UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO
Douglas Ferreira Goios
Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto para
aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cognição
Corporificada para o ensino de trigonometria.
Mestrado Acadêmico
UNIBAN-SP
2010
UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO
Douglas Ferreira Goios
Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto para
aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cognição
Corporificada para o ensino de trigonometria.
Dissertação apresentada ao programa
de pós-graduação Stricto Sensu em
Educação Matemática da UNIBAN,
para defesa, sob orientação da Profª.
Dra. Janete Bolite Frant.
Linha de pesquisa: Tecnologias Digitais
e Educação Matemática
Mestrado Acadêmico
UNIBAN-SP
2010
G556pGoios, Douglas Ferreira.
Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto
para aprendizagem: Uma análise através da Teoria da
Cognição Corporificada para o ensino de trigonometria /
Douglas Ferreira Goios - São Paulo: [s.n.], 2010.
132f. ;il. 30 cm.
Dissertação de Mestrado - Programa de Pós
Graduação em Educação Matemática, Universidade
Bandeirante de São Paulo, Curso de Educação
Matemática.
Orientadora: Profa. Dra. Janete Bolite Frant.
1.Trigonometria 2.Metáforas 3.Objetos de Ensino
4.Cenário para Investigação I. Título
CDD 510
FOLHA DE APROVAÇÃO
Aprovado em:1 de Setembro de 2010
Banca examinadora
Profa. Dra. Janete Bolite Frant
Instituição: UNIBAN
Assinatura: ______________________
Profa. Dra. Nielce Meneguelo Lobo da Costa
Instituição: UNIBAN
Assinatura:______________________
Profa. Dra Rosana Giaretta Sguerra Miskulin
Instituição: UNESP
Assinatura: ______________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total
ou parcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _________________________
Aos meus pais Darlan e Heloisa que
sempre estiveram presentes e me
apoiaram em todas as minhas
realizações e as minhas filhas
Bárbara e Beatriz, minha inspiração
para viver.
Agradecimentos
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização
desse trabalho, meus sinceros agradecimentos.
À minha orientadora Profa. Dra. Janete Bolite Frant, pela paciência,
dedicação, incentivo e por acreditar no meu trabalho. Mais do que
orientadora, uma amiga.
À minha esposa Patrícia, pelo incentivo, amor, carinho e cumplicidade.
À minha tia Célia, especialmente pelas várias correções desse texto.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação
Matemática, pelo apoio, incentivo, dedicação e presença sempre
constantes.
Aos colegas do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade
Bandeirante de São Paulo, pelos bons momentos que vivemos juntos.
Aos professores da Banca Examinadora: Profa. Dra. Nielce Meneguelo
Lobo da Costa e Profa. Dra Rosana Giaretta Sguerra Miskulin, por
aceitar o convite para participar da banca examinadora deste trabalho e
pela avaliação cuidadosa que fizeram, pelas sugestões e críticas que me
ajudaram a alcançar os resultados aqui apresentados.
Resumo
Esta pesquisa tem por objetivo investigar e analisar que aspectos são ou não
favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio,
especificamente sobre conceitos de trigonometria, em um ambiente utilizando
recursos digitais. A partir da Teoria da cognição corporificada (LAKOFF &
JOHNSON, 2001; LAKOFF & NUÑEZ, 2000) busca analisar a produção de
significados e as metáforas apresentadas pelos alunos durante as aulas de
trigonometria. Para o desenvolvimento do cenário de aprendizagem utiliza o
conceito de Cenário para Investigação (Skovsmose, 2008), que tem como
princípio fundamental a aprendizagem dos alunos através da investigação.
Este cenário foi construído a partir dos materiais disponibilizados para um
professor de matemática da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo,
tais como livros didáticos, Proposta Curricular do Estado de São Paulo e
Objetos de Aprendizagem disponibilizados pelo Ministério de Educação e
Cultura – MEC.
Como resultados desta pesquisa podemos dizer que o Objeto de Ensino (OE)
elaborado colaborou com a aprendizagem dos alunos, e entre as
características positivas do OE também podemos acrescentar a qualidade
visual do círculo trigonométrico, que não é possibilitada no uso do papel e lápis,
também acrescento que o OE permite inúmeras interações entre o aluno e o
círculo trigonométrico. Nesta pesquisa também surgiram exemplos de
metáforas de ligação, onde através de outros conhecimentos matemáticos os
alunos construíram um novo conhecimento. Isto é evidenciado quando os
alunos fazem a montagem de seus conhecimentos de plano cartesiano,
conforme sugere Lakoff & Núñez (2000) na montagem do círculo trigonométrico
e nas metáforas do movimento fictivo. Sobretudo, a dinâmica possibilitada
pelos OEs criou um movimento no círculo trigonométrico, onde esta percepção
visual é evidenciada pelas metáforas dos alunos como o “seno subiu” o “seno
desceu”. Assim o movimento, inicialmente fictivo do seno de um ângulo tornase factivo, via o dinamismo proporcionado pela representação virtual do OE.
Isto é, o seno de um ângulo é a razão entre as medidas do cateto oposto e da
hipotenusa, cujo valor é expresso por um número que “evidentemente” não se
move e a função e seu gráfico idem. Mas quando o aluno fala sobre o OE o
dinamismo se sobrepõe ao estático auxiliando a compreensão deste conceito.
Palavras-chave: Trigonometria, Metáforas, Objetos de Ensino, Cenário para
Investigação.
Abstract
This research aims to investigate and analyze the aspects which are or are not
favored in the teaching of trigonometry in high school, specifically on the
concepts of trigonometry in an environment using digital resources. From the
theory of embodied cognition (Lakoff & Johnson, 2001; LAKOFF & NUÑEZ,
2000) analyzes the production of meanings and metaphors presented by the
students during classes in trigonometry. To develop the learning scenario uses
the concept of Scenario for Research (Skovsmose, 2008), which has as its
basic principle the students' learning through research. This scenario was
constructed from the materials made available as a mathematics professor at
the Department of Education of the State of São Paulo, such as didactic books,
curricular proposal of the State of São Paulo and the objectives of learning
available by MEC.
The results of this research we can say that the object of education (OE)
prepared collaborated with students' learning, and between the positive
characteristics of the OE can also add the visual quality of the trigonometric
circle, which is not made possible the use of paper and pencil, also add that the
budget allows countless interactions between the student and the trigonometric
circle. This research also appeared examples of metaphors of connection,
where other means of mathematical knowledge students have constructed a
new knowledge. This is evidenced when students are assembling their
knowledge of the Cartesian plane, as suggested by Lakoff & Núñez (2000) in
the assembly of the trigonometric circle and the metaphors of fictive motion.
Above all, the dynamics made possible by OEs created a stir in the
trigonometric circle, where the visual perception is evidenced by the metaphors
of the students as the "sine rose" the "sine fell." So the movement, initially
fictive sine of an angle becomes feasible, through the dynamism provided by
the virtual representation of OE. That is, the sine of an angle is the ratio
between measurements of the leg opposite and hypotenuse, whose value is
expressed by a number that "obviously" does not move and function, its graph
Ibid. But when a student talks about the dynamism OE overlaps the static aiding
the understanding of the concept.
Keywords:
Trigonometry,
Investigation.
Metaphors,
Learning
Objects,
Scenario
for
Índice de Figuras
Figura 1: Tela de abertura para acesso ao OA – “Trigonometria com Molas” do
RIVED .............................................................................................................. 20
Figura 2: Os espaços de uma Montagem Conceitual....................................... 30
Figura 3: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico (Lakoff & Núñez,
2000, p.390) ..................................................................................................... 32
Figura 4: 2º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez,
2000, p.391) ..................................................................................................... 32
Figura 5: 3º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez,
2000, p.392) ..................................................................................................... 33
Figura 6: Papiro Rhind, Museu de Londres. (fonte: http://www.archaeowiki.org/
Image: Rhind_Mathematical_Papyrus.jpg – acesso 10/09/2009).................... 57
Figura 7: Tela de abertura para acesso ao OA – “Mundo da Trigonometria” ... 72
Figura 8: Círculo Trigonométrico ...................................................................... 74
Figura 9: Localização de um ponto P sobre o círculo ....................................... 74
Figura 10: Determinação do ângulo ................................................................ 75
Figura 11: Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y ................................. 75
Figura 12: Determinação do valor do seno....................................................... 76
Figura 13: Tela do gráfico da função seno ....................................................... 77
Figura 14: Tela do jogo do AO “Mundo da Trigonometria” ............................... 78
Figura 15: Tela da atividade do OA “Trigonometria com Molas” ...................... 80
Figura 16: Tela das questões da atividade do OA “Trigonometria com Molas” 80
Figura 17: Tela da atividade 2 do OA “Trigonometria com Molas” ................... 81
Figura 18: Layout da sala – Encontro 1 ............................................................ 89
Figura 19: Grupo 1 - Sequencia de Atividades ................................................. 93
Figura 20: Grupo-2 iniciando atividade............................................................. 94
Figura 21: Grupo-2 – desenvolvendo atividade ................................................ 95
Figura 22: Layout da sala 2º e 3º encontro ...................................................... 97
Figura 23: Texto confuso para Renan ............................................................ 100
Figura 24: Leitura da função seno por Gabriela ............................................. 104
Figura 25: Entendimento do valor do Seno pelo Grupo 2 .............................. 106
Figura 26: Grupo 2 Sequencia de Atividades ................................................. 106
Figura 27: Movimento das mãos de Renan .................................................... 108
Figura 28: Resposta grupo 1 .......................................................................... 108
Figura 29: Resposta grupo 2 .......................................................................... 109
Figura 30: Applet Círculo Trigonométrico ....................................................... 110
Figura 31: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico ....................... 116
Figura 32: OE Função Seno ........................................................................... 127
Índice de Tabelas
Tabela 1 – Metáfora VIAGEM É VIDA .............................................................. 26
Tabela 2 – Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS .................................. 28
Tabela 3 – Domínio fonte para o Círculo Trigonométrico ................................. 31
Tabela 4 – Metáfora para o Círculo Trigonométrico ......................................... 33
Tabela 5 – Ambientes de aprendizagem (Skovsmose, 2008, p.23) ................. 37
Tabela 6 – Nativos e Imigrantes Digitais .......................................................... 41
Tabela 7 – Metas IDESP .................................................................................. 46
Tabela 8 – Indicador de desempenho IDESP .................................................. 46
Tabela 9 – Desempenho Português e Matemática IDESP 2009 ...................... 47
Tabela 10 – Análise Livros Didáticos ............................................................... 67
Tabela 11 – Atividade 1º Encontro ................................................................... 86
Tabela 12 – Análise dos resultados do 1º Encontro ......................................... 90
Tabela 13 – Transcrição 1 – 2º Encontro ......................................................... 99
Tabela 14 – Metáfora: Círculo Trigonométrico é Relógio ............................... 101
Tabela 15 – Transcrição 2 – 2º Encontro ....................................................... 102
Tabela 16 – Respostas do 2º encontro .......................................................... 104
Tabela 17 – Comparação de resultados OE / Applet ..................................... 110
Tabela 18 – Transcrição 3 – 3º Encontro ....................................................... 111
Tabela 19 – Metáfora COSSENO É SENO .................................................... 117
Tabela 20 – Transcrição 4 – quarto encontro ................................................ 117
Sumário
1. Introdução .................................................................................................... 13
1.1 - Objetivo ................................................................................................ 14
1.2 - Justificativa ........................................................................................... 14
1.3 - Problema .............................................................................................. 21
2. Fundamentação Teórico Metodológica ........................................................ 23
2.1 - Teoria da Cognição Corporificada ........................................................ 24
2.2 - Linguagem ............................................................................................ 34
2.3 - Cenário para investigação .................................................................... 36
2.4 - Ambientes Virtuais e Objetos de Aprendizagem - OAs ........................ 39
2.5 - Procedimento Metodológico e desenvolvimento da pesquisa. ............. 45
2.5.1 - Local e Participantes ...................................................................... 45
2.5.2 - Experimento de ensino ou Design experiment ............................... 48
2.5.3 – Coleta e Análise dos Dados .......................................................... 49
2.5.4 - Fases de desenvolvimento da pesquisa ........................................ 51
3. Primeira Fase ............................................................................................... 53
3.2 - Análise dos livros didáticos / Proposta Curricular SP ........................... 65
3.3 - Análise dos OAs – Objetos de Aprendizagem / Apllet .......................... 71
3.3.1 - Objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonometria”...................... 71
3.3.2 - Objeto de aprendizagem “Trigonometria com Molas” .................... 79
3.3.3 – Applets .......................................................................................... 82
3.4 - Primeira investigação junto a um grupo de professores/ pesquisadores
...................................................................................................................... 84
3.5 - Desenvolvimento das Atividades para o 1º encontro............................ 85
4. Segunda Fase .............................................................................................. 88
4.1 – Primeiro encontro ................................................................................ 89
4.2 – Segundo encontro ............................................................................... 97
4.3 – Terceiro encontro ............................................................................... 109
4.4 – Quarto encontro ................................................................................. 112
5. Discussões e Considerações Finais........................................................... 120
Referências Bibliográficas .............................................................................. 128
Esta dissertação é parte do projeto LOVEME Lab/Tidia Ae da Fapesp #60655-4
Capítulo 1
Introdução
Capítulo 1 – Introdução
14
Neste primeiro capítulo descrevo o principal objetivo desta pesquisa e quais
os fatores que me motivaram para sua realização. No final deste capítulo apresento
o problema de pesquisa e qual questão espero responder ao seu final.
1.1 - Objetivo
Esta pesquisa visa investigar e analisar aspectos que são ou não favorecidos
nos processo de ensino e de aprendizagem em aulas de trigonometria, em um
cenário elaborado para o Ensino Médio incluindo recursos digitais. Em particular,
busco analisar a produção de significados e as metáforas apresentadas pelos alunos
durante as aulas de trigonometria para o círculo trigonométrico.
O cenário proposto, para estas aulas, foi construído utilizando-se os recursos
disponíveis para um professor da escola pública do estado de São Paulo, tais como
livros didáticos, a proposta curricular do Estado de São Paulo e programas
fornecidos pela Secretaria da Educação, bem como recursos disponíveis na internet,
privilegiando os OA - Objetos de Aprendizagem disponibilizados pelo MEC.
Este trabalho se insere na linha de pesquisa “Tecnologias Digitais e Educação
Matemática”, e o que me levou a escolher esta linha foi, em grande parte, minha
trajetória como professor de matemática, até chegar neste momento como
mestrando em educação matemática.
1.2 - Justificativa
Os motivos que me levam a direcionar essa pesquisa para o ensino da
trigonometria são vários, dentre eles estão: a dificuldade que, enquanto professor de
matemática, encontrei no ensino e aprendizagem da trigonometria no círculo
trigonométrico, as dificuldades evidenciadas por pesquisadores, em diferentes
países como Weber (2005) e Tall (2000) e a grande ênfase que os currículos atuais
dão a este tema.
Os livros didáticos analisados, com mais detalhes no capítulo 3, dedicam
grande número de suas páginas à trigonometria. Na proposta curricular do Estado
Capítulo 1 – Introdução
15
de São Paulo também vemos que o quarto bimestre do primeiro ano do Ensino
Médio e o primeiro bimestre do segundo ano do Ensino Médio são totalmente
voltados a este tópico. A ênfase dada a este tema pode ser justificada também pela
importância das aplicações das funções trigonométricas em diversas áreas, por
exemplo, física e engenharia.
Sou graduado em Engenharia Industrial Modalidade Mecânica, com certeza
esta escolha foi feita pelo gosto pelas ciências exatas na minha vida de estudante. E
foi durante o primeiro ano de engenharia que iniciei minha carreira de professor de
matemática. Nesta época ministrei minhas primeiras aluas de matemática para
alunos de 5ª, 6ª e 7ª séries, como professor substituto em uma escola da rede
estadual, o que perdurou durante todo meu primeiro ano de engenharia.
Nos anos seguintes iniciei minha breve carreira de engenheiro, e foi como
estagiário de engenharia que tive meu primeiro contato com computadores. Era
início dos anos 90 e as empresas iniciavam o processo de informatização, em pouco
tempo o computador começou a fazer parte do meu trabalho o que me levou, após
alguns anos, a deixar minha carreira de engenheiro para trabalhar como instrutor de
informática ministrando cursos de informática básica. Foi quando voltei a ministrar
aulas de matemática na rede estadual, e retornei a estudar fazendo o curso de
Licenciatura Plena em Matemática.
Como professor da rede estadual fui convidado a ministrar cursos de
informática básica para os professores da rede. Na época (1998 a 2000), o governo
estadual estava começando a implantar laboratórios de informática dentro das
escolas, e surgiram vários cursos de capacitação para os professores. Eu trabalhei
como instrutor de informática, ministrando vários destes cursos, que tinham como
base alguns softwares educacionais e os softwares Windows, Word, Excel.
Até então, embora a informática já fizesse parte de meu cotidiano, ainda não
utilizava os recursos tecnológicos em minhas aulas de matemática e foi durante
estes cursos que comecei a me interessar pelo uso de novas tecnologias em sala de
aula.
Durante os anos de 1999 a 2004 trabalhei com diversos cursos de informática
para professores, além dos cursos da rede estadual, ministrei cursos de inclusão
Capítulo 1 – Introdução
16
digital gerenciado pela Fundação Vanzolini, fornecido para qualquer funcionário
público, e o Programa de Educação Continuada para Municípios - PEC Municípios,
que se tratava de um curso de formação universitária (Normal Superior) para
professores de educação fundamental – ciclo I, da rede municipal, que tinham
apenas o magistério.
Este curso era realizado em pólos onde as aulas eram ministradas através de
vídeo conferência e as atividades eram entregues e realizadas pelos alunos em um
laboratório de informática com acesso a internet. Neste curso, apenas a primeira
etapa, com a qual eu trabalhei, de introdução à Informática não era realizado através
de vídeo conferência, mas sim de forma presencial, realizada no laboratório de
informática de cada pólo.
No decorrer da minha carreira como professor de matemática, algumas
dificuldades dos alunos durante minhas aulas de trigonometria me chamaram a
atenção. Uma aluna perguntou-me quando voltaríamos a usar “números normais”,
pois os números irracionais encontrados como 2π,
2 2,
3 3 , que eram resultados
freqüentes nestas aulas, isso me levou a refletir sobre suas dificuldades.
Entre as dificuldades que percebi entre os alunos destaco algumas que
considero importantes, pois foram dificuldades apresentadas por vários deles pelas
questões que apresentavam nas aulas, são elas:
Relacionar medidas de arcos em graus e em radianos.
Softwares de geometria dinâmica ou plotadores de gráficos não utilizam
radianos, mas sim os sistemas decimais, o que se torna uma linguagem
diferente da utilizada pelos livros didáticos que priorizam o radiano.
Utilizar as razões trigonométricas como valores que não têm unidade de
medida, que são adimensionais.
Em um artigo publicado no “Mathematics Education Research Journal” Keith
Weber (2005) fala da importância da trigonometria no currículo escolar. Para Weber,
compreender funções trigonométricas é um pré-requisito para a compreensão de
temas da física Newtoniana, arquitetura, agrimensura, e muitos ramos da
Capítulo 1 – Introdução
17
engenharia. Além disso, como a trigonometria é um dos primeiros temas da
matemática que faz a ligação entre a álgebra linear, a geometria e os gráficos, ela
pode servir como um importante precursor para a compreensão do pré-cálculo e do
cálculo.
Alguns
pesquisadores
já
identificaram
dificuldades
encontradas
no
aprendizado das funções trigonométricas, “Infelizmente, as fases iniciais de
aprendizado sobre funções trigonométricas são repletas de dificuldade.”. (Blackett &
Tall,1991 apud Weber, 2005).
O aprendizado das funções trigonométricas, a meu ver, se diferencia de
outros aprendizados da matemática, a forma de raciocinar é bastante peculiar e
exige do aprendiz além de coordenar diferentes representações - a gráfica, algébrica
e geométrica - coordenar as mesmas com uma linguagem que inclui números
racionais na forma fracionária, na forma decimal e números irracionais o que, em
geral, não é muito fácil para o aluno.
Segundo Blackett & Tall, (apud Weber, 2005) “Os alunos também precisam
relacionar diagramas de triângulos com relações numéricas e de manipular os
símbolos envolvidos nessas relações.”. E na minha prática verifico que muitos
estudantes não estão habituados com este tipo de raciocínio. Senti a necessidade
de investigar mais sobre o modo de raciocinar dos estudantes para que como
professor pudesse elaborar um cenário propicio para o ensino de trigonometria.
Além disso, Weber (2005) em seu artigo aponta que a pesquisa e a literatura
nesta área ainda são escassas. E hoje em 2010, encontro dificuldade para encontrar
pesquisas realizadas sobre este tema.
Dentre algumas pesquisas realizadas no ensino e aprendizagem da
trigonometria, podemos citar a pesquisa realizada por Blackett e Tall (1991, apud
Weber, 2005), onde foram analisados dois grupos de estudantes que tiveram aulas
de modo diferente: o primeiro grupo fez uso de computadores e de maneira
interativa e permitiu a exploração das propriedades numéricas e geométricas; o
segundo grupo foi ensinado por um professor da mesma escola que ensinava
trigonometria tradicionalmente. As conclusões de Blackett e Tall foram que os alunos
do primeiro grupo superaram significativamente os estudantes do segundo grupo,
Capítulo 1 – Introdução
18
tanto em testes com modelos convencionais quanto em testes atípicos para este
tema.
Como mostra esta pesquisa de Blackett e Tall (1991, apud Weber, 2005), o
uso de computadores facilitou o aprendizado de trigonometria, mas após 19 anos
desta pesquisa, com uma geração de “Nativos Digitais”, como detalhado no capítulo
2, e toda a evolução tecnológica ocorrida neste período, como devemos utilizar
estes recursos digitais em um cenário de aprendizagem?
Outra pesquisa, realizada por Kendal e Stacey (1997), onde dois grupos
distintos foram submetidos a aulas de trigonometria, constatou que os alunos que
aprenderam funções trigonométricas usando o triângulo retângulo foram melhores
em um pós-teste do que aqueles que aprenderam trigonometria usando o círculo
trigonométrico. Com este indício de dificuldade com o círculo trigonométrico, gostaria
de verificar se em um cenário construído com os recursos digitais atuais, é possível
superar esta dificuldade.
No Brasil uma pesquisa realizada por Costa (1997), que construiu uma
seqüência didática usando o “mundo experimental” e um ambiente computacional
mostrou a importância de se trabalhar nos dois contextos, com resultados mais
significativos com o grupo que trabalhou primeiro o “mundo experimental” e depois o
ambiente computacional. No “mundo experimental” foram utilizadas experiências
com simulador do alarme óptico, roda com a caneta laser e pêndulo de areia. Para
as atividades do mundo computacional foram utilizados os softwares Cabri II e
Graphmatica.
Como apresentado por Blackett e Tall (1991) e Costa (1997), o uso de
computadores colaborou com o ensino e aprendizagem da trigonometria, Kendal e
Stacey (1997) mostram a dificuldade dos alunos com o círculo trigonométrico. Então
estes indícios levam esta pesquisa a fazer o uso de programas de computadores
direcionados a aprendizagem da trigonometria no círculo trigonométrico, procurando
assim preencher esta lacuna.
Embora ainda sejam poucos os resultados de pesquisa sobre o ensino e
aprendizagem das funções trigonométricas a realidade atual é bastante diferente de
quando iniciei minha carreira. Com certeza atualmente os ambientes escolares são
Capítulo 1 – Introdução
19
mais ricos do que os encontrados nos anos 90, onde tínhamos apenas giz e lousa.
Hoje, os livros didáticos estão presentes nas escolas públicas, nos anos 90 este uso
se restringia na maioria das vezes ao livro didático do professor, que era utilizado
como um guia para o professor que repassava um resumo na lousa do que achava
mais importante e selecionava alguns exercícios para serem realizados pelos
alunos.
Em 2008 começou a ser implantada uma nova proposta curricular para o
Estado de São Paulo e a partir de 2009 os alunos e o professor receberam apostilas
denominadas “Caderno do Aluno” e “Caderno do Professor”, respectivamente, com
orientações e roteiros de aprendizagem. Esta proposta apresenta uma perspectiva
diferente para a trigonometria das apresentadas nos livros didáticos e que serão
comentadas mais adiante no capítulo 3.
Em relação às tecnologias, as escolas públicas do Estado de São Paulo
possuem laboratório de informática, possuem disponível para os professores um
notebook e projetor de imagens para usar em suas aulas. Na sala dos professores
existe um computador com impressora e internet em banda larga e podemos
encontrar na internet inúmeros aplicativos conhecidos como applets desenvolvidos
para o ensino de matemática, sítios oficiais de educação, como os disponibilizados
pelo MEC (Ministério de Educação e Cultura) que oferece um Banco Internacional
de Objetos Educacionais onde encontramos diversos aplicativos, softwares ou
vídeos em várias áreas de conhecimento. Também temos disponibilizado pelo MEC
o RIVED1 - Rede Internacional Virtual de Educação, onde se encontra muito
material.
Especificamente o RIVED disponibiliza no sítio www.rived.mec.gov.br o que
chama de “Objetos de aprendizagem”, apresentados conforme mostra a figura
abaixo. Para o Ensino Médio o RIVED disponibiliza 14 objetos de aprendizagem de
matemática, sendo 3 deles orientados para a aprendizagem da trigonometria.
1
RIVED é um programa da Secretaria de Educação a Distância do MEC.
Capítulo 1 – Introdução
20
Figura 1: Tela de abertura para acesso ao OA – “Trigonometria com Molas” do RIVED
Mais adiante no capítulo referente à fundamentação teórico metodológica
será descrito o conceito de OA – objeto de aprendizagem, adotado nesta pesquisa,
mas para o RIVED um OA, é definido como:
Um objeto de aprendizagem é qualquer recurso que possa ser reutilizado
para dar suporte ao aprendizado. Sua principal idéia é "quebrar" o conteúdo
educacional disciplinar em pequenos trechos que podem ser reutilizados em
vários ambientes de aprendizagem. Qualquer material eletrônico que
provém informações para a construção de conhecimento pode ser
considerado um objeto de aprendizagem, seja essa informação em forma
de uma imagem, uma página HTM, uma animação ou simulação.
(www.rived.mec.gov.br/site_objeto_lis.php - acesso 14/04/2009)
Embora o RIVED apresente esta definição de OA, a maneira que estes
objetos de aprendizagem são disponibilizados parece não atender a esta definição.
Pois, estes OAs acompanham um guia de utilização que, segundo os autores, deve
ser útil para professores que pretendem iniciar um trabalho com OAs, mas as
sugestões deste guia parecem levar o professor a “reproduzir” a atividade do mesmo
modo que fazia com o livro Didático, não fica explícito para o professor como ele
pode “reutilizar pequenos trechos do conteúdo” como sugere a definição utilizada
para OA.
Além disso, dificilmente um professor na escola da rede é também
programador ou conta com uma equipe que o ajudaria a modificar para reutilizar um
Capítulo 1 – Introdução
21
OA. Para conhecer e entender melhor os OAs utilizados, apresento uma análise
destes OAs, em capítulo dedicado à análise dos materiais disponíveis para professor
e aluno. No capítulo 3 apresento uma análise dos livros didáticos, da nova proposta
curricular do Estrado de São Paulo e dos Objetos de Aprendizagem.
Com o propósito de compreender como os alunos produzem significados e
metáforas para os conceitos de trigonometria, utilizo a Teoria da Cognição
Corporificada (Lakoff & Johnson (2001), Lakoff & Núñez (2000)). Tais processos tem
um impacto na análise do objeto de aprendizagem escolhido.
As
Metáforas
Conceituais
são
construtos
que
podem
ajudar
essa
compreensão, pois segundo Lakoff e Johnson (2001) “nosso sistema conceptual
ordinário, em termos do qual não só pensamos, mas também agimos, é
fundamentalmente metafórico por natureza.” Estes autores acrescentam que
A metáfora é, para a maioria das pessoas, um recurso da imaginação
poética e um ornamento retórico – é mais uma questão de linguagem
extraordinária do que de linguagem ordinária. Mais do que isso, a metáfora
é usualmente vista como uma característica restrita à linguagem, uma
questão mais de palavras do que de pensamento ou ação. Por essa razão,
a maioria das pessoas acha que pode viver perfeitamente bem sem a
metáfora. Nós descobrimos, ao contrário, que a metáfora está infiltrada na
vida cotidiana, não somente na linguagem, mas também no pensamento e
na ação. Nosso sistema conceptual ordinário, em termos do qual não só
pensamos, mas também agimos, é fundamentalmente metafórico por
natureza. (Lakoff; Johnson, 2001, p.39)
No capítulo 2 será detalhada a Teoria da Cognição Corporificada e as teorias
que vão compor o encaminhamento desta pesquisa.
1.3 - Problema
O foco desta pesquisa reside em investigar e analisar que aspectos são ou
não favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio,
especificamente sobre o círculo trigonométrico, em um ambiente utilizando recursos
digitais.
Pretendo ao final desta pesquisa responder algumas questões:
Capítulo 1 – Introdução
22
Questão 1 - Quais são os argumentos e metáforas utilizados pelos alunos
nesse cenário que podem influenciar na manutenção ou modificação do
mesmo?
Questão 2 - Que aspectos podem ser considerados mais ou menos
relevantes, para a construção de um cenário para a aprendizagem do
círculo trigonométrico, utilizando como recursos tecnológicos applets e
objetos de aprendizagem disponíveis na internet?
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
23
Capítulo 2
Fundamentação Teórico
Metodológica
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
24
Para embasar esta pesquisa descrevo a seguir os aspectos mais importantes
das teorias que auxiliaram tanto na elaboração do cenário quanto na análise deste
cenário partindo da compreensão dos estudantes. Primeiro descrevo alguns
aspectos da Teoria da Cognição Corporificada (Lakoff & Johnson, 2001, Lakoff &
Núñez, 2000), posteriormente trago um pouco sobre linguagem segundo Lev
Vygotsky com a contribuição do Círculo de Baktin. Em seguida apresento uma
análise sobre os ambientes virtuais e também o que entendo por OA - Objeto de
Aprendizagem.
Para o desenvolvimento do cenário de aprendizagem vamos utilizar o
conceito de Cenário para Investigação, que tem como princípio fundamental a
aprendizagem dos alunos através da investigação. (Skovsmose, 2008)
Encerro este capítulo com a descrição dos processos metodológicos desta
pesquisa, na qual caracterizo o local, os participantes e os instrumentos para coleta
e análise de dados.
2.1 - Teoria da Cognição Corporificada
Buscamos na lingüística cognitiva o papel da linguagem cotidiana na
construção do conhecimento, encontramos que para Lakoff e Johnson (2001) o
pensamento é metafórico e em sua maioria é concebido de forma inconsciente.
Cabe notar que segundo Bolite Frant2 (prelo) não se trata do inconsciente freudiano3
mas de ações que realizamos sem “esforço” do pensamento. Por exemplo,
levantamos da cama e caminhamos para a cozinha dificilmente pensamos sobre que
pé pisou primeiro a entrada na cozinha, podemos dizer que foi uma ação
inconsciente, ou seja de maneira automatizada.
Assumindo com Rabello e Bolite Frant (ver Boletim GEPEM) que pensamento
e linguagem são inseparáveis, um modo de investigar o pensamento metafórico é
através da linguagem utilizada pelos alunos.
2
Bolite Frant, J. (prelo) Linguagem, tecnologia e corporiedade: Produção de significados para o
Tempo em gráficos cartesianos.
3
Inconsciente Freudiano: não é um trauma.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
25
Concordamos com vários pesquisadores da Teoria da Cognição Corporificada
(Lakoff e Johnson (2001), Lakoff e Núñez (2000)), que os processos cognitivos não
dependem somente da atividade cerebral, mas estão vinculados também às
diversas partes do corpo humano. São as experiências de nosso cotidiano, nossa
interação com o meio ambiente e meio cultural, que estruturam nosso pensamento,
assim existe uma relação indissociável entre corpo e mente. A dicotomia mente
corpo é inexistente. “A natureza detalhada e dinâmica de nossos corpos, nosso
cérebro e nosso funcionamento cotidiano no mundo, estruturam os conceitos e a
razão humana. Isto inclui os conceitos matemáticos e o raciocínio matemático.”
(Núñez, 2000, p.6). Sendo assim recorro à Teoria da Cognição Corporificada para
melhor entender os mecanismos que nos permitem pensar sobre um determinado
conceito e como aprendemos conceitos novos.
Lakoff & Johnson (2001) afirmam que as metáforas são partes integrantes de
nosso pensamento, elas não são apenas recursos da linguagem poética, mas
também pensamento e ação. “A essência da metáfora é compreender e experienciar
uma coisa em termos de outra”. (p. 41). Eles também afirmam que a maioria de
nossos pensamentos ocorrem de forma metafórica e inconsciente.
Todos nós temos sistemas conceituais que usamos ao pensar, mas não
podemos, conscientemente, inspecionar nosso inventário conceitual . Todos
nós tiramos conclusões instantaneamente numa conversação, mas não
podemos olhar, conscientemente, para cada inferência nem para os nossos
próprios mecanismos de inferir enquanto estamos no ato de inferir em larga
escala segundo por segundo. Todos nós falamos em uma língua que tem
uma gramática, mas não colocamos as frases juntas palavra por palavra
checando conscientemente se estamos seguindo as regras de nossa língua
em cada frase. Para nós, isto parece fácil: apenas falamos, ouvimos e
tiramos conclusões sem esforço. Mas o que ocorre em nossas mentes, no
pano de fundo, é enormemente complexo e amplamente não disponível
para nós. (Lakoff & Núñez, 2000, p. 27).
Segundo esses autores a Metáfora Conceitual é um mecanismo cognitivo que
nos permite fazer inferências num domínio desconhecido (alvo) partindo de
inferências que são possíveis e válidas em um domínio conhecido (fonte). Em outras
palavras, o conhecimento de algo novo não acontece no vazio, não vem do nada,
mas das relações inferenciais que fazemos sobre o que conhecemos e projetamos
para este domínio alvo.
Para exemplificar apresento o conceito de vida entendido através de
inferências possíveis a partir das realizadas para o conceito de viagem. Podemos
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
26
entender uma vida como uma viagem, não que ela seja um tipo de viagem, mas o
modo como caracterizamos uma vida pode partir do modo pelo qual caracterizamos
uma viagem.
Já conheço os passos dessa estrada
Sei que não vai dar em nada
Seus segredos sei de cor
Já conheço as pedras do caminho
E sei também que ali sozinho
Eu vou ficar, tanto pior
Metáfora: VIDA É VIAGEM
Domínio Fonte
Domínio Alvo
VIAGEM
VIDA
Pedras
Dificuldades
Estrada, caminho
Linha da vida
Passo
Atitudes
Tabela 1 – Metáfora VIAGEM É VIDA
Nestes versos Chico Buarque utiliza da metáfora “VIDA É VIAGEM”, assim
quando cita passos faz referência a nossas atitudes, pedras as dificuldades
encontradas e estrada ou caminho o decorrer da vida. Repare que uma dificuldade
não é exatamente uma pedra mas as inferências que podemos fazer como tropeçar
na pedra e cair nos levam a pensar que podemos enfrentar e sair de dificuldades na
vida.
Nos exemplos abaixo estão grifados vários termos que caracterizam uma
viagem onde para entendermos a vida utilizamos de nossos conhecimentos de
viagem, ou seja entendemos uma coisa “abstrata” em termos de outra mais tangivel.
Não sei qual caminho seguir
Ele teve uma vida longa
Demorou para chegar este momento
Encontrei muitos obstáculos para chegar até aqui
Foi uma longa jornada
Ele vai chegar lá
Vamos seguir em frente
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
27
Podemos perceber que nestes casos não apenas falamos de vida com os
mesmos termos de uma viagem, mas nossas ações durante a vida também são as
mesmas de uma viagem, escolhemos caminhos, seguimos em frente, superamos
obstáculos. Mesmo para uma pessoa que nunca tenha viajado, o conceito de uma
viagem está impregnado na cultura social, conhecemos vários tipos de viagens
através de relatos de outras pessoas, filmes, documentários, reportagens, internet,
ou seja, mesmo sem ter participado de uma viagem estes conceitos fazem parte de
nossa cultura. Este tipo de metáfora é concebido como metáfora estrutural, pois
estrutura nosso sistema conceitual.
Lakoff & Johnson (2001, p.44) nos apresentam outro exemplo que é a
metáfora “TEMPO É DINHEIRO”, neste exemplo concebemos o tempo como sendo
dinheiro.
“Você está desperdiçando meu tempo.
Esta coisa vai te poupar horas.
Eu não tenho tempo para te dar.
Como você gasta seu tempo hoje em dia?
Aquele pneu furado me custou uma hora.”
Em nossa cultura o tempo é algo muito valioso. Para nós o tempo é limitado
assim como o dinheiro e as expressões gastar, investir, poupar, dar, custou são
expressões que não apenas se aplicam ao tempo, mas são atitudes que temos
diante do tempo e do dinheiro.
Em uma cultura onde não se utilize o dinheiro, como uma tribo indígena, com
certeza não se aplicaria estas expressões e o conceito de tempo deve ser diferente
das culturas capitalistas. Assim, as ações diante do tempo também serão
provavelmente diferentes.
Cabe observar, portanto, que a teoria da corporeidade engloba também o
contexto sócio-cultural. O que não poderia ser diferente, uma vez que se trata de
uma teoria que leva em conta o ser humano que tem seu lugar na história, na
sociedade e no contexto cultural.
Além das metáforas estruturais que são as usadas para entender uma
estrutura através de outra, existem as metáforas orientacionais, que recebem este
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
28
nome por ter relação com nossas orientações espaciais; acima/abaixo, dentro/fora,
profundo/superficial.
Expressamos um estado de espírito, muitas vezes, através de metáforas
orientacionais, por exemplo FELIZ É PARA CIMA, TRISTE É PARA BAIXO, quando
estamos tristes ou deprimidos podemos dizer que “Estou para baixo hoje”, quando
nos referimos a alguém feliz dizemos “Ele esta para cima hoje”, ou usarmos o
polegar PARA CIMA ou PARA BAIXO. Observe que a linguagem engloba os gestos,
assim enunciar “Estou para baixo” ou mostrar o polegar PARA BAIXO são
expressões sinônimas.
Quando falamos de afeição usamos muitas vezes das inferências que
fazemos para temperatura para caracterizá-la, vejamos os exemplos: “Eles me
acolheram calorosamente”; “Você foi frio comigo hoje”. Nestes casos a temperatura
é o domínio fonte e a afeição é o domínio alvo. Outro exemplo é a importância
conceitualizada como tamanho: “Tenho um grande problema para resolver”, “Ele foi
um grande homem”, “Não me abato com pequenas coisas”.
Também podemos nos utilizar de várias fontes diferentes para conceber um
novo conceito, sendo assim teremos mais de um domínio fonte para um único
domínio alvo, neste caso temos as montagens conceituais.
Um exemplo de metáfora conceitual dentro da matemática é dado por Bolite
Frant et al (2004) onde temos a metáfora PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS.
Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS
Domínio Fonte
Domínio Alvo
COISAS FÍSICAS
PONTO
Um corpo físico no espaço.
Um ponto no plano cartesiano.
Um carro se movendo ao longo de uma Um ponto que se "move" ao longo de
trajetória.
uma curva que representa uma função
real.
Um carro que viaja através de um túnel é Um ponto que se "move" ao longo de
o mesmo quando ele entra e sai do túnel. uma curva é sempre a mesmo.
A trajetória representa o movimento.
O gráfico na tela é a trajetória do ponto.
Tabela 2 – Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS (in Bolite Frant)
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
29
Lakoff & Nuñez (2000) distinguem dois tipos de metáforas conceituais as
Metáforas Básicas e as Metáforas de Ligação.
A diferenciação se dá por conta de que o pensamento metafórico não ocorre
apenas entre domínios distintos, mas também entre domínios de mesma natureza.
O exemplo acima trata de uma Metáfora Básica já que o domínio fonte e o domínio
alvo são distintos.
As Metáforas Básicas relacionam a matemática com os conhecimentos do
cotidiano, logo o domínio fonte está relacionado, geralmente, com nossas
experiências sensoriais, são nossas experiências do cotidiano, e o domínio alvo é o
conhecimento matemático. Os mapeamentos do tipo metáforas básicas geralmente
não requerem esforços e são realizados de maneira inconsciente.
As Metáforas de Ligação nos ajudam a entender melhor as idéias mais
avançadas da matemática, e os dois domínios são iguais, como veremos a seguir
para o caso do círculo trigonométrico. No nosso caso, são mapeamentos que
possuem domínio fonte e alvo na matemática, permitindo deste modo conceitualizar
um domínio matemático através de outro domínio matemático. Segundo Lakoff e
Núñez (2000) estas metáforas exigem um esforço maior e um grau de instrução
maior e mais explícito.
Para este trabalho ressalto as metáforas orientacionais, onde criamos uma
linguagem de movimento para coisas estáticas. Talmy (2000) tratou estas metáforas
como movimento fictivo onde, pela análise de expressões lingüísticas do cotidiano,
cenas estáticas são descritas em termos dinâmicos. Ele mostra o uso e ocorrência
do movimento fictivo na linguagem falada, sua representação mental, e do
seqüenciamento dos componentes do caminho na representação mental. Isso
constrói um interessante par contrastivo transformando cenas estáticas em cenas
descritas mentalmente em termos dinâmicos.
Estas metáforas aparecem com freqüência, quando indicamos um caminho
para alguém, falamos “desça esta rua e quando ela cruzar com a outra rua você
vira”, estas duas ruas não vão se cruzar, elas estão estáticas e continuarão assim,
mas usamos termos que sugerem o movimento das ruas. E isto facilita a
compreensão do que estamos falando.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
30
O movimento fictivo também aparece no pensamento matemático, segundo
Lakoff e Núñez (2000) e Núñez (2004), ao falar de determinados objetos
matemáticos com propriedades estáticas, por exemplo funções de uma variável real,
utilizamos uma linguagem dinâmica dando a idéia de movimento, a função cresce.
Perceba que ao falar, por exemplo, de limite de uma função usamos uma linguagem
próxima ao nosso cotidiano, tende, se aproxima de equivale a limx→∞ (x²+1). Para os
autores a manifestação de movimento para expressar as idéias matemáticas é
genuína e constitutiva, no entanto, esses movimentos não são capturados pelos
formalismos e sistemas axiomáticos da matemática. Nossa hipótese é a de que com
o dinamismo de applets e OAs este movimento fictivo pode ser capturado de modo a
torná-lo factivo.
Ampliando as possibilidades propostas pela teoria das metáforas conceituais,
a teoria das montagens conceituais, segundo Fauconnier & Turner (1998), propõe
que além dos mapeamentos do tipo das metáforas conceituais realizado entre um
domínio fonte e um domínio alvo, podemos ter um mapeamento que integre
diferentes espaços mentais. Uma das possibilidades é o mapeamento entre quatro
espaços mentais: Domínio Fonte, Domínio Alvo, Espaço Genérico e o Espaço de
Montagem. Conforme apresenta a figura 2 o espaço genérico representa uma
estrutura conceitual que é compartilhada pelo domínio fonte e domínio alvo, e o
espaço de Montagem é onde os objetos dos domínios são combinados e integrados.
Espaço Genérico
Entrada 1
Entrada 2
Montagem
Figura 2: Os espaços de uma Montagem Conceitual
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
31
Em “Where Mathematics – Comes From”, Lakoff e Núnez (2000) sugerem
como pode ser a compreensão do círculo trigonométrico seguindo uma perspectiva
da teoria da cognição corporificada. Para eles a construção do círculo trigonométrico
pode ser compreendida a partir de três estágios. Estes estágios mostram um pouco
da complexidade da construção do círculo trigonométrico.
A metáfora ÂNGULOS SÃO NÚMEROS, fundamental ao campo da
trigonometria, segundo Lakoff e Nuñez (2000), conceitualiza ângulos como números.
Em primeiro lugar há a montagem conceitual do Círculo Unitário. Tal montagem
possui três estágios que apresentamos a seguir.
No primeiro estágio temos a montagem de dois elementos em dois domínios:
um círculo no plano euclidiano combinado com o plano cartesiano de modo a gerar o
círculo unitário - um círculo cujo centro está no ponto (0,0) do plano cartesiano e que
tem raio 1. Quando esta montagem é feita, são atribuídos números aos
comprimentos das cordas do círculo dado que a combinação metafórica Números
são Pontos é inerente ao Plano Cartesiano. Lakoff & Núñez (2000) descrevem mais
detalhadamente, dividindo esta metáfora em três estágios conforme mostramos a
seguir.
Primeiro Estágio:
Domínio I
Domínio II
Um círculo no plano euclidiano com centro O plano cartesiano com os eixos x e y,
e raio
origem em (0,0)
Plano Euclidiano
Plano Cartesiano
Centro
Origem
Raio
Distando 1 unidade da origem
Tabela 3 – Domínio fonte para o Círculo Trigonométrico - Fonte: Lakoff & Núñez, 2000, p.390.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
32
Figura 3: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico (Lakoff & Núñez, 2000, p.390)
Segundo Estágio:
O segundo momento desta construção é a combinação do resultado do
primeiro estágio com o ângulo qualquer de medida α com o vértice na origem do
eixo cartesiano, o ponto (0,0), e um de seus lados sobre o eixo x.
Figura 4: 2º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.391)
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
33
Terceiro Estágio
No terceiro momento temos a combinação do segundo estágio com o
triângulo retângulo, onde a hipotenusa é o raio do círculo o vértice do ângulo α esta
sobre a origem do eixo cartesiano e o cateto adjacente esta sobre o eixo x.
Figura 5: 3º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.392)
Dada a Combinação Metafórica do Círculo Trigonométrico Unitário, é possível
enunciar de forma mais simples a Metáfora da Trigonometria:
Domínio Fonte
Domínio Alvo
Círculo trigonométrico Unitário
Funções Trigonométricas
Comprimento do Arco definido pelo Ângulo α
Número associado ao Ângulo α
Comprimento do Lado a
Função sen α
Comprimento do Lado b
Função cos α
Tabela 4 – Metáfora para o Círculo Trigonométrico
Uma vez que, para levantarmos as metáforas e/ou montagens realizadas
pelos alunos, iremos investigar suas interações neste ambiente, é necessário
também colocar de que modo estaremos tratando da linguagem nesse estudo.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
34
2.2 - Linguagem
Procurando compreender melhor as relações dos processos de ensino e de
aprendizagem, descrevo a seguir algumas definições do que são o pensamento e a
linguagem segundo Vygotsky (2001) e algumas contribuições de Bakhtin (apud, Brait
2005) a compreensão do uso da linguagem.
Para Vygotsky (2001) os processos de ensino e de aprendizagem são
concebidos pela presença do outro social, portanto a linguagem é um elemento
fundamental nesse processo.
Para Vygotsky (2001) pensamento e linguagem são indissociáveis, a relação
entre o pensamento e a palavra se estabelece por um movimento contínuo de vai e
vem, do pensamento para a palavra e vice versa, assim, o pensamento não é
simplesmente expresso em palavras, é por meio delas que ele passa a existir
A relação entre pensamento e linguagem é uma característica tipicamente
humana, mas essa relação não nasce com o sujeito, ela não aparece pronta, ela é
estabelecida ao longo do desenvolvimento psicológico. Num determinado momento
do desenvolvimento humano essas duas potencialidades se unem e não se separam
mais.
Para Vygotsky (1987, apud Oliveira, 1999, p. 60), o sentido da palavra é:
...complexo, fluido, estando em constante mudança. Até certo ponto ele é
único para cada consciência e para a mesma consciência em circunstâncias
diversas. Quanto a isso, o sentido da palavra é inesgotável. A palavra
adquire seu sentido na frase. A frase, entretanto, adquire seu sentido
somente no contexto do parágrafo, o parágrafo no contexto do livro, e o livro
no contexto das obras completas do autor. Em última instância, o verdadeiro
sentido da palavra é determinado por tudo aquilo que, na consciência, se
relaciona com o que apalavra expressa. (...) Em última instância, o sentido
de uma palavra depende da compreensão que se tenha do mundo como um
todo e da estrutura interna da personalidade.
Para também auxiliar minha pesquisa recorro aos estudos do Círculo
Bakhtiniano, que possui uma extensa obra sobre a concepção de linguagem.
Segundo Brait (2005) o Círculo de Bakhtin enxerga a linguagem como um constante
processo de interação mediado pelo diálogo.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
35
A língua materna, seu vocabulário e sua estrutura gramatical, não
conhecemos por meio de dicionários ou manuais de gramática, mas graças
aos enunciados concretos que ouvimos e reproduzimos na comunicação
efetiva com as pessoas que nos rodeiam. (Bakhtin, apud Brait,2005, p.95)
Segundo Brait (2005) para Bakhtin o enunciado é resultado não apenas do
locutor, mas de uma interação de locutor e interlocutor, quem fala ou escreve
sempre o faz para alguém e sendo assim este diálogo sofrerá influencia do contexto
social, histórico, cultural e ideológico em que ele está envolvido. Neste contexto
todos que estão envolvidos com o enunciado participam em condições de igualdade.
Quando alguém enuncia o faz de maneira a ser compreendido, para isto seleciona o
tipo de discurso e quais palavras são as mais adequadas para aquele enunciado.
Com base nesta seleção de palavras e tipos de discurso o Círculo de Bakthin
faz uma reflexão sobre os gêneros de discurso, na qual realiza uma classificação
destes gêneros quanto às esferas de uso da linguagem. Temos dois tipos de
discursos os primários e os secundários. Os discursos primários são os utilizados de
forma espontânea em nossa vida cotidiana, já os discursos secundários são mais
elaborados e seguem um padrão cultural de acordo com a esfera na qual ele está
contido. Por exemplo, um palestrante fará seu discurso com o gênero apropriado de
acordo com o público, uma vez que cada esfera cultural possui seus códigos e
acordos. Como explica Di Fanti (2003):
A linguagem do ponto de vista bakhtiniano tem vida em um espaço
enunciativo-discursivo e, com isso, amplia-se mais ainda ao ser considerada
não como um privilégio do verbal, ou seja, todas as manifestações que
tenham a interferência do homem constituem-se como linguagem,
enunciado, texto. Essa posição é clara em O problema do texto (BAKHTIN,
1992 [1959-1961]) já que todo texto tem sujeito, é enunciado, e aglutina o
verbal e o extraverbal. Além disso, a constituição em texto é uma condição
para haver objeto de estudo e de pensamento. (p.100)
Segundo Bakthin o conhecimento é do domínio da enunciação. Assim,
afirmam Rabello e Bolite Frant (2002) que não existe conhecimento em livros, pois
ali há apenas enunciados. O que está enunciado no livro é um texto, acabado, por
isso é preciso a enunciação efetiva daqueles enunciados para que eles tomem parte
na produção de conhecimentos.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
36
As interações e a linguagem que devemos analisar ocorrem num cenário que
elaboramos para tal. A seguir comentamos sobre o embasamento do mesmo.
2.3 - Cenário para investigação
O conceito de cenário para investigação que será utilizado nesta dissertação
é o apresentado por Skovsmose (2008), onde ele diz que:
Um cenário para investigação é aquele que convida os alunos a formular
questões e procurar explicações. O convite é simbolizado por seus “Sim, o
que acontece se...?”. Dessa forma os alunos se envolvem no processo de
exploração. O “Por que isto?” do professor representa um desafio, e os
“Sim, por que isto...?” dos alunos indicam que eles estão encarando o
desafio e que estão em busca de explicações. Quando os alunos assumem
o processo de exploração e explicação, o cenário para investigação passa a
constituir um novo ambiente de aprendizagem. (Skovsmose, 2008, p.20)
Para a constituição de um cenário de investigação Skovsmose destaca a
importância do convite do professor aos alunos para sua participação. Este convite
pode ser feito de muitas maneiras pelo professor, mas sua aceitação depende
somente do aluno, pois ele é o responsável pelo seu processo de aprendizagem,
mas cabe ao professor tentar tornar a situação atrativa aos alunos. Também é
importante ressaltar que para determinado grupo de alunos um cenário de
investigação pode ser perfeitamente atrativo e este mesmo cenário não ser
adequado a outro grupo de alunos. A determinação deste cenário é uma questão
empírica que apenas a prática do professor e dos alunos envolvidos pode respondêla.
Segundo Skovsmose (2008) a prática em sala de aula que predomina hoje
em dia é a resolução de exercícios. Dentro desta prática temos referencias a três
segmentos do ensino da matemática, referência a matemática pura, a semirealidade e a realidade. A proposta não é de acabar com a prática de exercícios,
mas a de também utilizar cenários de investigação dentro destas três referências,
criando novas alternativas de ambientes de aprendizagem. Embora a utilização de
um cenário para investigação em sala de aula diferencie em muito a prática da
resolução de exercícios a utilização dos diversos caminhos podem otimizar a
produção de significados matemáticos pelos alunos. Em nenhum momento
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
37
Skovmose defende a substituição das práticas atuais pelos cenários de
investigação, mas aponta estes cenários como uma alternativa de prática em sala de
aula.
Skovmose resume os ambientes de aprendizagem em seis grupos, três deles
tendo como base a prática de resolução de exercícios e três tendo como base um
cenário para investigação, conforme mostra a tabela a seguir:
Exercícios
Cenários para
investigação
Referências a matemática pura
(1)
(2)
Referências à semi-realidade
(3)
(4)
Referência à realidade
(5)
(6)
Tabela 5 – Ambientes de aprendizagem (Skovsmose, 2008, p.23)
A sugestão de Skovsmose é a de tentarmos migrar de práticas como
exercícios para práticas de cenários de investigação. No ambiente (1) caracterizado
pela resolução de exercícios onde o enunciado quase sempre diz “resolva as
equações”, “efetue”, “calcule”, assim de maneira quase automática e seguindo
determinadas regras, os alunos chegam ao resultado. Pode se tentar converter
estes exercícios em um cenário de investigação quando possibilitamos que os
alunos descubram algumas regras através de investigações realizadas por eles, por
exemplo, podemos convidar os alunos a experimentarem outras maneiras de
resolver os mesmos exercícios, perguntar “o que acontece se...?”, estimular os
alunos a questionar os resultados, perguntas do tipo “porque sempre acontece...?”
são questões que devem aparecer quando um cenário de investigação é criado.
O cenário de investigação criado nesta pesquisa tenta seguir estas
sugestões, assim utilizamos de questionamentos durante a aplicação dos cenários
para guiar os alunos a uma investigação dos estudos em trigonometria, mas também
como é proposto, não eliminamos os exercícios deste cenário, uma vez que fazem
parte da realidade dos alunos. Buscamos iniciar com exercícios e seguir cada vez
mais na direção da criação de um cenário de investigação.
O ambiente (3) é muito comum na prática docente, desde os primeiros anos
de estudo da matemática. Nele os alunos convivem com problemas de referência à
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
38
semi-realidade. Um exemplo desta semi-realidade muito comum nos livros didáticos
quando abordado o tema trigonometria é:
- Um edifício forma uma sombra de 10 m sobre o solo, formando um ângulo de
30º com o solo, determine a altura do edifício.
Com certeza nenhum autor de livro didático foi medir o comprimento da
sombra ou o ângulo que esta forma com o solo, mas os alunos aceitam estas
condições para resolver o exercício. Nenhum outro aspecto é levado em
consideração, e o que parece acontecer é que existem padrões de semi-realidade e
se criam técnicas para a resolução destes problemas. Assim toda vez que temos um
problema envolvendo sombras de árvores ou edifícios, utiliza-se das razões
trigonométricas para resolvê-lo.
Esta semi-realidade também pode ser utilizada em um cenário para
investigação, desde que se tente explorar as características matemáticas que
circundam este problema. A abordagem que o professor pode realizar dentro desta
semi-realidade pode levar o aluno a transformá-lo em um cenário de investigação,
perguntas do tipo “o que acontece se...?” pode ser muito útil para a construção deste
cenário. Esta que é a situação (4), sugerido por Skovsmose, pode ser muito rica
para a construção de um cenário de aprendizagem, pois a simulação de uma
situação hipoteticamente real poderá facilitar o entendimento e contextualização da
matemática pelos alunos.
Podemos construir cenários com semi-realidade bastante próxima da
realidade, um exemplo poderia ser a de construir maquetes de edifícios e expô-las
ao sol para medir sua sombra, assim podemos explorar outras situações que
poderão aparecer, os alunos, por exemplo, poderão indagar quanto ao horário e o
tamanho da sombra, perguntas sobre escalas ou qualquer situação não prevista.
Para um cenário de investigação a curiosidade é um fator muito importante, levando
o aluno a ser protagonista em seu processo de aprendizagem.
Skovsmose sugere que o cenário de investigação seja propiciado aos alunos
antes mesmo de demonstrar ou trabalhar as propriedades matemáticas que são
pertinentes ao problema. Utilizando o exemplo anterior, se já foi trabalhado com os
alunos as razões trigonométricas, dentro de um cenário de investigação, eles
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
39
provavelmente irão tentar utilizar as fórmulas ou exemplos desenvolvidos nas aulas
anteriores, mas se a primeira aula for dentro do cenário de investigação, este poderá
trazer outras contribuições para o processo de aprendizagem e a partir deste cenário
de investigação poderemos chegar aos conceitos matemáticos desejados.
Os ambientes de aprendizagem (5) e (6) fazem referência a situações reais,
mesmo assim estas podem ser implementadas simplesmente como um exercício se
as possibilidades que forem oferecidas não forem trabalhadas e isolarmos apenas
alguns valores reais para desenvolvermos alguns cálculos.
Para que tenhamos em situações reais um cenário para a investigação,
Skovsmose diz que o professor tem que assumir a possibilidade de sair de uma
zona de conforto indo a uma zona de riscos4 (Penteado 2001), onde alunos podem
explorar áreas não esperadas pelo professor e assim tendo que assumir um papel
também de investigador, como seus alunos. O professor pode guiar todos os passos
dos alunos, evitando assim sair da zona de conforto, e transformando o que seria
um cenário de investigação em um exercício, mas é a possibilidade de entrar na
zona de risco que pode nos levar a novas possibilidades de aprendizagem para
ambos: alunos e professores.
Nesta pesquisa será proposto aos alunos participantes um cenário de
investigação que inclui applets e OAs.
Propomos aos alunos uma investigação
sobre o círculo trigonométrico, para melhor entendermos como eles produzem
significados para as funções seno e cosseno, levantando assim algumas
possibilidades para o ensino em trigonometria.
2.4 - Ambientes Virtuais e Objetos de Aprendizagem - OAs
Os ambientes virtuais, hoje, são uma realidade em muitos setores da
sociedade, seja para diversão ou para grandes transações comerciais. Os recursos
tecnológicos que utilizamos hoje através dos computadores, celulares, calculadoras
4
Segundo Penteado (2001), a zona de conforto é uma situação vivida pelo professor na qual quase
tudo é previsível, conhecido e controlável em suas aulas. Na zona de risco, por sua vez, imperam a
imprevisibilidade e a incerteza, o surgimento de situações inesperadas é uma constante e o professor
deve estar preparado para enfrentá-las.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
40
ou qualquer outro dispositivo tecnológico, podem ter superado as expectativas de
muitas pessoas, mas para as gerações que nasceram e cresceram com esta
tecnologia estes são recursos muito simples de manipular e quase corriqueiros. Mas
esta tecnologia ainda sofre resistência para entrar na sala de aula.
Prensky (2001) nomeia esta nova geração, que nasceu e cresceu utilizando
computadores, controles remotos, celular e toda esta tecnologia que nos cerca
atualmente, como sendo “Nativos Digitais” e nomeia a geração de pessoas que
embora não tenha nascido com toda esta tecnologia, faz uso constante dela, como
sendo os “Imigrantes Digitais”.
Justificando o nome atribuído para estas gerações Prensky diz que como
imigrantes, sempre manteremos um sotaque da língua materna, ou seja, por mais
que utilizemos as novas tecnologias sempre temos em nossas atitudes vestígios de
um passado onde ela ainda não existia. Como exemplo de atitudes de um “Imigrante
Digital” podemos citar que muitos destes imigrantes ainda imprimem um texto para
sua leitura enquanto poderiam simplesmente lê-lo na própria tela do computador, ou
ainda um “imigrante”, com menor grau de adaptação ao novo ambiente, se utiliza do
telefone para confirmar o recebimento de um email.
...o maior problema que a educação enfrenta hoje é que os nossos
instrutores são “Imigrantes Digitais”, que falam uma língua desatualizada (a
da idade pré-digital), e que estão se esforçando para ensinar a população
que fala uma língua inteiramente nova. (Prensky, 2001)
Para diferenciar as duas gerações Prensky apresenta algumas características
que diferenciam os nativos dos imigrantes digitais.
“Nativos Digitais”
Imigrantes Digitais
Recebem informações muito rápido.
Recebem informações lentamente.
Realizam atividades em paralelo e multitarefas.
Realizam atividades passo a passo e
uma coisa de cada vez.
Gostam de gráficos antes de seu texto.
Gostam de textos antes dos gráficos.
Preferem acesso aleatório das
informações (tipo hiperlink).
Preferem acesso linear das informações.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
41
Funcionam melhor quando ligados em
rede.
Funcionam melhor individualmente.
Gostam de jogos de trabalho.
Preferem trabalhos a sério.
Prosperam com a gratificação
instantânea e recompensas freqüentes
Prosperam com gratificação estáveis e
duradouras.
Tabela 6 – Nativos e Imigrantes Digitais
Hoje não precisamos mais discutir se o uso de novas tecnologias irá alterar o
modo que as pessoas vivem ou se estas tecnologias irão trazer benefícios para a
educação, pois a verdade é que estas modificações já fazem parte de nossas vidas,
e a competitividade do mercado em todas as áreas impulsiona cada vez mais estas
mudanças e cada vez mais a sociedade necessita de tecnologias cada vez mais
sofisticadas. Nenhum de nós consegue conviver na sociedade atual sem a influência
das evoluções tecnológicas, e nossos alunos também estão envolvidos nesta
mudança. Muitos destes alunos são tão familiarizados com vários tipos de
ambientes virtuais que nem podem imaginar como seria viver sem estas tecnologias.
Sendo assim o uso de ambientes virtuais faz parte da linguagem cotidiana de
nossos alunos e a utilização desses ambientes em sala de aula não me parece ser
apenas mais uma ação motivadora para uma determinada aula, mas sim uma
conseqüência natural da evolução tecnológica em que todos, professores e alunos,
estamos inseridos.
Compartilho da idéia de Miskulin (1999) que educar em uma Sociedade da
Informação é muito mais do que “treinar” pessoas no uso das novas tecnologias;
trata-se de formar os indivíduos para "aprender a aprender" de forma a prepará-los
para a contínua e acelerada transformação do conhecimento tecnológico.
A escola em que realizo esta pesquisa, é uma escola na periferia de uma
cidade do interior de São Paulo. Os alunos, na sua maioria, tem familiarização com
computadores, celulares de última geração e outros equipamentos tecnológicos.
Então, nós professores, não temos mais porque perguntar se devemos utilizar um
ambiente virtual, mas sim, perguntar como elaborar um cenário de investigação que
utilize tecnologia computacional.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
42
Nós podemos observar que nas escolas onde a tecnologia está demorando a
chegar em suas salas de aula, seja por políticas educacionais conservadoras, seja
por resistência dos profissionais da educação ou por dificuldades econômicas,
vemos que os próprios alunos estão fazendo com que a tecnologia invada as salas
de aula de alguma forma, quer seja pelo celular ou por trabalhos realizados no
computador e internet ou qualquer outro tipo de intervenção que eles mesmos
utilizam em seus aprendizados.
Os alunos utilizam este ambiente como uma prótese cognitiva (Bolite Frant,
2010). A metáfora “TECNOLOGIA É PRÓTESE” propõe que o uso da tecnologia nos
permite fazer de forma diferente, forma esta que não seria possível realizar sem o
uso da tecnologia, fazendo-nos assim produzir um conhecimento diferente daquele
que produziríamos sem o uso da tecnologia.
Portanto o uso da tecnologia não apenas torna possível realizar alguma
atividade, mas também modifica a forma de agir e pensar sobre algo. Não adotamos
a tecnologia apenas como uma ferramenta facilitadora, muito mais que isto, a
tecnologia modifica e cria novas possibilidades e formas de pensamento.
Nesta pesquisa a tecnologia utilizada são os Objetos de Aprendizagem (OA).
Cabe observar que a palavra objeto utilizada tanto no contexto cotidiano quanto no
contexto acadêmico traz diversas significações. Deste modo faz-se necessário
colocar, já que concordamos com Bakhtin e outros acima citados, para nós os
objetos devem ser constituídos na e pela linguagem. Então no máximo poderíamos
falar em Objeto de Ensino – que seria utilizado e escolhido pelos professores e/ou
Objeto
Para
Aprendizagem
(OPA)
que
podem
ser
aprimorados
pelos
alunos/aprendizes.
No entanto, herdando da ciência da computação a idéia de “programação
orientada objeto” surgem os Objetos de Aprendizagem e como veremos a seguir
algumas definições que os caracterizam.
Algumas definições tratam os aspectos técnicos como a manipulação dos
objetos e armazenamentos, outras tratam os aspectos educacionais e pedagógicos.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
43
A definição mais utilizada é a de Wiley (2000) que define um OA “como
qualquer recurso digital que possa ser reutilizado e ajude na aprendizagem”. Para
nós, esta definição por ser tão ampla não caracteriza adequadamente, isto é, ela é
pouco operacional.
Uma definição bastante técnica (Downes, 20001 apud Handa, 2003) é dada
pelo Instructional Management Systems (IMS) - consórcio de especificações dos
fabricantes de softwares em que apresenta Objetos de Aprendizagem segundo a
idéia de “programação orientada objeto” e define OA como:
“um conjunto de informações que contém rotinas e estruturas de dados que
interagem com outros objetos. Nos Objetos de Aprendizagem, o “objeto”
serve para encapsular ou “armazenar” materiais digitais, transformando-os
em módulos reutilizáveis de fácil manipulação.” (p.116).
Weller, et al. (2003) também apresentam uma definição bastante ampla para
o objeto da aprendizagem definindo-o como “a parte digital de um material didático
que aborda um tema claramente definido ou resultados de aprendizagem e tem o
potencial para ser reutilizado em diferentes contextos.”
A definição utilizado pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC é a
seguinte:
Um objeto de aprendizagem é qualquer recurso que possa ser reutilizado
para dar suporte ao aprendizado. Sua principal idéia é "quebrar" o conteúdo
educacional disciplinar em pequenos trechos que podem ser reutilizados em
vários ambientes de aprendizagem. Qualquer material eletrônico que
provém informações para a construção de conhecimento pode ser
considerado um objeto de aprendizagem, seja essa informação em forma
de uma imagem, uma página HTM, uma animação ou simulação.
(www.rived.mec.gov.br/site_objeto_lis.php - acesso 14/04/2009)
Embora ainda não se tenha uma definição consensual para Objetos de
Aprendizagem algumas características são comuns em muitas de suas definições.
Destaco
a
reusabilidade
e
portabilidade
como
duas
de
suas
principais
características.
Em relação a reusabilidade dos Objetos de Aprendizagem, estes devem
permitir seu uso em diversas situações diferentes, não apenas para a que eles foram
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
44
inicialmente desenvolvidos, isto é, possibilitar a sua incorporação em múltiplas
aplicações, podendo serem usados em um determinado contexto e depois
reutilizados em outro contexto.
A portabilidade é a característica dos Objetos de Aprendizagem de permitir
seu uso em diversas plataformas. Para isto é desejável que eles tenham sido
projetados com padrões já consolidados e amplamente conhecidos para facilitar sua
utilização a qualquer usuário.
Observamos, mais uma vez, que um professor da rede formado em um curso
de licenciatura onde a tecnologia, quando foi abordada, aparece apenas em um uso
“imediato”, nunca aprendeu a programar; este professor, portanto, não tem
condições de sozinho reutilizar um OA.
Nesta pesquisa ao invés de OA chamaremos esses objetos disponíveis na
internet de Objeto de Ensino. Nosso Objeto de Ensino poderá ser escolhido pelo
professor para aplicação em sua sala de aula, ele compõe um cenário de
aprendizagem, pois o estudo não se limita e nem pretende que apenas com um
Objeto de Ensino tenhamos todo um processo de ensino e aprendizagem da
trigonometria.
Os Objetos de Ensino utilizados nesta pesquisa, assim como qualquer objeto
virtual ou não, que seja utilizado para compreender algo, não são apenas
ferramentas mediadoras de nossos pensamentos. Segundo Radford (2006) os
objetos que compõem o ambiente de aprendizagem são parte integrante dos
pensamentos e de como produzimos conhecimento. Nosso olhar se voltará a
emergência destes objetos no cenário elaborado.
“Uma das fontes de aquisição de saber resulta de nosso contato com o
mundo material, o mundo de artefatos culturais em torno de nós (objetos,
instrumentos, etc.) e que se encontra depositada a sabedoria histórica da
atividade cognitiva das gerações passadas.” (Radford, 2006, p.113)
Uma das diferenças entre Objetos de Ensino e Objetos de Aprendizagem,
para esta pesquisa, é que este objeto a princípio é utilizado pelo professor em um
curso presencial. Os alunos além dos recursos tecnológicos possuem todo um
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
45
cenário de ensino e aprendizagem composto por alunos, professor, material
impresso, giz, lousa e outros componentes que fazem parte de uma aula para
alunos do Ensino Médio. Diferente dos objetos de Aprendizagem que possuem a
característica de serem utilizados principalmente em cursos de educação a distância
em um ambiente web.
Os Objetos de Ensino utilizados nesta pesquisa são reutilizações de Objetos
de Aprendizagem já existentes e disponibilizados pelo RIVED. Todavia apenas
partes destes objetos são utilizados, ou applets que foram desenvolvidos pelo
pesquisador no decorrer da pesquisa, como veremos posteriormente neste texto, na
analise os Objetos de Aprendizagem e os Applets.
Para nós, nesta pesquisa, caracterizamos Objetos de Ensino como sendo
objetos digitais utilizados em um processo de ensino e aprendizagem, onde um
professor pode se utilizar destes objetos ou de partes destes para compor um
cenário de aprendizagem de um tópico definido. Deste modo, o fantasma da
programação do OA desaparece e o professor escolhe o que e como usar um OE,
pois a programação de softwares não é uma habilidade exigida para um professor
de matemática e poucos deles saberiam como fazê-la.
2.5 - Procedimento Metodológico e desenvolvimento da pesquisa
2.5.1 - Local e Participantes
As atividades desta pesquisa foram aplicadas em uma escola pública, situada
na periferia de Bragança Paulista, cidade do interior do estado de São Paulo que se
localiza a 80 km da capital paulista. Esta escola atende principalmente alunos de
classe sócio-econômica de baixa renda. Funciona em três períodos, sendo que no
período da manhã atende alunos do Ensino Médio, no período da tarde alunos do
Ensino Fundamental e no período noturno alunos do Ensino Médio e EJA,
totalizando aproximadamente 900 alunos. A escola possui oito salas de aulas que
são utilizadas durante os três períodos.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
46
Esta escola nas últimas avaliações externas tem apresentado desempenho
insatisfatório dos alunos, principalmente quando avaliado as competências em
matemática, segundos os critérios da Secretaria de Educação do Estado de São
Paulo.
O IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo
é um indicador de qualidade das séries iniciais (1ª a 4ª séries) e finais (5ª a 8ª
séries) do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Na avaliação de qualidade das
escolas, para a obtenção do valor do IDESP são considerados dois critérios, o
desempenho dos alunos nos exames do SARESP – Sistema de Avaliação do
Rendimento Escolar de São Paulo e o fluxo escolar.
A secretaria de Educação do Estado de São Paulo definiu metas de qualidade
estabelecidas a partir dos índices dos IDESPs das séries iniciais e finais do EF e do
EM. As metas de longo prazo, definidas para todas as escolas da rede estadual,
para 2030 são:
METAS DE LONGO PRAZO – 2030
4ª SÉRIE EF
8ª SÉRIE EF
3ª SÉRIE EM
7,0
6,0
5,0
Tabela 7 – Metas IDESP <http://idesp.edunet.sp.gov.br/o_que_e.asp> - acesso 28/01/2010
O IDESP 2008 desta escola é de 2,14 e a média estadual é de 2,60; em 2007
o IDESP da escola era de 2,00 enquanto que a média estadual era de 2,54. No
indicador por desempenho da escola onde se tem o valor por disciplina esta escola
possui em matemática os seguintes indicadores:
Indicador de desempenho em Matemática
2007
2008
2009
8ª Série EF
1,16
2,4242
2,5600
3º Serie EM
Não avaliado
1,3492
1,4667
Tabela 8 – Indicador de desempenho IDESP
Como apresentado, o IDESP desta escola é baixo, principalmente quando
avaliado na disciplina de matemática, outro valor significativo é o baixo índice do 3º
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
47
ano do Ensino Médio, todos os valores se encontram muito longe da meta
estabelecida para 2030 e também abaixo da média estadual, caracterizando assim
seus alunos em um nível abaixo do satisfatório.
O relatório do IDESP 2009, também apresenta outra tabela que caracteriza o
conhecimento dos alunos em português e matemática desta escola, na tabela de
distribuição por nível de desempenho, apresenta 58% dos alunos do 3º ano do
ensino médio com um desempenho abaixo do básico em matemática, o que é
considerado insuficiente segundo os critérios da Secretaria da Educação do Estado
de São Paulo. Ressalto também que apenas 2% se encontram em nível considerado
adequado e no nível avançado o índice é de 0%.
8ª série EF
3ª série EM
Abaixo do
Básico
Básico
Adequado
Avançado
Português
0,2735
0,6068
0,1197
0,0000
Matemática
0,2960
0,6400
0,0640
0,0000
Português
0,1702
0,5745
0,2553
0,0000
Matemática
0,5800
0,4000
0,0200
0,0000
Insuficiente
Suficiente
Avançado
Tabela 9 – Desempenho Português e Matemática IDESP 2009
Participam desta pesquisa oito alunos escolhidos aleatoriamente visando a
possibilidade de sua participação, que ocorre fora do horário de suas aulas.
Os alunos que participaram desta pesquisa são alunos matriculados no
primeiro ano do ensino médio desta escola, no período da manhã. Nenhum destes
alunos participou de grupos de recuperação, e apresentam um desempenho médio
ou bom nas aulas regulares de matemática. Até o momento da pesquisa o
conhecimento que eles possuem de trigonometria é as razões trigonométricas no
triângulo retângulo.
Todos os encontros com os alunos são realizados na sala da coordenação da
escola, onde é disponibilizada uma mesa retangular com dois computadores. Esta
sala fica localizada de frente para o pátio da escola, sendo necessário manter a
porta fechada para que o som externo, como o intervalo dos alunos do período da
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
48
tarde, não atrapalhe o encontro com os alunos. Mas mesmo tomando estes
cuidados por alguns momentos o som externo dificulta identificação de algumas
falas da filmagem.
2.5.2 - Experimento de ensino ou Design experiment
Para desenvolver esta pesquisa adotamos a metodologia de design
experiment, que permite que o pesquisador-professor possa analisar de forma
detalhada a Matemática desenvolvida pelos estudantes através de atividades
matemáticas propostas por ele. Algumas pesquisas se referem à Metodologia de
Projeto, no entanto optamos por manter a palavra design no inglês concordando
com Drisóstes:
O termo design não tem tradução para o português. O design envolve
atividades como planejar, desenhar, esboçar, projetar, esquematizar, criar,
inventar e executar. (Drisostes, 2005, p.38).
Segundo Cobb, Confrey, DiSessa, Lehrer e Schauble (2002) o design
experiment tem como ideal obter uma maior compreensão da ecologia de
aprendizagem que envolve uma determinada situação; a utilização da metáfora da
ecologia se justifica pelos inúmeros fatores que cercam uma situação de
aprendizagem. Dentre os elementos que constituem esta ecologia encontramos os
problemas propostos para os alunos, a dinâmica em sala de aula, as ferramentas
disponíveis utilizadas e todo o sistema interativo que envolve vários elementos de
diferentes tipos e níveis, concebendo assim elementos e antecipando a forma como
esses elementos funcionam em conjunto para apoiar a aprendizagem.
Como a pretensão desta pesquisa é de criar um cenário de investigação para
aulas de trigonometria, para cada etapa de experimentação segue uma fase de
desenvolvimento, assim, esta metodologia parece a mais indicada.
Uma das características mais importante do design para a educação é a
responsabilidade do aluno no processo de aprendizagem, o aprendiz é um
participante ativo em todo o processo e tem responsabilidade sobre este; o objeto do
design que está sendo desenvolvido deve levar à reflexão e discussão do aprendiz.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
49
Também é importante ressaltar que nesta metodologia é fundamental a
negociação entre professor e alunos para que os conhecimentos matemáticos sejam
conjuntamente construídos não deixando com que apenas a visão do professor
quanto aos conhecimentos matemáticos seja predominante.
Outro fator importante no experimento de design é a característica do
professor-pesquisador e alunos, onde todos eles são vistos como colaboradores do
processo de design.
O design experiment sugere vários tipos de cenários em que ele pode se
desenvolver, para esta pesquisa destaco o cenário “one-on-one” (professor e aluno)
onde são realizadas várias aulas com um número reduzido de alunos, tendo como
objetivo “criar uma pequena versão de uma ecologia de aprendizagem para que
possa ser estudado em profundidade e pormenor” (Cobb & Steffe, 1983; Steffe &
Thompson, 2000).
2.5.3 – Coleta e Análise dos Dados
A coleta de dados incluiu a filmagem dos encontros com os alunos e os
materiais produzidos por eles nestes encontros. A escolha pela utilização deste tipo
de mídia para coleta de dados é pelo fato da flexibilidade que ele permite para a
análise de dois tipos de informações, auditiva e visual, onde capturamos gestos,
falas, comportamentos que apenas com as anotações do observador poderiam se
perder.
“... o vídeo supera a limitação humana de observação por ser capaz de
capturar não apenas “parte do retrato integral” e é superior às notas do
observador, uma vez que não envolve edição automática”. (Martin, 1999,
apud Powell)
O vídeo embora tenha inúmeras vantagens sobre a observação ao vivo ou da
análise de áudios e documentos criados pelos participantes de uma pesquisa, ele
também está sujeito a problemas, Bottorff (1994, apud Powell 2004) cita três razões
pelas quais considera o vídeo incompleto:
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
50
“... a capacidade de ser seletivo devido a limitações mecânicas; a
incapacidade de discernir o conteúdo subjetivo do comportamento que está
sendo gravado; e, usualmente, a incapacidade de carregar o contexto
histórico do comportamento capturado.”
Para a análise de dados gravações de vídeo com trabalhos escritos dos
estudantes, além do referencial teórico, é necessário o uso de algumas técnicas
para análise destes vídeos. Mesmo reconhecendo as limitações colocadas por
Bortoff (1994, apud Powell 2004) da coleta de dados através de vídeos, sua
utilização ainda oferece muitas vantagens à análise de dados. Dentre algumas
vantagens podemos citar com Powell (ibid 2004) a possibilidade da análise posterior
diminuir as interpretações antecipadas e prematuras do observador; poder rever
inúmeras vezes a mesma cena permite que acontecimentos que tenham passado
despercebido em uma análise prévia seja revisto e analisado; a flexibilidade de
visualização com recursos de parar a imagem, câmera lenta, passo a passo,
avançar vídeo, retroceder vídeo permite uma análise mais detalhada; análise
posterior dos vídeos por outros pesquisadores e não restringindo-se apenas ao
observador presente, permitindo múltiplas visões sobre o mesmo acontecimento.
A transcrição de dados de vídeo também é tarefa árdua e não existe
consenso quanto ao que devemos transcrever, o vídeo todo ou apenas eventos
críticos. A transcrição também pode se tornar difícil, pois como cita Martin (1999,
apud Powell 2004) com o videoteipe, ironicamente, pode se produzir dados demais.
Por isso alguns pesquisadores como Pirie e Martin defendem a análise dos dados
apenas trabalhando exclusivamente sobre os vídeos em vez de transcrevê-los.
Uma opção metodológica utilizada para análise de vídeos surgi com o grupo
de pesquisa no RBDIL (The Robert B. Davis Institute for Learning) em que Arthur B.
Powel propõe um modelo analítico que consiste em sete fases não lineares, que têm
por objetivo estudar o desenvolvimento do pensamento matemático em aprendizes.
As fases deste método são:
1.
Observar atentamente os dados do vídeo.
2.
Descrever os dados do vídeo.
3.
Identificar eventos críticos.
4.
Transcrever.
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
5.
Codificar.
6.
Construir o enredo.
7.
Compor a narrativa.
51
Os vídeos nesta pesquisa são analisados da seguinte forma, primeiro a
observação dos vídeos de forma integral sem interrupções, após isto os vídeos
passam por uma segunda observação onde são levantados os eventos críticos.
Estes eventos são discutidos com outra pesquisadora e em uma terceira fase cada
evento crítico é observado cuidadosamente com a utilização dos recursos de pausa,
retroceder, passo a passo. Não há transcrição integral dos vídeos, pois isto
demandaria muito tempo e um número muito grande de informações, e como já
relatado por alguns pesquisadores, pouco eficaz. Para os pontos críticos há
transcrição facilitando e ampliando as possibilidades de análise, para posteriormente
permitir a composição das narrativas.
2.5.4 - Fases de desenvolvimento da pesquisa
Esta pesquisa está subdividida em duas fases, a primeira destinada à análise
dos objetos de aprendizagem e outros materiais disponíveis que poderiam ser
utilizados, onde percebemos a necessidade de um levantamento histórico para
complementar os materiais e elaborarmos um cenário para o ensino do círculo
trigonométrico. A segunda fase consta da implementação deste cenário junto aos
alunos e suas modificações.
Fase 1 – Análise de Materiais
Esta fase é destinada à análise dos materiais que estão disponíveis para
qualquer professor de ensino médio da rede estadual de ensino do estado de São
Paulo e a elaboração da proposta de atividade para implementá-la na segunda fase
da pesquisa.
Buscando
entender
melhor
o
que
é
oferecido
ao
professor
e
conseqüentemente ao aluno iniciamos com o levantamento do histórico sobre a
trigonometria, depois nos voltamos para os livros didáticos de matemática que estão
Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica
52
disponíveis no PNLEM 2009, dos “Cadernos do Aluno” e “Cadernos do Professor” da
Proposta Curricular do Estado de São Paulo, estes cadernos são distribuídos a
todos os alunos e professores da rede estadual de ensino de São Paulo.
Os Objetos de Aprendizagem disponíveis gratuitamente também fizem parte
desta fase. Assim são analisados os OAs que estão disponibilizados pelo RIVED,
sob o tema trigonometria. Além dos OAs estuda-se a possibilidade de uso de outros
aplicativos disponíveis na internet conhecidos como “applet”. Um applet é um
aplicativo que é executado no contexto de outro programa (como por exemplo um
web browser), um applet geralmente executa funções bem específicas. O termo foi
introduzido pelo AppleScript em 1993.
Na intenção de verificar algumas hipóteses e evidências sobre o ensino e
aprendizagem de trigonometria, que levantei, realizamos uma primeira investigação
junto ao grupo de pesquisa “Tecnologias Digitais e Educação Matemática” da
UNIBAN, formado por professores e/ou pesquisadores, onde colaboram em muito na
construção do Cenário para Investigação de trigonometria no círculo trigonométrico
como veremos no capítulo 3.
A seguir partimos para a montagem do cenário de investigação e elaboramos
a primeira atividade proposta para os alunos no primeiro encontro. As demais
atividades, também são desenvolvidas neste momento, mas elas sofrem
modificações, de acordo com o retorno dos alunos em atividades anteriores,
conforme sugere o design experiment.
Fase 2 - Implementação e Análise do Cenário
A segunda fase se destina à implementação do cenário sugerido com suas
respectivas atividades para os alunos. Neste momento realiza-se também, após
cada encontro com os alunos uma análise parcial dos resultados destes encontros e
quando necessário são feitas alterações nas atividades subseqüentes, conforme
previsto pela metodologia de Design Experiment.
Capítulo 3 – Primeira Fase
53
Capítulo 3
Primeira Fase
Capítulo 3 – Primeira Fase
54
Descrevo a 1ª fase da pesquisa onde foi realizado o levantamento histórico da
trigonometria a analise dos livros didáticos, da proposta Curricular do Estado de São
Paulo e dos OAs/Apllet´s. Também é descrito a primeira análise do grupo de
professores / pesquisadores do problema de pesquisa e levantamento de algumas
hipóteses e o desenvolvimento da primeira atividade para sua aplicação junto com
os alunos.
3.1 - História da Trigonometria
Neste tópico procuro através da história da trigonometria compreender como
surgiu a trigonometria e sua evolução até os dias atuais, buscando um suporte para
melhor analisar os materiais disponíveis, livros didáticos, Proposta Curricular do
Estado de São Paulo, OA e applets.
Em particular esta pesquisa procura entender alguns pontos relevantes para o
estudo atual da trigonometria no círculo trigonométrico, entre estes pontos destaco:
as medida de ângulo em grau na base sexagesimal e em radiano; os números
negativos, racionais e irracionais; triângulo retângulo e o círculo trigonométrico.
Segundo Caraça (2005) a origem e desenvolvimento das noções matemáticas
seguem um movimento ora por motivos pragmáticos ora dentro da própria ciência,
sempre num processo dialético.
A trigonometria também segue estes momentos citados por Caraça,
observamos
seu
surgimento
pragmático
e
posteriormente
temos
seu
desenvolvimento dentro da própria matemática, sempre em busca da economia, do
menor esforço, facilitando os processos matemáticos que envolvem o assunto.
O homem tem tendência a generalizar e estender todas as aquisições do
seu pensamento, seja qual for o caminho pelo qual essas aquisições se
obtém, e a procurar o maior rendimento possível dessas generalizações
pela exploração metódica de todas as suas conseqüências. (Caraça, 2005,
p.9)
Este levantamento histórico da trigonometria teve como fonte inspiradora o
trabalho de Costa (1997), Cajori (2007), Kennedy (1992), Boyer (1974) além de
informações
disponíveis
nos
sítios
da
internet
http://www-history.mcs.st-
Capítulo 3 – Primeira Fase
andrews.ac.uk/HistTopics/Trigonometric_functions.html e
55
http://ecalculo.if.usp.br
/historia/historia _trigonometria.htm.
A etimologia da palavra Trigonometria vem do grego TRI – três, GONO ângulo e METRIEN - medida, significando Medida de Triângulos. Trata-se, assim,
do estudo das relações entre os lados e os ângulos de um triângulo.
A origem da trigonometria é incerta, mas é anterior à era cristã, e nos remete
a séculos de história e interação humana até ser conhecida como é hoje. Sua maior
fonte motivadora e impulsionadora foi o fascínio do homem pela astronomia. Sua
relação da trigonometria com a astronomia é tão estreita que apenas no século XIII
os dois assuntos foram considerados tópicos separados.
Uma idéia primitiva da trigonometria surgiu com a invenção do relógio de sol,
os mais antigos relógios de Sol teriam surgido no Egito ou na Mesopotâmia, desde
3000 a.C, mas a China ou as civilizações Maia, Inca e Asteca também nessa época,
ou um pouco mais tarde, desenvolviam instrumentos semelhantes. As tábuas de
sombra, utilizadas para marcar as horas do dias, encontradas possuem marcações
imprecisas, não seria de grande utilidade procurar conhecimentos matemáticos mais
profundos nas seqüências numéricas demonstradas nessas tábuas.
Tanto no Egito quanto na Babilônia temos rudimentos da trigonometria que
aparecem a partir do cálculo de razões entre números e entre lados de triângulos
semelhantes, realizando estudos relativos a fenômenos astronômicos e geográficos
como, a determinação de eclipses, fases da lua, estimar equinócios, estabelecerem
calendários, distâncias inacessíveis e rotas de navegação.
Já podemos observar que o homem fazia uso das funções periódicas, mesmo
sem o formalismo matemático de hoje e também apresenta seus primeiros estudos
dos triângulos, mostrando assim um surgimento na necessidade do homem de sua
época.
Os babilônicos nos deixaram um valioso registro de sua cultura, foram
desenterrados cerca de meio milhão de placas com manuscritos, datados de 1800 –
1600 a.C.. Estas placas eram feitas de argila mole e impressas com um estilete de
junco, posteriormente estas placas eram colocadas a secar ao sol ou fornos. Deste
Capítulo 3 – Primeira Fase
56
meio milhão de placas, algumas centenas estão relacionadas a conhecimentos
matemáticos.
Nestas placas temos indícios que nos mostram que o teorema de Pitágoras já
era conhecido pelos babilônicos. A área de um círculo era dada por 3r², mas o valor
de π era dado por 3 1/8. Em placas de 1700 a.C. encontram-se tabelas de cordas no
sistema sexagesimal sumeriano, o que atualmente equivaleria ao seno. A origem do
sistema sexagesimal atribui-se ao fato de que os babilônicos utilizavam como
unidade de medida para avaliar a prata o talento valendo 60 vezes o valor e peso da
mana, e a mana valendo 60 vezes o valor do sequel. Esta razão de 1 para 60
provavelmente se estendeu para outras unidades e também os números. Acreditase também que foram os babilônios que fizeram a divisão da circunferência em
graus, minutos e segundos.
Como veremos a seguir os gregos mais tarde também fazem o uso da base
sexagesimal para as medidas dos ângulos, provavelmente sobre a influência
babilônica, e o uso da medida em grau se mantém como principal unidade de
medida do ângulo por muitos anos até o surgimento dos radianos.
Os egípcios nos deixaram indícios de conhecimentos em trigonometria que
aparecem no Papiro Ahmes, também conhecido como Papiro Rhind, este é o mais
extenso documento egípcio em matemática que chegou aos nossos dias, sua data é
aproximadamente 1700 a.C., embora seu conteúdo tenha sido descoberto em outra
fonte datado por volta de 3400 a.C., este papiro é conhecido como o mais antigo
manual de matemática. Nele não se encontram teoremas, mas sim algumas regras
gerais de como calcular áreas e algumas propriedades dos triângulos, trapézios e
círculos onde o π é dado por (16/9)² = 3,1604....
Capítulo 3 – Primeira Fase
57
Figura 6: Papiro Rhind, Museu de Londres. (fonte: http://www.archaeowiki.org/Image:
Rhind_Mathematical_Papyrus.jpg – acesso 10/09/2009)
Os escritores gregos como Platão, Aristóteles, Heródoto, Diódoro, Diógenes
atribuem aos egípcios à invenção das ciências matemáticas e da geometria.
Com a expansão do intercambio comercial muitos estudiosos gregos
visitaram o Egito a procura de conhecimento. Thales, Pitágoras, Cenópides, Platão,
Demócrito e Eudoxo foram alguns dos que foram ao Egito a procura de sacerdotes
egípcios para os instruírem. Trazendo assim para a Grécia conhecimento e novas
linhas de pensamento formando uma base para se começar a trabalhar.
No que se diz respeito à trigonometria, assim como diversos ramos da
matemática evoluíram gradualmente, e seu desenvolvimento está muito ligado ao
desenvolvimento da geometria. É atribuída a Thales de Mileto a introdução do
estudo da geometria pelos gregos. Foi durante seus estudos, no Egito, que ele fez
as medições das alturas das pirâmides através das sombras. Não se sabe ao certo
como ele realizou estes cálculos, acredita-se que foi comparando as razões das
sombras da pirâmide com as razões da sombra de um bastão. Outra hipótese foi a
de que, em determinado momento a sombra do bastão tinha a mesma medida da
altura do bastão, logo a neste momento a sombra das pirâmides teriam a mesma
altura de suas sombras. O mais provável é que ele tenha utilizado as duas técnicas
para medir as alturas das pirâmides.
Problemas parecidos como o de medir a altura das pirâmides, ainda são
muito utilizados em sala de aula, mudando-se apenas a pirâmide por um edifício ou
árvore. Outra utilização da trigonometria era na agrimensura, exemplos que também
Capítulo 3 – Primeira Fase
58
utilizamos atualmente. Exemplos de utilização como estas também são encontrados
na cultura chinesa.
Os historiadores consideram muito difíceis datar documentos matemáticos da
China, e acredita-se que o clássico mais antigo da matemática chinesa é “Chou Pei
Suang Ching”. Outra publicação também muito antiga é o livro de matemática “Chui
Chang Suan Shu” onde existem nove capítulos sobre a arte da matemática, datados
em torno de 1200 a.C.. Entre vários assuntos abordados, chama a atenção
problemas sobre mensuração de terras, agricultura, sociedades, engenharia,
impostos, cálculos, soluções de equações e propriedades dos triângulos retângulos.
Os gregos fizeram um estudo sistemático das relações entre ângulos ou arcos
numa circunferência e os comprimentos de suas cordas. Não se sabe ao certo se o
conceito da medida de ângulo surgiu com os gregos. O mais provável é que eles,
por contato com a civilização babilônica, tenham adotado suas frações
sexagesimais.
Pitágoras foi de extrema importância para a matemática dos gregos, foi o
fundador da escola pitagórica, que era mais do que um local para o estudo da
filosofia, matemática, astronomia e ciência natural, era uma irmandade onde seus
membros tinham condutas parecidas com as sociedades maçônicas.
A teoria dos números irracionais é creditada segundo Eudemo aos
pitagóricos, o que para época era um pensamento extremamente audacioso. Os
pitagóricos viram os irracionais como um grande mistério e guardavam esta teoria
em absoluto segredo. Consta que o primeiro a divulgar esta teoria, em conseqüência
disto, foi vítima de um naufrágio, devido a esta revelação.
Destaco neste momento a dificuldade que os matemáticos, ao longo da
história, tiveram em aceitar os números negativos e principalmente os números
irracionais. Mostra a história que estes números, muitos utilizados na trigonometria
para o Ensino Médio, tiveram muita resistência da sua existência. Será que
atualmente nossos alunos conseguem compreender o significado destes números?
Capítulo 3 – Primeira Fase
59
Hipsicles (200-100 a.C.) que deve ser o autor do décimo quarto livro de
Euclides, onde apresenta um tratado de Hipsicles sobre o Nascer dos Astros que
apresenta a divisão da circunferência em 360 graus, seguindo o modelo babilônico.
Hiparco (190-126 a.C.) foi astrônomo, construtor, cartógrafo e matemático
grego da escola de Alexandria, influenciado pela Matemática babilônica,
desenvolveu métodos para a determinação de locais na superfície terrestre e
introduziu o sistema de localização por latitude e longitude.
Ele é considerado “o pai da Trigonometria", pois desenvolveu o que deve ter
sido a primeira tabela trigonométrica, uma tábua de cordas, evidentemente, Hiparco
fez esses cálculos para usá-los em seus estudos de astronomia. Embora estas
tabelas não sobrevivam, reivindica-se que doze livros das tabelas das cordas foram
escritos por Hiparco em aproximadamente 140 a.C.. Provavelmente ele utilizou a
idéia da representação por coordenadas, anteriormente apresentada por Apolônio.
A matemática desenvolvida por Hiparco tinha forte influência dos babilônios,
acreditando que 60 era a melhor base de contagem. Assim como os babilônicos ele
também dividiu a circunferência em 360 graus, e atribuído a ele a divisão de cada
arco de 1 grau em 60 partes obtendo o arco de 1 minuto. A "Trigonometria" era
então baseada no estudo da relação entre um arco arbitrário e sua corda. Apesar da
corda de um arco não ser o seno, uma vez conhecido o valor do seu comprimento,
pode-se calcular o seno da metade do arco, pois a metade do comprimento da corda
dividido pelo comprimento do raio do círculo é justamente esse valor.
Como podemos observar o maior interesse dos matemáticos era o de
determinar o comprimento da corda de um arco e assim muitos matemáticos se
dedicaram a isto, mas hoje o comprimento da corda de um arco não é contemplado
nos currículos atuais do ensino médio, mas é um importante momento pois a partir
das cordas do círculo que a trigonometria tem seu encaminhar as razões
trigonométricas.
Ptolomeu (90-165 d.C) nasceu no Egito e foi um renomado astrônomo,
reconhecido também pelos seus trabalhos em matemática, astrologia, geografia e
cartografia. É autor da mais influente e significativa obra trigonométrica da
Antigüidade foi a Syntaxis Mathematica, obra que contém 13 livros. Este tratado é
Capítulo 3 – Primeira Fase
60
famoso por sua compacidade e elegância, e para distingui-lo de outros foi associado
a ele o superlativo magiste ou "o maior". Mais tarde na Arábia o chamaram de
Almajesto, e a partir de então a obra é conhecida por esse nome.
O Almagesto constitui os fundamentos de toda ciência astronômica utilizada
por árabes, indianos e europeus até o surgimento da teoria heliocêntrica, de Nicolau
Copérnico. O Livro I do Almagesto intitulado “Princípios da Astronomia Esférica” traz
o capítulo “Avaliação das cordas inscritas no círculo” onde descreva tabela de
cordas que diferem de meio em meio grau, com demonstrações de seus cálculos.
O objetivo de Ptolomeu era tabelar todas as cordas de meio em meio grau de
0º a 180º, o restante seria determinado por interpolação. Mas este objetivo não foi
completamente atingindo, ele não conseguiu, por exemplo, determinar a corda de
um arco de 1º com precisão, embora tenha determinado a corda de grau e meio.
Ptolomeu aproximou o valor da corda de 1º a 1,047222, não esquecendo que ele
dividia o diâmetro em 120 partes, para compararmos esta aproximação com valores
atuais podemos determinar o seno de meio grau em uma calculadora cientifica e
multiplicarmos por 120.
Assim como os babilônicos e Hiparco, Ptolomeu também optou pela divisão
da circunferência em 360 graus e o diâmetro em 120 partes, o que facilitaria seus
cálculos. Nota-se também na obra de Ptolomeu muito cuidado com os cálculos e
para evitar o embaraço das frações ele faz a opção pelo sistema sexagesimal.
Neste momento destaco que conforme sugere Caraça (2005) os matemáticos
procuram sempre facilitar os processos matemáticos e Ptolomeu não o fez diferente,
optando pelo sistema sexagesimal, as frações foram evitadas, mostrando que este
tipo de representação numérica não era a forma mais produtiva de se trabalhar.
Os hindus também deram sua contribuição para o desenvolvimento da
trigonometria, embora eles não tenha tido muito êxito em geometria na trigonometria
eles tiveram alguns avanços principalmente durante o século VI d.C..
O matemático Varaha Mihira descreve em sua obra Pañcha Siddhântikâ,
algumas interessantes passagens de trigonometria, com tabelas de cordas,
provavelmente de Ptolomeu. Mas diferente dos gregos os hindus dividiram o raio em
Capítulo 3 – Primeira Fase
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120 partes e não em 60. O círculo também aparece dividido em quadrantes de 90
graus. Mas diferente dos gregos, para determinar a corda, eles contavam com o
seno e não com a corda toda.
Partindo do seno de 90º ter o valor igual ou raio e do seno de 30º ser metade
do seno de 90º, eles aplicando a fórmula sen² + cos² = r² determinaram o seno de
45º e 60º. Tendo os senos de 90º, 60º, 45º e 30º como pontos iniciais eles
calcularam o seno da metade destes ângulos seus senos complementares. Assim
conseguiram determinar uma tabela de senos com intervalos de 3º45’.
Entre os árabes o primeiro matemático que se destacou foi Mohammed ibn
Musa Al-Khowarizmi (790 – 840), que realizou um importante trabalho em álgebra e
aritmética, mas também foi designado pelo califa Al-Mamun a revisar as tabelas de
Ptolomeu e medir o comprimento de um grau do meridiano terrestre. As tábuas
astronômicas de Al-Khowarizmi, foram revisadas posteriormente por Maslama alMajrîtî, onde além da função seno, apareceria uma provável ampliação sua, a
função tangente.
Durante o século IX destacou-se na Arábia o matemático Al-Battani (850-929
d.C.) chamado de Albategnius pelos latinos, seus estudo foram de alta relevância
para a matemática e astronomia e era conhecido como o Ptolomeu de Bagdá.
Pela tradução de suas obras deu-se origem a palavra “sinus” para o nome da
função trigonométrica. A palavra árabe para “seno”, jiba foi derivada do sânscrito
jiva, que se assemelha à palavra árabe jaib, significando um recorte ou golfo, daí,
portanto, a razão da palavra latina “sinus”. (Cajori, 2007, pag. 160).
Al-Battani foi um grande estudante de Ptolomeu, mas fez grandes melhorias
para a trigonometria. Ele utilizou metade da corda para a função seno criando o
seno indiano, criou tabelas para a cotangente e a tangente. Também e atribuído a
ele a utilização do círculo de raio unitário e com isso demonstrar que a razão seno é
válida para qualquer triângulo retângulo, independentemente do valor da medida da
hipotenusa.
Outro trabalho importante entre os árabes é a obra de Nasir-Eddin (12011274 d.C.), realizou uma tradução dos Elementos de Euclides fez estudos em
Capítulo 3 – Primeira Fase
geometria,
álgebra
62
e
aritmética.
Destacam-se
também
seus
escritos
em
trigonometria que pela primeira vez aparece independente da astronomia e foi
realizado com extrema perfeição que estes estudos continuaram a ser utilizados no
século XV pelos europeus, que pouco puderam alterá-los. Podemos creditar aos
árabes avanços em varias áreas da matemática, mas destaca-se a trigonometria
que foi aperfeiçoada até elevados níveis de conhecimento.
Durante o século XVI, no período da renascença, são os estudiosos alemães
e italianos que dão as melhores contribuições para a matemática. Na Alemanha se
dá o renascer da trigonometria, por Regiomontanus (1436-1476 d.C.).
Regiomontanus
enfatizou
o
uso das
tangentes e
construiu
tábuas
trigonométricas com maior precisão. Deixou para os estudiosos alemães o fascínio
pela trigonometria que após sua morte construíram instrumentos astronômicos
extremamente refinados que junto com suas tábuas trigonométricas obtinham alto
grau de precisão.
Em 1613 Bartolomeu Pitiscus (1561-1613 d.C.) republicou as obras de
Rgiomontanus e provavelmente foi o primeiro a usar a palavra trigonometria. Na
mesma época em que Rhaeticus (1514-1574 d.C.) usou pela primeira vez o triângulo
e fazê-lo depender diretamente de seus ângulos, foi ele também o precursor a
planejar uma tábua das secantes.
Outro trabalho relevante foi do francês François Viète (1540-1603 d.C.), que
foi um grande defensor do uso das frações decimais em vez das sexagesimais
sendo também reconhecido pelos significativos avanços quanto ao uso de símbolos
para representações matemáticas, utilizava em suas obras uma vogal para
representar as grandezas desconhecidas e uma consoante para um número ou
grandeza conhecida, o que significava uma grande inovação para a época.
Em 1579 Viète publicou Canon mathematicus seu ad triangula cum
appendicibus, onde apresentava de forma sistemática métodos para os cálculos
triângulos planos e esféricos utilizando-se das seis funções trigonométricas. Ele
estabeleceu a forma atual dos teoremas dos co-senos e provavelmente o primeiro a
usar a lei das tangentes. Usou o recurso sistemático do círculo trigonométrico e a
aplicação da trigonometria à resolução de problemas algébricos.
Capítulo 3 – Primeira Fase
63
Na Inglaterra William Oughtred (1574-1660 d.C.), juntamente com outros
matemáticos como Richard Norwood, John Speidell e outros, deram suas
contribuições para a trigonometria desenvolvendo sistemas simbólicos. Na época
ainda se tinha um sistema de simbolismo algébrico desenvolvido para a matemática,
portanto estes símbolos não foram muito utilizados pelos matemáticos da época.
Mais tarde Euler acata e desenvolve uma série de símbolos algébricos utilizados até
hoje.
Oughtred foi o inventor da régua de cálculo reta e circular e também devemos
a ele a utilização da notação π = 3,14159..., que foi usada pela primeira vez por
William Jones em 1706 e também acatado por Euler que disseminou o seu uso.
A trigonometria tem um novo marco pelas mãos de Leonhard Euler (1707–
1783 d.C.). Nenhum outro matemático o superou na produção de trabalhos
matemáticos, e muito do que usamos hoje devemos a ele.
A obra de Euler é extremamente abrangente, percorrendo quase todos os
ramos da matemática, conhecida até a época. Para ressaltar sua extrema habilidade
matemática o acadêmico francês François Arago fez o seguinte comentário: “Euler
calculava sem qualquer esforço aparente como os homens respiram e as águias se
sustentam no ar.” De fato ele mereceria muitas páginas para descrever um pouco de
sua obra, mas vou me conter a citar apenas alguns pontos que fundamentais para o
desenvolvimento da trigonometria.
Pode ser dito com justiça que Euler fez pela análise infinita de Newton e
Leibniz (e por áreas importantes da Matemática) o que Euclides fizera pela
geometria de Eudoxo e Teaetetus, ou o que Viète fizera pela álgebra de alKhowarizmi e Cardano. (Boyer, 1974, p.326)
Para a trigonometria Euler deu diversas contribuições, ele a tratava como um
ramo da análise e considerava os valores trigonométricos de seno, co-seno e de
tangente como números ou razões e não mais como um segmento de reta; começou
a utilizar sistematicamente o círculo de raio um; utilizou para as funções
trigonométricas as respectivas notações sen x, cos x, tg x, cotg x.
Capítulo 3 – Primeira Fase
64
Mas mesmo Euler que realizou um trabalho muito extenso não encerrou a
história do desenvolvimento da trigonometria. No final do século XIX, surge o
radiano, com uma história bastante diferente do restante da trigonometria.
O radiano, que hoje é a unidade de medida angular do sistema internacional
(SI), tem sua origem no quando apareceu impresso pela primeira vez apenas em
1873, em um exame escrito aplicado por Thomson e posteriormente em Algebra
identified with Geometry (Londres: 1874) de Ellis.
Consta que o matemático Thomas Muir e o físico James T. Thomson,
independentemente, consideraram a necessidade de uma nova unidade de medida
angular. Sendo assim, encontram-se para discutir a necessidade e definiram o nome
para a nova medida para os ângulos, criando o radian (radiano), pois os estudiosos
discutiam uma "expressão" do ângulo em termos de π, que primeiramente foi
chamada "π-medida", "circular" ou "medida arcual". Nenhum autor explica por que
fizeram uso dessa unidade, o que parece justificar a nova unidade de medida talvez
tenha sido a simplificação de fórmulas matemáticas e físicas, especialmente as
derivadas e integrais de funções trigonométricas.
Destaco que durante quase toda a história, a unidade de medida do ângulo
como grau, dividindo a circunferência em 360 partes, foi a melhor maneira de
trabalhar com a trigonometria. O radiano que surgiu muito mais tarde nasce da
necessidade de facilitar cálculos mais avançados.
Eu acredito que esta dupla maneira de se medir um ângulo é um fator
dificultador de seu aprendizado, sendo utilizada aleatoriamente nas atividades
propostas nos livros didáticos. Também acredito que o grau é uma medida mais
amigável para quem esta iniciando seus estudos em trigonometria. Sendo assim no
decorrer da pesquisa houve a preocupação, com as atividades propostas, de utilizar
inicialmente apenas medidas em graus e posteriormente introduzir as medidas dos
arcos em radianos.
Percebemos também que a trigonometria, tanto no seu uso como na sua
forma, modificou-se muito de sua origem até os dias atuais. As aplicações atuais das
funções trigonométricas não lembram as primeiras aplicações de Thales, quando
media as pirâmides.
Capítulo 3 – Primeira Fase
65
Se é fácil criar problemas, para nossos alunos, parecidos como o das
sombras das pirâmides, para procurar concretizar o conceito das razões dos lados
do triângulo, esta mesma facilidade não se encontra para justificar o uso das
funções trigonométricas, mesmo sabendo que ela é utilizada na física, na mecânica,
acústica e em muitas áreas da engenharia. Como percebemos no rumo da história
da trigonometria, depois que a trigonometria teve uma história independente da
astronomia, seu desenvolvimento foi dentro da própria matemática, ou em cálculos
mais avançados de física.
Podemos notar que algumas dificuldades encontradas hoje no aprendizado
da trigonometria, também foram problemas para os matemáticos anteriores, só que
hoje eles já nos deram as repostas. Foram séculos de história e desenvolvimento e
cabe a nós hoje propagar estes conhecimentos a nossos alunos. Acredito que a
dúvida seja quais conhecimentos e de forma devemos apresentá-los aos nossos
alunos.
3.2 - Análise dos livros didáticos / Proposta Curricular SP
Para entender melhor como é tratado o tema trigonometria no Ensino Médio,
faço neste capítulo, uma avaliação de alguns dos livros didáticos aprovados pelo
MEC que participaram do PNLEM 2009. Também faço uma análise da Proposta
Curricular do Estado de São Paulo apresentada em 2008 para a rede estadual de
ensino e atualmente em vigor.
Para a proposta pedagógica analiso o “Caderno do Professor” e o “Caderno
do Aluno”, referentes ao 1º Bimestre de 2009 do 2º ano do Ensino Médio e também
referente ao 4º Bimestre de 2009 da 1º série do Ensino Médio.
Estes cadernos foram escolhidos, pois a Proposta Curricular do Estado de
São Paulo localiza no 4º bimestre do 1º ano do Ensino Médio o tema “Razões
trigonométricas nos triângulos retângulos” e “Resolução de triângulos não
retângulos: lei dos senos e lei dos co-senos” e para o 2º ano do Ensino Médio
propõe para o 1º bimestre o tema “Trigonometria: Fenômenos periódicos; Funções
trigonométricas; Equações e inequações; Adição de arcos”. Além de estar presente
Capítulo 3 – Primeira Fase
66
no currículo do Ensino Médio, a Proposta do Estado de São Paulo também trabalha
com Razões Trigonométricas no 4° Bimestre da 8ª Sér ie do Ensino Fundamental.
De maneira geral os livros didáticos dedicam em média 13% de suas páginas
para a trigonometria, o que sugere um trabalho médio de 4 meses ou dois bimestre
de todo ensino médio dedicado a este tema. Segue uma tabela sintética sobre
alguns aspectos analisados nos livros.
Livro Didático
Matemática
Completa
Giovanni &
Bonjorno
Matemática Ensino
Médio
Katia Stocco Smole
– Maria Ignez Diniz
Volumes
Total de
Páginas
Vol.1 – 400
3
Vol.2 – 384
Vol.3 – 400
Total – 1184
Vol.1 – 432
3
Vol.2 – 480
Vol.3 – 352
Total – 1264
Páginas
dedicadas a
trigonometria / %
Vol.1 – 65 / 16%
Vol.2 – 69 /
18%
Vol.3 – 0 / 0%
Total- 134 / 11%
Vol.1 – 125 /
29%
Vol.2 – 62 /
13%
Tópico
História: Origem da trigonometria e
utilização de razões trigonométricas no
antigo Egito.
Uso da Calculadora.
Instrumentos de medição de ângulos.
Problemas do tipo sombra.
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra.
Uso da Calculadora.
Elos da Matemática com a História,
música, topografia, arte e astronomia.
Instrumentos de medição de ângulos.
Vol.3 – 12 / 3%
Problemas do tipo sombra.
Total -199 / 16%
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra.
Importância histórica.
Matemática
Dante
Desafios em equipe.
1
504
52 / 10%
Problemas do tipo sombra.
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra
Matemática aula
por aula
3
Xavier & Barreto
Vol.1 – 416
Vol.1 – 78 /
19%
História: Origem da trigonometria e
utilização de razões trigonométricas no
antigo Egito.
Vol.2 – 400
Vol.2 – 81 / 20%
Problemas do tipo sombra.
Vol.3 – 336
Vol.3 – 0 / 0%
Total – 1152
Total – 159 /
14%
Contextualização em fatos científicos e
tecnológicos.
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra.
História: Origem da Trigonometria.
Problemas do tipo sombra.
Matemática
Manoel Paiva
1
551
72 / 13%
Contextualização em fatos
astronômicos
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra.
Matemática e suas
3
Vol.1 – 312
Vol.1 – 107 / 34%
História: Origem da trigonometria.
Capítulo 3 – Primeira Fase
tecnologias
Angel Panadés
Rubió – Luciana
Maria Tenuta de
Freitas
67
Vol.2 – 224
Vol.2 – 0
Problemas do tipo sombra.
Vol.3 –272
Vol.3 – 0
Total – 808
Total – 107 / 13%
Ciclo Trigonométrico, resolução pela
álgebra.
Tabela 10 – Análise Livros Didáticos
A importância dada a este tema fica nítida não apenas pelas páginas
dedicadas a ele nos livros didáticos como também na Proposta do Estado de São
Paulo também dedica um bimestre inteiro do 1° e do 2° ano para a trigonometria.
Os livros didáticos analisados apresentam uma seqüência parecida no trato
da trigonometria, de modo geral apresentam primeiro a trigonometria no triângulo
retângulo, normalmente aplicada na 1ª Série, seguido da trigonometria no ciclo
trigonométrico e as funções trigonométricas, que são introduzidas na 1ª Série e
aprofundadas na 2ª Série.
A Proposta do Estado de São Paulo também segue este padrão, tendo como
diferencial a abordagem do tema, pois esta apresenta os fenômenos naturais
periódicos como tema norteador para a introdução das funções trigonométricas, este
enfoque não se apresenta em nenhum livro didático analisado.
Quanto aos livros didáticos analisados, todos apresentam algum contexto
histórico, quase sempre mencionando a origem da trigonometria, a origem da
palavra trigonometria e algumas utilizações de razões trigonométricas na
antiguidade. Todos os fatos históricos apresentados nestes livros estão reportados a
trigonometria no triângulo retângulo. Quando se trata da trigonometria no círculo
trigonométrico e suas funções nenhum fato histórico é apresentado, assim como
também não é contextualizado o uso destas funções. Como já mencionado no
levantamento histórico esta falta de contextualização em situações reais se deve,
talvez ao fato que a evolução das funções trigonométricas ter ocorrido dentro da
própria matemática e sendo aplicadas em situações mais avançadas da física, ou
seja que depois de seu surgimento pragmático, desenvolveu-se dentro da própria
matemática, seguindo os três momentos citados por Caraça: surgimento pragmático,
desenvolvimento dentro da própria matemática e a busca da economia, ou seja,
facilitar os processos matemáticos que envolvem o assunto.
Capítulo 3 – Primeira Fase
68
Os problemas apresentados pelos livros didáticos, quando tratam a
trigonometria no triângulo, são em sua maioria variações dos problemas envolvendo
a sombra de um objeto e os ângulos do triângulo formado pela sombra e o objeto.
Na tentativa de contextualizar o conteúdo matemático com situações que podem ser
pertinentes ao cotidiano do aluno os livros didáticos utilizam-se de argumentos
quase sempre superficiais a realidade do aluno, como havia detectado Arcavi que
enfatiza:
“É muito comum afirmar que todo currículo em Matemática deve conter
problemas realistas que permitam usar instrumentos matemáticos para
resolver situações da vida diária. De fato, encontramos este tipo de
problema em quase todos os livros-texto, porém na maioria das vezes
uma observação crítica dos mesmos revela que muitos deles são
apenas disfarces para os alunos fazerem mais exercícios e sua
conexão com o real é totalmente superficial. Desta maneira, a
metamensagem desses problemas leva o aluno a perceber a atividade
matemática como algo esotérico e artificial.” (Arcavi, 2000, p.90)
Nos Livros “Matemática Completa de Giovanni & Bonjorno”; “Matemática aula
por aula de Xavier & Barreto Matemática” e “Matemática Ensino Médio de Katia
Stocco Smole – Maria Ignez Diniz”, encontramos recortes falando sobre
instrumentos de medição de ângulos como o astrolábio, grafômetro e teodolito,
alguns citam a utilização da trigonometria na agrimensura. Mas estes recortes
contextualizando a importância da trigonometria são pouco explorados nos
exercícios e problemas encontrados nesses livros, que dedicando mais espaço para
a sistematização de resoluções de problemas relacionados à trigonometria no
triângulo retângulo.
Os livros didáticos não apresentam contextualização da trigonometria no ciclo
trigonométrico e suas funções. Pouco se encontra sobre fatos históricos, onde se
aplica ou como chegamos a necessidade das funções trigonométricas.
Segundo Weber (2005) a trigonometria é muito valorizada nos cursos técnicos
de mecânica, eletricidade e eletrônica, mas em nenhum momento suas aplicações
aparecem nos livros didáticos.
Revisitando os livros que utilizei em minha graduação em Engenharia
Mecânica, notei que nos livros de “Mecânica Vetorial para Engenheiros: Estática”
dos autores Beer e Johnston (1990) e “Mecânica Vetorial para Engenheiros:
Capítulo 3 – Primeira Fase
69
Cinemática e Dinâmica” dos autores Beer e Johnston (1990) o uso da trigonometria
é constante. Era também constante o uso das funções trigonométricas nas aulas de
eletricidade e de eletrônica. É fato que os cursos de engenharias utilizam-se muito
da trigonometria, mas isto sequer é citado nos livros didáticos que analisei ou até
mesmo pela proposta curricular do Estado de São Paulo.
Outro fato que me chama a atenção nos livros didáticos que analisei é a
valorização de exercícios e nestes das resoluções algébricas, enquanto resoluções
geométricas são bem menos solicitadas ou até inexistentes.
Sugestões para o uso de softwares de geometria dinâmica ou aplicativos
computacionais sequer são citados em qualquer um dos livros didáticos. Na
Proposta Curricular do Estado de São Paulo existe uma atividade onde é sugerido o
uso de plotadores de gráficos para a comparação das variações gráficas das
funções seno e cosseno.
A Proposta Curricular do Estado de São Paulo nos mostra uma perspectiva
diferente daquelas dos livros didáticos. A Proposta é estruturada em cadernos
bimestrais, e, ao longo do bimestre, as atividades são distribuídas em quatro
situações de aprendizagens apresentadas, que, ao serem desenvolvidas pelos
alunos procuram levar a compreensão do tema proposto.
Cada situação de aprendizagem possui um tema gerador no qual são
desenvolvidas as atividades propostas para os alunos. Este é o grande diferencial
da Proposta Curricular do Estado de São Paulo, onde para a trigonometria são
valorizados os fenômenos periódicos da natureza, como a sombra de uma estaca
durante o decorrer do dia e os movimentos das marés. Embora eu também
considere interessante a associação dos movimentos das marés como fenômeno
periódico, será que para os alunos do interior, onde muitos deles nunca viram o mar,
esta é uma situação significativa para eles?
Um exemplo da diferença entre os livros didáticos analisados e a Proposta
Curricular do Estado de São Paulo é o modo como tratam o mesmo tema, neste
exemplo a medida dos arcos em radianos. Os livros didáticos definem o que é um
radiano e após isto sugere a conversão de graus para radianos ou vice versa,
através de uma regra de três. A Proposta Curricular do Estado de São Paulo, tenta
Capítulo 3 – Primeira Fase
70
demonstrar que uma semi-circunferência mede pouco mais de três radianos, e
depois apresenta que ela mede π radianos. No lugar de propor a conversão de graus
para radianos ela propõem exercícios nos quais o aluno é levado a medir em
radianos pelo fracionamento da semi-circunferência, ou seja, medindo arcos da
circunferência em frações de π radianos.
Sem dúvida a Proposta Curricular do Estado de São Paulo tenta
contextualizar com muito mais intensidade a utilização da trigonometria, mas como
ela não é uma seqüência didática e não tem a pretensão de esgotar o assunto,
assim muitos dos conhecimentos desejáveis para o desenvolvimento das atividades
propostas necessitam de um elo entre o livro didático e a proposta, o que fica por
conta do professor.
Um ponto importante encontrado no Caderno do Aluno são as várias
atividades de construção de gráficos para verificação da periodicidade, pouco
comum nos livros didáticos que apresentam apenas os gráficos das funções já
prontos.
Podemos observar que os livros didáticos, assim como na história da
trigonometria, apresentam para a trigonometria no triângulo retângulo, situações
práticas e contextualização, muito parecida com os problemas que os matemáticos
gregos já nos apresentavam, estudos como o de Thales de Mileto, com as medições
das alturas das pirâmides no Egito através das sombras ainda se apresenta em
todos os livros didáticos analisados, muitas vezes modificando apenas de pirâmides
para edifícios.
Também observamos que, assim como nos livros didáticos, não se apresenta
contextualização
em
situações
práticas
para
os
estudos
das
funções
trigonométricas.
A Proposta Curricular do Estado de São Paulo, na busca da contextualização
das funções trigonométricas, também traz da história sua referencia, e apresenta os
fenômenos periódicos da natureza sua primeira contextualização, assim como os
primórdios da trigonometria, as relações com a sombra e o movimento entre a Terra
e o Sol, introduzem os primeiros estudos das funções trigonométricas.
Capítulo 3 – Primeira Fase
71
Não foi encontrado em nenhum livro didático analisado assim como na
Proposta Curricular do Estado de São Paulo e também nos OA´s do RIVED que
foram analisados, uma justificativa prática para o uso das funções trigonométricas,
mesmo sabendo que ela é utilizada na física, na mecânica, acústica e em muitas
áreas da engenharia.
3.3 - Análise dos OAs – Objetos de Aprendizagem / Apllet
Neste capítulo faço uma descrição e análise de dois OAs – Objetos de
Aprendizagem, disponibilizado pelo RIVED, o primeiro OA será “O Mundo da
Trigonometria” e o segundo “Trigonometria com Molas”.
Destaco em primeiro lugar algumas características do RIVED, em seu sítio na
internet encontramos vários OAs que podem ser localizados de acordo com o nível
de ensino e a disciplina, além de um filtro, possibilitando a busca por palavras
chaves.
Quando definido o nível de ensino como “Ensino Médio” a disciplina
“Matemática” e palavra chave “Trigonometria” o RIVED nos disponibiliza três OAs.
Todos os OAs apresentam uma tela padrão com informações inicias, conforme
mostra a figura 7, ele também oferece um “Guia do Professor” detalhando como este
OA pode ser utilizado pelo professor com seus alunos. Outro item importante é a
opção “Comentar” onde os usuários do OA podem enviar suas sugestões ou críticas
para o RIVED, possibilitando assim o desenvolvimento e melhoria destes OAs.
O Guia do Professor de cada OA mostra os objetivos do software, os prérequisitos que os alunos deverão possuir, o tempo previsto para as atividades
propostas e os procedimentos que se deve ter em sala de aula e no ambiente
computacional.
3.3.1 - Objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonometria”
O objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonometria” é destinado a trabalhar
com as funções seno, cosseno e tangente. Ele apresenta as três funções no círculo
trigonométrico, possibilitando seu movimento em até duas voltas no círculo
trigonométrico.
Capítulo 3 – Primeira Fase
72
Figura 7: Tela de abertura para acesso ao OA – “Mundo da Trigonometria”
Neste
OA
devo
destacar
algumas
características
quanto
a
seu
funcionamento. Quando acessado sua tela de abertura nos mostra uma animação
com imagens e frases nos sugerindo o uso da trigonometria no cotidiano, as
imagens são de descida em botes a cachoeiras, lances de jogos de futebol
sugerindo o movimento da bola e jogos de sinuca.
As imagens são muito bonitas e entendo a tentativa do OA de mostrar aos
alunos o uso da trigonometria, mas será que realmente existe uma relação da
trigonometria com estas sugestões? Algum jogador de sinuca ou de futebol realiza
algum cálculo para realizar suas jogadas, antes de dar sua tacada ou chutar uma
bola? Não acredito que possamos ter resultados favoráveis, na tentativa de
concretizar o uso da matemática, utilizando exemplos de uma pseudo matemática
do cotidiano. Nestes exemplos citados, talvez o conhecimento matemático possa ser
utilizado para a criação de um software de jogo de sinuca ou jogo de bilhar, mas no
cotidiano do aluno estes exemplos eu acredito que não são muitos significativos.
Depois da abertura temos uma tela de introdução explicando como funciona o
software “Mundo da Trigonometria” e qual conteúdo ele possui, ressaltando a
necessidade de conhecimentos prévios com a seguinte mensagem “Mas
ATENÇÃO!!! Para o bom uso do módulo é importante que você já tenha visto em
sala de aula os conceitos aqui abordados”. Como todos os OAs oferecidos pelo
RIVED em seu guia do professor ele apresenta quais os conhecimentos prévios que
os alunos devem possuir para o seu uso.
Capítulo 3 – Primeira Fase
73
No menu nomeado de Noções Básicas, o OA apresenta alguns conceitos
fundamentais da trigonometria, com uma breve introdução, um pouco de história da
trigonometria e também são definidos e apresenta arcos côngruos e o círculo
trigonométrico.
Até este item este OA poderia ser substituído por algum material impresso,
mas os itens a seguir, que serão as partes deste OA, que iremos aproveitar e
transformá-lo em um Objeto de Ensino, são mais interessantes e oferecem uma
abordagem dinâmica no círculo trigonométrico. O que vai ao encontro de nossa
hipótese, de que existe uma diferença entre usar um material impresso que é
estático e um objeto virtual dinâmico.
Chamo a atenção neste ponto para o movimento circular oferecendo uma
leitura linear, ou seja, ao mesmo tempo o aluno deverá observar o ponto que se
move sobre a circunferência para determinar o ângulo ou comprimento do arco e
outro ponto que se movimenta sobre o eixo dos senos e cossenos para determinar a
razão trigonométrica.
Como veremos os dois movimentos coordenados/sincronizados na tela, é
nossa hipótese que tal representação venha a enriquecer o domínio fonte dos
estudantes como ocorreu em uma pesquisa com sensores e calculadoras gráficas
(para maiores detalhes ver Bolite Frant, 2009b) (SIPEM).
Seguimos este OA com as funções seno, cosseno e tangente que são
desenvolvidas em cinco passos. Para a função seno eles se apresentam da seguinte
maneira.
•
Apresentação do Círculo Trigonométrico; (fig.8)
•
Localização de um ponto P sobre o círculo; (fig.9)
•
Determinação do ângulo formado do centro do círculo até o ponto na
circunferência; (fig.10)
•
Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y; (fig.11)
•
Determinação do valor do seno. (fig.12)
Capítulo 3 – Primeira Fase
74
Figura 8: Círculo Trigonométrico
Figura 9: Localização de um ponto P sobre o círculo
Capítulo 3 – Primeira Fase
75
Figura 10: Determinação do ângulo
Figura 11: Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y
Capítulo 3 – Primeira Fase
76
Figura 12: Determinação do valor do seno
As demais funções seguem o mesmo padrão de apresentação. Logo após a
definição da função seno no círculo trigonométrico, temos a construção da função y
= sen x. Neste momento é solicitado para que o usuário do sistema digite um ângulo
entre -720º e 720º e observe a linha construída no plano cartesiano. Ressalto que
embora se peça para digitar o ângulo em graus o plano cartesiano apresentado para
a construção do gráfico da função apresenta o ângulo em radianos. Como já
observado também nos livros didáticos existe uma alternância entre o uso de graus
e radianos, sem nenhuma justificativa aparente. Como também podemos observar
na imagem da fig.14, ele apresenta em uma mesma tela a unidade de medida para
um ângulo em graus e radianos e ainda para os radianos apresenta uma
representação decimal e outra em forma de fração.
Capítulo 3 – Primeira Fase
77
Figura 13: Tela do gráfico da função seno
Depois da definição da função seno no círculo trigonométrico e construção do
gráfico da função y = sen x, o OA propõe uma atividade que consiste em definir o
sentido horário ou anti-horário no círculo trigonométrico e movimentar com o mouse
o ponto P sobre o círculo observando a construção do gráfico da função y = sen x.
As construções dos gráficos e atividades propostas para as funções cosseno
e tangente seguem também o mesmo padrão da função seno.
Por último é apresentado um jogo de sinuca para a aplicação da
trigonometria. Neste jogo encontramos uma incoerência com as atividades
trabalhadas anteriormente, pois o jogo apresenta apenas a necessidade de
conhecer como calcular as razões no triângulo retângulo.
Com o desenho de parte da mesa de bilhar (fig.15), sugere um triângulo
retângulo fornecendo os valores dos catetos e solicita que o usuário calcule o valor
do ângulo α e depois o valor da hipotenusa.
Neste jogo se o usuário simplesmente clicar sobre o botão que calcula o
ângulo e depois clicar sobre o botão “Dar Tacada”, a bola se movimenta até a
caçapa e apresenta o resultado da hipotenusa. Portanto o jogo além de não
apresentar ligação com as atividades do círculo trigonométrico apresentadas
Capítulo 3 – Primeira Fase
78
anteriormente o também não exige do usuário nenhuma interação com algum
conhecimento de trigonometria que se tenha apresentado no OA.
Figura 14: Tela do jogo do OA “Mundo da Trigonometria”
Apenas parte deste OA foi utilizado nesta pesquisa, pois conforme foi
sugerido nesta pesquisa, este OA- objeto de aprendizagem foi utilizado como OE –
objeto de ensino. Assim podemos dividir o OE em duas partes, a primeira que
poderia ser substituída por algum material impresso ou livro didático onde utilizamos
a tela de abertura, sua contextualização histórica e as páginas onde se apresentou
os conceitos de trigonometria no círculo trigonométrico.
A segunda parte deste OE é composta pelos recursos dinâmicos fornecidos
por ele, assim as telas de onde apresentam a definição das funções seno e cosseno
no círculo trigonométrico e as telas onde apresentam os gráficos das funções seno e
cosseno, onde os alunos podem interagir, completam a segunda parte deste OE.
O jogo de bilhar apresentado no final do AO “Mundo da Trigonometria” não foi
utilizado, pois para nós se trata de exercícios e como sugere Skovsmose (2008)
para a criação de um cenário de investigação devemos substituir os exercícios por
situações onde os alunos possam investigar a matemática, portanto é na utilização
Capítulo 3 – Primeira Fase
79
da segunda parte deste OE que temos a possibilidade de criação deste cenário de
investigação, mesmo porque somente quando e se os alunos assumirem o papel de
investigadores é que realmente este cenário irá existir.
3.3.2 - Objeto de aprendizagem “Trigonometria com Molas”
O objeto de aprendizagem “Trigonometria com Molas” apresenta os conceitos
relacionados a funções trigonométricas através do movimento de vai e vem que a
mola realiza após fixarmos um peso em sua extremidade e puxá-lo para baixo a uma
certa distância. Este OA é indicado no guia do professor, para trabalhar com os
alunos a Teoria do Movimento Harmônico Simples.
Este objeto é composto de duas atividades, a primeira oferece um peso
pendurado em uma mola e na segunda atividade temos dois pesos pendurados em
duas molas com movimentos independentes.
Na primeira atividade é apresentado ao usuário um peso preso em uma mola
e o plano cartesiano com o eixo x representando o tempo e o eixo y representado a
altura do peso em relação a um ponto inicial. Quando acionado o botão para iniciar a
animação este peso segue um movimento contínuo para cima comprimindo a mola
até sua altura máxima e depois este peso desce até um ponto mínimo esticando a
mola. Acompanhando o movimento do peso no plano cartesiano forma-se o gráfico,
da altura da mola pelo tempo do movimento. Nesta primeira atividade faço algumas
observações, primeiro o eixo do tempo utiliza uma escala em radianos e não uma
escala com alguma unidade de medida de tempo. Segundo, embora o peso se
localize no ponto inicial zero, seu gráfico inicia do ponto 10 e o eixo que representa a
altura da mola não possui nenhuma unidade de medida.
Capítulo 3 – Primeira Fase
80
Figura 15: Tela da atividade do OA “Trigonometria com Molas”
Após a manipulação e observação o OA sugere a seguinte atividade: “Caro
aluno, após a manipulação e interação com o objeto, tente explicar a relação do
movimento da mola com o gráfico. Discuta com seus colegas e faça um relatório.”
Para direcionar o trabalho dos alunos o OA oferece algumas dicas, são elas:
a) Qual é o período da função, ou seja, em qual instante o gráfico da função começa
a se repetir? Explique o que isto significa. (Dado: ω = 4 e T =
2π
ω
)
b) Segundo o gráfico, quantas vezes o movimento se repete?
c) Qual é a freqüência do movimento? Explique o que isto significa. (Dado: f = 1/T)
d) Qual é a amplitude do movimento, ou seja, qual é o deslocamento máximo e
mínimo que a mola faz em relação à origem?
Figura 16: Tela das questões da atividade do OA “Trigonometria com Molas”
Capítulo 3 – Primeira Fase
81
Na atividade 2 existem duas molas com pesos, o usuário determina a
amplitude do movimento de cada mola e observa a construção do gráfico. Nesta
segunda atividade não existe uma escala de tempo no eixo x e a amplitude pode ser
definida de 0 a 6, novamente sem escala de medida.
Após a manipulação e observação o OA sugere a seguinte atividade: “Caro
aluno, após a manipulação e interação com o objeto, tente explicar a relação entre
as duas molas com amplitudes diferentes. Discuta com seus colegas e faça um
relatório.”
Novamente são oferecidas para direcionar o trabalho dos alunos algumas
dicas, são elas:
a) Qual é a amplitude da mola Amarela? E da Vermelha?
b) As duas molas alcançam os extremos no mesmo instante? Discuta com seus
colegas.
Este OA apresenta sempre exercícios para que os alunos resolvam, como a
resolução de exercícios não é a maneira como pretendemos construir um cenário de
investigação, para a sua utilização como OE a abordagem deverá ser diferente da
proposta. No lugar das perguntas objetivas que o OA apresenta como “Qual é...?”,
“quantas...?” deverão ser substituídas por perguntas ou desafios do tipo “Por que
isto?”.
Figura 17: Tela da atividade 2 do OA “Trigonometria com Molas”
Capítulo 3 – Primeira Fase
82
Fazendo uma comparação com outros OAs oferecidos pelo RIVED o OA
“Trigonometria com Molas” segue o padrão da maioria dos OAs, são softwares de
utilização bastante simples, baseados em animações seguidos de sugestões de
atividades. Neste tipo de objeto é comum que o usuário explore suas possibilidades
antes mesmo de fazer uma leitura de suas instruções.
O OA “Mundo da Trigonometria” apresenta um padrão diferente, se
assemelhando a uma página de internet, com muitas informações apresentadas em
textos exigindo do usuário a leitura de suas páginas para o uso.
Quanto a linguagem utilizada nos dois objetos, podemos dizer que é muito
parecida com as encontradas nos livros didáticos, mas o fato de poder oferecer uma
dinâmica nos movimentos de construção dos gráficos e manipulação do círculo
trigonométrico, temos a hipótese que estes objetos podem auxiliar na aprendizagem
dos alunos, pois conforme já apresentado por Blackett e Tall (1991, apud Weber
2005) e Costa (1997) a utilização de recursos computacionais colaboraram para a
construção de conhecimentos em trigonometria em participantes de suas pesquisas.
Algumas instruções encontradas nos OAs como a “movimente o ponto P
sobre o círculo” também são utilizadas pelo professor em sala de aula quando utiliza
giz e lousa ou o livro didático, mas ele necessita modificá-la um pouco e diz “imagine
o ponto P se movimentando pelo círculo”. Com a utilização dos OAs o aluno não
necessita imaginar ele pode realmente ver este movimento e mais ele mesmo pode
manipular este movimento. Acredito que esta interação do aluno com os OAs
colabore com sua aprendizagem.
3.3.3 – Applets
Durante a aplicação das atividades no segundo encontro com os alunos, onde
fizeram o uso do OE “Mundo da Trigonometria”, verificamos a necessidade de
algumas modificações nos OAs disponíveis.
Para os eixos do seno e cosseno no círculo trigonométrico pereceu
necessário a criação de uma escala decimal, inexistente no OA “Mundo da
Trigonometria”, também observamos que em um primeiro momento a apresentação
Capítulo 3 – Primeira Fase
83
do gráfico da função seno ou cosseno junto com a primeira experiência com o
círculo trigonométrico pareceu inadequada, pois os alunos estavam com muitas
informações novas e simultâneas para serem compreendidas, e como já sugerido
por Lakoff e Núnez (2000) a compreensão do círculo trigonométrico é complexa.
Assim buscou-se algum applet para auxiliar nas dificuldades encontradas
pelos alunos. Após uma busca minuciosa pela internet decidi desenvolver um apllet
com as características que no momento apresentavam-se importante. Isso foi feito
com a utilização do software GeoGebra, que se trata de um software livre disponível
no sitio www.geogebra.com.br.
Nesta pesquisa iremos tratar um applet também como um Objeto de Ensino
(OE), pois entendemos que ele também pode ser utilizado pelo professor como
ferramenta para sua aula e este objeto de ensino em conjunto com as atividades ou
outras
ferramentas
proposta
pelo
professor
pode
gerar
um
cenário
de
aprendizagem.
Através do software GeoGebra foi desenvolvido um círculo trigonométrico
com algumas características não encontradas nos OAs e apllet´s pesquisados. Entre
as principais características estão à visualização de uma escala decimal no eixo dos
senos e cosseno, maior destaque para o triângulo retângulo formado pelo raio do
círculo (hipotenusa) e as projeções do seno e cosseno (catetos), destaque ao arco e
sua medida em graus e radianos, criação de uma escala no eixo x em graus e
também em radianos, exibição do gráfico da função somente quando solicitado.
Este apllet funciona da seguinte maneira, sobre o círculo trigonométrico
encontre-se um ponto B, onde pode ser movimentado por toda a circunferência. Um
segmento de reta liga o ponto O ao ponto B, tendo assim o segmento OB como o
raio da circunferência. Sobre a circunferência existe o ponto A na posição de zero
graus, assim o arco AB é destacado com a cor roxa e área formada pelos pontos
delimitados pelo ângulo AOB também é diferenciada pela cor roxa em um tom mais
claro. O ângulo AOB também está representado pela letra grega α.
Para representar o valor do seno existe um segmento de reta perpendicular
ao eixo dos cossenos (eixo x), ligando o ponto B sobre a circunferência a este eixo,
Capítulo 3 – Primeira Fase
84
a projeção deste segmento de reta é destacada sobre o eixo dos senos com um
vetor na cor vermelha indicando o valor do seno do arco AB.
O eixo dos senos possui uma escala decimal com incremento de um décimo
para facilitar a leitura dos valores do seno, logo sobre o círculo encontra-se a medida
do arco AB ou ângulo α, esta medida se apresenta em graus e radianos, os valores
em radiano são mostrados em uma escala decimal. Embora tivesse o desejo de que
os valores em radianos fossem apresentados na forma fracionária em uma
representação do tipo “a/b.π rad”, a limitação do software utilizado, neste caso o
GeoGebra, não permitiu esta opção.
Outro acréscimo neste apllet foi a opção de visualização do gráfico da função,
apenas quando selecionado a opção “visualizar gráfico”, neste caso um cuidado que
se teve foi quanto a escala utilizada no eixo x, onde foi representado os valores em
graus e radianos e para a escala do eixo y foi utilizado a mesma escala do círculo
trigonométrico, portanto a medida utilizado pelo raio da circunferência é a mesma
medida representada para o seno igual a uma unidade.
3.4 - Primeira investigação junto a um grupo de professores/ pesquisadores
Foi discutido com grupo de pesquisa de “Tecnologias Digitais e Educação
Matemática” da UNIBAN algumas evidências e algumas hipóteses sobre o ensino e
aprendizagem de trigonometria e também foi apresentado o OA “Mundo da
Trigonometria” oferecido pelo RIVED.
Entre as evidências e hipótese destacou-se:
- Números irracionais, frações e números decimais – Apresentei ao grupo
que os livros didáticos trabalham indistintamente com frações ou números decimais
e também é muito comum encontrar notações de todos os tipos em um único
exemplo ou exercício de trigonometria nos livros didáticos.
O grupo de professores observou que pela primeira vez os alunos do Ensino
Médio iriam lidar com uma quantidade muito grande de números irracionais e
acreditando que este é um fator complicador, sugere que as primeiras atividades
Capítulo 3 – Primeira Fase
85
deverão trazer apenas os números decimais, o que me parece ser mais familiar aos
alunos.
- Graus ou Radianos – Este também pareceu ser uma das dificuldades de
compreensão, não se tem um padrão na utilização de graus ou radianos, acredito
que o uso dos radianos que sempre vem em notações com frações dificulta o
processo de ensino-aprendizagem. Mesmo quando os alunos compreendem o que é
o radiano, sua notação é pouco familiar, e sendo assim as primeiras atividades
também irão trabalhar apenas com graus.
- Triângulo Retângulo – É comum nos livros didáticos, iniciarem as funções
trigonométricas com demonstrações das razões no triângulo retângulo. Depois este
triângulo é inserido no círculo trigonométrico no primeiro quadrante e quando
mudamos para o segundo, terceiro ou quarto quadrante do círculo o triângulo
retângulo desaparece. Sendo assim acredito que obteremos maior sucesso se não
mencionarmos o triângulo retângulo no círculo trigonométrico.
- Círculo trigonométrico estático ou dinâmico – Quando expomos o círculo
trigonométrico é comum falarmos do movimento do ponto sobre o círculo, para
determinarmos o ângulo, mas a lousa ou o livro são estáticos, então será proposto
atividades com o uso de recursos digitais par dar movimento ao círculo
trigonométrico, acreditando que isto poderá facilitar o processo de ensinoaprendizagem da trigonometria.
Quanto a utilização do OA “Mundo da Trigonometria” o grupo a apresentou a
crítica de que parte deste OA se parecia muito com um livro didático eletrônico, mas
concordaram com a hipótese de que a dinâmica apresentada pelo OA poderia trazer
benefícios no processo de ensino e aprendizagem da trigonometria no círculo
trigonométrico.
3.5 - Desenvolvimento das Atividades para o 1º encontro
Para o primeiro encontro com os alunos foram criadas duas tarefas, uma lista
de exercícios (Atividade 1- Trabalhando com números racionais e irracionais) onde
os alunos responderam questões para verificar se algumas das hipóteses
Capítulo 3 – Primeira Fase
86
levantadas por mim e pelo grupo de professores e pesquisadores se confirmava.
Procuramos neste primeiro encontro verificar se realmente os alunos apresentavam
dificuldades com racionais e irracionais.
Atividade 1 – Trabalhando com números racionais e irracionais.
1 – Complete com os sinais de > (maior) ou < (menor):
a- 4/5 ______ 1/2
3 _______ 2
eb- 3/2 ______ 4/5
2 ______ 3
f-
3 ______ 3/4
h- 3/4 ______ 2
g-
c- 5/2 ______ 4
d- 8/7 ______ 3
2- Associe a primeira coluna com o valor mais próximo na segunda coluna:
(
) 0,75
A-2 3
B-2 2
C–¾
D - 3 /2
(
(
(
) 3,46
) 0,71
) 2,83
2 /2
(
) 0,86
E-
3 – Sabendo que π ≅ 3,14, determine:
a- 2π = ______
b- π/2 = ______
c- 3/4 π = ______
d- 4/3 π = ______
4- Escreva abaixo alguns números que você conhece que são maiores que -1 e menores que
1.
Para esta primeira tarefa optei pela resolução de exercícios, pois ainda não se
pretendia criar o cenário de investigação para a trigonometria, mas sim verificar
algumas hipóteses para subsidiar a construção deste cenário.
Além de resolver esta lista de exercícios foi proposto uma segunda tarefa na
qual os alunos, divididos em grupos, organizaram vários números em ordem
crescente. Os números foram entregues a eles recortados em pedaços de papéis
em uma ordem aleatória, estes números seguem na tabela abaixo:
7/8
-7/8
¾
-3/4
1/2
-1/2
1/4
-1/4
Capítulo 3 – Primeira Fase
87
1/3
-1/3
11/12
-11/12
0,6
-0,6
0,8
1
-1
2
-2
3
-3
0
-0,8
Tabela 11 – Atividade 1º Encontro
Esta segunda tarefa teve a finalidade de verificar as dificuldades que
poderiam existir com o tratamento de frações e criar condições para que os alunos
expusessem suas dificuldades através das falas entre eles e o professor. E mesmo
não sendo o objetivo desta pesquisa, esta atividade poderia ajudar a sanar
eventuais dificuldades que estes alunos tivessem com frações.
Capítulo 4 – Segunda Fase
88
Capítulo 4
Segunda Fase
Capítulo 4 – Segunda Fase
89
Neste capítulo descrevo como ocorreram os encontros com os alunos,
fazendo uma análise sobre os pontos mais relevantes. Estão descritos também as
alterações e o desenvolvimento das atividades realizadas nos encontros seguintes.
4.1 – Primeiro encontro
Este encontro teve duração de aproximadamente uma hora e trinta minutos e
foi realizado na sala da coordenação da escola, pois como foi realizada fora do
horário regular das aulas dos alunos participantes não foi possível fazer uso da sala
de aulas. Os alunos ficaram dispostos em uma mesa retangular, de forma que fosse
possível enquadar todos os participantes na filmagem, conforme o layout
apresentado a seguir.
Layout da sala – Encontro 1
Grupo 1 de
Alunos
Grupo 2 de
Alunos
Estante de livros
Janela para o
pátio da escola
Mesa
Cadeiras
Porta de
entrada
Mesa com 2
Computadores
Estante de livros
Campo visual
da filmadora
Filmadora
Figura 18: Layout da sala – Encontro 1
Para
o
primeiro
encontro
a
filmadora
ficou
primeiramente
fixa
e
posteriormente móvel, permitindo a filmagem mais detalhada de algumas atividades
realizadas pelos alunos.
Capítulo 4 – Segunda Fase
90
Haviam sido convidados oito alunos mas apenas seis compareceram. Deste
modo contamos com a presença de Angeline, Renan, Gabriela, Marcella, Maiara e
Tais. Nesta pesquisa estamos utilizando os nomes reais dos participantes.
Iniciei expondo aos alunos sobre o que se tratava a pesquisa na qual eles
participariam. Em seguida foi entregue a primeira tarefa (atividade-1) para verificar
se a hipótese da dificuldade com números racionais e irracionais se confirmava. Não
foi mencionado se era permitido o uso de calculadora, e no primeiro momento esta
não foi utilizada.
Atividade 1 – Trabalhando com números racionais e irracionais.
1 – Complete com os sinais de > (maior) ou < (menor):
i- 4/5 ______ 1/2
m- 3 _______ 2
j- 3/2 ______ 4/5
n- 2 ______ 3
k- 5/2 ______ 4
l- 8/7 ______ 3
3 ______ 3/4
p- 3/4 ______ 2
o-
2- Associe a primeira coluna com o valor mais próximo na segunda coluna:
(
) 0,75
A-2 3
(
) 3,46
B-2 2
C–¾
(
) 0,71
(
) 2,83
D - 3 /2
(
) 0,86
E - 2 /2
3 – Sabendo que π ≅ 3,14, determine:
e- 2π = ______
f- π/2 = ______
g- 3/4 π = ______
h- 4/3 π = ______
4- Escreva abaixo alguns números que você conhece que são maiores que -1 e menores que
1.
Os alunos respondiam individualmente as questões em silêncio, após alguns
minutos me ausentei da sala. Analisando posteriormente o vídeo observei que após
minha saída eles trocavam informações para responder as questões propostas,
embora soubessem que estavam sendo filmados. Uma hipótese para que estes
Capítulo 4 – Segunda Fase
91
alunos não tenham se intimidado com a câmera de vídeo é o fato de estarmos
lidando com uma geração acostumada a ter foto e vídeo no celular, geração youtube
e blog.
Para analisar as dificuldades encontradas pelos alunos na resolução da
primeira tarefa tabulei os resultados dos alunos na tabela a seguir.
Questão
1
Item
Acertos
Erros
Comentários
abcd-
4/5 ______ 1/2
3/2 ______ 4/5
5/2 ______ 4
8/7 ______ 3
1
5
4
2
3
3
e-
3 _______ 2
3
3
Dificuldades
em
entender
fração
como
quociente.
Algumas
vezes
parecem
inverter
denominador
com
numerador.
f-
2 ______
3
5
1
g-
3 ______ 3/4
2
4
4
2
4
2
h- 3/4 _____
2
2
Todos: A – E
6
0
Valores utilizados em sala de
aula.
3
abcd-
6
0
4
2
Erros quando trabalham com
frações, o π não parece ser um
dificultador.
1
5
3
3
6
0
4
2π = ______
π/2 = ______
3/4 π = ______
4/3 π = ______
Nº > -1 e <1
Apenas nº na representação
decimal
Tabela 12 – Análise dos resultados do 1º Encontro
No primeiro item onde o aluno teria que comparar dois números e ordená-los,
nenhum deles obteve 100% de acerto. O erro mais frequente, foi na ordenação das
frações 4/5 e 1/2 e o maior número de acertos ocorreu na comparação entre
Uma hipótese para o maior acerto é que o número
3 e 2.
3 foi trabalhado com os alunos
em suas aulas regulares e definido como aproximadamente igual a 1,7 ou igual a
1,73. O número
2
também foi trabalhado em sala de aula e definido
aproximadamente como igual a 1,4 ou a 1,41 e no item onde compara
houve quatro erros e dois acertos.
2 e
3
Capítulo 4 – Segunda Fase
92
Então uma hipótese para os erros e acertos do item 1 desta tarefa é que os
alunos possuem dificuldades em entender as frações como quociente, e quanto aos
números representado na forma decimal pode existir uma dificuldade quanto a
expansão decimal.
No segundo item houve 100% de acerto, o que pode ser interpretado como
sendo o item onde eu, professor, saí da sala e a interação entre os alunos se
estabeleceu. Ou pelo fato de que este item abordou números que estes alunos
estavam mais familiarizados, pois os mesmos já haviam sido tratados recentemente
nas aulas regulares do ensino médio quando abordado o tema trigonometria no
triângulo retângulo.
No terceiro item no qual os alunos deveriam efetuar cálculos com π, nos dois
primeiros cálculos houve quase totalidade de acertos. Para os cálculos 3/4 π e 4/3 π
houve uma grande quantidade de erros, para o valor 3/4.π a resposta mais comum
foi 4,18 e para 4/3π a resposta mais presente foi 2,35, nitidamente houve uma
inversão do numerador com o denominador quando eles efetuaram os cálculos. A
aluna Maiara apresentou 3/4 π = 3/12,56 e 4/3 π = 4/9,42 , neste caso a forma como
foi apresentado estes dois números a levou a um equívoco multiplicando o
denominador por π. Quanto aos outros erros a hipótese é que a dificuldade não foi a
presença do π mas novamente, como apresentado no primeiro item, a dificuldade
em entender a fração como quociente ou em operar frações
No quarto item no qual foi pedido para que eles apresentassem valores
maiores do que -1 e menores do que 1, as respostas foram corretas, mas destaco
que foram apresentados apenas valores na forma decimal com uma ou duas casas
decimais. Os valores mais comuns que apareceram foi 0,1; 0,2; 0,3; 0,10 e 0,20.
Nota-se a aluna Marcella inseriu em sua resposta os valores 0,2 e 0,20 e Maiara
inseriu 0,1 e 0,10, dando a entender que estes valores são diferentes, novamente
apresentando dificuldade na expansão decimal.
Quando os alunos terminaram a primeira tarefa foram divididos em dois
grupos para a segunda tarefa. O grupo-1 formado pelas alunas Gabriela, Marcela e
Maiara e o grupo-2 formado pelos alunos Renan, Tais e Angeline, recebendo assim
Capítulo 4 – Segunda Fase
93
23 pedaços de papéis, cada um deles com um número diferente, conforme a tabela
a seguir, para serem organizados em ordem crescente.
7/8
-7/8
3/4
-3/4
1/2
-1/2
1/4
-1/4
1/3
-1/3
11/12
-11/12
0,6
-0,6
0,8
-0,8
1
-1
2
-2
3
-3
0
Tabela 11 – Atividade 1º Encontro
O grupo-1 começou a organizá-los pelos números inteiros, colocando-os em
um a linha horizontal, iniciou pelo número zero e simetricamente organizou os outros
números inteiros. Isto feito, procurou colocar os números na representação decimal,
colocando-os na posição correta. Até este momento trabalhando com os números
inteiros e representações decimais com apenas uma casa decimal o grupo-1 não
apresentou dificuldade.
Grupo-1 – iniciando a atividade
Grupo-1 – organizando os números
Figura 19: Grupo 1 - Sequencia de Atividades
O grupo-2 iniciou com os valores decimais, após centralizar o número zero de
maneira simétrica organizava os outros valores, ou seja para cada número positivo
colocado em ordem também era adicionado seu oposto negativo. No primeiro
momento o grupo organizou os valores decimais entre -1 e 1, deixando as frações
1/2, 1/3 e 1/4 após o número 1.
Capítulo 4 – Segunda Fase
94
Figura 20: Grupo-2 iniciando atividade
Uma hipótese para que os dois grupos iniciarem a organização dos números
pelo zero e distribuir os valores negativos e positivos simetricamente é a
familiaridade que estes alunos possuem na construção de gráficos das funções de
primeiro e segundo grau e funções exponenciais, no qual costumam representar no
eixo das abscissas e das ordenadas os valores positivos e negativos.
Após alguns instantes o segundo grupo organizava parte dos números na
seguinte sequência (1/4; 3; 2; 1/3; 7/8; 1; 3/4; 0,8; 1/2; 0,6; 0; -1/2; -0,6; -3/4; -0,8; 1/3; -1/4; -1; -7/8; -2; -3) nota-se que as frações 11/12 e -11/12, conforme apresenta
a imagem a seguir, estão fora do agrupamento organizado pelos, para eles estas
frações parecer ser mais difíceis que os outros números.
A aluna Tais, após fazer alguma conta diz que acha que 7/8 é igual a “um e
alguma coisinha”, logo após uma aluna pergunta se temos que dividir 11 por doze ou
12 por 11, e Angeline responde que se divide 11 por 12, mas mesmo assim existem
alguns momentos de silencio para a decisão do que fazer com este número, e a
aluna afirma que é difícil, até que chegam a conclusão que 11/12 é igual a 1,09. Este
fato corrobora com a hipótese levantada na primeira tarefa em que os alunos estão
trocando o numerador e o denominador e também aponta a dificuldade desses
alunos escreverem a expansão decimal que representa um número fracionário.
Capítulo 4 – Segunda Fase
95
Figura 21: Grupo-2 – desenvolvendo atividade
O grupo-2 trabalhando com poucas conversas chegou a seguinte sequência (3; -2; -1; -0,8; -0,6; -1/2; -1/4; -1/3; -3/4; -7/8; -11/12; 0; 11/12; 7/8; 3/4; 1/4; 1/3; 1/2;
0,6; 0,8; 1; 2; 3), podemos notar nesta sequência que se retirarmos as frações o
restante dos números se encontraram em ordem crescente. O que podemos concluir
que a dificuldade se encontra, como no grupo-1, no tratamento com as frações.
Após os alunos apresentarem estas seqüências, eu falei para os grupos quais
eram os números que se encontrava fora de ordem, e como todos eles eram frações
solicitei para que estes números fossem retirados da seqüência, para uma melhor
análise destes. Indagados de como eles poderiam refazer a leitura destes números,
houve a sugestão de transformá-los em valores decimais, onde mostraram
incertezas de como fazê-lo, após a confirmação de que poderiam dividir o
numerador pelo denominador, os alunos fizeram os cálculos para transformar estes
números em decimais e recolocá-los em ordem crescentes junto aos outros
números.
Neste momento o primeiro grupo fazendo uso de uma calculadora
rapidamente verificou os valores e recolocou estes em seus lugares, mas apareceu
neste momento outra dúvida que até então não havia aparecido e para este grupo a
valores como 0,25 são maiores do que 0,8, apresentando assim mais um problema
quando ocorre uma expansão decimal.
Capítulo 4 – Segunda Fase
96
O grupo-2 mostrou dificuldade para a divisão dos valores apresentados, mas
obteve êxito para colocá-los na ordem correta. Neste grupo não houve problemas
com a expansão decimal.
No momento em os alunos conseguiram colocar todos estes valores na forma
de números decimais o trabalho se apresentou bem mais fácil, mesmo o grupo que
teve problemas com a expansão decimal, com poucas informações foi possível a
compreensão e entendimento do que estavam errando e rapidamente conseguiram
corrigir seus erros.
Destaco o momento em que os alunos puderam interagir em grupo e
manipular suas combinações de seqüência, onde puderam investigar formas de
organizar alguns números em ordem crescente, foi algo próximo ao que Skovsmose
chamaria de um cenário para a investigação com referência a matemática pura.
Como apresentado anteriormente um grupo inicialmente organizou as frações
como sendo 1/4 maior que 1/3, e 1/3 maior que 1/2 e somente quando eles dividiram
o numerador pelo denominador da fração eles corrigiram isto. Assim eles puderam
testas suas hipóteses e depois as conferiram com o recurso da divião do numerador
e denominador transformando estas frações em números decimais para facilitar sua
compreenção. Com certeza não foram exploradas todas as possibilidades, mas os
alunos apresentaram indicios de estarem desenvolvendo um processo de
aprendizagem.
Observo que uma das hipóteses levantadas anteriormente, pelo grupo de
professores e pesquisadores, dos fatores que dificultam o aprendizado do aluno no
estudo da trigonometria se confirma. Esta hipótese é que os alunos apresentam
dificuldades na utilização de valores racionais em forma de fração ou decimal e na
utilização de números irracionais.
Confirmado esta hipótese da dificuldade com os valores fracionários e
irracionais durante as próximas atividades foram monitorados os momentos onde
será necessário o uso destes valores, verificando se estas dificuldades realmente
poderiam trazer prejuízos para a aprendizagem dos alunos.
Capítulo 4 – Segunda Fase
97
4.2 – Segundo encontro
Neste encontro foi utilizado o Objeto de Aprendizagem “Mundo da
trigonometria”, que nesta fase será tratado como Objeto de Ensino (OE), conforme
apresentado neste texto anteriormente, então nota-se que para esta pesquisa o OA
“Mundo da Trigonometria” será chamado de OE “Mundo da Trigonometria”. Para
este encontro foi previsto a exploração deste OE e após isto foi proposto que
fizessem uma estimativa sobre o seno de alguns ângulos.
Participaram deste encontro seis alunos, a aluna Maiara que participou do
primeiro encontro não pode comparecer e para o seu lugar esteve presente a aluna
Débora, estes alunos foram divididos em dois grupos de 3 alunos, o grupo-1
formado por Renan, Angeline e Débora e o grupo-2 por Gabriela, Marcella e Tais.
Este encontro teve a duração de uma hora e quarenta minutos.
Para o segundo e terceiro encontro a filmadora ficou fixa, capturando as
imagens de frente para os grupos. A intenção foi a de capturar melhor os diálogos
dos alunos e permitir que eu enquanto professor pudesse interagir melhor com os
alunos.
Layout da sala – Encontro 2 e 3
Grupo de
Alunos 1
Grupo de
Alunos 2
Estante de livros
Janela para o
pátio da escola
Mesa e
computadores
Cadeiras
Porta de
entrada
Mesa com 2
Computadores
Filmadora
Campo visual
da filmadora
Figura 22: Layout da sala 2º e 3º encontro
Capítulo 4 – Segunda Fase
98
Para a exploração deste OE, os alunos tiveram minha orientação, neste
momento acompanhei os alunos para a visualização das telas do software,
aproveitando
o
momento
fiz
uma
pequena
contextualização
histórica
da
trigonometria, após continuei acompanhando e direcionando os primeiros passos
dos alunos até a apresentação da função seno pelo OE.
Logo no primeiro contato com o software, visualizando a imagens de abertura
do programa, a aluna Gabriela sorri ao ver as imagens, que são fotos de descida em
botes a cachoeiras, lances jogos de futebol sugerindo o movimento da bola e jogos
de sinuca, e pergunta “O que isto tem a ver com trigonometria?”, prontamente o
aluno Renan responde “triângulos, geometria, contas.”, até o momento o único
contato dos alunos com a trigonometria foi em suas aluas regulares onde já haviam
trabalhado a trigonometria no triângulo retângulo, o que deve ter motivado a
resposta do aluno Renan. No final da apresentação das imagens iniciais o OE
apresenta uma jogada de bilhar onde a bola entra na caçapa, e o aluno Renan
apresenta empolgação com a jogada.
Faço uma observação neste momento, quanto ao OE “Mundo da
Trigonometria”, a tela de apresentação sugere através de fotos que a trigonometria
esta ligada a várias ações do cotidiano, mas em nenhum momento o OE mostra
como algumas de suas sugestões estão ligadas a trigonometria. A pergunta da
aluna Gabriela “O que isto tem a ver com trigonometria?”, fica sem uma resposta
explicita no OE, embora o aluno Renan tenha respondido “Triângulo, geometria,
contas”, não acredito que esta pseudo matemática sugerido pelas imagens na
tentativa de concretizar o uso da matemática, traga resusltados positivos.
O sorriso de Gabriela e a empolgação de Renan, mostra a animação e euforia
por utilizar um software em uma aula de matemática, o que não é comum para eles,
pois suas aulas de matemática são sempre realizadas em sala de aula com a
utilização de livros, caderno do aluno da Proposta Curricular do Estado de São
Paulo, giz e lousa.
Após esta apresentação os alunos começam a explorar o OE, no início faço a
leitura junto com eles da apresentação histórica da trigonometria. No momento que o
OE apresenta a função seno no círculo trigonométrico eles fazem a leitura silenciosa
Capítulo 4 – Segunda Fase
99
destas páginas, após a leitura dos alunos perguntei o que eles tinham entendido do
que acabaram de ler e nenhum aluno respondeu e tinham neste momento uma
expressão de dúvida e um pouco tímidos por não saber explicar, assim expliquei os
itens que o OE apresentava para definir a função seno no círculo trigonométrico.
Podemos citar duas hipóteses para esta reação dos alunos, a primeira seria a
inibição inicial dos alunos ao falar de um tema novo para eles e a outra é fato de
realmente eles não terem entendido o que estava sendo exposto pelo OE. Observo
que neste momento o OE apresenta uma explicação formal dos significados das
funções trigonométricas, o que poderia ter dificultado o entendimento dos alunos.
Seria interessante se neste momento que o OE apresentasse este tópico de maneira
mais dinâmica com possíveis interações dos alunos, facilitando e tornando esta
parte do OE mais acessível aos alunos.
Neste momento os alunos fizeram a primeira interação com o OE, testando
como se comportava o software com a inserção de vários ângulos diferentes,
positivos e negativos, assim observavam ao mesmo tempo o movimento do ponto
sobre o círculo trigonométrico, sua projeção sobre o eixo dos senos e depois sobre o
eixo dos cossenos e também observavam a formação do gráfico de suas funções.
Ao testar pela primeira vez o OE com o ângulo de 120º, valor sugerido por
mim, a aluna Angeline fala sorridente “Olha! que legal!” referindo-se ao movimento
do ponto sobre o círculo trigonométrico e a formação do gráfico da função seno.
Outras falas também apareceram logo em seguida enquanto eles testavam
aleatoriamente alguns valores de ângulos, Renan disse “Parece um relóginho”,
Angeline disse “Professor... muito louco ein!”. Mais uma vez podemos observar a
animação pelo uso de um software com as falas da aluna Angeline.
Tempo
Fala/ Descirção
0:18:50
O professor pede ao aluno, para que eles
avancem a tela seguinte para mostrar
como o OE funciona, apresentando aos
alunos a tela ao lado
0:19:20
Prof: coloquem o ângulo de 120° e clique
em traçar.
Angeline: Olha que legal! (risos)
Comentário / Imagem
Capítulo 4 – Segunda Fase
100
0:19:51
Prof: Agora testem alguns ângulos,
dentre aqueles que ele (OE) indicou. O
ângulo pode ser negativo é só
acrescentar o sinal de menos e prestem
atenção no quadro que aparece depois
de traçar o ângulo.
0:20:00
Angeline: Olha lá professor muito loco
ein!!
Renan: Parece um relóginho.
Renan: (após a leitura do quadro verde)
Que conta é essa?!
Tabela 13 – Transcrição 1 – 2º Encontro
Também foi pedido para que eles lessem o quadro verde que aparece no final
da execução de cada ângulo que é inserido, e após a leitura deste quadro Renan
diz: “Que conta é essa?”, com uma expressão de dúvida e indignação.
Figura 23: Texto confuso para Renan
Capítulo 4 – Segunda Fase
101
O texto encontrado no quadro em destaque pareceu bastante confuso para
Renan. Quando o aluno se referiu a qual conta era aquela, ele se referia como
mostra o exemplo na figura acima, quando inserido o ângulo de 680º e o OE diz que
o gráfico apresenta um valor de C≅11.868 radianos, mas como observamos (Figura
23) no gráfico o valor de C está entre 7π/2 e 4π.
Neste momento são utilizadas três formas simultâneas para se referir ao
mesmo ângulo, em graus (680°), em radianos acompanh ados de valores em forma
de fração (7π/2 e 4π) e em radianos acompanhados de valores em forma de
decimais com 3 casas decimais (11.868 radianos). Para a representação em decimal
também podemos notar que o OE utiliza o ponto em vez da vírgula para separar as
casas decimais, podendo levar o aluno a entender que 680° é igual a onze mil
oitocentos e sessenta e oito radiano enquanto que o valor deveria ser onze inteiros e
oitocentos e sessenta e oito milésimos. Neste momento esta compreensão não foi
possível para Renan.
Uma possível justificativa para o uso do ponto no lugar da vírgula é que
provavelmente o software utilizado para a elaboração deste OE seja se origem
americana e como ponto é usado nos Estados Unidos ao invés da vírgula e talvez o
programador não tenha prestado atenção para este fato.
A dificuldade encontrada por Renan neste momento reafirma a hipótese da
dificuldade dos alunos em compreender os números racionais e irracionais,
principalmente quando se encontram na forma fracionária.
Quando Renan se referiu ao círculo trigonométrico como um relóginho
podemos entender sobre a perspectiva das metáforas que o relógio foi o domínio
fonte e o círculo trigonométrico o domínio alvo, fazendo-se entender o círculo
trigonométrico através de seu conhecimento de relógio. Sendo assim encontramos a
metáfora “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO”. As inferências que ele
poderá ter feito em seu processo de aprendizagem foram:
Capítulo 4 – Segunda Fase
102
Metáfora: CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO
Domínio Fonte
Domínio Alvo
Relógio
Círculo Trigonométrico
Ponteiros do relógio
Ângulos
Movimento dos Ponteiros
Variação do ângulo
Eixo do relógio
Ponto de origem do plano cartesiano
Ângulo de 360º
Uma volta completa dos ponteiros
Tabela 14: Metáfora: CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO
Para explorar algumas das possibilidades do OE foi pedido para que os
alunos analisassem apenas o tamanho do segmento de reta vermelho sobre o eixo y
que representa o valor do seno, assim eles testaram estes tamanhos com os
ângulos de 90º, 180º e 360º.
A seguir, fiz algumas perguntas aos alunos, procurando trazer algumas
características do cenário para investigação, conforme sugere Ole Skovsmose.
Primeiro perguntei o que aconteceu com o segmento de reta vermelho, quando eles
indicaram 360º.
Tempo
Fala/ Descirção
0:22:00
Prof: o que acontece com o tamanho da
seta vermelha que é o valor do seno entre
0 e 90, digitem 90º e vejam onde vai
parar,
Renan: Vai curvando (movimentando a
mão para cima e curvando)
Professor: só a seta vermelha?
Renan: sobe
Prof: então até 90 ela sempre subiu
Renan; é
0:22:45
Professor: digita agora 180º
Gabriela: Ela sobe e desce.
Prof: Coloca agora 360°
Gabriela: Ela vai dar a volta inteira
Prof.: Como vocês conseguem descrever
para mim só a seta vermelha. O que
aconteceu com ela do 0° ao 360°. Podem
Comentário / Imagem
Capítulo 4 – Segunda Fase
103
contar errado.
Renan: Subiu e desceu, todo o seno.
Gabriela: Duas vezes.
Renan: Eixo y
Prof.: subiu e desceu até onde?
Angeline: subiu e desceu, desceu e
subiu.
Tela apresentada pelo OE após o teste com
360º.
0:24:00
Prof.: Para ela subir foi de quanto a
quanto?
Renan: de 0 a 1.
Prof: pensando nos ângulos, de 0 a 90 a
reta do seno sempre?
Alunos: Subui:
Prof: do 90 ao 180
Angeline: desceu
Renan: (movimenta as mãos para baixo),
desceu.
0:24:30
Prof: Quando chega no 180° ela fica de
que tamanho?
Renan: zero
Neste momento o aluno Renan mantém a mão
levantada fazendo o movimento de subir e
descer de acordo com as indagações do
professor.
Gabriela: π radianos.
Prof: Vamos pensar no tamanho da
setinha vermelha.
Angeline: Ela não tem tamanho
Prof: Ela não tem tamanho?
Angeline: A gente não pode ver?
Prof: Não sei você que esta olhando para
a tela.
Prof.: Então quando você digita 180° ela
fica de que tamanho:
Renan: zero
Prof.: Digita agora 270. A seta do 270 é
do mesmo tamanho da seta do 90?
Alunos: sim
Prof: qual a diferença entre elas.
Renan: 0 foi positivo e 270 negativo.
Tabela 15 – Transcrição 2 – 2º Encontro
Neste momento podemos observar que para os alunos a função seno tem
“movimento”, ou seja ela sobe e desce o ângulo gira como os ponteiros de um
Capítulo 4 – Segunda Fase
104
relógio. Este é um movimento fictivo, nós sabemos que a função é estática, o ângulo
não se movimenta em torno de um círculo, mas o OE está possibilitando tornar este
movimento fictivo em factivo.
Voltaremos a esta discussão nas considerações finais pois entendemos que
tal fato é uma característica relacionada a este tipo de dinamismo oferecido pela
tecnologia. A definição matemática para função avançou historicamente quando foi
possível descrevê-la analiticamente do modo que hoje conhecemos. Por exemplo a
definição para continuidade de que uma função seria continua quando fosse
possível traçar seu gráfico sem tirar a mão do papel deu lugar a uma nova onde a
função pode ser continua se determinado ponto é retirado de seu domínio. Assim,
as definições para funções reais “independem” do movimento. No entanto, as
metáforas utilizadas pelos matemáticos as utilizam, por exemplo ao falar de limite
embora tenhamos a definição estática limx→∞ (x²+1) falamos de x tendendo a ou se
aproximando a um determinado valor.
No caso da trigonometria este dinamismo parece auxiliar a compreensão dos
alunos.
Gabriela estava observando a formação do gráfico da função seno, conforme
apresenta o OE, e π radianos é a unidade do eixo x para as medidas dos ângulos.
E, como vimos por sua resposta, ela não estava associando o eixo x como sendo o
valor dos ângulos.
Figura 24: Leitura da função seno por Gabriela
Continuando a exploração deste OE foi pedido para que os alunos fizessem
uma estimativa de quanto deveria ser o seno de alguns ângulos, o valor destes
Capítulo 4 – Segunda Fase
105
ângulos foram determinados por mim e pelos alunos assim os ângulos escolhidos e
a respostas dos alunos seguem na tabela abaixo:
Ângulo
30º
45º
52º
60º
77º
80º
120º
137º
225º
300º
Grupo1
0,6
0,75
0,76
0,85
0,98
≅1
0,90
0,68
-0,75
-0,85
Grupo2
0,5
0,75
0,77
0,80
0,98
0,99
1,05
1,73
-2,75
-3,03
Correto
0,5
0,7
0,79
0,86
0,97
0,98
0,86
0,68
-0,7
-0,86
Tabela 16 - Respostas do 2º encontro.
Dentre os ângulos escolhidos por mim estão os ângulos de 30º, 45º, 60º, 120º
225º e 300º, que foram escolhidos devido ao fato de aparecerem com freqüência
nos livros e matérias didáticos, conhecidos como ângulos notáveis e alguns
simétricos a eles, já os ângulos de 52º, 77º, 80º e 137º foi escolhidos pelos alunos,
por iniciativa deles mesmos, assim podemos observar que para eles o que acontece
com estes valores fora dos padrões didáticos pode ser mais ou tão interessantes e
curiosos do que os valores normalmente apresentados a eles. Outra observação é
quanto ao uso da tecnologia, não apenas a deste OE, mas também os alunos no
uso diário da calculadora e outros recursos tecnológicos ajuda a quebrar “padrões”
estabelecidos numa época onde seria mais fácil calcular valores múltiplos como por
exemplo 30, 60, 120.
Como podemos observar na tabela 16 o grupo-1 teve todas as respostas
bastante satisfatórias e próximas aos valores corretos, o grupo-2 acertou os valores
dos ângulos do primeiro quadrante, já os ângulos dos outros quadrantes eles
erraram. Procurando compreender o erro ocorrido, ao ser indagada, a aluna Taís
explicou como chegaram aos resultados. Observando o gráfico a seguir ela mostrou
que o seno de 120º seria a soma do valor 1 que seria o tamanho do segmento AB
mais o segmento BC, que deveria ser algo próximo de 0,05, chegando assim ao
valor 1,05. O grupo imaginou que o seno de 120º seria a medida da linha do gráfico
da função e não a projeção do ponto sobre o eixo y, assim eles somavam 1 mais
0,05. Quando o ponto se acima do eixo x, o valor era dado como positivo e quando
se encontrava abaixo do eixo x o valor era negativo.
Capítulo 4 – Segunda Fase
106
B
BC=0,05
C
AB=1,00
5
A
Figura 25: Entendimento do valor do Seno pelo Grupo 2
Neste momento podemos perceber que o grupo2 estava tentando relacionar a
imagem da linha do gráfico no plano cartesiano ao valor do seno e para ela naquele
momento o seno era o comprimento da linha representada no gráfico, que eles
entendiam como o tamanho do percurso da linha vermelha que representa o seno
no círculo trigonométrico ao lado do gráfico. Em conversa entre as alunas Marcela e
Tais para definirem o seno dos ângulos Marcela diz: “é só esticar esta linha...
(fazendo um movimento com as mãos, como se puxasse a linha da tela do
computador para esticá-la no ar) esticou!”.
Grupo-2 – Discutindo a atividade (1º momento)
Grupo-2 – Discutindo a atividade (2º momento)
Figura 26: Grupo 2 Sequencia de Atividades
Entendo que aqui poderia estar ocorrendo uma metáfora com a reta numérica
que de certo modo também “estica” os números reais de modo a acomodá-los numa
reta. Além disso eles “somam 1+0,05 = 1,05”, como adicionam números reais.
Não percebendo no calor das discussões e no imediatismo a qual um
professor deve atuar, minha atitude neste momento foi a de auxiliar os alunos.
Capítulo 4 – Segunda Fase
107
Sendo assim mostrei para o grupo que eles deveriam observar naquele momento
apenas a projeção do ângulo sobre o círculo trigonométrico e deixasse para mais
tarde a compreensão do gráfico da função seno.
Pedi para os dois grupos que explicassem e escrevessem como o valor do
seno se comportava durante o movimento do ponto sobre a circunferência, quando
ele partisse de 0º e fosse até 360º.
O grupo2 estava com dificuldade para responder esta pergunta e
conversando com o grupo para elucidar a questão, indaguei sobre a variação do
valor do seno entre 0º e 90º, quando a aluna Tais referindo-se ao eixo y diz: “é como
uma régua” movimentando suas mãos para cima e para baixo, e assim continuei a
pergunta variando o ângulo de 90º a 180º, 180º a 270º e 270º a 360º. Quando
indagados sobre a variação do seno entre 180º e 270º a aluna Gabriela disse:
“Desceu só que aumentou”.
Neste momento podemos perceber que a aluna Tais usa da metáfora “EIXO
CARTESIANO É RÉGUA” para associar a escala do eixo y, ela possui um domínio
fonte que é a régua e sua escala e a associa a outro conhecimento que é a escala
do eixo y. Gabriela também se utiliza de uma metáfora de movimento quando diz
“desceu só que aumentou”, ela se refere a um movimento antes apenas fictivo do
valor do seno.
Nesta frase de Gabriela pudemos perceber que também surgiu outra situação
complicada, pois como ela estava analisando o seno de um ângulo de acordo com o
tamanho do segmento vermelho sobre o eixo y e embora utilizasse como referência
o tamanho do segmento vermelho o que realmente queríamos era a projeção do
arco sobre o eixo y, portanto os valores poderiam ser negativos.
Assim quando utilizado este OE ao falarmos que seno é o tamanho do
segmento vermelho, o seno de 90º e 180º deveria ser o mesmo, mas devemos nos
atentar que o seno não é este tamanho, mas sim a projeção do ponto sobre a
circunferência ao eixo y.
O grupo1 enquanto tentava entender o que acontecia com a função seno
entre 0º e 360º, podemos ressaltar que em muitos momentos eles utilizavam-se dos
Capítulo 4 – Segunda Fase
108
movimentos das mãos e de uma linguagem com expressões que indicavam
movimento, o aluno Renan para explicar ao o grupo que o valor do seno diminuía
entre os ângulos de 90º e 270º graus faz o movimento das mãos para baixo
acompanhado de um assovio, como se algo estivesse caindo, Renan diz: “Até o
noventa só sobe, depois desce (assovio)”, podemos ressaltar que em muitos
momentos eles utilizavam-se dos movimentos das mãos e de uma linguagem com
expressões que indicavam movimento. O que corrobora com a teoria utilizada de
que na compreensão de idéias abstratas ou novas o corpo como um todo e não
apenas a mente está envolvido.
Renan movimenta sua mão (1º momento)
Renan movimenta sua mão (2º momento)
Figura 27: Movimento das mãos de Renan
Grupo1: Percebe-se que do 0º a 360º sai do ponto de origem (O), vai até 1
positivo; decai até o 1 negativo e volta ao seu ponto de origem. A partir de
90º à 180º o valor no gráfico se mostra positivo, de 180º à 360º o valor passa
a ser negativo.
Figura 28: Resposta grupo 1
Grupo2: De 90º ela sobre 1; de 180º ela desceu diminuiu e chegou a 0; de
270º ela saiu do 0 a ficou a -1; de 360º ela voltou ao eixo 0.
Capítulo 4 – Segunda Fase
109
Figura 29: Resposta grupo 2
A explicação dos grupos mostra que a coordenação da linguagem com a
percepção visual proporcionada pelo dinamismo do OE ajudou no entendimento.
Também podemos perceber que a utilização de termos que indicam movimento,
conforme grifado nas respostas dos alunos, apareceram várias vezes para a
elaboração de suas respostas. A utilização destes termos é entendido pela Teoria da
Cognição Corporificada como movimento fictivo. Ocorrência parecida com esta
também aparece com Dall´Anese (2006), onde cita que a utilização do computador
permitiu criar um cenário onde foi possível transformar um movimento fictivo,
intrínseco da linguagem, em um movimento factivo.
4.3 – Terceiro encontro
Para este terceiro encontro compareceram os mesmos alunos do segundo
encontro. Após uma primeira análise do vídeo do segundo encontro desenvolvi um
apllet que pudesse suprir algumas dificuldades encontradas pelos alunos no
entendimento da função seno.
Após ver os vídeos detectamos que entre as dificuldades apresentadas pelos
alunos no uso do OE “Mundo da Trigonometria” encontra-se a falta de uma escala
decimal no eixo y para facilitar a leitura do seno como projeção sobre o eixo y e não
como módulo de sua projeção sobre o eixo; a escala também se propõe a facilitar a
leitura dos valores dos senos permitindo uma estimativa mais precisa de seus
valores.
Baseado na complexidade que envolve a compreensão do círculo
trigonométrico, já relatada por Lakoff e Núnez (2000) onde a construção do círculo
trigonométrico pode ser compreendida a partir de três estágios, elaborei e utilizei um
applet onde apresentava apenas o círculo trigonométrico e a projeção do valor do
Capítulo 4 – Segunda Fase
110
seno, sobre o eixo dos senos, não apresentando assim o gráfico da função seno
simultaneamente com o círculo trigonométrico como no OE “Mundo da
Trigonometria”.
O applet apresentado aos alunos foi desenvolvido por mim no Geogebra, que
é um software livre de geometria dinâmica. Este applet apresentada o círculo
trigonométrico, conforme a figura 30, onde P2 é a projeção do ponto P1 da
circunferência sobre o eixo dos senos, neste caso o eixo do seno possui uma escala
de um décimo e o usuário do applet pode movimentar o ponto sobre o círculo
trigonométrico obtendo o ângulo desejado.
Figura 30: Applet Círculo Trigonométrico
Após a exploração do applet pelos alunos, foi pedido para que eles,
organizados nos mesmos grupos do encontro anterior, respondessem novamente o
valor dos senos dos ângulos, que eles já tinham respondido anteriormente, só que
Grupo1
agora utilizando este applet.
30º
45º
52º
60º
77º
80º
120º
137º
225º
300º
Mundo da
Trigonometria
0,6
0,75
0,76
0,85
0,98
≅1
0,90
0,68
-0,75 -0,85
Applet
0,5
0,7
0,79
0,88
0,98
0,99
0,87
-0,68
-0,7
-0,88
Capítulo 4 – Segunda Fase
111
0,5
0,75
0,77
0,80
0,98
0,99
1,05
1,73
Applet
0,5
0,7
0,8
0,85
0,98
0,99
0,85
-0,69 -0,71 -0,81
Valores Correto
0,5
0,7
0,79
0,86
0,97
0,98
0,86
0,68
Grupo2
Mundo da
Trigonometria
-2,75 -3,03
-0,7
-0,86
Tabela 17 – comparação de resultados OE / Applet
Neste momento os alunos diziam que era bem mais fácil determinar os
valores do seno com o applet, porque ele tinha uma escala para orientá-los. Como
vemos na tabela anterior as respostas foram muito próximas e o grupo2 não errou
os dos ângulos do segundo, terceiro e quarto quadrante, mas esta dúvida já tinha
sido esclarecida anteriormente. O que podemos concluir é que o fato de não termos
neste momento a presença do gráfico da função junto do círculo trigonométrico o
foco da atenção dos alunos foi apenas na projeção do ponto sobre a circunferência
no eixo dos senos.
O fato dos alunos considerarem mais fácil a utilização do applet se deve a
escala existente no eixo y, assim não foi necessário eles estimarem os valores do
seno, ou quando necessário a estimativa seria apenas para os centésimo do seno,
facilitando sua compreensão.
Conversando com o grupo um para entender melhor se eles teriam
compreendido como determinar o seno no círculo trigonométrico, e sabendo que
eles também já conheciam o valor da razão seno no triângulo retângulo, pois estes
alunos também são meus alunos do 1º ano do ensino médio, perguntei a eles se era
mais fácil determinar o seno de um ângulo no triângulo retângulo ou no círculo
trigonométrico, obtive as seguintes respostas:
Tempo
Fala/ Descirção
Comentário / Imagem
1:18:00
Prof: Onde é mais fácil determinar o seno
de um ângulo, no triângulo retângulo ou no
círculo trigonométrico?
Neste momento o professor esta conversando
com o grupo-1
Renan: aqui. (referindo-se ou círculo
trigonométrico)
Angeline: Os dois são fáceis, só que aqui
é bem mais fácil, vem na hora... (estalando
os dedos) assim, porque você bate o olho
Capítulo 4 – Segunda Fase
112
e já tem uma noção.
Professor: No triângulo retângulo vocês
não conseguem bater o olho e ter esta
noção?
Renan: não.
Angeline: eu não
1:20:00
Prof: Onde é mais fácil determinar o seno
de um ângulo, no triângulo retângulo ou no
círculo trigonométrico?
Neste momento o professor esta conversando
com o grupo-1
Grupo2- o círculo
Gabriela: Principalmente quando tem
estes números (apontando na tela do
computador a escalo do applet utilizado)
Tais: é fica mais fácil, agente olha para ele
e já sabe.
Gabriela: o triângulo a gente olha e fica
meio assim... aqui não, agente olha e já
sabe mais ou menos.
Tabela 18 – Transcrição 3 – 3º Encontro
Podemos perceber na fala da aluna Angeline, que a utilização dos OEs dando
uma dinâmica para o círculo trigonométrico, permitiu que eles conseguissem estimar
valores do seno de qualquer ângulo, devido a percepção visual que o OE fornecia.
Pudemos observar o uso de diferentes metáforas utilizadas para a
compreensão do círculo trigonométrico com as metáforas do movimento fictivo,
“CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO CARTESIANO É RÉGUA”.
Estas metáforas ajudam a produzir o conhecimento matemático. Observamos ainda
que os alunos na produção de novos conhecimentos matemáticos utilizam como
domínio fonte conhecimentos tanto do cotidiano quanto conhecimentos anteriores de
dentro da própria matemática.
4.4 – Quarto encontro
Para o quarto encontro foi utilizado novamente o OE “Mundo da
Trigonometria”, foi preparado uma atividade onde os alunos responderiam questões
sobre seno e cosseno, de modo que pudessem, também, explorar a função
cosseno, pois no encontro anterior eles exploram apenas a função seno.
Capítulo 4 – Segunda Fase
113
Para este encontro compareceram os mesmos alunos do encontro anterior,
com exceção do aluno Renan que não pode comparecer, mais em seu lugar
compareceu a aluna Mayara. Este encontro teve a duração de uma hora e trinta
minutos.
Neste momento os alunos foram divididos em duplas e após uma explicação
do que era a função cosseno, comparando com o que eles já conheciam da função
seno, eles exploraram o OE e responderam a atividade3. Assim como no segundo e
terceiro encontro para a medida dos ângulos utilizei o grau nesta atividade.
Atividade-3 - Função Seno
1) Utilizando o OA “Mundo da Trigonometria”, faça uma estimativa dos valores do seno dos
seguintes ângulos:
a) 30° = _________
b) 140° = _________
c) 270° = __ _______
d) 80° = _________
e) 210° = _________
f)
330° = __ _______
g) 90° = _________
h) 360° = _________
i)
180° = __ _______
2) Complete com os sinais de maior (>), menor (<) ou igual (=):
a) sen 40° ______ sen 60°
b) sen 60° ______ sen 160 °
c) sen 140° _____ sen 200°
d) sen 260° ______ sen 170° e) sen 75° ______ sen 2 30°
f) sen 80° ______ sen 300°
g) sen 290° ______ sen 40°
i) sen 150° _____ sen 210°
h) sen 70° ______ sen 10 0°
3) Observando os círculos trigonométricos abaixo responda:
A
B
C
a) Determine os valores aproximados dos ângulos:
A - __________
B - __________
C - ___________
b) Determine os valores aproximados do seno dos arcos:
A - __________
B - __________
C - ___________
Capítulo 4 – Segunda Fase
114
Função Cosseno
4) Utilizando o OA “Mundo da Trigonometria”, faça uma estimativa dos valores do cosseno dos
seguintes ângulos:
j)
30° = _________
k) 140° = _________
l)
270° = __ _______
m) 80° = _________
n) 210° = _________
o) 330° = __ _______
p) 90° = _________
q) 360° = _________
r)
180° = __ _______
5) Complete com os sinais de maior (>), menor (<) ou igual (=):
a) cos 40° ______ cos 60°
b) cos 60° ______ cos 160 °
c) cos 140° _____ cos 200°
d) cos 260° ______ cos 170°
e) cos 75° ______ cos 2 30°
f) cos 80° ______ cos 300°
g) cos 290° ______ cos 40°
h) cos 70° ______ cos 10 0°
i) cos 150° ______ cos 210°
6) Observando os círculos trigonométricos abaixo responda:
A
B
C
c) Determine os valores aproximados dos ângulos:
A - __________
B - __________
C - ___________
d) Determine os valores aproximados do cosseno dos arcos:
A - __________
B - __________
C - ___________
Esta atividade foi desenvolvida para percebermos a capacidade de estimativa
dos valores de seno, cosseno e medida dos arcos, que os alunos teriam com a
utilização do OE Mundo de Trigonometria. Ainda não se tinha falado aos alunos
sobre os ângulos simétricos no círculo trigonométrico, portanto alguns exercícios
poderiam levar a assunto, pois em alguns momentos eles poderiam perceber que
alguns ângulos possuem os mesmos valores de seno ou cosseno.
Como os alunos já conheciam o OE “Mundo da Trigonometria”, e a função
seno, pedi para que os alunos explorassem as páginas do OE relacionadas a função
Capítulo 4 – Segunda Fase
115
cosseno. Após esta exploração dos alunos pelo OE, pedi pare que eles testassem o
valor de 60º, onde os alunos chegarão a conclusão que o valor do cosseno de 60º
deveria ser 0,5, também sugeri o teste do ângulo de 120º e indagados de qual era o
cosseno de 120º, as respostas vieram aos poucos, primeiro Gabriela diz: “é
negativo?” Após minha confirmação de que o valor era negativo a aluna Angeline
diz: “zero vírgula alguma coisa” e Marcela concluí: “meio.”
Analisando posteriormente o vídeo noto que poderia ter explorado melhor a
primeira dúvida quanto as valor negativo do cosseno de 120º, apesar de ser um
professor que acredita nos cenários de investigação, em sala de aula, está tão
incorporado o papel do professor como facilitador que também assumo este papel e
só na hora da análise, ou seja, pós-facto posso observar que numa próxima vez
poderia perguntar aos outros no grupo se concordam ou não com a resposta do tipo
da Gabriela podendo assim entender melhor como eles estão pensando para
resolver a tarefa.
Quando perguntei para os alunos porque o valor era negativo, Marcela diz:
“porque está do outro lado”; e logo em seguida Marcela conclui: “é igual ao gráfico”,
gesticulando as mãos para a direita e esquerda, referindo-se ao plano cartesiano e
dos gráficos que eles conheciam das funções de primeiro e segundo grau que viram
durante o primeiro ano do ensino médio.
Neste momento fica claro que Marcela fez uso de uma metáfora orientacional
quando falou que o valor negativo está do outro lado, e também fez uma montagem
como já sugerida por Lakoff e Núnez (2000). No primeiro estágio da compreenção
do círculo trigonométrico existe o Domínio I, que é um círculo no plano euclidiano
com centro e raio e o Domínio II que é o plano cartesiano com os eixos x e y, origem
em (0,0). E culmina na montagem do Domínio III do Ciclo Trigonométrico.
Capítulo 4 – Segunda Fase
116
Figura 31: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico
Os alunos foram convidados a continuar explorando o OE, utilizando ângulos
quaisquer e posteriormente respondessem a atividade-3. Para responder as
questões desta atividade os alunos poderiam utilizar o OE, e assim o fizeram, na
maioria das vezes antes de responder uma questão consultava o OE para
verificação dos valores encontrados.
A falta de uma escala no eixo dos senos e eixo dos cossenos representou
uma dificuldade para os alunos. E apesar de orientados para trabalhar com valores
aproximados, com uma casa decimal, os alunos sempre tentaram utilizar os
centésimos, duas casas, isto poderia se explicar pela familiaridade que possuem
com o dinheiro, onde utilizamos os centavos.
As maiores dificuldades surgiram quando os alunos tinham que identificar o
seno ou cosseno dos ângulos 0º, 90º, 180º, 270º ou 360º. Para estes ângulos foram
constantes as trocas dos valores de seno e cosseno, embora as respostas fossem
sempre 0, 1 ou -1. Ao estimarem os valores do seno e cosseno de outros ângulos, a
referência dos alunos sempre foi projeção do raio sobre os eixos, e quando este raio
se encontrava sobre o eixo x ou eixo y, a referência se perdia provocando os erros.
Capítulo 4 – Segunda Fase
117
Uma hipótese para este erro podemos encontrar no domínio fonte destes
alunos, que é a trigonometria no triângulo retângulo, onde não é possível construir
um triângulo retângulo com um ângulo de 0º ou dois ângulos de 90º.
Como já mencionamos anteriormente é muito comum nos livros didáticos e
também na prática do professor os problemas envolvendo a sombra de alguma
coisa para determinar sua altura, mas nestes problemas sempre estão inseridos
dentro de uma semi-realidade, assim como sugere Ole Skovsmose, se a prática do
professor migrar para uma situação dentro da realidade, os problemas envolvendo
sombra também iriam abordar situações onde não seria possível o cálculo de alturas
através do tamanho de sombra, pois teriamos as sombras do meio dia ou do
entardecer onde estariamos próximos das situações onde não seria possível a
construção de um triângulo retângulo com estas medidas.
Notamos que no encontro anterior, quando os alunos tiveram o primeiro
contato com a Trigonometria no círculo trigonométrico e o OE “Mundo da
Trigonometria” a necessidade de se utilizar de metáforas básicas para produzir
novos conhecimentos foi muito maior do que a encontrada neste encontro. Talvez
aqui uma explicação seja que, de acordo com a teoria da cognição corporificada,
para entender algo novo utilizamos inferências que podemos fazer num domínio
fonte conhecido, assim para entender o círculo trigonométrico foi possível destacar
as metáforas, “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO CARTESIANO
É RÉGUA”, fazendo inferências do que se conhece de relógio e régua para o
entendimento do círculo trigonométrico.
Podemos entender também, que estes alunos no segundo momento onde
tinham que entender a função cosseno, utilizaram-se dos conhecimentos da função
seno, já conhecida anteriormente, para o seu processo de aprendizagem. Segundo
a teoria da cognição corporificada, estes alunos buscaram dentro da matemática
suas inferências para produzir novos conhecimentos. Sendo assim utilizaram uma
metáfora de ligação “COSSENO É SENO”.
Capítulo 4 – Segunda Fase
118
Metáfora: COSSENO É SENO
Domínio Fonte: SENO
Domínio Alvo: COSSENO
Eixo dos senos (eixo y)
Eixo dos cossenos (eixo x)
Projeção sobre o eixo y
Projeção sobre o eixo x
Os valores negativos do seno estão
abaixo do eixo x.
Os valores negativos do cosseno estão
a esquerda do eixo y
Tabela 19: Metáfora COSSENO É SENO
No final do encontro conversei com os alunos perguntando o que eles
acharam dos encontros, onde a aluna Angeline se manifestou dizendo que seria
muito mais fácil estudar este conteúdo com o uso do computador, e a aluna Gabriela
concorda e acrescenta que o fato de não necessitar desenhar no caderno onde os
desenhos não ficam tão perfeitos.
Tempo
1:00:00
Fala/ Descirção
Prof: O que vocês acharam destes
encontros, sobre o que vocês aprenderam?
Comentário / Imagem
Referência de Angeline as aulas regulares
do Ensino Médio.
Angeline: É tipo assim quando a gente for
estudar isto se tiver o computador vai ser
super fácil.
Professor: Com o computador vai ser fácil?
Angeline: É ajuda mais.
1:01:00
Gabriela: a... é melhor do que ficar fazendo o
desenho no caderno.
O computador facilita o entendimento dos
desenhos.
Angeline: não precisa fazer o círculo com o
compasso.
Gabriela: é sai meio torto, nem com o
compasso sai perfeito.
Tabela 20 - Transcrição 4 – quarto encontro
Então podemos dizer que o OE colaborou com a aprendizagem dos alunos, e
entre as características positivas do OE também podemos acrescentar a qualidade
visual do círculo trigonométrico, que não é possibilitada no uso do papel e lápis,
também acrescento que o OE permite inúmeras interações entre o aluno e o círculo
Capítulo 4 – Segunda Fase
119
trigonométrico, ou seja, o OE torna possível o aluno testar vários ângulos em um
espaço de tempo muito pequeno, tornando a aula mais dinâmica.
Uma observação técnica que teve impacto na análise teórica é que para este
quarto encontro, no qual as duplas trabalharam para responder as questões
propostas pela atividade, talvez fosse melhor ter filmado apenas uma dupla. Deste
modo seria possível analisar melhor a interação entre eles, interação que se perdeu
com a filmagem atual, que focou todo o grupo dificultando o entendimento do diálogo
entre as duplas, perdendo assim algumas falas relevantes para esta pesquisa.
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
120
Capítulo 5
Discussões e
Considerações Finais
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
121
O objetivo desta pesquisa foi o de investigar e analisar que aspectos são ou
não favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio,
especificamente sobre o círculo trigonométrico em um ambiente utilizando recursos
digitais. Investigando as dificuldades e facilidades encontradas por um professor ao
longo deste processo.
Antes de retomar as questões iniciais desta pesquisa faço uma análise
observando os procedimentos metodológico utilizados. Assim descrevo quais de
suas etapas ocorreram conforme o esperado e quando os resultados ou situações
não eram esperadas.
Quanto ao tipo de pesquisa, quero ressaltar que o design experiment permitiu,
com análise de cada encontro, o ajuste necessário para um melhor aproveitamento
das informações coletadas e analisadas.
A filmagem dos encontros permitiu uma análise posterior detalhada,
permitindo a compreensão dos acontecimentos, que sem ela teriam se perdido.
Também relato que a filmagem poderia ter tido um resultado melhor, principalmente
no terceiro encontro onde o trabalho dos alunos foi desenvolvido em duplas. Como a
filmagem focou todas as duplas ao mesmo tempo não foi possível identificar todas
as falas entre os alunos de cada dupla. Caso esta filmagem tivesse tido o foco em
apenas uma dupla, talvez tivéssemos um número maior de falas para analisar nesta
pesquisa.
Quanto ao som capturado também tivemos alguns problemas, pois estes
encontros foram realizados em horário de funcionamento da escola. O horário
escolhido coincidiu com o horário de intervalo do período da tarde, algumas falas
não foram possíveis de ser identificadas, principalmente quando alguns alunos
falaram mais baixo.
Quanto à formação do grupo de alunos participantes, alguns imprevistos
também ocorreram. Foram convidados oito alunos para participar da pesquisa,
destes somente seis apareceram nos encontros e a cada encontro houve a
alteração de um dos participantes. Mas mesmo com estes imprevistos foi possível
um levantamento importante de informações, que podem auxiliar para o
desenvolvimento de outras aulas de trigonometria.
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
122
Retomando minhas questões inicias, procurando analisar como esta pesquisa
pode responder estas questões.
Quais são os argumentos e metáforas utilizados pelos alunos nesse cenário
que podem influenciar na manutenção ou modificação do mesmo?
Vou iniciar minha análise pela segunda questão, pois foi através das
metáforas utilizadas pelos alunos que pude responder à primeira questão. Uma vez
que através das metáforas utilizadas pelos alunos foi possível comprender algumas
de suas dificuldades e suas formas de produção de conhecimento.
Estas metáforas foram fundamentais para que os alunos desenvolvessem
seus conceitos sobre trigonometria, fazendo uso de conhecimentos prévios para
inferências que permitiram a produção de um conhecimento novo.
As metáforas “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO
CARTESIANO É RÉGUA” são metáforas básicas em que os alunos trazem de suas
vidas cotidianas inferências para construção de um conhecimento matemático.
“CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO”.
Quando o aluno Renan disse “parece um reloginho” aparece esta metáfora
onde o aluno fez algumas inferências sobre o círculo trigonométrico a partir do que
ele conhece sobre um relógio com ponteiros. Assim o movimento dos ponteiros de
um relógio infere sobre os ângulos ou arcos, 360º é igual a 60 segundos e o eixo do
relógio é a origem do plano cartesiano.
“EIXO CARTESIANO É RÉGUA”
Para produzir conhecimento sobre o eixo cartesiano a aluna Tais se refere a
escala do eixo y dizendo “é igual a régua” e utilizou-se desta metáfora para
produção de conhecimento, assim a os números inteiros são os centímetros e os
números decimais são os milímetros de uma régua.
Nesta pesquisa também surgiram exemplos de metáforas de ligação, onde
através de outros conhecimentos matemáticos os alunos construíram um novo
conhecimento. Isto é evidenciado quando os alunos fazem a montagem de seus
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
123
conhecimentos de plano cartesiano, conforme sugere Lakoff & Núñez (2000) na
montagem do círculo trigonométrico e nas metáforas do movimento fictivo e
metáfora “COSSENO É SENO”.
“COSSENO É SENO”
Quando apresentada a função cosseno aos alunos, eles fizeram uso da
metáfora acima, assim a projeção sobre o eixo y é igual a projeção sobre o eixo x e
os valores negativos do seno, que estão abaixo do eixo x é igual aos valores
negativos do cosseno, que estão a esquerda do eixo y.
Movimento Fictivo que se torna Movimento Factivo
Destaco aqui a importância que os Objetos de Ensino utilizados no estudo,
pois estes OEs possibilitaram aos alunos uma maneira de construção do
conhecimento de trigonometria diferente da que eles teriam construído apenas com
papel e lápis. Sobretudo, a dinâmica possibilitada pelos OEs criou um movimento no
círculo trigonométrico, onde esta percepção visual é evidenciada pelas metáforas
dos alunos como o “seno subiu” o “seno desceu”. Assim o movimento, inicialmente
fictivo do seno de um ângulo torna-se factivo, via o dinamismo proporcionado pela
representação virtual do OE. Isto é, o seno de um ângulo é a razão entre as medidas
do cateto oposto e da hipotenusa, cujo valor é expresso por um número que
“evidentemente” não se move e a função e seu gráfico idem. Mas quando o aluno
fala sobre o OE o dinamismo se sobrepõe ao estático auxiliando a compreensão
deste conceito.
Através desta análise das metáforas que surgiram nos encontros com os
alunos, sob o olhar da Teoria da Cognição Corporificada, respondo à segunda
questão desta pesquisa.
Observo que para esta pesquisa os Objetos de Aprendizagem - OAs do
RIVED e o applet utilizados no encontro com os alunos, são Objetos de Ensino –
OEs, portanto foram utilizados parcialmente, onde através de suas análises prévias
deterimamos quais as partes destes objetos iriamos utilizar.
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
124
Que aspectos podem ser considerados mais ou menos relevantes, para a
construção de um cenário para a aprendizagem do círculo trigonométrico, utilizando
como recursos tecnológicos applets e objetos de aprendizagem disponíveis na
internet?
Para responder a primeira questão é necessário ressaltar alguns pontos que
considero relevante nesta pesquisa. Primeiro quanto à dificuldade dos alunos com
os números racionais e irracionais, o que era uma hipótese levantada por mim e o
grupo de professores e pesquisadores da UNIBAN se confirmou no primeiro
encontro, sendo assim se esta dificuldade foi encontrada com este grupo de alunos
é possível que tenhamos também esta dificuldade com um número muito maior de
alunos e se isto for confirmado este é um fator dificultador não apenas para o
aprendizado da trigonometria mas para muitos outros conteúdos trabalhados na
matemática do ensino médio.
Quanto aos OEs utilizados nesta pesquisa “Mundo da Trigonometria” e o
Applet, podemos citar alguns aspectos relevantes para a sua utilização dentro de um
cenário para aprendizagem.
Aspectos Positivos dos OEs
1. A motivação gerada entre os alunos, pudemos observar no vídeo o sorriso
e demonstração de satisfação ao utilizar o computador em uma aula de matemática.
2. A percepção visual e o dinamisno que possibilita o OE. Para o Objeto de
Aprendizagem do RIVED “Mundo da Trigonometria”, podemos notar que sua parte
mais relevante para esta pesquisa foi a dinâmica apresentada no círculo
trigonométrico, a possibilidade de testar vários ângulos em um pouco espaço de
tempo.
3. O Applet que desenvolvi, devido a escala decimal no eixo y, facilita a leitura
e entendimento dos valores do seno, principalmente quando estes valores são
negativos.
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
125
Aspectos Negativos dos OEs
1. Para o OE “Mundo da Trigonometria” em suas telas de apresentações das
noções
básicas
com
alguns
conceitos
fundamentais
de
trigonometria,
a
apresentação histórica, a demonstração dos arcos côngruos e o círculo
trigonométrico poderiam ser substituídas por outro material impresso, mas uma
possível melhora para este OE seria a inserção de objetos dinâmicos também para
esta parte do OE, permitindo maior interação entre o usuário e o aplicativo.
2. Padrão nas unidades e falta de escala nos eixos do círculo trigonométrico.
Para o OE “Mundo da Trigonometria” a falta de uma escala decimal nos eixos x e y,
foi um fator dificultador para a produção de conhecimento dos alunos
3. Também para o OE “Mundo da Trigonometria” outros fatores negativos que
apareceram foram a leitura do gráfico da função simultaneamente com a leitura do
círculo trigonométrico; a escala do eixo x do gráfico da função está em radianos e na
forma fracionária, mas os alunos inserem valores em graus para a construção deste
gráfico; a mensagem exposta na tela onde apresentavam valores em radianos mas
utilizando uma notação decimal e no padrão norte americano trocando o ponto pela
vírgula.
Para futuras modificações ou criações de Objetos de Ensino para
tigonometria deixo a proposta de se apresentar primeiro aos alunos o círculo
trigonométrico com uma escala interna decimal para os eixos do seno e do cosseno,
isto poderá ajudar os alunos na construção de seus conhecimentos, já que tivemos
como exemplo o grupo que para determinar o valor do seno utilizava do
comprimento da linha do gráfico da função seno para determimar o valor do seno.
Trago como proposta apresentar o gráfico das funções trigonométricas no OE em
um segundo momento, após a compreenção dos valores do seno e cosseno dentro
do círculo trigonométrico.
Quanto aos valores dos ângulos devemos trabalhar em graus e radianos de
maneira a levar os alunos a construir o conceito de ângulo com as duas formas. É
aceitável que os alunos prefiram trabalhar com as medidas dos ângulos em graus já
que esta é bem mais familiar para ele, pois além de já conhecer préviamente os
ângulos medidos em graus estes utilizam quase sempre números inteiros para
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
126
representá-los, não aparecendo os números racionais em forma de fração ou
decimais e irracionais como na medidas em radianos, mas as aplicação das funções
trigonometricas nos dias atuais são de grande importância e não podemos ignorar
as medidas em radianos, mas sim ajudar os alunos a sua compreensão.
Uma sugestão para minimizar a dificuldade dos alunos com as medidas em
radianos, seria os objetos de ensino apresentarem de forma conjunta as medidas
em graus e radianos, para que os alunos pudessem se familiarizar com estes
valores. Também é necessário um trabalho anterior com os números racionais e
irracionais, pois a dificuldade com estes números impacta a compreenção dos
alunos dos valores em radianos.
Conforme apresentado anteriormente as medidas em radianos apresentam
alguns problemas para compreenção dos alunos o primeiro é o próprio conceito de
radianos e o segundo é o fato dos materias didáticos impressos trazem as medidas
em radianos sempre em forma de frações ou números inteiros acompanhados do π
e os objetos de ensino devido a limitação dos softwares trazem alguns valores em
frações e para a maioria dos valores eles estão representados por números
decimais, aumentado ainda mais a dicficuldade de compreenção dos alunos.
Observando as dificuldades apresentadas pelos alunos assim como os
beneficios encontrados na utilização dos OEs nesta pesquisa, apresento um applet,
construído por mim através do software Geogebra, com algumas sugestões para um
modelo de OE para aulas de trigonometria. Conforme a figura a seguir o OE para a
função seno deverá ter as seguintes caracteristicas:
- Escala decinal para o eixo dos seno;
- Linha tacejada para o acompanhamento da projeção do cateto sobre o eixo y;
- Arco AB, apresentando suas medida em graus e radianos;
- Destaque para área do ângulo formado pelo arco AB;
- Escala em graus e radianos para o eixo x, quando apresentado o gráfico da função
seno;
- Mesma escala para o gráfico da função e para o círculo trigonométrico;
- Opção para exibir ou ocultar o gráfico da função seno.
Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais
127
OE – Interpretação para a Função Seno
Figura 32: OE interpretação para a Função Seno
Como já era esperado não apareceu nenhuma dificuldade no uso dos
computadores pelos alunos, confirmando que esta é uma tecnologia em que o aluno
esta preparado para utilizar, pois eles já fazem partem da geração “Nativo Digital”,
portanto cabe aos professores, que ainda na sua maioria pertencentes a uma
geração de “Imigrantes Digitais”, a incumbência de aprender como se utilizar dos
recursos digitais em suas aulas.
Concluindo, esta pesquisa apresenta que o uso de recursos digitais nas aulas
de trigonometria é uma prática que trouxe pontos positivos, mesmo quando estes
recursos apresentam itens que podem ser aperfeiçoadas. Pois a utilização destes
recursos além de ser uma fonte motivadora traz também novas possibilidades para a
construção do conhecimento da trigonometria, possibilidade estas diferentes das
que se apresentam em uma aula com papel e lápis, que não seriam possíveis sem a
utilização do computador, Assim como sugere a metáfora “TECNOLOGIA É
PRÓTESE” (Bolite Frant, 2010) onde a tecnologia é uma prótese cognitiva,
permitindo aos alunos produzir um conhecimento diferente daquele que produziriam
sem o uso da tecnologia.
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