam as entidades
contatadas na pesquisa de campo, consideradas as mais representativas no Estado. Como
se poderá observar, a maior parte das atividades é direcionada a processos de organização
dos agricultores, de formação e capacitação, de assistência técnica, de apoio a demandas e
políticas públicas, bem como de apoio a processos de comercialização, particularmente
aqueles em que o agricultor encontra maior autonomia nas transações comerciais, como as
feiras, as entregas de sacola e o comércio justo nas transações com o mercado externo.
QUADRO 3.2 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS FEDERAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
INSTITUIÇÕES
ATIVIDADES
RESTRIÇÕES
- Apoio a projetos de implantação de sistemas de
- Falta de produção regular, qualificada e confiável
produção
- Estudo de mercado
- Pesquisa de extensão e capacitação
OPORTUNIDADES
Mercado potencial
- Falta de assistência técnica aos produtores
- Falta de pesquisa para o desenvolvimento da
agricultura orgânica
- Industrialização/transformação de produtos
agrícolas
Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA)
- Aquisição de bancas para feiras de produtos
orgânicos
- Projetos em parceria com entidades públicas e
privadas
- Construção do mercado permanente de
produtos orgânicos, com recursos do MDA Programa de Apoio a Projetos de Infra-estrutura
e Serviços em Territórios Rurais, bem como do
Estado e Prefeitura Municipal
- Projeto Cultivando Água Boa - apoio ao
desenvolvimento da agricultura orgânica na
região da Bacia Hidrográfica Paraná III
Itaipu Binacional
(30 municípios do oeste paranaense)
- Parcerias com entidades públicas, privadas e
ONGs
- Ausência de pesquisa na área da produção
(universidades e instituições de pesquisa)
- Falta de crédito específico para a agricultura
orgânica
- Ampliação do Programa de Compra Direta
- Programas instituídos pelos governos federal e
estadual para apoiar o desenvolvimento da
agricultura orgânica
- Falta de assistência técnica
- Preço elevado dos produtos em
estabelecimentos como supermercados
Realização do curso de Agroecologia pela
INCRA
Escola Técnica Federal do Paraná, com
recursos do PRONERA (Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária)
Comissão da Produção Orgânica
Instituída no Paraná em 2002, sua função é o
do Paraná (CEPOrg- PR),
credenciamento da certificação e aplicação da
vinculada ao Ministério da
Lei.
Preço elevado para o consumidor
- Aumento do consumo
- Várias entidades estão engajadas no
desenvolvimento da agricultura orgânica.
Agricultura, Pecuária e Pesca
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
90
QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
INSTITUIÇÕES
Secretaria de Estado da
Agricultura e do Abastecimento
(SEAB/DERAL)
ATIVIDADES
OPORTUNIDADES
- Elevado custo da certificação
- Falta de assistência técnica
- Dificuldades de comercialização
- Ausência de pesquisa
- Mercado em expansão
- Segurança alimentar - sustentabilidade
ambiental
- Estrutura fundiária (proporciona boa
rentabilidade em relação ao tamanho da área)
- Preocupação da população com a qualidade de
vida
- Atendimento a 2.000 produtores no ano de 2005
- Parcerias: SEBRAE, Instituto Maytenus
- Número de técnicos: 103 técnicos, que atuam
em tempo parcial, abrangendo 92 municípios
- Falta de definição de um programa
- Necessidade de tecnologia apropriada
- Falta de divulgação do produto orgânico
- Dificuldade de trabalhar de forma associativa
- Falta de formação/capacitação por parte dos
produtores
- Baixa qualidade dos produtos, em alguns casos
- Ausência de logística de distribuição
- A comercialização ainda é um dos entraves
para os produtores.
- Falta de técnicos especializados para atender
aos produtores
- Mercado promissor, principalmente nos grandes
centros urbanos
- Mercado institucional
- Existência de várias áreas de proteção
ambiental, onde só é permitido o
desenvolvimento de agricultura livre de
agrotóxicos e agroquímicos
- Planejamento para o período 2007/2010 - o
plano de ação prevê a capacitação de 56 novos
grupos de agricultores, em que cada grupo terá
entre 20 e 30 produtores
- Pesquisa agrícola
- Desenvolvimento rural
- Falta de quadro técnico de pesquisadores, de
pessoal de apoio
- Fraca integração de programas e projetos
institucionais
- Faltam estudos de mercado, logística,
comercialização e distribuição de produtos.
- Ausência de definição de uma política de
Estado para identificar competências regionais
para produtos orgânicos
- O mercado de varejo de massa (supermercados)
e de venda direta passou de potencial a
francamente real.
- O mercado institucional (merenda escolar,
compra direta) está definido por lei e não é
minimamente atendido.
- Há definição institucional para ações de apoio
ao desenvolvimento da atividade (CPRA,
Programa Agroecologia/IAPAR).
- Há método, estratégia e ações de
desenvolvimento da Pesquisa/ATER/ONGs,
com indicativos favoráveis à expansão das
ações/projetos.
91
- Levantamento e acompanhamento da conjuntura
da produção orgânica
- Projeto Paraná 12 Meses (1998-2005) financiamento de projetos, cursos, seminários,
capacitação, apoio a produtores através de
melhorias na propriedade, além de atividades
para o desenvolvimento da agricultura orgânica
no Paraná por meio de entidades como AOPA,
PUC, UEM e IAPAR
Instituto EMATER
Instituto Agronômico do Paraná
(IAPAR)
RESTRIÇÕES
QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
INSTITUIÇÕES
ATIVIDADES
- Geração de conhecimentos científicos e
tecnológicos através de pesquisa e validação
- Promoção da reinserção social aos reclusos da
- Pesquisa insuficiente e inadequada para a visão - Exigência de processos produtivos sustentáveis
Adauto Botelho
instituído pela Lei 14.980 de
28/12/2005
necessidade de melhoria da alimentação e
- Falta de assistência técnica
aos pacientes do Hospital Psiquiátrico Colônia
em Agroecologia (CPRA),
deficiente.
OPORTUNIDADES
- A população está cada vez mais consciente da
- Promoção de ações de ensino e extensão rural
Colônia Penal agrícola e terapia ocupacional
Centro Paranaense de Referência
RESTRIÇÕES
- A Legislação para produtos de origem animal é
- Produção de alimentos, plantas aromáticas,
condimentares e medicinais
- Produção de sementes, mudas, compostos,
biofertilizantes, coberturas mortas, adubos
ecológica
- Dificuldade ao acesso a insumos permitidos
- Produto com preço diferenciado
produtos veterinários)
- Múltiplos canais de comercialização (local,
- Apoio deficiente e insuficiente na fase de conversão
comercialização
do CPRA
- Ainda há desconhecimento, por parte dos
estabelecimento de parcerias com instituições
estadual, outros estados e externo)
- Necessidade de fortalecimento de canais de
- Falta capacitação em organização rural
do Parque Prof. Newton Freire Maia;
para preservação dos recursos naturais
- Crescente demanda por alimentos orgânicos
(sementes, mudas, fertilizantes, fitoterápicos e
verdes, húmus e insumos para sustentabilidade
- Apoio a ações em educação ambiental na área
qualidade de vida.
consumidores, das vantagens do alimento
orgânico.
- Elevado custo da certificação
públicas e privadas promotoras da agricultura
ecológica
Responsável pela administração de recursos
- A falta de certificação dificulta a rastreabilidade
Companhia de Desenvolvimento
financeiros do subcomponente implantação dos
- Falta ATER
Agropecuário do Paraná
módulos agroecológicos e fiscalização e
- Ausência de pesquisa
(CODAPAR)
acompanhamento do Projeto Paraná
- O mercado encontra-se em expansão, com a
crescente procura por produtos orgânicos.
- O preço diferenciado comparativamente ao
produto convencional é um dos motivadores ao
Biodiversidade
desenvolvimento da agricultura orgânica.
- Em Curitiba há o Mercado do Produtor,
- Irregularidade na oferta de produtos
- Mercado em expansão
destinado a permissionários e produtores, local
Centrais de Abastecimento do
Paraná S.A. (CEASA)
onde são comercializados produtos
agroecológicos
- Realização de Feira de Produtos Orgânicos e
Artesanato Rural, em Curitiba, aos sábados pela
o
manhã (com início no 2. semestre de 2006)
92
QUADRO 3.3 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS ESTADUAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
conclusão
INSTITUIÇÕES
ATIVIDADES
- TECPAR CERT - certificadora de produtos
orgânicos
RESTRIÇÕES
- Falta de regulamentação da Lei 10.831
orgânica em função de fatores como
confiabilidade dos empresários para investir no
sustentabilidade, oportunidade aos agricultores,
- Elevados preços dos produtos orgânicos, pois a
oferta é pequena e a demanda é grande.
- Falta fiscalização das certificadoras (sabe-se
(TECPAR)
- Desenvolvimento extraordinário da agricultura
(definição mais clara sobre o segmento e maior
setor)
Instituto de Tecnologia do Paraná
OPORTUNIDADES
que há aquelas que procuram obter clientes a
qualquer custo).
- É necessário que a certificação seja
reconhecida por outro organismo certificador
com o objetivo de diminuir a burocracia e o
retrabalho (para o reconhecimento da origem e
empresários, entidades públicas
- Construção do mercado fixo de orgânico em
Curitiba
- Ampliação das feiras verdes em Curitiba
- Existência de um órgão público atuando na
certificação
- Apoio de secretarias municipais de agricultura
ao desenvolvimento da agricultura orgânica
- Existência de um plano estadual de
desenvolvimento da agricultura orgânica
identidade dos produtos).
- Faltam técnicos capacitados para
acompanhamento e assessoria aos produtores
orgânicos.
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
93
QUADRO 3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
INSTITUIÇÕES
Prefeitura Municipal de Curitiba/
Secretaria Municipal de
Abastecimento (SMAB)
ATIVIDADES
RESTRIÇÕES
OPORTUNIDADES
- Feiras orgânicas - regulamentação e apoio
- Produção não profissional
- Há mercado potencial de 507 mil consumidores.
- Mercado Permanente de Orgânicos - área para
- Educação sanitária (garantia da qualidade do
- Dentre os entrevistados na pesquisa realizada
comercialização de produtos in natura,
produto)
restaurantes e locais para eventos
pela SMAB, 72% realizam compra semanal e
afirmaram que estão preocupados com a saúde.
- Parceria com entidades públicas, privadas e
- Diversificação de atividades para o produtor
ONGs
familiar, como o desenvolvimento da
agroindústria, lácteos, carnes e cosméticos.
- Diversificação de produtos e serviços.
- Apoio a feiras de produtores com barracas
exclusivas de produtos orgânicos identificados
por meio de banners
Prefeitura Municipal de Maringá
- Pequeno número de produtores
- Mercado em expansão
- A produção é pequena, dado o tamanho do
- Apoio ao produtor
mercado.
- Projeto de instalação de um Centro de
- Merenda escolar, pela segurança alimentar
- Difusão do alimento orgânico na Feira da
Referência em Agroecologia e Desenvolvimento
Agroindústria Familiar e Manualidades
Sustentável, nos moldes do CPRA
- Parceria com entidades públicas e ONGs
- Implantação de programa de inclusão com 420
famílias de pequenos agricultores
Prefeitura Municipal de São Roque
- Projeto de horta, apicultura e frutas
de Boa Ventura
- Disponibilização de 5 técnicos para atender aos
A produção é insuficiente para atender a todas
as escolas.
- A Prefeitura atende à rede municipal com
merenda escolar.
- Incentivo ao Programa de Semente Crioula
produtores rurais
- Parceria com o Instituto EMATER
- Apoio para realização de feiras (mista, com
produtos coloniais e orgânicos), com a
Prefeitura Municipal de Pato
Branco
- Falta de assistência técnica
Mercado em expansão
- Falta de informação ao consumidor
participação de uma agrônoma da Prefeitura de
Pato Branco
- Disponibilização de horas/máquina aos
produtores rurais
- Apoio a feiras (feiras mistas)
Prefeitura Municipal de
Borrazópolis
- Contratação de um agrônomo e um técnico
agrícola para desenvolver a agricultura orgânica
no município
94
QUADRO 3.4 - INSTITUIÇÕES PÚBLICAS MUNICIPAIS DE APOIO à AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
conclusão
INSTITUIÇÕES
ATIVIDADES
- Apoio à atividade com corpo técnico
especializado em agroecologia
RESTRIÇÕES
OPORTUNIDADES
A produção para merenda escolar é restrita a
A produção orgânica é um dos objetivos da
algumas escolas.
Prefeitura.
- Programa Sementeiro - resgate da semente
Prefeitura Municipal de Francisco
Beltrão
crioula
- Parceria com o Instituto EMATER para
capacitação de produtores
- Merenda escolar (escolas rurais com produção
orgânica)
- Atuação na área de formação e capacitação,
Prefeitura Municipal de Missal
Prefeitura Municipal de Santa
Terezinha de Itaipu
basicamente na produção de leite
- Falta de divulgação
- Mercado institucional favorável
- Baixa escala de produção
- Há demanda do mercado em geral.
- Parcerias com Instituto EMATER e ITAIPU
- Problemas técnicos na produção a campo
- Desenvolvimento de agricultura orgânica por 4
- Faltam técnicos
- Possibilidade de realizar projetos com a ITAIPU
- Dificuldade na comercialização
- O mercado regional é favorável (Foz do Iguaçu).
produtores
Prefeitura Municipal de Vera Cruz
- Parcerias com CAPA e ITAIPU
- Falta de um projeto regional
Possibilidade de realizar projetos com a ITAIPU.
do Oeste
- Oportunidade: mercado institucional favorável
- Faltam técnicos
O mercado regional é favorável (Foz do Iguaçu).
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
95
QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
ENTIDADES
Associação para o
Desenvolvimento da Agroecologia
(AOPA)
ATIVIDADES
RESTRIÇÕES
-
Falta de assistência técnica.
Falta de pesquisa.
Falta de crédito ao produtor.
A comercialização é um dos gargalos.
OPORTUNIDADES
- Mercado de orgânicos em expansão.
- O potencial de mercado pode ser viável ao
produtor familiar.
96
- Desenvolve trabalhos em agroecologia através
de três eixos: articulação políticointerinstitucional, processos de organização dos
agricultores e fortalecimento de sistemas
agroecológicos.
- Faz parte da Rede Ecovida, através do Núcleo
Maurício Burmester, que congrega municípios
da RMC e Litoral.
- Atualmente desenvolve os seguintes projetos:
ƒ Programa de Inclusão Social, financiado pela
TRIAS (entidade belga), com o objetivo de
inclusão de agricultores em risco de exclusão
social, nos municípios do Vale do Ribeira.
ƒ Projeto Florestando a Agricultura Familiar,
com o objetivo de recuperação de recursos
naturais a partir da agroecologia e agricultura
familiar, em 5 municípios da RMC, Vale do
Ribeira em PR e SP, com financiamento da
Petrobrás e em parceria com a CCA
(Cooperativa Central de Reforma Agrária do
Paraná Ltda), FETRAF/Sul-Cut (Federação dos
Trabalhadores da Agricultura Familiar do Sul
do Brasil), Embrapa Florestal (Centro Nacional
de Pesquisa em Florestas) e FNMA (Fundo
Nacional do Meio Ambiente).
ƒ Projeto Trilhares, com recursos do MMA/PDA visa desenvolver sistemas agroflorestais,
gerando referências de indicadores para
outras regiões, na região do Vale do Ribeira,
principalmente em Barra do Turvo/SP e
Adrianópolis/PR, em parceria com as
prefeituras, Cresol's, Parque Estadual do
Jacupiranga, entre outras.
- Entre 2004 e 2005, coordenou o Curso PósMédio de Agroecologia, realizado na Fazenda
Camguiri, campus da UFPR, voltada à formação
de agricultores e agricultoras do Paraná, através
da UFPR e DESER, com recursos do MDA.
QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
ENTIDADES
Rede Ecovida de Agroecologia
ATIVIDADES
RESTRIÇÕES
OPORTUNIDADES
- Através de grupos de pessoas, a Rede procura
organizar e consolidar a agricultura familiar.
- Atua nos três estados do Sul.
- Desenvolve iniciativas em agroecologia.
- Promove o desenvolvimento de associações.
- A população ainda não está esclarecida sobre
as diferenças entre produtos orgânicos/
agroecológicos e convencionais.
- Faltam pontos de venda (não aquele mercado
convencional, mas principalmente locais como
feiras etc.).
- Não há recursos financeiros para os agricultores
na fase de conversão.
- Os agricultores não conhecem o mercado.
- Falta relação com o consumidor.
- Há pouca organização por parte dos produtores.
- Falta apoio financeiro - PROAGRO, para
sementes crioulas.
- Falta experiência de ação conjunta
(associação).
- Falta apoio da pesquisa.
- Conscientização de parcela da população
quanto os benefícios de consumir produtos
orgânicos/agroecológicos.
- A preocupação das pessoas com relação à
saúde tem favorecido o desenvolvimento da
agricultura orgânica/agroecológica.
- Programa de Aquisição de Alimentos da
CONAB.
- Merenda escolar.
- Apoio a programas de fruticultura temperada.
- Políticas públicas para conversão.
- Formação de maior número de profissionais em
agroecologia.
- Intercâmbio entre grupos de agricultores.
- Articulação de ações de produção com
comercialização.
- Atua no Centro-Sul do Estado e também em
nível nacional.
- Visa à promoção do desenvolvimento da
agricultura, baseado na agroecologia e no
fortalecimento da agricultura familiar.
- Realiza cursos de formação e capacitação.
- Presta assistência técnica.
Assessoria e Serviços a Projetos
- Atua na organização da produção agroecológica.
em Agricultura Alternativa (ASPTA)
- Na região onde atua, atende diretamente a 40
grupos de produtores, com atendimento direto e
indireto a 500 famílias.
- Parceiros: IAPAR, UEL e EMBRAPA.
- É uma das entidades organizadoras das
Jornadas Paranaenses de Agroecologia.
- Participa da Rede Ecovida.
- São 380 associados no sudoeste paranaense.
- Em 2006, a prioridade é a formação de filhos de
agricultores, com enfoque em todas as
dimensões: cultural, produção e vida. É uma
formação de referência, envolvendo o produtor
no processo de construção.
Associação de Estudos,
- Parcerias: CAPA, DESER, Sindicatos de
Orientação e Assistência Rural
Trabalhadores, FETRAF, entidades de
(ASSESSOAR)
articulação (MST, Via Campesina, MAS, MPA,
MMC). Utiliza-se da Pedagogia da Terra para
Assentados - PRONERA.
- Participa da Rede Ecovida.
- Atualmente não presta assistência técnica aos
agricultores.
- Fortalecimento do mercado institucional.
- Falta crédito diferenciado.
- O modelo da produção orgânica poderá ser a
- Não há legislação própria para produção e
mudança da matriz tecnológica.
comercialização.
- É necessária maior infra-estrutura no meio rural. - Criação de alternativas de comercialização
(canais alternativos, mercado justo).
- Burocracia nos processos de licitação.
97
QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO à AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
ENTIDADES
ATIVIDADES
- Trabalha a produção e a comercialização de
forma associativa, solidária e agroecológica.
- Atua em oito municípios da região Oeste.
RESTRIÇÕES
- Irregularidade na produção.
- Falta de critério da classificação dos produtos
pelo mercado comprador.
OPORTUNIDADES
- A Associação é uma oportunidade de
comercialização para o produtor.
- Fortalecimento do Programa Fome Zero.
- Apoio à ACEMPRE - Associação Central dos
Produtores Rurais Agroecológicos - Mal.
Cândido Rondon, que comercializa produtos
(olerícolas, frutas e produtos de origem animal)
dos associados.
- Apoio à APAVE - Associação dos Produtores
Agroecológicos de Verê, que comercializa
Centro Paranaense de Apoio ao
produtos (hortaliças, frutas e produtos de
Pequeno Agricultor (CAPA) -
origem animal) dos produtores assistidos pelo
Marechal Cândido Rondon e Verê
CAPA.
- Incentivo ao agricultor para agroindustrializar os
produtos com o objetivo de agregar valor
(geléias, doces, biscoitos, queijos etc.).
- Parcerias: entidades públicas - municipal e
estadual, sindicatos, universidades, MDA, entre
outras.
- Participação na elaboração e execução de
políticas públicas voltadas ao desenvolvimento
rural.
- Participa da Rede Ecovida.
- Atua principalmente na região norte paranaense
e também na região oeste, em Comitês Gestores
de Agroecologia.
- Presta assistência técnica.
Fundação Mokiti Okada
- Na data da pesquisa, a instituição atendia a 15
famílias diretamente e a mais de 40 famílias de
forma indireta.
- Parcerias: IAPAR, SEBRAE, EMATER, CAPA e
Prefeituras.
- Falta capacitação ao produtor.
- O mercado para produtos orgânicos é grande.
- É necessário que a atuação do CPRA seja
- Há procura por alimentos sem produtos
descentralizada.
químicos.
- Falta conscientização do consumidor quanto
aos benefícios em consumir produtos
orgânicos/naturais.
- Necessidade de melhorar os preços pagos pelo
PAA.
- Não há apoio (crédito) ao agricultor no período
de conversão.
98
QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
ENTIDADES
ATIVIDADES
- Atua na região central paranaense, com o
objetivo de fortalecer a agricultura familiar,
assentados, sem-terra e categorias de
produtores como arrendatários e parceiros.
- Atua no desenvolvimento da produção agrícola,
gestão econômica, capacitação e formação de
recursos humanos, gestão participativa nos
grupos e comunidades.
Fundação RURECO
- Atua no desenvolvimento da olericultura, grãos,
frutas, plantas medicinais e mel junto aos
RESTRIÇÕES
- Necessidade de maior apoio para extensão
rural e assistência técnica.
- Necessidade de formação de profissionais -
OPORTUNIDADES
- Implantação do tema agroecologia no currículo
escolar.
- Fortalecimento do sistema ATER.
inclusão, no currículo, dos cursos técnicos e
superior de agronomia, com enfoque à
agroecologia.
- Necessidade de organização da produção e
comercialização.
- Necessidade de incentivar o produtor a agregar
valor aos produtos (agroindustrialização).
agricultores.
- Trabalha em cooperação com organismos
internacionais, com entidades como FUNBIOMDA-SAF_SDT e UNICENTRO.
- Os agricultores comercializam seus produtos em
feiras, mercado institucional, supermercados,
CERCOPA, lojas, sacolas e na propriedade.
- Participa da Rede Ecovida.
- Atua na região central do Estado,
principalmente no município de Turvo, na
- Necessidade de pesquisa.
Mercado em crescimento.
- Necessidade de crédito.
preservação das florestas.
- Presta serviços de assistência técnica,
planejamento da produção, comercialização,
Instituto Agroflorestal Bernardo
Hakvoort (IAF)
certificação e processamento dos produtos.
- Atende a 80 famílias de agricultores, que
trabalham basicamente com plantas medicinais.
- Mantém parceria com a Fundação RURECO.
- Os recursos para desenvolver as atividades são
provenientes de cooperação internacional e
organismos nacionais.
- Participa da Rede Ecovida.
99
QUADRO 3.5 - ENTIDADES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
conclusão
ENTIDADES
ATIVIDADES
- Atua na formação e capacitação e na
assistência técnica.
Instituto Os Guardiões da Natureza
(ING)
- Auxilia os agricultores na comercialização.
RESTRIÇÕES
- Falta assistência técnica.
OPORTUNIDADES
O mercado para produtos orgânicos é grande.
- Falta pesquisa para o desenvolvimento da
agricultura orgânica.
- Realiza estudos e projetos com recursos de
entidades ligadas ao desenvolvimento da
biodiversidade.
- Participa da Rede Ecovida.
- Atua em nível regional.
- No município de Turvo, atende a 11 grupos
compostos por 4 a 5 famílias que desenvolvem
a fruticultura. Em Irati, atua com oito grupos que
exploram a olericultura, fruticultura e grãos.
Instituto Equipe de Educadores
Populares (IEEP)
- Atua nas áreas de formação, capacitação e
gestão para agroindústria com base no método
- Preferência, por parte do consumidor final,
- Capacitação de agricultores através do "Método
pelos produtos convencionais, em função do
de Educação Popular" (troca de experiências
padrão de apresentação destes.
entre grupos, a lógica do mercado é solidária e
não-mercantil).
- Incentivo à agroindustrialização.
- Apoio à organização de grupos de
consumidores.
de educação popular.
- A comercialização dos produtos é realizada
através da associação AGAECO, com
orientação dos técnicos do Instituto.
- Participa da Rede Ecovida.
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
100
QUADRO 3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
continua
ENTIDADES
ATIVIDADES
PROJETO ORGANICS BRASIL -
- Atua em nível nacional.
entidade ligada à Agência de
- Aproximação dos potenciais mercados
Promoção de Exportação e
Investimento (APEX), do Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior
SEBRAE-PR
RESTRIÇÕES
- Faltam produtos.
- Mercado interno e externo de orgânicos em
crescimento.
compradores e vendedores.
- Há demanda do mercado internacional por
- Presta serviço de organização de feiras
frutas tropicais.
internacionais, realizando o trabalho de
logística.
- Atua no desenvolvimento da agricultura orgânica
desde 2000, com participação no Projeto
PROCAXIAS.
- Realizou vários eventos sobre agricultura orgânica
- Com a coordenação da entidade, criou-se o
Comitê Estadual de Agricultura Orgânica, para,
entre outras atividades, capacitar técnicos e
agricultores.
- Faltam estudos de mercado.
- Estabelece e fomenta as relações de parcerias
- Problemas de acesso a mercados (regularidade
- Tendência de crescimento do mercado.
- Falta capacitação em gestão e gerência.
- Falta logística de distribuição de produtos.
- Falta assistência técnica.
- Falta pesquisa na área de produção.
- Em função do momento difícil pelo qual
tanto com a organização da agricultura familiar
de vários produtos, falta de organização de
atravessa a agricultura (estiagem, alta dos
como com instituições públicas e privadas.
entidades de agricultores).
preços dos insumos, queda nos preços dos
- Orienta e monitora o produtor e realiza o
controle e avaliação dos projetos financiados.
- Sistema bancário elitizado e pouco capilarizado
produtos agrícolas, endividamento pelos
para ações locais em nível do crédito
modelos de financiamento tradicionais), a
agroecológico.
agricultura orgânica seria fundamental para a
- Necessidade de serviço de ATER efetivo para a
agroecologia. A ATER estatal ocupa-se de
Cooperativa Central Cresol Baser
OPORTUNIDADES
sustentabilidade desses agricultores.
- Necessidade de aproximar os financiamentos às
programas governamentais (está engessada
propostas agroecológicas. Alguns avanços na
com outras funções, como, por exemplo,
área do crédito já são vistos, apresentando bons
efetivar o Pronaf em muitos municípios).
resultados.
- A ATER não-governamental possui pouca
- Organização dos segmentos sociais, a exemplo
estrutura (humana e de infra-estrutura).
das cooperativas e associações de pequenos
- Aspectos tecnológicos, principalmente
relacionados à penosidade do trabalho (a
agricultura convencional tem larga vantagem,
produtores na área da produção e
comercialização.
- Os mercados consumidores estão consolidando
comparada à agroecológica). Faltam pesquisas
a necessidade de produtos saudáveis, embora
e tecnologias que potencializem trabalhos e
nas pequenas cidades isto seja mais difícil.
101
produtos no sistema agroecológico.
QUADRO 3.6 - OUTRAS ENTIDADES DE APOIO À AGRICULTURA ORGÂNICA NO PARANÁ - 2006
conclusão
ENTIDADES
PROCAXIAS - Localizado em
ATIVIDADE
- Principais produtos desenvolvidos - plantas
Quedas do Iguaçu, foi implantado
medicinais, banana-passa, soja, hortaliças e
em 1999, através de uma
frutas.
associação de municípios da
tem prestado serviço visando ao
Jorge d'Oeste, Capitão Leônidas
desenvolvimento agroecológico e ambiental e à
Cruzeiro do Iguaçu, Boa Vista
d'Aparecida, Boa Esperança, Nova
OPORTUNIDADES
- Falta assistência técnica.
- Mercado de orgânicos em crescimento.
- Falta crédito para os agricultores.
- Venda através do PAA.
- Na área do assentamento a ONG WWF-Brasil
região centro-sul paranaense: São
Marques, Três Barras do Paraná,
RESTRIÇÕES
capacitação técnica de produtores.
- Tem recebido apoio institucional de prefeituras
e do SEBRAE.
Prata do Iguaçu, Salto do Lontra e
Quedas do Iguaçu
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
102
103
4
MERCADOS E AGENTES DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS
NO PARANÁ
Nesta quarta parte do estudo são apresentados os resultados relativos à pesquisa de
campo, com o objetivo de caracterizar os agentes atualmente envolvidos diretamente nos
processos de comercialização, procedendo a uma descrição de como se organizam os três
principais tipos de mercado dos produtos orgânicos pesquisados: o da venda direta, do
varejo e da transformação. Também apresentam-se, de forma geral, algumas informações
relativas aos dois outros tipos de mercado de orgânicos existentes no Paraná, o externo e o
institucional, ressalvando-se que estes últimos não tiveram o mesmo tratamento e aprofundamento que os anteriores.
A seguir explicita-se o entendimento sobre cada um dos tipos de mercado que
comercializam produtos orgânicos no Paraná:
a) mercado da venda direta: predominam como agentes o agricultor/produtor e o
próprio consumidor, os quais estabelecem uma relação face a face no processo
de comercialização, situação típica em feiras livres, entrega de sacola e venda
direta na propriedade;
b) mercado do varejo: os principais agentes são os equipamentos do varejo –
redes de hiper e supermercados, supermercados locais e regionais, lojas
especializadas e outros –, as empresas de transformação e distribuição de
produtos orgânicos, os agricultores individuais e as associações de agricultores;
c)
mercado de transformação: os principais agentes são as empresas de
transformação – processadoras e beneficiadoras –, os agricultores como
fornecedores de matéria-prima, e os demais tipos de mercado onde os
produtos são comercializados, seja no varejo, na relação face a face ou no
mercado externo. Aqui também têm papel importante associações e/ou
cooperativas de agricultores que atuam na transformação de alimentos;
d) mercado externo: é voltado para a exportação, em que estão envolvidos como
agentes empresas comerciais que atuam segundo demandas preestabelecidas
por compradores externos, e os agricultores, direta ou indiretamente, através
de entidades representativas;
e) mercado institucional: os agentes envolvidos são instituições governamentais,
desde as federais às municipais, bem como organizações de agricultores.
A seguir tem-se o mapa 2, que situa os agentes de comercialização pesquisados no
Paraná.
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105
4.1
O MERCADO DA VENDA DIRETA: AS FEIRAS
O mercado da venda direta de produtos orgânicos no Paraná, concebido como o
ambiente de relações face a face entre o agricultor e o consumidor final, tem como principais
canais de comercialização as feiras livres e a venda direta pelos agricultores familiares.
A partir dos resultados da pesquisa de campo, aborda-se a atuação dos atores envolvidos
no processo e apontam-se algumas restrições e oportunidades identificadas. Para efeito da
pesquisa de campo, visitou-se uma feira em cada uma das cinco grandes regiões, situada
nos seguintes municípios: Curitiba, Francisco Beltrão, Borrazópolis, Maringá e União da Vitória.
4.1.1
Feiras: Um Canal em Expansão
Com base nos dados coletados na pesquisa de campo elaborou-se uma tipologia
das feiras de orgânicos no Estado do Paraná considerando dois aspectos principais: modo
de estruturação e funcionamento. Em todas as feiras predomina a comercialização dos produtos
pelos próprios agricultores familiares produtores de orgânicos. Contudo, as diferenças podem
ser explicadas por um conjunto de fatores que envolvem forma de produção, processo de
certificação, organização dos produtores, fatores socioculturais e apoio institucional (municipal,
estadual e federal). Nesse sentido, três tipos de situações foram observadas: as feiras orgânicas,
as agroecológicas e as mistas (orgânicas e convencionais).
As feiras orgânicas são caracterizadas pela presença de produtores certificados,
que comercializam produtos in natura e processados no próprio estabelecimento ou de
terceiros também certificados, seguindo as normas da Lei 10.83157. A barraca e a
propriedade recebem o selo de certificação, com validade de um ano, que pode ser por
auditagem ou participativa.58
Este tipo de feira é característico de municípios com maior número de habitantes, a
exemplo de Curitiba, que atualmente conta com seis locais de comercialização na cidade.
O quadro 4.1 mostra que esse tipo de feira tende a se estabelecer em capitais e
municípios de maior porte, como já acontece em outros estados do País. Dos seis locais de
feiras orgânicas em Curitiba, quatro foram abertos nos últimos cinco anos. Entretanto, a
análise do contexto das feiras livres, quanto à representatividade e abrangência, mostra que
o número de pontos de feiras orgânicas ainda é pequeno em relação às feiras convencionais,
que contabilizam 40 pontos de vendas em 75 bairros da cidade. Vale lembrar que todos os
pontos funcionam em bairros de maior poder aquisitivo no centro da cidade e entorno.
57 A Lei 10.831 estabelece normas para produção, processamento, transporte e comercialização de produtos orgânicos.
58 A diferenciação nos formas de certificação são discutidas neste trabalho na Parte 2, item 2.2, que trata da
institucionalização da agricultura orgânica.
106
QUADRO 4.1 - LOCAL, ESTRUTURA, DIA DE FUNCIONAMENTO E DATA DE ABERTURA DAS FEIRAS ORGÂNICAS
EM CURITIBA - PARANÁ - 2006
(1)
LOCAL/BAIRRO
NÚMERO DE
BARRACAS
(2)
DIA DA
SEMANA/PERÍODO
DATA DE ABERTURA
Passeio Público - Centro
22
Sábado de manhã
18/03/1995
Campina do Siqueira - Champagnat
10
Terça-feira de manhã
13/01/1998
Jardim Botânico
07
Sábado de manhã
27/01/2001
03 (orgânicas)
Quarta-feira de manhã
30/09/2003
Praça do Expedicionário - Centro
08
Quarta-feira de manhã
20/10/2004
Praça do Japão - Batel
12
Quinta-feira à tarde
20/02/2005
Emater (Mista) - Cabral
FONTES: SMAB, ACOPA
(1) Segundo a Prefeitura Municipal, outros dois pontos de feira devem ser abertos: no Cabral, às quintas-feiras, e na Praça
da Ucrânia, no bairro Champagnat, aos sábados pela manhã.
(2) Há repetição de produtores nos locais de venda. Alguns permissionários atendem a dois pontos de venda. São
comercializados 67 itens nas diferentes feiras, entre produtos in natura (a maioria deles) e processados.
A feira orgânica de Curitiba, conhecida inicialmente como "Feira Verde", foi inaugurada
em 1989, com uma barraca junto à feira de artesanato no Largo da Ordem, na Rua Jaime Reis,
ao lado da Sociedade Garibaldi. Foi criada oficialmente em 06/06/1993, com oito barracas, e
depois transferida para o Passeio Público, em 18/03/1995, com 10 barracas. Em 2005, este
espaço de comercialização passou a ser denominado "Feiras Orgânicas"59.
Segundo dados da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento (SMAB)
de Curitiba, em 2006 foram contabilizados 39 permissionários nos seis locais de feiras orgânicas, sendo 34 produtores certificados e 5 distribuidores, que trabalham com revenda de
produtos certificados.
Os dados de acompanhamento da comercialização mostram que o consumo nas
feiras orgânicas passou de 156 toneladas/ano, em 1997, para 470 toneladas/ano, em 2005,
segundo informações obtidas junto à Secretaria Municipal do Abastecimento de Curitiba. No
gráfico 4.1, a seguir, observa-se que o incremento maior na comercialização ocorreu entre 2000
e 2001, mantendo-se relativamente estável nos anos seguintes. Alguns fatores contribuíram
para o aumento nas vendas das feiras orgânicas, como a frustração das associações na
comercialização com os supermercados, a abertura de novos pontos de feira, a expansão
do número de agricultores e de barracas nas feiras, acrescidos da maior divulgação a
respeito dos produtos na mídia. Nesse mesmo período ocorreu também a fundação da
Associação de Consumidores de Produtos Orgânicos do Paraná (ACOPA)60, que tem como
um de seus objetivos a divulgação da agricultura orgânica.
59 Ver item 2.2, Parte 2, deste estudo, que aborda a institucionalização da agricultura orgânica no Paraná.
60 A ACOPA foi fundada em 15 de julho de 2000 com o objetivo de aproximar agricultor e consumidor, e apoiar o
consumo responsável e o mercado justo e solidário. Possui uma barraca na feira do Passeio Público para divulgar e
apoiar a abertura de novos pontos de venda de orgânicos na cidade, estimulando o consumo consciente.
107
O crescimento indica uma mudança de comportamento e de decisão políticoeconômica das associações de produtores em relação à escolha de canais para comercialização
de orgânicos. Estudo realizado por Darolt (2002a) mostrou que, no período de 1998 a 2001,
as associações de agricultores tiveram como importante estratégia de comercialização a
venda de produtos para algumas redes de supermercados, tanto as regionais como outras
fora do Estado do Paraná. Naquele período verificou-se um crescimento na demanda por
orgânicos 35% superior à oferta. Retomando o quadro 4.1, constata-se que, no período,
Curitiba contava com apenas dois pontos de feiras, que permaneceram com um crescimento
pequeno no volume de vendas até 2001 (ver gráfico 4.1).
Essa fórmula de comercialização via supermercado mostrou-se insustentável para
as associações de produtores, havendo um desgaste na imagem dos alimentos orgânicos
por parte da população. Pesquisa de Darolt, acompanhando cerca de 40 produtos orgânicos
comercializados basicamente via supermercado, mostrou que, do valor total (100%) deixado
no caixa pelo consumidor, 30% em média foi destinado ao agricultor, 33% para cobrir os custos
dos distribuidores com classificação, embalagem, transporte e pessoal, e o restante (37%)
ficou com os supermercados. Ademais, os descartes nas gôndolas de supermercados eram
assumidos integralmente pelas associações, o que aumentava a margem dos supermercados
e encarecia demasiadamente o produto final para o consumidor.
O quadro atual mostra uma tendência diferenciada, em que empresas orgânicas
integradas assumem a negociação com as redes de supermercados e as associações operam
em circuitos mais curtos, fortalecendo as feiras e o pequeno varejo. Outra tendência para os
grandes centros, que se dará em Curitiba em breve, é a abertura de Mercados Públicos
Fixos de Orgânicos. A idéia inicial é estruturar um espaço para comercialização tanto de produtos
in natura quanto de orgânicos industrializados, não só do Paraná mas também de outros
108
estados brasileiros e mesmo de outros países. Encontrar a equação ideal entre a participação
das associações de agricultores e as empresas nesse empreendimento será um desafio
para todos os envolvidos no processo. Para diminuir a margem de erro, o apoio institucional
da Prefeitura Municipal tem sido decisivo, realizando pesquisas com os consumidores, os
produtores e os distribuidores. Tomando como base o Mercado Municipal de produtos
convencionais, a tendência é de que os produtos in natura e processados, provenientes da
região, sejam comercializados pelas associações, enquanto produtos orgânicos processados
de outras regiões e países seja tarefa das empresas.
Em relação à divulgação, o estudo de campo mostra que não existe uma estratégia
de marketing que permita aos consumidores diferenciarem a feira orgânica de uma feira
convencional, por exemplo. Apesar de a feira orgânica apresentar barracas diferenciadas
(confeccionadas em bambu) e o selo de certificação (pouco reconhecido pelos consumidores),
as informações ainda são insuficientes para sensibilizar a grande massa de consumidores
em potencial, o que faz com que o aumento do número de clientes seja gradual, ocorrendo
principalmente na forma de comunicação direta (boca-a-boca).
Em pesquisa recente, Kirchner (2006) observou que a média de público que passa
pela maior feira orgânica do Estado, a do Passeio Público, é similar à média da feira
convencional, cerca de 600 pessoas/feira, com pico entre 10 e 12 horas. A pesquisa revelou
também que o perfil do público em feiras orgânicas e convencionais também é semelhante,
formado por profissionais liberais e funcionários públicos com famílias de 3 a 4 membros,
nível de renda entre 9 e 12 salários mínimos e instrução superior. É interessante observar que os
consumidores de produtos convencionais mostram-se motivados a adquirir produtos orgânicos,
porém consideram como entraves o preço alto e a dificuldade de encontrá-los. Muitos
consumidores desconhecem o local da feira orgânica próximo à residência, bem como as
diferenças entre as feiras orgânicas e as convencionais.
Um dos motivos principais para o baixo consumo dos orgânicos está relacionado aos
altos preços destes. Nesse sentido, o tipo de canal tem influência preponderante. O gráfico
4.2 mostra uma comparação de preços, para uma cesta de 13 produtos hortifrutigranjeiros,
entre a feira convencional e a orgânica. Os resultados indicam uma similaridade em relação
ao preço e qualidade dos produtos. Assim, pode-se concluir que o fator preço, normalmente
apontado como motivo para o não-consumo de orgânicos, não é relevante neste tipo de
canal – as feiras – para uma mudança de atitude do consumidor.
109
Por outro lado, quando se comparam os preços dos orgânicos nas feiras e supermercados, as diferenças são muito significativas, apontando uma variação superior a 100% (gráfico
4.3). Como a maior parte das pessoas freqüenta os supermercados, a imagem predominante
é a de que os produtos orgânicos são caros, difíceis de encontrar e destinados à população
com alto poder aquisitivo.
Quanto à origem dos produtos, a maior parte das hortaliças e frutas in natura
encontradas na feira orgânica é proveniente de produção própria e colhida num raio que varia
entre 30 e 100 km do local dos estabelecimentos dos agricultores familiares. Alguns produtos
processados, com destaque para sucos de frutas e geléias, são provenientes de outras
regiões e também de outros estados, como Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo.
110
Entre as dificuldades apontadas pelos agricultores orgânicos cabe citar a falta de
assistência técnica continuada, dificuldade de acesso ao crédito para financiamento da produção
e comercialização, logística, transporte das mercadorias, falta de divulgação para os consumidores e poucos locais de venda. Alguns produtores comercializam em dois pontos de
feiras, além de fazerem entrega em domicílio e restaurantes e venderem no próprio local de
produção. A atividade de comercialização restringe o tempo dispensado à produção,
levando à necessidade de contratação temporária de pessoal, nem sempre qualificado para
a produção de orgânicos.
Para melhorar a comercialização, os feirantes trocam produtos entre si e com grupos
de outras regiões visando aumentar a oferta de suas barracas. Possuem também um acordo
para uma política de preços, que equipara o preço da maioria dos 67 itens comercializados,
privilegiando a cooperação e minimizando a concorrência entre eles.
O segundo tipo de mercado de produtos orgânicos identificado na pesquisa são
as feiras agroecológicas, que se caracterizam por comercializarem produtos certificados e
não certificados. Os produtos não certificados são considerados coloniais e/ou artesanais.
Essas feiras ocorrem principalmente em municípios de menor porte no interior do Estado,
sobretudo nas regiões Centro-Sul, Sudoeste e Oeste do Paraná. A maioria dos produtos
também é produzida na região pelos próprios agricultores, grupos ou associações. No caso
dos produtos in natura, como hortaliças e frutas, a forma de produção costuma seguir as
normas da agricultura orgânica. Entretanto, para alguns alimentos processados produzidos
de forma artesanal, utilizam-se insumos convencionais no processo (por exemplo, pão
produzido com farinha de trigo convencional e fermento em pó químico, frango alternativo
tratado com ração convencional, queijo produzido com leite convencional).
Observou-se que esse tipo de feira caracteriza-se, em muitos casos, pela existência
de uma barraca, gerenciada por um agricultor responsável que representa um grupo de 3 a 7
agricultores. Esta situação foi verificada nas regiões Centro-Sul, Sudoeste e Oeste, em municípios
de pequeno porte. Esses espaços de comercialização aproximam-se muito do que podemos
chamar de comércio justo e solidário, pois estimulam a diversificação da produção vegetal e
animal, além de possibilitar o acesso ao alimento agroecológico para a maior parte da população.
Os preços são similares aos dos produtos convencionais e bastante acessíveis, apresentando
uma diferença acentuada com relação às feiras orgânicas dos grandes centros. O público é
diversificado, incluindo praticamente todas as classes sociais.
Os agricultores estão organizados em grupos ou associações e a certificação
predominante é a participativa, por meio da Rede Ecovida. Outra forma de certificação é a que
garante que o agricultor está de acordo com as Normas da Agricultura Orgânica (Garantia
de Conformidade). Neste caso, como acontece em União da Vitória, as propriedades
recebem a certificação através da Secretaria da Agricultura Municipal, podendo usar um selo de
qualidade que permite comercializar os produtos agroecológicos em feiras e estabelecimentos
do município e região.
111
O terceiro tipo de feira encontrado na pesquisa é a feira mista, que possui barracas
de venda de produtos certificados (orgânicos e/ou agroecológicos) e produtos convencionais e
hidropônicos (com uso de agrotóxicos e adubos químicos). Este tipo de feira ocorre no Paraná
em cidades-pólo, como Maringá. A estrutura e o funcionamento das barracas orgânicas seguem
as mesmas regras da feira convencional, ocupando uma pequena parte (de 10% a 15%) em
relação ao total de barracas. A diferenciação básica se dá por meio de cartazes e faixas, que
identificam as barracas como certificadas. Os preços praticados apresentam uma pequena
diferença em relação aos dos similares convencionais, cerca de 5 a 10% superiores.
Em termos de divulgação, esse formato acaba por confundir ainda mais o consumidor,
por nivelar os produtos orgânicos com os convencionais e hidropônicos. Outro ponto a ser
observado é que, nos grandes centros, parte dos produtos convencionais é proveniente das
Centrais de Abastecimento Atacadistas (CEASAs), fazendo o agricultor mais o papel de
intermediário do que de produtor. Neste caso, a maior parte dos produtos é proveniente de
outros estados, com destaque para São Paulo, que possui o maior centro atacadista da América
Latina, distribuindo para as regiões Norte e Oeste do Paraná, além de Curitiba. Ressalte-se que
esta concorrência acaba prejudicando os produtores orgânicos.
Segundo os agricultores entrevistados as dificuldades estão relacionadas, sobretudo,
à falta de assistência técnica na produção, e de assistência administrativa na comercialização, o
que resulta na pouca diversidade de produtos oferecidos. No caso de Maringá, as 13 barracas
de orgânicos acabam ofertando os mesmos tipos de produtos, destacando-se alface, almeirão,
rúcula e cenoura, evidenciando uma falta de planejamento conjunto da produção. Os dados da
pesquisa mostram uma aparente contradição. Se por um lado a demanda dos consumidores
aumenta, há pouco interesse por parte de novos agricultores de se inserirem no processo, o
que pode ser explicado pela gestão inadequada do processo e pela falta de apoio para a
diminuição dos riscos inerentes à fase de conversão.
A pesquisa identificou ainda outras dinâmicas de comercialização de orgânicos, como
a entrega de cestas em domicílio, restaurantes e pequenos varejos, e o mercado ambulante,
que circula com veículo identificado (em bairros de Marechal Cândido Rondon, por exemplo).
Outras oportunidades têm surgido com as vendas institucionais para merenda escolar e
instituições públicas.
Além do trabalho dos próprios agricultores familiares e de suas entidades de
apoio, o que se verificou é que o apoio institucional tem sido decisivo, situação que ficou
evidente em alguns municípios do Oeste do Paraná.
No quadro 4.2, a seguir, apresentam-se algumas características do mercado face
a face, destacando-se as feiras, a entrega em domicílio e a venda direta, apontando-se
também algumas oportunidades e restrições identificadas.
QUADRO 4.2 - MERCADO DA VENDA DIRETA DE PRODUTOS ORGÂNICOS (FEIRAS, ENTREGA EM DOMICÍLIO E VENDA NA PROPRIEDADE) - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES E
RESTRIÇÕES - PARANÁ -2006
MERCADO FACE A FACE
CARACTERÍSTICAS
- Barraca apropriada e diferenciada (por exemplo,
bambu), desmontável ou móvel
- Certificação da propriedade e dos produtos
comercializados
- Preparação do local, em termos de divulgação,
Feiras Orgânicas
considerando a clientela que se deseja atingir
- Respeito à regulamentação sanitária (sobretudo
OPORTUNIDADES
RESTRIÇÕES
- Contato direto com o consumidor
- Deslocamentos e horários fixos
- Divulgação do trabalho e da filosofia
- Desconforto, sobretudo no inverno e em
orgânicos
locais abertos
- Pagamento à vista
- Pouco tempo disponível para a produção
- Abertura de novos pontos de venda
- Exigências sanitárias (principalmente os
- Formação de clientela
- Direito ao local, formação de "ponto"
quanto aos produtos de origem animal)
produtos de origem animal)
- Necessidade de grande diversificação de
produtos
- Respeito aos horários de funcionamento
- Necessidade de pessoas com sensibilidade para
lidar com o público
Deslocamentos regulares ao encontro do
consumidor
- Conhecimento com antecedência mínima
dos produtos a comercializar
- Regularidade no sistema de produção
- Possibilidade de contato na casa do
consumidor
Entrega em Domicílio
- Pouca flexibilidade de horários
- Número insuficiente de entregas para
compensar o deslocamento
- Dificuldade de criar, manter e renovar a
clientela
- Venda de toda a mercadoria
- Falta de tempo para a produção
- Maior margem líquida de comercialização
- Necessidade de grande diversificação de
- Recebimento do dinheiro à vista ou no curto
produtos para atender aos pedidos
prazo
- Formação de clientela fiel
- Recepção de grupos em épocas determinadas
ou com horário marcado
- Respeito aos horários para abertura e
Venda na Propriedade
Sistema "Colha-e-Pague", com prova
e degustação
fechamento do ponto de venda
- A colheita é realizada pelos próprios
consumidores
- Exigência de proximidade com a clientela e de
fácil acesso
- A publicidade e a sinalização são indispensáveis
- Permite sensibilizar os turistas e
consumidores
- Valorização do tempo pelo custo do produto
degustado
- Permite a elaboração de uma lista de
visitantes para encaminhamento de produtos
- Não há custos diretos de colheita
- Possibilidade de diversificação, visando
tornar a clientela fiel
- Necessidade de pelo menos duas pessoas:
uma delas para acompanhar as visitas e a
outra para a degustação e venda
- Maior logística, sobretudo nos finais de
semana (estacionamento, acesso,
banheiros, sinalização)
- Abertura obrigatória nos finais de semana,
feriados e férias
- Perdas de produtos por pisoteio
- Baixo rendimento com grupos escolares
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
112
113
4.1.2
Algumas Considerações sobre o Mercado da Venda Direta
O mercado da venda direta de produtos orgânicos é o mais antigo do Paraná.
O processo de construção desse mercado iniciou-se na primeira metade da década de 1980,
quando predominava a comercialização através da entrega de sacolas, tanto entre agricultores
e consumidores individuais, como entre grupos/associações de agricultores e grupos de
consumidores. Embora esta forma ainda exista em várias cidades do Estado, o que predomina
atualmente são as feiras de produtos orgânicos.
A primeira iniciativa ocorreu no final dos anos 80, na cidade de Curitiba, quando
foi inaugurada a "Feira Verde", oficializada como uma feira específica em meados de 1990.
É na cidade de Curitiba que está o maior número de feiras.
Constatou-se, pela pesquisa, que as feiras do mercado da venda direta podem ser
consideradas a partir de três tipos: as feiras orgânicas, as feiras agroecológicas e as feiras
mistas. O que diferencia os dois primeiros tipos é a existência ou não da comercialização de
produtos com certificação, seja ela por auditagem ou certificação participativa. No primeiro
caso, todas os produtores e as barracas exibem um selo de certificação. No caso das feiras
agroecológicas os produtos podem exibir ou não um selo de certificação, sendo que a
principal garantia de procedência é dada pela própria relação de confiança estabelecida
entre o agricultor e o consumidor no momento da compra.
As feiras mistas são aquelas que originariamente comercializavam somente produtos
convencionais e, com o passar do tempo, foram agregando barracas que comercializam
produtos orgânicos, sejam eles certificados com selo ou tenham a garantia do produtor.
Os três tipos de feira estão espalhados por vários municípios do Estado do Paraná.
Na capital, Curitiba, o tipo que predomina é a feira orgânica, que exibe a certificação em
cada uma das barracas. Em Curitiba também se encontra o maior número de feiras –
atualmente são seis –, situadas em bairros distintos da cidade, funcionando em dias e
horários diversos.
Nas cidades menores do interior do Estado predominam as feiras agroecológicas.
O que possibilita esta condição é o fato de o agricultor e o consumidor viverem próximos
física e socialmente, o que muitas vezes dispensa a certificação.
As feiras mistas, por sua vez, também ocorrem no interior, predominando, contudo,
nas cidades de porte médio, como Maringá, seja pelo ainda limitado número de produtores e
de produção como também pelo número de consumidores, o que inviabiliza a existência de
uma feira única de orgânicos.
As feiras comercializam principalmente produtos in natura do grupo das hortaliças,
mas também ofertam grãos, produtos de lavoura temporária, frutas e produtos transformados,
desde os beneficiados aos processados. De um modo geral uma barraca oferece mais de 20
itens, cuja produção é dos próprios agricultores responsáveis pelas barracas ou do grupo de
114
agricultores a eles ligados. Alguns produtos são trazidos de outras regiões do Estado e também
dos demais estados do sul do País. Entretanto, em sua expressiva maioria são originários
da produção de agricultores familiares individuais ou de organizações de agricultores.
Para o presente estudo, uma das principais características a ser consideradas é
que neste mercado as transações comerciais são estabelecidas mediante a relação face a
face entre o produtor e o consumidor. Em todos os tipos de feiras mencionados são os próprios
agricultores familiares os comerciantes dos produtos orgânicos, e, como já se mencionou,
uma mesma barraca pode oferecer produtos de uma única família de agricultor ou reunir a
produção de mais de uma família e mesmo de um grupo de agricultores familiares.
Esse tipo de mercado oportuniza, de um lado, que o consumidor tenha um maior
conhecimento sobre os produtos que está comprando, o que de certa forma amplia sua
compreensão de que, para além do produto, há um processo que envolve o sistema de
produção, e, do lado do agricultor, há a oportunidade de desenvolver habilidades no âmbito
das transações comerciais, o que certamente contribui para a apreensão do mercado como
um ambiente fundado em relações sociais.
4.2
O MERCADO DO VAREJO: OS SUPERMERCADOS E AS LOJAS
As recentes pesquisas relativas à comercialização de produtos orgânicos têm
enfatizado a relevância do mercado do varejo na quantidade de venda dos produtos. Esta
afirmativa decorre do fato de a maioria dos estudos ter sido realizada na Região Sudeste do
Brasil, na qual concentram-se a maior parte da população urbana e as maiores redes de
super e hipermercados, que representam as estruturas de abastecimento hegemônicas no
mercado agroalimentar nas últimas décadas.
Uma pesquisa realizada nessa região (ALCÂNTARA; SOUZA, 2005) mostrou que
"as grandes redes de varejo concentram atualmente 80% da oferta de hortícolas orgânicas
ao consumidor final, no Estado de São Paulo, e 73% da oferta no Estado do Rio de Janeiro".
E identificou, na estrutura desse mercado, as principais formas de aquisição de produtos
orgânicos, sendo que a última é a que vem se consolidando. São elas:
- compras com base única e exclusivamente no preço;
- obtenção dos produtos por produção própria (integração vertical);
- aquisição por meio de formas intermediárias entre a integração vertical e a
compra em "alianças estratégicas" ou por contratos, formais ou não.
O presente estudo identificou que esse último formato também predomina na cidade
de Curitiba, cujas características de abastecimento assemelham-se àquelas dos grandes
centros urbanos da Região Sudeste do País. Como se mostra a seguir, as grandes redes da
capital só transacionam com fornecedores já estruturados empresarialmente, os quais mantêm
115
relações de integração vertical e/ou horizontal, denominadas parcerias, com os agricultores
familiares de orgânicos.
Nas demais regiões do Estado o mercado do varejo é bastante incipiente. Quando
existe a comercialização de orgânicos o que se verifica é que os fornecedores são de menor
porte, ofertando tanto produtos convencionais como orgânicos, com produção própria, às
vezes integrados com outros produtores, cujas transações se dão na maioria das vezes
mediante contratos informais.
Os dados da pesquisa sobre o mercado do varejo no Paraná são apresentados
a seguir, abordando-se inicialmente as características que este mercado adquire nos
supermercados e, em seguida, nos equipamentos do varejo de menor porte, como lojas
e restaurantes.
4.2.1
Os Supermercados e a Comercialização de Produtos Orgânicos
A comercialização de produtos orgânicos pelos supermercados no Paraná tornou-
se mais significativa a partir dos últimos cinco anos, e está concentrada praticamente na
cidade de Curitiba. Antes de 2000 ocorreram as primeiras iniciativas, estabelecidas em
associações de agricultores e gerentes de setor de FLV (frutas, legumes e verduras) de
determinadas lojas de redes de supermercado regionais. A produção em maior escala, a
definição de alguns itens de logística – acondicionamento, regularidade da entrega –, as
formas de contratação (prazos de pagamento, consignação, devolução etc.) estavam se
estruturando, num processo de construção deste mercado para os orgânicos.
Atualmente é na capital que a atividade está de fato estruturada e onde a
comercialização de orgânicos teve um impulso definido e sustentado. Este processo iniciou-se
entre os anos de 1995 e 1997, com a criação da Associação de Agricultura Orgânica do
Paraná - AOPA61, por agricultores familiares, técnicos e consumidores de produtos orgânicos
da região metropolitana de Curitiba. As primeiras iniciativas de comercialização com
supermercados não foram no Estado do Paraná, mas sim na cidade de São Paulo, através
de uma empresa paulista, com lojas da rede Carrefour e Pão de Açúcar. Em 1997 a AOPA
estabeleceu uma parceria com a Associação de Pequenos Agricultores de Colombo (APAC),
61 A AOPA foi criada em 1995 tendo como um de seus objetivos viabilizar processos de comercialização da
produção de orgânicos para os agricultores a ela associados. A comercialização de alguns agricultores já ocorria
no mercado face a face, na Feira Verde e na entrega de sacolas, mas o objetivo da Associação era encontrar
novos canais a fim de dar vazão à produção que crescia em volume à medida que se ampliava o número de
novos agricultores. A primeira iniciativa da AOPA na relação com supermercados ocorreu fora do Paraná, em
1996, resultando de uma parceria com uma empresa paulista, fornecedora de produtos orgânicos no mercado
varejista de São Paulo, atendendo lojas do Carrefour e da rede Pão de Açúcar. Frustrados nesta primeira
iniciativa, voltaram, em 1998, a estabelecer nova parceria com outra empresa, Sítio "A Boa Terra", para também
entregar produtos às redes de supermercados (KARAM, 2001, p.123-130).
116
do município de Colombo, na RMC, e transferiu sua sede junto a esta entidade, que passava
por dificuldades de manutenção.
Embora a APAC e seus agricultores já comercializassem a produção de hortaliças
com algumas redes de supermercados da cidade de Curitiba, foi a AOPA que desencadeou
as negociações com os supermercados para comercialização de produtos orgânicos na
RMC, através das gerências de FLV. Em 1997 começaram a ser atendidas quatro lojas da
rede Mercadorama de Curitiba. Em 1998 a relação comercial ampliou-se para 12 lojas, e em
1999 este número cresceu para 16 lojas de supermercados que ofertam produtos orgânicos
em Curitiba, sendo a maioria da rede Mercadorama (KARAM, 2001, p.128-129).
Cabe destacar que os agricultores familiares envolvidos não se restringiam somente
àqueles situados nos municípios da RMC, mas também participaram deste processo grupos
de agricultores associados à AOPA da região centro-sul do Estado (principalmente União da
Vitória e entorno, Palmeira, Irati, São João do Triunfo, Lapa, entre outros).
Ao mesmo tempo em que a AOPA acompanhava tecnicamente a produção orgânica,
para atender ao mercado varejista foi necessário montar e organizar toda uma estrutura de
recebimento, seleção, embalagem dos produtos, bem como a logística de distribuição às
lojas dos supermercados. Os dois principais embates, na época, eram a dificuldade em
efetivar o planejamento da produção, garantindo a produção demandada pelas lojas, e arcar
com o processo de devolução dos produtos não comercializados pelos supermercados, que
tratavam os produtos orgânicos nos mesmos termos da relação contratual com os
fornecedores de hortaliças convencionais.
Entre 2000 e 2001, a relação entre a associação e os supermercados, já bastante
tensionada, chega no limite, e os agricultores, em assembléia, decidem desistir de se relacionar
por meio da AOPA com os supermercados. As razões que levaram à decisão passavam pelas
novas relações contratuais impostas pelo grupo Sonae, como aquisição do espaço, devolução
integral, taxa sobre cada produto cadastrado, e, a mais perversa, o pagamento à Associação
passou a ser feito mensalmente, chegando a ocorrer, porém, 120 dias após a entrega
dos produtos.62
A partir desse período as relações entre os fornecedores e os supermercados
passaram a ocorrer nos moldes que predominam no mercado agroalimentar, tendo, de um
lado, os próprios equipamentos, e, de outro, empresas estruturadas para tal fim. A exceção
ficou por conta de algumas lojas de supermercados locais e regionais, que permaneceram
62 A AOPA, após ter deliberado pelo fim da relação com os supermercados, transferiu sua sede para Curitiba,
com o propósito de instalar uma loja de produtos orgânicos. A loja funcionou até 2003. Os produtos eram
entregues no local, onde havia um barracão para recepção, seleção e armazenagem dos produtos, sendo
vendidos prioritariamente a granel, tanto aqueles in natura como os grãos. A diversidade ofertada era bastante
expressiva, com produtos tanto da RMC como de outras regiões do Paraná, e também de outros estados.
117
negociando com a APAC, a qual, além dos produtores de hortaliças convencionais, tinha já
agricultores produzindo orgânicos.
Duas empresas estruturaram-se e mantêm-se como as principais fornecedoras
para os supermercados de Curitiba: Fruto da Terra e Rio de Una. A primeira é de propriedade
de uma família agricultora do município de Colombo, tradicionais produtores de hortaliças,
que em 1995 destinaram uma parte das terras para o cultivo de orgânicos. Como a empresa
já era fornecedora e transacionava com os supermercados, a partir de 2000 estrutura-se como
uma fornecedora empresarial de orgânicos. A segunda é uma empresa instalada no município
de São José dos Pinhais, que antes de 2002 já era fornecedora de hortaliças para os
supermercados, atuando principalmente com embalados e minimamente processados. A partir
dessa data deixa de produzir e ingressa no ramo de orgânicos como uma empresa agrícola.63
Essas empresas obtêm grande parte da produção de agricultores familiares, com os
quais mantêm relações de integração vertical e, por vezes, horizontal, denominadas parcerias.
Atualmente, segundo informações dos gerentes das maiores redes de supermercados da região de Curitiba, no setor de FLV o percentual das vendas de hortícolas orgânicas
em relação às convencionais varia de 8% a 15%, contra menos de 3%, há dois anos. As
hortaliças são, sem dúvida, o grupo de produtos orgânicos de maior comercialização nos
equipamentos varejistas, sendo que o percentual de vendas dos produtos orgânicos de
mercearia seca (produtos não-perecíveis e que não precisam de refrigeração) em relação
aos similares convencionais é irrisório.64
Os supermercados em Curitiba
Atualmente, as grandes redes em Curitiba – Wal-Mart65, Condor, Carrefour, Extra,
Muffato, Angeloni – ofertam produtos orgânicos em todas as lojas da capital. Quando não o
fazem, é por falta de produtos ou problemas de logística. As redes de porte médio – Festval,
Super Dip, Jacomel e outras – procuram seguir a tendência das grandes redes. Nas lojas de
bairro, de redes menores (Fantinato, Gasparin), ou em supermercados de loja única há
pouca oferta de orgânicos, normalmente os produtos da mercearia seca mais comuns
(açúcar mascavo, farinhas).
63 A empresa Rio de Una iniciou suas atividades em 1996 como uma empresa de alimentos, trabalhando com
hortaliças de produção convencional. Inicialmente dispunha de produção própria e aquisição fidelizada de
agricultores locais e seu objetivo era produzir legumes e verduras selecionados, lavados e embalados em
atmosfera especialmente controlada, empregando tecnologias de processamento. Somente em 2002 estrutura-se
para atuar no mercado de orgânicos (RIO DE UNA, 2006; PLANETA ORGÂNICO, 2006).
64 Não foi possível obter dados das planilhas dos supermercados.
65 O Wal-Mart é uma empresa varejista americana que atua também no ramo supermercadista. Em 2006 a
empresa comprou a rede de supermercados do grupo Sonae, em Curitiba, sendo que este último havia
adquirido a rede regional Mercadorama, atuante em Curitiba, em 2000.
118
Nas grandes redes, até o ano de 2004 as negociações e o recebimento dos produtos
hortícolas eram definidos e realizados pelos responsáveis do setor de FLV, diretamente nas lojas.
Mais recentemente os procedimentos são feitos pelas centrais de compras e distribuição.66
Os fatores que motivaram essas mudanças foram principalmente o aumento da demanda,
das vendas no varejo e do volume, e a concentração da oferta em duas grandes empresas
fornecedoras em Curitiba (Fruto da Terra e Rio de Una), o que permitiu aos supermercados
empregar a mesma logística aplicada aos demais grupos de produtos comercializados.
Também contribuiu para isso o movimento recente e acentuado de concentração no setor
supermercadista em Curitiba e no Paraná, com aquisições de redes de médio e grande
portes por grupos maiores (o Wal-Mart adquiriu o Sonae, em 2005), os quais têm aberto um
número significativo de novas lojas nas principais cidades do Estado. Nas demais redes, de
médio e pequeno portes,67 predomina o modo anterior de aquisição de produtos pelas lojas,
com tendência a centralizar os processos à medida que crescem e ajustam a logística.
Em termos de estrutura desse tipo de mercado, os produtos orgânicos estão
inseridos nos processos de transação comercial da mesma forma que os demais produtos do
mercado agroalimentar. Entretanto, há algumas iniciativas nas redes maiores, que atualmente
mantêm um mesmo profissional para negociar a aquisição dos produtos com os fornecedores
atuais e buscar novos fornecedores, quer se trate de produtos convencionais ou orgânicos,
declarando a atenção ao crescimento da demanda destes últimos. Porém, de modo geral
não há qualquer diferença nas negociações por se tratar de produto orgânico – os prazos de
pagamento, a consignação, as formas de desconto e a devolução são semelhantes aos que
se aplicam aos demais produtos.
Os supermercados no interior do Paraná
No interior do Estado, a comercialização de orgânicos nos supermercados é relevante
apenas na região Oeste, onde, nos últimos cinco anos, ocorreram ações mais definidas, aparentemente comandadas pela rede de supermercados Muffato, uma empresa de origem regional.
66 No Wal-Mart o processo é coordenado pelo Clube do Produtor, uma gerência responsável pela negociação
com os produtores/fornecedores de FLV convencionais e orgânicos, fiambreria, padaria, açougue e peixaria.
Nos demais, há os encarregados pelas negociações nos diferentes setores de produtos, nas Centrais de
Compras e Distribuição (CDs).
67 Segundo a tipificação dos formatos de loja elaborada pela Abras/Nielsen, um supermercado pequeno possui
até 250 m² de área de vendas, em média 3 check-outs (caixas de saída) e número médio de 5.000 itens de
venda. Nos supermercados médios, esses indicadores situam-se em 1.001 a 2.500 m² de área de venda, 12
caixas e média de 14.464 itens ofertados. Os grandes, classificados como supermercados ou hipermercados
compactos, têm uma área de venda de 2.501 a 5.000 m² de venda, 22 check-outs e média de 19.880 itens
ofertados. Finalmente, os hipermercados possuem acima de 5.000 m², 49 caixas e média de 36.716 itens.
119
Nesse caso, a estratégia era iniciar a oferta de produtos orgânicos em lojas de
bairros com população de maior renda, em Cascavel e Foz do Iguaçu. Para isso pensava-se
em desenvolver formas de apoio à produção e aos produtores, e definir a logística de entrega
e comercialização, de contratos de fornecimento etc. Contudo, passado o período inicial de
organização das atividades, em 2001/2002, e apesar das intenções de todos os gerentes de
supermercados em dinamizar a comercialização nas suas lojas, o que se observa é a estagnação,
refletida na ausência de produtos à venda nos supermercados.
A situação diferenciada que se identificou no interior do Estado foi a do supermercado
da Cooperativa COPAGRIL, de Marechal Cândido Rondon, cujos produtos orgânicos são
fornecidos na sua maioria pela ACEMPRE68, a associação de comercialização dos produtores
orgânicos com sede no município. Ali se ofertam hortícolas, frutas (acerola, banana, carambola),
farinhas e farelos (centeio, fubá, soja, trigo, arroz), açúcar mascavo e guaraná em pó.
Uma particularidade que aparece de forma mais significativa no Oeste são as
iniciativas de algumas associações e de agricultores para negociar com os proprietários de
supermercados das redes locais ou regionais (2 e 3 lojas, respectivamente) e com supermercados
de loja única. Isto ocorre devido à possibilidade de menor burocratização nas negociações
com os proprietários dos supermercados, à intermediação de pessoas do poder local
(secretários de agricultura, prefeitos), às vantagens de logística de transporte e entrega, de
comunicação etc.
Fora a capital e a região Oeste, a comercialização de produtos orgânicos nas demais
regiões é pouco significativa atualmente. Em Londrina, apenas em um supermercado havia
oferta de hortícolas, oriundas da empresa Rio de Una, de Curitiba, e alguns produtos de
mercearia seca. Em Guarapuava, uma rede regional comercializa hortícolas, também de Rio
de Una, bem como frutas, café, suco, arroz, feijão, soja em grão, farinha de trigo, que
provêm de associações de agricultores da região e de outras regiões do Estado. Em
Francisco Beltrão, uma rede local comercializa orgânicos desde 2002, principalmente
hortícolas, e açúcar mascavo, fornecidos por uma associação de produtores de orgânicos
do município de Verê.
A visão dos supermercados sobre os produtos orgânicos
A visão dos supermercados com relação aos orgânicos é apresentada a seguir, a partir
de algumas entrevistas realizadas com gerentes ou responsáveis por setores de frutas, legumes
e verduras. Em geral, esses referem-se aos produtos orgânicos de forma positiva quanto:
- às suas peculiaridades (por serem isentos de agrotóxicos, pela qualidade
alimentar);
68 A ACEMPRE (Associação Central de Produtores Rurais Ecológicos) comercializa produtos de uma "rede" de
associações de agricultores familiares orgânicos, estruturada há uma década, e atende aos supermercados
locais, porém de forma intermitente.
120
- ao potencial de atração de clientes de renda elevada;
- ao potencial futuro de vendas dos produtos orgânicos em geral (hortifrúti,
sucos, farinhas, grãos etc.).
Relativamente aos pontos negativos, afirmam que o principal deles está na esfera
da produção, referindo-se ao fato de a atividade não estar estruturada tal como a produção
convencional, o que resulta em dificuldades para atender aos parâmetros ditados pelo mercado
agroalimentar.
Segundo esses mesmos gerentes, a comercialização de produtos orgânicos ainda
não se firmou no grande varejo pelas seguintes dificuldades:
a) pouco volume e diversidade - alega-se que os clientes demandam a mesma
variedade de produtos orgânicos durante todo o ano, por estarem habituados
a consumir os produtos convencionais sem muita variação no suprimento;
afirmam também que, além das hortaliças, há poucos produtos disponíveis,
como frutas e produtos de origem animal;
b) preço elevado - o preço pago ao produtor seria muito superior ao dos
produtos convencionais, acima de uma variação admitida pela maioria como
razoável (em torno de 30% a mais). Contudo, em nenhum dos casos solicitados
os entrevistados dispuseram-se a apresentar a planilha de preços pagos aos
produtores. Em consulta aos produtores, a afirmação geral é de que os seus
produtos são mais caros que os convencionais, mas com variações para mais
que raramente excedem os 50%.69
c)
insuficientes divulgação institucional/campanhas educativas da população - os
produtos orgânicos são divulgados na mídia apenas em ocasiões especiais,
como a Semana de Alimentos Orgânicos; mesmo os consumidores de renda
elevada e outros, como os profissionais da saúde, são pouco incentivados a
consumir orgânicos;
d) atuação dos fornecedores - segundo os entrevistados, os fornecedores de
orgânicos devem responsabilizar-se pela promoção, exposição, arrumação e
reposição dos produtos nas gôndolas, a exemplo dos demais fornecedores de
produtos convencionais.
O que se verificou no decorrer da pesquisa é que efetivamente não há uma
atenção diferenciada por parte dos supermercados com relação aos produtos orgânicos,
seja na apresentação destes nas lojas e gôndolas, seja na relação com os produtores ou
69 É o caso dos produtos fora de época ideal da espécie, de produção extemporânea, em situações bastante adversas
de clima etc. Um fornecedor em Curitiba afirmou que, em diversas ocasiões, quando os produtores baixam o
preço dos produtos, os supermercados não fazem o mesmo, acarretando aumento das margens de lucro.
121
fornecedores nas esferas da produção ou circulação (apoio à produção e/ou assistência
técnica, logística de transporte etc.), nas transações comerciais (formas de pagamento), ou
ainda nas outras formas de apoio, como divulgação/propaganda (ver informações complementares no Apêndice 4).
4.2.2
Lojas: Outro Agente no Mercado Varejista
Outro equipamento do mercado varejista considerado na pesquisa foram as lojas
especializadas e restaurantes, embora sejam ainda pouco representativos na comercialização
de orgânicos no Paraná. Foram identificadas e pesquisadas nove lojas nas cidades de
Curitiba, Londrina, Maringá e Francisco Beltrão.
Esses equipamentos foram localizados principalmente nas cidades de maior porte,
como Curitiba e Londrina. De forma geral, são estabelecimentos abertos recentemente, a
maioria a partir de 2002. Segundo um dos entrevistados, pioneiro no ramo, o negócio começa a
apresentar maior estabilidade a partir do momento em que o número de fornecedores aumenta.
Em 2002, a diversidade da loja era atendida por cerca de 10 fornecedores, enquanto no
momento são aproximadamente 30 fornecedores.
Diferentemente de equipamentos como os supermercados, no caso das lojas
especializadas os fornecedores são principalmente as associações de agricultores familiares
de produtos orgânicos, ou mesmo agricultores individuais. Todos têm que ter algum tipo de
certificação, sendo que a maioria é certificada pelo sistema da garantia participativa da Rede
Ecovida, mas também pelo IBD e pela ECOCERT.
No quadro 4.3 são identificados alguns produtos e fornecedores para a capital, Curitiba.
QUADRO 4.3 - FORNECEDORES DE PRODUTOS ORGÂNICOS PARA AS LOJAS DE CURITIBA - PARANÁ - 2006
FORNECEDORES
Grupos da Rede Ecovida do Litoral e Adrianópolis
REGIÕES/ESTADOS
(1)
Região Metropolitana e Litoral
PRODUTOS
frutas (banana e citrus)
do Paraná
APOMOP
AFRUTA
(1)
Norte e Noroeste do Paraná
(1)
Associação do Verê - ACEMPRE
(1)
(1)
APOL
Oitavo Mar
Ecocitrus
(2)
(1)
Cooperativa Aécia
Korin
(1)
(2)
(2)
Native
frutas (kiwi), batata e cebola
Oeste do Paraná
tomate
Norte e Noroeste do Paraná
frutas e legumes
Oeste do Paraná
peixe (tilápia)
Rio Grande do Sul
sucos
Rio Grande do Sul
sucos e molhos
São Paulo
frango
São Paulo
açúcar
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
(1) São associações ou organizações de agricultores familiares que comercializam.
(2) Trata-se de empresas privadas.
café
Centro-Sul do Paraná
122
A pesquisa mostrou que a maioria das lojas trabalha com o esquema de entrega
de sacolas em domicílio. Este serviço, ainda pouco explorado, permite que o consumidor
receba os produtos orgânicos em casa com preços inferiores aos dos supermercados e um
pouco superiores aos da feira. A operacionalização desse sistema de venda ocorre de
diferentes maneiras: pela internet, com opção de escolha de produtos pelo cliente, ou por
meio de telefonema a cada um dos clientes, fornecendo-lhes a lista dos produtos disponíveis
naquele dia. A maioria das lojas procura valorizar suas vendas oferecendo material educativo
sobre os orgânicos, como fôlderes, panfletos, distribuídos nas sacolas ou durante as vendas
no balcão.
Outra constatação do estudo é que a procura dos consumidores por orgânicos está
crescendo e que este canal ajuda na divulgação e conscientização do trabalho das associações.
O trabalho de certificação também oferece uma garantia ao consumidor e auxilia nas vendas.
A aquisição dos produtos pelas lojas segue alguns critérios. São eles, em ordem
de prioridade:
- o produto deve ser certificado, o que aumenta a credibilidade e facilita a
comercialização;
- diversidade de produtos (mix) (para o abastecimento da loja, o que permite oferecer
diversificação ao consumidor);
- preço e prazo (pois possibilitam capital de giro);
- negociação do frete (relação custo/benefício).
As condições de compra funcionam de acordo com o tipo de produto. No caso dos
alimentos in natura a compra é realizada à vista, com cheque para 7 ou no máximo 10 dias.
Em relação aos processados a compra é efetuada a prazo (15-45 dias), com média de
pagamento para 28 dias. É importante destacar que não há devolução de produtos para o
produtor e o estabelecimento responsabiliza-se pelas perdas. Para minimizá-las, uma das
estratégias é trabalhar em parceria com algumas associações para processamento das
frutas que estão passando do ponto ideal para venda, o que contribui no relacionamento
entre loja e agricultor.
A análise dos principais produtos orgânicos comercializados mostra que a procura
é maior, em primeiro lugar, por hortaliças folhosas, sendo a alface americana a mais
procurada, seguida pela rúcula e espinafre. Para hortaliças de flores, a maior procura é por
brócolis e, depois, pela couve-flor. Entre os tubérculos, a batata, cenoura e beterraba
apresentam boas vendas, nessa ordem. Entre as hortaliças de fruto, o campeão de vendas
ainda é o tomate, seguido do pepino japonês e abobrinha. Entre os meses de setembro e
novembro, há falta de tomate, em função da sazonalidade do produto.
Para o grupo dos grãos o produto orgânico mais vendido é o feijão carioca, seguido
do feijão preto e adzuki. Em seguida aparece o arroz integral dos tipos agulha e cateto. No
caso do cateto, considerado mais saboroso, o preço é 50% superior ao do tipo agulha.
123
O terceiro produto mais comercializado deste grupo é a soja em grão. Por último, tem-se o
fubá (amarelo e branco, respectivamente). Um dos pontos que podemos destacar neste
grupo é a falta de milho orgânico ranço no mercado.
Passando para a análise da venda de frutas orgânicas, ficou evidente, na
pesquisa, a dificuldade de aquisição deste produto no Estado do Paraná, mostrando o
grande potencial para as diferentes regiões do Estado, que têm a possibilidade de trabalhar
com frutas orgânicas tropicais e temperadas. A procura maior é por laranja, seguida de
mamão papaia, que apresenta preços muito altos (R$ 12,00/quilo), caqui, abacaxi e banana.
Em relação à venda de produtos de origem animal, os mais procurados são os
derivados de leite (queijo, manteiga e iogurte), o frango, o peixe e o porco. Para os suínos, o
fornecimento foi interrompido em função da perda de certificação e descredenciamento do
fornecedor, por falta de ingredientes orgânicos na ração. Outro grupo importante de
produtos para sustentação de uma loja é o alimento processado. A venda maior ocorre com
os sucos de frutas, com destaque para o suco de uva, citrus e amora preta. Neste grupo,
seguem as geléias de frutas, como a de morango, e novidades como a geléia de melancia
sem açúcar. Por último, têm-se as farinhas de trigo, soja e arroz.
Quanto à origem dos produtos, os resultados da pesquisa mostram que a maioria
deles é adquirida de produtores individuais ou de associações de produtores locais. No caso
de Curitiba, 100% das hortaliças folhosas são provenientes de municípios da RMC que se
encontram num raio de até 60 km da loja. Para os legumes, 60% vêm da RMC e os outros
40% do Norte, Oeste e Centro do Paraná. No caso da cenoura, por exemplo, a região Norte
apresenta um clima bastante favorável à adaptação desta cultura ao sistema orgânico.
As frutas são originárias da RMC (Adrianópolis, Cerro Azul) e Litoral, que
respondem por 25% do total comercializado, seguidos de municípios das regiões Norte e
Oeste do Paraná, que respondem por 50%, e o restante, 25%, é proveniente de outros
estados (15% de Santa Catarina - maçã, kiwi, maracujá; 5% do Rio Grande do Sul Ecocitrus; 5% de São Paulo - manga, laranja, tangerina morgote).
Os grãos comercializados são originários do próprio Estado do Paraná (60%) e do
Rio Grande do Sul (40%). Os feijões são provenientes do grupo da Rede Ecovida do município
da Lapa, e o arroz tem origem na região do litoral do Paraná e do Rio Grande do Sul.
Para os processados, a pesquisa mostrou que o Paraná tem um grande potencial
de investimento nas agroindústrias orgânicas. A maior parte (60%) deles vem do Rio Grande
do Sul (doces e geléias sem açúcar), 20% do Paraná, 10% de Santa Catarina (Cooperativa
Afruta) e 10% de São Paulo.
O perfil do consumidor das lojas é semelhante ao que foi identificado nas feiras.
A maioria dos clientes são mulheres que buscam, normalmente, produtos orgânicos in natura.
Os homens procuram mais os processados, como bebidas (vinhos e cachaças). A faixa de
idade dos compradores está entre os 35 e 50 anos, e o nível de renda situa-se acima dos
10 salários mínimos.
124
As motivações dos consumidores para compra, segundo os resultados da
pesquisa, estão relacionadas à melhoria da qualidade de vida, considerando aspectos como
saúde e meio ambiente, e ao consumo consciente. Segundo os resultados, a influência da
mídia e o processo de divulgação nas feiras contribuem para reforçar a imagem dos orgânicos
também nas lojas. Entretanto, uma constatação importante é a de que nem sempre são
consistentes as informações sobre os orgânicos por parte dos funcionários das lojas, o que
pode comprometer a credibilidade dos produtos frente aos consumidores.
Em relação ao preço, os informantes declararam que o ideal é manter os preços o
mais próximo possível dos similares convencionais. Quando a diferença ultrapassa os 10%,
já se notam dificuldades para venda.
A certificação dos produtos comercializados em lojas e restaurantes do Paraná é
proveniente, na grande maioria, da Rede Ecovida, IBD e ECOCERT. Apenas um restaurante
apresentou certificação da ECOCERT. Observa-se, contudo, que o alto custo da certificação
do estabelecimento, no estágio atual, apenas diminui as margens, pois o consumidor ainda não
reconhece este atributo como diferencial.
A pesquisa permitiu destacar alguns produtos com potencial de venda nas lojas,
como: massas orgânicas, derivados de leite (iogurte de frutas), derivados de carne (bovinos,
suínos), frutas exóticas (lixia, romã, melão de São Caetano, pitanga e fruta-do-conde).
O quadro 4.4 apresenta, no que tange às lojas no contexto do mercado varejista,
algumas condições, oportunidades e restrições.
QUADRO 4.4 - MERCADO VAREJISTA (LOJAS) DE PRODUTOS ORGÂNICOS - CARACTERÍSTICAS, OPORTUNIDADES
E RESTRIÇÕES - PARANÁ - 2006
MERCADO VAREJISTA
Características
Oportunidades
Restrições
Atendimento ao consumidor
Boa margem de lucro;
Alto custo de manutenção (energia, funcionários, aluguel,
oferecendo uma grande
forma rápida de conseguir
transporte-frete)
diversidade de produtos
novos clientes, se o ponto for
(in natura, processados e
bem localizado
outros)
Investimento em equipamentos (expositores refrigerados)
Necessidade de grande diversificação de produtos
Troca de mercadorias com vida de prateleira maior
Investimentos em material de divulgação para fixação no
local (cartazes, fôlderes, folhetos com receitas culinárias,
brindes promocionais)
Pagamento antecipado nas primeiras compras
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
Por fim, apesar de existirem particularidades entre as regiões de estudo, em função
das características dos grupos de agricultores e canais de comercialização, os resultados da
pesquisa mostram que as lojas são ainda pouco expressivas no conjunto do mercado
varejista. Contudo, como se identificou, do ponto de vista dos agricultores familiares essas
125
constituem um importante equipamento no mercado do varejo, uma vez que as possibilidades
de definir as bases das transações comerciais estão em processo de construção.
4.2.3
Algumas Considerações sobre o Mercado do Varejo
O estudo mostrou que a comercialização de produtos orgânicos no mercado do
varejo é muito recente em todo o Paraná, iniciando-se de maneira mais estável a partir de
2000, tendo como os dois principais agentes que atuam nas vendas dos produtos as redes
de supermercados e as lojas especializadas.
Esses agentes estão situados predominantemente em Curitiba, sendo os
equipamentos das redes de supermercados em maior número que as lojas especializadas.
No interior do Estado verificou-se que a presença de tais agentes e do próprio mercado do
varejo é bem menos relevante. A situação excepcional que se observou foi na região oeste
do Paraná, no município de Marechal Cândido Rondon, onde os produtos orgânicos são
comercializados pelo mercado do varejo. Entretanto, trata-se de um supermercado local
vinculado a uma cooperativa de produtores. No caso de lojas especializadas, no interior
foram identificadas somente três lojas, duas delas na região Norte (uma em Londrina e outra
em Maringá) e a terceira na região Sudoeste, em Francisco Beltrão.
Quanto à oferta de produtos orgânicos no mercado do varejo, a pesquisa mostrou
que, no caso dos supermercados, são as hortaliças o principal grupo comercializado. Os produtos
de mercearia seca, como os processados em geral, são ofertados em menor escala, sendo
praticamente inexistentes em alguns casos. No caso das lojas especializadas, os principais
produtos comercializados são os processados em geral, particularmente os sucos, geléias,
grãos e farinhas. Contudo, também são comercializadas hortaliças e frutas, embora com
diversidade limitada, verificando-se ainda, em alguns casos, a oferta de produtos de origem
animal, como queijo, manteiga e iogurte, bem como frango, peixe e suínos, cabendo destacar
que, para estes últimos, há alguns limitantes quanto às exigências da legislação sanitária.
Nos supermercados os produtos orgânicos são ofertados somente embalados, na
maioria das vezes em gôndolas com algum tipo de identificação, embora se tenha observado
que muitas vezes esses são encontrados misturados com produtos hidropônicos e convencionais,
sendo reconhecidos somente pelo selo de certificação na embalagem. Já nas lojas os produtos
embalados são em sua maioria processados, aqueles de mercearia seca, enquanto as
hortaliças, frutas e alguns grãos são ofertados a granel em sua maior parte.
Com relação à estrutura de relações sociais que envolvem as transações comerciais
entre os agentes do mercado do varejo, identificou-se que há diferenças bastante significativas
entre os dois tipos de equipamento.
Os supermercados atuam com os produtos orgânicos empregando a mesma
lógica com que transacionam com os demais produtos do mercado agroalimentar, seja em
termos de exigências de padronagem, embalagem, custos e prazos de pagamento. Não
126
negociam com agricultores produtores de orgânicos. Todo o processo de negociação se dá
com empresas constituídas para tal fim, as quais são apresentadas a seguir, quando se
abordam as características do mercado da transformação de produtos orgânicos.
A pesquisa mostrou que, no Paraná, há duas empresas que transacionam produtos
orgânicos do grupo das hortaliças com as redes de supermercados, ambas situadas em dois
municípios da RMC. Embora essas duas empresas mantenham áreas próprias de cultivo
(cerca de 25%), a maior parte da produção que negociam é oriunda de mais de 100
agricultores familiares produtores de hortícolas orgânicas (a grande maioria da RMC), com
os quais estabelecem contrato do tipo parceria ou de integração, dependendo da situação.
Com relação às lojas especializadas a situação encontrada é distinta. Nestes
equipamentos a relação de compra de produtos se dá diretamente de produtores individuais
ou de associações de agricultores familiares produtores de orgânicos, sendo que as
condições são estabelecidas diretamente entre os dois agentes, produtores e compradores.
Os produtos são originários na sua maioria das próprias regiões das lojas, no caso de
hortaliças e frutas, e os demais produtos de mercearia seca são provenientes também de
outras regiões e estados.
Quanto ao processo de garantia de procedência dos produtos orgânicos, a
pesquisa mostrou que o mercado do varejo só opera com produtos que têm o selo de
certificação de terceira parte, sendo que os dois principais certificadores são o IBD e a
ECOCERT. A exceção é o caso do supermercado da região Oeste, que, dadas as suas
características, trabalha com produtos orgânicos certificados pela Rede Ecovida de
Agroecologia, que se baseia no sistema de garantia participativo (SGP).
Finalmente, o estudo verificou que o mercado do varejo é um dos tipos de mercado
onde se transacionam os produtos orgânicos, predominando aí as estruturas que caracterizam o
mercado agroalimentar, com as redes de supermercados. Neste mercado os produtos parecem
ser mais importantes que o conhecimento e a valorização do processo de produção, o que de
certa forma não só obscurece a importância da agricultura familiar como ator fundamental
da produção, mas limita sua atuação como um agente de comercialização.
4.3
MERCADO DE TRANSFORMAÇÃO: EMPRESAS E ASSOCIAÇÕES DE
PROCESSAMENTO E BENEFICIAMENTO
As empresas de processamento e beneficiamento de produtos orgânicos são
analisadas neste estudo como mais um tipo de mercado para os produtos orgânicos do Paraná.
O que se constatou foi uma diversidade de formatos, envolvendo o tamanho das empresas;
produtos; formas de contrato, tanto com os agricultores como com os compradores; tipo de
clientela a ser atendida nos níveis local/regional, nacional ou internacional; tecnologia envolvida
no processamento ou beneficiamento etc.
127
A pesquisa de campo possibilitou uma visão geral deste segmento. Os dados e
informações coletados destinaram-se a investigar alguns aspectos, tais como: agregação de
valor nos produtos processados ou beneficiados; fornecedores de matérias-primas; formas
de aquisição e origem dos produtos primários; existência ou não de serviços de apoio aos
produtores; destino dos produtos comercializados; vantagens e restrições apontadas no
mercado de orgânicos; perspectivas das empresas em relação à comercialização, dentre
outras questões.
As primeiras empresas começaram a atuar há pelo menos 10 anos e estão
localizadas em praticamente todo o território paranaense (mapa 3). Os produtos com os
quais trabalham são provenientes em sua maioria da agricultura familiar e apresentam uma
significativa diversificação com relação aos grupos de produtos. Dentre eles destacam-se os
grãos (principalmente soja e café), hortaliças, frutas, mandioca (fécula), cana-de-açúcar
(açúcar mascavo e cachaça), mel, ervas medicinais (chás), erva-mate e alguns subprodutos
(geléias, barras de cereais, biscoitos).
No que se refere à relação das empresas com os seus produtores de matéria-prima,
observou-se que esta pode ocorrer tanto com produtores individuais como com associações
de produtores e cooperativas de produtores, podendo a matéria-prima ser proveniente, ainda,
de produção própria. De um modo geral as empresas adquirem os produtos de origem certificada.
A pesquisa de campo permitiu que se identificassem três formas de relação entre
as empresas e os produtores fornecedores, independentemente dos produtos e de estar
formalizada ou não a relação. Os formatos de relacionamento apresentados a seguir foram
adaptados de Alcântara e Souza (2005), verificando-se, de um modo geral, a predominância
de relacionamento informal entre as partes envolvidas:
a) relação contratual - ocorre quando existe um acordo/contrato formal, em que
os agricultores assumem o compromisso de entrega da produção e a
empresa compromete-se com a aquisição da produção (situação semelhante
ao sistema de integração);
b) relação independente - não existe vínculo entre as partes e a compra pode
ocorrer a qualquer momento; os agricultores escolhem o produto que desejam
oferecer de acordo com o interesse da empresa;
c)
relação de parceria - o agricultor não possui terra, mas planta na propriedade
da empresa que comercializará os produtos; a parceria viabiliza a renda pelo
trabalho do agricultor, enquanto a empresa tem garantia da produção.
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TENDÊNCIAS DO MERCADO DE PRODUTOS
ORGÂNICOS NO PARANÁ
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129
Muitos outros aspectos merecem destaque nesses tipos de relação, dentre eles a
troca de experiências entre os agricultores e a empresa. Nesse sentido, os pontos mais
ressaltados foram relativos ao sistema produtivo, tanto no que se refere a contar com
assistência técnica, como ter acesso a insumos orgânicos. Ainda neste campo destacam-se
a organização e o próprio planejamento da produção, o qual favorece não só a empresa,
garantindo regularidade, diversidade, quantidade, qualidade etc., mas também contribui com
o agricultor que se organiza na unidade. Outro aspecto mencionado refere-se à certificação,
quando, via de regra, a empresa contribui com os agricultores na viabilização da acreditação,
particularmente naquelas situações em que o produto final é destinado à exportação. Por
fim, cabe citar a maior estabilidade financeira do agricultor, desde que a empresa efetivamente
cumpra com os acordos estabelecidos previamente.
À exceção de situações bastante particulares, onde estão envolvidos agentes
relacionados ao mercado justo (fair-trade), também neste tipo de mercado o que se verifica
é uma maior ênfase nas tecnologias de produto do que nas de processo.
Do ponto de vista da gestão da produção processada ou beneficiada, o resultado
da pesquisa de campo possibilitou a construção de tipos de empresas, tomando por base a
proposta de Alcantara e Souza (2005):
a) empresas de processamento: produzem produtos que passam por algum
processo de transformação, mudando as características físicas, químicas e
fisiológicas do produto original, resultando em maior valor agregado. São
empresas com grau de investimento e tecnologia de processo de produção
conhecidos, e pouco exigentes em termos de mão-de-obra especializada. No
caso dos orgânicos, são exemplo dessas empresas as que processam canade-açúcar para fabricação de cachaça ou de açúcar mascavo, e mandioca,
para a produção de fécula;
b) empresas de processamento mínimo: os produtos permanecem em sua forma
in natura, apenas com leve modificação em suas condições iniciais (são
eliminadas as partes não comestíveis, com redução de tamanho ou montagem
de mix diversos). Os produtos são menos elaborados e, portanto, com menor
agregação de valor. Tais empresas necessitam fazer investimentos em equipamentos, como câmaras frias, transporte refrigerado, técnicas de processo
de produção (saladas higienizadas e preparadas diretamente para o consumo
em embalagens com atmosfera modificada) e mão-de-obra especializada.
Este é o caso, principalmente, das empresas que atuam com hortaliças e frutas;
c)
empresas de beneficiamento: os produtos não sofrem nenhum processo de
transformação e não ocorre agregação de valor, passando apenas por procedimentos mais simples que não alteram suas características como produto
natural. A retirada de impurezas que acompanham o produto do campo, a
130
lavagem e a secagem são exemplos de procedimentos do beneficiamento.
Foram identificadas como empresas de beneficiamento de orgânicos as que
atuam com alguns grãos (soja, arroz, feijão) e outros produtos de origem
animal (mel e ovos).
Das 22 empresas pesquisadas, 15 foram enquadradas como de processamento,
2 como de processamento mínimo e 5 como de beneficiamento (quadro 4.5).
De modo geral, constata-se que a relação com os compradores é praticamente a
mesma, independentemente do tipo de produto oferecido, sejam os processados, minimamente
processados ou beneficiados, salvo aquelas que estão direcionadas ao mercado exportador.
Os principais compradores dessas empresas, em âmbito nacional, são os supermercados, seguidos das lojas especializadas, eventualmente das feiras, da venda direta e também
do mercado institucional.
Quanto à comercialização com os supermercados, as empresas de produtos
orgânicos processados e beneficiados estabelecem relações diretamente com a central de
compras, como é o caso das redes supermercadistas como Wal-Mart, Carrefour, Angeloni,
Extra, Mufato), ou com as lojas de supermercados de redes menores, como o Festval, Super
Dip, Superpão, Condor. Há situações específicas em que a relação das empresas com os
supermercados pode ocorrer por um intermediário atacadista.
Um fato que chamou a atenção foi o de que a maior parte das empresas de
processamento e de beneficiamento identificadas e pesquisadas não atua exclusivamente
com produtos orgânicos, operando também com produtos convencionais, utilizando-se das
mesmas plantas industriais para ambos os processamentos. Verificou-se que, nessas situações,
são realizados procedimentos de limpeza das máquinas e equipamentos, para evitar a mistura
com as sobras do produto convencional, garantindo, ao mesmo tempo, a rastreabilidade do
produto orgânico. Segundo as empresas há também uma particular atenção com relação à
mão-de-obra, que passa por treinamento e qualificação para atuar em tarefas específicas
exigidas na transformação dos produtos orgânicos.
A seguir apresenta-se a análise de cada um dos tipos de empresas identificadas,
destacando-se os produtos transformados em cada uma delas.
QUADRO 4.5 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DOS PRODUTOS ORGÂNICOS SEGUNDO AS EMPRESAS, LOCALIZAÇÃO E PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006
TIPOS DE
NÚMERO DE
TRANSFORMAÇÃO
EMPRESAS
Processamento
Processamento mínimo
Beneficiamento
15
2
5
EMPRESAS
MUNICÍPIOS
PRINCIPAIS PRODUTOS
Gama S/A
Ponta Grossa/Londrina
Soja e açúcar mascavo
Lapinha Alimentos Orgânicos
Lapa
Geléias, sucos e conservas
Quina Amarela
Campina Grande do Sul
Geléias
Porto Morretes
Morretes
Cachaça
Terra Verdi Café Orgânico
Curitiba
Café
Tribal Brasil
Campo Largo
Chás, erva-mate e açúcar mascavo
Nutrimental
São José dos Pinhais
Barra de cereais
Fruto da Terra - Chác. Oliveira
Antonina
Banana passa
Fecularia Yamakawa
Amaporã
Fécula de mandioca
Fecularia Loanda
Loanda
Fécula de mandioca
Gebana do Brasil
Capanema
Soja, farinhas (trigo, milho)
Matraga
Planalto
Cachaça
Moinho D'Alegria
Medianeira
Soja, fubá e farinhas
Alimentos Marechal Paulínea
Mal. Cândido Rondon
Açúcar mascavo e melado
Açucarita
Medianeira
Rio de Una
S. José dos Pinhais
Hortaliças
Fruto da Terra
Colombo
Hortaliças
Indústria Breyer
União da Vitória
Mel, pólen e cera de abelha
Tozan Alimentos Orgânicos
Ponta Grossa
Soja
Gama S/A
Ponta Grossa/Londrina
Arroz, feijão, milho e trigo
Agroorgânica
Campo Largo
Soja
Gralha Azul Avícola
Francisco Beltrão
Ovos
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
131
132
4.3.1
Empresas de Processamento
As empresas de processamento de produtos orgânicos são bastante recentes no
Estado, tendo iniciado as atividades a partir da segunda metade dos anos 90, sendo o soja
o principal produto transformado.
Foram visitadas 14 empresas privadas na pesquisa de campo, e mais 6 outras de
entidades de agricultores, entre associações e cooperativas (mapa 4). No que se refere ao
relacionamento com os fornecedores de matéria-prima, predominam as relações comerciais
tal como indicado anteriormente. Em geral são contratos informais estabelecidos diretamente
com os agricultores ou suas associações, garantindo-lhes, ao mesmo tempo, a compra da
produção e a oferta de insumos e serviços – assistência técnica, apoio para a regularização da
certificação, entre outros. São exemplos marcantes dessa prática as indústrias de processamento
de soja, hortaliças, fécula de mandioca, chás e erva-mate, café e açúcar mascavo. A seguir,
detalham-se as particularidades das empresas a partir dos principais produtos.
Soja
As primeiras plantas industriais de soja orgânica foram instaladas na região sudoeste
do Paraná, na década de 90, por uma questão estratégica, uma vez que a produção da
matéria-prima concentrada na agricultura familiar é bastante expressiva naquela região.
A pesquisa constatou a presença de empresas voltadas ao processamento da
soja para alimentação humana – soja grão, óleo, lecitina de soja, farinha de soja integral
(kinako), soja descascada, tofu (queijo de soja) e até o gérmen de soja, que entra na
composição de medicamentos. Do mesmo modo, foi possível observar a presença de
empresas que se dedicam à produção de farelo de soja para alimentação animal.
O mercado exportador é o principal destino da soja processada (90%), principalmente
para a Europa, Estados Unidos e Japão, e em menor escala para a Ásia, Oriente Médio e
Oceania. De um modo geral o mercado na Europa tem sido mais atraente para as empresas
nacionais, em razão dos preços vantajosos comparativamente aos dos Estados Unidos, pois,
para este último, além de o frete marítimo ser mais alto, observa-se que as necessidades de
consumo para alimentação animal vêm sendo supridas internamente. Quanto à constituição de
capital das empresas, apenas uma delas tem a participação de capital externo (50%),
enquanto as demais são constituídas exclusivamente de capital nacional.
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ORGÂNICOS NO PARANÁ
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134
A origem do produto concentra-se basicamente no Estado do Paraná, mas esse
também provém de outros estados, como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do
Sul, Santa Catarina, Goiás e São Paulo, e mesmo do Paraguai. Por sua vez, os fornecedores
da matéria-prima em sua grande maioria são produtores individuais, com propriedades que
variam de 1 a 30 hectares (excepcionalmente existem propriedades maiores em outros estados),
associações de produtores e algumas cooperativas, estabelecendo-se, em geral, uma relação
de parceria com a empresa (similar ao formato de uma integração), em que são fornecidos
ao produtor a assistência técnica, os insumos básicos (sementes, defensivos naturais), a
certificação, e, em alguns casos, o transporte, havendo, em contrapartida, o compromisso
da garantia de compra da safra. Esses produtores têm sido praticamente os mesmos nos
últimos dois anos, o que sugere uma relação estável e de confiança com as empresas. Ainda
assim, quando há a entrada de novos fornecedores, as exigências apresentadas pelas empresas
são bastante rigorosas: treinamento do produtor, histórico da área a ser cultivada, disponibilidade
de mão-de-obra e fidelidade com a empresa. Uma das empresas estabeleceu com o produtor a
formação de um fundo de reserva quando o produto é exportado, visando reverter na forma
de capacitação/formação técnica do produtor. As certificadoras mais presentes são o
IBD/Demeter, Ecocert, OCIA, Jas, Nop-Usda, Soil Association e IMO.
Por outro lado, as empresas vêem o atendimento ao mercado externo com bastante
otimismo, em razão dos preços e da menor carga tributária em relação ao mercado interno,
bem como do padrão de qualidade exigido para o produto, pelos países importadores. Já no
mercado interno, a soja e seus derivados, incluindo aí a produção animal orgânica,
alimentada à base de soja, encontram um mercado pouco atrativo (algumas empresas
consideram-no ainda como um nicho de mercado), pois além da carga de impostos ser mais
elevada, não existe uma conscientização por parte da população quanto aos benefícios do
consumo desses produtos, nem tampouco renda por parte desta.
Café
Uma empresa e uma associação de produtores representam as experiências
levantadas pela presente pesquisa em relação à produção e comercialização de café orgânico.
A empresa, situada em Curitiba, tem seu funcionamento baseado na compra da
produção dos agricultores ou de suas associações, visando atender ao mercado interno mas
principalmente à exportação (trata-se de uma traiding). No entanto, o maior volume de
compra é originário de produção de fora do Estado, de Minas Gerais, o qual é exportado via
"mercado justo".
As exportações ocorrem para os mercados europeu e asiático (Japão, principalmente)
e, em menor escala, para os Estados Unidos. Nesses casos, o produto é processado e até
liofilizado pronto para o consumo.
De outra parte, a associação de produtores, localizada no oeste do Estado, congrega
135
outras 6 associações de municípios em seu entorno, com um total de 70 produtores, sendo
51 em processo de conversão, embora apenas 12 estejam envolvidos com a produção do
café orgânico.
A produção é certificada pelo IBD, e o produto final comercializado já é preparado
e pronto para o consumo, embalado em pacotes de 500 gramas para atender às lojas e ao
pequeno varejo local/regional.
Algumas dificuldades foram encontradas nesse processo, tais como: obtenção de
preço diferenciado, pequeno volume de produção orgânica e baixa qualidade da bebida, o
que tem dificultado a exportação.
Fécula de mandioca
O principal país produtor de fécula orgânica no globo é a Tailândia, que apresenta
custos bastante reduzidos em comparação com os demais países. Porém, de acordo com
as fecularias pesquisadas neste estudo, trata-se de um produto de qualidade inferior.
No Brasil, são poucas as empresas que fazem a transformação da mandioca orgânica
em fécula, não ultrapassando meia dúzia, sendo que, dentre elas, duas fecularias situam-se
no Paraná, na região noroeste do Estado. Ambas iniciaram a atividade com orgânico
recentemente, em 2000, visando atender ao mercado externo. A transformação da produção
ainda é muito pequena quando comparada à convencional, pois, segundo uma das fecularias
entrevistadas, o produto orgânico representa apenas 5% do total das vendas. Em decorrência,
o que se verifica é que há um número muito reduzido de agricultores que se dedicam à
produção da mandioca orgânica.
O principal importador das empresas paranaenses são os Estados Unidos, que
utilizam o produto principalmente para atender à indústria alimentícia em produtos como
baby-food, barras de cereais, biscoitos, glicose, doces e sorvetes, mas também há compradores
da indústria farmacêutica, que utilizam a fécula na fabricação de xarope. Um dos compradores
dos EUA importa do Brasil e exporta para a Europa, que emprega a fécula para as mesmas
finalidades. Hoje começa a surgir uma demanda, ainda pequena, pela fécula orgânica no
mercado nacional, para atender a demandas da indústria alimentícia.
A matéria-prima utilizada pelas fecularias é oriunda da produção de mandioca
orgânica da própria região. As empresas transformadoras mantêm com os produtores o
compromisso de compra da safra, oferecendo, em contrapartida, a prestação de assistência
técnica e a certificação da produção, cujo certificador é o IBD, responsável, também, pela
certificação do processo industrial. O produtor de mandioca orgânica chega a receber pela
sua produção até 30% a mais que o valor da mandioca produzida no sistema convencional.
No entanto, como a indústria opera na área de orgânicos segundo a demanda dos
compradores, a demanda de produção é correspondente. Um aspecto que chama a atenção
é o fato de a empresa relacionar-se com pouquíssimos produtores, entre seis e dez, os
136
quais fazem a produção em áreas mais extensas (entre 10 e 100 hectares por produtor),
situação bastante diversa daquela que se verifica na maioria dos demais cultivos de orgânicos.
Outro fato observado é que uma das empresas produz parte de sua própria demanda de
matéria-prima, o que indica um processo de verticalização entre produção e transformação.
Com relação ao processamento da matéria-prima para a produção de fécula,
trata-se de um processo bastante simples: inicialmente a mandioca, ao ser descarregada,
passa por uma lavagem para retirar as impurezas vindas do campo; em seguida é
transportada para um picador para retirada da camada mais fina e, depois, para um
secador; depois, este produto é ralado e prensado para separar a fibra do leite; o leite passa
por um secador até atingir 13% de umidade, quando então é transformado na fécula de
mandioca, cuja validade é de dois anos.
Chás e Erva-Mate
Existem pelo menos quatro empresas que vêm processando chás ou erva-mate
orgânicos no Estado do Paraná. Para este estudo pesquisou-se somente uma delas, situada
na região metropolitana de Curitiba.
De um modo geral a produção de chás e erva-mate orgânicos é bastante recente.
A empresa entrevistada iniciou suas atividades em 2000, com uma linha de produtos que
apresenta oito variedades. Os chás têm como base a própria erva-mate, a qual é misturada
a outras ervas ou essências naturais que originam sabores específicos.
A matéria-prima vem tanto de produção própria como do sistema de parceria, este
último estabelecido com produtores individuais, cooperativas e associações de produtores,
chamados de fornecedores. A relação entre ambos tem se mantido estável, segundo a
empresa, sendo que, além do cultivo, os parceiros fazem a limpeza do produto colhido.
A empresa oferece aos seus parceiros capacitação na produção orgânica e intermedia
os serviços das certificadoras – a ECOCERT, que certifica para o mercado interno, e a USDAOrganic e JAS, para os produtos destinados à exportação. Segundo a empresa há também
um trabalho voltado à organização dos agricultores e um trabalho de conscientização sobre a
relevância de se produzir um produto limpo e saudável.
O processamento se dá a partir da erva-mate seca e desidratada – etapa
realizada nas unidades de produção dos parceiros –, a qual é encaminhada posteriormente
à empresa. A partir deste ponto, a erva-mate é picada e misturada às outras ervas, que
também passaram pelo mesmo processo (secagem/desidratação/picagem). Após, o produto
é colocado em embalagens prontas para o consumo em forma de sachês ou a granel
(a empresa prioriza o layout da embalagem, em latinhas ou pacotes em papel kraft metalizado e
embalado a vácuo). Por ora a produção está sendo destinada ao mercado externo, mas a
empresa acredita que em breve estará lançando o produto no mercado interno.
137
Açúcar mascavo
Em quase todas as regiões do Estado está sendo produzido o açúcar mascavo
orgânico, principalmente por meio das associações ou cooperativas de agricultores, de
produtores individuais ou, ainda, por empresas. No entanto, as produções ainda são baixas,
oriundas da agricultura, e atendem, em geral, às necessidades locais, com algumas exceções
de empresas que estão exportando.
A transformação do produto é bastante simples: inicia-se com a moagem da cana,
cujo caldo é fervido até encontrar o ponto ideal (brix); em seguida retira-se do fogo e
continua mexendo até sua solidificação, visando, então, ao resfriamento e à embalagem.
Outros produtos: geléias, cachaças, peixes, barras de cereais, grãos – feijão,
arroz, milho
Tanto agricultores individuais ou reunidos em associações e/ou cooperativas
quanto empresas processadoras têm produzido outros produtos, como geléias, cachaças,
barras de cereais, bem como beneficiado alguns grãos, principalmente feijão, arroz e milho.
De acordo com as características de quem produz e do destino final dos produtos, o processo
pode se realizar de forma artesanal ou mediante industrialização.
Todos esses produtos já se encontram disponíveis no mercado interno, alguns há
mais tempo, como geléias, cachaça, arroz, derivados do milho, e outros em fase de prélançamento, como barras de cereais, ovos e peixe.
Independentemente do processo pelo qual passam os produtos, a demanda por
estes é que tem orientado as empresas e mesmo as organizações de produtores a atender
ao mercado interno ou ao externo. O que se verificou é que são direcionados à exportação e
ao mercado interno produtos como os grãos beneficiados, a cachaça (EUA e Europa) e,
recentemente, o peixe (EUA). Outros produtos, como geléias e barras de cereais, têm sido
produzidos e comercializados sobretudo no País e regionalmente, inclusive por enfrentarem
algumas dificuldades, como é o caso da barra de cereais, para cuja composição falta matériaprima. Entretanto, as empresas e organizações de agricultores apostam na ampliação de
mercados para seus produtos.
4.3.2
Empresas de Processamento Mínimo
As empresas de processamento mínimo que atuam no Paraná transformam
fundamentalmente produtos que são comercializados no setor de frutas, legumes e verduras
dos supermercados. Elas têm se especializado na oferta de produtos pré-lavados, embalados
ou prontos para o consumo. Para este estudo foram ouvidas duas empresas situadas na
RMC, consideradas de médio e grande portes (Fruto da Terra e Rio de Una), as quais atuam
no setor de legumes e verduras, e duas associações de produtores que estão trabalhando
com frutas: acerola, no noroeste do Estado, e banana-passa, no litoral.
138
As empresas que atuam com processamento mínimo requerem investimentos em
equipamentos e tecnologias aprimoradas, além de mão-de-obra qualificada, instalações
higienizadas e de refrigeração, embalagens especiais e transporte adequado. A seguir
comenta-se a atuação dessas empresas, a partir dos produtos.
Hortaliças
As duas empresas pesquisadas trabalham no processamento de hortaliças
convencionais e orgânicas, sendo que, atualmente, mais de 90% da sua produção é com
orgânicos.
Ambas atuam fundamentalmente no mercado do varejo, atendendo grandes equipamentos, como as redes de hiper e supermercados, sendo que 90% destes estão situados
em Curitiba e, em menor proporção, em outros centros maiores do Estado e também nos
Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e na cidade de São Paulo.
Em função disso as empresas estruturaram-se para atender às demandas e exigências
organizacionais desse mercado, produzindo alimentos de consumo rápido e prático, prélavados, cortados e embalados com higienização recomendada. São produtos considerados
de maior valor, uma vez que a eles estão agregados os procedimentos de processamento.
As empresas dedicam-se à integralidade do processo, atuando desde a produção
da matéria-prima, processamento, distribuição e comercialização de hortaliças orgânicas.
Ambas trabalham com uma gama bastante diversificada de produtos. São mais de 30 espécies,
como alface americana, brócolis, couve-flor, tomate comum, tomate cereja, cenoura, couvemanteiga, cenoura baby, rúcula, repolho e beterraba, entre outras.
No que se refere à obtenção da matéria-prima, ambas trabalham tanto com produção
própria como com a produção de agricultores familiares, denominados parceiros, e, ainda,
com produção vinda do sistema de integração. Em ambas as empresas a produção própria
corresponde a 23%, a de produtores individuais a 47%, e a das associações de produtores a
30%. A produção por parceria é estabelecida em 20% da produção para o produtor, ou a
R$ 0,50 a R$ 0,70 por caixa de produto, com fornecimento dos insumos por conta da empresa,
assistência técnica, certificação, embalagem e transporte. No sistema de integração, em que
o cultivo ocorre nas terras do próprio agricultor e a empresa também oferece as mesmas
condições de apoio, o preço para o produtor é estabelecido em função dos custos de produção
calculados pela empresa.
As duas empresas têm seus fornecedores concentrados na RMC, porém uma
delas também busca a produção com 22 produtores do norte do Paraná. No total trabalham
com cerca de 100 agricultores, seja no formato de parceria ou de integração.
Outra característica em relação aos fornecedores diz respeito ao planejamento da
produção. Uma das empresas o faz quatro vezes ao ano, de acordo com as estações do ano,
organizando e monitorando cada produtor e o índice de produtividade. Na outra empresa
139
o planejamento inicialmente foi de sua responsabilidade, mas atualmente são os próprios
produtores que elaboram seu planejamento, de acordo com o ciclo de produção e a
responsabilidade assumida com a empresa.
Na linha de processamento, os produtos podem ser classificados de três formas:
- produtos acabados (PA): vêm embalados diretamente do produtor (por exemplo:
aipim, broto de alfafa, morango);
- produtos embalados e cortados (PEC): são lavados e embalados in natura ou
lavados e cortados para compor o mix-salada ou para sopas;
- produtos minimamente processados: são lavados, cortados e higienizados (folhas)
e requerem estocagem sob refrigeração.
É importante ressaltar que há um domínio, por parte das empresas, na área da
tecnologia do processamento das hortaliças, sendo apontada a logística de frios como
principal gargalo nessa área. Dentre as oportunidades que podem ser vistas por essas
empresas estão o atendimento a cozinhas industriais, o fornecimento a granel para
supermercados, o aumento de vendas de frutas orgânicas, e a exportação de hortaliças e
processados (batata-palito) e de congelados (biofrozen).
Frutas
Identificou-se, como processadora de frutas, uma associação de produtores no
litoral do Estado que agroindustrializa a banana, transformando-a em banana-passa. A produção
destina-se principalmente para o mercado externo, em particular a Suíça.
No noroeste do Paraná, no município de Cruzeiro do Oeste, situa-se uma outra
associação de agricultores que faz o processamento mínimo de frutas, desta vez com a
acerola. Iniciou a produção da matéria-prima convencional no final da década passada, e,
no início de 2002, a partir da demanda de uma indústria alimentícia do Ceará, iniciou a
conversão do sistema de produção para o de acerola orgânica. No processamento mínimo a
acerola é lavada, acondicionada e mantida sob baixa refrigeração, sendo que em dois dias a
indústria deve estar com o produto para realizar outros procedimentos. A acerola é utilizada
principalmente para a produção de polpa de suco, mas também há demanda da indústria
farmacêutica para o produto.
Atualmente existem cerca de 45 produtores distribuídos em vários municípios da
região noroeste do Estado, cultivando, em média, 3 hectares com a fruta. A certificação é
realizada pelo IBD, responsável também pela garantia no processo industrial.
A associação está com projeto para implantação de uma agroindústria de polpa
congelada de acerola orgânica, com demanda de 200 toneladas para o mercado europeu.
Outras frutas estão sendo testadas pelos produtores: laranja, limão, abacaxi e uva.
140
4.3.3
Empresas de Beneficiamento
O processo de beneficiamento é bastante simples e compreende as etapas de
limpeza do produto, secagem, classificação e acondicionamento para expedição. O produto
beneficiado não passa por nenhum tipo de transformação.
Na pesquisa realizou-se o levantamento de informações em três empresas de
beneficiamento: uma delas de soja, na RMC; uma de mel, na região centro-sul; e uma
empresa que beneficia ovos, no sudoeste.
Soja
A empresa Tozan Alimentos Orgânicos atua no setor desde 1999. Criada na região
sudoeste, em 2004, transferiu a planta industrial para Ponta Grossa por uma questão de
logística, para atender à demanda do mercado exportador pelo porto de Paranaguá. O custo
do frete foi o fator decisivo para tal mudança.
Atua basicamente com soja, tanto para o consumo humano quanto animal, trabalhando em menor escala, também, com arroz e fécula de mandioca. Cerca de 80% de seus
principais fornecedores estão localizados nos Estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso,
São Paulo e Santa Catarina. No Paraná estão cerca de 10% dos demais agricultores
fornecedores, e os outros 10% estão situados no Paraguai, onde a relação se estabelece a
partir de uma associação de produtores com 500 famílias. O relacionamento que mantém é
de contrato e integração com pequenos e grandes produtores (existem áreas de até 2 mil
hectares), com vínculo de fidelidade comercial.
As exportações da empresa são destinadas principalmente aos países europeus.
A Bélgica adquire em torno de 80% dos produtos. Em menor proporção, a empresa destina
os produtos para países asiáticos, e não comercializa com países norte-americanos.
Mel
Pesquisou-se somente uma empresa que beneficia mel, a saber, a Indústria Breyer,
situada no município de União da Vitória, na região centro-sul do Estado. A empresa comercializa,
como orgânico, o mel, vendido em tambores de 200 litros, o própolis, o pólen e a cera de
abelha. Além destes, comercializa também outros produtos com a designação de naturais, por
não ter certeza de serem de origem orgânica. São eles: mel, geléia real liofilizada, propolinaextrato, shampoos e condicionadores, mel com própolis, sabonete, protetor solar, entre outros.
Os produtos orgânicos são exportados principalmente para a Europa, com destaque
para a Alemanha, Espanha, França e Inglaterra, e também para os EUA e Japão. A exigência
dos países compradores é a qualidade do produto, e para tanto são avaliados mais de
100 itens que determinam essa qualidade, como, por exemplo, a existência de resíduos de
agrotóxicos ou antibióticos.
141
O relacionamento com os agricultores se dá mediante contrato, que caracteriza a
integração vertical, em que a empresa disponibiliza assistência técnica especializada, certificação,
fornecimento de equipamentos, embalagens etc., além de fazer o acompanhamento do processo
de qualidade dos produtos com rastreabilidade. A empresa mantém relacionamento com um
grupo de 120 produtores, somando cerca de 30 mil colméias, espalhados nos municípios da
região centro-sul do Paraná, próximos da sede da empresa, além de municípios de Santa
Catarina. Com relação à certificação ela é realizada pela IMO-Control do Brasil (ISO 65), sendo
que os produtores associados não pagam a certificação diretamente, pois o valor é diluído
nos custos finais.
O processo de beneficiamento do mel é bastante simples e envolve as seguintes
etapas: primeiramente o produto (mel) que vem do campo é recepcionado e passa por um
controle de qualidade (passa pela centrifugação e filtragem); sendo aprovado, é encaminhado
para o depósito de matérias-primas, passando para o setor de fabricação com controle de
qualidade; setor de envase; rotulagem; depósito de produto acabado e, finalmente, expedição.
Segundo a empresa entrevistada, a produção melífera orgânica apresenta ainda
algumas restrições do ponto de vista da produção, pelo fato de não existir um zoneamento
apícola no Estado que evite a contaminação por transgênicos, por exemplo, ou que possibilite
a manutenção e ampliação de áreas de preservação permanente, reserva legal, impróprias
para o cultivo e APAs (ambiental). De outro lado, há dificuldades com relação à capacitação
dos agricultores/produtores para a atividade apícola; à legislação própria; e, ainda, questões
ligadas à comercialização com o mercado externo, que precisaria contar com uma política
cambial mais estável. Contudo, o setor pode vir a ser promissor à medida que essas
restrições sejam sanadas, que a questão da rastreabilidade possa minimizar os riscos e haja
a possibilidade de expandir a ação para outros mercados, como o mercado institucional
(merenda escolar).
Ovos
Trata-se de um produto novo no mercado de orgânicos, o qual vem sendo produzido
dentro de um padrão tecnológico diferenciado, principalmente no que diz respeito ao sistema
de manejo dos animais.
A empresa Gralha Azul Avícola, situada na região sudoeste do Paraná, obtém a
matéria-prima de apenas três produtores com os quais estabeleceu um contrato, caracterizando
uma relação do tipo de integração. Os agricultores foram treinados para a atividade de recria
das aves, uma vez que, no período de criação (15 semanas iniciais), os animais ficam aos
cuidados da própria empresa. Para o produtor, a vantagem está no preço recebido de até
40% acima do produto convencional.
A produção ainda é pequena e as relações de comercialização são estabelecidas
somente com duas regiões. Uma delas situa-se no Rio Grande do Sul e a outra é a de
142
Curitiba, cujo produto é ofertado em uma única loja de supermercado. Neste último caso, as
relações comerciais são estabelecidas através de outra empresa que não a produtora.
Como principal restrição para a atividade a empresa aponta o preço elevado do
milho orgânico (R$ 32,00 a saca), que encarece o custo de produção, resultando em um
produto final de R$ 4,35 para meia dúzia de ovos.
4.3.4
Associações e Cooperativas de Agricultores e a Transformação de Produtos Orgânicos
Embora a maioria das associações e cooperativas não atue diretamente nos
processos de comercialização – particularmente as associações, por não disporem de
condições legais para efetuar transações comerciais, uma vez que não podem emitir nota
fiscal, dadas as características jurídicas –, a maior parte delas desenvolve trabalhos com
este propósito.
Via de regra as associações contam com algum técnico ou articulam-se com entidades de assessoria, normalmente ONGs, que realizam trabalhos de organização, formação
e capacitação junto com os agricultores, tanto voltada ao sistema de produção como à
própria comercialização. Outras associações procuram acercar-se de orientação técnica por
meio de convênios com instituições públicas, como a EMATER e as prefeituras que atuam na
região. Na maioria das vezes a associação é a principal responsável por equacionar a questão
da certificação, atuando desde a orientação, a organização e o acompanhamento do processo
junto com os agricultores.
No que tange diretamente à comercialização, algumas associações viabilizam a
venda dos produtos in natura ou transformados, em lojas próprias, nas feiras de produtores,
e outras o fazem em lojas e supermercados da região. Os produtos transformados, também
chamados de artesanais ou coloniais, em geral são etiquetados com o rótulo da associação,
da certificadora oficial, e, em alguns casos, com o nome do produtor e do próprio técnico
que presta a orientação. São exemplos: APAVE - Vereda Ecológica (município de Verê/
região sudoeste), APRAECOL - Alimentos Orgânicos (Barbosa Ferraz/sudoeste), BIOVALE
(São João do Ivaí/norte), BIOSABOR - Associação Alternativa Pé na Terra (Maringá/norte),
POMAR - Associação dos Produtores Orgânicos de Maringá, na região norte (nesta consta o
nome do produtor e do técnico).
De outra parte, verificou-se que, de modo geral, os produtos transformados pelos
filiados às associações e cooperativas são elaborados na própria unidade de produção dos
produtores e, em alguns casos, em instalações próprias dessas entidades. O quadro 4.6
mostra a relação das associações e cooperativas pesquisadas que elaboram algum tipo de
processamento e beneficiamento, sendo que 14 delas voltam-se mais ao processamento e
18 ao beneficiamento.
QUADRO 4.6 - TIPOS DE TRANSFORMAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS, SEGUNDO AS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE PRODUTORES, LOCALIZAÇÃO E
PRINCIPAIS PRODUTOS - PARANÁ - 2006
TIPOS DE
TRANSFORMAÇÃO
Processamento
Beneficiamento
NÚMERO DE
EMPRESAS
ASSOCIAÇÕES E
COOPERATIVAS
Biscoitos
União da Vitória
Erva-mate e fumo
São Mateus do Sul
Porto União - SC; União da Vitória - PR Suco de uva, molho de tomate e geléias
14
COAVI
COFAECO
AFRUTA
Associação dos Produtores
Rurais Batuva
AFRHUCO
COOPAVI
COOPERTERRA
Associação Central Capanema
Associação Verde Vida
APOP
APROMIS
APOMOP
APAVE
ACEMPRE
Guaraqueçaba
Cruzeiro do Oeste
Paranacity
Jaboti
Capanema
Serranópolis Iguaçu
Pato Bragado
Missal
Iracema do Oeste
Verê
Marechal Cândido Rondon
Banana-passa e bala de banana
Acerola
Cachaça, açúcar mascavo e melado
Açúcar mascavo
Açúcar mascavo, sucos, derivados de leite e farinhas (milho, soja)
Melado e açúcar mascavo
Derivados de leite, de cana e defumados
Processados em geral (animal e vegetal)
Açúcar mascavo, conservas e doces
Processados em geral (animal e vegetal)
Processados em geral (animal e vegetal)
União da Vitória
São Mateus do Sul
São João do Ivaí
18
COOAVI
COFAECO
BIOVALE
Associação dos Produtores do
Turvo
APROVERDE
APROPAR
APOMAR
APOL
Associação Central Capanema
APOP
APOMOP
APROMIS
APROSMI
APROMED
APONG
APRAECOL
APAVE
ACEMPRE
Arroz, feijão e quirera
Feijão e milho
Arroz, café, cana-de-açúcar, citrus, frutas, hortaliças, mandioca,
soja e bucha
Hortaliças
Banana
Mandioca, soja, frutas (laranja, banana), pupunha e hortaliças
Hortaliças, grãos (soja, milho, feijão) e frutas (morango, uva, maçã)
Grãos (soja, feijão, milho) e hortaliças
Hortaliças, mel, abacaxi e leite
Hortaliças
Soja, café e hortaliças
Hortaliças, mandioca, frutas e leite
Hortaliças, grãos (soja e feijão) e frutas (goiaba, morango)
Hortaliças e grãos (soja, milho)
Frutas (morango, abacaxi, banana) e frango
Hortaliças e grãos (feijão, milho)
Hortaliças, frutas e mandioca
Hortaliças e grãos (soja, milho)
MUNICÍPIOS
Turvo
Guaraqueçaba
Paranavaí
Marilândia do Sul
Uraí
Capanema
Pato Bragado
Iracema do Oeste
Missal
São Miguel do Iguaçu
Medianeira
Guaíra
Barbosa Ferraz
Verê
Marechal Cândido Rondon
PRINCIPAIS PRODUTOS
FONTE: Pesquisa de campo - IPARDES e IAPAR
NOTAS: Para as associações/cooperativas, as hortaliças e frutas foram consideradas como produtos que passam por algum tipo de beneficiamento, diferentemente das empresas,
que fazem o processamento mínimo desses produtos.
Algumas associações/cooperativas aparecem repetidas nos tipos de transformação dos produtos (processamento e beneficiamnto), pois atuam em ambos os processos.
143
144
4.3.5
Algumas Considerações sobre o Mercado da Transformação
A pesquisa mostrou que, entre os agentes que atuam na transformação de produtos
orgânicos, encontram-se as seguintes situações: empresas voltadas especificamente para
atuar com os orgânicos; empresas que atuam com produtos convencionais, mas que estão
também trabalhando com orgânicos; e associações e/ou cooperativas de agricultores que
fazem a transformação de produtos orgânicos.
Cada um desses agentes estabelece relações distintas, seja na aquisição da matériaprima, em que os agricultores familiares são um dos agentes, seja na comercialização do
produto final, quando se relacionam com os outros tipos de mercado – do varejo, da venda
direta, o mercado externo e o mercado institucional.
Verificou-se que as empresas de transformação que trabalham com hortaliças
transacionam comercialmente, de um lado, com os agricultores fornecedores, e de outro com
o mercado do varejo, principalmente as redes supermercadistas. Por sua vez, as associações/
cooperativas de agricultores não necessariamente compram a matéria-prima dos agricultores,
mas esta será remunerada após a comercialização dos produtos transformados, sendo que,
no caso das associações, a relação de venda dos produtos se dá principalmente para o
mercado da venda direta, ou institucional, e eventualmente o mercado externo.
No que se refere ao mercado externo, as empresas transformadoras têm um papel
fundamental, seja nos processos que envolvem somente o beneficiamento dos produtos,
como é o caso do soja e do café, seja naquelas situações de transformação total, como é o
caso das fecularias. Para se relacionar com o mercado externo verificou-se que outros
agentes entram no circuito, por meio de compradores diretos de outros países ou por meio de
uma trading (processadoras de soja), que faz a intermediação entre os futuros compradores e
as empresas locais. Já as associações/cooperativas têm uma menor participação no mercado
exportador. Normalmente o interesse pelos produtos que podem comercializar desperta
interesse de compradores, sendo que, em boa parte das vezes, estas iniciativas inserem-se
no chamado comércio justo e solidário, onde se focalizam as tecnologias de processo, em
vez das tecnologias de produto. Tal situação verificou-se, por exemplo, no caso da cachaça
exportada pela Cooperativa Vitória da Conquista, no município de Paranacity, para organizações
não-governamentais da Espanha, apoiadoras da reforma agrária e da agroecologia.
Por fim, cabe destacar que são crescentes a diversidade e a quantidade de produtos
orgânicos que têm passado por processos de transformação. Em geral, quem está atuando
nesse mercado de produtos transformados têm sido as empresas processadoras/beneficiadoras,
incluindo as de pequeno a grande portes e associações e cooperativas de agricultores
familiares. Ou seja, é um ambiente que comporta desde uma empresa como a Rio de Una,
que montou a mais moderna processadora de legumes e verduras da América do Sul, a
grupos de agricultores que conduzem processos de transformação com tecnologia de menor
complexificação e com interesses que não se reduzem a transações econômicas.
145
4.4
O CENÁRIO DO MERCADO EXTERNO: TENDÊNCIAS E PROCESSOS DE
COMERCIALIZAÇÃO COM OS PRINCIPAIS PAÍSES IMPORTADORES
Neste estudo não se aprofundou a pesquisa sobre o mercado externo de produtos
orgânicos do Paraná por se entender que ele não está entre os três principais tipos de
mercado no cenário da agricultura orgânica paranaense, abordados anteriormente.
Entretanto, julgou-se relevante apresentar o cenário atual do mercado externo de orgânicos,
destacando a situação do Brasil nesse contexto e evidenciando algumas iniciativas em
curso no Estado do Paraná.
4.4.1
O Brasil e o Mercado Externo de Produtos Orgânicos
O Brasil está entre os seis maiores exportadores mundiais de orgânicos. Cerca de
75% da produção nacional em volume é exportada, especialmente para Europa, Estados
Unidos e Japão. Os principais produtos exportados são a soja, o café e o açúcar, sendo que
o café orgânico brasileiro figura entre os cafés especiais premiados em importantes concursos
internacionais. Para exportar, os produtores brasileiros seguem as regras estabelecidas no
mercado importador, atendendo às exigências de certificação de produtos orgânicos
estabelecidas segundo o país importador.
Na Europa, a Alemanha é o maior consumidor dos produtos orgânicos brasileiros,
seguida pela Holanda. Outros países que compram do Brasil são os Estados Unidos, Japão,
Canadá, Dinamarca, Itália, Espanha, Áustria, Austrália, Suíça, França, Reino Unido, Nova
Zelândia, Portugal, China, Israel, África do Sul, Uganda, Coréia, Taiwan, Uruguai, Bolívia
e Argentina.
A produção orgânica brasileira exportável, ou seja, aquela que atende às exigências
de certificação dos países demandantes, é bastante diversificada, sobretudo a dos produtos
in natura. Os principais produtos orgânicos exportados têm sido: soja (em grãos e derivados),
café (em coco, torrado e moído), açúcar, castanha de caju, suco concentrado de laranja e
tangerina, óleo de palma e de babaçu, e, em volumes menores, manga, melão, uva, derivados
da banana, fécula de mandioca, feijão adzuki, gergelim, especiarias (cravo da Índia, canela,
pimenta do reino e guaraná), óleos essenciais e cogumelo agaricus. O principal comprador
até o momento foi a América do Norte (51%), seguido da Europa (46%). A APEX (Agência de
Promoção de Exportações do Brasil) estima que, em 2004, as exportações dos produtos
orgânicos tenham atingido a cifra de U$ 115 milhões de dólares.
O Brasil vem dando passos importantes para estimular o crescimento do setor de
orgânicos no mercado externo. A partir do 2º semestre de 2006, pretende-se obter dados sobre
o tamanho real das transações que ocorrem neste mercado, investigando quem exporta, para
onde exporta, quais os principais produtos, entre outras informações, visando construir uma
base de dados estatísticos para acompanhar a exportação de produtos orgânicos do País.
146
Para tanto, a Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), já enviou comunicado às empresas e
empresários informando da criação de um campo específico a ser preenchido no registro de
exportação. No entanto, como a opção de declaração de orgânico ou convencional é
opcional, o dado a ser obtido pode não expressar a realidade sobre o mercado externo de
orgânicos. Ainda em 2006 (no mês de junho), a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX)
publicou a Resolução Camex n.º 13, que cria classificação especial para produtos orgânicos
dentro do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX).
Quanto ao posicionamento do País no mercado internacional, a possibilidade de
intensificar a participação da agroindústria, ampliando a oferta de produtos processados,
bem como as condições climáticas nacionais, favorecem a produção de produtos de clima
tropical para fins de exportação. No entanto, no processo de negociação tem sido o lado
comprador aquele que tem imposto as condições às transações comerciais, utilizando para
tanto os sistemas de certificação, rastreabilidade e, por vezes, critérios definidos como de
sustentabilidade, os quais são impostos aos produtores.
Para alcançar mercados de países desenvolvidos, as exportações brasileiras de
orgânicos enfrentam as mesmas barreiras impostas à exportação de produtos convencionais,
a saber:
a) subsídios agrícolas daqueles países aos seus produtores, o que tem criado
distorções comerciais;
b) limitado acesso à informação sobre as regras exigidas para regulamentação,
fatores de qualidade, práticas de demanda, práticas de mercado e aspectos
logísticos no atendimento aos mercados estrangeiros;
c)
limitado acesso ao crédito e financiamento, especialmente para agricultores
familiares, principais produtores de orgânicos.
Além desses há um outro aspecto fundamental que se apresenta como limitante:
as exigências para importações, que diferem de um país a outro, devido à falta de harmonia
entre as diversas agências certificadoras, bem como de confiança no outro agente da negociação.
Este é considerado um dos principais obstáculos para o desenvolvimento contínuo e rápido
do setor de orgânicos dos países em desenvolvimento, devendo, portanto, ser gerenciado
para a garantia do sucesso do setor.
Aqui também é o lado comprador que impõe as condições que estruturam o mercado
externo. Os compradores norte-americano e europeu exigem que os processos e produtos
orgânicos sejam certificados por organizações reconhecidas por eles. O uso de sistemas de
rastreabilidade e de sustentabilidade, definido pelos países compradores, é outra exigência
básica para produtores de orgânicos brasileiros que pretendem transacionar seus produtos
junto aos países desenvolvidos, lembrando-se que os padrões e exigências são diferentes
para cada país.
147
Com relação à sustentabilidade, Aragão (2006) destaca que os países importadores
têm utilizado este conceito para expressar a preferência por produtos provenientes de empresas
que tenham responsabilidade social e ambiental, além daqueles oriundos do comércio justo.
Nesta última categoria enquadram-se prioritariamente os produtos produzidos por agricultores
familiares, organizados em associações e/ou cooperativas, via de regra com atenção especial
para o sistema de produção que privilegie o processo, e não o produto em si.70 De outro lado,
também se constata que, entre os compradores do mercado externo, busca-se discriminar
aquelas situações em que a produção de orgânicos possa estar utilizando práticas como
trabalho infantil, salário vil etc.
Com um mercado de alimentos orgânicos que fatura US$ 350 milhões anuais e
que importa 90% dos alimentos consumidos, o Japão é outro país que deseja ampliar a
compra do produto brasileiro (CARDOSO, 2002). Segundo Julia Yamagushi, inspetora
internacional de certificação orgânica, a pauta de exportação brasileira inclui, hoje, banana,
soja e café. Para entrar no mercado japonês, é preciso obter o Jas (selo de certificação para
o mercado japonês), mesmo para produtores que já possuam registro de exportação de
orgânicos para a Europa e os Estados Unidos.
Algumas empresas brasileiras já estão atentas a essa grande demanda por orgânicos
no mercado mundial. A Native, certificada desde 1997 para vender açúcar orgânico, exporta
80% da produção mensal de 25 mil toneladas. A marca é do Grupo Balbo, que tem as Usinas
de São Francisco e Santo Antonio, localizadas no município de Sertãozinho, no interior de São
Paulo. Da produção anual de 200 mil toneladas de açúcar orgânico só três mil destinam-se ao
mercado interno. Além do açúcar, a Native também exporta café, suco de laranja e achocolatados. Os produtos são transacionados com a Europa, Estados Unidos, Canadá, Japão, Coréia
do Sul e Arábia Saudita (DANIEL, 2005).
O representante da empresa Chá Campo Verde do Paraná, que há anos vendia
apenas a erva orgânica, recentemente passou a comercializar o chá beneficiado no mercado
externo. Esta situação representou um aumento em torno de 60% nos negócios da empresa.
Para ele, investimentos do setor, como o da união de parcerias que resultou no Projeto
Orgânicos Brasil, são de extrema importância para o setor. Na visão do empresário, um bom
contrato com uma grande rede pode dobrar as vendas de um ano para o outro.
Uma outra empresa, a Jasmine Alimentos, de Curitiba, que já oferece produtos
orgânicos como açúcar mascavo, arroz, farinhas, feijão adzuki, soja e chá, também está
interessada em crescer nesse segmento. As vendas estão pulverizadas por todo o Brasil e
70 Fair trade: movimento internacional, notadamente ativo na Europa, pela ampliação do acesso ao mercado de
agricultores familiares, economicamente em desvantagem estrutural.
148
já chegam a outros países da América Latina, como Venezuela, Chile, Paraguai e toda a
América Central. Participante do programa Organics Brasil, a empresa afirma que
campanhas educativas são a melhor forma de conscientizar as pessoas em relação ao
consumo de alimentos orgânicos.
4.4.2
Café e Soja Orgânicos – principais produtos exportados
A comercialização de café orgânico é predominante para a exportação. Segundo
Pedini (2000), isto ocorre pela reduzida demanda no mercado interno voltada aos cafés
diferenciados, incluindo-se aí o orgânico. No entanto, esse cenário tende a mudar devido ao
crescimento do mercado de café orgânico no Brasil, na ordem de 20%, segundo Gomes e
Macau (2003), e de 100% ao ano, segundo Ricci et al. (2004).
Tradicional exportador de café em grãos e de café solúvel, o Brasil ingressa aos
poucos na disputa pelo mercado internacional de café orgânico com demanda crescente,
sobretudo por parte da Europa, dos Estados Unidos e do Japão. Estes são os principais
importadores, que pagam 50% a mais pelo grão sobre o produto convencional. Os volumes
destinados ao mercado externo em 2002 representaram 70% da produção brasileira do grão
orgânico, de 100 mil sacas (HERBÁRIO, 2002).
Apesar do crescimento, os volumes exportados são pequenos, se comparados
aos grandes negociadores internacionais, como o México, os países da América Central e o
Peru, que concentram mais de 50% das vendas mundiais, avaliadas em 1 milhão de sacas
por ano. Contudo, o Brasil tem um potencial ainda a ser explorado e pode ficar entre os três
maiores exportadores mundiais nos próximos anos. Algumas empresas brasileiras já se
destacam na exportação de café, como o Café Bom Dia (MG), o Café Santa Clara (MG), o
Café do Ponto, São Braz Alimentos (PB), Café Maratá (SE), Ipanema Agrícola (MG), Sassi
Alimentos (SC), Café Bom Jesus (RS) e Gazzola Chierighini Alimentos (SP). Não há ainda
nenhuma empresa paranaense atuando neste mercado.
Considerado um produto diferenciado, o café orgânico tornou-se uma alternativa
atraente numa época em que boa parte dos cafeicultores tradicionais enfrentava uma das
piores crises de preço da história. No entanto, percebe-se que quando há uma recuperação
das cotações internacionais da commodity no mercado internacional, ocorre uma evasão de
parte dos produtores ainda pouco comprometidos com a filosofia do cultivo orgânico. Porém,
Rodrigues (2005) afirma que os preços do café orgânico são mais estáveis se comparados
com os dos grãos convencionais, que oscilam muito mais nas bolsas.
Quanto à soja orgânica, a produção é voltada para o mercado externo, onde o
grão é destinado ao consumo humano e à transformação em ração, a ser adquirida por
produtores de carne orgânica. O preço da soja orgânica é elevado. O grão é vendido até 35%
149
a mais que o convencional, o que torna sua utilização ainda restrita no mercado brasileiro.
Essa aparente desvantagem é compensada pelo interesse despertado pelo produto brasileiro
nos vários países europeus.
Segundo o representante da ONG Agriterra, a Holanda tem interesse em estabelecer
parceria com a agricultura familiar brasileira no incentivo à produção de soja orgânica.
O país compra 12% (aproximadamente 50 mil toneladas) da soja orgânica exportada no mundo
e vem demonstrando interesse pelo produto ecologicamente correto. Conforme os levantamentos
da ONG, a Holanda consome 5,145 milhões de toneladas de soja por ano. O país alimenta,
com o produto, um rebanho suíno de 15 milhões de cabeças e tem preocupações de ordem
sanitária e ambiental, provocadas, principalmente, pelo aparecimento de doenças como o
mal da vaca louca.
De acordo com especialistas na área entrevistados para este estudo, os países
europeus preferem comprar produtos orgânicos in natura aos produtos industrializados.
Para a venda de produtos orgânicos processados, as empresas necessitam de um agente
do país europeu comprador para facilitar a entrada dos mesmos. Aqueles países são grandes
compradores de soja e café. No entanto, a maior parte dos grãos é vendida sem processamento,
sendo que, no caso do café, algumas vezes vende-se o grão torrado.
Segundo o representante da APEX, verifica-se uma situação diferente com relação
aos EUA, pois neste país os compradores têm se mostrado dispostos a adquirir os produtos
orgânicos brasileiros com a marca desenvolvida aqui no país. Haveria, por parte deles,
interesse pela busca de produtos que mantenham uma boa relação socioambiental, uma
vez que os consumidores norte-americanos desejariam saber a origem do produto orgânico,
como e por quem foi produzido, entre outras informações. Tais fatores têm levado a uma
maior atividade da APEX na relação com aquele país.
Para tanto, alguns produtores brasileiros se uniram, sob a supervisão da APEX, e
contrataram uma trading no Brasil para fazer o trabalho de adequação da embalagem,
rotulagem, desembaraço alfandegário etc. e entregar os produtos ao importador norte-americano.
Este agente é o responsável pela distribuição dos produtos orgânicos brasileiros aos pontos de
venda, geralmente o mercado do varejo dos grandes equipamentos – hiper e supermercados.
No caso da importação por países europeus, a estrutura de transação ocorre a
partir de grandes importadores, que consolidam os produtos e os distribuem para agentes
de outros mercados, como o de processamento, da distribuição e do varejo. Nestes países
não há interesse na marca brasileira. Os produtos são vendidos com a marca de um
produtor ou distribuidor local, já que os consumidores europeus valorizam a produção
orgânica local. Portanto, é mais difícil para a APEX ou produtores e processadores venderem
produtos com a marca brasileira naqueles países.
Entretanto, há situações em que as empresas brasileiras contratam tradings para
vender seus produtos orgânicos aos importadores europeus, como há também algumas
150
empresas que trabalham com representantes de vendas (da própria empresa ou não) para
tal. Esta é a situação da empresa paranaense Tozan, cujo carro-chefe é o soja, que negocia
diretamente com clientes internacionais. A empresa possui apenas um cliente em cada país
importador, dentre distribuidores, processadores e tradings.
Segundo declarações do proprietário da Tozan, os importadores europeus são
mais estáveis, tanto para a compra de soja para alimentação animal quanto para alimentação
humana. E menciona que a responsabilidade da empresa é entregar o produto até o porto do
país comprador e, a partir daí, o agente responsável (trading, processador ou distribuidor)
encarrega-se do produto. Tal situação implica uma rede de relações na qual os produtores
brasileiros nem sempre estão preparados para atuar, uma vez que exige que se diferencie a
transação de acordo com sua destinação, como é o caso do soja.
No caso dos EUA, o tipo de relação que a Tozan mantém é outra, sendo ela a
responsável pela entrega do produto até o comprador. Para auxiliar neste processo, a empresa
contrata uma trading ou distribuidor. No entanto, a empresa ressalta que o mercado de soja
orgânica nos EUA é altamente competitivo e os custos logísticos são muito elevados.
Com relação à negociação com o Japão, as vendas de soja pela empresa são
esporádicas, pois, segundo o entrevistado, o produto brasileiro perde em qualidade e preço para
o soja chinês. Dessa forma, afirma, a exportação para o Japão não é o foco para a Tozan.
Ainda com relação ao Japão, segundo se verificou na pesquisa, a entrada no país
dos produtos orgânicos ocorre, via de regra, por meio de uma trading. Além do selo
específico para o país (JAS), a trading também representa uma entidade creditadora para os
compradores japoneses. Para esses clientes não basta a certificação. Eles querem saber
como esta certificação é feita e são bastante sensíveis às questões relacionadas à saúde, e
principalmente às questões socioambientais.
Com essa perspectiva é que a empresa paranaense Café Terra Verdi, situada em
Curitiba, trabalha com aquele país via comércio justo. Além de exportar o café em grão,
também negocia o produto processado, com maior valor agregado, exportando o café
torrado, o verde, o moído e o solúvel. A empresa trabalha com o mercado japonês desde
1992, como processadora e como uma trading no Brasil. Trabalha a divulgação de seus
produtos com a estratégia "boca-a-boca", baseando-se na concepção de comércio justo,
produtos orgânicos e rastreabilidade.
Com outros países importadores a empresa atua como intermediadora (trading),
vende produtos fora do comércio justo, mas com certificação para produtos orgânicos, por
pressão dos produtores. No entanto, o dirigente da empresa ressalta que esta forma de
comercialização é pouco expressiva, e que o foco da empresa é o comércio justo (80%
das vendas).
151
4.4.3
Algumas Considerações sobre o Mercado Externo de Produtos Orgânicos
Durante a Conferência do Organic Trade Association (OTA), em maio de 2005,
em Chicago/EUA, vários empresários e consultores apontaram que a diferença entre o
preço do produto orgânico e o do convencional tende a se reduzir, ao passo que o preço dos
alimentos orgânicos embalados e processados ainda terá uma maior disparidade quando
comparado ao dos convencionais.
Empresas agroalimentares multinacionais já tendem a incorporar os produtos
orgânicos ao seu mix de produtos processados, por acreditarem que este é um mercado de
crescimento rápido. Ademais, a imagem desse produto ajusta-se ao compromisso da companhia
de nutrição e bem-estar. Essas empresas acreditam que os ingredientes orgânicos se tornarão
mais disponíveis, o custo declinará e a qualidade continuará a melhorar. O foodservice
ainda é um mercado restrito para alimentos orgânicos, mas este cenário tende a mudar. Em
alguns locais de Curitiba já existem restaurantes e cafés que servem especificamente alimentos
orgânicos, a exemplo do Restaurante Chauá e Terra Verdi Café.
Os analistas são cautelosos e avaliam que, no longo prazo, a indústria orgânica
terá um crescimento anual otimista, predizendo o crescimento dos mercados orgânicos em
torno de 20% no médio prazo (FAO, 2002). O crescimento da agricultura orgânica certificada
dependerá das relações que se estabelecerem nos próximos anos entre governos, produtores e
demais agentes envolvidos nas transações comerciais. Também são importantes os agentes
envolvidos nos processos de transformação, havendo o interesse crescente de várias
empresas nos produtos orgânicos, inclusive multinacionais. Além disso, há o papel relevante
e propulsor da sociedade, que cada vez mais se mostra interessada com a segurança
alimentar, sobretudo no que se refere aos efeitos negativos do uso de agrotóxicos, por
exemplo, nos sistemas de produção convencional.
O mercado orgânico certificado de alimentos compreende uma parte pequena,
mas crescente (1 a 2%, em 2003), do mercado total de alimentos. Segundo a Organização
das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação - FAO (2002), para 2010 o mercado
pode crescer até US$ 61-94 bilhões nos países com mercados orgânicos certificados, ou
entre 3,5 e 5% no mercado global de alimentos. Esta previsão pode ser maior se os
mercados orgânicos não-certificados forem incluídos. Se as vendas de produtos orgânicos
têm crescido rapidamente nos últimos anos devido às questões de segurança alimentar,
pode ser que taxas de crescimento mais lentas sejam mais prováveis de ocorrer a partir de
2010 (FAO, 2002).
Em países industrializados, a demanda por produtos orgânicos certificados deve
continuar a aumentar, talvez acima da taxa de crescimento de 20% registrada atualmente.
Entretanto, o crescimento futuro da agricultura orgânica certificada dependerá mais de
restrições no fornecimento do que de mudanças na demanda. A tendência, portanto, é de
152
que a demanda cresça mais rapidamente que o fornecimento desses produtos, mas esta
diferença pode ser equacionada com o ingresso de maior número de produtores no
processo produtivo, apoiados no processo de transição, na produção propriamente dita e,
posteriormente, nos processos que envolvem a comercialização dos produtos orgânicos.
De um modo geral considera-se que os países em desenvolvimento estão começando
a se beneficiar com as oportunidades do mercado de produtos orgânicos. Porém, sob as
circunstâncias atuais, não são os agricultores familiares mas sim os grandes produtores que
têm se mostrado mais estruturados para atuar nos mercados internacionais. Entretanto, o
que se verifica é que ainda é limitada a quantidade de produtos orgânicos brasileiros no
mercado externo, e é ainda menor a participação dos orgânicos do Paraná neste mercado.
Os principais limitantes parecem estar relacionados principalmente às exigências e padrões
impostos por aqueles países, bem como às normas que regulamentam os processos de
certificação em cada país importador. Cabe ao Brasil regulamentar rapidamente todo o
processo que envolve a agricultura orgânica, estimular e apoiar a produção, em particular
aquela já praticada pela agricultura familiar, incentivar e desenvolver novas formas de
processamento dos produtos orgânicos. Estes são apenas alguns dos desafios que se
colocam, mas que necessitam de ações rápidas e efetivas que envolvam todos os atores e
agentes interessados no mercado de produtos orgânicos.
4.5
O MERCADO INSTITUCIONAL: A AÇÃO DO ESTADO COMO UM AGENTE NO
MERCADO DE ORGÂNICOS
Neste estudo entende-se como mercado institucional aquele em que o Estado é
um agente fundamental no processo de comercialização de produtos agroalimentares, atuando
por meio de programas institucionais que operacionalizam políticas públicas voltadas à
"política de segurança alimentar e nutricional". É neste contexto que se apresentam a seguir
dois programas em que os produtos orgânicos têm sido comercializados dentro do mercado
institucional: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação
Escolar (PNAE).
Na atualidade, a comercialização de alimentos e produtos orgânicos pelo PAA no
Paraná é ainda pouco expressiva, não ultrapassando 5% do total da quantidade comercializada
pelo Programa. Contudo, como se verá mais adiante, além do expressivo potencial desse
tipo de mercado para aquisição de orgânico e ampliação do número de produtores, nele se
verificam processos de relações mercantis que se estabelecem para além dos aspectos
meramente econômicos, na medida em que envolve agricultores produtores, beneficiários
recebedores de alimentos, entidades e instituições intervenientes e o próprio Estado, na
gestão sociopolítica do programa.
153
Com relação ao Programa de Alimentação Escolar, as informações disponíveis
mencionam que, em 2006, cerca de 5% dos alunos paranaenses foram atendidos com
alimentos orgânicos nas escolas da rede pública. Embora ainda seja incipiente em termos
de valores, o fundamental são as potencialidades desta política pública para a produção
orgânica, estimulando a interação e/ou participação dos agricultores nos Conselhos de
Alimentação Escolar (CAE), instituídos em cada município, a fim de garantir a aplicação
obrigatória de 70% dos recursos transferidos pelo governo federal na aquisição exclusiva de
alimentos e produtos básicos semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos
alimentares regionais e a vocação agrícola do município, fomentando o desenvolvimento da
economia local.
O que se considera importante destacar, no que se segue, é a relevância do
mercado institucional para a comercialização da produção de orgânicos dos agricultores
familiares paranaenses, ao mesmo tempo em que se estreita a relação social entre esses
agentes, o Estado e demais atores da sociedade civil, visando atender parcelas da
população em vulnerabilidade alimentar e/ou nutricional.
4.5.1
Programa de Aquisição de Alimentos - PAA
O Programa de Aquisição de Alimentos é um instrumento de política pública,
instituído pelo artigo 19 da Lei n.o 10.696, de 2 de julho de 2003, e regulamentado pelo
Decreto n.o 4.772, de 02 de julho de 2003, o qual foi alterado pelo Decreto n.o 5.873, de 15
de agosto de 2006. Foi definido no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS), e constitui uma das ações que compõem o Programa Fome Zero
(PFZ), instituído em outubro de 2001, considerado prioridade do atual governo federal.
A implementação do PAA é realizada por um Grupo Gestor coordenado pelo MDS
e composto, ainda, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)
e Ministério da Fazenda. A coordenação do Programa está sob a responsabilidade do MDS
e do MDA, e é executado pelos governos estaduais e municipais e, em âmbito federal, pela
Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), órgão do MAPA.
Segundo o MDS, o Programa de Aquisição de Alimentos tem como objetivos:
garantir o acesso aos alimentos em quantidade, qualidade e regularidade necessárias às
populações em situação de insegurança alimentar e nutricional e promover a inclusão
social no campo por meio do fortalecimento da agricultura familiar.
Os alimentos adquiridos pelo Programa são destinados às pessoas em situação de
insegurança alimentar e nutricional, atendidas por programas sociais locais e demais
cidadãos em situação de risco alimentar, como indígenas, quilombolas, acampados
da reforma agrária e atingidos por barragens.
154
A CONAB tem a tarefa de executar ações do PAA, por ser a empresa pública
responsável pelo abastecimento agroalimentar e por dispor de unidades em todas as
regiões do Brasil. Através do Programa a CONAB compra produtos da agricultura familiar
"de maneira rápida e descomplicada" e os encaminha aos grupos sociais em situação de
insegurança alimentar e nutricional.
Os mecanismos do PAA têm sido considerados como um programa relevante para
o agricultor familiar, particularmente aquele com limitações para a comercialização da sua
produção, possibilitando que acesse um tipo de mercado, neste caso o institucional.
Segundo informações obtidas junto à CONAB, "ao comprar a produção familiar, o
governo assegura preço remunerador aos produtos, gera renda ao agricultor [...] permite
valorizar o produto regional, dinamizar a produção nas diversas regiões, resgatar a cidadania,
preservar o meio-ambiente e a cultura gastronômica local". A aquisição de alimentos pelo
PAA é efetuada como segue:
- com isenção de licitação;
- são definidos preços de referência, que não podem ser superiores nem
inferiores aos praticados nos mercados regionais;
- o limite atual é de R$ 3.500,00 ao ano por agricultor familiar que se enquadre
no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),
exceto na modalidade Incentivo à Produção e Consumo do Leite, cujo limite é
semestral.
A aquisição dos produtos pelo PAA é praticada segundo quatro modalidades:
Compra Direta da Agricultura Familiar (CDAF); Compra Antecipada Especial da Agricultura
Familiar (CAEAF); Compra Antecipada da Agricultura Familiar (CAAF); e Compra Direta Local
da Agricultura Familiar (CDLAF).
Para operacionalizar a modalidade CDLAF são estabelecidos convênios entre o
Ministério do Desenvolvimento Social e as administrações municipais e os governos
estaduais. As demais modalidades são operacionalizadas pela CONAB sem a participação
de mediadores ou intermediários, em que a aquisição da produção se dá com base nos
preços de referência, segundo a avaliação baseada nos mercados locais e regionais.
Mattei (2006) destaca, em recente estudo, o impacto do programa:
a lei que instituiu o PAA também desburocratizou o processo de aquisição de produtos
da agricultura familiar para o atendimento aos programas públicos, dispensando as
regras de licitação requeridas pela Lei 8.666, de 1993. Com isso, se criou um marco
jurídico capaz de possibilitar a presença mais efetiva do Estado no apoio a processos de
comercialização desenvolvidos por esta categoria específica de produtores.
No Estado do Paraná a operacionalização do PAA é realizada tanto pela ação
direta da CONAB/PR como por meio de um convênio específico celebrado em 2003 entre o
Governo do Estado e o Ministério do Desenvolvimento Social, para implementação e execução
155
das ações da modalidade CDLAF. Este convênio entre o nível federal e o estadual constituiuse como um projeto-piloto, inicialmente envolvendo dois estados – Paraná e Piauí –, sendo
que em 2005 este projeto foi ampliado para os Estados do Tocantins, Rio Grande do Norte e
Santa Catarina.
A coordenação estadual do PAA no Paraná é realizada pela Secretaria Estadual
do Trabalho, Emprego e Promoção Social (SETP), Secretaria de Estado da Agricultura e
Abastecimento (SEAB), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), Central
de Abastecimento (CEASA) e Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional
(CONSEA-PR). Os executores do Programa no Estado são as associações de utilidade pública
com apoio das prefeituras, CONSEA-PR e CEDRAF-PR.
Dentro da SETP quem coordena o Programa é a Coordenadoria de Programas
Especiais de Enfrentamento à Pobreza (CPEEP), que, com recursos do governo federal, faz a
compra de alimentos produzidos por agricultores familiares enquadrados no PRONAF (DAP Declaração de Aptidão do Pronaf - do A ao D), também de agroextrativistas, quilombolas,
famílias atingidas por barragens, trabalhadores rurais assentados, comunidades indígenas.
Os alimentos adquiridos são doados simultaneamente para instituições sociais,
consideradas beneficiárias consumidoras. Essas instituições devem possuir o Cadastro
Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) e desenvolver trabalhos publicamente reconhecidos de
atendimento às populações em situação de risco social, prioritariamente: creches, asilos,
hospitais, associações beneficentes, cozinhas comunitárias, bancos de alimentos, APMs das
escolas municipais e estaduais, entre outros.
Segundo técnicos das duas instituições que operacionalizam o PAA no Estado do
Paraná – CONAB/PR e CPEEP/SETP –, embora o PAA também atue junto aos agricultores
familiares que praticam a agricultura orgânica e remunere de forma diferenciada os produtos,
com 30% a mais, é ainda insignificante a quantidade adquirida, que não ultrapassa 5% do
total dos produtos adquiridos no Estado.
Segundo dados da CPEEP/SETP, o PAA no Paraná tem tido um crescimento
significativo nos três anos de atuação. Em abril de 2004, o Programa iniciou com 41
municípios participantes, um recurso disponível de 5 milhões de reais e um investimento de
1,7 milhão de reais. Naquele ano eram 943 agricultores fornecedores, 341 entidades
beneficiadas e mais de 96,5 mil pessoas atendidas.
Em 2006 esses números cresceram expressivamente. Os recursos disponíveis
passaram para 6 milhões de reais. A expectativa é de se atingir 210 municípios, com
previsão de que mais de 6.000 famílias agricultoras sejam fornecedoras, atendendo a cerca
de 3.000 entidades beneficiadas que, por sua vez, atendem aproximadamente 650 mil
pessoas, segundo informações obtidas junto à SETP.
Como se mencionou anteriormente, segundo os técnicos envolvidos na execução
do PAA no Paraná a participação dos produtos orgânicos não ultrapassa os 5% do total de
156
alimentos e produtos adquiridos, embora tenham um valor diferenciado em até 30% dos
produtos convencionais. Entretanto, os dados disponíveis não permitem que se identifique o
número de agricultores familiares orgânicos que são fornecedores, onde estão situados, quais
os produtos orgânicos que são adquiridos, tampouco quais as quantidades comercializadas.
Contudo, é interessante considerar que, dentre os 20 principais alimentos e
produtos adquiridos pelo PAA no primeiro semestre de 2006 (quadro 4.7), verifica-se que há
um enorme espaço para que muitos deles venham a ser adquiridos dos agricultores
orgânicos do Paraná, pois praticamente todos os produtos mencionados, como se vê a
seguir, também são produzidos pelo sistema da agricultura orgânica, tanto os alimentos in
natura como os transformados, em praticamente todas as grandes regiões envolvidas na
pesquisa para este estudo.
QUADRO 4.7 - PRINCIPAIS PRODUTOS COMERCIALIZADOS NO
PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS/COMPRA
DIRETA NO PARANÁ - PRIMEIRO SEMESTRE DE 2006
PRODUTOS
QUANTIDADE
(kg)
Arroz
225.216
Feijão
208.667
Carne de frango
30.173
Carne de gado
175.504
Carne de porco
45.286
Peixe
Verduras e legumes
7.442
1.283.026
Frutas
821.346
Milho verde
121.945
Açúcar mascavo
14.986
Mel
26.229
Melado de cana
Polpa de fruta
8.127
17.423
Queijo
6.240
Doce de leite
8.547
Doce de frutas
Conservas
23.509
2.138
Bolacha caseira
71.182
Macarrão caseiro
24.092
Cuca
23.923
FONTE: Informativo (n.25, 2006)
Embora se saiba que a produção da agricultura orgânica é ainda limitada, tanto em
número de agricultores envolvidos no processo produtivo como em termos da quantidade
produzida, o mercado institucional constitui um ambiente importante em termos de construção
social de mercado, uma vez que envolve diretamente os próprios agricultores e suas
organizações, agentes do Estado e parcelas da população urbana. Esta condição pode ser
verificada em recente evento de avaliação do PAA, promovido pela CONAB, realizado em
abril de 2006, em Curitiba (Apêndice 5).
157
4.5.2
Programa de Alimentação Escolar: a merenda orgânica
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é um dos instrumentos da
política de segurança alimentar e nutricional voltados a atender à população escolar. Seu
objetivo é "atender às necessidades nutricionais dos alunos durante sua permanência em
sala de aula, contribuindo para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem e o
rendimento escolar dos estudantes, bem como a formação de hábitos alimentares saudáveis"
(BRASIL, 2006b). É considerado um dos maiores programas na área de alimentação escolar
no mundo e é o único com atendimento universalizado.
A alimentação escolar, comumente denominada merenda escolar, visa suprir,
parcialmente, as necessidades nutricionais da população escolar. Para tanto, o Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que operacionaliza o programa, transfere recursos
financeiros aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios, em caráter suplementar, para que
estes façam a aquisição de alimentos que compõem a alimentação escolar.
O Programa foi instituído em 1955, pelo Decreto n° 37.106, através da Campanha de
Merenda Escolar (CME), subordinada ao Ministério da Educação, passando a se denominar,
no ano seguinte, Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), com a intenção de
promover o atendimento em âmbito nacional, e somente em 1979 passou a se chamar
Programa Nacional de Alimentação Escolar. A partir da promulgação da Constituição Federal, em
1988, é que efetivamente ficou assegurado o direito a todos os alunos do ensino fundamental
à alimentação escolar, por meio de programa suplementar oferecido pelos governos federal,
estaduais e municipais.
A execução do programa era centralizada até 1993, o que dificultava a aquisição
de alimentos e produtos diretamente pelas escolas, municípios e/ou estados. Era o órgão
gerenciador que planejava os cardápios, adquiria os gêneros alimentícios (através de
licitação), controlava a qualidade dos alimentos e fazia a distribuição destes em todo o
território nacional.
A descentralização só ocorreu em 1994 (Lei n.o 8.913, de 12/7/94), com os recursos
sendo repassados para os municípios, através de convênios, e com o envolvimento das
secretarias de educação dos estados e do Distrito Federal, para atendimento dos alunos
das suas redes e das redes municipais das prefeituras que não haviam aderido à descentralização. Em 1998 mais de 70% dos municípios brasileiros tinham aderido à descentralização,
e com a gerência do Programa pelo FNDE o repasse de recursos passou a ser feito diretamente aos municípios e secretarias de educação, sem convênios ou quaisquer outros
instrumentos similares.
Contudo, foi entre 2000 e 2001, quando ocorrem duas importantes mudanças no
PNAE, que efetivamente se abrem as condições para que os alimentos orgânicos fossem
incorporados à pauta da alimentação escolar. A partir daí novas relações sociais se
estabelecem neste mercado institucional, permitindo processos de negociação no nível local
e entre atores diretamente interessados.
158
A primeira mudança deu-se em 2000, com a instituição do Conselho de
Alimentação Escolar (CAE) em cada município brasileiro. Tal fato é considerado uma
conquista, uma vez que o conselho é formado por membros da comunidade, professores,
pais de alunos e representantes dos poderes Executivo e Legislativo, como um órgão
deliberativo, fiscalizador e de assessoramento para a execução do programa.
A segunda mudança resultou da Medida Provisória n.o 2.178, de 28/6/2001
(reedição da MP anterior), que determinou a obrigatoriedade de que 70% dos recursos
transferidos pelo governo federal sejam aplicados exclusivamente na aquisição de alimentos
e produtos básicos semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos alimentares
regionais e a vocação agrícola do município, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento
da economia local.
Além do PNAE, no Estado do Paraná também há o Programa Estadual de Alimentação Escolar (PEAE), que vem acompanhando as mudanças instituídas em nível nacional.
Criado em 1983, é operacionalizado pelo Instituto de Desenvolvimento Educacional
do Paraná (FUNDEPAR), de duas formas: 1) municipalização parcial - o município recebe os
alimentos da FUNDEPAR e os distribui às escolas estaduais, e recebe recursos para atender
às escolas municipais e filantrópicas; 2) municipalização integral - o município recebe o
recurso, planeja, executa a aquisição e a distribuição dos gêneros alimentícios, acompanha
o recebimento, a distribuição às Escolas Municipais, Estaduais e Filantrópicas (quando for o
caso), conforme guia emitida pela Prefeitura. Cabe à FUNDEPAR fazer o acompanhamento
mediante análise de relatórios e supervisões às escolas, promovendo ações complementares
ao Programa Merenda Escolar.
Em 2001 instituiu-se o Conselho Estadual de Alimentação Escolar (CEAE), com
representantes do poder executivo, legislativo, professores, pais e outros segmentos da sociedade,
como um órgão deliberativo, fiscalizador e de assessoramento para a execução do programa.
Embora não se disponha de dados precisos sobre alimentação escolar orgânica no
Estado do Paraná, o que se sabe é que foi a partir de 2001, com as mudanças mencionadas,
que alguns municípios71 implementaram a merenda orgânica. Entretanto, em muitas situações,
tanto no Paraná como nos demais estados, a decisão de instituir a merenda orgânica tem se
caracterizado muito mais como ato de governo do que como política de Estado. O resultado
tem sido a descontinuidade das ações na direção de aperfeiçoar os mecanismos relativos ao
processo, ao mesmo tempo em que, para os agricultores, isto resulta em prejuízos monetários e
em desconfiança com relação a programas similares.
Os dados mais atualizados para o Estado referem-se àqueles divulgados para os anos
de 2005 e 2006, para o Projeto Escola Cidadã, gerenciado pelo Instituto de Desenvolvimento
Educacional do Paraná (FUNDEPAR). Este projeto prevê o atendimento e repasse de
71 Ver Apêndice 6 deste estudo, extraído do artigo de Darolt (2002b), onde se aborda a experiência de implantação
do programa de merenda orgânica no município de Palmeira/PR, que atualmente não existe mais.
159
recursos financeiros às escolas da rede estadual, através de um fundo rotativo, em duas
situações, sendo que uma delas é a que interessa destacar neste projeto, qual seja:
- repasse para 311 municípios com estabelecimentos de ensino atendidos pelo Programa
Estadual de Alimentação Escolar, para a aquisição de alimentos in natura, preferencialmente cultivados por métodos orgânicos, de forma a promover práticas
alimentares saudáveis através da inclusão de gêneros perecíveis. [grifo nosso]
É importante destacar, para efeito deste projeto, que, dentre os objetivos
propostos, está o de "tornar o estado do Paraná referência na distribuição de merenda
agroecológica", além de visar:
- incrementar a economia local, através da aquisição de gêneros cultivados pelo
pequeno produto;
- incentivar a implantação de hortas escolares com técnicas agroecológicas;
- estimular e organizar a agroecologia no estado.
Para poder alcançar esses objetivos, o Projeto previu, para 2006, a ampliação do
atendimento com a merenda agroecológica de 45 mil crianças (em 2005) para 75,7 mil
crianças, de 185 escolas, em 24 municípios. Estima-se que os alimentos e produtos
envolverão pelo menos 350 propriedades de agricultores familiares.
Embora não se disponha de dados para confirmar a previsão do início de 2006,
caso esta se confirme o atendimento passará de 5% de alunos/dia com merenda orgânica
para mais de 9% (atualmente são cerca de 830 mil crianças/dia atendidas com alimentação
escolar, em 320 municípios do Paraná). Se se confirmar tal fato, caberá conhecer os efeitos de
tal ação sobre a produção de alimentos e produtos orgânicos, bem como sobre o incremento
no número de agricultores, além de estudar com mais profundidade como se estabeleceram
as relações comerciais entre os agentes envolvidos.
Dentre os alimentos e produtos que compõem a pauta alimentar72, vários são
produzidos pelos agricultores orgânicos no Paraná. Para se ter uma idéia dos produtos e da
dimensão que envolve este mercado, relacionam-se, a seguir, os alimentos e produtos (não-
72 Segundo dados da FUNDEPAR (2006), atualmente os gêneros que fazem parte da pauta são: achocolatado
em pó, açúcar cristal, almôndega bovina, amido de milho, arroz, bebidas lácteas, biscoito coco ou leite,
biscoito cream craker/água e sal, biscoito tipo "it sal", biscoito Maisena, biscoito Maria, biscoito rosquinha,
biscoito recheado, biscoito sortido, biscoito wafer, carne bovina em cubos, carne de frango ao molho, carne
moída, carne suína, cereais de milho enriquecido com ferro, chá-mate, charque bovino, ervilha em conserva,
extrato de tomate, farinha de milho, feijão carioca e preto, fubá de milho comum, leite em pó integral,
macarrão espaguete, macarrão padre-nosso, conchinha ou letrinha, macarrão parafuso, milho para canjica,
milho verde em conserva, mistura para preparo de molho à bolonhesa, mistura para preparo de picadinho,
mistura para preparo de sopa (diversos sabores), óleo de soja, pão de mel, pescado em conserva, preparado
para refresco, sagu, sal refinado iodado, salsicha Viena e tempero em pó.
160
orgânicos) adquiridos no ano de 2006, e a respectiva quantidade: carne bovina - 145 toneladas;
carne de frango - 115 t; carne suína - 105 t; charque bovino - 82 t; pescado - 75 t; fubá (farinha
de milho) - 92 t; milho de canjica - 64 t; feijão carioca - 155 t; feijão preto - 58 toneladas.
Segundo informações da responsável pelo Projeto na FUNDEPAR, também fazem
parte da pauta as hortaliças, arroz e chá-mate, podendo ser acrescidos outros produtos locais,
desde que sejam realizados os procedimentos legais necessários para tanto.
Esse talvez seja um dos principais entraves para os agricultores familiares estabelecerem relações nesse mercado institucional, uma vez que a aquisição de alimentos e produtos
para o Programa de Alimentação Escolar é feita normalmente por meio de procedimentos
licitatórios, os quais exigem que os participantes sejam pessoas jurídicas, situação nem
sempre adequada aos agricultores, com exceção daqueles que estão mais organizados, via
de regra em cooperativas, já prevendo situações desta ordem.
Recente estudo73 sobre esse mercado tem mostrado um esforço de desburocratização
por parte do poder público de muitos municípios. Como exemplo pode-se citar o fato de os
editais de licitação especificarem a aquisição por produto e não por pauta, uma vez que
empresas que participavam desse mercado entravam com mandato de segurança ou
qualquer processo de contestação legal sobre um produto, trancando todo o processo.
Outra medida para a simplificação do processo de aquisição tem sido o uso de instrumentos
como carta-convite ou nota do produtor, quando o valor é inferior ao limite mínimo
propugnado pela Lei de Responsabilidade Fiscal n.º 8.666, de 21/06/93 (em 2004 este valor
era inferior a R$ 8.000,00).
Por fim, cabe mencionar que o Programa Nacional da Alimentação Escolar, bem
como o Programa do Estado do Paraná, ampliaram, desde 2003, o benefício da merenda
escolar para creches públicas e filantrópicas e alunos das comunidades indígenas e, em 2005,
passaram a contemplar também os estudantes matriculados em escolas localizadas em
comunidades quilombolas. Além disso, nestes últimos dois anos foram efetuados reajustes
significativos no valor da merenda escolar. Atualmente o valor é de R$ 0,22 por aluno/dia do
ensino fundamental e da pré-escola, bem como para crianças de creches e instituições
filantrópicas; para os estudantes indígenas e quilombolas o valor é de R$ 0,44 aluno/dia. Para
2006, o orçamento do programa foi de R$ 1,5 bilhão, para atender 37 milhões de alunos
brasileiros. No Paraná, a previsão total do PEAE é de atender a 830 mil alunos/dia de 1.863
estabelecimentos, em 320 municípios, com um orçamento de R$ 3 milhões.
73 Estudo realizado pela AOPA, em 2004, com o título Um Olhar sobre a Alimentação Escolar Ecológica no Sul
do Brasil, com recursos da Secretaria da Agricultura Familiar e Ministério do Desenvolvimento Agrário.
161
Diante desse quadro é possível visualizar um amplo cenário positivo para os
produtos orgânicos no mercado institucional, em ambos os programas – PAA e PNAE/PEAE,
influenciando positivamente nas possibilidades de comercialização da produção. Como
decorrência poderão ser estimuladas a produção e ampliação no número de agricultores,
promovendo, além disso, um importante espaço de aprendizado para os agricultores e
demais agentes envolvidos neste mercado no sentido de estabelecerem, em conjunto, não
só valores, mas procedimentos para as transações. Tem-se, ainda, o aspecto positivo de se
atender com qualidade, pela oferta de alimento orgânico, populações em situação de risco
alimentar e nutricional.
4.5.3
Algumas Considerações sobre o Mercado Institucional
As informações apresentadas até aqui mostraram o papel relevante que o Estado vem
tendo como agente no mercado institucional, não necessariamente como um comercializador
direto, mas propiciando que se simplifiquem os procedimentos em programas onde há comercialização de alimentos e produtos orgânicos, como é o caso do PAA e do PNAE. Mais que isso,
o que se pode verificar é que a definição de uma política pública voltada à segurança
alimentar e nutricional, além de ter como público central as populações em risco alimentar,
também é capaz de articular atores sociais no campo da produção, por vezes com limitações
para se relacionar com outros tipos de mercado, ou, ainda, que prioriza a ação num tipo de
mercado como o institucional.
A análise sobre os dois programas evidenciou que a participação dos orgânicos é
incipiente. Contudo, em ambos, o potencial de crescimento e consolidação para a comercialização
desses alimentos e produtos é muito amplo. Como se verificou, trata-se de um mercado que
permite que os alimentos sejam vistos não só como produtos, mas inseridos num contexto de
proximidade entre o ambiente da produção e do consumo, em que os processos produtivos são
melhor conhecidos e interligados a outras questões locais e regionais, como as ambientais, as
sociais, as culturais e as referentes ao desenvolvimento econômico.
Ademais, esse tipo de mercado é importante como espaço de aprendizado na
construção de relações sociomercantis, uma vez que nele estão envolvidos muitos agentes,
exigindo acordos entre as partes, ajustes de procedimentos etc., situação que favorece os
produtores de orgânicos e aprimora a própria ação do Estado e a definição de novas
políticas públicas para os alimentos e produtos orgânicos.
162
4.6
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS AGENTES QUE ATUAM NO MERCADO DE
ORGÂNICOS NO PARANÁ
O mapa 5, a seguir, mostra a situação atual dos agentes envolvidos no desen-
volvimento da agricultura orgânica no Estado, no qual se pode perceber que a concentração
dos agentes ocorre no Oeste, Sudoeste e na RMC/Litoral, sendo pouco expressiva nas
demais macrorregiões.74
Quanto às feiras orgânicas, chama a atenção a quantidade destas existente nas
macrorregiões Centro-Sul, Oeste e Sudoeste. No Norte e Noroeste do Estado ainda é
pequeno o número de feiras desse tipo.
As associações estão presentes nas regiões onde se mantém o trabalho das
ONGs no desenvolvimento da agricultura orgânica.
As empresas que comercializam ou exportam grãos orgânicos estão localizadas
estrategicamente na região próxima ao Porto de Paranaguá.
Observa-se, ainda, que o serviço de assistência técnica e extensão rural para
produtos orgânicos está presente em quase todas as macrorregiões do Estado, havendo
ainda algumas regiões onde não se constatou atividade ligada à agricultura orgânica.
74 O mapa foi elaborado a partir das informações constantes do Cadastro de Agentes de Comercialização e de
Apoio, que pode ser consultado no Apêndice 7 deste estudo.
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164
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS – SUGESTÃO DE DIRETRIZES E POLÍTICAS PÚBLICAS
O objetivo do presente estudo foi identificar e caracterizar o mercado dos produtos
orgânicos no Estado do Paraná, segundo os principais tipos de mercado e agentes de
comercialização que nele atuam, visando subsidiar a formulação de políticas públicas de
ciência e tecnologia para o desenvolvimento do setor.
A oportunidade desta investigação decorre do fato de se reconhecer que, no
cenário atual, é crescente a demanda por alimentos orgânicos, decorrente da busca por mais
qualidade de vida e por sustentabilidade ambiental, econômica e social. Os alimentos "limpos e
saudáveis" da agricultura orgânica destacam-se nesse contexto, pela exigência de cuidados
específicos às questões ambientais no sistema de produção, pela qualidade nutricional dos
alimentos, bem como pela importância social que se confere à agricultura familiar como
principal produtora de tais alimentos.
O Estado do Paraná tem sido pioneiro no País com relação à agricultura orgânica.
Desde os anos de 1970, tanto iniciativas de instituições públicas, de organizações nãogovernamentais e de movimentos sociais, como também da iniciativa privada, têm contribuído
principalmente no estímulo e apoio técnico à produção de orgânicos no Estado. Embora os
dados sobre a produção sejam frágeis e precariamente sistematizados, acredita-se que no
Paraná concentra-se o maior número de famílias produtoras de orgânicos do País, cultivando
uma ampla diversidade de produtos, segundo as características socioambientais das regiões
onde estão inseridas.
No decorrer destes últimos anos, a maior parte das iniciativas das instituições públicas
e organizações não-governamentais tem sido direcionada à esfera da produção, visando
apoiar e estimular o processo de conversão do sistema convencional para o sistema de produção
da agricultura orgânica. Contudo, no ambiente da comercialização, isto é, no mercado dos
produtos orgânicos, as iniciativas têm se restringido aos próprios agentes envolvidos, sendo
ainda precário o conhecimento sobre quem são efetivamente os agentes, como se organizam
e quais os tipos de mercado em que atuam.
O poder público, em particular, tem se mantido à distância da esfera do mercado,
com intervenções voltadas às questões legais e normativas que envolvem a agricultura
orgânica, seja nos aspectos referentes ao processo produtivo seja com relação à certificação.
Entretanto, há uma preocupação recente do Estado em contribuir para o desenvolvimento
do mercado de orgânicos, estimulando a formulação de algumas políticas públicas, sendo
esta uma das razões deste estudo, a saber, oferecer subsídios para que haja políticas
específicas, em particular no âmbito da ciência e tecnologia.
Com base nesse cenário é que se desenvolveu este estudo, em que se assumiu
como norteadora da análise a concepção do mercado como resultado de relações sociais,
165
desencadeadas por agentes envolvidos nos processos de transações mercantis. Esta perspectiva
insere-se na abordagem proposta pela Nova Sociologia Econômica (NSE), que vê o mercado
como uma construção social e não como um ambiente de domínio meramente econômico.
Um dos autores da NSE, Pierre Bourdieu (2005), ligado à abordagem políticocultural, sugere que os estudos sobre o mercado devem ser pesquisados como um campo
de ação, ou seja, um lugar onde há agentes sociais concretos, onde há situações históricas
específicas, onde há disputas políticas para garantir estruturas. Destaca ainda que o Estado
tem um papel relevante, pois, como diz o autor,
a competição entre as empresas assume freqüentemente a forma de competição
para o poder sobre o Estado – notadamente, sobre o poder de regulamentação e
sobre os direitos de propriedade – e para as vantagens asseguradas pelas
diferentes intervenções do Estado (BOURDIEU, 2005, p.41).
Partindo dessa perspectiva, buscou-se tratar o mercado de produtos orgânicos no
Paraná como um campo de ação, procurando entender como este campo se constituiu
histórica e socialmente. Além disso, procurou-se verificar qual o papel que a agricultura
familiar desempenha neste mercado, ator fundamental na produção orgânica no Estado,
atuação, porém, pouco conhecida nos processos de comercialização.
A principal constatação deste estudo é que no Estado do Paraná o mercado de
orgânicos é um campo de ação que não possui uma estrutura hegemônica. Diferentemente
disso, está organizado em diferentes tipos de mercado, quais sejam: mercado da venda direta,
mercado do varejo, mercado da transformação, mercado externo e mercado institucional.
Essa situação é muito positiva para a agricultura familiar e para a ação do Estado,
na implementação de diretrizes, políticas, programas e ações diferenciadas, apoiando a
perspectiva de construção social de mercado, segundo os tipos de mercado, reforçando
estratégias apoiadas em relações sociais existentes ou a se constituírem.
A seguir apresenta-se a síntese dos resultados para cada um dos mercados de
orgânico estudados, apontando para possíveis diretrizes e políticas públicas.
Mercado da Venda Direta
Os resultados deste trabalho mostraram que o mercado da venda direta estruturase a partir de dois agentes, de um lado o agricultor familiar – produtor e comerciante – e de
outro o próprio consumidor. As transações mercantis dão-se por meio das relações face a face,
sendo a feira o principal canal de comercialização neste mercado, embora incipientemente
se verifique iniciativa de entrega de sacolas e venda direta na propriedade.
Este tipo de mercado orgânico é o mais antigo no Paraná. Começou a se
estruturar no final de 1980, em Curitiba, e sua oficialização na cidade ocorreu em meados
de 1990, com a inauguração da "Feira Verde".
166
O estudo de campo mostrou que as feiras podem ser caracterizadas segundo três
tipos: as feiras orgânicas, as feiras agroecológicas e as feiras mistas. O que diferencia as
feiras orgânicas das agroecológicas é a certificação. No primeiro caso, todos os produtores
e barracas exibem um selo de certificação, seja por auditagem ou pelo sistema de garantia
participativa. Nas feiras agroecológicas pode ou não ser exibido um selo de certificação
(caso haja, é o da Rede Ecovida de Certificação Participativa), pois a principal garantia é
firmada pela relação de confiança estabelecida entre o agricultor e o consumidor. As feiras
mistas são aquelas que originariamente comercializavam produtos convencionais e, com o
passar do tempo, foram agregando barracas que comercializam produtos orgânicos, sejam
eles certificados com selo ou tenham a garantia do produtor.
Embora os três tipos de feira ocorram em vários municípios do Paraná, é em
Curitiba que predomina a feira orgânica. Atualmente existem seis espalhadas em vários bairros,
e mais duas estão previstas para o ano de 2007. Nas cidades de menor porte predominam as
feiras agroecológicas, em razão da proximidade física e social entre agricultor e consumidor.
As feiras mistas predominam nas cidades de porte médio, a exemplo de Maringá.
A pesquisa mostrou que, nas feiras, os principais produtos comercializados são os
produtos in natura, do grupo das hortaliças, notadamente as folhosas. Também se ofertam grãos,
produtos de lavoura temporária, frutas e produtos transformados, desde os beneficiados aos
processados, embora em menor quantidade e diversidade, havendo uma grande demanda
por estes produtos pelos consumidores.
Em todas as feiras a grande maioria dos produtos vem da produção dos próprios
agricultores, que são também os comerciantes nas barracas, ou do grupo de agricultores
aos quais estão ligados. Verificou-se também que há intercâmbio de produtos de outras
regiões e de agricultores e/ou associações do Paraná e demais estados do sul do País, que
são comercializados nas barracas.
Outro aspecto que merece destaque neste tipo de mercado é o perfil do consumidor
de produtos orgânicos. O estudo mostrou que o consumidor da feira orgânica, em particular
em Curitiba, tem renda acima de 10 salários mínimos, possui formação de 3.o grau, muitos
são profissionais autônomos e a maioria são mulheres. A principal motivação de consumo é
a saúde da família e o meio ambiente. Entretanto, embora a maioria conheça o agricultor
comerciante, pouco sabe do seu papel como ator fundamental para a expansão deste tipo
de mercado, bem como para a própria agricultura orgânica.
O estudo mostrou também que em municípios onde ocorre a articulação entre os
diferentes atores ligados a esse mercado, a possibilidade de este se estruturar e fortalecer é
maior. Esta situação é visível na cidade de Curitiba, onde se verifica uma estreita interação
entre o poder público municipal, por meio da Secretaria de Abastecimento, entidades nãogovernamentais, como a AOPA, organizações de agricultores dos municípios produtores e
participantes da feira, bem como a associação de consumidores, a ACOPA. O resultado
167
desta ação integrada aparece quando se constata que em dez anos o número de feiras
expandiu-se significativamente: de 1 feira, em 1995, hoje já funcionam 6, com a projeção de
mais 2 para janeiro de 2007.
A partir desses resultados, são apontadas, a seguir, diretrizes e orientação de
políticas públicas para o fortalecimento do mercado da venda direta no Paraná.
ƒ
Diretriz
- Promover apoio institucional ao mercado da venda direta de produtos
orgânicos.
ƒ
Sugestões de Políticas Públicas
- estimular e apoiar financeiramente (custeio e investimento) a criação e
melhoria de estruturas de comercialização do mercado da venda direta em
todas as regiões do Paraná, em particular feiras orgânicas e agroecológicas,
mas também estruturas locais como mercados públicos e outras;
- desenvolver e implementar programas de formação e capacitação em
gestão para comercialização, logística e distribuição para associações de
agricultores familiares;
- estruturar uma rede de informações – eletrônica ou de tipo acessível –,
destinada ao intercâmbio de produtos orgânicos das diferentes regiões do
Paraná, para a comercialização no mercado da venda direta;
- apoiar e estimular a diversificação da produção para o abastecimento do
mercado da venda direta, segundo as características regionais, com
destaque para sistemas de produção animal, fruticultura e transformados;
- apoiar estudos e pesquisa sobre o mercado da venda direta, segundo as
particularidades dos sistemas de produção de cada região.
ƒ
Sugestões para ações específicas
- ampliar o espaço das feiras orgânicas em municípios onde já ocorrem,
como Curitiba, Maringá e União da Vitória, com a participação ativa dos
governos municipais em articulação interinstitucional com outros atores;
- apoiar a abertura de Mercados Municipais de Orgânicos fixos, possibilitando a
compra durante toda a semana em regiões metropolitanas do Paraná (por
exemplo, Curitiba);
- apoiar a abertura de boxes fixos de associações em mercados públicos,
notadamente em municípios de menor porte (a exemplo de União da Vitória);
- apoiar a implantação de lojas de associações, mantidas pelas prefeituras e
associações (por exemplo, ACEMPRE, em Marechal Cândido Rondon, Pato
Bragado e Missal);
- criar uma marca social que identifique os produtos orgânicos e os pontos de
venda direta (como barracas de bambu nas feiras orgânicas de Curitiba);
168
- apoiar mecanismos de garantia/certificação do produto orgânico, oferecendo
garantias ao consumidor na venda direta (a exemplo da Secretaria Municipal
de Agricultura e Abastecimento de Curitiba);
- apoiar a realização de eventos para uma agenda de discussão das restrições
e oportunidades na venda direta, sobretudo em feiras.
Mercado do Varejo
O estudo mostrou que a comercialização de produtos orgânicos no mercado do
varejo é muito recente em todo o Paraná, tendo se iniciado de maneira mais estável a partir
de 2000, e os dois principais canais de comercialização que atuam nas vendas dos produtos
são as redes de supermercados e as lojas especializadas, situadas na sua maioria em
Curitiba, com o predomínio das redes de supermercados.
No interior do Estado verificou-se que a presença de tais agentes e do próprio
mercado do varejo é bem menos relevante. A situação excepcional que se verificou foi na região
Oeste, no município de Marechal Cândido Rondon, onde os produtos orgânicos são comercializados pelo mercado do varejo. Entretanto, trata-se de um supermercado local, vinculado a uma
cooperativa de agricultores. No caso de lojas especializadas, no interior só foram identificadas
três lojas, duas delas na região Norte – uma em Londrina e outra em Maringá (esta com
produtos agroecológicos) – e a terceira na região Sudoeste, em Francisco Beltrão.
No que se refere aos agentes envolvidos nas transações comerciais, o que predomina
nas redes de supermercados é, de um lado, a própria rede, e, de outro, empresas intermediárias
de fornecimento de produtos orgânicos. Trata-se de uma situação típica em Curitiba, semelhante
à de outros grandes centros urbanos do País, onde as redes de supermercados só transacionam
com fornecedores já estruturados empresarialmente, os quais mantêm relações de integração
vertical e/ou horizontal com os agricultores familiares produtores de orgânicos.
Os supermercados de Curitiba operam com os produtos orgânicos com a mesma
lógica com que transacionam com os demais produtos do mercado agroalimentar, seja em
termos de exigências, padronagem, embalagem, custos e prazos de pagamento.
Com relação aos fornecedores para o mercado do varejo, a pesquisa identificou
que são duas as empresas no Paraná que trabalham com os produtos orgânicos, ambas
situadas em municípios da região metropolitana de Curitiba. Trabalham exclusivamente
com hortaliças, processadas minimamente. Embora as duas empresas mantenham áreas
próprias de cultivo (cerca de 25%), a maior parte da produção que negociam é oriunda de
mais de 100 agricultores familiares produtores de hortícolas orgânicas (a grande maioria
da RMC), com os quais estabelecem contrato de parceria ou de integração, dependendo
da situação.
169
Nas demais regiões do Estado o mercado do varejo é bastante incipiente. Quando
existe a comercialização de orgânicos o que se verifica é que os fornecedores são de menor
porte, ofertando tanto produtos convencionais como orgânicos, com produção própria, às
vezes integrados com outros produtores, cujas transações se dão, na maioria das vezes,
mediante contratos informais.
Com relação às lojas especializadas a situação encontrada é distinta. Nestes
equipamentos a relação de compra de produtos se dá diretamente de produtores individuais
ou de associações de agricultores familiares produtores de orgânicos, sendo que as
condições são estabelecidas diretamente entre os dois agentes, produtores e compradores.
Os produtos são originários na sua maioria das próprias regiões das lojas, no caso de
hortaliças e frutas, porém os demais produtos de mercearia seca são provenientes também
de outras regiões e estados.
Os principais produtos orgânicos transacionados nos supermercados são as hortaliças,
e os transformados são praticamente inexistentes, diferentemente das lojas especializadas,
que comercializam em maior escala os processados em geral, sobretudo os sucos, geléias,
grãos e farinhas.
Quanto à garantia de procedência dos produtos orgânicos comercializados, a
pesquisa mostrou que o mercado do varejo (supermercados e lojas) só opera com produtos
que têm selo de certificação de terceira parte, sendo que os dois principais certificadores
são o IBD e a ECOCERT. A exceção é o caso do supermercado da região Oeste, que, dadas
as suas características, trabalha com produtos orgânicos certificados pela Rede Ecovida de
Agroecologia, que se baseia no sistema de garantia participativo (SGPs).
Por fim, no mercado do varejo a relação do consumidor é exclusivamente com o
produto orgânico, desconhecendo, na maior parte das vezes, o processo de produção que
deve caracterizar a agricultura orgânica.
ƒ
Diretriz
- Promover os alimentos e produtos orgânicos no mercado do varejo.
ƒ
Sugestões de políticas públicas
- estabelecer parceria com o setor privado para a promoção e divulgação
dos produtos orgânicos, a exemplo da Semana da Alimentação Orgânica;
- estabelecer um canal de comunicação com agentes do mercado do varejo
para discussão permanente de restrições e potencialidades dos produtos
orgânicos neste mercado;
- apoiar iniciativas de associações/cooperativas de agricultores familiares
para o estabelecimento de lojas especializadas com produtos orgânicos em
cada região paranaense.
170
Mercado de Transformação
O mercado de transformação de produtos orgânicos é entendido, neste estudo,
como aquele que envolve as empresas de transformação – processadoras e beneficiadoras –,
os agricultores como fornecedores de matéria-prima e os demais tipos de mercado onde os
produtos são comercializados.
Com este estudo constatou-se que as empresas de transformação de produtos
orgânicos apresentam uma diversidade de formatos, que envolve desde o tamanho,
produtos, formas de contratos – tanto com os agricultores como com os compradores –, tipo
de clientela a ser atendida (seja no nível local/regional, nacional ou internacional), tecnologia
envolvida no processamento ou beneficiamento etc.
As primeiras empresas começaram a atuar no Paraná há menos de 10 anos e estão
localizadas em praticamente todas as regiões paranaenses. Os produtos com os quais
trabalham são provenientes em sua maior parte da agricultura familiar e apresentam uma
significativa diversificação com relação aos grupos de produtos. Dentre eles destacam-se os
grãos (principalmente soja e café), hortaliças, frutas, mandioca (fécula), cana-de-açúcar
(açúcar mascavo e cachaça), mel, ervas medicinais (chás), erva-mate e alguns subprodutos
(geléias, barras de cereais, biscoitos).
No que se refere à relação das empresas com os seus produtores de matéria-prima,
verificou-se que ela pode ocorrer tanto com produtores individuais quanto com associações
de produtores, cooperativas de produtores, podendo os produtos ser provenientes também de
produção própria. De um modo geral, as empresas adquirem produtos de origem certificada.
A pesquisa de campo permitiu que se identificassem três formas de relação entre
as empresas e os produtores, independentemente dos produtos e de estar formalizada ou
não a relação. São elas: relação contratual, relação independente e relação de parceria.
Do ponto de vista do processo de transformação, o estudo verificou que as empresas
agrupam-se em três tipos: as de beneficiamento (em que os produtos não sofrem processo
de transformação); as de processamento mínimo (os produtos permanecem em sua forma
in natura, apenas com leve modificação das condições iniciais); e as empresas de processamento (os produtos passam por transformação, que altera as características físicas, químicas
e fisiológicas).
A pesquisa mostrou que, entre as empresas pesquisadas, há aquelas que trabalham
exclusivamente com produtos orgânicos e aquelas que trabalham com produtos convencionais
e também com orgânicos. Identificou-se ainda que, no mercado da transformação, estão
atuando associações e/ou cooperativas de agricultores familiares que fazem a transformação de
produtos orgânicos.
No mercado da transformação é fundamental considerar quatro aspectos que
estão inter-relacionados: o tipo de mercado comprador do produto transformado – mercado
171
da venda direta, do varejo, externo e o institucional; o tipo de processo de transformação; a
relação com o produtor da matéria-prima, e o produto a ser transformado propriamente dito.
Para o estudo foram investigadas 22 empresas. Com exceção de uma cooperativa
de agricultores, as demais são de propriedade privada. Deste total, a maioria (15 delas) atua
com o processamento, ofertando uma gama diversa de produtos transformados: geléias,
sucos, conservas, cachaça, açúcar mascavo, chás, barras de cereais, farinhas, melado,
féculas, derivados de soja e café torrado e moído. Apenas duas empresas trabalham no
processamento mínimo, com as hortaliças, e outras cinco somente beneficiam os produtos,
como: mel, soja, ovos, arroz, feijão, milho e trigo.
Grande parte dos produtos transformados é comercializada por meio do mercado
externo. Predominam aqueles produtos destinados somente ao beneficiamento, como é o caso
do soja e do café, e em menor escala estão os processados, como a fécula de mandioca.
Para atuar no mercado externo as empresas privadas do mercado da transformação têm que estabelecer relações com outros agentes que entram no circuito, sejam
compradores diretos de outros países ou através de uma trading (processadoras de soja),
que faz a intermediação entre os futuros compradores e as empresas locais.
No caso das associações/cooperativas, estas têm uma menor participação no
mercado exportador. Na maioria das vezes os produtos que podem comercializar despertam
interesse de compradores, sendo que em boa parte das vezes estas iniciativas inserem-se
no chamado comércio justo e solidário, onde se focalizam as tecnologias de processo, em
vez das tecnologias de produto. Tal situação se verificou, por exemplo, no caso da cachaça
exportada pela Cooperativa Vitória da Conquista, situada no município de Paranacity, para
ONGs da Espanha, as quais apoiavam a reforma agrária e a agroecologia.
O que merece ser destacado é a crescente diversidade e quantidade de produtos
orgânicos que têm passado por processos de transformação, onde predominam as empresas
privadas de grande a pequeno portes. A presença das associações e cooperativas de agricultores
familiares é praticamente inexistente neste mercado, e, quando transformam os produtos,
estes são destinados ao mercado da venda direta, comercializados como artesanais.
ƒ
Diretriz
- Apoiar a agricultura familiar no mercado da transformação de produtos
orgânicos.
ƒ
Sugestões de Políticas Públicas
- criar um programa de apoio e incentivo financeiro à transformação da produção
de orgânicos pelos agricultores familiares (Fábrica do Agricultor Orgânico);
- desenvolver e implementar ações de capacitação em processos de transformação de produtos orgânicos, considerando não só os processos produtivos
mas também sanitários, de gestão etc., destinados a agricultores orgânicos;
172
- apoiar e diversificar a rede de intercâmbio de produtos orgânicos entre as
regiões do Paraná (conforme proposta do mercado de venda direta),
estimulando a aquisição de produtos, insumos etc., para os processos de
transformação;
- desenvolver um programa para regularizar/legalizar os processos de
transformação de produtos orgânicos artesanais.
Mercado Externo
O estudo demonstrou que existe uma demanda crescente por produtos orgânicos
não atendida no mercado mundial. Alguns produtores ou empresas brasileiras que já
conseguiram atender às exigências de certificação e padrões de qualidade impostos pelos
países importadores estão exportando regularmente produtos orgânicos beneficiados e
alguns processados para o atendimento desta demanda insatisfeita. No entanto, a pesquisa
revelou que não são os agricultores familiares e nem mesmo suas organizações que estão
se beneficiando desta situação, mas sim grandes produtores ou empresas que se mostram
mais estruturadas para atuar no mercado internacional. Esta situação não é diferente no
Estado do Paraná.
Em função disso, cabe aos organismos nacionais, e também aos organismos
estaduais dedicados à promoção das exportações, desenvolver ações efetivas para democratizar
o acesso ao mercado externo de produtos orgânicos, disponibilizando informações e oportunidades de negócios, indicando produtos com potencialidade para exportação, incentivar e
capacitar produtores ou associações de produtores para desenvolverem tecnologias de
processamento dos produtos orgânicos mais demandados pelo mercado de outros países.
ƒ
Diretriz
- Democratizar o mercado externo de produtos orgânicos, promovendo a
participação da agricultura familiar.
ƒ
Sugestões de Políticas Públicas
- criar uma unidade de informação e divulgação sobre o acesso ao mercado
externo de produtos orgânicos, acessível a todos os agentes, em particular
à agricultura familiar;
- estimular as transações mercantis do Mercado Justo e Solidário, desburocratizando os processos de exportação;
- desenvolver uma marca social para os produtos orgânicos paranaenses e
divulgá-la entre os agentes que atuam no mercado externo.
173
Mercado Institucional
Neste estudo tratou-se como mercado institucional aquele em que o Estado é um
agente fundamental no processo de comercialização de produtos agroalimentares, atuando
por meio de programas institucionais que operacionalizam políticas públicas voltadas à "política
de segurança alimentar e nutricional". Nesse contexto identificaram-se dois programas em
que os produtos orgânicos têm sido comercializados: o Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
O PAA é um programa voltado à aquisição de alimentos e produtos da agricultura
familiar, e é um dos componentes do Programa Fome Zero, destinado a atuar junto a populações
em situação de insegurança alimentar e nutricional. Os produtos orgânicos comercializados
pelo PAA recebem um diferencial de 30% em relação àqueles da agricultura convencional,
valorizando a qualidade nutricional e demais aspectos socioambientais envolvidos.
O PNAE, ou a merenda escolar/orgânica, é destinado a atender crianças do ensino
fundamental e pré-escolar, de creches e de instituições filantrópicas. A decisão da pauta de
alimentos e produtos para o programa é da alçada dos municípios e estados, envolvendo,
para tanto, os Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), instituídos em cada município.
A possibilidade de se ampliar a aquisição de orgânicos pela merenda é muito grande, uma
vez que há a obrigatoriedade de os municípios e estados aplicarem 70% dos recursos
transferidos pelo governo federal na aquisição exclusiva de alimentos e produtos básicos
semi-elaborados e in natura, respeitando os hábitos alimentares regionais e a vocação
agrícola do município e fomentando o desenvolvimento da economia local.
No Paraná, na atualidade, em ambos os programas a comercialização de alimentos e
produtos orgânicos não ultrapassa 5% do total das quantidades comercializadas. Entretanto,
verifica-se que há um expressivo potencial para a ampliação dos alimentos e produtos
orgânicos neste mercado, sendo necessário, contudo, apoio para a ampliação da produção,
da organização dos agricultores, da conscientização dos gestores públicos locais, de
articulação interinstitucional, entre outros.
É relevante destacar que o estudo apontou que, além das transações mercantis,
os programas têm atuado como importantes catalisadores no desenvolvimento econômico e
social local e territorial, promovendo a articulação entre diferentes atores sociais interessados.
No mercado institucional há possibilidades de os alimentos não serem vistos somente como
produtos, dada a proximidade entre o ambiente da produção e do consumo. Também tem-se
apontado que há, neste mercado, um ambiente para a concertação das relações mercantis,
onde tanto os agricultores, as entidades intervenientes e os agentes do poder público têm
buscado soluções para chegar a acordos e ajustes nos procedimentos, os quais, muitas vezes,
devido ao trâmite burocrático, dificultam a implementação dos programas localmente.
174
ƒ
Diretriz
- Incrementar as ações dos programas institucionais (PAA) e Merenda
Escolar Orgânica.
ƒ
Sugestões de Políticas Públicas
- divulgar informações sobre os programas para todos os municípios paranaenses;
- desenvolver mecanismos de facilitação/desburocratização aos programas
para as organizações de agricultores familiares orgânicos;
- divulgar sistematicamente os resultados dos programas em nível local, regional
e estadual;
- ampliar programas institucionais para o atendimento de outros consumidores
coletivos estaduais, como hospitais públicos, entre outros.
A realização deste estudo, além de identificar aspectos específicos relativos aos
mercados de orgânicos existentes no Paraná e de apontar diretrizes e sugestões de
políticas públicas para os mesmos, também verificou que há aspectos restritivos ao
desenvolvimento de tais mercados, os quais, se solucionados, podem incrementar os
diferentes tipos de mercado de orgânicos. Com este intuito é que se apresenta, a seguir, um
conjunto de orientações para diretrizes, políticas públicas e ações, destinadas a
potencializar o mercado de orgânicos no Paraná.
Necessidade de estabelecer uma base de dados e de divulgação de informações sobre
a agricultura orgânica
A pesquisa verificou que, embora se tenham dados sobre a produção orgânica no
Paraná, esta precisa estar melhor organizada, estruturada e disponibilizada, no sentido de
garantir a confiabilidade nos dados e informações sobre os produtores, os produtos, as
regiões produtoras e os processos de comercialização nos mercados de produtos orgânicos.
Isso implica definir um programa institucional voltado a apoiar ações de pesquisa
e tecnologia para a construção de uma base de dados, estabelecendo metodologia de
coleta de dados, definição de indicadores e variáveis de acompanhamento de dados, marco
referencial de análise dos dados e produção de informação, bem como definir estratégias de
divulgação sistematizada, organizada, periódica e, fundamentalmente, de fácil acesso e
compreensão para os agentes envolvidos, em particular aqueles da agricultura familiar. Para
tanto, entende-se como indispensável a constituição de coordenação colegiada, com atribuição
definida e específica, que envolva os interessados no processo – instituição pública, entidades
dos agricultores, ONGs, iniciativa privada e de consumidores.
175
Apoio ao sistema de produção – financiamento, assistência técnica e pesquisa
O estudo mostrou que a pauta de produtos orgânicos comercializados no Paraná é
relativamente ampla, embora ainda insuficiente para atender aos diferentes tipos de mercado.
O que de fato predomina são os produtos in natura, principalmente o grupo das hortaliças, mas
também se produzem grãos/cereais, frutas, mel, chás, produtos de origem animal, além daqueles
produtos orgânicos que são transformados, passando por distintos processos: beneficiamento,
minimamente processado e processado, segundo características e condições regionais.
A insuficiência de produtos expressa restrições que ocorrem no âmbito da
produção e que afetam diretamente as estruturas dos mercados de orgânicos. Ou seja, além
de haver um número ainda pequeno de agricultores produzindo orgânicos, na maior parte
das vezes não há subsídios ou financiamento específico e adequado, tanto para aqueles que
estão produzindo como para os que desejam fazer o processo de transição da agricultura
convencional para a orgânica.
Da mesma forma, também se constatou, em todas as regiões do Paraná pesquisadas,
que é incipiente o número de profissionais da extensão e assistência técnica oficial dedicados
exclusivamente a atender à produção orgânica. Via de regra, os técnicos, em muitos municípios,
fazem a assistência aos agricultores orgânicos como mais uma de suas atribuições. Muitos
deles demandam processos continuados de formação e capacitação para prestar o serviço de
ATER aos agricultores orgânicos, podendo inclusive colaborar nos processos de comercialização
da produção.
Ainda com relação à assistência técnica, há que se considerar as ações das
entidades de assessoria aos agricultores e as ONGs que trabalham com a temática, que
também têm restrições com relação ao número de profissionais, e, às vezes, as mesmas
debilidades em termos de capacitação. Nesse sentido, seria recomendável que esses
profissionais também fossem contemplados nos processos de formação e capacitação, a fim
de se criar núcleos regionais/municipais que integrem as ações entre os órgãos, entidades
de agricultores, ONGs e outros que trabalham com a agricultura orgânica nas regiões.
No que tange à pesquisa na área da produção, o estudo identificou que as mesmas
estão dispersas em instituições governamentais, universitárias e ONGs, abordando temas
bastante específicos e pontuais relativos ao sistema de produção. O que se constata é a
necessidade de se estabelecer uma política de investigação para a área, com apoio e recursos
financeiros adequados para a realização de pesquisas e estudos. Mas, para tanto, é essencial
que se proceda a um levantamento do que existe, que se estabeleçam linhas de pesquisa
de médio e longo prazos, focadas nos agroecossistemas regionais e da agricultura familiar.
É importante que seja um programa integrado, articulado e coordenado no nível estadual
entre as instituições afins – SETI, IAPAR, CPRA, SEAB, EMATER e universidades –, mas que
se mantenha articulado e apoiado no nível federal com os diversos centros de pesquisa da
EMBRAPA, bem como com as agências de fomento em suas várias instâncias.
176
Embora a indicação de diretrizes, políticas ou programas voltados à produção não
seja objeto deste estudo, entende-se que é um relevante obstáculo para a implementação
das políticas direcionadas especificamente aos mercados de orgânicos. O fundamental, no
que tange à produção, é que o foco esteja voltado ao sistema de produção como processo e
não aos produtos isoladamente, favorecendo posteriores ações no âmbito da comercialização e
da divulgação da agricultura orgânica no Paraná.
Divulgação, informação e consumo responsável de produtos orgânicos
O estudo verificou que são praticamente inexistentes ações direcionadas à divulgação
de informações sobre a importância dos produtos orgânicos, para a segurança alimentar e
nutricional da população, bem como para a promoção do consumo responsável.
A pesquisa mostrou que, de um lado, existe um consumidor individual de orgânicos,
que é aquele que freqüenta as feiras orgânicas ou agroecológicas e que tem uma relação de
fidelidade na aquisição dos produtos. Via de regra este consumidor tem um poder aquisitivo
mais alto que a maioria da população do Estado, concentra-se nas camadas com renda acima de
10 salários mínimos, tem idade superior a 30 anos, e, em sua maioria, são profissionais liberais
e mulheres. A motivação para a compra destes alimentos tem como base as preocupações
com a saúde da família e com as questões ambientais. Este mesmo consumidor também
busca produtos nas lojas especializadas e em restaurantes específicos, que oferecem os
alimentos orgânicos. Nem sempre este consumidor está preocupado com a certificação, ou,
quando está, é receptivo tanto à certificação participativa como à certificação por auditagem.
Embora disponha de informações sobre a agricultura orgânica e sua relevância, pouco conhece
sobre o processo que envolve o sistema de produção, bem como sobre a importância do seu
ato de consumo para o meio rural, para o meio ambiente e para os agricultores familiares
produtores de orgânicos.
De outro lado há o consumidor individual que freqüenta os supermercados, que se
insere no mercado do varejo de produtos orgânicos. Embora com perfil semelhante no que
tange à faixa de renda, profissão, idade e sexo, o que o difere daquele da feira é que ele não
tem uma relação de fidelidade na aquisição de orgânicos. Adquire o que está disponível, só
compra produtos com selo de certificação, e considera que seu consumo é restrito, devido
aos preços praticados pelos equipamentos deste mercado do varejo.
Além desse consumidor individual, o estudo mostrou que há uma categoria de
consumidores que se denominou consumidor coletivo. O consumidor coletivo é aquele
beneficiário dos programas institucionais, promovidos pelo Estado, como o PAA – Programa
de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, vinculado ao Programa Fome Zero, e o
PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, em particular a merenda orgânica.
177
Tais programas sociais destinam-se a atender à população em situação de
insegurança alimentar e nutricional. Na atualidade identificam-se dois grandes grupos no
âmbito do consumo coletivo que têm se beneficiado de produtos orgânicos: a população
infantil do ensino fundamental, pré-escola, creches e instituições filantrópicas que atendem
crianças são abastecidas pelo PNAE; e o PAA tem como público consumidor o das entidades
beneficiárias do programa, como creches, orfanatos, APAES (Associações de Pais e Amigos
dos Excepcionais), APMIS (Associação de Proteção à Maternidade e Infância), centros de
assistência, entre outras entidades filantrópicas.
Entende-se que o Estado tem um papel importante nesse cenário, desencadeando
programas ou ações voltadas a produzir e divulgar informação sobre a agricultura orgânica e
os aspectos correlacionados a ela. Tais ações devem ser direcionadas para ambos os tipos
de consumidores, os individuais e os coletivos, estimulando o consumo responsável.
Compreende-se que várias estratégias podem ser adotadas. Dentre elas pode-se
apontar a possibilidade de parcerias com entidades que já atuam nesta direção, como, por
exemplo, com a Associação de Consumidores Orgânicos do Paraná (ACOPA), o Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa
do Consumidor (FNECDC), entre outras. Tais iniciativas podem se amparar no Código de
Defesa do Consumidor, em seu capítulo IV, art. 4.o, que prevê que o Estado destine recursos
específicos para a educação e informação dos consumidores, apoiando atividades de educação
informal desenvolvidas pelas entidades civis de consumidores e campanhas públicas sobre
os direitos dos consumidores.
Também pode-se considerar como estratégia o estímulo à organização e ao
funcionamento de outras associações de consumidores, com o intuito de promover o
desenvolvimento local e regional, a partir do estreitamento de relações entre consumidores
e produtores de orgânicos.
Com relação ao consumidor coletivo, o que se verificou também é que há precariedade de divulgação de informações sobre os produtos orgânicos para a população beneficiária
dos atuais programas sociais. Isso se constatou, por exemplo, na oficina de avaliação do
PAA/Região Sul, realizada em 2006, em Curitiba. Considera-se que este deveria ser um
consumidor privilegiado no acesso aos alimentos e produtos orgânicos, dadas as suas particulares condições de insegurança alimentar e nutricional, e o reconhecimento da qualidade
nutricional dos orgânicos. Desta forma, são relevantes não só as informações sobre os
alimentos orgânicos, mas também sobre os programas que promovem a compra dos
mesmos, através de campanhas junto às entidades, às prefeituras e escolas, entidades e
associações de produtores.
178
O conjunto de resultados apresentados neste estudo cumpriu o objetivo de identificar
e caracterizar o mercado de orgânicos do Paraná. A partir da constatação de que não se está
diante de uma estrutura hegemônica, é que se mostrou que o mesmo deve ser apreendido a
partir de diferentes tipos de mercado: o da venda direta, do varejo, da transformação, o
externo e o institucional.
Essa condição permite que o Estado atue de forma mais contundente e particularizada
em cada um dos diferentes mercados, através de diretrizes e políticas, buscando contemplar
de maneira particular a agricultura familiar como um ator e agente relevante nos processos
mercantis, marcados que são por relações sociais.
179
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O MERCADO DE ORGÂNICOS NO PARANÁ