Mastozoología Neotropical, 22(1):55-62, Mendoza, 2015
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Artículo
ASSEMBLEIA DE MORCEGOS EM REMANESCENTE DE
FLORESTA OMBRÓFILA MISTA NO PLANALTO
DE GUARAPUAVA, PARANÁ, BRASIL
João M. D. Miranda1 e Luciana Zago2
Departamento de Biologia. Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná. Campus CEDETEG. Rua: Simeão
Camargo Varela de Sá, 03. Vila Carli. Guarapuava, Paraná, Brasil. CEP 85040-080. [Correspondência: João M. D.
Miranda <[email protected]>]
2
Programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação. Universidade Federal do Paraná. Campus Centro Politécnico.
Setor de Ciências Biológicas. Jardim das Américas, Curitiba, Paraná, Brasil. Caixa Postal: 19031. CEP 81531-990.
1
RESUMO. A Mata Atlântica é um dos ecossistemas mais ameaçados e ricos do mundo, contando com cerca
de 113 espécies de morcegos. O objetivo do presente estudo foi caracterizar a assembléia de morcegos de um
remanescente de Floresta Ombrófila Mista a 1100 metros de altitude, no planalto de Guarapuava, estado do
Paraná, Brasil. Os morcegos foram capturados com dez redes de neblina instaladas acima do solo em 24 noites de amostragem durante 12 meses. Um total de 160 capturas de 144 indivíduos foi realizado, sendo estes
distribuídos em dez espécies, com a família Vespertilionidae sendo a mais representativa. A riqueza estimada
(Chao2) foi de 12.75 ± 4.14 espécies. Sturnira lilium e Molossus molossus foram as espécies mais abundantes,
com 36 capturas cada. Os morcegos insetívoros dominaram a assembléia tanto em número de espécies quanto
em número de indivíduos capturados. Sugerimos que essa assembléia possa ser caracterizada como uma fauna
tipicamente subtropical de altitude e pode ser relacionada aos ambientes de Floresta Ombrófila Mista, em
especial acima dos 1000 metros de altitude.
ABSTRACT. Bat assemblage in a remnant of Araucaria Pine Forest at Guarapuava Highlands, Paraná State,
Brazil. The Atlantic Forest is one of the most rich and threatened ecosystems in the world, and has about
113 bat species. The aim of this study was to characterize the bat assemblage in a remnant of Araucaria Pine
Forest at 1100 meters of altitude, at Guarapuava Highlands, Paraná State, Brazil. Bats were caught with ten
mist nets installed above ground in 24 night sampling distributed in 12 months. A total of 160 catches of 144
individuals was performed, these being allotted to ten species, and the Vespertilionidae family being the most
represented. The estimated richness (Chao2) was 12.75 ± 4.14 species. Sturnira lilium and Molossus molossus
were the most abundant species with 36 catches to each. The insectivore bats dominate the assemblage both
in number of species and number of individuals captured. We suggest that this assemblage can be characterized as a typical subtropical highland fauna and be related to environments of Araucaria Pine Forest, especially
above 1000 meters of altitude.
Palavras-chave: Chiroptera. Inventário de morcegos. Mata Atlântica. Vespertilionidae.
Key words: Atlantic rainforest. Bat inventory. Chiroptera. Vespertilionidae.
Recibido 17 febrero 2014. Aceptado 10 febrero 2015. Editor asociado: D Astúa de Moraes
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INTRODUÇÃO
A Mata Atlântica foi uma das maiores florestas
tropicais do mundo, abrigando uma das maiores
biodiversidades conhecidas e contando com
um grande número de endemismos (Fonseca,
1985). Atualmente esse bioma conta com uma
área remanescente estimada dentre 11 e 16% de
sua área original (Ribeiro et al., 2009) e consta
entre os 25 hotspots ou áreas prioritárias para
a conservação do mundo (Myers et al., 2000).
Esse status é conferido principalmente em
função do número de endemismos e de seu
atual quadro de destruição (Myers et al., 2000).
Existem cerca de 300 espécies de mamíferos
ocorrentes na Mata Atlântica, sendo que 30%
dessas são endêmicas (Paglia et al., 2012). Atualmente no Brasil são registradas 178 espécies
de morcegos, das quais ao menos 113 espécies
ocorrem na Mata Atlântica (Nogueira et al.,
2014). Porém, a despeito da grande riqueza
de morcegos na Mata Atlântica, dados sobre
a biologia e a ecologia desses animais permanecem insuficientemente conhecidos (Bernard
et al., 2010).
Embora a Mata Atlântica seja o bioma mais
estudado e conhecido do Brasil (Chiarello et
al., 2008; Bernard et al., 2010), poucos são
os estudos que caracterizam as estruturas de
suas assembléias (e.g., Bianconi et al., 2004;
Arnone e Passos, 2007; Bernardi e Passos,
2012; Carvalho et al., 2013). A maior parte
do conhecimento sobre os morcegos da Mata
Atlântica se concentra nas regiões próximas
às grandes cidades das regiões Sul e Sudeste
do Brasil (Bernard et al., 2010), especialmente
nas fisionomias da Floresta Ombrófila Densa
(Floresta Atlântica stritcu sensu) e na Floresta
Estacional Semidicidual (Floresta Atlântica de
Interior), sendo raros os estudos na Floresta
Ombrófila Mista (Floresta com Araucária) (Miretzki, 2003; Pacheco et al., 2007) assim como
também são raros os estudos em regiões mais
altas (>1000 metros de altitude) (e.g., Nobre et
al., 2009, 2013; Moras et al., 2013).
A Floresta Ombrófila Mista ocorre principalmente na região subtropical do Brasil e
tipicamente acima dos 800 metros de altitude
(Maack, 2010). Essa formação florestal é onde
se encontram os climas mais frios do Brasil
JMD Miranda e L Zago
com invernos severos e com geadas freqüentes
(Maack, 2010; IAPAR, 2013). O objetivo do
presente trabalho foi descrever uma assembleia
de morcegos ocorrente em um remanescente de
Floresta Ombrófila Mista localizado no Planalto
de Guarapuava a 1100 metros de altitude, no
estado do Paraná, sul do Brasil.
MATERIAIS E MÉTODOS
O estudo foi realizado no Parque Municipal das
Araucárias (PMA) localizado no Município de
Guarapuava, no estado do Paraná (25º21’16”S;
51º28’58”W). O PMA está inserido no bioma da
Mata Atlântica e possui uma área total de 104 ha
com 41 ha ocupados pela formação fitofisionômica
Floresta Ombrófila Mista ou Floresta de Araucária
(Cordeiro e Rodrigues, 2007). Além da Floresta
Ombrófila Mista, o PMA também possui áreas de
Campos Naturais e Várzeas (Cordeiro e Rodrigues,
2007; Hiert e Moura, 2007). O PMA encontra-se no
limite entre a zona urbana e rural de Guarapuava e
está inserido em uma matriz agro-florestal, sendo
que suas áreas naturais podem ser consideradas
contínuas a outras áreas incluindo a Área de Proteção
Ambiental Serra da Esperança com 206.555ha (IAP,
2009). O clima da região pode ser classificado como
Cfb ou Subtropical Úmido Mesotérmico sem estação
seca definida (Cordeiro e Rodrigues, 2007). A temperatura média mensal é de 17.1 oC, sendo a média
do mês mais quente (janeiro) de 20.8oC e do mês
mais frio (julho) de 12.8oC com uma precipitação
anual média entre 1800 e 2000 mm (IAPAR, 2013).
Foram realizadas 12 fases de campo mensais entre
setembro de 2012 e agosto de 2013. Foram amostradas duas noites consecutivas por mês, totalizando
24 noites. A cada noite foram armadas dez redes de
neblina, sendo seis redes de 6x3 m e quatro de 9x3 m.
Essas redes foram armadas a aproximados 50 cm
da altura do solo em trilhas já existentes, clareiras,
próximo a riachos, potenciais fontes alimentares e
possíveis abrigos, visando amostrar uma maior variedade de habitats. As redes permaneceram abertas
por seis horas após o pôr-do-sol, sendo revisadas
em intervalos de 30 minutos a 1 hora, totalizando
um esforço de 31104 m².h (segundo o proposto por
Straube e Bianconi, 2002).
Os morcegos capturados foram acondicionados
em sacos de algodão e levados à base de campo
para triagem. A triagem constituiu na identificação
e marcação com anilhas metálicas numeradas para
cada indivíduo. Os morcegos foram identificados
segundo as chaves de Gardner (2008) e Miranda et
al. (2011). Os primeiros exemplares capturados de
57
MORCEGOS DO PARQUE MUNICIPAL DAS ARAUCÁRIAS
cada espécie foram coletados e tombados na Coleção
Científica de Mastozoologia da Universidade Federal
do Paraná como material testemunho do trabalho
segundo a licença 34884-1 (ICMBio). As capturas,
o manejo e os procedimentos dos animais seguiram
as indicações da American Society of Mammalogists
(Sikes et al., 2011).
O sucesso de captura foi calculado a partir da
divisão do número total de capturas pelo esforço
amostral e foi representado em número de capturas/m2.h. A riqueza estimada de morcegos foi
calculada através do estimador não paramétrico
Chao de segunda ordem (Chao2) através de 1000
re-amostragens (bootstraping) dos dados originais.
A avaliação do esforço amostral foi feita através
da análise de complementariedade, dada pela percentagem das espécies registradas em relação ao
número estimado de espécies. Além disso, também
foi construída uma curva de rarefação baseada em
um algoritmo de função γ-log para aleatorizações
das amostras (Krebs, 1989).
Cada espécie de morcego registrada foi avaliada
quanto à guilda trófica (GT), número de indivíduos
capturados (N), taxa de recaptura (REC), abundância
relativa (AR) e índice de constância (IC). As GTs
foram baseados em Gardner (1977) e Simmons e
Voss (1998). A REC foi dada pela percentagem de
indivíduos recapturados em relação ao total de capturas de uma dada espécie. A AR foi dada pela percentagem de indivíduos capturados de cada espécie
em relação ao total de morcegos capturado. O IC foi
calculado pela frequência (percentagem) de fases de
campo em que cada espécie foi registrada (Bianconi
et al., 2004; Carvalho et al., 2013). Baseando-se no
IC as espécies foram classificadas como: Comum
(IC≥50%), Intermediária (25%≤IC<50%) ou Rara
(IC<25%). Todas as análises foram desenvolvidas
no Software PAST® versão 2.14 (Hammer, 2012) e
o nível de significância considerado foi de p < 0.05.
RESULTADOS
Foram realizadas 160 capturas (incluindo 16
recapturas de cinco espécies), sendo registrados 144 indivíduos e uma taxa de 10% de
recapturas. O sucesso de captura foi de 0.0051
capturas/m2.h. Foram registradas dez espécies
pertencentes a oito gêneros e três famílias (Tabela 1). A riqueza estimada para o PMA foi de
12.75 ± 4.14 espécies (Chao2), indicando que a
presente amostragem foi de 78.4% da riqueza
estimada. A análise de rarefação indica que
90% das espécies amostradas seriam atingidas
Tabela 1
Morcegos registrados no Parque Municipal das Araucárias, Guarapuava, Paraná, seguidos por seus respectivos:
guildas tróficas (GT), número de indivíduos capturados (N) (número de recapturas entre parênteses), taxa de
recapturas (REC), abundância aelativa (AR) e índice de constância (C). FRU = Frugívoros; INS = Insetívoros
Aéreos; CO = comum; INT = intermediária; RA = rara.
Táxon
GT
N
REC
AR
IC
Artibeus fimbriatus Gray, 1838
FRU
2
-
1.4%
RA
Pygoderma bilabiatum (Wagner, 1843)
FRU
1
-
0.7%
RA
Sturnira lilium (É. Geoffroy, 1810)
FRU
36 (5)
12.2%
25%
CO
INS
36 (7)
16.3%
25%
CO
Eptesicus furinalis (d’Orbigny, 1847)
INS
12
-
8.3%
CO
Eptesicus taddeii Miranda, Bernardi & Passos, 2006
INS
13
-
9%
CO
Histiotus velatus (I. Geoffroy, 1824)
INS
14 (2)
12.5%
9.7%
CO
Lasiurus blossevillii (Lesson & Garnot, 1826)
INS
1
-
0.7%
RA
Myotis izecksohni Moratelli, Peracchi, Dias & Oliveira, 2011
INS
16 (1)
5.9%
11.1%
INT
Myotis ruber (É. Geoffroy, 1806)
INS
13 (1)
7.1%
9%
CO
Família Phyllostomidae
Família Molossidae
Molossus molossus (Pallas, 1766)
Familia Vespertilionidae
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com 85 indivíduos capturados. A curva de
rarefação indica uma estabilização a partir de
20 capturas, porém, permanece subindo até o
final das amostragens (Fig. 1).
As espécies mais abundantes foram Sturnira
lilium e Molossus molossus que somadas
representaram 50% do total de capturas
(Fig. 2A). A assembléia apresentou mais
espécies comuns que espécies raras ou
intermediárias (Fig. 2B; Tabela 1). Sturnira
lilium, M. molossus e H. velatus apresentaram as
maiores taxas de recapturas (>12%). Por outro
lado, P. bilabiatum, L. blossevillii e A. fimbriatus
foram as espécies com menores abundâncias
relativas e foram consideradas raras. A guilda
trófica mais representada em número de
espécies e em número de indivíduos capturados
foi de morcegos insetívoros, contando com sete
espécies e 65.3% dos indivíduos (Tabela 1).
DISCUSSÃO
O esforço utilizado no presente trabalho foi
suficiente para amostrar quase 80% da riqueza estimada de morcegos do PMA, embora a
curva de rarefação não tenha apontado uma
estabilização no aumento da riqueza. O valor
de sucesso de captura foi baixo comparado a
outros estudos realizados na Mata Atlântica
(e.g., Bernardi e Passos, 2009; Nobre et al.,
2009; Carvalho et al., 2009; 2013), porém foi
maior ou similar outros estudos (e.g., Bianconi
et al., 2004; Arnone e Passos, 2007; Moras et
JMD Miranda e L Zago
al., 2013; Nobre et al., 2013). Comparativamente a outros estudos na mata Atlântica
brasileira a riqueza foi baixa (e.g., Bianconi
et al., 2004; Arnone e Passos, 2007; Bernardi
e Passos, 2009; Carvalho et al., 2013), porém
foi similar a outras áreas de montanhas ou
em planaltos (e.g., Modesto et al., 2008; Nobre
et al., 2009; Moras et al., 2013). Esses baixos
valores parecem ser relativos à altitude e ao
clima subtropical encontrado na área de estudo.
De fato, Patterson et al. (1996) apontaram que
existe uma relação negativa entre a altitude e
a riqueza e também em relação ao número de
capturas. Além disso, Stevens (2013) apontou
que a latitude e a altitude seriam os principais
fatores afetando a riqueza das assembléias de
morcegos de Mata Atlântica.
Bergallo et al. (2003) basearam-se em dados
da região sudeste do Brasil e sugeriram que
um esforço entre 750 e 1000 capturas seria
capaz de avaliar adequadamente assembleias de
morcegos da Mata Atlântica. Por outro lado,
em altas latitudes ou altitudes (ambos os fatores
caracterizando ambientes mais frios) torna-se
muito difícil atingir esse total de capturas,
sendo necessários vários anos de amostragens
para tal (extrapolando com base em nossa taxa
de captura). Assim é possível que em regiões
com menor riqueza de espécies como no sul
do Brasil (Passos et al., 2010; Stevens, 2013)
um menor esforço de capturas seja capaz de
amostrar adequadamente a riqueza de morcegos
de uma determinada localidade.
A riqueza registrada
no presente trabalho
representa 5.6% das 178
espécies de morcegos
registradas para o Brasil
(Nogueira et al., 2014),
8.8% daquelas registradas
para a Mata Atlântica
Fig. 1. Curva de rarefação de
espécies (±95%; intervalo de
confiança) morcegos em função no número de indivíduos
capturados no Parque Municipal
das Araucárias, Guarapuava,
Paraná, Brasil.
MORCEGOS DO PARQUE MUNICIPAL DAS ARAUCÁRIAS
59
Fig. 2. (A) Abundância relativa
e (B) Índice de constância de
cada espécie registrada no Parque Municipal das Araucárias,
Guarapuava, Paraná, Brasil.
(Paglia et al., 2012), 15.6% daquelas registradas
para o Paraná (Passos et al., 2010) e 30% das
espécies registradas para a formação da Floresta
Ombrófila Mista (Miretzki, 2003; Marques et al.,
2011). Além disso, o presente estudo acrescenta
cinco novas espécies (A. fimbriatus, P. bilabiatum,
E. taddeii, E. furinalis e M. izecksohni) à lista
de mamíferos do Município de Guarapuava
(Valle et al., 2011), considerado parte de uma
região prioritária para inventários de morcegos
(Miretzki, 2003; Bernard et al., 2010).
Em conformidade com outros estudos realizados no sul do Brasil, S. lilium consta como a
espécie mais abundante ou entre as mais abundantes das assembléias de morcegos, incluindo
áreas urbanas (e.g., Reis et al., 2000; Arnone e
Passos, 2007; Zanon e Reis, 2007; Miranda et
al., 2008, 2009; Bernardi e Passos, 2012; Pires
e Fabián, 2013). Já a abundância relativa de M.
molossus encontrada no presente trabalho pode
ser explicada pelo grande número de capturas
realizadas próximas a um abrigo (oco de árvore-imbuia, Ocotea porosa). Além disso, M. molossus
é considerada uma espécie bastante comum
e apresenta uma ampla
distribuição geográfica,
ocorrendo em uma grande variedade de habitats,
incluindo áreas alteradas e
urbanas (Fábian e Gregorin, 2007; Gardner, 2008;
Bernardi et al., 2009; Passos et al., 2009; Pacheco
et al., 2010). Essas duas
espécies comuns sendo
as mais abundantes na assembléia do PMA podem
indicar as alterações do
ambiente bem como sua
proximidade com a área
urbana de Guarapuava.
A assembleia de morcegos do PMA apresentou
mais espécies comuns que espécies intermediárias e raras, assim como foi encontrado
também por Bianconi et al. (2004). Quatro
dessas espécies comuns estavam entre as que
apresentam alguma recaptura (Tabela 1). Tanto
a constância quanto a presença de recapturas
podem indicar que essas espécies possuem áreas
de vida mais restritas e podem ser fiéis à área
(Flemming et al., 1972; Kaku-Oliveira et al.,
2011). Os morcegos que apresentam abrigos
permanentes tendem a apresentar fidelidade à
área do abrigo (Kunz e Lumsden, 2003), como
foi para M. molossus e possivelmente também
para S. lilium, H. velatus, M. izecksohni e
M. ruber no presente estudo.
Ao contrário do que ocorre de maneira geral
na Mata Atlântica onde os morcegos frugívoros
dominam as assembléias (e.g., Reis et al., 2000;
Bianconi et al., 2004; Faria et al., 2006; Bernardi
e Passos, 2012), no presente estudo os morcegos
insetívoros dominaram a comunidade. A família Vespertilionidae foi a mais representativa
contando com o maior número de espécies
(6) e também de indivíduos capturados (45.1%
60 Mastozoología Neotropical, 22(1):55-62, Mendoza, 2015
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dos indivíduos). Em outras localidades amostradas de Floresta Ombrófila Mista, a família
Verpertilionidae também apresentou a maior
riqueza (Miranda et al., 2008; Pulchério-Leite,
2008; Marques et al., 2011). Além disso, outras
formações fitofisionômicas da Mata Atlântica
amostradas em maiores altitudes ou latitudes
também mostram uma maior riqueza de
morcegos vespertilionídeos em detrimento de
morcegos de outras famílias (Bernardi et al.,
2009; Bracamonte, 2010; Mohr et al., 2011;
Bernardi e Passos, 2012). A substituição de
morcegos filostomídeos por vespertilionídeos
em regiões de maiores altitudes e/ou latitudes parece ligada às limitações impostas pela
temperatura sobre os primeiros, uma vez que
a família Phyllostomidae em geral possui uma
distribuição tipicamente tropical com poucas
espécies alcançando os subtrópicos (Willig e
Secler, 1989; Willig et al. 2000; Stevens 2004).
Por outro lado, as espécies da família Vespertilionidae ocorrem tanto nos trópicos quanto nos
subtropicos além de regiões temperadas (Willig
e Selcer 1989; Willig et al. 2000). Essa maior
riqueza de morcegos vespertilionídeos também
parece ser uma característica das assembleias de
morcegos subtropicais (Willig e Selcer, 1989),
como observado no presente trabalho.
Miretzki (2003) apontou que a região centrosul do Paraná é prioritária para estudos com
morcegos. O presente trabalho, além de aumentar a lista de espécies de morcegos do município
(Valle et al., 2011) em cinco espécies, registra
algumas espécies relativamente incomuns e
recém descritas como M. ruber, M. izekshoni e
E. taddeii. Trabalhos de levantamentos possuem
uma importância ligada ao fornecimento de
dados sobre a ocorrência e a distribuição de
espécies, bem como sobre a caracterização de
suas assembléias. Assim, trabalhos como este
são essenciais para a elaboração de estratégias
de conservação e políticas públicas voltadas
à conservação da natureza (Bernard et al.,
2010; 2013).
AGRADECIMENTOS
Agradecemos à CAPES pela bolsa de estudos concedida à
Luciana Zago. Agradecemos também o valoroso auxílio em
campo das seguintes pessoas: Sidnei Pressinate Júnior, Keyti
JMD Miranda e L Zago
Lílian da Silva, Luana Almeida Pereira, Sabrina Marchioro
Gonçalves e Katrin Goede.
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assembleia de morcegos em remanescente de floresta