Artigo do Perfil Arquitectónico da Clinica Dentária S. Paulo
Clínica Dentária de São Paulo
Notas arquitectónicas
A clínica dentária de São Paulo tem uma história documentada de mais de 100 anos no ramo
da medicina dentária, com registos fotográficos desde o final do século XIX.
A clínica localiza-se num 1º andar de um edifício pombalino, com entrada pelo topo nascente
do largo de S. Paulo. Além da base pombalina de todo o edifício, aquilo que mais caracteriza o
interior da clínica resulta de uma intervenção arquitectónica do fim da década de 10 do século
passado.
Essa intervenção ter-se-á estendido na época a todo o 1º piso do edifício, que terá sido
posteriormente dividido. A actual clínica ocupa a metade sul. A obra terá sido muito profunda,
incluindo a renovação e substituição de pavimentos, revestimentos de paredes, e carpintarias
interiores e exteriores e quase certamente alterações de compartimentação interior. Revela
um forte pendor Arte Nova com algumas tendências geometrizantes a anunciar influencias Art
Deco. Pode-se admirar a elevada qualidade artística e construtiva dos diversos elementos, que
sobreviveram em relativas boas condições durante um século.
O acesso fazia-se por uma entrada central em relação a todo o piso, com porta frontal ao subir
a escada, como hoje. Esse centro era marcado pelas colunas em escaiola avermelhada e
capitéis dourados e reforçada pelo tratamento diferenciado do desenho dos vãos, com um
curioso padrão de envidraçados em malha diagonal, que se estendia para a janela central
exterior e quase certamente para o guarda vento das escada, hoje desaparecido. O centro
charneira de entrada e distribuição do piso era assim fortemente referenciado por um
tratamento arquitectónico diverso. Actualmente essa entrada mantém-se, embora o corredor
que abria nas duas direcções esteja cortado para a fracção independente a Norte. Um espelho
providencialmente colocado a toda a altura desse fecho replica a sensação espacial que se
teria na versão original aberta.
A qualidade dos elementos construtivos que sobreviveram é notória. Pinturas manuais de
belíssimo recorte nas bandeiras em vidro, azulejos de fino vidrado, carpintarias de alta
qualidade e soalhos com embutidos magníficos em dois compartimentos.
Nos anos 50 houve uma obra de modernização que incluiu a colocação de betonilhas sobre
soalhos. É de destacar que essa obra, para um fim com uma dominante tão técnica e numa
época de cultura do novo e do produto industrial em que a preservação não era valorizada,
deixou intocada grande parte da intervenção 40 anos anterior, o que permitiu que chegasse
aos nosso dias. Isso deve-se certamente à elevada qualidade dos elementos construtivos em
causa.
Os curiosos soalhos trabalhados que sobreviveram em dois compartimentos certamente são
colocados sobre soalhos base mais antigos, sendo que resultam nivelados com as zonas
revestidas a betonilha nos anos 50. É lícito presumir que na intervenção dos anos 10 a
colocação de soalho semelhante sobre os largos tabuados pombalinos tenha sido generalizado
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a todo o piso, com mais ou menos desenhos. Nos anos 50, por melhor estado, tipo de
utilização ou desenho de mais qualidade, este foi preservado nesses dois compartimentos em
particular, que são actualmente áreas administrativas.
A intervenção dos anos 10, agora do século XXI, é uma intervenção de elevado nível de
respeito e carinho pela carga histórica e qualidade do património construído que chegou aos
nosso dias. Tudo o que se podia preservar, mesmo que implicando custos acrescidos, foi
preservado. Cada detalhe foi acarinhado e reposto no esplendor que terá tido 100 anos atrás.
Os belos capitéis dourados Arte Nova finamente esculpidos brilham de novo ao receber os
visitantes. Conseguiu-se simultaneamente modernizar a clínica colocando-a no mais alto nível
técnico da especialidade e preservar a alma e a história que respiram daquelas paredes e
carpintarias. Nas casas de banho foram executados painéis com azulejos pombalinos
encontrados em baldes na arrecadação. Mesmo os elementos construtivos há muito
descartados voltaram a marcar presença no local.
A seguinte fotografia sumariza o que anteriormente se referiu. A inovação técnica e o respeito
pela pegada histórica do edifício a concorrer num local pleno de personalidade e carácter
espacial.
António Alfarroba
arquitecto
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