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CAPITAL SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO RIO GRANDE DO SUL
Everton Santos1
Hemerson Luiz Pase2
INTRODUÇÃO
A identificação e diagnóstico dos problemas do Brasil, em particular, e dos países
em desenvolvimento, em geral, é lugar comum na literatura das ciências sociais. Problemas
como a pobreza, concentração de riqueza, a exploração do trabalho, entre outros, receberam
um tratamento especial por boa parte da intelectualidade latino americana que procuravam
explicar nossa situação de subdesenvolvimento quer seja através da “lei das vantagens
comparativas” como a concepção clássica de Paul Samuelson, que ressaltava as vantagens
que teríamos na especialização como produtores primários em relação aos países
industrializados, como forma de superarmos nosso atraso, ou mesmo através da crítica da
CEPAL a este autor, que demonstrava que, ao contrário do que Samuelson defendia, o
nosso subdesenvolvimento em relação aos chamados centros desenvolvidos estava ligado
exatamente à falta de dinamismo de nossas estruturas produtivas, baseado num punhado de
produtos primários, com pouco desenvolvimento industrial e tecnológico que insistíamos
em produzir (Mantega, 1990)3. Assim, a saída estava na industrialização e não na
especialização em produtos primários.
O lugar comum deste tipo de explicação sobre as mazelas brasileiras recaía sempre
em ilações exógenas e macro analíticas dos dilemas nacionais. As possibilidades do
desenvolvimento ligavam-se a superação de certos obstáculos estruturais do sistema
capitalista internacional.
Não desconsiderando a importância desta bibliografia para a compreensão do
processo histórico brasileiro, pretendemos neste trabalho, inflexionar por uma episteme que
explique o Brasil e particularmente o Rio Grande do Sul dando acento aos problemas de
ordem endógena em detrimento das exógenas. Em outras palavras, explicar o Brasil pelo
Brasil.
Interessa-nos assim, sublinhar as tarefas que nos cabe realizar para o
desenvolvimento, independentemente, num primeiro momento, das questões estruturais da
sociedade internacionalizada que estamos inseridos e que somos parte. Assim, o
desenvolvimento aqui entendido constitui-se na ampliação das capacidades humanas da
população de um país ou região nas suas múltiplas dimensões, isto é, ampliação da
longevidade das pessoas, de sua saúde, de seus níveis de instrução e da participação na vida
em comunidade (Sen, 2000). A realidade brasileira e gaúcha, particularmente, carece em
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O autor é pesquisador e professor no Centro Universitário Feevale, onde coordena o Grupo de Pesquisa em
Desenvolvimento Regional e o Mestrado Profissional em Inclusão Social e Acessibilidade. É também professor na
Universidade Luterana do Brasil, no Programa de Pós-graduação em Odontologia. Graduado em Ciências Sociais, Mestre
e Doutor em Ciência Política pela UFRGS. [email protected].
2
O autor é pesquisador da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária- FEPACRO e Professor da Universidade de
Caxias do Sul. Graduado em Filosofia, Mestre em Desenvolvimento Rural e Doutor em Ciência Política pela UFRGS. Email [email protected].
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No interior da Cepal encontramos importantes intelectuais brasileiros entre eles Celso Furtado, Maria da Conceição
Tavares, Fernando Henrique Cardoso entre outros, que desenvolveram a chamada “Teoria da Dependência”.
2
várias destas dimensões, pois a democracia que construímos até o momento, muito embora
tenha vencido etapas importantes, não foi suficiente para impulsionar um processo de
desenvolvimento consistente, principalmente para os setores mais pobres da população.
Se observarmos os últimos vinte anos da agenda política brasileira desde a transição
democrática iniciada com as eleições indiretas em 1985, veremos um longo painel. Nele, a
construção democrática e as possibilidades do desenvolvimento constitui-se num caminho
tortuoso que podemos resumir em três grandes desafios. O primeiro, foi o desafio
“político”, onde transitamos de um regime autoritário para um regime democrático no
governo Sarney, o segundo foi o “econômico”, a estabilidade monetária com Fernando
Henrique Cardoso. O terceiro desafio foi o “social” com a reorganização dos programas
sociais e a diminuição das desigualdades sociais no governo Lula nos últimos anos4.
Olhando estes desafios dentro do mesmo processo histórico perceberemos que a construção
da democracia e do próprio desenvolvimento conseqüentemente constitui-se em tarefa
complexa e lenta. Todavia, hoje muito mais do que na década de oitenta a agenda social
não somente se impõe como encontra condições mais adequadas (políticas e econômicas)
para ser conduzida.
A bibliografia especializada que segue uma perspectiva endógena (Putnam, 2000)
tem enfatizado que às possibilidades do desenvolvimento estaria mais relacionado ao
volume de capital social existente em uma determinada sociedade, ou seja, com laços de
solidariedade, confiança interpessoal e sistemas de participação social, do que com fatores
exógenos, como aludimos anteriormente. Que estas características cívicas, contribuem para
o processo de desenvolvimento, ou seja, daquela ampliação das capacidades humanas de
que nos fala Sen (2000), quer seja através da comunicação, coordenação, troca ou ajuda
mútua para a construção de bens e serviços que beneficiem amplas parcelas da população.
Destarte, neste trabalho, procuraremos analisar a relação existente entre capital
social e desenvolvimento a partir do estudo de duas regiões do Rio Grande do Sul. O
COREDE Nordeste e o COREDE Vale do Rio dos Sinos. Nossa hipótese central afirma que
o capital social impulsiona o desenvolvimento, cuja determinação ocorre
proporcionalmente ao empoderamento (empowerment), enquanto capacidade de decidir e
deliberar da sociedade.
A metodologia utilizada recolhe os resultados de pesquisa do Grupo de Pesquisa
em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE e do projeto de pesquisa “Capital social e
desenvolvimento regional: a importância do capital social no desenvolvimento territorial do
COREDE Nordeste”. Ambos foram Surveys aplicados nos respectivos coredes totalizando
cerca de 1200 questionários. Trabalhamos com erro amostral 4% e confiança de 95%.
A confiança, solidariedade e reciprocidade serão indicadores de existência de
capital social, que será considerado variável independente em relação ao desenvolvimento
socioeconômico, medido pelo Índice de Desenvolvimento Socioeconômico – IDESE. O
empoderamento é variável interveniente, pois, configura-se como o elo de ligação entre o
capital social e o desenvolvimento.
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Muito embora nas últimas décadas a desigualdade social na América Latina tenha sido uma constante observando-se
longitudinalmente, nos últimos anos há uma leva inflexão de acordo com os últimos dados do IBGE na diminuição dos
percentuais de pobreza no Brasil.
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1 A CULTURA IMPORTA
Segundo a perspectiva que adotamos nesse trabalho, a cultura política de uma
sociedade influencia decisivamente o desenvolvimento social, econômico e político das
regiões. A confiança, reciprocidade e solidariedade, embasadas em normas claras e na livre
e vigorosa circulação de informações definem o capital social, cuja potencialidade de obter
resultados e / ou bens tangíveis é inegável embora, muitas vezes, insuficiente (PUTNAM,
2000).
Aplicando esta perspectiva teórica ao caso do Rio Grande do Sul, Bandeira (2003),
estabelece uma diferença regional no Estado muito semelhante ao que Putnam (2000) fez
na Itália. Como uma primeira aproximação haveria uma diferença entre o “Norte colonial”,
cuja matriz é de imigrantes europeus, com existência de pouca escravidão e predomínio do
minifúndio e em contraste, nós teríamos no “Sul”, uma matriz com o predomínio do
latifúndio e o uso extensivo da mão-de-obra escrava.
No que se refere à primeira região, Bandeira (2003) ressalta que estas zonas
coloniais de imigração estão dotadas de mais capital social do que as da região sul. Nas
primeiras encontramos uma infinidade de associações recreativas, clubes sociais,
sociedades de canto, de atiradores e artísticas, bem como uma intensa vida social
colaborativa e cooperativa entre os primeiros colonos que aqui chegaram no século XIX.
Nas áreas de colonização italiana, por exemplo, também se registra esta cooperação, um
grupo fazia a colheita quando um colono estava doente, assim como a conservação da
estrada feita por todos, bem como os acordos para a construção do cemitério, a construção
da capela por iniciativa dos pequenos proprietários rurais (De Boni e Costa, 1979 apud
Bandeira, 2003).
Assim, o nível de confiança inerente numa sociedade é considerado essencial para o
fortalecimento do desenvolvimento das regiões. Coerentemente com esta assertiva teórica,
são os COREDES em análise mais ao Norte, COREDE Nordeste e COREDE Vale do Rio
dos Sinos os melhores posicionados do estado em termos de IDESE.
A Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser (FEE) calcula
o Índice de Desenvolvimento Socioeconômico – IDESE para o Rio Grande do Sul,
municípios e Coredes. O Idese é um índice sintético, inspirado no IDH, que abrange um
conjunto amplo de indicadores sociais e econômicos classificados em quatro blocos
temáticos: Educação; Renda; Saneamento e Domicílios; e Saúde. O Idese varia de zero a
um e, assim como o IDH, permite que se classifique o Estado, os municípios ou os Coredes
em três níveis de desenvolvimento: baixo (índices até 0,499), médio (entre 0,500 e 0,799)
ou alto (maiores ou iguais que 0,800).
Muito embora sejam considerados de índices médios, os COREDES em análise
ficam nas primeiras posições do estado. O COREDE Vale do Rio dos Sinos está no 3º lugar
com 0,769 no ranking do Índice de Desenvolvimento Socioeconômico – IDESE, para o ano
de 2003 acima do índice do próprio Rio Grande do Sul que é de 0,754. O COREDE
Nordeste também ocupa as primeiras classificações com o 5º lugar com um índice de 0,752,
também próximo do índice do estado. Se compararmos estes índices com a outra ponta,
com os COREDES mais ao sul, nós teremos o COREDE Campanha com 0,745, no 10º
lugar e o COREDE Sul com 0,734, no 13º lugar.
4
Pesquisas efetuadas na Região Sul (açambaracando os COREDES Sul e Campanha)
mostram que os índices de capital social lá são baixos. O Gráfico 1 indica que a região sul
possui baixos estoques de capital social na comparação com as demais5.
Gráfico 1 Nível de Confiança Interpessoal COREDES e Região Sul
83,3%
80,8%
69,2%
30,8%
19,2%
Nordeste
15,1%
Vale do Sinos
Região Sul
Se pode confiar (Pode-se confiar na maior parte das pessoas)
Não se pode confiar (É preciso muito cuidado ao tratar com outras pessoas)
Fonte: Projeto de Pesquisa “Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância do capital social
no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste”, pesquisa “Capital Social, Democracia,
Desempenho Institucional e Desenvolvimento Sustentável no Vale do Rio dos Sinos” do Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE, e pesquisa “Desenvolvimento Regional,
Cultura Política e Capital Social” do Laboratório de Observação Social – LABORS/UFRGS.
Total: 2679
Numa perspectiva de comparação espacial, o Gráfico 1 aponta 80,8% no COREDE
Nordeste e 69,2% no COREDE Vale do Rio dos Sinos e 83,3% na Região Sul
respectivamente de pessoas que disseram que “não se pode confiar nas pessoas”. Na
resposta “se pode confiar nas pessoas”, aparecem respectivamente 19,2% para o COREDE
Nordeste e 30,8% no Vale do Rio dos Sinos e em último lugar a Região Sul 15,1%. De uma
forma geral podemos verificar que estas duas regiões (Nordeste e Vale do Sinos) estão mais
dotadas de capital social e conseqüentemente de IDESEs melhores para o ano de 2003 e
2004.
Contudo no ano de 2004 o COREDE Nordeste cai para a 17° posição no IDESE
mesmo tendo capital social mais alto do que no Sul. Como explicar este fato? Devemos
observar que no ano de 2004 o COREDE Nordeste passou por uma alteração significativa,
perdendo o município de Vacaria que possuía um IDESE alto e incorporando outras com
IDESE mais baixo do COREDE Hortências. Essa é a razão da piora do IDESE do
COREDE Nordeste que cai da 5° posição (2003) para a 17° (2004). Já o COREDE
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Muito embora a formulação da pergunta (para a Região Sul) não seja idêntica a nossa pesquisa, incorporamos este dado
de Pesquisa do Laboratório de Observação Social – LABORS/UFRGS, por julgarmos que há uma semelhança que mais
ajuda na compreensão do que prejudica, já que a teoria é indicativa de certos padrões que o dado corrobora.
5
Hortências melhorou de 17° (2003) para 7° (2004). Observamos que houve uma inversão
em favor do COREDE Hortências.
O COREDE Vale do Rio dos Sinos permaneceu inalterado tanto em termos
geográficos, quanto sócio econômicos na 3° posição no ranking do IDESE, bem como os
COREDES Sul e Campanha que ficaram relativamente nas mesmas posições. O Sul
cresceu uma posição em 2004 e a campanha caiu uma posição em 2004 em seu IDESE,
pois não houve alteração como no Nordeste. Ou seja, muito provavelmente, guardados os
limites geográficos de 2003, o COREDE Nordeste teria aumentado seu IDESE,
corroborando a tese de que o capital social influencia nos índices de desenvolvimento.
Comparando o COREDE Vale do Rio dos Sinos e os COREDES Sul e Campanha
para 2004, nós observamos que houve um crescimento de 0,004 no IDESE do Vale do Rio
dos Sinos contra 0,002 dos COREDES ao sul. O primeiro COREDE dotado de maior
volume de capital social, cresceu mais.
Todavia, quando verticalizamos a análise no que se refere aos níveis de confiança
interpessoal, perguntando a respeito da confiança nos vizinhos com a pergunta: “Se
precisasse viajar por um ou dois dias da semana, o/a sr/a poderia contar com vizinhos para
cuidar da sua casa e/ou filhos?”. O COREDE Nordeste passa à frente do COREDE do Vale
do Rio dos Sinos.
Gráfico 2 Nível de Confiança nos Vizinhos
76,0%
71,3%
19,4%
12,6%
9,3%
Vale dos Sinos
Sim
11,4%
Nordeste
Provavelmente
Não
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância do
capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de Pesquisa em
Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.
Total: 1195
No Gráfico 2 observamos que no Nordeste 76,0% das pessoas confiam em seus
vizinhos e no Vale do Rio dos Sinos 71,3%. Entretanto, chama a atenção o fato de que
19,4% no COREDE Vale do Rio dos Sinos responderam que “Não confiam em seus
vizinhos”, contra 11,4% no COREDE Nordeste que responderam negativamente, o que
demonstra ter o COREDE Nordeste um percentual neste gráfico de maior confiança em
seus vizinhos do que no COREDE do Vale do Rio dos Sinos.
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Nesta mesma direção, o Gráfico 3 vem reforçar os percentuais maiores de
confiança interpessoal no COREDE Nordeste. Quando perguntamos: “Em uma situação de
emergência, como a doença de um familiar ou perda de emprego, o/a sr/a receberia ajuda
de familiares, vizinhos ou colegas de trabalho?”.
Gráfico 3 Nível de confiança em Familiares, Vizinhos e Colegas de Trabalho
88,6%
79,9%
18,8%
8,1%
3,3%
1,3%
Vale dos Sinos
De colegas de trabalho
Nordeste
De vizinhos
De familiares
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância
do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE
Total: 1039
Como podemos observar, no Gráfico 3, o “familismo”, na perspectiva posta por
Fukuyama (1996) é mais forte no COREDE do Vale do Rio dos Sinos com 88,6% de
pessoas que responderam que receberiam ajuda de seus familiares, contra 79,9% do
COREDE Nordeste. Coerentemente com este dado, no Nordeste, onde temos menos
“familismo”, 20,1% das pessoas receberiam ajuda de seus vizinhos ou colegas de trabalho,
contra 11,4% no Vale do Rio dos Sinos.
Se o Nordeste é menos “familista” e confia mais em seus vizinhos, teoricamente
esperávamos que houvesse mais confiança nas associações comunitárias
conseqüentemente. Pois o Gráfico 4 vai exatamente nesta direção demonstrando que
52,3% das pessoas que moram no COREDE Nordeste confiam muito nas associações
comunitárias e 6,9% não confiam. Das pessoas que moram no COREDE Vale do Rio dos
Sinos, apenas 41,6% disseram que confiam muito nas associações comunitárias (uma queda
de mais de 10%) e 18,4% disseram não confiar. Ou seja, este último dado indica que o
número de pessoas que não confiam nas associações comunitárias no COREDE Vale do
Rio dos Sinos é mais do que o dobro do Nordeste.
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Gráfico 4 Confiança nas Associações Comunitárias
52,3%
41,6%
40,8%
40,0%
18,4%
6,9%
Vale dos Sinos
Confia muito
Nordeste
Confia pouco
Não confia
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância
do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.
Total: 1190
Nos quatro gráficos analisadas na comparação entre os COREDES, observamos
que, a exceção da primeira em que perguntamos no sentido genérico sobre a confiança
interpessoal, o COREDE Nordeste se sobressai positivamente na dotação de capital social
em relação ao COREDE do Vale do Rio dos Sinos em todas restantes. Evidencia-se maior
solidariedade e colaboração entre os cidadãos na primeira região comparativamente
(COREDE Nordeste).
No Gráfico 5 observamos que mais da metade da população do COREDE Nordeste
participa de algum grupo ou organização (56,3%), contra apenas 18,4% da região do Vale
do Rio dos Sinos.
8
Gráfico 5 Participação em Grupos ou Organizações
81,6%
56,3%
43,7%
18,4%
Vale dos Sinos
Sim
Nordeste
Não
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância
do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.
Total: 1198
Quando procuramos medir os níveis de solidariedade entre as regiões, o COREDE
Nordeste nos surpreende positivamente, pois conforme o Gráfico 6, 61,4% das pessoas
responderam que nos últimos anos tentaram resolver algum problema local associados a
outras pessoas, enquanto praticamente a metade, 32,5% dos entrevistados no COREDE
Vale do Rio dos Sinos, tentaram resolver algum problema com a ajuda da comunidade. Ou
seja uma queda significativa.
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Gráfico 6 Nos últimos anos, o/a sr/a tentou resolver algum problema local do
bairro/comunidade junto com outras pessoas?
67,5%
61,4%
38,6%
32,5%
Vale dos Sinos
Sim
Nordeste
Não
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância
do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.
Total: 1189
Observando o Gráfico 7 vemos que os estoques de capital social são maiores no
COREDE Nordeste em comparação com o COREDE Vale do Rio dos Sinos. Neste último
a média de capital social é de 0,292 e no Nordeste é de 0,426. Aplicando-se o teste t no
COREDE Nordeste temos capital social médio significativamente maior do que no
COREDE Vale do Rio dos Sinos(t=18,591;p=0,000).
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Gráfico 7 Índice de Capital Social COREDE Nordeste e Vale do Sinos6
71,6%
65,3%
33,8%
22,6%
5,8%
0,8%
Vale do Sinos
Alto
Corede Nordeste
Médio
Baixo
Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância
do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de
Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.
Total: 1206
Com índices melhores de Capital Social no Nordeste, não é surpreendente que suas
posições no ranking dos IDESEs tenham saltado da 7º posição no ano de 2000 para a 5º
posição em 2003, ao passo que o COREDE Vale do Rio dos Sinos manteve-se na 3º
posição durante estes três anos. Assim, o capital social pode estar funcionando como um
rio caudaloso, como uma variável importante, aliada a outras, que incide sobre os índices
de desenvolvimento da região. Neste sentido analisando mais detidamente o COREDE do
Vale do Rio dos Sinos (com nossos índices já construídos de capital social) e procurando
estabelecer uma relação entre capital social e desenvolvimento, conforme nossa hipótese
central, nós cruzamos o ranking do IDESE dos municípios que compõe o COREDE com os
Índices de Capital Social (ICS) da região. Verificamos que os três primeiros colocados em
6
Este Índice de Capital Social (ICS) foi construído de forma idêntica para os dois COREDES a partir da seleção de 9
questões relativas ao capital social, são elas: “Em termos gerais, o senhor diria que se pode confiar nas pessoas ou não se
pode confiar nas pessoas?” Sim (peso 2), Não (peso 0); “Gostaria de saber se o senhor confia muito (peso 2), pouco (peso
1) ou não confia (peso 0) na: igreja, família, vizinhos, associações comunitárias, sindicatos”; “O senhor costuma
participar de: partidos políticos, reuniões políticos, comícios, associações comunitárias, associações religiosas,
associações sindicais, conselhos populares, ONG’s, orçamento participativo, abaixo assinados, manifestações ou
protestos, greves, ocupação de terrenos ou prédios públicos, outros” Sim (peso 2), Não (peso 0); “Nos últimos anos, o
senhor tentou resolver algum problema local do bairro/comunidade junto com outras pessoas? Sim (peso 2), Não (peso 0);
“Dentre os grupos que eu vou mencionar, quais deles existem no seu bairro: grupo político, grupo ou associação cultural,
grupo educacional, grupo esportivo, grupo de jovens, ONG ou grupo cívico, grupo baseado na comunidade étnica, grupos
de mulheres, outro” Sim (peso 2), Não (peso 0); “Atualmente o senhor participa de algum grupo ou organização?” Sim
(peso 2), Não (peso 0); “Se precisasse viajar por um ou dois dias, o senhor poderia contar com vizinhos para cuidar da sua
casa e/ou filhos?” Sim (peso 2), Provavelmente (peso 1), Não (peso 0); “Em uma situação de emergência como a doença
de um familiar ou perda de emprego, o senhor receberia ajuda:” familiares (peso 0), vizinhos (peso 2), colegas de trabalho
(peso 2); “Se um projeto da comunidade não lhe beneficia diretamente, mas pode beneficiar outras pessoas do seu bairro,
o senhor contribui pra este projeto?” Sim (peso 2), Não (peso 0).
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termos de IDESE como Canoas (0,820), Esteio (0,819) e Campo Bom (0,813) apresentam
igualmente ICS, 47,1, 24,93% e 23,9% respectivamente. Já os três últimos colocados em
termos de IDESE, pontuam pouco ou nada em ICS, Portão 2,5, Nova Santa Rita (0,0),
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Nova Hartz (0,0) conforme Gráfico 8 abaixo .
Gráfico 8 Correlação IDESE e Índice de Capital Social COREDE Vale dos Sinos
0,820
0,819
0,813
0,678
0,632
0,613
47,1%
24,9%
23,9%
2,5%
1ª Canoas
2ª Esteio
IDESE 2004
3ª Campo
Bom
12ª Portão
0,0%
13ª Nova
Hartz
0,0%
14ª Nova
Santa Rita
Índice de Capital Social Alto
Fonte: Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE e Fundação de
Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE).
No COREDE Nordeste novamente encontramos esta relação. Verificamos que os
três primeiros colocados em termos de IDESE como Lagoa Vermelha (0,777), Tapejara
(0,761) e Sananduva (0,757) apresentam igualmente ICS mais altos, 28,4%, 10,4% e 26,1%
respectivamente. Já os três últimos colocados em termos de IDESE, pontuam pouco ou
nada em ICS, Tupanci do Sul 1,4%, Pinhal da Serra 4,7% e Santa Cecília 1,8% conforme
Gráfico 9.
7
É importante ressaltar que os dados da pesquisa aplicados em cada cidade do COREDE vem ao encontro do que nossa
hipótese sugere. No entanto, para fins de generalização seriam necessárias futuras pesquisas que tenham amostras
representativas das populações dessas cidades, pois nossa amostra não é estatisticamente representativa destas populações.
Também é importante ressalvar que Nova Santa Rita e Nova Hartz entraram no sorteio da amostra, mas não foram
escolhidas no sorteio aleatório da região para aplicação dos questionários. Todavia, a indicação do índice de Portão dá um
indicador do comportamento destas cidades (Nova Santa Rita e Nova Hartz).
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Gráfico 9 Correlação IDESE e Índice de Capital Social COREDE Nordeste
0,777
0,761
0,757
0,643
0,645
28,4%
26,1%
10,4%
1,4%
1ª Lagoa
Vermelha
0,599
2ª Tapejara
4,7%
3ª
21ª Tupanci 22ª Pinhal
Sananduva
do Sul
da Serra
IDESE 2004
1,8%
23ª Santa
Cecília
Índice de Capital Social Alto
Fonte: Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE) e Projeto de
Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importância do capital social
no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste.
Neste trabalho estamos procurando estabelecer as relações entre capital social e
desenvolvimento, demonstrando o quanto este primeiro é benéfico para este último, no
entanto, as sociedades que não tenham construído capital social devem ser condenadas ao
desespero do determinismo histórico do atraso? Há na bibliografia especializada um
argumento de que o capital social pode ser impulsionado ou construído a partir de ações
institucionais, principalmente movidas pelo Estado (COLEMAN, 1990).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procuramos neste trabalho demonstrar a relação existente entre o capital social
e o desenvolvimento, cuja determinação ocorre proporcionalmente ao empoderamento
(empowerment), enquanto capacidade de decidir e deliberar de uma sociedade. Os dados
analisados referentes ao COREDE Nordeste e COREDE Vale do Rio dos Sinos
demonstram que estes possuem não somente os maiores índices de IDESE do Estado como
também os maiores escores de capital social. Estes dados ficaram mais nítidos quando
comparamos os IDESE destes COREDES com aqueles situados mais ao sul do estado.
Entretanto, a análise sobre o COREDE Nordeste ficou prejudicada devido ao fato da
mudança de seus limites territoriais para o COREDE Hortências. Todavia, na comparação,
entre os COREDEs do Vale do Rio dos Sinos, Sul e Campanha, o COREDE Vale do Rio
dos Sinos ainda coloca-se à frente em capital social e IDESE.
Quando particularizamos a análise, vemos que no caso do COREDE Vale do
Rio dos Sinos os municípios da região com maior dotação de ICS correspondem
exatamente aqueles que também possuem os maiores IDESES, aos passo que aquelas
cidades que possuíam ICS mais baixos, também ficaram com IDESEs mais baixos. No
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COREDE Nordeste aplicando-se o mesmo procedimento chegamos as mesmas conclusões,
os três primeiros municípios com ICS alto têm igualmente, em média, escores melhores de
IDESEs. Já os três últimos colocados nos ICS tem baixos indicadores de IDESEs.
Chama a atenção nos dados analisados o aspecto do “familismo” do COREDE
Vale do Rio dos Sinos, quando 88,6% dos entrevistados disseram que se precisassem de
ajuda provavelmente receberiam ajuda de familiares em detrimento de vizinhos ou colegas
de trabalho. Este dado vai ao encontro das hipóteses de Fukuyama (1996) e Putnam (2000)
que argumentam sobre os efeitos do processo de urbanização, industrialização que
enfraquecem os laços de solidariedade e tecido social, podendo a médio prazo
enfraquecerem ainda mais os estoques de capital social.
Por fim cabe ressaltar, que no Brasil a emergência da sociedade organizada e dos
movimentos sócias das últimas décadas estão relacionados à existência e / ou
desenvolvimento de relações de confiança, reciprocidade. O capital social materializado
nos movimentos sociais e organizações da sociedade produz um inegável empoderamento,
já que estes conseguem muito mais que visibilidade pública, incluindo aí, a obtenção de
políticas públicas segmentadas e diferenciadas. Todavia, não queremos com isso diminuir a
importância da incidência dos governos que através de políticas públicas, reformas, ajustes
administrativos e investimentos, também possam colaborar para o desenvolvimento
regional. As dotações de IDESEs certamente não são influência única do capital social, mas
estão relacionadas também as ações e políticas federais, estaduais e municipais que incidem
nestas regiões, que pesquisas outras poderão aferir estas dimensões não contempladas aqui.
Assim, um sinergismo entre institucionais e capital social, não somente é algo possível
como desejável para o desenvolvimento regional.
BIBLIOGRAFIA
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capital social na estruturação de uma cultura política participativa. Revista Sociologia e
Política, Curitiba, nº 21, p. 83 – 108, nov.
BAQUERO, Rute V. A. (2005). Empoderamento: questões conceituais e metodológicas. In:
Revista Debates. NUPESAL / UFRGS. N. 1, dez. Poa: UFRGS / Escritos, V.1. Pág. 69 – 84
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BOURDIEU, Pierre (1980). Le Capital Social: Notes Provisoires. In: Actes de la
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