PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
TALITA CARVALHO SILVA DE ALMEIDA
SÓLIDOS ARQUIMEDIANOS E CABRI 3D: UM ESTUDO
DE TRUNCATURAS BASEADAS NO RENASCIMENTO
MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA
São Paulo
2010
TALITA CARVALHO SILVA DE ALMEIDA
SÓLIDOS ARQUIMEDIANOS E CABRI 3D: UM ESTUDO
DE TRUNCATURAS BASEADAS NO RENASCIMENTO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
MESTRE EM ENSINO DE MATEMÁTICA, sob a
orientação da Professora Doutora Maria José
Ferreira da Silva.
PUC/SP
2010
Banca Examinadora
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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total
ou parcial desta Dissertação por processos de foto copiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _________________________São Paulo e Data: _________
Dedico este trabalho aos meus pais, Henrique e
Eliana, pelo amor, compreensão, paciência e
incentivo sempre.
A GRADECIMENTOS
Primeiro agradeço a DEUS e aos meus anjos da guarda,
pela força, pela proteção e pela oportunidade de iniciar
e concluir esta importante etapa de minha vida.
A querida Professora Doutora Maria José Ferreira da
Silva, pela orientação, apoio e amizade.
Ao Professor Mestre Mário Thomaz (in memorian), por
ter me estimulado a iniciar o mestrado.
Aos membros da banca, Professores Doutores Iran
Abreu Mendes e FumiKazu Saito, pelas valiosas
sugestões e contribuições para essa pesquisa.
Ao corpo docente do Programa de Estudos PósGraduados
em
Educação
Matemática
da
PUC-SP,
especialmente, aos Professores Doutores Saddo Ag
Almouloud, Benedito Antonio da Silva, Cileda de
Queiroz e Silva Coutinho e Sandra Maria Pinto Magina.
A todos os Funcionários do Centro de Ciências Exatas
da PUC-SP, especialmente ao Francisco, pela amizade e
pela ajuda final na formatação da dissertação.
Aos amigos do Programa de Estudos de Pós-Graduados
em Educação Matemática, Juliana, Rosana, Pimenta, Ana
Lúcia, Edna, Gilson, Victória, Patrícia, Ivete e Aida.
A querida amiga Victória, pela amizade, apoio e
sugestões preciosas.
Aos meus amados pais, Henrique e Eliana, por me
proporcionarem condições para estudar.
A minha avó Margarida, meu amor incondicional.
Ao meu namorado Érico, pelo amor e apoio sempre.
Ao meu tio Roberto, pelo carinho, amizade, apoio e
acolhida nessa fase de minha vida.
A minha irmã Thais; meu cunhado Sandy; minhas tias
Thereza, Alzira e Ulcirene; minhas primas Paloma, Ana
Paula e Nayana. E a todos os meus familiares, por
acreditarem em mim e por estarem sempre ao meu lado.
A CAPES, pela concessão da bolsa de estudos.
A todas as pessoas que, de certa forma, contribuíram
para a realização desta pesquisa.
A Autora
R ESUMO
O presente trabalho tem como objetivo revisitar o objeto matemático Sólidos
Arquimedianos por meio de suas construções no ambiente de Geometria
Dinâmica Cabri 3D. Assim, a pergunta de pesquisa foi: o objeto matemático
Sólidos Arquimedianos pode ser resgatado como objeto de ensino para a Escola
Básica, utilizando como habitat o ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D?
Para investigar processos de construção para esses sólidos, recorremos a um
estudo bibliográfico desenvolvido com base em material já elaborado, constituídos
principalmente de livros e artigos científicos. O referencial teórico baseou-se na
Transposição Didática e na Problemática Ecológica de Yves Chevallard (1991),
para promover a articulação entre a análise epistemológica e a análise didática,
além de apontar características outras que determinam a sobrevivência do objeto
matemático Sólidos Arquimedianos enquanto objeto de ensino, e na teoria dos
Registros de Representação Semiótica de Duval (1995), para identificar e analisar
quais os registros mobilizados para a construção desses sólidos, bem como
evidenciar os tratamentos e conversões efetuados. A escolha metodológica pela
pesquisa bibliográfica contribuiu para o alcance do objetivo desejado, visto que
nos permitiu encontrar um procedimento matemático realizado por renascentistas
para a obtenção de arquimedianos a partir de cortes nas arestas de sólidos
platônicos. As análises das construções realizadas ajudaram a perceber que os
tratamentos apenas figurais não são suficientes para a construção dos Sólidos
Arquimedianos no Cabri 3D, faz-se necessário mobilizar um registro discursivo
suporte para que os pontos de corte em sólidos platônicos possam ser
encontrados. Nesse sentido, constatamos que o Cabri 3D se confirmou como um
habitat para o estudo dos Sólidos Arquimedianos, na medida em reconheceu
como objeto todos os saberes que determinam a existência desse objeto
matemático enquanto objeto de ensino.
Palavras-Chave: Sólidos Arquimedianos. Cabri 3D. Transposição Didática.
Registros de Representação Semiótica.
A BSTRACT
This research aims to revisit the mathematical object Archimedean Solids through
their constructions on the environment of Dynamic Geometry Cabri 3D. Thus, the
research question was: Can the mathematical object Solids Archimedean be
rescued as the object of education for the Basic School using the environment as
habitat Dynamic Geometry Cabri 3D? To investigate processes of construction for
these solid, we resort to a bibliographic developed based on material already
prepared, consisting of books and scientific articles. The theoretical framework
was based on the Theory of Didactic Transposition to promote the relationship
between the epistemological analysis and didactic analysis, while identifying
characteristics that determine the survival of the Archimedean Solids mathematical
object as the object of education, and the theory of Register of Representation
Semiotics of Duval (1995), to identify and analyze the register mobilized for the
construction of solid as well as highlight treatments and conversions made. The
methodological choice for literature contributed to the achievement of the desired
goal, since it allowed us to find a mathematical procedure performed by
Renaissance to obtain Archimedean from cut edges of Platonic solids. The
analysis of the constructions helped us realize that the only figural treatments are
not sufficient for the construction of the Archimedean solids in Cabri 3D, it is
necessary to mobilize a record discursive support for the cut-off points on Platonic
solids can be found. Accordingly, we find that Cabri 3D was confirmed as a habitat
for the study of Archimedean Solids, because recognized as an object all the
knowledge that determine the existence of mathematical object as an object of
education.
Key-words: Archimedean Solids. Cabri 3D. Didactic Transposition. Register of
Representation Semiotics.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Representação de poliedro como sólido, superfície e estrutura. ....................... 23
Figura 2. Planificação da superfície de um poliedro. ....................................................... 23
Figura 3. Planificações de superfícies de poliedros. ........................................................ 24
Figura 4. Poliedro convexo e poliedro não-convexo. ....................................................... 25
Figura 5. Elementos de um poliedro ................................................................................ 27
Figura 6. Diferentes tipos de ângulos. ............................................................................. 28
Figura 7. Definição de Sólidos Arquimedianos. ............................................................... 38
Figura 8. Exemplo de poliedros arquimedianos. .............................................................. 39
Figura 9. Prisma e Antiprisma retos regulares. ................................................................ 40
Figura 10. Arquimedianos estudados em Geometria Prática. .......................................... 42
Figura 11. Sólidos considerados arquimedianos. ............................................................ 42
Figura 12. Caixa de ferramentas poliedros. ..................................................................... 48
Figura 13. Caixa de ferramentas poliedros regulares ...................................................... 48
Figura 14. Tetraedro regular ............................................................................................ 49
Figura 15. Caixa de medidas. .......................................................................................... 49
Figura 16. Comprimento do segmento AB. ...................................................................... 49
Figura 17. Ferramenta ponto médio. ............................................................................... 50
Figura 18. Ponto médio da aresta do prisma. .................................................................. 50
Figura 19. Ferramenta plano. .......................................................................................... 50
Figura 20. Plano de secção. ............................................................................................ 51
Figura 21. Ferramenta recorte de poliedro ...................................................................... 51
Figura 22. Recorte de poliedro. ....................................................................................... 51
Figura 23. Ferramenta planificação. ................................................................................ 52
Figura 24. Ferramenta abrir poliedro. .............................................................................. 52
Figura 25. Planificação da superfície do dodecaedro regular. ......................................... 52
Figura 26. Diferentes tratamentos. .................................................................................. 71
Figura 27. Diferentes conversões. ...................................................................................72
Figura 28. Sólidos de Platão. ...........................................................................................81
Figura 29. Descrição de Pappus sobre os sólidos arquimedianos. ..................................83
Figura 30. Tetraedro truncado e cuboctaedro. .................................................................87
Figura 31. Escrito de Piero della Francesca de um Tetraedro truncado. ..........................88
Figura 32. Escrito de Piero della Francesca de um Cuboctaedro. ....................................88
Figura 33. Hexágono regular a partir de um triângulo eqüilátero. .....................................89
Figura 34. Tetraedro truncado, octaedro truncado, icosaedro truncado. ..........................89
Figura 35. Cubo truncado e Dodecaedro truncado. .........................................................90
Figura 36. Desenho de Leonardo da Vinci do Icosidodecaedro. ......................................91
Figura 37. Desenho de Leonardo da Vinci do Rombicuboctaedro....................................91
Figura 38. Icosidodecaedro e rombicuboctaedro. ............................................................92
Figura 39. Cuboctaedro truncado e cubo achatado. ........................................................93
Figura 40. Planificação da superfície do cubo achatado. .................................................94
Figura 41. Construção do cubo achatado a partir do cubo. ..............................................94
Figura 42. Rombicosidodecaedro e icosidodecaedro truncado. .......................................95
Figura 43. Estrutura de poliedros em madeira. ................................................................97
Figura 44. Planificação de superfície de poliedros em madeira. ......................................98
Figura 45. Dodecaedro achatado. ....................................................................................99
Figura 46. Superfície de um dodecaedro achatado em madeira. .....................................99
Figura 47. Mistério Cosmográfico de Kepler. .................................................................101
Figura 48. Classificação de poliedros de Kepler ............................................................102
Figura 49. Exemplo Lema 2(i). .......................................................................................104
Figura 50. Exemplo Lema 2(ii). ......................................................................................105
Figura 51. Dois tipos de vértices de mesma espécie .....................................................106
Figura 52. Sólidos Arquimedianos. ................................................................................121
Figura 53. Rombicuboctaedro e pseudo rombicuboctaedro. ..........................................123
Figura 54. Sólidos Arquimedianos obtidos por truncaturas. ...........................................127
Figura 55. Arquimedianos obtidos por truncaturas modificadas. .................................... 128
Figura 56. Truncamento tipo 1....................................................................................... 129
Figura 57. Truncamento tipo 2....................................................................................... 129
Figura 58. Eliminação do canto do tetraedro, do cubo e do dodecaedro. ...................... 130
Figura 59. Eliminação do canto do octaedro.................................................................. 130
Figura 60. Eliminação do canto do icosaedro. ............................................................... 130
Figura 61. Cuboctaedro gerado a partir do cubo ou octaedro. ....................................... 131
Figura 62. Icosidodecaedro a partir do dodecaedro ou icosaedro. ................................ 131
Figura 63. Face hexagonal. ........................................................................................... 132
Figura 64. Pontos de corte no triângulo. ........................................................................ 133
Figura 65. Face octogonal. ............................................................................................ 133
Figura 66. Pontos de corte no quadrado. ...................................................................... 134
Figura 67. Face decagonal. ........................................................................................... 135
Figura 68. Pontos de corte no pentágono. ..................................................................... 135
Figura 69. Circunferência circunscrita ao decágono. ..................................................... 136
Figura 70. Triângulo 1. .................................................................................................. 137
Figura 71. Triângulo 1. .................................................................................................. 137
Figura 72. Ferramenta cubo. ......................................................................................... 141
Figura 73. Cubo............................................................................................................. 141
Figura 74. Pontos médios das arestas do cubo. ............................................................ 142
Figura 75. Plano de secção (cubo). ............................................................................... 142
Figura 76. Eliminação do canto do cubo. ....................................................................... 143
Figura 77. Cuboctaedro. ................................................................................................ 143
Figura 78. Ferramenta octaedro regular. ....................................................................... 143
Figura 79. Octaedro Regular. ........................................................................................ 144
Figura 80. Pontos médios das arestas do octaedro regular. .......................................... 144
Figura 81. Plano de secção (octaedro regular). ............................................................. 144
Figura 82. Eliminação do canto do octaedro regular. ..................................................... 145
Figura 83. Ferramenta dodecaedro regular. ...................................................................145
Figura 84. Dodecaedro regular. .....................................................................................146
Figura 85. Pontos médios das arestas do dodecaedro regular. .....................................146
Figura 86. Plano de secção (dodecaedro regular). ........................................................146
Figura 87. Eliminação do canto do dodecaedro regular. ................................................147
Figura 88. Icosidodecaedro............................................................................................147
Figura 89. Ferramenta icosaedro regular. ......................................................................148
Figura 90. Icosaedro Regular. ........................................................................................148
Figura 91. Pontos médios das arestas do dodecaedro regular. .....................................148
Figura 92. Plano de secção (dodecaedro regular). ........................................................149
Figura 93. Eliminação do canto do icosaedro regular.....................................................149
Figura 94. Face triangular ABC. .....................................................................................152
Figura 95. Ferramenta tetraedro regular. .......................................................................153
Figura 96. Tetraedro regular. .........................................................................................153
Figura 97. Arestas do tetraedro divididas em três partes congruentes. ..........................153
Figura 98. Plano de secção (tetraedro regular). .............................................................154
Figura 99. Eliminação do canto do tetraedro regular. .....................................................154
Figura 100. Tetraedro truncado. ....................................................................................155
Figura 101. Ferramenta octaedro regular.......................................................................155
Figura 102. Octaedro regular. ........................................................................................155
Figura 103. Arestas do octaedro dividas em três partes congruentes. ...........................156
Figura 104. Plano de secção (octaedro regular) ............................................................156
Figura 105. Eliminação do canto do octaedro regular. ...................................................157
Figura 106. Octaedro truncado. .....................................................................................157
Figura 107. Ferramenta icosaedro regular. ....................................................................157
Figura 108. Icosaedro regular. .......................................................................................158
Figura 109. Arestas do icosaedro dividas em três partes iguais. ....................................158
Figura 110. Plano de secção (icosaedro regular). ..........................................................158
Figura 111. Eliminação do canto do icosaedro regular. ................................................. 159
Figura 112. Icosaedro truncado. .................................................................................... 159
Figura 113. Triângulo eqüilátero. ................................................................................... 160
Figura 114. Ferramenta comprimento. .......................................................................... 163
Figura 115. Comprimento da aresta (cubo). .................................................................. 163
Figura 116. Ferramenta calculadora. ............................................................................. 163
Figura 117. Inserindo expressão na calculadora (cubo truncado). ................................. 164
Figura 118. Transferência de medida para a aresta do cubo. ........................................ 164
Figura 119. Plano de secção (cubo II) ........................................................................... 164
Figura 120. Eliminação do canto do cubo II. .................................................................. 165
Figura 121. Cubo truncado. ........................................................................................... 165
Figura 122. Conversão entre os registros figural e algébrico. ........................................ 166
Figura 123. Inserindo a expressão na calculadora (dodecaedro truncado). ................... 168
Figura 124. Transferência de medida para a aresta do dodecaedro regular. ................. 168
Figura 125. Plano de secção (dodecaedro regular II). ................................................... 169
Figura 126. Eliminação do canto do dodecaedro regular II. ........................................... 169
Figura 127. Dodecaedro truncado. ................................................................................ 169
Figura 128. Ferramenta transferência de Medidas. ....................................................... 184
Figura 129. Transferindo medidas. ................................................................................ 184
Figura 130. Ferramentas distância e comprimento. ....................................................... 185
Figura 131. Calculadora. ............................................................................................... 185
Figura 132. Ferramenta semi-reta. ................................................................................ 186
Figura 133. Criação semi-reta. ...................................................................................... 186
Figura 134. Ferramenta ponto. ...................................................................................... 187
Figura 135. Ponto 1 na semi-reta. ................................................................................. 187
Figura 136. Ferramenta esfera. ..................................................................................... 187
Figura 137. Ponto 2 e ponto 3 na semi-reta................................................................... 188
Figura 138. Ferramenta segmento. ............................................................................... 188
Figura 139. Criação segmento. ......................................................................................188
Figura 140. Ferramenta paralela. ...................................................................................189
Figura 141. Criação paralelas. .......................................................................................189
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Recursos do Cabri 3D. ................................................................................... 53
Quadro 2. Números de triângulos eqüiláteros que podem concorrer em um vértice. ....... 80
Quadro 3. Números de quadrados que podem concorrer em um vértice. ........................ 80
Quadro 4. Números de pentágonos regulares que podem concorrer em um vértice. ...... 80
Quadro 5. Características Poliedros de Platão. ............................................................... 82
Quadro 6. Descrição de Pappus sobre os sólidos arquimedianos. .................................. 84
Quadro 7. Sólidos Arquimedianos no Renascimento. ...................................................... 96
Quadro 8. Tipos de vértices que não formam um ângulo sólido. ................................... 104
Quadro 9. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de quatro lados e
no máximo quatro polígonos de três lados. ................................................................... 107
Quadro 10. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de quatro
lados e dois polígonos de três lados.............................................................................. 108
Quadro 11. Possibilidades de ângulos sólidos formados por três polígonos de quatro
lados e dois polígonos de três lados.............................................................................. 109
Quadro 12. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de cinco lados e
no máximo quatro polígonos de três lados.. .................................................................. 109
Quadro 13. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de cinco lados
e no máximo dois polígonos de três lados.. ................................................................... 110
Quadro 14. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de seis lados e
no máximo três polígonos de três lados. ....................................................................... 111
Quadro 15. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de seis lados
e um polígono de três lados. ......................................................................................... 112
Quadro 16. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de sete ou mais
lados e três lados. ......................................................................................................... 113
Quadro 17. Possibilidades de ângulos sólidos formados por mais de um polígono de sete
ou mais lados e três lados. ............................................................................................ 114
Quadro 18. Possibilidades de ângulos sólidos formados por polígonos de quatro lados e
cinco ou mais lados. ...................................................................................................... 115
Quadro 19. Possibilidades de ângulos sólidos formados por polígonos de cinco lados e
seis ou mais lados. ........................................................................................................116
Quadro 20. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de quatro lados,
dois polígonos de três lados e um polígono de cinco ou mais lados. .............................117
Quadro 21. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de quatro
lados e um polígono de cinco ou mais lados. .................................................................118
Quadro 22. Possibilidades de ângulos sólidos formados por três polígonos que não são
de três lados. .................................................................................................................119
Quadro 23. Pseudo Rombicuboctaedro. ........................................................................122
Quadro 24. Características numéricas dos arquimedianos estudados. ..........................172
Quadro 25. Características numéricas a partir do tipo de truncamento. .........................174
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS .................................................................................................... 18
CAPITULO 1 – ESTUDOS PRELIMINARES .......................................................................... 22
1.1 IDÉIA DE POLIEDRO ......................................................................................................... 22
1.2 ALGUNS ESTUDOS EM GEOMETRIA ESPACIAL......................................................... 28
1.3 OS POLIEDROS NOS DOCUMENTOS OFICIAIS ............................................................ 34
1.4 OS SÓLIDOS ARQUIMEDIANOS EM MATERIAIS DIDÁTICOS .................................. 38
1.5 DESENHO GEOMÉTRICO E GEOMETRIA DESCRITIVA ............................................. 43
1.6 GEOMETRIA DINÂMICA E CABRI 3D............................................................................. 46
1.7 OS TRÊS PÓLOS DA COMUNICAÇÃO ............................................................................ 54
CAPÍTULO 2 – PROBLEMÁTICA ............................................................................................ 58
2.1 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA ..................................................................................... 58
2.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................................... 59
2.3 QUADRO TEÓRICO ........................................................................................................... 60
2.3.1 NOÇÃO DE TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA E A PROBLEMÁTICA ECOLÓGICA ....... 61
2.3.2 REGISTRO DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA ........................................................ 66
CAPÍTULO 3 – ESTUDO HISTÓRICO .................................................................................... 78
3.1 POLIEDROS REGULARES ................................................................................................ 78
3.2 O DESENVOLVIMENTO DOS SÓLIDOS DE ARQUIMEDES ........................................ 82
3.3 SOLIDOS ARQUIMEDIANOS NO RENASCIMENTO..................................................... 85
3.4 SISTEMATIZAÇAO DE KEPLER .................................................................................... 100
3.5 TREZE OU QUATORZE ARQUIMEDIANOS? ............................................................... 121
CAPÍTULO 4 – ESTUDO DIDÁTICO E MATEMÁTICO .................................................... 126
4.1 OPERAÇÃO DE TRUNCAMENTO ................................................................................. 126
4.1.1 ARQUIMEDIANOS OBTIDOS POR TRUNCAMENTO TIPO 1 ................................. 131
4.1.2 ARQUIMEDIANOS OBTIDOS POR TRUNCAMENTO TIPO 2 ................................. 132
4.2. AS CONSTRUÇÕES E SUAS ANÁLISES ...................................................................... 140
4.2.1 TRUNCAMENTO TIPO 1 ............................................................................................ 141
4.2.2 TRUNCAMENTO TIPO 2 ............................................................................................ 152
4.3 AS CARACTERÍSTICAS NUMÉRICAS DOS POLIEDROS OBTIDOS ........................ 172
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 176
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 180
APÊNDICE A: TRANSFERINDO MEDIDAS NO CABRI 3D .............................................. 184
APÊNDICE B: APLICANDO O TEOREMA DE TALES NO CABRI 3D ............................ 186
CONSIDERAÇÕES INICIAIS1
As possibilidades interativas advindas da informática e os seus diversos
usos na educação matemática são aspectos que sempre chamaram minha
atenção. Talvez pelo fato de ter formação na área de tecnologia, além de ser
professora de matemática.
De fato meu interesse estava, desde meu ingresso no mestrado ou mesmo
antes, em desenvolver um trabalho em geometria espacial auxiliado pelo
ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D, software que conheci em 2004 na
condição de aluna da especialização em educação matemática da Universidade
do Estado do Pará. Assim, faltava escolher o objeto matemático de estudo para
dar início a pesquisa.
No programa de Pós Graduação em Educação Matemática da PUC-SP, eu
e outra aluna, tivemos a oportunidade de ministrar uma oficina de Cabri 3D.
Nosso intuito era apresentar as ferramentas e recursos do software via
construções geométricas espaciais. Para isso, elaboramos um material que
apresentava tais ferramentas e recursos por meio de atividades propostas. Uma
das atividades trazia o passo a passo da construção do sólido arquimediano
cuboctaedro, sem, no entanto nomeá-lo ou mesmo ilustrá-lo.
Observamos que essa atividade incomodou vários de nossos colegas
presentes, pois uma vez concluída a construção a mesma era apagada e
recomeçada, como se a figura gerada não fosse à esperada. Essa situação nos
fez perceber que a maioria dos alunos desconhecia o cuboctaedro, bem como os
outros Sólidos Arquimedianos.
A situação exposta me levou a procurar trabalhos em geometria espacial
que discorressem a respeito desses sólidos, na tentativa de talvez entender o
porquê desse não conhecimento. No entanto, para minha surpresa, percebi que
pesquisas e até mesmo livros de geometria espacial a respeito do assunto quase
inexistiam no Brasil.
____________
1
Essa dissertação está conforme as regras do Acordo Ortográfico.
18
Essa inquietação contribuiu em grande parte para a escolha do tema do
presente trabalho na medida em que me fez investigar além do objeto matemático
em questão, processos de construções para esses sólidos.
Desse modo, eu e minha orientadora decidimos desenvolver nosso estudo
no ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D, por o considerarmos uma
ferramenta potencial de ajuda ao raciocínio, principalmente pela possibilidade de
corrigir e aperfeiçoar continuamente construções geométricas espaciais ao longo
das simulações.
Para tanto, tomamos por hipótese que o Cabri 3D possibilita o estudo dos
Sólidos Arquimedianos, pois além de favorecer a representação de objetos
tridimensionais, permite manipulá-las, o que facilita a exploração e a elaboração
de conjecturas. Desse modo, objetivamos com a pesquisa revisitar o objeto
matemático Sólidos Arquimedianos por meio de suas construções no ambiente de
Geometria Dinâmica Cabri 3D.
Assim, nos propomos responder à seguinte questão de pesquisa: O objeto
matemático Sólidos Arquimedianos pode ser resgatado como objeto de
ensino para a Escola Básica, utilizando como habitat o ambiente de
Geometria Dinâmica Cabri 3D? Para respondê-la investigamos na história
processos de construção para esses sólidos e verificamos se o ambiente proposto
permite que tais construções sejam realizadas.
O presente trabalho foi estruturado em quatro capítulos. No primeiro
capítulo, apresentamos estudos preliminares importantes para a composição de
nossa problemática. Nesse capítulo, destacamos algumas idéias que envolvem o
termo poliedro, apontamos como os Sólidos Arquimedianos são abordados em
pesquisas realizadas em Educação Matemática, nos documentos oficias e em
materiais didáticos, assinalamos as possíveis causas para o declínio das
disciplinas
Desenho
Geométrico
e
Geometria
Descritiva,
bem
como
apresentamos uma reflexão acerca da complementaridade entre as duas
disciplinas citadas e o ambiente Cabri 3D.
No segundo capítulo trazemos a problemática, na qual destacamos nosso
problema de pesquisa, procedimentos metodológicos e nosso quadro teórico. O
terceiro capítulo tece considerações a respeito da história dos Sólidos de
19
Arquimedes, traz a demonstração da existência de apenas treze sólidos e
apresenta um procedimento matemático descoberto no Renascimento que
possibilita a construção dos mesmos.
No último capítulo, apresentamos o nosso estudo didático e matemático a
respeito dos Sólidos Arquimedianos que aponta uma possibilidade para o ensino
e aprendizagem e sua inclusão na Educação Básica por meio do ambiente de
Geometria Dinâmica Cabri 3D. Essa possibilidade está atrelada a sistematização
do procedimento de construção renascentista.
Por fim, apresentamos algumas considerações finais, oriundas das
construções realizadas no Cabri 3D, a resposta para a nossa questão de
pesquisa, bem como algumas perspectivas futuras.
20
CAPITULO 1 – ESTUDOS PRELIMINARES
Iniciamos o capítulo com algumas idéias que envolvem o termo poliedro e
com a apresentação de alguns estudos já realizados em Geometria Espacial. Em
seguida, destacamos como os documentos oficiais sugerem o ensino dos Sólidos
Arquimedianos, bem como a maneira que esse conteúdo é abordado em
materiais didáticos. Por fim, apontamos as possíveis causas do abandono das
disciplinas Desenho Geométrico e Geometria Descritiva, um possível ambiente
informático que possibilite o estudo de poliedros, além de uma reflexão acerca da
complementaridade existente entre o Desenho Geométrico, a Geometria
Descritiva e o ambiente informático proposto.
1.1 IDÉIA DE POLIEDRO
Wenninger (1996) lembra que a geometria é, por vezes, definida como o
estudo do espaço ou de figuras no espaço de duas dimensões, para as figuras
planas, polígonos, e de três dimensões para poliedros. A idéia de conjunto é
utilizada pelo autor para definir polígono como um conjunto de segmentos que
limitam uma porção do espaço bidimensional, e poliedros como um conjunto de
figuras planas que limitam uma porção do espaço tridimensional.
Para Cromwell (2008) a definição de poliedros assinalada por Wenninger
(1996) pode ser interpretada de muitas maneiras, pois não fornece qualquer
restrição para a forma como os polígonos estão dispostos ou que tipos de
polígonos podemos usar. No entanto para o autor, tal definição tem sido
produtiva, já que possibilita o termo poliedro envolver várias direções e conduzir
para o estudo de diferentes tipos de objetos poliédricos.
O autor, ainda, afirma que estabelecer uma definição geral para poliedros
é impossível, uma vez que diversos escritores têm aplicado o mesmo termo para
idéias distintas, algumas mutuamente exclusivas. Se em um nível mais elementar
perguntarmos se um poliedro é um objeto sólido ou uma superfície oca, para
Cromwell (2008) essas respostas dependem do período em que os geômetras
viveram e os problemas que eles estudaram. Para um agrimensor da Grécia
antiga, por exemplo, um poliedro era um sólido, ao longo dos últimos anos,
22
tornou-se, segundo o autor, mais conveniente pensar em poliedros como
superfícies ocas. Entretanto, o autor aponta que há ainda estudiosos que
consideram poliedros apenas como estrutura, como mostramos na Figura 1.
Figura 1. Representação de poliedro como sólido, superfície e estrutura.
No Brasil, de acordo com o Novo Dicionário da Língua Portuguesa
(Aurélio), o termo poliedro é designado para “sólido limitado por polígonos
planos”. Contudo ao observarmos a definição de Poliedro apresentada em livros
de Geometria Espacial, percebemos contradições nos discursos dos autores, que
embora considerem poliedros como sólidos, não os definem como tal.
Freire (1897, p. 146) em Primeiras Noções de Geometria Prática admite
poliedro como sendo “os volumes limitados por superfícies planas”. Em um
primeiro momento, a definição dada nos permite considerar poliedro como sólido,
entretanto, há uma passagem no livro em que o autor revela as faces como “os
planos que formam o poliedro”. (Ibid., p.147). Tal afirmação se confirma nas
representações de poliedros, observadas na Figura 2, em que o autor apresenta a
planificação como exemplo do mesmo.
Figura 2. Planificação da superfície de um poliedro.
Fonte: Freire, 1897, p. 151.
23
Para Carvalho (1960, p. 80), em Programa de Desenho para a primeira e
segunda séries ginasiais, os poliedros “são sólidos completamente limitados por
polígonos planos” e os sólidos são caracterizados por possuírem três dimensões:
comprimento, largura e altura ou espessura. No entanto, o exemplo dado pelo
autor, conforme mostra a Figura 3, elucida a idéia de poliedro apenas como uma
superfície.
Figura 3. Planificações de superfícies de poliedros.
Fonte: Carvalho, 1960, p.93.
Lima et. al. (1999) em A Matemática do Ensino Médio iniciam a discussão
a respeito de Poliedro designando-o, de uma forma geral, como sólido formado
por faces, mas o definem como “uma reunião de um número finito de polígonos
planos”. (Ibid., p.232).
24
Para os mesmos autores, conforme mostra a Figura 4, “um poliedro é
convexo se qualquer reta (não paralela a nenhuma de suas faces) o corta em, no
máximo, dois pontos. (LIMA ET AL, 1999, p.233).
Figura 4. Poliedro convexo e poliedro não-convexo.
Fonte: Lima et. al., 1999, p. 233.
A definição adotada pelos autores torna clara a idéia de poliedro como
superfície. Contudo, vale ressaltar que em outro momento, os mesmos autores
estudam o volume de poliedros e o definem como “a quantidade de espaço por
ele ocupado”. (LIMA et. al., 1999, p.251).
Diferente das definições já apresentadas, Rangel (1982, p. 6) afirma que
poliedro é toda superfície poliédrica fechada. É, portanto, a
superfície que pode ser concebida como um conjunto de
polígonos tais que cada lado de uma face pertence sempre, e no
máximo, a duas faces.
De acordo com o autor, por hábito de linguagem, é comum se referir ao
nome do corpo, em vez do nome da superfície que o limita, como por exemplo,
diz-se cubo, quando se quer referir à superfície cúbica. Embora a idéia de
poliedro para o autor seja a de superfície, ele considera seu volume quando diz
que “dois poliedros são eqüilaventes quando têm o mesmo volume”. (Ibid., p. 9).
Nesse sentido, o autor confunde volume com capacidade.
Já Dolce e Pompeo (1998, p.124), em Fundamentos de Matemática
Elementar: geometria espacial, discorrem a respeito de Poliedro Convexo como
segue.
Consideremos um número finito n (n
4) de polígonos planos
convexos (ou regiões poligonais convexas) tais que:
a) dois polígonos não estão num mesmo plano;
b) cada lado de polígono é comum a dois e somente dois
polígonos;
25
c) o plano de cada polígono deixa os demais polígonos num
mesmo semi-espaço.
Nessas condições, ficam determinados n semi-espaços, cada um
dos quais tem origem no plano de um polígono e contém os
restantes. A intersecção desses semi-espaços é chamado
poliedro convexo.
Um poliedro convexo possui: faces, que são os polígonos
convexos; arestas, que são os lados dos polígonos e vértices, que
são os vértices dos polígonos.
A reunião das faces é a superfície do poliedro.
A definição apresentada de poliedro convexo como a intersecção de semiespaços nos conduz assumir poliedro não como um sólido. Assim, em um
primeiro momento, somos levados a crer que os autores entendem poliedro como
uma superfície.
No entanto, os mesmos autores, em Fundamentos de Matemática
Elementar: geometria plana, definem polígono como a reunião de segmentos e
não como uma superfície, como segue:
dada uma seqüência de pontos de um plano (A1, A2,..., An) com
n ≥ 3, todos distintos, onde três pontos consecutivos não são
colineares, considerando-se consecutivos An-1, An e A1, assim
como An, A1, e A2, chama-se polígono à reunião dos segmentos
A1A2, A2A3, ..., An-1An, An A1 (POMPEO e DOLCE, 2006, p. 132).
Se considerarmos a definição de polígono apresentada pelos autores, a
idéia de poliedro como superfície também é descartada, pois, a idéia que
prevalece é a de poliedro como estrutura, e, portanto, não há volume e nem
capacidade.
Kaleff (1998), embora não defina Poliedros, em Vendo e Entendendo
Poliedros, a todo momento designa-o como um sólido. Tal interpretação ocorre
quando a autora descreve dois tipos de representação concreta que podem
favorecer o reconhecimento e análise de propriedades geométricas por parte do
aluno: o modelo casca, que representa a superfície do poliedro, e o modelo
esqueleto, que representa a estrutura das arestas do poliedro.
A maioria das definições apresentadas nos conduz a um problema que
envolve a interpretação do termo poliedro. Ora, se considerarmos poliedro como a
reunião de um número finito de faces, entendemos que a idéia que prevalece é a
de um objeto oco e não a de um objeto sólido, e nesse caso não há volume, mas
26
sim capacidade. A idéia de volume nos remete a admitir poliedro como algo que
não seja oco, nem vazio.
Ponte (2000, p.15) adverte que
a capacidade é muitas vezes confundida com o volume e, por
vezes, as crianças têm dificuldade em separar o volume de um
objeto do seu peso. Enquanto que volume de um objeto é a
quantidade de espaço que ocupa, a capacidade é a quantidade de
espaço ou de líquido que pode conter.
Diante das definições apresentadas, percebemos contradições na maioria
dos discursos dos autores em relação ao termo poliedro. Acreditamos que,
embora seja possível definir poliedro de diferentes maneiras, isto é, como sólido,
como superfície ou ainda como estrutura, precisamos ser coerentes com a
definição adotada.
No trabalho, assumimos a idéia de poliedro como um sólido e adotamos a
definição de poliedro convexo apresentada por Dolce e Pompeo (1998). Contudo,
definimos polígono como “a reunião de uma linha fechada simples formada
apenas por segmentos de reta com a sua região interna”, conforme Giovanni,
Castrucci e Giovanni Jr. (1998, p. 202).
Alguns termos básicos, listados abaixo e ilustrados na Figura 5, serão
mencionados no decorrer do trabalho.
Cada polígono é chamado de face de um poliedro.
Um segmento comum a duas faces é chamado de aresta.
Um ponto comum a várias arestas e faces é chamado de vértice.
vértice
aresta
face
Figura 5. Elementos de um poliedro
Fonte: Cromwell, 2008, p.13.
27
Existem também vários tipos de ângulos em um poliedro: ângulo plano,
ângulo sólido e ângulo diedral, respectivamente mostrados na Figura 6. O ângulo
no canto de uma face poligonal é chamado de ângulo plano. O ângulo sólido é a
região do poliedro próxima a um vértice, em outras palavras, é um pedaço do
canto e está delimitada por três ou mais ângulos planos. O ângulo entre duas
faces adjacentes é chamado de ângulo diedral e para encontrá-lo marca-se um
ponto na aresta compartilhada e cria-se uma perpendicular à aresta em cada uma
das duas faces passando pelo ponto marcado. O ângulo diedral é o ângulo entre
as duas linhas.
Figura 6. Diferentes tipos de ângulos.
Assim, em continuidade aos nossos estudos analisamos as pesquisas
que se aproximam do tema de pesquisa.
1.2 ALGUNS ESTUDOS EM GEOMETRIA ESPACIAL
Nessa parte do trabalho, procuramos analisar as pesquisas em Geometria
Espacial que retratassem em seus estudos os Sólidos de Arquimedes.
A procura no Banco de Dissertações e Teses da Capes por pesquisas em
Geometria Espacial, considerando o descritor “geometria espacial”, nos conduziu
a um total de 35 trabalhos, 27 relacionados à Educação ou Educação Matemática,
4 à Engenharia, 1 à Biologia, 1 à Ciências Ambientais, 1 à Ciência da
Comunicação e 1 à Ciência da Computação.
Das pesquisas relacionadas à área de Educação ou Educação Matemática,
percebemos que apenas duas retratam em seus estudos os Sólidos
Arquimedianos. No entanto, esse levantamento nos permitiu constatar que 19
28
pesquisas se aproximam por considerarem a representação e visualização em
Geometria Espacial, habilidades importantes para o desenvolvimento do
raciocínio geométrico espacial do indivíduo.
Nesse sentido, procuramos então, não apenas no Banco de Teses da
Capes, mas no Brasil, por estudos em Matemática e em Educação Matemática
que discutissem a questão da visualização e representação em Geometria
Espacial, e também por pesquisas que abordassem o conteúdo matemático
Sólidos Arquimedianos.
Nessa busca encontramos vários estudos em Educação Matemática que
ressaltam a importância de se incentivar o desenvolvimento da habilidade de
visualizar tanto objetos do mundo real, quanto conceitos, processos e fenômenos
matemáticos. Dentre esses, destacamos os trabalhos de Kaleff e Rei (1994);
Kaleff, Rei e Garcia (1996) e Kaleff (1998) relacionados à visualização e
interpretação de sólidos geométricos e os estudos de Cavalca (1997),
Montenegro (2005) e Flores (2007) que retratam a questão da visualização de
forma mais abrangente. Quanto a trabalhos que abordam o objeto matemático
Sólidos Arquimedianos, encontramos apenas o estudo de Allan (1997) e as
dissertações de Fernandes (2008) e Silva (2008).
As dificuldades apresentadas pelos alunos na visualização de sólidos
geométricos e a desmotivação que muitos apresentavam nas aulas de Geometria
Espacial levaram Kaleff e Rei (1994) a procurar meios que facilitassem o ensino
de propriedades geométricas dos sólidos e tornassem esse ensino mais atrativo e
motivador.
Para as autoras umas das formas de se desenvolver o raciocínio espacial
seria construir os sólidos geométricos por meio de materiais concretos. Tais
construções dariam ao aluno não só a oportunidade de observar e utilizar várias
relações espaciais, mas ao mesmo tempo, por meio da manipulação dos
materiais concretos, o mesmo seria motivado à ação e teria estimulada a sua
criatividade.
Foi nesse sentido que Kaleff e Rei (1994) utilizaram, em suas práticas
materiais concretos, como canudos e varetas, para a construção de estruturas
que representassem “esqueletos” dos cinco sólidos platônicos construídos por
29
meio de suas arestas. A seqüência de construção dos sólidos foi à seguinte:
tetraedro, octaedro, icosaedro e cubo. As autoras assinalaram que alunos entre
13 e 15 anos perceberam que, após construírem os quatros sólidos, a idéia da
construção do dodecaedro surgiu naturalmente. Dessa forma, enfatizaram a
importância de uma abordagem pedagógica que permita o aluno criar imagens,
interpretar desenhos, conjecturar e intuir soluções para problemas, habilidades
úteis não apenas para o desenvolvimento de idéias matemáticas, mas também
para o desenvolvimento integral do ser humano.
Já Kaleff, Rei e Garcia (1996) com o propósito de investigar como
professores e futuros professores interpretavam desenhos e calculavam volumes
de sólidos construídos por pequenos cubos, desenvolveram um estudo com 590
indivíduos, entre professores e alunos do curso de graduação em matemática,
com diferentes experiências de escolaridade e em diferentes meios sociais. Para
avaliar e quantificar tais observações, as autoras elaboraram e aplicaram um
questionário relacionado a objetos tridimensionais.
Com
as
respostas
dadas
as
autoras
constataram
significativas
deficiências apresentadas pelos sujeitos investigados no que tange a visualização
e interpretação de informações pictóricas implícitas, necessárias para a
determinação do volume de sólidos, além de deficiências outras relativas a
diversos conceitos matemáticos elementares.
A preocupação com a visualização em Geometria levou Kaleff (1998) a
desenvolver um trabalho que contribuísse para sua valorização, enfatizando as
representações e suas interpretações. Nesse sentido, um material para
professores foi desenvolvido para que conteúdos pouco explorados nos
programas escolares, como os sólidos platônicos e os poliedros regulares
convexos duais2, fossem revisitados e vivenciados de maneira dinâmica e
objetiva.
Para Kaleff (1998, p.16) “ao visualizar objetos geométricos, o indivíduo
passa a ter controle sobre o conjunto das operações mentais básicas exigidas no
trato da Geometria”. Contudo, segundo a autora, é importante não confundir a
____________
2
Segundo Veloso (1998), diz-se que dois poliedros são duais um do outro se consideramos um
poliedro qualquer e obtermos os vértices do outro poliedro a partir dos pontos centrais das faces
adjacentes do primeiro poliedro.
30
habilidade de perceber o objeto matemático em sua totalidade, habilidade de
visualização, com a percepção visual das representações disponíveis deste
objeto.
A autora pontua que embora haja muitas discussões sobre a forma como
a visualização se processa na mente, é importante considerá-la principalmente na
Geometria e assinala que a habilidade de visualização não é inata a todos os
indivíduos, contudo pode ser desenvolvida. Para Kaleff (1998), um dos caminhos
seria dispor de um apoio didático baseado em materiais concretos representativos
do objeto geométrico de estudo.
Compartilhando esta mesma assertiva, de que alguns indivíduos
simplesmente não possuem capacidade de visualização, Cavalca (1998) elaborou
uma seqüência didática com o propósito de desenvolver com alunos do terceiro
grau, que apresentavam tal carência, as habilidades necessárias para a
visualização, interpretação de objetos espaciais e suas representações.
A seqüência de atividades desenvolvida pelo autor, com material concreto
e suas representações com lápis e papel, ajudou os alunos a desenvolverem suas
capacidades de interpretar representações distintas de um mesmo objeto
matemático e resolver problemas por meio de processos apoiados na
visualização. Para Cavalca (1998, p. 163), “isto significa que eles conseguiram
estabelecer uma relação mais adequada entre os objetos do espaço e a
representação plana deles, e dessa forma, evidenciou que é possível desenvolver
a habilidade de visualização mesmo em alunos adultos”.
Montenegro (2005) também acredita que a habilidade de visualização
pode ser estimulada, contudo adverte que não pode ser
[...] tida como específica; ela englobaria diferentes tipos de
aprendizagem que procuram identificar relações de posição,
direção, tamanho, forma e distância entre objetos. Ela percebe
detalhes e os agrupa em conjuntos; ou os monta em padrões
dentro de uma base conhecida. (Ibid., p.8).
O autor conduziu a pesquisa com 41 alunos do Ensino Médio com o
intuito de analisar como objetos espaciais eram visualizados por eles. Na
pesquisa, seis testes foram aplicados, com distintas figuras, em diferentes
posições. Os resultados obtidos evidenciaram muitas dificuldades por parte dos
31
alunos em representar objetos tridimensionais, a representação mais utilizada foi
a perspectiva Cavaleira. Para o autor, desenvolver as capacidades de
visualização e representação é ter estimulada a criatividade humana, inteligência
para criar coisas novas.
Da mesma forma, Flores (2007) considera a visualização importante para
a aquisição dos conhecimentos geométricos, e atribui à geometria uma atividade
do olhar, considerada pela autora, um tanto complexa por envolver outros
elementos que não estejam relacionados, exclusivamente, às figuras em si e nem
a capacidade visual de cada um de nós. A autora sugere que analisemos uma
imagem como representação de um modo de olhar e apresenta a perspectiva
como “suporte tanto da representação, quanto da epistemologia de um modo
específico do olhar”. (Ibid., p. 20).
Para a autora entender como esse olhar se fez em perspectiva, pode nos
ajudar a compreender o problema da visualização no ensino de Matemática, uma
vez que a “intimidade entre a visualização e a geometria não se restringe ao
espaço de sala de aula, tão pouco às questões atuais”. (FLORES, 2007, p.17). O
que a autora sugere é “deslocar o pólo do processo de ensino e de aprendizagem
centrado no aluno e apromixar-se do saber instituído”. (Ibid., p.36). Em outras
palavras, compreender tanto o lugar efetivo do conhecimento, quanto a relação
que o professor tem com o saber que ele ensina.
Flores (2007) ao investigar na história, na arte e na técnica, um
conhecimento de um saber, o da técnica em perspectiva, e mostrar como o modo
de olhar, os saberes e os sujeitos foram se construindo, pôde compreender as
dificuldades e os erros de interpretação visual dos alunos, bem como relacionalos a construção de um olhar estabelecido em uma ordem que se deu há séculos
atrás.
Nos estudos apresentados até aqui, percebemos a preocupação dos
autores em amenizar dificuldades no que tange a visualização, interpretação e
representação de objetos tridimensionais ou mesmo procurar meios didáticos que
possibilitem o desenvolvimento de tais capacidades. Acreditamos também que
esses aspectos são importantes e precisam ser considerados, entretanto como
fogem do escopo principal deste trabalho serão explorados em trabalhos futuros.
32
Quanto aos estudos que envolvem o objeto matemático Sólidos
Arquimedianos, observamos que Allan (1997) os apresenta por meio de um breve
estudo histórico sobre poliedros e nos indica um processo geral que envolve suas
construções. O processo de lapidação sugerido pelo autor, consiste em cortar
pedaços de um sólido regular qualquer para a obtenção de outro sólido em que
todas as arestas são congruentes. Contudo, o autor não ilustra nenhum sólido
arquimediano e tão pouco os nomeia apenas nos indica o sólido platônico a partir
do qual se originam. Esse estudo contribuiu para o desenvolvimento de nossa
pesquisa, sobretudo em relação aos aspectos históricos apontadas pelo autor.
Em relação às pesquisas de Fernandes (2008) e Silva (2008) percebemos
que ambas compartilham do mesmo sólido arquimediano. Suas pesquisas estão
relacionados à WebQuest “Bola de Futebol e a Matemática”, desenvolvida pelas
autoras para o ensino e aprendizagem do sólido arquimediano icosaedro
truncado. A WebQuest apresenta tarefas que envolvem noções relativas aos
Sólidos Arquimedianos, bem como competências para o trabalho geométrico, tais
como: leitura e interpretação de textos, definições em matemáticas, princípios das
construções geométricas, dentre outros. A WebQuest traz, ainda, a tarefa de
construir um modelo do icosaedro truncado utilizando papel cartão, além das
instruções necessárias para sua confecção.
Enquanto Fernandes (2008) analisou o papel que o professor
desempenhava ao utilizar a WebQuest, Silva (2008) procurou investigar como
esta metodologia de ensino pode colaborar para o desenvolvimento de conteúdos
matemáticos com alunos do Ensino Médio. Ambas as autoras dedicaram um
capítulo de suas dissertações ao estudo matemático, ainda que tímido, dos
sólidos arquimedianos. Como os objetivos do estudo não estavam relacionados
com o objeto matemático em si, mas com a utilização e interação dos alunos e
professores com a WebQuest, não temos como apontar resultados no que tange
a construção do conhecimento matemático.
Nas pesquisas apresentadas, identificamos que o estudo matemático dos
Sólidos Arquimedianos no Brasil é pouco explorado, talvez pela dificuldade
relacionada a visualização e representação desses sólidos, bem como da
compreensão de noções e propriedades geométricas espaciais.
33
Diante das dificuldades apresentadas a respeito da representação e
visualização de objetos espaciais, procuramos observar como o ensino de Sólidos
Arquimedianos é sugerido pelos documentos oficiais.
1.3 OS POLIEDROS NOS DOCUMENTOS OFICIAIS
Os Documentos Oficiais de Educação em Matemática, seja para o nível
fundamental, seja para o nível médio, destacam a importância do papel da
educação no desenvolvimento das pessoas e da sociedade, além de
estabelecerem diretrizes baseadas em orientações gerais para que sirvam de
apoio ao ato de ensinar.
Todos concordam quanto à importância do ensino de Geometria como
forma de proporcionar o desenvolvimento de um pensamento matemático
específico, baseado na leitura e interpretação do espaço do qual fazemos parte.
O estudo da Geometria cria oportunidade para melhor compreender e representar
os vários tipos de organização desse espaço, isto é, as obras do homem ou da
natureza.
Nesse sentido, Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998, p.122)
afirmam que:
a Geometria desempenha um papel fundamental no currículo, na
medida em que possibilita ao aluno desenvolver um tipo de
pensamento particular para compreender, descrever e representar
de forma organizada, o mundo em que vive. Também é fato que
as questões geométricas costumam despertar o interesse dos
adolescentes e jovens de modo natural e espontâneo. Além disso,
é um campo fértil de situações-problema que favorece o
desenvolvimento da capacidade para argumentar e construir
demonstrações.
A escolha dos conteúdos específicos relativos ao tema Geometria, seu
ensino e recursos, a metodologia utilizada para abordar esse conhecimento, bem
como o espaço para que seu ensino e aprendizagem ocorram, são fatores
importantes apontados e discutidos.
Em geral, os documentos oficiais sinalizam que para a seleção desses
conteúdos, critérios orientadores devem ser estabelecidos como forma de evitar a
quantidade excessiva de informações. A seleção de conteúdos a serem
34
trabalhados em Geometria deve estar relacionada à sua relevância científica e
cultural e sua assimilação é essencial para a produção de novos conhecimentos,
o que permite o desenvolvimento e/ou aprimoramento de competências e
habilidades.
As Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006, p.7), também,
apontam a contextualização e interdisciplinaridade como “princípios condutores
da organização curricular” e, portanto são aspectos que precisam ser
considerados nessa seleção. Tais aspectos devem possibilitar a conexão entre
conceitos matemáticos e entre formas distintas de pensamento matemático, ou
ainda, relevância cultural dentro ou fora da matemática. O estudo dos Sólidos de
Arquimedes, conhecidos também por sólidos semi-regulares, pode se tornar
evidente e justificável segundo esses aspectos, uma vez que estabelecem
conexão com outras áreas do conhecimento (biologia, arte, arquitetura,
cartografia...) e suas representações fazem parte do nosso contexto social e
cultural.
Nesse
sentido,
observamos
as
orientações
sinalizadas
nesses
documentos em respeito ao ensino dos Sólidos de Arquimedes. Embora, esses
sólidos não sejam mencionados, seu ensino está vinculado ao conteúdo
matemático Poliedro.
Os PCN (1998) apontam em quatro blocos - Números e Operações;
Espaço e Forma; Grandezas e Medidas; e Tratamento da Informação - os
conteúdos matemáticos a serem ensinados. Tal documento propõe que o trabalho
com o bloco Espaço e Forma – que aborda conteúdos relativos à Geometria - seja
realizado com a exploração de situações que envolvam construções com régua e
compasso, ao passo que propriedades de figuras planas possam ser aplicadas e
visualizadas, além de construções de demais relações. Em relação aos conceitos
e procedimentos pontuados neste bloco, esse documento destaca a:
[...] classificação de figuras tridimensionais e bidimensionais,
segundo critérios diversos, como: corpos redondos e poliedros;
poliedros regulares e não-regulares; prismas, pirâmides e
outros poliedros; círculos, polígonos e outras figuras; número de
lados dos polígonos; eixos de simetria de um polígono;
paralelismo de lados, medidas de ângulos e de lados. (BRASIL,
1998, p. 73, grifo nosso).
35
Esse mesmo documento aponta a construção de figuras geométricas
espaciais como meio de capacitar o aluno a identificá-las, interpretá-las e
representá-las no plano, bem como classificá-las utilizando noções de
paralelismo, perpendicularismo e de ângulo.
Embora atenção maior seja dada para a Geometria Plana nesse nível de
ensino, a noção de figuras tridimensionais é introduzida. Dentre essas noções,
apontamos Poliedros como conteúdo a ser trabalhado com os alunos. Ainda que
propriedades mais particulares de Poliedros regulares e não-regulares não sejam
evidenciadas, percebemos a preocupação em classificar, desde o nível
fundamental, formas geométricas básicas espaciais a fim de que possam ser
reconhecidas e diferenciadas.
As orientações sinalizadas para a Geometria, em especial Poliedros, que
compõem o Ensino Médio são as mesmas dadas ao Ensino Fundamental.
Entretanto, nesse nível de ensino, essas orientações se intensificam e
desenvolvem de maneira mais ampla as capacidades de abstração e raciocínio.
Pode-se verificar tal afirmação ao observar as orientações dadas pelos PCN+
(2002, p.125, grifo nosso) ao trabalho com Poliedros em Geometria Espacial:
elementos dos poliedros, sua classificação e representação;
sólidos redondos; propriedades relativas à posição: intersecção,
paralelismo e perpendicularismo; inscrição e circunscrição de
sólidos.
• Usar formas geométricas espaciais para representar ou
visualizar partes do mundo real, como peças mecânicas,
embalagens e construções.
• Interpretar e associar objetos sólidos a suas diferentes
representações bidimensionais, como projeções, planificações,
cortes e desenhos.
• Utilizar o conhecimento geométrico para leitura, compreensão e
ação sobre a realidade.
• Compreender o significado de postulados ou axiomas e
teoremas e reconhecer o valor de demonstrações para perceber a
Matemática como ciência com forma específica para validar
resultados.
Nesse sentido, o currículo de Geometria do Ensino Médio, com o intuito
de complementar a formação inicial no Ensino Fundamental, deve garantir que os
alunos estendam e aprofundem alguns conteúdos geométricos já ensinados ou
introduzidos, como no caso de Poliedros.
36
Os Parâmetros Curriculares para o Ensino Médio (2000) enfatizam que o
trabalho com representação de figuras planas e espaciais deve ser também
aprofundado e sistematizado. Essa competência amplia a compreensão e
percepção do espaço e permite estabelecer relações entre suas propriedades
com a geometria plana e sua representação com os objetos que lhe deram
origem. É nesse sentido que
[...] as habilidades de visualização, desenho, argumentação lógica
e de aplicação na busca de soluções para problemas podem ser
desenvolvidas com um trabalho adequado de Geometria, para que
o aluno possa usar as formas e propriedades geométricas na
representação e visualização de partes do mundo que o cerca.
(BRASIL, 2000, p.44).
A visualização, portanto, assume um papel importante na exploração e
construção dos conceitos matemáticos, particularmente da Geometria. A
preocupação com o seu desenvolvimento, bem como a elaboração e
interpretação de suas representações no plano, deve ocupar uma posição de
destaque em todo o processo de ensino e aprendizagem.
Identificando a importância de se desenvolver uma educação visual
adequada, as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006) afirmam que
para trabalhar com poliedros,
existem também programas interessantes. Neles, há poliedros em
movimento, sob diferentes vistas, acompanhados de planificação.
São programas apropriados para o desenvolvimento da
visualização espacial. (BRASIL, 2006, p.89).
A Informática e as ferramentas advindas da computação introduziram
uma dimensão mais dinâmica, em que formas virtuais, além de ganharem
aspectos de uma realidade quase material, podem ser manipuladas e
transformadas de diferentes maneiras.
Como podemos observar, os documentos oficiais sugerem o estudo de
poliedros, mas não detalham os tipos de poliedros a serem ensinados. Sugerem,
também, que seu ensino esteja atrelado a construções de figuras geométricas
planas e espaciais sem, no entanto apontar um caminho. Embora o uso das
tecnologias seja pontuado como recurso didático para ensino e aprendizagem de
poliedros, o que facilitaria a sua construção e visualização, é pouco enfatizado.
37
Como os Sólidos Arquimedianos não são mencionados nesses
documentos, procuramos observar como são discutidos e apresentados em
materiais didáticos, o que mostramos no que segue.
1.4 OS SÓLIDOS ARQUIMEDIANOS EM MATERIAIS DIDÁTICOS
Pretendemos nesse tópico observar, no Brasil, como os Sólidos
Arquimedianos são abordados e como estão organizados em materiais didáticos,
paradidáticos e materiais de apoio ao professor.
Fernandes (2008) em sua dissertação de mestrado realizou esse
levantamento e constatou que o objeto matemático Sólidos Arquimedianos não
aparecia explícito nos materiais pesquisados. Dos nove livros observados, a
autora constatou que esse conteúdo aparecia apenas por meio de exemplos e
exercícios, em geral, relacionados à Relação de Euler e à convexidade, mas sem
qualquer definição ou mesmo nomeação correspondente. O icosaedro truncado é
o sólido arquimediano que mais aparece, provavelmente, por ser associado à bola
de futebol.
Persistindo nessa busca, encontramos um material do GESTAR 3 que
aborda esse conteúdo matemático com definição e exemplos, Caderno de Teoria
e Prática 3: matemática nas formas geométricas e na ecologia. A definição
apresentada dos Sólidos Arquimedianos, conforme mostra a Figura 7, se
confunde com a de poliedros semi-regulares, que em geral são tratados como
sinônimos.
Figura 7. Definição de Sólidos Arquimedianos.
Fonte: Brasil, 2008, p.98.
____________
3
Programa de Gestão Escolar aprovado pelo Ministério da Educação para oferecer formação continuada em
língua portuguesa e matemática aos professores do ensino fundamental (6º ao 9º ano) em exercício nas
escolas públicas. Esse material tem sido usado na formação de professores na Bahia, Tocantins e
Pernambuco e está disponível no site http://portal.mec.gov.br/.
38
Essa definição comunga da mesma idéia de Veloso (1998) que apresenta
os Sólidos Arquimedianos da seguinte maneira:
se na definição que demos de poliedro regular mantivermos a
condição das faces serem polígonos regulares, mas não a de
serem todas congruentes, obtemos uma família mais ampla de
sólidos, estudada por Arquimedes (287 – 212 a. C.). Note-se que
as arestas são todas congruentes, e os vértices também. As faces
são polígonos regulares, mas enquanto nos platônicos eram
apenas de um tipo, aqui poderão ser de vários tipos. É ainda
necessário acrescentar a condição de que todo o vértice pode ser
transformado noutro vértice por uma simetria de poliedro. A estes
sólidos é habitual chamar arquimedianos ou semi-regulares. (Ibid.,
p.235).
No Caderno de Teoria e Prática 3, ainda estão ilustrados três poliedros–
prisma reto triangular, prisma reto hexagonal e octaedro truncado –, como mostra
a Figura 8, apresentados como arquimedianos.
Figura 8. Exemplo de poliedros arquimedianos.
Fonte: Brasil, 2008, p.99.
39
Segundo Veloso (1998, p. 235),
os prismas cujas faces laterais são regulares, de acordo com a
definição dada, são arquimedianos. Do mesmo modo, também os
antiprismas de faces regulares são arquimedianos. No entanto, os
infinitos prismas e antiprismas não são em geral incluídos na
família dos arquimedianos.
De acordo com Eves (2004, p. 358), um antiprisma
é obtido de um prisma efetuando-se uma rotação de sua base
superior em seu próprio plano de modo a fazer seus vértices
corresponderem aos lados da base inferior, e ligando então, em
zigue-zague, os vértices das duas bases.
Os prismas e antiprismas retos de base regular cujas faces laterais são
quadrados e triângulos eqüiláteros respectivamente contemplam a definição dos
Sólidos Arquimedianos, conforme mostra a Figura 9. No entanto, para Veloso
(1998) a família dos arquimedianos é finita, uma vez que temos infinitos prismas e
antiprismas retos de bases regulares, isto é, de vértices do tipo (4,4,n) e (3,3,3,n)
respectivamente, sendo n o número de lados do polígono base. O autor, ainda
assinala que, assim como os platônicos, podemos investigar quantos poliedros
arquimedianos podem existir e chegaríamos à conclusão que não podem existir
mais do que treze tipos de poliedros diferentes.
Figura 9. Prisma e Antiprisma retos regulares.
Além do material anteriormente citado, encontramos também no Brasil,
um livro sobre poliedros produzido por Rangel (1982), Engenheiro Civil e Doutor
em Ciências Físicas e Matemáticas. Segundo o próprio autor, o livro se originou
40
de uma apostila com circulação praticamente restrita, na época, à Escola de
Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O livro Poliedros apresenta um estudo detalhado a respeito dos Sólidos
Arquimedianos
contemplado
com
definição,
classificação,
propriedades,
demonstração e ilustração dos treze sólidos. Para Rangel (1982), todo
arquimediano
é
semi-regular,
mas
nem
todo
poliedro
semi-regular
é
arquimediano. Segundo o autor,
poliedro semi-regular é todo poliedro que se apresenta de uma
das duas seguintes formas:
1. Os ângulos sólidos são todos iguais entre si, mas as faces não
são iguais, embora sejam polígonos regulares. Esses poliedros
são chamados poliedros semi-regulares equiangulares ou
poliedros semi-regulares arquimedianos.
2. As faces são todas iguais entre si, mas os ângulos sólidos não
são iguais. Esses poliedros são chamados poliedros semregulares equifaciais ou poliedros semi-regulares nãoarquimedianos. (Ibid., p.36).
O autor classifica os poliedros semi-regulares equiangulares ou
arquimedianos em três grupos: os poliedros semi-regulares equiangulares
individuais, que são os treze sólidos de Arquimedes; os prismas arquimedianos,
prismas retos regulares; e os antiprismas arquimedianos, antiprismas retos
regulares.
Embora o foco do nosso trabalho não esteja em observar currículos de
outras
áreas
de
conhecimento
para
ratificar
a
presença
dos
Sólidos
Arquimedianos, o material produzido nos dá indícios que esses sólidos, com uma
nomenclatura diferente da habitual, eram estudados na Engenharia.
Pelas observações realizadas, podemos constatar a carência de
informações a respeito do objeto matemático Sólidos Arquimedianos no Brasil. A
dificuldade de encontrar materiais, na Escola Básica, que discorram sobre os
mesmos, pode ser uma possível causa para que muitos desconheçam sua
existência.
Contudo vale ressaltar que nem sempre foi assim. Para confirmar essa
assertiva, apresentamos dois livros de Desenho Geométrico que nos fornecem
informações sobre alguns dos Sólidos Arquimedianos: Primeiras Noções de
Geometria Prática de Olavo Freire, publicado em 1897 e Programa de Desenho
41
para a primeira e segunda séries ginasiais de Benjamin de A. Carvalho, publicado
em 1960.
Para Freire (1897) os Sólidos Arquimedianos são irregulares e simétricos
por terem todos os planos que os formam simetricamente dispostos. O autor
ilustra cinco representações dos treze sólidos arquimedianos, com planificações
de suas superfícies, mostradas na Figura 10, e nos indica o sólido a partir do qual
se originam.
Figura 10. Arquimedianos estudados em Geometria Prática.
Fonte: Freire, 1897, p. 151-155.
Entretanto Carvalho (1960, p.92) define os Sólidos Arquimedianos como
poliedros “semi-regulares que têm suas faces formadas por polígonos regulares
ou não, mas diferentes entre si, embora dispostos simetricamente no espaço”
(CARVALHO, 1960, p.92). A Figura 11 ilustra três exemplos desses sólidos.
Figura 11. Sólidos considerados arquimedianos.
Fonte: Carvalho, 1960, p. 93.
42
Os livros apresentados levam-nos a inferir que esse objeto matemático já
fez parte da grade curricular de Matemática, mais especificamente em Desenho
Geométrico, disciplina que de acordo com Zuin (2002), permaneceu oficialmente
por quarenta anos consecutivos nos currículos escolares – 1931 a 1971.
Para compreender o motivo que levou ao “desaparecimento” desse
conhecimento de ensino, procuramos identificar as possíveis causas do abandono
da disciplina Desenho – Desenho Geométrico e Geometria Descritiva – da grade
curricular de matemática.
1.5 DESENHO GEOMÉTRICO E GEOMETRIA DESCRITIVA
Nesse tópico, nos baseamos nos estudos de Silva (2006) que em sua
dissertação de mestrado “Proposta de Aprendizagem sobre a importância do
Desenho Geométrico e da Geometria Descritiva“ avaliou as razões do declínio do
ensino das duas disciplinas, e em algumas considerações de Zuin (2002), Rabello
(2005) e Pavanello (1993).
Silva (2006) realizou um estudo histórico a respeito da ocorrência do
Desenho Geométrico e da Geometria Descritiva no Brasil, além do estudo da
legislação de ensino a partir de 1942.
De acordo com o autor, a geometria foi implantada no Brasil no século
XVIII, mas é no século XIX que começa a ser ensinada. Nesse século, o Desenho
Geométrico e a Geometria Descritiva são vistos como meios de fomentar e atingir
o desenvolvimento industrial e assim promover o progresso do país. Segundo o
autor, a disciplina Desenho Geométrico constava na grade curricular do Ensino
Primário, cuja geometria estava voltada para prática, conforme já mostrado na
Figura 9, e a disciplina Geometria Descritiva contemplava o currículo do Ensino
Secundário.
Segundo Rabello (2005) no século XX o Desenho Geométrico, a
Geometria Descritiva bem como a Perspectiva, eram assuntos que contemplavam
a prova de desenho no exame de capacitação, atualmente vestibular, de
Arquitetura e Engenharia.
43
Na metade do século XX, novas reformas no Sistema de Ensino
continuavam a serem feitas. Entretanto, para Silva (2006) é impossível precisar o
momento em que o ensino de Desenho declinou. O autor aponta três reformas
que contribuíram para que o Desenho Geométrico e a Geometria Descritiva
fossem pouco a pouco eliminados da grade curricular.
A primeira, Lei 4.024/61 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) – que propôs opções de currículo em que a disciplina Desenho
não era obrigatória. Para Zuin (2002, p.1), “vemos surgir os primeiros sinais de
desprestígio dessa área do conhecimento”.
A segunda, Lei 5.540/68 – Lei da Reforma Universitária – sinalizava a
unificação do vestibular, como podemos observar em seu artigo 21:
O concurso vestibular, referido na letra “a”do artigo 17, abrangerá
os conhecimentos comuns às diversas formas de educação do
segundo grau, sem ultrapassar este nível de complexidade, para
avaliar a formação recebida pelos candidatos e sua aptidão
intelectual para estudos superiores. (BRASIL, 1968).
Silva (2006) pontua que é a partir dessa Lei que o ensino de Desenho
começa a declinar. Com a reformulação do ensino superior, fixada por essa lei, o
Desenho que já não constava em todas as formas de educação do segundo grau,
desde a LDB 4.024/61, foi eliminado do vestibular. “Qualquer discordância em
relação às medidas torna-se impossível, porque estas são introduzidas durante a
vigência do Decreto Lei 477/69”. (PAVANELLO, 1993, p.14).
A terceira e última reforma citada pelo autor, Lei 5692/71, acarretou
consideráveis mudanças nos currículos escolares do Ensino Fundamental.
Havia um núcleo de disciplinas obrigatórias e outros núcleos de
disciplinas optativas, as quais poderiam integrar a parte
diversificada do currículo. As escolas tinham a liberdade de
construir a sua grade curricular apenas dentro da parte
diversificada do currículo. [...] O Desenho tornara-se uma
disciplina optativa da parte diversificada do currículo. (Zuin, 2006,
p.1).
Desse modo, Rabello (2005), Zuin (2002) e Silva (2006) concordam que
com o advento das provas de múltipla escolha, resultado da unificação do
vestibular, e da não obrigatoriedade do ensino de Desenho na Escola Básica,
muitas escolas aboliram o ensino da disciplina Desenho Geométrico.
44
Além disso, Pavanello (1993) e Rabello (2005) pontuam que com a
promulgação da referida lei, o Desenho foi substituído na grade curricular do
ensino público, em todas as séries do 1° e 2° graus do Ensino Básico, por
Educação Artística. Rabello (2005) lembra, ainda, que o Ministério da Educação e
Cultura tornou obrigatória a inserção da disciplina de Educação Artística no
segundo segmento do Ensino Fundamental.
De acordo com os PCN de Artes (1997) a substituição ocorreu porque o
ensino de Desenho Geométrico estava voltado essencialmente para o domínio
técnico, centrado na figura do professor que privilegiava a reprodução de
modelos. Segundo o documento, a disciplina Desenho era considerada mais por
seu aspecto funcional do que uma experiência em arte.
Valorizavam-se principalmente as habilidades manuais, os "dons
artísticos", os hábitos de organização e precisão, mostrando ao
mesmo tempo uma visão utilitarista e imediatista da arte. Os
professores trabalhavam com exercícios e modelos convencionais
selecionados por eles em manuais e livros didáticos. (BRASIL,
1997, p.22).
Em contrapartida Rabello (2005, p. 50) assinala que,
equivalente à educação musical ou às artes cênicas, nessas
séries o desenho é tratado em sua forma mais elementar, sendo
incluído ou excluído conforme as conveniências do momento.
Convém lembrar que o desenho geométrico, a geometria
descritiva e a perspectiva têm base conceitual matemática, não
possuindo, em tese, afinidade estrutural com a área artística,
salvo quanto à beleza das representações gráficas.
Dentro desse contexto concordamos com Pavanello (1993, p.16) quando
afirma que o abandono da Geometria, e assim das disciplinas Desenho
Geométrico e Geometria Descritiva, deve ser caracterizado “como uma decisão
equivalente às medidas governamentais, em seus vários níveis, com relação à
educação”.
A situação exposta leva-nos a inferir que a ausência das Disciplinas
Desenho Geométrico e Geometria Descritiva da grade curricular de matemática
contribuiu para que o objeto matemático Sólidos Arquimedianos não fosse mais
abordado. Sabemos que esses sólidos não são facilmente representados, em
45
ambientes bidimensionais, sem domínio de conhecimentos e habilidades
oferecidos pelo Desenho Geométrico.
Nesse sentido, buscamos um ambiente computacional que se aproxime
da filosofia dessa disciplina, isto é, que favoreça não só a representação e
visualização de objetos tridimensionais como também possibilitem o estudo de
suas propriedades por meio de suas construções.
1.6 GEOMETRIA DINÂMICA E CABRI 3D
Muitas pesquisas em Educação Matemática têm mostrado que o uso da
Geometria Dinâmica como recurso didático não só favorece a exploração e
aquisição de conceitos geométricos, como também apresenta vantagens em
relação às construções com régua e compasso no ambiente papel e lápis.
Para Gravina (2001) a Geometria Dinâmica pode ser entendida como a
implementação da geometria tradicional, aquela estática da régua e compasso, no
computador, mas com caráter dinâmico. Essa característica dinâmica permite que
a partir de uma única construção, um número arbitrário de experimentações seja
efetuado, o que seria praticamente impossível com régua e compasso.
Além disso, a autora afirma que:
os ambientes de Geometria Dinâmica também incentivam o
espírito de investigação Matemática: sua interface interativa,
aberta à exploração e à experimentação, disponibiliza os
experimentos de pensamento. Manipulando diretamente os
objetos na tela do computador, e com realimentação imediata, os
alunos questionam o resultado de suas ações/operações,
conjecturam e testam a validade das conjecturas inicialmente
através dos recursos de natureza empírica. (GRAVINA, 2001, p.
89-90).
O termo Geometria Dinâmica é usado para designar softwares interativos
que permitem a criação e manipulação direta de figuras geométricas a partir de
suas propriedades. Assim, vemos emergir uma maneira de ensinar e aprender
geometria, a partir da exploração experimental que possibilita a passagem de
uma figura à outra pelo deslocamento quase contínuo dos elementos, viável
apenas em ambientes dinâmicos.
46
Para Sangiacomo (1996), a geometria dinâmica permite além de um
melhor estudo das propriedades geométricas uma importante distinção entre
desenhar e construir.
Para a autora, desenhar é visto como um caso particular, uma
representação de um objeto geométrico geralmente relacionado com a
reprodução da imagem mental que temos do mesmo. Contudo, as propriedades
geométricas do objeto não são conservadas quando movimentamos essa
representação em um ambiente dinâmico. Já construir é visto como um caso
geral, uma representação do objeto geométrico a partir de suas propriedades, que
se conservam mesmo quando a movimentamos.
Enquanto os alunos trabalham sobre o traçado material, podemos
dizer que eles não fizeram a passagem do desenho para a figura
geométrica. Essa passagem só é efetivada quando as
propriedades geométricas passam a ter significado e a concepção
de classe de figuras, seus representantes e suas propriedades
seja assimilada. (SANGIACOMO, 1996, p. 40).
Construída uma figura em um ambiente dinâmico, tratamos de investigar
suas propriedades. Para isso arrastamos a figura até deformá-la, dentro das
restrições impostas pela construção. Enquanto fazemos isso, muitas relações e
medidas vão se alterando na figura e isso nos permite reconhecer seus
invariantes bem como a existência de uma classe de figuras representando o
objeto geométrico.
A manipulação direta dos elementos básicos da figura cria um dinamismo
cuja vantagem está em conservar as relações entre seus componentes. Para
Veloso (1998, p. 96), “a procura do que permanece constante no meio de tudo o
que varia”, é a razão pela qual este ambiente é apropriado para apoiar um ensino
renovado da geometria plana.
Assim como a Geometria Plana, a Geometria Espacial pode, também, ser
ensinada em um ambiente de Geometria Dinâmica. O ambiente computacional
Cabri 3D4 é o primeiro software de manipulação direta desenvolvido para simular
o trabalho com três dimensões. Nesse sentido, todo tipo de figura tridimensional
____________
4
O Cabri 3D foi desenvolvido por Cabrilog e apresenta os mesmos princípios e objetivos do
projeto Cabri Géomètre, disponível no site www.cabri.com.
47
pode ser construída, visualizada e manipulada nesse ambiente, que além de
preservar as propriedades de figuras geométricas espaciais, permite mudar o
ponto de vista em relação ao objeto representado.
A seguir, optamos por apresentar, as caixas de ferramentas “poliedros” e
“poliedros regulares”, por estarem relacionadas com o objeto matemático em
questão, bem como os recursos oferecidos pelo software.
Caixa de ferramentas poliedros: qualquer poliedro convexo pode ser
construído ao acionar essa caixa, como mostra a Figura 12.
Figura 12. Caixa de ferramentas poliedros.
Caixa de ferramentas
poliedros regulares: para usar qualquer
ferramenta dessa caixa, como mostra a Figura 13, acionamos primeiro com
o mouse o poliedro regular escolhido. Em seguida, devemos criar no plano
de base um ponto, arrastar o mouse e dar um último clique para finalizar. A
Figura 14 mostra um exemplo de um tetraedro regular obtido a partir da
seqüência acima realizada.
Figura 13. Caixa de ferramentas poliedros regulares
48
Figura 14. Tetraedro regular
Caixa de ferramentas medidas: para usar qualquer ferramenta dessa
caixa, como mostra a Figura 15, devemos acionar a medida desejada e
clicar no objeto já construído no plano de base. A Figura 16 mostra o
comprimento do segmento AB.
Figura 15. Caixa de medidas.
Figura 16. Comprimento do segmento AB.
Ferramenta ponto médio: para obter o ponto médio das arestas de um
poliedro qualquer, como mostra a Figura 17, basta acionar essa ferramenta
e indicar uma aresta qualquer, conforme mostra a Figura 18.
49
Figura 17. Ferramenta ponto médio.
Figura 18. Ponto médio da aresta do prisma.
Ferramenta plano: para obter um plano de secção, acionamos essa
ferramenta, como mostra a Figura 19, e indicamos com o clique do mouse
três pontos distintos, conforme mostra a Figura 20.
Figura 19. Ferramenta plano.
50
Figura 20. Plano de secção.
Ferramenta recorte de poliedro: para utilizar essa ferramenta, como
mostra a Figura 21, devemos criar um poliedro e um plano que o intersecta.
Em seguida, acionamos “recorte de poliedro” e clicamos no poliedro e no
plano. A Figura 22 mostra o procedimento realizado.
Figura 21. Ferramenta recorte de poliedro
Figura 22. Recorte de poliedro.
Ferramenta planificação: para usar essa ferramenta, conforme mostra a
Figura 23, devemos criar um poliedro qualquer, em seguida utilizar a
51
ferramenta “abrir poliedro”, mostrada na Figura 24, para depois obter a
planificação de sua superfície. A figura 25 ilustra o processo para gerar a
planificação do dodecaedro regular.
Figura 23. Ferramenta planificação.
Figura 24. Ferramenta abrir poliedro.
Figura 25. Planificação da superfície do dodecaedro regular.
52
Os principais recursos do Cabri 3D, bem com suas respectivas funções
são mostrados no Quadro 1.
Quadro 1. Recursos do Cabri 3D.
Recurso
Função
Tecla
Escape
Cancela a seleção de objetos
Pressionar a tecla ESC
Apagar
Excluir os conteúdos selecionados
Selecionar o objeto e
pressionar a tecla DELETE
Selecionar a última opção
ao pressionar o botão
direito do mouse em cima
do objeto
Esconder/Mostrar
Esconde ou mostra objetos criados
Atributos
Altera cores, tamanho, estilo de
superfície, espessura dos objetos
criados
Clicar sobre o objeto com o
botão direito do mouse
Ajuda de Ferramentas
Mostra-se uma janela com instruções
de auxílio para cada ferramenta
selecionada
F1
Manter o botão direito do
mouse pressionado sobre
o objeto e arrastá-lo
Mudar de Vista
Altera a posição do objeto sem
deformá-lo
Desfazer
Desfaz uma ação realizada
CTRL + Z
Animação
Anima um ponto sobre o objeto
F10
Revisar a Construção
Mostra todas as ações realizadas para
a construção de um objeto
F11
Rótulo
Nomeia objetos
Clicar no objeto e nomeá-lo
com a ajuda do teclado
Caixa de Texto
Insere uma caixa de texto para
anotações
Menu “documento”: nova
vista texto
Observamos que o Cabri 3D não só possui ferramentas matemáticas que
permitem a construção de poliedros, mas a vantagem de oferecer a manipulação
direta de suas representações sob diferentes pontos de vista, dinamismo que
favorece a visualização de objetos tridimensionais.
Diante do exposto, e por acreditar que o Cabri 3D renova o ensino de
Geometria Espacial com representações dinâmicas, pensamos que seja oportuno
53
fazer uma reflexão acerca da complementaridade existente entre o papel do
Desenho Geométrico, da Geometria Descritiva e da Geometria Dinâmica como
meios de formulação conceitual ampliada.
1.7 OS TRÊS PÓLOS DA COMUNICAÇÃO
Para fazermos essa reflexão recorremos aos três pólos complementares
da comunicação: o oral, o escrito e o virtual. A relação entre esses três pólos é
abordada por Lévy (2002) que discute aspectos ligados a comunicação humana e
seu processo compreensivo.
O autor discorre sob a temporalidade social e os modos de
conhecimentos que surgem do uso das novas tecnologias intelectuais baseadas
na informática, “se alguns tempos sociais e estilos de saber peculiares estão
ligados aos computadores, a impressão, a escrita e os métodos mnemotécnicos
das sociedades orais não foram deixados de lado”. (LÉVY, 2002, p.75). Para o
autor, essas “antigas” tecnologias intelectuais ainda são importantes no
estabelecimento
dos
referenciais
intelectuais
e
espaços-temporais
das
sociedades humanas.
É com esse pensamento que Lévy (2002) analisa as evoluções
contemporâneas sob o império da informática como continuidade de uma história
das tecnologias intelectuais e das formas culturais que a elas estão vinculadas.
Sabe-se que a linguagem é o principal instrumento de memória e de
desenvolvimento de representações. Para o autor, a produção de representações
nas sociedades sem escrita está quase, senão toda, baseada na memória
humana associada ao manejo da linguagem, isto é, contos e narrativas. “Nestas
culturas, qualquer proposição que não seja periodicamente retomada e repetida
em voz alta está condenada a desaparecer”. (Ibid., p.83).
Por esta razão, somado a dificuldade em produzir representações
singulares, uma vez que há distorções entre mensagens originais e as
representações que associamos a elas, a memória humana, para o autor, não
apresenta um desempenho de um equipamento ideal para armazenar e recuperar
informações.
54
Com a escrita, as representações perduram em formatos outros, suas
singularidades passam a ser transmitidas e a durarem de forma autônoma, uma
vez que se torna muito mais cômodo conservá-las. Os contos e narrativas,
característicos das sociedades sem escrita, agora se encontram registrados em
papel.
Para Lévy (2002), a passagem do manuscrito ao impresso transformou
ainda mais a transmissão dos textos, o uso das representações tornou-se mais
intenso e difundido na sociedade. Assim surge outro tipo de memória, uma
memória objetiva, impessoal que traz uma verdade independente dos sujeitos que
a comunicam. “Sem a escrita, não há datas nem arquivos, não há listas de
observações, tabelas de números, estaríamos no eterno retorno e na deriva
insensível da cultura oral”. (Ibid., p. 96).
No entanto para o autor, como a escrita aposta no tempo, o principal
obstáculo da comunicação diferida trazida por essa tecnologia intelectual está
relacionado a distância entre o emissor e o receptor, a impossibilidade de
interação em um mesmo contexto para a construção de uma interpretação
comum. Isso pode tornar a mensagem escrita obscura para o leitor.
O terceiro pólo se inicia com a rede digital, inovação que de acordo com
Lévy (2002) transformou a informática em um meio de criação, comunicação e
simulação. O computador aos poucos vai se transformando em um instrumento
poderoso de visualização, nele a imagem torna-se ponto de apoio de novas
tecnologias intelectuais.
Nesse sentido, a informática nasce não apenas para dar continuidade ao
trabalho de acumulação e de conservação realizado pela escrita, mas a noção de
tempo real, um tempo condensado no presente, na operação em andamento.
Modelos inscritos em papel, agora se encontram também inseridos em programas
de computador, podendo ser explorados de maneira interativa e dinâmica, o que
suscita o conhecimento por simulação.
Para Lévy (2002, p.124),
Enquanto a escrita permite estender as capacidades da memória
a curto prazo [ o que explica sua eficácia como tecnologia
intelectual], a informática da simulação e da visualização, ainda
55
que também estenda a memória de trabalho, funciona mais como
um módulo externo suplementar para a faculdade de imaginar.
A simulação permite desenvolver as habilidades necessárias para a
visualização uma vez que modelos mais complexos podem ser explorados e em
maior número do que se estivesse reduzido aos recursos da oralidade primária e
da escrita. Por essa razão a simulação, de acordo com o ator, remete a um
aumento dos poderes da imaginação e da intuição.
A simulação por computador faz emergir uma nova maneira de
representar objetos geométricos, representações estáticas produzidas em
ambientes de lápis e papel, agora podem se tornar representações dinâmicas,
dotadas de certa autonomia de ação e reação. Para Lévy (2002, p.121), “o
conhecimento por simulação é sem dúvida um dos gêneros de saber que a
informática transporta”.
É esse gênero de saber que aqui recorremos para o ensino e
aprendizagem da Geometria Espacial, em especial dos Sólidos Arquimedianos,
saber que traz a possibilidade de estudar por meio de simulações digitais
fenômenos acessíveis ou não à experiência.
O conhecimento por simulação possibilitou o desenvolvimento de
programas voltados para o ensino, como é o caso do Cabri 3D que diferente da
escrita, pólo característico do Desenho Geométrico, permite que construções de
objetos geométricos espaciais sejam enriquecidas ou modificadas sem que seja
necessário recomeçá-las. Além disso, uma vez realizada uma construção, esta
pode ser manipulada à vontade, com parâmetros de cor, tamanho, textura etc.
Nesse sentido, o Cabri 3D assume um papel complementar em relação
ao Desenho Geométrico estudado em ambiente lápis e papel, pois não institui
uma nova Geometria, apenas traz uma linguagem mais acessível a compreensão
humana de objetos geométricos.
Lévy (2002) elucida bem a idéia de complementaridade entre os pólos da
oralidade primária, da escrita e da informática ao enfatizar que não correspondem
de maneira simples a épocas determinadas, posto que a cada instante e a cada
lugar essas tecnologias intelectuais estão sempre presentes, entretanto com
intensidade variável.
56
As reflexões realizadas até aqui, assim como os tópicos já apresentados
evidenciam a necessidade de buscar contribuições para o ensino do objeto
matemático Sólidos Arquimedianos na Escola Básica, além de formar as bases
para a construção de nossa problemática presente no capítulo a seguir.
57
CAPÍTULO 2 – PROBLEMÁTICA
Nesse
capítulo
apresentamos
nossa
questão
de
pesquisa,
os
procedimentos metodológicos do estudo e o nosso quadro teórico.
2.1 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA
As reflexões pontuadas no capítulo anterior nos permitiram identificar que
os problemas de ensino e aprendizagem de Geometria Espacial têm relação com
aspectos ligados à visualização e interpretação de objetos tridimensionais e suas
representações, por isso a preferência dos autores por métodos didáticos que
privilegiem tais capacidades. Identificamos, também, que embora existam alguns
estudos sobre poliedros, em geral sobre os poliedros convexos regulares devido à
simplicidade de suas formas, os que se dedicam a estudar os Sólidos
Arquimedianos quase inexistem.
Lembramos ainda, que os Sólidos Arquimedianos eram estudados em
Desenho Geométrico, disciplina que dava suporte para que suas propriedades
geométricas fossem exploradas por meio de suas construções. Contudo, com a
substituição de Desenho Geométrico por Educação Artística no currículo, esse
conhecimento de ensino passou a não ser mais abordado.
Cogitamos que a ausência de pesquisas que explorem o objeto
matemático Sólidos Arquimedianos pode também estar associada à carência de
literatura a respeito desses poliedros no Brasil, assim como à dificuldade em
visualizá-los e representá-los.
Em geral, sabemos que há perda de informações quando representamos
objetos tridimensionais no plano, uma vez que representações bidimensionais de
objetos espaciais quase sempre não correspondem à formação de suas imagens
mentais. Há um conflito do que é visto no espaço e o que é representado no
plano.
Acreditamos, que o Cabri 3D pode ser o ambiente que possibilite a
realização de tal estudo, pois não só favorece a representação de figuras
58
espaciais como também permite manipulá-las, o que facilita a exploração, a
elaboração de conjecturas e a validação ou refutação de resultados.
Diante das considerações feitas anteriormente, nosso objetivo principal é
revisitar o objeto matemático Sólidos Arquimedianos por meio de suas
construções no ambiente de Geometria dinâmica Cabri 3D.
Assim, elaboramos a seguinte questão:
O objeto matemático Sólidos Arquimedianos pode ser resgatado
como objeto de ensino para a Escola Básica, utilizando como habitat o
ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D?
A seguir apresentamos a metodologia utilizada para responder nossa
questão de pesquisa e o nosso quadro teórico.
2.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Lakatos e Marconi (2001) assinalam que o contato direto do pesquisador
com tudo aquilo que foi escrito a respeito do assunto, oferece meios, tanto para a
definição e resolução de problemas já conhecidos, quanto à exploração de novas
áreas, isto é, a descoberta de novos fatos ou dados, em qualquer campo do
conhecimento.
Nesse sentido, todo o estudo apresentado no primeiro capítulo está de
acordo com a linha de pensamento dos autores, uma vez que permitiu o contato
com
aspectos
conceituais
a
respeito
do
objeto
matemático
Sólidos
Arquimedianos, conteúdo pouco conhecido pela maioria dos professores
matemáticos que atuam na Educação Básica, bem como evidenciou relações
construtivas do objeto geométrico com régua e compasso e com o auxílio do
Cabri 3D.
É essa descoberta de relações que direciona o caminho de nossa
pesquisa, a possibilidade de resgatar esse conhecimento para a matemática
ensinada com o auxílio da tecnologia implementada no ambiente de geometria
dinâmica Cabri 3D. No entanto para tal sucesso, é inevitável a apropriação do
objeto de estudo, e para isso recorremos a fontes histórias para não só auxiliar a
compreensão dos processos de desenvolvimento desse conhecimento, mas
59
também evidenciar tendências e posturas a serem consideradas no planejamento
de ensino.
Assim, para responder ao problema de pesquisa proposto neste trabalho
recorremos a um estudo bibliográfico desenvolvido com base em material já
elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. De acordo
com Gil (2009, p. 44), embora a pesquisa bibliográfica seja considerada como a
primeira etapa de toda a pesquisa científica, “há pesquisas desenvolvidas
exclusivamente a partir de fontes bibliográficas”.
Para o autor,
a principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de
permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos
muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar
diretamente. Essa vantagem torna-se particularmente importante
quando o problema de pesquisa requer dados muito dispersos
pelo espaço. (GIL, 2009, p.45).
Gil (2009, p. 45), ainda pontua que a pesquisa bibliográfica é
indispensável em estudos históricos, uma vez que “em muitas situações, não há
outra maneira de conhecer os fatos passados se não com base em dados
bibliográficos”, isto é, em dados baseados em fontes primárias.
Diante do exposto e tendo em vista que o estudo dos Sólidos
Arquimedianos no material encontrado é realizado a partir da planificação de suas
superfícies e o que pretendemos é estudá-los por meio de suas construções no
ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D, se faz necessário um estudo
bibliográfico para investigar processos de construção para esses sólidos, bem
como verificar se tais construções podem ser realizadas no ambiente proposto.
2.5 QUADRO TEÓRICO
Neste tópico, são abordadas as teorias que dão suporte a nossa
pesquisa, a Noção de Transposição Didática e a Problemática Ecológica de Yves
Chevallard e a Teoria dos Registros de Representação Semiótica de Raymond
Duval.
60
As teorias de Chevallard mencionadas são importantes na medida em
que nos aproximam do objeto de estudo Sólidos Arquimedianos, pois permitem a
articulação entre a análise epistemológica e a análise didática, além de apontar
características outras que determinam a sobrevivência desse objeto matemático
enquanto objeto de ensino.
Já a noção de registros de representação semiótica instituída por Duval é
importante por considerar os diversos tipos de representação utilizados em
matemática, e dessa forma nos é útil para identificar e analisar quais os registros
mobilizados para a construção dos Sólidos Arquimedianos, bem como evidenciar
os tratamentos e conversões efetuados.
2.5.1 NOÇÃO DE TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA E A PROBLEMÁTICA
ECOLÓGICA
A idéia de transposição didática foi formulada pelo sociólogo Michel
Verret, em 1975. No entanto, foi com o matemático Yves Chevallard, em 1980,
que essa idéia se inseriu em um contexto mais específico, o da Didática da
Matemática.
A noção de transposição didática introduzida por Chevallard (1991)
distingue os diferentes saberes envolvidos no processo de ensino e de
aprendizagem, além de analisar a transformação de um objeto de saber em um
objeto de ensino.
Um conteúdo de saber que é designado como saber a ensinar
sofre então, um conjunto de transformações adaptativas que vão
torná-lo apto a ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O
trabalho que transforma um saber a ensinar em um objeto de
ensino é chamado de transposição didática. (CHEVALLARD,
1991, p.45).
Chevallard (1991) apresenta a transposição didática como um fenômeno
inerente a qualquer processo de ensino. De acordo com o autor, um conceito ao
ser transposto, de um contexto de saber ao outro, passa por modificações. Isso
quer dizer que qualquer conceito matemático ao ser ensinado, ainda que se
aproxime do contexto de saber a partir do qual o originou, adquire outros
significados, próprios do contexto o qual será inserido. Esse processo de
61
transposição vai transformar o saber científico, atribuindo-lhe um novo status
epistemológico: o saber escolar.
Para Pais (2008, p. 16),
o estudo da trajetória percorrida pelo saber escolar permite
visualizar as influências recebidas do saber científico, bem como
de outras fontes. São influências que moldam não só o aspecto
conceitual como também didático, em conseqüência da defesa do
pressuposto que as praxeológicas matemáticas e didáticas são
indissociáveis.
Chevallard (1991) evidencia que a relação entre o saber científico e o
saber escolar é um dos pontos fundamentais em toda a didática. Essa relação
ocorre em um ambiente que configura o contexto escolar, denominado de
Sistema Didático, que está inserido em um ambiente mais amplo, o Sistema de
Ensino. O Sistema de Ensino, por exemplo, seriam os sistemas educacionais que
de certa forma influenciam o universo da sala de aula, isto é, o Sistema Didático.
O Sistema de Ensino, ainda, se encontra inserido em um contexto mais amplo e
complexo, a Sociedade.
O entorno imediato de um sistema didático está constituído
inicialmente pelo sistema de ensino, que reúne o conjunto de
sistemas didáticos e tem ao seu lado um conjunto diversificado de
dispositivos estruturais que permitem o funcionamento didático e
que intervém nos diversos níveis. (CHEVALLARD, 1991, p.27).
Qualquer instituição cuja intenção é didática é considerada por Chevallard
(1996) como um sistema didático. Para o autor, a constituição de tal sistema
pressupõe a existência de pelo menos três termos: professor, aluno e um ou
vários investimentos didáticos, isto é, o próprio saber. A inclusão do saber,
também como elemento fundamental no processo, acaba por indicar duas novas
relações: relação professor-saber e relação aluno-saber.
[...] uma vez que se torna possível falar desse terceiro termo, tão
curiosamente esquecido: o saber, pode formular-se uma pergunta
que concede à polêmica seu verdadeiro interesse: O que é então
aquilo que, no sistema didático, se coloca sob o estandarte de O
Saber? O “saber ensinado” que concretamente encontra o
observador, que relação estabelece com o que se proclama dele
fora desse âmbito? E que relação estabelece então com o “saber
sábio”, o dos matemáticos? Quais distâncias existem entre um e
outro? (CHEVALLARD, 1991, p.15).
62
O autor define três tipos de saberes: Saber Sábio, Saber a Ensinar e
Saber Ensinado. O Saber Sábio é aquele produzido nas universidades ou
institutos de pesquisa, porém não está diretamente associado ao ensino da
Escola Básica. Esse saber, ao ser transposto para o contexto escolar transformase em outro tipo de saber, Saber a Ensinar, adaptado para sua apresentação aos
alunos. O Saber a Ensinar é o saber que aparece nos programas, livros didáticos
e materiais instrucionais, mas isso não garante que ele seja assim apresentado
para os alunos. Nesse sentido, identifica-se uma segunda Transposição Didática
que transforma o Saber a Ensinar em Saber Ensinado.
Cada um desses saberes se refere a sujeitos pertencentes a grupos
sociais diferentes, com interesses distintos e com normas próprias que
influenciam nas modificações do saber ao longo da trajetória epistemológica.
Contudo, existem ainda fatores externos ao Sistema de Ensino, inseridos em um
contexto mais amplo, onde todos os três tipos de saberes coexistem e se
influenciam.
O conjunto das fontes de influências que atuam na seleção dos
conteúdos que deverão compor os programas escolares e
determinam todo o funcionamento do processo didático recebeu
de Chevallard, o nome de noosfera, da qual fazem parte
cientistas, professores, especialistas, políticos, autores de livros e
outros agentes da educação. (PAIS, 2008, p. 16).
É na noosfera que se encontram diretamente ou indiretamente todos
aqueles que ocupam os cargos principais do funcionamento didático e os
representantes da sociedade, a fim de que determinem a forma final do saber a
ensinar, além dos objetivos e dos métodos que conduzem tal prática de ensino.
Nesse sentido, a matemática ensinada deve ser compatível com seu meio social,
em especial, com a esfera de produção da matemática de um lado, e com a
instituição dos pais pelo outro.
Para Chevallard (1991), a Transposição Didática funciona como um
instrumento de análise que evidencia o percurso de um saber, desde sua origem
até a sala de aula. Sendo assim, essa análise pode indicar características que
possibilitam definir a sobrevivência de um saber enquanto um objeto de ensino. A
primeira delas está relacionada ao fato de que o Saber Sábio para se transformar
em Saber a Ensinar deve ser consensual, isto é, não se devem ter dúvidas
63
daquilo que está sendo ensinado. A segunda característica está relacionada à
operacionalidade do Saber a Ensinar, isto é, a possibilidade de que atividades e
tarefas sejam produzidas a partir dele.
Para não se ter dúvida a respeito do objeto matemático Sólidos
Arquimedianos faz-se então necessário investigar e compreender a origem das
idéias que possibilitaram sua descoberta, bem como observar as circunstâncias
em que elas se desenvolveram. Esse estudo histórico pode nos aproximar da
aplicabilidade desse conhecimento e identificar também atividades que podem ser
produzidas a partir dele.
Contudo é ainda necessário que sejam satisfeitas algumas condições
para que um objeto de ensino, ou ainda um Sistema Didático, possa existir ou
continuar existindo. “Ecologicamente, a sua existência apela geralmente a outros
tipos de sistemas didáticos que reunirão, por exemplo, no que diz respeito à
escola primária, o mesmo aluno e o mesmo saber à volta de outros professores”.
(CHEVALLARD, 1996, p. 134-135).
Nesse sentido a existência do objeto matemático Sólidos Arquimedianos
enquanto objeto de ensino sugere a existência de saberes outros presentes ou
não na matemática ensinada. Esse encadeamento de saberes é o que Chevallard
denomina de ecologia didática dos objetos matemáticos.
A problemática ecológica apresentada pelo autor não só amplia o campo
de análise como, também, permite abordar os problemas que se estabelecem
entre os diferentes objetos do saber a ensinar. Segundo Almouloud (2007), os
objetos possuem inter-relações hierárquicas que possibilitam evidenciar e analisar
as estruturas ecológicas dos objetos. Para Artaud (1998) essas inter-relações
entre objetos permitem o controle didático do professor e cognitivo do aluno,
controle sem o qual o contrato de ensino não seria possível.
Essas relações hierárquicas entre objetos são facilmente observadas na
matemática, por exemplo, ao se ensinar o conceito de pirâmide a um aluno,
conceitos como vértice, aresta, face, polígono, ângulo, dentre outros, precisam
ser mobilizados. É nesse sentido que a estrutura ecológica do objeto matemático
pirâmide é evidenciada.
64
Artaud (1998), ainda, afirma que a ecologia didática dos objetos se
apresenta como um meio de questionar o real, “o que existe, e por quê? Mas
também, o que não existe e por quê? Poderia existir? Sobre quais condições?”.
(Ibid., p.1). Para a autora, esse questionamento ecológico tende a aproximar o
pesquisador das dependências dos objetos que ele estuda e afirma que o mesmo
já se fazia presente nos primeiros estudos sobre os processos de transposição.
De acordo com o pensamento da autora é a transposição didática que
permitirá evidenciar quais os saberes envolvidos que determinam a existência do
objeto matemático Sólidos Arquimedianos enquanto objeto de ensino, isto é, sua
ecologia didática.
A ecologia didática se apóia nas idéias da ecologia biológica - nicho,
habitat, ecossistema – para tentar explicar as relações entre os objetos e no
estudo do próprio objeto.
A idéia de ecossistema é utilizada por Chevallard (1991) para indicar um
conjunto de saberes que ali vivem e evidenciar como esses saberes interagem
entre si. A alteração de um único saber pode acarretar modificações em todo o
ecossistema, podendo ocorrer perda do equilíbrio existente. Segundo Almouloud
(2007, p. 114), Chevallard
introduz a noção de habitat de um objeto matemático como sendo
o tipo de instituição onde se encontra o saber relacionado ao
objeto de estudo, que por sua vez determinará a função desse
saber, ou seja, determinará seu nicho.
De acordo com Artaud (1998), um objeto não vive isoladamente, então se
faz necessário identificar, ou até mesmo fazer viver, um complexo de objetos em
torno do próprio objeto. É nesse sentido que a problemática ecológica aparece de
maneira mais explícita, uma vez que convém examinar os diferentes espaços em
que encontramos o objeto matemático e os saberes com os quais ele entra em
associação, em outras palavras, seus habitats.
Nesse sentido para que o ambiente de Geometria dinâmica Cabri 3D seja
um habitat para o estudo dos sólidos de Arquimedes é necessário que reconheça
como objetos todos os saberes que determinam a existência desses sólidos
enquanto objeto de ensino, ou ainda, se necessário, permitir que esses saberes
existam, isto é, fazê-los viver.
65
Chevallard (1996) insere a didática da matemática no campo da
antropologia cognitiva e considera três temas primitivos: os objetos, as pessoas e
as instituições. Para o autor, os objetos ocupam uma posição privilegiada, visto
que são tidos como o material de base da construção teórica considerada.
Qualquer coisa pode ser um objeto e esse existe se alguma pessoa ou instituição
o reconhece e se relaciona com ele.
As pessoas e as instituições também são objetos, mas de um tipo
particular. Por exemplo, as instituições são caracterizadas “por qualquer coisa que
se produza, se utiliza e se ensina” (ALMOULOUD, 2007, p. 113) e as pessoas são
os sujeitos das instituições.
Dessa forma, em nosso trabalho os objetos que ocupam posição
privilegiada são os Sólidos Arquimedianos, a instituição escolhida para o ensino é
o Cabri 3D e o sujeito da instituição é a pesquisadora. Assim, com base na teoria
de Chevallard procuramos evidenciar quais saberes determinam a existência dos
Sólidos Arquimedianos enquanto objeto de ensino, bem como se tais saberes
estão presentes ou são reconhecidos pela instituição Cabri 3D.
Para identificar quais registros são mobilizados para a construção dos
sólidos arquimedianos, bem como suas articulações nos apoiamos na noção de
registro de representação semiótica de Duval.
2.5.2 REGISTRO DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA
Duval (2002) assinala que as mudanças que a Educação Matemática vem
sofrendo nos últimos cinqüenta anos têm como base pesquisas relacionadas à
psicologia, tecnologias e as novas exigências de avaliação. Entretanto, essas
mudanças têm se efetivado mais no currículo da matemática e em seu ensino, do
que na compreensão do processo de sua aprendizagem.
Para entender as dificuldades que muitos alunos têm na compreensão da
matemática, a natureza dessas dificuldades, bem como onde elas se encontram,
Duval (2008) afirma que não podemos buscar essa compreensão apenas no
campo matemático. Aponta a necessidade de estabelecer uma estrutura
epistemológica específica para a atividade matemática e de entender que as
funções cognitivas do pensamento que a envolvem não podem ser dissociadas.
66
De acordo com Duval (2008), uma abordagem cognitiva é necessária,
pois o propósito de se ensinar matemática, em formação inicial não é formar
futuros matemáticos e muito menos apresentar instrumentos que só terão, talvez,
utilidade mais tarde, mas sim um propósito de contribuição e fomentação para o
desenvolvimento de suas capacidades de raciocínio, análise e visualização.
Nesse sentido, é necessário ir além dos estudos locais do conceito, que são
desenvolvidos em cada nível do currículo, bem como da mera referência às
teorias muito gerais da aprendizagem.
Segundo Duval (2008, p. 12),
a originalidade de uma abordagem cognitiva está em procurar
inicialmente descrever o funcionamento cognitivo que possibilite a
um aluno compreender, efetuar e controlar ele próprio a
diversidade dos processos matemáticos que lhes são propostos
em situação de ensino.
Analisar o conhecimento matemático de um ponto de vista de
aprendizagem e compreender as principais dificuldades que os estudantes
apresentam, em cada nível do currículo, que os impedem de irem mais além, não
é uma tarefa fácil. Nesse sentido, o que é relevante ser analisado a fim de
evidenciar condições de aprendizagem em matemática?
O autor destaca que a complexidade do funcionamento cognitivo é
subjacente às atividades matemáticas mais simples ou mais elementares, pois “a
diferença entre a atividade requerida pela matemática e aquela requerida em
outros domínios de conhecimento não deve ser procurada nos conceitos”
(DUVAL, 2008, p.13), mas sim na importância da visualização e na grande
variedade de representações utilizadas em matemática. A representação e a
visualização estão no núcleo de sua compreensão e o papel de ambas é
fundamental no pensar e aprender matemática.
A representação refere-se a uma escala grande de atividades do
significado: opinião constante e holística sobre algo, várias
maneiras de evocar e denotar objetos, como a informação é
codificada. No contrário, a visualização parece enfatizar imagens
e a intuição empírica de objetos e de ações físicas. (DUVAL,
2002, p.1, tradução nossa).
67
Dentro desse contexto, nos limitamos a esboçar a complexa arquitetura
cognitiva desenvolvida por Duval a respeito do uso das representações em
matemática, a visualização será explorada em trabalhos futuros.
Noções de Registros de Representação Semiótica
Para qualificar os diversos tipos de representação utilizados em
matemática a noção de registro de representação semiótica é instituída por Duval
(2008). Entretanto, antes de definirmos registro de representação semiótica, nos
cabe aqui outra discussão importante e fundamental para melhor compreensão
dessa noção. O que é Semiótica? O que é Representação Semiótica?
De acordo com Santaella (2006) o nome semiótica vem da raiz grega
semeion, que quer dizer signo. Semiótica quer dizer ciência dos signos, mas
signo como linguagem.
A semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas
as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame
dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como
fenômeno de produção de significação e de sentido (SANTAELLA,
2006, p.13).
Segundo a autora, a confusão se estabelece quando entendemos
linguagem como sinônimo de língua. Nesse sentido, alerta para uma distinção
necessária. O século XX testemunhou o crescimento de duas ciências da
linguagem, a Lingüística, ciência da linguagem verbal, e a Semiótica, ciência de
toda e qualquer linguagem. Destaca, ainda, que para desatarmos o nó que essa
confusão traz é necessária a discriminação entre linguagens verbais e não
verbais.
Para Santaella (2006) o uso da língua que falamos e que fazemos uso
para escrever - isto é, na sua manifestação como linguagem verbal (oral ou
escrita) - é tão natural e evidente que tendemos a não perceber que esta não é a
única forma de linguagem que somos capazes de ver, ouvir e ler. Existe uma
variedade de outras linguagens, não-verbais, que se constituem ou vem se
constituindo em sistemas de produção de significação e de sentido. Dessa
maneira, o termo linguagem se refere a todo e qualquer sistema de signos
68
humanos ou aparentemente inumanos, como as linguagens binárias, linguagem
dos ruídos, a linguagem do silêncio etc.
A partir da definição de semiótica apresentada pode-se entender
representação semiótica como:
uma representação construída a partir da mobilização de um
sistema de sinais. Sua significação é determinada, de um lado,
pela sua forma no sistema semiótico e de outro lado, pela
referência ao objeto representado. (HENRIQUES, 2006, p.17).
Para Duval (2002) existem dois tipos de representações cognitivas: as
representações
semióticas
e
as
representações
físico-orgânicas.
As
representações semióticas são produzidas intencionalmente com o uso de
sistemas semióticos (sentenças, gráficos, diagramas, desenhos...) cuja produção
pode ser interna (mental) ou externa. As representações físico-orgânicas são
casualmente produzidas, isto é, por um sistema orgânico (imagens visuais do
sonho ou da memória) ou por um dispositivo físico (reflexões, fotografias...). No
primeiro caso, o índice das representações que denota o objeto representado é
uma seleção explícita porque cada unidade significativa resulta de uma escolha.
No outro caso, o índice das representações é o resultado de uma ação física do
objeto representado em algum sistema orgânico ou em algum dispositivo físico.
Para o autor, o uso de representações semióticas para o pensamento
matemático é essencial, pois, ao contrário de outros campos do conhecimento
(botânica, geologia, astronomia, física...), não há nenhuma outra maneira de ter
acesso aos objetos matemáticos a não ser por meio delas. Nos outros campos do
conhecimento, as representações semióticas são imagens ou descrições sobre
alguns fenômenos do mundo externo real que podemos ter acesso perceptual e
instrumental sem recorrer a estas representações. Na matemática isso não é
possível.
Duval (1995) pontua que a distinção entre um objeto e sua representação
é de fundamental importância para a compreensão da matemática visto que sem
essa distinção haverá perda de compreensão, o que torna os conhecimentos
adquiridos inutilizáveis no seu contexto de aprendizagem. A linguagem natural,
uma figura geométrica, a linguagem da escrita dos números, uma fórmula
algébrica, uma representação gráfica, uma representação decimal, uma
69
representação fracionária, são exemplos de representações semióticas que
revelam sistemas semióticos diferentes.
Segundo Duval (1995), alguns sistemas semióticos diferem de outros
sistemas, também semióticos, (por exemplo, código de Morse) por permitirem o
cumprimento de três funções cognitivas: comunicação, produção do sujeito para
os outros; objetivação, produções do sujeito para si; tratamento, produções do
sujeito para si e para os outros. Para o autor, são essas as funções que permitem
desenvolver um nível de funcionamento consciente em relação ao fenômeno
observado.
Dessa forma, Duval (1999 apud ALMOULOUD, 2007, p. 80) define um
registro de representação semiótica como:
um sistema semiótico que tem as funções cognitivas fundamentais
no funcionamento cognitivo consciente, ou seja, sendo uma
maneira típica de representar um objeto matemático, ou um
problema, ou uma técnica.
Para tanto, todos os sistemas semióticos que permitem realizar as três
funções cognitivas são considerados por Duval (1995) como Registros de
Representação Semiótica. Os registros matemáticos mais destacados pelo autor
são: língua natural, numérico, figural, algébrico e gráfico.
Para Almouloud (2007) a noção de registro facilita o processo de ensino e
de aprendizagem na medida em que concede meios ao professor para tornar
mais acessível a compreensão de conteúdos matemáticos. Todavia, para que a
compreensão matemática aconteça, faz-se necessário a realização de atividades
que mobilizem simultaneamente dois registros (no mínimo) de representação ou
ainda, a possibilidade de mudar a todo o momento de registro de representação.
De acordo com Duval (2002), cada registro de representação semiótica
tem uma maneira específica de trabalhar. Nesse sentido, para analisar a
matemática em uma perspectiva de ensino e aprendizagem, é necessário
distinguir dois tipos de transformações semióticas:
Os tratamentos: são transformações de uma dada representação no
mesmo registro onde foi formada. O tratamento possibilita a geração
de uma nova representação a partir de uma representação já dada
70
ou explorada. Por exemplo, as figuras geométricas dão também
ascensão às transformações intrínsecas na forma de configurações
a partir de considerações prévias de propriedades matemáticas.
Nesse caso, essas transformações são como as transformações
visuais. Outro exemplo é resolver uma equação ou efetuar um
cálculo ficando no mesmo sistema de escrita.
As conversões: são transformações de uma dada representação em
uma representação em outro registro, conservando os mesmos
objetos indicados. Por exemplo, passar da escrita dos números
fracionários
para
a
escrita
dos
números
decimais
ou
a
transformação de equações em gráficos cartesianos.
Duval (1995) sinaliza dois tipos de tratamento: os tratamentos
algoritmizáveis e os não algoritmizáveis, conforme mostra a Figura 26. Os
tratamentos algoritmizáveis por seguirem uma seqüência de instruções bem
definida, são encontrados nos registros algébrico, numérico e gráfico. Já os
tratamentos não algoritmizáveis, por não seguirem uma seqüência de instruções,
são encontrados nos registros de língua natural e figural.
Tratamento algoritmizável
Tratamento não algoritmizável
6 x (9 + 3 x 2) / (2 x 4 – 11)
6 x (9 + 6) / (8 – 11)
6 x 15 / (- 3)
90 / (- 3)
- 30
Figura 26. Diferentes tratamentos.
Com o surgimento da Geometria Dinâmica e com base no registro figural
instituído por Duval (1995), Salazar (2009) em sua tese de doutorado considerou
o registro figural dinâmico5. No trabalho, também consideramos esse registro, pois
____________
5
O termo registro figural dinâmico foi introduzido por Salazar (2009) para designar o registro
figural utilizado em ambientes de Geometria Dinâmica.
71
além dos Sólidos Arquimedianos serem construídos no ambiente de Geometria
Dinâmica Cabri 3D, acreditamos que o registro figural dinâmico permite melhor
evidenciar os tratamentos especificamente figurais que dão as figuras um papel
heurístico6 e explicar a variabilidade desse papel de uma situação à outra. No
entanto, assim como o registro figural, o registro figural dinâmico não preenche
nenhuma função discursiva7.
A respeito das conversões, Duval (1995) pontua que podem ser
realizadas entre registros que não envolvem a língua natural (símbolos, gráficos e
equações) e com registros que a envolvem (gráficos e textos, compreensão de
um enunciado, língua formal e língua natural). A Figura 27 traz exemplos de
conversões que envolvem o registro figural e um registro discursivo, registros
requeridos em qualquer atividade geométrica.
Conversão que envolve a língua natural
Conversão que não envolvem a língua
natural
Rotação de uma pirâmide em torno de um eixo
r // s
segundo um ângulo de cento e oitenta graus.
r
s
Figura 27. Diferentes conversões.
____________
6
Possibilidade de descobrir, por meio da manipulação da figura, propriedades geométricas, bem
como outros elementos.
7
A função discursiva está aqui relacionada a todas as maneiras de registrar observações a partir
dos tratamentos realizados no registro figural. Estas podem ser registradas por meio dos registros
língua natural, simbólico e algébrico.
72
Segundo Duval (2008) a escolha de um registro de representação
adequado bem como as diferentes representações de um mesmo objeto
matemático dentro de um mesmo registro (tratamento) não é suficiente para que a
compreensão matemática se estabeleça. Para que ocorra tal aprendizado, faz-se
necessário a articulação de no mínimo dois registros de representação. No
entanto,
Se muitos estudantes podem aprender algum tratamento, poucos
deles podem realmente converter representações. [...] Em geral,
os professores dão mais importância aos processos matemáticos
do que a sua aplicação aos problemas da vida diária, ou
problemas econômicos e físicos. (DUVAL, 2002, p. 5, tradução
nossa).
Duval (2008) aponta a conversão de representações como um problema
crucial na aprendizagem da matemática e a observa por dois pontos de vista: o
matemático e o cognitivo.
Do ponto de vista matemático, a conversão, não chama atenção por que
“não tem nenhum papel intrínseco nos processos de justificação ou de prova, pois
eles se fazem baseados em um tratamento efetuado em um registro determinado,
necessariamente discursivo”. (DUVAL, 2008, p.16). Nesse sentido, essa atividade
ocorre, apenas, na escolha de registros em que os tratamentos realizados serão
mais econômicos ou na obtenção de um segundo registro que sirva de apoio aos
tratamentos que se realizam em outro registro.
Do ponto de vista cognitivo,
é a atividade de conversão que, ao contrário, aparece como a
atividade de transformação representacional fundamental, aquela
que conduz aos mecanismos subjacentes à compreensão.
(DUVAL, 2008, p. 16).
Segundo Duval (2002) o que determina o caráter natural ou arbitrário de
uma atividade de conversão é a congruência ou a não-congruência entre
registros. Explica congruência como uma representação de partida ser mais ou
menos “transparente” a uma representação de chegada. A congruência ou nãocongruência de toda conversão dependem de seu sentido. Uma conversão pode
ser congruente em um sentido e não-congruente no sentido oposto.
73
Por exemplo, a expressão “XY ≥ 0” e a representação gráfica
cartesiana de dois quadrantes determinados respectivamente
pelos semi-eixos Y e X positivos, X e Y negativos, são
congruentes se passamos do registro algébrico para o registro
gráfico, no entanto não são no sentido inverso. (DUVAL, 1995,
p.19).
Os contrastes causados pela não congruência podem ser observados em
uma maneira sistemática em todos os estágios do currículo, dos problemas
verbais mais elementares na escola preliminar ao nível da universidade. Segundo
Duval (2002), a maioria dos professores, matemáticos e mesmo psicólogos dão
pouca atenção à diferença da natureza entre o tratamento e a conversão, pois
quando uma mudança de registro é introduzida na aprendizagem escolhe-se
geralmente um sentido e os casos que são congruentes.
Há algo como, instinto, evitar as situações de não-congruência
que conduzem às dificuldades reais. Mas é impossível evitar
especialmente quando a transferência do conhecimento é
requerida. Então as falhas são explicadas como engano
conceitual, o que é uma explicação inadequada, desde que nós
temos um contraste dos sucessos e das falhas para os mesmos
objetos matemáticos em situações muito similares. Na realidade o
fato que os estudantes não reconhecem mais, quando o sentido
da conversão é mudado, revela uma falta da coordenação entre
os registros. A coordenação entre registros não é uma
conseqüência para compreender a matemática, ao contrário, é
uma condição essencial. (Duval, 2002, p.6, tradução nossa).
Para a análise de uma situação em termos de registros de representação
semiótica, Duval (1995) explica a necessidade de determinar o funcionamento de
representação próprio de um registro, bem como as unidades significantes de
uma representação desse registro.
Para determinar essas unidades, Almouloud (2007) pontua que
precisamos considerar todas as variáveis possíveis de representação. Dessa
forma, destaca dois tipos de variações que devem ser diferenciados: variações
estruturais e as variações cognitivas. As variações estruturais transformam uma
dada representação em outra identificável no mesmo registro e as variações
cognitivas, consideradas também variáveis estruturais, preservam a referência, ou
parte dela, ao objeto representado. Ainda afirma que, as unidades significantes de
uma representação só podem ser identificadas por meio das variações cognitivas.
74
Nesse sentido, é preciso se deter no que realmente interessa quando se
analisa a aprendizagem sob o ponto de vista cognitivo. Duval (1995) salienta que
a conversão é o instrumento que determina o funcionamento da representação
próprio em um registro, pois distingue as variações unicamente estruturais das
variações cognitivas propriamente ditas.
Duval (2008) ressalta que não se deve entender a conversão como uma
operação simples e local, ou ainda reduzi-la a uma “codificação”. A passagem de
um sistema de equações a sua representação gráfica poderia ser feita aplicando
a regra em que um ponto é associado a um par ordenado sobre um sistema de
coordenadas. Esse é um exemplo elementar que Duval (2008) apresenta ao
reduzir a atividade de conversão a uma simples codificação. Ao efetuar essa
conversão, devem-se considerar as variáveis próprias dos gráficos (inclinação,
intersecção com os eixos etc.) e das equações (coeficientes positivos ou
negativos, raízes etc.). Ainda, segundo Duval (2008), essa regra não possibilita
uma apreensão global e qualitativa, indispensável para a determinação das
variáveis cognitivas, que permitem identificar as unidades pertinentes próprias de
cada um dos dois registros.
Para Henriques (2007, p.19) existe, além da codificação, outra atividade
bem próxima à conversão: a interpretação. Essas duas atividades, conversão e
interpretação não devem ser jamais confundidas, pois “a interpretação requer
uma mudança de quadro ou de contexto”.
Almouloud (2007) salienta que a noção de quadro desenvolvida por
Régine Douady, ainda que considere os registros de representação, fundamentase nas diferentes abordagens e nos diferentes domínios matemáticos e não a
sistemas semióticos.
Segundo Duval (1999 apud ALMOULOUD, 2007) a mudança de quadro é
uma atividade que precisa ser pensada e sugerida pelo professor, o que não
garante a percepção de mudança por parte do aluno. Já para que ocorra a
mudança de registro é necessária a compreensão, do aluno, de conceitos e
propriedades matemáticas envolvidas para que tal conversão seja efetuada.
O ponto chave da teoria de Duval (1995) está na distinção entre um
objeto e sua representação e na compreensão da matemática como uma
75
atividade que mobiliza inevitavelmente uma variedade de registros de
representação semiótica. Duval (2008) prioriza o estudo da conversão e não o
estudo do tratamento visto que é por meio da atividade de conversão que se
evidenciam as variáveis cognitivas próprias ao funcionamento de cada registro e
se exploram as variações de congruência e não-congruência que podem surgir
entre registros nas diversas representações dos objetos matemáticos.
Para Duval (1995) a articulação e/ou a coordenação entre diferentes
registros de representação é condição necessária para a compreensão
matemática, ainda que diversas abordagens didáticas não a considerem. Estas
conexões entre registros compõem a arquitetura cognitiva, na qual estudantes
podem reconhecer o mesmo objeto por meio de diferentes representações, bem
como fazer conexões objetivas entre a matemática empírica e a dedutiva.
A aprendizagem da matemática, em especial da geometria, implica na
construção desta arquitetura cognitiva. Tem início com a coordenação de um
registro que fornece a visualização, registro figural, e de outro registro para
executar as funções discursivas. Dessa maneira os alunos desenvolvem
consideravelmente suas capacidades de utilizar os conhecimentos já adquiridos e
suas possibilidades de adquirir novos conhecimentos matemáticos.
Diante do exposto, para identificar quais os registros de representação
semiótica que articulados possibilitam a construção dos Sólidos Arquimedianos, e
se essa articulação promove conversões congruentes ou não, é necessário partir
para o estudo do objeto matemático. Como os Sólidos Arquimedianos não estão
presentes na matemática ensinada e quase inexistem trabalhos a respeito deles,
julgamos necessária a apropriação desse objeto matemático via estudo histórico,
contemplado no próximo capítulo.
76
CAPÍTULO 3 – ESTUDO HISTÓRICO
Neste capítulo, destacamos aspectos históricos relacionados ao tema
Sólidos Arquimedianos, importantes para a construção do conhecimento
proposto. Para compreender o desenvolvimento desses sólidos, realizamos uma
breve discussão acerca dos poliedros platônicos para em seguida apresentarmos
o primeiro estudo matemático dos Sólidos de Arquimedes, bem como sua
sistematização.
3.1 POLIEDROS REGULARES
Segundo Soler (2007) não se sabe com exatidão em que época o cubo, o
tetraedro regular, o octaedro regular, o dodecaedro regular e o icosaedro regular,
tornaram-se conhecidos. Contudo, a autora assinala que há investigações que
sugerem o conhecimento desses cinco sólidos pelos pitagóricos, e outras que
indicam que os pitagóricos conheciam apenas a construção de três deles –
tetraedro, cubo e dodecaedro – e que se deve a Teeteto8 um estudo teórico dos
cinco poliedros regulares, em particular do octaedro e do icosaedro.
De acordo com Eves (1992), a teoria geral a respeito dos cinco sólidos
formulada por Teeteto foi descrita por volta de 380 a.C. Tal teoria, observada no
livro XIII de “Os Elementos” de Euclides, apresenta a construção geométrica
sobre os cinco corpos e demonstra que não podem existir outros.
Em “Os Elementos”, os sólidos regulares são tratados nos livros XI, XII e
XIII. Mas é no livro XIII, a partir da proposição 139, que Euclides estuda
sistematicamente esses cinco sólidos. As proposições 13, 14, 15, 16 e 17
apresentam
as construções do
tetraedro,
octaedro,
cubo, icosaedro e
dodecaedro, respectivamente. A proposição 18, “expor os lados das cinco figuras
e compará-las entre si”. (EUCLIDES, 2009, p. 589), institui as relações entre as
arestas desses sólidos e o diâmetro da superfície esférica. É a partir dessa
proposição que Euclides (2009, p. 592) afirma e demonstra “que exceto as cinco
____________
8
Segundo Veloso (1998), um dos matemáticos gregos mais importantes da época de Platão,
ensinou na Academia fundada por este em Atenas em 385 a.C.
9
“Construir uma pirâmide e contê-la pela esfera e provar que o diâmetro da esfera é, em potência,
uma vez e meia o lado da pirâmide” (EUCLIDES, 2009, p. 577).
78
ditas figuras não será construída outra figura, contida por eqüiláteras e também
eqüiângulas iguais entre si”.
Sigamos sua demonstração.
Pois, um ângulo sólido não é construído, certamente, por dois
triângulos [eqüiláteros] ou, em geral, planos. Mas por três
triângulos, o da pirâmide, e por quatro, o do octaedro, e por cinco,
o do icosaedro; mas por seis triângulos tanto, eqüiláteros quanto
eqüiângulos, construídos junto a um ponto, não existirá um ângulo
sólido; pois, sendo o ângulo [sólido] de um triângulo eqüilátero
dois terços de um reto, os seis serão iguais a quatro retos; o que é
impossível; pois todo ângulo sólido é contido por um menor do
que quatro retos. Pelas mesmas coisas, então, nem um ângulo
sólido é construído por mais do que seis ângulos planos[medindo
cada um dois terços do ângulo reto]. Mas o ângulo do cubo é
contido por três quadrados; e por quatro é impossível; pois sendo
o ângulo [interno] do pentágono eqüilátero um reto e um quinto, os
quatro ângulos serão maiores do que quatro retos. Mas por
pentágonos eqüiláteros e eqüiângulos, certamente por três, o do
dodecaedro; e por quatro, é impossível. Nem, por certo, por outras
figuras poligonais [regulares] será contido um ângulo sólido, pelo
mesmo absurdo.
Portanto, exceto as figuras ditas, uma outra figura sólida não será
construída, contida por eqüiláteras e também eqüiângulas; o que
era preciso provar. (Ibid., p. 592).
Vale ressaltar que ao mencionar “triângulo”, Euclides quer dizer triângulo
eqüilátero, já que sempre se refere a polígonos regulares. De acordo com Veloso
(1998), o fato de Euclides terminar Os Elementos com a proposição 18, conduz
alguns autores a acreditarem que o propósito principal da obra é demonstrar a
existência de somente cinco sólidos regulares. Essa demonstração considera
todas as possibilidades de união de polígonos regulares e para isso se baseia nas
seguintes observações:
Para que se forme um ângulo sólido, a soma dos ângulos planos
que concorrem em um vértice tem que ser menor que 360°.
Em cada vértice do ângulo sólido devem concorrer no mínimo três
faces.
À medida que aumenta o número de lados de um polígono regular a
medida do ângulo sólido aumenta.
Dessa forma conclui-se que não podemos construir sólidos regulares,
concorrendo em cada vértice: seis ou mais triângulos, mais de três quadrados,
mais de três pentágonos, três ou mais hexágonos, e assim sucessivamente.
79
Nos Quadros 2, 3 e 4 relacionamos os números possíveis de triângulos
eqüiláteros, quadrados e pentágonos regulares, respectivamente, que podem
concorrer em um vértice.
Quadro 2. Números de triângulos eqüiláteros que podem concorrer em um vértice.
Número de
triângulos
eqüiláteros
Soma dos ângulos
planos que
concorrem em um
vértice
Poliedro
3
< 360°
Tetraedro
4
< 360°
Octaedro
5
< 360°
Icosaedro
6
= 360°
?
7
> 360°
?
Quadro 3. Números de quadrados que podem concorrer em um vértice.
Soma dos ângulos
planos que
concorrem em um
vértice
Poliedro
3
< 360°
cubo
4
= 360°
?
5
> 360°
?
Número de
quadrados
Quadro 4. Números de pentágonos regulares que podem concorrer em um vértice.
Número de
Soma dos ângulos
pentágonos
planos que
regulares
concorrem em um
Poliedro
vértice
3
< 360°
dodecaedro
4
> 360°
?
Os cinco sólidos regulares, mostrados na Figura 28, receberam a
denominação de sólidos platônicos, pois Platão (427-347 a.C.) os cita em Timeu,
diálogo em que apresenta reflexões a respeito da origem do universo e do
homem. De acordo com Eves (2004), nessa mesma obra, Platão descreve os
80
cinco corpos e mostra como modelos desses sólidos podem ser construídos a
partir de triângulos, quadrados e pentágonos.
Figura 28. Sólidos de Platão.
Fonte: Cromwell, 2008, p. 57
Platão, também, associa os quatro sólidos mais fáceis de construir tetraedro, cubo, octaedro e icosaedro – aos quatro elementos primordiais da
natureza – fogo, terra, ar e água, respectivamente. Segundo Soler (2007), a terra,
forma mais sólida e menos móvel, corresponde ao cubo; o fogo, mais agudo e
mais móvel, o tetraedro; o ar foi relacionado ao octaedro por rodopiar facilmente,
o que lembra a instabilidade do ar; e a água ao icosaedro, por apresentar maior
volume. Mas existe, um quinto elemento, o dodecaedro, que de acordo com Eves
(2004), é associado com o Universo ou ao cosmos, por ter dez faces e ao
zodíaco, por ter doze secções.
Em respeito às considerações atuais sobre os cinco sólidos platônicos, de
acordo com Eves (1992), elas tendem a ser topológicas. Para o autor isso pode
ser observado em uma definição moderna em que
um sólido [platônico] é um poliedro convexo regular se todas as
suas faces são polígonos regulares congruentes entre si, se seus
vértices são convexos e se em cada vértice incide o mesmo
número de faces. (Ibid., p. 59).
A regularidade de poliedros convexos, também, pode surgir por analogia
à regularidade de polígonos convexos, como explica Soler (2007, p. 46):
um polígono [convexo] regular tem lados e ângulos iguais; como
os lados do polígono se correspondem com as faces dos poliedros
e os vértices com os vértices, a idéia de poliedro [convexo] regular
que pode desprender-se por analogia é a de um poliedro que tem
as faces iguais e regulares e também ângulos iguais que formam
as faces nos vértices.
81
No Quadro 5 apresentamos algumas características a respeito de cada
poliedro de Platão. A última coluna mostra quantas arestas partem de cada
vértice do poliedro regular, bem como o tipo de polígono que corresponde suas
faces. Por exemplo, a configuração do vértice (3.3.3) nos indica que de cada
vértice do tetraedro regular partem três arestas e que o mesmo está rodeado por
três triângulos eqüiláteros.
Quadro 5. Características Poliedros de Platão.
Vértices por
Faces por
Configuração dos
faces
vértices
vértices
Poliedros
Faces
Arestas
Vértices
Tetraedro
4
6
4
3
3
3.3.3
Cubo
6
12
8
4
3
4.4.4
Octaedro
8
12
6
3
4
3.3.3.3
Dodecaedro
12
30
20
5
3
5.5.5
Icosaedro
20
30
12
3
5
3.3.3.3
O estudo dos poliedros convexos regulares se faz necessário para
entendermos outra classe de poliedros com algumas características em comum,
os poliedros arquimedianos que são estudados a seguir.
3.2 O DESENVOLVIMENTO DOS SÓLIDOS DE ARQUIMEDES
Alguns temas em geometria ficam adormecidos durante anos, ou séculos,
para depois tornarem a despertar o interesse de alguns estudiosos, que retomam
a sua exploração e descobrem novos caminhos de estudo. Um desses temas é o
estudo dos Sólidos de Arquimedes (287 a.C -212 a.C.).
De acordo com Eves (2004), os trabalhos originais de Arquimedes que
tratam de sólidos estão perdidos, assim como grande parte das obras dos
matemáticos gregos. Seus trabalhos são conhecidos, principalmente, pelas
escritas de comentadores. Pappus de Alexandria (290 – 350 d.C.), um
82
comentador do início do quarto século, fornece-nos informações, a respeito
desses sólidos, em sua extensa obra denominada: “Coleção Matemática”, que
reúne uma lista eclética de obras antigas, algumas atualmente perdidas.
A Coleção Matemática de Pappus é composta por oito livros, ou capítulos,
cada um existindo como obra única. De acordo com Cromwell (2008), é um
manual para os clássicos, uma consideração sistemática das obras mais
importantes da matemática grega e inclui comentários e descrições históricas de
muitos trabalhos.
É apenas no quinto livro da obra que Pappus atribui a Arquimedes a
descoberta dos treze sólidos.
Embora muitos sólidos possam ser concebidos tendo todos os
tipos de faces, aqueles que parecem ser formados regularmente
são mais merecedores de atenção. Estes incluem não apenas os
cinco sólidos encontrados por Platão [...] mas também os sólidos,
em número treze, que foram descobertos por Arquimedes e que
contém polígonos eqüilaterais e eqüiangulares, mas não similares.
(PAPPUS, 1876, p.353).
A descrição de Pappus a respeito dos treze Sólidos de Arquimedes, de
acordo com o número total de faces pode ser vista na Figura 29.
Figura 29. Descrição de Pappus sobre os sólidos arquimedianos.
Fonte: Pappus, 1876, p.353 e 355.
83
Pappus (1876) organizou essas informações de acordo com o número
total de faces de cada poliedro arquimediano. Iniciou sua discussão com os três
poliedros que apresentam 14 faces e com os dois poliedros que apresentam 26
faces. Em seguida apresenta três poliedros com 32 faces e apenas um de 38
faces. Por fim, apresenta dois poliedros de 62 faces e um único poliedro de 92
faces. No estudo de Pappus não há qualquer nomeação para os sólidos
arquimedianos.
Para melhor compreensão, a descrição realizada por Pappus para os
treze sólidos de Arquimedes está organizada no Quadro 6. A primeira coluna
apresenta o nome dado a cada sólido por Kepler, a segunda apresenta o total de
faces que cada poliedro possui e as demais indicam os polígonos que formam
suas faces.
Quadro 6. Descrição de Pappus sobre os sólidos arquimedianos.
Sólidos
Tetraedro
truncado
Cuboctaedro
Octaedro truncado
Cubo truncado
Rombicuboctaedro
Cuboctaedro truncado
Icosidodecaedro
Icosaedro truncado
Dodecaedro truncado
Cubo achatado
Rombicosidodecaedro
Icosidodecaedro
truncado
Dodecaedro achatado
Faces
Triângulos
8
14
14
14
26
26
32
32
32
38
62
62
4
8
92
Números de
Quadrados
Pentágonos
Hexágonos
8
6
12
20
80
Decágonos
4
6
6
8
20
32
20
Octógonos
8
12
12
6
20
12
6
30
30
12
20
12
12
É dessa maneira que o primeiro estudo matemático dos sólidos
arquimedianos, pós-Arquimedes, é realizado. Tudo indica que esse estudo
matemático só foi retomado no século XV com Kepler, talvez o primeiro a
sistematizá-lo. Entretanto, no período do Renascimento, diversos artistas e
matemáticos se interessaram pelo estudo e representação desses sólidos. Esses
artistas, para variar seus desenhos, cortavam cantos e arestas de sólidos
platônicos, o que naturalmente produzia alguns Sólidos Arquimedianos como
resultado.
84
3.3 SOLIDOS ARQUIMEDIANOS NO RENASCIMENTO
Nesse tópico apresentamos os artistas do Renascimento que produziram
sólidos arquimedianos em suas obras, bem como os procedimentos utilizados que
levaram a redescoberta dos mesmos.
Field (1997) assinala que cinco renascentistas – Piero della Francesca
(1412-1492), Luca Pacioli (1445-1517), Leonardo da Vinci (1452-1519), Albert
Durer (1471-1528) e Daniele Barbaro (1513-1570) – descreveram em suas obras
os Sólidos de Arquimedes sem o conhecimento do estudo de Arquimedes,
relatado por Pappus, em escritos que foram impressos em 1588 e seus
manuscritos não estavam disponíveis antes de 1560.
Para Field (1997), a história da redescoberta de poliedros arquimedianos
durante o Renascimento não é a da recuperação de um texto clássico perdido, diz
respeito à redescoberta da matemática real, matemática figurada por profissionais
que exerceram atividades outras que não a de matemáticos, o que neste caso
poderia ter sido puramente racional.
Dos cinco renascentistas apontados por Field (1997), três deles – Piero
della Francesca, Leonardo da Vinci e Albert Durer – estão presentes na obra
biográfica de Coolidge (1950 apud Brolezzi, 1991) “Matemática dos Grandes
Amadores” cujo destaque maior é dado a matemáticos não profissionais. Coolidge
(1950 apud Brolezzi, 1991, p. 211) considerou que:
através de séculos têm havido um certo número de homens, não
matemáticos profissionais, que fizeram contribuições significativas
para essa, a mais antiga das Ciências.
Pareceu-me que valia a pena fazer algum estudo das
contribuições desses homens que, por falta de um termo melhor,
chamei amadores.
Os artistas renascentistas como sinaliza Field (1997), não estavam
interessados, pelo menos não a sério, na regularidade combinatória desses
sólidos, mas na existência de uma esfera circunscrita. Como a busca de outros
sólidos também inscritíveis em uma esfera era o que os movia, os cortes sobre as
arestas de sólidos platônicos não poderiam ser feitos de maneira arbitrária. O
processo utilizado por esses artistas, que deu origem a essa redescoberta, é
85
chamado de truncatura, eliminação de partes de um sólido de forma simétrica que
pode ser feita sobre seus vértices ou sobre suas arestas.
Embora, não haja qualquer explicitação ou esquematização do estudo
das relações entre sólidos platônicos e os sólidos arquimedianos e os diferentes
processos de construção a partir de truncaturas, Field (1997) pontua que tais
artistas tiveram que se dirigir a Os Elementos de Euclides, mais especificamente
ao livro XIII.
O autor, ainda, destaca dois livros pseudo-euclidianos, livro XIV e livro
XV, cuja importância não está em sua autoria (provavelmente considerados por
seus autores como suplementos do livro 13 de Euclides), mas sim em seu
conteúdo. O livro XIV discorre a respeito da secção áurea e as relações métricas
entre os poliedros regulares inscritos em uma mesma esfera. O livro XV
apresenta sólidos regulares inscritos em outros sólidos. Esses dois livros,
apontados por Field (1997), são as supostas fontes para a redescoberta de
alguns sólidos arquimedianos por Piero della Francesca.
Piero della Francesca (1412-1492)
De acordo com Cromwell (2008), os princípios para representações
realistas do espaço estabelecido por Alberti10 não foram suficientes para permitir
que desenhos mais complexos, como o de poliedros, fossem produzidos. Embora
os métodos de construção de poliedros fossem conhecidos por Alberti, ele não os
descreveu. Foi Piero della Francesca que os apresentou pela primeira vez e após
isso, a construção de poliedros em perspectivas tornou-se uma característica
normal para pintores.
Piero della Francesca, pintor do século XV, foi também um estudioso em
matemática. Conhecedor de Os Elementos de Euclides, ele escreveu vários
tratados matemáticos, três deles já recuperados e impressos, mas não em seu
nome. Field (1997) afirma que dois desses tratados, Trattato d’Abaco (1450) e
Libellus de Quinque corporibus regularibus (1480), apresentam alguns estudos
____________
10
De acordo com Veloso (1998), Leon Battista Alberti nasceu em Florença em 1404, foi pintor,
compositor, poeta e filósofo, mas ficou mais conhecido como “arquiteto” e autor da primeira
análise científica da perspectiva.
86
realizados com poliedros regulares e fornecem a construção de alguns sólidos
arquimedianos.
Segundo o autor, Trattato d’Abaco é um tratado derivado de duas obras
de Leonardo de Pisa (1170-1250), também conhecido como Fibonacci. Nesse
tratado, os problemas apresentados por Piero della Francesca envolvem dois
sólidos arquimedianos, o tetraedro truncado e o cuboctaedro, ilustrados na Figura
30.
Figura 30. Tetraedro truncado e cuboctaedro.
Fonte: Kepler, 1864, p.123 e 124.
Para o tetraedro truncado temos o exemplo: “existe um corpo esférico
cujo diâmetro é seis; nele, quero colocar um corpo com oito faces, quatro
triângulos e quatro hexágonos. Eu pergunto: quais são suas arestas?”.
(FRANCESCA, p. 230 apud FIELD, 1997, p. 248, tradução nossa).
Para completar essa descrição Piero della Francesca fornece-nos um
diagrama, como mostra a Figura 31, em que um círculo indica a esfera
circunscrita. Para Field (1997), Piero della Francesca sabia que esse novo sólido
resultaria de cortes nos cantos de um tetraedro regular, entretanto não
apresentou qualquer informação de como esse sólido pôde ter sido redescoberto.
87
Figura 31. Escrito de Piero della Francesca de um Tetraedro truncado.
Fonte: Field, 1997, p.249.
Para o cuboctaedro temos o exemplo:
existe um corpo esférico, cujo diâmetro é seis braças; nele, quero
colocar uma figura com quatorze faces, seis quadrados e oito
triângulos, de arestas congruentes. Eu pergunto: qual é a medida
de cada aresta?
Tal figura é obtida a partir do cubo, porque ele (o cubo) tem seis
faces e oito cantos; cortando seus oito cantos, obtêm-se quatorze
faces, como segue. Você tem o cubo ABCD.EFGH, divide cada
lado na metade: AB no ponto I, CD no ponto L, BD no ponto K, AC
no ponto M...(FRANCESCA, p. 231 e 232 apud FIELD, 1997, p.
248, tradução nossa).
O digrama fornecido por Piero della Francesca, conforme mostra a figura
32, utiliza, mais uma vez, um círculo para indicar a presença da esfera
circunscrita. Para esse sólido, Piero della Francesca adverte quanto à forma como
deve ser construído, visto que por meio dos pontos médios de suas arestas, os
cantos de um cubo são removidos de forma simétrica. Seu diagrama, no entanto,
omite o cubo.
Figura 32. Escrito de Piero della Francesca de um Cuboctaedro.
Fonte: Field, 1997, p.249.
88
Já o livro Libellus Quinque Corporibus Regularibus de Piero della
Francesca descreve, de acordo com Field (1997), cinco sólidos arquimedianos
obtidos pela eliminação dos cantos dos sólidos platônicos. Como já observado,
executar truncaturas em um desenho ou em um sólido requer descobrir o ponto
em que o corte será efetuado, e isso implica cálculos.
Field (1997) assinala que Piero della Francesca introduz os cinco
arquimedianos – tetraedro truncado, cubo truncado, icosaedro truncado,
dodecaedro truncado e octaedro truncado – a partir de problemas que relacionam
a aresta do sólido com o diâmetro de sua esfera circunscrita.
Assim, segundo o autor, quando as faces do sólido de partida são
triângulos (tetraedro, octaedro e icosaedro), Piero della Francesca forma faces
hexagonais pela divisão das arestas em três partes iguais, como mostra a Figura
33.
Figura 33. Hexágono regular a partir de um triângulo eqüilátero.
Fonte: Field, 1997, p. 251.
Esse procedimento resulta nos sólidos arquimedianos conhecidos como
tetraedro truncado, octaedro truncado e icosaedro truncado, ilustrados na Figura
34.
Figura 34. Tetraedro truncado, octaedro truncado, icosaedro truncado.
Fonte: Cromwell, 2008, p. 161.
89
Os dois sólidos arquimedianos restantes, dodecaedro truncado e cubo
truncado, mostrados na Figura 35, são obtidos por cortes nas arestas do
dodecaedro regular e do cubo, respectivamente, sólidos que os originam. Dessa
forma, faces formadas por octógonos e decágonos são obtidas como resultado.
Figura 35. Cubo truncado e Dodecaedro truncado.
Fonte: Cromwell, 2008, p. 161.
De acordo com Field (1997), parece ter sido Piero della Francesca quem
inventou o uso da truncatura como um procedimento matemático, em que
mostrou preocupação com a simetria e com o tratamento de formas
tridimensionais, ao invés de reduzir o problema a uma série de problemas
bidimensionais em planos distintos. O autor, ainda, pontua o grau de habilidade
incomum para um pintor em manusear composições pictóricas no espaço, o que
evidencia capacidade de visualização tridimensional bastante desenvolvida.
Além de Piero della Francesca, os artistas Luca Pacioli e Leonardo da
Vinci redescobriram alguns sólidos arquimedianos como segue.
Luca Pacioli (1445-1517) e Leonardo da Vinci (1452-1519)
Luca Bartolomeo de Pacioli foi um monge franciscano e célebre
matemático italiano. Segundo Cromwell (2008), em uma de suas obras mais
importantes, De Divina Proportioni (publicada em 1509), é apresentado um estudo
de sólidos regulares e outros sólidos que podem ser derivados a partir deles.
Nessa obra, seis dos sólidos arquimedianos aparecem, dois dos quais não estão
presentes nas obras de Piero della Francesca.
Assim como o trabalho de Piero della Francesca a respeito de poliedros,
De Divina Proportioni de Luca Pacioli fornece pouca informação sobre a forma
90
como os sólidos arquimedianos são obtidos, além de complicações adicionais
assinaladas por Field (1997). Para o autor, uma dessas complicações está
relacionada aos diagramas, que acompanham parte do trabalho. Estes diagramas
por sua vez ilustram os sólidos, que se sabe terem sido desenhados por Leonardo
da Vinci e que contém muitas informações que não constam no texto. Para Field
(1997) isso pode ser observado nas Figuras 36 e 37, desenhos de Leonardo da
Vinci que salientam a estrutura dos poliedros, representando somente as suas
arestas, informações não fornecidas por Luca Pacioli.
Figura 36. Desenho de Leonardo da Vinci do Icosidodecaedro.
Fonte: Field, 1997, p.257.
Figura 37. Desenho de Leonardo da Vinci do Rombicuboctaedro.
Fonte: Field, 1997, p.258.
Field (1997) afirma que os seis sólidos arquimedianos trazidos por Pacioli
são produzidos pelo método de truncamento descrito por Piero della Francesca
no Trattato d’Abaco. Assim, Pacioli redescobre também o tetraedro truncado, o
icosaedro truncado, o octaedro truncado, o cuboctaedro e outros dois sólidos que
91
não aparecem nas obras de Piero della Francesca, icosidodecaedro e o
rombicuboctaedro, ilustrados na Figura 38.
Figura 38. Icosidodecaedro e rombicuboctaedro.
Fonte: Cromwell, 2008, p.160.
Assim como o cuboctaedro, o icosidodecaedro é obtido por truncaturas
sobre os pontos médios das arestas dos sólidos platônicos dodecaedro ou
icosaedro. O rombicuboctaedro resulta de truncaturas no sólido arquimediano
cuboctaedro, mas Pacioli não fornece qualquer informação que explique tal
truncatura. Para Field (1997), o estilo geral da obra de Pacioli seria a desculpa
para a ausência de uma explicação matemática da origem do novo sólido.
Além do procedimento de truncatura descoberto por Piero della
Francesca para a obtenção de sólidos arquimedianos, outro procedimento
matemático é apontado por Dürer, mostrado no que segue.
Albert Dürer (1471-1528)
Segundo Cromwell (2008), Albert Dürer dedicou muitos dos seus últimos
anos de vida a estudos teóricos de textos clássicos, cujo interesse no espírito
humanista do Renascimento abrangia áreas como a Matemática, em especial a
Geometria, a Geografia, a Arquitetura e a Engenharia.
Em 1525, publicou Unterweysung der Messung MIT dem Zirkel um
Richtscheyt in Linien Ebnen unnd Gantzen Corporen (Instrução da Arte da
Medição com Compasso e Regras de Linhas, Planos e Corpos Sólidos), um
trabalho compreendido em quatro livros. Segundo Field (1997), no primeiro livro
discute conceitos básicos da geometria (ponto e reta) e avança para conceitos
92
mais complexos. O segundo traz discussões a respeito de polígonos regulares e,
Dürer, expõe como polígonos regulares podem ser incorporados em ornamentos,
pisos e pavimentações. No terceiro livro aborda problemas de arquitetura e
engenharia e no quarto os sólidos arquimedianos são introduzidos.
Sete arquimedianos são discutidos em conjunto com sólidos platônicos e
cada um deles é ilustrado apenas pela planificação de sua superfície. Dos sete
arquimedianos descritos, Field (1997) sinaliza que quatro podem ter sido retirados
da obra, De Divina Proportioni, de Pacioli (tetraedro truncado, cuboctaedro,
octaedro truncado e o rombicuboctaedro), um da obra Libellus Quinque
Corporibus Regularibus de Piero della Francesca (cubo truncado) e os dois
restantes, cuboctaedro truncado e cubo achatado, ilustrados na Figura 39, podem
ter sido redescobertos por ele.
Figura 39. Cuboctaedro truncado e cubo achatado.
Fonte: Cromwell, 2008, p.160.
Com base nos escritos de Dürer sobre o arquimediano cuboctaedro
truncado, Field (1997) pontua a ausência de um procedimento matemático
evidente, ou ainda indicativo, que aponte como o novo sólido foi redescoberto. No
entanto, de acordo com o autor, o procedimento efetuado por Dürer parece não
ter sido o truncamento, mas sim o procedimento de construção de sólido a partir
da planificação de sua superfície.
Field (1997) sinaliza que a idéia de construção introduzida por Dürer torna
mais simples a representação da superfície dos sólidos arquimedianos por sua
forma planificada do que por perspectiva. Ainda para o autor, esse método pode
ter sido essencial para a redescoberta do cubo achatado por Dürer.
93
O cubo achatado foi descrito por Dürer como um sólido de seis faces
quadradas e trinta e duas faces triangulares, com vinte quatro ângulos sólidos e
sessenta arestas. A planificação da superfície do sólido, ilustrada na Figura 40
destaca uma simetria diferente dos arquimedianos anteriores e desta forma nos
leva a crer que ele não pode ser obtido por um processo simples de truncamento,
como os descritos por Piero della Francesca.
Figura 40. Planificação da superfície do cubo achatado.
Fonte: Field, 1997, p.268.
A Figura 41 mostra que o cubo achatado pode ser construído a partir do
cubo. De acordo com Schreiber, Fischer e Sternath (2007), o problema está em
encontrar x e y de modo que todas as arestas sejam congruentes, o que resulta
na equação x 3
2x 2
2x
1 .
2
Figura 41. Construção do cubo achatado a partir do cubo.
Fonte: Schreiber, Fischer e Sternath, 2008, p. 463.
94
O método da planificação introduzido por Dürer também foi utilizado por
Danielle Barbaro para ilustrar onze dos treze sólidos arquimedianos que
apresentamos no que segue.
Danielle Barbaro (1513-1570)
Segundo Field (1997), a maneira pela qual os sólidos arquimedianos são
retratados na obra Pratica della perspectiva (1568 e 1569) de Danielle Barbaro, é
muito semelhante à De Divina Proportioni de Pacioli, pois o foco está na
apresentação visual desses sólidos e apenas uma breve discussão matemática
nos é fornecida.
Todos os onze sólidos arquimedianos apresentados em sua obra são
obtidos por truncaturas, fato que para Field (1997) pode explicar a ausência do
sólido arquimediano cubo achatado redescoberto por Dürer. No entanto, o autor
sinaliza que Danielle Barbaro utiliza o método de planificação de Dürer para
ilustrá-los.
Dos onze sólidos arquimedianos descritos por Barbaro, dois deles,
rombicosidodecaedro e icosidodecaedro truncado, ilustrados na Figura 42, não
haviam sido ainda obtidos, ou talvez indicados, por Piero della Francesca, Luca
Pacioli e Albert Dürer.
Figura 42. Rombicosidodecaedro e icosidodecaedro truncado.
Fonte: Cromwell, 2008, p.161.
De
acordo
com
Field
(1997),
Danielle
Barbaro
redescobriu
o
rombicosidodecaedro ao truncar as arestas do icosidodecaedro em seus pontos
médios. No entanto, não há qualquer informação da maneira como obteve o
icosidodecaedro truncado.
95
Para finalizar, apresentamos no Quadro 7, uma síntese que possibilita
observar melhor os sólidos arquimedianos redescobertos pelos artistas do
Renascimento. A primeira coluna mostra a nomenclatura dada por Kepler a cada
sólido arquimediano, e as demais indicam em que obras os sólidos aparecem. A
letra “T” refere-se ao Trattato d’Abaco e a letra “L” a Libellus Quinque Corporibus
Regularibus, ambas as obras de Piero della Francesca.
Quadro 7. Sólidos Arquimedianos no Renascimento.
Sólido
Arquimediano
Piero della
Francesca
Luca Pacioli
Albert Dürer
Danielle
Barbaro
L
-


T, L



Dodecaedro Truncado
L
-
-

Icosaedro Truncado
L

-

Octaedro Truncado
L



Cuboctaedro truncado
-
-


Icosidodecaedro
-
-
-

Cuboctaedro
T



Icosidodecaedro
-

-

Rombicuboctaedro
-



Rombicosidodecaedro
-
-
-

Cubo achatado
-
-

-
Dodecaedro achatado
-
-
-
-
Cubo truncado
Tetraedro truncado
truncado
Além de pinturas, a madeira foi também um meio utilizado por artesões no
Renascimento para representar poliedros. Segundo Cromwell (2008), alguns
artistas renascentista associavam a perspectiva com marchetaria, considerada no
período do Renascimento como arte de construir objetos tridimensionais tendo
como principal suporte a madeira. A madeira era uma espécie de marca
registrada, motivo de sua popularidade.
96
Sólidos Arquimedianos em Madeira
De acordo com Cromwell (2008), as formas simples de poliedros eram as
favoritas dos artesões e assim, poliedros platônicos e alguns arquimedianos
foram produzidos. O autor apresenta, na Figura 43, um bloco em madeira feito por
artesões florentinos em 1470. Pontua, ainda, que para tornar a construção mais
difícil e expor maior habilidade técnica, os artesões produziam apenas as
estruturas de poliedros para que todas as faces se tornassem visíveis. Poliedros
inscritos em outros também foram produzidos.
Figura 43. Estrutura de poliedros em madeira.
Fonte: Cromwell, 2008, p. 118.
Muitos autores afirmam que Kepler foi o primeiro a explorar todos os
Sólidos Arquimedianos. No entanto, Schreiber, Fischer e Sternath (2007) apontam
evidências que a história sobre esses sólidos, dita e aceita até hoje pode não
estar completa.
De acordo com os autores, no outono de 2006, em um curso de criação
de um catálogo digital para a Galeria Albertina11, foi dada atenção, mais uma vez,
para as telas de quarenta blocos construídos a partir de cortes em madeira que
exibem sólidos regulares e semi-regulares. Todos os Sólidos Arquimedianos
foram apresentados por meio da planificação de suas superfícies, uma delas é
mostrada na figura 44.
____________
11
Museu de arte de Viena, na Áustria.
97
Figura 44. Planificação de superfície de poliedros em madeira.
Fonte: Schreiber, Fischer e Sternath, 2008, p. 459.
O catálogo foi feito por Gisela Fischer, que descobriu recentemente em
três dos blocos, a assinatura de Hieronymus Andreae, conhecido na história da
arte como colaborador de Dürer, além de editor e impressor. Com a assinatura de
Andreae nos blocos, os autores puderam presumir uma conexão com os
trabalhos de Dürer,
Com a morte de Andreae em 1556, os autores estabeleceram um ano
limite para a produção dos blocos e assim constataram que anterior a Kepler
existiu um matemático, ainda que desconhecido, interessado em explorar todos
os Sólidos Arquimedianos. No entanto, segundo os autores, nenhuma informação
se tem a respeito desse desconhecido, talvez pelo fato de inexistirem documentos
impressos acerca dos blocos produzidos. Ainda assim, os autores listam detalhes
do projeto dos quarenta blocos.
A conexão do trabalho desse matemático desconhecido com Dürer,
também pode ser justificada por ambos compartilharem do mesmo método para a
produção de superfícies de Sólidos Arquimedianos, o da planificação. Para os
autores, assim como Dürer obteve o cubo achatado, esse matemático obteve o
dodecaedro achatado, mostrado na Figura 45, único sólido arquimediano que
ainda não havia sido explorado. A planificação da superfície desse sólido é
mostrada na Figura 46.
98
Figura 45. Dodecaedro achatado.
Fonte: Cromwell, 2008, p.92.
Figura 46. Superfície de um dodecaedro achatado em madeira.
Fonte: Schreiber, Fischer e Sternath, 2008, p. 462.
Com a planificação da superfície do dodecaedro achatado representada
em bloco de madeira, o conjunto completo dos treze Sólidos Arquimedianos pode
ter sido explorado antes mesmo de Kepler.
A seguir apresentamos o estudo matemático sobre os Sólidos
Arquimedianos realizado por Kepler que não só retoma o estudo de Pappus, mas
também o sistematiza.
99
3.4 SISTEMATIZAÇAO DE KEPLER
Nesse tópico, indicamos algumas razões que despertaram o interesse de
Kepler ao estudo dos poliedros, a demonstração da existência de apenas treze
Sólidos Arquimedianos, bem como a nomeação dada por Kepler a cada um
desses sólidos.
Segundo Garozzo (1975), Johannes Kepler (1571-1630) nasceu na
cidade de Weil der stadt, na região do Wurttemberg. Ele viveu em uma época de
transição, final da Idade Média e início da Idade Moderna, em meio a uma Europa
turbulenta, cheia de transtornos políticos e religiosos. Embora seja lembrado
principalmente por suas obras astronômicas, Kepler foi um autor prolífico e
escreveu sobre assuntos diversos.
Assim como Copérnico e Galileu, Kepler foi um grande explorador do
espaço. Garozzo (1975) afirma que Kepler embora fosse adepto de Copérnico,
visto que reconhecia as vantagens matemáticas do novo sistema planetário, foi
além da explicação cinemática do universo copernicano, pois procurava uma
explicação mais física dos fenômenos celestes, de natureza quase dinâmica.
Kepler atraído pelo sistema de Copérnico e pelas leituras de Pitágoras e
Platão desejava desvendar os mistérios do cosmos. Dessa forma, percebeu que o
corpo mais importante do universo, a fonte única de toda e qualquer energia e
movimento, não era a terra, mas o sol. E para estabelecer a ordem que presidia à
distribuição dos planetas chegou a exprimir uma relação entre os cinco poliedros
platônicos e as órbitas dos seis planetas até então conhecidos: Mercúrio, Vênus,
Terra, Marte, Júpiter e Saturno.
Segundo Schoot (2001), Kepler acreditava que as distâncias entre as
órbitas dos planetas só poderia ser estabelecida pela forma dos cinco poliedros
platônicos. Entre as órbitas de Mercúrio e Vênus situava-se um octaedro, entre
as órbitas de Vênus e Terra um icosaedro, entre as órbitas de Terra e Marte um
dodecaedro, entre as órbitas de Marte e Júpiter um tetraedro, e entre as órbitas
de Júpiter e Saturno um cubo. Ainda segundo o autor, Kepler acreditava que cada
corpo celeste possuía sua própria esfera e se movia ao longo de sua superfície,
100
além de também acreditar que a distância entre cada planeta do centro do
universo não era constante.
Com esse raciocínio, Kepler pensou explicar, não somente a ordem
espacial dos planetas, cuja escolha não poderia ter sido arbitrária, mas também
seu número. Acreditava que Deus, criador de coisas perfeitas, havia usado para
construir o universo somente figuras geométricas perfeitas. De acordo com
Garozzo (1975), ninguém antes de Kepler procurou deduzir o número e
dimensões das órbitas para tentar compreender os planos do criador.
Sua teologia, crença em Deus criador, somado ao seu misticismo
pitagórico, o levou a procurar a ordem matemática subjacente a fenômenos da
natureza. Nesse sentido, segundo Cromwell (2008), o modelo poliédrico de Kepler
do universo, ilustrado na Figura 47, foi motivado pelo desejo de tentar explicar a
estrutura do universo e expor as relações geométricas harmoniosas utilizadas
pelo grande arquiteto na criação do universo.
Figura 47. Mistério Cosmográfico de Kepler.
Fonte: Cromwell, 2008, p. 145.
O interesse em poliedros abrange toda a carreira de Kepler.
Eles
ocorrem em seu primeiro tratado publicado, Mistério Cosmográfico, em que
descreve e explica a sua concepção do sistema planetário tendo como base o
modelo heliocêntrico de Copérnico, e também em uma de suas últimas grandes
obras, Harmonices Mundi, obra em que Kepler revela sua visão do cosmos em
101
que a ciência se mistura com poesia, filosofia, teologia e misticismo. Embora,
mais tarde, Kepler tenha se convencido de que os sólidos platônicos não davam
as proporções exatas na distribuição dos planetas no universo, seus estudos
deram notáveis contribuições ao estudo dos poliedros.
Os escritos de Kepler a respeito dos sólidos arquimedianos estão
presentes no segundo livro de sua obra Harmonices Mundi (De Congruentia
Figurarum Harmonicarum). Os dois primeiros, dos cinco livros, abordam polígonos
e as diferentes maneiras nas quais eles formam congruências no plano e no
espaço. No livro I, Kepler define polígono regular como eqüilateral e eqüiângular e
polígono semi-regular apenas como eqüilateral, e restringe a atenção para
aqueles que têm quatro lados. No livro II, ele investiga as maneiras que polígonos
regulares ou semi-regulares podem ser arranjados em torno de um ponto, o que
conduz a construção de poliedros.
Kepler classifica e descreve os tipos de poliedros que o interessam, como
pode ser visto na Figura 48. Cromwell (2008) afirma que para Kepler uma
congruência é perfeita quando todos os vértices estão igualmente cercados e a
subdivide em poliedros mais perfeitos e poliedros perfeitos a um menor grau. Os
poliedros mais perfeitos são contemplados por faces iguais, estes são ainda
subdivididos em regulares e semi-regulares, isto é, de acordo com suas faces,
polígonos regulares ou semi-regulares. O poliedro que Kepler considera perfeito a
um menor grau tem faces regulares de vários tipos: arquimedianos e as famílias
de prismas e antiprismas, em que alguns são considerados imperfeitos.
Figura 48. Classificação de poliedros de Kepler
Fonte: Cromwell, 2008, p.150.
102
Segundo o autor, Kepler descreve exemplos de vários tipos de poliedros.
Os poliedros regulares são os primeiros a serem enumerados, pois observa que
essa classificação constitui a última proposição em Os Elementos de Euclides.
Sua demonstração segue a de Euclides, já que ele tenta arranjar polígonos em
torno de um ponto e eliminar todas as possibilidades cuja soma dos ângulos
supere 360°. Dessa forma, as cinco possibilidades existentes resultam nos
Sólidos de Platão.
De acordo com Cromwell (2008), Kepler conheceu o trabalho de Pappus
a respeito dos Sólidos de Arquimedes e por meio de uma análise sistemática
concluiu que prismas e antiprismas também satisfaziam a definição dada por
Pappus aos sólidos, até então, nada havia sido escrito sobre isso. Ainda, para o
autor é provável que Kepler tenha sido o primeiro a observar o antiprisma.
Para enumerar os Sólidos de Arquimedes, Kepler considerou todas as
possíveis maneiras que um ângulo sólido pode ser formado a partir de polígonos
regulares. Kepler utilizou dois lemas para tornar o processo mais fácil.
Lema 1:
Se todas as faces de um poliedro convexo são polígonos regulares,
então, no máximo, três tipos diferentes de faces podem aparecer em torno
de qualquer ângulo sólido.
Os quatro polígonos regulares com os menores ângulos internos são: o
triângulo (60°), o quadrado (90°), o pentágono (108°) e o hexágono (120°). A
soma desses quatro ângulos é maior que 360°. Como a soma ultrapassa 360°, é
fácil notar que esses quatro polígonos regulares não podem cercar um vértice.
Com um conjunto diferente, isto é, de quatro ou mais polígonos regulares
diferentes, em torno de um vértice, o total da soma dos ângulos é ainda maior.
Portanto, quatro ou mais tipos diferentes de polígonos regulares não podem
cercar um vértice.
■
Lema 2:
Um poliedro em que todos os ângulos sólidos estão rodeados da
mesma maneira não pode ter ângulos sólidos conforme mostra o Quadro 8.
103
Quadro 8. Tipos de vértices que não formam um ângulo sólido.
(i) Em que a é impar e b ≠ c.
(ii) Em que a ≠ c
Fonte: Cromwell, 2008, p.159.
i.
Como todos os ângulos sólidos têm o mesmo tipo, isto é, estão rodeados
da mesma maneira, a face do polígono de b lados deve alternar com a face
do polígono de c lados cercando a fronteira de um polígono de face a.
Entretanto, se a for ímpar ocorre uma contradição, conforme mostra a
Figura 49.
Figura 49. Exemplo Lema 2(i).
ii.
Nesse caso, consideramos a maneira em que as faces devam ser
arranjadas em torno de um polígono de 3 lados. Em cada ângulo sólido, a
face oposta ao polígono de 3 lados é um polígono de b lados. Desde que
todos os vértices tenham o mesmo tipo, o tamanho dos polígonos de 3
lados deve ser anexado aos polígonos de a lados e polígonos de c lados, e
estes devem alternar em torno do polígono de 3 lados. Isto leva a uma
inconsistência, como mostra a Figura 50.
104
Figura 50. Exemplo Lema 2(ii).
Fonte: Cromwell, 2008, p.162.
O segundo lema é usado por Kepler para excluir certas combinações de
polígonos que contém um número ímpar de lados. Kepler afirma que três
polígonos de tipos diferentes não podem formar um ângulo sólido em uma figura
perfeita se algum deles tem um número ímpar de lados.
Depois de demonstrar o Lema 2, Kepler afirma que existem treze
congruências sólidas as quais são perfeitas a um menor grau. A partir delas nós
obtemos os Sólidos Arquimedianos. A única figura perfeita, para Kepler, é a
esfera, por isso considera os sólidos arquimedianos como figuras perfeitas a um
menor grau.
A demonstração a seguir, é baseada nas idéias de Kepler com adicionais
de Peter R. Cromwell. A diferença básica entre as duas demonstrações está na
distinção feita por Cromwell (2008) entre tipos e espécies de um vértice.
Para Cromwell (2008) a distinção entre a definição das faces que estão
vinculadas a um ângulo sólido e a específica ordem em que elas ocorrem é
necessária. O autor entende espécie de um ângulo sólido como uma lista
desordenada das faces presentes e como tipo de um ângulo sólido a ordem
específica em que as faces ocorrem ao redor do vértice. Por exemplo, conforme
mostra a Figura 51, a espécie do ângulo sólido delimitado por dois triângulos e
dois quadrados compreende dois tipos de ângulo sólido, isso se deve a maneira
como essas faces estão arranjadas.
105
Figura 51. Dois tipos de vértices de mesma espécie
Fonte: Cromwell, 2008, p.158.
Os diagramas representam a região em torno de um vértice e os números
indicam os tipos e as relativas posições dos polígonos os quais cercam o vértice.
Esta informação pode ser, também, escrita na forma (3,4,3,4) e (3,3,4,4), a qual
lista em ordem (horária) o número de lados de cada face.
Segue a demonstração.
Teorema: Considera-se que todos os ângulos sólidos de um poliedro
convexo sejam do mesmo tipo. Além de duas famílias de tipos (4,4,n) e
(3,3,3,n), existem treze tipos de ângulos sólidos que podem ocorrer. Essas
possibilidades são realizadas pelas famílias de prismas, antiprismas e dos
Sólidos Arquimedianos, respectivamente.
O teorema é provado por exaustão, isto é, por esgotar todas as possíveis
combinações de faces que podem cercar um ângulo sólido e esgotar aquelas que
não respeitam a condição de existência, conforme já mostradas nos lemas 1 e 2.
O primeiro lema mostra que as espécies de ângulos sólidos presentes
podem ter, no máximo, três tipos de polígonos regulares e deve haver, por
definição, pelo menos dois tipos de polígonos.
Primeiro, considera-se aquelas espécies de ângulo sólido em que existem
dois tipos de faces.
(1) Espécie de ângulo sólido limitado por polígonos de 3 lados e polígonos
de 4 lados.
Se na espécie de um ângulo sólido existir um único polígono de 4 lados, então
pode haver, no máximo, quatro polígonos de 3 lados, uma vez que a soma entre
os ângulos de 5 ou mais polígonos de 3 lados e um polígono de 4 lados é superior
106
a 360°.Desta forma, existem três tipos possíveis de ângulos sólidos, conforme
mostra o Quadro 9.
Quadro 9. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de quatro lados e
no máximo quatro polígonos de três lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
5x(60°) + 1x(90°) = 390°
(3,3,3,3,3,4)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Cubo achatado.
4x(60°) + 1x(90°) = 330°
(3,3,3,3,4)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°.
Resulta
em
um
antiprisma
quadrangular.
3x(60°) + 1x(90°) = 270°
(3,3,3,4)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,3,4)
Fonte: Cromwell, 2008, p.163.
Se existirem dois polígonos de 4 lados na espécie de ângulo sólido, então pode
haver, no máximo, dois polígonos de 3 lados. Dois polígonos de 4 lados e três ou
mais polígonos de 3 lados não podem formar um ângulo sólido, pois a soma dos
ângulos planos é maior ou igual a 360°.
107
As espécies de ângulos sólidos que contém dois polígonos de 4 lados e
dois polígonos de 3 lados vêm em dois tipos, como indica o Quadro 10.
Quadro 10. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de quatro lados
e dois polígonos de três lados
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
3x(60°) + 2x(90°) = 360°
(3,3,3,4,4)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (ii).
(3,3,4,4)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em cuboctaedro.
(3,4,3,4)
2x(60°) + 2x(90°) = 300°
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um prisma triangular.
1x(60°) + 2x(90°) = 240°
(3,4,4)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 163.
Se existirem mais do que dois polígonos de 4 lados no ângulo sólido, então
existe uma única possibilidade que é indicada no Quadro 11.
108
Quadro 11. Possibilidades de ângulos sólidos formados por três polígonos de quatro lados
e dois polígonos de três lados.
A soma dos ângulos planos é maior 360°.
Portanto, não pode ser considerada.
2x(60°) + 3x(90°) = 390°
(3,3,4,4,4)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Rombicuboctaedro.
1x(60°) + 3x(90°) = 330°
(3,4,4,4)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 163.
A soma dos ângulos de três polígonos de 4 lados e dois polígonos de 3
lados supera 360°, assim como a soma de quatro ou mais polígonos de 4 lados.
(2) Espécie de ângulo sólido limitado por polígonos de 3 lados e polígonos
de 5 lados.
A análise desse caso é a mesma do caso anterior.
Se existir apenas um polígono de 5 lados, então pode haver, no máximo,
quatro polígonos de 3 lados. Os dois possíveis tipos ocasionam no dodecaedro
achatado e no antiprisma pentagonal, conforme mostra o Quadro 12.
Quadro 12. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de cinco lados e
no máximo quatro polígonos de três lados..
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
5x(60°) + 1x(108°) = 408°
(3,3,3,3,3,5)
109
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Dodecaedro
achatado..
(3,3,3,3,5)
4x(60°) + 1x(108°) = 348°
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um antiprisma
pentagonal.
(3,3,3,5)
3x(60°) + 1x(108°) = 288°
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,3,5)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 164.
Se existirem dois polígonos de 5 lados na espécie de ângulo sólido então
podem haver, no máximo, dois polígonos de 3 lados. Mais uma vez a espécie que
contém dois polígonos de 3 lados vem em dois tipos, como mostra o Quadro 13.
Quadro 13. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de cinco lados
e no máximo dois polígonos de três lados..
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
3x(60°) + 2x(108°) = 396°
(3,3,3,5,5)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (ii).
(3,3,5,5)
110
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Icosidodecaedro.
(3,3,5,5)
2x(60°) + 2x(108°) = 336°
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,5,5)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 164.
(3) Espécie de ângulo sólido limitado por polígonos de 3 lados e polígonos
de 6 lados.
Neste caso quando as espécies contém um único polígono de 6 lados, podem
existir, no máximo, três polígonos de 3 lados. Quatro polígonos de 3 lados e um
polígono de 6 lados não podem formar um ângulo convexo mas sim planar. Três
polígonos de 3 lados e um polígono de 6 lados formam um antiprisma hexagonal
de vértice do tipo (3,3,3,6).
O caso de dois polígonos de 3 lados e um polígono de 6 lados é excluído.
O Quadro 14 exemplifica as espécies mencionadas.
Quadro 14. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de seis lados e no
máximo três polígonos de três lados.
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
(3,3,3,3,6)
4x(60°) + 1x(120°) = 360°
111
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um antiprisma
hexagonal.
3x(60°) + 1x(120°) = 300°
(3,3,3,6)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,3,6)
Fonte: Cromwell, 2008, p.164.
Se existirem dois polígonos de 6 lados no ângulo sólido, então pode haver
apenas um polígono de 3 lados. De outra maneira, a soma dos ângulos é igual ou
maior a 360°. O único caso, (3,6,6), corresponde ao tetraedro truncado. Mais do
que dois polígonos de 6 lados não podem formar um ângulo sólido (ver Quadro
15).
Quadro 15. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de seis lados e
um polígono de três lados.
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
(3,3,6,6)
2x(60°) + 2x(120°) = 360°
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Tetraedro Truncado.
1x(60°) + 2x(120°) = 300°
(3,6,6)
112
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
(6,6,6)
3x(120°) = 360°
Fonte: Cromwell, 2008, p. 166.
(4) Espécie de ângulo sólido que contém polígonos de 3 lados e polígonos
de n lados, em que n ≥ 7.
Nenhuma das espécies de ângulos sólidos que contém um único polígono de n
lados pode formar um sólido arquimediano. A única possibilidade é (3,3,3,n), o
antiprisma com um polígono base de n lados, conforme indica o Quadro 16.
Quadro 16. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de sete ou mais
lados e três lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
4x(60°) + 1x(α) > 360°
(3,3,3,3,n)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um antiprisma.
(3,3,3,n)
3x(60°) + 1x(α) < 360°
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,3,n)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 165.
Se houver mais de um polígono de n lados no ângulo sólido então a única
possibilidade é ter dois polígonos de n lados e um polígono de 3 lados. Se n é
113
ímpar, então este tipo de ângulo sólido não pode ser formado (lema 2(i)). E se n é
par e maior do que 10, a soma dos ângulos planos é igual ou maior que 360°. O
Quadro 17 indica as espécies mencionadas.
Quadro 17. Possibilidades de ângulos sólidos formados por mais de um polígono de sete
ou mais lados e três lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
2x(60°) + 2x(α) > 360°
(3,3,n,n)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Cubo Truncado.
1x(60°) + 2x(135°) = 330°
(3,8,8)
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Dodecaedro Truncado.
1x(60°) + 2x(144°) = 348°
(3,10,10)
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo, mas
sim
(3,12,12)
planar.
Portanto,
não
pode
ser
considerada.
1x(60°) + 2x(150°) = 360°
Fonte: Cromwell, 2008, p. 165.
Essa é a completa análise de todas as espécies de ângulo sólido que
contém polígono de 3 lados e um outro tipo de polígono. As outras espécies que
contém apenas dois tipos de polígonos são investigadas a seguir.
114
(5) Espécie de ângulo sólido que contém polígonos de 4 lados e polígonos
de n lados (n ≥ 5).
Se existir uma única face composta por um polígono de n lados, então o tipo de
ângulo sólido deve ser (4,4,n), uma vez que a soma dos ângulos planos de três
ou mais polígonos de 4 lados e um polígono de n lados é maior que 360°. O caso
admissível é um prisma com um polígono base de n lados.
Se existirem duas faces compostas de polígonos de n lados então existe
somente um único polígono de 4 lados (de outra maneira a soma dos ângulos
ultrapassaria 360°). Então, o tipo de ângulo sólido é (4,n,n):
 Se n ≥ 8, então a soma do ângulo é igual ou maior que 360°.
 Se n é ímpar, então a parte (i) do lema 2 mostra que nenhum poliedro é
possível.
 O único caso possível é (4,6,6), poliedro chamado de octaedro truncado.
A possibilidade de três ou mais polígonos de n lados com polígonos de 4 lados
é excluída pela soma dos ângulos.
O Quadro 18 indica as espécies mencionadas.
Quadro 18. Possibilidades de ângulos sólidos formados por polígonos de quatro lados e
cinco ou mais lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
(4,4,n,n)
4x(90°) + 2x(α) > 360°
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
(4,8,8)
115
1x(90°) + 2x(135°) > 360°
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Octaedro Truncado.
1x(90°) + 2x(120°) = 330°
(4,6,6)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 166.
(6) Espécie de ângulo sólido com polígonos de 5 lados e polígonos de n
lados (n ≥ 6).
Um único polígono de n lados não pode formar parte de um ângulo sólido, pois
a soma dos ângulos de três polígonos de 5 lados e um polígono de n lados é
maior que 360° e um ângulo de tipo (5,5,n) é excluído pela parte (i) do lema 2.
Se existirem dois polígonos de n lados, então a soma dos ângulos mostra
argumentos que o ângulo sólido deve ser do tipo (5,n,n). O menor valor dado a n
resulta em um icosaedro truncado (5,6,6). Para qualquer valor maior de n a soma
dos ângulos planos é maior do que 360°.
Mais do que dois polígonos de n lados conduz a uma soma de ângulos igual ou
maior a 360°.
O Quadro 19 indica as espécies mencionadas.
Quadro 19. Possibilidades de ângulos sólidos formados por polígonos de cinco lados e seis
ou mais lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°.
Portanto,
não
pode
ser
considerada.
(5,5,n,n)
2x(108°) + 2x(α) > 360°
A soma dos ângulos planos é maior que
360°.
(5,7,7)
Portanto,
não
pode
ser
considerada.
1x(108°) + 2x(900°/7) > 360°
116
A soma dos ângulos planos é menor que
360°.
Resulta
em
um
Icosaedro
Truncado.
(5,6,6)
1x(108°) + 2x(120°) = 348°
Fonte: Cromwell, 2008, p.166.
Em qualquer outra espécie de ângulo sólido que contém somente dois tipos
de polígonos, a menor possibilidade da soma dos ângulos resulta em dois
polígonos de 6 lados e um de 7 lados, e esta é maior do que 360°. Assim, todas
as espécies de ângulos sólidos que contém apenas dois tipos de polígonos já
foram abordadas. Mantém-se a considerar as espécies que envolvem três tipos
de polígono.
(7) Espécie de ângulo sólido que contém polígonos de 3 lados, polígonos
de 4 lados e polígonos de n lados (n ≥ 5).
Assume-se, em primeiro lugar, que existe um único polígono de n lados.
Se houvesse um polígono de 4 lados poderia haver, no máximo, dois polígonos
de 3 lados; as espécies que contém dois polígonos de 3 lados são excluídas pela
parte (ii) do lema 2; e o tipo de ângulo (3,4,n) é excluído pela parte (i) do lema 2.
O Quadro 20 indica a situação exposta.
Quadro 20. Possibilidades de ângulos sólidos formados por um polígono de quatro lados,
dois polígonos de três lados e um polígono de cinco ou mais lados.
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
3x(60°) + 1x(90°) + 2x(α) > 360°
(3,3,3,4,n)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (ii).
(3,n,3,4)
117
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (ii).
(3,3,n,4)
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (i).
(3,4,n)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 167.
Se existem dois polígonos de 4 lados e um único polígono de n lados no ângulo
sólido, então pode haver um único polígono de 3 lados, conforme mostra o
Quadro 21, de outra maneira a soma dos ângulos ultrapassaria 360°. A soma dos
ângulos é também superior a 360°se n ≥ 6.
Quadro 21. Possibilidades de ângulos sólidos formados por dois polígonos de
quatro lados e um polígono de cinco ou mais lados.
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo, mas
sim
planar.
Portanto,
não
pode
ser
considerada.
(3,4,4,6)
1x(90°) + 2x(90°) + 1x(120°) = 360°
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo, mas
sim
planar.
Portanto,
não
pode
ser
considerada.
(3,4,6,4)
1x(90°) + 2x(90°) + 1x(120°) = 360°
Impossível.
Excluído pelo Lema 2 (ii).
(3,4,4,5)
118
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Rombicosidodecaedro.
1x(60°) + 2x(90°) +1x(108°) = 348°
(3,4,5,4)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 167.
(8) Espécie de ângulos sólidos que contém três tipos de face, faces que
não são polígonos de 3 lados.
Supõe-se que quatro faces formam o ângulo sólido.
A menor combinação possível é ter dois polígonos de 4 lados, um de 5 lados e
um de 6 lados. A soma dos ângulos internos desses polígonos é maior do que
360°.
Dessa forma, devem existir três polígonos diferentes que formam o
ângulo sólido. A parte (i) do lema mostra que, neste caso, nenhum dos polígonos
pode ter um número ímpar de lados.
A menor combinação possível de faces é (4,6,8) que corresponde ao grande
rombicuboctaedro (ou cuboctaedro truncado).
A próxima menor combinação é (4,6,10) que corresponde ao grande
rombicosidodecaedro (ou icosidodecaedro truncado).
Em todas as outras combinações de faces a soma dos ângulos é muito grande
para produzir um ângulo sólido.
O Quadro 22 mostra a situação exposta.
Quadro 22. Possibilidades de ângulos sólidos formados por três polígonos que não são de
três lados.
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Cuboctaedro
Truncado.
1x(90°) + 1x(120°) +1x(135°) = 345°
(4,6,8)
119
A soma dos ângulos planos é menor que
360°. Resulta em um Icosidodecaedro
Truncado.
1x(90°) + 1x(120°) +1x(144°) = 354°
(4,6,10)
A soma dos ângulos planos é 360°. Essa
espécie não forma um ângulo convexo,
mas sim planar. Portanto, não pode ser
considerada.
1x(90°) + 1x(120°) + 1x(150°) = 360°
(4,6,12)
A soma dos ângulos planos é maior que
360°. Portanto, não pode ser considerada.
1x(90°) + 1x(135°) + 1x(144°) = 369°
(4,8,10)
Fonte: Cromwell, 2008, p. 167.
Todas as possibilidades de colocar polígonos regulares juntos para formar
um ângulo sólido foram consideradas e todos os tipos de ângulos sólidos que não
são excluídos pela simples condição dos lemas anteriores podem ser candidatos
a poliedros perfeitos, a um menor grau.
Depois de excluir, as famílias de prismas e antiprismas, as treze
possibilidades remanescentes são denominadas Sólidos de Arquimedes,
mostradas na Figura 52.
120
Figura 52. Sólidos Arquimedianos.
Fonte: Kepler, 1864, p.123 a 126.
De maneira sistemática, Kepler determinou que os treze poliedros
descritos são arquimedianos. No entanto, os nomes que Kepler atribui aos sólidos
de Arquimedes não refletem o seu método de construí-los, posto que a atribuição
se dá pela forma como os sólidos podem ser produzidos por truncamento. Para
Field (1997), o mérito de Kepler está em reencontrar o conjunto completo dos
Sólidos Arquimedianos e demonstrar que só existem treze.
Nesse sentido, somos levados a crer que cada uma das possibilidades
enumeradas para os vértices dos poliedros somente nos conduz a um único
poliedro. No entanto, isso não acontece para um sólido arquimediano, como
apresentado no que segue.
3.5 TREZE OU QUATORZE ARQUIMEDIANOS?
Para Cromwell (2008), a descrição de Pappus dos Sólidos Arquimedianos
como figuras compostas por polígonos eqüilaterais e eqüiangulares, mas não
similares, não é suficiente para caracterizá-los. A condição de Pappus requer
apenas que um sólido arquimediano tenha como faces polígonos regulares,
quanto à disposição dessas faces nada foi mencionado.
121
É importante ressaltar, que de acordo com a definição adotada por
Pappus e depois por Kepler, existem quatorze e não treze Sólidos Arquimedianos.
Cromwell
(2008)
aponta
que
Miller
ao
tentar
fazer
um
modelo
do
rombicuboctaedro, ficou surpreso ao verificar que tinha reunido pedaços de
maneira incorreta.
O autor aponta que os pedaços reunidos por Miller são os chamados
poliedros elementares de Norman Johnson, que os definiu como poliedro de faces
regulares que não podem ser separados por um plano em dois menores poliedros
de faces também regulares. Todos os outros poliedros de faces regulares podem
ser formados por estas unidades básicas reunidas em diferentes maneiras.
O sólido encontrado por Miller, chamado de pseudo rombicuboctaedro, de
acordo com Cromwell (2008) e Veloso (1998), também era familiar a Kepler, o
que mais tarde o fez considerar os Sólidos Arquimedianos em número quatorze.
No entanto, Kepler não acrescentou qualquer outra informação. O quadro 23 traz
a ilustração do pseudo rombicuboctaedro, bem como suas características
numéricas.
Quadro 23. Pseudo Rombicuboctaedro.
Características:
24 vértices;
18 faces quadradas;
8 faces triangulares;
48 arestas.
O Sólido de Miller respeita a definição dada aos Sólidos Arquimedianos
por apresentar todos os ângulos sólidos iguais, arestas congruentes e faces de
mais de um tipo. Cromwell (2008) pontua o interesse de alguns estudiosos em
considerar esse poliedro como o décimo quarto sólido arquimediano. Isso,
entretanto, falha em um ponto: os verdadeiros Sólidos Arquimedianos, assim
como os sólidos platônicos, tem uma natureza estética que o sólido de Miller não
possui. Essa natureza provém de seu elevado grau de simetria – uma
propriedade, que de acordo com Cromwell (2008), pode ser facilmente apreciada
e entendida no nível intuitivo. Portanto, a condição dos ângulos sólidos serem
122
todos congruentes não é a característica mais importante dos sólidos
arquimedianos, mas sim o fato de todos os ângulos sólidos serem indistinguíveis
a partir de outro.
Na Figura 53, temos o sólido arquimediano rombicuboctaedro à direita, e
o pseudo rombicuboctaedro ou Sólido de Miller à esquerda. Observa-se que os
vértices continuam com os mesmos polígonos e dispostos da mesma maneira.
Porém, não há qualquer transformação de simetria do poliedro que transforme o
vértice A no vértice B, por exemplo. Assim, esse poliedro obtido é muito menos
simétrico que o rombicuboctaedro.
Os vértices em um sólido arquimediano são cercados por mesmas faces
arranjadas de uma mesma maneira, e cada vértice desempenha o mesmo papel
no poliedro como um todo. Para o sólido de Miller este não é o caso. Ao observar
a Figura 53 podemos constatar que a parte inferior do sólido foi deslocada em
45º.
Figura 53. Rombicuboctaedro e pseudo rombicuboctaedro.
Fonte: Veloso, 1998, p 241.
De acordo com Soler (2007, p.135), se quisermos excluir esse poliedro da
família dos arquimedianos, uma nova definição para os poliedros arquimedianos
deve ser considerada. Nesse sentido, a autora sugere a seguinte definição: “são
poliedros que têm faces regulares de mais de uma classe, enquanto que todos os
vértices se transformam um nos outros por seu grupo de rotação”.
Conforme
mencionado
anteriormente,
os
Sólidos
Arquimedianos
apresentam duas características principais. A primeira delas é que toda face do
poliedro é um polígono regular, embora as faces não sejam todas do mesmo tipo.
123
A segunda está relacionada à congruência de um vértice do poliedro a qualquer
outro, uma vez que as faces estão arranjadas na mesma ordem em torno de cada
vértice.
Embora os sólidos arquimedianos sejam atribuídos a Arquimedes, Kepler
parece ter sido o primeiro matemático a sistematizá-los. Ele, ainda, descobriu
duas infinitas famílias de prismas e antiprismas que também possuem vértices
congruentes e faces regulares. Os prismas regulares satisfazem a definição de
poliedros semi-regulares se as faces laterais são quadrados. O mesmo acontece
se os antiprismas regulares apresentarem como faces laterais triângulos
eqüiláteros. Entretanto, como em ambos os casos não há limite para o número de
poliedros que respeitem essa condição, eles não serão de nosso interesse.
Também foi demonstrado que além dessas duas famílias existem apenas
treze Sólidos Arquimedianos. Esses sólidos também podem ser obtidos como
produto de uma modificação, isto é, por truncamento de outros poliedros,
processos de construção estudados e determinados no próximo capítulo.
124
CAPÍTULO 4 – ESTUDO DIDÁTICO E MATEMÁTICO
No
presente
capítulo
retomamos
alguns
aspectos
e
pontos
já
mencionados, no segundo e no terceiro capítulos, para apresentar uma
possibilidade para o ensino e a aprendizagem dos Sólidos Arquimedianos e sua
inclusão na Educação Básica por meio do ambiente de Geometria Dinâmica Cabri
3D.
Essa possibilidade surgiu a partir do estudo histórico dos Sólidos
Arquimedianos, posto que nos permitiu identificar o truncamento, procedimento
matemático utilizado por artistas renascentistas para a obtenção de onze dos
treze Sólidos Arquimedianos. Esse procedimento evidenciou um caminho de
construção para os sólidos bem diferente do apresentado nos livros encontrados
de Desenho Geométrico, a planificação de suas superfícies.
Nesse capítulo, discorremos sobre a operação de truncamento, bem
como os tipos de truncamentos possíveis para a obtenção de sete Sólidos
Arquimedianos, obtidos a partir de truncaturas diretas em sólidos platônicos.
Trazemos, também, a matemática utilizada em cada processo de construção,
assim como os passos de geração no Cabri 3D de cada arquimediano a partir do
sólido platônico de origem.
Realizadas as construções no Cabri 3D, partimos para a análise de cada
arquimediano construído com base em nosso quadro teórico, identificando os
saberes matemáticos e os registros de representação envolvidos no processo. É
a partir dessa análise que a questão de pesquisa - O objeto matemático Sólidos
Arquimedianos pode ser resgatado como objeto de ensino para a Escola Básica,
utilizando como habitat o ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D? - é
respondida.
4.1 OPERAÇÃO DE TRUNCAMENTO
Nesse
tópico,
apresentamos
a
sistematização
da
operação
de
truncamento de Piero della Francesca e os tipos de truncamentos efetuados em
sólidos platônicos para a obtenção de Sólidos Arquimedianos.
126
Existem apenas treze Sólidos Arquimedianos e todos são obtidos por
operações sobre os sólidos platônicos. A Figura 54 ilustra onze dos treze Sólidos
Arquimedianos, incluindo os nomes, que podem ser obtidos por meio de uma
sucessão de cortes, chamados de truncaturas. Os demais, cubo achatado e
dodecaedro achatado, são obtidos por snubificação12 de sólidos platônicos.
Figura 54. Sólidos Arquimedianos obtidos por truncaturas.
Os sete primeiros arquimedianos, ilustrados na Figura 54, são obtidos a
partir de truncaturas feitas nas arestas de um único sólido, sendo este platônico.
Os quatro últimos - cuboctaedro truncado, rombicuboctaedro, icosidodecaedro
truncado e rombicosidodecaedro - são obtidos a partir de truncaturas nas arestas
de três sólidos, um deles platônico, como mostra a Figura 55, e seguem uma
seqüência de truncamento.
____________
12
Nesse caso, segundo Veloso (1998) a operação consiste em afastar todas as faces de um
poliedro platônico, girá-las a 45° e preencher os espaços vazios resultantes com triângulos.
127
Figura 55. Arquimedianos obtidos por truncaturas modificadas.
A Figura 55 nos indica que a partir do cubo ou do octaedro regular
podemos chegar nos arquimedianos cuboctaedro truncado e rombicuboctaedro,
entretanto observamos que um poliedro intermediário (com faces retangulares e
octogonais)
aparece
no
processo.
Dessa
forma,
para
chegarmos
nos
arquimedianos indicados, o poliedro intermediário deve ter suas arestas truncadas
de maneira que os retângulos resultem em quadrados. O mesmo acontece para
os arquimedianos icosidodecaedro truncado e rombicuboctaedro obtidos a partir
do icosaedro regular ou do dodecaedro regular.
Nesse sentido, para a obtenção de arquimedianos a partir de truncaturas
em platônicos, optamos denominar de truncaturas diretas, as truncaturas que
envolvem apenas um sólido, sendo este platônico,
e de truncaturas
modificadas, as truncaturas diretas em sólidos platônicos seguidas de
transformações convenientes.
Tendo em vista que a construção dos onze Sólidos Arquimedianos se
inicia a partir de sólidos platônicos, optamos estudar no trabalho os
arquimedianos obtidos por truncaturas diretas, os demais serão estudados em
trabalhos futuros.
128
Os sete arquimedianos13 obtidos por truncaturas diretas, conservam uma
relação com os poliedros platônicos que se torna mais evidente a partir da
operação de truncamento. Tal operação está aqui relacionada ao corte de cantos
de poliedros platônicos de maneira a obter poliedros com todas as faces
regulares. Para a obtenção desses sete arquimedianos, consideramos dois tipos
de truncamento:
 TRUNCAMENTO TIPO 1: nesse tipo de truncamento, o corte se realiza
por planos que passam pelos pontos médios das arestas do poliedro
platônico de partida que concorrem em um vértice. A Figura 56 ilustra o
arquimediano cuboctaedro obtido a partir de truncaturas nas arestas do
cubo.
Figura 56. Truncamento tipo 1.
 TRUNCAMENTO TIPO 2: nesse tipo de truncamento, o corte nas
arestas do platônico de partida se realiza por planos a uma distância
adequada de cada vértice, para que por cada face do poliedro de partida
resulte em um polígono regular. A Figura 57 ilustra o arquimediano cubo
truncado obtido a partir de truncaturas nas arestas do cubo.
Figura 57. Truncamento tipo 2.
____________
13
Cuboctaedro, icosidodecaedro, tetraedro truncado, octaedro truncado, icosaedro truncado, cubo
truncado e dodecaedro truncado.
129
Ambos os tipos de truncamento nos conduzem a eliminação de cantos do
poliedro de partida. Ao eliminar cantos de poliedros platônicos deduz-que
1. Quando eliminamos um canto do tetraedro regular, do cubo ou do
dodecaedro regular, obtemos um triângulo, conforme mostra a Figura 58,
uma vez que em seus vértices concorrem três arestas.
Figura 58. Eliminação do canto do tetraedro, do cubo e do dodecaedro.
2. Na eliminação de um canto do octaedro regular obtemos um quadrilátero,
Figura 59, visto que quatro arestas concorrem em seus vértices.
Figura 59. Eliminação do canto do octaedro.
3. Já na eliminação de um canto do icosaedro, vértice em que cinco arestas
concorrem, um pentágono é obtido, conforme mostra a Figura 60.
Figura 60. Eliminação do canto do icosaedro.
130
As características numéricas, isto é, número de arestas de cada face,
bem como o número vértices e ordem de um poliedro obtido por truncamento
podem ser estabelecidos a partir do sólido que se trunca e dependem também do
tipo de truncamento como mostramos a seguir.
4.1.1 ARQUIMEDIANOS OBTIDOS POR TRUNCAMENTO TIPO 1
Dois Sólidos Arquimedianos são obtidos ao truncar poliedros platônicos
por planos que passam pelos pontos médios de suas arestas: cuboctaedro e
icosidodecaedro. Os próprios nomes dos sólidos sugerem os poliedros platônicos
a partir do qual se originam:
Cuboctaedro: esse arquimediano apresenta quatorze faces, seis
quadradas e oito triangulares, e pode ser obtido por truncaturas nos
pontos médios das arestas cubo ou do octaedro regular. A Figura 61
ilustra o cuboctaedro (no centro) gerado a partir do cubo (à esquerda) ou
do octaedro (à direita).
Figura 61. Cuboctaedro gerado a partir do cubo ou octaedro.
Icosidodecaedro: esse arquimediano apresenta trinta e duas faces,
doze pentagonais e vinte triangulares, e pode ser obtido por truncaturas
nos pontos médios das arestas do dodecaedro regular ou icosaedro
regular. A Figura 62 ilustra o icosidodecaedro (centro) gerado a partir do
dodecaedro regular (à esquerda) ou do icosaedro regular (à direita).
Figura 62. Icosidodecaedro a partir do dodecaedro ou icosaedro.
131
4.1.2 ARQUIMEDIANOS OBTIDOS POR TRUNCAMENTO TIPO 2
Cinco Sólidos Arquimedianos são obtidos ao truncar poliedros platônicos
por planos que passam por pontos, em cada aresta, eqüidistantes a seus vértices:
tetraedro truncado, cubo truncado, octaedro truncado, dodecaedro truncado e
icosaedro truncado. Seus nomes sugerem os poliedros platônicos a partir do qual
se originam.
Os cinco sólidos arquimedianos obtidos por esse tipo de truncamento
apresentam dois tipos de faces. Cada tipo de face está relacionado à eliminação
do canto do poliedro platônico ou à truncatura de arestas das faces. Quanto às
faces que provêm das truncaturas das arestas de platônicos, apresentamos três
casos, a saber:
Tetraedro truncado, Octaedro truncado e Icosaedro truncado: esses
poliedros se originam de poliedros platônicos cujas faces são formadas
por triângulos eqüiláteros (tetraedro, octaedro e icosaedro), conforme
mostra a Figura 63. As arestas das faces do tetraedro regular, octaedro
regular e icosaedro regular quando truncadas resultam em faces
hexagonais regulares.
Figura 63. Face hexagonal.
Para que as faces hexagonais regulares dos arquimedianos (tetraedro
truncado, octaedro truncado e icosaedro truncado) sejam obtidas a partir das
faces triangulares regulares dos poliedros de partida (tetraedro regular, octaedro
regular e icosaedro regular), precisamos encontrar a distância entre o vértice e o
ponto da aresta do platônico de partida em que deve ser efetuada a truncatura.
Nesse sentido, dada uma face ABC triangular do platônico de partida,
como pode ser observada na Figura 64, tem-se que: P1 e P2 são os pontos de
132
corte da aresta AB; P3 e P4 são pontos de corte da aresta BC; P5 e P6 são os
pontos de corte da aresta AC; a é a aresta da face e d a distância entre um vértice
e um ponto de corte.
Figura 64. Pontos de corte no triângulo.
Podemos então deduzir, que o triângulo AP1P6 é eqüilátero, pois M(Â)=60º
e AP1≡AP6. Dessa forma, temos que: d = a – 2d, logo d = a/3. Com d encontrado,
as truncaturas nas arestas dos poliedros platônicos de partidas podem ser
realizadas.
Cubo truncado: esse poliedro se origina do cubo cujas faces são
formadas por quadrados. As arestas das faces do cubo quando
truncadas devem resultar em faces octogonais regulares, como mostra a
Figura 65.
Figura 65. Face octogonal.
Para que as faces octogonais regulares do arquimediano cubo truncado
sejam obtidas a partir das faces quadradas do poliedro de partida cubo,
precisamos encontrar a distância entre o vértice e o ponto da aresta do cubo em
que deve ser efetuada a truncatura.
133
Nesse sentido, dada uma face ABCD do cubo, como pode ser observada
na Figura 66, tem-se que: P1 e P2 são os pontos de corte da aresta AB; P3 e P4
são pontos de corte da aresta BC; P5 e P6 são os pontos de corte da aresta CD;
P7 e P8 são os pontos de corte da aresta AD; a é a aresta da face e d a distância
entre um vértice e um ponto de corte.
Figura 66. Pontos de corte no quadrado.
Podemos então deduzir que, o triângulo AP1P8 é retângulo, pois
M(Â)=90º. Dessa forma, aplicando o teorema de Pitágoras, temos que:
d²
d²
2d²
(a
(a
2d²
2d)²
2d)²
(a
2d)²
d 2
a
2d
d 2
2d
a
d( 2
2)
a
a
d
2
2
Observamos que a distância encontrada é um número irracional, portanto
vamos trabalhar com uma distância aproximada. Com a distância encontrada, as
truncaturas nas arestas do cubo podem ser efetuadas.
Dodecaedro truncado: esse poliedro se origina do dodecaedro regular
cujas faces são formadas por pentágonos regulares. As arestas das
faces do dodecaedro regular quando truncadas devem resultar em faces
decagonais regulares, como mostra a Figura 67.
134
Figura 67. Face decagonal.
Para que as faces decagonais regulares do arquimediano dodecaedro
truncado sejam obtidas a partir das faces pentagonais regulares do poliedro de
partida dodecaedro regular, precisamos encontrar a distância entre o vértice e o
ponto da aresta do dodecaedro regular em que deve ser efetuada a truncatura.
Nesse sentido, dada uma face ABCDE do dodecaedro regular, como
pode ser observada na Figura 68, tem-se que: P1 e P2 são os pontos de corte da
aresta AB; P3 e P4 são pontos de corte da aresta BC; P5 e P6 são os pontos de
corte da aresta CD; P7 e P8 são os pontos de corte da aresta DE; P9 e P10 são os
pontos de corte da aresta AE; a é a aresta da face e d a distância entre um vértice
e um ponto de corte.
Figura 68. Pontos de corte no pentágono.
Dessa forma, se tomarmos o triângulo AP1P10, com M(Â)=108º, pela lei
dos cossenos podemos deduzir que: (a – 2d)2 = d2 + d2 – 2dd.cos108° (1). Por
135
outro lado sabemos que cos108° = cos(90°+18°), ou seja, cos108° = cos90°.
.cos18° - sen90°.sen 18°. Assim, concluímos que cos108° = - sen18° (2).
Com a substituição de (2) em (1), obtemos: (a - d)2 = d2 + d2 + 2dd.sen18°
(3). Observamos que se encontramos sen18° e o substituirmos na equação (3),
encontramos d. Deste modo, precisamos encontrar sen18°.
Para tanto, ao observarmos a Figura 68, percebemos que os pontos de
corte na face ABCDE do dodecaedro regular, corresponderão aos vértices de
uma das faces decagonais regulares do arquimediano dodecaedro truncado.
Para encontrarmos o sen18° e assim obter d, consideramos a
circunferência circunscrita a uma das faces do dodecaedro truncado, como vemos
na Figura 69, que tem centro em O e raio r e l10 o lado do decágono regular.
Dessa forma, se tomarmos o triângulo OP4P5, com M(Ô)=36°, podemos deduzir
que: o triângulo OP4P5 é isósceles, pois os segmentos OP4 e OP5 são
congruentes. Pela soma dos ângulos internos de um triângulo, podemos também
concluir que os ângulos P4 e P5 medem 72°.
O
Figura 69. Circunferência circunscrita ao decágono.
Obtendo a bissetriz OQ do ângulo O, como mostra a Figura 70, podemos
concluir que: os triângulos OQP4 e OQP5 são retângulos e que os segmentos QP4
e QP5 correspondem a metade do lado do decágono. Assim, sen18°= l10/2r (4).
136
Figura 70. Triângulo 1.
Para encontrarmos l10 e assim sen18°, retomamos o triângulo OP4P5 e
obtemos a bissetriz P4T do ângulo P4, como mostra a Figura 71. Se tomarmos o
triângulo P4P5T, pela propriedade da soma dos ângulos internos de um triângulo,
concluímos que o ângulo P4TP5 mede 72°, logo P4T l10. Como no triângulo P4OT,
os segmentos P4T e OT são congruentes, concluímos que OT
l10. Assim,
aplicando o teorema da bissetriz interna no triângulo OP 4P5, podemos deduzir que
r/ l10=l10 / (r-l10) ↔l102 + r l10 – r2 = 0.
Figura 71. Triângulo 2.
Desenvolvendo a equação polinomial do 2°, deduzimos que:
l10
137
r
5r²
2
(5)
Com l10 determinado podemos obter sen18°. Para isso, substituímos (5)
em (4) e concluímos que:
5 1
4
sen18º
(6)
Encontrado sen18°, podemos encontrar d. Para isso, substituímos (6) em
(3) e concluímos que:
( a 2 d )²
2d ²
( a 2 d )²
d² 2 2
( a 2 d )²
d² 2
( a 2 d )²
d ².
( a 2 d )²
d ².
( a 2 d )²
a 2d
d.
5 1
4
2 d ².
5
1
4
5
1
2
4
5 1
2
5
3
2
d ².
3
3
5
2
5
(7)
2
Para tornarmos a igualdade acima mais simples, consideramos:
3
5
x
y , com x e y reais
(8)
Ao desenvolvermos a igualdade, chegamos ao sistema de equações:
x
y
4 xy
3
5
Dessa maneira, podemos deduzir que: x
5
2
e y
1
2
Substituindo em (8) os valores de x e y encontrados, constatamos que:
138
3
5
3
5
5
2
1
2
1
5
2
(10)
Se substituirmos (10) em (7) encontramos d:
a 2d
d.
a 2d
d.
a
2d
d.
a
d. 2
a
d.
d
1
5
2. 2
1
5
2
1
5
2
1
5
2
5
5
2
2a
5
5
Observamos que a distância encontrada é um número irracional,
portanto, vamos trabalhar com uma distância aproximada. Encontrada a distância
entre o vértice do dodecaedro regular e o ponto da aresta em que será efetuada a
truncatura, a construção do dodecaedro truncado pode ser iniciada.
Diante do que foi exposto, podemos observar que os Sólidos
Arquimedianos obtidos por truncamento tipo 2 só podem ser construídos se
encontrada a distância entre o vértice do poliedro platônico de partida e o ponto
de corte. Como para cada caso já determinamos como encontrar os pontos de
corte, no que segue mostramos as construções dos Sólidos Arquimedianos
obtidos por truncamento tipo 1 e tipo 2 realizadas com o auxílio do ambiente Cabri
3D.
139
4.2. AS CONSTRUÇÕES E SUAS ANÁLISES
Em
nossa
problemática
propusemo-nos
revisitar
os
Sólidos
Arquimedianos por meio de suas construções no ambiente de Geometria
Dinâmica Cabri 3D. Essa parte do trabalho tem como propósito apresentar os
passos de geração de cada arquimediano no Cabri 3D e analisar as construções
com base na Ecologia dos objetos matemáticos de Chevallard e na teoria de
Registro de Representação Semiótica de Duval.
De acordo com Chevallard (1991), o objeto matemático Sólidos
Arquimedianos existe se uma pessoa ou instituição o reconhece. Entretanto, para
que esse mesmo objeto se transforme em objeto de ensino é necessário
identificar onde ele vive, ou pode viver, e que função possui, isto é, seu habitat e
seu nicho. Para identificar seu habitat, alguns aspectos precisam ser
considerados, tais como: os saberes que possibilitam a existência do objeto
matemático Sólidos Arquimedianos e as relações inter-hierárquicas entre esses
saberes com o próprio objeto.
Nesse
sentido,
nossas
unidades
de
análise
para
cada
sólido
arquimediano obtido por truncaturas em arestas de sólidos platônicos têm por
base os saberes mobilizados para suas construções, a função que cada saber
assume no processo e as relações inter-hierárquicas entre o sólido arquimediano
produzido e o sólido platônico que o originou. Dessa forma, nos aproximamos dos
saberes envolvidos no processo e verificamos se o ambiente Cabri 3D, o
reconhece como objeto, bem como contribui para que se transforme em objeto de
ensino.
Quanto à teoria de Duval (2002), nossas unidades de análise têm por
base evidenciar os tratamentos efetuados no registro figural e a possível
articulação entre o registro figural e um registro discursivo, diálogo indispensável
em toda atividade geométrica.
Nossas
construções
e
análises
são
apresentadas
por
tipo
de
truncamento, mostradas no que segue.
140
4.2.1 TRUNCAMENTO TIPO 1
Nesse
tópico
são
apresentadas
as
construções
dos
sólidos
arquimedianos cuboctaedro e icosidodecaedro no ambiente Cabri 3D.
4.2.1.1 CUBOCTAEDRO
Como vimos anteriormente, para gerar o cuboctaedro precisamos truncar
as arestas, do cubo ou do octaedro regular, em seus pontos médios. Mostramos a
seguir esse processo com o auxílio do Cabri 3D.
Geração do cuboctaedro a partir do cubo no Cabri 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do cuboctaedro com a criação do
cubo. Para que o cubo seja criado, como mostram as Figuras 72 e 73, acionamos
na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta cubo. Em seguida clicamos com o
mouse no plano de base, arrastando-o, e por fim um duplo clique.
Figura 72. Ferramenta cubo.
Figura 73. Cubo.
141
Passo 2: Com o cubo já criado, marcamos o ponto médio de cada aresta. Para
isso, como mostra a Figura 74, acionamos a ferramenta ponto médio e indicamos
com o clique do mouse as arestas do cubo.
Figura 74. Pontos médios das arestas do cubo.
Passo 3: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do cubo
com a determinação do plano que deve ser criado. Para isso, com a utilização da
ferramenta plano e com a indicação de três pontos médios das arestas que
concorrem em um vértice, conforme mostra a Figura 75, obtemos o plano de
secção.
Figura 75. Plano de secção (cubo).
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do cubo será
eliminado. Como mostra a Figura 76, indicamos o plano obtido no passo 3 e o
canto do cubo que contém o vértice desejado. Com o recurso esconder/mostrar
podemos optar em esconder o plano, o que facilita a eliminação dos demais
cantos do cubo.
142
Figura 76. Eliminação do canto do cubo.
Passo 5: Nesse passo efetua-se o mesmo procedimento do passo 4 para a
eliminação dos demais cantos do cubo. A Figura 77 mostra o resultado obtido,
isto é, o cuboctaedro .
Figura 77. Cuboctaedro.
Geração do cuboctaedro a partir do octaedro regular
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do cuboctaedro com a criação do
octaedro regular. Como mostram as Figuras 78 e 79, para que o octaedro seja
criado, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta octaedro. Em
seguida clicamos com o mouse no plano de base, arrastando-o, e por fim um
duplo clique.
Figura 78. Ferramenta octaedro regular.
143
Figura 79. Octaedro Regular.
Passo 2: Com o octaedro já criado, como mostra a Figura 80, marcamos o ponto
médio de cada aresta. Para isso acionamos a ferramenta ponto médio e em
seguida indicamos com o clique do mouse as arestas do octaedro.
Figura 80. Pontos médios das arestas do octaedro regular.
Passo 3: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do
octaedro regular. Assim, como mostra a Figura 81, um plano de secção deve ser
criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos
médios das arestas que concorrem em um vértice.
Figura 81. Plano de secção (octaedro regular).
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro o primeiro vértice do octaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 82, indicamos o plano
144
obtido no passo 3 e o canto do octaedro que contém o vértice desejado. Com o
recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano, o que facilita a
eliminação dos demais cantos do octaedro.
Figura 82. Eliminação do canto do octaedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetuamos o mesmo procedimento do passo 4
para a eliminação dos demais cantos do octaedro regular. O resultado obtido é o
cuboctaedro, já ilustrado na Figura 77.
4.2.1.2 ICOSIDODECAEDRO
Como vimos anteriormente, para gerar o icosidodecaedro precisamos
truncar as arestas, do icosaedro regular ou do dodecaedro regular em seus
pontos médios. Mostramos no que segue esse processo com o auxílio do Cabri
3D.
Geração do icosidodecaedro a partir do dodecaedro regular no Cabri 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do icosidodecaedro com a criação do
dodecaedro regular. Como mostram as Figura 83 e 84, para que o dodecaedro
seja criado, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta
dodecaedro regular. Em seguida clicamos com o mouse no plano de base,
arrastando-o, e por fim um duplo clique.
Figura 83. Ferramenta dodecaedro regular.
145
Figura 84. Dodecaedro regular.
Passo 2: Com o dodecaedro já criado, marcamos o ponto médio de cada aresta e
como mostra a Figura 85 selecionamos a ferramenta ponto médio, e em seguida
indicamos com o clique do mouse as arestas do dodecaedro regular.
Figura 85. Pontos médios das arestas do dodecaedro regular.
Passo 3: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do
dodecaedro regular. Assim, como mostra a Figura 86, um plano de secção deve
ser criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos
médios das arestas que concorrem em um vértice.
Figura 86. Plano de secção (dodecaedro regular).
146
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do dodecaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 87, indicamos o plano
obtido no passo 3 e o canto do dodecaedro regular que contém o vértice
desejado. Com o recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano,
o que facilita a eliminação dos demais cantos do dodecaedro regular.
Figura 87. Eliminação do canto do dodecaedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetua-se o mesmo procedimento do passo 4 para a
eliminação dos demais cantos do dodecaedro regular. A Figura 88 mostra o
resultado obtido, isto é, o icosidodecaedro.
Figura 88. Icosidodecaedro
Geração do icosidodecaedro a partir do icosaedro regular no Cabri 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do icosidodecaedro com a criação do
icosaedro regular. Para que o icosaedro regular seja criado, como mostram as
Figuras 89 e 90, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta
147
icosaedro regular. Em seguida clicamos com o mouse no plano de base,
arrastando-o, e por fim um duplo clique.
Figura 89. Ferramenta icosaedro regular.
Figura 90. Icosaedro Regular.
Passo 2: Com o icosaedro regular já criado, como mostra a Figura 91, marcamos
o ponto médio de cada aresta. Para isso acionamos a ferramenta ponto médio e
em seguida indicamos com o clique do mouse as arestas do poliedro.
Figura 91. Pontos médios das arestas do dodecaedro regular.
148
Passo 3: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do
icosaedro regular. Assim, como mostra a Figura 92, um plano de secção deve ser
criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos
médios das arestas que concorrem em um vértice.
Figura 92. Plano de secção (dodecaedro regular).
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro o primeiro canto do icosaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 93, indicamos o plano
obtido no passo 3 e o canto do poliedro que contém o vértice desejado. Com o
recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano, o que facilita a
eliminação dos demais cantos do icosaedro regular.
Figura 93. Eliminação do canto do icosaedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetuamos o mesmo procedimento do passo 4 para a
eliminação dos demais cantos do icosaedro regular. O resultado obtido, já
ilustrado na Figura 88, é o icosidodecaedro.
149
ANÁLISE DAS CONSTRUÇÕES DOS ARQUIMEDIANOS CUBOCTAEDRO E
ICOSIDODECAEDRO
Observamos que as construções no Cabri 3D dos arquimedianos
cuboctaedro e icosidodecaedro só foram possíveis a partir do estudo realizado no
tópico anterior, no qual discutimos o processo de construção por truncamento tipo
1. Essa discussão foi fundamental para identificarmos que pontos de truncaturas,
correspondem aos pontos médios das arestas dos poliedros platônicos de partida
(cubo, octaedro, dodecaedro e icosaedro), sem isso as construções não seriam
possíveis.
Assim, entendemos que esses dois arquimedianos foram construídos a
partir da articulação entre o registro figural dinâmico e um registro discursivo,
nesse caso, registro da língua natural. Nesse sentido, os tratamentos apenas
figurais – construções do cubo, octaedro regular, icosaedro regular, dodecaedro
regular, ponto médio, secção plana e eliminação dos cantos dos poliedros
platônicos – não foram suficientes para geração no Cabri 3D dos sólidos
arquimedianos cuboctaedro e icosidodecaedro.
Realizadas as construções no Cabri 3D dos sólidos arquimedianos
cuboctaedro e icosidodecaedro, percebemos que apenas saberes geométricos
viveram e interagiram entre si. Os saberes matemáticos envolvidos em todo o
processo foram os poliedros de partida cubo e octaedro regular para a construção
do cuboctaedro e os poliedros de partida icosaedro regular e dodecaedro regular
para a construção do icosidodecaedro, além de ponto médio e de secção plana.
Esses saberes envolvidos foram reconhecidos como objeto pela
instituição Cabri 3D por meio das ferramentas cubo, octaedro regular, icosaedro
regular, dodecaedro regular, ponto médio e plano, pois cada um deles
desempenhou um papel na construção. Enquanto os poliedros platônicos
apresentavam o objeto geométrico que seria truncado, isto é, o poliedro de
partida, os pontos médios determinavam os pontos em que as truncaturas
deveriam ser efetuadas e os planos auxiliavam a eliminação dos cantos do
poliedro platônico de partida.
Estendendo um pouco mais a problemática ecológica dos objetos
matemáticos proposta por Chevallard, podemos ainda inserir em nossa análise a
150
idéia de competição entre saberes - apoiada no conceito de competição entre
espécies da ecologia biológica. Assim, podemos dizer que o saber “cubo” e o
saber “octaedro regular” desempenham a mesma função e competem entre si
(pois ambos servem de poliedro de partida) no processo de construção do
arquimediano cuboctaedro. O mesmo acontece com os saberes “icosaedro
regular” e “dodecaedro regular” no processo de construção do icosidodecaedro.
Percebemos relações inter-hierárquicas entre os poliedros platônicos de
partida e os sólidos arquimedianos construídos. Os arquimedianos cuboctaedro e
icosidodecaedro apresentam faces de dois tipos. Enquanto um tipo de face está
atrelado à eliminação dos cantos, o outro tipo está atrelado a truncatura das
arestas das faces.
No caso do cuboctaedro gerado a partir do cubo, as suas oito faces
triangulares provêm da eliminação dos oito cantos do cubo e as suas seis faces
quadradas provêm das truncaturas das arestas das seis faces do cubo. Quando
esse mesmo arquimediano é gerado a partir do octaedro regular, as suas seis
faces quadradas passam a ser obtidas pela eliminação dos seis cantos do
octaedro regular e as suas oito faces triangulares pelas truncaturas das arestas
das oito faces do octaedro regular.
Esse
mesmo
raciocínio
pode
ser
observado
no
arquimediano
icosidodecaedro com faces formadas por pentágonos e triângulos. Quando
gerado a partir do icosaedro regular, as suas doze faces pentagonais provêm da
eliminação dos doze cantos do icosaedro regular e suas vinte faces triangulares
provêm das truncaturas das arestas das vinte faces do icosaedro regular. Quando
esse mesmo arquimediano é obtido a partir do dodecaedro regular, as suas vinte
faces triangulares passam a ser obtidas pela da eliminação dos vinte cantos do
dodecaedro regular e as suas doze faces pentagonais pelas truncaturas das
arestas das doze faces do dodecaedro regular.
Outra relação observada entre o poliedro de partida e o arquimediano
produzido diz respeito ao número total de vértices de ambos os poliedros
arquimedianos construídos. Esse total é igual ao número de arestas dos poliedros
platônicos de partida, visto que em cada aresta há somente um ponto de
truncatura, o que origina cada vértice arquimediano.
151
Assim, entendemos que o Cabri 3D se confirmou como um habitat para o
estudo dos Sólidos Arquimedianos cuboctaedro e icosidodecaedro na medida em
que reconheceu como objetos todos os saberes que determinam a existência dos
mesmos.
4.2.2 TRUNCAMENTO TIPO 2
Nesse tópico são apresentadas as construções no Cabri 3D dos sólidos
arquimedianos: tetraedro truncado, octaedro truncado, icosaedro truncado, cubo
truncado e dodecaedro truncado.
4.2.2.2 TETRAEDRO TRUNCADO, OCTAEDRO TRUNCADO E ICOSAEDRO
TRUNCADO
Como vimos anteriormente, o processo de geração dos Sólidos
Arquimedianos tetraedro truncado, octaedro truncado e icosaedro truncado, inicia
a partir da divisão das arestas dos poliedros platônicos de partida em três partes
congruentes.
Sabemos que as faces do tetraedro regular, octaedro regular e icosaedro
regular (platônicos de partida), são formadas por triângulos eqüiláteros. Nesse
sentido, como mostra a Figura 94, tomamos uma face triangular qualquer e
apontamos com o uso de ferramentas do Cabri 3D, dois caminhos para dividir as
arestas da face ABC em três partes congruentes. Um é por transferência de
medidas que detalhamos no apêndice A, e o outro é pelo teorema de tales que
também está detalhado no apêndice B.
Figura 94. Face triangular ABC.
152
GERAÇÃO DO TETRAEDRO TRUNCADO NO CABRI 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do tetraedro truncado com a criação do
tetraedro regular. Como mostram as Figuras 95 e 96, para que o tetraedro regular
seja criado, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta tetraedro
regular. Em seguida clicamos com o mouse no plano de base, arrastando-o, e por
fim um duplo clique.
Figura 95. Ferramenta tetraedro regular.
Figura 96. Tetraedro regular.
Passo 2: Com o tetraedro regular já criado, como ilustra a Figura 97, dividimos
cada aresta do poliedro em três partes congruentes (apêndice A ou B).
Figura 97. Arestas do tetraedro divididas em três partes congruentes.
153
Passo 3: Nesse passo, como mostra a Figura 98, iniciamos o processo de
eliminação dos cantos do tetraedro regular. Assim, um plano de secção deve ser
criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos, das
arestas que concorrem em um vértice, sendo esses os mais próximos do vértice
desejado.
Figura 98. Plano de secção (tetraedro regular).
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do tetraedro
regular será eliminado. Para isso, como podemos ver na Figura 99, indicamos o
plano obtido no passo 3 e o canto do tetraedro regular que contém o vértice
desejado. Com o recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano,
o que facilita a eliminação dos demais vértices.
Figura 99. Eliminação do canto do tetraedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetuamos o mesmo procedimento do passo 3 e 4 para a
eliminação dos demais cantos do tetraedro regular. A Figura 100 mostra o
resultado obtido, isto é, o tetraedro truncado gerado no Cabri 3D.
154
Figura 100. Tetraedro truncado.
GERAÇÃO DO OCTAEDRO TRUNCADO NO CABRI 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do octaedro truncado com a criação do
octaedro regular. Para criar esse octaedro regular, como mostram as Figuras 101
e 102, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta octaedro
regular. Em seguida clicamos com o mouse no plano de base, arrastando-o, e por
fim um duplo clique.
Figura 101. Ferramenta octaedro regular.
Figura 102. Octaedro regular.
155
Passo 2: Com o octaedro regular já criado, dividimos cada aresta do poliedro em
três partes congruentes (apêndice A ou B). A Figura 103 mostra o resultado desse
procedimento.
Figura 103. Arestas do octaedro dividas em três partes congruentes.
Passo 3: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do
octaedro regular. Assim, conforme mostra a Figura 104, um plano de secção deve
ser criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de quatro
pontos das arestas que concorrem em um vértice, sendo esses os mais próximos
do vértice desejado.
Figura 104. Plano de secção (octaedro regular)
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do octaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 105, indicamos o plano
obtido no passo 3 e o canto do octaedro regular que contém o vértice desejado.
Com o recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano, esse
procedimento facilita a eliminação dos demais cantos do poliedro.
156
Figura 105. Eliminação do canto do octaedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetuamos o mesmo procedimento do passo 3 e 4 para a
eliminação dos demais cantos do octaedro regular. A Figura 106 ilustra o octaedro
truncado gerado no Cabri 3D.
Figura 106. Octaedro truncado.
GERAÇÃO DO ICOSAEDRO TRUNCADO NO CABRI 3D
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do icosaedro truncado com a criação
do icosaedro regular . Para criar esse objeto, como mostram as Figura 107 e 108,
acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta icosaedro regular. Em
seguida clicamos com o mouse no plano de base, arrastando-o, e por fim um
duplo clique.
Figura 107. Ferramenta icosaedro regular.
157
Figura 108. Icosaedro regular.
Passo 2: Com o icosaedro regular já criado, dividimos cada aresta do poliedro em
três partes congruentes (apêndice A ou B). O resultado desse procedimento é
mostrado na Figura 109.
Figura 109. Arestas do icosaedro dividas em três partes iguais.
Passo 3: Nesse passo, como mostra a Figura 110, iniciamos o processo de
eliminação dos cantos do icosaedro regular. Assim, um plano de secção deve ser
criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos.
Figura 110. Plano de secção (icosaedro regular).
158
Passo 4: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do octaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 111, indicamos o plano
obtido no passo 3 e o canto do icosaedro regular que contém o vértice desejado.
Com o recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano, o que
facilita a eliminação dos demais cantos do icosaedro.
Figura 111. Eliminação do canto do icosaedro regular.
Passo 5: Nesse passo efetua-se o mesmo procedimento do passo 3 e 4 para a
eliminação dos demais cantos. A Figura 112 ilustra o icosaedro truncado gerado
no Cabri 3D.
Figura 112. Icosaedro truncado.
ANÁLISE
DAS
CONSTRUÇÕES
DOS
ARQUIMEDIANOS
TETRAEDRO
TRUNCADO, OCTEADRO TRUNCADO E ICOSAEDRO TRUNCADO
Observamos que as construções no Cabri 3D dos arquimedianos
tetraedro truncado, octaedro truncado e icosaedro truncado só foram possíveis a
partir do estudo realizado no tópico anterior, no qual também discutimos o
processo de construção por truncamento tipo 2. Essa discussão foi essencial para
159
identificarmos que a distância entre um ponto de truncatura e o vértice mais
próximo dele, equivale a um terço da aresta do poliedro platônico de partida
(tetraedro, octaedro e icosaedro). Sem essa discussão as construções realizadas
no Cabri 3D não seriam possíveis.
Assim, entendemos que esses três arquimedianos foram construídos a
partir da articulação entre o registro figural dinâmico e um registro discursivo,
nesse caso, o registro algébrico. Nesse sentido, os tratamentos apenas figurais –
construções do tetraedro regular, octaedro regular, icosaedro regular, secção
plana e eliminação dos vértices dos poliedros platônicos – não foram suficientes
para geração no Cabri 3D dos sólidos arquimedianos tetraedro truncado, octaedro
truncado e icosaedro truncado.
Para que os três arquimedianos fossem construídos o registro algébrico
precisou ser mobilizado a fim de que fosse determinada a que distância de cada
vértice, do poliedro platônico de partida, a truncatura deveria ser realizada. A
articulação imediata entre o registro figural dinâmico e o registro algébrico foi
essencial para a conversão de representações, pois a representação figural
precisou ser convertida para a escrita algébrica para poder ser tratada. Assim, o
tratamento algébrico possibilitou encontrar o ponto de truncatura nas arestas dos
poliedros de partida ao dividi-las em três partes congruentes.
A conversão realizada entre a representação no registro figural e a
representação no registro algébrico nos conduz a um fenômeno de congruência,
pois entendemos que há facilidade em reconhecer e representar algebricamente a
situação exposta na Figura 113, sabendo que o triângulo AP1P6 é eqüilátero.
Figura 113. Triângulo eqüilátero.
É somente a partir dessa conversão, sentido figural-algébrico, e do
tratamento algébrico efetuado que encontramos os pontos de truncaturas para a
obtenção dos arquimedianos.
160
Entendemos, também, que a conversão no sentido oposto, isto é,
algébrico-figural, é congruente pela facilidade em representar figuralmente a
escrita algébrica d=a/3, sabendo que d é a distância entre um vértice do poliedro
de partida e um ponto de truncatura e a a aresta desse mesmo poliedro.
Realizadas as construções no Cabri 3D dos sólidos arquimedianos
tetraedro truncado, octaedro truncado e icosaedro truncado, percebemos que
saberes geométricos e algébricos viveram e interagiram entre si. Os saberes
mobilizados na construção foram os poliedros de partida tetraedro regular – para
a construção do tetraedro truncado -, octaedro regular – para a construção do
octaedro truncado – e o icosaedro regular – para a construção do icosaedro
truncado, além do teorema de tales ou tranferência de medidas e secção plana.
A maioria dos saberes envolvidos na construção dos três arquimedianos foi
reconhecida como objeto pela instituição Cabri 3D por meio das ferramentas
tetraedro regular, octaedro regular, icosaedro regular e plano. No entanto, como o
Cabri 3D não possui uma ferramenta que por si só divida um segmento em três
partes congruentes, dois procedimentos foram apontados: teorema de tales e
transferência de medidas.
Para que ambos os procedimentos fossem efetuados na instituição
proposta, foi necessário mobilizar um conjunto de saberes outros, tais como:
semi-reta, ponto, ponto de intersecção, esfera, segmento, reta paralela, medida
da aresta e operação de divisão. Esses saberes foram reconhecidos pela
instituição Cabri 3D por meio das ferramentas semi-reta, ponto, ponto de
intersecção, esfera, segmento, paralela, distância ou comprimento e calculadora,
respectivamente.
Cada saber mobilizado para a construção foi importante na medida em
que apresentou uma função. A função de cada poliedro platônico no processo foi
apresentar o objeto geométrico a partir do qual a truncatura se iniciou, a função
do teorema de tales ou da transferência de medidas foi dividir as arestas do
poliedro de partida em três partes congruentes e assim indicar os pontos de
truncatura, e a função da secção plana foi auxiliar a eliminação dos cantos do
poliedro platônico de partida.
161
Entendemos que as funções do teorema de tales e transferência de
medidas, competiram entre si no processo de construção por ambas serem
utilizadas apenas para a divisão das arestas dos poliedros de partida.
Durante as construções, percebemos também relações inter-hierárquicas
entre os poliedros platônicos de partida e os sólidos arquimedianos construídos.
Percebemos que os arquimedianos tetraedro truncado, octaedro truncado e
icosaedro truncado apresentam dois tipos de faces, faces que provêm de
truncaturas nas arestas dos platônicos tetraedro regular, octaedro regular e
icosaedro regular e faces que provêm da eliminação dos seus vértices.
Observamos que o número das arestas em cada face dos arquimedianos obtidos
a partir de truncaturas nas arestas dos platônicos equivale ao dobro do número de
arestas da face do poliedro de partida.
Outra relação observada entre o poliedro platônico de partida e o
arquimediano produzido diz respeito ao número total de vértices dos poliedros
arquimedianos construídos. Esse total é igual ao dobro de arestas dos poliedros
platônicos de partida, visto que em cada aresta há dois pontos de truncatura, o
que origina dois vértices arquimedianos.
Assim, entendemos que o Cabri 3D se confirmou como um habitat para o
estudo dos sólidos arquimedianos tetraedro truncado, octaedro truncado e
icosaedro truncado na medida em que reconheceu como objetos todos os
saberes que determinam a existência dos mesmos.
4.2.2.3 CUBO TRUNCADO
Como
vimos
anteriormente,
o
processo
de
geração
do
sólido
arquimediano cubo truncado inicia a partir de truncaturas realizadas nas arestas
do cubo a uma distância adequada dos vértices. A distância d já encontrada no
tópico anterior, d
a
(em que a é aresta do cubo), é utilizada na construção
2 2
como segue.
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do cubo truncado com a criação do
cubo. Para que o cubo seja criado, acionamos na caixa de ferramenta “poliedro” a
162
ferramenta cubo, conforme já mostrado na Figura 73. Em seguida clicamos com o
mouse no plano de base, arrastando-o, e por fim um duplo clique.
Passo 2: Com o cubo já criado, como mostram as Figuras 114 e 115, obtemos o
comprimento da aresta acionando a ferramenta comprimento e indicando uma
das arestas do cubo.
Figura 114. Ferramenta comprimento.
Figura 115. Comprimento da aresta (cubo).
Passo 3: Nesse passo obtemos os pontos de corte nas arestas. Para isso, como
mostram as Figuras 116 e 117, acionamos a ferramenta calculadora, indicamos
a
com o clique do mouse o comprimento da aresta e inserimos a expressão
2
Figura 116. Ferramenta calculadora.
163
.
2
Figura 117. Inserindo expressão na calculadora (cubo truncado).
Passo 4: Para encontrar os pontos de cortes nas arestas, como mostra a Figura
118, utilizamos a ferramenta transferência de medidas (apêndice A) para transferir
o resultado obtido no passo 3 para as arestas do cubo.
Figura 118. Transferência de medida para a aresta do cubo.
Passo 5: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do cubo.
Assim, como mostra a Figura 119, um plano de secção deve ser criado com a
utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos das arestas que
concorrem em um vértice, sendo esses os mais próximos do vértice desejado.
Figura 119. Plano de secção (cubo II)
164
Passo 6: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do cubo será
eliminado. Para isso, como mostra a Figura 120, indicamos o plano obtido no
passo 4 e o canto do cubo que contém o vértice desejado. Com o recurso
esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano, esse procedimento facilita
a eliminação dos demais cantos do cubo.
Figura 120. Eliminação do canto do cubo II.
Passo 7: Nesse passo efetua-se o mesmo procedimento do passo 4 para a
eliminação dos demais vértices. O resultado obtido, isto é, o cubo truncado
gerado é ilustrado na Figura 121.
Figura 121. Cubo truncado.
ANÁLISE DA CONSTRUÇÃO DO ARQUIMEDIANO CUBO TRUNCADO
Observamos que a construção no Cabri 3D desse arquimediano só foi
possível a partir do estudo realizado no tópico anterior, no qual discutimos o
processo de construção por truncamento tipo 2. Essa discussão foi essencial para
identificarmos a que distância dos vértices do cubo seriam realizadas as
165
truncaturas. Sem essa discussão a construção do cubo truncado no Cabri 3D não
seria possível.
Constatamos que os pontos de truncaturas só puderam ser encontrados a
partir da articulação entre o registro figural dinâmico e o registro algébrico, registro
discursivo mais uma vez presente na construção de um arquimediano. Nesse
sentido, os tratamentos apenas figurais – construções do cubo, semi-reta, secção
plana e eliminação dos vértices do cubo – não foram suficientes para geração no
Cabri 3D do arquimediano cubo truncado.
Entendemos que a conversão realizada entre o registro figural e o registro
algébrico em relação ao teorema de Pitágoras é espontânea, conforme mostra a
Figura 122. Assim, consideramos a conversão no sentido figural-algébrico
congruente, pois entendemos que há facilidade em reconhecer e representar
algebricamente a figura.
Registro figural
Registro algébrico
Figura 122. Conversão entre os registros figural e algébrico.
No entanto, o tratamento efetuado no registro algébrico nos permitiu
chegar à escrita algébrica d
a
2
. Escrita que nada tem de evidente e
2
espontânea em ser reconhecida e representada figuralmente. Nesse caso,
entendemos que a conversão no sentido oposto, isto é, algébrico-figural nos
conduz a um fenômeno de não congruência, problema essencial da semiótica
considerado por Duval (1995).
Realizada a construção no Cabri 3D do sólido arquimediano cubo
truncado, percebemos que saberes geométricos e algébricos viveram e
166
interagiram entre si. Os saberes geométricos envolvidos em todo o processo,
além do teorema de pitágoras - cubo, medida da aresta, semi-reta, secção plana
– foram reconhecidos pela instituição Cabri 3D, por meio das ferramentas cubo,
comprimento, semi-reta e plano.
Cada um desses saberes apresentou uma função no processo de
construção. O saber cubo indicou o objeto geométrico a partir do qual a truncatura
se iniciou, o saber semi-reta possibilitou indicar em cada aresta do cubo os pontos
de truncaturas e a secção plana auxiliou a eliminação dos cantos do cubo.
Durante a construção percebemos também relações inter-hierárquicas
entre o poliedro platônico de partida, cubo, e o poliedro de chegada, cubo
truncado. Lembramos que o arquimediano cubo truncado apresenta dois tipos de
faces, tipo de face octogonal regular obtida a partir de truncaturas nas arestas do
cubo e o tipo de face triangular regular obtida a partir da eliminação dos cantos do
cubo.
Assim, notamos que o número de arestas em cada face do arquimediano
cubo truncado obtidos a partir de truncaturas de arestas do cubo equivale ao
dobro do número de arestas da face do poliedro de partida cubo. Outra relação
também notada diz respeito ao número total de vértices do cubo truncado
equivalente ao dobro do número de arestas do cubo.
Diante do exposto acreditamos que a instituição Cabri 3D se confirmou
como um habitat para o estudo do sólido arquimediano cubo truncado,.uma vez
que reconheceu como objetos todos os saberes que determinam sua existência.
4.2.2.4 DODECAEDRO TRUNCADO
Como
vimos
anteriormente,
o
processo
de
geração
do
sólido
arquimediano dodecaedro truncado inicia a partir de truncaturas realizadas nas
arestas do dodecaedro regular a uma distância adequada dos vértices. A
distância d já encontrada no tópico anterior, d
2a
5
5
(em que a é aresta do
dodecaedro regular), é utilizada na construção como segue.
Passo 1: Iniciamos o processo de geração do dodecaedro truncado com a criação
do dodecaedro regular. Para que o dodecaedro regular seja criado, acionamos na
167
caixa de ferramenta “poliedro” a ferramenta dodecaedro regular, conforme já
mostrado na Figura 84. Em seguida clicamos com o mouse no plano de base,
arrastando-o, e por fim um duplo clique.
Passo 2: Com o dodecaedro regular já criado, obtemos o comprimento da aresta,
conforme já mostrado nas Figura 115 e 116, acionando a ferramenta
comprimento, e indicando uma das arestas do poliedro.
Passo 3: Nesse passo obtemos os pontos de corte nas arestas. Para isso, como
mostra a Figura 123, acionamos a ferramenta calculadora e inserimos a
expressão
2a
5
5
, sendo a o comprimento da aresta.
Figura 123. Inserindo a expressão na calculadora (dodecaedro truncado).
Passo 4: Para encontrar os pontos de cortes nas arestas, como mostra a Figura
124, transferimos o resultado obtido no passo 3 para as arestas do dodecaedro
regular. Para isso utilizamos a ferramenta transferência de medidas (apêndice A).
Figura 124. Transferência de medida para a aresta do dodecaedro regular.
Passo 5: Nesse passo, iniciamos o processo de eliminação dos cantos do
dodecaedro regular. Assim, como mostra a Figura 125, um plano de secção deve
168
ser criado com a utilização da ferramenta plano e com a indicação de três pontos
de arestas que concorrem em um vértice, sendo esses os mais próximos do
vértice.
Figura 125. Plano de secção (dodecaedro regular II).
Passo 6: Com a ferramenta recorte de poliedro, o primeiro canto do dodecaedro
regular será eliminado. Para isso, como mostra a Figura 126, indicamos o plano
obtido no passo 5 e o canto do dodecaedro regular que contém o vértice
desejado. Com o recurso esconder/mostrar podemos optar em esconder o plano.
Figura 126. Eliminação do canto do dodecaedro regular II.
Passo 7: Nesse passo efetuamos o mesmo procedimento do passo 6 para a
eliminação dos demais cantos. O resultado obtido, isto é, o dodecaedro truncado
gerado é ilustrado na Figura 127.
Figura 127. Dodecaedro truncado.
169
ANÁLISE
DA
CONSTRUÇÃO
DO
ARQUIMEDIANO
DODECAEDRO
TRUNCADO
Assim como a construção do cubo truncado, observamos que a
construção no Cabri 3D do dodecaedro truncado só foi possível a partir do estudo
realizado no tópico anterior, no qual discutimos o processo de construção por
truncamento tipo 2. Essa discussão foi fundamental para identificarmos a que
distância dos vértices do dodecaedro regular seriam realizadas as truncaturas.
Sem essa discussão a construção desse arquimediano no Cabri 3D não seria
possível.
Da mesma forma que a construção do arquimediano cubo truncado, a
construção do dodecaedro truncado só pôde ser realizada a partir da articulação
entre o registro figural dinâmico e o registro algébrico. Nesse sentido, os
tratamentos figurais presentes no processo – construção do dodecaedro regular,
medida da aresta, semi-reta, transferência de medida, secção plana e eliminação
dos cantos do dodecaedro regular - também não foram suficientes para a geração
no Cabri 3D do sólido arquimediano dodecaedro regular.
Mais uma vez o registro algébrico nos serviu como registro suporte para
que fossem encontrados os pontos de truncaturas nas arestas do poliedro
platônico de partida. Para Duval (1995) isso acontece por que o registro figural
não
preenche
nenhuma
função
discursiva,
entretanto
os
tratamentos
especificamente figurais dão às figuras um papel heurístico, isto é, a possibilidade
de definir os diferentes tipos de modificação a qual é suscetível. É com esse
pensamento que Duval afirma que toda atividade geométrica requer um diálogo
contínuo entre a visualização e o discurso.
Esse diálogo está bem presente no processo de construção do
dodecaedro regular, pois a todo o momento recorremos a um registro discursivo,
isto é, algébrico para registrar os tratamentos figurais realizados. Só assim a
distância entre o vértice do dodecaedro regular e o ponto de truncatura pôde ser
determinada.
Entendemos que as conversões realizadas entre o registro figural e o
registro algébrico foram congruentes, pois há facilidade em reconhecer e
representar algebricamente a situação exposta na figura. No entanto, o
170
tratamento efetuado no registro algébrico nos permitiu chegar a escrita algébrica
d
2a
5
5
, nada fácil de representar figuralmente. Por isso, consideramos não
congruente a conversão no sentido inverso, isto é, algébrico-figural.
Realizada a construção no Cabri 3D do sólido arquimediano dodecaedro
truncado, percebemos que saberes geométricos e algébricos viveram e
interagiram entre si. Os saberes matemáticos envolvidos - dodecaedro regular,
medida da aresta, semi-reta e secção plana - foram reconhecidos de forma direta,
pela instituição Cabri 3D por meio das ferramentas dodecaedro regular,
comprimento, semi-reta e plano.
Assim como as construções dos arquimedianos já mencionados, todos os
saberes envolvidos foram essenciais para a construção do arquimediano
dodecaedro truncado, tendo cada saber assumido uma função no processo de
construção. Enquanto o saber dodecaedro regular indicou o objeto geométrico a
partir do qual a truncatura se iniciou, o saber semi-reta possibilitou indicar em
cada aresta do dodecaedro regular os pontos de truncaturas e a secção plana
auxiliou a eliminação dos cantos do dodecaedro regular.
Durante a construção percebemos também relações inter-hierárquicas
entre o poliedro platônico de partida dodecaedro regular e o poliedro de chegada
dodecaedro truncado. Indicamos que o arquimediano dodecaedro truncado
também apresenta dois tipos de faces, o tipo de face decagonal regular obtida a
partir de truncaturas nas arestas do dodecaedro regular e o tipo de face triangular
regular obtida a partir da eliminação dos cantos do dodecaedro regular.
Assim, observamos que o número das arestas em cada face do
arquimediano dodecaedro truncado obtidos a partir de truncaturas nas arestas do
dodecaedro regular equivale ao dobro do número de arestas da face do poliedro
de partida. Outra relação também observada diz respeito ao número total de
vértices do dodecaedro truncado igual ao dobro do número de arestas do
dodecaedro regular.
Diante do exposto, acreditamos que a instituição Cabri 3D se confirmou
também como um habitat para o estudo do sólido arquimediano dodecaedro
171
truncado, visto que reconheceu como objetos todos os saberes que determinam
sua existência.
A partir das análises realizadas, apontamos no que segue as
características numéricas dos poliedros arquimedianos obtidos, bem como a
relação com o poliedro platônico de partida.
4.3 AS CARACTERÍSTICAS NUMÉRICAS DOS POLIEDROS
OBTIDOS
Durante o processo de construção dos arquimedianos observamos que
qualquer sólido arquimediano obtido a partir de truncaturas diretas em um sólido
platônico apresenta faces de dois tipos: faces que provêm de faces e faces que
provêm da eliminação dos cantos do poliedro de partida. Isto quer dizer que as
características numéricas (número de faces, de vértices, bem como a ordem 14)
dos arquimedianos obtidos, indicadas no Quadro 24, dependem do número de
faces e vértices do poliedro platônico de partida.
Quadro 24. Características numéricas dos arquimedianos estudados.
Arquimediano
Características numéricas
Superfície planificada
12 vértices;
Cuboctaedro
6 faces quadradas;
8 faces triangulares;
24 arestas.
30 vértices;
Icosidodecaedro
12 faces pentagonais;
20 faces triangulares;
60 arestas.
____________
14
Número de arestas que concorrem em um vértice.
172
12 vértices;
Tetraedro truncado
6 faces hexagonais;
4 faces triangulares;
18 arestas.
24 vértices;
Octaedro Truncado
6 faces quadradas;
8 faces hexagonais;
36 arestas.
60 vértices;
Icosaedro truncado
12 faces pentagonais;
20 faces hexagonais;
90 arestas.
24 vértices;
6 faces octogonais;
8 faces triangulares;
Cubo truncado
36 arestas.
60 vértices;
Dodecaedro truncado
12 faces decagonais;
20 faces triangulares;
90 arestas.
Podemos
também
relacionar
as
características
numéricas
dos
arquimedianos obtidos ao tipo de truncamento, conforme é mostrado no Quadro
25. A primeira coluna indica os tipos de truncamentos efetuados, já a segunda
coluna indica que o número de arestas das faces que provém de faces depende
do tipo de truncamento. No truncamento tipo 1 essas faces têm o mesmo número
de arestas das faces do poliedro platônico de partida. Já no truncamento tipo 2 o
número de arestas das faces duplica.
A terceira coluna mostra que em ambos os tipos de truncamento, o
número total de arestas do arquimediano obtido depende do número de vértices
173
ou arestas do poliedro de partida e de sua ordem. Nos poliedros obtidos pelo
truncamento do tipo 1 o total de arestas do poliedro obtido é o produto entre o
número de vértices do poliedro inicial e sua ordem. No truncamento do tipo 2 o
total de arestas do poliedro obtido é o produto entre o número de arestas do
poliedro inicial e sua ordem.
Já na quarta coluna, está indicado que o número de vértices do poliedro
resultante é igual ou o dobro do número de arestas do poliedro inicial. Com o
truncamento do tipo 1 cada aresta do poliedro original se converte em um vértice,
enquanto que com o truncamento do tipo 2, por cada aresta aparecem dois
vértices.
A última coluna mostra que os vértices dos poliedros resultantes no
truncamento do tipo 1 são de ordem 4. Com o truncamento do tipo 2 se obtém
poliedros com vértices de ordem 3.
Quadro 25. Características numéricas a partir do tipo de truncamento.
Tipo de
Número de
Número total
Número total
Ordem dos
Truncamento
arestas em
de arestas
de vértices
vértices
cada face
Produto entre o
Mesmo número
Truncamento 1
do poliedro de
partida
número de
vértices do
poliedro de
partida e sua
Igual ao número
total de arestas
Ordem quatro
do poliedro de
partida
ordem
O dobro do
Truncamento 2
poliedro de
partida
Produto entre o
Dobro do
número de
número total de
arestas do
arestas do
poliedro de
poliedro de
partida e sua
partida
Ordem três
ordem
A seguir apresentamos nossas considerações finais em relação ao
estudo.
174
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse momento, retomamos aspectos abordados ao longo dos capítulos
anteriores deste trabalho, sendo oportuno mencionar a convergência de pontos
de vista a respeito do que foi investigado, analisado e percebido. Consideramos
também oportuno apontar as reais possibilidades de concretização desse estudo
nas aulas de Geometria, bem como as possíveis adaptações que podem ser
feitas com o auxílio da tecnologia, na perspectiva de contribuir para a melhoria da
aprendizagem da Geometria Espacial na Educação Básica.
Nossos estudos preliminares nos permitiram identificar que os principais
problemas enfrentados pelo ensino e aprendizagem de Geometria Espacial estão
associados
à
visualização,
interpretação
e
representações
de
objetos
tridimensionais. Tais problemas contribuem para que alguns conteúdos
geométricos espaciais não sejam mais abordados, como por exemplo, os Sólidos
de Arquimedes.
Por outro lado, com o surgimento do conhecimento por simulação advindo
da informática, programas de auxílio ao ensino têm sido desenvolvidos na busca
de minimizar tais dificuldades, ou ainda, na possibilidade de resgatar conteúdos
não mais presentes na matemática ensinada. A utilização de ambientes de
Geometria Dinâmica, especialmente o Cabri 3D que simula um ambiente em três
dimensões, pode contribuir para que conteúdos geométricos espaciais sejam
recordados e revisitados com um dinamismo inexistente em ambiente lápis e
papel.
Nesse sentido, concordamos com Lévy (2002, p. 129) ao afirmar que
à aparição de novas tecnologias intelectuais ativam à expansão
de formas de conhecimento que durante muito tempo estiveram
relegadas a certos domínios, bem como o enfraquecimento
relativo de certo estilo de saber, mudanças de equilíbrio,
deslocamentos de centros de gravidade. A ascensão do
conhecimento por simulação deve ser entendida de acordo com
uma modalidade aberta, plurívoca e distribuída.
É dentro desse contexto que se inseriu nossa pesquisa, se propondo
oferecer uma contribuição a estudos sobre ensino de matemática e o uso de
tecnologias em Educação Matemática. Para tanto, tomamos como eixo,
176
apresentar uma possibilidade para o ensino e aprendizagem dos Sólidos
Arquimedianos e sua inclusão na Educação Básica por meio do ambiente de
Geometria Dinâmica Cabri 3D aliada a história como fonte geradora de
conhecimento.
Os procedimentos metodológicos utilizados contribuíram para que o
estudo do objeto matemático Sólidos Arquimedianos fosse realizado. Vale
ressaltar que a metodologia utilizada nos permitiu evidenciar um processo de
construção para esses sólidos bem diferente da planificação de superfície,
estudada na disciplina Desenho Geométrico. O estudo bibliográfico, realizado a
partir de fontes históricas, foi fundamental para a realização do estudo
matemático do objeto proposto, uma vez que foi a partir dele que descobrimos a
relação existente entre os sólidos arquimedianos e platônicos, além do
procedimento matemático truncamento.
Consideramos que os referenciais adotados na pesquisa, Transposição
Didática e a Problemática Ecológica de Chevallard (1991) e Registro de
Representação Semiótica de Duval (1995), foram pertinentes para nosso estudo.
Com as teorias de Chevallard (1991), pudemos nos aproximar dos
saberes matemáticos que entram em associação com o objeto matemático
Sólidos Arquimedianos e assim identificar dentre eles, os saberes que
determinam a existência desse objeto matemático enquanto objeto de ensino,
bem como analisar ecologicamente as interações entre eles. Assim, foi possível
distinguir os diferentes saberes envolvidos no processo de ensino e analisar a
transformação do objeto de saber Sólidos Arquimedianos em um objeto a ser
ensinado.
Em se tratando dos registros de representação semiótica, constatamos
que as construções dos arquimedianos no Cabri 3D só foram possíveis mediante
a articulação entre o registro figural dinâmico e um registro discursivo. Desse
modo, concordamos com Duval (2002) quando afirma que toda atividade
geométrica requer um diálogo contínuo entre a visualização (registro figural) e o
discurso (registro discursivo). No trabalho, percebemos que o discurso pode ser
realizado por meio do registro de língua natural e do registro algébrico.
177
Assim, podemos responder nossa questão de pesquisa - O objeto
matemático Sólidos Arquimedianos pode ser resgatado como objeto de ensino
para a Escola Básica, utilizando como habitat o ambiente de Geometria Dinâmica
Cabri 3D? – considerando as reflexões apresentadas em nossas análises e nessa
parte do trabalho. Diante do que foi apresentado, entendemos que esse ambiente
se confirmou como um habitat para o ensino desses sólidos, na medida em que
permitiu que as construções dos arquimedianos propostos fossem realizadas,
reconhecendo como objetos todos os saberes que determinam a existência desse
objeto matemático enquanto objeto de ensino.
Para finalizar, acreditamos que a relevância de nossa pesquisa foi
contribuir para uma reflexão acerca da utilização de meios informáticos em âmbito
escolar para resgatar conteúdos matemáticos não mais ensinados. Nesse
sentido, acreditamos na importância de outros estudos buscarem o auxílio de
novas tecnologias intelectuais para que conteúdos matemáticos adormecidos ou
mesmo esquecidos possam voltar a fazer parte do cotidiano escolar.
Como pesquisa futura, tendo em vista o resultado positivo dessa
investigação, acreditamos na possibilidade de elaborar e desenvolver uma
seqüência de atividades, apoiada nos referenciais teóricos apresentados, no
ambiente de Geometria Dinâmica Cabri 3D para que os Sólidos Arquimedianos
sejam explorados e ensinados por meio de suas construções. Deste modo, o
saber a ensinar Sólidos Arquimedianos passaria a ter também um status de saber
ensinado, o que caracterizaria a segunda transposição didática proposta por
Chevallard (1991).
178
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183
APÊNDICE A: TRANSFERINDO MEDIDAS NO CABRI 3D
Para utilizar a ferramenta transferência de medidas do Cabri 3D,
mostrada na Figura 128, é necessário indicar a medida que se deseja transferir e
uma semi-reta. A Figura 129 mostra a transferência de uma medida para uma
semi-reta de origem um vértice do cubo, e em seguida é omitida com o recurso
esconder/mostrar.
Figura 128. Ferramenta transferência de Medidas.
Figura 129. Transferindo medidas.
Podemos transferir qualquer medida. Para isso, como mostram as Figuras
130 e 131, podemos obtê-la com as ferramentas distância ou comprimento (ou
digitando um valor na calculadora, conforme mostra a Figura 130.
184
Figura 130. Ferramentas distância e comprimento.
Figura 131. Calculadora.
185
APÊNDICE B: APLICANDO O TEOREMA DE TALES NO
CABRI 3D
Utilizando o teorema de tales podemos dividir um segmento qualquer em n
partes iguais. Esse procedimento é mostrado no Cabri 3D para dividir um
segmento em três partes iguais como segue.
Com a ferramenta semi-reta, mostrada na Figura 132 traçamos uma semireta AD, conforme indica a Figura 133.
Figura 132. Ferramenta semi-reta.
Figura 133. Criação semi-reta.
Na semi-reta AD, com a ferramenta ponto, mostrada na Figura 134,
marcamos um ponto qualquer que chamaremos de P 1, conforme é indicado na
Figura 135.
186
Figura 134. Ferramenta ponto.
Figura 135. Ponto 1 na semi-reta.
Com a ferramenta esfera, indicada na Figura 136, construímos uma
esfera com centro em P1 e raio P1A para encontrar P2, o ponto de intersecção
entre a esfera e a semi-reta AD. Em seguida, outra esfera é construída com
centro em P2 e raio P2P1 para encontrarmos P3, conforme mostra a Figura 137.
Figura 136. Ferramenta esfera.
187
Figura 137. Ponto 2 e ponto 3 na semi-reta.
Com a ferramenta segmento, mostrada na Figura 138, traçamos o
segmento P3B, conforme mostra a Figura 139.
Figura 138. Ferramenta segmento.
Figura 139. Criação segmento.
188
Com a ferramenta paralela, mostrada na Figura 140, traçam-se duas retas
paralelas ao segmento P3B, passando por P1 e P2, para encontrar P1’ e P2’, os
pontos de intersecção com a aresta AB, conforme mostra a Figura 141. Assim
temos que A P1’ Ξ P1’ P2’ Ξ P2’ P3’.
Figura 140. Ferramenta paralela.
Figura 141. Criação paralelas.
189
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