AS DISCIPLINAS COMO OBJETO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
Simone Paixão Rodrigues – UFS/GPDEHEA
Grupo de Pesquisa: Disciplinas Escolares: História, Ensino, Aprendizagem).
[email protected]
Fabiana Cristina Oliveira Silva de Oliveira - Mestranda em Educação/UFS
[email protected]
Palavras- chave: História das Disciplinas; História da Educação; Fontes.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos a História da Educação vem se beneficiando por um
alargamento de fontes e objetos motivado pela contribuição da Nova História e Nova
História Cultural. Nesse contexto a histórias das disciplinas surge como um dos novos
objetos que merece investigação, pois permite a compreensão do processo de
configuração dos saberes escolares e acadêmicos. Considerando que o campo História
da Educação busca pesquisar os diversos sujeitos e objetos que contornam o processo
educativo. Desta forma, pode-se afirmar que este campo de pesquisa, inicialmente
marcado pela Pedagogia, assinalada “pela influência abstrato – filosófica da filosofia,
pois os clérigos da Igreja brasileira ocupam a cena acadêmica desta área de
conhecimento, pelo menos, do início do século XX até os anos 1940” (GATTI JR,
2002, p. 16).
A aproximação da História da Educação com a Pedagogia dificultou sua
legitimação, que no Brasil só ocorreu a partir dos anos de 1950 e 1960. Com a criação,
em 1955, do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e os Centros Regionais de
Pesquisas Educacionais, vinculados ao Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos a
pesquisa em educação se consolidou. Neste momento foram criados o Centro Brasileiro
de Pesquisas Educacionais no Rio de Janeiro e os Centros Regionais de Pesquisas
Educacionais na Bahia, em Minas Gerais, em São Paulo, no Rio Grande do Sul e em
Pernambuco.
De acordo com Cunha, só a partir de 1970 é que o sistema universitário
brasileiro vai institucionalizar os primeiros Programas de Pós-Graduação em Educação.
Estes programas vieram constituir o verdadeiro motor da reforma universitária
brasileira. Para tanto foi necessário uma um intercâmbio com as instituições
universitárias da Europa e dos Estados Unidos1.
Neste âmbito a criação dos cursos de Pós-Graduação em Educação no Brasil
contribuiu significativamente para o aumento do desenvolvimento de pesquisa dentro da
historiografia brasileira. Segundo Carvalho (2004) declara, o impacto da
institucionalização dos cursos de pós-graduação e das novas proposições e concepções
sobre a prática historiográfica provocou no cenário brasileiro em meados de 1980 uma
emergência de trabalhos sob a perspectiva de uma nova historiografia educacional que
se contrapunha com a produção historiográfica vigente.
Para as pesquisadoras Warde e Carvalho (2000) a institucionalização do
sistema nacional de pós-graduação que se deu a partir dos anos de 1970 concebeu uma
profunda transformação no tocante a pesquisa como o aparecimento de uma nova
gênese de autores, um crescimento considerável dos títulos publicados, diversificação
do mercado editorial, redistribuição dos status institucionais. “A expansão quantitativa
que surgiu na área como um todo refletiu-se imediatamente nos estudos sobre a história
da educação [...]” (WARDE e CARVALHO, 2000, p.26).
Warde (1984) confirma que a produção nos Programas de Pós-Graduação em
Educação no período de 1970 a 1984 resultou uma totalidade dos trabalhos na área da
organização dos sistemas de ensino e na legislação de ensino, sendo que 80% destes
estudos centram-se no marco temporal de 1889 a 1930, período correspondente a
Primeira República. As pesquisas coordenadas por Warde identificaram também nessa
produção a presença de uma característica dominante até meados da década de 1980:
uma peculiar simbiose entre a utilização dos referenciais teóricos de extração marxista,
que dominavam a produção acadêmica no período, e a permanência de temas e de
matrizes interpretativas extraídas de uma única obra – A Cultura Brasileira – de autoria
de Fernando de Azevedo, editada em 19432.
Vale também destacar que as influências do Marxismo e da Nova História,
particularmente da História Cultural contribuiu e contribui para o alargamento dos
objetos, das fontes e das abordagens utilizadas pelos pesquisadores na árdua tarefa da
pesquisa em Histórica da Educação. Essa influência permite a quebra do mito de que a
pesquisa em História da Educação está restrita apenas a história dos pensamentos
educacionais. “Desloca-se crescentemente, os interessados pesquisadores da investigação das
idéias e da legislação educacional para as práticas, os usos e as apropriações dos diferentes
objetos educacionais” (LOPES e GALVÃO, 2001, p.40 ).
A ampliação dos objetos e das fontes evidencia um rompimento dos estudos
em História da Educação com as velhas tradições da pesquisa histórica e coloca em seu
palco objetos de estudos, outrora ignorados, como as disciplinas escolares e as
instituições educacionais. A apropriação das disciplinas escolares como objeto de estudo
permite-nos declarar a assertiva de que a pesquisa sob as lentes deste objeto possibilita a
compreensão de uma forma de educação presente no ambiente do espaço educativo das
instituições escolares. O que conduzirá ao conhecimento das particularidades de uma instituição
educacional. É como se os estudos sobre disciplinas escolares abonassem uma investigação dos
espaços em que elas são ministradas.
OS TEÓRICOS E SUAS CONCEPÇÕES
Conquanto seja um campo ainda pouco explorado, História das disciplinas escolares,
vem sendo considerada por muitos estudiosos como campo fundamental para se compreender a
cultura escolar, bem como inserir a história da educação nas altercações atuais da história
cultural. De acordo com Bittencourt, a partir do período de 1970 e 1980 ocorre um crescimento
das pesquisas no interior do campo da história das disciplinas escolares. A autora afirma que:
O crescimento das pesquisas da história das disciplinas articula-se ao
processo de transformações curriculares dos anos de 1970 e decorrer
de 1980, momento em que se repensava o papel da escola em suas
especificidades e como espaço de produção do saber e não mero lugar
de reprodução de conhecimento impostos externamente. Estudos
críticos baseados na linha da interpretação estruturalista haviam
destacado os aspectos ideológicos inerentes as instituições criadas
pelo capitalismo e, no conjunto de ações desencadeadas a partir do
século XIX, nos quais o Estado- Nação mostrava-se como grande
sujeito das mudanças, o sistema escolar tornou-se um dos destaques
dessas análises baseadas em concepções macro do processo histórico.
(BITTENCOURT, 2003, p. 11).
Repensar o papel da escola enquanto espaço de produção do conhecimento, contribuiu
para o desenvolvimento de pesquisas que objetivavam analisar o sistema educacional. Ou seja,
os agentes constituintes do conhecimento escolar, como professor, aluno e comunidade escolar
e, “nesse processo as disciplinas escolares passaram a ser incluídas como um dos objetos
importantes das investigações sobre as práticas escolares” (BITTENCOURT, 2003, p.13).
Para Chervel (1990), os estudos em história das disciplinas escolares têm
manifestado uma tendência, entre docentes, em favor de uma história de sua própria
disciplina. Desta forma, debruçar-se sobre a história das disciplinas escolares no âmbito
de suas vertentes, implica efetuar escolhas, constituir hierarquias, considerar conceitos,
como também organizar análises. Ao pesquisar a história de uma disciplina escolar
deve-se considerar antes de mais nada, a constituição das disciplinas escolares.3 Chervel
(1990) ainda afirma que no âmbito da pesquisa em história das disciplinas escolares o
termo de disciplinas referes-se ao sentido dos conteúdos de ensino.
As pesquisar sobre as disciplinas escolares se faz necessário atentar para as
suas distintas concepções:
1 - A concepção da disciplina como transposição didática é defendida pelo
pesquisador francês Yves Chevallard4. Para este teórico a escola é apresentada como
incapaz de produzir saberes, sendo apenas um espaço de reprodução dos conhecimentos
eruditos ou científicos. Sendo o docente apenas um intermediário desse processo de
reprodução, “cujo grau de eficiência é medido pela capacidade de gerenciamento das
condições de adaptação do conhecimento científico ao meio escolar”.
(BITTENCOURT, 2004, p.37). Segundo Chevallard a disciplina escolar apresenta-se
em uma escala de inferioridade, ou seja, como um saber de segunda classe que só é
legitimado pelo saber científico.
2- A concepção da disciplina enquanto campo de conhecimento autônomo,
temos como principais defensores o pesquisador inglês Ivor Goodson e o pesquisador
francês André Chervel. 5 Os pontos centrais das posições de Chervel apresentam-se na
concepção das disciplinas escolares como entidades epistemológicas relativamente
autônomas e no deslocamento “das decisões, das influências e de legitimações
exteriores em direção à escola, inserido o saber por ela produzido no interior de uma
cultura escolar” (BITTENCOURT, 2003, p.25). Nesta concepção a disciplina escolar
tem autonomia e, é produzida dentro do espaço escolar, o qual se apresenta como uma
instituição que, mesmo recebendo influências de agentes externos e internos, é capaz de
produzir seus próprios saberes. De modo que, é nesse ideário que compartilhamos nosso
conceito de disciplina sendo “um modo de disciplinar o espírito, quer dizer de lhe dar os
métodos e as regras para abordar os diferentes domínios do pensamento, do
conhecimento e da arte”. (CHERVEL 1990, p.180)
Os estudos sobre as disciplinas escolares abordam sua lógica organizativa,
suas histórias da criação, suas disputas políticas e ideológicas travadas na sua
configuração, a eficiência para a sua autopromoção no sistema de ensino, e nos
possibilita a ampliação do debate sobre cultura escolar6. Sendo assim, as instituições de
ensino situa como espaço privilegiado para atuação das disciplinas escolares, o que
contribui significativamente para o entendimento da cultura escolar7.
Conseqüentemente, o estudo sobre a história das disciplinas escolares permite
a abertura de uma janela para a compreensão da cultura escolar que tem apresentado seu
conceito sempre relacionado com um “espaço destinado, privilegiado para a transmissão
do conhecimento e, principalmente valores em determinado tempo”. (JULIÁ, 2001,
p.10).
Para Venturi e Gatti Júnior, a conjuntura que faz surgir uma disciplina escolar,
a evolução e as mudanças pelas quais ela passa, que pode inclusive arrastar para seu
desaparecimento, é resultante dos fatos internos e externos. Sendo os fatos internos “as
estruturas e organização do trabalho na própria área e os externos relacionam-se às
questões da política educacional e ao contexto social, político, cultural e econômico”.
(VENTURI, GATTI JUNIOR, 2004, p.68). Continuando os autores ainda afirmam
A evolução das disciplinas escolares está também relacionada com as
condições materiais em que se desenvolve o ensino, as construções
escolares, o mobiliário, os recursos didáticos, o material do professor
e do aluno que se instaura e se modifica em função das finalidades
educacionais e, sobretudo, conforme o público escolar (idade,
características sócio-culturais, condições de vida, etc). (VENTURI,
GATTI JR, 2004, p.68).
Destarte, os estudos no campo da história das disciplinas escolares não só nos
desvendam a sua organização, sua lógica e objetivos, mas também a cultura escolar
presente nos espaços das instituições educativas.
AS FONTES NOS ESTUDOS SOBRE DISCIPLINAS ESCOLARES
A incansável e instigante busca de se compreender o presente, conduz o estudo
do passado da humanidade, realizados por pesquisadores que têm seus entusiasmos
embalados pelo fascinante sonho das representações e compreensão do passado.
Reconstruir a história do passado significa compreender este passado através de um
rigor metodológico, que crie condições para o entendimento dos fatos fragmentados que
se ligam e limitadamente constrói o passado de outrora.
O passado é algo incapaz de ser plenamente conhecido e compreendido,
mesmo sendo incansavelmente retomado para compreensão do hoje. Ele sempre terá um
novo ângulo para ser estudado e interpretado e para isso faz-se necessário as fontes
históricas produzidas pelo o homem. Para Fustell de Coulanges, “(---) onde o homem
passou, onde deixou qualquer marca da sua vida e da sua existência, aí está a história”.
(apud, Lê Gaff, 1992, p.539).
Contudo as fontes, não são capazes de por si só, reconstruir o passado. É
necessário o olhar do pesquisador que debruçando sobre as fontes, montará cada
fragmento da história e concretizará o seu objeto.
Durante o processo de cientificidade da história enquanto área do
conhecimento, as fontes sofreram valores distintos pelas correntes do pensamento
histórico. A Escola Positivista priorizando e glorificando o uso das fontes escritas, como
sendo um único instrumento capaz de conduzir a produção da historia pelo historiador,
ou seja, o documento escrito era entendido como o mecanismo mais confiável para o
registro da história da humanidade.
No entanto a Escola de Annales, em meados do século XX, cria uma nova
concepção de fontes históricas que se distinguirá da concepção positivista. Os
estudiosos da Escola de Annales possibilitam um enriquecimento e ampliação das
fontes, necessárias para construção da história. A história passaria a ser produzida pelo
uso dos diversos tipos de fontes, sejam elas escritas ou não. “A história faz-se com
documentos escritos, sem dúvida. Quando estes existem. Mas pode fazer-se, deve fazerse sem documentos escritos quando não existem (---)Logo com palavras. Signos.
Paisagens e telhas. (Le Goff, 1992, p, 540)
Qualquer tipo de fonte, trás em todo o seu corpo físico a presença da ação
humana e, é esta presença que possibilita a compreensão e a construção da história do
homem. Sabe-se que a fonte é a matéria – prima vital para o ofício do historiador, que é
nela que estão sufocadas os porquês da história e que ela está sempre disposta para
revelá-los para quem se proponha a estudá-la. Para isso faz-se necessário à construção
de uma relação entre o historiador e a fonte. Para Le Goff:
O historiador deve ser capaz em função da familiaridade com as
fontes e com o tempo em que vive sua personagem, de por nos
próprios documentos graças a uma” desmontagem apropriada “efeitos
do real” com a verdade dos quais se possa chegar a conclusões. Ou,
mais simplesmente, de destrinchar esses documentos para fazer com
que neles apareça o que introduz uma convicção razoável de verdade
histórica (Le Goff 1992, p.22).
A relação do historiador com as fontes deve fundamentar-se na exploração da
criticidade, pois responderá os questionamentos preconcebidos. A seleção das fontes
não deve ser priorizada pelo historiador, pois “a seleção já foi feita tanto por aqueles
que produziram o material, pelos que o conservaram ou que deixaram os rastros de
uma destruição-internacional ou não – por aqueles que o organizaram em acervos e
pelo próprio tempo” (Lopes, 2001, p.79).
Cabe ao historiador posicionar seus questionamentos sobre as fontes, duvidar
de suas informações, compreender os seus silêncios, pois assim estará explorando-as
incansavelmente e controlando a sua neutralidade e subjetividade. Para Lopes “somente
quando o historiador faz perguntas se inicia a produção da história. O documento em si
não é História, não faz História” (2001, p. 92).
O historiador deverá priorizar uma relação com as fontes mesclada de
intuição, criatividade, interrogações, sensibilidade e criticidade. Ele deverá ser
consciente que trabalhar com fontes não significa apenas organizar as informações delas
extraídas, de forma cronológica. O uso das fontes na construção do conhecimento
histórico requer um rigor teórico e metodológico que crie uma atmosfera de
objetividade e cientificidade. Le Goff alerta que
[...] O documento não é inocente, não decorre apenas da escolha do
historiador, ele próprio é parcialmente determinado por sua época e seu
meio; o documento é produzido consciente ou inconscientemente pelas
sociedades do passado, tanto para impor uma imagem desse passado
quanto para dizer a “verdade”[...] (LE GOFF, 1998, p. 54).
Neste sentido o estudo das disciplinas escolares considera significativamente as
fontes resguardadas nos arquivos escolares, pois lá estão registradas, além de suas
finalidades, seus constituintes e seus agentes, sobretudo estão registrados as
peculiaridades da relação professor/aluno que certamente tem papel decisivo para a
compreensão de uma disciplina. Contudo, o uso dos acervo escolares como
privilegiados para os estudos sobre disciplinas escolares, chamamos atenção para a dura
realidade da total desorganização dos arquivos escolares, quando também não mais
existem. Neste âmbito, Magalhães afirma que
[...] a importância dos acervos documentais, arquivísticos e
museológicos das instituições educativas, [...] se torna necessária uma
acção coerente de preservação e organização, porque há de facto uma
história da educação ameaçada (MAGALHÃES, 1999, p.63).
Contudo, a história das disciplinas escolares não restringi - se apenas aos
arquivos escolares como locais de referências para a compreensão de uma disciplina,
mesmo certos de que documentos como: diários de classes, regimentos internos.,
currículos, atas, relatórios, e etc, fundamentais a investigação de uma disciplinas e que
tem nos arquivos escolares o espaço fundamental para serem resguardados, ouras fontes
podem ser consultadas e encontradas nos mais diversos locais o que não dizer das
cadernos e livros didáticos dos alunos preservados nos arquivos particulares. Sobre o
livro didático como fonte, Bittencourt declara:
[...] Os livros didáticos têm se constituídos uma das fontes
privilegiadas para os estudos sobre os conteúdos escolares e pode-se
inclusive identificar pesquisas que se interligam, realizando uma
história das disciplinas e, ao mesmo tempo, a do livro didático
(BITTENCOURT, 2003, p.32).
Confirmando a autora ainda afirma que “[...] as investigações têm recorrido a
fontes de diferentes naturezas para que se possa situar a participação do conjunto de
agentes criadores de desse conhecimento [...] Legislação escolar, programas,[...], livros
didáticos, cadernos, provas, fotografias, matérias escolares e outros.” (BITTENCOURT,
2003, p.35). De modo, que propõe uma diversidade de fontes para o pesquisador.
Não se pode deixar de considerar também que além das fontes escritas, outras
fontes que poderão ser consultas são fontes orais. As fontes orais devem ser
consideradas como um ponto de partida, em que o pesquisador irá debruçar-se para
poder compreender as informações contidas em cada fala e contrapô-las com outras
fontes. O uso das fontes orais possibilita a reconstrução de algumas cenas do cotidiano
das práticas de uma disciplina escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O papel de um historiador de uma disciplina tem haver com a visão global que
ele toma do seu objeto sem se limitar, por exemplo, com o conteúdo. De acordo com o
autor, cabe ao historiador uma análise
“[...] detalhada do ensino em cada uma de suas etapas,
descrever a evolução da didática, pesquisar as razões da
mudança, revelar a coerência interna dos diferentes
procedimentos aos quais se apela, e estabelecer a ligação entre o
ensino dispensado e as finalidades que presidem a seu
exercício.” (CHERVEL, 1990 p. 192).
Verificamos assim que o estudo das disciplinas escolares tem-se mostrado
necessário para a compreensão do papel de classes e na manutenção de privilégios de
determinados setores da sociedade, a partir do fato de que é constituinte da formação
dessa sociedade. E ainda, as disciplinas escolares devem ser analisadas como parte
fundamental da cultura escolar, para que se possam entender as relações instituídas com
o externo, com a cultural de uma sociedade fora da escola.
Nesse fazer histórico devemos considerar dois pontos de bastante relevância: a
História deve ser dita pelo historiador de modo objetivo e imparcial, haja vista
pressupõe um dado afastamento do historiador com seu objeto, exigindo-se honestidade
e maior clareza dos fatos.
Nessa ótica também se revela à singularidade dos fatos históricos, conforme
Le Goff (1984) defende, afirmando que os objetos são únicos e que por esse motivo
emanam tratamentos próprios por parte do historiador. Isso se caracteriza muito bem ao
se tratar de qualquer objeto em História, já que ele estritamente único, no seu contexto,
mas está incluído numa estrutura bem maior.
Cabe destacar ainda os estudos que versam sobre a História das Disciplinas
Escolares, principalmente com o clássico texto de Chervel (1990) e outros dessa linha
de pesquisa como os de e Bittencourt (2003), estão sendo desenvolvidos em Sergipe por
Alves (2006),que nos subsidiaram nas questões mais teóricas da pesquisa, para que
pudéssemos compreender melhor a importância do processo na sala de aula, como
também da disciplina como conteúdo, e suas influências dentro dos processos
educacionais e sociais como um todo.
Portanto, o pesquisador é parte essencial para a construção da história de uma
disciplina, utilizando a vertente da História Cultural, ao usar todos os vestígios que lhe
sobrevenha como fonte de pesquisa e se apropriando de embasamento teóricometodológico e técnicas que se adaptem e adequem no decorrer da investigação.
Também devemos procurar propiciar novas leituras do processo histórico com o intuito
de contrapormos a uma visão predisposta de História, o de analisar o sujeito como um
mero objeto e não agente de desenvolvimento, e deixar de vê-lo como inserido em
relações reais interagindo com a realidade.
NOTAS
1
Cf. CUNHA, 2000.
Cf. CARVALHO, 2004, p. 377.
3
No seu uso escolar o termo disciplina e a expressão disciplina escolar não designam até o fim do século
XIX mais do que a vigilância dos estabelecimentos, a repreensão das condutas prejudiciais à sua boa
ordem e aquela parte da educação dos alunos que contribui para isso. (CHERVEL, 1990, p.178).
4
Para este pesquisador, “a escola parte de um sistema no qual o conhecimento por ela reproduzido se
organiza pela mediação da “noosfera”, conceito correspondente ao conjunto de agentes sociais externos à
sala de aula, inspetores, autores de livros, livros didáticos, técnicos educacionais, família. Esses agentes
garantem à escola o fluxo e as adaptações de saberes provenientes das ciências produzidas pela academia.
(BITTENCOURT, 2004, p.36).
5
Para eles a disciplina escolar não se constitui pela simples transposição didática, do saber erudito, mas
por outros conhecimentos. Nesta concepção a escola é compreendida como lugar de produção do saber
autônomo.
6
Cf: Martins , 2004.
7
[...] poder-se-ia descrever a cultura escolar como conjunto de normas que define conhecimentos a ensinar
e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permita a transmissão desses conhecimentos e a
incorporação desses comportamentos e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as
épocas (finalidades religiosas, sócio-políticas ou simplesmente da socialização) (JULIÁ, 2001, p.10).
2
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