UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I
CURSO DE PEDAGOGIA
Iolanda Carvalho dos Santos Freitas
HISTÓRIA DE VIDA DOS SUJEITOS DA EJA E A APRENDIZAGEM:
UMA EXPERIÊNCIA NO PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO DO
TRABALHADOR
Salvador
2009
IOLANDA CARVALHO DOS SANTOS FREITAS
HISTÓRIA DE VIDA DOS SUJEITOS DA EJA E A APRENDIZAGEM:
UMA EXPERIÊNCIA NO PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO DO
TRABALHADOR
Monografia apresentada como requisito final para
obtenção da graduação em Pedagogia com habilitação em
Educação Infantil do Departamento de Educação da
Universidade do Estado da Bahia - UNEB, sob orientação
da Profª. Terezinha Zélia Pinto de Queiroz.
Salvador
2009
3
IOLANDA CARVALHO DOS SANTOS FREITAS
HISTÓRIA DE VIDA DOS SUJEITOS DA EJA E A APRENDIZAGEM:
UMA EXPERIÊNCIA NO PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO DO
TRABALHADOR
Monografia apresentada ao Curso de graduação em Pedagogia — Licenciatura
Plena, Educação Infantil, do Departamento de Educação da Universidade do Estado
da Bahia, Campus I, para avaliação, em ____ de ____________ de 2009, e
_______________________________________ pela seguinte banca examinadora.
Orientadora:
Professora Terezinha Queiroz Oliveira
Departamento de Educação — UNEB/Campus I
Banca Examinadora:
Professor Sebastião Heber
Departamento de Educação — UNEB/Campus I
Professor Valdélio Silva
Departamento de Educação — UNEB/Campus I
Salvador
2009
Dedico este trabalho monográfico a JESUS CRISTO, primeiro pedagogo da história, Doutor
e Mestre em humanidade, contextualizou em sua prática a Pedagogia do Amor. Apesar de ter
dois mil e nove anos é recente e atual. O método utilizado por Ele na sua passagem pela terra
não deixou nenhuma dúvida de que o Sujeito deve ser contemplado como um TODO,
tornando-se alvo de qualquer pedagogia, sociologia, filosofia, antropologia, enfim toda e
qualquer ciência.
Amo-Te Jesus! Tu és o meu Senhor!
5
AGRADECIMENTOS
Inicialmente, agradeço a Deus, Ele é a razão da minha existência, minha Força, minha Luz, o
Senhor da minha vida. Essa oportunidade é obra Dele. A cada momento Ele esteve presente
me sustentando pelas mãos. “Sois meu refúgio e minha cidadela, meu Deus, em que eu
confio”. (SALMO, 91-2).
Dedico este momento da minha vida a minha MÃE, Dona Anaide, que embora não esteja
mais no nosso meio deixou-me como herança a coragem, a sensibilidade e a garra de uma
mulher forte e bela. Ela foi para mim o maior exemplo de determinação, bom caráter e retidão
que conheci e pude conviver em toda minha vida.
Agradeço aos meus filhos: Luana, Filhinho, Renan e Raí, pois foram as pessoas que mais me
incentivaram e contribuíram para que esse sonho se tornasse realidade, quando muitas vezes
se privaram da minha companhia pelos estudos. Renan e Raí as sementinhas que florescem a
minha vida a cada dia, você Lua que sempre teve suas palavras de carinho e incentivo, e a
você Filhinho que com sua música tantas vezes abrilhantou os nossos seminários. Obrigada!
A todos os meus irmãos: Camarão, Branca, Itamar, Binha, Zenaide, Nainha, Ivete que a cada
momento dessa caminhada, cada um à sua maneira estava sempre torcendo por mim.
Agradeço a minha turma, pois desde o começo foram tão companheiros e me ensinaram a
conviver na diversidade. Entre outros gostaria de destacar: Selene Magali, Naildes
Bittencourt, Charlene Quinto, Iacy, Angélica, Alane Peixoto, Sabrina Jordana, Mariana
Lazara, Vânia Campos, Daniela Santos, Tairone Paiva.
Agradeço aos meus amigos da faculdade, que ao longo do curso a cada dia estreitávamos os
laços de amizade, muitas vezes nos tornando mais que amigos, os quais destacam: Railda,
Carmem, Eudes, Carlinda, Ironildes...
Dos meus amigos da faculdade gostaria de destacar de maneira muito especial, Tatiane
Pimentel, Custódio e Selene Magali, pois foram colaboradores imediatos para o sucesso da
minha formação acadêmica.
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Aos meus professores, do primeiro ao último semestre, que contribuíram para o meu
crescimento intelectual, fazendo-me acreditar que a subjetividade é algo possível também no
ambiente acadêmico, os quais destacam: Profº Valdélio Silva, Profª Jaciete Barbosa, Profª Ana
Lúcia, Profº Sebastião Weber, Waldemar Nobre.
A minha professora orientadora, Profª Terezinha Queiroz de Olivera. Orientadora e amiga,
que muitas vezes representou meu porto seguro, demonstrando uma imensa e profunda
experiência com Deus. Orientou-me não somente no que se refere às técnicas de um Trabalho
de Conclusão de Curso, mas a subjetivade tão necessária e essencial para pessoas de essência
tão nobre como a sua. Obrigada minha Mestra!
A todos que acompanharam todo meu processo de luta e sobrevivência, de alegrias e tristezas
de desafios e superação. Pessoas que direta ou indiretamente colaboraram para que eu
chegasse à reta final, que naqueles momentos decisivos da caminhada eles se fizeram
presentes, não permitindo que eu desistisse: Conceição Brasil, Fausto Joaquim, minha tia
Cleide, todos os funcionários do SESI/NETI, Antonio Ribeiro entre outros.
“O indivíduo, na qualidade de sujeito, define cada vez maiores
responsabilidades dentro dos diferentes espaços de sua experiência social,
gerando novas zonas de significação e realização de sua experiência
pessoal”. (Rey, 2003, p.235).
RESUMO
8
FREITAS, Iolanda Carvalho dos Santos. História de Vida dos Sujeitos EJA e a
Aprendizagem: Uma Experiência no Programa SESI Educação do Trabalhador. 2009,
71 fls.. Monografia (graduação em Pedagogia), Universidade do Estado da Bahia, Salvador,
2009.
Esta pesquisa é resultado de uma experiência de estágio supervisionado no Programa SESI
Educação do Trabalhador. Para tanto, fez-se necessário situar a Educação de Jovens e
Adultos no contexto histórico, compreendendo a evolução do conceito de sujeito e sua
relação com a história de vida dos seus atores sociais e aprendizagem na EJA. A análise e a
reflexão da experiência docente permitiram compreender que o método autobiográfico não
só influencia como também contribui para uma aprendizagem significativa para os sujeitos
jovens e adultos. As discussões em torno da necessidade de uma prática docente
contextualizada e a valorização do sujeito na medida em que a realidade vai fazendo
exigências à subjetividade e à competência dos educadores, dando ênfase a uma pedagogia
crítica formando sujeitos críticos, reflexivos e autônomos. As questões que permearam as
discussões desse trabalho tomaram como base os seguintes autores: Di Rocco, Frei Betto,
Paulo Freire, Vera Maria Massagão Ribeiro, Tânia Moura, Miguel Arroyo e Vanilda Paiva.
Palavras–chave: Educação de Jovens e Adultos, Sujeitos, Aprendizagem, História de Vida
9
ABSTRACT
FREITAS, Iolanda Carvalho dos Santos. Life History of the Subjects EJA and Learning: An
Experiment in Education Program SESI Labor. 2009, 71 sh. Monograph (undergraduate
education), University of Bahia, Salvador, 2009.
This research is a result of a supervised internship experience in the Program SESI
Occupational Education. Therefore, it was necessary to place the Youth and Adults in the
historical context, understanding the evolution of the concept of subject and its relation to
the life history of their social actors and learning in adult education. The analysis and
reflection of teaching experience to understand that the autobiographical method not only
influences but also contributes to a significant learning for the young subjects and adults.
The discussions around the need for a contextualized teaching practice and appreciation of
the subject in that reality is making demands on the subjectivity and authority of teachers,
with an emphasis on forming a critical pedagogy of critical, reflective and autonomous. The
issues that permeated the discussions of this work were based on the following authors: Di
Rocco, Frei Betto, Paulo Freire, Vera Maria Ribeiro Massagão, Tania Moura, Miguel Arroyo
and Vanilda Paiva.
Keywords: Education, Youth and Adult Subjects, Learning, Life History
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LISTA DE SIGLAS
CEAA - Campanha de Erradicação do Analfabetismo Adulto
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNEA - Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo
CNE - Conselho Nacional de Educação
EJA - Educação de Jovens e Adultos
ENEJA - Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
MEB - Movimento de Educação de Base
MEC - Ministério da Educação e Cultura
MOBRAL - Movimento Brasileiro de Alfabetização
NETI – Núcleo de Educação do Trabalhador
PAS - Programa de Educação Solidária
PRONERA - Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
PSET – Programa SESI Educação do Trabalhador
SEC - Secretaria da Educação do Estado da Bahia
SECAD - Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
SESI – Serviço Social da Indústria
UNE - União Nacional dos Estudantes
UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura.
SUMÁRIO
11
1. INTRODUÇÃO................................................................................................................12
2. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL: UMA VISÃO
HISTÓRICA.........................................................................................................................16
2.1 – A DÉCADA DE 30........................................................................................................16
2.2 – CAMPANHA DE EDUCAÇÃO DE ADOLESCENTES E ADULTOS A 1964...........17
2.2.1 – Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos...................................................18
2.2.2 – Campanha Nacional de Educação Rural.....................................................................19
2.2.3 – Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo..............................................20
2.2.4 – Comissões de Cultura Popular e o Programa Nacional de Alfabetização..................21
2.2.4.1 – Os Centros Populares de Cultura.............................................................................23
2.2.4.2 – Os Movimentos de Cultura Popular........................................................................23
2.2.4.3 – O Movimento de Educação de Base – MEB...........................................................24
2.2.4.4 – Difusão e prática de novas idéias pedagógicas: Paulo Freire..................................24
2.3 – MOVIMENTO BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO (MOBRAL).........................25
2.4 – A EDUCAÇÃO DE ADULTOS APÓS A CONSTITUIÇÃO DE 1988......................26
2.4.1 A Constituição de 1998 e a Educação de Jovens e Adultos..........................................27
2.4.2 – Diretrizes Curriculares para a Educação de Adultos..................................................27
3. SUJEITO, HISTÓRIA DE VIDA E APRENDIZAGEM NA EJA..............................30
3.1 – Quem são os sujeitos da EJA? ......................................................................................35
3.2 – O Sujeito e a Educação na perspectiva de Paulo Freire.................................................37
3.2.1 – Humanização e Desumanização.................................................................................38
3.3 – A influência da História de Vida no processo de ensino/aprendizagem........................39
4. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA DE EJA: PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO
DO TRABALHADOR.........................................................................................................41
4.1 O Programa SESI Educação do Trabalhador como lócus de intervenção e pesquisa:
espaço, organização, funcionamento e os sujeitos da EJA.....................................................42
4.1.2- Sobre o Programa SESI Educação do Trabalhador......................................................43
4.1.1- O espaço físico da escola..............................................................................................44
4.1.3 - Organização e funcionamento da escola.....................................................................44
4.1.4- Os sujeitos da EJA........................................................................................................45
4.1.5 - Os educandos da EJA no processo de ensino aprendizagem no Programa SESI
Educação do Trabalhador: a influência da história de vida....................................................45
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................49
REEFERÊNCIAS.................................................................................................................52
ANEXOS................................................................................................................................54
APÊNDICE – A REPRESENTAÇÃO ESCRITA DOS EDUCANDOS.........................56
12
1. INTRODUÇÃO
A contextualização das histórias de vida dos sujeitos da EJA e suas especificidades
atualmente são elementos que vêm sendo bastante enfatizados em seminários, fóruns,
colóquios e encontros de jovens e adultos no âmbito nacional e internacional, sobretudo
após a realização da V Conferência Internacional de Educação de Adultos – CONFITEA
onde se viu a necessidade de reformulações político-pedagógicas em termos de concepção,
propostas, materiais didáticos entre outros aspectos.
Ao longo da história da EJA, vê-se que os sujeitos jovens e adultos sempre foram vistos
como sujeitos da falta numa perspectiva de suplência, deixando de se considerar os saberes
advindos das trajetórias de vida. A idéia que se tem é que sejam sofridos, drogados,
ignorantes, acríticos, desempregados, ingênuos etc. Porém essa visão aos poucos vem se
modificando devido às articulações dos vários segmentos da sociedade civil organizada em
prol da valorização da história de vida e o contexto do sujeito nos ambientes de
aprendizagem.
A valorização dos saberes e experiências dos sujeitos jovens e adultos podem ser
identificadas atualmente na proposta de reestruturação político pedagógica da Educação de
Jovens e Adultos na Rede Estadual de Educação do Estado da Bahia “Projeto Educação de
Jovens e Adultos: Aprendizagem ao Longo da Vida. O Projeto de Jovens e Adultos:
Aprendizagem ao Longo da Vida visa assumir um novo fazer coletivo, o qual se instituirá a
partir do diálogo com os próprios Jovens e Adultos e com os Educadores da EJA.
Contudo, verificamos que existem espaços de aprendizagem que não consideram as
trajetórias de vida dos sujeitos, seus saberes e experiências, trazendo abordagens que não
contemplam o sujeito como um todo. Segundo a abordagem sócio-cultural, não existem
senão homens concretos, situados no tempo e no espaço, imersos num contexto sócioeconômico-cultural-político, enfim num contexto histórico.
É o que afirma (MIZUKAMI, 1987, p. 87).
Considerando-se esta inserção, a educação para ser válida, deve levar
em conta necessariamente tanto a vocação ontológica do homem
(vocação de ser sujeito) quanto as condições nas quais ele vive
(contexto). [...] “O homem é um ser que possui raízes espaçotemporais: é um ser situado no e com o mundo. É um ser da práxis,
compreendida por Freire como ação e reflexão dos homens sobre o
mundo, com o objetivo de transformá-lo” (MIZUKAMI,1987, p. 87).
13
No que se refere às condições atuais da Educação de Adultos, traz a necessidade de
comprometimento, com o objetivo de oferecer aos sujeitos jovens e adultos uma educação
continuada ao longo de suas vidas. Para tanto é necessário construir amplas alianças para
mobilizar e compartilhar recursos, de forma a fazer da educação de jovens e adultos um
prazer, uma ferramenta, um direito e uma responsabilidade compartilhada, é o que afirma a
Declaração de Hamburgo na V CONFINTEA (HAMBURGO, 1997).
O novo conceito de Educação de Jovens e Adultos apresenta novos
desafios às práticas existentes, devido a exigência de um maior
relacionamento entre os sistemas formais e não-formais e de
inovação, além de criatividade e flexibilidade. Tais desafios devem
ser encarados mediante novos enfoques, dentro do contexto da
educação continuada durante a vida.
Nesse sentido, percebe-se que há uma preocupação, um novo olhar voltado para que os
saberes e experiências dos jovens e adultos das classes populares. É fundamental olhar para
esses sujeitos, dar consciência e pensar a prática docente voltadas para os seus sujeitos, em
que “a experiência complexa da vida seja o ponto de partida para o processo de
aprendizagem, conjugando essa necessidade, com a função ‘clássica’ da escola: socializar o
saber sistematizado que faz parte da herança da humanidade.” (Ireland, 2004, pó. 69).
Considerar as histórias de vida dos sujeitos é possibilitar a apreender a cultura “do lado de
dentro”; constituindo-se em instrumento valioso, uma vez que se coloca justamente no ponto
de intersecção das relações entre o que é exterior ao indivíduo e aquilo que ele traz dentro de
si.
É importante salientar que, as histórias de vida da pesquisa, começaram por uma reflexão da
minha própria história. Isso quer dizer que eu como pesquisadora/pessoa percebo que a
minha história de vida aparece de maneira evidente em toda pesquisa, descobrindo e
valorizando a singularidade do outro reconhecendo a minha própria singularidade. A minha
história pessoal envolvida na história de vida dos sujeitos, uma busca que embora seja
acadêmica começa da minha experiência subjetiva.
A busca de novas formas de levar o educando a compreensão do seu processo de aprendizagem e
principalmente devido à contextualização das histórias de vida dos sujeitos no decorrer das práticas
de sala de aula fica o questionamento: Afinal, será que a história de vida dos sujeitos jovens e
adultos influência no processo de ensino-aprendizagem?
14
Assim, a partir dessa indagação, os objetivos desse estudo são: situar a Educação de Jovens
e Adultos no contexto histórico; compreender a influência da história de vida no processo de
ensino – aprendizagem dos sujeitos jovens e adultos; analisar e refletir a experiência de
estágio supervisionado no Programa SESI Educação do Trabalhador.
Foi justamente a partir dessas inquietações que me motivou a investigar sobre a temática
apresentada. Porém, a escolha do tema aconteceu, principalmente, da experiência como
estagiária do Programa SESI Educação do Trabalhador.
A experiência de estágio teve inicio a partir de uma seleção de estudantes do curso de
pedagogia da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, onde fui selecionada para atuar
como professora da EJA. O Estágio teve duração de dois anos – 2006 a 2008. Nesse período
atuei nas classes do canteiro de obra do metrô de Salvador – Metrosal, pela Empresa
Construtora ANP e a Rust Engenharia.
Na perspectiva de compreender as questões que orientam a pesquisa, recorreu-se a uma
abordagem qualitativa autobiográfica por possibilitar, que o método de História de Vida,
objetiva aprender as articulações entre a história individual e a história coletiva, uma ponte
entre a história individual e a história social. O método de Histórias de Vida se insere dentro
de metodologias qualitativas (Abordagens Biográficas).
Na metodologia qualitativa, as abordagens biográficas caracterizam-se com um
compromisso com a história, como processo de recordar de que forma a vida vai sendo
refletida pelo sujeito. Nesse contexto a memória é elemento presente na existência do
homem, o que reflete uma valiosa importância do seu resgate para as contribuições do seu
desenvolvimento.
As pesquisas, primordialmente no campo das Ciências Sociais, que usam a história de vida
como método objetiva propiciar um campo interpretativo dos fenômenos que rompa com a
noção de um determinismo da história em relação às histórias, considerando que a
valorização dos sujeitos - atores sociais - oferece um campo de investigação no qual a
relação entre o individual e o social seja de reciprocidade, e de interconstrução.
15
As narrativas de vida singulares se situam, portanto, em um horizonte histórico-social,
denunciando-o em suas vicissitudes. É com o objetivo de relacionar a história de vida com a
história da sociedade que a "fala" dos sujeitos é considerada como espaço de articulação de
memória e história. Kramer e Souza (1996, p. 21), ao analisarem a história de vida como
método privilegiado na pesquisa em Educação.
Escreve com base no instrumento da Observação, do Relato (escuta), amorosa das falas dos
sujeitos, procurando acomodá-las no sentido de valorizar suas histórias de vida e utilizá-las
como influência no processo de aprendizagem.
A entrevista também é utilizada para o desenvolvimento da pesquisa, escutando
sem
críticas e julgamentos e se, ao final de cada entrevista, tecemos algumas poucas
interpretações, é preciso que se diga que essas poucas interpretações só têm valor se
levarmos em conta que as histórias de vidas narradas foram transformadas pela minha
própria subjetividade. Tais instrumentos permitiram compreender como a história de vida
dos sujeitos jovens e adultos influência no processo de ensino-aprendizagem. Como nos
dizem Martins & Bicudo (1989).
A entrevista pode ser construída como um “encontro social”, cujas
características, entre outras, seriam a empatia, a intuição e a imaginação;
ocorre nela uma penetração mútua de percepções, sentimentos, emoções.
O processo de intervenção pedagógica e foco de pesquisa monográfica abrangeram os
educandos operários da indústria de revestimento do Pólo Petroquímico de Camaçari Empresa Rust Engenharia. O período destinado à realização das intervenções pedagógicas e
de pesquisa foi de oito meses a começar pelo mês de maio do ano de 2008 a fevereiro de
2009, no turno noturno.
Este trabalho está organizado em três capítulos além da introdução. No primeiro tratou-se de
situar a Educação de Jovens e Adultos no contexto histórico a partir dos autores Vanilda
Paiva, Vera Maria Massagão Ribeiro. No segundo capítulo, trabalhou-se a compreensão da
influência da história de vida no processo de ensino – aprendizagem dos sujeitos jovens e
adultos através das concepções de Paulo Freire, Miguel Arroyo e Frei Betto. No terceiro,
foram apresentadas as análises e reflexões da pesquisa baseadas nos autores, sujeitoseducandos e educador da EJA. Por último, as considerações finais, em que sistematizamos
os achados mais relevantes da experiência de estágio supervisionado realizada no Programa
SESI Educação do Trabalhador.
16
2. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL: UMA VISÃO
HISTÓRICA
2.1– A DÉCADA DE TRINTA
“A educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tão pouco a
sociedade muda”. (FREIRE, 1987, p.37).
No decorrer da história da Educação de Adultos várias mudanças sucederam algumas de
ordem política e outras de ordem econômica, iniciando assim uma consolidação de um
sistema de educação elementar no país. Essa consolidação provocou significativas mudanças
para a Educação de Adultos.
A grande demanda ocorrida em virtude do processo de industrialização e urbanização fazia
com que a escolarização de adolescentes e adultos se ampliasse (MOURA, 1999, p. 47 apud
BEISIEGEL, 1974, p. 68). Nesse sentido, a inclusão dos adolescentes e adultos analfabetos
na educação elementar comum aparece como expressões e elementos constitutivos de um
processo mais amplo de transformação do estado.
Vê-se com isso que as grandes transformações advindas do processo de industrialização e
concentração da população fez com que a oferta de ensino básico gratuito foi aos poucos se
estendendo ao restante da população, acolhendo cada vez mais setores diversos da
sociedade. Portanto, a educação elementar foi impulsionada pelo governo federal, que por
sua vez buscou traçar diretrizes educacionais para todo o país, determinando as
responsabilidades dos estados e municípios para com a educação. Este movimento incluiu
esforços articulados nacionalmente de extensão do ensino elementar aos adultos,
especialmente nos anos 40.
2.2 – CAMPANHA DE EDUCAÇÃO DE ADOLESCENTES E ADULTOS EM 1947 A
1964.
O período que compreende o ano de 1947 constitui uma parte da história da educação de
adultos no Brasil, que nos leva a compreensão de uma realidade de exclusão, apontando para
a necessidade de maior participação da sociedade do processo de transformação da
realidade.
17
Devido à mudança de governo que fundamentalmente modifica a ideologia dos que detêm
o poder, onde o liberalismo da Segunda República dá lugar ao autoritarismo do Estado
Novo, colocam a educação como algo não prioritário, por outro lado dão lugar a uma
realidade de “guerra” e autoritarismo que fazem com que cresçam desenfreadamente os
índices de analfabetismo no país (PAIVA, 1987, p.141).
Com a criação da Organização das Nações Unidas para a Educação, após o final da primeira
Guerra Mundial, no plano internacional e conseqüente derrubada do Estado Novo, a
educação para adultos passa a ser percebida como “[...] instrumento de redemocratização,
como um problema que merecia tratamento especial e que polarizava as atenções pela
possibilidade de utilização da educação em função de novos objetivos políticos” (PAIVA,
1987, p.141).
A partir dos anos de 1940 o governo tomou a decisão de criar um fundo o FNEP (Fundo
Nacional de Educação Popular) destinado à educação da população adulta analfabeta. O
Fundo era baseado no lema: “ainda por amor as crianças é que devemos educar adolescentes
e adultos” (DI ROCCO, 1979, 44).
Com o final da ditadura de Vargas, em 1945 inicia-se um movimento de fortalecimento dos
princípios democráticos no país (CUNHA, 1987, P. 37). Com a criação da UNESCO
(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), surge a solicitação
dos países integrantes (e entre eles, o Brasil) de se educar os adultos analfabetos.
2.2.1 – Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos
A Campanha de Educação de adultos lançada em 1947 alimentou a reflexão e o debate em
torno do analfabetismo no Brasil. A Educação de Adultos nesse período é definida pela sua
identidade, definindo-se como uma Campanha Nacional de massa. Inicialmente a Campanha
previa uma ação extensiva para a Alfabetização, em seguida com uma Ação em
Profundidade, onde a capacitação era voltada ao desenvolvimento profissional e
comunitário. (MASSAGÃO, 1998, P. 20).
Com a direção do professor Lourenço Filho, a campanha obteve bons resultados, fazendo
uma articulação e ampliação das práticas já existentes, e espalhando-se por diversas regiões
18
do país. Teve uma movimentação bastante integrada, onde foram criadas várias escolas
supletivas, envolvendo diversas esferas, administrativas, profissionais e voluntárias.
Em virtude do entusiasmo da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos, todo
material didático para o ensino da leitura e da escrita para adultos foi pelo Ministério da
Educação denominado LAUBACH. O primeiro guia de leitura, distribuído pelo Ministério
em larga escala para as escolas supletivas do país, orientava o ensino pelo método silábico.
As lições partiam de palavras chaves selecionadas e organizadas segundo suas
características fonéticas. A função dessas palavras era remeter aos padrões silábicos, este
sim o foco do estudo (MASAGÃO, 1999, p. 22).
Porém na década de 60, esse clima de entusiasmo durante a Campanha de Educação de
Adolescentes e Adultos começou a diminuir, em virtude da ação comunitária nas zonas
rurais, porém deixou frutos como: a sobrevivência do ensino supletivo assumida pelos
estados e municípios, e a conformação de um campo teórico-pedagógico que marcou uma
nova etapa nas discussões sobre o analfabetismo no Brasil. Nesse “momento o
analfabetismo era concebido como causa e não efeito da situação econômica, social e
cultural do país” (MASSAGÃO, 1999, p. 20).
A Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes, já trazia implícita a idéia de educação
de base, sendo influenciada pelas idéias difundidas pela UNESCO (Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) no que se refere em que a alfabetização não
é em si mesma, porém é um conjunto que envolve oferecer condições mínimas para que os
sujeitos se desenvolvessem e atuassem no meio em que vivem.
2.2.2 – Campanha Nacional de Educação Rural
A partir da experiência de Itaperuna e em decorrência de recomendações do Seminário
Internacional de Educação de Adultos, ocorrido, em 1949, no Brasil, criou-se o CNER
Campanha Nacional de Educação Rural, sua criação é um marco importante para o ensino
rural, apesar de bastante acidentada (PAIVA, 1987, p. 143).
No início as Missões estavam ligadas a Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes,
em seguida tornou-se independente voltando novamente a ser controlada pelo Departamento
Nacional de Educação.
19
Segundo DI Rocco (1973) Educação o regulamento da Campanha Nacional de Educação
Rural foi aprovado pelo Ministério e tinha como objetivo o de levar a educação de base ao
meio rural. Tal documento entendia por educação de base ou educação fundamental, o
mínimo de educação geral que teria por objetivo ajudar as crianças, adolescentes e adultos a
compreenderem os problemas peculiares ao meio em que vivem e a formarem uma idéia
exata de seus deveres e direitos individuais e cívicos e a participarem eficazmente do
processo econômico e social da comunidade ao qual pertencem. (Di Rocco, 1973, p. 43).
As atividades da Campanha Nacional de Educação Rural tinham dois principais pontos de
apoio: as missões rurais, cuja metodologia, inspirada na experiência de Itaperuna, visava à
organização social da comunidade, e os centros de treinamento, destinados aos professores
leigos, à preparação de filhos de agricultores para as atividades agrárias e à preparação de
técnicos em audiovisuais aplicados à educação básica. Assim como existiam, também,
cursos especiais para capacitação do pessoal da própria Campanha.
A criação da Campanha Nacional de Educação Rural, que inicialmente atuou ligada à
Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes pode ser considerada como um dos
pontos altos do movimento em favor do ensino rural (PAIVA, 1973, p. 368). Nesse sentido a
Campanha Nacional de Educação Rural tinha a intenção de contribuir para acelerar o
processo de evolução do homem rural despertando nele a questão voltada ao comunitário, a
idéia de valorização humana e o sentido de responsabilidade e suficiência, para que não
houvesse diferença entre cidade e o campo em detrimento do meio rural, havendo a
tendência de enraizar-se a estagnação das técnicas de trabalho, a disseminação de endemias,
a consolidação do analfabetismo. Por isso, missões educativas penetravam no interior para
incentivar a elevação dos padrões de vida e a solução dos problemas coletivos através da
organização comunitária (PAIVA 1987, P. 197).
2.2.3 – Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo
Em 1958, nasce a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo no Brasil, as
Campanhas anteriores serviram de base para essa nova visão e alimentaram a reflexão e o
debate em torno do analfabetismo no Brasil, os diferentes movimentos mostram a
importância de cada um deles em prol da erradicação do analfabetismo.
20
Moura (1999) afirma que no período de 1958 a 1963 o país vive um clima de muita
efervescência no campo da educação, principalmente às teses defendidas no II Congresso
Nacional de Educação de Adultos, onde Paulo Freire, liderando um grupo de educadores
pernambucanos defende e apresenta um Relatório que tem como título: A Educação de
Jovens e Adultos e as Populações Marginas: o problema dos Mocambos.
Tal relatório trazia como proposta de educação de adultos que estimulava a colaboração, a
decisão, à participação e a responsabilidade social e política. Enfatizava o respeito ao senso
comum do trabalhador, ao conhecimento popular e, sobretudo a valorização do contexto do
trabalhador, ao qual envolve sua realidade e o seu cotidiano.
As discussões e encaminhamentos ocorridos durante realização do II Congresso Nacional de
Educação de Adultos possibilitaram uma avaliação das Campanhas realizadas até então,
delinearam o surgimento de ações norteadas por suas reflexões em torno da concepção e dos
objetivos da alfabetização, ao tempo em que possibilitaram o ressurgimento de movimentos
de caráter popular (Moura, 1973, p. 47).
A Campanha de Erradicação do Analfabetismo possibilitou que fossem esboçados princípios
que iriam servir de base ao sistema de ensino e a metodologia de Paulo Freire nos anos 60
da mesma forma com os métodos de ensino em geral. Em contrapartida surgiram idéias
preconceituosas sobre adultos analfabetos onde essas idéias foram criticadas, porém as
capacidades de aprendizagem dos jovens e adultos foram reconhecidas.
De acordo com Masagão (1999), iniciou-se, então, uma intensa mobilização da sociedade
civil em torno das reformas de base, com a proposta de erradicação do analfabetismo, o que
contribuiu para a mudança das iniciativas públicas de educação de adultos. Um novo olhar
sobre o problema do analfabetismo foi surgindo, junto à consolidação de uma nova
pedagogia de alfabetização de adultos, que tinha como principal referência Paulo Freire.
Surgiu então, um novo e necessário paradigma pedagógico – um novo entendimento da
relação entre a problemática educacional e a problemática social.
21
2.2.4 – Comissões de Cultura Popular e o Programa Nacional de Alfabetização
Em março de 1963 acontece à extinção da Mobilização Nacional Contra o Analfabetismo,
nesse período nenhuma outra campanha foi implementada de imediato, porém no mesmo
ano foram iniciados em Brasília os trabalhos da Comissão de Cultura Popular tendo como
presidente Paulo Freire, então professor da Universidade de Recife, os seus trabalhos
desenvolvidos na área de educação de jovens e adultos, já vinham ganhando repercussão
nacional, instalando-se em Brasília a primeira Comissão.
Paralelamente aos trabalhos das Comissões Populares, vários outros movimentos em prol da
erradicação do analfabetismo desenvolveram-se, dentre outros se destacam o Programa
Nacional de Alfabetização e o Movimento de Educação de Base da CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil). Uma nova visão sobre o problema do analfabetismo foi
surgindo, junto à consolidação de uma nova pedagogia de alfabetização de adultos, que tinha
como principal referência Paulo Freire.
O analfabetismo, que antes era apontado como causa da pobreza e da marginalização,
passou a ser, então, interpretado como efeito da pobreza gerada por uma estrutura social não
igualitária (MASAGÃO, 1999, p.22). O ano compreendido a 1964 foi aprovado o Plano
Nacional de Alfabetização que tinha como objetivo a disseminação de programas de
alfabetização por todo o país, orientados por Paulo Freire, durante o desenvolvimento dos
planos e diversos grupos se engajaram: os estudantes, sindicatos e diversos grupos que
apoiavam a efervescência política da época.
Devido o golpe militar de 1964, todo esse movimento em prol da disseminação de
programas de alfabetização seria interrompido, pois foram vistos como uma ameaça grave à
ordem, seus promotores ditadores e reprimidos. A educação passou a ser responsabilidade do
governo, para que o governo permitisse a realização dos programas de alfabetização de
adultos, deveriam ter características conservadoras e assistencialistas, ao contrário das
propostas de Freire, que tinha como um dos objetivos: iniciar o aprendizado da escrita, levar
o educando a assumir-se como sujeito da sua aprendizagem, tornando-os críticos e livres.
22
2.2.4.1 – Os Centros Populares de Cultura
Os Centros Populares de Cultura surgiram como movimentos a fim de transformar as
estruturas sociais, econômicas e políticas do país, buscando criar oportunidades de
construção de uma sociedade que valorize a cultura nacional, a cultura do povo, ou seja, a
cultura popular.
Essas preocupações são fruto das discussões dos intelectuais, políticos e estudantes com a
promoção da participação política das massas e do processo de tomada de consciência da
problemática brasileira. É nesse contexto que surge os Centros Populares de Cultura que
começam a florescer em todo país entre 1962 e 1964, tendo como ponto de partida o Centro
Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, a UNE, surgido em 1961.
No final de 1963, o Centro Popular de Cultura da UNE pensa em cuidar do problema da
alfabetização do povo, ampliando as atividades dos centros que antes se restringia as
atividades de teatro, chegando a levantar a possibilidade de organização de uma
Universidade de Cultura Popular que atuaria através de aulas por correspondência com
material didático, vendidos nas bancas de jornal. Em relação aos outros Centros, a exemplo
o de Belo horizonte, enfatizou o programa de alfabetização, chegando a elaborar material
didático próprio.
O papel dos Centros Populares de Cultura era o de “contribuir para o processo de
transformação da realidade brasileira” (PAIVA, 1987, p. 233). Para isso o plano cultural era
um dos planos possíveis de luta pela transformação social do país e a possibilidade da
população através da arte pudesse adquirir um caráter de luta social.
2.2.4.2 – Os Movimentos de Cultura Popular
A iniciativa de estudantes universitários, artistas e intelectuais do município de Pernambuco
e a união dos esforços da prefeitura da capital no combate ao analfabetismo e a elevação do
nível cultural do povo, em maio de 1960 fizeram nascer os Movimentos de Cultura Popular.
Para Paiva (1987) os Movimentos de Cultura Popular pretendiam encontrar uma fórmula
23
brasileira para a prática educativa ligada às artes e à cultura popular mediante atividades
voltadas para a conscientização das massas através da alfabetização e da educação de base.
As atividades dos Movimentos de Cultura Popular buscavam “a autenticidade da cultura
nacional, a valorização do homem brasileiro, a desalienação da nossa cultura [...]”, visando
“à conscientização da massa popular, á formação de uma consciência política e social que
preparasse o povo para a efetiva participação na vida na nação” (PAIVA, 1987, p.237).
As concepções e práticas advindas dos Movimentos de Cultura Popular expandiram e
difundiram-se pelo país, exercendo influência sobre os Centros Populares de Cultura que, a
partir do Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular, começaram a rever suas
formulações teóricas.
Os Movimentos de Cultura Popular representou um período importante no desenvolvimento
das idéias que estiveram presentes na teorização e na metodologia elaborada por Paulo
Freire, colaborador do movimento nos seus dois primeiros anos de funcionamento.
2.2.4.3 – O Movimento de Educação de Base – MEB
O então presidente eleito - Jânio Quadros através do decreto nº. 50.370, de 21 de março de
1961, Artigo 2º por meio de convênio com o MEC – Ministério da Educação e Cultura e da
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e financiada pelo governo da União
institui o Movimento de Educação de Base - MEB.
Caracteristicamente o MEB era um movimento de inspiração cristã, porém seus objetivos
catequéticos assumidos inicialmente foram deixados de lado e coube aos leigos, muitos
provenientes das próprias organizações católicas, a assumirem posteriormente a
responsabilidade pela reflexão, planejamento e execução do MEB, na realização de “um
trabalho de promoção humana através da educação do povo, sem propósitos
evangelizadores” (PAIVA,1987, p.223).
O Movimento de Educação de Base – MEB propunha não apenas a alfabetização do
trabalhador rural, mas a sua formação que deveria ocorrer num processo de conscientização:
física, espiritual, moral e cívica; e na valorização do código oral e da cultura popular. Nesse
sentido os promotores lançaram-se na tarefa de organizar “sistemas” de educação popular
24
através da criação de escolas radiofônicas; o movimento deveria executar um plano
qüinqüenal (1961-1965), através da instalação de 15.000 escolas.
Na medida em que os trabalhos se desenvolviam e que se difundiam as novas idéias sociais
cristãs, os técnicos do MEB começaram a ansiar por uma nova interpretação do papel, dos
objetivos e dos métodos do movimento. A partir de então os trabalhos do MEB passam a
serem pautados para a conscientização, a mudança de atitudes e a instrumentação das
comunidades por ele atendidas.
O Decreto 52.267 de 1963 amplia o espaço de atuação do MEB, criando novas escolas e
“sistemas”, passando a atender todas as áreas subdesenvolvidas do país. Segundo Paiva o
Movimento de Educação de Base no ano de 1963 teve maior amplitude. No entanto, em
virtude da situação política do país em 1964, o MEB e os “sistemas” vão sendo
progressivamente paralisados assim como as atividades vão diminuindo e sua orientação
sendo modificadas.
2.2.4.4 – Difusão e prática de novas idéias pedagógicas: Paulo Freire
Os anos que sucederam o final da ditadura de Vargas foram marcados pelo clima de
liberdade assim como da manifestação política garantida pela constituição de 1946. Nesse
mesmo momento denunciava-se o caráter superficial do aprendizado que se efetivava no
curto período da alfabetização, a inadequação do método para a população adulta e para as
diferentes regiões do país.
Essas críticas convergiram para uma nova visão sobre o problema do analfabetismo e para a
consolidação de um novo paradigma pedagógico para a educação de adultos, cuja referência
principal foi o educador pernambucano Paulo Freire.
O pensamento de Paulo Freire baseava-se na idéia de que o “grande desafio prosseguia e
transcendia a superação do analfabetismo e se situavam na necessidade de superarmos
também a nossa inexperiência democrática [...]” (BARRETO, 2005, p. 79 apud FREIRE,
1979). Assim a partir dos trabalhos iniciados em Recife, Paulo Freire marcou
definitivamente o pensamento relativo à alfabetização.
Paulo Freire em sua proposta conscientizadora de alfabetização de adultos cujo princípio se
25
traduz na frase: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra” (FREIRE, 1989, p.09),
desenvolveu um conjunto de procedimentos pedagógicos que ficou conhecido como método
Paulo Freire, cujo objetivo era levar o educando a assumir-se como sujeito de sua
aprendizagem, como ser capaz e responsável. Paulo Freire propunha uma ação educativa
que não negasse a cultura do sujeito, mas que a fosse transformando através do diálogo.
2.3 – MOVIMENTOS BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO (MOBRAL)
O Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL foi criado em 1967, mas só instalouse em 08 de setembro de 1970. O governo passou a controlar as iniciativas de educação com
o lançamento do MOBRAL, o qual tinha autonomia em relação ao Ministério da Educação,
pois contava com um volume significativo de recursos (DI ROCCO, 1973, p. 43).
O MOBRAL estava voltado para a população de 15 a 30 anos e tinha como objetivo a
alfabetização funcional – aquisição de técnicas elementares de leitura, escrita e cálculo. Com
isso, as orientações metodológicas e os materiais didáticos esvaziaram-se de todo sentido
crítico e contextualizado proposto anteriormente por Freire (CUNHA, 1999, p. 37).
Na década de 70, ocorreu, então, a expansão do MOBRAL, em termos territoriais e de
continuidade, iniciando-se uma proposta de educação integrada, que tinha por objetivo a
conclusão do antigo curso primário. Contudo, o Movimento Brasileiro de Alfabetização criado em 1967, desacreditado nos meios políticos e educacionais, foi mais um programa
que fracassou, por possuir um conteúdo acrítico e material padronizado, além de não
garantir a continuidade dos estudos da população destinada ao seu foco de atuação.
Paralelamente ao movimento de expansão do MOBRAL, alguns grupos que atuavam na
educação popular continuaram a alfabetização de adultos dentro da linha mais criativa. Esses
grupos estavam vinculados a movimentos populares e tinham uma linha de oposição à
ditadura - eram comunidades de base, associações e oposições sindicais. Em contra partida
Paulo Freire que fora exilado, continuava trabalhando com a educação de jovens e adultos
no Chile e posteriormente em países da África.
26
2.4 – A EDUCAÇÃO DE ADULTOS APÓS A CONSTITUIÇÃO DE 1988
Os anos 80 foram marcados pela emergência dos movimentos sociais e pela mobilização em
torno do processo da constituinte, pela democratização do país mediante a participação
popular, a garantia dos direitos e a conquista de espaços que assegurassem uma lei que fosse
a expressão da demanda da sociedade brasileira. Com efeito, a Constituição de 1988
reconheceu e possibilitou a participação dos cidadãos na formulação das políticas públicas,
inclusive a de educação.
Com a Constituição de 1988 fica estabelecido o direito de todos à educação, mas os artigos
referentes à educação só foram regulamentados pela LDBEN 9.394 em 1996. Desse modo,
amplia-se o direito de todos à educação; no entanto, o dever do estado foi proclamado, mas
não necessariamente cumprido (LEÔNCIO, 2005, p.278).
Contudo, observa-se que as políticas para o combate ao analfabetismo e a educação de
jovens e adultos, em plenos anos 90, ainda se valem de ações que no passado levaram ao
fracasso os programas implantados, por não considerarem as especificidades dos sujeitos
jovens e adultos. Nesse contexto vale destacar: o Programa de Alfabetização Solidária –
PAS, programa polêmico por utilizar práticas superadas, como o assistencialismo, criado em
1996, o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, em 2003 e o
Programa Brasil Alfabetizado, em 2003 que dá ênfase ao voluntariado, apostando na
mobilização da sociedade para resolver o problema do analfabetismo.
Devido às discussões em torno da especificidade da educação de jovens e adultos e de suas
demandas criam-se os Fóruns Regionais de Educação de Jovens e Adultos, a partir de 1997,
para responder as necessidades advindas desse campo de estudo. Nesse sentido, muda-se o
cenário das discussões em torno da EJA passando a ser registrada num Boletim da Ação
Educativa, que socializa a agenda dos Fóruns e os Relatórios dos ENEJAs. De 1999 a 2000,
os Fóruns passam a marcar presença nas audiências do Conselho Nacional de Educação para
discutir as diretrizes curriculares para a EJA e conseqüentemente sobre que sujeitos são
esses que se destinam as classes de jovens e adultos.
Ao passo que os Fóruns se movimentam em torno das discussões do direito dos sujeitos
jovens e adultos a educação, a Secretaria da Erradicação do Analfabetismo instituía uma
27
Comissão Nacional de Alfabetização solicitando aos Fóruns uma representação. Os
Fóruns, portanto, têm sido interlocutores da EJA no cenário nacional, contribuindo para a
discussão e aprofundamento do que seja a EJA no Brasil (SOARES, 2004, p. 133).
Nessa perspectiva verifica-se que o desafio imposto para a Educação de Jovens e Adultos na
contemporaneidade se constitui em reconhecer o direito do jovem/adulto de ser sujeito,
mudar radicalmente a maneira como a EJA é concebida e praticada, buscar novas
metodologias, considerando os interesses dos jovens e adultos, pensar novas formas de
conceber a EJA, dentre outras ações, de forma que a educação de pessoas jovens e adultas
passe a se constituir enquanto direito a uma educação de qualidade, não um favor prestado
em função da disposição dos governos, da sociedade ou dos empresários.
2.4.1 A Constituição de 1998 e a Educação de jovens e adultos
Em 1988, foi promulgada a Constituição, que ampliou o dever do Estado para com a
educação passando a garantir o ensino fundamental obrigatório e gratuito a todos que não
tiveram acesso a escola na idade “própria”. Nesse sentido a educação de jovens e adultos
passa a ser “direito de todos e dever do Estado e da família [...]” (Constituição Federal
Artigo 205).
No que tange à educação de jovens e adultos, essa lei representou certo avanço ao garantir
no Título V (Dos Níveis e Modalidades de Educação e Ensino), Capítulo II (Da Educação
Básica) na seção V denominada Da educação de Jovens e Adultos. Compõem esta seção os
arts. 37 e 38. Vejamos o que diz e recomenda esta legislação:
Trata-se, pois, de um modo de existir com características próprias, como assinala o Art. 37
que diz que a EJA: “será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de
estudos no ensino fundamental e médio na idade própria”.
4.2 – Diretrizes Curriculares para a Educação de Adultos
Com a regulamentação da LDBEN 9.394/96 a EJA torna-se modalidade da educação básica
e passa a ser reconhecida como direito público subjetivo na etapa do ensino fundamental.
28
Após essa conquista, as discussões e os esforços voltam-se para a aprovação das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, que se materializa
na criação de fóruns estaduais de EJA e na realização de encontros anuais de educação de
jovens e adultos.
Durante o ano de 1996, realizaram-se vários encontros estaduais de EJA com o objetivo de
mapear as ações e as instituições envolvidas com a área. Dessas iniciativas, surgiu um
movimento nacional de continuidade da V Conferência Internacional de Educação de
Adultos – CONFITEA, realizada no ano de 1997, em Hamburgo, na Alemanha.
Toda movimentação advinda das demandas das entidades nacionais e internacionais ligadas
à Educação de Jovens e Adultos e da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade – SECAD/MEC culminou com a aprovação pelo Conselho Nacional de
Educação por meio da Câmara de Educação Básica que regulamenta as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, estabelecidas no Parecer
CNE/CEB nº. 11/2000 e na Resolução nº. 11/2000.
Quanto ao disciplinamento legal que a Educação de Jovens e Adultos recebe na LDB (Leis
de Diretrizes e Bases, vale destacar:
Art. 37 – A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não
tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio
na idade própria.
§ 1º - Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e
adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular,
oportunidades educacionais apropriados, consideradas as características do
alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e
exames.
§ 2º - O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do
trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre
si.
Art. 38 – Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que
compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitado ao
processo de estudos em caráter regular.
§ 1º - Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:
I – no nível de conclusão do ensino fundamental, para maiores de quinze
anos;
II – no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito
anos.
29
§ 2º - Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por
meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames.
Portanto, a partir dessas considerações, que sustentam a identificação da Educação de
Jovens e Adultos como um direito público subjetivo, no que se refere ao disciplinmaneto
legal.
30
3.0 - SUJEITO, HISTÓRIA DE VIDA E APRENDIZAGEM NA EJA
Os jovens e adultos populares não são acidentados ocasionais que,
gratuitamente, abandonaram a escola. Esses jovens e adultos repetem
histórias longas de negação de direitos. Histórias que são coletivas. As
mesmas vivenciadas por seus pais e avós; por sua raça, gênero, etnia e
classe social (ARROYO, ano? p.).
Toda a história das idéias que estão em torno da Educação de Adultos no Brasil, acompanha
a história da educação popular. A “mobilização brasileira em favor da Educação do povo, ao
longo da nossa história parece realmente ligar-se às tentativas de sedimentação ou de
recomposição do poder político e das estruturas sócio-econômicas, fora e dentro da ordem
vigente” (Paiva, 1983, p. 142).
Nesse sentido, verifica-se que as práticas dos movimentos da Educação de Jovens e Adultos
– a Campanha Nacional de Alfabetização de Adolescentes e adultos e o MOBRAL – ao
longo da história contribuíram para a construção de uma concepção equivocada de sujeito,
carregada de preconceito, onde “o adulto analfabeto era identificado como marginal pessoa
que não tinha capacidades e que psicologicamente e socialmente pueril em relação aos que
dominam as letras” (MASSAGÃO, 1999, p.20).
Com isso, constata - se que há uma maior ênfase ao teórico metodológico em detrimento da
valorização do sujeito, pois se observa que durante a trajetória histórica da EJA em termos
de propostas metodológicas para o desenvolvimento curricular da Educação de Jovens e
Adultos estas não contemplaram o sujeito como SER que trás uma história e experiências de
vida. As propostas para a educação de adultos objetivavam somente o método e a interesses
políticos
econômicos,
deixando
de
vislumbrar
as
possibilidades
para
o
desenvolvimento contextualizado do sujeito.
De acordo com Massagão (1999) “Durante a Campanha Nacional de Educação de
Adolescentes e Adultos essa visão modificou-se, foram adensando-se as vozes dos que
superavam esse preconceito, reconhecendo o adulto analfabeto como ser produtivo, capaz de
raciocinar e resolver seus problemas.
Para tanto contribuíram também teorias mais modernas da psicologia, que desmentiam
postulados anteriores de que a capacidade de aprendizagem dos adultos seria menor do que
as das crianças.
31
A prática pedagógica dos alfabetizadores insistia em levar os mesmos métodos
pedagógicos utilizados em sala de aula infantil. “Métodos desenvolvidos com crianças,
aplicados nas turmas da Educação de Jovens e Adultos.
A proposta para alfabetização de Jovens e Adultos enquanto área específica da educação
além de buscar fundamentos teóricos metodológicos há a necessidade de delimitação do
campo epistemológico e o objeto de conhecimento, o que diferencia das outras áreas de
educação. Conforme (MOURA, 1999, p. 21)
Definindo o para que, para quem e como, a fim de que se possa expressar,
descrever e estudar o seu objeto, deixar claro o entendimento que se tem
sobre sua natureza, seu caráter e seus objetivos utilizando a analogia que
Vigotsky faz em relação o Marx: é preciso definir seu “o capital”. Somente
assim a alfabetização de adultos deixará de ser concebida e tratada como
um campo cuja polissemia leva a multifuncionalidade, ao ecletismo e a
uma abrangência, de tal forma que seu processo é tudo, pode tudo leva a
tudo e ao mesmo tempo não leva a nada.”
Segundo Massagão (1999), a consolidação de um novo paradigma pedagógico para a
Educação de Adultos, cuja referência principal foi o educador Paulo Freire. Ele elaborou um
“Método” de alfabetização de adultos que contemplava a conscientização, cujo princípio
básico pode ser traduzido numa frase célebre: “A leitura do mundo precede a leitura da
palavra”.
Segundo o dicionário Aurélio, método é: 1. Caminho pelo qual se atinge
um objetivo. 2. Programa que regula previamente uma série de operações que se devem
realizar, apontando erros evitáveis, em vista de um resultado determinado. 3. Processo ou
técnica de ensino. 4. Modo de “proceder, maneira de agir, meio.”
Ao tomarmos como referência a definição de “método” do dicionário, podemos afirmar que
o educador Paulo Freire elaborou um método, uma vez que o seu trabalho em Angicos uma
cidade do Rio Grande do Norte, uma das suas primeiras experiências educacionais, onde
traçou um caminho para alfabetizar os 300 trabalhadores que ali estavam cuja finalidade era
aprender a ler e escrever num determinado espaço de tempo, e foi o que aconteceu. Portanto,
o “Método” foi testado e aprovado numa experiência concreta.
Contudo, apesar dessa evidência, o que se depreende de uma obra que tem por finalidade,
32
”a leitura de mundo preceder a leitura da palavra”, ser muito mais do que um método; é,
pode-se afirmar assim, que se trata de uma teoria do conhecimento em relação ao processo
de ensino/aprendizagem.
A denominação do método foi reconhecida por outras pessoas, estudiosas da obra de Paulo
Freire, mas nunca foi assumida pelo próprio. As suas pretensões no que se refere ao método
eram outras de dimensões mais amplas.
Pelo conjunto da obra de Freire e relatos de suas experiências ao longo da história,
percebemos preocupações que vão muito além de um método pedagógico de qualquer nível
que seja. O que temos é, uma reflexão filosófico-política, sobre os processos educacionais
em busca de uma prática que contribua decisivamente para a transformação da sociedade.
Segundo Nascimento (1987), Paulo Freire escreveu sobre as vozes que são assumidas e as
vozes que são suprimidas no processo de educação em que só há um sujeito, o professor, e o
aluno é um mero objeto, portanto sem voz, sem vontades nem autonomia.
Ele está na sala de aula para receber os ensinamentos do professor. Ele é apenas uma caixa
vazia, um ser que nada sabe numa relação com um ser que tudo sabe o professor. O
professor tem por função depositar seus saberes na caixa vazia, os alunos.
Cabe àqueles descortinar o véu da ignorância que envolve a mente dos alunos e iluminá-la
com a luz da sabedoria. Por isso, a um cabe ouvir, obedecer e repetir; a outro, dizer, ordenar
e transmitir, para que o processo tenha êxito. Nessa relação não há espaços para
questionamentos, no máximo, perguntas sobre o que já foi dito para que o mesmo seja
reafirmado. Jamais alterado.
De acordo com Barreto (2005), prescindindo da utilização de cartilhas, desenvolveu um
conjunto de procedimentos pedagógicos que ficou conhecido como método Paulo Freire.
Para ele, mulheres e homens, se caracterizam como pessoas capazes de captar e responder
aos desafios do mundo onde se encontram.
Agir sobre a natureza, produzir cultura e conhecimento é marca fundamental dos seres
humanos. Coerente com essas idéias, Paulo Freire desenvolveu uma metodologia que
33
devolveu o papel ativo dos educandos enquanto sujeitos como um SER biopsicossocial e
do educador.
O diálogo entre educador, educando e o objeto do conhecimento foi um dos pontos fortes
desta nova alfabetização. Para que o diálogo realmente se efetivasse, ele desenvolveu um
trabalho onde os saberes, contextos e histórias de vida se transformavam em palavras
geradoras.
De acordo Nascimento (1987), realizada a seleção das palavras, iniciava-se um processo de
discussão sobre o significado das mesmas e estabeleciam-se relações com outras palavras ou
expressões que ajudassem a compreender a realidade na qual estavam inseridos os sujeitos,
bem como um processo de decodificação dessas expressões para que o processo da leitura
da palavra escrita se efetivasse.
Havia todo um cuidado para que não se caísse em discussões infindáveis e o educando não
alcançasse seu grande objetivo, aprender a ler e escrever as palavras para, com isso, poder
ler as cartas que recebiam e escrever as cartas para familiares e amigos que estavam a
milhares de quilômetros de distancia dos olhos, mas não do coração.
Duas outras características muito fortes no Método Paulo Freire eram a preservação e o
aumento dos laços de afetividade entre as pessoas. Pois, sendo um método feito por pessoas,
para pessoas e com pessoas, não poderia ser de outro modo, mesclando sujeito e teoria.
A necessidade de perceber os sujeitos nas suas múltiplas dimensões era a alma do “Método”,
sua razão de ser, sua condição de existência, seus saberes que possibilitavam a participação e
o entendimento para todos, pois se tratavam de palavras que tinha um peso de significados.
Para Massagão (1999), antes mesmo de entrar nessas palavras geradoras, Paulo Freire trazia
como proposta, que se tivesse um momento inicial em que o conteúdo do diálogo educativo
girava em torno do conceito antropológico de cultura.
Onde o educador utilizando uma série de ilustrações e exemplos do cotidiano, deveria dirigir
uma discussão na qual fosse evidenciado o papel ativo dos sujeitos como produtores de
culturas e as diferentes formas de cultura: a cultura letrada e não letrada, o trabalho, a arte, a
34
religião, os diferentes padrões de comportamento e o social.
Paulo Freire tinha como objetivo, antes mesmo de iniciar a aprendizagem da escrita e da
leitura levar o educando a assumir-se como sujeito da sua própria aprendizagem como ser
capaz e valorizando as experiências de vida e histórias vida dos sujeitos, o educador
possibilita na sua prática uma aprendizagem significativa.
Segundo Moreira (1999), "a aprendizagem significativa é um processo por meio do qual
uma nova informação relaciona-se, de maneira substantiva (não-literal) e não-arbitrária, a
um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo”.
De acordo com Moreira (1999), a teoria da Aprendizagem Significativa foi desenvolvida
por, David Ausubel, provavelmente a idéia mais importante da teoria de Ausubel (1968,
1978, 1980) e suas possíveis implicações para o ensino e a aprendizagem possam ser
resumidas na seguinte proposição de sua própria autoria (1978):
Se tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um só princípio,
diria o seguinte: o fator isolado ai importante Influenciando a
aprendizagem é aquilo que o aprendiz já sabe. Determine isso e ensine-o de
acordo.
Em outras palavras, os novos conhecimentos que se adquirem relacionam-se com o
conhecimento prévio que o aluno possui. David Ausubell define este conhecimento prévio
como "conceito subsunçor" ou simplesmente "subsunçor".
Os subsunçores são estruturas de conhecimento específico que podem ser mais ou menos
abrangentes de acordo com a freqüência com que ocorre aprendizagem significativa em
conjunto com um dado subsunçor.
Segundo Moreira (1999), ao falar em “aquilo que o aprendiz2 já sabe”, Ausubel está se
referindo a estrutura cognitiva, as experiências vividas pelo sujeito, ou seja, ao conteúdo
total de reorganização das idéias do indivíduo, ou no contexto da aprendizagem de um
determinado assunto, o conteúdo e organização de suas idéias nessa área particular do
conhecimento, as experiências de vida influenciando no aprendizado.
Um exemplo disso é o relato de Paulo Freire quando ele se refere ao exílio: “O exílio muda
o exilado. E, em geral, a prática do exílio acrescenta sua própria existência. No momento em
35
que chega à terra de empréstimo, o exilado ganha uma distância de seu contexto original,
daquele pedaço de mundo, que ele conheceu. E logo começa a viver essa ambigüidade: de
um lado, está sendo desafiado por algo novo diante dele; do outro lado, está amarrado ao
que ele viveu. Essa distância que ele toma do seu país é, ao mesmo tempo, uma distância
geográfica e uma distância no tempo. Esse é um dos riscos que um exilado corre. O risco de
se perder num tempo que ele, emocionalmente, imobiliza”.
E quantas vezes o sujeito analfabeto, se deparando com a estrutura de uma política
educacional e de uma cultura de prática docente que faz questão de negar a sua história de
vida, sente essa mesma sensação de imobilidade e exílio?
3.1 – Quem são os sujeitos da EJA?
O processo de ensino/aprendizagem da EJA na sua grande maioria é cercado de muitas
atribuições, por se tratar de adultos que trabalham para sustentarem suas famílias, alguns
deles vivem na zona urbana (cidade) e a família na zona rural (campo), são pessoas que
enfrentam uma situação social desigual e injusta e, além disso, convivem com um
preconceito historicamente enraizado conforme afirma Masagão (1999), quando se refere à
Campanha de Educação de Adultos lançada em 1947:
Nesse momento, o analfabetismo era concebido como causa e não efeito da
situação econômica, social e cultural do país. Essa concepção legitimava a
visão do adulto analfabeto como incapaz e marginal identificado
psicológica e socialmente com uma criança.
Diante de uma história, onde a construção do conceito de sujeito tornou-se um equívoco os
olhares sobre a condição social, política e social dos alunos da EJA, tem condicionado a
diversas concepções da educação que lhes é oferecida; lembra-nos Arroyo que os lugares
sociais a eles reservados são marginais, excluídos, empregáveis, miseráveis e tem
condicionado o lugar reservado a sua educação no conjunto das políticas públicas oficiais
(2001, p. 10). De uma forma geral os sujeitos da EJA, são tratados como massa, alunos que
trazem uma história de fracasso e o peso do preconceito, qualificados sob diferentes nomes,
relacionados diretamente ao “fracasso escolar”.
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Arroyo (2001) ainda chama atenção para o discurso escolar que os tratam, a priori, como
repetentes, evadidos, defasados, aceleráveis, deixando de fora dimensões da condição
humana desses sujeitos, básicas para o processo educacional. Ou seja, concepções e
propostas da EJA comprometidas com a formação humana, passam necessariamente, por
entender quem são esses sujeitos, e que processos pedagógicos deverão ser desenvolvidos
para dar conta de suas necessidades e desejos.
Esses sujeitos são pessoas que, apesar de fazerem parte de uma sociedade onde à educação
ao invés de servir como instrumento de desenvolvimento ou preparação social, intelectual,
moral, física e afetiva do sujeito, estigmatizam e inferioriza-os, tornando a volta à sala de
aula por muitas vezes uma decisão difícil.
De acordo com ARROYO (2001), construir uma Educação de Jovens e Adultos que tenha
como resultado em seu processo pedagógico, considerando quem são esses sujeitos,
representa pensar sobre as possibilidades de transformar a escola que os atende em uma
instituição aberta, que valorize seus interesses, seus saberes, história de vida e expectativas,
que favoreça sua participação, que respeite seus direito em práticas, e não somente os
enunciados de programas e conteúdos; que se proponha e motivar, mobilizar e desenvolver
conhecimento que partam da vida desses sujeitos.
A Educação de Jovens e Adultos concentra em si, processos formativos em diversas linhas
cuja efetivação se dá a partir de uma variedade de sujeitos, envolvendo de um lado o Estado,
as organizações da sociedade civil e setor privado, e de outro lado um grupo de sujeitos tão
diversificada e extensa quanto são os representantes das camadas mais empobrecidas da
população, (negros, jovens, idosos, trabalhadores, populações rurais etc.).
Esses sujeitos são trabalhadores e não-trabalhadores, das populações das regiões
metropolitanas e rurais, das diversas juventudes, dos internos penitenciários, contingentes
esses que na maioria são formados por sujeitos que vivem numa sociedade injusta, que
promove situação de desigualdade e falta de oportunidade aos seus cidadãos; jovens, negros,
mulheres portadores de necessidades especiais entre outros.
De acordo com ARROYO (2001), construir uma Educação de Jovens e Adultos que tenha
37
como resultado em seu processo pedagógico, considerando quem são esses sujeitos,
representa pensar sobre as possibilidades de transformar a escola que os atende em uma
instituição aberta, que valorize seus interesses, seus saberes, história de vida e expectativas,
que favoreça sua participação, que respeite seus direito em práticas, e não somente os
enunciados de programas e conteúdos; que se proponha e motivar, mobilizar e desenvolver
conhecimento que partam da vida desses sujeitos.
3.2 – O Sujeito e a Educação na perspectiva de Paulo Freire
Na educação, a presença de Freire é marcadamente reconhecida não apenas no Brasil, onde
a Educação Popular se apóia, explicitamente, em seus ensinamentos, como no mundo todo.
O pensamento de Paulo Freire nasce de uma visão de ser humano e de mundo, a relação
sujeito-sujeito e sujeito-mundo não se separam. Afirmando: “Ninguém educa ninguém,
ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”.
(FREIRE, 2002, p. 68).
O sujeito se constitui no coletivo mediando e sendo mediado por outros sujeitos. Cada um
de nós é um ser no mundo e com o mundo. Para os sujeitos, o mundo é uma realidade
objetiva, independente dele, possível de ser conhecida, em que não apenas está, mas com a
qual se defronta daí, o ser de relações que o sujeito é, e não só de contatos. Porque está com
a realidade na qual se acha, e que se relaciona com ela. É o que afirma (BARRETO, 2005, p.
58).
Para Freire o sujeito deve abranger as dimensões de um ser de
relação e o sujeito da sua história.
Na visão de Paulo Freire a Educação decorre do fato de as pessoas
serem incompletas e estarem em relação com o mundo e com as
outras pessoas, são incompletas desde que nascem: não falam, não
andam e são totalmente dependentes.
Gradativamente estas “incompletudes”, vão sendo superadas, mas ainda assim os seres
humanos não ficarão totalmente completos na infância, juventude, maturidade ou velhice,
passam a vida toda se modificando na busca de completarem-se como pessoas realizando a
sua vocação de ser “mais” humano. Esse processo pelo qual as pessoas vão se completando
durante a vida, na busca de serem “mais” é o que constitui para Paulo Freire a Educação.
38
Nesse sentido, a Educação de Jovens e Adultos deve ser compreendida enquanto processo
de formação humana plena que, embora instalado no contexto escolar deva levar em conta
as formas de vida, trabalho e sobrevivência dos jovens e adultos que se colocam como
principais destinatários dessa modalidade de educação.
Conseqüentemente se orienta pelos ideários da Educação Popular: formação social, política
e profissional. Para Paulo Freire o conceito de Educação de Adultos vai se movendo na
direção da Educação Popular na medida em que a realidade vai fazendo exigências à
sensibilidade e à competência científica dos educadores e educadoras. (SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO DO ESTADO, Projeto Aprendizagem ao Longo da Vida, 2008).
Para a garantia do Direito dos Jovens e Adultos à Educação Básica o currículo deverá ser
pautado numa pedagogia crítica, que considera a educação como dever político, como
espaço e tempo propício à emancipação dos educandos e à formação da consciência críticoreflexiva e autônoma.
Os sujeitos respondem aos desafios do mundo em que vivem e usam esse mundo natural, já
existente, para criar e recriar o mundo da cultura. Desta forma, os sujeitos vão mudando o
mundo para torná-lo mais adequado a suas necessidades, mesmo que a história tenha
conduzido a educação de adultos para um rumo humano/desumano.
3.1.1.1 – Humanização e Desumanização
A vocação de ser mais, de ser mais humano comum a todos os sujeitos se realiza pela
educação. Mas essa vocação de ser mais deixa de concretizar-se quando a relação entre os
sujeitos se desumanizam. Isto foi possível historicamente, quando os que detinham o poder
passaram a abusar dele e ganhar privilégios para si e para seus iguais, em prejuízo dos
outros.
Nesse sentido estas relações deixaram de ser de cooperação, para tornar-se relação de
dominação, nela os poderosos já não viam todos os sujeitos como seus iguais, mas como
objetos necessários para a satisfação de seus interesses. Tornaram opressores da maioria
impondo-lhes sacrifícios e restrições para aumentar seus próprios privilégios.
39
Sendo assim, essas relações opressoras consideradas naturais, nasceram de uma ordem
que legitima esta situação de opressão e reage contra todos que ameaçarem os privilégios
para restaurar a humanidade de todos.
Nenhuma “ordem” opressora suportaria que os oprimidos todos
passassem a dizer: “Por quê?” (FREIRE, 1979, p. 87).
Dessa forma, esta estrutura social de dominação desumanizou os oprimidos, pois os
transformou em objetos negando-lhes a condição de sujeitos que lhes é própria, mas também
desumanizou os opressores, já que não é próprio dos seres humanos tratarem como coisas ou
objetos outros seres humanos.
Portanto, para Paulo Freire, os oprimidos poderão romper com esta estrutura que causa a
desumanização dos opressores e oprimidos, só eles poderão acabar com esta ordem injusta,
buscando romper a opressão através da educação, reconquistando sua liberdade de ser mais,
de serem sujeitos de direito e de fato.
3.2 – A INFLUÊNCIA DA HISTÓRIA DE VIDA NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM
Enfatizar a história de vida do sujeito significa apreender as articulações entre a história
individual e a história coletiva, uma ponte entre a história individual e o social. O sujeito se
constitui como dimensão priorizando o método autobiográfico - história de vida. É o que
afirma Barros (2007): “Dessa maneira o método de história de vida pode ser classificado como um
método científico com a mesma validade e eficiência de outros métodos, sendo que o compromisso
maior do pesquisador é com a realidade a ser compreendida”.
São muitos os métodos e as técnicas de coleta e análise de dados em uma abordagem
qualitativa e, entre eles, a história de vida ocupa lugar de destaque. Através da história de
vida pode-se captar o que acontece na intersecção do individual com o social, assim como
permite que elementos do presente fundam-se a evocações passadas. Podemos assim, dizer,
que a vida olhada de forma retrospectiva faculta uma visão total de seu conjunto, e que é o
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tempo presente que torna possível uma compreensão mais aprofundada do momento
passado. É o que, em outras palavras, nos diz Soares (1994) quando discute as articulações
entre os conceitos vida e sentido: “Somente a posteriori podem-se imputar, aos retalhos
caóticos de vivência, as conexões de sentido que os convertem em “experiência” (SOARES,
1994:23)
Cabe lembrar que se deve estar ciente dos avanços e recuos, da cronologia própria, e da
fantasia e idealização que costumam permear narrativas quando elas envolvem lembranças,
memórias e recordações. Farias, (1994) adverte que as entrevistas de história de vida
trabalham com memória e, portanto, com seletividade, o que faz com que o entrevistado
aprofunde determinados assuntos e afastem outros da discussão. No entanto, como nos diz
Bosi (1994), o que interessa quando trabalhamos com história de vida é a narrativa da vida
de cada um, da maneira como ele a reconstrói e do modo como ele pretende seja sua, a vida
assim narrada.
Haguette (1987) considera que a história de vida, mais do que qualquer outra técnica, exceto
talvez a observação participante, é aquela capaz de dar sentido à noção de processo. Este
“processo em movimento” requer uma compreensão íntima da vida de outros, o que permite
que os temas abordados sejam estudados do ponto de vista de quem os vivencia, com suas
suposições, seus mundos, suas pressões e constrangimentos.
A definição de história de vida dada por Goy (1980) complementa os vários elementos já
apontados pelos autores acima cotejados. Ele, assim, acrescenta ser a história de vida “um
arquivo entrelaçando o verdadeiro, o vivido, o adquirido e o imaginado” (Goy, 1987:743
apud Pesce, 1980:154).
A história de vida pode ser desta forma, considerada instrumento privilegiado para análise e
interpretação, na medida em que incorpora experiências subjetivas mescladas a contextos
sociais. Ela fornece, portanto, base consistente para o entendimento do componente histórico
dos fenômenos individuais, assim como para a compreensão do componente individual dos
fenômenos históricos
4. ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA DE EJA: PROGRAMA SESI EDUCAÇÃO
DO TRABALHADOR
41
É exatamente a vida, que aguçando nossa curiosidade, nos leva ao
conhecimento; é o direito de todos à vida que nos faz solidários; é a opção
pela vida que nos torna éticos. (FREIRE, ano, p.)
No Livro “ESSA ESCOLA CHAMADA VIDA”, depoimentos ao repórter Ricardo Kotscho,
idealizado e escrito por Paulo Freire e Frei Betto. Respondendo a uma pergunta do repórter
Ricardo, Paulo Freire fala da sua experiência na educação, quando em 1946 ele começa a
trabalhar no SESI. Descreve como tudo aconteceu da seguinte forma:
É interessante observar como isso aconteceu dentro de uma instituição de
objetivos assistenciais, criada num desses momentos lúcidos da classe
dominante brasileira – e criada não para criticizar à consciência operária,
mas para opacizar a realidade e obstaculizar, assim, a assunção da classe
trabalhadora por si mesma, tornando-se classe para si. No fundo, o SESI se
cria para isso. Mas foi dentro de uma instituição assim, exatamente criada
para isso, que comecei a desvelar melhor a realidade. Então, no fundo, os
primeiros momentos de radicalização – nunca de sectarização - que
experimentei numa prática crescentemente consciente se deram no SESI
(FREIRE, 1986, p.08).
Coincidentemente ou não, a presente experiência pessoal e profissional no interior de uma
sala de Educação de Jovens e Adultos iniciou-se no SESI, assim como Freire tive a
oportunidade de vivenciar a realidade de uma práxis que me levou a muitas reflexões no que
se refere a Sujeito, História de vida dos sujeitos e a importância desses dois aspectos no
desenvolvimento do ensino/ aprendizagem.
Diante de alunos que trabalhavam na Construção Civil, trabalhei as duas primeiras turmas,
na empresa METROSAL Metrô de Salvador, foi no ano de 2006, experimentei a
oportunidade de descobrir que a educação de adultos, é algo imprescindível para a
construção de uma sociedade mais igualitária. Depois de participar da seleção para
professores estagiários do Programa SESI Educação do Trabalhador, comecei a participar da
capacitação e planejamento para a Aula Inaugural.
Mesmo antes de trabalhar com Jovens e Adultos, independente de ser educadora ou não,
sempre acreditei que o ser humano é mais importante que qualquer coisa, sempre me
espantava e me espanto quando vejo a falta de humanização nas relações entre as pessoas,
acredito ser minha a essência.
42
A preocupação com o sujeito foi um elemento que me levou a buscar uma prática
diferenciada, pois não me conformo quando vejo sujeitos da EJA sendo tratados como
“tábua rasa” na teoria piagetiana, o sujeito (aluno) é um ser ativo que estabelece relação de
troca com o meio-objeto (físico, pessoa, conhecimento) num sistema de relações vivenciadas
e significativas, uma vez que este é resultado de ações do indivíduo sobre o meio em que
vive, adquirindo significação ao ser humano quando o conhecimento é inserido em uma
estrutura – isto é o que denomina assimilação.
A aprendizagem desse sujeito ativo exige sempre uma atividade organizadora na interação
estabelecida entre ele e o conteúdo a ser aprendido, além de estar vinculada sua
aprendizagem ao grau de desenvolvimento já alcançado.
Nesse sentido, não existe história de vida desvinculada do sujeito, ela é parte integrante dos
sujeitos, esteja ele onde estiver ou em qualquer situação, as suas experiências de vida, elas
constituem saberes que levam os sujeitos a desenvolverem aprendizagem.
4.1 O Programa SESI Educação do Trabalhador como lócus de intervenção e pesquisa:
espaço, organização, funcionamento e os sujeitos da EJA
O Programa SESI Educação do Trabalhador representou na minha formação acadêmica e na
minha prática docente um lugar de intervenção e pesquisa, pois possibilitou durante
processo, a construção de conceitos com fundamentos teóricos, possibilitando reflexão e
descobertas para uma prática docente voltada para o sujeito e conseqüentemente uma prática
transformadora.
No dia da primeira aula inaugural foi uma emoção pra mim e acredito que para todos
aqueles operários/alunos que ali se encontravam. Depois de todas as apresentações e
cerimônias iniciamos nosso trabalho.
Em várias situações durante o estágio no Programa SESI Educação do Trabalhador,
verifiquei que os conceitos científicos que eu havia aprendido na faculdade teriam que ser
aplicados na prática de uma maneira concreta, onde a aplicação da teoria resultasse em
prática/práxis, onde o sujeito experimentasse o efeito da ação educativa.
43
Nesse sentido, o Programa foi um espaço de desenvolvimento de formação e pesquisa.
Idealizado por uma instituição tão competente e pioneira em ações sociais o SESI (Serviço
Social da Indústria), possibilitou desenvolver de forma orientada e planejada com o apóio
pedagógico do NETI (Núcleo de Educação do Trabalhador) a busca por novos
conhecimentos.
Sendo a pesquisa é um processo sistemático de construção do conhecimento que tem como
metas principais gerar novos conhecimentos e/ou corroborar ou refutar algum conhecimento
pré-existente. É basicamente um processo de aprendizagem tanto do indivíduo que a realiza
quanto da sociedade na qual esta se desenvolve.
4.1.2- Sobre o Programa SESI Educação do Trabalhador
O Sistema FIEB, através do SESI, desenvolveu o Programa SESI Educação do Trabalhador
com a finalidade de elevar o nível de escolaridade na indústria baiana e, conseqüentemente,
qualificar ainda mais os seus trabalhadores.
Um trabalhador que alcança maior nível escolar tende a elevar sua auto-estima e apresentar
um desempenho adequado aos constantes desafios impostos por um mercado competitivo e
globalizado, tendo consciência de suas funções, melhoria da capacidade de comunicação e
desempenho satisfatório em treinamentos com resultados imediatos na produção.
O Programa SESI Educação do Trabalhador, que está inserido na agenda de
responsabilidade social da indústria, oferece cursos de Ensino Fundamental I (alfabetização
a 4ª série), Ensino Fundamental II (5ª a 8ª série) e Ensino Médio (2º grau), assim como
cursos de Atualização de Conhecimentos, que funcionam em sua grande maioria no próprio
ambiente de trabalho do aluno.
44
4.1.3 – Organização e funcionamento da escola
As aulas aconteciam no próprio canteiro de obras onde os alunos trabalhavam todo o dia.
Geralmente, o espaço utilizado onde funcionavam as salas de aulas era no refeitório da
empresa, onde a mesma era responsável em adaptar o refeitório, para a noite
desenvolvermos as aulas.
A sala de aula após adaptação, contava com mesas e cadeiras, as mesmas onde os educandos
realizavam as refeições (ambiente muitas vezes utilizados na prática para contextualização),
quadro, armários para guardar o material e mural de avisos.
As salas eram grandes, arejadas, limpas, e tínhamos a preocupação de conservá-las sempre
com um aspecto de um lugar onde o conhecimento por ali passava. Havia um grande mural
onde os trabalhados desenvolvidos eram expostos e apreciados pelos outros trabalhadores.
Muitos após analisar os trabalhos desenvolvidos pelos colegas sentiam-se chamados a
também participar conosco.
4.1.3-Organização e funcionamento da escola
A escola era organizada junto à assistente social da empresa, onde a mesma tinha a
responsabilidade, de organizar o local onde aconteciam as aulas, da mesma forma o material
didático utilizados pelos educandos e educador.
As aulas aconteciam durante a semana, de segunda a quinta-feira, no horário noturno, das
18h00minhs às 20h30minhs. Os operários terminavam sua carga horária diária às
17h00minhs, no próprio canteiro de obras tomavam banho, lanchavam, (o lanche era
oferecido pela empresa) e as 18h00hs. iniciávamos nossos trabalhos.
Ao início e ao final de cada dia de aula, criamos o hábito de fazermos uma reflexão, onde
todos tinham possibilidade de se colocar. Esse espaço também foi espaço de construção de
conhecimento, onde a cada dia percebíamos que havia um progresso, uma oportunidade de
crescimento enquanto sujeitos. Alunos que passaram a participar e se colocar nos momentos
de encontros diários com seus encarregados devido à prática na escola.
4.1.4- Os sujeitos da EJA (turma Rust)
45
A Educação de Jovens e Adultos contempla homens e mulheres que lutam pela
sobrevivência nas cidades ou nos campos. Em sua maior parte os sujeitos da EJA são negros
e, em especial, mulheres negras. São moradores/moradoras de localidades populares;
operários e operárias assalariados (as) da Construção Civil, Condomínios, Empresas de
Transporte e de Segurança. Também são trabalhadores e trabalhadoras de atividades
informais vinculadas ao Comércio e ao Setor Doméstico. (Projeto Educação de Jovens e
Adultos: aprendizagem ao longo da vida).
O período ao qual experenciei a classe da Rust Engenharia convivi com sujeitos, operários
da indústria de revestimento e proteção anti corrosiva, do Pólo Petroquímico de Camaçari,
pessoas de várias regiões do estado da Bahia, que se deslocavam de suas cidades para
trabalhar e estudar em Camaçari.
São sujeitos que fazem parte da vivência concreta deste coletivo o exercício do papel de
mães, pais, avós, líderes ou membros de associações de bairro, de classe etc. São sujeitos
que se educam nas mais diferentes formas de trabalho, de organização social (família, igreja,
comunidade, associações, sindicatos etc.) e ainda no espaço e tempo da escolarização dos
seus filhos e netos. Colocam-se, portanto, na Educação de Jovens e Adultos como sujeitos de
direitos à formação e ao desenvolvimento humano pleno.
4.2 - Os educandos da EJA no processo de ensino aprendizagem no Programa SESI
Educação do Trabalhador: a influência da história de vida.
“Não há o diálogo verdadeiro se não há nos sujeitos um pensar
verdadeiro. Pensar crítico. Pensar que não aceitando a dicotomia
mundo/sujeito, reconhece entre eles uma inquebrantável
solidariedade. É um pensar que percebe a realidade como um
processo que se capta em constante movimento e não como algo
estático.” (FREIRE, 1970, p. 48)
Assim como Paulo Freire, acredito que o diálogo seja mais que um instrumento do
educador, é uma exigência da natureza humana.
Dessa forma, o papel do educador não é propriamente falar ao educando sobre sua visão de
mundo ou lhe impor esta visão, mas dialogar com ele sobre a sua visão e a dele,
46
contextualizando suas experiências de vida, seus saberes, levando-o a uma compreensão
de significados.
Durante a pesquisa foram observados alguns comportamentos dos sujeitos e algumas falas,
onde havia a constatação de que o método Autobiográfico ou História de Vida tinha como
resultado uma influência na aprendizagem dos sujeitos, os conteúdos eram compreendidos
de forma significativa, quando os mesmos eram trabalhados tendo como referência suas
vidas. Sendo assim, transcrevo alguns dos relatos, demonstrando a contribuição da pesquisa
para uma prática mais humana.
“Com o estudo de porcentagem, trabalhando o nosso contracheque,
foi muito fácil de aprender, agora sei fazer as contas de porcentagem
dos descontos no meu contracheque.” (aluno Y).
“Eu trabalhei muitos anos viajando por muitos estados do Brasil,
então quando estudamos o mapa e as Regiões do Brasil, foi fácil,
pois é como se eu estivesse fazendo uma viagem na minha mente.”
(aluno W).
“Devido alguns problemas de saúde da minha mãe, quando
estudamos os Sistemas do Corpo Humano e seu funcionamento eu
pude compreender melhor devido a experiência que eu passei no
hospital.” (aluno Y).
“Ninguém forma ninguém (..) a formação é inevitável, um trabalho
de reflexão sobre os percursos da vida”. (Bueno apud Novoa, 2002).
Verifica-se que, ao desenvolver determinada atividade que o educando demonstrava maior
interesse em resolver os problemas propostos, misturando disciplinas com a vida, já que elas
não estão separadas, integrar os sujeitos na vida escola e usar as experiências dele em sala.
Esses são elementos básicos para desenvolver na EJA uma aprendizagem significativa, em
que os sujeitos utilizam-se da escrita e da leitura para tornarem-se críticos e autônomos.
47
Projetos que fazem sentidos para os alunos e necessidade para a sociedade, mostram que o
mundo não pode ser dividido por disciplinas como acontece na escola. Dessa forma
desenvolvemos um Projeto Ambiental, chamando à atenção para a preservação do meio
ambiente.
A idéia do projeto surgiu depois de uma aula sobre “Rótulos”. Era o assunto ligado a
tipologia textual, os rótulos eram trazidos de suas casas, utilizados no dia a dia. A partir daí
vieram várias reflexões sobre a verificação das informações dos rótulos dos produtos nos
supermercados, preservação do meio ambiente, consumo sustentável responsável,
reciclagem e aquecimento global. Dentro do projeto organizamos uma Oficina de
Reciclagem de Papel, em parceria com a LIMPEC (Limpeza Pública de Camaçari).
“Eu, quando ia ao supermercado fazer minhas compras, nunca pensei
nas informações que os produtos trazem, nunca tinha pensado nisso!
E ainda mais, nunca tinha me preocupado na hora de jogar essas
embalagens no lixo”. (aluno X).
“Quando eu via o lixo cheio de papelão e as pessoas catando, ficava
pensando: o que será que vão fazer com isso? Agora com a oficina
de reciclagem de papel já consigo entender.” (aluno Z).
Dessa forma eles começam a relacionar os conteúdos estudados com fatos do cotidiano e do
trabalho. Ao aprenderem que é necessária a preocupação do destino que o lixo de sua casa
vai ter para a preservação do meio ambiente. Sem contar que essas embalagens serviam
como “portadores de textos”, os quais eles desenvolveram bastante a leitura.
Quem trabalha com jovens adultos, sabe das dificuldades de manter o interesse dos alunos,
eles chegam cansados do trabalho, do dia todo ao sol e chuva, é necessário planejar
encontros que tenham relação com a vida deles, trabalhar os assuntos de maneira que
tenham relevância, significado, enfim que vá servir para algo e não para ser esquecido antes
mesmo dele chegar a casa.
Fechamos o nosso projeto com uma aula/visita à Reserva Ecológica do Parque de Sauípe,
situado a Linha Verde (Região Metropolitana de Salvador). Onde o entendimento e a
48
concretização dos conceitos de alguns conteúdos ficaram bastante objetivos. A turma
ficou maravilhada diante das artesãs que teciam com palha de sisal, diante da cada de
farinha, do senhor que trabalhava o barro (oleiro), trazendo vários relatos e comentários de
suas próprias vidas em suas terras.
Foi uma oportunidade ímpar de presenciar tamanha interdisciplinaridade e aprendizagem,
foram várias as leituras feitas durante a aula/visita, como o a turma chamou esse passeio.
Estou convicta de que as histórias de vida dos sujeitos, sua valorização e sua utilização na
prática docente influência no processo de aprendizagem da EJA.
Alguns relatos referentes à aula/passeio na Reserva Ecológica do Parque SAUÍPE:
“A visita ao Parque Sauípe, quando visitamos as mulheres fazendo
trabalhos artesanais em palha, fez lembrar-me de minha irmã, pois
ela trabalha tecendo peneira de palha foi bastante significativo pra
mim.” (aluno A).
“Eu nunca pensei que existia uma daquele. Lá é muito bonito. Agora
eu sei que é importante preservar a natureza.” (aluno B).
O espaço educativo não é uma abstração, ele é constituído pelos sujeitos que viabilizam sua
existência, como diretores, professores, alunos, familiares etc., e as relações que estabelecem
entre si, inclusive as de conhecimento, por meio de suas propostas pedagógicas, curriculares
metodológicas, acesso a materiais, equipamentos e bens culturais.
Sendo assim, para dispor de uma prática docente que contemple a vida dos sujeitos de forma
que seja um elemento de vida e aprendizagem, é necessário ter “atitude”.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Visto que, os saberes e experiências dos sujeitos jovens e adultos influenciam no processo de
ensino aprendizagem contribuindo para um novo olhar para as práticas na EJA. Para tanto se
faz necessário desconstruirmos a visão preconceituosa com relação aos jovens e adultos
destinados das classes populares.
Os educandos, foco de intervenção pedagógica e de pesquisa, estão envolvidos no Programa
SESI Educação do trabalhador há algum tempo, demonstram determinada motivação ao
retornarem ao estudo. Isso por demonstrarem envolvimento nas atividades propostas para a
aprendizagem, e, sobretudo naquelas que o conteúdo ‘vida’ está presente.
A aprendizagem definida de forma sintética como o modo ao quais os sujeitos adquirem
novos conhecimentos, desenvolve competências e mudam o comportamento, está
diretamente ligada a pressupostos biográficos-político-ideológicos, relacionados com a visão
de homem, sociedade e saber.
Desconsiderar tais pressupostos que tem como resultado uma prática docente
transformadora é reproduzir métodos que não contemplam o sujeito como um ser holístico.
Holística é um termo que vem do grego holo igual ao todo, é, por conseguinte um termo que
indica uma tendência ao ver o TODO além das partes. Essa prática requer não somente o a
consciência ideológica como também suporte material didático.
As discussões em torno da necessidade de uma prática docente contextualizada e a
valorização do sujeito principalmente durante os anos 90 com a realização da V CONFINTEA
chamou a atenção dos diversos setores da sociedade civil representada pelos Fóruns Estaduais de
Educação de Jovens e Adultos e dos Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos
(ENEJA’s) para as reais condições dos educadores e educandos da EJA. Essas discussões
contribuíram para reformulações político - pedagógicas voltadas para o Direito dos Jovens e
Adultos à Educação Básica e da formação adequada aos educadores destinados a Educação
de Jovens e Adultos.
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Entretanto, além das discussões, é preciso garantir aos educadores reais condições de
formação inicial e continuada, para que os mesmos possam desenvolver um trabalho que
leve os sujeitos educandos da EJA possibilidades de se tornarem sujeitos conscientes de seu
papel cidadão na sociedade atual. AQUI NÃO. LA EM OUTRO TOPICO PODE SER.
A proposta de compreender a influência da história de vida dos sujeitos da EJA no processo
de aprendizagem buscou compreender, como método autobiográfico de pesquisa pode nos
levar a romper com a racionalidade técnica que a séculos domina a educação, ao permitir no
ensino aprendizagem a inclusão da subjetividade, desenvolvendo a reflexão interdisciplinar
e multirreferencializada a acerca dos conhecimentos da vida e a relação com o
ensino/aprendizagem na Educação de Jovens e Adultos.
As atuais mudanças que vêm processando nas unidades de ensino que contemplam a EJA
devem ser compreendidas enquanto processo de formação humana plena que, embora
instalado no contexto escolar deva levar em conta as formas de vida, trabalho e
sobrevivência dos Jovens e Adultos, que se colocam como principais destinatários dessa
modalidade de educação. Conseqüentemente se orienta pelos ideários da Educação Popular:
formação social, política e profissional.
Para Paulo Freire o conceito de Educação de Adultos vai se movendo na direção da
Educação Popular, na medida em que a realidade vai fazendo exigências à subjetividade e à
competência dos educadores, dando ênfase a uma pedagogia crítica formando sujeitos
críticos, reflexivos e autônomos.
Os sujeitos investigados nessa pesquisa são alunos do Programa SESI Educação do
Trabalhador, na empresa Rust Engenharia no Pólo Petroquímico de Camaçari, onde
funcionava a Escola Tempo de Aprender (nome escolhido pelos próprios alunos). São
operários da indústria de Revestimento e combate contra a corrosão, a contextualização da
vida desses sujeitos foram determinantes no processo de ensino aprendizagem, onde houve
uma disposição por parte dos pesquisados no que se refere a trabalhar a suas histórias de
vida, fazendo um paralelo sempre com conteúdos estudados.
Sendo assim a referida pesquisa demonstrou que a valorização da história de vida dos
sujeitos implica diretamente em desenvolver uma aprendizagem, permitindo compreender
51
que o método autobiográfico não só influencia como também contribui para uma
aprendizagem significativa dos sujeitos jovens e adultos. Tendo como resultado um sujeito
que se sentindo sua vida valorizada, aumenta sua auto-estima, sua autonomia, enfim sua
humanidade, tornando assim envolvido no processo de maneira contextualizada, assumindose como sujeito de sua aprendizagem.
“As práticas de repressão, opressão e irracionalidade têm como
efeito o ódio, o desespero, a desesperança, daí a prova de que são
atitudes nocivas ao homem, tendo como conseqüência a falta de:
autonomia, respeito, valorização e conscientização do sujeito, que
nos leva ao amor, elemento ou diria instrumento, para alcançar a
plenitude, o sujeito como um TODO. Essas são atribuições de uma
educação para libertar, só os instrumentos do amor proporcionam
uma Educação libertadora.” (FREIRE, 1979, P. 31)
52
REFERÊNCIA
ARROYO, Miguel G.. Da Escola Carente a Escola Possível. São Paulo Edições Loyola,
1981.
BEISIEGEL, Celso de Rui, Política e Educação Popular. (A teoria e a Prática de Paulo
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ANEXOS
Com este bonito texto, Frei Betto se referia ao amigo Paulo Freire, que no dia 02 de maio de
1997, cheio de planos e contando o tempo para ver a virada do século, encerrou sua
passagem por este mundo. Frei Betto escreveu este belíssimo texto sintetizando importantes
pontos do pensamento de Paulo Freire.
“Pedro viu a uva, ensinavam os manuais de alfabetização. Mas o professor Paulo Freire,
com o seu método de alfabetizar conscientizando, fez adultos e crianças, no Brasil e na
Guiné-Bissau, na Índia e na Nicarágua, descobrirem que Pedro não viu apenas com os olhos.
Viu também com a mente e se perguntou se uva é natureza ou cultura.
Pedro viu que a fruta não resulta do trabalho humano. É criação, é natureza. Paulo Freire
ensinou a Pedro que semear a uva é ação humana na e sobre a natureza. É a mão
multiferramenta, despertando as potencialidades do fruto. Assim como o próprio ser humano
foi semeado pela natureza em anos de evolução do cosmo.
Colher uma uva, esmagá-la e transformá-la em vinho é cultura assinalou Paulo Freire. O
trabalho humaniza, e ao realizá-lo, os sujeitos se humanizam. Trabalho que instaura o nó das
relações, a vida social. Graças ao professor, que iniciou sua pedagogia revolucionária com
os operários do SESI de Pernambuco, Pedro viu também que a uva é colhida por bóias-frias,
que ganham pouco, e comercializada por atravessadores que ganham melhor.
[...] Pedro viu a uva e Paulo Freire, mostrou-lhe os cachos, a parreira a plantação inteira.
Ensinou a Pedro que a leitura de um texto é tanto melhor compreendida quanto mais se
insere o texto no contexto do autor e do leitor. É dessa relação dialógica entre o texto no
contexto que Pedro extrai o pretexto para agir. No início e no fim do aprendizado é a práxis
de Pedro que importa. Práxis-teoria-práxis, num processo indutivo que torna o educando
sujeito histórico.
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[...] Agora Pedro vê a uva, a parreira e todas as relações sociais que fazem do fruto festa
no cálice de vinho, mas já não vê Paulo Freire que mergulhou no amor na manhã de 02 de
maio. Deixa-nos uma obra inestimável de competência e coerência.”
Assim Frei Betto encerra o seu texto/mensagem/homenagem, que com muita propriedade,
escreveu sintetizando, o pensamento de Paulo Freire: “Paulo deveria estar em Cuba, onde
receberia o título de doutor honoris causa, da Universidade de Havana. Ao sentir dolorido
seu coração que tanto amou, pediu que eu fosse representá-lo, De passagem marcada para
Israel, não me foi possível atendê-lo. Contudo antes de embarcar, fui rezar em torno do seu
semblante tranqüilo: PAULO VIA DEUS.” (BARRETO, 2005, p. 49).
APÊNDICE – A REPRESENTAÇÃO ESCRITA DOS EDUCANDOS
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Iolanda Carvalho dos Santos Freitas