UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO
JOÃO CARLOS DE AQUINO TEIXEIRA
A dinâmica de adoção de práticas
inovadoras e o desempenho dos
adotantes: um estudo na indústria
brasileira
Salvador
2005
JOÃO CARLOS DE AQUINO TEIXEIRA
A dinâmica de adoção de práticas inovadoras e o desempenho dos
adotantes: um estudo na indústria brasileira
Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Administração, Escola de
Administração, Universidade Federal da
Bahia, como requisito parcial para obtenção
do grau de Doutor em Administração.
Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth Loiola
Salvador
2005
Sumário
Sumário .........................................................................................................................3
Lista de Tabelas.............................................................................................................5
Lista de Figuras ............................................................................................................6
Lista de Figuras ............................................................................................................6
Lista de Quadros ...........................................................................................................7
Lista de Quadros ...........................................................................................................7
Agradecimentos.............................................................................................................9
Resumo ........................................................................................................................10
Abstract........................................................................................................................11
1.
Introdução ...........................................................................................................12
2. Em busca de uma abordagem sobre a dinâmica da relação entre inovação,
desenvolvimento econômico e organizações ..............................................................21
2.1.
Inovação e desenvolvimento econômico ..............................................................26
2.2.
Inovação e organizações ......................................................................................32
2.3.
Padrões de Mudança e de Inovação nas Organizações......................................35
2.4.
Uma proposta de classificação das perspectivas de análise entre tecnologia e
organização .........................................................................................................................39
2.5.
Críticas às perspectivas tradicionais de análise da relação entre tecnologia e
organização .........................................................................................................................42
2.6.
Em busca de uma visão mais matizada sobre a dinâmica de processos
organizacionais: mudança, inovação, conhecimento e aprendizagem organizacional.46
2.7.
Mudança, Inovação, Conhecimento e Aprendizagem nas Organizações........50
2.8.
A construção de tipologias de organizações em relação à mudança e à
inovação gerencial ..............................................................................................................55
3.
Práticas Inovadoras de Gestão ...........................................................................59
3.1.
O que são práticas de gestão e uma certa cronologia de aparecimento de
práticas selecionadas de gestão .........................................................................................59
3.2
Domínios de Práticas Inovadoras ........................................................................63
3.1.1. Práticas Inovadoras de Gestão de Pessoas ...................................................................... 65
3.1.2. Práticas inovadoras de gestão da produção..................................................................... 77
3.1.2.1.
Manutenção Produtiva Total ................................................................................. 78
3.1.2.2.
Células de Manufatura .......................................................................................... 82
3.1.3. Práticas inovadoras de gestão do desempenho e da qualidade........................................ 88
3.1.3.1.
Gestão da Qualidade Total .................................................................................... 89
3.1.3.2.
Reengenharia de Processos ................................................................................. 102
3.1.3.3.
Terceirização e Outsourcing ............................................................................... 108
3.1.3.4.
Just in Time ......................................................................................................... 113
4.
O estado do campo sobre práticas inovadoras de gestão .................................122
5.
6.
4.1.
A difusão de práticas de gestão inovadoras no Reino Unido...........................122
4.2.
Difusão de práticas inovadoras no Brasil..........................................................127
4.3.
Pesquisas comparativas entre o Brasil e outros países ....................................155
Método e Procedimentos...................................................................................163
5.1.
Problematização, objetivos e hipóteses .............................................................163
5.2.
Modelo de Análise ...............................................................................................182
5.3.
Universo e amostras ............................................................................................186
5.4.
Instrumento de coleta de informações e sistemática de análise dos dados.....189
Resultados e discussão ......................................................................................192
6.1.
Caracterização das amostras .............................................................................192
6.2.
Adoção de práticas inovadoras – comparação entre os resultados obtidos em
Peixoto (2004) e com a amostra desta tese .....................................................................199
6.2.1. Adoção de práticas inovadoras no Brasil – Nível de Utilização................................... 200
6.2.2. Resultados percebidos com a adoção das práticas – Melhorias em qualidade, reduções
em custos e melhorias em responsividade................................................................................... 202
6.2.3. Propensão à continuidade de uso de práticas inovadoras.............................................. 204
6.3.
Nível de utilização, características organizacionais e resultados financeiros 210
6.4.
Grupos de Práticas..............................................................................................219
6.5.
Tipologia de empresas da amostra ....................................................................227
6.5.1.
6.5.2.
6.6.
Identificação do número de clusters na amostra ........................................................... 229
Descrição e análise dos agrupamentos identificados .................................................... 230
Modelagem de Equações Estruturais ................................................................239
6.6.1. Relações entre utilização de práticas inovadoras de gestão, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso........................................................ 241
6.6.2. Modelo 1 - Práticas Inovadoras de gestão de pessoas, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso........................................................ 244
6.6.3. Modelo 2 – Células de manufatura, desempenho operacional, desempenho financeiro e
propensão à continuidade de uso................................................................................................. 246
6.6.4. Modelo 3: Reengenharia, reduções de custos, desempenho financeiro e propensão à
continuidade de uso..................................................................................................................... 247
6.6.5. Modelo 4: Terceirização, desempenho operacional, desempenho financeiro e propensão
à continuidade de uso.................................................................................................................. 248
7.
Considerações Finais........................................................................................251
7.1.
A adoção de práticas inovadoras de Administração no Brasil........................258
7.2.
O grau de adoção de práticas inovadoras, características organizacionais e
desempenho financeiro ....................................................................................................259
7.3.
A adoção de grupos de práticas inovadoras e Administração ........................262
7.4.
Padrões de adoção de práticas inovadoras .......................................................264
7.5.
A adoção de práticas inovadoras e o desempenho organizacional .................266
7.6.
Utilização de análise multivariada na pesquisa em administração e ciências
sociais 268
7.7.
8.
Limitações da pesquisa e recomendações para pesquisas adicionais .............269
Referências Bibliográficas................................................................................272
Lista de Tabelas
Tabela 4.1 – Satisfação com o Uso de Ferramentas................................................157
Tabela 4.2 – Satisfação com o Uso de Ferramentas................................................159
Tabela 6.1 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004), Amostra Tese e a
Distribuição Nacional: Local de Atuação................................................................193
Tabela 6.2 – Comparação entre a Amostra de Peixoto (2004), Amostra desta Tese e
Distribuição Nacional: Região .................................................................................194
Tabela 6.3 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004), Amostra desta Tese e
Distribuição Nacional: Gêneros Industriais............................................................197
Tabela 6.4 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004) e a Amostra Tese: Faixas
por Número de Funcionários ...................................................................................198
Tabela 6.5 – Distribuição Nacional de Empresas por Faixas de Funcionários....198
Tabela 6.6 – Comparação entre a Amostra de Peixoto (2004) e a Amostra Tese:
Origem do Capital .....................................................................................................199
Tabela 6.7 – Média da Intensidade de Uso das Práticas no Brasil.........................201
Tabela 6.8 – Teste t para amostras associadas ........................................................202
Tabela 6.9 – Grau de adoção de práticas gerenciais e Localização - Estado .........211
Tabela 6.10 – Grau de adoção de práticas gerenciais e Localização - Região.......212
Tabela 6.11 – Grau de adoção de práticas gerenciais e gênero industrial .............213
Tabela 6.12 – Grau de adoção de práticas gerenciais e número de funcionários..214
Tabela 6.13 – Grau de adoção de práticas gerenciais e origem de capital .............214
Tabela 6.14 – Crescimento da Receita .....................................................................215
Tabela 6.15 – Faixas de Lucro .................................................................................216
Tabela 6.16 – Rentabilidade sobre a Receita ...........................................................217
Tabela 6.17 – Rentabilidade sobre o Patrimônio.....................................................217
Tabela 6.18 – Comunalidades ..................................................................................221
Tabela 6.19 – Variância Total Explicada ................................................................222
Tabela 6.20 - Matriz de Componentes Rotacionados ..............................................223
Tabela 6.21 – Centros Finais dos Clusters...............................................................229
Lista de Figuras
Figura 2.1 - O Ciclo da Inovação...............................................................................38
Figura 3.1 – Um framework Integrado entre Gestão da Qualidade Total, Just in
Time e Manutenção Produtiva Total..........................................................................63
Figura 3.2 – Um Framework Teórico sobre a Combinação de Práticas Inovadoras
......................................................................................................................................64
Figura 3.3 - Elementos da Manutenção Produtiva Total..........................................79
Figura 3.4: O impacto do desempenho da qualidade no desempenho operacional do
negócio.........................................................................................................................95
Figura 4.1 - Tipos de Desenvolvimento Tecnológico ..............................................130
Figura 5.1 - Modelo Heurístico da Crise do Capitalismo e suas Repercussões .....167
Figura 5.2 – Modelo Heurístico de Análise .............................................................186
Figura 6.1 – Nível de Utilização das Práticas na Amostra Original e Amostra Final
....................................................................................................................................205
Figura 6.2 – Alcance das Práticas em Relação a Melhorias em Qualidade, na
Amostra Original e Amostra Final...........................................................................206
Gráfico 6.3 – Alcance das Práticas em Relação à Redução de Custos, na Amostra
Original e na Amostra Final ....................................................................................207
Figura 6.4 – Alcance das Práticas em Relação à Melhorias em Responsividade, na
Amostra Original e na Amostra Final .....................................................................208
Figura 6.5 – Propensão à Continuidade de Uso, na Amostra Original e Amostra
Final ..........................................................................................................................209
Figura 6.6 – Centros Finais dos Clusters ................................................................230
Figura 6.7 – Práticas inovadoras, desempenho operacional, desempenho financeiro
e propensão à continuidade de uso...........................................................................242
Figura 6.8 - Modelo 1: Práticas Inovadoras de gestão de pessoas, desempenho
operacional, desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso .............245
Figura 6.9 – Modelo 2: Células de Manufatura, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso ...................................247
Figura 6.10 – Modelo 3: Reengenharia, reduções de custos, desempenho financeiro
e propensão à continuidade de uso...........................................................................248
Figura 6.11 – Modelo 4: Terceirização, desempenho operacional, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso ........................................................249
Lista de Quadros
Quadro 2.1 - Questões centrais em quatro perspectivas organizacionais.................41
Quadro 2.2 - Fronteiras Organizacionais, Forma Organizacional e Ênfase
Estatégica ....................................................................................................................48
Quadro 3.1 - Cronologia de Desenvolvimento de Práticas em Administração ........62
Quadro 3.3 - Conceitos Selecionados de Células de Manufatura.............................83
Quadro 3.4. Sumário dos contrastes na implementação e institucionalização ........99
Quadro 4.1 - Taxonomia de práticas inovadoras em produção e organização ......124
Quadro 4.2 – Adoção de Práticas Inovadoras de Administração e Produção no
Reino Unido...............................................................................................................126
Quadro 4.3 – Clusters de Empresas em Relação aos Padrões de Adoção de Práticas
Inovadoras.................................................................................................................145
Quadro 4.4 – Adoção de Práticas Inovadoras de Administração e Produção Brasil
....................................................................................................................................154
Quadro 5.1 - Definições Operacionais das Práticas de gestão Pesquisadas ..........183
Quadro 6.1 – Fatores Identificados na Amostra .....................................................226
Quadro 6.2 Cluster 1 – Inovadores Intensivos.........................................................231
Quadro 6.3 Cluster 2 – Inovadores Moderados .......................................................233
Quadro 6.4 Cluster 3 – Inovadores Intensivos Indiferentes a Custos ....................235
Quadro 6.5 Cluster 4 – Inovadores Moderados com Foco em Gestão de Pessoas.236
Quadro 6.6 Cluster 5 – Inovadores Moderados Indiferentes a Produção ..............238
Quadro 6.7 – Interpretação e Classificação dos Clusters........................................239
Quadro 7.1 – Objetivos específicos, hipóteses e método estatístico.........................258
A Taís, Luís e João, pela constante compreensão nos momentos de ausência, mas,
principalmente, pela alegria e doce companhia. Sem vocês, tudo isto não faria
sentido...
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus pela oportunidade e condições de realizar um tão
importante projeto de vida e de carreira.
Aos meus pais, João Alberto e Maristela, por terem sido figuras tão marcantes em
minha vida, exemplos de luta e perseverança. O amor e o orgulho inquestionáveis de
vocês sempre foram importantes motivações para que eu acreditasse em minha
capacidade de me superar e reinventar.
A Professora Elizabeth Loiola, por suas inúmeras e incansáveis contribuições para a
realização desta tese, e pela forma cuidadosa com que me auxiliou a superar os
desafios surgidos.
Ao Professor Antonio Virgílio Bittencourt Bastos, pela sua presença e orientações,
sempre tão sensatas e apropriadas.
Aos amigos, colegas, professores e dirigentes do Núcleo de Pós-Graduação em
Administração e da Escola de Administração da UFBA, por me terem recebido e
acompanhado de forma tão carinhosa e atenciosa, pelas orientações e pelo apoio.
Em especial à grande amiga Maria Valéria Gaspar de Queiroz Ferreira, que esteve
sempre presente, compartilhando as angústias e ansiedades deste processo. Que
nossas vidas sejam marcadas por momentos de superação e realização, e que nunca
deixemos de almejar às mais nobres realizações.
Um agradecimento especial, também, à amiga Ana Luíza Codes, pelo precioso auxílio
na elaboração da modelagem de equações estruturais e pelas contribuições prestadas
na análise quantitativa desta tese.
À tia Marialva de Aquino Póvoas, não somente pela valiosa contribuição dada a esta
tese, mas também, e principalmente, pelo carinho, sempre dedicou a mim e à minha
família.
A todos que me acompanharam durante os últimos anos, que sofreram e se
angustiaram, mas também celebraram os momentos mais importantes.
Muito Obrigado!
Resumo
Esta tese avalia a adoção, os resultados percebidos e a propensão à continuidade de
uso de doze práticas inovadoras de administração no cenário industrial brasileiro,
assim como a relação entre a adoção de práticas inovadoras de gestão e o desempenho
operacional e financeiro das adotantes, com base em uma amostra não probabilística
por conveniência de 98 empresas, que compõem o banco de dados de pesquisa survey
cross section, aplicada junto a 220 empresas com mais de 150 funcionários. Os
resultados encontrados sobre adoção de práticas inovadoras foram comparados com
os apresentados em Peixoto (2004), não sendo encontradas diferenças relevantes.
Foram também verificadas as relações entre a adoção de inovações e as características
organizacionais. Apesar de haver diferenças entre características organizacionais e
inovatividade, não foram encontrados resultados estatisticamente significativos
quanto a estado, região e origem de capital. Entretanto, foram encontrados resultados
estatisticamente significativos entre inovatividade e porte organizacional, aqui
avaliado levando em conta o número de funcionários, e o desempenho financeiro.
Posteriormente, foram investigadas as relações internas entre as práticas investigadas,
no intuito de agrupar, com o uso da análise fatorial, aquelas que apresentaram relações
entre si. Foram identificados, no grupo de doze práticas avaliadas, três construtos que
explicam 51,43% da variância total da amostra – práticas inovadoras de gestão de
pessoas, de gestão do processo produtivo e do desenvolvimento de produtos e de
gestão do desempenho e dos custos. Esses construtos foram utilizados em análise
posterior, de modo a comparar e agrupar as organizações em clusters que
apresentaram características semelhantes, tendo sido identificados cinco grupos de
empresas – inovadores intensivos, inovadores moderados, inovadores intensivos
indiferentes a custos, inovadores moderados com foco em gestão de pessoas e
inovadores moderados indiferentes à produção. Por último, foram verificadas as
relações entre a adoção das práticas e o desempenho das organizações, tanto
operacional quanto financeiro, e ainda com a propensão à continuidade de uso, por
meio da modelagem de equações estruturais. A modelagem confirma a existência de
associações entre a adoção das práticas e o desempenho operacional, mas não
confirma associações com o desempenho financeiro.
Abstract
This thesis evaluates the adoption, perceived results and the propensity to continue to
use of twelve innovative business practices in the Brazilian industrial scenery, as well
as the relation between the adoption of innovative managerial practices and the
adopters operational and financial performance, based in a non-probabilistic by
convenience sample of 98 companies arranged in a research database from a cross
section survey methodology, with 220 companies with more than 150 employees. The
results found about the adoption of innovative practices were compared to those found
in Peixoto (2004), with no relevant differences found. The relationships between the
adoption of innovation and organizational features were investigated. In spite of
finding differences between organizational features and innovativeness, no
statistically significant differences were found as to state, region and capital
ownership. Nevertheless, statistically significant relations were found between
organizational innovativeness and size, measured through the number of employees,
and financial performance. Later, it was investigated the internal relationships
between the practices studied, with the intent of arranging, through factor analysis,
those which show any relationship among them in groups or constructs. In the twelve
practices investigated were identified three constructs that explain 51,43% of the total
variance of the sample – innovative practices of management of people, production
process and cost and performance. Those constructs were used in a subsequent
analysis, aimed at comparing and grouping the companies in clusters that showed
similar features. Five clusters were identified – intensive innovators, moderate
innovators, intensive innovators unconcerned with costs, moderate innovators focused
in people management and moderate innovators unconcerned with production.
Finally, the relationship between the adoption of the practices and organizational
performance, in both the financial and operational dimensions, and still between the
propensity to use the practices were investigated, through structural equation
modeling. The modeling confirms the existence of associations between the adoption
of innovative business practices and operational performance, but no association was
found with financial performance.
1. Introdução
Desde o início do século XX, com o advento da Administração Científica, a
prospecção, o desenvolvimento e a adoção de novas e melhores práticas gerenciais
tornaram-se comportamentos padrões de organizações líderes e seus executivos, em
seus respectivos campos de atuação, e de estudiosos e consultores do campo das
organizações. Com o avanço do capitalismo em direção a uma nova etapa, as grandes
conquistas sociais e produtivas da era de ouro do taylorismo/fordismo parecem ter
ficado para trás, erigindo-se uma cortina de fumaça sobre elas. A chegada do novo
século e a do novo milênio foram anunciadas como o começo de uma nova era no
campo das organizações na qual gestores, trabalhadores, consultores e pesquisadores
do campo organizacional muito pouco tinham a aprender com o que tinha ficado para
trás. Na verdade, o grande imperativo que se colocava aos agentes antes mencionados
era o de aprender novas práticas gerenciais, formatar novas estruturas, estabelecer
novos padrões de conduta, gerar novas teorias e metodologias, etc., para dar conta de
uma era sob a égide da mudança turbulenta e permanente, na qual práticas gerenciais,
estruturas, condutas, teorias e metodologias herdadas foram consideradas obsoletas e
até mesmo responsáveis pela crise do capitalismo, deflagrada na década de 1970.
Novos modelos de gestão e novas práticas gerenciais passaram a representar um
promissor filão no campo de negócios internacionais. As vendas de publicações de
negócios aumentaram rapidamente, especialmente no segmento de livros e material de
13
auto-ajuda. Consultores internacionais em especial – mas não somente eles –
passaram a prometer que seus novos modelos de gestão seriam os salvadores das
organizações, que poderiam se diferenciar e não só voltar a obter os mesmos
resultados alcançados nas décadas de 1950/1960, mas, também, superá-los.
Apesar de muitos dos novos modelos de administração ser embalagens novas para
velhas soluções, e passada a euforia da mudança, as evidências apontam diferentes
experiências organizacionais em relação à incorporação e absorção de novas
tecnologias gerenciais. Aparentemente, a mera incorporação de práticas inovadoras
não garante às organizações adotantes a obtenção de resultados iguais: a utilização de
alguns daqueles modelos e daquelas práticas gerenciais parece trazer vantagens reais a
seus adotantes, favorecendo melhorias em termos de desempenho e de
competitividade por meio de redução de custos, de responsividade e de maior
qualidade dos produtos, embora tais resultados sejam diferenciados entre os adotantes,
em função de fatores específicos dos próprios adotantes e de outros emanados de seus
ambientes técnicos e institucionais.
A visão apresentada no parágrafo anterior só recentemente vem se difundindo. Sob a
hegemonia de discursos que reforçavam a associação entre a difusão generalizada de
práticas de gestão da produção e do trabalho diferentes das tradicionais da era do
taylorismo/fordismo, a difusão de novas tecnologias informacionais e de formas
diferentes de organização dos estados e de participação social, o discurso da mudança,
do novo, certamente com suas variantes críticas, mas sempre enfocando a mudança, o
novo, foram ungidos à condição de único discurso científico, inclusive no campo dito
(REED, 1999) ‘historicamente contestado’ da teorização organizacional. Certamente,
assim como no lado de lá, no lado de cá houve um certo clamor no sentido de que se
14
perseguisse a adaptação das novas tecnologias de gestão, a exemplo de Wood Jr. e
Caldas (1998).
Apesar do apelo lançado por Wood Jr. e Caldas (1998), o fato é que por cá mais do
que apenas reproduzimos: reproduzimos de forma ampliada as idéias que aqui
aportavam. Aqui incorporamos a postulação lançada por Grey (2004, p.15) de que
“modismos são resultados de processos sociais particulares de imitação competitiva”.
Enfim, empurrado pelos ventos novidadeiros, no Brasil, como no mundo, com
enfoques mais micro ou enfoques mais macro, o tema da mudança tornou-se o centro
de inúmeros trabalhos desenvolvidos ao longo dos anos 90 ou a justificativa para a
realização, seja de trabalho teórico, seja de proposta de pesquisa de campo. Carvalho
e Vieira (2003, p.186) observam:
[...] Fazemos uso do pensamento dominante porque é mais facilmente
aceito sem precisar de tanto esforço e, principalmente, de tanto tempo para
o tornar legítimo, para fundamentar. Ele já o é a partir de pólos e pessoas
legitimas, pela repetição generalizada que construiu consenso. Assim a
academia pelas normas que se impôs, está conduzindo a sermos fabricantes
de uma ciência dócil [e, acrescentamos, dominada por um restrito grupo de
pesquisadores].
O ponto de partida desta tese de doutorado é o reconhecimento que há, sim, muitas
mudanças em curso. Mudanças essas, cujas forças são tão poderosas, que se
manifestam em novas formas de ver, de querer, de agir, de pensar e de fazer, em
comparação às formas prevalecentes na era do taylorismo/fordismo. Muitos dos
embriões dessas mudanças, tanto em suas manifestações micro-organizacionais,
quanto em suas manifestações macro-organizacionais, foram se formando e
desenvolvendo nas franjas do paradigma taylorista/fordista. Ademais, as mudanças
não ocorreram em sentido, ritmo e intensidade iguais entre setores, países, regiões e
organizações. Não têm, também, se consubstanciado, como se difundiu originalmente,
no sentido da conformação de um mundo mais singularizado pela igualdade do que
pela desigualdade. De uma perspectiva econômica neoschumpeteriana, na qual a
15
separação entre o micro e o macro encontra-se diluída por subsunção do micro pelo
macro, tudo isso tem a ver com as organizações e as instituições desses países.
Após décadas de relações internacionais restritas e políticas protecionistas da indústria
nacional, as empresas brasileiras mostraram-se muito fragilizadas competitivamente
com a abertura comercial promovida pelo Governo Collor no início dos anos 90 do
século XX. Seus gaps competitivos evidenciaram-se tanto em termos de
obsolescência da tecnologia gerencial quanto em relação à tecnologia stricto sensu, o
que criou uma defasagem de desempenho em comparação com suas concorrentes
internacionais. A partir da crescente redução de barreiras e aumento de intercâmbios
com organizações estrangeiras, movimento esse mais fortemente sentido a partir do
início da década de 1990, as empresas nacionais foram forçadas a tentar reduzir essa
defasagem, melhorando a qualidade de seus produtos e aprimorando sua capacidade
gestora.
Por outro lado, pode-se inferir que, em alguns casos, foram exatamente as políticas
protecionistas que permitiram o desenvolvimento de tecnologias originais de alta
qualidade. Nesses casos, por estarem protegidas contra a competição internacional, de
nível supostamente mais elevado que a competição doméstica, alguns setores e
algumas empresas puderam realizar investimentos e desenvolver soluções
competitivas, apesar da dificuldade de importação de equipamentos e de
conhecimento.
Com a crescente redução e eliminação de barreiras comerciais e alfandegárias, as
empresas brasileiras intensificam seu relacionamento com concorrentes e parceiros
internacionais, tanto domesticamente – o que provavelmente representa a maioria dos
casos – quanto internacionalmente – reflexo da atuação de uma elite de empresas
brasileiras que atua em mercados externos. Ao se compararem com suas concorrentes
16
internacionais, tornaram-se evidentes os gaps de desempenho, o que terminou
estimulando o aparecimento do que Wood Jr. e Paula (2001) chamaram de uma forma
de cultura da administração ou do management. Essa cultura se concretiza por
intermédio de alguns canais que se tornaram responsáveis pela difusão de modelos de
administração criados alhures: as escolas de administração, as empresas de
consultoria, os gurus de gestão e a mídia de negócios (WOOD JR. e CALDAS 1998,
WOOD JR. e PAULA 2001).
De fato, o novo ambiente empresarial, a partir do início da década de 1990, é marcado
pela crescente consciência da necessidade de melhorias em gestão, aumento da
eficiência e da competitividade de empresas nacionais, com base freqüentemente em
importação de práticas.
À medida em que o Brasil, como outros países emergentes, insere-se em
uma nova ordem econômica, marcada pela hipercompetitividade e pela
interconectividade, crescem as pressões para a adoção de práticas
gerenciais mais avançadas, que capacitem as empresas locais a competir
em um cenário globalizado (WOOD JR. e CALDAS, 1998, p.3)
O brasileiro tem se mostrado especialmente sensível a novidades desenvolvidas offshore, devido a fatos históricos que moldaram seu caráter e comportamento, desde sua
colonização, conforme sugerem Wood Jr. e Caldas (1998), em uma espécie de
etnocentrismo às avessas, no qual tudo o que é produzido lá fora é supostamente
melhor ou mais interessante do que o que é produzido aqui.
O fato é que tem havido no Brasil um movimento de importação e difusão de modelos
e práticas gerenciais desenvolvidos em outros países, especialmente no decorrer da
década de 1990 e no início dos anos 2000, e não se conhece o ritmo e a intensidade
desse movimento.
Trabalhos desenvolvidos no Brasil sobre mudanças em ‘práticas de gestão’
caracterizam-se, em regra, por serem estudos de caso de empresas bem sucedidas, ou
relatos de experiências de consultores-pesquisadores, também de abrangência limitada
17
e com base em metodologias qualitativas; são, essencialmente, abordagens
sincrônicas. Logicamente já existem muitas iniciativas que espelham a preocupação
com uma avaliação mais longitudinal, embora ainda limitada a setores específicos,
como é exemplo o trabalho de Githay (2000) e Bastos et al (2004).
Em síntese, no Brasil não tem sido comum a publicação de trabalhos que se destinam
a investigar, com um foco mais amplo, a utilização de práticas inovadoras de modo
geral em amostras mais amplas de organizações. Faz-se necessário, portanto,
compreender a dinâmica da adoção de práticas entre empresas, fenômeno que, de
acordo com os argumentos apresentados até aqui, tem sido marcante no cenário
empresarial brasileiro, especialmente no decorrer da década de 1990 e no início dos
anos 2000.
Esta tese de doutorado tem como objetivo identificar padrões de adoção e a relação
entre o uso de práticas inovadoras – reengenharia de processos, parcerias na cadeia de
suprimento (supply-chain management), terceirização (outsourcing), cultura de
aprendizagem, empowerment, trabalho baseado em equipes, manutenção produtiva
total (total productive maintenance), engenharia simultânea, tecnologia integradas
baseadas em computador (CIM – computer integrated manufacturing), células de
manufatura, just in time e gestão da qualidade total – e o desempenho, operacional e
financeiro, de organizações industriais, em operação no Brasil no ano de 2002. A
pesquisa desenvolvida foi de natureza quantitativa. Majoritariamente, os dados
analisados foram obtidos com base em uma amostra não probabilística por
conveniência. Esses dados foram tratados com base em técnicas de estatística
descritiva e multivariada.
Suas principais contribuições são no sentido de ampliar o conhecimento sobre
diferentes condutas organizacionais em relação à adoção de novas práticas,
18
possibilitar novos estudos em relação ao tema, permitir uma visão consolidada da
relação entre a utilização de práticas inovadoras de produção e seus reflexos no
desempenho organizacional e contribuir com as organizações e executivos, no sentido
de um aumento da possibilidade de sucesso na adoção de projetos que envolvam os
assuntos discutidos.
Esta tese se divide em seis seções, além desta introdução. No capítulo dois, são
discutidas diferentes abordagens sobre a dinâmica da relação entre inovação,
desenvolvimento econômico e organizações. Para os economistas, a análise da
tecnologia normalmente assume uma perspectiva macro orientada, focada na relação
entre tecnologia e desenvolvimento econômico e social. Examinando um nível mais
micro orientado, duas perspectivas são visíveis. A primeira, também associada a
análises econômicas da difusão de inovações na sociedade, interpreta a relevância da
inovação tecnológica com enfoque na organização (firma). A segunda perspectiva,
focada também no organizacional, posiciona o desenvolvimento da tecnologia como
fonte de vantagens competitivas sustentáveis que diferenciam as organizações entre si.
No capítulo três é apresentado o conceito de prática de gestão, e são propostos três
domínios organizacionais nos quais tem havido importantes inovações em práticas
gerenciais – práticas inovadoras de gestão de pessoas, práticas inovadoras de gestão
da produção e práticas inovadoras de gestão do desempenho, e são apresentadas e
discutidas algumas práticas de cada um desses domínios. Práticas inovadoras de
gestão de pessoas são voltadas para a obtenção de maior comprometimento e maior
envolvimento por parte dos empregados, como meio de melhorar o desempenho
organizacional. Práticas inovadoras de gestão da produção visam reorganizar o
processo produtivo, também no sentido de atingir melhores índices de desempenho.
Práticas inovadoras de gestão do desempenho são práticas mais amplas, que
19
normalmente envolvem uma compreensão mais ampla dos processos organizacionais,
inclusive a produção e a gestão de pessoas, que visam acelerar os tempos dos ciclos e
eliminar ineficiências em organizações.
O quarto capítulo investiga o estado do campo sobre práticas gerenciais inovadoras no
reino Unido, Brasil e no Brasil em comparação a outros países. As análise registradas
neste capítulo sugerem que, no Brasil, o movimento de modernização gerencial se
inicia a partir do movimento de redução de barreiras comerciais, o que favoreceu a
presença de organizações de outros países, criando um ambiente mais competitivo
para as organizações brasileiras, antes protegidas por decreto. Nesse sentido, o cenário
brasileiro na década de 1990 foi um terreno fértil para adoção de novas práticas
gerenciais, originadas offshore.
O quinto capítulo apresenta a metodologia utilizada nesta tese, incluindo a
problematização, definição de objetivos, hipóteses, a definição do modelo de análise,
do universo e da amostra, e ainda o instrumento de pesquisa e a forma de análise dos
dados.
O sexto capítulo trata dos resultados obtidos e sua discussão, incluindo a
caracterização da amostra, em comparação com aquela utilizada em Peixoto (2004),
uma investigação sobre a adoção de práticas inovadoras no Brasil, trata dos resultados
percebidos e a propensão à continuidade de uso e ainda de uma análise do grau de
adoção em relação às características organizacionais. O capítulo seis trata, ainda, do
agrupamento das doze práticas em três construtos, por meio da análise fatorial. Esses
construtos são, posteriormente, utilizados para agrupar as empresas em cinco tipos, de
acordo com o padrão de inovação verificado pela análise de conglomerados. Em
seguida, é realizada uma análise das associações entre as variáveis no intuito de
identificar as relações entre a adoção de inovações gerenciais, o desempenho
20
operacional e financeiro e a propensão à continuidade de uso de práticas inovadoras,
com base no método de equações estruturais.
Por último, no capítulo sete, são apresentados alguns comentários finais sobre a
pesquisa, relativas aos padrões de adoção de práticas inovadoras no Brasil. A análise
das informações aqui apresentadas sugere a existência de um movimento de
modernização gerencial no Brasil, resultante da necessidade das organizações
brasileiras de se atualizarem, especialmente diante dos novos desafios apresentados
pela crescente interação com organizações de outros países. Esse movimento não
converge em direção a algumas práticas isoladas, sugerindo, muito mais, uma busca
generalizada por soluções para a crise do modelo capitalista da produção em massa.
2. Em busca de uma abordagem sobre a dinâmica da relação entre
inovação, desenvolvimento econômico e organizações
A sucessão de novas tecnologias e de inovações sociais tem sido elemento central na
explicação do desenvolvimento do mundo capitalista. Quais são as trajetórias que os
Países têm desencadeado em busca de inovações? Quais os papéis das firmas no
processo de inovação? Qual a relação entre inovação, competitividade e
desenvolvimento? As respostas a essas questões são complexas e muitos de seus
aspectos ainda estão por serem decifrados ou estão decifrados de maneira
insatisfatória. Algumas explicações.
Appelbaum e Batt (1994) indicam que o modelo tradicional de administração,
prevalecente até a década de 1970 – o sistema de produção em massa – caracterizavase pela utilização de tecnologia dedicada, pela organização do trabalho parcelizado,
pelo compartilhamento de ganhos de desempenho entre trabalhadores e firmas, pelo
crescimento do consumo com base no crescimento do salário real e pela dinâmica de
investimento, baseada no princípio do acelerador, segundo o qual a expansão do
estoque de capital se dava com a expansão da demanda e do fluxo de caixa interno
(economia de escala).
Essa estrutura de crescimento cumulativo entrou em colapso devido ao
desaparecimento das condições que a favoreciam, como consumo em massa,
crescimento da renda e da demanda, bem como por pressões por maior responsividade
e competitividade organizacional. Como alternativa, emergem, nos Estados Unidos da
América, dois modelos que propõem solucionar as fraquezas do anterior – o modelo
das relações humanas e o modelo da produção flexível em massa. O primeiro envolve
práticas como enriquecimento e ampliação dos cargos e a oferta de oportunidades de
22
desenvolvimento de novas habilidades como forma de manter altos níveis de
satisfação e de desempenho. Incorpora também as descobertas feitas à época em
relação à comunicação, motivação e outros aspectos da psicologia organizacional
(APPELBAUM e BATT, 1994).
Ainda de acordo com Appelbaum e Batt (1994), o Modelo de Relações Humanas
apresenta diversas vantagens em relação ao tradicional Modelo de Relações
Industriais, como custos de trabalho mais reduzidos e maior flexibilidade na alocação
de trabalhadores. Ao desenvolver sistemas de compensação que contemplam as
diferenças individuais e recompensam um bom desempenho, e ao projetar cargos que
ofereçam variedade, desafios e oportunidades de aprendizado, as firmas esperam obter
benefícios como maior motivação e melhor desempenho por parte dos trabalhadores,
o que soa consistente com a abordagem motivacional, apresentada por Crowston e
Malone (1994).
O modelo de produção flexível em massa, por sua vez, engloba cortes de custos e
redução de equipes de tempo integral; é mais intensivo em tecnologias da informação
e de produção, baseadas em maior uso de microprocessadores. Esse modelo,
entretanto, mantém as estruturas hierárquicas de administração, as relações de poder
entre supervisores e trabalhadores, a separação entre concepção e execução, o uso
relativamente elevado de trabalhadores de baixa qualificação e a manutenção de
trabalho rotineiro. Ele inclui, em menor escala, o uso de tecnologia menos dedicada e,
portanto, mais flexível, como máquinas ferramentas programáveis e sistemas de
informações para administração. Inclui, também, a ampliação do treinamento
multifuncional
de
trabalhadores
qualificados,
em
um
contexto
geral
de
desqualificação de trabalhadores de linha de frente ou de produção, assim como
23
subcontratação e terceirização para atingir flexibilidade e responder à turbulência do
mercado e às variações na demanda (APPELBAUM e BATT, op.cit.).
Nenhum desses dois últimos modelos rompe com a organização tipicamente
centralizada e hierarquizada, nem com sua lógica de crescimento e desenvolvimento,
mantendo as organizações com praticamente as mesmas características e limites do
modelo tradicional. Ainda de acordo com Appelbaum e Batt (1994), o rompimento
desses limites será perseguido por modelos alternativos desenvolvidos em outros
países, como Japão (Produção Enxuta), Suécia (Sistema Sócio-Técnico), Alemanha
(Produção Diversificada com Qualidade) e Itália (Especialização Flexível).
Novamente para Appelbaum e Batt (1994), o desenvolvimento de um sistema norte
americano de alto desempenho vai se espelhar, mais recentemente, em experiências
bem sucedidas de países como o Japão, Suécia, Itália e Alemanha.
Apesar de esses modelos atingirem maiores níveis de sucesso que o tradicional, no
sentido em que permitem maior flexibilidade de ajustes às condições instáveis que
ocorrem em seus ambientes, nenhum deles emerge como um best way. Cada um deles
apresenta vantagens específicas em relação ao esgotado modelo de produção em
massa:
Sistemas sócio-técnicos usam equipes de produção para combinar
altos níveis de qualidade de projeto com melhorias regulares em
qualidade em bens produzidos para nichos de mercado de bens de
luxo ou de alta qualidade. A produção enxuta possibilita produtores
de grandes volumes a obter melhorias simultâneas em termos de
conformidade em qualidade e simplificações nos processos de
produção, de modo a oferecer produtos de alta qualidade e grande
variedade em mercados de consumo de massa. Especialização
flexível confere a empresas pequenas ou descentralizadas a
habilidade de inovar e responder rapidamente a variações na
demanda e as variações nos produtos. Produção diversificada com
qualidade habilita os produtores a fornecer produtos de alta
performance, customizados a segmentos de mercados mais altos,
que não competem com base no preço (APPELBAUM e BATT
1994, p.50)
24
A análise de Appelbaum e Batt (1994) sugere que não existe um único modelo de
organização que seria mais apropriado para um suposto contexto único mundial. Ao
contrário, são múltiplas as formas de organizar o trabalho e obter os resultados, dentro
de contextos sociais, econômicos e culturais diversos. Entretanto, é possível
identificar algumas características em comum, apresentadas pelos sistemas estudados
por essas autoras, como o uso de tecnologias flexíveis, algum tipo de participação dos
trabalhadores ou trabalho em equipes, níveis mais elevados de educação e
treinamento, utilização flexível dos trabalhadores, um maior compromisso com a
segurança do nível de emprego, a redução do gap entre trabalhadores e
administradores e o papel ativo dos sindicatos e comitês representantes dos
trabalhadores no alcance de ganhos de desempenho no processo de produção. Esses
elementos podem ser encontrados, ainda que com algumas diferenças em abordagem,
em Piore e Sabel (1984), Kumar (1997) e Gitahy (2000).
Outros autores extrapolam a importância da inovação e do conhecimento da esfera da
organização para a esfera da sociedade, estudando os efeitos agregados do
desenvolvimento tecnológico, que ocorre dentro das organizações, sobre a dinâmica
de nações e regiões geográficas. Para Teece (2000), as importâncias da firma e de sua
capacitação tecnológica para o desenvolvimento econômico são por demais evidentes:
O acúmulo bem sucedido de conhecimento e a orquestração de
ativos e tecnologias complementares em um sistema legal, político,
financeiro e social, que possibilitam o comprometimento crível e o
acúmulo de riqueza encontram-se no coração do processo de
desenvolvimento econômico. Para compreender o desenvolvimento
econômico, é necessário, portanto, que se compreenda o processo
de desenvolvimento da firma. Se as firmas são realmente o
instrumento de desenvolvimento, o estudo do desenvolvimento
econômico não pode ocorrer de forma separada do estudo da teoria
do desenvolvimento da firma. (TEECE, 2000, p.124)
25
Segundo, ainda, o mesmo autor, as forças das organizações enquanto vetores de
desenvolvimento econômico, derivam de duas dimensões, em especial: (1) a
alavancagem de ativos existentes em negócios novos ou correlacionados aos atuais, e
(2) a capacidade de aprender, de combinar ou de recombinar ativos para estabelecer
novos negócios ou direcionar esforços a novos mercados.
A capacidade de sobrevivência e a competitividade de uma organização diante de
pressões oriundas do ambiente pressupõem e levam ao desenvolvimento tecnológico.
Quando as organizações de determinado sistema social conseguem promover o
desenvolvimento conjunto de soluções tecnológicas, desencadeiam uma nova
dinâmica de desenvolvimento que perpassa todo esse sistema. Essa perspectiva
também é apresentada por Malerba (1992). Segundo este autor, o aprendizado
ocorrido nas organizações é a raiz do desenvolvimento industrial e econômico, por
intermédio de processos contínuos de aquisição e geração de conhecimento, que
proporcionam diversas trajetórias de mudança incremental.
Pode-se depreender que não é apenas a criação, mas também a adoção e a difusão de
novos conhecimentos que são o centro do desenvolvimento de organizações e
sociedades. O ritmo e a intensidade com os quais as inovações se propagam no tecido
social possibilitam mobilidade no posicionamento competitivo e empresas que
conseguem se desenvolver ou se apropriar de tecnologias de difícil imitação adquirem
vantagens, frequentemente sustentáveis, em relação às suas concorrentes.
Assim, diferentes perspectivas da relação entre inovação, desenvolvimento econômico
e
organizações,
oferecidas
por
economistas,
psicólogos
organizacionais
e
administradores são exploradas nesta seção para delimitar o macro contexto dentro do
qual se situam as inovações organizacionais.
26
2.1. Inovação e desenvolvimento econômico
Perez (2003) argumenta que as revoluções tecnológicas se sucedem, proporcionando
mudanças sociais e desenvolvimento econômico aos países e regiões de origem. Essa
autora sugere que cada revolução tecnológica inicia-se com forte divergência nas
taxas de crescimento das indústrias, países e regiões, e com reduções de tendências de
distribuição de renda. Durante essa fase, inovações sustentáveis convivem com
grandes manias e fraudes, verificam-se graves crises, recessões e depressões, abrindose caminho para a instalação de um novo paradigma tecnoeconômico.
A realização do pleno potencial de criação de riqueza de uma revolução tecnológica
requer o estabelecimento de uma estrutura sócio-institucional adequada. A estrutura
sócio-institucional existente, criada para manter o crescimento baseado no paradigma
anterior, não é adequada para sustentar o crescimento no novo paradigma. Sendo
assim, nas décadas iniciais da instalação de novas indústrias e infra-estruturas ocorre
um desequilíbrio entre as esferas tecnoeconômica e sócio-institucional, bem como um
desajuste interno no sistema econômico entre a tecnologia nova e a antiga. Mas com o
desenvolvimento e a difusão crescente de novas instituições, observa-se um período
de grande prosperidade, uma vez que tais instituições já oferecem plenas condições de
exploração da nova tecnologia em escala comercial. Deste modo, o processo de
restabelecimento do equilíbrio e de criação de condições para o reajuste do sistema,
assim como para a realização de seu pleno potencial, é complexo, longo e socialmente
doloroso.
Para Perez (2003), a dinâmica da economia baseia-se na forma como surgem as
revoluções tecnológicas, mais especificamente na maneira como elas geram um
grande potencial criador de riqueza, que é assimilado pelos sistemas econômico e
27
social. Entretanto, uma vez desenvolvida, a nova tecnologia só atingirá seu pleno
potencial lucrativo após duas ou três décadas, tempo médio necessário para o
desenvolvimento da infra-estrutura institucional para sua exploração em escala
comercial.
Freeman e Perez (1984) já haviam postulado que as principais mudanças históricas da
humanidade, a partir da primeira revolução industrial, deviam-se à sucessão de
paradigmas tecnoeconômicos, formados por sistemas inter-relacionados de produtos,
processos, e inovações tecnológicas e gerenciais radicalmente diferentes das práticas
predominantes em engenharia e administração. Segundo estes autores, na mudança de
paradigma, novas tecnologias vão crescentemente apresentando vantagens relativas
em comparação com as tecnologias tradicionais, como custo mais baixo e capacidade
ampliada de adequação às mais diversas aplicações, e como geração de impactos
positivos sobre qualidade e custo do equipamento, do capital, do trabalho e dos
produtos.
Logicamente, cada paradigma tecnoeconômico corresponde a um “tipo ideal” de
organização produtiva que incorpora um “fator-chave” ao máximo. Com a difusão do
paradigma e a conseqüente superação de seus problemas tecnológicos, tal fator-chave
tende a adquirir cada vez mais importância na determinação dos custos da estrutura
produtiva como um todo, enquanto que o “fator-chave” anterior passa a ser cada vez
menos encontrado. Adicionalmente, a difusão do novo paradigma tecnoeconômico
associa-se a (1) uma nova forma de organização da firma e das plantas industriais
(best practices), (2) a um novo perfil de habilidades que afeta a quantidade e a
qualidade do trabalho e o padrão de distribuição da renda, (3) a um novo mix de
produtos que fazem uso intensivo do fator chave de baixo custo e tornam-se o alvo
preferido dos investimentos (4) a novas tendências em inovações básicas e
28
incrementais, utilizando o “fator-chave”, que substituem os elementos de alto custo
ainda presentes no novo paradigma tecnológico (5) a um novo padrão na alocação de
investimentos resultante das mudanças ocorridas na estrutura de custos relativos, (6) a
uma onda de investimentos estruturais necessários para criar as externalidades
requeridas pelo novo “fator-chave”, e (7) a uma tendência à concentração de firmas
em setores em que o novo fator-chave é produzido ou mais bem utilizado, sendo que
diferentes setores atuam como vetores de crescimento em cada movimento ascendente
do ciclo.
O tipo ideal de organização prevalecente na etapa atual de desenvolvimento do
capitalismo tende a caracterizar-se pela associação entre administração e produção em
um único sistema integrado, de resultados flexíveis, e produtos e serviços
preferencialmente intensivos em informação, que mudam rapidamente. Com o
crescimento liderado pelo setor de eletrônica e de informação, há necessidade de
maciços investimentos em infra-estrutura de telecomunicações. O perfil de
habilidades muda para exigir qualificações cada vez maiores e mais generalistas,
incluindo a capacidade de gerenciar informação. A diversidade e a flexibilidade
tendem a substituir a massificação como padrões consensuais de “melhores práticas”.
Quando você introduz controle numérico ou tecnologia da
informação em uma firma, que trabalhava anteriormente com
tecnologia eletromecânica, não é possível atingir todo o aumento
potencial de produtividade sem transformar toda a organização,
tanto ao nível da planta quanto ao nível de escritório, incluindo
retreinamento e reestruturação das formas de interação
(FREEMAN e PEREZ, 1984, p.12).
Enfim, um novo paradigma tecnoeconômico não produzirá seus melhores resultados a
não ser que toda a estrutura sócio-institucional seja transformada para atender aos
seus requisitos, também para Freeman e Perez (1984). Essa mudança envolve enormes
transformações no padrão de habilidades da força de trabalho, assim como nos
29
sistemas de educação e treinamento, nas atitudes de gerentes e trabalhadores, no
padrão de relações industriais e de participação dos trabalhadores, nos arranjos
produtivos, no padrão de demanda dos consumidores, na estrutura conceitual de
economistas, contadores e governantes, e em prioridades políticas, sociais e
legislativas.
Nos estágios iniciais de difusão de um novo paradigma tecnoeconômico, as
oportunidades lucrativas de investimento em novas tecnologias são restritas
principalmente a alguns setores líderes. Somente quando as mudanças institucionais
necessárias se desenvolvem de forma mais abrangente, quando a infra-estrutura básica
já está preparada e as habilidades necessárias já estão mais disponíveis, é que as
oportunidades
para
novos
investimentos
tornam-se
amplamente
percebidas
observando a economia, e um aumento geral nas taxas de lucro e produtividade de
capital, viável.
Isso significa que, durante este período de transição, a maioria das firmas que opera
fora dos setores líderes se depara com problemas de peso: uma taxa de lucro
decrescente, baixa produtividade de capital, e, freqüentemente, com capacidade
excessiva e margens estagnadas. Nessas situações, essas empresas tentam recuperar
suas margens de lucro utilizando-se de práticas mais tradicionais como, por exemplo,
reduções de salários e aumento da intensidade do trabalho.
Também para a teoria da regulação, o desenvolvimento das economias de países
durante o período capitalista (AGLIETTA, 1987; BOYER, 1990; BOYER e
FREYSSENET 2000) pode ser explicado pela ótica da inovação. Para essa escola, a
cada etapa de desenvolvimento do capitalismo observa-se uma combinação específica
de modo de produção com regime de regulação e de desenvolvimento. Mudanças em
modos de produção seriam decorrentes da aplicação de inovações tecnológicas no
30
campo da produção, enquanto que os regimes de regulação e desenvolvimento se
relacionariam às inovações sociais e políticas para a exploração dos benefícios obtidos
com as novas tecnologias.
Essa corrente de estudiosos interpreta o desenvolvimento do capitalismo de acordo
com a difusão de dois padrões sociais. Cada um desses padrões apresenta uma forma
de organização do trabalho, decorrente da aplicação de tecnologias (paradigmas
tecnológicos) na empresa, permitindo novas formas de relações sociais.
O primeiro deles, denominado por seus estudiosos de fordismo, caracterizou as
economias ocidentais do final do século XIX até meados da década de 1970, com o
crescimento econômico sendo reflexo da combinação da produção em massa com
outros desenvolvimentos sociais, como a criação de sociedades de consumo, de uma
classe média trabalhadora com poder de compra que, juntos ao investimento público,
eram as principais fontes de aquecimento da economia.
O segundo padrão, por eles denominado pós-fordismo, representa um novo modelo de
desenvolvimento econômico e social que incorpora uma dinâmica de crescimento
mais adequada às condições existentes nas economias capitalistas a partir de meados
da década de 70 do século XX – demanda estagnada e fragmentada. O modelo pósfordista baseia-se na utilização de mecanismos flexíveis de produção, como
máquinas-ferramenta
numericamente
controláveis,
numa
re-qualificação
dos
trabalhadores, para que esses consigam absorver trabalhos mais amplos e mais
complexos, inclusive o controle da qualidade.
Aproximando-se de visão registrada no parágrafo anterior, Tenório (2000, p. 163)
considera que o pós-fordismo caracteriza-se pela “diferenciação integrada da
organização da produção e do trabalho sob a trajetória de inovações tecnológicas em
direção à democratização das relações sociais nos sistemas-empresa”. O pós-
31
fordismo, ainda segundo esse mesmo autor, é o resultado da evolução de condições
institucionais, alimentada pelo desenvolvimento tecnológico – em especial a
tecnologia eletroeletrônica, que não só possibilita, mas, também, demanda mudanças
significativas nos sistemas de produção utilizados pelas principais empresas do
mundo – e pela globalização, que se associaram à expansão da atuação das grandes
empresas em mercados internacionais, gerando a dinâmica de crescimento que
viabilizou o modelo. Ainda de acordo com Tenório (2000), o movimento de
mudanças estruturais no pós-fordismo inclui a utilização de estruturas organizacionais
mais horizontalizadas e menos compartimentalizadas, e a utilização de políticas
inovadoras de recursos humanos.
O paradigma pós-fordista é discutido ainda por outros autores - Womack, Jones e
Roos (1992), Kumar (1997), Clarke (1990) e Coriat (1994). Esses autores reconhecem
existir, em diferentes níveis, uma tendência irreversível de difusão do pós-fordismo,
uma vez que o cenário internacional se torna mais homogêneo e mais adverso, no
sentido em que muitos mercados não oferecem mais as vantagens da economia de
escala.
Segundo tais autores, fez-se necessária a exploração de outro tipo de
economia, a economia de escopo, baseada não na produção em grande escala de um
ou poucos produtos, mas na fabricação de vários produtos, utilizando-se da mesma
estrutura e sistema de distribuição. Esse tipo de economia também se baseia na
diluição dos custos em grandes quantidades de unidades produzidas, não de poucos
produtos, mas de uma linha mais diversificada de produtos.
De fato, os últimos 35 anos foram, provavelmente, muito prolíferos em
desenvolvimentos de novas formas de organizar o trabalho e de administrar
organizações. Contribuições oriundas de vários locais no mundo se difundiram,
proporcionando um significativo avanço na própria concepção de organização e
32
desempenho, com reflexos em todo o mundo do trabalho, em especial nas relações
entre empresas e entre empresas e indivíduos. O esforço para enumerar e descrever
todos esses desenvolvimentos é infrutífero. Entretanto, é possível destacar alguns dos
mais importantes, especialmente em relação ao impacto causado e à receptividade de
organizações em todo o mundo. Antes, porém, de focalizar novas formas de organizar
e de administrar, há ainda algumas perguntas cruciais que merecem respostas para
complementar o macro contexto em que se insere o objeto desta tese: Que são
inovações organizacionais? Quais as dinâmicas do processo de inovação
organizacional? Quais os padrões de mudanças associados à geração e à difusão de
inovações? Quais as perspectivas de análise dos impactos das mudanças sobre as
organizações?
2.2. Inovação e organizações
Dougherty (1996) caracteriza a inovação como uma tensão existente na organização
para dar conta dos desafios da interação entre diversas atividades, do rompimento de
barreiras e da solução de conflitos de forças aparentemente opostas, aspectos esses
que podem ser encontrados no processo de inovação. Trata-se, assim, de pensar a
inovação, isso é, o processo pelo qual a organização e seus novos produtos são
constituídos, de forma dialética.
Van de Ven (1995) apresenta as conclusões de um programa que se destinava a
investigar a dinâmica da inovação nas organizações, o Minnesota Innovation Research
Program (MIRP), em uma tentativa de produzir sugestões práticas para o
gerenciamento da inovação e da mudança em perspectivas micro e macroorganizacional. Segundo essa pesquisa, é possível apontar regularidades no processo
de inovação gerencial, conforme apresentado a seguir:
33
1) O processo de inovação consiste no somatório de numerosos eventos
desenvolvidos por muitas pessoas diferentes durante um longo período de tempo. O
processo de inovação não corresponde à visão ocidental mais corriqueira, que vê a
inovação como fruto de atos discretos de um único empreendedor em uma data e
lugar particulares. Em cada inovação estudada pelo MIRP, o processo de inovação
iniciou-se com um período de gestação que durou vários anos, durante os quais uma
variedade de eventos coincidentes preparou o cenário para o lançamento de um
processo de mudança ou inovação organizacional.
2) Ações concentradas para alocar recursos e iniciar o desenvolvimento da inovação
são disparadas por choques (não meramente persuasão) produzidos por confrontos
pessoais diretos com necessidades ou problemas. Esses choques são grandes o
suficiente para captar a atenção e disparar a ação de participantes organizacionais.
Quando as pessoas atingem um patamar suficiente de insatisfação com as condições
existentes, deflagram ações para resolver suas insatisfações.
3) Uma vez iniciado o trabalho de desenvolvimento de inovação, o processo não se
desdobra em uma seqüência linear simples de estágios e sub-estágios. Ao invés disso,
ele prolifera em lotes complexos de idéias inovadoras e caminhos divergentes de
atividades por diferentes unidades organizacionais. Mais especificamente, após o
início de uma seqüência de atividades simples e unitárias para desenvolver uma idéia
inovadora, o processo diverge em múltiplos e paralelos caminhos de atividades
independentes.
4) Freqüentemente são encontrados retrocessos durante o processo de inovação, seja
porque os planos fracassam, ou porque ocorrem eventos ambientais não antecipados
que alteram significativamente as suposições básicas da inovação. Esses retrocessos
34
sinalizam a rejeição da inovação ou novas oportunidades de aprendizado através da
reinvenção.
5) A receptividade, o aprendizado e a taxa de adoção de uma inovação são facilitados
quando a inovação é desenvolvida internamente em uma organização usuária, e são
inibidos quando não se oferecem oportunidades para que os usuários finais
reinventem ou modifiquem as inovações que foram inicialmente desenvolvidas em
outros lugares. Os participantes organizacionais não envolvidos no desenvolvimento
ou reinvenção de uma inovação tendem a percebê-la como um imperativo externo.
Independentemente de uma inovação ter sido desenvolvida internamente ou
externamente a uma organização que vai adotá-la, o processo de adoção é facilitado
pela sua modificação para que se adeque às situações locais, pelo envolvimento e
compromisso da alta gerência, e pelo uso de várias técnicas para manter o
cumprimento de tarefas e o ritmo durante o período de desenvolvimento.
6) A administração não pode garantir o sucesso da inovação, mas pode influenciar
suas chances de sucesso. As chances de sucesso aumentam com experiências e
aprendizados derivados de experiências anteriores de inovação, e diminuem de acordo
com a novidade, tamanho e duração temporal de um empreendimento inovador. Dessa
forma, as chances de sucesso não são somente funções do número de vezes que uma
organização tem se envolvido em jornadas de inovação no passado, mas também da
complexidade da jornada na qual ela decidiu se envolver em seguida.
As evidências coletadas por Van De Ven (op.cit.) permitem melhor compreender e
gerenciar os processos de geração e de adoção de inovações, apesar de sua conclusão
de que não é possível controlá-los totalmente, sendo possível, apenas, influenciar suas
chances de sucesso – através da motivação e envolvimento das pessoas e das equipes,
da criação de uma cultura que estimule a experimentação e o aprendizado, de
35
processos de tentativa e erro – e ao compreender-se que a inovação, freqüentemente,
sofre atrasos e desvios, durante sua ocorrência, que devem ser gerenciados antes que
se transformem em uma “bola de neve”.
2.3. Padrões de Mudança e de Inovação nas Organizações
Pode-se observar, portanto, na seção anterior, que a inovação organizacional segue
ciclos não lineares. Tal descrição do processo de inovação gerencial é corroborada por
Dooley e Van de Ven (1999). Mais detalhadamente, esses autores interpretam a
mudança e inovação organizacional como ciclos não lineares de atividades
convergentes e divergentes que podem se repetir ao longo do tempo e em diferentes
níveis organizacionais, caso sejam obtidos recursos para renovar o ciclo. Ao
examinarem as atividades que ocorrem durante os esforços de mudança
organizacional, os mesmos autores antes citados identificam uma série de atividades
que são geralmente convergentes em direções a fins comuns ou divergentes. Enfim,
um ato de inovação, por definição, implica divergência – uma mudança em algo
estabelecido requer um desvio do que está estabelecido. A implementação da
inovação, entretanto, requer uma síntese em prática. A fusão do novo com o antigo
representa
convergência.
Sem
convergência,
as
inovações
nunca
seriam
implementadas, devido ao constante fluxo. Dessa forma, o processo de inovação
consiste em ciclos de divergência e convergência.
Forças internas e externas à organização agem simultaneamente, mas diferentemente,
ao longo do tempo, permitindo a divergência ou forçando a convergência. A
simultaneidade desses ciclos de feedback faz com que a organização se comporte
como um sistema dinâmico não linear.
36
A divergência envolve um comportamento de ramificação que explora e se expande
em diferentes direções, disparado pela adição de recursos como atenção e tempo,
pessoas, idéias e recursos financeiros, além do nível regular de recursos existentes no
sistema. O comportamento divergente aumenta o número de dimensões ou a
complexidade de um sistema e tende a seguir dinamicamente um processo randômico
ou caótico. Quando atividades divergentes são predominantes, o processo geralmente
apresenta um comportamento dinâmico de alta dimensão, tipificado por mecanismos
generativos que são aleatórios ou semi-aleatórios por natureza e por busca de
inúmeras possibilidades de inovação, que disputam os recursos e a atenção da
organização.
Convergência é um processo integrador e restritivo, focado em testar e explorar uma
dada direção. Ela reduz as dimensões e a complexidade do sistema e se move em
direção a um padrão periódico de quase-equilíbrio. O comportamento convergente é
disparado pela dinâmica interna e externa. Restrições externas incluem regras e
mandatos institucionais e organizacionais que estreitam os limites possíveis de ação.
Restrições internas incluem limitações de recursos e a descoberta de uma
possibilidade que foca a atenção e as ações em uma dada direção. Quando as
atividades convergentes são dominantes, o processo geralmente entra em um
comportamento de baixa dimensão, tipificado por mecanismos generativos que são
periódicos ou equilibrados por natureza, caracterizados pela exploração de uma
solução que é técnica, econômica ou comercialmente viável.
Assim, a partir da perspectiva focalizada, mudança e inovação organizacional
consistem em um ciclo repetido de fases divergentes e convergentes de atividades,
que são possibilitadas pelo investimento de recursos e condicionadas por regras
externas e descobertas internas de um curso de ação (Figura 2.1).
37
Cada ciclo se inicia com o projeto de um arranjo organizacional e com a adição de
recursos de fontes externas, seguido por um período de “lua-de-mel” de
comportamentos exploratórios divergentes, que continua até que os recursos se
esgotem ou até que uma solução seja encontrada, e se conclui com um período
convergente de comportamento focado para explorar a solução ou para iniciar um
novo ciclo (DOOLEY e VAN DE VEN, 1999).
Ainda segundo Dooley e Van de Ven (1999), é possível perceber que divergência e
convergência são processos subjacentes a conceitos muito difundidos, como Pesquisa
e Desenvolvimento (P&D): Pesquisa envolve uma busca diligente entre soluções
potenciais (divergência entre possíveis caminhos de ação); desenvolvimento envolve
o ato de tornar a solução gradualmente manifesta (convergência a uma forma final); e
P&D seria simplesmente uma forma reduzida de dizer convergência e divergência.
Essa perspectiva de análise da relação entre inovação e organização, e a própria
descrição apresentada do processo de inovação, enquanto composto por ciclos de
atividades convergentes e divergentes não são nem únicas, nem representam a visão
dominante no campo de administração, no entanto. Como esta tese insere-se no
campo da administração, torna-se necessário situar suas principais abordagens da
relação entre tecnologia/inovação e organização, assim como retomar uma perspectiva
mais crítica em relação a essas abordagens dominantes. Esses são os objetivos dos
itens 2.4 e 2.5 a seguir.
38
Figura 2.1 - O Ciclo da Inovação
Fatores Restritivos
• Regras e imposições externas
• Foco e auto-organização interna
Comportamento Divergente
Comportamento Convergente
•
•
•
•
•
•
•
Um processo de expansão e ramificação que
explora novas direções (um padrão
randômico ou caótico)
Criação de idéias e estratégias (inspiração,
negociação)
Learning by discovery (busca exploratória)
Liderança pluralística (encorajamento e
equilíbrio de visões diversas)
Construção de relacionamentos e de redes
porosas
Criação da infra-estrutura para vantagem
coletiva (running in packs)
•
•
•
•
•
Um processo de integração e estreitamento
que explora uma dada direção (um padrão
linear ou periódico)
Implementação de idéias e estratégias
(transformar idéias em realidade)
Learning by testing (tentativa e erro)
Liderança unitária (encorajamento de
unidade e consenso de objetivos)
Execução de relacionamentos em redes
estabelecidas
Operação em uma infra-estrutura para
vantagem competitiva
Fatores Ativadores
• Investimento de Recursos
• Reestruturação da Unidade
Fonte: Adaptado de DOOLEY e VAN DE VEN (1999, p. 47)
39
2.4. Uma proposta de classificação das perspectivas de análise entre
tecnologia e organização
Crowston e Malone (1994), discutindo a relação entre tecnologia da informação (TI) e
organização, sugerem a existência de quatro perspectivas de estudos envolvendo esses
dois objetos, que podem ser também úteis na compreensão da adoção de inovações
em geral. Essas perspectivas são:
Perspectiva
racionalista:
as
organizações
são
compostas
de
agentes
intencionalmente racionais, que operam em direção a algumas metas ou objetivos
definidos, concentrando-se basicamente em eficiência econômica e lucratividade. As
organizações são, portanto, organizadas racionalmente em função desses objetivos.
De acordo com a perspectiva racionalista, a TI, por exemplo, deveria ser utilizada
para permitir o alcance das metas de maneira mais eficaz, reduzindo custos ou
aumentando a qualidade do produto.
Dessa forma, a adoção de inovações se refere a um ato consciente e racional em busca
de maior eficiência econômica, resultante de decisões igualmente racionais, tomadas
por parte dos gestores de tais organizações. A justificativa de projetos inovadores se
basearia simplesmente no retorno financeiro ou operacional, obtido por intermédio de
suas implementações, uma forma de retorno sobre o investimento realizado.
Implicaria, ainda, a posse de informações em volume e qualidade suficientes para que
a decisão seja correta. Caso sejam justificados racionalmente, os projetos inovadores
serão prontamente aceitos por todos os participantes da organização, recebendo
recursos necessários e enfrentando pouca ou nenhuma resistência à mudança.
Perspectiva do processamento da informação: essa perspectiva compartilha
algumas características com a primeira, mas foca-se, ao contrário, nos processos e
padrões organizacionais de comunicação. De acordo com a perspectiva de
40
processamento de informação, a inovação, especialmente em novas tecnologias da
informação e comunicação, como, também, em nova tecnologia gerencial, pode
permitir a redução do custo de coordenação, facilitando o desenvolvimento de uma
organização intensiva em relações e comunicações. De acordo com essa perspectiva,
as organizações poderão obter maiores economias de escala, com o desenvolvimento
de departamentos funcionais mais amplos e mais dispersos geograficamente, sem
perda significativa de controle. Melhor coordenação, proporcionada por sistemas mais
avançados, baseados em uso mais intensivo da tecnologia da informação também
implica redução de custos e maior eficiência organizacional, mas como decorrência da
maior qualidade no uso da informação gerencial e da comunicação entre os
participantes internos e externos à organização.
Perspectiva motivacional: reconhece que os trabalhadores podem possuir interesses
diversos daqueles da administração, mas esses objetivos podem ser igualados por
meio do desenho adequado dos cargos dos trabalhadores. Isto quer dizer que se um
trabalho é suficientemente motivador, os trabalhadores irão, presumivelmente, ficar
mais satisfeitos, e possuirão um melhor desempenho. De acordo com a perspectiva
motivacional, os clientes de um novo sistema de informação são os trabalhadores, e
apenas indiretamente a organização. Um projeto bem sucedido será aquele que
aumente a satisfação dos trabalhadores e melhore suas atitudes em relação ao
trabalho, o que, em contrapartida, oferece melhor desempenho econômico e maior
competitividade à organização.
Perspectiva política: presume que diferentes grupos na organização podem possuir
metas conflitantes que não podem ser conciliadas. O poder determina que grupo
atinge seus objetivos, e a TI pode ser utilizada como um meio para aumentar o poder.
Esta perspectiva considera que a tecnologia será utilizada pelas pessoas que possuem
41
poder em uma organização para sustentar sua posição, reforçando – não modificando
– a estrutura organizacional. Esta perspectiva sugere que é importante determinar o
cliente de um projeto, uma vez que diferentes grupos podem possuir objetivos e
valores conflitantes.
Quadro 2.1 - Questões centrais em quatro perspectivas organizacionais
Perspectiva
Racionalista
Processamento de Informação
Motivacional
Política
Questões Centrais
Emprego
• Perda de emprego
• Intensidade administrativa
• Níveis hierárquicos
Centralização/descentralização
Diferenciação
Formalização
Razões motivacionais e políticas
Razões econômicas
• Redução de estoques
• Economias de Escala
Padrões de comunicação
Ligações fracas
Dicas de contextos sociais
Motivações individuais
Variedade de habilidades
• Desespecialização
• Superespecialização
Significado da tarefa
Autonomia
Motivações interpessoais
Poder
• Distribuição vertical
• Distribuição horizontal
Fonte: Adaptada de CROWSTON e MALONE 1994, p.252
Crowston e Malone (1994) relacionam os possíveis resultados mais comuns com o
uso da TI, sugerindo os fatores que levam a tais resultados, de acordo com cada
perspectiva sobre organização. Cada perspectiva organizacional evidencia diferentes
tipos de efeitos que devem ser estudados (Quadro 2.1).
42
2.5. Críticas às perspectivas tradicionais de análise da relação entre
tecnologia e organização
As abordagens tradicionais da relação tecnologia-organização costumam sugerir que a
tecnologia exerce uma força transformadora, de fora para dentro da organização,
sendo a organização a variável dependente. Orlikowski (1992) tenta fugir à regra de
abordagens determinísticas, adotando uma perspectiva mais dialética, onde os
participantes do processo de desenvolvimento e utilização da tecnologia interagem
continuamente com ela, de modo que o seu desenvolvimento assume uma dinâmica
mais natural, fruto de processos subseqüentes de aprendizagem e mudança, isto é, de
convergência e de divergência, corroborando a descrição feita anteriormente.
Orlikowski (1992) revisa diferentes formas de interpretar o papel da tecnologia nas
organizações, classificando-as em três enfoques – como imperativo tecnológico, no
qual a tecnologia é uma variável independente em relação ao comportamento humano
que causa uma influência unidirecional irresistível na organização; como objeto de
uma escolha estratégica, no qual a tecnologia é produto da ação, projeto e apropriação
humana, com o objetivo de atingir metas pré-determinadas; e como gatilho para a
mudança estrutural, na qual a tecnologia é uma intervenção na relação entre agentes
humanos e estrutura, apresentando um potencial de mudança nesta última.
Orlikowski (1992) sugere que nenhuma das abordagens citadas no parágrafo anterior
permite uma visão exata da complexa relação entre organização, seres humanos e
tecnologia. Assim, propõe a adoção de uma abordagem estruturacional da tecnologia,
segundo a qual se percebem as relações entre organização, pessoas e tecnologia de
maneira dialética e menos determinística, considerando que mudanças em quaisquer
dos elementos dessa equação são fruto de influência mútua (dualidade da tecnologia)
e aprendizagem contínua (flexibilidade interpretativa), mesmo que diferenças
43
temporais e espaciais entre o desenvolvimento e a aplicação da tecnologia dificultem
essa compreensão.
Segundo King e Anderson (1995), o estudo de processos de inovação deve considerar
as diversas etapas que são desencadeadas em um caso típico. Em consonância com as
propostas de Van de Ven (1995), sugerem que a inovação não ocorre em um único
momento. Ao contrário, a adoção de inovações decorre de uma seqüência de eventos
que se iniciam com a percepção de necessidade de mudança e se encerram com a
institucionalização da inovação ou sua rejeição após a implementação. Da mesma
forma, Zaltman et al. (1973, apud KING e ANDERSON 1995) sugerem que o
processo de adoção de inovações possui basicamente dois estágios: iniciação – que se
desdobra em conscientização, formação de atitudes e decisão e implementação – que
se desdobra em implementação inicial e implementação contínua sustentada. Apesar
disso, muitas pesquisas sobre inovação tratam do assunto utilizando-se de
metodologias de um estágio, mensurando a inovação em um único ponto no tempo,
examinando a correlação entre a adoção de inovações e variáveis de atitude e
comportamentais.
Esses últimos tipos de pesquisa representam abordagens atemporais, que são
convenientes para os pesquisadores, mas geram pouca informação em relação ao
processo de inovação em estudo. Segundo Zaltman et al (1973, apud KING e
ANDERSON 1995), são necessários estudos em profundidade, buscando detalhar o
progresso de inovações em organizações. Abordagens mais criativas de pesquisa
poderiam responder o porquê da adoção de inovações, como elas se desenvolvem, e
porque algumas são mais bem sucedidas do que outras.
O início de um processo de inovação é normalmente descrito como a percepção de
uma defasagem de desempenho – uma diferença entre o desempenho real e o
44
potencial. Isso ocorre quando a organização identifica que seu desempenho não é
satisfatório, e busca uma inovação para eliminar a defasagem, ou porque a
organização torna-se consciente de que há alguma inovação em seu ambiente, com
potencial de melhorar seu desempenho, e decide adotá-la.
Entretanto, King e Anderson (1995) sugerem, baseados em suas pesquisas, que não há
evidências conclusivas sobre o comportamento de inovações, especialmente em
relação aos seus estágios. Segundo esses autores, os artigos publicados sobre o tema
tendem a indicar que a inovação não segue estágios discretos, claramente distintos.
Diferentes organizações adotarão procedimentos distintos em diferentes momentos do
tempo. As pessoas apresentarão diferentes percepções sobre a mudança, em diferentes
níveis organizacionais. Se isso acontece, não faz sentido definir um processo de
adoção de inovações, uma vez que este tenderá a ser prescritivo e normativo, no
sentido de forçar as organizações a desenvolver todos os estágios em seus processos
de adoção de inovações. Também não fará sentido a abordagem de pesquisa
centralizada em alguns poucos executivos, e em suas interpretações de como se
desdobrou o processo, e de que resultados foram auferidos.
Mas entende-se que a delimitação de processos de adoção de inovações pode
contribuir para comparações entre organizações e diferentes tipos de inovação,
permitindo uma maior compreensão dos aspectos da mudança. King e Anderson
(1995) complementam que há uma ênfase exagerada na decisão de inovação, e pouca
atenção sobre o que acontece após sua implementação. Isso pode ser problemático,
pois após a implementação de uma inovação, as expectativas dos adotantes serão
testadas para verificar seu sucesso, obtendo ou não a satisfação das expectativas.
Além disso, há um excesso de utilização de uma única metodologia básica – estudos
transversais. Nesses estudos, a inovatividade é investigada pelo número de inovações
45
adotadas pelas organizações, sem o estabelecimento claro de relações de causa e
efeito.
Essas pesquisas apresentam tendências normativas ou prescritivas, indicando que
medidas ou características tornam as organizações mais predispostas a inovar. Face
aos resultados de pesquisas dessa natureza, é possível sugerir uma forma de nova
ortodoxia, no sentido de que todas as organizações tenderão a adotar liderança
participativa, a apresentar estruturas orgânicas e culturas voltadas para tarefas, uma
espécie de modelo universal de organização inovadora, ainda de acordo com King e
Anderson (1995).
Outro autor que busca maior compreensão sobre os efeitos da utilização de práticas
inovadoras sobre o desempenho da organização é Kling (1995). Segundo ele, muitas
organizações estão adotando algum tipo de prática inovadora, o que tem trazido
melhorias no desempenho organizacional. Entretanto, elas o estão fazendo de maneira
fragmentada e não sistêmica, o que vem impedindo um maior aproveitamento dos
resultados potenciais oferecidos por estas práticas. A adoção de sistemas de trabalho,
ao invés de práticas isoladas, apresentaria um maior potencial de influência positiva
sobre o desempenho das organizações.
Como pôde ser visto, as relações entre inovação e organização são complexas. Apesar
disso, há um predomínio na literatura revisada a se considerar essas relações em uma
perspectiva normativa e prescritiva, à exceção de certos autores, como os focalizados
nesta seção de tese. Dado o predomínio da literatura normativa, destaca-se o desafio
de aprofundar a análise em torno de visões matizadas sobre a relação tecnologia
versus organizações. Acredita-se, no entanto, que para se ter maior possibilidade de
sucesso ao se abraçar tal desafio, novos aspectos concernentes à relação entre
tecnologia e organização devem ser enfocados, como aprendizagem e conhecimento.
46
Assim, a próxima seção retomará a relação entre mudança e inovação (outra forma de
se aproximar da relação entre tecnologia e organização, como já foi visto), que será
discutida levando-se em consideração abordagens sobre o conhecimento e
aprendizagem organizacional para ressaltar possíveis conexões entre mudança,
inovação, conhecimento e aprendizagem que são fontes de geração de trajetórias
específicas a cada organização.
2.6. Em busca de uma visão mais matizada sobre a dinâmica de processos
organizacionais: mudança, inovação, conhecimento e aprendizagem
organizacional
É provável que uma das idéias mais frequentemente evocadas na literatura de
administração e negócios seja o de que a mudança é algo tido como certo, inevitável e
inquestionável. Segundo defensores dessa idéia, o ritmo e a intensidade de mudança
ocorrida no ambiente externo forçam as organizações a revisarem muito
freqüentemente seus produtos, suas operações e sua estrutura, para que estejam
sempre adequados às condições externas. Mudança organizacional, portanto, adquire
um status ampliado, como sendo uma das principais habilidades ou capacidades
organizacionais, no sentido não só de garantir a sobrevivência das organizações como
de assegurar-lhes meios para crescimento (WOOD JR., 1992).
Essa perspectiva traz consigo a idéia de que a organização é obrigada a se reinventar
constantemente, em face de mudanças ocorridas em seu ambiente externo, como única
forma de sobrevivência. Uma das principais maneiras de viabilizar um
comportamento pró ativo parece ser o rompimento das fronteiras organizacionais,
tanto internas quanto externas. Por isso, novas formas de organização tendem a ser
caracterizadas por sua flexibilidade, por possuírem fronteiras amorfas, por sua
capacidade de aprender, desenvolvendo estratégias que a elas permite antecipar e
47
responder às incertezas do futuro. Estratégia e forma organizacional tendem, portanto,
a estar proximamente ligadas, de modo que a última possa apoiar a primeira. As
estratégias mais comuns enfatizam: (1) qualidade e satisfação do consumidor, (2)
rapidez e oportunidade, (3) customização e flexibilidade, (4) redução de custos e
produtividade, e (5) inovação (Davis, 1995). O quadro 2.2, adiante, apresenta diversas
formas pelas quais a eliminação de fronteiras organizacionais pode auxiliar as
organizações na obtenção de resultados estratégicos.
A afirmação de que inovação é algo desejável ou obrigatório, frequentemente,
desconsidera o fato de a inovação possuir custo e risco elevados, que podem
influenciar ou comprometer o fluxo de caixa das organizações, por um lado, ou leválas a desenvolver produtos e serviços fora de sintonia com as demandas de mercados
onde atuam, por outro. Em ambos os casos, as organizações terão “mudado para pior”
(Grey, 2004), e estarão em condições mais adversas do que aquelas existentes antes de
terem mudado.
Segundo Grey (2004), a crença de que se vive em um mundo em mudanças está
presente em muitas épocas, talvez em todas elas. Isso acontece, em parte, devido ao
fato de que, em retrospectiva, o passado normalmente parece mais estável do que o
presente, porque é mais familiar e porque é percebido de forma racionalizada e limpa.
Esse autor argumenta que não há bases para se acreditar que mudanças no presente
são mais intensas que no passado, exceto se se considera que o tempo presente
caracteriza-se pela mudança rápida, tendendo-se a confirmar esse pensamento por
ações.
48
Quadro 2.2 - Fronteiras Organizacionais, Forma Organizacional e Ênfase
Estratégica
Fronteira
Eliminada
Entre Grupos
Entre
Departamentos
I
N
T
E
R
N
A
S
Entre Níveis de
Autoridade
Entre Culturas
Entre
Funcionários
Permanentes e
Temporários
Entre Períodos
de Tempo
E
X
T
E
R
N
A
S
Característica da Forma
Organizacional
Processamento Paralelo
Groupware
Equipes Multifuncionais
Papéis Interligados
Equipes Multifuncionais
Empregados como Clientes
Integração Interna
Redes Eletrônicas
Papéis Interligados
Envolvimento dos
Empregados
Redes Eletrônicas
Downsizing
Achatamento das hierarquias
Diversidade Cultural
Trabalho Virtual
Trabalhadores
Temporários/Terceirização
Entre
Competidores e
Colaboradores
Horários Flexíveis de
Trabalho
Trabalho Contínuo
Fusões e Aquisições
Joint Ventures
Desmembramentos
Entre
Fornecedores
Just in Time
Terceirização
Entre
Consumidores
Gestão da Qualidade Total
Testes Beta
Entre o
Trabalho e o
Lar
Trabalho Virtual
Telecomutação
Ênfase Estratégica
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Inovação
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Inovação
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Redução de Custos
Inovação
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Inovação
Customização/Flexibilidade
Redução de Custos
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Redução de Custos
Inovação
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Velocidade/Oportunidade
Redução de Custos
Qualidade/Satisfação do Consumidor
Customização/Flexibilidade
Inovação
Velocidade/Oportunidade
Customização/Flexibilidade
Redução de Custos
Fonte: Davis, 1995.
Assim, se por um lado as organizações que não se adaptam às mudanças ocorridas no
ambiente externo fracassam, de acordo com certas perspectivas, por outro lado, e de
outras perspectivas, pode-se ponderar com base em histórias de grandes corporações
que, até mesmo, empresas bem organizadas e administradas podem fracassar em
49
adaptar-se a novas e emergentes tecnologias em suas indústrias e mercados no longo
prazo (CHRISTENSEN, 2001).
Um dos principais motivos que levam essas organizações ao fracasso é a miopia
criada pelo seu sucesso. Ou seja, elas são incapazes de perceber como novas
tecnologias, inicialmente inviáveis, face aos mercados existentes, vão modificar o seu
ramo de atividade. Especialmente por serem gerenciadas de acordo com as boas
regras da administração – ouvindo os clientes e investindo agressivamente em novas e
mais poderosas tecnologias, persistem investindo em mercados e tecnologias já
existentes e lucrativos, deixando abertas janelas de oportunidade para outras empresas
com percepção diferenciada.
Christensen (2001) sugere que essas organizações fracassam porque investem
excessivamente em tecnologias que já são amplamente satisfatórias, cujo mercado já
está suficientemente satisfeito e nos quais não existem espaços para novas melhorias
radicais. Esses investimentos acabam levando à oferta de capacidade acima daquela
desejada e acessível ao consumidor. Nesses casos, a rentabilidade já alcançada com o
uso da tecnologia existente torna pouco interessante a busca por tecnologias
emergentes, que, apesar de prometerem rupturas, não apresentam potenciais de
retorno suficientemente elevados nos médios e curtos prazos para atrair a atenção e os
investimentos de grandes empresas bem sucedidas.
Parece, portanto, aconselhável rever as crenças de que o novo é sempre o melhor, e o
antigo é sempre o ultrapassado, e as organizações e as pessoas devem estar
constantemente em busca de novas formas de trabalhar e novos comportamentos para
seus trabalhadores. Mesmo com avanços proporcionados por novas tecnologias
existentes e emergentes, existe, ainda, um grande espaço para exploração de
50
investimentos diferidos e ativos, tanto intelectuais quanto físicos, construídos por
gerações anteriores de dirigentes.
Por exemplo, alguns investimentos, em especial investimentos em tecnologias de
ruptura, que podem demandar a construção de uma infra-estrutura para que sejam
plenamente difundidos, requerem prazos de retorno muito extensos. Do ponto de vista
empresarial, pode ser mais aconselhável, primeiramente, amortizar investimentos já
realizados, assegurando-se que eles dêem suporte ao alcance das rentabilidades
projetadas, até que seja o momento certo para iniciar novos investimentos. A questão
mais importante em relação à inovação gerencial parece que não é “inovar já”, ou
“não inovar”, mas inovar no “tempo certo” e “na hora certa”. Quais os fatores, no
entanto, que podem estar por trás de decisões sobre inovações “no tempo certo” e “na
hora certa”? Problematizar alguns dos fatores é um dos objetivos da próxima seção.
2.7. Mudança, Inovação, Conhecimento e Aprendizagem nas Organizações
Nonaka (2000) propõe que conhecimentos formam os pilares sobre os quais são
construídas as vantagens competitivas e sustentáveis, e que gerar conhecimento
significa reinventar não só a empresa, mas também cada pessoa dela, em um processo
contínuo de auto-renovação individual e organizacional. Em uma época em que
“mercados e produtos se deslocam, tecnologias proliferam e os produtos tornam-se
obsoletos quase que de um dia para o outro” (p.43), a capacidade de criar e disseminar
novos conhecimentos de maneira consistente, incorporando-os a novas tecnologias e
produtos, passam a ser das mais importantes para qualquer organização.
Segundo Nonaka (2000), a agregação de maior valor à base de conhecimentos de
firmas requer o enfrentamento do desafio de valorização de conhecimentos implícitos
– seja na forma de intuição, experiência aplicada ou outras formas de conhecimento
51
subjetivo não formal – para viabilizar a possibilidade de formatação de soluções
inovadoras. Esse tipo especial de conhecimento, uma vez formalizado, pode ser
compartilhado com outras pessoas na organização, podendo dar bases para a criação e
internalização das tão desejadas vantagens competitivas.
Posição semelhante é adotada por Dougherty (1996). Essa autora também considera
que a habilidade de desenvolver inovação de produtos permite que organizações
melhorem a qualidade de seu output, revitalizem negócios maduros, entrem em novos
mercados, reajam a invasões competitivas, experimentem novas tecnologias,
alavanquem investimentos em tecnologias e desenvolvam aplicações alternativas para
categorias de produtos existentes, dentre outros. Para organizações que devem se
adaptar à competição, mercados e tecnologias mutáveis a inovação de produtos não é
simplesmente uma moda passageira, mas, uma necessidade.
Drucker (2000) se junta ao conjunto de autores que têm enfatizado a importância do
conhecimento no rol de fatores que, na sociedade do conhecimento, permite às
organizações obterem resultados positivos, chegando a considerá-lo um fator de
produção, assim como terra, trabalho e capital. Destaca ainda a tensão existente entre
organização
e
sociedade,
uma
vez
que,
enquanto
a
organização
busca
desestabilização, autonomia e bom desempenho, a sociedade anseia por estabilização
e apresenta demandas das mais variadas à primeira.
Sob a ótica de que a mudança e a aprendizagem são essenciais para a sobrevivência de
organizações, Weick e Westley (1996) apresentam uma visão mais matizada que a de
Drucker (2000) sobre a dinâmica organizacional e seu processo de aprendizagem. Os
autores referidos alertam para o fato de que o conceito de aprendizagem
organizacional é um oxímoro, uma vez que as duas expressões (organização e
52
aprendizagem) são antitéticas. Ou seja, “aprender é desorganizar e aumentar a
variedade”, enquanto que “organizar é esquecer e reduzir a variedade” .
Organização e aprendizado são processos essencialmente
antitéticos, o que significa que a frase ‘aprendizagem
organizacional’ qualifica-se como um oxímoro. Aprender é
desorganizar e aumentar a variedade. Organizar é esquecer e
reduzir a variedade. Na pressa de estudar aprendizagem, os teóricos
organizacionais freqüentemente negligenciam essa tensão, que
explica porque eles nunca têm certeza se aprendizagem é algo novo
ou simplesmente mudança organizacional requentada. (WEICK e
WESTLEY 1996, p.440)
Assim, o estudo da aprendizagem organizacional é uma tarefa complexa.
Primeiramente, porque organização é um conceito abstrato, de difícil compreensão e
avaliação. Em segundo lugar, o verbo aprender não pode ser considerado um verbo de
realização, como um final. Pelo contrário, ele deve ser interpretado como um verbo de
processo, de continuidade. Finalmente, existe ainda o debate em relação ao fato de a
aprendizagem organizacional ser um fenômeno que ocorre em diferentes níveis:
indivíduo, grupo e organização.
Segundo Weick e Westley (1996), a aprendizagem está relacionada à cultura de
qualquer organização, no sentido em que esta representa um repositório de
experiências passadas ou como sistemas auto-projetantes, nos quais se podem
identificar a evolução e o resultado do aprendizado. Aprendizagem, ainda para os
mesmos autores antes citados, é um fenômeno que ocorre primariamente através da
interação social, sendo a cultura de uma organização, ao mesmo tempo, o seu
instrumento e repositório. A aprendizagem organizacional está também ligada às
rotinas de ação, uma vez que estas podem ser causa e efeito do aprendizado
organizacional, de maneira circular e tautológica. Quanto mais as rotinas de ação
reduzirem a ambigüidade e a incerteza, pelas opções de esquecimento, menos
capacidade a organização possuirá para aprender novas rotinas. Mas, ambiguamente,
53
quanto mais ela souber lidar com os aspectos rotineiros, melhor ela poderá se adaptar
a ambientes turbulentos e mudança intensa.
Segundo Malerba (1992), as empresas aprendem de diferentes maneiras, e essas
maneiras produzem aumentos no estoque de conhecimento e em suas capacitações
tecnológicas, o que engendra uma série de novas trajetórias de avanço tecnológico, e
não simplesmente de trajetórias que viabilizem reduções de custo. Os tipos de
mecanismos de aprendizado utilizados por empresas são:
a) Aprendizado pela ação (learning by doing) e aprendizado através do uso (learning
by using), que estimularão mais visivelmente trajetórias de melhorias na lucratividade;
b) Aprendizado por meio da interação (learning by interacting) com fornecedores de
equipamentos, que também estimulará preponderantemente trajetórias de melhorias na
lucratividade;
c) Aprendizado pela interação (learning by interacting) com fornecedores de matérias
primas, que estimulará essencialmente trajetórias de mudança técnica incremental
relacionadas à melhoria de matérias primas e com usuários estimulará trajetórias
horizontais de diferenciação dos produtos;
d) Aprendizado por meio da busca (learning by searching), em especial através de
atividades de P&D, que estimulará primordialmente trajetórias verticais de
diferenciação de produtos em termos de qualidade e performance.
Ainda segundo Malerba (1992), para cada trajetória de mudança incremental existirá
uma base científica e tecnológica de suporte. Para justificar essas suposições, Malerba
(1992) discute as proposições gerais em relação ao aprendizado das firmas e suas
implicações. O artigo propõe que (i) aprendizagem é um processo dispendioso e
dirigido, que ocorre na firma, seja em produção, P&D, projeto, engenharia,
organização ou marketing; (ii) aprendizagem é associada a diferentes fontes de
54
conhecimento que podem ser internas ou externas; (iii) aprendizado é um processo
cumulativo em relação ao estoque de capital da organização; e (iv) o estoque de
conhecimento de uma firma gera inovações, principalmente em nível local e
incremental.
Pensamento similar ao desenvolvido por Nonaka, sobretudo em termos da relação
entre inovação e empresas de sucesso, é o de Teece (2000): a competitividade de uma
organização é decorrência de sua capacidade de desenvolver, de aplicar novas
tecnologias e de adotar novas formas organizacionais. Teece (2000), adere, também à
visão de Malerba (1992) sobre as características do desenvolvimento tecnológico em
organizações. Para ele, o desenvolvimento tecnológico ocorrido nas organizações é
um processo cheio de incertezas, dependente de trajetórias tecnológicas prédeterminadas e de paradigmas dominantes; é de natureza cumulativa, tácita e
irreversível.
Assim, cada organização, estudada isoladamente, adotará uma estratégia em relação à
inovação de produtos, de processos e gerenciamento. Diversos fatores influenciarão
em sua postura perante o novo e o incerto. Dentre esse conjunto de fatores, destacamse: sua experiência passada com novas práticas e novos métodos de gestão, além de
seu porte, origem de seu capital, número de funcionários, setor de atuação, tempo de
operação e suas possibilidades de acesso a novas tecnologias, utilizando-se de
consultores ou pela interação com clientes e fornecedores.
Apesar dessa variabilidade de trajetórias das firmas face ao aprendizado e à inovação,
pode-se supor que é possível identificar alguns padrões de comportamento
relacionados à inovação, que tornam as organizações semelhantes ou diferentes, em
algum nível e em alguma direção. É possível, portanto, desenvolver tipologias de
55
organizações em relação à mudança e à inovação, tanto stricto sensu quanto gerencial.
Uma tipologia clássica vai ser apresentada no próximo item.
2.8. A construção de tipologias de organizações em relação à mudança e à
inovação gerencial
Tipologias são formas de análise comparativa de organizações, que ressaltam suas
semelhanças e suas diferenças, no sentido de melhor explicar padrões de
comportamento de grupos de indivíduos em estudo (BERTERO, 1981). Dessa forma,
comparar organizações implica agrupá-las de modo a se conhecer, com maior clareza,
determinados aspectos ou variáveis que influenciam um grande número de
organizações, que pode ser tanto um universo quanto uma amostra. Inevitavelmente,
isso leva a um menor conhecimento de cada organização isoladamente.
O estudo comparativo de muitas organizações é necessário, não
apenas para verificar hipóteses levantadas por qualquer teoria, mas
para fornecer uma base para explorar e refinar a teoria, indicando
as condições em que relações inicialmente propostas
universalmente possam ser contingentes. (BERTERO, 1981, p.32)
Tipologias são associadas ao conceito de “tipos ideais” weberianos, no sentido em que
explicam padrões extremos de comportamentos organizacionais, que explicam a
forma de agir de um número razoável de indivíduos, cujos comportamentos se
assemelham. Tipologias podem desempenhar dois papéis básicos no estudo das
organizações (BERTERO, op.cit.): (i) um mapeamento de parte da realidade
organizacional, tornando mais claros aspectos organizacionais que se querem estudar;
ou (ii) uma forma de agregar resultados de pesquisa empírica. A tipologia mapeadora
aproxima-se do idealismo, enquanto a segunda se aproxima mais do realismo. Em
ambos os casos, as tipologias sempre servem a uma função agregadora, fundamental à
construção científica.
56
Segundo Bertero (1981), a construção de tipos ideais busca tornar o objeto de
conhecimento inteligível através da revelação (ou construção) de sua racionalidade
interna. Ele interpreta, de acordo com Weber e seus principais representantes (Aaron
e Freund), tipologias e tipos ideais como instrumentos para abordar alguns aspectos da
realidade, um artifício metodológico, um meio heurístico de estabelecer, sem
ambigüidade, o sentido do assunto que está sendo investigado. Bertero (op.cit.. p. 34)
prossegue dizendo que tipos ideais “são procedimentos puramente experimentais que
o cientista desenvolve deliberada e arbitrariamente, de acordo com suas necessidades
de investigação, e que abandona sem maiores problemas se suas expectativas não
forem satisfeitas” . As tipologias, enquanto expressões de tipos ideais, abrem caminho
para que se identifiquem regularidades e convergências entre grupos de indivíduos de
uma mesma população ou amostra, favorecendo a compreensão de suas semelhanças
e diferenças.
Tipologias agregadoras – aquelas que são elaboradas sem que o autor disponha de um
determinado número de organizações concretas com que lidar no plano da pesquisa –
surgem a fim de permitir a agregação de dados coletados. Nas tipologias mapeadoras,
por sua vez, a tipologia em si precede os dados, enquanto que na tipologia agregadora,
os dados antecedem a tipologia, emergindo após a análise de uma amostra de
organizações ou outros indivíduos em estudo.
Provavelmente, a tipologia mais difundida na literatura de administração e negócios é
a de Miles e Snow (1978:2003), que classifica as organizações com base em suas
estratégias inovacionais e de mudança em quatro grupos: defensivas, prospectivas,
analíticas e reativas. Segundo esses autores, a tipologia por eles desenvolvida busca,
dentre outros objetivos, ampliar a compreensão do processo pelo qual as organizações
se ajustam continuamente aos seus ambientes, criando uma consciência ampliada de
57
que a capacidade de mudança organizacional depende de teorias implícitas sobre
como as pessoas devem ser gerenciadas. A tipologia desses autores sugere a
necessidade de ajuste entre as características das organizações e as características do
ambiente que as cercam (fit organizacional), de modo que as organizações bem
sucedidas parecem ser capazes de desenvolver continuamente um forte alinhamento
entre suas estratégias, estruturas e processos, ao mesmo tempo em que buscam meios
de compreender e expressar como esses elementos se ajustam entre si.
Miles e Snow (1978:2003) utilizam como pressuposto o fato de que as organizações
atuam para criar seus ambientes (perspectiva da escolha estratégica), tomando
decisões que definem sua relação com o ambiente (environmental enacting, conforme
WEICK 1969, 1977 apud MILES e SNOW 1978). As escolhas estratégicas da
administração moldam as estruturas e os processos das organizações, referindo-se à
estratégia mais como um padrão de decisões, grandes e pequenas, que direcionam as
ações organizacionais para o futuro. Essas decisões adquirem significado conforme
vão sendo implementadas na estrutura e nos processos organizacionais.
Ao mesmo tempo, estrutura e processo restringem a estratégia, pois, uma vez que
tenha desenvolvido um arranjo viável entre essas duas variáveis, a organização pode
sentir dificuldade em desenvolver atividades fora do escopo de suas operações dele
decorrentes. Ao reduzir a incerteza, facilitando a tomada de decisão consistente com
objetivos organizacionais, através da adoção de normas, políticas e outros repertórios
de ação, a organização limita suas capacidades e competências ao permitido por esse
mecanismo, dessa forma restringindo suas possibilidades de ação.
Pode-se inferir, portanto, aspectos da complexidade de relações entre estratégia e
estrutura. Seguindo a veia convencional em administração, Miles e Snow (1978)
preconizam que a estrutura tende a seguir a estratégia, e as duas devem estar
58
altamente alinhadas para que a organização seja eficaz. No entanto, ainda conforme
Miles e Snow (1978:2003), simultaneamente ao padrão de relação entre estrutura e
estratégia, a estrutura restringe a estratégia, ou seja, uma organização raramente
consegue desviar-se substancialmente de seu curso de ação sem grandes alterações em
sua estrutura e seus processos.
Em síntese, a tipologia desenvolvida por Miles e Snow (1978) permite que se
visualizem similaridades entre condutas de diferentes organizações face às mudanças
e às inovações, pela via da relação entre estratégia e estrutura, enfatizando a natureza
bidirecional dessa última relação. Dessa forma, essa tipologia mostra-se afinada com a
visão mais matizada e dinâmica dos processos organizacionais.
No próximo item, o foco da discussão teórica desta tese vai se estreitar sobre as
práticas inovadoras de gestão que são seu objeto. Dessa forma, o próximo item iniciase com a delimitação do conceito de práticas inovadoras de gestão e a apresentação de
uma certa cronologia de aparecimento dessas práticas. Em seguida, são discutidos
cada grupo de práticas, objeto de análise desta tese, conforme sugerido pela revisão de
bibliografia. Assim, algumas das perguntas-chave que o próximo item tentará
responder são: o que são práticas de gestão? Quando surgem certas práticas de gestão?
Como e por que podem ser agrupadas tais práticas? Quais as características-chave
desses grupos de práticas?
3. Práticas Inovadoras de Gestão
3.1. O que são práticas de gestão e uma certa cronologia de aparecimento de
práticas selecionadas de gestão
De fato, a produção acadêmica sobre práticas inovadoras tem sido cada vez mais
abundante. Essas produções aprecem tanto no mercado editorial quanto em
congressos, em palestras e em conferências. Parece haver uma busca por uma solução
definitiva para os problemas empresariais. Em contraposição à visão mais matizada da
relação entre inovação e organizações, apresentada no capítulo anterior, o discurso
predominante é o de que está sendo desenvolvida uma “caixa de ferramentas
gerenciais”, que devem ser aplicadas criteriosamente para cada situação ou problema
vivenciado pelas organizações. Por exemplo, Araújo (2001) apresenta dez novas
“tecnologias de gestão organizacional”, surgidas como resultado de uma “quebra de
paradigma” resultante de mudanças políticas, econômicas, sociais e tecnológicas:
arquitetura organizacional, terceirização, gestão pela qualidade total, benchmarking,
aprendizagem organizacional, empowerment, open book management, gestão
horizontal, reengenharia e engenharia reversa. Essas tecnologias permitiriam
“aperfeiçoar o desempenho empresarial, de sorte a permitir a sobrevivência de
organizações competitivas de tantas turbulências e quebra constante de paradigmas”
(ARAÚJO, 2001, p.17). Existem outros autores que apresentam “receitas para o
sucesso” (KEARNEY JR., 1997) ou o “kit de ferramentas para o século XXI”
(BHOTE, 1997), compostos por práticas emergentes como sendo a última palavra em
administração. Outros estudiosos dedicam-se à busca de um novo padrão de
organização, algo como uma “manufatura de classe mundial”, que agrega os
desenvolvimentos mais recentes ocorridos em vários países.
As novas técnicas de gestão são amplamente discutidas no meio executivo e
acadêmico,
sob
variadas
terminologias:
tecnologias
gerenciais,
tecnologias
organizacionais, práticas de gestão, modelos de produção, por exemplo. Oliveira
(1990, p. 38) chama de metodologias administrativas os “conjuntos sistematizados de
princípios, métodos, técnicas e normas, expressos pela escrita [...], que visam
instrumentalizar as ações administrativas nas organizações produtivas”.
Já para Faria (1997, p. 29-30), tecnologias de gestão são: o conjunto de técnicas,
instrumentos ou estratégias utilizados pelos gestores — gerentes, administradores, etc.
— para controlar o processo de produção, em geral, e de trabalho, em particular, de
maneira a otimizar os recursos nele empregados, pondo em movimento a força de
trabalho capaz de promover a geração de excedentes apropriáveis de forma privada ou
coletiva (social). Devido a seus impactos sobre o processo produtivo, o referido autor
ressalta ser inegável que realmente se tratam de tecnologias. Segundo o mesmo autor,
as tecnologias gerenciais classificam-se em conjunto de técnicas de ordem
instrumental, para fins de racionalização do trabalho — estudos de tempo e
movimento, sistemas e métodos, layout físico e de processo — e de técnicas de ordem
comportamental e ideológica, que visam disseminar valores para o desempenho de
tarefas segundo a dominação burocrática — mecanismos de motivação, trabalhos em
grupos participativos, planos de treinamento e desenvolvimento. Ainda para Faria
(1997), as tecnologias de gestão, tais como as tecnologias físicas, são um meio de
aperfeiçoar a criação de valor para o capitalista, além de disseminar os ideais de sua
ética particular. Quando se percebe o esgotamento da eficiência marginal de
determinadas tecnologias, “ideólogos e pesquisadores orgânicos da gestão capitalista”
61
desenvolvem inovações nessas tecnologias a fim de melhorar os resultados, em uma
dinâmica que promove o surgimento de muitos modismos (FARIA, 1997)1.
As tecnologias gerenciais passam por processos de difusão, experimentando, pela
aprendizagem e adaptação pelos seus adotantes, processos de inovações incrementais.
Um aspecto importante nesse campo é que a adoção de uma tecnologia não se dá
necessariamente por um processo decisório racional clássico, conforme já foi
discutido nesta tese. Simon (1963), ao discutir a tomada de decisão, acrescentou
aspectos importantes que reforçam a percepção anterior sobre a natureza do processo
de decisão sobre a adoção de tecnologias. Esse autor, ao analisar de forma mais ampla
a questão da racionalidade, expôs o conceito de racionalidade limitada, segundo o
qual o homem não tem capacidade de analisar todas as alternativas e escolher a opção
ótima. A escolha se limita ao satisfatório. Assim, muitas decisões se dão por
processos que se baseiam em outras formas de racionalidade, que buscam, além da
eficiência, a legitimação em seu ambiente.
Independentemente de sua eficácia, todavia, práticas inovadoras têm surgido ao redor
do planeta, como resultado de novas formas de combinação de tecnologias produtivas
com a tecnologia da informação e com inovações sociais. Praticamente nenhum
domínio da empresa fica isento dessa mudança. Um esforço de catalogação e
classificação de todas as práticas existentes seria uma tarefa impossível de ser
realizada, dado seu ritmo de surgimento, difusão e desaparecimento. Entretanto, é
possível identificar algumas práticas que obtiveram relativo sucesso e têm sido
1
Entretanto, vale salientar que as tecnologias de gestão não só serviram para fins capitalistas, mas
também foram utilizadas nas sociedades de economia planificada. Assim, mesmo ciente de sua não
neutralidade, a tecnologia de gestão não só potencializa a acumulação capitalista, mas, antes, busca
dinamizar a produção e otimizar seus processos. Mintzberg (1995, p. 36), em seu livro Criando
Organizações Eficazes, ressalta que a técnica de especialização do trabalho foi bastante utilizada tanto
pela indústria americana como pela russa.
62
adotadas ao longo do tempo, ainda que a ritmos e intensidades diferentes, em
organizações do mundo todo (Quadro 3.1).
Quadro 3.1 - Cronologia de Desenvolvimento de Práticas em Administração
Ano
Desenvolvimento
1927
Controle Estatístico da Qualidade
1930
Estudo de Hawthorne
1942
Hierarquia das Necessidades
1946
Just in Time( prática a ser analisada nesta tese)
1948
Kanban
1948
Abordagem Sócio-Técnica
1949
Células “Ferradura” (prática a ser analisada nesta tese)
1950
PDCA
1954
Custos da Qualidade
1955
Diagrama de Ishikawa
1960
Teoria X e Teoria Y
1961
MRP – Material Requirement Planning
1962
Círculos de Controle da Qualidade
1966
Quality Function Deployment
1970
Grupos Semi-Autônomos
1975
MRPII – Manufacturing Resource Planing
1978
OPT – Teoria das Restrições
1980
Controle da Qualidade Total (prática a ser analisada nesta tese)
1980
Benchmarking
1985
Lean Manufacturing
1985
Supply Chain Management ( prática a ser analisada nesta tese)
1990
Agile Manufacturing
1990
Seis Sigma
1992
Efficient Consumer Response
1995
E-business / E-Procurement
Fonte: Adaptado de Corrêa, 2003
Como foi discutido anteriormente, a definição de tipologias pode ajudar a tornar mais
inteligíveis os processos organizacionais. Em função disso, a discussão a seguir sobre
práticas gerenciais é feita por tipologias de práticas.
63
3.2 Domínios de Práticas Inovadoras
Parte da literatura concernente às práticas inovadoras evidencia as sobreposições
existentes em relação ao arcabouço de métodos que as compõem. Por exemplo, tanto
a gestão da qualidade total, o just in time e a manutenção produtiva total incluem o
compromisso da liderança, o planejamento estratégico, treinamento multi-funcional e
o envolvimento dos trabalhadores. Entretanto, outra parte da literatura especializada
não costuma evidenciar essas sobreposições. As figuras 3.1 e 3.2 apresentam uma
proposição de agrupamento de práticas gerenciais frequentemente relacionadas à
Gestão da Qualidade Total, Just in time, Manutenção Produtiva Total e Gestão de
Pessoas e Estratégia, bem como a alguns dos resultados que podem ser obtidos através
de sua utilização, de acordo com Cua et al (2001).
Figura 3.1 – Um framework Integrado entre Gestão da Qualidade Total, Just in
Time e Manutenção Produtiva Total
Técnicas Básicas de Gestão
da Qualidade Total
Técnicas Básicas de Just in
Time
Técnicas Básicas de
Manutenção Produtiva Total
Projeto Multi-Funcional de
Produtos
Gestão de Processos
Gestão da Qualidade de
Fornecedores
Envolvimento dos
Consumidores
Redução do Tempo de Setup
Produção “Puxada”
Entregas just in time pelos
fornecedores
Layout dos equipamentos
Calendário diário de produção
Manutenção autônoma e
manutenção planejada
Ênfase na tecnologia
Desenvolvimento de
Equipamento Proprietário
Técnicas Comuns Orientadas para as Pessoas e para a Estratégia
Compromisso da Liderança
Planejamento Estratégico
Treinamento Multi-Funcional
Envolvimento dos Trabalhadores
Informação e Feedback
Fonte: Cua et al 2001 (p.679).
64
Figura 3.2 – Um Framework Teórico sobre a Combinação de Práticas Inovadoras
GQT
JIT
MPT
Práticas Orientadas para Pessoas e Estratégia
Fatores Contextuais
Desempenho Produtivo
Custos
Qualidade
Entrega
Flexibilidade
Desempenho
Fonte: CUA et al 2001 (p.679).
Cua et al (2001) sugerem que a implementação de técnicas básicas não causará tanto
impacto no desempenho produtivo quanto a utilização combinada de práticas básicas
– específicas de cada técnica (sistema técnico) – com as práticas comuns de gestão de
pessoas (sistema social). Tanto o subsistema social quanto o subsistema técnico
devem ser otimizados para alcançar o melhor desempenho possível. A hipótese dos
autores é de que um nível mais alto de desempenho produtivo pode ser esperado
quando práticas comuns e específicas de GQT, JIT e MPT são implementadas
conjuntamente. Segundo esses autores, a adoção dessas práticas, como GQT, JIT e
MPT, auxiliará no estabelecimento de uma estrutura na qual os recursos humanos de
uma fábrica podem adquirir informação e aprender, ser empoderados e se envolver
mais intensamente com as operações.
Amparando-se nos conceitos de fit2 organizacional, que envolve a consistência entre
os grupos ou subsistemas de uma organização (fit interno), e de fit entre a estrutura e
estratégia organizacional e o contexto externo (fit externo), tais autores acreditam que
um fit adequado entre fatores relevantes levará a um desempenho melhorado.
O artigo ressalta a necessidade de adoção de práticas combinadas que se suportam
mutuamente. Avanços obtidos em um campo, através de uma prática, serão estímulos
por avanços em outros campos, com o uso de práticas complementares. Investimentos
realizados, por exemplo, em treinamento multifuncional, necessários para a
2
Em geral, fit significa a coerência entre dois ou mais fatores.
65
implementação de uma prática, serão aproveitados quando houver novos esforços para
a adoção de novas práticas gerenciais.
Seguindo as proposições encontradas em Loiola et al (2003b), é possível sugerir três
domínios nos quais práticas inovadoras têm sido crescentemente adotadas: práticas
inovadoras de gestão de pessoas, práticas inovadoras de gestão da produção e práticas
inovadoras de gestão do desempenho e da qualidade. Dessa forma, serão apresentadas
a seguir, sem presunção de esgotar a discussão sobre inovações em quaisquer desses
domínios, algumas inovações que tipificam as mudanças que neles têm ocorrido.
3.1.1. Práticas Inovadoras de Gestão de Pessoas
Assim como outras áreas da administração, o campo da gestão de pessoas tem sido
marcado por inúmeras inovações no modo como se gerenciam as relações de trabalho
nos últimos anos.
Conforme discutido em seções anteriores desta tese, é possível identificar duas fontes
para tais inovações. Uma de natureza interna, da organização, e outra de natureza
externa, oriunda do ambiente. Internamente, as pressões têm ocorrido no sentido de
atingir o pleno potencial produtivo da organização, obtendo o máximo desempenho
possível de seus recursos, inclusive humanos. Para tanto, foram desenvolvidas novas
práticas de gestão do trabalho para aumentar sua produtividade, seu comprometimento
com o trabalho e com a empresa, e fomentar sua capacitação. Essas novas práticas de
gestão do trabalho humano são mais sutis em seus métodos e em sua retórica, e
incluem novas formas de relacionamento social no ambiente de trabalho e a promessa
de recompensas crescentes em retribuição aos esforços oferecidos pela força de
trabalho, exigindo mais abertamente o esforço e a dedicação das pessoas, por
exemplo.
66
Osterman (1998) sugere que sistemas de trabalho de alto desempenho se difundiram
rapidamente durante a década de 1990. As premissas sobre o uso desses sistemas são:
1) eles permitem maior produtividade e maior qualidade, uma vez que utilizam mais
eficientemente a mão de obra, explorando sua criatividade e força de vontade3, e 2)
esses sistemas também prometem benefícios que atingem tanto a força de trabalho
quanto os empregadores, distribuindo parte dos ganhos para estes últimos.
De fato, a retórica associada a muitas dessas novas práticas sugere que é papel de cada
indivíduo gerenciar sua contribuição para a organização, transferindo-lhe a
responsabilidade de melhorar seu desempenho. Adicionalmente, essas novas retóricas
prometem, em troca da dedicação integral dos trabalhadores, maior auto realização e
maiores recompensas financeiras e não financeiras.
A segunda fonte de pressão pró-mudanças sobre as organizações é externa, e refere-se
não somente a pressões por competitividade e desempenho, mas também a pressões
por práticas mais humanas de gestão de pessoas e condições mais aceitáveis de
trabalho. Sindicatos, governo e sociedade têm exigido que as organizações melhorem
as condições de trabalho de seus empregados, visando reduzir o impacto negativo do
trabalho sobre o indivíduo.
As organizações têm sido cobradas a adotarem um
comportamento comprometido com a dimensão social, que inclui também as formas
como gerenciam e recompensam as pessoas que nelas atuam.
Davis (1995) ressalta a influência de um novo ambiente das organizações, marcado
por outros vetores de mudança intensiva: a tecnologia da informação, o crescimento
do conhecimento e a globalização. Segundo Davis (1995), as organizações devem se
esforçar para aproveitar as oportunidades e evitar as ameaças apresentadas por esse
ambiente, cujo ritmo de mudança é acelerado, impedindo organizações de mudar
3
Adler (1993) relata a experiência na NUMMI, segundo a qual os trabalhadores apresentaram dez mil
novas idéias, oitenta por cento das quais foram aproveitadas.
67
incrementalmente e forçando-as a perceber e responder rapidamente a janelas globais
de oportunidade.
A tecnologia da informação, o crescimento do conhecimento e a
globalização estão levando as organizações a remover suas
fronteiras internas e externas. Essas mudanças podem trazer
vantagens somente quando elas são buscadas apropriadamente
como parte de uma estratégia deliberada. Essas mudanças
organizacionais fornecem novas oportunidades para psicólogos
industriais e organizacionais. A identificação dos requisitos dos
recursos humanos, a mensuração e o desenvolvimento do domínio
pessoal, e a mensuração e gestão das competências organizacionais
representam novas áreas para pesquisa e prática. (DAVIS, 1995,
p.133-134)
Osterman (1998) acrescenta ao conjunto até aqui delineado de explicações para o
fenômeno de adoção de práticas inovadoras de gestão, o comportamento imitativo por
parte de organizações secundárias que acompanham movimentos inovadores das
líderes de seus setores, o que explicaria movimentos tardios de difusão –
racionalidade econômica seria uma explicação para os adotantes iniciais, enquanto
que mimetismo seria uma explicação para adotantes tardios.
Segundo Ichniowski et al (1996) práticas tradicionais de gestão de pessoas incluem
cargos definidos de maneira restrita, com formas de pagamento também restritas,
claras linhas de demarcação, separando direitos e deveres dos trabalhadores e
supervisores, poderes de decisão centralizados na administração, e comunicação e
conflitos canalizados para as cadeias de comando e procedimentos de reivindicações
formais.
Ainda segundo Ichniowsky et al (1996), práticas inovadoras se diferenciam de
práticas tradicionais de gestão de pessoas porque buscam maior grau de flexibilidade
na organização do trabalho, maior cooperação entre os trabalhadores e a gerência, e
maior participação do trabalhador nas decisões e no bem-estar financeiro da empresa.
68
Prosseguindo, tais autores postulam que as teorias sobre práticas inovadoras as
relacionam com melhoraria de produtividade, pois estimulam os trabalhadores a se
dedicar mais intensamente ao trabalho e a compartilhar mais suas idéias. Além disso,
elas podem tornar a estrutura da empresa mais eficiente, a despeito de qualquer efeito
que possam gerar sobre a motivação dos trabalhadores. Em ambos os casos, as
companhias que adotam essas práticas propendem a desfrutar maior produtividade e
qualidade, reduzindo seus custos e aumentando a demanda pelos seus produtos. Em
última análise, a melhoria dos resultados das empresas adotantes dessas práticas
inovadoras se reflete em melhor lucratividade, melhor retorno sobre o ativo, melhor
retorno sobre o investimento, pelo menos no longo prazo, afetando positivamente o
valor de suas ações.
Sendo assim, tem sido construído um novo padrão de gestão de pessoas, denominado
de Sistemas de Trabalho de Alto Desempenho (HPWS – High Performance Work
Systems) (WAY, 2002; KLING, 1995). Segundo Way (2002), HPWS são conjuntos
de práticas de administração de recursos humanos que funcionam complementarmente
para selecionar, desenvolver, reter e motivar uma força de trabalho que (1) possua
habilidades superiores, (2) que aplique essas habilidades em suas atividades
profissionais, (3) que resultem em desempenho superior por parte da organização.
Sistemas dessa natureza normalmente envolvem a transferência de certo nível de
controle aos empregados e outros mecanismos, como programas de envolvimento,
trabalho em equipe, treinamento e desenvolvimento, formas de compartilhamento dos
resultados (gain sharing) e outros sistemas de recompensas, com o intuito de produzir
maior bem estar dos trabalhadores e assim obter o melhor resultado possível
(RAMSAY et al, 2000). Em outras palavras, essas práticas tipicamente envolvem uma
combinação de organização do trabalho e políticas de administração de recursos
69
humanos, adotadas com a finalidade de oferecer maior participação na tomada de
decisão (empoderamento), a oportunidade de aprender novas habilidades (cultura de
aprendizagem) e os incentivos financeiros, para que sejam despendidos maiores
esforços a serviço das metas dos empregadores, envolvendo, geralmente, alguma
forma de trabalho em equipe, círculos de qualidade e remuneração por desempenho.
Sistemas do tipo HPWS prometem realizar melhorias no desempenho das
organizações, principalmente com resultados típicos da gestão de pessoas, como
redução do turnover e do absenteísmo, mas, também, com resultados relacionados ao
desempenho organizacional, como a própria elevação da produtividade do trabalho, e
a melhoria de outros resultados de desempenho contábil e/ou financeiro, como o
retorno sobre o investimento (DYER & REEVES,1995 apud WAY, 2002).
O empoderamento, em especial, se refere a uma maior distribuição de poder nas
organizações, em todos os níveis hierárquicos, na busca de maior rapidez de resposta,
maior efetividade nas decisões e nas ações organizacionais (MILLS 1996; TRACY
1994; SOARES E LUCAS 1995). Quando todos na organização possuem a
informação e o discernimento para tomar decisões mais apropriadas, torna-se menos
necessária a intervenção de gerentes e executivos de alto escalão para resolver os
problemas do dia-a-dia das organizações. O empowerment envolve a participação dos
gerentes médios e dos funcionários em geral no planejamento e nas decisões
estratégicas das empresas, combinada com outras práticas como trabalho flexível,
gestão de livro aberto, gerência participativa e remuneração por desempenho. Essas
práticas, quando associadas, compõem um poderoso modelo de administração, que
pode produzir um efeito motivacional intenso, trazendo melhorias significativas para
o desempenho das organizações.
70
A mudança para se adotar o empowerment nas organizações envolve o aumento da
confiança entre as pessoas e a gerência, a adoção de tolerância a erros, a fixação de
metas desafiadoras e de elevados padrões de excelência, associados a investimentos
em treinamento e desenvolvimento de pessoas que trabalham em equipes
autodirigidas e motivadas intrinsecamente (MILLS, 1996; TRACY, 1994).
Enfim, há uma corrente de estudiosos que defende que trabalhadores preferem atuar
em ambientes mais desafiadores, que explorem mais intensamente suas capacidades e
talentos, e aceitam participar em programas de tal natureza, mesmo quando condições
externas ao programa pareçam ameaçar sua estabilidade. Ou seja, apesar de os
trabalhadores estarem conscientes do potencial explorador de sistemas de trabalhos de
alto desempenho e não confiarem completamente em seus administradores, existe
uma chance de que eles prefiram trabalhar em condições semelhantes a esses tipos de
sistemas. Além disso, os empregadores também exigirão que os trabalhadores de suas
organizações se engajem em sistemas dessas naturezas, devido ao grande potencial de
ganhos a serem auferidos.
Assim, um subconjunto da literatura especializada na área enfatiza que estes sistemas
de trabalho de alta performance (HPWS) oferecem benefícios tanto para
empregadores quanto para empregados. De acordo com esse ponto de vista, com a
adoção de HPWS’s é possível que os empregadores obtenham maior qualidade,
produtividade e retorno financeiro, enquanto que os empregados obtenham salários
mais elevados e maior satisfação com o trabalho, ao mesmo tempo em que elevam
suas habilidades, motivações e o nível de empoderamento.
Entretanto, pesquisas recentes demonstram que funcionários de empresas que adotam
práticas de elevado desempenho têm reportado resultados contrários aos inicialmente
identificados como desejáveis. Os trabalhadores têm relatado redução da auto-estima,
71
extenuação e baixa satisfação com o trabalho, forçando organizações adotantes de
HPWS a desenvolver sistemas de compensação, como esquemas flexíveis de trabalho
e outras práticas que permitem maior adaptação.
White (2003) investiga a relação entre a adoção de práticas inovadoras de
administração, comumente denominadas “administração de alto desempenho”, ou
“administração de alto compromisso” e o equilíbrio entre vida profissional e vida
pessoal e familiar. Segundo esse último autor, essas práticas recentes nesse campo
implicam maiores exigências sobre o desempenho do indivíduo, o que repercute
negativamente em sua qualidade de vida, trazendo conseqüências negativas sobre sua
família.
A principal causa dessas repercussões negativas seria o enfraquecimento do poder de
barganha dos empregados, face à queda na estabilidade dos empregos, associado ao
aumento de suas necessidades financeiras, resultantes de aumentos de preços e taxas
de juros. Os empregadores, por sua vez, têm buscado maior retorno sobre o custo de
mão de obra. Práticas de alto desempenho ou alto comprometimento exercem um
impacto negativo nas vidas dos trabalhadores, uma vez que estes são forçados a
oferecer maior esforço discricionário na busca dos objetivos organizacionais.
A determinação de horas de trabalho pelos empregadores tende a aumentar as
demandas de trabalho acima do nível de escolha ótima para os empregados. Dessa
forma, as horas trabalhadas de fato serão relacionadas positivamente com
transbordamento negativo do trabalho para casa.
Segundo White (2003), as práticas que elevam as demandas sobre o trabalho
aumentam o ‘transbordamento’ (spillover) negativo do trabalho para o lar, enquanto
que práticas que aumentam a escolha ou a flexibilidade do empregado sobre as
demandas do trabalho reduzem o ‘transbordamento’ negativo do emprego para o lar.
72
Três tipos de práticas de alto desempenho gerarão mais demanda de trabalho, e dessa
forma, transbordamento negativo do trabalho para casa: práticas de avaliação do
desempenho; trabalho em equipe; e remuneração por desempenho. Por outro lado,
práticas que reduzem a pressão sobre o trabalhador são aquelas que aumentam a
escolha e a flexibilidade do trabalhador sobre as demandas do trabalho, como horários
flexíveis de trabalho.
Certamente, há também diferenças individuais que influenciam os resultados da
adoção dessas práticas, como dificuldades financeiras que levam o indivíduo a
trabalhar por mais tempo, gerando conseqüências negativas sobre suas vidas pessoais.
Outras circunstâncias que levam a dificuldades financeiras são a existência de
crianças (filhos) na família, o fato de somente uma pessoa de o casal trabalhar, por
exemplo.
A pesquisa realizada por Osterman (1998) amplia as evidências registradas em
parágrafos anteriores, sugerindo que a adoção de sistemas de HPWO associa-se a
aumentos na probabilidade de demissões e redução dos ganhos indenizatórios, além
de redução do emprego de administradores e à utilização de força de trabalho
temporária. A turbulência gerada por demissões e transferências reduz a probabilidade
de que equipes possam funcionar adequadamente, alcançando os resultados desejados.
Sem segurança em seus empregos, os trabalhadores tendem a evitar participação,
especialmente no que se refere a melhorias em produtividade, que são associadas,
pelos menos popularmente, a demissões e enxugamentos.
Esses argumentos tornam evidente o fato de que práticas inovadoras de gestão de
pessoas nem sempre são favoráveis aos indivíduos, conforme pregado por parte da
literatura do ramo. “Melhores práticas de administração de alto desempenho devem
ter maior cautela ao proclamar a presunção unitarista de que todos ganham com a
73
inovação gerencial” (WHITE 2003, p. 191). Essa ponderação é repetida também por
Appelbaum et al (2000: p.228) e por Tenório (2000).
Para Tenório (2000), em especial, as conseqüências negativas da utilização da
tecnologia da informação sobre os trabalhadores são o aviltamento do trabalho, o
desemprego e decorrências sociais além da desqualificação dos trabalhadores, apesar
de haver, como contrapartida, uma qualificação intelectiva, que se reflete em
exigências para os trabalhadores de maior capacidade de pensar abstratamente, melhor
raciocínio indutivo e uma maior concepção teórica dos processos aos quais os dados
se referem.
Ao discutir sobre a natureza e o conteúdo do trabalho em organizações que adotam
alguma forma enriquecida de gestão de pessoas, como os sistemas High Performance
Work Systems (HPWS), Howard (1995), todavia, não negligência a existência de um
debate sobre a tendência à manutenção da desqualificação do conteúdo do trabalho,
conforme o trabalho intelectual continue a ser transferido para equipamentos mais
inteligentes, potencialmente substitutos do trabalho intelectual do ser humano.
Entretanto, Howard (1995) sugere que a competição esteja forçando as organizações a
realizarem um upgrading no conteúdo do trabalho, como forma de obterem
combinações mais produtivas de suas capacidades humanas e mecânicas.
As organizações necessitam de conhecimento e iniciativa de operadores qualificados,
de modo a aproveitar ao máximo o potencial dos equipamentos, exigindo que os
operadores
se envolvam em atividades de programação, testes e alterações. A
manufatura flexível normalmente encoraja essas modificações, uma vez que ciclos
mais curtos de produção requerem mais atividades de setup e programação, o que, por
sua vez, requerem maiores habilidades (HOWARD op.cit.).
74
Além do mais, ainda segundo Howard (op.cit.), o nível ampliado de interdependência
dos trabalhadores nas fábricas modernas, aliado ao custo elevado dos equipamentos,
exerce uma pressão aumentada na prevenção de erros e na redução da incerteza, o que
exige maior responsabilidade e iniciativa dos trabalhadores na fábrica.
Wood (1999) alerta para o fato de que a simples adoção de práticas inovadoras não
assegura as vantagens desejadas. A questão é a de que há condições que limitam o
sucesso na adoção de novas práticas organizacionais, inclusive as práticas de gestão
de pessoas. Essa é a lógica predominante na teoria da contingência, que reclama a
importância do ajuste entre os sistemas de recursos humanos e seu contexto, e,
particularmente, a estratégia organizacional. Sendo assim, práticas de administração
de alto desempenho só oferecem desempenho superior sob certas circunstâncias.
Segundo Wood (1999), a questão ultrapassa a simples verificação do universalismo
das práticas de alto envolvimento e teoria contingencial. Há hipóteses mais complexas
ligando práticas de recursos humanos. Uma análise dessa literatura apresenta um
quadro desequilibrado. Primeiramente, há diferenças conceituais nos estudos. Além
disso, os resultados variam entre si, e os efeitos dos sistemas de administração de alto
envolvimento ou alto comprometimento (HIM) no desempenho variam entre eles,
mesmo em estudos particulares. Apesar de esses trabalhos alegarem comprovar
universalismo, suas evidências empíricas não são inquestionáveis.
Um dos problemas potenciais em relação à adoção de HPWS é a possibilidade de que
a adoção dessas práticas possa gerar custos adicionais que superem os benefícios
obtidos. A adoção desses sistemas é uma decisão que envolve a análise dos riscos
associados ao investimento necessário e dos retornos esperados, especialmente
quando se trata de organizações que não possuem capital para investir nesses
programas, que prometem ganhos diferidos. Isso pode ser ainda mais relevante no
75
caso de micro e pequenas empresas que não conseguem atingir o volume suficiente
para obterem economia de escala (GUTHRIE, 2001 apud WAY, 2002). Além do
mais, os excedentes de ganhos auferidos na adoção de sistemas HPWS têm sido
usualmente negociados e repassados para os trabalhadores, na forma de aumentos de
salários e de bonificações e outros incentivos salariais, o que reduz ainda mais os
ganhos reais das organizações (OSTERMAN,1998).
Osterman (1998) sugere ainda que, em épocas de grandes reestruturações, as
organizações tendem a deixar de adotar ou de sustentar práticas de recursos humanos
associadas aos sistemas de trabalho de alto desempenho. Isso ocorre, em primeiro
lugar, porque essas práticas requerem certo nível de estabilidade, de modo que os
participantes possam aprender novas habilidades e acostumarem-se ao trabalho em
equipe. Práticas associadas a elevado desempenho organizacional exigem elevado
nível de comprometimento com o trabalho – os trabalhadores devem estar
interessados em aprender novas habilidades, devem estar confiantes para apresentar
suas idéias e sugestões, baseadas em suas experiências e conhecimentos.
Na verdade, uma das principais questões levantadas pela literatura mais crítica é o
quanto as práticas utilizadas pelas empresas se ajustam entre si e com outros aspectos
que envolvem a organização – fit organizacional (esta preocupação também aparece
em outros trabalhos, como o de Miles e Snow 2003). Wood (1999) sugere que três
tipos de ajustamento organizacional devem ser levados em consideração: 1) o
ajustamento interno entre as práticas de ARH; 2) o ajustamento entre o sistema de
ARH e outros sistemas da organização – fit organizacional; e 3) o ajustamento entre
os sistemas de ARH e a estratégia competitiva da organização – fit estratégico.
Entretanto, existe ainda um quarto ajustamento, que deve ser levado em consideração,
que é aquele entre o sistema de ARH da organização e o seu ambiente (fit ambiental),
76
apesar de este ajustamento ser capturado indiretamente através da estratégia
organizacional.
Sendo assim, seria controverso tratar práticas inovadoras como sendo um novo “one
best way” de se organizar o trabalho humano. Modelos como “world class
manufacturing” devem, então, ser vistos com cautela. Não faz sentido dizer que existe
um modelo único que proporciona resultados de alto desempenho, uma vez que as
combinações de práticas de gestão de pessoas entre si, com outras práticas
organizacionais, com a estratégia e com o ambiente organizacional proporcionam
resultados diversos, invalidando a proposição das melhores práticas.
Certamente, uma das questões é a de como validar esse modelo, uma vez que não é
possível reduzi-lo simplesmente a uma proposição de universalidade ou
contingencialidade. Primeiramente, há diferenças conceituais nos diferentes termos
sendo utilizados para rotular as diferentes práticas de envolvimento utilizadas em
gestão de pessoas que implicam diferentes concepções do relacionamento entre as
práticas de gestão de pessoas e desempenho. Além disso, existe uma discussão teórica
no campo da gestão de pessoas que ultrapassa a simples competição entre a
perspectiva universalista e a contingencial, com ênfase na mensuração de seu fit
estratégico.
Em especial, as correntes que discutem o ajuste entre as práticas inovadoras de gestão
de pessoas e modelos emergentes como produção enxuta ou a gestão da qualidade
total consideram que as práticas inovadoras de gestão de pessoas seriam o “lado
humano” dessas estratégias gerenciais, sendo, dessa forma, mais provavelmente
encontradas quando as organizações adotassem tais práticas. Em outras palavras,
quando um modelo mais amplo de administração, de nível estratégico, é combinado
com as práticas de gestão de pessoas apropriadas, os efeitos tendem a ser ampliados.
77
3.1.2. Práticas inovadoras de gestão da produção
O campo da administração da produção tem sido um terreno fértil para inovações
gerenciais. Muitos trabalhos apontam como foi necessário um aprimoramento das
práticas industriais, em especial desde a década de 1970, e a localização desses
desenvolvimentos. Dessa forma, têm sido repetidamente tratados os desenvolvimentos
ocorridos principalmente no Japão, na Itália e na Suécia, como contrapontos ao
modelo industrial norte-americano de produção em massa, conforme já foi registrado
nesta tese.
Diversas inovações têm se sucedido, ao longo desses anos, e modificado a forma
como se gerenciam todas as atividades de produção, incluindo o planejamento da
produção, a gestão das relações de trabalho e a atividade de produção em si.
Destacam-se, nesse campo, as inovações ocorridas no Japão, como o just in time, o
kanban, os custos da qualidade, o PDCA, o diagrama de Ishikawa, os círculos de
controle da qualidade, o quality function deployment, o controle da qualidade total, o
lean manufacturing, ou produção enxuta, só para enumerar algumas.
Ressaltam-se, também, as inovações surgidas nos Estados Unidos da América, como
aprimoramento do modelo clássico de produção em massa, como o MRP – Material
Requirements
Planning,
o
MRPII -
Manufacturing Resource Planing,
o
benchmarking, o supply-chain management, o agile manufacturing, seis sigma e EProcurement.
Dentre as principais evoluções verificadas na administração industrial, encontram-se
uma ampla variedade de práticas específicas, que combinam metodologias de gestão
participativa com tecnologia da informação e outras tecnologias de modo a obter
sistemas de produção mais eficazes, permitindo maior flexibilidade de produção e
78
viabilizando a produção em lotes menores e com maior variabilidade, reduzindo o
tempo de preparação de máquinas, de substituição de moldes e de paradas por
problemas de manutenção e outros problemas comuns na indústria. Serão
apresentadas, a seguir, práticas que tipificam os principais desenvolvimentos na área,
mais uma vez sem a presunção de esgotar o assunto. As práticas foram selecionadas
por sua relevância nesse cenário, e por fazerem parte do conjunto de práticas
pesquisadas nesta tese: Manutenção Produtiva Total (MPT) e Células de Manufatura
(CM).
3.1.2.1.Manutenção Produtiva Total
A Manutenção Produtiva Total (MPT) é uma prática gerencial voltada para a
maximização da eficácia dos equipamentos durante toda sua vida útil. Essa prática
incorpora
a
manutenção
autônoma,
manutenção
planejada,
enfatizando
o
comprometimento da liderança, planejamento estratégico, treinamento multifuncional, envolvimento dos trabalhadores e o uso de equipamentos proprietários
(CUA et al, 2001; MILLING et al 1999).
A idéia central da MPT é a de que a sustentação da eficácia de equipamentos, livres
de paradas inesperadas, depende de manutenção planejada e de melhorias ou
desenvolvimentos dos equipamentos. Para conduzir essa manutenção, é necessário
treinamento multi-funcional para desenvolver as habilidades dos trabalhadores, além
de desenvolver seu comprometimento com o processo de manutenção e de fornecer o
tempo e os recursos necessários para melhorar o desempenho dos equipamentos. . Por
último, é necessário adquirir ou desenvolver internamente novas tecnologias e
equipamento proprietário
79
Através de manutenção autônoma, os operadores aprendem a desenvolver tarefas
críticas diárias, que a equipe de manutenção não tem condições de realizar
(housekeeping), como limpeza e inspeção, lubrificação, checagens de precisão e
outras tarefas leves de manutenção. Depois que essas tarefas são transferidas para o
pessoal de operações, o pessoal de manutenção pode se concentrar no
desenvolvimento e implementação de outras tarefas e planejamento da manutenção
proativa (MCKONE et al, 1999).
Figura 3.3 - Elementos da Manutenção Produtiva Total
Manutenção
Produtiva Total
Processo de Melhoria Contínua
Manutenção
preventiva
descentralizada
Trabalho e
responsabilidade em equipe
Qualificação do
pessoal de
produção
Mensuração da
eficácia do
equipamento
Limpeza do
ambiente de
trabalho
Fonte: Milling et al, 1998, p.3
Na essência, segundo Milling et al (1998 – Figura 3.1), a MPT se refere à
transferência, aos operadores de máquinas, de tarefas rotineiras de manutenção
preventiva, como limpeza, lubrificação e pequenos ajustes preventivos, de modo a
permitir maior precisão no uso de equipamentos e reduzir o número de paradas por
quebras. Para tanto, torna-se necessário qualificar os operadores através de
treinamento de complexidade crescente, de modo que os operadores possam, cada vez
mais, ser capazes de fazer não somente tarefas simples de manutenção, como a
80
substituição de peças e componentes simples, mas também diagnosticar o surgimento
de problemas mais complexos, que serão consertados preventivamente pela equipe
especializada em manutenção da empresa.
Sendo assim, os operários assumem maior responsabilidade sobre o funcionamento e
o ciclo de vida dos equipamentos que operam, atuam mais ativamente na identificação
de problemas e na prevenção de paradas, reduzindo a variabilidade no produto final.
O ambiente de trabalho torna-se mais limpo e organizado, e permite, por exemplo, a
identificação de pequenos vazamentos de lubrificante que, de outra maneira, ficaria
oculto sob o óleo derramado nos equipamentos.
De acordo com McKone et al (1999), a manutenção autônoma (como também pode
ser denominada a MPT) pode ser mais bem definida pelos seus principais objetivos,
tanto no curto como no longo prazo. Primeiramente, à curto prazo, programas desse
tipo reúnem grupos ou equipes de manutenção, de modo a estabilizar as condições e
deter a deterioração dos equipamentos. Em seguida, com o desenvolvimento e
compartilhamento de responsabilidades sobre tarefas diárias de manutenção, o pessoal
de produção e de manutenção trabalha para melhorar as condições gerais de
manutenção dos equipamentos, oferecendo ganhos ainda mais significativos no longo
prazo.
Em seguida, a manutenção produtiva total é projetada para que os operadores
aprendam ainda mais sobre como funcionam os seus equipamentos, que problemas
mais comuns podem acontecer, seus motivos e como evitá-los pela detecção
antecipada e tratamento de condições anormais (treinamento cruzado). Finalmente, o
programa de MPT promove maior envolvimento dos operadores, preparando-os para
se tornar parceiros ativos do pessoal de manutenção e engenharia, e trabalhar na
81
melhoria do desempenho geral e da confiabilidade do equipamento (MCKONE et al,
op.cit.).
A MPT está fortemente vinculada à preservação de equipamentos, aumentando seu
ciclo de vida e, consequentemente, retornos sobre investimentos em capital produtivo
(MCKONE et al, 1999). Assim como outras práticas inovadoras de administração da
produção, a utilização da MTP depende de fatores organizacionais, como a idade e o
tipo de equipamento utilizado, a idade da planta, o padrão de administração utilizado
na planta e outros aspectos gerenciais, o porte da organização e o nível de
sindicalização existente no setor. Depende também de fatores ambientais, além da
influência significativa do contexto gerencial envolvido na fábrica, como a existência
de outros programas gerenciais – que no caso da MPT são comumente programas de
gestão da qualidade total, just in time e envolvimento dos trabalhadores.
Depreende-se, portanto, que a prática somente atingirá seu potencial de ganhos se
associada a algum tipo de “manufatura de classe mundial” ou algum outro padrão de
atividades que multipliquem seus efeitos.
Tanto McKone et al (1999) quanto Schonberger (1988:1992) ressaltam a
interdependência de práticas de administração ao considerarem, em seu modelo, que a
existência de programas de gestão da qualidade total, de just in time e de
envolvimento dos trabalhadores pode influenciar a adoção da manutenção produtiva
total.
Milling et al (1998) investigam a difusão da manutenção produtiva total em cinco
países (Japão, Itália, Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos da América do Norte),
indicando o Japão como o país com o maior nível de difusão da prática. Com a análise
de clusters, identificam os Estados Unidos da América como early followers e os
demais países como late followers. Avaliam os resultados percebidos por adotantes da
82
prática pelas mensurações objetivas, como eficiência em custos, desempenho da
qualidade, rapidez nas entregas, entregas no prazo, giro do estoque e flexibilidade, e
pelas mensurações subjetivas, como flexibilidade do programa, volume do programa,
velocidade da entrega, qualidade, e custos unitários médios.
Segundo esses autores, a MPT influencia parcialmente o desempenho, com os efeitos
mais consideráveis ocorrendo na velocidade de entrega. A prática gerencial em foco
apresentou pequeno impacto nos custos, o que não é considerado pelos autores uma
surpresa, uma vez que reduções de custos resultantes da MPT normalmente
representam apenas um percentual muito baixo do custo total. Entretanto, surpreende
o fato de esses autores não identificarem a ausência de influência sobre qualidade,
giro do estoque e flexibilidade.
3.1.2.2.Células de Manufatura
O termo Células de Manufatura (CM) foi usado pela primeira vez pelo pesquisador
russo Sokolovsky, em 1930, quando propôs que famílias de produtos deveriam ser
manufaturadas do mesmo modo e com processos tecnológicos específicos (HYER e
BROWN, 1999). Este conceito, de certa forma, foi ampliado, ou melhor, refinado,
passando a designar um arranjo específico da tecnologia, adequada à fabricação de
famílias de produtos por outros pesquisadores russos que seguiram a rota aberta por
Sokolovsky. Dessa forma, o conceito de CM nasceu intimamente ligado ao arranjo da
tecnologia, sendo compreendido, a partir de então, principalmente, como fruto da
combinação entre um cluster tecnológico e um layout. Uma certa cronologia de
diferentes conceitos de CM, que apontam alguns refinamentos, mas que mantêm
como eixo central de sua delimitação a questão tecnológica e de layout , encontra-se
no Quadro 3.3.
83
Quadro 3.3 - Conceitos Selecionados de Células de Manufatura
Autor/data
Sokolovsky (1930)
Definição
Reúnem partes de uma configuração e de características similares que
são manufaturadas de uma mesma forma por meio de um processo
tecnológico padronizado
Pesquisadores russos Manufatura de uma família de peças, usando uma linha ou células de
(seguidores de
máquinas. Conjunto de máquinas diferentes, que são agrupadas e
Sokolovsky)
comprometidas, por programação, com a produção de um conjunto
similar de partes, cada uma das quais é produzida em lotes de pequeno
a médio tamanho
Burbidge (1991)
Esse conjunto de máquinas fabrica o produto todo ou suas partes e
estão equipadas com todas as facilidades necessárias para cumprir sua
tarefa produtiva. Inicia-se a associação entre CM e GT (grupo de
tecnologia). CM e GT passaram a ser vistos enquanto construtos
equivalentes
Garza e Smut (1991) Aplicação de grupo de tecnologia em que as partes similares são
agrupadas por famílias e são processadas separadamente em
subsistemas de manufaturas chamados de CM
Stendel e Desruelle Conjunto de máquinas agrupadas por funções não similares e dedicadas
(1992)
a processar famílias de peças (ou de componentes) similares
Vakharia (1986)
Equivale a um grupo de máquinas ou processos funcionalmente não
similares, que são colocadas próximas umas a outras e são dedicadas à
manufatura de um conjunto específico de famílias de peças.
Shafer et al. (1995) Um grupo de máquinas, incluindo aquelas com uma mesma função,
definição essa realizada com base em informações de praticantes.
Fonte: elaboração dos autores com base em Hyer e Brown, 1999.
Segundo Hyer e Brown (1999), à exceção da definição de Shafer et al. (1995), todas
as outras, registradas no Quadro 3.3, consideram que uma CM compreende: (i) a
produção de parte ou de uma família de produtos; (ii) a localização de máquinas umas
próximas às outras e; (iii) que essas máquinas são dedicadas à produção de parte ou à
família de produtos. Para aqueles autores, da análise das definições constantes do
Quadro 3.3, denota-se que as células de manufatura são descritas essencialmente
como lay-out. Esta noção traz implicações desfavoráveis no que diz respeito aos
resultados esperados. Além disso, entender CM apenas como um lay-out ou grupo
tecnológico – um arranjo tecnológico específico para a fabricação específica de
produtos de uma mesma família – não permite que se tracem diferenças entre a CM e
uma linha de produção taylorista/fordista e nem que se possa aplicar o conceito de
CM a diferentes indústrias e setores.
84
Para se contraporem às definições de CM, que reduzem essa prática gerencial a um
tipo de lay-out, Hyer e Brown (1999) propõem o conceito de células reais. Segundo
esses autores, células reais definem-se por: (i) equipamentos e materiais dedicados a
uma família ou parte de família de produtos; (ii) que possuem requisitos de produção
similares; (iii) e por um fluxo de trabalho em que tarefas e pessoas encontram-se
fortemente conectadas em termos de tempo, espaço e informação.
Enquanto formas híbridas de organização, as células de manufatura incorporam
atributos positivos das linhas de montagem e dos processos de produção por batelada.
Então, como diferenciar células de produção de outros tipos de trabalho em grupo?
Para Hyer e Brown (1999), o tamanho do grupo é uma das variáveis-chave para a
diferenciação. Isso porque, ultrapassado o tamanho de 10-12 membros, a efetividade
da interação entre os três pilares das células reais de manufatura (tempo, espaço e
informação) fica prejudicada. Os três elementos de uma célula real de manufatura –
tempo, espaço e informação – interagem entre si e com outros capacitores,
influenciando o desempenho da célula. Em síntese, espaço e tempo são variáveis que
são administradas para, assim como na linha de montagem, eliminar o trabalho inútil,
mas a proximidade espacial entre membros da CM permite que os resultados obtidos
na administração das linhas de montagem sejam ultrapassados, porque essa
proximidade é fundamental para que o fluxo de informação ocorra de forma eficaz.
Neste sentido, experiências demonstram que o número reduzido de pessoas nas CMs
catalisa as vantagens esperadas. Sendo assim, a informação assume papel
preponderante na implementação das CMs, implicando além de um lay-out favorável,
uma crescente democratização no ambiente de trabalho.
Marx (1992) identifica as inovações ocorridas nas plantas suecas da Volvo como
sendo primariamente inovações sociais, uma vez que se centram ao redor de novas
85
configurações da participação do ser humano no processo produtivo (sistemas sóciotécnicos).
Aponta como características do modelo de especialização flexível (conforme Piore e
Sabel, 1984), o novo paradigma, denominado especialização flexível, que está
substituindo gradativamente o anterior (fordista/taylorista):
•
Substituição da estratégia de economia de escala pela economia de escopo;
•
Utilização intensiva de tecnologia de base microeletrônica;
•
Utilização crescente do trabalhador como um recurso inteligente;
•
Utilização de sub-contratação de mão de obra, especialmente em áreas
distintas do negócio central das empresas;
•
Reunião de empresas em redes, de forma a tirar proveito de esquemas
cooperativos e flexíveis de intercâmbio tecnológico, de recursos físicos e
humanos.
De acordo com Marx (1992), o conceito de células de produção difere do conceito
tradicional de produção em massa pelo fato de que nele o fluxo e o ritmo de produção
não são dependentes de uma linha ou correia móvel, mas ocorre de maneira mais
natural e fragmentada, em prédios separados (modularização das linhas), na qual os
produtos em fabricação são transportados entre as várias etapas por veículos
automatizados controlados por computadores (AGVs – Automated Guided Vehicles).
Nessa configuração, o trabalho humano adquire um novo significado, representado
por um aumento na responsabilidade e autonomia dos trabalhadores, sendo
responsáveis por uma série de tarefas de montagem, dentro de uma área de trabalho,
com possibilidade de rotação de cargos e tarefas amplas, que incluem a montagem e
teste de produtos.
86
Essa nova configuração industrial implica em necessidades ampliadas de
conhecimentos e habilidades, requerendo investimento em treinamento e qualificação
profissional, cuja decisão também é transferida aos empregados de fábricas que
adotam as células de produção – esse é um dos aspectos-chave que caracteriza o
modelo de células de produção suecas, diferenciando-as do mesmo padrão advindo do
modelo japonês: maior autonomia para os trabalhadores, incluindo decisões sobre
rotação de cargos e controle da qualidade.
O layout da fábrica é modificado, abandonando o esquema tradicional de linha de
produção para adotar um layout mais parecido com um grupo de mini-fábricas menos
interdependentes, responsáveis pela fabricação de produtos inteiros ou de
componentes complexos, distintamente do que ocorre no modelo fordista/taylorista,
no qual cada estação de trabalho é responsável por somente uma etapa, ou uma peça
simples.
Furtado (2004) interpreta as implicações da adoção das células de manufatura sobre a
natureza do trabalho humano ocorrido nas organizações após o estudo de alguns casos
de adoção da prática, sugerindo que esse novo formato de fabricação implica uma
mudança sutil na forma como é exercido o controle do indivíduo e do grupo pela
organização, como contraponto à ampliação da liberdade e da autonomia dos
trabalhadores prometida pela experiência sueca:
Os grupos de trabalho não são a ‘libertação da classe operária’...
há, sim, um controle da empresa sobre o trabalho. Porém, agora,
um controle mais sutil, exercido sobre o trabalho coletivo e não
individualizado, exercido sobre um trabalhador que tem a visão
completa do processo produtivo e não mais o horizonte restrito das
seções e departamentos; um trabalhador muito menos especialista e
muito mais multifuncional, mas um trabalhador ainda dentro da
relação capitalista, ainda sendo controlado, explorado pelo capital.
(FURTADO, 2004, p.246)
Huber e Brown (1991) ressaltam a importância de se estudar o lado humano das
células de manufatura, uma vez que os impactos da adoção dessa prática sobre os
87
indivíduos e seu papel no trabalho podem ser muito intensos. Segundo os autores,
muito pouco tem sido explorado dessa perspectiva, que pode ser tida como a mais
importante em relação à prática, especialmente sob a perspectiva sócio-técnica, de
acordo com a qual, nenhum avanço técnico apresentará resultados significativos sem
ser acompanhado por avanços sociais correspondentes.
Em função do atrelamento ao processo de ruptura paradigmática e de emergência de
novos paradigmas de produção e de organização do trabalho em nova etapa do
capitalismo, as CMs foram, quase que exclusivamente, vinculadas aos novos modelos
de organização do trabalho e da produção difundidos a partir do sucesso competitivo
do Japão na década de 1970. Nem outras experiências de utilização de CM, como, por
exemplo, as da Noruega e da Suécia, foram muito focalizadas no Brasil.
Na Noruega, por exemplo, para conter um intenso êxodo rural no sentido das cidades,
foram projetadas mini-fábricas (ou células de manufatura), em áreas rurais. Cada
célula era responsável pela manufatura de uma família específica de produtos,
determinada pelos princípios de tecnologia de grupo. Tais células se ligavam por meio
de uma rede de transportes de materiais e de componentes. Esse projeto foi
relativamente bem sucedido, mas os elevados salários da mão-de-obra norueguesa
levaram ao desenvolvimento de um novo conceito de fábrica, com base no trabalho
em CM, mas enfatizando a utilização de máquinas de controle numérico, distribuídas
em torno de um robô. Essa nova unidade produtiva passou a funcionar 24 horas por
dia e os trabalhadores passaram a desempenhar tarefas como programação de
computadores, planejamento da produção, escalonamento, manutenção, tratamento
térmico em certos componentes, gestão do sistema de transporte, etc. (BORENSTEIN
e BECKER, 1994).
88
A experiência da Suécia também é muito antiga e, a exemplo do caso anteriormente
relatado da Noruega, está fortemente relacionada a seus padrões socioculturais e seus
desafios de desenvolvimento. A Suécia caracteriza-se pelo elevado nível de
escolaridade e cultura de sua população; seus trabalhadores possuem as médias
salariais mais altas do mundo; grande influência sindical, sobretudo em questões
relativas à organização do trabalho e da produção; forte dependência das exportações;
e por um Estado forte, com políticas de bem-estar ainda muito ativas (Marx, 1992;
1998). A Volvo é o caso sueco de maior difusão no mundo ocidental. Segundo Marx
(1992, p. 43):
O caso das experiências suecas na montagem final de veículos e,
em particular, a planta de Uddevalla mostra que características da
‘especialização flexível’ também estão presentes, de certa forma,
de modo ainda mais flagrante do que, por exemplo, na planta
paradigmática da Toyota no Japão.
Ainda de acordo com Marx (1998), entre 1992-1995, ocorreu um debate acentuado
envolvendo autores de origem sueca e norte-americana sobre as experiências das
fábricas de Uddevalla (experiência sueca) e NUMMI (joint venture GM-Toyota). Tal
debate refletia duas concepções diferentes de projeto organizacional – o primeiro
enfocava o desempenho e a estratégia, enquanto o segundo enfatizava o compromisso
com o desempenho e com as condições de trabalho na fábrica.
3.1.3. Práticas inovadoras de gestão do desempenho e da qualidade
As principais práticas inovadoras de gestão do desempenho e da qualidade, enfocadas
nesta tese, foram oriundas da evolução ocorrida no Japão, à partir do final da II
Guerra, e essas foram seguidas por práticas desenvolvidas em outros países, em
especial nos Estados Unidos da América, à partir da década de 1980.
89
Apresentam diversos aspectos em comum, em especial a grande preocupação com o
desempenho organizacional, que pode ser mensurado de diversas maneiras, como
rentabilidade e lucratividade, preços das ações, crescimento nas vendas, satisfação dos
clientes, produtividade, dentre outras. De uma maneira geral, representam uma nova
forma de organizar o trabalho humano, acrescentando valores que foram
negligenciados anteriormente, como a preocupação com a qualidade e a satisfação de
stakeholders, enfatizando a participação de trabalhadores no processo decisório,
valorizando a aprendizagem e a transferência de tecnologia, reduzindo custos e
aumentando a produtividade organizacional.
3.1.3.1.Gestão da Qualidade Total
O movimento da Gestão da Qualidade Total surge historicamente no Japão, dentre os
esforços da adaptação da estrutura industrial japonesa, cuja criação fora originalmente
baseada no modelo taylorista/fordista, às condições locais do pós-guerra, de demanda
reduzida e fragmentada. Os registros históricos identificam o surgimento de uma
grande quantidade de práticas nessa mesma época, como just in time e kanban,
apontando as experiências pioneiras de Kiichiro Toyoda e Taiichi Ohno como tendo
dado origem a essas práticas (CORIAT 1994; WOMACK et al 1992; SHIMOKAWA
1993).
Na tentativa de adaptar o modelo industrial norte-americando, essencialmente
taylorista/fordista, às condições do Japão no período seguinte à guerra, esses e outros
personagens iniciam uma busca por soluções inovadoras de gestão organizacional
(CORIAT 1994; WOMACK et al 1992; SHIMOKAWA 1993). A principal questão a
ser resolvida era a de como tornar viável uma fábrica de pequenas proporções,
90
especialmente diante de flutuações constantes de demanda, tanto em quantidade
quanto em diversidade. A pedra central do modelo industrial norte-americano,
referência original para o modelo japonês, era a economia de escala, ganhos
crescentes, decorrentes de quantidades também crescentes de produção.
As primeiras experiências com o modelo taylorista/fordista de produção deixaram
evidentes que as vantagens de economia de escala não eram disponíveis no Japão,
cuja extensão geográfica e demográfica não acomodaria tais margens crescentes de
produção e consumo. A solução para esse problema seria desenvolver um padrão
industrial que reduzisse os custos e garantisse o escoamento da produção – logo ficou
evidente que o maior inimigo da produção em pequena escala era a manutenção de
grandes volumes de estoque, bem como os desperdícios oriundos de descuidos em
relação à qualidade de processos e produtos.
Dessa forma, foram desenvolvidos, através de experiências de tentativa e erro, ao
longo de três décadas, diversos métodos de produção adaptados e melhorados,
especialmente sob a ótica de demandas irregulares, isso é, os principais métodos
japoneses de produção: gestão da qualidade total – originalmente conhecida como
controle da qualidade e controle estatístico de processo –, just in time, kanban e
outros.
Segundo Cua et al (2001), a gestão da qualidade total é um programa de produção que
visa a melhoria e sustentação da qualidade de produtos e processos. Para esses
autores, a literatura sobre tal prática, normalmente, identifica a ênfase na importância
do projeto de produto com o uso de equipes multifuncionais e do gerenciamento
sistemático de processos. Ademais, essa literatura ressalta a importância do
envolvimento dos consumidores, fornecedores e trabalhadores, de modo a garantir a
qualidade de produtos e processos. Finalmente, os programas de gestão da qualidade
91
total põem em relevo a importância do compromisso da administração e a definição
de uma estratégia bem definida de qualidade.
Ishikawa (1990) corrobora a visão anteriormente registrada. De acordo com esse
autor, Gestão da Qualidade Total é um modelo de organização orientado por uma
filosofia de respeito pelas pessoas – todos são considerados clientes da organização,
internos ou externos. A lógica desse modelo consiste em desenvolver, projetar,
produzir, comercializar e entregar serviços e produtos com ótima utilidade e custobenefício, que são comprados pelos consumidores com satisfação. Isso só é possível
se todas as pessoas na organização trabalharem em conjunto com os mesmos
objetivos em mente, utilizando uma variedade de técnicas como métodos estatísticos e
técnicos, padrões e regulamentos, métodos computadorizados, controle automatizado,
controle de facilidades, controle de medidas, pesquisa operacional, engenharia
industrial e pesquisa de mercado.
De igual maneira Shani e Mitki (1996) consideram Gestão da Qualidade Total uma
abordagem gerencial para melhoria de processos em uma organização a fim de gerar
produtos ou serviços de alta qualidade, que satisfarão o consumidor. Essa abordagem
enfatiza uma série de elementos como melhoria contínua, trabalho em equipe,
empoderamento de empregados, utilização de controle estatístico de processos. Sua
utilização implica mudança cultural inserindo valores relacionados à satisfação de
consumidores, uma consciência de qualidade por parte da perspectiva do cliente.
Segundo Lederer e Rhee (1995), a gestão da qualidade total surgiu a partir de
movimentos históricos envolvendo a inspeção da qualidade, o controle estatístico de
processos e a garantia de qualidade. Winter (1995) ressalta, como aspectos chave da
GQT: orientação para os processos, foco nos consumidores, base analítica e factual, e
liderança e participação.
92
A abordagem é aplicada de maneira top-down, com a criação de um departamento de
qualidade, qualquer que seja sua nomenclatura, e de equipes de trabalho, para
discussão e aplicação de métodos que permitam o desenvolvimento contínuo de
qualidade. Alguns percebem a GQT como uma integração de ferramentas e sistemas
projetados para melhorar a produtividade, enquanto que outros a percebem como uma
ampla e compreensiva filosofia gerencial. Por exemplo, Kathuria (2000) interpreta a
gestão da qualidade total como uma abordagem de administração que envolve uma
variedade de métodos comportamentais e técnicos para melhorar o desempenho
organizacional, baseado nos princípios de foco no consumidor, melhoria contínua e
trabalho em equipe.
Beyer et al (1997) reconhecem que a gestão da qualidade representa um “movimento
social inquestionável”, dado seu nível de difusão entre as maiores empresas do
mundo, e por isso já não há mais debate sobre sua relevância e importância, como
mecanismo de revitalização e reforma da indústria internacional.
•
Qualidade de Produto e Qualidade de Processo
O conjunto de práticas existentes na Gestão da Qualidade reduz a variabilidade e
aumenta a qualidade interna do processo de fabricação e a conformidade do produto.
Segundo Lederer e Rhee (1995), qualidade pode ser visualizada como qualidade de
produto, dependente da percepção dos clientes em relação à satisfação de suas
expectativas, e como qualidade de processo, de acordo com o nível de conformidade
às especificações de produção. Dessa forma, problemas de qualidade surgem quando
o produto não possui o conjunto de atributos desejados pelos consumidores (qualidade
de produto), ou quando há problemas de confiabilidade na produção do produto
(qualidade de processo), ou ambas.
93
Lederer e Rhee (1995) sugerem ainda que há dois aspectos centrais na economia da
gestão da qualidade total: o primeiro lida com o custo dos programas de melhoria da
qualidade e o segundo explica como a satisfação do consumidor pode ser utilizada
como uma medida de desempenho em empresas descentralizadas.
Seguindo linha semelhante, Garvin (1984 apud SOUZA e VOSS, 2002) adverte que
há duas rotas para que a qualidade contribua com o desempenho da organização, a
qualidade interna de processos e a qualidade e desempenho do produto. A qualidade
de processos, que significa menos defeitos, sobras e retrabalho, resulta em melhoria
no desempenho operacional, custos mais reduzidos, processos mais confiáveis, que
levam a desempenho melhorado. A qualidade de produto, que tem a ver com o
desempenho comparativo no mercado, leva ao aumento nas vendas, na participação de
mercado, a menor elasticidade de demanda e a preços maiores. O aumento na
participação de mercado pode melhorar o desempenho de uma empresa direta ou
indiretamente, com economias de experiência e outros ganhos em rentabilidade.
Demanda menos elástica e preços mais altos podem levar diretamente a um
desempenho melhorado. Desempenho melhor do produto pode levar a custos de
garantia e menores dívidas, também melhorando o desempenho do produto (Figura
3.2).
Souza e Voss (2002) sugerem, ainda, que o impacto da Gestão da Qualidade sobre o
desempenho operacional – processos internos – é significativo, enquanto que sobre o
desempenho do negócio – desempenho geral – não o é. De acordo com as evidências
empíricas utilizadas por esses autores, foi possível relacionar o uso de práticas de
gestão da qualidade a melhorias no desempenho operacional de empresas, mas a
relação entre o uso de tais práticas sobre o desempenho geral de organizações não foi
suficientemente documentado.
94
Souza e Voss (op.cit.) apresentam duas possíveis causas para essa fraqueza. É
provável que as pesquisas realizadas no sentido de associar GQT ao desempenho
organizacional não tenham utilizado metodologias adequadas para captar essa
associação. Ou então não tem sido possível isolar a influência da utilização de prática
de GQT de outras influências ambientais e contextuais, como o tamanho do mercado,
o tipo de concorrência existente e outras.
Souza e Voss (2002) indicam também a diferenciação de aspectos das práticas de
qualidade em dois grupos: aspectos centrais, ou núcleo (core aspects) da gestão da
qualidade, representados pelos métodos e técnicas utilizados (aspectos mecanicistas
ou técnicos), e aspectos estruturais, ou infra-estruturais, representados pelos aspectos
sócio-comportamentais da GQT, não mecanicistas. Dada essa divisão, quais seriam as
origens dos ganhos de desempenho resultantes da adoção de um ou de ambos os
aspectos da gestão da qualidade total? Supostamente, os aspectos centrais seriam mais
facilmente copiados por concorrentes, o que diminuiria sua capacidade de oferecer e
sustentar vantagem competitiva.
95
Figura 3.4: O impacto do desempenho da qualidade no desempenho operacional
do negócio
Rota da
Produção
Qualidade de
Processos Internos
(variabilidade de
processo antes da
inspeção final)
Performance
Operacional
(Custos, entrega;
exclui a qualidade)
Prática de
Administração
da Qualidade
Desempenho
Empresarial
(financeiro)
Desempenho da Qualidade do Produto
(após a inspeção final)
- Conformidade
- Qualidade do
- Desempenho
serviço
- Características
- Estética
- Confiabilidade
- Outras dimensões
- Durabilidade
relevantes
Rota do
Mercado
Fonte: Garvin (1984 apud SOUZA e VOSS, 2002, p.96).
Por outro lado, os aspectos infra-estruturais seriam mais complexos, associando-se ao
repertório comportamental dos funcionários das organizações, e seriam mais difíceis
de serem imitados, sendo, portanto, a fonte principal de vantagem de uma organização
sobre suas concorrentes. Essa linha de raciocínio não tem sido encontrada
tradicionalmente nos estudos sobre a adoção de GQT e desempenho organizacional.
Para implementar a qualidade, reduzir custos e potencialmente
melhorar a qualidade, as empresas devem realizar investimentos
que são amplamente ‘sunk’... Com as novas tecnologias de
qualidade, os preços e os custos médios reduzem e a qualidade
aumenta... Quando todas as empresas rapidamente adotam
tecnologias de qualidade, o retorno sobre tais investimentos é
96
normal, ou seja, tendem a apresentar um valor presente líquido
igual a zero. (LEDERER e RHEE 1995, p.355)
Destaca-se aqui a percepção de que, caso uma prática inovadora seja extensivamente
difundida em todo um setor da economia, os benefícios organizacionais são
neutralizados, uma vez que as concorrentes também se beneficiam.
Por outro lado, caso uma organização relute em adotar uma prática inovadora que
esteja sendo difundida extensivamente no setor em que atua, essa organização gozará
de desvantagens competitivas, podendo tornar-se inviável perante seus concorrentes.
O oposto também pode ser verdadeiro, ou seja, caso uma organização adote uma
prática inovadora com exclusividade em seu setor, poderá desfrutar de vantagens
comparativas que a colocarão em uma posição superior à de seus concorrentes.
Ademais, se uma empresa compete com outras que são lentas em adotar tecnologias
relacionadas à qualidade, ela pode obter lucros acima do normal. Uma empresa que
adota novas tecnologias de qualidade mais rápido do que seus concorrentes investe
mais em seus programas de qualidade e apresenta maior qualidade em seus produtos.
Empresas que não adotam tecnologias relacionadas com a qualidade são forçadas a
abandonar o mercado (LEDERER e RHEE 1995, p.355).
•
GQT, Ritmo de Adoção e Aprendizagem
Souza e Voss (2002) ressaltam a necessidade de uma compreensão mais sólida acerca
dos efeitos da GQ sobre o desempenho, utilizando-se de modelos mais refinados, que
incluam
todas
as
variáveis
e
relacionamentos
relevantes,
investigando
relacionamentos em diferentes contextos, aprofundando-se na interação entre aspectos
do núcleo e aspectos de infra-estrutura, bem como na relação entre o uso de práticas
de GQT e outras práticas inovadoras, e, por último, investigando os mecanismos e os
97
intervalos de tempo pelos quais a GQT afeta o desempenho. Isso poderia ser
conseguido através da condução de pesquisas, baseadas em teorias mais consistentes,
que explorassem o caráter contingencial da adoção da GQT e que auxiliariam os
administradores a ajustar o método a condições existentes.
Conforme já foi visto, a metodologia de GQT é bastante ampla, e permite infinitas
interpretações e caminhos de implementação. Consultores e executivos adaptam o
método de acordo com sua experiência, atentando para peculiaridades em que será
utilizado, resultando em padrões bastante distintos de utilização da prática. Diferentes
organizações apresentarão diferentes padrões de desenvolvimento com o uso dessas
ferramentas e isso levará a diferentes tipos de resultados e de aprendizagem como
decorrência. Isso pode ser verdadeiro, inclusive para os diferentes sites de uma mesma
corporação, como no caso de multinacionais e empresas globais ( SOUZA e VOSS,
2002).
Adam (2000) considera que, em empresas multi-site, é esperado que as condições que
envolvem a prática da qualidade sejam diferentes entre os sites, apesar de serem
niveladas pela idiossincrasia geral da organização. Ou seja, existe um certo
nivelamento entre os sites de uma mesma organização, reflexo de políticas emanadas
da alta direção da empresa. As plantas compartilham valores culturais, terminologia
técnica e objetivos em comum. É provável que as plantas desempenhem as mesmas
funções, com o uso das mesmas práticas, fruto de decisões da alta cúpula da empresa,
que se difundem aos níveis médio e operacional. Entretanto, a aplicação desses
métodos depende de uma sintonia fina, de ajustes que serão realizados localmente,
levando a uma variabilidade na forma como são aplicados os mesmos métodos,
produzindo comportamentos (sub-cultura) e resultados diferentes.
98
Além disso, Adam (2000) observa que o ritmo de adoção da metodologia de
qualidade determina, em algum nível, os resultados percebidos. Novamente de acordo
com esse autor, organizações que adotam métodos mais incrementais apresentam
resultados melhores, uma vez que podem explorar melhor a experiência,
proporcionando aprendizado mais consistente e duradouro.
•
GQT como sistema Mecânico ou Orgânico
De acordo com Beyer et al (1997), a implantação da GQT pode se dar tanto por
modelos mecânicos quanto orgânicos. A implantação da GQT pela abordagem
mecânica implica a concentração de todas as decisões referentes à metodologia da
GQT na alta administração de uma organização, que centraliza as decisões e impõe
padrões de comportamento e desempenho de subordinados e gerentes intermediários,
sem necessariamente transferir autoridade e poder para que possam contribuir mais
significativamente com o método.
A utilização de uma abordagem orgânica implica a transferência de maior poder para
os subordinados e gerentes intermediários, permitindo maior nível de iniciativa e auto
controle sobre o desempenho. A abordagem orgânica está mais consistente com as
definições clássicas de gestão da qualidade total, como por exemplo, as apresentadas
por Deming (1990) e Ishikawa (1990), que consideram essencial, em processos de
GQT, a participação ativa de todos os empregados, como forma de estimular a
geração de idéias de melhorias e de tornar o trabalho mais enriquecido e mais
interessante para os funcionários.
99
Quadro 3.4. Sumário dos contrastes na implementação e institucionalização
Mecânica
1. Filosofia
1. Mensuração quantitativa é essencial
2. A implementação é uniforme, requer
aderência a métodos formais
3. A aplicação é pré-determinada, segue o
script
4. Os números são os alvos das ações
5. Única ideologia prescrita
2. Estilos
1. Aprendizagem explícita para implícita
2. Top-down, altamente dirigida
Orgânica
1. Mensuração quantitativa é suficiente
2. A implementação pode variar; envolve
adaptação local
3. A aplicação é emergente; testa seus
ajustes, aplica da forma mais apropriada
4. Os números são instrutivos
5. Agnóstico
1. Aprendizagem implícita para explícita
2. Emergente, com compromisso da alta
administração
3. Campeão - temido
3. Campeão - admirado
4. Campeão – força dominante, visível
4. Campeão permanece nos bastidores
5. O campeão fez todo o treinamento
5. O campeão transferiu o treinamento para
outra pessoa
6. Nunca foi difundida para os níveis 6. Difundida para níveis inferiores
inferiores
7. Falta de confiança; empregados percebem 7. Muita confiança na alta administração
a administração como não completamente
confiável
8. Equipes estruturadas formalmente
8. As equipes se desenvolvem conforme
necessário
9. O campeão possui um grande ego, 9. O campeão se afasta, empodera
ditatorial
10. Aplica o único método
10. Experimentam aquilo que funciona
11. Empoderamento restrito, disperso
11. Empoderamento universal
3. Resultados
1. Se o campeão se afasta, o programa 1. Algumas vezes o programa é
desaparece. Durante a implementação, o negligenciado, mas os princípios são tão
Campeão se afasta (sob pressão); o futuro do incrustados nos processos de trabalhos que
programa torna-se incerto
jamais serão abandonados
2. Alta rotatividade em quadros gerenciais
2. Baixa rotatividade; muita contratação e
promoção
3. A empresa-mãe se preocupa com a bottom- 3. Stockholders internos acompanham o valor
line (linha de fundo)
das ações
Fonte: BEYEr et al (1997), p. 25
•
Relação da Gestão da Qualidade Total com Outras Práticas Gerenciais
Uma importante sugestão presente no artigo de Souza e Voss (2002) é o estudo da
relação da utilização de GQT com outras práticas gerenciais como o just in time,
benchmarking, empowerment, trabalho em equipe e outras, e o espaço de tempo
necessário
para
que
a
adoção
dessa
metodologia
surta
efeito
100
(implementação/avaliação de resultados). A GQT preconiza, como um dos
mecanismos de melhoria contínua, a participação ampliada dos trabalhadores na
solução de problemas e implementação de melhorias. Sendo assim, o método
incorpora diversas práticas de gestão de pessoas, como gestão participativa,
remuneração pelo desempenho e outras.
Soares e Chamone (1994) apontam a inclusão de inúmeras inovações gerenciais
dentro do grande guarda-chuva metodológico que é a Gestão da Qualidade Total.
Programas desenvolvidos por empresas envolvem, frequentemente, diversas práticas
gerenciais surgidas no limiar da década de 1990: just-in-time e kanban,
benchmarking, gestão por processos, empowerment e equipes autogerenciadas,
qualidade de vida no trabalho, remuneração baseada em resultados, metodologias de
solução de problemas, e até mesmo reengenharia aparecem como complementos à
Gestão da Qualidade Total, além da utilização extensiva de tecnologias da informação
e da utilização de uma metodologia mais tradicional, o planejamento estratégico.
Isso reforça a suposição de que a empresa que tende a utilizar práticas inovadoras
raramente o faz isoladamente, mas em “pacotes” de práticas complementares,
buscando aquilo que presumivelmente trará maiores resultados de acordo com os
objetivos organizacionais.
Em uma abordagem mais voltada para aspectos orgânicos da GQT, Kathuria e Davis
(2000) dedicam-se a estudar a relação entre práticas de gestão de pessoas, mais
especificamente práticas de gestão do relacionamento, como trabalho em equipe,
supporting, mentoring, inspiração e reconhecimento e a adoção de metodologias de
gestão da qualidade. Os resultados indicam que práticas orientadas a relacionamento
parecem desempenhar um importante papel em indústrias cujo ambiente se caracteriza
101
por uma elevada ênfase em qualidade. Essas práticas aparentemente motivam os
trabalhadores a produzir produtos que são precisos, duráveis e confiáveis.
Kathuria e Davis (2000) classificam as práticas de gestão da força de trabalho como
práticas relacionadas ao relacionamento (networking, formação de equipes,
supporting, mentoring, inspiração, reconhecimento e recompensa), liderança
participativa e delegativa (consultoria e delegação) e práticas orientadas para o
trabalho (planejamento, esclarecimento, solução de problemas e informação).
Sugerem que os administradores que percebem uma ênfase elevada na qualidade
tendem a considerar as práticas networking, trabalho em equipes, supporting,
mentoring, inspiração, reconhecimento, consultoria, delegação, planejamento e
informação mais intensamente do que aqueles que percebem uma fraca ênfase em
qualidade; e (2) administradores que percebem uma grande ênfase na qualidade não
tendem a demandar certas práticas como solução de problemas, monitoramento,
esclarecimento e recompensa mais intensamente do que aqueles que percebem uma
menor ênfase na qualidade.
Em outras palavras, quando um administrador enfatiza a produção com qualidade,
tenderá a transferir tarefas e decisões para os grupos de trabalho, que ganham
autonomia para analisar problemas, modificar produtos e processos de trabalho, auto
atribuir tarefas e responsabilidades, planejar mudanças e metas, enfim, as equipes
ganham poder para decidir o que e como fazer para melhorar a qualidade. Ao mesmo
tempo, esse administrador tenderá a abster-se de decisões que podem ser tomadas pela
equipe, adotando, pelo menos, uma postura consultiva (KATHURIA e DAVIS, 2000).
Aparentemente, a produção de produtos que atendam às necessidades dos
consumidores pode ser encorajada com a utilização de práticas que estimulem a
cooperação e o trabalho de equipe, utilizando práticas que gerem entusiasmo nos
102
trabalhadores, pela adoção de uma postura amigável e de consideração e pela oferta
de conselhos e sugestões sobre as carreiras dos funcionários. Esses resultados também
podem ser obtidos com a adoção de posturas gerenciais participativas e delegativas,
transferindo parte do trabalho de planejamento e poder decisório para os
trabalhadores.
Uma das discussões em relação à qualidade, é a questão da maturidade do campo.
Muitos autores sugerem que após mais de três décadas de experiência – pelo menos
para as empresas ocidentais – é possível sugerir que o modismo tenha se esgotado, e
que a gestão da qualidade passa a ser considerada uma técnica já consagrada, cuja
validade como modelo de gestão já tenha sido aprovada por administradores e
gestores. Mas é possível sugerir que não esteja havendo declínio em relação ao uso da
prática, mas sua adoção nas operações rotineiras das empresas está eliminando o
caráter inovativo da mesma, reduzindo seu brilho perante a opinião pública.
Autores que defendem a gestão da qualidade total argumentam que o trade-off entre
qualidade e custo é um mito. Os defensores da GQT argumentam que os líderes na
redução de custos também são líderes em qualidade, e vice-versa. Alguns outros
apontam que após ganhar prêmios de qualidade, algumas organizações não foram
capazes de recuperar os pesados investimentos realizados para a obtenção do prêmio.
(FULLERTON 2003).
3.1.3.2.Reengenharia de Processos
Outra prática que proporcionou grande impacto nas organizações foi a reengenharia
de processos, conforme proposta principalmente por Hammer e Champy (1994). Essa
prática parte do pressuposto de que as organizações estariam sofrendo de ineficiências
103
crônicas graças a utilização de práticas tradicionais obsoletas, que elevam os custos e
reduzem o desempenho da organização e dos produtos. A reengenharia se refere,
segundo esses autores, a um “repensar fundamental e a reestruturação radical dos
processos empresariais que visam alcançar drásticas melhorias em indicadores críticos
e contemporâneos de desempenho, tais como custos, qualidade, atendimento e
velocidade” (HAMMER e CHAMPY, 1994, p.22).
Segundo Hammer e Champy (1994), reengenharia consiste em combinar várias etapas
de um processo de múltiplas versões, que ocorrerá em uma ordem mais natural,
transferindo autoridade para os trabalhadores, realizando o trabalho onde ele faz mais
sentido, reduzindo os pontos de contato com os clientes, bem como as verificações e
controles. Dessa forma, a organização pode obter, ao mesmo tempo, os benefícios da
centralização, mantendo um nível de controle onde é mais necessário, e os da
descentralização, transferindo autoridade e poder decisório onde também são
necessários.
A reengenharia se diferencia de reorganizações convencionais por envolver uma
grande ambição, contestação das regras e o uso criativo da tecnologia da informação,
de modo a modificar radicalmente os processos organizacionais. Segundo Shani e
Mitki (1996), o pressuposto básico da reengenharia é o de que a melhoria incremental
de processos existentes não representa uma resposta adequada às necessidades de
empresas da atualidade. Para que haja um rompimento com a baixa produtividade das
indústrias, seria necessária uma mudança de paradigma, uma revolução cognitiva e
conceitual.
A reengenharia requer o desenvolvimento de estruturas e processos em respostas às
necessidades e desejos de consumidores, transformando organizações baseadas em
funções
para
organizações
baseadas
em
processos,
eliminando
barreiras
104
interdepartamentais, achatando a hierarquia organizacional e reduzindo os limites
existentes. O uso da Tecnologia da Informação permite que unidades operacionais
atuem de maneira autônoma, enquanto que a organização como um todo consiga
manter um nível suficiente de controle (descentralização e centralização). Essa
abordagem de mudança radical busca resultados rápidos e intensos, de modo que
organizações com problemas de desempenho possam melhorar seus custos, qualidade
e velocidade.
Sancovschi (1999) identifica algumas das hipóteses sobre as quais se baseia a
reengenharia de processos. Em relação aos recursos humanos, a reengenharia
considera que as pessoas são educadas e capazes de assumir responsabilidades,
prezam por sua autonomia e esperam poder influenciar na forma como os negócios
são conduzidos. Em relação à organização, a prática gerencial de reengenharia
considera que o escopo da análise do trabalho deve mudar de departamentos
funcionais para equipes de processo, enquanto os serviços devem mudar de tarefas
simples para trabalhos multidimensionais. O nível de formalização de atividades deve
ser reduzido; a preparação dos funcionários para os serviços deve mudar do
treinamento para a educação; as medidas de desempenho e a remuneração devem
valorizar os resultados em detrimento das atividades. Os critérios de promoção devem
mudar do desempenho para a habilidade; a cultura deve enfatizar que todos os
serviços são destinados a atender a um único destinatário, o cliente, interno ou
externo; os gerentes devem mudar de supervisores para instrutores; o número de
níveis hierárquicos deve ser reduzido; e os executivos devem ser líderes e não
controladores de resultado. A tecnologia da informação é a capacitadora dos
processos de mudança, pois viabiliza projetos de trabalho mais ágeis, menos onerosos
e mais eficazes, que respeitam as hipóteses anteriores.
105
Sancovschi (1999) ressalta que uma das fraquezas da reengenharia é o fato de que, na
busca obsessiva pela agilidade e competitividade, projetos de reengenharia podem
levar a uma perigosa perda de controle contábil e financeiro, que pode custar mais
caro do que os ganhos obtidos. Como resultado, a decisão de adoção de reengenharia
seria resultante de uma escolha entre oportunidade/risco e segurança/controle.
A reengenharia de processos – processo otimista, progressista e liberal
(SANCOVSCHI 1999) – pode ser interpretada ainda como uma busca pela redução
nos tempos de ciclos operacionais, de modo a aumentar a quantidade de “giros” de
tais processos em determinados períodos. De certa forma, os objetivos são os mesmos
do just in time. Entretanto, os caminhos selecionados para o alcance desses objetivos
são claramente distintos. Enquanto o JIT busca a redução do tempo de ciclo com o
foco no processo produtivo, apoiando-se extensivamente na colaboração dos
funcionários para obter ganhos incrementais e contínuos de produtividade, a
reengenharia baseia-se em quaisquer processos organizacionais relevantes e implanta
a mudança de maneira radical, “one-shot”, sem que haja a participação extensiva dos
funcionários, mas somente com a participação de poucos membros de equipes multifuncionais.
Zhang e Cao (2002) comparam os benefícios da reengenharia com os da melhoria
contínua, ressaltando as vantagens da primeira. Enquanto a primeira se refere a uma
mudança abrupta, com efeitos imediatos e profundos, envolvendo poucos
participantes, requerendo elevado investimento inicial e reduzido investimento de
manutenção, orientada para a tecnologia e as pessoas, com foco nos processos e nos
lucros, a segunda se refere a uma mudança gradual, constante, com efeitos mais sutis,
envolvendo de poucas pessoas a todos na organização, com baixo investimento
inicial, orientada para as pessoas e com foco nos processos.
106
Aqueles autores ressaltam que a reengenharia pode diferir em escopo (mudança
incremental
versus
radical4),
profundidade
(mudanças
procedurais
versus
organizacionais) assim como em extensão (intrafuncional, interfuncional e
interorganizacional), mas nenhuma dimensão organizacional (estratégia, estrutura,
processos, tecnologia ou cultura) pode ser modificada de maneira isolada. Cada um
desses elementos deve estar associado aos outros, potencializando uma cadeia de
valor e o foco no processo dos negócios. Sugerem, ainda, que a reengenharia deve ser
combinada com a terceirização de parte de todas as operações que não são centrais
para sua atividade, de modo a manter seu foco absolutamente restrito ao seu core
business.
A adoção e difusão dessa prática causaram um impacto em organizações do mundo
todo, sendo responsável por ondas de enxugamento em grandes organizações, uma
vez que a tecnologia substituía o ser humano na realização de tarefas, e os novos
processos desenvolvidos pelas organizações dependiam menos de mão-de-obra do que
os anteriores.
Ao comparar reengenharia com GQT, Wood Jr. e Urdan (1994) propõem uma
integração entre ambas, de acordo com a sugestão de Davenport (1993). Segundo essa
proposta, a organização adotante de ambos os modelos poderia se beneficiar
duplamente, capitalizando benefícios tanto da mudança incremental quanto da
mudança radical. A reengenharia contribuiria com uma maior orientação para
resultados, por apresentar maior apoio da alta gerência e por permitir mudanças
radicais. A gestão da qualidade total contribuiria para o desenvolvimento de
4
As referências à reengenharia normalmente a tratam como uma metodologia de intervenção radical,
grandes incrementos no desempenho do processo re-estruturado. Pode-se depreender que Zhang e Cao
(2002) interpretem diferentes níveis de intensidade e impactos em processos de reengenharia, ou seja,
reengenharias podem ser “mais” ou “menos” radicais, comparativamente
107
conhecimentos em análise e medição de processos, permitindo a aquisição de maior
estabilidade após as mudanças radicas da reengenharia.
Já de acordo com Shani e Mitki (1996), gestão da qualidade total e reengenharia
apresentam algumas similaridades intrigantes: todas requerem uma decisão estratégica
que envolve grande comprometimento de recursos financeiros e humanos, focam
todo o sistema organizacional, melhoria e consumidores, envolvem um significativo
aprendizado organizacional e exigem uma transformação ou modificação da cultura
organizacional.
Apesar dessas similaridades, ainda de acordo com Shani e Mitki (1996), gestão da
qualidade e reengenharia apresentam algumas diferenças: a reengenharia busca
mudanças radicais de processos centrais, enquanto a gestão da qualidade total busca
melhoria contínua da qualidade de produtos, processos e serviços. Processos de
reengenharia seguem um esquema de fases indutivas, enquanto a gestão da qualidade
total segue um esquema dedutivo.
Ademais, cada uma das orientações incorpora o subsistema tecnológico de maneira
diferente. A reengenharia é baseada na implementação de nova tecnologia, em
especial na tecnologia da informação (alguns autores sugerem que a TI é o centro das
mudanças de reengenharia). A gestão da qualidade total se concentra em melhorias de
processos em geral.
Também em relação aos resultados desejados, as práticas se diferenciam. Enquanto os
processos de gestão da qualidade total normalmente visam melhoria contínua, de
longo prazo, a reengenharia visa obter resultados radicais rapidamente. Por último, a
qualidade total não requer grandes mudanças na estrutura organizacional, o oposto da
reengenharia.
108
Após alguns anos de sua principal onda de difusão, atualmente a reengenharia é
considerada por muitos como um modismo que já passou, cujos efeitos foram
devastadores em alguns setores e algumas organizações, em especial sobre as pessoas
e seus empregos. Entretanto, considera-se que a reengenharia é uma prática de
intervenção organizacional, que ainda pode ter uma aplicabilidade real e atual, mas
deve ser utilizada com cautela, de modo a reduzir seus efeitos negativos sobre as
organizações adotantes (LOPES e TORRES, 1995).
3.1.3.3.Terceirização e Outsourcing
É possível associar a origem do movimento de terceirização ao surgimento dos
movimentos de gestão da qualidade total e do just in time. O movimento de
terceirização,
também
denominado
desintegração,
desconcentração
vertical,
desverticalização ou subcontratação, acentua a percepção de que têm surgido novos
padrões de relações entre organizações parceiras. Sua idéia central é a transferência de
atividades produtivas para contratadas, fornecedores de peças, componentes e
serviços, mas podendo incluir o desenvolvimento cooperativo de novos projetos e
produtos, aperfeiçoamento dos já existentes, utilização em comum de laboratórios,
pessoal, equipamentos para testes, podendo até mesmo ocorrer financiamento por
parte da contratante para as contratadas (AMATO NETO, 1995). Basicamente, a
terceirização se refere a uma decisão de produzir internamente (make) ou adquirir
externamente (buy) as matérias primas, insumos e componentes necessários.
Segundo Rezende (1997), a terceirização é uma contraposição à integração (vertical e
horizontal), conforme proposto pelo fordismo. Pela estratégia de integração, uma
organização incorpora atividades que, de outra forma, seriam responsabilidade de
109
outras parceiras de negócio, desde algumas matérias primas, distribuição, venda e
entrega, controlando grande parte da cadeia de suprimentos. Essa estratégia pode
associar-se a diversas vantagens como a garantia de suprimento e escoamento de sua
produção, custos mais reduzidos, apropriação do lucro de intermediários, proximidade
com o cliente, aceleração de mudanças tecnológicas e sinergias.
Colins et al (1997) apresentam o conceito de consórcios modulares como uma
evolução do just in time, acrescido de uma visão mais clara e utilização mais ampla da
gerência da cadeia de suprimentos e da terceirização, como uma evolução das relações
interorganizacionais em busca de maior eficiência e maior competitividade.
Nos consórcios modulares, os fornecedores assumem a responsabilidade de montar o
módulo diretamente na linha de montagem do fabricante. Os trabalhadores de
fabricantes e fornecedores trabalham lado a lado no mesmo site produtivo. Essa nova
forma de relacionamento inclui contratos de fornecimento de longo prazo entre os
fabricantes e um pequeno número de fornecedores de primeira linha, os quais
assumem a gerência do relacionamento com outros fornecedores de segunda e terceira
linha da cadeia de suprimento, enquanto que o fabricante assume a responsabilidade
pela coordenação da planta e pelos testes finais de produtos.
De certa forma, consórcios modulares podem ser interpretados como um tipo de
terceirização ampliada, na qual os papéis dos fornecedores aumentam mais ainda,
incluindo a gerência do relacionamento com fornecedores de segunda e terceira linha,
design de componentes e peças e co-investimento. Isso afasta a noção de que
terceirização deve ser uma forma de eliminar da empresa as preocupações e os custos
com atividades que não agregam valor aos produtos, uma vez que as atividades
terceirizadas por de consórcios modulares são exatamente aquelas associadas ao core
business da empresa: projetar e montar produtos (COLINS et al 1997). Seja como for,
110
os consórcios modulares representam uma importante transformação na relação
fabricante-fornecedor, cuja eficácia ainda está em processo de comprovação.
De acordo com Wood Jr. e Zuffo (1998), a sobrevivência, em um contexto de
permanente desequilíbrio, torna-se função da capacidade de interagir associativamente
com fornecedores, clientes e concorrentes. Surgem, assim, as redes organizacionais,
formadas com o objetivo de reduzir incertezas e riscos, organizando atividades
econômicas por meio de coordenação e coordenação entre as empresas. A adoção de
estratégias de parceria com fornecedores atua, no front interno, em uma série de
esforços por processos mais eficientes e pela adoção de sistemas mais modernos de
gestão, e no front externo, multiplicam-se fusões, aquisições, terceirizações e alianças
estratégicas. Sendo assim, a busca pela competitividade relaciona-se cada vez mais
com a busca do “ótimo sistêmico”, dentro e fora das fronteiras da empresa.
Já Bronzo (2004) ressalta que, em relações de parceria, típicas da terceirização
ocorrida em consórcios modulares, o conteúdo das transações tende a ser mais
complexo, e os meios utilizados para a troca de informações e para a comunicação
bilateral entre os agentes são mais articulados, ao mesmo tempo em que os contratos
tendem a ser mais flexíveis ou a apresentar um nível menor de especificações, o que
ocorre, sobretudo, quando o objeto da transação envolve conteúdos complexos. As
relações perenes entre compradores e fornecedores possuem um potencial de reduzir
os controles e as taxas de risco existentes nas transações, reduzindo a possibilidade de
comportamentos oportunistas entre os parceiros. Nesses casos,
[...]transações recorrentes com um número mais restrito de
fornecedores preferenciais teriam o potencial de reduzir os custos e
o risco de comportamentos oportunistas entre os agentes, uma vez
que, quanto mais significativos são os volumes das trocas e as
expectativas de vigência dos contratos, teoricamente são maiores a
rentabilidade e a relevância do negócio para as duas partes. As
economias de escala nas relações de suprimento fazem com que as
empresas consigam trabalhar com um conjunto mais previsível de
informações sobre produtos e mercados com seus fornecedores, o
111
que pode gerar um efeito sensível na redução dos custos ex ante e
ex post dos contratos. (BRONZO, 2004, p.67)
Bronzo (2004) ainda sugere que o maior compartilhamento de informações
estratégicas e a melhoria da confiabilidade e da robustez do fluxo informacional com
fornecedores e clientes podem tornar menores as assimetrias de informação entre os
agentes, definindo uma vantagem competitiva fundamental em várias frentes, como
nos processos de inovação e na coordenação logística. Com o passar do tempo, e com
a amortização dos primeiros investimentos e o bom histórico do relacionamento, o
clima de confiança entre as partes pode efetivamente crescer, favorecendo a trajetória
de redução dos custos de transação enquanto, simultaneamente, há a impulsão de
economias de escala e aprendizagem entre as empresas.
Amiti e Wei (2004) enfatizam a escassez de atenção acadêmica em relação à
terceirização internacional de serviços, ao contrário da terceirização de materiais e
produtos. Essas autoras trazem para o debate as conseqüências da terceirização,
especialmente a terceirização internacional, sobre o nível de empregos no setor de
serviços. Segundo as últimas autoras, existe uma preocupação crescente com os
impactos negativos da terceirização no setor de serviços, em relação à redução de seu
nível de emprego. Entretanto, a análise de dados internacionais realizada por essas
autoras sugere que a terceirização em países desenvolvidos não está associada à
redução do nível de emprego. Pelo contrário, os países desenvolvidos geralmente são
os maiores exportadores de serviços.
Rezende (1997) ressalta que a terceirização por parte de uma empresa pode implicar o
aumento da integração por parte de seus parceiros de negócio. Quando uma
montadora de veículos resolve terceirizar parte de suas atividades para seus
fornecedores, como a montagem de subcomponentes, estes são forçados a instalar
112
parte de suas operações no site do cliente, aumentado a complexidade de suas
operações e consequentemente seu nível de integração vertical. Alerta para a confusão
conceitual existente entre terceirização e desintegração vertical. Terceirização só pode
ser considerada sinônimo de desintegração quando for associada a atividades
produtivas, ligadas à cadeia de suprimento. Quando for realizada no âmbito de
atividades de apoio, terceirização ganha uma conotação de enxugamento (downsizing
ou rightsizing) ou desburocratização.
Dentre as dificuldades para a adoção da terceirização, Rezende (1997) destaca a
dificuldade de estabelecer parcerias, a dependência do fornecedor decorrente da
terceirização, a dificuldade de gerenciar os contratados, a possibilidade de engendrar
novo concorrente como decorrência da transferência de tecnologia resultante da
terceirização.
Provavelmente, uma das áreas que melhor tem convivido com a terceirização é a da
tecnologia da informação. Muitas organizações, após o desenvolvimento de seus
sistemas de informação, deparam-se com departamentos de tecnologia ociosos. Tendo
os sistemas de informação sido desenvolvidos e implantados, o trabalho de
manutenção não ocupa a totalidade da equipe de desenvolvimento, e percebe-se, desse
ponto em diante, que há excesso de pessoal. A solução encontrada para esse
problema, de maneira geral, tem sido a terceirização dessas atividades, conforme
apresentado em Leite (1997a; 1997b).
A terceirização da informática difere da terceirização de atividades de apoio, como
limpeza, segurança e distribuição, uma vez que seus principais objetivos não estão
somente relacionados à redução de custos e que ela tende a assumir um caráter mais
estratégico, dada à importância da tecnologia da informação como elemento
competitivo (LEITE, 1997b). Neste caso, os riscos são maiores e os custos assumem
113
um papel secundário. A relação entre contratante e fornecedor absorve uma delicada
tensão entre prestadores e usuários de serviço, na qual parece haver uma insatisfação
constante com os papéis desempenhados por ambos. A abrangência das atividades de
informática e o ritmo de introdução de inovações impõem uma grande pressão,
estimulando um conflito de interesses e competição entre parceiros de negócios.
3.1.3.4. Just in Time
A lógica básica do just in time é a de que é necessário que uma fábrica reaja
adequadamente a flutuações na demanda dos produtos por ela oferecidos. Nesse caso,
as máquinas continuam operando próximas de sua capacidade máxima, sem que seja
necessário estocar grandes quantidades de matérias primas, componentes, peças em
fabricação e produtos acabados. A taxa de operação fica associada aos pedidos, de
forma que, caso os pedidos sejam suspendidos, as máquinas e a produção possam ser
desligadas, sem que haja um acréscimo significativo nos custos de produção e
estoque.
O conceito de Just in Time (JIT) se confunde com os conceitos de gestão da qualidade
total, modelo japonês de fabricação e modelo toyotista de fabricação, além do
conceito de kanban (SHIMOKAWA, 1993, PROFETA, 2003). Conforme já foi
acentuado anteriormente, todas essas nomenclaturas referem-se a um único modelo,
que combina vários elementos em comum. Para Profeta (2003, p 17), just in time se
refere a uma “filosofia de gestão da produção baseada na redução de perdas pela
aplicação de técnicas voltadas à melhoria da qualidade/produtividade visando alcançar
a excelência na manufatura”.
Segundo Cua et al (2001), just in time é um programa de produção com o objetivo
primário de reduzir continuamente, até a eliminação completa, todas as formas de
114
desperdício na produção. Esses autores sugerem duas grandes formas de desperdício
que podem ser reduzidas pela utilização do JIT – estoque de mercadorias em
fabricação e atrasos desnecessários no tempo de fluxo. Essas formas de desperdício
podem ser solucionadas com a redução do tempo de setup e com o sistema de
produção baseado na demanda. Essas práticas, por sua vez, requerem que os
trabalhadores possuam habilidades ampliadas e sejam treinados para desenvolver as
múltiplas tarefas requeridas pelos esforços de melhorias. Para garantir o apoio ao just
in time, é necessário que a administração esteja comprometida com o programa e com
o desenvolvimento dos trabalhadores.
Em síntese, Just in Time é um sistema de produção que permite a fabricação de lotes
flexíveis de produtos, em termos de quantidade e diversidade, de modo a adequar a
produção em função de modificações na composição da demanda para um produto ou
linha de produtos. A lógica central do JIT é garantir que todas as seções de uma
fábrica e todas as etapas de produção fabriquem os produtos necessários no momento
e nas quantidades certas, de modo a somente atender à demanda real, buscando
eliminar qualquer estoque em grande escala.
O primeiro elemento do método just in time, ainda segundo Profeta (2003), é a busca
da eliminação de paradas do processamento industrial, tanto dentro de processos
isolados, quanto entre processos interdependentes. Para tanto, torna-se necessário
transferir aos trabalhadores as decisões operacionais imprescindíveis para gerar
melhorias operacionais, transferindo-lhes toda a informação, em especial a
informação sobre o andamento da produção. Isso foi realizado através da criação do
sistema kanban, segundo o qual o andamento da produção é coordenado com a
fixação de cartões em toda a fábrica, que indicam o que e quanto está sendo produzido
115
e os materiais e componentes necessários para a produção. Ao mesmo tempo, foi
desenvolvida uma nova mentalidade em relação ao andamento da fabricação.
Foram criados padrões renovados de fabricação, eliminando a noção de que é
necessário ou aceitável estocar produtos em grandes quantidades durante o processo
produtivo. O processo produtivo também foi modificado, sendo adotado um novo
layout de fábrica, que permite maior mobilidade e flexibilidade dos trabalhadores,
estimulando e explorando sua mulifuncionalidade. Os trabalhadores passam a ser
responsáveis por mais de uma tarefa, operando mais de uma máquina
simultaneamente.
Segundo Arnold e Bernard (1989), para que a implementação de just in time seja
completa, é necessária a coordenação de fluxos de materiais de acordo com os
requisitos reais do sistema de produção. A cadeia logística deve ser ajustada para
atender as demandas dos vários estágios de produção, de acordo com os intervalos
requeridos. Isso pode estimular o abandono de estratégias tradicionais de procurement
em favor de uma concentração em fornecedores exclusivos, especialmente para
aqueles produtos classificados como A ou B (aproximadamente 15% dos materiais
utilizados, que representam até 80% dos custos com materiais).
Dentre os elementos mais comumente citados pela bibliografia como requisitos para a
implantação bem sucedida da prática gerencial em foco, estão a redução do tempo de
setup, o layout do equipamento, a redução dos lotes de fabricação, a carga uniforme
da fábrica, o sistema de fabricação “puxada”, o fornecimento de produtos JIT, a
autonomação, a qualidade, o zero defeito, a simplicidade de design, a manutenção
preventiva,
o
envolvimento
(MCLACHLIN, 1997).
dos
empregados
e
sua
multifuncionalidade
116
Assim como em relação ao conceito de Gestão da Qualidade Total, percebe-se, em
relação ao conceito de just in time, uma certa confusão, em especial sobre o fato de
ser efetivamente uma prática ou, de maneira mais ampla, uma filosofia gerencial,
apoiada por práticas diversas. Ao ser investigado o conceito na literatura de negócios,
encontram-se elementos como melhoria contínua (kaisen), redução do desperdício,
aumento da qualidade, utilização de CCQs, manutenção preventiva, células de
produção, controle estatístico de processo e outros, típicos da gestão da qualidade
total, que também inclui, por sua vez, a gestão just in time de estoques (PROFETA
2003).
Segundo Arnold e Bernard (1989), o principal fator que estimula a adoção da prática
gerencial just in time é o contínuo aumento na quantidade de produtos disponíveis aos
consumidores industriais e individuais, devido a mudanças na estrutura da demanda,
com os consumidores se tornando cada vez mais diferenciados e individualizados,
exigindo maior conveniência dos vendedores, devido ao aumento da competição
internacional, acompanhada por maior embate com base no preço, especialmente em
mercados saturados, e às reduções no tempo de vida útil dos produtos.
•
Resultados Obtidos Através do JIT (JIT e ROA)
Os resultados ou benefícios decorrentes do uso de técnicas JIT, conforme a literatura
revisada nesta tese, são a redução de estoques e áreas de estocagem, o aumento da
qualidade, a redução do lead time, a redução de perdas e retrabalho, a redução de
custos, do lote de fabricação, da movimentação de materiais, a redução do tempo de
parada de máquinas e o conseqüente aumento na produtividade. A utilização de JIT
deve proporcionar melhorias em competitividade e desempenho de uma organização,
117
com um fluxo mais equilibrado de produção em lotes reduzidos e com a integração da
estabilidade do calendário, e devem levar, direta ou indiretamente, a ganhos
financeiros.
Na teoria, o JIT melhora a rentabilidade devido ao seu impacto nos dois componentes
independentes do retorno sobre o ativo (ROA), o giro do ativo, que mede o retorno
das vendas sobre o investimento, e o retorno sobre as vendas, que mede o lucro em
relação às vendas. O just in time supostamente melhora o retorno sobre os ativos de
várias maneiras. Primeira: o giro sobre o ativo deve melhorar, uma vez que o JIT
libera ativos e capitais. A redução do ativo aumento o ROA. Segunda: estoques
reduzidos também reduzem o ativo, melhorando o giro sobre os ativos no curto prazo.
Terceira: a redução de estoques reguladores motiva a eliminação de atividades que
não acrescentam valor e que exercem um efeito negativo sobre a margem de lucro,
como o retrabalho e faltas de estoque.
Entretanto, esses efeitos não são automáticos e podem até ser negativos no curto
prazo, devido à necessidade de investimentos de implementação, como em
treinamentos, aquisição de equipamentos e outros. É provável que, no momento da
implementação da prática, surjam dificuldades que representem custos adicionais que
serão recuperados após sua plena implementação.
Muito além da noção reduzida de redução de estoque e de tamanho ótimo de lote, JIT
é a gênese da competição baseada em tempo, que oferece flexibilidade e rapidez,
essenciais para a competição em nível global. Para que potencialize os resultados, o
JIT deve ser aplicado como uma filosofia organizacional alinhada aos fatores críticos
de sucesso de uma organização (FULLERTON, 2003).
Arnold e Bernard (1989) ressaltam a importância do JIT como uma estratégia de
flexibilização da produção, dada a capacidade oferecida pelo método de modificar
118
rapidamente a linha de produção (setup rápido), permitindo a produção de lotes
pequenos em ciclos reduzidos.
•
JIT e distribuição de poder entre compradores e fornecedores
Apesar da literatura comumente ressaltar os benefícios obtidos pelos adotantes do JIT,
com a redução de desperdício (produção, materiais, trabalho, tempo, energia, recursos
financeiros utilizados e imobilizados em excesso), Arnold e Bernard (1989) destacam
que pouca atenção tem sido destinada à investigação dos benefícios obtidos pelos
consumidores finais.
A adoção de técnicas JIT por um produtor tenderá a beneficiar seus fornecedores da
mesma maneira que o comprador? Isso não está claro, de acordo com Arnold e
Bernard (1989). Mas esses autores sugerem que sim, desde que as disposições de
compra estejam padronizadas de tal forma que os custos fixos de pedidos sejam
desprezíveis Mas é possível que haja conflito de interesses.
Segundo os autores antes citados, o fornecedor se beneficiará caso surjam relações
contratuais de longo prazo com o comprador, aumentando as quantidades a ele
fornecidas, o que, por sua vez, proporcionará efeitos de escala, permitindo maior
coordenação por parte do fornecedor. O uso de JIT também influenciará a estrutura
logística a ser utilizada na relação comprador/fornecedor. O processo é caracterizado
por maior freqüência e menor volume que as rotinas tradicionais de logística, que
podem ser acompanhadas ou não de terceirização de atividades, desde o transporte,
armazenamento e coleta de pedidos.
Dong et al (2001) propõem uma análise dos resultados da adoção do JIT por parte de
compradores e vendedores, ressaltando que, muitas vezes, a adoção do método por
119
compradores implica transferência do estoque para os vendedores, conseqüentemente
resultando em ganhos somente pelo primeiro grupo de empresas.
Como forma de solucionar essa tensão, Dong et al (2001) sugerem a diferenciação
entre fabricação JIT e compras JIT. Consideram que fabricação just in time inclui
técnicas de fabricação japonesas derivadas do sistema kanban, como lotes reduzidos
de fabricação, lead times reduzidos e programas de melhoria da qualidade, requeridos
para a implementação de processos de manufatura flexível. Compras just in time, por
outro lado, se referem ao recebimento de pequenos lotes que facilitam o controle de
estoque e a redução do nível de matéria prima e materiais brutos. O conceito de
compras just in time inclui (DONG et al, 2001) a redução no tamanho dos pedidos, a
redução no lead time dos pedidos, medidas de controle de qualidade, incluindo
certificação de fornecedores, programas de manutenção preventiva e inspeção de
qualidade na recepção e o desenvolvimento de procedimentos de avaliação e seleção
de fornecedores.
Para a implantação de fabricação just in time, é necessário melhorar a coordenação da
cadeia de suprimentos, de modo a melhorar o desempenho do sistema de fabricação
como um todo. É essencial, ainda, uma relação bem estabelecida entre fornecedor e
comprador para que uma estratégia just in time seja efetiva. Entretanto, a adoção desse
tipo de estratégica tende a favorecer aos compradores, que poderão reduzir o tamanho
de seu lote de fabricação e, conseqüentemente, o tamanho dos lotes de compra de
matéria primas e componentes. Quanto aos fornecedores, não é claro o resultado
obtido em relação à participação de esquemas do tipo JIT com seus clientes.
Normalmente, os custos dos compradores são reduzidos devido à transferência dos
estoques para os vendedores, causando, nestes, aumentos de custos e redução de
120
economias de escala, devido à redução do tamanho do lote de entrega e ao aumento
no número de entregas necessárias.
•
Implantação de uma estratégia just in time
Segundo Arnold e Bernard (1989), para desenvolver o potencial para produção
flexível, necessária em processos JIT, são necessários investimentos substanciais em
hardware e software, como tecnologia de processamento de informação, sistemas
flexíveis de produção, controle de qualidade automatizado, técnicas de controle e
regulação e facilidades de transporte e armazenamento. Esses investimentos elevam o
nível de intensidade de uso do capital, o que aumenta o risco da adoção dessas
práticas, devido aos riscos associados a custos fixos na teoria administrativa.
Como a implementação de JIT requer uma seleção cuidadosa de fornecedores para
que seja possível atingir aos objetivos de zero defeito, de confiabilidade absoluta nas
entregas e de níveis de custos adequados, os grandes compradores exercerão forte
pressão na estrutura de seus principais fornecedores, envolvendo a prescrição de
utilização de determinado sistema de informação, incluindo funções de IED, e a
transferência de atividades que anteriormente eram desenvolvidas pelos compradores,
como controle de inventário e controle de qualidade. Essa transferência cria um
contrato de longo prazo, entre comprador e vendedor, tácito ou explícito, que inclui
exclusividade de fornecimento, prioridades de entrega, financiamento de atividades do
fornecedor, transferência de tecnologia – inclusive da tecnologia JIT, e de maquinária.
A participação nesses relacionamentos transacionais será crescentemente influenciada
por coordenação interativa, ao invés de competição induzida pelo mercado. Isso
significa que serão criadas barreiras à entrada e à saída de participantes nos mercados.
121
McLachlin (1997) e Fullerton (2003) levantam o argumento de que as empresas
ocidentais tendem a adotar práticas inovadoras, especialmente aquelas surgidas no
Japão (JIT), apenas parcialmente, não obtendo todos os resultados comuns aos
adotantes de tais práticas. Esse autor sugere que as empresas estão adotando
subconjuntos de práticas, e não adotam os elementos centrais do JIT, obtendo
resultados temporários, superficiais e não significativos.
Relacionadas ao sucesso ou ao fracasso das iniciativas de implantação do JIT,
McLachlin (1997) encontra, baseado em revisão de bibliografia, as seguintes
iniciativas: a segurança de emprego, a promoção da responsabilidade dos empregados,
a oferta de treinamentos, a promoção do trabalho em equipe, a utilização de medidas
de desempenho em grupo e a demonstração de compromisso por parte da
administração. Estas seis iniciativas, por sua vez, levariam ao envolvimento dos
empregados, o que também contribuiria para o sucesso na adoção do JIT.
4. O estado do campo sobre práticas inovadoras de gestão
Em que pese a grande demanda e a abundância de publicações que se destinam a
discutir cada prática individualmente, ainda são poucos os trabalhos que se voltam
para a pesquisa do movimento de adoção de conjuntos de práticas inovadoras de um
modo geral, que emergiram ao longo do período de crise do taylorismo-fordismo.
Destacam-se, nesse sentido, os trabalhos de Rigby et al (2003), Waterson (1997),
Bolden et al (1997) e Bastos et al (2004). Esses trabalhos vão ser analisados neste
capítulo, juntamente com trabalhos de outros autores que focalizam a adoção de
práticas gerenciais de forma isolada ou desenvolvem estudos de caso sobre empresas
particulares.
4.1. A difusão de práticas de gestão inovadoras no Reino Unido
Bolden et al (1997) enfatizam a necessidade de realização de pesquisas mais
abrangentes, que enfoquem as práticas inovadoras de administração como um todo, e
apresentam resultados de pesquisa em uma tentativa mais compreensiva de análise do
processo de incorporação de novas práticas gerenciais por organizações no Reino
Unido. Nesse sentido, Bolden et al (1997) desenvolvem uma taxonomia de práticas
inovadoras, classificando-as de acordo com suas dimensões básicas, bem como por
suas semelhanças e diferenças (Quadro 4.1).
Esses autores identificaram, inicialmente, 254 práticas de produção e organização que
podem ser consideradas inovadoras sob algum aspecto. Essas práticas foram
agrupadas em 87 clusters de práticas semelhantes, que foram posteriormente
123
reclassificadas em uma matriz, construída com as dimensões “ênfase estratégica” –
que se refere ao foco principal das estratégias diretivas do uso das práticas (foco nos
negócios e foco na organização) – e “domínio da aplicação” – que se refere aos
diferentes estágios do ciclo produtivo (design e produção, inventário e estoque,
organização do trabalho e organização mais ampla da produção).
Segundo Bolden et al (op.cit.), as organizações utilizam práticas inovadoras buscando
basicamente onze metas competitivas: redução nos custos, flexibilidade em design,
flexibilidade em volume, conformidade em qualidade, performance do produto,
velocidade na entrega, confiança na entrega, serviços pós-vendas, publicidade,
distribuição ampla e ampla linha de produtos. Entretanto, os autores decidiram
utilizar, na taxonomia, apenas cinco objetivos principais, distribuindo-os entre as
dimensões “foco em negócios” e “foco em organização”.
A dimensão “foco em negócios” se subdivide de acordo com os objetivos “melhorias
em qualidade”, “redução de custo” e “responsividade aos clientes”, enquanto que a
dimensão “foco em organização” se subdivide nos objetivos “tecnologia melhorada” e
“desenvolvimento de funcionários” (Quadro 4.1).
De acordo com Bolden et al (op.cit.), o desenvolvimento de uma taxonomia como a
proposta por eles traz como benefícios o fornecimento de uma visão mais ampla do
campo da produção, auxiliando na identificação de aspectos comuns e diferenças
sistemáticas entre as práticas e técnicas de produção, identificando técnicas e práticas
sobre as quais alguns pesquisadores podem não estar informados, auxiliando o
trabalho de formação de engenheiros, gerentes e cientistas sociais e, por fim,
orientando novas pesquisas e desenvolvimentos em produção.
124
Quadro 4.1 - Taxonomia de práticas inovadoras em produção e organização
Domínio
Primário de
Aplicação
1. Design e
Produção
Foco em Negócios
A. Melhorias
B. Redução
C. Responsiem Qualidade
de Custo
vidade aos
Clientes
Prototipação
Progresso de
Padrões de
rápida
trabalho
qualidade
Engenharia
reduzido
Controle
Produção Just concorrente
estatístico de
Envolvimento
in time
processo
do consumidor
Mapeamento
Manutenção
no design
de processo
produtiva total
Redução do
Desdobramento Design
lead-time
inteligente
da função da
Manufatura
qualidade (QFD) Re-utilização
À prova de erros Racionalização ágil
de produto
Parcerias na
2.
Inventário e cadeia de
suprimento
estoque
Feedback do
consumidor
Checagem de
conformidades
Previsão dos
requisitos do
consumidor
Manutenção
de níveis de
estoque
3.
Organização
do Trabalho
Organização
flexível do
trabalho
Suporte pósvendas
Manufatura
celular
4.
Organização
mais ampla
da produção
Inventário
reduzido
Singlesourcing
Controle de
inventário just
in time
Previsões
Gestão da
logística
Downsizing
Equipes de
Delayering
melhoria da
Terceirização
qualidade
Responsabilidade Trabalho
do operador pela informal
qualidade
Feedback de
qualidade para os
operadores
Treinamento de
qualidade
Design
ergonômico
Produção
Gestão da
enxuta
qualidade total
Gestão dos
Prêmios de
custos
qualidade
Medidas de
Gurus da
desempenho
qualidade
Produção classe financeiro
Gestão
mundial
baseada no
Benchmarking
tempo
de qualidade
Benchmarking
de custos
Fonte: BOLDEN et al, 1997, p. 1120-1121
Foco em Organização
D. Tecnologia
E. DesenvolviMelhorada
mento de
Funcionários
Planejamento e Rotação de
funções
controle de
Multi-habilidades
processo
Psicométricos
auxiliado por
Avaliações
computador
Treinamento e
Sistemas de
desenvolvimento
produção
Esquemas de
auxiliados por
sugestão
computador
Pesquisas de
Automação
atitude
Design e
Secondments
engenharia
Gestão da
auxiliados por
segurança
computador
Armazenamento Equipe com
responsabilidades
e recuperação
de compras e
automatizada
distribuição
Intercâmbio
eletrônico de
dados
Sistemas de
manufatura
flexível
Tecnologia de
grupo
Trabalho
cooperativo
apoiado por
computador
MRP –
planejamento de
recursos de
produção
Estratégia
Prioridades
tecnológica para
dadas aos
a companhia
clientes
Ferramentas
Pesquisa de
baseadas em
marketing
Pesquisas com computador
Benchmarking
os clientes
Benchmarking de tecnologia
de
responsividade
aos clientes
Reengenharia
de processos
Harmonização
Trabalho baseado
em equipes
Gestão dos
limites
Companhia
explícita
Estratégia de RH
Empowerment
Pagamento
baseado no
desempenho
Mudança cultural
Clima de
aprendizado
Investidores em
pessoas
Benchmarking de
eficácia de
funcionários
125
Waterson et al (1997) são autores de outro trabalho, que se propõe a verificar o nível
de adoção de práticas inovadoras de produção e de administração no Reino Unido.
Utilizando pesquisa do tipo survey, os autores buscaram reunir evidências sobre a
extensão de uso das práticas inovadoras, bem como os motivos de sua introdução e a
eficácia percebida em relação aos objetivos perseguidos pelos adotantes. A pesquisa
desenvolvida por Waterson et al (op.cit.) enfocou a utilização de doze práticas
inovadoras de administração no campo da produção – reengenharia de processos,
parcerias na cadeia de suprimento (supply-chain management), terceirização
(outsourcing), cultura de aprendizagem, empowerment, trabalho baseado em equipes,
manutenção produtiva total (total productive maintenance), engenharia simultânea,
tecnologias integradas baseadas em computador (CIM – computer integrated
manufacturing), células de manufatura, just in time e gestão da qualidade. Os
resultados dessa pesquisa estão sintetizados no Quadro 4.2.
De acordo com a percepção de executivos britânicos da área industrial, as práticas
mais difundidas no Reino Unido foram as parcerias na cadeia de suprimentos, a
gestão da qualidade total, o just in time, o trabalho em equipes e a tecnologia
integrada baseada em computador (CIM). As parcerias na cadeia de suprimentos e o
just in time foram indicadas como as mais voltadas para melhorias em responsividade,
enquanto que a gestão da qualidade total, assim como o trabalho em equipe, foram
associadas exclusivamente a melhorias de qualidade. Todas as práticas pesquisadas
apresentaram elevada propensão à continuidade de uso.
Já as práticas menos difundidas no Reino Unido foram manutenção produtiva total,
células de produção, engenharia simultânea e terceirização. Dessas, a única que
apresentou relação significativa com algum dos objetivos investigados foi a célula de
produção, que foi indicada como prática que contribui para melhorias em qualidade.
126
Apesar de ter sido verificado baixo nível relativo de difusão dessas práticas, observouse certa propensão de continuidade de uso em relação às células de produção, à
engenharia simultânea e à terceirização. Os executivos da indústria britânica
ressaltaram, ainda, o baixo potencial da terceirização no sentido de reduzir custos.
Por último, as práticas que apresentaram nível mediano de difusão foram a
reengenharia de processos, o empowerment e a cultura de aprendizagem. Dentre essas,
a única que contribuiu significativamente para alguns dos resultados investigados foi a
reengenharia de processos, cuja adoção, de acordo com os respondentes, associou-se a
reduções de custos. Ainda dentre esse último grupo de práticas, a única que
apresentou propensão à continuidade de uso foi a cultura de aprendizagem.
Quadro 4.2 – Adoção de Práticas Inovadoras de Administração e Produção no
Reino Unido
Discriminação das dimensões
Resultados
avaliadas
Difusão
Mais difundida: Parcerias na Cadeia de Suprimentos;
Gestão da Qualidade Total; Just in Time; Trabalho em
Equipes; Tecnologia Integrada Baseada em Computador;
Menos difundida: Manutenção Produtiva Total;
Terceirização; Engenharia Simultânea; Células de
Produção;
Ganhos de qualidade
Maior êxito: Gestão da Qualidade Total; Trabalho em
Equipes; Células de Produção;
Menor êxito: Terceirização; Just in Time;
Redução de custos
Maior êxito: Reengenharia de Processos
Menor êxito: Cultura de Aprendizagem; Gestão da
Qualidade Total;
Responsividade
Maior êxito: ; Just in Time; Engenharia Simultânea;
Parcerias na Cadeia de Suprimentos;
Menor êxito: Terceirização; Manutenção Produtiva Total;
Cultura de Aprendizagem;
Perspectivas
Maior crescimento: Cultura de Aprendizagem; Tecnologia
Integrada Baseada em Computador; Empowerment;
Parcerias na Cadeia de Suprimentos; Trabalho em
Equipes; Gestão da Qualidade Total;
Menor crescimento: Terceirização; Células de Produção;
Engenharia Simultânea;
Fonte: elaborado com base em Waterson et al (1997, p.3)
127
A análise dos dados do Quadro 4.2 ressalta, também, que as técnicas mais difundidas
são, simultaneamente, as de maiores perspectivas de crescimento em termos de
utilização, enquanto várias das práticas de menor difusão tenderão a continuar assim.
Ademais, duas das práticas melhores sucedidas em termos de ganhos de qualidade
pertencem também ao conjunto de práticas mais difundidas e de melhores indicações
de crescimento em seus usos.
Chama a atenção, ainda, o fato de que, embora atualmente avaliada como uma das
menos importantes nos quesitos redução de custos e melhoria nas condições de
responsividade das empresas entrevistadas, a prática “cultura de aprendizagem” é uma
das que apresenta melhor tendência ao crescimento de sua adoção, enquanto a prática
“células de manufatura”, conquanto associada a ganhos expressivos em termos de
qualidade, não integra o conjunto de práticas com melhor perspectiva de crescimento
futuro. Pelo contrário, tal prática foi indicada pelo conjunto de empresas entrevistadas
como uma daquelas de menor tendência ao crescimento quanto à sua utilização.
4.2. Difusão de práticas inovadoras no Brasil
Conforme Paulinyi (1993), o desenvolvimento tecnológico brasileiro teve seu início
associado ao movimento de industrialização, após a Segunda Grande Guerra (IIGG).
Após seu início, garante o autor, seu desenvolvimento foi acelerado, exceto por crises
ocorridas nos períodos 1964-1966 e 1981-1983. O governo desempenha um papel
crucial nesse sentido, apresentando, em 1968, o Plano Nacional de Desenvolvimento,
e, em 1973, o Primeiro Plano Básico para Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
Esses planos incluíam fundos subsidiados e incentivos fiscais para expansão e
modernização do parque industrial, ao mesmo tempo em que criaram barreiras para a
128
importação de tecnologia e serviços correlatos, protegendo o mercado para produtos
nacionais que continham inovações domésticas.
Essa
iniciativa trouxe algumas
vantagens para o país, especialmente o
desenvolvimento interno de uma força de trabalho mais qualificada e especializada,
particularmente em algumas áreas estratégicas, como tecnologia da informação e
energia nuclear, incluindo engenheiros e designers de produtos. Ademais, estimulou o
desenvolvimento tecnológico nacional, ao incentivar empresas brasileiras a
desenvolver as tecnologias das quais dependiam para seu bom funcionamento. Alguns
setores são emblemáticos do desenvolvimento tecnológico in-house, como, por
exemplo, o setor de hardware nacional (PAULINYI, 1993; CAMPELO de MELO et
al, 1993).
Entretanto, são notórios os problemas que essa política de substituição de importações
causou ao desenvolvimento tecnológico de outros setores, os quais não representavam
seu foco. As empresas brasileiras que atuavam nesses setores puderam se acomodar e
simplesmente explorar o mercado interno, já que desfrutavam de vantagens por
atuarem em monopólios ou oligopólios internos, ou em mercados onde a competição
não se baseava em tecnologia.
De acordo com Paulinyi (op.cit.), não somente essas organizações deixaram de se
desenvolver tecnologicamente em relação aos seus produtos e serviços, seja por
adquirirem equipamentos de baixa qualidade e produtividade, seja por não
desenvolverem seus produtos o suficiente, mas restrições de importações de
equipamentos
também
isolaram
as
empresas
brasileiras
dos
principais
desenvolvimentos gerenciais que ocorriam no mercado internacional, retardando as
melhorias que seriam amplamente realizadas posteriormente. Essa acomodação trouxe
129
uma crescente insatisfação e desconfiança por parte de diversos segmentos da
sociedade influenciados por essa política.
A Nova Política Industrial começou em julho de 1990, introduzindo modificações na
política de substituição de importações: tarifas menores, a eliminação de barreiras não
tarifárias, a redução da participação do governo na economia e a ênfase em melhorias
de qualidade e produtividade. Como resultado dessa nova política, as empresas
começaram a educar e treinar seu pessoal, desenvolver procedimentos mais severos de
controle de qualidade, desenvolver a capacidade interna de design e engenharia de
produtos e instalar unidades permanentes de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento
(PAULINYI 1993).
Com o foco no cenário industrial brasileiro, Paulinyi (1993) identifica quatro padrões
de inovação, a partir da análise de doze variáveis associadas ao desenvolvimento
tecnológico das organizações: Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), royalties e
assistência técnica domésticos, royalties e assistência técnica estrangeiros, vendas,
importações (excluindo bens de capital), exportações, educação e treinamento, lucros,
incentivos fiscais para a Região Amazônica, incentivos fiscais para a Região
Nordeste, incentivos fiscais em Educação e incentivos fiscais em Aeronáutica.
Essas doze variáveis foram agrupadas, de acordo com a análise fatorial, em três
fatores. O primeiro fator representa um atributo da liderança da empresa, composto
pelas seguintes variáveis: lucros, importações, educação e treinamento, e P&D. O
segundo fator representa o esforço tecnológico da empresa, representado pelas
seguintes variáveis: P&D, exportação e incentivos fiscais. Os dois primeiros fatores
explicam entre 65 e 78% da variância total. O terceiro fator representa a dependência
tecnológica de fontes externas, composto pelas variáveis relacionadas ao pagamento
de royalties doméstica e internacionalmente.
130
Em seguida, considerando os fatores 1 e 2 como sendo os discriminantes em relação a
atividades de P&D, o autor classifica as empresas estudadas entre aquelas que
desempenham P&D e aquelas que não desempenham, em contraste com a
classificação adicional das empresas de acordo com o ambiente em que atuam, o de
empresas mais ou menos ativas. Essa classificação permitiu o desenvolvimento de
uma tipologia de quatro dimensões – líder, dependente, hard working, e novata,
conforme a figura 4.1.
Figura 4.1 - Tipos de Desenvolvimento Tecnológico
Fonte: Paulinyi 1993, p.89
Empresas líderes, segundo a tipologia de Paulinyi (1993), são tipicamente as maiores
empresas (em termos de vendas), que operam em indústrias tecnicamente dinâmicas,
como mineração, eletro-eletrônicos e comunicação, transportes (automotivo e
aeroespacial), utilidades públicas (geração de energia hidroelétrica), serviços
profissionais
(consultoria),
(principalmente aço).
construção
e
engenharia,
drogas
e
metalurgia
131
As empresas desse tipo estão continuamente à frente do desenvolvimento tecnológico
de seus setores, encontrando concorrência tecnológica em seus mercados externos.
Essas empresas possuem interesse em ganhar ou manter a liderança tecnológica no
mercado doméstico. Importam insumos, equipamentos e materiais atualizados, e
desenvolvem soluções proprietárias pela P&D. As inovações incorporadas em seus
equipamentos e materiais importados parecem ser importante fator para a manutenção
dessas empresas em sua fronteira tecnológica. Para essas empresas, o pagamento
explícito de royalties e assistência técnica são de importância marginal.
Empresas hard-working, conforme o mesmo autor, são tipicamente de porte médio em
vendas, que operam em indústrias menos dinâmicas, como metalurgia, transportes,
agricultura, papel e serviços profissionais. A pressão por mudança tecnológica é
originária na agressiva atividade de exportação que essas empresas realizam. Sua
modernização se dá pela P&D, basicamente, apesar de investir menos do que as
líderes. Apesar disso, em alguns casos, os esforços relativos de desenvolvimento e
domínio de tecnologias proprietárias são equivalentes em algumas indústrias.
Empresas dependentes, ainda segundo a tipologia de Paulinyi (1993), são de porte
médio, que operam em indústrias tecnologicamente dinâmicas como mineração,
eletrônica e comunicações, química, maquinário e engenharia e construção. A
demanda por mudança tecnológica se origina do ambiente industrial em que operam.
Seu desenvolvimento se dá com a aquisição de tecnologia não incorporada e serviços
correlatos de fontes externas, preferencialmente as matrizes internacionais, no caso de
subsidiárias.
Empresas novatas, por último, ainda segundo o mesmo autor (Paulinyi 1993), são
pequenas empresas que operam em segmentos dinâmicos da indústria, como
metalurgia, agricultura, papel e serviços profissionais, bem como em setores
132
tradicionais como manufatura de minerais não-metálicos, cópias e impressões,
plásticos, borracha, móveis e couro. Essas empresas adquirem tecnologia e serviços
correlatos ocasionalmente e em pequena escala. Algumas dessas companhias podem
se tornar companhias médias do tipo hard-working no futuro. Entretanto, a aquisição
de know-how e inovações, para a maioria dessas organizações não é suficiente para
quebrar o ciclo vicioso da estagnação, em parte devido à falta de potencial para
absorver os novos inputs tecnológicos, e em parte devido aos elevados custos dessa
aquisição. Essas empresas pagam, em média, cinco vezes mais por contrato do que
suas contrapartidas em outros grupos.
Uma das contribuições secundárias do trabalho de Paulinyi (1993) é a verificação, de
maneira ampla, dos setores da economia onde os investimentos em P&D são mais
elevados do que a média: equipamento automotivo, eletro-eletrônico e equipamentos
de comunicação, química e petroquímica, maquinário, mineração de ferro, metalurgia
do aço, utilidades públicas como geração de energia hidroelétrica, engenharia e
construção (rodovias, barragens e outros grandes projetos ao redor do mundo),
segmentos modernos da agricultura (soja), papel (celulose) e transportes,
especificamente transporte aéreo e rodoviário. Isso pode proporcionar um parâmetro
de avaliação com os setores estudados nesta tese, esperando-se encontrar maior
evolução gerencial em organizações que atuam nesses setores.
A restrição às importações de tecnologia da informação se encerra em outubro de
1992, trazendo às organizações brasileiras do setor de informática uma nova pressão
por competitividade e por sobrevivência, dada a nova concorrência internacional,
mesmo levando em consideração os ainda elevados preços dos equipamentos
importados (CAMPELO de MELO et al, 1993).
133
Tendo como referência esse contexto, o principal objetivo do trabalho desenvolvido
por Campelo de Melo et al (1993) foi identificar as condições que poderiam favorecer
a sobrevivência das empresas brasileiras de eletro-eletrônica face às novas demandas
impostas pela abertura de mercado, aumentando sua competitividade e melhorando o
desempenho das indústrias e do setor como um todo. Tendo em vista essas
perspectivas, Campelo de Melo et al (1993) sugeriram que o setor devesse adotar
práticas inovadoras, como programas abrangentes de qualidade, requeridos para
atingir os novos padrões apresentados pela concorrência internacional. Os autores
avançaram em suas proposições enfatizando que se tornou necessário, como saída
para a crise então iminente, o desenvolvimento de soluções específicas completas para
organizações ou setores – a exemplo dos desenvolvimentos ocorridos em relação à
tecnologia de suporte aos serviços bancários, que buscaram soluções de ponta, mesmo
com a impossibilidade de importar tecnologia mais avançada – e o desenvolvimento
de ações coordenadas entre pequenas e médias empresas de tecnologia, por meio de
alianças estratégicas e esforços colaborativos para aumentar a eficiência do setor, ou
seja, para assegurar sua eficiência conjunta.
O termo eficiência conjunta se refere à eficiência melhorada obtida
por parte de firmas dentro de um setor específico através de ações
colaborativas com investimentos conjuntos em aspectos relevantes
para o desempenho organizacional e tecnológico. O ponto chave é
a obtenção de resultados que não poderiam ser obtidos
individualmente por nenhuma das partes envolvidas... O que é
proposto aqui, em termos de eficiência conjunta, é uma possível
solução para a crescente necessidade de configurações interorganizacionais que favoreçam um desempenho melhorado por um
grupo de organizações, com objetivos complementares, em um
ambiente turbulento. (CAMPELO DE MELO et al, 1993 pp. 374375)
Outro artigo que destaca as mudanças que ocorreram no Brasil no final da década de
1980 e no início da década de 1990 é o de Soares e Chamone (1994). Estes autores se
referem ao caso da Xerox do Brasil, que foi a vencedora do Prêmio Nacional de
134
Qualidade do ano de 1993. O que torna esse exemplo “tão especial”, segundo os seus
autores, é o fato de ser uma subsidiária de uma multinacional que, apesar de estar em
um ambiente protegido por barreiras tecnológicas e comerciais, desenvolve métodos
de controle da qualidade total, com foco na satisfação dos clientes, que passam a ser
considerados referências internacionais.
Aliando tecnologias soft e hard, a filial brasileira da Xerox Corporation consegue
melhorar diversos indicadores de desempenho e satisfação do cliente, como: redução
no número de defeitos, redução do número de chamadas de assistência técnica por
problemas de qualidade, redução do número de serviços incompletos, de parada de
máquinas e do tempo de resposta aos pedidos dos clientes.
A análise demonstra aumento em índices de lucratividade e produtividade, como a
receita por funcionário, a redução do número de fornecedores, o aumento do número
de fornecedores certificados – aqueles que dispensam a inspeção dos produtos na
recepção – e a redução do trabalho em progresso, de forma que são inquestionáveis os
benefícios da utilização de controle da qualidade nas organizações, segundo os
autores do artigo em foco.
Entretanto, a contribuição do trabalho de Soares e Chamone (1994) não é a mera
ilustração de mais um caso de sucesso de mudança gerencial. Instigante, por exemplo,
é a forma como demonstra a utilização de inúmeras inovações gerenciais dentro do
grande guarda-chuva tecnológico que é a Gestão da Qualidade Total. O programa
desenvolvido pela empresa envolve diversas práticas gerenciais difundidas a partir do
início da década de 1990: just-in-time e kanban, benchmarking, gestão por processos,
empowerment e equipes autogerenciadas, qualidade de vida no trabalho, remuneração
baseada em resultados, metodologias de solução de problemas, e até mesmo
reengenharia. Essas tecnologias gerenciais aparecem como complementos à Gestão da
135
Qualidade Total, além da utilização extensiva de tecnologias da informação e da
utilização de uma tecnologia de gestão mais tradicional, o planejamento estratégico.
Isso reforça a suposição de que certas empresas tendem a utilizar “pacotes” de
práticas inovadoras, buscando aquilo que presumivelmente trará maiores resultados de
acordo com os objetivos organizacionais (ICHNIOWSKY et al 1996).
Wood Jr. e Urdan (1994) identificam Ishikawa (1985 apud WOOD JR. e URDAN
1994) como o criador dos CCQ’s. Ressaltam o ceticismo crescente em relação ao uso
dessa prática, tanto por parte de administradores quanto por parte de estudiosos.
Aparentemente, depois do frenesi inicial com o surgimento e difusão da prática, as
pessoas estão se questionando em relação à sua verdadeira validade enquanto solução
organizacional. As críticas mais comuns são relacionadas a problemas de
implementação da prática nas organizações, não em relação à sua concepção.
Segundo esses autores, a GQT tardou a se desenvolver no Brasil, ocorrendo no final
da década de 1980 devido à insuficiência de fundos para investimento em tecnologia e
treinamento, em razão da instabilidade política e econômica, aos altos custos de
importação e mercado protegido, cultura inadequada, conservadorismo e visões
ultrapassadas do próprio empresariado e falta de empenho da mão-de-obra, e falta de
conhecimento técnico e administrativo.
Diferentemente de Campelo de Melo et al (1993) e Prochno (2004), que avaliam
casos isolados de subsidiárias que adotaram tecnologias gerenciais oriundas de suas
matrizes off-shore, Soares e Lucas (1995) avaliaram a utilização do empowerment em
100 empresas selecionadas entre as “Melhores e Maiores” de 1992 e 1993, as
vencedoras e finalistas do Prêmio Nacional de Qualidade e do Prêmio Petrobrás de
Qualidade, e membros da Fundação do Prêmio Nacional de Qualidade do Brasil ou do
Primeiro Grupo Executivo da Qualidade (RJ) nos meses de março a agosto de 1994. A
136
comparação com empresas norte-americanas foi feita com base em pesquisa realizada
pela American Society for Quality Control, através do Instituto Gallup, em 1993.
Dentre as conclusões dessa pesquisa, encontram-se:
•
O nível de empowerment ainda é baixo no Brasil, mas é um pouco maior nas
multinacionais;
•
as empresas norte-americanas apresentam maior incidência de equipes autogerenciadas, que possuem maior autonomia;
•
nenhuma empresa brasileira declarou delegar a responsabilidade para tomada
de decisões relativas à remuneração e recompensas ou à avaliação do
desempenho. A grande maioria das empresas brasileiras somente permite, sem
a aprovação de seu superior, que os funcionários interrompam o trabalho em
progresso e refaçam o produto ou serviço. Mesmo assim, ainda há uma parte
significativa das empresas (algo entre 25 a 45% das empresas) que não
permite nem mesmo essas simples decisões, mesmo entre as multinacionais
brasileiras;
•
quase todas as empresas investigadas concordam que os seus funcionários
foram empoderados a partir da implementação dos programas de
administração da qualidade;
•
grande parte das empresas norte-americanas começou a empoderar seus
empregados a partir dos programas de qualidade de vida no trabalho, enquanto
que no Brasil isso só começa a acontecer com a introdução de programas de
administração da qualidade total;
•
apesar do grande avanço das estratégias de gestão da qualidade total no Brasil,
ainda há uma grande carência de orientação para o consumidor, o que
contribuiria para essas estratégias;
137
•
a maioria das iniciativas de qualidade no Brasil ainda é uma agregação de
esforços dispersos, sem integração com outras práticas de qualidade, e sem
alinhamento com os objetivos estratégicos das empresas;
•
pode ser verificada uma coincidência de iniciativas de empoderamento com o
foco
no
consumidor
e
de
reengenharias
de
processo
orientadas
estrategicamente;
•
a cultura organizacional representa um grande desafio para que reflita os
novos padrões de comportamento, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos
da América;
•
é possível classificar as empresas em três grupos: multinacionais, nacionais
com níveis elevados ou médios de compromisso à iniciativa de empowerment,
e nacionais com baixos níveis de compromisso. As empresas nacionais do
segundo tipo apresentariam condições desfavoráveis para a implantação de
processos de empowerment. Já as empresas nacionais da primeira categoria
apresentariam condições razoavelmente favoráveis, assim como as empresas
multinacionais.
Ferro (1995) pesquisa o parque automotivo brasileiro e discute a preocupação com a,
então, nova concorrência internacional a que foram expostas as montadoras nacionais
de veículos, concorrência essa centrada em novos padrões de desempenho, tanto em
termos de qualidade quanto em preços.
Novos padrões de fabricação foram evidenciados, incluindo-se as relações com os
fornecedores – não somente em relação à quantidade de fornecedores, mas, também,
em termos da exigência por parte das montadoras em relação à sua qualificação e à
modernização dos produtos e do parque produtivo com o aumento do percentual de
138
robotização das fábricas, e investimentos em recursos humanos e em práticas de
qualidade e produtividade.
Quanto às práticas de recursos humanos e relações trabalhistas, Ferro (1995) constata
melhorias ocorridas em ambas. Segundo ele, um dos pontos fortes da mão-de-obra
brasileira é sua disposição em aprender e participar, desde que isso seja devidamente
recompensado, apesar de seu baixo nível de educação formal. Segundo ele, o número
de horas de treinamento foi multiplicado por quatro entre 1990 e 1995. Os sindicatos
passaram de uma relação de antagonismo e reação para uma situação de participação e
influência na discussão dos assuntos estratégicos, como programas de qualidade,
políticas de terceirização, educação, remuneração, planejamento de carreira, níveis de
emprego, jornada de trabalho, etc.
Em relação às práticas de gestão de pessoas, em particular, a indústria automotiva do
país introduziu, no período estudado por Ferro (1995), várias inovações, como:
trabalho em equipe, treinamento, participação, envolvimento e compromisso da força
de trabalho, melhorias em comunicação e descentralização, ênfase em atividades de
solução de problemas, eliminação ou redução significativa dos inspetores de
qualidade e achatamento dos níveis organizacionais. Como resultado dessas
mudanças, o autor indica ter havido um aumento de produtividade da ordem de 40%,
entre 1990 e 1994.
O principal fator que estimulou essas mudanças foi a mudança das instituições, ou
seja, das regras do jogo, que influenciavam o setor, na visão de Ferro (1995). A
mudança institucional foi causada, principalmente, pelo governo, que passou a adotar
novas políticas para modernizar a indústria brasileira, primeiramente com a abertura
do mercado doméstico para as importações, a adoção de tarifas decrescentes, com a
criação de uma Câmara Setorial para discutir os assuntos relevantes do setor, e a
139
criação do regime de carro popular, estimulou o consumo em classes menos abastadas
da população. Percepção semelhante também está presente em Gitahy (2000).
Quanto à terceirização, Amato Neto (1995) considera que tal prática no Brasil tem se
concentrado no global sourcing, especialmente por parte de produtores de bens
duráveis, como as montadoras de veículos, e tem sido caracterizada por constantes
reduções nos quadros de trabalho, por meio de processos pouco organizados e não
negociados.
Segundo Leite (1997b), os principais motivos que têm levado as organizações
brasileiras a adotar a terceirização são: a focalização em atividades-fim, a
previsibilidade dos custos e investimentos, a objetividade na análise custo-benefício, a
agilidade na implantação de soluções, a redução de custos e a previsibilidade de
prazos. Sob a ótica dos contratantes, a terceirização de serviços de tecnologia, no
Brasil, tem apresentado aspectos de maturidade, tendendo a se intensificar no futuro.
Sob a ótica do prestador de serviços de informática, o processo de terceirização
representa a perda da estabilidade trabalhista, associada aos desafios e oportunidades
da carreira como empresários independentes, que inclui o gerenciamento de contratos
de prestação de serviços, a satisfação de clientes e a constante atualização tecnológica.
Ferro e Grande (1997) retomam as pesquisas sobre o movimento da qualidade e
afirmam que esse surgiu no Brasil no final da década de 1970, seguindo o sucesso do
chamado ‘modelo japonês de gestão’ (FERRO e GRANDE, 1997), e com o
mecanismo dos Círculos de Controle de Qualidade, criado para analisar e propor
soluções para problemas de qualidade e de produção. Os CCQ’s são grupos formados
por cinco a dez pessoas, que podem ser ou não de um único departamento ou nível
hierárquico, que se reúnem em média uma vez por semana. Os seus membros recebem
140
treinamento em métodos de solução de problemas, ferramentas estatísticas e dinâmica
de grupo, sendo ou não remunerados por sua participação e sugestões.
Inicialmente, os CCQ’s foram implantados nas organizações no Brasil desvinculados
de outras práticas de GQT, como instrumentos isolados de melhoria contínua e
incremental. Sua disseminação foi estimulada pelo grande sucesso obtido pela prática
junto às indústrias japonesas, pela facilidade e baixos custos de implantação,
requerendo pouca alteração na estrutura das organizações e atendendo às demandas
sociais emergentes e crescentes à época no país.
Sobre trabalho em grupo no Brasil, a pesquisa de maior fôlego é a que foi relatada por
Marx (1998). Neste trabalho, o autor apresenta os resultados de estudo de caso
múltiplos em seis empresas no Brasil, sendo cinco multinacionais e uma nacional.
Com base em revisão de bibliografia sobre a experiência da Volvo sueca, da Toyota
japonesa e da joint-venture GM-Toyota, nos Estados Unidos, ele conclui que existem
dois tipos de grupos: o grupo semi-autônomo, mais representativo da experiência da
unidade da Volvo de Uddevalla, e os grupos enriquecidos, mais representativos da
experiência da Toyota e da NUMMI. No caso dos grupos enriquecidos, a autonomia
centra-se em torno das questões de gestão da produção, enquanto no caso dos grupos
semi-autônomos há um maior espectro e profundidade da autonomia exercida pelos
seus membros.
Em relação às empresas pesquisadas no Brasil, suas principais conclusões são: a
existência daqueles dois tipos de trabalho em grupo; a adoção do trabalho em grupo
foi motivada pela necessidade de incremento da flexibilidade, que se colocava como o
principal fator competitivo; as principais referências levadas em conta eram as
oriundas de casos de sucesso, o que parece explicar a maior difusão do tipo grupo
enriquecido em detrimento de grupo semi-autônomo; as empresas multinacionais
141
destacavam-se em termos de adoção de grupos semi-autonômos em relação àquelas de
capital nacional.
A pesquisa de Gitahy (2000), de natureza mais abrangente em comparação às
anteriormente comentadas, evidencia que, após um período de protecionismo do
mercado interno e das indústrias nacionais, tem havido uma significativa evolução no
cenário industrial brasileiro durante as últimas três décadas, que tem se associado a
aumentos de competitividade dos produtos brasileiros em relação aos países mais
desenvolvidos.
Gitahy (2000) interpreta esse processo de modernização como uma mudança social
altamente complexa, que reverte normas estabelecidas de comportamento e estabelece
novos sistemas de autoridade e controle, criando novas fontes de instabilidade e
ansiedade (também presente em Tenório 2000 e em White et al 2003). A difusão do
novo paradigma tecno-econômico associada ao processo de globalização da economia
e ao abandono da política de substituição das importações, transformou a organização
do trabalho tanto intra quanto inter-organizacionalmente, mudando o volume,
estrutura e localização do emprego, assim como o conteúdo e a hierarquia das
habilidades requeridas ao trabalhador. Essa transformação ocorreu em um contexto
marcado pela crise, instabilidade econômica, recessão e desemprego, assim como pela
redemocratização e influência crescente do movimento trabalhista.
Após um movimento de estagnação dos anos 1980, cujo padrão de competição se
caracteriza pela contração do mercado doméstico e pelo aumento de exportações para
os Estados Unidos da América e para a Europa, associados a um padrão tecnológico
caracterizado por reestruturações defensivas orientadas pelo novo paradigma de
eficiência, os anos 1990 deparam-se com um cenário composto por acordos definidos
no complexo automotivo entre o governo, sindicatos e companhias, pelo crescimento
142
do mercado doméstico e redirecionamento das exportações para o Mercosul, por
novos investimentos e novas plantas em todo o país, por um padrão tecnológico
voltado para a intensificação de processos de reestruturação orientado pelo novo
paradigma de eficiência, e por mudanças no padrão gerencial, caracterizados por uma
agenda de negociações mais complexa e descentralizada, em um contexto de redução
do emprego.
O novo paradigma causou, nos últimos anos do século XX, um grande aumento na
produtividade e um agudo declínio nos níveis de emprego, devido ao processo de
reestruturação ocorrido em um período de crise e recessão econômica no mercado
doméstico, associados à intensa competição internacional, estimulados pelo processo
gradual de substituição de importações (Gitahy op cit).
Essas mudanças envolvem vários aspectos na cadeia produtiva, desde o tipo de
equipamentos e o sistema de manutenção utilizado, incluindo aspectos da organização
do trabalho e da produção, políticas de qualidade, relações inter-organizacionais com
clientes e fornecedores, novas configurações de estrutura organizacional, novos
padrões de habilidades e políticas gerenciais e novas formas de relações industriais.
Cavalcante e Teixeira (2003) contestam parcialmente as afirmações de Campelo de
Melo et al (1993), no que dizem respeito ao desenvolvimento tecnológico no setor
bancário. Enquanto Campelo de Melo et al (1993) destacam as virtudes do setor de
automação de serviços bancários no desenvolvimento de tecnologia proprietária,
tornando-se referência internacional, Cavalcante e Teixeira (2003) não identificam os
supostos ganhos auferidos pelo setor em função dos investimentos em tecnologia.
Como decorrência, pode-se supor que, apesar de ser um destaque em termos
tecnológico, o setor bancário não apresenta meios de justificar os enormes
investimentos realizados, uma vez que eles não se traduzem em maior produtividade.
143
Ressalta-se que a grande diferença temporal existente entre os trabalhos de Cavalcante
e Teixeira (2003) e Campelo de Melo et al (1993) bem como as distintas condições
contextuais que envolvem os dois trabalhos proporcionam condições suficientes para
conclusões tão distintas.
Ao examinar a disseminação do conceito just in time no Brasil, Profeta (2003) não
confirma a existência de alguns aspectos importantes mencionados pela revisão
bibliográfica, como contratos de longo prazo com fornecedores únicos nem
interferências advindas dos sindicatos.
Além do mais, o referido autor (Profeta op cit) identifica o problema da síndrome do
final do mês: apesar de atuarem tacitamente sob o regime JIT, algumas empresas
adotam comportamentos dissimulados, ou seja, declaram que adotaram os princípios
da prática selecionada, mas na realidade retêm comportamentos residuais de práticas
tradicionais. No caso do JIT, as empresas continuam sem planejar seus estoques e o
fluxo de mercadorias, mantendo estoques reguladores (buffer inventories), mesmo que
não o declarem abertamente.
Apesar disso, Profeta (2003) validou alguns outros pressupostos teóricos, como a
importância de uma coordenação central do processo de JIT, da transparência de alta
administração, a necessidade de apoio a mudanças comportamentais, o aumento na
confiabilidade de fornecedores, seguido pelo aumento das exigências de clientes e
modificações na estrutura da indústria e as contingências no processo de
implementação. Ao contrário do que sugere a literatura sobre o tema, não foi
verificada influência negativa por parte dos sindicatos nem existência de contratos de
longo prazo com fornecedores únicos.
O caso brasileiro evidencia, segundo Profeta, que não houve demissões de
funcionários como decorrência da adoção do Just in Time, uma das preocupações dos
144
empregados quando da adoção de novas práticas, especialmente aquelas que visam
reduzir custos e melhorar a produtividade. (PROFETA, 2003)
Outros trabalhos que estudam a adoção de práticas inovadoras no Brasil são os de
Loiola et al (2003a e 2003b) e o de Peixoto (2004). Utilizando a mesma fonte de
dados de Bastos (2004), os trabalhos antes mencionados detalham resultados de
pesquisa sobre a adoção de práticas inovadoras no Brasil. Os trabalhos de Loiola et al
buscam desenvolver uma visão mais complexa da adoção de práticas inovadoras, com
a aplicação de técnicas de análise multivariada, enquanto que o de Peixoto apresenta
os resultados de maneira descritiva, comparando a realidade percebida no Brasil com
aquela percebida no Reino Unido.
Loiola et al (2003a) utilizam a análise de conglomerados (clusters) para agrupar as
empresas pesquisadas5 em cinco grupos, qualificando o comportamento de adoção das
práticas das empresas pesquisadas: inovadores pioneiros e intensivos, inovadores
retardatários, inovadores pioneiros e moderados, inovadores seguidores e inovadores
seletivos (Quadro 4.3).
De acordo com tal trabalho, organizações inovadoras pioneiras e intensivas pertencem
aos setores de metalurgia básica, produtos alimentícios e bebidas e máquinas e
equipamentos. Esse agrupamento apresenta organizações com grande amplitude em
número de funcionários, variando entre 150 e 3500 funcionários, com maior
concentração na faixa de 150 a 499 funcionários (57,7 % das participantes).
5
A pesquisa envolve uma amostra inicial de 220 empresas industriais apresentando a partir de 150
funcionários, que foram, posteriormente, reduzidas a 78 casos considerados válidos
145
Quadro 4.3 – Clusters de Empresas em Relação aos Padrões de Adoção de
Práticas Inovadoras
Cluster 1 – Inovadores Pioneiros e Intensivos
Número de Empresas:
26
Setores:
Metalurgia Básica
Produtos Alimentícios e Bebidas
Máquinas e Equipamentos
Funcionários:
Em torno de 500 (até 3500)
Região:
Sul
Origem do Capital:
Nacional
Adoção:
Até 1995 (60%)
Continuidade de Uso:
73,1 % (mais ou muito mais)
Cluster 2 – Inovadores Retardatários
Número de Empresas:
4
Setores:
Indefinido
Funcionários:
Menos de 500 (até 1700)
Região:
Sudeste
Origem do Capital:
Nacional
Adoção:
Últimos 6 anos
Continuidade de Uso:
86,1 % (mais ou muito mais)
Cluster 3 – Inovadores Pioneiros e Moderados
Número de Empresas:
15
Setores:
Produtos Alimentícios e Bebidas
Produtos Químicos
Funcionários:
Entre 300 e 350 (até 740)
Região:
Sul, Sudeste, Nordeste
Origem do Capital:
Nacional
Adoção:
Até 1995 (60%)
Continuidade de Uso:
57,8 % (mais ou muito mais)
Cluster 4 – Inovadores Seguidores
Número de Empresas:
13
Setores:
Metalurgia Básica
Celulose, Papel e Produtos de Papel
Produtos de Metal
Funcionários:
Menos que 250 (até 750)
Região:
Indefinido
Origem do Capital:
Maior participação de capital estrangeiro (cinco de treze organizações)
Adoção:
Período de adoção mais diversificado
Continuidade de Uso:
53,2 % (mais ou muito mais)
Cluster 5 – Inovadores Seletivos
Número de Empresas:
Setores:
Funcionários:
Região:
Origem do Capital:
Adoção:
Continuidade de Uso:
Objetivos Pretendidos:
Fonte: Loiola et al 2003a.
20
Produtos Alimentícios e Bebidas
Produtos de Minerais Não-Metálicos
Metalurgia Básica
Menos que 1000 (até 4000)
Sul, Sudeste, Nordeste
Nacional
Seletivamente
65,1 % (mais ou muito mais)
Tendência a priorizar os custos
146
Aproximadamente dois terços das empresas contidas no primeiro agrupamento, estão
situadas na Região Sul do país, possuindo capital de origem nacional (16 empresas em
ambos os casos). Esse agrupamento é formado, ainda, por empresas com pouco tempo
de experiência com as novas práticas, com as organizações que o compõem, tendo
iniciado a adoção predominantemente nos primeiros anos da década de 1990. Entre 40
e 50% das organizações participantes adotaram as práticas inovadoras nos últimos seis
anos. Em média, 73% delas afirmam que vão continuar utilizando as práticas
inovadoras com intensidade maior ou muito maior (Quadro 4.3).
O segundo agrupamento, denominado inovadores retardatários, está distribuído
eqüitativamente entre todos os setores industriais e predominantemente na Região
Sudeste do País. Todas possuem capital de origem nacional e buscam obter resultados
diversos com o uso das práticas inovadoras que utilizam. Em relação ao número de
funcionários, esse agrupamento engloba empresas com menos de 500 funcionários.
Em relação ao ritmo de adoção de práticas inovadoras, as empresas desse
agrupamento apresentam, ainda, uma experiência mais recente do que o agrupamento
anterior. Ademais, esse segundo agrupamento singulariza-se por ser composto por
empresas que adotaram as práticas “terceirização” e “cultura de aprendizagem” até
1995. Em relação às demais práticas, a adoção ocorreu mais recentemente, nos
últimos seis anos.
Com o primeiro agrupamento, este segundo apresenta um
percentual médio de 86,1% de organizações que afirmam que utilizarão as práticas
inovadoras em intensidade maior ou muito maior (Quadro 4.3).
O agrupamento de empresas inovadoras do tipo pioneiros e moderados compõe-se de
empresas pertencentes às indústrias de alimentos e bebidas (5 unidades) e química (2
unidades), possuindo entre 300 e 350. As organizações que compõem esse
agrupamento estão distribuídas eqüitativamente entre as regiões Sul, Sudeste e
147
Nordeste, apresentado, em sua maioria, capital de origem nacional. Também buscam
objetivos diversos utilizando práticas inovadoras. Adotaram as novas práticas mais
recentemente do que o grupo anterior -- entre 60 e 100% das participantes por
indústria iniciaram a adoção das práticas inovadoras nos últimos seis anos. Esse
agrupamento apresenta um percentual menor, em relação aos demais, de organizações
que afirmam que utilizarão as práticas com intensidade maior ou muito maior (Quadro
4.3).
As organizações inovadoras do tipo seguidoras estão distribuídas nos setores da
metalurgia básica, celulose, papel e produtos de papel e produtos de metal. Em
relação ao número de funcionários, esse agrupamento apresenta, em sua maioria, entre
180 e 249 funcionários. Suas empresas estão distribuídas de maneira equilibrada em
vários estados e regiões do país, possuindo, em relação aos demais aglomerados, uma
maior freqüência de organizações com capital oriundo de outros países – 4 possuem
capital estrangeiro, enquanto uma possui capital misto. Em relação aos objetivos
buscados, essas organizações também buscam diversos tipos, de acordo com cada
prática, especificamente. As organizações demonstram, como os demais componentes
dos outros grupos, certo atraso na adoção de práticas inovadoras, apesar de haver
maior variabilidade nesse sentido, com índices entre 50 e 100% de adoção de práticas
inovadoras por setor nos últimos seis anos. O quarto agrupamento é aquele que,
aparentemente, possui menor satisfação com o uso das práticas inovadoras, uma vez
que somente 53,2% das empresas pesquisadas afirmam que continuarão utilizando as
práticas com intensidade maior ou muito maior (Quadro 4.3).
O quinto e último agrupamento, inovadores seletivos, apresenta componentes
distribuídos de maneira quase eqüitativa entre todos os setores industriais. Apesar
disso, pode-se admitir certo destaque para os setores de produtos alimentícios e
148
bebidas, produtos de minerais não-metálicos e metalurgia básica. Em relação ao
número de funcionários, a grande maioria dessas organizações possui até 499
funcionários (75% das organizações). Essas organizações estão distribuídas também
quase que eqüitativamente, entre as regiões Sul, Sudeste e Nordeste, havendo, ainda,
uma predominância de organizações com capital nacional. Em relação aos objetivos
pretendidos, esse agrupamento apresenta uma leve tendência a priorizar a redução de
custos. Este é o agrupamento que menos utiliza as práticas inovadoras pesquisadas,
apresentando os menores índices de organizações que iniciaram o uso das práticas no
início da década de 1990, variando esse índice entre 5,6 e 47,0% por setor. Em
comparação com o agrupamento anterior, este apresenta um índice um pouco maior
de organizações que afirmam que continuarão utilizando as práticas inovadoras –
65,1% do conjunto (Quadro 4.3).
Em síntese, a análise de clusters sugere que as organizações industriais brasileiras têm
adotado práticas inovadoras de produção e de organização do trabalho, mas isso tem
ocorrido a ritmos diferentes. Enquanto algumas organizações são mais rápidas e
intensas na adoção, incorporando todas as práticas pesquisadas de forma abrangente
ou localizada, e moderada ou intensamente, outras são mais conservadoras e adotam
algumas poucas práticas, pouco ou moderadamente. Há ainda um grupo de
organizações que adota essas mesmas práticas seletivamente, aparentemente
escolhendo aquelas que mais lhes parecem oferecer um potencial de flexibilização e
ganhos de qualidade, de custos ou de responsividade.
O segundo artigo de Loiola et al (2003b)6 foi desenvolvido com perspectiva similar ao
anteriormente comentado: busca unificar as práticas entre si, por meio da aplicação da
análise fatorial exploratória, reduzindo as doze variáveis estudadas, que representam o
6
Envolve uma amostra de 220 empresas industriais contendo mais do que 150 funcionários
149
nível de utilização (grau de adoção) de doze práticas inovadoras, em três fatores que
explicam aproximadamente 47,0% da variância total da amostra estudada. Dessa
forma, o primeiro fator incorpora as práticas parceria na cadeia de suprimento, cultura
de aprendizagem, empowerment e trabalho em equipes. A associação dessas práticas
em um único fator é teoricamente consistente, uma vez que elas apresentam
semelhanças, à exceção da parceria na cadeia de suprimentos – que se volta para o
desenvolvimento de esforços colaborativos entre fabricantes e fornecedores –, em
relação aos objetivos, aos métodos utilizados e à preocupação com o desempenho da
mão de obra. Uma vez que as práticas associadas a esse fator destinam-se
normalmente a gestão de pessoas, do trabalho em equipe e das relações com
fornecedores, esse fator foi denominado de Práticas Inovadoras de Gestão do
Trabalho e do Desenvolvimento de Pessoas.
Já os resultados associados ao segundo fator, sugerem que a manutenção produtiva
total, engenharia simultânea, células de produção e just in time compõem outro
construto. Essa sugestão também é consistente pelo fato de que, do ponto de vista
teórico, tais práticas focalizam, primordialmente, a organização do processo
produtivo. Desta feita, esse fator foi denominado de Práticas Inovadoras de Gestão
da Produção.
O terceiro fator está associado ao uso de reengenharia, terceirização, tecnologia
integrada baseada em computadores e gestão da qualidade total. Inicialmente,
surpreende que essas práticas se agrupem no mesmo fator, devido às suas diferenças,
tanto em objetivos quanto em métodos. Gestão da qualidade total e reengenharia, por
exemplo, podem ser vistas como práticas totalmente opostas, especialmente levandose em consideração os métodos de cada uma, bem como a intensidade da mudança
proporcionada. Além dessas e de outras diferenças, as três práticas agrupadas nesse
150
fator objetivam, no entanto, modificar o processo gerencial, reduzir custos e aumentar
o desempenho e a qualidade da organização e de seus produtos. Portanto, esse fator
foi denominado de Práticas Inovadoras de Gestão do Desempenho e da Qualidade.
Comparando os fatores apresentados por Loiola et al (2003b) à taxonomia de Bolden
et al (1997), é possível perceber que fatores e taxonomias mostram-se relativamente
consistentes entre si. As práticas inovadoras de gestão do trabalho e do
desenvolvimento de pessoas estão associadas à dimensão “ênfase estratégica/foco em
organização” e ao domínio de aplicação “gestão de pessoas”, com exceção da prática
“parcerias na cadeia de suprimentos”, que está classificada, quanto à ênfase
estratégica como “foco no negócio” e quanto ao domínio de aplicação, como
“inventário e estoques”. O segundo e o terceiro fatores parecem estar mais associados
à dimensão “ênfase estratégica/foco no negócio”. Das quatro práticas abarcadas no
segundo fator, todas pertencem à dimensão estratégica “foco no negócio” e três ao
domínio de aplicação “design e produção”, enquanto uma pertence ao domínio de
aplicação “organização do trabalho”. Comportamento similar observa-se quanto às
práticas englobadas no fator três: quanto à ênfase estratégica, três em um total de
quatro práticas pertencem à dimensão “foco no negócio”, sendo duas classificadas em
termos de domínio de aplicação como “organização mais ampla da produção” e uma
como “organização do trabalho”.
Nenhum dos dois trabalhos por último comentados, entretanto, utiliza dados de
desempenho, de modo a analisar a relação entre a utilização de práticas inovadoras, o
desempenho e a competitividade das organizações. Da mesma forma, nenhum dos
dois trabalhos objetiva estudar com maiores detalhes o tipo de organização que possui
maior propensão a adotar práticas inovadoras, em relação, por exemplo, aos
desempenhos financeiro e operacional.
151
Prochno (2004) se propõe a verificar o processo de transferência de conhecimento de
uma matriz internacional de um fabricante de automóveis para sua mais recente
subsidiária brasileira, detalhando os maiores desafios pelos quais a organização teve
que passar durante o seu primeiro ano de operações. Segundo esse autor, a empresa
não teve dificuldades em transferir o conhecimento componente, ou seja, a
compreensão de como operar cada módulo de operações isoladamente. Isso foi
realizado através de leitura de documentos, treinamentos e orientações de expatriados
que ocorreram antes do início das atividades produtivas. Inicialmente, entretanto, os
módulos não funcionaram com todo seu potencial, devido à ausência do
conhecimento arquitetural, ou seja, a capacidade de compreender não somente os
módulos, mas sua integração e coerência como um todo. Esse conhecimento, segundo
o texto, teve que ser construído localmente, especialmente por meio de processos de
construção de significado (sensemaking), uma vez que os funcionários, recémcontratados, não possuíam os conhecimentos nem a experiência necessários para
compreender toda a interdependência dos componentes.
Enquanto a transferência de componentes pode ser mais facilmente realizada, a
transferência do conhecimento arquitetural requer maior cautela, uma vez que o bom
funcionamento e a perfeita integração dos componentes deve levar em consideração
as peculiaridades locais, inclusive a cultura e o ambiente institucional. O mesmo autor
sugere que pode ser mais eficaz a transferência de um “pacote completo” de práticas
de uma única fonte, ao invés da importação de melhores práticas de fontes diversas.
Ao serem adotadas todas as práticas de um único benchmark, essas práticas trarão
consigo o conhecimento arquitetural, ou seja, a forma como integrar os componentes
para que o sistema atinja todo o seu potencial de desempenho.
152
Segundo Prochno (2004), tem havido aumento de interesse em estudos sobre
transferência de práticas organizacionais, devido à crescente importância de redes
organizacionais, à expansão geográfica de empresas e à disseminação de uso do
benchmarking, como forma de melhorar o desempenho organizacional. Com a
transferência de práticas, é possível que as organizações criem sinergias e maximizem
o desempenho, padronizando as operações em suas unidades, em países distintos.
Mais recentemente, Silva (2004), com base em três estudos de caso, afirma que,
apesar de grande parte da literatura sobre mudanças organizacionais, desde 1980,
considerar que as CM são alternativas à lógica do posto de trabalho, seus achados de
pesquisa, corroboram os de Marx (1998), sinalizando para a existência de duas
configurações extremas possíveis: uma configuração que se aproxima da ruptura com
o modelo clássico de organização do trabalho (taylorista-fordista) e outra que convive
hibridamente com esse modelo.
Na prática, a ambigüidade, a situação de ‘meio caminho’ entre dois
padrões-típicos de relação entre capital e trabalho no âmbito
gerencial, além de ser bastante funcional em termos de controle,
parece ser a regra antes do que a exceção no meio industrial. Esse
ponto remete ao hibridismo dos modelos – lean-production e
fordismo – e às intermináveis discussões sobre a ruptura do
primeiro em relação segundo (SILVA, 2004, p.234).
Ainda a partir dos casos observados, Silva (2004) registra que as modalidades de
trabalho em grupo encontradas não substituem o posto de trabalho, ao contrário,
pressupõem-no. Segundo ele, verificaram-se também: uma divisão de trabalho menos
segmentada; margens de decisão variando em torno de certos padrões definidos de
“cima” e a realização de acordos dentro do grupo e do grupo com instâncias
hierárquicas superiores, quer sejam sobre problemas novos surgidos ou sobre as metas
estabelecidas. Novamente de acordo com o mesmo autor, os trabalhadores das células
de produção na fábrica de cuecas externaram a opinião de que o que há de mais
153
negativo na CM é o ritmo de trabalho muito intenso (59% dos respondentes),
enquanto que apenas 31% do mesmo contingente declarou que “encontraria com
facilidade um novo emprego na mesma função pois os trabalhadores da empresa são
muito bem treinados” (p.240) e 77% admitiu que “quando um membro da CM não
consegue manter o ritmo de trabalho, não diminui seu ritmo e continua a produção
para não comprometer a meta de produção da célula” (p.247).
No Brasil, conforme foi sendo importada, a prática de CM foi sofrendo adaptações,
pois conceitos e soluções organizacionais, especialmente quando são transplantados
de outros países, tendem a assumir características muito distintas das originais,
especialmente considerando-se as condições que circundam sua implantação e
adaptação no país de destino. Sendo assim, o nível de autonomia verificado por
Furtado (2004) em algumas fábricas brasileiras só foi assegurado depois da
participação do sindicato em negociações que estabeleceram limites para que as
células de manufatura não fossem apenas mais uma forma de se produzir. Esse autor
ressalta a necessidade de um sindicato atuante para assegurar que as células de
manufatura proporcionem ganhos de autonomia e liberdade para os trabalhadores das
empresas adotantes.
[...] acreditamos que os grupos de trabalho sem a existência de
sindicatos fortes e comissões de fábrica atuantes, não constituem
por si só um instrumento de democratização da fábrica. A nosso
ver, os grupos de trabalho, sem o respaldo de representações
trabalhistas, têm os seus objetivos limitados à produção, à inserção
do trabalhador em um mecanismo de organização da produção, que
dão à empresa maior flexibilidade no uso da força de trabalho e o
necessário comprometimento dos trabalhadores com ganhos de
qualidade e produtividade. (FURTADO, 2004., p.258)
Também de caráter mais abrangente, destaca-se, no Brasil, a pesquisa realizada por
Bastos et al (2004). Adotando metodologia semelhante àquela de Waterson et al
(1997), Bastos et al (2004) verificam a utilização das mesmas doze práticas no Brasil,
no período de 2001 a 2002. Foram entrevistados executivos-chefe da área industrial
154
de 220 organizações industriais brasileiras, que possuíam acima de 150 funcionários.
Os achados dessa pesquisa estão sintetizados no Quadro 4.4.
Quadro 4.4 – Adoção de Práticas Inovadoras de Administração e Produção
Brasil
Discriminação das dimensões
avaliadas
Difusão
Resultados
Mais difundida: Trabalho em Equipes; Gestão da Qualidade
Total; Parceria na Cadeia de Suprimentos; Cultura de
Aprendizagem; Tecnologia Integrada Baseada em Computador;
Menos difundida: Terceirização; Engenharia Simultânea;
Manutenção Produtiva Total; Células de Produção;
Reengenharia;
Ganhos de qualidade
Maior êxito: Gestão da Qualidade Total; Trabalho em Equipes;
Tecnologia Integrada Baseada em Computadores; Células de
Produção
Menor êxito: Terceirização; Just in Time; Manutenção
Preventiva Total;
Redução de custos
Maior êxito: Just in Time; Tecnologia Integrada Baseada em
Computadores; Células de Produção; Trabalho em Equipes
Menor êxito: Terceirização; Manutenção Produtiva Total;
Cultura de Aprendizado; Engenharia Simultânea;
Responsividade
Maior êxito: Tecnologia Integrada Baseada em Computadores;
Trabalho em Equipe; Células de Produção; Gestão da Qualidade
Total;
Menor êxito: Terceirização; Manutenção Produtiva Total; Just
in Time; Engenharia Simultânea;
Perspectivas
Maior crescimento: Gestão da Qualidade Total; Trabalho em
Equipe; Cultura de Aprendizado; Empowerment;
Menor crescimento: Terceirização; Células de Produção;
Engenharia Simultânea
Fonte: elaborado com base em Bastos et al (2004)
As práticas mais difundidas no Brasil foram, conforme a pesquisa de Bastos et al
(2004), a gestão da qualidade total, as parcerias na cadeia de suprimentos, a cultura de
aprendizagem, o trabalho em equipe e a tecnologia integrada baseada em
computadores. Segundo os executivos questionados, tanto o trabalho em equipe
quanto a tecnologia integrada baseada em computadores oferecem melhorias
associadas à qualidade, aos custos e à responsividade, enquanto que a gestão da
qualidade total, segundo a opinião dos mesmos executivos, está somente associada a
resultados de melhorias de qualidade e aumento da responsividade. Cultura de
aprendizagem e parcerias na cadeia de suprimentos não foram associadas
155
significativamente a qualquer dos objetivos verificados. Quatro destas práticas, com
exceção da tecnologia integrada baseada em computadores, apresentaram grande
propensão à continuidade de uso.
O just in time e o empowerment apresentaram, segundo a pesquisa, difusão moderada
entre as organizações industriais brasileiras. Os respondentes associaram o just in time
somente a reduções de custos, enquanto que o empowerment não foi associado
significativamente a nenhum dos resultados considerados pela pesquisa, apesar de
apresentar elevada propensão à continuidade de uso.
As práticas menos difundidas entre as indústrias brasileiras foram reengenharia de
processos, terceirização, células de manufatura, engenharia simultânea e manutenção
produtiva total.
As análises dos trabalhos registradas neste item parecem reforçar a necessidade de
estudos que classifiquem as práticas adotadas e pesquisadas de maneira mais ampla
para ser possível identificar a propensão das organizações a adotar determinados tipos
de práticas inovadoras em especial. Por exemplo, pode-se sugerir que algumas
organizações tendem a adotar práticas que proporcionem redução de custos, em
especial, ao invés de, por exemplo, adotarem práticas inovadoras que proporcionem
maior rapidez de resposta ou outro objetivo.
4.3. Pesquisas comparativas entre o Brasil e outros países
Apesar de haver uma significativa diferença temporal entre as pesquisas de Waterson
et al (1997) e Bastos et al (2004), é possível verificar diferenças e semelhanças nos
comportamentos de executivos brasileiros e do Reino Unido. Assim como na pesquisa
realizada no Reino Unido (WATERSON et al 1997), foi possível identificar, no
Brasil, as práticas mais difundidas, as que apresentaram maior propensão à
156
continuidade de uso e as que contribuíram para os três objetivos estudados –
melhorias em qualidade, redução de custos e aumento da responsividade. Com base
na comparação das duas pesquisas, pode-se sugerir que as organizações industriais
brasileiras apresentam comportamento tão prospectivo quanto as empresas britânicas
pesquisadas, apesar de isso ocorrer de maneira menos seletiva e com menor grau de
satisfação com os resultados obtidos.
É importante ressaltar as limitações resultantes do modo de obtenção de dados
utilizado em ambas as pesquisa em foco. A pesquisa realizada no Brasil, conforme
relatado pelos autores (Bastos et al 2004), apresentou algumas dificuldades de acesso
aos dirigentes, foi realizada por telefone, e foi de longa duração (entre 45 minutos e 1
hora). Esses fatores podem ter enviesado os resultados, mesmo que o instrumento
tenha sido construído especificamente para esse fim. Além disso, as informações
foram obtidas pelas respostas apresentadas pelos executivos-chefe da área industrial,
ou seja, basearam-se na percepção dos dirigentes, fragilizando a confiabilidade das
respostas, apesar do tratamento quantitativo aplicado. Esses aspectos também foram
relatados como preocupantes por Gondim et al (2003).
Já outra pesquisa sobre a utilização de diversas ferramentas de gestão em 708
empresas de cinco continentes verifica um crescimento no uso de tais ferramentas. No
ano de 2000, as empresas pesquisadas utilizaram dez ferramentas de gestão, em
média, enquanto que, em 2002, foram utilizadas dezesseis delas, em média. No Brasil,
o aumento em relação ao uso de ferramentas foi de 25% - em média, uma empresa
pesquisada utilizou 13,1 ferramentas de gestão.
157
Tabela 4.1 – Satisfação com o Uso de Ferramentas
Ferramenta
Planejamento Estratégico
Benchmarking
Pesquisas Junto ao Cliente
Remuneração por Desempenho
Missão e Visão
Outsourcing
Segmentação da Base de Clientes
Gerenciamento da Qualidade Total
Códigos de Ética Corporativa
Estratégias de Crescimento
Integração Logística
Gerenciamento da Relação com o Cliente
(CRM)
Programa de Gerenciamento de Mudanças
Painel de Controle (Balanced Scorecard)
Knowledge Management
Competências Essenciais
Planejamento para Contingências
Análise de Valor Econômico Agregado
Alianças Estratégicas
Downsizing
Gerenciamento Baseado na Atividade
Reengenharia
Corporate Venturing
Equipes de Integração Pós-Fusão
Stock Buybacks
Fonte: Rigby et al (2003)
Nível de
Utilização (BR) %
84
84
80
76
73
71
69
61
59
59
57
55
Nível de Utilização
(Mundo) %
89
84
78
76
84
78
79
57
78
76
62
78
53
51
49
49
49
47
45
45
35
20
18
16
1
64
52
62
75
70
52
69
59
50
54
32
37
18
Algumas ferramentas, como planejamento estratégico e benchmarking, obtiveram um
índice de utilização superior a 80% das empresas pesquisadas (a média mundial de
utilização de práticas inovadoras foi de 65%, enquanto que no Brasil foi de 52%). As
práticas mais utilizadas internacionalmente foram: planejamento estratégico,
benchmarking, missão e visão, segmentação da base de clientes e outsourcing,
enquanto que as práticas mais utilizadas no Brasil foram planejamento estratégico,
benchmarking, pesquisas junto ao cliente, remuneração por desempenho e missão e
visão.
As menos utilizadas mundialmente foram stock buybacks, corporate venturing,
equipes de integração pós-fusão, gerenciamento baseado na atividade e análise de
158
valor econômico agregado, enquanto que, no Brasil, foram stock buybacks, equipes de
integração pós-fusão, corporate venturing, reengenharia, gerenciamento baseado na
atividade e downsizing.
Apesar de comparar os resultados obtidos nesta pesquisa com os de pesquisas
anteriores, o relatório não ressalta o movimento de crescimento de algumas das
práticas/ferramentas investigadas. A questão é a seguinte: planejamento estratégico e
benchmarking são, atualmente, práticas bastante reconhecidas no meio empresarial, já
contando com algumas décadas de história e difusão, enquanto corporate venturing e
balanced scorecard são práticas mais recentes, criadas há uma década ou menos, que
ainda não tiveram o seu grande movimento de difusão entre as empresas brasileiras.
Outras, ainda, como outsourcing, reengenharia e downsizing, amplamente utilizadas
na década de 1990, apresentaram valores intermediários de utilização, talvez devido
às experiências negativas ocorridas durante sua utilização. Em outras palavras, é
natural pensar que há um ciclo de utilização de práticas inovadoras, algo como um
ciclo de vida de uso de práticas gerenciais. Algumas dessas práticas possuem ciclos
mais longos do que outras – como planejamento estratégico, cujo surgimento remonta
da década de 1970, ou antes, se considerarmos as contribuições originais de Peter
Drucker em relação à APO, na década de 1950. Além disso, muitas práticas se
encontram no movimento descendente do ciclo, já tendo sido experimentadas e
descartadas por fracassarem ou por esgotarem o seu potencial de contribuição durante
o movimento de maturidade. Dessa forma, é natural que as práticas apresentem
diferentes níveis de utilização e de satisfação.
159
Tabela 4.2 – Satisfação com o Uso de Ferramentas
Ferramenta
Alianças Estratégicas
Planejamento Estratégico
Códigos de Ética Corporativa
Remuneração por Desempenho
Estratégias de Crescimento
Knowledge Management
Benchmarking
Downsizing
Segmentação da Base de Clientes
Pesquisas Junto ao Cliente
Gerenciamento da Relação com o Cliente (CRM)
Competências Essenciais
Programa de Gerenciamento de Mudanças
Gerenciamento da Qualidade Total
Gerenciamento Baseado na Atividade
Missão e Visão
Integração Logística
Análise de Valor Econômico Agregado
Painel de Controle (Balanced Scorecard)
Planejamento para Contingências
Corporate Venturing
Outsourcing
Equipes de Integração Pós-Fusão
Stock Buybacks
Reengenharia
Fonte: Rigby et al (2003)
Satisfação Média
(BR)
4,37
4,24
4,15
4,12
4,11
4,10
4,05
4,05
4,13
4,01
4,01
4,00
4,00
4,00
4,00
3,97
3,92
3,90
3,90
3,86
3,86
3,75
3,71
3,50
3,25
Satisfação Média
(Mundo)
3,80
4,04
4,05
3,90
3,82
3,63
3,96
3,49
4,01
3,99
3,81
4,01
3,80
3,80
3,76
3,74
3,88
3,85
3,80
3,81
3,45
3,84
3,83
3,74
3,75
De maneira geral, a utilização das ferramentas de gestão proporcionou uma grande
satisfação às empresas adotantes, tanto no Brasil quanto em outros países – a média
brasileira foi de 3,96 em uma escala de 1 a 5 (extrema insatisfação e extrema
satisfação, respectivamente), enquanto que a média mundial foi de 3,85.
As ferramentas que mais satisfizeram seus usuários, de acordo com a pesquisa, foram
as alianças estratégicas, o planejamento estratégico, os códigos de ética corporativa, a
remuneração por desempenho e as estratégias de crescimento. Por outro lado, as
ferramentas que menos satisfizeram seus usuários foram a reengenharia, stocks
buybacks, equipes de integração pós-fusão, outsourcing e corporate venturing.
160
Em relação à inovação, as empresas brasileiras demonstraram estar mais empolgadas
do que suas contrapartidas internacionais. Setenta e um por cento das empresas
pesquisadas no Brasil admitiram estar preocupadas com os meios para alcançar os
alvos de crescimento, afirmando que confiam na capacidade de se adaptar (84% das
respondentes), na inovação (78%) e no desenvolvimento de parcerias com outras
empresas (67%) como mecanismos para assegurar o alcance desse crescimento (no
exterior, esses números mudam para 65%, 71%, 68% e 63%, respectivamente).
Comparativamente entre os continentes, os asiáticos são os que apresentaram maior
propensão à utilização de ferramentas de gestão. Em média, uma empresa asiática
utiliza 17,5 ferramentas de gestão, enquanto que as européias utilizam 16,2, as norteamericanas utilizam 15,8 e as sul-americanas utilizam 14,3 ferramentas diferentes ao
mesmo tempo. As brasileiras aparecem abaixo dos resultados relatados por empresas
desses continentes, utilizando 13,1 ferramentas de gestão. Outras evidências
encontradas na pesquisa de Rigby et al (2003, p.10):
•
Empresas na América do Norte e Europa estão menos propensas a se
concentrar no crescimento da receita do que na redução de custos, enquanto o
crescimento da receita se manteve como alta prioridade na Ásia e no Brasil
(70%).
•
Executivos europeus indicaram a maior probabilidade de que viessem a
demitir empregados em 2003 (no Brasil, 41% dos entrevistados indicaram essa
probabilidade).
•
Knowledge Management foi mais utilizada na Ásia e Europa, e menos
utilizada nas Américas do Sul e Norte.
•
Empresas européias apresentaram menor probabilidade de usar Código de
Ética Corporativa.
161
•
A América do Norte foi a única região a ter Planejamento por Contingências
entre as 10 mais usadas da lista de ferramentas.
A pesquisa verifica, ainda, uma concentração em alguns setores da economia
(serviços financeiros, empresas químicas, metalúrgicas e empresas de alimento e
bebidas) ou em empresas menores, que apresentaram uma propensão mais elevada à
adoção de ferramentas de gestão, além de estarem mais focadas em crescimento do
que as grandes.
Ademais,
técnicas
largamente
testadas
como
Planejamento
Estratégico
e
Competências Essenciais (que consistentemente chegaram próximas ao topo desde
1993), mais uma vez causaram entusiasmo ao ajudar empresas a manterem o curso.
Este ano, elas estavam acompanhadas nos rankings de satisfação pelas ferramentas
concentradas na definição de mercados e melhorias nos relacionamentos com os
clientes ou atividades-chave enquanto as empresas tentavam aumentar ao máximo a
receita dos clientes já existentes (RIGBY et al 2003 p.4).
A pesquisa representa uma importante verificação sobre a adoção de modelos
inovadores, mesmo que alguns deles já não sejam tão inovadores assim. Pode-se
considerar que no contexto brasileiro ainda é inovação adotar práticas como
planejamento estratégico e benchmarking. Entretanto, o relatório não descreve a
amostra utilizada pela pesquisa, o que pode enfraquecer o poder de conclusão do
trabalho, uma vez que ele pode ter se concentrado nos clientes atuais da consultoria, e
especialmente, em grandes corporações multinacionais. Além do mais, a forma como
são apresentados os resultados desta pesquisa limita-se à apresentação da média
aritmética simples das respostas obtidas, não havendo registros sobre os motivos que
levaram as organizações a adotarem as práticas em questão, nem os resultados são
analisados comparativamente, em relação às práticas, seja em relação às adotantes, o
que contribuiria mais significativamente para a compreensão do fenômeno.
5. Método e Procedimentos
Com base na revisão de bibliografia teórico-empírica constantes dos itens 2 , 3 e 4
desta tese, este item tem o objetivo de apresentar, discutir e delimitar questões de
método e de procedimentos de pesquisa correlacionadas. Essas questões desdobramse em: problemática, objetivos e hipóteses; modelo de análise; universo e amostra;
instrumento de coleta de informações e sistemática de análise de dados.
5.1. Problematização, objetivos e hipóteses
Como visto na revisão de bibliografia desta tese, o estudo de características
organizacionais na atualidade não pode prescindir de análises dos contextos nos quais
as organizações estão inseridas para ressaltar as principais variáveis externas que
influenciam de alguma maneira o seu comportamento e seu desempenho. Dessa
forma, em pesquisas sobre adoção de práticas inovadoras e suas relações com o
desempenho dos adotantes, torna-se necessário discutir inicialmente os fatores que
têm sido estímulos /ou restrições ao comportamento das organizações e que, por isso,
afetam a decisão de adoção de práticas inovadoras. Essa tarefa se inicia com a seleção
daqueles fatores que, provavelmente, sejam os mais importantes, dentro de um
conjunto expressivo de fatores (vide Figura 5.1).
Alguns autores, como Piore & Sabel (1984), Aglietta (1987), Boyer (1990), Burawoy
(1990), Clarke (1991), Lazonick (1992), Womack et al (1992), Shimokawa (1993),
Kumar (1997), Alban (1999), e Boyer e Freyssenet (2000) identificam a ocorrência de
uma crise do capitalismo, decorrente dos choques do petróleo ocorridos na década de
1970. Segundo esses autores, essa crise manifesta-se em desaceleração do nível de
crescimento das principais economias do mundo e das principais organizações norte-
164
americanas e européias. Com a desaceleração do crescimento, reduz-se, também, o
potencial de exploração da economia de escala, elemento central da estratégia de
modelos clássicos ou tradicionais de administração, baseados na produção em grande
escala de produtos relativamente padronizados com o uso de tecnologias dedicadas
(vide Figura 5.1).
Dessa forma, observa-se uma associação entre crise do capitalismo e crise do modelo
clássico de administração. Face à crise, as organizações deflagram várias estratégias
para sua superação, que incluem a busca por soluções e modelos de gestão
alternativos, gerando um ciclo divergente de busca por um novo modelo
organizacional (DOOLEY e VAN DE VEN, 1999), mais adaptado às condições de
demanda inferior à oferta, existente em muitos mercados, conforme discutido em
capítulo anterior (vide Figura 5.1).
A crise se intensifica, quando as organizações passam a enfocar a expansão de suas
atividades
para
novos
mercados
externos,
gerando
um
contra-fluxo
de
internacionalização, no sentido do oriente para o ocidente, com o crescimento das
economias do Japão e de outros países asiáticos, que iniciam sua expansão para o
oeste (Figura 5.1). Observa-se, simultaneamente, um movimento generalizado no
mundo, embora diferenciado em ritmo e intensidade, de quebra de barreiras
comerciais e alfandegárias. No Brasil, em particular, tal movimento emerge com
maior visibilidade e força no início da década de 90 (vide Figura 5.1).
Sendo assim, o segundo fator motivador de adoção de novas práticas gerenciais é a
globalização, que coloca frente a frente organizações de diversos portes e
nacionalidades, competindo por mercados domésticos e internacionais. Com a queda
de barreiras comerciais e alfandegárias, organizações podem realizar movimentos de
entrada em novos mercados mais facilmente, por meio de aquisições, licenciamento
165
ou mesmo de instalação de novas fábricas em países estrangeiros. Esses movimentos
passaram a ser reforçados por políticas de incentivos fiscais, de atração de
investimentos e novos sistemas de regulamentação de setores econômicos adotados
por governos, como forma de fomentar o aquecimento de suas economias (Figura
5.1).
A globalização também estimulou, e simultaneamente foi estimulada, pelo movimento
de difusão de novas tecnologias da informação e de produção, que não somente
incentivam, mas, frequentemente, exigem mudança no padrão de operações das
empresas adotantes para realizar suas promessas de aumento de produtividade, de
flexibilidade e de melhoria de desempenho. Essas tecnologias possibilitam novas
formas de interação entre as pessoas, novas formas de coordenação de atividades
internas e externas, viabilizando novas formas de organização do trabalho e da
produção. Dessa forma, as buscas das organizações por novas práticas de
administração de pessoas, de administração das operações e da produção, e de
administração da qualidade e do desempenho organizacional ganharam dimensões
ampliadas nesse novo contexto (Figura 5.1).
Em especial, as organizações foram desafiadas a melhorar seu desempenho em
dimensões que, no paradigma taylorista-fordista, eram consideradas secundárias ou
sequer eram consideradas: custos, agilidade e responsividade, e qualidade. A
dimensão custos estava presente nos modelos tradicionais de administração, mas seu
papel era o de funcionar como patamar para definição de preços, abaixo do qual era
impraticável a venda dos produtos, exceto em situações atípicas. Ou seja, as análises
tradicionais de custos limitavam-se a identificar os custos de produtos, de modo que
fosse possível projetar o preço de venda para garantir o lucro ou resultado desejado,
fosse esse último crescimento de vendas, o aumento de market share ou outro
166
relacionado. Atualmente, a dimensão custo se refere a um alvo móvel, que vem sendo
forçado para baixo constantemente, forçando as organizações a redefinirem suas
operações, reduzindo constantemente o comprometimento de recursos com despesas
fixas ou estoques (vide Figura 5.1).
A dimensão qualidade também está presente nos modelos clássicos de administração.
Na verdade, um dos grandes pontos fortes do taylorismo-fordismo foi melhoria na
qualidade dos produtos (WOMACK et al, 1992). No fordismo, a melhoria da
qualidade foi resultado da redução da variabilidade de componentes e da integração
vertical realizada; no taylorismo, a análise de tarefas e o estudo de tempos e
movimentos geraram um aumento na qualidade, no sentido em que as pessoas,
passando a desempenhar tarefas simples e rotineiras, conseguiram realizar um
trabalho mais padronizado, portanto livre de grande variabilidade. Entretanto, com o
desenvolvimento das novas tecnologias de gestão da produção e de novas tecnologias
sociais de gestão do trabalho humano, normalmente associadas ao modelo japonês de
administração, a dimensão qualidade foi forçada para cima, assumindo também um
caráter sistêmico, mais dinâmico e central na competitividade das organizações
(Figura 5.1).
167
Figura 5.1 - Modelo Heurístico da Crise do Capitalismo e suas Repercussões
Esgotamento
do Modelo
Clássico
Globalização
Crise do
Capitalismo
Desenvolvimento
Científico e
Tecnológico
Organização
Novas Demandas:
• Menores Custos
• Maior Qualidade
• Maior Agilidade
Práticas Inovadoras
de Administração do
Desempenho e da
Qualidade
Práticas Inovadoras
de Administração de
Pessoas
Melhor Desempenho
Práticas Inovadoras
de Administração do
Processo Produtivo
Resultados
Percebidos
(Aprendizagem)
Padrões de Adoção
de Práticas
Inovadoras de
Administração
Inovadores
Ofensivos
Inovadores
Seletivos
Inovadores
Retardatários
Conservadores
Fonte: Elaboração própria com base em revisão de bibliografia desta tese
Outros Padrões
168
A dimensão responsividade, por último, não aparece nos modelos tradicionais,
focados na burocracia e previsibilidade das operações. Conforme o ambiente das
organizações se torna mais complexo e turbulento, a capacidade de modificar suas
operações e ajustar seus produtos para atender a requisitos especiais de seus mercados
ganha espaço nas estratégias de organizações, de modo a garantir sua sobrevivência.
Da mesma maneira, conforme as organizações se expandem geograficamente, tornase cada vez mais importante a capacidade de ajustar operações internacionais a
contextos locais, e a reagir rapidamente a mudanças ocorridas nesses contextos como
forma de garantir não somente a sobrevivência organizacional, mas, também, seu
crescimento (Figura 5.1).
Têm sido criados novos modelos e práticas de administração em organizações do
mundo todo, mais apropriados às condições do novo contexto organizacional. Alguns
autores se esforçaram para classificar práticas inovadoras em taxonomias diversas
(por ex. WATERSON et al, 1997; PEIXOTO, 2004; PAULINYI, 1993). Entretanto, a
diversidade e a complexidade de práticas existentes tornam complexa essa tarefa.
Apesar desses obstáculos, adotou-se como ponto de partida, nesta tese, a classificação
das 12 (doze) práticas gerenciais pesquisadas apresentada em Loiola et al (2003b).
Essas 12 (doze) práticas foram classificadas em três grupos: práticas inovadoras de
administração de pessoas, práticas inovadoras de administração das operações e do
processo produtivo, e práticas inovadoras de administração da qualidade e do
desempenho.
Práticas inovadoras de administração de pessoas são voltadas para a obtenção de
maior envolvimento e comprometimento dos funcionários para com a empresa e seus
resultados. Depois da queda do modelo de relações industriais, focado na
intermediação das relações entre empregados e empregadores, com a participação dos
169
sindicatos, práticas de administração de recursos humanos têm buscado acionar novos
mecanismos para envolver e comprometer os funcionários com os objetivos
organizacionais. Dessa forma, a remuneração por resultados, a avaliação do
desempenho e a qualidade de vida no trabalho tornam-se aspectos-chave de modelos
gerenciais mais avançados, assim como a preocupação com o aprendizado individual
e organizacional, e o trabalho em equipe. Muitas dessas práticas associam-se ao
modelo japonês de administração e ao modelo norte-americano de relações humanas
(APPELBAUM e BATT, 1994).
Práticas inovadoras de gestão de operações e produção também se desenvolveram em
grande escala, recentemente, especialmente como decorrência de aplicações de outras
tecnologias na produção industrial, como a robótica e a tecnologia da informação
(CAD, CAM e CIM, por exemplo) (WOMACK et al, 1992; KUMAR, 1997). Essas
práticas visam aprimorar o processo operacional das organizações, reduzindo tempos
de ciclos, melhorando sua capacidade produtiva e reduzindo custos, além de
aprimorar a agilidade do lançamento de novos produtos. A incorporação dessas
tecnologias no processo produtivo desdobra-se, muitas vezes, em novas formas de
organizar o trabalho humano na fábrica, como a utilização de equipes e trabalhadores
multi-funcionais, a organização do trabalho em células de produção, ao invés da
organização típica linear existente no modelo tradicional.
Têm surgido, ainda, práticas voltadas ao aprimoramento do desempenho
organizacional como um todo, melhorando operações e processos, também reduzindo
tempos de ciclos industriais e não industriais. Normalmente mais abrangentes, tais
práticas tendem a modificar profundamente a organização, incluindo reestruturações e
reformulações de processos e tarefas, a formação de parcerias com fornecedores, a
externalização de atividades (terceirização), mudanças culturais e adoção intensiva de
170
tecnologia da informação em funções administrativas e em comunicação. Práticas
como reengenharia, terceirização, gestão da qualidade total e just in time são
exemplos dentro do grupo de práticas.
Ao adotarem práticas inovadoras de gestão, ao longo do tempo, as organizações
desenvolvem um repertório de experiências bem ou mal sucedidas, o que,
provavelmente, determina, em algum nível, sua propensão em relação à adoção de
novas práticas inovadoras. Resultados bem sucedidos, provavelmente, geram um
feedback positivo, que torna a empresa receptiva a novas práticas, levando a maior
atenção em relação a novidades emergentes. Essas empresas tenderão a canalizar
maior volume de recursos na busca e experimentação de metodologias surgidas em
outros mercados e em outras organizações. Espera-se que as organizações que
possuem maior número de experiências bem sucedidas façam, com maior freqüência,
comparações e estudos com outras organizações (benchmarks), a fim de obterem novo
conhecimento e aplicá-lo em suas operações. Não se pode negligenciar, contudo,
conforme também ressaltado pela revisão de literatura desta tese, que o sucesso em
utilização de tecnologia pode funcionar, em alguns casos, como incentivo à
manutenção de foco das empresas nessas tecnologias. A literatura tem se reportado a
esse fenômeno como “armadilha do conhecimento” ou “barreiras à aprendizagem”
(CHRISTENSEN , 2001). Por outro lado, pode ser que organizações que possuam um
repertório menos bem sucedido apresentem um comportamento mais conservador e
resistam à adoção de novas práticas. Essas organizações tenderão a focalizar-se na
imitação de técnicas e métodos já consagrados ou, então, a não buscar inovação de
maneira ativa e intencional.
Conforme discutido, a adoção de práticas inovadoras tem sido uma tendência
crescente no mundo desde o final da década de 1970. No Brasil, em especial, a partir
171
da década de 1990, tornou-se mais intensa, conforme as barreiras comerciais e
alfandegárias foram sendo reduzidas ou eliminadas. Entretanto, a mera utilização de
práticas inovadoras não garante a obtenção de resultados positivos de desempenho
operacional ou financeiro. Essa relação é complexa, sofrendo, freqüentemente,
influências de múltiplos fatores de dentro e de fora das empresas.
Certamente, a adoção de novas práticas exige um deslocamento de recursos de outras
áreas da organização, como P&D e marketing, e deve ser analisada como qualquer
outro investimento. Sob a ótica estratégica, esse investimento representa um esforço
de melhoria na posição competitiva da adotante, seja como forma de se diferenciar da
concorrência, adquirindo vantagens competitivas, ou como forma de recuperar terreno
frente à evolução de seus concorrentes, também fortalecendo sua posição competitiva.
Operações mais ágeis, custos mais baixos e maior qualidade – objetivos esses
buscados por meio da adoção de práticas inovadoras de um modo geral – representam
vantagens, que podem garantir a sobrevivência e o sucesso de uma organização em
determinados ambientes. Sob a ótica financeira, o investimento em novas práticas
deve proporcionar ganhos de produtividade que reflitam um retorno financeiro, cujo
saldo deve ser, ao menos no longo prazo, superior ao valor investido, acrescentado de
juros de mercado. Esses postulados parecem valer para as empresas pioneiras, tendo
em vista que a literatura revisada nesta tese também aponta uma tendência à imitação
por parte de adotantes retardatários. Mas em um ou outro caso, sempre o processo de
adoção é afetado pelo aprendizado, que, como já se viu, também é localizado e
específico a cada empresa.
Pesquisas no Brasil sobre adoção de novas práticas de gestão ainda são escassas,
configurando-se, quase que exclusivamente, como estudos de caso de sucesso.
Também são escassas pesquisas mais abrangentes sobre a adoção dessas práticas, de
172
forma isolada e, principalmente, por grupos ou clusters de práticas, objetivando
evidenciar seus padrões. Persistem, portanto, muitas questões em aberto sobre o
fenômeno de adoção e a relação entre adoção de novas práticas de gestão e
desempenho operacional e financeiro, justificando-se a realização de pesquisas e
estudos que venham a permitir uma compreensão mais clara sobre tal fenômeno e tais
relações.
Assim, após uma década e meia de experiência com o uso de novas práticas gerenciais
no Brasil, é necessário averiguar o quanto as organizações têm utilizado essas
práticas, em que grau essas práticas as têm auxiliado, e quais as tendências em relação
a seu uso futuro. Sendo assim, o objetivo geral desta tese é: identificar padrões de
adoção e a relação entre o uso de práticas inovadoras e o desempenho, operacional e
financeiro de organizações industriais. Pode-se supor que a utilização de práticas
inovadoras esteja associada, em alguma medida, aos resultados gerenciais de
desempenho operacional e de desempenho financeiro. A adoção de novas práticas
leva à suposição de que é vantajoso para a organização fazê-lo, como forma de obter
ganhos de produtividade ou de eliminar gaps de desempenho em relação a seus
concorrentes.
A adoção de práticas gerenciais em empresas de vários países vem sendo investigada
por muitos estudiosos, com diversas metodologias. Por exemplo, muito tem sido
discutido sobre o chamado modelo japonês de administração (p.ex. WOMACK et al,
1992, CORIAT, 1990, KUMAR, 1997), fonte de práticas como gestão da qualidade
total e just in time, considerado por esses autores como uma das explicações do
apogeu do Japão como potência econômica mundial no pós Segunda Grande Guerra
Mundial. Há também muitos trabalhos que discutem a implantação de práticas
originárias do Japão em países ocidentais, especialmente nos Estados Unidos da
173
América, em empresas que são consideradas o berço do modelo clássico de
administração (por ex. ADLER, 1993:2000). É possível encontrar, ainda, publicações
destinadas a investigar o surgimento de outros modelos, em outros países, como nos
Estados Unidos da América, na Suécia (WOOD JR. e URDAN, 1994; BERGGREN,
1993), e na Alemanha (APPELBAUM e BATT, 1994) ou em outros países (KEEP e
PAYNE, 2002), e sua disseminação (ICHNIOWSKI et al, 1996). No Brasil, a maioria
dos estudos desenvolvidos é estudo de caso, que foca cada prática de forma isolada,
embora já se tenham registros de resultados de pesquisas com objetos mais
abrangentes e cobrindo séries temporais mais longas, conforme já registrado no corpo
desta tese (BASTOS et al, 2004; RIGBY et al, 2003; GITAHY, 2000).
Ainda assim, são escassas no Brasil pesquisas que permitam a apreciação do quadro
geral e que apresentem visões mais abrangentes, ao mesmo tempo longitudinais e
transversais, permitindo identificar peculiaridades sobre o nível de adoção de novas
práticas gerenciais e os resultados percebidos por empresas brasileiras adotantes. É
necessário compreender melhor como as organizações brasileiras têm se portado
frente às mudanças que vêm sendo engendradas no seio da sociedade capitalista e,
especialmente, no tocante à adoção de novas práticas gerenciais. Para tanto, questões
mais específicas ainda aguardam respostas, sobre que práticas têm sido utilizadas por
empresas brasileiras, quais os resultados desejados por parte das organizações que
adotaram tais práticas inovadoras e que resultados têm sido percebidos, assim como
quais as perspectivas de continuidade de uso das mesmas. Assim, o objetivo geral
desta tese desdobra-se nos seguintes objetivos específicos e hipóteses.
•
Comparar os resultados originais da pesquisa, encontrados em Peixoto (2004)
e os resultados obtidos com base na amostra desta tese.
174
Peixoto (2004) relatou resultados sobre a adoção das práticas de gestão enfocadas
nesta tese com base em pesquisa survey cross section, cuja amostra constituiu-se de
220 empresas que possuem acima de 150 funcionários em seu quadro de pessoal.
Assim como Bastos et al (2004), investiga a difusão de doze práticas inovadoras no
Brasil, em relação ao nível de utilização das práticas, tempo de uso, resultados
operacionais – melhorias em qualidade, reduções de custos e melhorias em
responsividade – desejados e percebidos, e propensão à continuidade de uso com as
práticas estudadas.
Esta tese utiliza uma sub-amostra do banco de dados utilizado por Peixoto (2004) e
Bastos et al (2004), contendo somente 98 casos, sobre os quais foram localizadas
informações de desempenho financeiro, em pelo menos três anos, no período 19972003, no periódico Desempenho das Empresas, da Fundação Instituto Miguel Calmon
de Estudos Sociais e Econômicos – ImiC, em suas edições do período de 1997-2003.
Fez-se necessário, portanto, comparar os resultados gerais, relativos ao nível de
adoção, aos resultados percebidos e à propensão à continuidade de uso das práticas
pesquisadas, encontrados por Peixoto (2004) e para a amostra desta tese. A hipótese 1
relacionada a esse objetivo encontra-se registrada a seguir:
H1: Os resultados obtidos por Peixoto (2004) quanto ao nível de utilização, ao
alcance das práticas em relação a melhorias em qualidade, reduções de custos e
melhorias na responsividade e à propensão à continuidade de uso das práticas, são
relativamente mantidos para a amostra desta tese.
•
Investigar o grau de adoção das práticas gerenciais em relação às
características organizacionais e ao desempenho financeiro.
A revisão de bibliografia teórica e empírica realizada nesta tese estimula a percepção
de que diferentes organizações apresentam diferentes experiências com práticas
175
inovadoras, devido a características como porte, localização e origem de capital.
Organizações de maior porte, provavelmente, apresentarão maior propensão à adoção
de práticas inovadoras, como decorrência da necessidade de coordenação das
atividades de um número maior de funcionários ou inter-sites e de maior robustez
financeira para dar suporte à adoção de inovações. De maneira semelhante,
organizações localizadas em estados e regiões, com diferentes históricos e diferentes
trajetórias industriais tenderão a apresentar diferentes comportamentos em relação à
inovação e à adoção de novas práticas de administração.
Organizações de capital nacional no Brasil tenderão a possuir menor acesso a novas
práticas de administração do que organizações que possuam controle acionário em
países pioneiros na geração e adoção de novas práticas gerenciais, uma vez que estas
realizam maior intercâmbio de informações, não somente com suas matrizes
internacionais, mas, também, com fornecedores e clientes internacionais, ocorrendo
maior nível de benchmarking e favorecendo a modernização gerencial. Por último,
espera-se que as organizações usuárias de elevado nível de práticas inovadoras
apresentem diferentes resultados em relação ao desempenho financeiro. A partir
desses argumentos, se constrói a segunda hipótese desta tese:
H2: O grau de adoção das práticas gerenciais pesquisadas é diferenciado por
características organizacionais como localização, gênero industrial, porte,
origem de capital e desempenho financeiro.
•
Agrupar as práticas estudadas de acordo com os padrões de adoção das
empresas brasileiras.
Primeiramente, é necessário verificar se as empresas costumam adotar práticas de
maneira isolada ou em pacotes inovativos, agrupando práticas correlatas em grandes
movimentos de reorganização. Conforme já discutido nesta tese, algumas práticas são
176
abrangentes e incluem subcomponentes de inovações complementares. Por exemplo, a
gestão da qualidade total pode envolver a adoção, como subcomponentes, de uma
série de outras práticas voltadas para a gestão de pessoas, como empowerment, CCQ’s
e alguma forma de remuneração por desempenho. Entretanto, uma empresa pode
decidir adotar algumas dessas práticas como decorrência de uma decisão isolada, sem
adotar a gestão da qualidade total ou just in time ou, de maneira inversa, pode adotar
um projeto de gestão da qualidade que não contemple o empoderamento, nem CCQ’s,
nem formas diferenciadas de remuneração de pessoas. Essa decisão pode incorrer em
resultados satisfatórios ou não, conforme sugere a bibliografia.
Caso as organizações estejam adotando práticas por mero modismo gerencial, é
provável que haja algum tipo de “efeito manada”, no qual todas as organizações
adotam e abandonam as “práticas do momento”, estimuladas por uma publicação ou
por um seminário persuasivo. Ou pode-se esperar que as empresas, por questões de
natureza setorial ou de origem do capital, privilegiem a adoção de práticas vinculadas
à gestão da produção ou à gestão de recursos humanos. Ou ainda, pode-se supor que
empresas no Brasil, filiais de multinacionais, tendam a adotar novas práticas
gerenciais de forma diferenciada das empresas nacionais por estímulo de suas
matrizes. Ou, por último, que quanto maior o porte da empresa maior propensão ela
tenderá à adoção de novas práticas, tendo em vista a existência de um maior aporte de
capital para tais fins, por exemplo.
Todos os argumentos delineados até aqui foram extraídos da revisão de bibliografia
desta tese. Desses argumentos, depreende-se a terceira hipótese desta tese:
H3: As organizações tendem a adotar práticas inovadoras, isoladas ou em pacotes
que se complementam, concentradas em áreas que lhes são mais significativas.
177
• Classificar organizações de acordo com o padrão de adoção de práticas
inovadoras de administração e de produção.
Outro tipo de questão que ainda permanece sem resposta satisfatória é sobre o perfil
de empresas inovadoras no Brasil. Mas, com base na revisão de literatura
empreendida para esta tese, é possível sugerir que haja algum tipo de “padrão” de
adoção de práticas inovadoras, que as organizações adotem comportamentos
semelhantes em relação à experimentação de novos métodos e novas práticas, e que
seja possível identificar esses padrões. Tal suposição não implica negligenciar o fato,
amplamente discutido nesta tese, de que as organizações apresentam condutas
diferenciadas face ao processo inovativo e de adoção de inovações, em função de suas
características internas, em função de fatores de seus ambientes (institucional e
técnico), mas também em função da natureza peculiar do próprio processo de
inovação gerencial, que não é linear, mas, sim, marcado por trajetórias/atividades
convergentes e divergentes.
Assim, decisões estratégicas podem levar as organizações a focar-se em uma ou outra
área da organização, como práticas de gestão de pessoas, ou práticas de gestão da
produção. Outras organizações podem estar mais focadas na redução dos custos, ou na
redução do lead time, e buscam práticas que prometem a obtenção desses resultados,
por exemplo.
É possível esperar que setores da economia proporcionem diferentes estímulos às
organizações atuantes, devido a fatores como o nível e o tipo de concorrência
prevalecente no setor, o nível de obsolescência da tecnologia utilizada, a
disponibilidade de tecnologia nacional ou o acesso a tecnologias desenvolvidas em
outros países, que forçam as empresas a buscar novas soluções. O mesmo pode
ocorrer em relação a regiões onde atuam as empresas.
178
Pode-se sugerir, por exemplo, conforme proposto por Winter (1995), que o tempo de
existência e o porte de uma organização determinem de alguma forma seu
comportamento em relação a novas práticas de administração. É provável, conforme
sugerido por Christensen (2001), que grandes organizações, marcadas por longas
histórias de sucesso, sejam desestimuladas a adotar algum tipo de prática inovadora,
devido à percepção de que o sucesso do passado justifique o sucesso do futuro.
Apesar de possuírem recursos para investir em novas tecnologias, organizações que
operam com produtos do tipo “geradores de caixa” serão desestimuladas a adotar
práticas inovadoras, pois continuam capitalizando sobre produtos e investimentos
realizados no passado, maximizando o retorno sobre o investimento, até que pressões
internas ou externas as forcem a modificar sua atitude em relação aos métodos que
utilizam. Em determinado momento, essas organizações são forçadas a reiniciar seu
aprendizado, reinventando seus produtos e práticas. Por outro lado, organizações
jovens podem apresentar comportamentos mais inovadores, com maior nível de
improvisação e com maior energia para experimentar novos métodos promissores.
Nesses casos, a falta de referências sobre o the one best way elimina resistências à
mudança, facilitando a decisão e a implementação de novas práticas de administração.
Organizações maiores, com participação em diversos países, possivelmente tenderão a
ter mais recursos e acesso a novas tecnologias gerenciais do que pequenas
organizações que atuam em um único país. Em organizações multi-site, por exemplo,
pode acontecer intercâmbio de experiências de sucesso entre as unidades, com
benchmarking interno, cooperação técnica e desenvolvimento de projetos-piloto,
elevando o padrão de desempenho das unidades isoladamente, bem como da
organização como um todo.
179
Sendo assim, é possível investigar que padrões de adoção de inovação podem ser
encontrados no Brasil, permitindo uma identificação de que variáveis explicam os
diferentes padrões de adoção de práticas inovadoras e comparar como as organizações
se assemelham e se diferenciam nesse sentido, levando à quarta hipótese desta tese:
H4: As organizações apresentam certas regularidades de comportamento em adoção
de inovação, relacionadas às suas características estruturais, como porte, setor de
atuação, origem de capital e processo produtivo, às suas estratégias genéricas, além
de às suas experiências com a utilização de práticas inovadoras.
•
Associar os padrões de adoção de práticas inovadoras ao desempenho
operacional e ao desempenho financeiro.
Além de investigar sobre os padrões de adoção de práticas inovadoras no país, é
necessário identificar se essas práticas estão de fato contribuindo para mudanças em
resultados alcançados pelas adotantes.
Se as organizações estão adotando novas
práticas de administração, que resultados, operacionais e financeiros, têm sido
obtidos?
Práticas inovadoras só terão vida longa, em termos de uso, se entregarem a promessa
realizada. Melhores operações, com custos reduzidos, maior rapidez e qualidade, são
as promessas mais comumente verificadas na bibliografia especializada. Bons
resultados obtidos com experiências passadas podem ser, ou não, estímulos fortes para
novas experiências inovadoras. Práticas como terceirização e reengenharia prometem
ganhos imediatos em custos e rapidez de processamento, e seus resultados podem ser
verificados e medidos pouco tempo após sua implementação. Outras práticas,
entretanto, só poderão ter seus resultados avaliados após algum tempo de sua
implantação, os quais poderão não estar, necessariamente, ligados diretamente ou
exclusivamente à sua implementação.
180
A adoção de inovações gerenciais – ou de práticas inovadoras – normalmente é
interpretada como uma decisão apoiada pela percepção de que é possível alcançar
vantagens significativas resultantes na adoção de tais inovações, que reforçarão a
propensão organizacional de continuar a adotar novas práticas, e de sustentar a
utilização de práticas adotadas anteriormente.
Para além da problematização desenvolvida nesta tese, sobre a natureza não apenas
racional do processo de decisão, mas, também, sobre a adoção de inovação pelas
empresas, a decisão sobre a continuidade de uso das inovações gerenciais adotadas
parece requer a capacidade de mensurar o desempenho organizacional, em seus
aspectos tangíveis e objetivos, mais facilmente mensuráveis, e em relação a aspectos
subjetivos e intangíveis, que exigirão um esforço maior para que se capturem nuances
da percepção humana e da satisfação relativa da aplicação dessas práticas no cotidiano
organizacional.
Espera-se que práticas inovadoras contribuam de duas maneiras para as organizações,
abstraindo-se a proposta de Lederer e Rhee (1995) e de Garvin (1984 apud SOUZA e
VOSS, 2002, p.96). Por um lado, práticas inovadoras podem contribuir para melhorias
em processos organizacionais, por exemplo, reduzindo a variabilidade de processos e
de produtos, melhorando a produtividade, aumentando a satisfação dos funcionários,
facilitando o processo de coordenação das atividades da empresa e aumentando a
satisfação dos clientes. Por outro lado, e talvez como resultante do caminho
mencionado antes, espera-se que práticas inovadoras proporcionem ganhos
financeiros que não somente refletirão os ganhos de produtividade auferidos, mas,
ainda, serão reflexo de maior capacidade competitiva e de melhor qualidade de
produtos e serviços, resultantes, também, da adoção de práticas inovadoras
181
Empowerment, por exemplo, é uma prática que é voltada para a agilidade e
responsividade organizacional, no sentido em que permite que as pessoas reajam
rapidamente a situações inesperadas, na busca por um maior nível de ajuste de
operações a peculiaridades locais e momentâneas, mas que não oferece resultados
imediatamente perceptíveis. No longo prazo, e caso a implementação seja bem
sucedida, o empoderamento de pessoas pode, todavia, garantir vínculos mais intensos
com os clientes, que garante a estabilidade de vendas e redução de custos como, por
exemplo, despesas com propaganda.
A gestão da qualidade total, igualmente, nem sempre oferece resultados imediatos,
apesar de a literatura especializada apresentar casos nos quais isso ocorreu (DEMING
1980, WHITELEY, 1991, GERHARDT e TOWSEND, 1993, por exemplo). O
investimento em programas de qualidade, normalmente, representa um investimento
de longo prazo, que apresenta resultados rápidos em termos de redução de custos, mas
não influencia imediatamente os resultados financeiros mais amplos de uma
organização adotante, como a lucratividade e o volume de vendas.
Ademais, alguns indicadores de resultado podem estar associados a objetivos-meio,
como maior rapidez de resposta, estoques mais reduzidos, menor volume de
retrabalho e menores taxas de absenteísmo ou de rotatividade de pessoal.
Os questionamentos desenvolvidos em relação aos comportamentos das empresas
vinculados ao quinto objetivo específico desta tese são evidentes em Peixoto (2004).
Encontrar respostas para eles vai permitir conhecer em maior detalhe o nível de
adoção de práticas organizacionais inovadoras no país, bem como o perfil das
organizações adotantes, os motivos que as levaram a adotar tais práticas, os benefícios
obtidos com essa adoção, bem como as ações levadas à cabo pelas empresas quando
da adoção. O objetivo desta tese, aqui delineado, é estudar as organizações e práticas
182
em conjunto, como forma de apresentar uma visão agregada de seu comportamento. A
hipótese 5, relacionada a este objetivo, é a que se segue.
H5: A adoção de práticas inovadoras associa-se a ganhos de desempenho
operacional e financeiro, que justificam as decisões de adoção, reforçando a
propensão à continuidade de uso.
5.2. Modelo de Análise
As dimensões que compõem o modelo de análise adotado nesta tese são: adoção de
práticas inovadoras no Brasil, práticas inovadoras de gestão do desempenho e da
qualidade, práticas inovadoras de gestão de pessoas, práticas inovadoras de gestão do
processo produtivo, padrões de adoção de práticas inovadoras, resultados percebidos e
propensão à continuidade de uso. A primeira dimensão, Práticas Inovadoras de
Administração do Desempenho e da Qualidade, foi mensurada pela abrangência da
adoção e do tempo de utilização de quatro práticas pesquisadas – reengenharia de
processos, gestão da qualidade total, terceirização e just in time. Já a segunda
dimensão, Práticas Inovadoras de Administração de Pessoas, foi mensurada pela
abrangência da adoção e do tempo de utilização de três práticas pesquisadas –
trabalho em equipe, empowerment e cultura de aprendizagem, enquanto que a terceira
dimensão, Práticas Inovadoras de Administração do Processo Produtivo e das
Relações de Produção, foi mensurada por meio de cinco práticas pesquisadas –
parcerias na cadeia de suprimento (supply-chain management), engenharia
simultânea,
manutenção
produtiva
total,
tecnologia
integrada
baseada
em
computadores e células de manufatura. Essas dimensões serão avaliadas adiante, com
a análise fatorial.
183
Como mencionado, foram investigadas 12 práticas de gestão. A relação dessas
práticas, assim como suas definições encontram-se no Quadro 5.1.
Quadro 5.1 - Definições Operacionais das Práticas de gestão Pesquisadas
Discriminação
Definição
1. BPR – Reengenharia
Redesenho ou racionalização radical do processo de produção para eliminar
práticas e procedimentos desnecessário (mais do que processos mais graduais e
contínuos de melhoria).
2. Parceria na cadeia de
Desenvolvimento de alianças e relações de longo prazo com fornecedores e
suprimento (Supply-chain)
clientes (mais do que negociação de curto prazo).
3. Outsourcing
Contratar a outra empresas certos processos e subprocessos (mais do que fazer
todo internamente).
4. Cultura de Aprendizagem
Promoção de um leque de oportunidades de desenvolvimento para todos os
empregados (mais do que treinar ocasionalmente os funcionários);
5. Empowerment
Transferência de considerável responsabilidade pelo gerenciamento operacional
aos indivíduos ou times (mais do que manter todo o processo decisório em nível
gerencial)
6. Trabalho baseado em Distribuição dos operadores em times cada qual com suas responsabilidades e
equipes
dar a eles liberdade para a distribuição do trabalho entre seus membros.
7. TPM –Total Productive
Envolvimento de todos os operadores em pequenas tarefas de manutenção e
Maintenance
reparo (mais do que ter todas as tarefas de manutenção realizadas por
engenheiros)
8.Engenharia simultânea
Projeto e manufatura de produtos em tempos simultâneos ( mais do que ter
projeto e manufatura como funções separadas).
9. Tecnologias integradas
Ligação entre os equipamentos computadorizados para elevar a integração do
baseadas em computador
sistema (tais como CAD/CAM e FMS)
10. Células de manufatura
Sistema de organização no chão da fabrica no qual um grupo de operários
recebe os recursos para fabricar um produto por inteiro (mais do que a produção
por deslocamento dos produtos entre as áreas funcionais).
11. JIT – Just in time
Produção acionada por demanda direta de clientes internos e externos (diferente
de produzir antecipadamente para manter em estoques).
12. TQM – Gestão da Busca de mudanças contínuas para elevar a qualidade e fazer todo o pessoal
qualidade total
responsável pela qualidade (inclui Kaizen e práticas de melhoria contínua)
Fonte: elaboração com base em Waterson e outros, 1997, p. 2
A quarta dimensão, padrões de adoção de práticas inovadoras, representa os
resultados obtidos com a adoção de práticas inovadoras, neste caso, limitados ao
desempenho organizacional, subdividido em desempenho operacional e desempenho
financeiro. Desempenho operacional representa o quanto a nova prática contribuiu
para o desempenho do processo produtivo como um todo, incluindo melhorias em
qualidade, reduções de custos, e aumento da responsividade. Esta tese adota o
conceito de qualidade em suas múltiplas dimensões, resultantes de um esforço de
melhoria contínua, refletidos na redução das margens de erro e no aumento da
satisfação dos clientes. A variável custo, de forma similar à qualidade, foi considerada
um conceito auto explicativo, e a variável responsividade representa a velocidade de
184
resposta percebida pelos gestores de produção da organização, no atendimento a
necessidades específicas dos clientes, definida ainda como velocidade de resposta aos
clientes, quando os entrevistados apresentaram dúvidas sobre o conceito.
O desempenho financeiro, por sua vez, foi avaliado com três indicadores que são
usualmente utilizados em análises industriais: lucratividade, rentabilidade sobre o
patrimônio e rentabilidade sobre a receita. O indicador de lucratividade utilizado é o
lucro líquido do exercício, já descontado o Imposto de Renda, constante no balanço
apresentado pela empresa. Além do lucro líquido, outros índices utilizados incluem a
rentabilidade sobre a receita e sobre o patrimônio líquido, que se referem à divisão do
lucro, antes do resultado financeiro, pela receita operacional líquida e pelo patrimônio
líquido, respectivamente.
Por último, a dimensão propensão à continuidade de uso, que representa o quanto a
organização acredita que continuará utilizando as práticas investigadas.
Registra-se, ainda, que o modelo heurístico de análise incorpora a percepção de que a
difusão liga-se a aprendizado e, consequentemente, a melhorias incrementais nas
práticas adotadas, o que, por sua vez, favorece o processo de difusão, ainda que esse
processo se dê a ritmo, intensidade e direção variáveis entre indústrias, empresas,
regiões e países. A percepção de efeitos relacionados à adoção de práticas levará a um
mecanismo de aprendizado, tanto para mais (feedback positivo) quanto para menos
(feedback negativo), estimulando tanto a ampliação de uso da prática em questão
quanto a adoção de novas práticas inovadoras, que oferecem potencial semelhante de
proporcionar melhorias significativas, conforme sugere a literatura revisada para esta
tese.
Por fim, não se pode encerrar a apresentação do modelo heurístico desta tese, que se
associa a duas dimensões de desempenho organizacional – operacional e financeiro, –
185
sem fazer referências a dificuldades de delimitação e de operacionalização desse
conceito. Isso ocorre por vários motivos. Primeiramente porque o conceito de
desempenho engloba aspectos intangíveis, que não são facilmente mensuráveis. Além
disso, porque qualquer definição de desempenho terminará em escolhas que
certamente deixarão aspectos importantes fora da análise, reduzindo sua validade
teórica e capacidade de generalização. Por último, para que seja possível avaliar
concretamente os resultados obtidos com a difusão de práticas inovadoras, é
necessário ter uma visão do grande quadro, considerando aspectos agregados, de
natureza meso e macro, que tipificam setores industriais ou economias nacionais.
186
Figura 5.2 – Modelo Heurístico de Análise
Adoção de
Praticas
Inovadoras no
Brasil (H1)
H3
H2
H3
Características
Organizacionais
(Porte, localização ,
origem de capital...)
H3
Práticas
Inovadoras de
Adm. do Desemp.
e da Qualidade
Práticas
Inovadoras de
Administração de
Pessoas
Práticas
Inovadoras de
Adm. do Processo
Produtivo
Reengenharia
Terceirização
Just in Time
Gestão da Qualidade Total
Parcerias na Cadeia de
Suprimento
Trabalho em Equipe
Cultura de Aprendizagem
Empowerment
Células de Manufatura
Manutenção Produtiva Total
Engenharia Simultânea
Tecnologia Inegrada (CIM)
H4
Padrões de
Adoção de
Práticas
Inovadoras
H5
Melhor Desempenho Financeiro
Aumento da Receita
Aumento da Lucratividade
Aumento do Retorno sobre o
Patrimônio e sobre a Receita
H5
Resultados
Percebidos
(learn by using)
H5
Melhor Desempenho
Operacional
Maior Qualidade
Menores Custos
Maior Responsividade
H5
Propensão à
Continuidade de
Uso
Fonte: Elaboração própria
5.3. Universo e amostras
Parte dos dados utilizados nesta tese compõe banco de dados de projeto de pesquisa,
articulado com uma pesquisa internacional, em desenvolvimento pelo ESRC – Centre
187
for Organization and Innovation do IWP -- Instituto de Psicologia do Trabalho da
Universidade de Sheffield, Inglaterra. A difusão de sua metodologia tem sido
incentivada. Para tanto, têm sido realizadas muitas parcerias entre o ESRC e outros
centros de pesquisa de universidades estrangeiras. O Brasil encontra-se integrado a
essa rede de pesquisa (WATERSON et al, 1997), com o apoio do CNPq. Trata-se de
pesquisa survey descritiva, cross section, sobre práticas de gestão da produção e do
trabalho em diversos países envolvidos, buscando identificar o nível de difusão de 12
práticas selecionadas – Reengenharia, Terceirização, Células de Manufatura,
Tecnologia Integrada por Computador (CIM), Qualidade Total, Parceria na Cadeia de
Suprimento, Cultura de Aprendizagem, Trabalho em Equipe, Engenharia Simultânea,
Just in Time, Empowerment, Manutenção Preventiva Total.
A pesquisa no Brasil buscou ter uma abrangência nacional, atingindo todos os estados
da Federação. Assim, a unidade de análise, base para definição da amostra, consistiu
em empresas industriais de médio e grande porte, com 150 ou mais empregados,
atuando no Brasil, independente do controle do seu capital ser ou não nacional. Na
ausência de uma base disponível de dados nacionais, para definir a população,
trabalhou-se com várias bases de dados, como, por exemplo, os cadastros das
Federações Estaduais das Indústrias, a relação das “Maiores e Melhores” da Revista
Exame, e ainda o cadastro do Instituto Miguel Calmon – IMiC. Todas essas bases se
revelaram incompletas no tocante a informações críticas para a delimitação do
universo da pesquisa, sobretudo no que se refere ao quantitativo atualizado de
empregados. Em conseqüência, durante o próprio processo de coleta de dados, se
tornou necessário atualizar esse tipo de informação, levando a exclusão de algumas
empresas inicialmente selecionadas, que não se incluíam no tamanho desejado quanto
ao número de empregados.
188
Com base nos cadastros disponíveis, foi possível delimitar uma população de 4.637
empresas estratificadas por gênero industrial (segundo categorias do IBGE – CNAE –
Cadastro Nacional de Atividades Econômicas) e número de empregados. O tamanho
da amostra, considerando um erro de aproximadamente 5%, foi definido como 300
empresas, que foram selecionadas de forma aleatória estratificada. No entanto, 80
empresas do total antes mencionado ou não foram localizadas ou foram localizadas e
não aceitaram participar da pesquisa por diversas razões, sendo as mais freqüentes o
tempo envolvido para responder ao questionário e à modalidade de entrevista por
telefone. Assim, a amostra inicial da pesquisa ficou reduzida a 220 empresas do setor
industrial, com mais de 150 empregados, distribuídas em 14 estados.
Apesar de se buscar preservar uma representatividade da amostra com relação aos
diversos segmentos industriais e ao peso de cada estado na composição do PIB
nacional, houve discrepâncias entre o planejado e o realizado, pois, em uma pesquisa
com essas características, a amostra somente é definida a posteriori, uma vez que não
se pode controlar a disponibilidade das empresas para a realização de entrevistas.
As entrevistas das empresas no Brasil foram realizadas com os responsáveis pela área
industrial – principalmente os seus Diretores Industriais, por telefone, replicando a
mesma metodologia utilizada pelo IWP. Apesar de haver problemas potenciais, em
relação à utilização de somente um executivo responder às questões sobre toda a
organização derivadas da possibilidade de que sua visão não represente a opinião de
todos, ou a realidade sobre a experiência organizacional com práticas inovadoras
(KING e ANDERSON 1995; ROGERS 1995), a pesquisa buscou minimizar esses
problemas. Os entrevistados não tinham acesso ao menu de respostas de cada
pergunta, cabendo ao entrevistador direcionar a seqüência das questões de acordo com
alternativas previamente definidas. Para assegurar relativa coerência, todos os
189
entrevistadores foram treinados sobre a dinâmica da entrevista e questões conceituais
envolvidas.
Mas, para efeito de realização desta tese, ao conjunto informações levantadas pelo
instrumento, tipicamente objetivas, foram acrescentadas outras relativas ao
desempenho financeiro das empresas respondentes – lucro anual, rentabilidade sobre
o patrimônio e rentabilidade sobre a receita. Essas últimas informações foram
coletadas apenas em 98 empresas relativas a, pelo menos, três anos, com base no
periódico “Desempenho das Empresas”, em suas edições do período de 1997-2003, da
Fundação Instituto Miguel Calmon de Estudos Sociais e Econômicos. Dada a grande
variabilidade, os dados assim coletados foram ajustados em escalas, variando, por
exemplo, de “grande prejuízo” ou “grande redução”, com escore igual a 1, até “grande
lucro” ou “grande crescimento”, com escore igual a 7.
Sendo assim, a amostra final desta tese, com 98 empresas, é do tipo não probabilístico
por conveniência, tendo sido comparada à original e à distribuição nacional de
empresas, conforme apresentado na seção 6.1, como forma de identificar se as
propriedades da amostra original estão presentes na final.
5.4. Instrumento de coleta de informações e sistemática de análise dos dados
O instrumento, integrado principalmente por itens fechados, envolve uma matriz com
as doze práticas selecionadas, sobre as quais foram feitas várias perguntas específicas
que buscam identificar o uso, a efetividade e as razões para introdução das práticas
nas organizações. O instrumento foi testado, permitindo ajustes na formulação das
questões e nas categorias utilizadas para registro das informações coletadas. Os dados
coletados são de natureza quantitativa e descritiva, utilizando-se primeiramente
190
rotinas simples do SPSS (Statistical Package for Social Sciences) para cálculos de
freqüências e medidas de associações entre variáveis.
A análise dos dados, de natureza quantitativa multivariada, dividiu-se em quatro
etapas, de acordo com as hipóteses apresentadas. Inicialmente, foi realizada uma
análise das médias e da distribuição de freqüência das variáveis estado, região, setor,
origem do capital e número de funcionários da sub-amostra de 98 empresas,
comparando os resultados com aqueles referentes à amostra original (220 empresas),
para checar se as propriedades da última estão presentes na primeira. Esta análise
incluiu, ainda, a comparação dos mesmos dados com dados sobre o desempenho
industrial, conforme apresentado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE, de modo a verificar as características das amostras em relação ao ambiente
industrial brasileiro. A análise de freqüências incluiu, ainda, a análise da difusão das
doze práticas estudadas, o nível de satisfação em relação à adoção das práticas, com
os objetivos de redução de custos, de aumento na responsividade e de aumento na
qualidade, e ainda a propensão à continuidade de uso, também comparativamente à
amostra original (220 empresas) e à amostra final (98 empresas). Ainda foram
comparadas as médias de adoção de práticas com as variáveis descritivas (estado,
região, setor, número de funcionários e origem do capital).
Em seguida, foi realizada a análise fatorial com variáveis referentes ao nível de
adoção das práticas investigadas, no sentido de identificar quantos construtos
emergiram de sua combinação. O pressuposto dessa análise era testar novamente os
resultados apresentados em Loiola et al (2003b), de que as doze práticas se referiam
somente a três construtos: a adoção de práticas de gestão do desempenho e da
qualidade, a adoção de práticas de gestão de pessoas e a adoção de práticas de gestão
da produção e operações.
191
Foram criados indicadores para comparar as organizações respondentes, identificando
padrões de comportamento com a análise de clusters, ou análise de conglomerados.
Por último, foi realizada a combinação das variáveis envolvidas no trabalho, com a
modelagem de equações estruturais, que permitiu identificar relações de associação
entre elas, identificando relações de dependência que não eram visíveis inicialmente.
6. Resultados e discussão
6.1. Caracterização das amostras
A amostra desta tese é não probabilística por conveniência, tendo sido extraída de
amostra de 220 empresas industriais em operação no Brasil, em 2002, que serviu de
base ao trabalho desenvolvido por Peixoto (2004), conforme já foi registrado no item
5. 4 desta tese.
Uma das preocupações relativas à eliminação de casos em qualquer amostra é quanto
a manutenção de suas propriedades originais. Para investigar esse problema, foram
comparadas as empresas da amostra desta tese, contendo 98 empresas, com as da
amostra do trabalho desenvolvido por Peixoto (2004), que contém 220 empresas, de
forma a investigar suas propriedades. A amostra desta tese foi, ainda, comparada com
a distribuição nacional de empresas industriais entre regiões, estados e setores
industriais (Tabelas 6.1 a 6.6), também com foco nas propriedades de ambas.
O maior número de casos da amostra desta tese advém do estado de São Paulo – 31
casos ou 31,6% do total, seguido por Bahia, que apresenta 14 casos (14,3%), Rio de
Janeiro, de onde se originam 11 casos (11,2%), Rio Grande do Sul, que apresenta 10
casos (10,2%), Paraná (8 casos ou 8,2%), Minas Gerais e Ceará (cada um
apresentando 6 casos ou 6,1%), Santa Catarina (com 5 casos ou 5,1%), Amazonas
(somente 3 casos ou 3,1%) e Distrito Federal (com 2 casos ou 2% da amostra). Há,
ainda, uma empresa de Pernambuco e uma do Maranhão (1,0% cada), conforme a
Tabela 6.1.
Em relação à distribuição relativa do total de empresas industriais entre as diferentes
unidades da federação brasileira e a amostra desta tese, identificaram-se diversas
variações: aumentos de representação relativa dos estados do Amazonas, Bahia,
Ceará, Distrito Federal, Maranhão e Rio de Janeiro, e reduções das participações
relativas dos estados de Espírito Santo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do
Norte e Santa Catarina, este último em menor escala na amostra desta tese. O Paraná,
Rio Grande do Sul e São Paulo tiveram sua representatividade razoavelmente mantida
na amostra desta tese, ainda em comparação com a distribuição relativa nacional.
Tabela 6.1 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004), Amostra Tese e a
Distribuição Nacional: Local de Atuação
Amostra Peixoto (2004)
Amostra Tese
Distribuição
Nacional1
Freq.
Perc.
680
0,5%
3714
2,5%
3024
2,1%
886
0,6%
3065
2,1%
626
0,4%
17952 12,3%
12120
8,3%
3432
2,3%
3654
6,6%
1130
0,8%
14909 10,2%
11410
7,8%
50397 34,5%
Estado
Freq.
% Válido Freq. % Válido
Amazonas
4
1,84%
3
3,06%
Bahia
30
13,82%
14
14,29%
Ceará
10
4,61%
6
6,12%
Distrito Federal - Brasília
5
2,30%
2
2,04%
Espírito Santo
1
0,46%
0
0%
Maranhão
1
0,46%
1
1,02%
Minas Gerais
7
3,23%
6
6,12%
Paraná
31
14,29%
8
8,16%
Pernambuco
1
0,46%
1
1,02%
Rio de Janeiro
30
13,82%
11
11,22%
Rio Grande do Norte
2
0,92%
0
0%
Rio Grande do Sul
22
10,14%
10
10,20%
Santa Catarina
24
11,06%
5
5,10%
São Paulo
49
22,58%
31
31,63%
Soma
217
100%
98
100%
Missing Cases
3
0
Total
220
98
Fonte: Dados da Pesquisa
1
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Indústria, Pesquisa Industrial Anual Empresa 2000-2001.
Em relação aos estados que compõem a amostra do trabalho de Peixoto (2004),
somente dois estados foram eliminados da amostra desta tese, Espírito Santo e Rio
Grande do Norte, que apareciam com uma e duas indústrias, respectivamente. Sendo
assim, somente doze estados estão representados na amostra utilizada para investigar
a relação entre adoção de práticas inovadoras e desempenho operacional e financeiro.
Apesar de ter havido variações na representação relativa dos estados na composição
da amostra desta tese, especialmente em comparação àquela de Peixoto (2004),
194
considera-se que a amostra desta tese mantém satisfatoriamente as características
originais.
Dentre as 98 organizações industriais pesquisadas nesta tese, 48 estão situadas na
Região Sudeste (49,0%), 23 na Região Sul (23,5%), 22 na Região Nordeste (22,4% ),
3 na Região Norte (3,1 %) e somente 2 na Região Centro Oeste (2,0%). Percebe-se
que as regiões Sudeste e Norte tiveram sua participação relativa aumentada na
amostra desta tese, enquanto que a região Sul teve sua representatividade
significativamente reduzida, em comparação com a amostra de Peixoto (2004).
(Tabela 6.2).
Tabela 6.2 – Comparação entre a Amostra de Peixoto (2004), Amostra desta Tese
e Distribuição Nacional: Região
Amostra Peixoto (2004)
Amostra Tese Distribuição Nacional1
Freq.
% Válido Freq. % Válido
Freq. % Válido
Sudeste
84
38,7%
48
49,0%
81068
55,4%
Sul
80
36,9%
23
23,5%
38439
26,3%
Nordeste
44
20,3%
22
22,4%
14980
10,2%
Norte
4
1,8%
3
3,1%
3762
2,6%
Centro-oeste
5
2,3%
2
2,0%
7976
5,5%
Total
217
98
Missing Cases
3
Total
220
98
Fonte: Dados da Pesquisa
1
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Indústria, Pesquisa Industrial Anual Empresa 2000-2001.
Comparando-se a amostra desta tese com a distribuição nacional de empresas por
região, percebe-se, também, pequenas variações nas participações relativas de
empresas das regiões Sudeste, Sul e Norte (Tabela 6.2). As variações em relação às
regiões Nordeste e Centro-oeste foram muito significativas Quanto a essas
propriedades, cabe registrar, também, que já na amostra de Peixoto (2004) esses
diferenciais estavam presentes.
O ramo mais representado na amostra desta tese é o de metalurgia básica, com 16
empresas (16,3%), seguido pelo de produtos químicos, que apresenta 14 empresas
(14,3%), produtos alimentícios e bebidas, com 13 casos (13,3%), produtos de
195
minerais não-metálicos, com 10 empresas (10,2%). Em seguida, aparece o ramo de
celulose, papel e produtos de papel, com 6 casos (6,1%), os de produtos têxteis,
artigos de borracha e plástico e produtos de metal, que apresentam 5 casos cada (5,1%
cada), os de máquinas e equipamentos e material eletrônico e de comunicação, que
apresentam 4 casos cada um (4,1% cada) e os de edição, impressão e reprodução de
gravações, máquinas, aparelhos e materiais elétricos e móveis e indústrias diversas,
participando, cada um, com 3 casos (3,1%).
Por último, aparecem os ramos de preparação de couros e fabricação de artefatos de
couros, artigos de viagem e calçados e equipamentos de instrumentação, precisão e
automação industrial, com dois casos cada (2,0% cada), e de confecção de artigos de
vestuário e acessórios, fabricação de produtos de madeira e fabricação e montagem de
veículos automotores, que aparecem, cada um, com somente 1 único caso (1,0% cada
– veja Tabela 6.3).
Em relação aos ramos industriais, somente o ramo de Produtos de Fumo foi eliminado
da amostra desta tese em comparação à amostra adotada por Peixoto (2004), sendo
que este aparecia com apenas uma indústria na amostra referida por último. Em
relação aos demais ramos presentes na amostra de Peixoto (2004), na amostra desta
tese ganham maior participação relativa os de Edição, Impressão e Reprodução de
Gravações, Fabricação de Produtos Químicos, Metalurgia Básica e Fabricação de
Produtos de Metal – Exclusive Máquinas e Equipamentos, enquanto que os que
tiveram sua participação relativa ligeiramente reduzida foram os de Confecção de
Artigos do Vestuário e Acessórios, Fabricação de Produtos de Madeira, Fabricação de
Máquinas e Equipamentos, Fabricação e Montagem de Veículos Automotores e
Fabricação de Móveis e Indústrias Diversas. Os demais ramos tiveram sua
participação relativamente mantida (Tabela 6.3).
196
Comparando-se a amostra desta tese ao cenário nacional como um todo, percebe-se
que os setores de Fabricação de Produtos Alimentícios e Bebidas, Confecção de
Artigos do Vestuário e Acessórios, Preparação de Couros e Fabricação de Artefatos
de Couros, Artigos de Viagem e Calçados, Fabricação de Produtos de Madeira,
Edição, Impressão e Reprodução de Gravações, Fabricação de Produtos de Metal –
Exclusive Máquinas e Equipamentos e Fabricação de Móveis e Indústrias Diversas
tiveram participação relativa menor em relação à do cenário nacional. Já os ramos de
Fabricação de Produtos Têxteis, Fabricação de Produtos Químicos, Fabricação de
Produtos de Minerais Não-Metálicos, Metalurgia Básica, Fabricação de Máquinas,
Aparelhos e Materiais Elétricos, Fabricação de Material Eletrônico e Equipamentos de
Comunicação e Equip. de Instrumentação, Precisão e Automação Industrial tiveram
participação relativa maior, em especial o setor de Metalurgia Básica,cuja
participação relativa foi da ordem de oito vezes a maior. Os setores de Fabricação de
Artigos de Borracha e Plástico, Fabricação de Produtos de Minerais Não-Metálicos,
Fabricação de Máquinas e Equipamentos, Equipamentos de Instrumentação, Precisão
e Automação Industrial e Fabricação e Montagem de Veículos Automotores,
Reboques e Carrocerias apresentaram participação proporcionalmente equivalentes
(Tabela 6.3).
197
Tabela 6.3 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004), Amostra desta Tese e
Distribuição Nacional: Gêneros Industriais
Amostra Peixoto
(2004)
Gêneros Industriais7
15
Fabricação de Produtos Alimentícios e Bebidas
16
Fabricação de Produtos do Fumo
17
Fabricação de Produtos Têxteis
Freq.
Amostra Tese
Freq.
27
%
Válido
12,27%
1
0,45%
0
0%
218
0,2%
13
5,91%
5
5,10%
5031
3,5%
13
%
Válido
13,27%
Distribuição
*
Nacional
Freq.
%
Válido
24226
17,0%
18
Confecção de Artigos do Vestuário e Acessórios
5
2,27%
1
1,02%
18741
13,1%
19
4
1,82%
2
2,04%
6111
4,3%
20
Preparação de Couros e Fabricação de Artefatos de Couros,
Artigos de Viagem e Calçados
Fabricação de Produtos de Madeira
21
Fabricação de Celulose, Papel e Produtos de Papel
22
Edição, Impressão e Reprodução de Gravações
5
2,27%
3
23
Fabricação de Produtos Químicos (23/24)
23
10,45%
14
25
Fabricação de Artigos de Borracha e Plástico
14
6,36%
5
26
Fabricação de Produtos de Minerais Não-Metálicos
18
8,18%
27
Metalurgia Básica
28
12,73%
28
Fabricação de Produtos de Metal – Exclusive Máquinas e
Equipamentos
Fabricação de Máquinas e Equipamentos
7
16
29
6
2,73%
1
1,02%
8331
5,8%
12
5,45%
6
6,12%
2738
1,9%
3,06%
7871
5,5%
14,29%
6514
4,6%
5,10%
6880
4,8%
10
10,20%
12515
8,8%
16
16,33%
2594
1,8%
3,18%
5
5,10%
12462
8,7%
7,27%
4
4,08%
7465
5,2%
31
Fabricação de Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos
7
3,18%
3
3,06%
2670
0,9%
32
Fabricação de Material Eletrônico e Equipamentos de
de Comunicação
Equip. de Instrumentação, Precisão e Automação Industrial
9
4,09%
4
4,08%
1006
0,7%
5
2,27%
2
2,04%
1340
0,9%
Fabricação e Montagem de Veículos Automotores,
Reboques e Carrocerias
Fabricação de Móveis e Indústrias Diversas
8
3,64%
1
1,02%
2860
2,0%
12
5,45%
3
3,06%
11604
8,1%
220
100%
98
100%
33
34
36
Total
Fonte: Dados da Pesquisa
* Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Indústria, Pesquisa Industrial Anual
- Empresa 2000-2001.
A composição da amostra final desta tese apresenta 35 empresas que possuíam entre
250 e 499 funcionários (35,71%), 29 empresas, entre 150 e 249 funcionários
(29,59%), 24 casos de empresas, entre 500 e 999 funcionários, e somente 10 casos de
empresas, a partir de 1000 funcionários (Tabela 6.4).
Em relação ao número de funcionários, a amostra desta tese manteve
aproximadamente a mesma proporção em relação à amostra de Peixoto (2004), com
ligeira representação a maior de empresas com maior número de funcionários.
Empresas com 150 a 249 funcionários tiveram sua participação relativa reduzida,
enquanto que empresas com 500 a 999 funcionários tiveram sua participação relativa
7
De acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE
198
aumentada e as duas últimas categorias de número de funcionários se mantiveram
relativamente estáveis (Tabela 6.4).
Tabela 6.4 – Comparação entre a Amostra Peixoto (2004) e a Amostra Tese:
Faixas por Número de Funcionários
Amostra Original
Amostra Final
Freq. % Válido Freq. % Válido
Faixa N° de
Func.
de 150 a 249
86
de 250 a 499
73
de 500 a 999
41
mais de 1000
20
Total
220
Fonte: Dados da Pesquisa
39,09%
33,18%
18,64%
9,09%
100
29
35
24
10
98
29,59%
35,71%
24,49%
10,20%
100
Percebe-se, em relação à distribuição nacional de empresas por número de
funcionários (tabela 6.5), que há uma concentração de empresas que empregam até 99
funcionários (93,7%). Assim, com base nesse dado, a amostra desta tese não pode ser
considerada representativa do universo estudado, reduzindo-se o seu poder de
generalização, apesar de esta pesquisa não possuir essa pretensão.
Tabela 6.5 – Distribuição Nacional de Empresas por Faixas de Funcionários
Faixa de Número de
Freq. % Válido
Funcionários
De 5 a 29
114 988
78,6%
De 30 a 49
12 838
8,8%
De 50 a 99
9 262
6,3%
De 100 a 249
5 846
4,0%
De 250 a 499
2 044
1,4%
Com 500 e mais
1 248
0,9%
Total
146 226
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Indústria, Pesquisa Industrial Anual Empresa 2001.
Quanto à origem de capital, a amostra utilizada nesta tese apresentou a seguinte
composição: 68 casos, ou 76,4% do total de empresas com capital 100% nacional,
seguidas por 17 empresas, ou 19,10% do total, de capital estrangeiro e poucos casos
de empresas com capital misto (4 casos ou 4,49%), conforme pode ser verificado na
Tabela 6.6.
199
Em relação à origem de capital das empresas da amostra desta tese, percebe-se ligeira
redução na concentração de empresas com capital de origem nacional e misto em
relação à amostra adotada por Peixoto (2004).
Tabela 6.6 – Comparação entre a Amostra de Peixoto (2004) e a Amostra Tese:
Origem do Capital
Amostra Peixoto (2004)
Amostra Tese
Origem do Capital
Freq.
% Válido
Freq. % Válido
Nacional
163
80,30%
68
76,40%
Estrangeira
33
16,20%
17
19,10%
Mista
7
3,44%
4
4,49%
Total
203
100
89
100
Missing
17
9
Total
220
98
Fonte: Dados da Pesquisa
Apesar de a amostra desta tese ter sido não probabilística por conveniência, percebese que a maioria das propriedades encontradas na amostra de Peixoto (2004), de 220
casos, mantém-se relativamente presente. A amostra desta tese representa, ainda,
razoavelmente bem, o universo das maiores organizações industriais brasileiras, que
empregam a partir de 150 funcionários, especialmente em relação à distribuição
estadual, regional, setorial e por origem de capital.
6.2. Adoção de práticas inovadoras – comparação entre os resultados obtidos
em Peixoto (2004) e com a amostra desta tese
Após a verificação das características da amostra desta tese face à de Peixoto (2004),
é possível prosseguir com a análise, tendo como foco o primeiro objetivo específico,
que é “comparar os resultados originais da pesquisa encontrados em Peixoto (2004) e
os resultados obtidos com base na amostra desta tese”, assim como testar a hipótese a
ele relacionada de que “os resultados obtidos por Peixoto (2004) quanto ao nível de
utilização, ao alcance das práticas em relação a melhorias em qualidade, às reduções
de custos e melhorias na responsividade e à propensão à continuidade de uso das
práticas, são relativamente mantidos para a amostra desta tese”.
200
6.2.1. Adoção de práticas inovadoras no Brasil – Nível de Utilização
O gráfico apresentado na Figura 6.1, adiante, apresenta a adoção das doze práticas
investigadas nas duas amostras, comparando as diferenças encontradas entre ambas.
As práticas mais adotadas, segundo a amostra desta tese, são trabalho em equipe e
gestão da qualidade total (ambas apresentaram média = 3,67), parceria na cadeia de
suprimentos (média = 3,38), cultura de aprendizagem (média = 3,37) e tecnologia
integrada baseada em computadores (média = 3,26), que apresentam maior percentual
de empresas que as utilizam “muito” ou “totalmente”. As práticas menos utilizadas
são manutenção produtiva total e células de manufatura (ambas apresentaram média =
2,54), terceirização (média = 2,38) e engenharia simultânea (média = 2,34) que
apresentam os maiores percentuais de empresas que as utilizam “nada” ou “pouco”.
Empowerment (média =3,05), just in time (média = 2,87), reengenharia de processos
(média = 2,77) são práticas de utilização mediana. Essas médias de intensidade de uso
são comparáveis com aquelas encontradas em Peixoto (2004), conforme a tabela 6.7.
Para assegurar a consistência entre as duas amostras foi realizado o teste t para
amostras independentes, conforme verificado na tabela 6.8. De acordo com esse teste,
conforme sugerido em Cooper (2003) e em Malhotra (2001), não existem diferenças
significativas (p = 0,05) entre as respostas encontradas na amostra utilizada por
Peixoto (2004) e na amostra utilizada por esta tese.
201
Tabela 6.7 – Média da Intensidade de Uso das Práticas no Brasil
Utilização da Reengenharia
Utilização da Parceria na Cadeia de Suprimentos
Utilização da Terceirização
Utilização da Cultura de Aprendizagem
Utilização do Empowerment
Utilização do Trabalho em Equipes
Utilização da Manutenção Produtiva Total
Utilização da Engenharia Simultânea
Utilização da Tecn. Int. Baseada em
Computadores
Utilização das Células de Produção
Utilização do Just in Time
Utilização da Gestão da Qualidade Total
Fonte: Dados da pesquisa.
* Amostra desta tese
** Amostra utilizada por Peixoto (2004)
Amostra
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
*
**
N
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
Média
2,765
2,827
3,378
3,373
2,378
2,323
3,367
3,286
3,051
3,118
3,673
3,655
2,541
2,627
2,337
2,455
3,255
3,182
2,541
2,627
2,867
2,927
3,673
3,682
D. Padrão
1,225
1,234
1,070
1,080
1,041
1,021
1,097
1,176
1,088
1,070
1,199
1,150
1,186
1,204
1,377
1,379
1,279
1,287
1,444
1,455
1,382
1,322
1,053
1,081
202
Tabela 6.8 – Teste t para amostras associadas
Teste de Levene
de Igualdade de
Variâncias
Nível de Utilização
da Prática
Reengenharia
F
*
Sig.
*
Terceirização
*
*
Inferior
Superior
-0,356
0,232
-0,416 187,503
0,678
-0,062
0,149
-0,356
0,232
0,037 316,000
0,971
0,005
0,131
-0,252
0,262
0,037 187,897
0,971
0,005
0,130
-0,252
0,262
0,440 316,000
0,660
0,055
0,125
-0,191
0,300
0,436 183,046
0,663
0,055
0,126
-0,193
0,303
0,579 316,000
0,563
0,081
0,140
-0,194
0,356
0,055 0,815
0,096 0,757
1,205 0,273
0,594 198,664
0,553
0,081
0,136
-0,188
0,350
0,056 0,813 -0,514 316,000
0,608
-0,067
0,131
-0,324
0,190
-0,511 183,621
0,610
-0,067
0,131
-0,327
0,192
0,134 316,000
0,894
0,019
0,142
-0,260
0,297
**
Trabalho em Equipes
*
0,072 0,789
**
Manutenção Produtiva Total
*
0,132 179,415
0,895
0,019
0,144
-0,265
0,303
0,007 0,931 -0,594 316,000
0,553
-0,086
0,146
-0,373
0,200
**
Engenharia Simultânea
*
-0,598 188,931
0,551
-0,086
0,145
-0,372
0,199
0,008 0,931 -0,704 316,000
0,482
-0,118
0,167
-0,447
0,212
-0,704 186,573
0,482
-0,118
0,167
-0,448
0,212
0,470 316,000
0,639
0,073
0,156
-0,234
0,380
**
Tecnologia Integrada Baseada em
Computadores
*
Células de Produção
*
**
**
Just in Time
*
**
Gestão da Qualidade Total
*
**
Intervalo de
Confiança de 95%
da Diferença
0,150
**
Empowerment
Dif.
Erro
Padrão
-0,062
**
*
df
Dif.
Média
0,679
**
Cultura de Aprendizagem
t
Sig.
(2tailed)
0,098 0,754 -0,414 316,000
**
Parceria na Cadeia de
Suprimentos
Teste t para igualdade das médias
0,035 0,851
0,471 187,379
0,638
0,073
0,156
-0,234
0,380
0,006 0,936 -0,490 316,000
0,624
-0,086
0,176
-0,433
0,260
-0,492 187,517
0,623
-0,086
0,176
-0,433
0,260
0,721 0,397 -0,368 316,000
0,713
-0,060
0,163
-0,380
0,260
-0,362 179,033
0,718
-0,060
0,166
-0,387
0,267
0,021 0,885 -0,064 316,000
0,949
-0,008
0,130
-0,265
0,248
-0,065 190,764
0,948
-0,008
0,129
-0,263
0,246
Fonte: Dados da Pesquisa
* Amostra desta tese
** Amostra de Peixoto (2004)
6.2.2. Resultados percebidos com a adoção das práticas – Melhorias em
qualidade, reduções em custos e melhorias em responsividade
Ao serem analisadas as figuras 6.2 a 6.4, adiante, é possível identificar que resultados
têm sido obtidos com a adoção de práticas inovadoras, tanto segundo a amostra
original quanto na amostra desta tese. Nesse sentido, percebe-se que houve pequenas
diferenças em relação à contribuição de algumas práticas para os três objetivos nas
duas amostras estudadas. Por exemplo, as empresas da amostra desta tese
apresentaram resultados significativamente diferentes sobre a contribuição da gestão
203
da qualidade total para melhorias em qualidade. O mesmo ocorre, ainda que em
menor escala, com a cultura de aprendizagem. Isso pode ser percebido, ainda, em
relação à contribuição da engenharia simultânea para melhorias em responsividade.
De qualquer maneira, as práticas que aparentemente mais contribuem para melhorias
em qualidade são, em ordem decrescente, nas duas amostras, a cultura da
aprendizagem, o trabalho em equipe, a tecnologia integrada baseada em
computadores, as células de manufatura e a gestão da qualidade total, que apresentam
maior percentual de empresas que acreditam que essas práticas contribuíram “muito“
ou “totalmente” para melhorias em qualidade. Por outro lado, as práticas que foram
identificadas como sendo as que menos contribuem para melhorias em qualidade
foram terceirização, manutenção produtiva total, e parcerias na cadeia de suprimentos,
que apresentaram um maior percentual de respondentes que acreditam que essas
práticas contribuem “nada” ou “pouco” para melhorias de qualidade. As demais
práticas investigadas apresentaram resultados intermediários.
Com relação à redução de custos, foram percebidas menores diferenças nas
percepções das empresas respondentes. De maneira geral, a dimensão “custos”
apresentou posições com uma maior concentração de respostas variando entre
“moderadamente” e “muito”. Destaca-se, neste sentido, manutenção produtiva total e
terceirização, que apresentaram um percentual ligeiramente superior de empresas que
consideram que essas práticas contribuem “nada” ou ”pouco” para a redução de
custos. Percepção semelhante ocorre em relação à dimensão “melhorias em
responsividade”. A maior quantidade das respostas se aglutina em torno das opções
“moderadamente” e “muito”, com destaque para engenharia simultânea, manutenção
produtiva total e terceirização, que apresentaram maiores percentuais de organizações
que percebem que essas práticas contribuem “nada” ou ”pouco” para melhorias em
204
responsividade. Esses resultados são semelhantes tanto na amostra desta tese quanto
na amostra utilizada por Peixoto (2004).
Percebe-se, nessas informações, que a adoção de práticas inovadoras contribui um
pouco mais intensamente para melhorias em qualidade, mas, também, para reduções
de custos e melhorias em responsividade.
6.2.3. Propensão à continuidade de uso de práticas inovadoras
Em relação à propensão à continuidade de uso das práticas estudadas, também se
percebe que não há grandes variações entre os resultados apresentados em Peixoto
(2004) e os resultados obtidos com base na amostra desta tese, sem exceções. De
maneira geral, percebe-se que há uma forte propensão à continuidade de utilização de
práticas inovadoras. Destacam-se, nesse sentido, a gestão da qualidade total, o
trabalho em equipe, a tecnologia integrada baseada em computadores, a cultura da
aprendizagem e as parcerias na cadeia de suprimentos, que apresentaram,
respectivamente, maiores percentuais de respondentes que afirmaram que continuarão
a utilizar essas práticas “mais” ou “muito mais” do que o fazem atualmente. Somente
a terceirização e a reengenharia de processos e, em menor escala, as células de
manufatura e a engenharia simultânea, apresentaram comparativamente um maior
percentual de empresas escolhendo as categorias “muito menos” ou “menos”, embora
a maioria das empresas tenha se posicionado nas categorias “mais” e “muito mais”.
GQT – Gestão da qualidade
total
JIT – Just in time
CM – Células de manufatura
CIM – Tecnologias integradas
baseadas em computadores
ES- Engenharia simultânea
MPT – Manutenção produtiva
total
TEQ – Trabalho em equipe
EMP – Empowerment
CAP – Cultura de
aprendizagem
TER – Terceirização
SCM – Parcerias na cadeia de
suprimento
BPR – Engenharia de processos
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
TEQ
98
220
EMP
MPT
ES
CIM
CM
JIT
GQT
Figura 6.1 – Nível de Utilização das Práticas na Amostra Original e Amostra Final
220
98
CAP
220
TER
98
220
98
SCM
220
BPR
98
220
98
0%
10%
20%
30%
nada
40%
pouco
50%
moder. muito
60%
totalm.
70%
80%
90%
100%
Fonte: Dados da Pesquisa
205
98
GQT – Gestão da qualidade
total
JIT – Just in time
CM – Células de manufatura
CIM – Tecnologias
integradas baseadas em
computadores
ES- Engenharia simultânea
MPT – Manutenção
produtiva total
TEQ – Trabalho em equipe
EMP – Empowerment
CAP – Cultura de
aprendizagem
TER – Terceirização
SCM – Parcerias na cadeia
de suprimento
BPR – Engenharia de
processos
220
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
TEQ
220
EMP
98
220
CAP
MPT
ES
CIM
CM
JIT
GQT
Figura 6.2 – Alcance das Práticas em Relação a Melhorias em Qualidade, na Amostra Original e Amostra Final
220
98
98
TER
220
SCM
220
BPR
98
220
98
98
0%
20%
40%
nada
60%
pouco
moder.
muito
80%
100%
totalm.
Fonte: Dados da Pesquisa
206
98
220
GQT – Gestão da qualidade
total
JIT – Just in time
CM – Células de manufatura
CIM – Tecnologias
integradas baseadas em
computadores
ES- Engenharia simultânea
MPT – Manutenção
produtiva total
TEQ – Trabalho em equipe
EMP – Empowerment
CAP – Cultura de
aprendizagem
TER – Terceirização
SCM – Parcerias na cadeia de
suprimento
BPR – Engenharia de
processos
98
220
98
220
98
220
98
220
98
220
TEQ
98
220
EMP
MPT
ES
CIM
CM
JIT
GQT
Gráfico 6.3 – Alcance das Práticas em Relação à Redução de Custos, na Amostra Original e na Amostra Final
220
98
CAP
220
TER
98
220
98
SCM
220
BPR
98
220
98
0%
20%
40%
nada
60%
pouco
moder.
muito
80%
100%
totalm.
Fonte: Dados da Pesquisa
207
98
GQT – Gestão da
qualidade total
JIT – Just in time
CM – Células de
manufatura
CIM – Tecnologias
integradas baseadas em
computadores
ES- Engenharia simultânea
MPT – Manutenção
produtiva total
TEQ – Trabalho em equipe
EMP – Empowerment
CAP – Cultura de
aprendizagem
TER – Terceirização
SCM – Parcerias na cadeia
de suprimento
BPR – Engenharia de
processos
220
98
220
98
220
98
220
98
220
MPT
TEQ
220
EMP
98
220
220
CAP
ES
CIM
CM
JIT
GQT
Figura 6.4 – Alcance das Práticas em Relação à Melhorias em Responsividade, na Amostra Original e na Amostra Final
220
98
98
98
TER
220
SCM
220
BPR
98
220
98
98
0%
20%
40%
nada
60%
pouco
moder.
muito
80%
100%
totalm.
Fonte: Dados da Pesquisa
208
98
220
GQT – Gestão da
qualidade total
JIT – Just in time
CM – Células de
manufatura
CIM – Tecnologias
integradas baseadas em
computadores
ES- Engenharia simultânea
MPT – Manutenção
produtiva total
TEQ – Trabalho em equipe
EMP – Empowerment
CAP – Cultura de
aprendizagem
TER – Terceirização
SCM – Parcerias na cadeia
de suprimento
BPR – Engenharia de
processos
98
220
98
220
98
220
98
220
MPT
98
220
TEQ
ES
CIM
CM
JIT
GQT
Figura 6.5 – Propensão à Continuidade de Uso, na Amostra Original e Amostra Final
220
98
EMP
220
CAP
220
TER
220
SCM
220
BPR
98
220
98
98
98
98
0%
10%
20%
30%
40%
Muito Menos
50%
Menos
O Mesmo
60%
Mais
70%
80%
90%
100%
Muito Mais
Fonte:Dados Pesquisados
209
210
Com a análise dessas informações, valida-se a primeira hipótese desta tese, que é a de
que os resultados obtidos por Peixoto (2004), quanto a nível de utilização, alcance
das práticas em relação a melhorias em qualidade, reduções de custos e melhorias na
responsividade e propensão à continuidade de uso das práticas, são relativamente
mantidos para a amostra desta tese. Apesar de haver pequenas diferenças entre as duas
amostras, elas mantém um elevado nível de similaridade em seus resultados globais.
Com base nesses resultados, pode-se manter a afirmação de Peixoto (2004) de que
existe um movimento de modernização gerencial das grandes empresas industriais
brasileiras. Esse movimento representa um grande esforço de catching up das
empresas nacionais em relação a suas concorrentes estrangeiras. Não é possível
perceber, todavia, um padrão para esse movimento. O que os dados apresentados
indicam é a existência de um movimento difuso de experimentação de novas práticas,
em um padrão divergente de busca por soluções para a crise do modelo capitalista de
produção em massa.
6.3.Nível de utilização, características organizacionais e resultados financeiros
Esta seção apresenta e discute os resultados relacionados ao segundo objetivo
específico desta tese, que é “investigar o grau de adoção de práticas gerenciais em
relação às características organizacionais e ao desempenho financeiro”, para testar a
hipótese a ele relacionada de que “o grau de adoção das práticas gerenciais
pesquisadas é diferenciado por características organizacionais como localização,
gênero industrial, porte, origem de capital e desempenho financeiro”. Para tanto, foi
calculada a média do grau de adoção de práticas gerenciais, que corresponde à
variável “nível de adoção” das doze práticas em análise. Essa variável foi comparada
211
por estado, região, gênero industrial, por porte de empresa (segundo o número de
funcionários), por origem de capital, por taxa de crescimento da receita, por faixas de
lucro e por rentabilidade em relação à receita e ao patrimônio.
A média geral do grau de adoção de práticas gerenciais encontrada na amostra desta
tese foi de 2,99 (desvio padrão = 0,6185). Inicialmente, foram verificadas as
diferenças no grau de adoção de práticas gerenciais, representado pelo score médio de
adoção das doze práticas, em cada subdivisão da amostra. Ao serem comparadas as
médias do grau de adoção de práticas gerenciais e os estados (unidades) da Federação,
percebe-se que há diferenças entre eles, apesar de essas diferenças não poderem ser
justificadas teoricamente. As maiores médias de grau de adoção de práticas gerenciais
foram verificadas nos estados do Amazonas (3,53), Santa Catarina (3,30), Ceará
(3,19), São Paulo (3,15), Distrito Federal (3,13), Paraná (3,06) e Bahia (3,04). Em
ordem decrescente, os estados com menores graus de adoção de práticas gerenciais
foram Minas Gerais (2,74), Rio Grande do Sul (2,59) e Rio de Janeiro (2,55). Os
estados de Pernambuco e Maranhão foram excluídos desta análise por terem
apresentado somente um caso cada (tabela 6.9).
Tabela 6.9 – Grau de adoção de práticas gerenciais e Localização - Estado
Frequência Percentual
Amazonas
Santa Catarina
Ceará
São Paulo
Distrito Federal - Brasília
Paraná
Bahia
Minas Gerais
Rio Grande do Sul
Rio de Janeiro
Total
Fonte: Dados da pesquisa
3
5
6
31
2
8
14
6
10
11
98
3,1%
5,1%
6,1%
31,6%
2,0%
8,2%
14,3%
6,1%
10,2%
11,2%
Graus de Adoção
Médios
3,53
3,30
3,19
3,15
3,13
3,06
3,04
2,74
2,59
2,55
Desvio
Padrão
0,502
0,380
0,437
0,502
0,295
0,719
0,427
0,802
0,873
0,627
212
Considerando-se o desenvolvimento e o histórico industrial de cada estado, esperavase maior destaque para São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
Ao contrário, São Paulo encontra-se somente na quarta posição dentre os estados por
grau de adoção de práticas gerenciais. Mais surpreendente ainda, Minas Gerais, Rio
Grande do Sul e Rio de Janeiro, respectivamente, são os três estados com menores
graus de adoção de práticas gerenciais da amostra desta tese. Certamente tais
resultados refletem as propriedades da amostra não probabilística por conveniência
desta tese, os quais já foram comentados anteriormente.
Em relação às demais regiões da federação, percebe-se que a região Norte apresentou
a maior média em termos de grau de adoção de práticas gerenciais da amostra desta
tese (3,53), representada apenas por três empresas do Amazonas, seguida pela região
Centro-Oeste (3,13), representada por somente duas empresas do Distrito Federal,
região Nordeste (3,06), Sul (2,99) e Sudeste (2,93). Conforme visto na análise
anterior, relativa aos estados da Federação, chama a atenção o fato de as empresas
localizadas nas regiões Sul e Sudeste, que possuem trajetórias industriais mais
longevas, serem as de menores graus de adoção de práticas gerenciais na amostra
desta tese, ao contrário do que era esperado, conforme já mencionado (tabela 6.10).
Tabela 6.10 – Grau de adoção de práticas gerenciais e Localização - Região
Norte
Centro-oeste
Nordeste
Sul
Sudeste
Total
Fonte: Dados da pesquisa
Frequência
Percentual
3
2
21
29
43
98
4,1%
2,0%
20,4%
29,6%
43,9%
Graus de
adoção médios
3,53
3,13
3,06
2,99
2,93
Desvio
Padrão
0,795
0,295
0,427
0,747
0,609
Quanto aos gêneros industriais (tabela 6.11), identifica-se que o de Material
Eletrônico e de Comunicação é o que apresenta o maior grau de adoção de práticas
inovadoras (3,5), seguido pelos ramos de Máquinas e Equipamentos (3,29), Artefatos
213
de Couros, de Viagem e Calçados (3,25), Produtos de Minerais Não-Metálicos (3,24),
e Produtos Alimentícios e Bebidas (3,14). Os setores de Produtos Químicos (2,98),
Artigos de Borracha e Plásticos (2,98), Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos
(2,94) e Produtos de Metal (2,86) apresentaram graus medianos de adoção de práticas
inovadoras. Em ordem decrescente, os ramos que apresentaram os menores graus de
adoção de práticas inovadoras foram o de Celulose, Papel e Produtos de Papel (2,83),
Edição, Impressão e Reprodução de Gravações (2,83), Metalurgia Básica (2,73),
Produtos Têxteis (2,69) e Móveis e Indústrias Diversas (2,33).
Tabela 6.11 – Grau de adoção de práticas gerenciais e gênero industrial
Gênero Industrial
Material Eletrônico e de Comunicação
Máquinas e Equipamentos
Artefatos de Couros, de Viagem e Calçados
Produtos de Minerais Não-Metálicos
Produtos Alimentícios e Bebidas
Produtos Químicos
Artigos de Borracha e Plásticos
Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos
Produtos de Metal
Celulose, Papel e Produtos de Papel
Edição, Impressão e Reprodução de Gravações
Metalurgia Básica
Produtos Têxteis
Móveis e Indústrias Diversas
Total (Casos Válidos)
N
4
4
2
8
12
14
3
6
5
5
3
14
3
2
85
Freq.
4,7%
4,7%
2,4%
9,4%
14,1%
16,5%
3,5%
7,1%
5,9%
5,9%
3,5%
16,5%
3,5%
2,4%
Média
3,500
3,292
3,250
3,242
3,141
2,982
2,979
2,944
2,867
2,833
2,833
2,728
2,688
2,333
D. Padrão
0,414
0,963
0,118
0,359
0,646
0,544
0,708
0,516
0,929
0,603
0,712
0,624
0,542
0,726
Fonte: Dados da pesquisa
Em relação ao número de funcionários, verifica-se que as empresas maior grau de
adoção de práticas gerenciais são aquelas com maior número de trabalhadores.
Empresas com 1000 ou mais funcionários apresentaram o grau médio de adoção de
práticas gerenciais mais elevado (3,30), em comparação com as demais. Em seguida,
vêm as empresas que empregam entre 500 e 999 funcionários (2,98), as empresas que
empregam entre 150 e 249 funcionários (2,98) e as empresas que empregam entre 250
e 499 funcionários (2,91), conforme apresentado na Tabela 6.12.
214
Tabela 6.12 – Grau de adoção de práticas gerenciais e número de funcionários
Trabalhadores por
Faixa
Mais de 1000
De 500 a 999
De 250 a 499
De 150 a 249
Total
Fonte: Dados da pesquisa
Frequência Percentual
10
24
35
29
98
10,2%
24,5%
35,7%
29,6%
Graus de
adoção
médios
3,30
2,98
2,91
2,98
Desvio
Padrão
0,691
0,660
0,609
0,566
Ao serem comparadas as médias de grau de adoção de práticas gerenciais entre
empresas de diferentes origens de capital (tabela 6.13), não se percebem diferenças.
As organizações de capital estrangeiro, de capital nacional e capital misto não
apresentaram diferenças entre as médias de grau de adoção de práticas gerenciais
(2,98; 3,01 e 3,02 respectivamente). Essas médias são próximas da média geral de
grau de adoção de práticas gerenciais da amostra desta tese (2,99).
Tabela 6.13 – Grau de adoção de práticas gerenciais e origem de capital
Origem capital
Misto
Nacional
Estrangeira
Total
Missing
Total
Fonte: Dados da pesquisa
Frequência Percentual
4
68
17
89
9
98
4,5%
76,4%
19,1%
Graus de
adoção
médios
3,02
3,01
2,98
Desvio
Padrão
0,756
0,598
0,706
A análise do desempenho financeiro das empresas incluídas na amostra desta tese
abarca quatro dimensões: o crescimento da receita, o lucro médio, a rentabilidade
sobre a receita e a rentabilidade sobre o patrimônio. Os indicadores utilizados para
essas dimensões foram categorizados automaticamente pelo software (SPSS), gerando
sete categorias em cada uma das variáveis, que foram, posteriormente, nomeadas de
acordo com o tipo de variável. Por exemplo, a variável crescimento da receita foi
categorizada entre “grande redução da receita” e “grande crescimento da receita”,
sendo atribuídos scores que representavam a intensidade, negativa ou positiva, do
215
crescimento da receita, entre 1 e 7 respectivamente. Foram calculados os graus de
adoção de práticas gerenciais médios em relação ao desempenho financeiro das
empresas, conforme verificado nas tabelas 6.14 a 6.17.
Em relação ao crescimento da receita, percebem-se concentrações em torno das
categorias “estagnação” (21,4% da amostra), “pequeno crescimento” (12,2%) e
“crescimento moderado” (22,4%) e “grande crescimento” (16,3%), demonstrando
ligeira inclinação ao crescimento das empresas da amostra desta tese como um todo.
Percentuais menores apresentaram as categorias “reduções pequenas” (13,3%),
“moderadas” (10,2%) e “grandes” (4,1%) da receita. Neste caso, percebe-se que o
grupo de empresas que apresentou maiores índices de crescimento da receita também
apresentou maiores graus de adoção de práticas gerenciais médios, – variando entre
2,96 e 3,16.
Tabela 6.14 – Crescimento da Receita
Evolução da Receita
Grande redução da receita
Redução moderada da receita
Pequena Redução
Estagnação
Pequeno crescimento
Crescimento moderado
Grande Crescimento
Total
Fonte: Dados da Pesquisa
Frequência Percentual Percentual
Acumulado
4
10
13
21
12
22
16
98
4,1%
10,2%
13,3%
21,4%
12,2%
22,4%
16,3%
4,1%
14,3%
27,6%
49,0%
61,2%
83,7%
100,0%
Graus de
adoção
médios
2,94
2,88
2,75
3,03
3,16
2,96
3,09
Percebe-se, na amostra estudada, uma ligeira inclinação positiva em relação às faixas
de lucro apresentadas pelas empresas. Dentre as empresas investigadas, 13,3%
apresentaram “grande lucro”, 21,4% apresentaram “lucros moderados”, 15,3%
apresentaram “pequenos lucros” e 19,4% não apresentaram “nem lucro nem
prejuízo”. Dentre as demais empresas, 10,2% apresentaram “pequeno prejuízo”,
“prejuízo moderado” e “grande prejuízo”. A distribuição das empresas por faixa de
lucro aparece na tabela 6.15. Neste caso, apesar de serem mais sutis as diferenças
216
entre os grupos de empresas que apresentaram lucro e prejuízo, também se percebem
graus de adoção de práticas gerenciais ligeiramente superiores nas empresas
lucrativas, em especial nas empresas que obtiveram lucro moderado, que
apresentaram o maior grau de adoção de práticas gerenciais (3,20).
Tabela 6.15 – Faixas de Lucro
Faixas Lucro
Prejuízo Grande
Prejuízo moderado
Prejuízo Pequeno
Nem lucro nem prejuízo
Lucro Pequeno
Lucro Moderado
Lucro Grande
Total
Fonte: Dados da pesquisa
Frequência Percentual Percentual
Acumulado
10
10
10
19
15
21
13
98
10,2%
10,2%
10,2%
19,4%
15,3%
21,4%
13,3%
10,2%
20,4%
30,6%
50,0%
65,3%
86,7%
100,0%
Graus de
adoção
médios
2,94
2,90
2,88
3,06
2,94
3,20
2,98
Em relação à rentabilidade sobre a receita, encontra-se na amostra desta tese um
grande percentual de empresas que apresentam rentabilidade positiva. Do total de
empresas da amostra, 13,3% classificaram-se na categoria de rentabilidade positiva
grande sobre a receita, 31,6% obtiveram rentabilidade positiva moderada sobre a
receita, 15,3% obtiveram rentabilidade positiva pequena sobre a receita, 21,4%
obtiveram rentabilidade neutra (próxima de zero). Poucas empresas apresentaram
rentabilidade negativa – 2,0% obtiveram rentabilidade negativa pequena, 8,2%
obtiveram rentabilidade negativa moderada e somente 8,2% obtiveram rentabilidade
negativa grande. Comparativamente à rentabilidade sobre a receita apresentada pelas
empresas da amostra desta tese, percebe-se que há uma ligeira superioridade nos graus
de adoção de práticas gerenciais das empresas mais rentáveis, ainda mais sutis do que
em relação à lucratividade. Empresas com rentabilidade negativa demonstraram graus
de adoção de práticas gerenciais, variando entre 2,88 e 3,03. Aquelas que obtiveram
rentabilidade sobre a receita positiva apresentaram graus de adoção de práticas
gerenciais, entre 2,84 e 3,24 (tabela 6.16).
217
Tabela 6.16 – Rentabilidade sobre a Receita
Frequência Percentual Percentual
Acumulado
Rentabilidade Negativa Grande
Rentabilidade negativa moderada
Rentabilidade Negativa Pequena
Rentabilidade Neutra
Rentabilidade Positiva Pequena
Rentabilidade Positiva Moderada
Rentabilidade Positiva Grande
Total
Fonte: Dados da pesquisa
8
8
2
21
15
31
13
98
8,2%
8,2%
2,0%
21,4%
15,3%
31,6%
13,3%
8,2%
16,3%
18,4%
39,8%
55,1%
86,7%
100,0%
Graus de
adoção
médios
2,88
3,03
2,88
2,87
3,24
3,02
2,84
Finalmente, em relação à rentabilidade sobre o patrimônio, percebe-se um número
maior de empresas que apresentaram rentabilidade positiva, em especial nas
categorias de pequena (24,5%) e grande (36,7%) rentabilidade, totalizando 61,2% das
empresas da amostra. Verifica-se, ainda, que onze empresas apresentaram
rentabilidade negativa grande (11,2%), seis apresentaram rentabilidade negativa
moderada (6,1%), dez apresentaram rentabilidade negativa pequena, dez apresentaram
rentabilidade neutra (10,2% cada). Em relação aos graus de adoção de práticas
gerenciais, também se percebe que as empresas rentáveis apresentaram graus médios
maiores do que as não rentáveis, com destaque para as empresas que apresentaram
rentabilidade pequena ou moderada (scores = 3,05 e 4,5 respectivamente), neste
último caso, com apenas uma ocorrência.
Tabela 6.17 – Rentabilidade sobre o Patrimônio
Rentabilidade Negativa Grande
Rentabilidade Negativa Moderada
Rentabilidade Negativa Pequena
Rentabilidade Neutra
Rentabilidade Positiva Pequena
Rentabilidade Positiva Moderada
Rentabilidade Positiva Grande
Total
Fonte: Dados da pesquisa
Freq. Percentual Percentual
Acumulado
11
11,2%
11,2%
6
6,1%
17,3%
10
10,2%
27,6%
10
10,2%
37,8%
24
24,5%
62,2%
1
1,0%
63,3%
36
36,7%
100,0%
98
Graus de adoção
médios
3,02
2,86
2,67
3,18
3,05
4,5
2,94
218
As informações apresentadas anteriormente referem-se ao segundo objetivo específico
desta tese, que é “investigar graus de adoção de práticas gerenciais em relação às
características organizacionais e ao desempenho financeiro”, cuja hipótese
correlacionada é “o grau de adoção das práticas gerenciais pesquisadas é diferenciado
por características organizacionais como localização, gênero industrial, porte, origem
de capital e desempenho financeiro”. As informações apresentadas evidenciam
particularidades do movimento de adoção de inovações gerenciais, mais
especificamente, a adoção de práticas inovadoras de gestão no Brasil, durante o final
dos anos 1990 e início dos anos 2000.
Não foram percebidas relações fortes entre grau de adoção de práticas gerenciais e
algumas características organizacionais, como estado, região, gênero industrial e
origem de capital. Ou melhor, apesar de terem sido verificadas algumas diferenças
quanto ao nível de utilização de práticas inovadoras em diferentes grupos de
organizações, de acordo com as características mencionadas, essas diferenças não são
justificadas. Entretanto, foram identificadas diferenças de grau de adoção de práticas
gerenciais investigadas entre porte organizacional, aqui avaliado pelo do número de
funcionários, e desempenho financeiro. Observou-se que maiores empresas tendem a
apresentar maiores graus de adoção das práticas gerenciais pesquisadas comparadas às
empresas menores. De maneira semelhante, verificou-se que empresas mais
lucrativas, mais rentáveis ou que apresentam maior crescimento da receita tendem a
ter maiores graus de adoção das práticas gerenciais pesquisadas. Esses achados
parecem validar parcialmente a hipótese antes mencionada, embora com base em
estatística descritiva. Resultados mais conclusivos implicariam a realização de testes
de significância estatísticas, o que não faz parte do escopo da técnica utilizada nesta
etapa da tese.
219
Em síntese, as informações desta seção apresentaram um caráter meramente
descritivo, de modo a permitir uma visão panorâmica do grande cenário de adoção de
práticas gerais e sua relação com características e desempenho organizacionais,
utilizando-se, para tanto, de uma seleção de práticas que buscaram representar as
grandes áreas de inovação gerencial. O grande número de práticas utilizado adiciona
um elevado nível de complexidade na interpretação desses resultados, reduzindo o
poder de compreensão desse movimento. Por isso, mais adiante vão ser utilizadas
técnicas estatísticas que permitem associar variáveis e interpretar os conceitos
subjacentes ao objeto de estudo, para melhor lapidar o tratamento dos resultados. As
técnicas escolhidas foram as de análise fatorial, da análise de conglomerados e da
modelagem de equações estruturais, conforme será apresentado a seguir.
6.4. Grupos de Práticas
O terceiro objetivo específico desta tese é “agrupar as práticas estudadas de acordo
com os padrões de adoção das empresas brasileiras”, para testar a hipótese de que “as
organizações tendem a adotar práticas inovadoras, isoladas ou em pacotes de práticas
que se complementam, concentradas em áreas que lhes são mais significativas".
Em presença de informações excessivamente abrangentes, com grande número de
variáveis, que dificultam a interpretação dos dados em seu formato puro, torna-se
necessário recorrer a técnicas de tratamento que permitam dar ordem a esse “caos
aparente”. Se as variáveis são correlacionadas entre si, pode-se reduzir o seu número
com a utilização da análise fatorial (factor analysis), conforme sugerido por Malhotra
(1999), Mattar (2000), Aaker et al (2001) e ainda Hair (2005).
A análise fatorial tem sido utilizada recentemente em publicações científicas em
diversas áreas da administração para identificar as dimensões subjacentes, que
220
explicam as correlações entre um conjunto de variáveis, sintetizando as informações
de um grande número de variáveis correlacionadas em um conjunto menor de
variáveis não correlacionadas, os fatores. Um fator é uma variável ou construto não
diretamente observável, mas que emerge após a análise fatorial com base nas
variáveis de entrada. Esses fatores podem ser utilizados, posteriormente, para analisar
os dados com o uso de outros tipos de análise multivariada.
Para definir a pertinência desse tipo de análise a casos específicos, dois tipos de testes
devem ser feitos (MALHOTRA, 1999; MATTAR, 2000; AAKER et al, 2001; HAIR,
2005). O primeiro é o teste de adequação da amostra de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO).
O segundo é o teste alpha de Cronbach, que pode ser aplicado não somente às
variáveis observáveis, de modo a avaliar a propriedade de aplicação do método, mas,
também, aos fatores identificados, para avaliar sua consistência. Com valores
esperados próximos de 1, ambos são testes de consistência interna, baseados na média
de correlação inter-itens. Neste caso, os índices de consistência obtidos foram 0,698
para o KMO e 0,7425 para o alpha de Cronbach, o que valida a aplicação do método
nesta tese.
Comprovada a consistência do método, o próximo passo consiste na análise das
comunalidades, que indicam a quantidade de variância pela qual cada variável é
responsável. Assim como os dois indicadores anteriores, as comunalidades devem
apresentar valores elevados, próximos de 1, em todas as variáveis que irão compor a
análise. Caso contrário, deve-se considerar a hipótese de eliminação daquelas
variáveis que apresentem valores reduzidos. Nesta tese, todos os valores de extração
(comunalidades), exceto da prática terceirização, foram considerados elevados,
devendo ser mantidas essas variáveis (tabela 6.16). Quanto à variável terceirização,
ela também foi mantida, mesmo apresentando valor reduzido, para verificar as
221
relações que essa variável demonstra. As variáveis que representam o nível de
utilização das práticas manutenção produtiva total, engenharia simultânea e gestão da
qualidade total também apresentaram valores razoavelmente reduzidos, em menor
intensidade.
Tabela 6.18 – Comunalidades
Inicial Extração
Utilização atual da prática reengenharia
1,000
,651
Utilização atual da prática parceria
1,000
,614
Utilização atual da prática terceirização
1,000
,497
Utilização atual da prática cultura de aprendizagem 1,000
,742
Utilização atual da prática empowerment
1,000
,657
Utilização atual da prática trabalho em equipes
1,000
,659
Utilização atual da prática manutenção p. total
1,000
,562
Utilização atual da prática engenharia simultânea
1,000
,576
Utilização atual da prática tecnologia integrada
1,000
,619
Utilização atual da prática células de produção
1,000
,662
Utilização atual da prática just in time
1,000
,635
Utilização atual da prática g. qualidade total
1,000
,548
Método de Extração: Análise de Componentes Principais.
Em seguida, calcula-se o número de fatores, a partir do método escolhido. Neste
trabalho, foi utilizado o método do componente principal, utilizando-se o eingenvalue
ou autovalor – um índice que representa a variância associada a um determinado fator.
A literatura sugere que somente sejam utilizados os fatores com autovalores totais
superiores a 1, uma vez que são esses fatores que explicarão a maior parte da
variância existente. Esta análise sugere a retenção de quatro componentes, que
explicam 61,83% da variância total da amostra (tabela 6.17). O primeiro componente,
ou fator, explica sozinho 28,84% da variância de todas as variáveis envolvidas. O
segundo fator explica, isoladamente 12,78% da variância da amostra, enquanto que o
terceiro explica 10,40%, e o quarto, aproximadamente 9,81% da variância total da
amostra. A partir do quinto fator, que apresenta eingevalue inferior a 1, não faz mais
sentido agrupar os dados, uma vez que os ganhos de poder de explicação tornam-se
decrescentes.
222
A etapa seguinte da análise fatorial é o calculo das correlações entre as variáveis
observáveis e cada fator encontrado, identificando as associações entre eles. Essas
correlações são denominadas cargas fatoriais. O resultado é uma matriz de
componentes que apresenta esses índices e a composição dos fatores. Entretanto, essa
matriz normalmente apresenta sobreposições que dificultam a interpretação dos
resultados, muitas vezes distribuindo as variáveis em vários fatores.
Tabela 6.19 – Variância Total Explicada
Extração
Inicial
Somas das Cargas ao Quadrado
Eigenvalues
Componente Total
% da
%
Total
% da
%
Variância
Cumulativo
Variância
Cumulativo
1
3,461
28,846
28,846
3,461
28,846
28,846
2
1,534
12,782
41,628
1,534
12,782
41,628
3
1,248
10,403
52,031
1,248
10,403
52,031
4
1,177
9,808
61,839
1,177
9,808
61,839
5
,946
7,882
69,721
6
,834
6,946
76,667
7
,650
5,419
82,086
8
,618
5,148
87,234
9
,493
4,108
91,342
10
,391
3,254
94,596
11
,363
3,022
97,618
12
,286
2,382
100,000
Método de Extração: Análise de Componentes Principais.
Para solucionar esse problema, o método utiliza uma estratégia de rotação dos fatores,
em especial a rotação varimax, que minimiza o número de variáveis com valores
elevados em cada fator (AAKER et al, op.cit.), clarificando a relação entre cada
variável e os fatores identificados. O resultado da rotação é uma matriz de
componentes rotacionados, conforme apresentado na Tabela 6.18, na qual se
identificam as correlações entre cada variável observável e os fatores ou componentes
identificados. A seqüência da análise é a interpretação desses resultados e
identificação de cada fator encontrado, caso seja possível.
Os fatores identificados com base na amostra desta tese são parcialmente consistentes
com aqueles identificados em Loiola et al (2003b). Entretanto, os objetivos do
223
referido trabalho (LOIOLA et al, op cit) referem-se exclusivamente a identificação e
interpretação dos fatores subjacentes às variáveis estudadas. Nesta tese, a análise
fatorial ultrapassa o escopo desses objetivos, uma vez que busca utilizar os fatores
identificados como base para análises complementares. Isso exige maiores cuidados
na análise dos fatores e na manutenção de variáveis que compõem cada fator.
Tabela 6.20 - Matriz de Componentes Rotacionados
Utilização atual da prática reengenharia
Utilização atual da prática parceria
Utilização atual da prática terceirização
Utilização atual da cultura aprendizagem
Utilização atual da prática empowerment
Utilização atual do trabalho em equipes
Utilização atual da manutenção p. total
Utilização atual da engenharia simultânea
Utilização atual da tecnologia integrada
Utilização atual das células de produção
Utilização atual da prática just in time
Utilização atual da gestão da qualidade
1
,209
,689
0,066
,762
,788
,769
,370
0,036
,126
,178
,406
,333
Componente
2
3
0,022
-0,089
-0,021
0,091
,438
,143
,182
-,352
0,084
-0,029
,217
,133
,352
,539
0,043
,744
-,216
,746
,132
,782
,135
,452
,187
-,624
4
,774
,360
,530
-0,068
,165
-0,055
-0,097
,137
-0,015
0,046
-,498
,111
Método de Extração: Análise de Componentes Principais.
Método de Rotação: Varimax com Normalização Kaiser.
A Rotação Convergiu em 7 iterações.
O primeiro fator identificado é composto pelas práticas parceria na cadeia de
suprimentos (parceria), cultura de aprendizagem, empowerment e trabalho em
equipes. O elevado índice alpha das variáveis envolvidas neste fator (0,7580) sugere
sua aceitação. Com exceção da primeira prática, as demais são tipicamente focadas na
gestão de pessoas e do trabalho, mais especificamente no desenvolvimento de pessoas
nas organizações.
É possível sugerir que houve algum tipo de viés com relação à prática parceria,
possivelmente na compreensão da questão “o quanto as parcerias na cadeia de
suprimentos são utilizadas atualmente na produção dessa fábrica?”. Aparentemente, a
tradução da prática supply chain management para parcerias na cadeia de
suprimentos levou os respondentes a se influenciaram com a expressão “parceria” e a
224
enfocarem mais as relações interpessoais com os fornecedores do que a questão de
suprimento de insumos. Certamente, tal interpretação é pertinente, porque tal prática
vem se colocando associada ao desafio de enxergar parceiros, e não apenas
fornecedores envolvidos com a cadeia de suprimento. Dessa forma, vem se
vinculando ao estabelecimento de contratos de longo prazo, certificação de
fornecedores, atividades cooperativas e de suporte entre os envolvidos nas transações
de suprimentos, maiores níveis de cooperação e confiança e menor importância de
interações inspiradas em lógicas de ação exclusivamente competitivas. Apesar das
explicações anteriores, a prática parceria na cadeia de suprimentos será eliminada do
primeiro fator, para assegurar que o primeiro fator se componha de práticas
exclusivamente de gestão de pessoas dentro de cada organização pesquisada.
O segundo fator é composto pelas práticas manutenção produtiva total, engenharia
simultânea, tecnologia integrada baseada em computadores e just in time. O índice
alpha em relação às variáveis envolvidas neste fator, apesar de inferior ao mesmo
índice relativo às variáveis do fator anterior, também sugere sua aceitação (0,5759).
As três primeiras práticas são tipicamente voltadas para a gestão do processo
produtivo, em especial com o desenvolvimento de produtos e do próprio processo
produtivo. Engenharia simultânea e tecnologia integrada utilizam extensivamente a
tecnologia da informação para projetar, desenvolver e fabricar produtos que
normalmente apresentam elevado conteúdo tecnológico, de acordo com revisão de
bibliografia desta fase. Manutenção produtiva total também é uma prática típica do
ambiente de produção e se refere à preservação por maior período de tempo e melhor
aproveitamento dos equipamentos, pelo treinamento extensivo da equipe de
operadores para a realização de tarefas de manutenção preventiva e de pequenos
reparos, ainda conforme definido na revisão bibliográfica desta tese. Entretanto, o
225
nível de utilização de tecnologia da informação dessa prática não é tão elevado quanto
a engenharia simultânea e a tecnologia integrada.
Já o just in time visa maior sincronização do processo produtivo, assegurando que os
fluxos de entrada de matérias primas e componentes sejam mais adequados aos fluxos
de saídas, reduzindo níveis de estoque e, consequentemente, os custos associados a
esse fluxo, como já discutido nesta tese.
Das quatro práticas posicionadas no fator 2, a que menos se ajusta teoricamente é o
just in time, que será eliminada. Ademais o just in time apresentou uma carga fatorial
elevada, porém negativa, em relação ao quarto fator, o que amplia sua inconsistência.
O terceiro fator representa a combinação das práticas células de produção e gestão da
qualidade total, sendo que esta última apresenta carga negativa, sugerindo uma
relação inversamente proporcional entre a utilização de células de produção e gestão
da qualidade total. Não há meios de justificar essa relação teoricamente.
Historicamente, as células de manufatura são associadas ao modelo japonês de
administração, que inclui também a gestão da qualidade total, o que torna inaceitável
essa relação inversa, muito pelo contrário. Crê-se que esse fator não faz sentido e que
as duas práticas devam ser desconsideradas enquanto fatores.
O quarto e último fator encontrado incorpora as práticas reengenharia, terceirização e
just in time, sendo que esta última apresenta carga fatorial negativa, o que sugere uma
relação inversamente proporcional. Destaca-se o fato de que just in time também
apresenta elevada carga fatorial positiva no fator dois devendo ser, portanto,
eliminada, também, do quarto fator. As duas práticas remanescentes no quarto fator
são representativas de práticas mais focadas na gestão do desempenho da organização
como um todo. A reengenharia se concentra na reformulação dos processos
empresariais visando à obtenção de ganhos de desempenho que incluem melhorias em
226
tempo, qualidade e custos. Entretanto, evidências sugerem que a reengenharia tenha
sido adotada no Brasil com um forte viés associado a demissões em grande escala,
voltadas a reduções de custos, mais uma vez de acordo com a revisão de literatura
desta tese.
A terceirização também passa por problema semelhante. Teoricamente, a terceirização
visa eliminar esforços internos que não contribuem diretamente para o negócio central
de uma organização, transferindo esses esforços para outras organizações parceiras e
permitindo que a organização contratante se foque em seu negócio central (core
business). Entretanto, no Brasil, com base na revisão de pesquisas sobre esta prática,
nesta tese, tende-se a concluir que houve uma tendência de terceirizações focadas na
eliminação de custos com pessoal, em serviços como limpeza, segurança e serviços de
tecnologia. Sendo assim, acredita-se que este fator se associa a práticas voltadas para
o desempenho das organizações, em especial na dimensão custos.
Quadro 6.1 – Fatores Identificados na Amostra
Fatores
Práticas
1. Práticas Inovadoras de Gestão de Pessoas e do Cultura de Aprendizagem
Desenvolvimento de Pessoas
Trabalho em Equipe
Empowerment
2. Práticas Inovadoras de Gestão do Processo de Manutenção Produtiva Total
Produção
Engenharia Simultânea
Tecnologia Integrada
3. Práticas Inovadoras de Gestão do Desempenho e Reengenharia
dos Custos
Terceirização
Fonte: Dados da pesquisa.
Dessa forma, das doze práticas incluídas na pesquisa, somente oito foram mantidas,
devido a inconsistências nos parâmetros calculados, e essas puderam ser reduzidas a
três fatores que acomodaram satisfatoriamente uma grande parte da variância
existente nos dados originais (51,43%), facilitando sua utilização em análises
adicionais, sem perda significativa de poder explicativo.
Com a identificação desses três grupos de práticas, o terceiro objetivo específico desta
tese foi alcançado, sendo que a hipótese relacionada a esse objetivo foi parcialmente
227
validada, tendo em vista que, do conjunto pesquisado de práticas, emergiram três
grupos de práticas, mas que esses três grupos não incorporaram quatro práticas
daquelas originalmente investigadas: qualidade total, parcerias na cadeia de
suprimento, células de produção e just in time.
Apesar disso, é possível afirmar que as organizações tendem a adotar práticas
inovadoras, concentradas em áreas que lhes são mais significativas, de forma isolada
ou em pacotes que se complementam. Como substituições das variáveis originais,
serão utilizadas, a seguir, suas combinações, com a somatória dos níveis de utilização
e tempo de uso das práticas que compõem cada fator, conforme apresentado no
quadro 6.1.
6.5. Tipologia de empresas da amostra
Nesta seção, resultados associados ao quarto objetivo específico desta tese, de
“classificar organizações de acordo com o padrão de adoção de práticas inovadoras de
administração e de produção”, assim, como com sua hipótese associada “as
organizações apresentam certas regularidades de comportamento em inovação,
relacionadas às suas características estruturais, como porte, setor de atuação, origem
de capital e processo produtivo, às suas estratégias genéricas, além de às suas
experiências com a utilização de práticas inovadoras” vão ser apresentados e
discutidos.
Para tanto, os dados foram tratados com a análise de conglomerados (análise de
clusters ou de agrupamentos), conforme apresentado em Malhotra (1999) Aaker et al
(2001), e Hair (2005), por exemplo. Essa análise busca integrar indivíduos ou objetos
a grupos, com base em semelhanças e diferenças existentes em uma determinada
população a partir de um conjunto previamente selecionado de variáveis. Os
agrupamentos resultantes dessa análise devem exibir elevada homogeneidade interna
228
e elevada heterogeneidade externa para que seja possível, ao mesmo tempo, separar
aqueles elementos que são diferentes e agrupar aqueles que apresentem semelhanças.
Embora venha sendo mais utilizada em pesquisas de marketing, em especial para o
desenvolvimento de segmentos de consumidores, a análise de conglomerados pode ser
uma técnica eficaz para analisar indivíduos e grupos de indivíduos, em qualquer área
de pesquisa. Uma vez criados os conglomerados, é possível, então, descrevê-los, seja
pelas próprias variáveis que os agrupam, ou por outras variáveis que possam
complementar a análise, sugerindo algo como a formação de taxonomias (tipologias
agregadoras).
Um dos problemas a serem resolvidos quando da utilização da análise de clusters é a
decisão de identificar em quantos grupos os indivíduos devem ser estudados. A
maneira mais comum de se realizar essa tarefa é o método hierárquico, aglomerativo,
segundo o qual os elementos de uma amostra são comparados, um a um, até que
sejam identificados os dois casos que apresentam as maiores similaridades entre si.
Esses dois casos são, então, combinados entre si, formando um agrupamento (cluster).
O método prossegue, então, identificando novos agrupamentos e incluindo novos
casos até que toda a amostra componha um único agrupamento. Essa combinação
pode ser visualizada por um gráfico, denominado dendrograma, que apresenta essas
relações, identificando visualmente o número de grupos ou clusters existentes na
amostra estudada (HAIR, 2005).
As principais críticas em relação à análise de conglomerados são as de que, (i) apesar
de ser apresentada como uma técnica quantitativa multivariada, com razoável
complexidade metodológica, ela é, na realidade, uma técnica meramente descritiva,
sem base teórica e não-inferencial (HAIR, 2005); e (2) essa técnica não apresenta
229
bases estatísticas sobre as quais seria possível esboçar inferências de uma amostra
para uma população, e é usada principalmente como uma técnica exploratória.
6.5.1. Identificação do número de clusters na amostra
Nesta tese, os clusters foram identificados utilizando-se variáveis geradas com a
combinação do nível de utilização e tempo de uso das práticas que compõem cada
fator identificado na seção anterior. Ou seja, foram criadas três novas variáveis que
representam os três fatores identificados, pelo cálculo das médias das médias das duas
variáveis e de todas as práticas que foram identificadas em cada fator, resultando em
scores representativos de o quanto cada empresa utiliza cada um dos três fatores –
Gestão de Pessoas, Gestão da Produção e Gestão dos Custos.
Em seguida, com o método de agrupamento hierárquico, foi identificado como cinco
o número de grupos existentes na amostra, que apresentariam o poder de associar com
maior homogeneidade interna e heterogeneidade externa os 98 casos da amostra desta
tese. O resultado dos agrupamentos está representado na tabela 6.19 e na figura 6.6,
pelos centros finais dos clusters.
A interpretação dos resultados sugere o desenvolvimento de uma taxonomia ou
tipologia das organizações com base nos resultados encontrados (HAIR, 2005),
conforme realizado, por exemplo, em Bastos e Borges-Andrade (2002), em Bastos
(1994), em Bertero (1981) e Miles e Snow (2003).
Tabela 6.21 – Centros Finais dos Clusters
Gestão de Pessoas
Gestão da Produção
Gestão do Desempenho / Custos
Fonte: Dados da pesquisa
Cluster 1 Cluster 2 Cluster 3 Cluster 4 Cluster 5
3,65
2,06
3,28
2,21
3,02
2,92
2,25
3,01
1,75
1,74
3,25
2,56
2,05
1,64
2,59
230
Figura 6.6 – Centros Finais dos Clusters
4,00
3,50
3,00
2,50
2,00
1,50
1,00
0,50
0,00
1
2
Gestão de Pessoas
3
Gestão da Produção
4
5
Gestao dos Custos
Fonte: Dados da Pesquisa
6.5.2. Descrição e análise dos agrupamentos identificados
O primeiro agrupamento identificado, contendo 16 empresas, apresenta os valores
mais elevados relativamente aos fatores 1 e 3, que representam práticas inovadoras de
gestão de pessoas (F1) e práticas inovadoras de administração dos custos (F3). Possui,
ainda, valor relativamente moderado em relação ao fator 2, que representa práticas
inovadoras de gestão da produção (F2). Tais resultados sugerem que este grupo de
empresas tem maior nível de inovação nas três dimensões. Este agrupamento é o que
detém a maior média de adoção de inovações, em relação aos demais (3,24). É,
também, o que se caracteriza por maior tempo de utilização de práticas inovadoras,
tendo começado por volta da primeira metade da década de 1990. Suas empresas
estão localizadas principalmente na região Sudeste, em São Paulo, mas também as
empresas localizadas na Bahia são expressivas. Os principais ramos industriais que
compõem este agrupamento são os de Produtos Químicos, de Artigos de Plástico e
Borracha, de Produtos de Minerais Não-Metálicos e de Metalurgia Básica.
231
Quadro 6.2 Cluster 1 – Inovadores Intensivos
Média de Adoção de Inovações
Tempo de Adoção
Estado
Região
Setores CNAE
No. Funcionários
Origem do Capital
País de Origem
Processo de Produção
Nível de Concorrência
Variações Imprevisíveis no
Nível de Demanda do Cliente
Variações Imprevisíveis no Tipo
de Produto Exigido Pelo Cliente
Variações Imprevisíveis nas
Matérias Primas
Estratégia Genérica
Crescimento da Receita
Lucratividade Média
Rentabilidade sobre a Receita
Rentabilidade sobre o
Patrimônio
3,24
Entre 1990 e 1995 (Entre dez e quinze anos)
São Paulo
Bahia
Sudeste
Nordeste
Produtos Químicos
Artigos de Plástico e Borracha
Produtos de Minerais Não-Metálicos
Metalurgia Básica
Entre 150 e 249 funcionários
Entre 250 e 499 Funcionários
Nacional
Brasileira
Por Encomenda
Processo Contínuo
Alto
Moderadamente
2,93
50%
25%
56,3%
25%
31,3%
12,5%
12,5%
12,5%
31,3%
25,0%
57,1%
64,3%
33,3%
33,3%
53,3%
33,3%
Muito
Pouco
33,3%
40,0%
Moderadamente
Moderadamente
40,0%
46,7%
Muito
Diferenciação
Custos
Estagnação
Pequeno Crescimento
Crescimento Moderado
Lucro Moderado
Grande Lucro
Rentabilidade Moderada
Pequena Rentabilidade
Pequena Rentabilidade
26,7%
53,3%
26,7%
31,3%
18,8%
25,0%
25,0%
18,8%
37,5%
12,5%
25,0%
Rentabilidade Moderada
Grande Rentabilidade
6,3%
37,5%
Fonte: Dados da pesquisa
As empresas pertencentes ao primeiro agrupamento identificado possuem
principalmente entre 150 e 499 funcionários. Esse agrupamento é o que apresenta o
menor percentual de empresas com capital nacional, comparativamente à amostra e
aos demais agrupamentos. As organizações desse agrupamento utilizam, como
processo produtivo, principalmente, a produção por encomenda e o processo contínuo.
Segundo as respostas obtidas, esse agrupamento se caracteriza, ainda, por apresentar
232
elevado nível de competição, enfrentar um nível também elevado de variações
imprevisíveis com relação à demanda do cliente e em variações na matéria prima;
todavia, as variações imprevisíveis no tipo de produto exigido pelos clientes são
moderadas ou baixas. As estratégias genéricas utilizadas pelas empresas desse
agrupamento são, principalmente, de diferenciação.
Em termos de resultados financeiros, as organizações do primeiro agrupamento não
apresentaram diferenças significativas em comparação com as empresas dos demais
segmentos, mas apresentaram tendência à estagnação ou baixo crescimento da receita.
Ainda, em termos de rentabilidade, essas organizações apresentaram valores
moderados, tanto sobre a receita quanto sobre o patrimônio (quadro 6.2).
O segundo agrupamento, por sua vez, apresenta valores reduzidos ou moderados em
todos os fatores que compõem a análise, o que sugere uma postura mais conservadora
por parte das empresas que o compõem – 20 empresas. Esse agrupamento apresenta a
segunda menor média de adoção de inovações (2,32) e vem adotando práticas
inovadoras a partir de 1995, principalmente. Além de São Paulo e outros Estados da
Região Sudeste, as organizações deste agrupamento também se concentram na Região
Sul do país, em especial no Rio Grande do Sul.
As indústrias do segundo cluster atuam principalmente nos ramos de Metalurgia
Básica, de Produtos Químicos e Máquinas, de Aparelhos e Materiais Elétricos, e
possuem até 1000 funcionários em seu quadro de pessoal. São empresas de capital
principalmente nacional, que utilizam diversos tipos de processo produtivo – por
encomenda, em processo contínuo e por lotes. As empresas desse agrupamento
afirmam enfrentar elevado nível de concorrência, com elevado nível de variações
imprevisíveis na demanda dos clientes e de variações imprevisíveis no tipo de produto
exigido pelos clientes, mas com poucas variações imprevisíveis nas matérias primas.
233
Essas empresas costumam adotar estratégias genéricas híbridas (meio-termo) ou de
custos.
Quadro 6.3 Cluster 2 – Inovadores Moderados
Média de Adoção de Inovações
Tempo de Adoção
Estado
Região
Setores CNAE
No. Funcionários
Origem do Capital
País de Origem
Processo de Produção
Nível de Concorrência
Variações Imprevisíveis no
Nível de Demanda do Cliente
Variações Imprevisíveis no Tipo
de Produto Exigido Pelo Cliente
Variações Imprevisíveis nas
Matérias Primas
Estratégia Genérica
Crescimento da Receita
Lucratividade Média
Rentabilidade sobre a Receita
Rentabilidade sobre o
Patrimônio
2,32
Entre 1995 e 2000 (Entre 5 e 10 anos)
São Paulo
Rio Grande do Sul
Sudeste
Sul
Metalurgia Básica
Produtos Químicos
Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos
Até 1000 Funcionários (Distribuídos)
Nacional
2,08
25%
25%
40,0%
45,0%
25,0%
20,0%
15,0%
95,0%
82,4%
Brasileira
Por Encomenda
Processo Contínuo
Por Lotes
Alto
Muito
82,4%
26,3%
26,3%
26,3%
57,9%
44,4%
Totalmente
Moderadamente
33,3%
31,6%
Muito
Sempre
Pouco
26,3%
21,1%
47,4%
Moderadamente
Custos
Meio-Termo
Distribuído (Tendência a Pequeno Crescimento)
Distribuído (Tendência a prejuízo)
Pequena Rentabilidade
Rentabilidade Moderada
Grande Rentabilidade
Pequena Rentabilidade
21,1%
36,8%
52,6%
15,0%
25,0%
15,0%
25,0%
Grande Rentabilidade
50,0%
Fonte: Dados da pesquisa
Em termos de resultados financeiros, essas organizações apresentam crescimento da
receita e lucratividade classificados nas diferentes categorias e elevados índices de
rentabilidade, especialmente em rentabilidade sobre o patrimônio (quadro 6.3).
Já o terceiro agrupamento, um conjunto de vinte casos, apresenta valores elevados em
relação aos fatores 1 e 2 e o segundo valor mais baixo em relação ao fator 3, gestão
dos custos. Se, por um lado, essas empresas são inovadoras em práticas de gestão de
234
pessoas e em práticas de gestão da produção, apresentam certa despreocupação com
as práticas inovadoras de gestão dos custos.
Em geral, as empresas do terceiro cluster caracterizam-se por um nível moderado de
adoção de inovações (2,93) próximo da média geral de adoção de todas as empresas
investigadas (2,99). Essas empresas também iniciaram a adoção de inovações por
volta de 1995. Esse agrupamento apresenta expressiva participação de empresas
situadas no Estado do Ceará, além das empresas situadas na Região Sudeste, que
possui a maior participação na amostra. Tipicamente, são empresas dos ramos de
Produtos Alimentícios e Bebidas e de Produtos de Minerais Não-Metálicos. Em
relação ao número de funcionários, as empresas desse agrupamento apresentam uma
distribuição eqüitativa, não se concentrando em qualquer das faixas. A propriedade do
capital dessas empresas é predominantemente nacional, em percentual proporcional
àquele presente na amostra desta tese.
O processo de produção utilizado pelas empresas do terceiro agrupamento é
tipicamente por encomenda ou por processo contínuo. Os respondentes dessas
empresas afirmaram que o nível de concorrência enfrentado por eles é muito alto, que
enfrentam níveis moderados de variações imprevisíveis no nível de demanda dos
clientes, variações imprevisíveis no tipo de produto exigido pelo cliente e nas matérias
primas em nível baixo ou moderado. Curiosamente, essas empresas afirmam utilizar
estratégias genéricas de custos.
As empresas do terceiro agrupamento apresentam tanto o crescimento da receita
quanto lucratividade de moderados a grandes, e comparativamente às empresas da
amostra, menores níveis de rentabilidade sobre receita e rentabilidade sobre o
patrimônio (quadro 6.4).
235
Quadro 6.4 Cluster 3 – Inovadores Intensivos Indiferentes a Custos
Média de Adoção de Inovações
Tempo de Adoção
Estado
2,93
Por volta de 1995 (2,5)
São Paulo
Ceará
Sudeste
Nordeste
Produtos Alimentícios e Bebidas
Produtos de Minerais Não-Metálicos
35,0%
15,0%
45,0%
25,0%
30,0%
15,0%
No. Funcionários
Origem do Capital
Distribuídos Equilibradamente
Nacional
78,9%
País de Origem
Processo de Produção
Brasileira
Por Encomenda
Processo Contínuo
Alto
Muito Alto
Moderadamente
78,9%
26,3%
31,6%
36,8%
31,6%
42,1%
Muito
Pouco
15,8%
36,8%
Moderadamente
Pouco
36,8%
47,4%
Moderadamente
Muito
Custos
Meio-Termo
Crescimento Moderado
Grande Crescimento
Pequeno Lucro
Lucro Moderado
Grande Lucro
Pequena Rentabilidade
Rentabilidade Moderada
Pequena Rentabilidade
21,1%
21,1%
42,1%
42,1%
25,0%
25,0%
20,0%
30,0%
10,0%
25,0%
35,0%
30,0%
Grande Rentabilidade
35,0%
Região
Setores CNAE
Nível de Concorrência
Variações Imprevisíveis no
Nível de Demanda do Cliente
Variações Imprevisíveis no Tipo
de Produto Exigido Pelo Cliente
Variações Imprevisíveis nas
Matérias Primas
Estratégia Genérica
Crescimento da Receita
Lucratividade Média
Rentabilidade sobre a Receita
Rentabilidade sobre o
Patrimônio
Fonte: Dados da pesquisa
O quarto agrupamento, que contém 22 empresas, apresenta valores reduzidos em
relação aos fatores 2 e 3, enquanto apresenta valor moderado em relação ao fator 1 –
práticas inovadoras de gestão de pessoas, sugerindo certo foco nesse campo. É o
segmento que apresenta o menor índice de adoção de inovações de todos os
identificados nesta tese (2,0). As empresas deste agrupamento também são as que
iniciaram suas atividades inovativas mais tardiamente, por volta de 1996 a 1997. São
236
empresas concentradas na Região Sudeste, com destaque para empresas situadas no
Rio de Janeiro, distribuídas em diversos ramos industriais, especialmente Celulose,
Papel e Produtos de Papel, Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos, e Móveis e
Indústrias Diversas.
Quadro 6.5 Cluster 4 – Inovadores Moderados com Foco em Gestão de Pessoas
Média de Adoção de Inovações
Tempo de Adoção
Estado
Região
Setores CNAE
No. Funcionários
Origem do Capital
País de Origem
Processo de Produção
Nível de Concorrência
Variações Imprevisíveis no
Nível de Demanda do Cliente
Variações Imprevisíveis no Tipo
de Produto Exigido Pelo Cliente
Variações Imprevisíveis nas
Matérias Primas
Estratégia Genérica
Crescimento da Receita
Lucratividade Média
Rentabilidade sobre a Receita
Rentabilidade sobre o
Patrimônio
2,00
A partir de 2000 – Por volta de 1996
São Paulo
Rio de Janeiro
Sudeste
Sul
Produtos Químicos
Produtos Metalurgia Básica
Celulose, Papel e Produtos de Papel
Produtos Alimentícios e Bebidas
Máquinas, Aparelhos e Materiais Elétricos
Móveis e Indústrias Diversas
Até 499 Funcionários
Nacional
Estrangeira
Brasileira
Por Encomenda
Por Lotes
Alto
Muito Alto
Equilibrado
18,2%
31,8%
59,1%
22,7%
13,6%
13,6%
13,6%
9,1%
9,1%
9,1%
77,3%
75%
20,0%
75,0%
42,9%
23,8%
42,9%
33,3%
Pouco
38,1%
Moderadamente
Pouco
33,3%
33,3%
Moderadamente
Muito
Custos
Meio-Termo
Crescimento Moderado
Grande Crescimento
Nem Lucro Nem Prejuízo
Pequeno Lucro
Lucro Moderado
Pequena Rentabilidade
Rentabilidade Moderada
Pequena Rentabilidade
28,9%
33,3%
38,1%
38,1%
27,3%
18,2%
27,3%
18,2%
18,2%
18,2%
31,8%
27,3%
Grande Rentabilidade
22,7%
Fonte: Dados da pesquisa
Essas empresas possuem até 499 funcionários, capital nacional e processos de
produção por encomenda. Seus dirigentes declararam que enfrentam um nível muito
237
alto de concorrência e baixo ou moderado nível de variações imprevisíveis, tanto em
relação à demanda dos clientes, quanto ao tipo de produto exigido pelos clientes e nas
matérias primas. Informaram, ainda, que adotam estratégias genéricas de meio termo
ou de custos.
Ademais, suas empresas apresentam nível de moderado a grande de crescimento da
receita, baixos índices de lucratividade e índices moderados de rentabilidade sobre o
patrimônio e receita (quadro 6.5).
O quinto e último agrupamento, composto por vinte empresas, apresenta valores
elevados em relação aos fatores 1 e 3, embora em menor nível que o primeiro, e
apresenta, ainda, reduzido valor em relação ao fator 2 – gestão da produção, também
sugerindo a pouca importância dada pelas empresas às práticas gerenciais nessa área.
Esse agrupamento também apresenta baixo índice geral de adoção de inovações em
comparação com a amostra geral (2,45). Suas empresas iniciaram seu processo de
modernização gerencial por volta de meados da década de 1990, mais precisamente
em 1993. Assim, como o primeiro cluster estudado, apresenta uma significativa
participação de empresas baianas, além das empresas situadas em São Paulo.
As empresas desse grupo atuam em diversos ramos da indústria, com destaque para o
de Produtos de Minerais Não-Metálicos e Metalurgia Básica. São empresas que
possuem até 499 funcionários, e possuem capital de origem nacional, em nível
ligeiramente maior que a média. Utilizam processos de produção tipicamente por
processo contínuo, enfrentam níveis de moderados a altos de concorrência e
enfrentam níveis de baixos a moderados de variações imprevisíveis com relação à
demanda dos clientes. Essas empresas também enfrentam níveis de moderados a
baixos de variações imprevisíveis no tipo de produto exigido pelos clientes e de
variações imprevisíveis nas matérias primas (quadro 6.6).
238
Quadro 6.6 Cluster 5 – Inovadores Moderados Indiferentes a Produção
Média de Adoção de Inovações
Tempo de Adoção
Estado
Região
Setores CNAE
No. Funcionários
Origem do Capital
País de Origem
Processo de Produção
Nível de Concorrência
Variações Imprevisíveis no
Nível de Demanda do Cliente
Variações Imprevisíveis no Tipo
de Produto Exigido Pelo Cliente
Variações Imprevisíveis nas
Matérias Primas
Estratégia Genérica
Crescimento da Receita
Lucratividade Média
Rentabilidade sobre a Receita
Rentabilidade sobre o
Patrimônio
2,45
Entre 1995 e 2000 – Por volta de 1998
São Paulo
Bahia
Sudeste
Nordeste
Produtos de Minerais Não-Metálicos
Metalurgia Básica
Produtos Alimentícios e Bebidas
Até 499 Funcionários
Nacional
Estrangeira
Brasileira
Processo Contínuo
Por Encomenda
Moderado
Alto
Pouco
35,0%
25,0%
45,0%
35,0%
20,0%
20,0%
15,0%
75,0%
84,2%
15,8%
84,2%
50,0%
25,0%
35,0%
45,0%
20,0%
Moderadamente
Sempre
Moderadamente
45,0%
20,0%
50,0%
Pouco
Pouco
20,0%
25,0%
Moderadamente
Muito
Custos
Diferenciação
Pequeno Crescimento (Distribuídos)
Crescimento Moderado
Grande Crescimento
Distribuídos
Rentabilidade Moderada
Grande Rentabilidade
Rentabilidade Neutra
45,0%
25,0%
50,0%
20,0%
15,0%
10,0%
25,0%
Pequena Rentabilidade
Grande Rentabilidade
15,0%
40,0%
30,0%
25,0%
15,0%
Fonte: Dados da pesquisa
Paradoxalmente, as empresas desse segmento apresentam maiores percentuais de
adotantes de estratégias genéricas de custos, e, em menor escala, de diferenciação.
São empresas que apresentam elevados níveis de crescimento da receita, de
rentabilidade sobre o patrimônio e sobre a receita, e lucratividade distribuída entre
todas as categorias. A interpretação dos resultados acerca dos cinco agrupamentos
239
sugere a classificação dos agrupamentos conforme apresentado no quadro 6.7,
adiante.
Quadro 6.7 – Interpretação e Classificação dos Clusters
Cluster 1 - Inovadores Intensivos
Cluster 2 - Inovadores Moderados
Cluster 3 - Inovadores Intensivos Indiferentes a Custos
Cluster 4 - Inovadores Moderados com Foco em Gestão de Pessoas
Cluster 5 - Inovadores Moderados Indiferentes a Produção
Fonte: Dados da pesquisa
A análise realizada nesta seção demonstra a possibilidade de identificar grupos com
características semelhantes em amostras e populações de qualquer natureza. Com a
aplicação da análise de clusters, é possível subdividir amostras e populações em
subgrupos que permitam identificar nuances de comportamento, de acordo com
variáveis selecionadas. As organizações estudadas puderam ser agrupadas de maneira
que fosse possível identificar padrões de adoção de inovações, conforme proposto na
quarta hipótese desta tese. Foi possível, ainda, identificar outras diferenças e
semelhanças de comportamento, associadas aos perfis identificados. Entretanto,
persiste o desafio de selecionar as variáveis que sejam mais significativas para a
realização dessa análise, tanto para o agrupamento dos casos quanto para a
identificação das diferenças que façam sentido. Somente a cuidadosa preparação da
pesquisa e minuciosa seleção de variáveis poderão garantir análises de agrupamentos
que façam sentido, e que contribuam para percepções originais e a construção de
taxonomias ou tipologias que aumentem o conhecimento acerca do objeto de estudo.
6.6. Modelagem de Equações Estruturais
Esta seção relaciona-se ao objetivo específico de “associar os padrões de adoção de
práticas inovadoras ao desempenho operacional e ao desempenho financeiro”, cuja
hipótese correlata é: “A adoção de práticas inovadoras associa-se a ganhos de
240
desempenho operacional e financeiro, que justificam racionalmente as decisões de
adoção, reforçando a propensão à continuidade de uso”.
Modelagem de equações estruturais (MEE) é método multivariado de análise
quantitativa, que, segundo Codes (2005), se caracteriza pela capacidade de
especificar, estimar e testar relações hipotéticas entre um grupo de variáveis
observáveis, demonstrando e/ou confirmando a existência de variáveis latentes e
relações de associação, e ainda de estimar o erro de mensuração do processo de
estimação (HAIR 2005). De maneira geral, a MEE utiliza um conjunto de equações
separadas de regressão múltipla, mas interdependentes, simultaneamente, com a
especificação do modelo estrutural utilizado (HAIR, 2005).
Um dos modos de proceder da MEE é a construção de diagramas de caminhos, que
servem tanto para entrada de dados quanto para a saída dos resultados. Como entrada
de dados, o diagrama de caminhos ilustra as relações hipotéticas de dependência
esperadas, de acordo com a teoria abraçada e com as hipóteses dos pesquisadores
sobre o objeto de estudo. Como saída, o diagrama de caminhos apresenta os
resultados das relações testadas (HAIR, 2005). A técnica permite a construção de
modelos alternativos e teste de suas validades, de modo que seja possível identificar o
que melhor explica a relação entre as variáveis, assim como o que se ajusta completa
ou parcialmente às teorias abraçadas ou, ainda, sugerindo novas hipóteses sobre
relações envolvidas no objeto de estudo.
Assim como na análise fatorial, alguns testes de confiabilidade são utilizados para
informar a decisão de aceitação de modelos: o BBNFI (Bentler-Bonnet Normed Fit
Index), o BBNNFI (Bentler-Bonnet Non-Normed Fit Index), o CFI (Comparative Fit
Index) e o RMSEA (Root Mean Square Error of Approximation). Tais testes indicam
a proporção na melhoria de ajuste geral do modelo proposto pelo pesquisador, exceto
241
o último deles, que representa o desajuste do modelo (CODES, 2005). Para que seja
aceito o modelo, os valores dos três primeiros testes devem ser próximos de 1,
enquanto que o do último deve apresentar valor reduzido, inferior a 0,07 (sete por
cento). Uma discussão mais aprofundada sobre esses índices pode ser encontrada em
Codes (2005). Outra importante medida utilizada na interpretação do modelo é o
coeficiente de determinação (R2), que representa a percentagem da variabilidade
presente em uma variável dependente que foi explicada pela independente (CODES,
2005).
6.6.1. Relações entre utilização de práticas inovadoras de gestão,
desempenho operacional, desempenho financeiro e propensão à
continuidade de uso
Inicialmente, será apresentado o modelo que norteia as análises desta seção, com a
apresentação de todas as variáveis envolvidas e das associações esperadas, conforme
descrito na hipótese 5 deste trabalho. A lógica do modelo proposto é a de que a
adoção de práticas inovadoras de gestão, subdivididas em três conjuntos – práticas
inovadoras de gestão de pessoas, práticas inovadoras de gestão da produção e práticas
inovadoras de gestão do desempenho e dos custos – tende a influenciar o desempenho
organizacional, tanto operacional quanto financeiro, o que, em contrapartida,
influencia também a propensão à continuidade de uso. Ademais, a utilização de
práticas inovadoras de gestão, isoladamente, tende a influenciar também a propensão
à continuidade de uso.
A figura 6.7 apresenta as relações entre as variáveis que compõem esta análise.
Entretanto, uma das características da modelagem de equações estruturais se refere ao
número de variáveis necessárias para construção de um modelo, sendo recomendada
uma proporção de cerca de dez casos estudados para cada variável observável. Como
242
a amostra, neste trabalho, consistiu de 98 casos, com um considerável número de
missing cases em algumas variáveis, o limite máximo de variáveis envolvidas no
modelo se limitou a dez, sendo necessário construir um modelo para cada construto,
ao invés de um único modelo que envolvesse todas as variáveis, relativas a todos os
construtos.
Figura 6.7 – Práticas inovadoras, desempenho operacional, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso
Práticas Inovadoras de
Gestão de Pessoas
Cultura de Aprendizagem
Empowerment
Trabalho em Equipe
Práticas Inovadoras de
Gestão Desempenho e
dos Custos
Manut.Produt. Total Tec.Integrada Baseada
Engenharia Simultânea em Computadores
Práticas
Inovadoras de
Gestão
Melhorias em
Qualidade
Reduções de
Custos
Práticas Inovadoras de
Gestão da Produção
Desempenho
Operacional
Lucratividade
Desempenho
Financeiro
Melhorias em
Respons.
Reengenharia
Terceirização
Rentabilidade
s/ Patrimônio
Rentabilidade
s/ Ativo
Propensão à
Continuidade e
Uso
Prop. À
Continuidade
Uso
Fonte: Dados da pesquisa
Os diagramas de caminho avaliados foram resultantes de análises fatoriais
preliminares, que identificaram três construtos (variáveis latentes) com base no banco
de dados utilizado, conforme visto em seção anterior. Os dois primeiros fatores –
práticas inovadoras de gestão de pessoas e práticas inovadoras de gestão do processo
de produção – apresentaram consistência interna aceitável (alpha de Cronbach,
243
respectivamente, iguais a 0,758 e 0,576), e foram utilizados na íntegra na modelagem.
O terceiro fator identificado – práticas inovadoras de gestão do desempenho e dos
custos, entretanto, apresentou um alpha muito reduzido (0,2715), o que desencorajou
sua utilização como construto independente. Dessa forma, foram construídos modelos
que utilizaram as variáveis relativas ao nível de utilização da terceirização e da
reengenharia isoladamente, sem a formação de variável latente.
Entretanto, após a construção dos modelos propostos, o segundo modelo, relativo à
utilização de práticas inovadoras de gestão do processo de produção e o desempenho
operacional e financeiro e a propensão à continuidade de uso não convergiu. Ou seja,
não foi processado pelo software (EQS), devido a problemas de consistência interna,
sendo abandonado.
Em substituição ao segundo modelo, foi incluída na análise a interpretação da
influência das células de manufatura, isoladamente, sobre os desempenhos financeiro
e operacional e sobre a propensão à continuidade de uso. Mesmo tendo sido
desconsiderado pelos resultados da análise fatorial, o construto representado pelas
células de manufatura ainda explicava, sozinho, aproximadamente 10% da variância
total verificada na amostra.
Além dos construtos relativos às práticas inovadoras, foram testados outros três
construtos, referentes aos resultados esperados com a adoção das práticas. O primeiro
representa o desempenho operacional, incluindo três dimensões – melhorias em
qualidade, reduções de custos e melhorias em responsividade. Foi avaliado, ainda, o
desempenho financeiro, também incluindo três dimensões – lucratividade,
rentabilidade sobre o patrimônio e rentabilidade sobre o ativo –, além de um terceiro
construto, referente à propensão à continuidade de uso com as práticas que compõem
o primeiro construto.
244
6.6.2. Modelo 1 - Práticas Inovadoras de gestão de pessoas, desempenho
operacional, desempenho financeiro e propensão à continuidade de
uso
O primeiro diagrama de caminhos testado incorpora as relações entre a utilização de
práticas inovadoras de gestão de pessoas, desempenho operacional, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso, conforme apresentado na figura 6.8.
Este modelo foi o único que pôde ser construído completamente, uma vez que os
demais modelos ou não convergiram na modelagem ou seus construtos não
apresentaram consistência suficiente na análise fatorial para serem utilizados na
modelagem de equações estruturais.
Percebe-se, no modelo, que a utilização dessas práticas inovadoras influencia,
indiretamente, na satisfação obtida com as melhorias em desempenho financeiro e
operacional, a propensão à continuidade de uso com as mesmas práticas.
O modelo mostra uma relação significativa8 entre a adoção de práticas inovadoras de
gestão de pessoas e desempenho operacional, apresentando um coeficiente de
determinação (R2) de 0,681 para esse último construto. Entretanto, o modelo não
identifica relações significativas entre a adoção de tais práticas, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso. Somente são identificadas relações
entre o desempenho operacional e desempenho financeiro com a propensão à
continuidade de uso com essas práticas (R2 = 0,168).
8
Nível de significância de 5%
245
Figura 6.8 - Modelo 1: Práticas Inovadoras de gestão de pessoas, desempenho
operacional, desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso
Cultura de
Aprendizagem
Trabalho em
Equipe
Empowerment
0,669
0,430
0,535
Práticas
Inovadoras de
Gestão de
Pessoas
0,825
Melhorias em
Qualidade
Lucratividade
0,695
Reduções de
Custos
0,854
0,858
Desempenho
Operacional
R2 = 0,681
Desempenho
Financeiro
0,973
Rentabilidade
s/ Patrimônio
0,664
0,557
Melhorias em
Respons.
Rentabilidade
s/ Ativo
0,255
0,532
Prop.Cont.Cult.
Aprend.
Propensão à
Continuidade e
Uso
R2 = 0,168
0,515
Prop.Cont.
Empowerment
-0,321
BBNFI = 0,794
BBNNFI = 0,910
CFI = 0,930
RMSEA = 0,070
0,738
Prop.Cont.
Trab. Equipe
Fonte: Dados da pesquisa
Em relação ao primeiro modelo construído nesta análise, todos os índices de ajuste
apresentaram resultados satisfatórios, sugerindo que o modelo pode ser considerado
uma boa representação das relações propostas.
Entretanto, a relação identificada entre desempenho financeiro e propensão à
continuidade de uso é negativa, ou seja, sugere uma relação inversamente
proporcional, contrária ao esperado pelas hipóteses desta tese. Como não foi
verificada relação entre a utilização de práticas inovadoras de gestão de pessoas e
desempenho financeiro, pode-se sugerir a existência de variáveis intervenientes que
não foram incluídas pelo modelo, mas que influenciam significativamente o
desempenho financeiro. Ou seja, é possível afirmar, com base nos resultados obtidos,
que a adoção de práticas inovadoras de gestão de pessoas influencia positivamente o
246
desempenho operacional, o qual, por sua vez, influencia a propensão à continuidade
de uso. Sendo assim, adicionalmente, a adoção de práticas inovadoras de gestão de
pessoas influencia indiretamente a propensão à continuidade de uso.
As relações significantes incorporadas ao modelo mostram-se em consonância com a
discussão teórica e o relato de outros resultados de pesquisa registrados nesta tese, que
sugerem que empresas tenderão a adotar práticas inovadoras de gestão de pessoas
como cultura de aprendizagem, empowerment e trabalho em equipe, como forma de
buscar novos padrões de desempenho operacional, que poderiam, no curto ou no
longo prazo, concorrer para melhorar seu desempenho financeiro.
6.6.3. Modelo 2 – Células de manufatura, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso
As relações entre a adoção de células de manufatura, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso são apresentadas no
segundo modelo (Figura 6.9). Testados os coeficientes de ajuste do modelo, os
resultados sugerem que, também neste caso, o modelo oferece uma representação
satisfatória da realidade estudada.
No segundo modelo, são identificadas fortes relações entre a utilização de células de
manufatura e desempenho operacional e, também, entre o desempenho operacional e a
propensão à continuidade de uso. Não foram identificadas relações entre a adoção de
células de manufatura e desempenho financeiro, assim como no primeiro modelo. Os
coeficientes de determinação sugerem razoável poder de explicação da variância de
variáveis dependentes como resultado da variação das independentes.
Os resultados obtidos neste modelo sugerem que a adoção de células de manufatura
influencie direta e positivamente o desempenho operacional, mas não influencia
diretamente o desempenho financeiro. Apesar de somente validar parcialmente a
247
quinta hipótese desta tese, este achado está em consonância com a teoria existente
sobre a prática células de manufatura, que não associa diretamente a adoção dessa
prática a ganhos financeiros, especialmente no curto prazo.
Figura 6.9 – Modelo 2: Células de Manufatura, desempenho operacional,
desempenho financeiro e propensão à continuidade de uso
Células de
Manufatura
0,854
Melhorias em
Qualidade
Lucratividade
0,940
Reduções de
Custos
0,926
Desempenho
Operacional
R2 = 0,730
Desempenho
Financeiro
Rentabilidade
s/ Patrimônio
0,946
Melhorias em
Respons.
Rentabilidade
s/ Ativo
0,443
Prop. Cont.
Cél.Manufatura
R2 = 0,197
BBNFI= .965
BBNNFI= .995
CFI= .987
RMSEA= .034
Fonte: Dados da pesquisa.
6.6.4. Modelo 3: Reengenharia, reduções de custos, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso
O terceiro modelo avalia as relações entre a adoção da reengenharia, enquanto
representante de práticas inovadoras de gestão do desempenho e dos custos,
desempenho operacional, propensão à continuidade de uso e desempenho financeiro,
(figura 6.10). Como nos casos anteriores, o sistema de relações gerado pelo terceiro
modelo estudado apresenta índices de ajuste aceitáveis. Este modelo identifica um
padrão de relações semelhante ao identificado nos demais modelos: há uma relação
248
entre adoção da reengenharia, desempenho operacional (R2 = 0,505) e propensão à
continuidade de uso (R2 = 0,233).
Figura 6.10 – Modelo 3: Reengenharia, reduções de custos, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso
Reengenharia
0,711
Melhorias em
Qualidade
Lucratividade
0,886
Reduções de
Custos
0,915
Desempenho
Operacional
R2 = 0,505
Desempenho
Financeiro
Rentabilidade
s/ Patrimônio
0,785
Melhorias em
Respons.
Rentabilidade
s/ Ativo
0,483
Prop. Cont.
Reengenharia
R2 = 0,233
BBNFI= .968
BBNNFI= .972
CFI= .986
RMSEA= .087
Fonte: Dados da pesquisa.
Desse modo, é possível sugerir que a adoção da reengenharia esteja associada à
melhorias em desempenho operacional, e à propensão à continuidade de uso, mas não
ao desempenho financeiro. Teoricamente, espera-se, de fato, que a reengenharia esteja
mais associada ao desempenho operacional, com reflexos posteriores no desempenho
financeiro.
6.6.5. Modelo 4: Terceirização, desempenho operacional, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso
O quarto e último modelo construído nesta análise se refere à relação entre a adoção
da terceirização, também representante da adoção de práticas inovadoras de gestão do
desempenho pelos custos, desempenho operacional, desempenho financeiro e
249
propensão à continuidade de uso, conforme apresentado na figura 6.11. O quarto
modelo também apresenta índices satisfatórios de ajuste.
O padrão de relações identificadas neste modelo é equivalente ao anterior: são
identificadas relações entre a adoção de terceirização e desempenho operacional, e
entre desempenho operacional e propensão à continuidade de uso com a prática,
ambas em nível de significância de cinco por cento.
Por outro lado, não foi identificada uma relação direta entre a adoção da prática, o
desempenho financeiro e a propensão à continuidade de uso, nem indireta, entre o
desempenho financeiro e a propensão à continuidade de uso. Ao que parece, a adoção
da terceirização no Brasil está exclusivamente associada ao desempenho operacional,
ainda que exista um consenso de que o grande foco das terceirizações no Brasil venha
sendo a redução de custos, conforme registrado em partes anteriores desta tese.
Figura 6.11 – Modelo 4: Terceirização, desempenho operacional, desempenho
financeiro e propensão à continuidade de uso
Terceirização
0,391
Melhorias em
Qualidade
Lucratividade
0,680
Redução de
Custos
0,606
0,884
Desempenho
Financeiro
Desemp.
Operacional
R2 = 0,681
0,956
Rentabilidade
s/ Patrimônio
0,674
0,590
Melhorias em
Responsiv.
Rentabilidade
s/ Ativo
0,247
Prop. Cont.
Terceirização
R2 = 0,110
BBNFI = 0,853
BBNNFI = 0,916
CFI = 0,940
RMSEA = 0,085
Fonte: Dados da pesquisa.
De maneira geral, percebe-se nos modelos avaliados que a adoção de práticas
inovadoras no campo da administração da produção, em suas diversas ramificações
250
(gestão de pessoas, gestão do desenvolvimento de produtos, gestão do processo
produtivo, gestão do desempenho produtivo), está mais diretamente relacionada a
melhorias no desempenho operacional em três dimensões: qualidade, custos e
responsividade.
Os resultados percebidos no desempenho operacional, por sua vez, parecem
influenciar a propensão à continuidade de uso. Não se percebe uma influência direta
da adoção dessas práticas sobre o desempenho financeiro, nem influências do
desempenho financeiro sobre a propensão à continuidade de uso.
Sendo assim, valida-se, parcialmente, a hipótese 5 desta tese, que sugere que “a
adoção de práticas inovadoras associa-se a ganhos de desempenho operacional e
financeiro, que justificam racionalmente as decisões de adoção, reforçando a
propensão à continuidade de uso”. Os resultados encontrados validam essa hipótese
somente no sentido do desempenho operacional, não no desempenho financeiro. Não
somente não foram encontrados indícios de que a adoção de tais práticas influencie
positivamente o desempenho financeiro, mas, também, não foram encontrados
indícios de que ganhos financeiros influenciem a propensão à continuidade de uso
com tais práticas.
7. Considerações Finais
A sucessão de novas tecnologias e de inovações sociais tem sido elemento central nas
explicações do desenvolvimento do mundo capitalista. Segundo algumas dessas
perspectivas, diversas trajetórias tecnológicas têm ocasionado diferentes impactos
sobre as economias de Países, e a organização tem sido elemento central nessa
dinâmica, enquanto locus primário do desenvolvimento científico e tecnológico.
Inovação, não somente como fonte de novos produtos e tecnologias produtivas, mas,
também, como fonte de novas formas de organizar o trabalho humano, passa a ser
associada à competitividade e ao desenvolvimento em sociedades crescentemente
marcadas pela descontinuidade e pela ruptura.
Em uma perspectiva mais micro orientada, a inovação também pode ser utilizada
como explicação para mudanças no cenário competitivo entre organizações. Nessa
perspectiva, a inovação e a aprendizagem são mecanismos organizacionais que levam
ao aprimoramento de suas operações e de seus produtos, enriquecem suas
competências essenciais e permitem melhor produtividade e maior competitividade,
ainda que em um contexto de mudanças bruscas e descontinuidade.
Mas a análise da inovação deve ser realizada com cautela, como forma de evitar
interpretações ingênuas e posições limitadas sobre seu desenvolvimento. Uma das
posições mais cautelosas sobre o desenvolvimento de inovações é a de que o processo
de inovação se desenvolve em ciclos não lineares ou descontínuos, em processos
desorganizados que freqüentemente encontram retrocessos e fracassos, em
contraponto à interpretação de que o processo de inovação sempre ocorre em uma
seqüência clara de estágios perfeitamente identificáveis e gerenciáveis, movimentos
descontínuos e aleatórios que iniciam trajetórias divergentes de desenvolvimentos
252
que, em algum ponto da história de uma organização ou de uma sociedade, passam a
fazer sentido, convergindo para soluções inovadoras que representam soluções viáveis
de tecnologias e arranjos sociais (VAN de VEN, 1995; DOOLEY e VAN de VEN,
1999).
É possível assumir diversas perspectivas de análise sobre a adoção de inovações –
perspectiva racionalista, do processamento de informações, motivacional e política
(CROWSTON e MALONE, 1994). Essas perspectivas proporcionam uma forma mais
flexível de interpretar as causas da adoção de inovações e os resultados tipicamente
obtidos com cada uma delas, proporcionando uma compreensão menos estreita de
como analisar a relação entre tecnologia e organização. Outra forma mais sóbria de
analisar a relação entre inovação e organização é a perspectiva estruturacional
(ORLIKOWSKI, 1992), segundo a qual essa relação assume uma postura mais
dialética e interativa, superando as perspectivas do imperativo tecnológico, da escolha
estratégica e do gatilho para a mudança estrutural. Segundo a perspectiva
estruturacional, mudanças, em qualquer dos elementos dessa relação, são frutos de
influência mútua e aprendizagem contínua, apesar de haver limites para a
compreensão dessa influência.
Por fim, para relativizar mais completamente a relação entre tecnologia e organização,
é necessário questionar o pressuposto de que a inovação e a mudança são sempre
necessárias, ao menos desejáveis, como forma de assegurar a posição competitiva de
organizações. Enquanto mudança e inovação podem ser interpretadas como
mecanismos de renovação e ampliação da capacidade competitiva de organizações e
sociedades, essa interpretação, levada ao extremo, pode gerar comportamentos
neuróticos e compulsivos em relação à necessidade de se renovar processos e
produtos, provocando o abandono precoce de soluções viáveis.
253
A necessidade de aprimorar o processo produtivo nas organizações, com novas
formas de organização do trabalho em torno do processo produtivo, tem levado ao
desenvolvimento de um grande volume de publicações, tanto acadêmicas quanto
gerenciais. Parece existir uma busca por soluções alternativas ao modelo tradicional
de administração, uma forma de manufatura de classe mundial ou de produção enxuta,
que permita que as organizações aumentem a capacidade produtiva e a qualidade de
seus produtos e serviços e reduzam custos e erros na fabricação, demandas crescentes
no ambiente competitivo da atualidade.
Dessa forma, têm surgido práticas inovadoras de administração ao redor do planeta,
combinando novas tecnologias produtivas, tecnologia da informação e novas formas
de arranjos sociais. Três domínios de práticas inovadoras se destacam: práticas
inovadoras de gestão de pessoas, práticas inovadoras de gestão da produção e práticas
inovadoras de gestão do desempenho. Essas três áreas foram exploradas nesta tese.
Práticas inovadoras de gestão de pessoas têm sido desenvolvidas como forma de
superar as limitações advindas do modelo clássico de administração, cujos impactos
negativos sobre os indivíduos já são notórios – fragmentação e desqualificação do
trabalho, apatia e desinteresse.
Os novos métodos de gestão de pessoas são mais sutis em sua prática e retórica, no
sentido de extrair o melhor esforço das pessoas e suas melhores contribuições para o
trabalho e a produtividade, prometendo, em contrapartida, recompensas também
ampliadas. Por outro lado, existe, também, uma pressão social, por parte de
sindicatos, governos e da sociedade em geral, para que as organizações ofereçam
práticas mais aceitáveis de trabalho, reduzindo o impacto negativo que recai sobre os
indivíduos.
254
Essas novas práticas incluem maior grau de flexibilidade na organização do trabalho,
maior cooperação entre trabalhadores e gerência, maior participação do trabalhador
nas decisões e no bem-estar financeiro das empresas, incluindo o compartilhamento
de parte dos ganhos de produtividade auferidos pelas organizações (ICHNIOWSKI,
1992; WAY, 2002). Seus objetivos incluem a seleção, desenvolvimento, retenção e
motivação de uma força de trabalho que possua habilidades superiores, que aplique
essas habilidades em suas atividades profissionais e que isso resulte em desempenho
superior por parte da organização (WAY, 2002).
Entretanto, são apontados possíveis efeitos indesejáveis como resultantes de novas
formas de pressões utilizadas por essas práticas, como o aviltamento do trabalho e o
transbordamento negativo no sentido do trabalho para o lar, ou seja, o trabalho
ultrapassa os limites da empresa e interfere negativamente na vida pessoal dos
trabalhadores. Apesar de oferecerem ambientes de trabalho intelectualmente mais
interessantes, as novas práticas exigem que o trabalhador se dedique mais
intensamente ao trabalho, exercendo efeitos ainda mais negativos sobre os seres
humanos, como ameaças de demissões e utilização de trabalho temporário.
Outro problema em potencial em relação à adoção de novas práticas de gestão de
pessoas é a possibilidade de que possam gerar custos adicionais que ultrapassem os
benefícios obtidos. Esse problema é maior quando se trata de organizações que não
possuem excedentes de capital para suportar o tempo necessário de retorno do
investimento. Além do mais, parte dos ganhos auferidos tem sido repassada aos
trabalhadores por meio das compensações extras oferecidas como estímulo ao
desempenho superior, reduzindo ainda mais os ganhos das organizações
(OSTERMAN, 1998; GUTHRIE, 2001 apud WAY, 2002).
255
Outro domínio no qual houve mudanças significativas em práticas de administração
foi o campo da gestão da produção. Desenvolvimentos nesse campo têm sido
essenciais para o crescimento da produtividade, e esse campo tem sido a origem do
desenvolvimento econômico de alguns países, a exemplo do Japão, da Itália e da
Suécia, que superaram os limites da produção em massa. Práticas inovadoras de
gestão da produção envolvem o planejamento da produção, a gestão das relações de
trabalho e desenvolvimentos específicos da atividade produtiva em si.
Esse campo da administração tem se dedicado à redução de ciclos e tempos de
processamento, à redução de custos, à redução do desperdício, ao aumento da
qualidade, e ainda ao aumento da própria capacidade produtiva. Para tanto, tem sido
desenvolvida uma série de tecnologias produtivas, como máquinas-ferramenta
numericamente controladas, veículos guiados por computadores (AGV’s), manufatura
e projeto auxiliados por computadores (CAD/CAM) e outras tecnologias stricto sensu
aplicadas na área da produção (TENÓRIO, 2000). Têm sido desenvolvidas, também,
outras tecnologias mais soft, que envolvem novas formas de organização do ambiente
de produção, como células de manufatura, manutenção produtiva total, trabalho em
equipe e outras formas de organizar o trabalho humano na fábrica (BOLDEN et al,
1997).
Por último, pode-se identificar uma busca mais ampla por desempenho das
organizações, que atua com uma perspectiva mais ampla da organização, em todo o
processo de produção, visando melhorias no desempenho da organização como um
todo – práticas inovadoras de gestão do desempenho. Nessa área têm surgido
inovações que passam pela reorganização de processos das empresas, pela adoção de
programas de gestão da qualidade, envolvem a interligação de atividades com
parceiros dedicados de negócio, em relacionamentos mais significativos em toda a
256
cadeia de suprimentos, e ainda envolvem a possibilidade de transferência de
atividades para terceiros.
Em que pese o grande volume de produção acadêmica e gerencial a respeito de novas
práticas de administração no Brasil, normalmente direcionadas a discussões sobre
práticas isoladas, muitas vezes assumindo o formato de estudos de casos, ainda são
escassos, com exceção dos trabalhos apresentados nesta tese (FERRO, 1995;
GITAHY, 2000; RIGBY et al, 2003; BASTOS et al 2004; PEIXOTO 2004), que
apresentam visões mais abrangentes sobre a disseminação dessas práticas.
A bibliografia referente à disseminação de novas práticas gerenciais no Brasil sugere
que práticas inovadoras de administração têm sido difundidas neste país,
crescentemente, desde o início da redução de barreiras à entrada de investidores
internacionais no mercado doméstico, no início da década de 1990. É possível propor
que, com a chegada em maior escala de concorrentes internacionais, as diferenças em
práticas gerenciais tornaram-se cada vez mais evidentes, assim como as diferenças em
desempenho, refletidas especialmente na qualidade e nos preços relativos dos
produtos e serviços. Essas diferenças, provavelmente, foram o principal motivador de
evoluções no campo das práticas de administração, principalmente por um movimento
de imitação de modelos e práticas bem sucedidas em outros lugares.
As organizações que adotam práticas inovadoras de administração têm visado
objetivos diversos, como redução do número de defeitos, redução do número de
chamadas de assistência técnica por problemas de qualidade, redução do número de
serviços incompletos, de parada de máquinas e do tempo de resposta aos pedidos dos
clientes (SOARES e CHAMONE, 1994). Reduções nos custos, flexibilidade em
design, flexibilidade em volume, conformidade em qualidade, desempenho do
produto, velocidade e confiança na entrega, serviços pós-vendas, publicidade,
257
distribuição ampla e ampla linha de produtos são outros objetivos normalmente
buscados por organizações que adotam práticas inovadoras de administração
(BOLDEN et al, 1997).
Essas modificações fazem parte de uma transformação social mais ampla e complexa,
que modifica normas estabelecidas e estabelece novas formas de relações, incluindo
novos tipos de relações de autoridade e controle, mas também criando novas fontes de
instabilidade e ansiedade (GITAHY, 2000; TENÓRIO, 2000; WHITE et al, 2003). A
difusão de um suposto novo paradigma tecno-econômico transformou a organização
do trabalho, modificou o volume, a estrutura e a localização do emprego, assim como
o conteúdo e a hierarquia das habilidades requeridas ao trabalhador, em um contexto
marcado pela crise, instabilidade econômica, recessão e desemprego, assim como pela
redemocratização e pela crescente influência de movimentos trabalhistas.
O objetivo geral desta tese foi identificar padrões de adoção e a relação entre o uso
de práticas inovadoras e o desempenho, operacional e financeiro, de organizações
industriais brasileiras. A metodologia utilizada para realizar esse objetivo incluiu a
combinação de métodos quantitativos, com o intuito de enriquecer a compreensão
dessas relações, ampliando a visão apresentada por Peixoto (2004) sobre a mesma
base empírica. No quadro 7.1, adiante, estão relacionados os objetivos específicos,
suas hipóteses e os métodos estatísticos utilizados.
258
Quadro 7.1 – Objetivos específicos, hipóteses e método estatístico
Objetivos Específicos
Hipóteses
Método
Estatístico
Estatística
descritiva
Comparar os resultados
originais da pesquisa,
encontrados em Peixoto
(2004) e os resultados obtidos
com base na amostra desta
tese.
H1: Os resultados obtidos por Peixoto (2004)
quanto ao nível de utilização, ao alcance das
práticas em relação a melhorias em qualidade,
reduções de custos e melhorias na responsividade e
à propensão à continuidade de uso das práticas, são
relativamente mantidos para a amostra desta tese.
Investigar o grau de adoção
das práticas gerenciais em
relação às características
organizacionais e ao
desempenho financeiro.
H2: O grau de adoção das práticas gerenciais
pesquisadas é diferenciado por características
organizacionais como localização, gênero industrial,
porte, origem de capital e desempenho financeiro.
Estatística
descritiva
Agrupar as práticas estudadas
de acordo com os padrões de
adoção das empresas
brasileiras.
H3: As organizações tendem a adotar práticas
inovadoras, isoladas ou em pacotes que se
complementam, concentradas em áreas que lhes são
mais significativas.
Análise
fatorial
Classificar organizações de
acordo com o padrão de
adoção de práticas inovadoras
de administração e de
produção.
H4: As organizações apresentam certas
regularidades de comportamento em adoção de
inovação, relacionadas às suas características
estruturais, como porte, setor de atuação, origem de
capital e processo produtivo, às suas estratégias
genéricas, além de às suas experiências com a
utilização de práticas inovadoras.
Análise de
clusters
Associar os padrões de
adoção de práticas inovadoras
ao desempenho operacional e
ao desempenho financeiro
H5: A adoção de práticas inovadoras associa-se a
ganhos de desempenho operacional e financeiro, que
justificam as decisões de adoção, reforçando a
propensão à continuidade de uso.
Modelagem
de equações
estruturais
7.1. A adoção de práticas inovadoras de Administração no Brasil
O primeiro objetivo específico desta tese foi o de comparar os resultados originais da
pesquisa, encontrados em Peixoto (2004) e os resultados obtidos com base na
amostra desta tese, associado à hipótese de que os resultados obtidos por Peixoto
(2004) quanto a nível de utilização, alcance das práticas em relação a melhorias em
qualidade, reduções de custos e melhorias na responsividade e propensão à
259
continuidade de uso das práticas, são relativamente mantidos para a amostra desta
tese. Este objetivo e hipóteses foram verificados pela estatística descritiva.
As informações apresentadas nesta tese evidenciam particularidades do movimento de
adoção de inovações gerenciais, mais especificamente, a adoção de práticas
inovadoras de gestão no Brasil, durante o final dos anos 1990 e início dos anos 2000.
Através da análise das informações utilizadas nesta tese, valida-se sua primeira
hipótese – apesar de haver pequenas diferenças entre as duas amostras, elas mantém
um elevado nível de similaridade em seus resultados globais.
Com base nesses resultados, pode-se manter a afirmação de Peixoto (2004) de que
existe um movimento de modernização gerencial nas grandes empresas industriais
brasileiras. Esse movimento representa um grande esforço de catching up das
empresas nacionais em relação às suas concorrentes estrangeiras. Não é possível
perceber, todavia, um padrão para esse movimento. O que os dados apresentados
indicam é a existência de um movimento difuso de experimentação de novas práticas,
em um padrão divergente de busca por soluções para a crise do modelo capitalista de
produção em massa.
7.2. O grau de adoção de práticas inovadoras, características organizacionais
e desempenho financeiro
O segundo objetivo específico foi o de investigar o grau de inovatividade
organizacional em relação às características organizacionais e ao desempenho
financeiro, associado à hipótese de que o grau de adoção das práticas gerenciais
pesquisadas é diferenciado por características organizacionais como localização,
gênero industrial, porte, origem de capital e desempenho financeiro. Este objetivo e
hipótese também foram avaliados pela estatística descritiva.
260
Não foram percebidas fortes relações entre grau de adoção de práticas gerenciais e
algumas características organizacionais, como estado, região, gênero industrial e
origem de capital. Entretanto, foram identificadas diferenças de grau de adoção de
práticas gerenciais investigadas entre desempenho financeiro e porte organizacional,
aqui avaliado pelo do número de funcionários. Observou-se que maiores empresas
tendem a apresentar maiores graus de adoção das práticas gerenciais pesquisadas. De
maneira semelhante, verificou-se que empresas mais lucrativas, mais rentáveis ou que
apresentam maior crescimento da receita também tendem a ter maiores graus de
adoção das práticas gerenciais pesquisadas. Esses achados parecem validar
parcialmente a segunda hipótese desta tese, embora com base em estatística descritiva.
Resultados mais conclusivos foram buscados nas seções que se seguem.
Não emerge, da análise efetuada nesta tese, nenhuma melhor forma de se realizar as
operações das organizações, pelo contrário. O que se percebe é um movimento difuso
de experimentação de novas práticas, o que sugere um padrão divergente de busca por
soluções para a crise do modelo capitalista de produção em massa; por outro lado,
essas práticas são aquelas também mais difundidas em outros países, sobretudo nos
Estados Unidos da América e no Reino Unido.
Ao que parece, esse movimento de modernização continuará acontecendo no cenário
nacional nos anos que se seguirão, mesmo que ele não convirja em direção a práticas
específicas, aprovadas ou rejeitadas pelas empresas nacionais. Alguns pontos de
convergência, entretanto, despontam nesse movimento.
Esse movimento de inovação gerencial não se restringe a setores ou regiões ou a
outras características organizacionais, apesar de se manifestar com maior ou menor
intensidade em alguns deles. Alguns setores da economia apresentam maiores índices
de inovação gerencial, enquanto que empresas maiores também parecem apresentar
261
tendências inovadoras mais fortes do que as empresas menores (relativamente ao
número de funcionários), apesar de a amostra incorporar somente médias e grandes
empresas.
De acordo com essa análise, percebe-se uma tendência de difusão de práticas amplas,
focadas no desempenho “mais macro” da organização, voltadas tanto para a eficiência
interna (como gestão da qualidade total) quanto para sua eficiência externa, ou
sistêmica (como parceiras na cadeia de suprimento). Dentre as práticas mais
difundidas na amostra, encontram-se, também, duas práticas focadas na gestão de
pessoas e do trabalho, sugerindo uma tendência nessa direção.
Destaca-se o baixo nível de difusão de práticas como terceirização e reengenharia, que
tiveram o seu apogeu durante os meados da década de 1990. Pode-se inferir que, após
as ondas de difusão dessas práticas, típicas de modismos gerenciais, as organizações
adotantes reavaliaram os resultados reais obtidos com a utilização dessas práticas e as
abandonaram, não tendo satisfeito suas intenções de adoção. Por outro lado, práticas
como reengenharia são abordagens do tipo one-shot, e não faz sentido “continuar
adotando” a reengenharia após sua implantação. Ou seja, após a realização de
reengenharias – mesmo que não faça sentido utilizar o termo no plural, é possível
sugerir que alguma adotante empolgada repita a experiência algumas poucas vezes –
uma organização atinge um nível satisfatório de eficiência e desempenho, deixando de
adotar novamente a metodologia. Após algum tempo, seus executivos, mesmo aqueles
que foram seriamente afetados pelo processo, deixam de associar as operações da
empresa ao processo modificado, afetando as respostas ao questionário. Pode-se
sugerir, ainda, que o método simplesmente caiu em descrédito, após anos de
experiências malsucedidas.
262
Ainda com relação a práticas pouco difundidas, ocorre que práticas como engenharia
simultânea e células de produção são técnicas muito específicas, restritas a
determinados setores industriais e a determinadas tecnologias de produção, o que
torna pouco viável sua difusão em grande escala. Sua aplicação faz sentido somente
em determinadas condições, que não são encontradas em grande escala nos setores da
economia. Por outro lado, ainda parece existir uma predominância de organizações
que utilizam processos de produção baseados no modelo industrial norte-americano,
de produção em massa, incompatíveis com as práticas em questão.
7.3. A adoção de grupos de práticas inovadoras e Administração
O terceiro objetivo desta tese foi agrupar as práticas estudadas de acordo com os
padrões de adoção das empresas brasileiras, associado à hipótese de que as
organizações tendem a adotar práticas inovadoras, isoladas ou em pacotes que se
complementam, concentradas em áreas que lhes são mais significativas. Este objetivo
e hipótese foram verificados pela análise fatorial.
As doze práticas incluídas na pesquisa foram reduzidas a três fatores que acomodaram
satisfatoriamente uma grande parte da variância existente nos dados originais
(51,43%), facilitando sua utilização em análises adicionais, sem perda significativa de
poder explicativo. Entretanto, somente oito práticas foram mantidas, devido às
inconsistências encontradas.
Com a identificação desses três grupos de práticas, o terceiro objetivo específico desta
tese foi alcançado, sendo a hipótese relacionada a esse objetivo parcialmente validada,
tendo em vista que quatro práticas daquelas originalmente investigadas, não foram
mantidas na análise: qualidade total, parcerias na cadeia de suprimento, células de
produção e just in time. Apesar disso, é possível afirmar que as organizações tendem a
263
adotar práticas inovadoras, concentradas em áreas que lhes são mais significativas, de
forma isolada ou em pacotes que se complementam.
Apesar de o movimento de inovação ter sido distribuído de maneira relativamente
equilibrada em toda a amostra, é possível identificar alguns padrões de adoção de
práticas inovadoras, pela verificação de como essas práticas têm sido combinadas
entre si, na formação de pacotes inovadores.
Isso sugere que a adoção de práticas não tem sido resultante de decisões isoladas ou
momentâneas, típicas de modismos, mas de seqüências de decisões que se reforçam
mutuamente ao longo do tempo, criando campos de inovação nos quais as
organizações percebem oportunidades de melhorias. As organizações combinam, em
seus esforços inovativos, práticas que se complementam e contribuem de maneira
consistente para seus esforços estratégicos.
Dessa forma, ao analisar a inovação gerencial, faz menos sentido se referir a práticas
isoladas, como abordagens one-shot, e faz mais sentido utilizar conceitos mais
amplos, grupos ou pacotes de práticas inovadoras, como práticas inovadoras de gestão
de pessoas, práticas inovadoras de gestão da produção, práticas inovadoras de gestão
do desempenho e dos custos ou outras dimensões da organização, pois estes são mais
adequados ao desenvolvimento de inovações gerenciais.
Abordagens dessa natureza reduziriam a fragmentação dos estudos no campo da
administração, permitindo visões mais completas e realistas sobre os processos e
estratégias de inovação, identificando e facilitando a compreensão de tendências em
gestão e em inovação gerencial.
264
7.4. Padrões de adoção de práticas inovadoras
O quarto objetivo desta tese foi classificar organizações de acordo com o padrão de
adoção de práticas inovadoras de administração e de produção, associado à hipótese
de que as organizações apresentam certas regularidades de comportamento em
adoção de inovação, relacionadas às suas características estruturais, como porte,
setor de atuação, origem de capital e processo produtivo, às suas estratégias
genéricas, além de suas experiências com a utilização de práticas inovadoras, que
foram verificados através da análise de clusters.
A análise realizada nesta tese demonstra a possibilidade de identificar grupos com
características semelhantes em amostras e populações de qualquer natureza. Com o
uso da análise de clusters, foi possível subdividir a amostra em subgrupos que
permitiram identificar nuances de comportamento, de acordo com as variáveis
utilizadas. Foi possível, ainda, identificar outras diferenças e semelhanças de
comportamento, associadas aos perfis identificados. Entretanto, persiste o desafio de
selecionar as variáveis que sejam mais significativas para a realização dessa análise,
tanto para o agrupamento dos casos quanto para a identificação das diferenças, que
façam sentido. Somente a cuidadosa preparação da pesquisa e minuciosa seleção de
variáveis poderão garantir análises de agrupamentos que façam sentido e que
contribuam para percepções originais e a construção de taxonomias ou tipologias que
aumentem o conhecimento acerca do objeto de estudo.
Apesar de o movimento de difusão de práticas inovadoras ter ocorrido de forma
distribuída em toda a indústria nacional, sem que haja a prevalência ou preferência
por alguma prática ou algum tipo de prática em especial, é possível identificar padrões
organizacionais de inovação. As empresas se assemelham em relação ao seu
comportamento inovativo, e essas semelhanças podem ser identificadas e avaliadas.
265
Se as organizações possuem à sua disposição os mesmos repertórios de práticas
inovadoras, elas tenderão a decidir sobre elas de maneira que se assemelham, e essas
semelhanças podem ser associadas a alguma característica organizacional, como setor
de atuação, número de funcionários, área de localização e atuação, lucratividade,
rentabilidade e outras características não investigadas aqui. A partir da identificação
dessas características, é possível desenvolver tipologias de organizações em relação à
inovação gerencial, ressaltando características comuns a grupos, associando padrões
de inovação ao perfil organizacional.
Empresas tenderão a ser mais inovadoras e prospectivas ou mais conservadoras ou
ainda reativas no que se refere à inovação gerencial. Poderão, ainda, ser seletivas, no
sentido de escolherem mais cautelosamente o tipo de inovação que contribui para seu
desempenho. As semelhanças também passam pela cronologia de adoção de práticas
inovadoras. Organizações mais compulsivas tenderão a adotar e, muitas vezes,
abandonar mais rapidamente novas práticas gerenciais, enquanto que organizações
mais ponderadas tenderão a analisar mais cuidadosamente cada projeto inovador,
avaliando mais cautelosamente os benefícios de implementá-lo.
A grande questão que emerge da possibilidade de se estudar as empresas em
agrupamentos é a seleção de variáveis que sirvam para explicar os diferentes
comportamentos das organizações em relação à adoção de inovações gerenciais. É
preferível utilizar variáveis comportamentais mais abstratas, que justifiquem a
propensão de inovação de uma organização, ao invés de variáveis quantitativas ou
objetivas, que nem sempre são a fonte da inovatividade de organizações.
266
7.5. A adoção de práticas inovadoras e o desempenho organizacional
O quinto e último objetivo específico desta tese foi associar os padrões de adoção de
práticas inovadoras ao desempenho operacional e ao desempenho financeiro,
associado à hipótese de que a adoção de práticas inovadoras associa-se a ganhos de
desempenho operacional e financeiro, que justificam as decisões de adoção,
reforçando a propensão à continuidade de uso. Esse objetivo e hipótese foram
verificados pela modelagem de equações estruturais.
De maneira geral, percebe-se, nos modelos avaliados, que a adoção de práticas
inovadoras no campo da administração da produção, em suas diversas ramificações
(gestão de pessoas, gestão da produção e gestão do desempenho), está mais
diretamente relacionada a melhorias no desempenho operacional, em três dimensões:
qualidade, custos e responsividade.
Os resultados percebidos no desempenho operacional, por sua vez, parecem
influenciar a propensão à continuidade de uso. Não se percebe uma influência direta
da adoção dessas práticas sobre o desempenho financeiro, nem influências do
desempenho financeiro sobre a propensão à continuidade de uso.
Sendo assim, se valida, parcialmente, a quinta hipótese desta tese, que sugere que a
adoção de práticas inovadoras associa-se a ganhos de desempenho operacional e
financeiro, que justificam, racionalmente, as decisões de adoção, reforçando a
propensão à continuidade de uso. Os resultados encontrados também validam
parcialmente a perspectiva racional apresentada por Crowston e Malone (1994), uma
vez que foi possível identificar benefícios que justificam a adoção de práticas
inovadoras.
A falta de relação entre adoção de práticas inovadoras e desempenho financeiro
sugere a ausência, nas variáveis adotadas na análise, de outras variáveis
267
intervenientes, que podem influenciar mais significativamente o desempenho
financeiro. Dessa forma, o desempenho financeiro seria resultante de uma série de
variáveis operacionais, dentre as quais poderia se encontrar a adoção de práticas
inovadoras.
A alocação de recursos para projetos inovadores depende da existência de relações de
sucesso entre as experiências passadas e os resultados verificados. O fato de não ter
sido identificada relação entre a adoção de práticas inovadoras e o desempenho
financeiro sugere algumas hipóteses sobre essas relações. A primeira diz respeito à
rota pela qual as organizações obtém resultados com a adoção de práticas inovadoras.
Os resultados percebidos nesta tese validam a proposição de Garvin (1984 apud
SOUZA e VOSS, 2002), de que há duas rotas pelas quais a adoção de práticas
inovadoras influenciam o desempenho das organizações – a rota da produção e a rota
do mercado. Aparentemente, a mensuração dos resultados obtidos com a rota da
produção são mais prontamente percebidos pelos dirigentes industriais do que com a
rota do mercado. O mesmo pode ser proposto em relação aos resultados financeiros.
A sugestão é a de que a adoção de práticas inovadoras não proporcione resultados
diretos imediatos sobre o desempenho financeiro. Ao contrário, esses efeitos são
indiretos e diferidos. De imediato, é possível perceber somente os efeitos sobre o
desempenho operacional, que, posteriormente, reflete no desempenho financeiro,
apesar dessa relação não ter sido identificada.
A segunda hipótese sobre a relação entre a adoção de práticas inovadoras e
desempenho financeiro é a de que a mensuração desses resultados não é prontamente
percebida pelos usuários, em especial pelos Diretores Industriais, respondentes desta
pesquisa. Por atuarem estritamente no campo da administração da produção, esses
profissionais estão mais voltados e mais preocupados sobre os efeitos operacionais da
268
adoção de novas práticas de administração, e não conseguem associar os efeitos da
adoção dessas práticas sobre o desempenho financeiro.
De qualquer forma, a análise aqui realizada sugere relações positivas entre a utilização
desses tipos de práticas, desempenho organizacional e propensão à continuidade de
uso, ainda que desempenho financeiro não seja claramente um reflexo de sua adoção.
7.6. Utilização de análise multivariada na pesquisa em administração e
ciências sociais
Esta tese ilustra a possibilidade de utilização de métodos de análise multivariada em
administração e em ciências sociais, como forma de apresentar novas visões sobre
dados quantitativos, agrupando e aglutinando variáveis e indivíduos, identificando
construtos subjacentes aos dados, avaliando relações e sugerindo influências entre
elas.
A análise multivariada é uma decorrência do aumento da disponibilidade de
capacidade de processamento de dados em pesquisas, e mostrou-se válida enquanto
mecanismo moderno e sofisticado de tratamento de dados. Entretanto, sua utilização
depende de cuidadosa reflexão teórica sobre os resultados obtidos, direcionando
decisões de análise e orientando interpretações sobre esses resultados obtidos. As
teorias sobre objetos de estudo direcionarão a combinação de variáveis, e outros
elementos, de maneira mais lógica e aceitável, de modo a representar o estado real das
coisas. De outra maneira, corre-se o risco de identificar relações que não existam de
fato e analisar os dados e os resultados de maneira equivocada, atingindo resultados
incorretos.
269
7.7. Limitações da pesquisa e recomendações para pesquisas adicionais
Muitas pesquisas têm sido realizadas sobre a adoção de práticas inovadoras e suas
decorrências. Uma parte dessas pesquisas adota um estilo descritivo, especialmente na
forma de estudos de casos de sucesso, que realçam as vantagens dessa decisão
estratégica, sem maiores questionamentos ou confirmação por evidências empíricas.
Além do viés ideológico – esses trabalhos parecem ser voltados para a exaltação das
qualidades de práticas inovadoras –, a principal fraqueza desses trabalhos reside na
impossibilidade de generalização dos resultados.
Entretanto, o desafio de articular uma metodologia de pesquisa que permita capturar
as particularidades de uma miríade de experiências distintas, ocorridas em
praticamente todos os países desenvolvidos e em desenvolvimento, não é uma tarefa
simples de ser resolvida. Primeiramente, o ritmo e volume de surgimento de práticas
inovadoras impõem dimensões gigantescas à tarefa de acompanhar o surgimento e a
difusão de tais práticas e suas repercussões na vida organizacional. Enquanto a
academia está discutindo práticas surgidas na última década, executivos e consultores
estão tratando de desenvolver e implementar novas práticas em tempo real, que ainda
não são sequer conhecidas na academia – e é provável que esses criadores sejam
muito mais bem sucedidos na divulgação e promoção de suas práticas do que a
academia em suas críticas.
Além disso, as peculiaridades de cada prática e dos contextos nos quais são criadas e
aplicadas acrescentam muitas variáveis no objeto de estudo, tornando-se quase
impossível o isolamento das variáveis e suas relações, de modo que se possa prever
com clareza seu comportamento. Utilizando uma abordagem contingencialista,
compreende-se que cada prática é desenvolvida originalmente em contextos
organizacionais, setoriais e territoriais muitos distintos, com arranjos culturais,
270
mercadológicos e institucionais específicos, em relação a outros contextos para onde
tais práticas se difundem. Essas variáveis não controláveis influenciam o processo de
implementação de práticas, acrescentando uma variabilidade de eventos que torna
cada caso único.
Poucas pesquisas têm adotado a forma de levantamentos e surveys, que visam
descrever o nível de adoção de práticas em determinado setor ou na economia como
um todo. Esse tipo de pesquisa proporciona um panorama geral de como as
organizações têm respondido aos desafios enfrentados, e em que nível as práticas
inovadoras têm sido consideradas soluções para esses desafios. Entretanto, até mesmo
abordagens abrangentes de pesquisa possuem limitações importantes, que devem ser
levadas em consideração, conforme sugerido nesta tese (ZALTMAN et al, 1973 apud
KING e ANDERSON, 1995; KLING, 1995; ORLIKOWSKI, 1992).
Assim, é necessário articular uma metodologia que permita uma investigação
detalhada sobre como as empresas industriais brasileiras estão adotando práticas
inovadoras e como essas práticas têm contribuído para que essas organizações se
desenvolvam, conforme a sugestão de King e Anderson (1995), por exemplo. Essa
metodologia deve ser, tanto quanto possível, de horizonte temporal amplo,
compreendendo um período não inferior a cinco anos, e transversal, abordando um
amplo espectro de setores da economia brasileira e um grupo significativo de práticas,
cujo surgimento e difusão sejam relativamente recentes e cuja contribuição tenha sido
significativa para o desempenho organizacional, conforme sugerido pela bibliografia
especializada.
O tratamento quantitativo a ser aplicado nos dados obtidos, que representam
dimensões mais subjetivas da adoção e dos resultados percebidos e suas repercussões,
permitirá a identificação de relações entre variáveis, mensurando o nível de difusão de
271
práticas inovadoras e a contribuição de cada uma para o melhoramento do
desempenho organizacional. Pela análise quantitativa, será possível comparar como as
práticas têm sido combinadas entre si, agrupadas em diferentes tipos, comparar as
empresas entre si, identificando possíveis padrões de adoção de práticas inovadoras e
os traços ou padrões que as assemelham.
Em geral, há problemas que podem levar o pesquisador a não identificar relação,
quando há uma, ou levá-lo a concluir que há relação, quando não há alguma.
Variáveis esquecidas, amostras não aleatórias e erros de mensuração são todas fontes
potenciais de vieses, que afetam tanto a validade interna quanto externa dos estudos
nesse ramo. O resultado final desse problema é que nenhuma metodologia isolada
pode ser convincente. A chave para a obtenção de resultados críveis é a utilização de
uma colagem de estudos que usem diferentes designs, com suas forças e limitações.
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