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Políticas públicas de leitura em Portugal e Brasil:
novos caminhos, velhos problemas
Reading public policies in Portugal and Brazil: new directions, old problems
Ângela Balça*
Renata Junqueira de Souza**

RESUMO – Neste artigo, pretendemos descrever as políticas públicas de leitura, em dois países, cujos
problemas em redor do ensino da leitura apresentam muitas semelhanças. Nos últimos anos, o poder
político e a sociedade civil tomaram consciência desta realidade, revelada por estudos internacionais.
Neste sentido, muitos têm sido os programas implementados, na tentativa de melhorar o desempenho dos
alunos ao nível da literacia em leitura. Destes programas, destacamos os Planos Nacionais de Leitura do
Brasil e de Portugal. Apesar de todos estes esforços, é necessário e urgente continuar a investir na escola
e no ensino da leitura. Este investimento passa seguramente por uma maior e continuada formação de
professores, nas áreas do ensino da leitura, da compreensão da leitura e da literatura infantil e juvenil.
Palavras-chave – leitura; escola; políticas públicas de leitura; formação de professores
ABSTRACT – In this paper, we intend to describe public policies reading, in two countries, whose
problems surrounding the teaching of reading have many similarities. In recent years, political power
and civil society have become aware of this reality, revealed by international studies. In this sense, many
programs have been implemented in an attempt to improve student performance at the level of reading
literacy. We highlight National Plans Reading from Brazil and Portugal. Despite all these efforts is an
urgent need to continue to invest in schools and in teaching reading. This investment is certainly a major
and continuing teacher training in the areas of teaching reading, reading comprehension and children’s
and youth literature.
Keywords – reading; school; reading public policies; teacher’s training
Leitura e Estado
O Estado é a instituição política encarregada de
manter a ordem social por meio de ações que visam a
resolver possíveis conflitos e situações que possam trazer
algum tipo de insatisfação e problemas à sociedade.
Tais ações promovidas pelo Estado são chamadas de
políticas públicas. Para Abad (2008), há dois sentidos
quando se trata de uma política. Um deles seria “a luta
pelo poder e a busca de acordos de governabilidade”.
O outro sentido enfoca a política como “programa de
ação governamental” com “conotações mais técnicas e
administrativas”, definição adotada neste projeto.
Na verdade, as políticas públicas relacionadas
com a língua e, mais diretamente, com o ensino e a
aprendizagem da língua portuguesa são, de acordo com
Reis (2008a, p. 9) “um imperativo nacional e uma questão
de Estado”, pois é pelo domínio da língua materna que
“ascendemos a outros conhecimentos, cuja apreensão,
maturação e representação dele dependem, de uma ou de
outra forma” (REIS, 2008a, p. 8). Nos contextos atuais,
o ensino do português tem de ser uma preocupação e
um desígnio das nações e comunidades que o falam por
todo o mundo e os respectivos governantes devem estar
muito atentos a todas as problemáticas em seu redor. É,
de novo, Reis (2008a, p. 7) que nos desperta para alguns
**Doutora em Ciências da Educação pela Universidade de Évora (Portugal) e Professora Auxiliar no Departamento de Pedagogia e Educação da Universidade
de Évora (Portugal). E-mail: <[email protected]>.
**Doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Presidente Prudente, SP, Brasil) e Professora Assistente da Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Presidente Prudente, SP, Brasil). E-mail: <[email protected]>.
Artigo recebido em julho 2012 e aprovado em setembro de 2012.
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pontos-chaves que permeiam toda a sociedade sobre
o ensino do português – o ensino do português é um
problema cultural, um problema de identidade e de
valores, chega a ser um problema de cidadania e envolve
inúmeros atores, dos quais nós destacamos os professores
e os alunos.
Dentro destas políticas públicas para a língua portuguesa, nas quais a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem responsabilidades específicas e vitais,
surge-nos, na última década em particular, as políticas
públicas de leitura, cujo expoente máximo são os Planos
Nacionais de Leitura, quer do Brasil quer de Portugal.
Neste sentido, processos avaliativos, como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), dão
suporte a políticas públicas de leitura. O PISA (2003),
cuja principal finalidade é produzir indicadores sobre
a efetividade dos sistemas educacionais, avaliando o
desempenho de alunos em diversas disciplinas escolares
(inclusive na aquisição da leitura), tem-se baseado em um
modelo dinâmico de aprendizagem.
Com relação às habilidades de leitura, o programa
define o letramento em leitura como “a capacidade de
compreender textos escritos, usá-los e refletir sobre eles
de forma a alcançar objetivos próprios, desenvolver
os próprios conhecimentos e o próprio potencial e
participar ativamente da sociedade” (PISA, 2003, p. 20).
Tal definição revela uma leitura para além da simples
decodificação e compreensão literal, incorporando
compreensão, interpretação e reflexão sobre os textos.
Para verificar o desempenho de jovens leitores, o
programa utilizou diversos tipos de textos. No processo
de avaliação, três dimensões serviram para construir os
resultados do PISA (2003): a forma do material de leitura,
o tipo de tarefa de leitura e o uso para o qual o texto foi
construído.
Sobre a forma do material de leitura, o PISA utiliza
diversos tipos de prosa, tais como narração, exposição
e argumentação, incluindo textos não contínuos, como
listas, formulários e gráficos. Essa diversidade baseia-se
no princípio do letramento, pois sujeitos “encontram na
escola e na vida adulta uma variedade de textos escritos
que requerem diferentes técnicas de processamento de
informação. A flexibilidade ou habilidade de adequar
ao tipo de texto as técnicas apropriadas para localizar
informação relevante no texto é o que caracteriza a leitura
eficiente.” (p. 22).
Com relação ao tipo de tarefa de leitura, o programa
seleciona diante das habilidades cognitivas e pelas
características das questões da prova. O foco do PISA é
‘ler para aprender’. Espera-se que o aluno seja capaz de
fazer relações com o texto e seu próprio conhecimento de
mundo. “Portanto, um leitor crítico, interpretativo, leitor
social de seu mundo” (p. 22).
O último aspecto diz respeito ao uso para o qual o
texto foi elaborado, seu contexto. Neste sentido, o aluno/
leitor deve ter consciência dos usos privados, públicos,
ocupacional e educacional dos textos. Ou seja, perceber
que uma carta é escrita para uso privado, que anúncios
oficiais para uso público e que um roteiro de instruções,
por exemplo, é elaborado visando o uso educacional.
Os resultados divulgados pela OCDE (Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico)
evidenciam que os alunos brasileiros obtiveram, em 2006,
médias que os colocam na 53ª posição em matemática
(entre 57 países) e na 48ª, em leitura (entre 56). Em leitura, 56% dos jovens estão apenas no nível um ou abaixo
dele, o que significa que são capazes apenas de localizar
informações explícitas no texto e fazer conexões simples.
Quanto aos alunos portugueses ficaram em 2000, 2003
e 2006 no nível 2, tendo alcançado em 2009 o nível 3,
o que indica que estes alunos alcançaram, desta vez,
pontuações situadas na média dos desempenhos dos países
participantes, no domínio do letramento de leitura. Estes
resultados indicam-nos que os alunos portugueses são
capazes de realizar tarefas de complexidade moderada,
que envolvem a localização de vários segmentos de informação, de modo a comparar, contrastar ou categorizar.
Assim, ressaltamos dois aspectos avaliados: a
capacidade de o aluno ler diversos tipos de textos,
inclusive os literários, e a importância de superar o nível
um – aquele da decodificação, atingindo níveis superiores
que o levará a entender o que lê, bem como a relacionar
o lido com outros textos.
Diante de índices baixos e desses dois aspectos
avaliados, observamos que a promoção da leitura de
diversos tipos de textos em Portugal e no Brasil tem sido
motivo de preocupação para os órgãos responsáveis pelo
ensino da leitura: Ministério da Educação, Secretarias
Estaduais de Educação, Secretarias Municipais, Direções
Regionais de Educação, Câmaras Municipais, dentre outros.
Dessa forma, vimos, nos últimos anos, um acanhado, mas
contínuo investimento em livros nos dois países.
É nossa convicção que muitos fatores contribuem
para que as novas gerações tenham sucesso no domínio da
competência da leitura, essencial para o seu crescimento
na plenitude, como Homens e como Cidadãos. Neste
sentido, o entendimento pelos Governos de que o ensino
do português, e mais particularmente, o ensino da leitura
é um desígnio público, fundamental para a evolução e o
crescimento das sociedades, é visível pela participação
dos países em estudos internacionais, como por exemplo
o PISA. Aliás de acordo com Afonso e Costa (2009), os
decisores políticos dão especial relevância aos estudos
internacionais, aos indicadores de desempenho e às
boas práticas, num quadro de crescente complexidade
das ações do Estado e da presença de múltiplos atores
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na construção de políticas, neste caso, educativas. Assim,
naturalmente que os dados obtidos nos testes PISA, pelos
alunos portugueses e brasileiros, estiveram na génese das
decisões de política educativa e de política de leitura, nas
quais se inserem não só os Planos Nacionais de Leitura dos
dois países bem como a formação de professores de língua
portuguesa. Estes são apenas alguns fatores que concorrem
para o sucesso do ensino e da aprendizagem da leitura e são
aqueles que nos propomos abordar neste texto.
Portugal e investimentos em leitura
Em Portugal, desde a metade dos anos 2000, têm
surgido algumas iniciativas voltadas para a promoção
da leitura; no entanto, estas ainda são tímidas e, de certa
forma, pouco voltadas para a sala de aula.
O Programa de Itinerâncias, do antigo Instituto
Português do Livro e das Bibliotecas (IPLB), desde
2007, sob a Direção-Geral do Livro e das Bibliotecas
(DGLB), é uma dessas ações de promoção da leitura.
Constituiu-se, até há pouco tempo, como o principal
instrumento de promoção da leitura da DGLB. Os
objetivos eram promover e incentivar a criação de novos
públicos leitores de modo a combater o analfabetismo e
os baixos níveis de leitura dos portugueses. Assim, em
2003, o IPLB dirigiu as suas ações essencialmente para
o público infanto-juvenil, visto que é nesta faixa etária
que se começa a construir os futuros leitores. Nesta
perspectiva, as atividades do IPLB também se voltaram
para os mediadores de leitura (bibliotecários, professores,
pais), uma vez que são os adultos que têm, nestas faixas
etárias, de aproximar, orientar, mediar a relação entre a
criança/jovem e o livro. Percebendo o papel fundamental
que a comunidade escolar poderia ter neste projeto, o
Gabinete da Rede de Bibliotecas Escolares (GRBE) foi
convidado a estabelecer uma parceria com o IPLB para
implementar projetos de animação continuada à leitura.
Em 2004, cerca de 350 ações (oficinas, espetáculos,
cursos de literatura, comunidades de leitores, exposições,
etc.) foram postas à disposição das Bibliotecas da Rede
Nacional de Bibliotecas Públicas. Em 2005, o número de
ações aumentou, assim como a natureza de algumas delas.
Foram postas à disposição de bibliotecas que integram a
Rede Nacional de Bibliotecas Públicas 450 ações, que se
traduziram em oficinas, ações de formação, espetáculos,
cursos de literatura, comunidades de leitores e exposições (IPLB, 2006). Todas estas atividades do Programa
Itinerâncias têm continuado, em maior ou menor número,
a serem promovidas, ao longo destes anos. No entanto,
este programa passou, em 2007, a ser promovido em
parceria com o Plano Nacional de Leitura (PNL).
A Rede de Conhecimento das Bibliotecas Públicas
(RCBP) é também um projeto da iniciativa do então
Instituto Português do Livro e das Bibliotecas (IPLB),
co-financiado (47,5%) pelo Programa Operacional para
a Sociedade do Conhecimento (POS-Conhecimento) e
pretende desenvolver-se em parceria com as Câmaras
Municipais visando a uma estruturação da Rede Nacional
de Bibliotecas Públicas. Atualmente este projeto continua
o seu trabalho, com inúmeras ações em redor da promoção
da leitura, sempre com as parcerias entre os Municípios,
as bibliotecas que estão sob sua responsabilidade e o PNL.
Um outro projeto desenvolvido em Portugal é o
Serviço de Apoio à Leitura (SAL). O SAL apresenta-se
como um Guia de Orientação à Leitura. Nesse guia, podemos encontrar 150 títulos divididos por áreas temáticas
e por três faixas etárias. O SAL
é um instrumento de orientação à leitura e às práticas
de indução ao prazer de ler, dirigido aos mediadores de
leitura que trabalham junto ao público infanto-juvenil,
nomeadamente professores, bibliotecários e pais. É um
instrumento particularmente útil para todos aqueles
que, interiorizando a bondade da leitura, necessitam de
um conhecimento mais aprofundado sobre literatura
para a infância e juventude, publicada em Portugal, e
sobre metodologias indutoras aos hábitos de leitura.
(SAL, 2006)
Muito embora este projeto também dependa do
IPLB e posteriormente da DGLB, se pretendesse alargar,
introduzindo-se novos títulos e novas temáticas bem como
integrando-se uma espécie de banco de recursos ligados
às práticas e às metodologias de aproximação ao livro e
à leitura que foram testadas no projeto do IPLB/GRBE,
assim como experiências internacionais neste domínio,
ele nunca chegou a ser alvo dessa ampliação. Podemos
avançar alguns motivos para o relativo abandono a que o
SAL se encontra sujeito atualmente, mas parece-nos que o
principal se prende com o lançamento do Plano Nacional
de Leitura, em 2006. A partir desta data, quase todos os
projetos de promoção da leitura em Portugal foram sendo
progressivamente anexados ou suplantados pelo PNL.
Assim, em 2006, foi lançado, em Portugal, o Plano
Nacional de Leitura, numa parceria entre os então
Ministérios da Cultura e da Educação. Desde o início, o
PNL estabelece uma interface muito sólida com a Rede de
Bibliotecas Escolares e é, portanto, através das bibliotecas
escolares que começam a chegar às escolas os livros
fornecidos pelo PNL. Muitos têm sido os programas e
inúmeras as iniciativas desenvolvidas, ao longo destes
anos, pelo PNL em prol da promoção da leitura. Referimonos apenas a Semana da Leitura, que decorre anualmente
em todas as escolas do país, ou o Concurso Nacional
de Leitura, destinado também a todas as escolas, desta
vez do 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário,
numa aposta que visa alcançar um público juvenil, que,
no início do PNL, não era considerado como prioritário
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nestas ações. O PNL aposta igualmente em ações que
promovam um trabalho continuado na formação das
famílias, com o projecto Ler+ Em Família, e desenvolve
programas de promoção da leitura em sítios tão diversos
como Centros de Saúde e Hospitais, através do projecto
Ler+ Dá Saúde.
Se até aqui, a grande maioria dos programas de
promoção da leitura não se preocupavam diretamente
com a sala de aula, o PNL veio mudar radicalmente essa
realidade. O PNL entrou nas escolas e entrou nas salas de
aulas, não só através dos livros que indica pelas listas de
livros, atualizadas anualmente, para a leitura orientada na
sala de aula, mas também através dos Programas PNL. Os
Programas PNL destinam-se a todos os níveis de ensino,
desde a educação pré-escolar até ao ensino secundário,
ou seja, destinam-se a crianças/jovens dos 3 aos 18 anos.
Nestes Programas, são trazidas aos docentes diretrizes
muito concretas sobre a forma como trabalhar o livro na
sala de aula, e a novidade foi a obrigatoriedade de ler e
trabalhar diariamente, caso as crianças estejam no préescolar ou no 1º ciclo do ensino básico ou semanalmente,
para os jovens dos outros níveis de ensino, em atividades
de leitura, com textos literários e não literários.
O PNL, em Portugal, tornou-se de fato mobilizador da
sociedade para as questões da leitura e da sua promoção
junto de toda a população. Neste contexto favorável,
foram surgindo muito projetos municipais ou de outras
instituições da sociedade civil em redor da promoção
da leitura. Destacamos aqui brevemente o projeto,
patrocinado pela Fundação Calouste Gulbenkian, Casa
da Leitura. Esta ação constitui-se como um endereço na
Web – http://www.casadaleitura.org – da responsabilidade de investigadores universitários na área da leitura,
da literatura infantil e da psicologia, de bibliotecários,
de especialistas em comunicação, que disponibiliza,
entre outras coisas, um vastíssimo conjunto de livros e
respectivas recensões críticas, categorizados por faixas
etárias, por temas, atividades a desenvolver em redor dos
livros e ainda inúmeros artigos de investigação em áreas
científicas de referência para esta temática. A Casa da
Leitura tem-se constituído, nos últimos anos, como uma
preciosa ferramenta de trabalho, para professores, alunos,
investigadores e promotores da leitura.
Assim, fizemos um breve apanhado de algumas
iniciativas, de carácter público ou privado, que se têm
desenvolvido na última década em Portugal, em redor do
livro e da leitura e que, certamente, contribuíram para um
novo olhar da sociedade civil sobre estas questões.
Brasil e investimentos em leitura
No Brasil são várias as instituições públicas e privadas
que promovem atividades, programas, capacitações
de leitura entre alunos, professores, jovens e adultos.
Podemos afirmar que as ações do Ministério de Educação
e Cultura atingem um número maior de brasileiros, pois
não se trata de uma atividade isolada e, sim de programas
nacionais para formação de leitores. A partir dos anos
80, por iniciativa do governo federal, alguns projetos
de leitura são criados, todos com o objetivo comum de
estimular e propagar a leitura.
Um deles, chamado de Programa Nacional Sala de
leitura (PNSL), elaborado pela Fundação de Assistência
ao Estudante (FAE), atuou de 1984 a 1987. O PNSL tinha
por objetivo compor e ambientar espaços denominados
salas de leitura, através do envio de acervos e repasse
de recursos. Este programa foi realizado em parceria
com as Secretarias Estaduais de Educação e com
universidades, que se responsabilizaram pela capacitação
dos professores. Na ocasião, foram distribuídos livros de
literatura e periódicos para alunos e professores.
Em 1992, institui-se por meio do Decreto nº 519,
o Proler (Programa Nacional de Incentivo à Leitura),
vinculado à Fundação Biblioteca Nacional, órgão ligado
ao Ministério da Cultura. Os objetivos desse programa
são: a) promover o interesse pela leitura e escrita na
sociedade em geral; b) promover políticas públicas que
garantam o acesso ao livro e à leitura; c) articular ações
de incentivo à leitura nos diferentes setores da sociedade;
d) viabilizar pesquisas sobre o livro, leitura e escrita;
e) incrementar o Centro de Referência sobre Leitura.
As atividades do Proler são de diversas naturezas, desde
visita de autores aos municípios brasileiros, cursos de
capacitação para professores e bibliotecários, semanas
culturais sobre livro e leitura, entre outras.
Segundo Guimarães (2010) também em 1992, o MEC
em parceria com as secretarias estaduais de educação, universidades e a Embaixada da França, cria o Pró-leitura na
formação do professor, que oficialmente teve suas atividades encerradas em 19961. Em Belo Horizonte, por exemplo,
as ações continuaram até 2004. O programa tinha por meta
atuar na formação de professores leitores e estimular a
prática da leitura na escola através da criação e organização
de salas, cantinhos de leitura e bibliotecas escolares.
Foram oferecidos cursos e oficinas a professores do ensino
fundamental, supervisores pedagógicos e bibliotecários.
Um programa que incluiu a literatura em suas ações foi
o PNLD – Programa Nacional do Livro Didático. Há anos,
o governo federal mantém o PNLD como responsável
pela aquisição e distribuição gratuita de livros didáticos.
Aos diretores e professores cabem a análise e a seleção
dos manuais didáticos que deverão ser utilizados por suas
respectivas instituições de ensino. A partir de 1998, as
instituições de ensino puderam optar entre livros didáticos
ou módulos de paradidáticos (módulos literários, obras de
ficção e obras multidisciplinares).
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Políticas públicas de leitura em Portugal e Brasil
Em 1994, criou-se o Programa Nacional Biblioteca
do Professor, que se encerrou em 1997. Seu o objetivo
era oferecer suporte para a formação dos professores das
séries iniciais do Ensino Fundamental. Tal iniciativa tinha
duas linhas de ação: aquisição e distribuição de acervos
bibliográficos e a produção e difusão de materiais que
seriam destinados à capacitação do trabalho docente.
Em 1997, por meio da Portaria 652, é instaurado o
Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), pondo
fim ao Programa Nacional Biblioteca do Professor.
Atualmente o PNBE é executado pelo Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Educação (FNDE) em parceria
com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da
Educação SEB/MEC. O programa tem por objetivo
democratizar o acesso às obras de literatura infantil e
juvenil, brasileiras e estrangeiras, e também o acesso a
materiais de pesquisa e referência a professores e alunos.
Esta ação faz parte do Programa Toda Criança na
Escola2, apoiada pelas políticas públicas de leitura gerenciadas pelo MEC e a documentação que o regulamenta
vai ao encontro do artigo 208 da Constituição Federal, que
estabelece o direito de todo educando ter acesso a material
de apoio didático, bem como a universalização e melhoria
do ensino fundamental, estabelecidos na LDB 9394/96.
Desde sua criação o PNBE sofreu algumas modificações e ajustes para atender a realidade e necessidades
educacionais. No ano de 1998 o acervo do PNBE foi
destinado às escolas de 5ª a 8ª séries (atualmente 6º ao
9º ano) e era composto por 215 títulos, dentre eles, obras
clássicas e modernas da literatura brasileira, enciclopédias,
atlas, globos terrestres, livros sobre a história do Brasil,
bem como sua formação econômica, além de um “Atlas
Histórico Brasil 500 anos”.
Em 1999, a aquisição de livros foi destinada às escolas
de 1ª a 4ª séries (atual 2º ao 6º ano), com um acervo de
109 títulos, também de literatura. Foram incluídos neste
acervo quatro livros direcionados às crianças portadoras
de necessidades especiais. Tais obras foram indicadas
pela Secretaria de Educação Especial do MEC.
Na sequência, em 2000, o foco da seleção de
livros e compra foi o docente do ensino fundamental
das escolas públicas que participaram do Programa de
Desenvolvimento Profissional Continuado – Programa
Parâmetros em Ação. As escolas receberam material
didático-pedagógico, com o objetivo do proporcionar
incentivo e apoio ao desenvolvimento profissional de
professores e especialistas em educação. De acordo com
o site do MEC, o acervo era composto por: Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN’s) de 1ª a 8ª séries (2º9º ano); Parâmetros em Ação – Curso de Formação Continuada, a Ética e Cidadania no Convívio Escolar – Uma
Proposta de Trabalho; Referencial Curricular Nacional
para Educação Infantil (RCNEI); Referencial Nacional
para Educação Indígena e; Proposta Curricular para
Educação de Jovens e Adultos (EJA). Percebemos aqui
o cuidado com a formação continuada dos professores,
com a distribuição de acervos. No entanto, cursos e
práticas na formação docente, aconteceram de maneira
isoladas – prefeituras, organizações sem fins lucrativos,
universidades de diversos estados e municípios preparam
docentes para o ensino da leitura, sem se pensar em uma
matriz metodológica comum para tais materiais.
No PNBE de 2001, segundo Guimarães (2010, p. 49),
teve início a ação denominada “Literatura em Minha
Casa”. “O intuito do Programa era incentivar a leitura e
a troca de livros entre os alunos e possibilitar às famílias
dos alunos a opção de fazer leituras em casa, distribuindo
livros aos alunos que podiam levá-los para casa.” O
acervo foi composto por seis diferentes coleções, cada
uma contendo cinco títulos: poesia (autor brasileiro),
novela, conto, clássicos da literatura universal e peça
teatral ou folclore. Vale ressaltarmos que, segundo o
site, cada escola recebeu quatro acervos para compor a
biblioteca escolar. Em 2002 a ação “Literatura em Minha
Casa” continuou com a distribuição de oito acervos com
cinco títulos para alunos brasileiros.
No ano seguinte, 2003, ainda segundo Guimarães
(2010), o PNBE foi executado em cinco ações,
dinamizando o programa:
1 – Literatura em Minha Casa: executada como nos
anos anteriores (2001 e 2002). Foram distribuídos livros
de literatura e informação a alunos matriculados na 4ª
série (5º ano) e 8ª série (9º ano) do ensino fundamental.
2 – Palavra da Gente: destinado à Educação de
Jovens e Adultos (EJA), com distribuição de acervos
para cada aluno “da última série, termo, módulo ou
similar, correspondentes à última etapa do 2º segmento
da educação de jovens e adultos”, de cursos presenciais
do ensino fundamental.
3 – Casa da Leitura: desenvolvido em parceria com
as Secretarias Municipais e Estaduais de Educação e
consistiu na distribuição de “bibliotecas” itinerantes para
uso de toda a comunidade do município. Composto por 24
coleções do acervo das ações Literatura em Minha Casa e
Palavra da Gente, com 154 livros e 114 títulos. Os livros
foram entregues às prefeituras municipais, que ficavam
responsáveis por distribuir o acervo em bibliotecas
públicas ou outro estabelecimento apropriado para sua
utilização.
4 – Biblioteca do Professor: foram distribuídos dois
livros para cada professor das classes de alfabetização e
de 1ª a 4ª série (2º ao 5º ano) do ensino fundamental da
rede pública. Os livros, de uso pessoal e de propriedade
dos professores, foram escolhidos via internet pelos
mesmos, que tinham a sua disposição uma lista com
144 títulos divididos em obras de ficção e não ficção.
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5 – Biblioteca Escolar: por meio desta ação, foram
distribuídos 144 títulos de ficção e não ficção, com ênfase
na formação histórica, política e econômica do Brasil,
para as escolas com maior número de alunos matriculados
de 5ª a 8ª séries (6º ao 9º ano).
Em 2004, houve a continuidade das ações desenvolvidas pelo PNBE 2003. Em 2005 o atendimento aos
alunos nas escolas volta a ser o foco do Programa por
meio da ampliação dos acervos das bibliotecas escolares.
Atinge-se a “universalização” do atendimento, isto é,
todas as escolas públicas brasileiras que oferecem as
primeiras séries iniciais do ensino fundamental passam
a ser beneficiadas com, no mínimo, um acervo composto
por 20 títulos, com diferentes gêneros e tipos de textos,
tais como: poesias, quadras, parlendas e cantigas; contos,
crônicas, teatro, fábulas, mitologia, lenda, textos de
tradição popular, contos de fada e adivinhas; novelas;
livros de imagem. Além de distribuir em CD ROM, a
coleção “Clássicos da Literatura em Libras – a Língua
Brasileira de Sinais”.
O PNBE de 2006 foi destinado às escolas públicas de
5ª a 8ª série (6º ao 9º ano), com a distribuição de acervos
compostos por 75 títulos de vários gêneros. O critério
de atendimento adotado foi: escolas com até 150 alunos,
receberam um acervo composto por 75 títulos; escolas
com 151 a 300 alunos receberam um acervo com 150
títulos e; escolas com mais de 300 alunos receberam um
acervo com 225 títulos.
Em 2007, aconteceu uma mudança na nomenclatura
do PNBE, até então o nome do Programa se referia ao ano
de aquisição das obras. A partir deste ano, o nome passou
a se referir ao ano de atendimento (entrega), ou seja, os
livros que compõem o PNBE 2008 foram adquiridos
em 2007 e entregues em 2008. Portanto, não houve uma
“versão do programa PNBE 2007”. Neste momento, o
CEALE (Centro de Alfabetização e Escrita) da UFMG
(Universidade Federal de Minas Gerais) assume a
organização da equipe de especialistas responsáveis pela
avaliação e seleção do material que irá compor o PNBE.
Em 2008, o PNBE foi ampliado, passando a atender
além de escolas de ensino fundamental, também escolas
de educação infantil e ensino médio. Os acervos foram
compostos por livros de imagem, histórias em quadrinhos,
obras clássicas da literatura universal, textos em verso
(poemas, quadras, cantigas e etc.) e textos em prosa
(crônicas, contos, novelas, pequenas histórias e etc.). Os
critérios de atendimento foram:
– Educação Infantil – escolas com até 150 alunos
receberam um acervo com 20 títulos; com 151 a
300 alunos dois acervos; acima de 300 alunos, três
acervos.
– Ensino Fundamental e Médio – escolas com até
250 alunos receberam um acervo com 20 títulos;
com 251 a 500 alunos, dois acervos; de 501 a 750
alunos, três acervos; de 751 a 1.000 alunos, quatro
acervos; a cima disto, cinco acervos.
No ano seguinte, em 2009, o Programa focaliza aos
anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) e Ensino
Médio. Os acervos foram compostos por textos variados
como poemas, contos, crônicas, teatro, romances, obras
clássicas, ensaios, e etc. O critério de atendimento foi:
escolas com até 250 alunos receberam 100 títulos; com
251 a 500 alunos receberam 200 títulos; acima de 500
alunos, 300 títulos.
O Programa de 2010 foi direcionado para a Educação
Infantil, anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º
ano) e EJA. O acervo composto por títulos diversificados
como poemas, contos, crônicas, romances, teatro, obras
clássicas, e etc. Segundo o site do MEC, aproximadamente
24 milhões de alunos foram beneficiados com o Programa,
que distribuiu 10,7 milhões de livros às escolas públicas,
sendo: Educação Infantil (86.379 escolas); anos iniciais
do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano – 122.742 escolas);
e EJA (39.696 escolas).
Neste sentido, percebemos que o Programa Nacional
Biblioteca da Escola caracteriza-se com uma história –
mais de uma década na avaliação, seleção, aquisição e
distribuição de textos literários, destinados a crianças,
jovens e adultos das escolas públicas brasileiras.
No entanto, pesquisas (PAIVA e SOARES, 2008,
MONTUANI, 2009) indicam que embora haja grande
investimento na aquisição de materiais de leitura, o
investimento na capacitação em serviço, ou educação
continuada de docentes, ou mesmo “professores bibliotecários” como política pública de leitura, ainda é
baixo e quase inexistente. Sobre esse aspecto discorreremos adiante.
Congruências entre
Brasil e Portugal
Diante de todos os aspectos congruentes nos dois
países, a literatura não deve ser oferecida como atividade
isolada; ao contrário, o estudo literário deve ser integrado
com outras linguagens. Algumas experiências internacionais (WILKINSON e RENINGER, 2005) mostram que
a aprendizagem do falar, da leitura e da escrita deve
ser integrada e centrada na criança, desenvolvidas em
situações reais. Deste modo, as crianças devem procurar
construir sentidos a partir de textos autênticos. Neste
contexto, os manuais escolares não seriam necessários,
mas precisaria haver materiais abundantes e genuínos de
leitura. E, neste sentido, os dois governos: Portugal e Brasil,
empenharam-se nos últimos anos para disponibilizar em
suas escolas, bons textos literários. Os professores, por
seu turno, têm o papel de guias, facilitadores, motivadores
Educação, Porto Alegre, v. 35, n. 3, p. 371-379, set./dez. 2012
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Políticas públicas de leitura em Portugal e Brasil
e mentores neste processo, sendo-lhes quase que exigido
que sejam abertos, organizados, flexíveis, envolvidos,
interessados e entusiasmados. (SLOAN, 1991) Nas
escolas portuguesas e brasileiras, os manuais escolares
configuram-se como um dos maiores entraves à entrada
de textos autênticos nas salas de aulas. Tendo um peso
considerável em termos editoriais, os livros didáticos
constituem-se como um elemento importante para a
família, mas muito empobrecedor para os professores,
que sem esta “muleta” se mostram, na generalidade,
incapazes de trabalhar com textos e muito particularmente
com textos literários (BALÇA, 2010).
Para superar esses entraves, Souza et al. (2010)
sugerem que nas salas de aula onde a literatura é utilizada
com freqüência, crianças e professores deveriam praticar
atividades de leitura todos os dias. O professor seleciona
uma história que pode ou não estar relacionada com a
matéria do currículo escolar. A seguir escolhe uma
maneira de ler. Entre variadas técnicas para o incentivo
da leitura e a fomentação do gosto podemos mencionar: a
leitura em voz alta, o teatro da leitura, o contar histórias, o
conte e desenhe, a participação de fantoches, os círculos
literários, a leitura compartilhada, a leitura de poesia e
o planejamento de uma unidade poética, entre as mais
usadas. A escolha por uma destas técnicas leva em
consideração o desenvolvimento, interesse e faixa etária
das crianças.
A seleção do tipo de texto a ser lido também considera
a diversidade: livros de imagem, poesia, cantigas de roda,
parlendas, livros infantis, contos folclóricos, adivinhas,
fábulas, contos de fada, ficção histórica, ficção verista,
não-ficção (ou livros informativos) e biografias.
Ao exercitar a leitura, os alunos fazem uso da
linguagem oral, falam sobre a história, aprendem a ouvir,
lêem em voz alta, dramatizam o texto e fazem uso da
escrita para expressar o entendimento do texto lido.
Mostram o conhecimento das estruturas literárias e da
linguagem através de processos de escrita mais formais:
composição de poemas, textos jornalísticos e textos em
prosa.
Segundo Tompkins e McGee (1993), ao adotar as
estratégias de leitura o professor deve integrar a leitura e
a escrita. Ou seja, ao ler uma história utilizando técnicas
variadas de leitura e tipos de textos diversificados, o aluno
também registrará em forma de texto seus sentimentos e
compreensão do que foi lido. Assim, a criança é estimulada
através do professor para atividades que desenvolvem
as habilidades de compreensão literal e pragmática do
texto literário. No entanto, parece-nos fundamental
que o professor promova igualmente a compreensão
inferencial, que exige do aluno, na interrogação ao texto, a
mobilização da sua experiência leitora, da sua experiência
de vida e do seu conhecimento do mundo.
Sobre a escrita, Tompkins e McGee (1993) afirmam
que os alunos escrevem informalmente para explorar
o que aprenderam e usam o processo de escrita formal
para compartilhar o que aprenderam. A escrita informal
deve ser entendida como um exercício de exploração:
frases, pensamentos ou parágrafos rápidos relacionados
com o livro que podem ser escritos antes, durante ou
depois da leitura. Já as atividades de escrita formais
estão relacionadas com o processo de aprendizagem,
compreensão e produção do texto: narrativa, carta, poema,
ensaio, reportagem etc.
Entendemos que a leitura do texto literário associada
a estas ações pode proporcionar um ensino de leitura
diferenciado por sugerir o uso de diversos tipos de textos
literários e modos de estimular o ato de ler.
Neste sentido, as escolas brasileiras e portuguesas
quando se utilizam dos livros infantis para atividades de
leitura, podem criar e vislumbrar um ensino de leitura e
literatura diferencial em que os professores estabelecem
uma “comunidade de leitores” (cf. HEPLER, 1991).
Nesta comunidade, as crianças escolhem seus próprios
caminhos literários e lêem com prazer, tornando-se,
assim, leitoras.
Sucesso e perspectivas futuras
Se um dos aspectos avaliados pelo PISA é contemplado
por essas ações, o outro ainda enfrenta dificuldades. Pois
tanto as escolas portuguesas e brasileiras hoje possuem
materiais de leitura diversos, e um bom acervo de livros
de literatura, no entanto, falta ao principal mediador de
leitura, o professor, ações voltadas à superação da simples
decodificação, atividades desenvolvidas para levar os
alunos a entenderem o texto e principalmente, lê-lo.
No entanto, para que tais ações ocorram, o professor
deve ter oportunidade de aprender seja em sua formação
inicial, seja na continuada metodologias para promover
o ensino e aprendizagem da leitura e da escrita. Partindo
da premissa de que, para verdadeiramente gerar o
aprendizado dos alunos, é preciso que ele saiba aprender
e ensinar, e de que, para ensinar, é necessário que ele
primeiro aprenda, para que depois ensine. Seria possível
supor que somente aquele que lê e que conhece o universo
da leitura será capaz de formar leitores. Tal afirmação
leva-nos a refletir sobre as condições práticas e objetivas
de leitura dos professores e a questionar sua formação.
Apoiamos em Nóvoa (2002) para enfatizar que os
professores podem construir sua trajetória de formação
em diferentes instâncias e contextos, aprimorando e
ampliando suas experiências intraescolares, mas tal
formação se dá, principalmente, no contexto de suas
experiências profissionais: “[...] é no espaço concreto
de cada escola, em torno de problemas pedagógicos ou
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Ângela Balça, Renata Junqueira de Souza
educativos reais, que se desenvolve a verdadeira formação
do professor” (NÓVOA, 2002).
Segundo Sousa (2006), a formação do professor como
leitor envolve questões relativas à sua subjetividade, a
suas crenças e valores, e esse aspecto ainda necessita ser
incorporado às discussões sobre a estrutura dos cursos de
formação inicial. É preciso uma mudança de concepção
no currículo desses cursos para que a formação não se
ocupe apenas do nível intelectual, mas que envolva o nível
sensorial e afetivo, ou seja, que favoreça a construção da
subjetividade dos professores.
Acreditamos que as leituras do professor influenciam
sua prática pedagógica e, portanto, ampliando-se seu
universo de leitura, abrem-se espaços para que colabore
mais efetivamente para o processo de letramento de seus
alunos. Nesse sentido, encontramos novamente em Nóvoa
(1997) a afirmação dessas ideias, quando o autor discorre
sobre o processo de construção da formação docente:
A formação não se constrói por acumulação (de cursos,
de conhecimento ou de técnicas), mas sim através de
um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas
e de (re)construção permanente de sua identidade
pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa
e dar um estatuto ao saber da experiência. (NÓVOA,
1997, p. 25).
Assim, se as políticas públicas adotadas enfatizam a
distribuição cabe a elas pensar na formação docente. E
desta maneira, avançaremos na formação do leitor, pois,
esta formação docente terá de continuar a privilegiar a
área do ensino da leitura, com ênfase no trabalho com
o texto literário em situação de sala de aula. Muito
embora este aspecto não seja frisado nas Recomendações
efetuadas na Conferência Internacional sobre o Ensino
do Português (REIS, 2008b), onde se valoriza apenas os
textos do passado, não pelo seu valor intrínseco, mas como
“factor de autoconhecimento colectivo e identitário”, aqui
reconhece-se que “a leitura deverá ocupar um espaço e
um tempo próprios” (REIS, 2008b, p. 241). Espaço e
tempo que tem obrigatoriamente de ter lugar na sala de
aula, permitindo aos alunos que estabeleçam uma relação
afetiva e de prazer com o texto literário, numa leitura que
tem de ser pessoal e única.
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Notas
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WILKINSON, Ian A. G.; RENINGER, Kristin Bourdage.
What the approaches look like: A conceptual framework for
discussions. In: NYSTRAND, M. (Chair). Making sense of
group discussions designed to promote highlevel comprehension
1
Em alguns estados do Brasil, o Pró-Leitura ainda está em funcionamento,
agora não mais sob a responsabilidade do governo federal e sim dos
governos estaduais ou mesmo municipais.
2 O Programa Toda Criança na Escola é desenvolvido pelo MEC e tem por
objetivo promover a universalização do Ensino Fundamental, garantindo
equidade nas condições de acesso, permanência e êxito do aluno com
idade entre 7 e 14 anos.
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