ENTREVISTA
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,
\
JESSICA KURTEN
"Continuo com a mesma determinacão"
,
Nascida nUIna pequena cidade do norte da Irlanda, a amazona é actualmente uma das melhores cavaleiras do mundo, há vários anos sem arredar pé do lap 10 do ranking FEL A an1bição e o sonho levaram-na até onde está hoje.
çAo
Do
cam-se presenças em
Jogos Olímpicos, Camseu currículo destapeonatos do Mundo e
da Europa, e um sem número de vitórias que a tornam numa das principais figuras do panorama hípico
mundial. Vencedora da última edição
do Global Champions Tour (GCT),
em 2009 por esta competição abdicou da sua presença na Final da Taça
do 11undo FEl em Las Vegas. Implacável dentro de pista, fora delas Jessica Kürten é uma amazona afável e
simpática, com quem a EQUITA-
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teve o prazer de conversar e conhecer um pouco melhor.
Filha de um dentista e de uma
artista, como começou a sua ligação ao mundo equestre?
Os meus pais gostavam ambos de
montar. O meu pai sonhava ser jóquei profissional mas não tinha dinheiro para isso e sempre disse que o
único motivo que o fez tornar-se dentista, foi para poder pagar os cavalos.
Teve sucesso como jóquei amador. A
minha mãe ajudava-o a treinar os cavalos, e caçava. Quando eu e os meus
irmãos éramos pequenos havia em
nossa casa burros, póneis ... Era normal para nós montar todos os dias.
Sei que teve um burro chamado
"Mr. Porridge" , de quem gostava
muito. Foi com ele que começou a
montar?
É um burro muito famoso! (risos)
Sim, foi com ele que comecei e que
aprendi muito, a começar por não ter
medo. Foi uma boa experiência para
rnlm.
Quando era criança, já sonhava
vir a ser uma cavaleira profissional?
Sem dúvida e a toda a hora! Era
tudo o que queria. Costumava assistir
a provas na televisão e fazia competições com o meu pónei.
Ainda se lembra do primeiro
concurso em que entrou?
Não me recordo, mas sei que participei pela primeira vez numa competição de saltos com quatro anos e tenho uma fotografia numa "Leading
Reine Class", com dois anos e meio.
E como profissional?
Comecei a saltar com póneis "à séria" aos 12. Participei em vários festivais, em Campeonatos da Europa e
fui dois anos se!:,ruidoscampeã Irlandesa. Depois o meu pai avisou-me
..
T
que quando terminasse
com os pÓ-
nha mãe e baseio-me
O
muito na sensa-
mães,
mas já tive cavalos
franceses
neis, não me compraria cavalos, por-
ção.
que era demasiado caro e eu tinha de
olha, vê, e diz se é bom ou não. Nor-
maravilhosos,
al/:,runs cruzados
alemães e franceses. Gostava de ter um
estudar. Nessa altura, ele tinha um cayalo de corrida e comecei a saltar com
malmente
bom cavalo irlandês
esse animal! Seguiu-s~ outro, também
saltos. Se o queremos
de corrida, que era muito bom a sal-
que compramos.
Procuram características
tar e depois tive mesmo que me dedicar aos estudos. Quando
terminei
a
mo-nos
meu marido
vemos
é mais objectivo,
o cavalo, apaixona-
por ele ao fim de dois ou três
Não. É a sensação.
muito
é esse
comuns?
Claro que um
Diamond
Exchange
mas estou longe.
foi um dos me-
lhores cavalos que já montei
landês.
Como
prepara
e era ir-
os seus cavalos?
Tento tê-los o mais jovens possível.
bom cavalo tem que fazer determina-
Gosto
de lhes seguir a carreira,
cayalo de cinco anos, que acabou por
das coisas, mostrar
como
se comportam
se tornar na minha montada
rísticas de atleta, portar-se
escola, o meu pai comprou-me
um
olímpi-
ca. Penso que tinha eu 19 anos. Com
mostrar
o Oiamond Exchange fiz todo o caminho.
de saltar. l~ uma mistura
Actualmente
vive na Alemanha.
Quando se deu essa
respeito,
que tem caracte-
com a sensação
como
entre vê-lo,
que causa. Para mim,
um cavalo tem que me mostrar,
mudança
e
do o monto,
tal,
que não tem medo
quan-
que gosta do que faz e
que é ambicioso.
porquê?
Troquei de país dois meses depois
de conhecer o meu marido. Conhecia num concurso em Dublin quando
tinha 24. Na semana se-
Há
alguma
raça
com
que goste
mais de competir?
De todo. Por estar na Alemanha
monto
mais
cavalos
ale-
no trabalho
ça quando
sentir
nos estábulos,
diário, para que os conhecomeçar
internacional.
a competir
a nível
Vão ao campo, são tra-
tados, fazem Dressage,
mos mantê-los
lógica e numa atmosfera
ral possível.
Como
Saltos. Tenta-
felizes, de uma forma
é
o mais natu-
um dia normal
na
vida de Jessica Kurten?
Não há muitos dias
normais.
Levanto-me
guinte foi visitar-me a
casa dos meus pais e dois
meses depois estava a viyer com ele na Alemanha.
Foi tudo muito rápido. Ele
era muito esperto!
(ri-
sos). Na Irlanda não se
passa muita coisa durante o Inyerno, então ele arranjou-me um trabalho
na Alemanha, fui e ao fim de duas semanas
decidi que não ia regressar a casa. Muitas pessoas pensam
que fui para a Alemanha pelo desporto, mas
na yerdade fui por causa do meu marido!(risos)
Tem tido vários cavalos de sucesso. Algum preferido?
Tenho tido ao longo dos anos animais maravilhosos por diversas
ra-
zões.Acho que o mais fenomenal
que
já
tiye é a Castle [<orbes ubertina,
simplesmente pelo que já ganhou
forma como o conseguiu.
e a
É incrível.
Sempre disse que é um tigre, uma lutadora. É muito especial. Tem
uma
boa cabeça, é bonita, atlética, é um caralo de corrida, uma saltadora ... Encontro semelhanças
entre
pónei que tive, chamado
ela e um
Dramiler
Boj'.
Quando decide
adquirir
um ca-
\'3io,como o escolhe?
Passa muito pelo
sentimento.
rou comprar, habitualmente
e o meu marido observa-o
Se
monto-o
do chão.
Creioque herdei a veia artística da mi.".
•
ENTREVISTA
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cedo, tomo o pequeno-almoço e começo a montar. O meu marido faz
todo o trabalho administrativo. Tentamos jantar juntos ou com os donos
dos cavalos. ]\[as não há assim tantos
dias normais. De segunda a quartafeira estou em casa e o resto do tempo nos concursos.
Qual foi, até ao momento, a prova mais marcante da sua carreira?
O momento mais incrível da minha vida foi ganhar o GCT, na Final
de S. Paulo no ano passado. Foi uma
sensação indescritivel, o maior feito
de um cavalo meu, um momento
muito comovente e um sonho!
Quando se salta a um nível internacional, está-se tão ocupado com as
questões práticas da \~da que se deixa
•
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de sonhar muito. Desde que me envol\~ com o GCT descobri um evento es-
Tenho um gato preto em casa e se
o vir antes de sair, sinto-me bem. Há
tupendo e sonhei sempre ganhar um.
E ainda poderá repetir ...
Acho que vitórias como aquela só
acontecem uma vez na vida.
quem pense que os gatos pretos dão
azar, mas para mim simboliza sorte.
Não gosto de caminhar por baixo de
escadas e o número 13 faz sentir-me
Ainda fica nervosa quando entra
em pista?
Se não ficar ner\'Osa não é bom si-
bem. O meu pai ganhou uma corrida
importante com o n.o 13 e sempre me
dizia que era o seu número da sorte.
Prefere provas indoor ou outdoor?
l\doro as duas. Normalmente no
nal. Tenho que sentir as borboletas no
estômago. Sou terrivelmente ambiciosa em prova. No dia-a-dia sou relaxada, com as pessoas, com os cavalos,
mas mal entro em pista transformome. Nem sempre o desejo é ganhar,
mas ser boa. Por isso, sem dúvida que
ainda sinto a excitação antes de cada
prova e um nervosismo positivo.
É supersticiosa?
fim da época de Verão estou pronta
para as indoor, e no fim da época indoar, estou pronta para o ar line.
Gosta mais de competir em areia
ou relva?
É difícil ter boa relva. Quando \'amos a locais como o Estoril ou S.
Paulo, a relva é estupenda por isso é
um prazer saltar aí. Devido ao tempo
é difícil ter a certeza que a relva vai ser
um bom piso, enquanto que com
uma boa areia, é fácil saber que vai
correr bem.
Quais as qualidades que um cavaleiro deve ter para chegar ao
topo?
Acho que tem de ser determinado.
Acho também que tem que saber sonhar.
Estava num momento alto da sua
carreira quando se viu envolvida
num caso de medicação proibida e
que levou a uma suspensão da FEl.
O que tem a dizer sobre este caso?
Não dei nada ao meu cavalo, não
tenho ideia do que terá acontecido. Já
ENTREVISTA
quanto o seu. Não tenho ideia nenhuma. Recorri
porque
acho que tenho
razão e que não fiz nada de mal. Mas
até hoje não sei o que aconteceu.
Neste
momento
está a lutar para
o n.o 1 do ranking?
Não. O meu objectivo
estar no Top
sempre
foi
10. Ser a primeira
do
mundo nunca fez parte dos meus planos, porque
isso podemos
na minha
opinião,
arruinar
valos. Já fui segunda,
próxima
ziam-me
dada
da liderança
com
os nossos
estive
ca-
muito
e as pcssoas
di-
que eu devia continuar.
altura
respondi-lhcs
meus cavalos precisavam
que
A
Idade: 39 anos
os
Cidade
Cidade
Inmáos:
Casada:
descansar
e
não podia prosseb'1lir. Fiquei em 2.° e
não tenho problema
algum com isso,
porque para mim o Top 10 é onde dcvemos
estar para sermos
convidados
É importante lutar
por csses lugares. É difícil, e um pospara os concursos.
o
ultrapassei e a "ida continua.
tempos difíceis, custou-me
Foram
muito di-
to em que nunca
estar durante
tanto
•••
ImagIncl cOnSeb'1llr
tempo.
Uma pe-
nheiro mas lutei pela minha causa.
qucna menina do nortc da Irlanda, fi-
Estou certa que tenho razào e que fiz
lha de um dentista
tudo o que podia. Agora
frente
Top 10 do mundo, é inacreditável.
Continuo com a mesma determina-
sigo em
e uma artista,
no
Sente-se injustiçada pelo sucedido?
ção, gosto dos meus cavalos, do que
Claro, pois nào fiz nada de maL
faço e espero estar por cá nos próximos anos.
O que acha que sucedeu?
I\ào sei. O meu palpite é tão bom
Ana Filipe/Fotos: Nuno Pragana •
onde nasceu: Cullybackey (Irlanda)
onde vive: Hünxe (Alemanha)
Quatro (dois inmãos e duas irmãs)
Sim
Filhos: Sem tempo, sem filhos.
Animal de estimação: Sete gatos
Hobbies: correr. nadar, tudo o que estiver relacionado com fitness
Uma música: "Imagine" Uohn Lenon)
Um cantor/grupo: Celine Dion
Um livro: "It' s not about the bike: My joumey back to life" de Lance Arrnstrong
Um filme: "O guarda-costa"
Uma comida: peixe e pasta com trufas
Um concurso: GCT
Um país: Portugal
Um sonho: Ganhar uma competição grande e a sensação de tenminar o jump-off
Uma pessoa que gostava de conhecer: Os meus pais. Já faleceram ambos e perderam estes últimos anos. Gostava de os rever para lhes agradecer por me terem apoiado, amado e ajudado a seguir os meus sonhos. Não achavam uma
boa ideia mas deixaram-me fazê-lo.
Um defeito: não resisbr a cIhocolates. Acho seriamente que não podia viver sem eles!
Uma qualidade: terá de ser outra pessoa a responder por mim!
11
Jesslcajá esteve no nosso país várias vezes e cada vez mais. com ele se identifica. 'O meu irmão costumava vir a Portugal quando eu era pequena e sempre diziaque isto era lindo. A mínha primeira vez foi ao Estoril, quando ganhei o Grande Premio, logo há todo um sentimento romântico associado. Mas tenho que dizer. Uau!A costa, o restaurante, o clima, as pessoas ... é fantástico!" Por estes mobvos. a irlandesa não pensou duas vezes quando foi convidada a fazer parte do
projecto Quintas de Obidos. um empreendimento
com 57 hectares situado entre o mar e a Lagoa de Óbidos. que inclui 79 lotes com uma média de 5200m2.
Centro
um Hotel de 5· e um Centro Hípico desenhado pela própria Jessica.
Hípicoé claramente vocacionado para o Topo a nível mundial", explicou à EQUITAÇÃO Miguel Pereira de Abreu, Presidente das Quintas. "Escolhemos a Jessica
porque é uma figura mundial do hipismo, uma pessoa que conhece por dentro a
actividadee que nos pode dar todo o apoio na concepção. Pretendemos vir a organizarvários concursos no futuro, mas também albergar durante as épocas mais
calmas, em termos de circuito intemacional, cavalos de grande qualidade. Para
isso,decidimos ter boxes com dimensões muito generosas, de 4x4m, num tota!
de 36 previstas na fase inicial, com a possibilidade deste número ser estendido. Temos também apartamentos para tratadores, para que um cliente estrangeiro possa trazer os seus cavalos e apoio humano'. Não sendo para uso exclusivo de residentes e utilizadores do Hotel. o Cento Hípico terá capacidade para receber
provas de Saltos e Dressage, havendo a possibilidade de "no futuro contemplar
Concurso Completo de Equitação, ponque temos mais terreno conecto ao nosso
empreendimento, onde será possível encontrar uma solução para fazer a pista de
Cross'. adiantou Miguel.
O projecto Quintas de Óbidos teve início em Março de 2007. estão neste momento praticamente concluídas as infra-estruturas, tendo sido já iniciada a construção
dasprimeirascasas - desenhadas por quatro arquitectos, havendo um total de I6 opções - que estarão disponíveis em meados do próximo ano. com previsão de todo
o empreendimento estar concluído em 20 I I . Entre vendidas e reservadas estão já
um terço das unidades. uma delas para o ex-cavaleiro, Capitão Mark Phillips.
'0
Outro elo de ligação a Portugal da amazona é Francisco Nobre Guedes, cavaleiro que com ela esteve a treinar cavalos na Compor.ta. "Estou muito satisfeita
com a forma como o Francisco tem montado os meus cavalos novos. É ainda jovem e aclho que se está a desenvolver muito bem. Estou orgulhosa do que está a
atingir e dos seus bons resultados", comentou sobre o mesmo. "Sem dúvida que
a Comporta vai estar no nosso calendário em 20 I O. É um sítio fonmidável para
preparar a época outdoor e para trazer alunos", acrescentou. Quanto a cavalos Lusitanos, Jessica diz conhecer, achar bonitos mas "nunca os montei. Provavelmente
numa das próximas vindas a Portugal tenha essa oportunidade.'
I Miguel Pereira de Abreu, Jessica Kürten e Amónio Moura
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"Continuo com a mesma determinacão" ,