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FACULDADE SETE DE SETEMBRO – FASETE
CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM LETRAS COM
HABILITAÇÃO EM PORTUGUÊS E INGLÊS
SUELLEN CHRISTINA DE FREITAS E SILVA
O PODER DE PERSUASÃO EM PROPAGANDAS DE TV
PAULO AFONSO – BA
NOVEMBRO/ 2009
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SUELLEN CHRISTINA DE FREITAS E SILVA
O PODER DE PERSUASÃO EM PROPAGANDAS DE TV
Monografia apresentada ao curso de graduação em
Letras – Habilitação em Português e Inglês, da
Faculdade Sete de Setembro – FASETE, como
requisito para avaliação conclusiva. Sob orientação
da profª. Ms.Maria do Socorro Pereira de Almeida.
PAULO AFONSO – BA
NOVEMBRO/ 2009
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DEDICATÓRIA
Há no mundo duas pessoas muito especiais para mim. Meu esposo, que em
muitos momentos proferiu palavras de ânimo, coragem e incentivo em meio
à tantas dificuldades vividas ao longo dessa árdua caminhada; minha filha,
jóia rara que tive o privilégio de ser presenteada pelo Senhor, para com seus
lindos olhos e doce sorriso, renovar as minhas forças, fazendo-me crer que
enquanto vida houver, haverá batalha, e em quanto houver batalha, vitórias
virão.
A vocês, Jó (Joanes) e Lelinha (Elen), dedico este trabalho e todo o meu
carinho, respeito e admiração.
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AGRADECIMENTOS
A Deus, criador do universo, ser supremo que me fez sua filha e deu-me sabedoria para que
pudesse concluir esta etapa de suma importância em minha vida. Agradeço-te Senhor.
Aos meus pais, que mesmo distantes, me incentivaram e se mostraram muito orgulhosos
diante da conclusão desta gratificante jornada estudantil.
Sou profundamente grata à Cema – avó materna, Cley – tio, Neuma e Déa – amigas, por
tomarem como filha, Elen, meu porto seguro, nos momentos em que precisei ausentar-me. Por
isso, jamais vou cansar de repetir, muito, muito, muito obrigada.
Com imenso apreço agradeço ao amigo Ailton Teixeira (Bilú) que em muito contribuiu para
que trilhasse esta longa caminhada e a conclui-se com dignidade.
Com carinho especial, agradeço ao meu avô Fernando, que desde muito cedo me incentivou a
ir sempre em frente, a partir de uma linda experiência de vida, determinação e grande
empenho no que diz respeito aos estudos.
De maneira especial agradeço às amigas, Adriana Ribeiro, Joranaide Alves, Maricleide de
Jesus e Tatiana Xavier, com as quais tive o grande privilégio de conviver por quatro anos,
durante noites, sábados e até mesmo infindos domingos e feriados. Compartilhamos tristezas,
alegrias e principalmente conhecimento. A vocês, o eterno carinho da minha amizade.
Ao corpo docente e administrativo da Escola Julimara e Colégio Montessori, instituições em
que trabalho, que sempre demonstrou muita compreensão nos momentos em que não pude me
fazer presente. Edy, Eulália, Jordana, Lucy, Marileide e Tânia muito obrigada pelo carinho e
compreensão.
Carinhosamente, agradeço a minha eterna mestra e amiga Sandra Silva, por acreditar em meu
potencial e ter aguçado minha mente para escolha do tema deste prazeroso trabalho. Muito
obrigada.
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Agradeço de forma especial à minha sábia orientadora Socorro Almeida, que com todo
carinho, dedicação, paciência e a bagagem (conhecimento) que traz em sua mala, me deu
forças para concluir esta etapa tão importante em minha vida.
Aos educadores Eloy Lago, Sávio Roberto, Sherry Morgana, Cleber Ataíde, Kárpio Siqueira,
Gercinaldo Moura e Isa Úrsole, por terem sido peças chaves para o caminho que pretendo
seguir. Muito obrigada por terem, a partir de atividades propostas, exigido o que pude dar de
melhor, para assim exercer com ímpeto a árdua arte de educar.
Com profundo carinho e apreço, agradeço a grande profissional prof. Especialista Sandra
Marcula, que a partir das suas aulas dinâmicas me fez amar ainda mais a prática de Língua
Portuguesa.
A minha grande e melhor amiga, Maria da Saúde, por se fazer presente em todos os
momentos da minha vida, me oferecendo palavras de conforto, dividindo tristezas, somando
alegrias e sempre me incentivando a trilhar por caminhos imbuídos de graça e paz.
Finalmente, a todos que, direta ou indiretamente, colaboraram para a conclusão dessa etapa.
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Se não conseguis convencê-los, confundi-os
HARRY TRUMAN
Nada persuade tanto as pessoas de pouco juízo quanto o que
elas não entendem
JEAN-FRANÇOIS PAUL
A arte de persuadir consiste tanto
mais
em
agradar
do
que
em
convencer, quanto os homens se
guiam mais pelo capricho do que pela
razão.
BLAISE PASCAL
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RESUMO
O presente trabalho visa analisar a importância do senso crítico do indivíduo como alicerce
para que este não caia nas artimanhas do poder persuasivo inserido na mídia em geral e,
especialmente, nas propagandas de TV. Para tanto, foram analisados sete textos publicitários,
sendo dois extraídos de uma revista semanal de circulação nacional e os demais de
propagandas exibidas na TV mediante pesquisa de cunho bibliográfico, sob uma perspectiva
semiótica pautada em diversos teóricos. Através da pesquisa e de análises em textos
publicitários, constatou-se que os produtores destes revestem os mesmos de argumentos
plausíveis ou verossímeis (sonhos, fantasias, desejos) para conseguirem atingir seu objetivo, a
obtenção de lucros. Nesse sentido, os resultados do trabalho apontam para indivíduos acríticos
que, manipulados pelo jogo ideológico do poderio por meio das propagandas de TV,
emergem da condição de personagens principais a seres de consciência, sensibilidade e
pensamento adormecidos, em outras palavras, meros objetos.
Palavras-chave: mídia, propagandas de TV, senso crítico, poder persuasivo, lucros.
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ABSTRACT
The present paper aims to analyze the critical sense importance of the individual as the
foundation for this will not fall into the tricks of the persuasive power inserted on all media
and specific on TV ads. To do so, it had been analised seven advertising tents, two from a
weekly newspaper of national circulation and some other advertisements shown on TV, it had
been done a bibliographic research, in a semiotic perspective guided in various theorists.
Through research and analysis on advertisements texts, it was found that the producers of
these texts the same arguments plausible or believable (dreams, fantasies, desires) to achieve
your goal profit. In this sense, the results suggest that individuals uncritical handled by the
ideological game power through TV ads, emerging from the condition of the main characters
of the human consciousness, sensibility and thought dormant, in others words, mere objects.
Keywords: media, TV ads, critical sense, persuasive power, profits.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................... 11
CAPÍTULO I ........................................................................................... 14
1 DISCURSO E IMAGEM ..................................................................... 14
1.1 LINGUAGEM: UMA BREVE ABORDAGEM................................. 14
1.2 O DISCURSO: ALGUNS ESCLARECIMENTOS............................. 18
1.3 LEITURA DE IMAGEM: UMA BREVE ABORDAGEM................. 22
CAPÍTULO II .......................................................................................... 31
2 CULTURA, INDÚSTRIA CULTURAL E MÍDIA ........................ 31
2.1 CULTURA ...........................................................................................31
2.2 IDENTIDADE CULTURA ................................................................. 33
2.3 INDÚSTRIA CULTURAL: O QUE É? .............................................. 35
2.4 CULTURA ERUDITA, CULTURA POPULAR E CULTURA DE MASSA:
TENTANDO DIFERENCIAR ............................................................ 40
CAPÍTULO III ........................................................................................ 43
3 O PAPEL DA MÍDIA ............................................................................ 43
3.1 ONDE ENTRA A TELEVISÃO ......................................................... 48
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 57
REFERÊNCIAS ...................................................................................... 58
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INTRODUÇÃO
A mídia, no âmbito em que vive a sociedade pós moderna, encontra um largo espaço e se faz
cada vez mais presente. Esta circunda o indivíduo de modo que, ao direcionar seu olhar para
as mínimas coisas do cotidiano estará sujeito, a partir do jogo de raciocínio meticuloso, a
receber a informação, desde que seja um sujeito crítico e tenha suas próprias ideologias ou
que a partir de outras forme as suas. Por outro lado o indivíduo pode estar exposto à persuasão
quando se trata de um sujeito acrítico e não conhecedor das artimanhas lançadas pela
poderosa mídia. Determinante na vida de muitos cidadãos, esta os diz o que devem comer,
beber, vestir, lugares aonde devem ir e até mesmo o modo como devem comportar-se.
Atrelados a esta, estão os meios de comunicação de massa, que lançam uma dada informação
em um mesmo espaço de tempo para um grande número de pessoas. A televisão, foco do
presente trabalho, para os espectadores considerada um eletrodoméstico, e para os produtores
um poderoso veículo de transmissão de ideologias formadas pelos detentores do poder e do
saber, é condizente com o jogo ideológico que culmina por tornar mero objeto os seres
desprotegidos de um senso crítico que estão em contato direto com esses artefatos
tecnológicos.
Nesse sentido, as propagandas por meio da TV, se revestem de recursos linguísticos e visuais
para elaborarem seu discurso pautado em uma linguagem verbal e/ou não-verbal, cuja
intenção é a venda de felicidade, bem-estar, comodidade, atrelados ao produto anunciado, é
sempre seduzir e persuadir o espectador fazendo-o compactuar com suas ideias.
Este trabalho objetiva explicitar a relevância do conhecimento lingüístico, bem como o
conhecimento de mundo para que o indivíduo compreenda em sentido lato a verdadeira
intenção da mensagem inserida nas propagandas de televisão e assim não sejam sucumbidos
às armadilhas da linguagem da mídia em geral.
Sua importância consiste na tentativa de fazer com que o leitor aprimore sua criticidade, tendo
em vista que, ao adquirir tais conhecimentos, ficará mais atento às informações e
possivelmente não submergirá ao mundo ilusório retratado nas propagandas de TV que estão
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inseridas não só na parte comercial, mas dentro de toda programação, de forma sorrateira para
que o indivíduo se deixe envolver sem perceber.
Destarte, o fundamento dessa pesquisa é informar que a falta de criticidade por parte do leitor
espectador o leva a consumir determinados produtos, mesmo que em estado de distração,
além de fazê-lo compactuar com ideologias alheias pelo fato de serem induzidos pelo enredo
argumentativo dos textos publicitários e também das ideologias e manipulações que são
passadas através das programações.
Para atingir os objetivos de tal pesquisa foi de suma importância que bebêssemos em fontes
de teóricos como: Santaella, Koch, Fiorin, Bosi, Manguel, Chauí, Hall, Adorno, entre outros,
que muito contribuíram para a concretização deste trabalho, através de pesquisa bibliográfica
de caráter explicativo.
O corpus utilizado para a realização das análises foi extraído da revista semanal de circulação
nacional Veja: 2009, edição: 2104, páginas 6, 7, 48 e 49, respectivamente, além de
propagandas exibidas na televisão, de onde foram extraídas cinco amostras por apresentarem
os elementos persuasivos abordados teoricamente, oportunizando os leitores desse trabalho
científico a se manterem informados por meio das propagandas e não persuadidos e
manipulados.
As propagandas analisadas se referem a produtos tais como: cerveja, carro, refrigerante, e até
mesmo uma promovida pelo Governo Federal cujo público é variado e revelam claramente, o
poder persuasivo por meios dos sonhos e fantasias que estão acoplados aos produtos
anunciados.
Com o intuito de facilitar a leitura e torná-la aprazível, esse trabalho está dividido em três
capítulos cujos títulos são: Capítulo I: Discurso e imagem. Neste capítulo, foram abordadas as
diversas concepções de linguagem, a discrepância entre esta e língua e a definição de
linguagem verbal e não verbal. Capítulo II: Cultura, indústria cultural e mídia. Neste capítulo,
é realizada uma abordagem entre as discrepantes culturas: a popular, a erudita e a de massa, o
poder persuasivo exercido pela mídia por meio da indústria cultural bem como a importância
do senso crítico para a construção da identidade do indivíduo. Capítulo III: O papel da
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mídia/Onde entra a televisão, traz em seu bojo o poder da mídia, em especial a televisiva, por
meio de propagandas que foram analisadas sob a perspectiva embasada teoricamente.
Para finalizar, vale dizer que é esperado a partir do trabalho aqui desenvolvido que haja total
compreensão acerca de tudo que foi debatido para que sejamos seres mais críticos ao nos
depararmos com os poderosos argumentos utilizados pela mídia, em especial a televisiva, que
visa incessantemente nos persuadir e nos fazer tomar como nossa uma ideologia alheia e
muitas vezes longínqua da nossa realidade.
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1 - DISCURSO E IMAGEM
1.1 – LINGUAGEM: UMA BREVE ABORDAGEM
Esse trabalho objetiva uma análise midiática, tendo como foco de visão, a televisão. No
entanto sabemos que a TV trabalha usando o discurso e a imagem, assim como a mídia em
geral. Dessa forma torna-se pertinente um olhar sobre o discurso e sobre a leitura de imagem,
no intuito de trazer ao leitor um melhor entendimento da proposta desse estudo. Desse modo
começamos falando das formas de linguagem e distinção entre essa e a língua para, em
seguida apresentar uma breve análise do discurso e da leitura de imagem.
Desde os primórdios, o homem sente a necessidade de comunicar-se com seus semelhantes,
para tanto, faz uso das mais diversificadas formas de linguagem. Viajando no tempo, é
possível constatar a partir de registros históricos que, a espécie humana, no decorrer dos
séculos, passa por inúmeras experiências tais como, a descoberta do fogo, a invenção da roda,
da escrita, entre outras. Portanto, atrelada a estas inovações está a linguagem que, em virtude
destas, como um rio que segue seu curso, saturado de pequenas dimensões vai de encontro ao
mar, esta por sua vez exige do ser humano uma maior expressividade e dialogicidade. Para
uma melhor compreensão do que foi versado anteriormente evoquemos Santaella:
(...), em todos os tempos, grupos humanos constituídos sempre recorreram a
modos de expressão, de manifestação de sentido e de comunicação sociais
outros e diversos da linguagem verbal, desde os desenhos nas grutas de
Lascaux, os rituais de tribos “primitivas”, danças, músicas, cerimoniais e
jogos, até as produções de arquitetura e de objetos, além das formas de
criação de linguagem que viemos a chamar de arte: desenhos, pinturas,
esculturas, poética, cenografia etc. (2005, p.11).
Tendo em vista que este trabalho versará acerca da linguagem, fica a nós a incumbência de
evidenciar a discrepância entre língua e linguagem. Estas, embora na maioria das vezes por
nós confundidas, isso quando não postas em equivalência, apresentam peculiaridades.
Segundo Santaella (2005,p.10)
Tão natural e evidente, tão profundamente integrado ao nosso próprio ser é o
uso da língua que falamos, e da qual fazemos uso para escrever – língua
nativa, materna ou pátria, como costuma ser chamada -, que tendemos a nos
desaperceber de que esta não é a única e exclusiva forma de linguagem que
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somos capazes de produzir, criar, reproduzir, transformar e consumir, ou
seja, ver-ouvir-ler para que possamos nos comunicar uns com os outros.
Tendo como elemento norteador o referido embasamento teórico, podemos acreditar que,
embora língua e linguagem apresentem conceitos diferenciados, ambas servem de ponte
condutora à aquisição do conhecimento. Pautaremos a seguir o conceito acerca da linguagem,
defendido por Saussure, pai da lingüística moderna.
A linguagem tem um lado individual e um lado social, sendo impossível
conceber um sem o outro. [...] Tomada em seu todo, a linguagem é
multiforme e heteróclita; o cavaleiro de diferentes domínios, ao mesmo
tempo física, fisiológica e psíquica, ela pertence além disso ao domínio
social, não se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos, pois
não se sabe como inferir sua unidade.(2004,p.16-17)
Sobre a língua o mesmo afirma:
A língua não se confunde com a linguagem; é somente uma parte
determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um
produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de convenções
necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa
faculdade nos indivíduos. (SAUSSURE, 2004, p.17)
Como se pode notar, tanto esta quanto aquela são de suma importância para o
desenvolvimento cultural do individuo e, mesmo apresentando diferenças estão intimamente
ligadas. Para validarmos a relevável importância da linguagem no processo de formação
comunicativa e cultural do indivíduo, façamos alusão aos homens pré-históricos que, mesmo
desprovido da língua falada ou escrita faziam uso de rabiscos e desenhos nas grutas como
formas de expressão, manifestação, sentido e comunicação. Assim sendo, a depender do tipo
de comunicação, a linguagem caracteriza-se em verbal ou não-verbal. Utilizemos das palavras
de Santaella para defini-las.
[...] existe uma linguagem verbal, linguagem de sons que veiculam conceitos
e que se articulam no aparelho fonador, sons estes que, no Ocidente,
receberam uma tradução visual alfabética (linguagem escrita), mas existe
simultaneamente uma enorme variedade de outras linguagens que também se
constituem em sistemas sociais e históricos de representação do mundo.
(2005, p. 11)
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Portanto, ao nos referirmos à linguagem, devemos nos voltar para indagações que superem a
simples expectativa de decodificação de signos e, adentremos com ímpeto em nossas
inquietações, pondo em evidência o nosso lado sensível e perceptível. Em decorrência desta
afirmação é possível constatar que a linguagem é um campo vasto e que vai além de ações
humanas como já afirmara Santaella (2005, p.13)
Haverá, assim, a linguagem das flores, dos ventos, dos ruídos, dos sinais de
energia vital emitidos pelo corpo e, até mesmo, a linguagem do silêncio. Isso
tudo, sem falar do sonho que, desde Freud, já sabemos que também se
estrutura como linguagem.
Para compreendermos a linguagem como define a referida autora, basta que viajemos no
vasto campo da semiótica, ciência de toda e qualquer linguagem, filha do americano Charles
S. Peirce, grande cientista e, entre outras ocupações, matemático, físico e astrônomo.
[...] ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens
possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição
de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de significação e de sentido.
(SANTAELLA, 2005, p. 13)
Mesmo sendo a semiótica uma jovem ciência em construção, é válido salientar que esta é de
grande significância para todos os fenômenos que sucedem, mesmo que inesperadamente e,
culminam em denominar-se linguagem. Portanto, em decorrência desta definição, é atribuída
a incumbência ao interlocutor de compreender a linguagem como um emaranhar de teias das
mais diversificadas formas e espessuras que, juntas se completam e seguem rumo a um
mesmo objetivo: a comunicação como elemento carregado de significação e sentido. Nessa
medida, não podemos brincar de fazermos de conta que as linguagens são inerentes ao
mundo, assim como, tê-las como aliadas no processo de uma identidade cultural.
Contudo, podemos afirmar que as linguagens se fazem presente nos infindos e mais
diversificados âmbitos, assim como, estamos intimamente ligados a mesma, em outras
palavras “As linguagens estão no mundo e nós estamos na linguagem.” (SANTAELLA, 2005,
p.13). Ao fazermos menção ao termo comunicação, devemos antes de tudo, conhecer e
discernir duas formas de linguagem: verbal e não-verbal, estas definidas por Santaella da
seguinte maneira:
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[...] existe uma linguagem verbal, linguagem de sons que veiculam conceitos
e que se articulam no aparelho fonador, (...), mas existe simultaneamente
uma enorme variedade de outras linguagens que também se constituem em
sistemas sociais e históricos de representação do mundo. (2005, p.11).
Fica então esclarecido a partir das palavras da autora, que a linguagem verbal não é a única e
exclusiva forma de linguagem e, sobretudo que, esta acaba por desmerecer as demais
coeficientemente usadas em nosso cotidiano para nos comunicarmos. Em decorrência disto,
o próprio ser dialógico, é incrédulo da existência de outras formas de linguagem a não ser a
verbal.
Enraizado à linguagem está o discurso, este, peça chave e decisiva na arte de convencer ou
persuadir o interlocutor. É através deste que o homem trava relação com seus semelhantes,
expondo, seu ponto de vista acerca de um dado contexto e, dotado de intencionalidade pode
exercer forte influência no agir do outro ou até mesmo compartilhar de algumas de suas
ideologias, neste sentido:
Como ser dotado de razão e vontade, o homem, constantemente, avalia,
julga, critica, isto é, forma juízos de valor. Por outro lado, por meio do
discurso – ação verbal dotada de intencionalidade – tenta influir sobre o
comportamento do outro ou fazer com que compartilhe determinadas de suas
opiniões (KOCH, 2004, p. 17).
Partindo do referido pressuposto, fica então evidenciada a intencionalidade no discurso, não
havendo espaço para impessoalidade, isto quer dizer que “A neutralidade é apenas um mito: o
discurso que se pretende “neutro”, ingênuo, contém também uma ideologia – a da sua própria
objetividade.” (KOCH, 2004, p. 17). Para tornar ainda mais claro esta assertiva, façamos uma
análise tanto do discurso verbal, quanto do imagético dos cartazes de cerveja a seguir:
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Partamos do discurso verbal do cartaz à nossa esquerda “BAR DA BOA”. O mesmo suscita a
seguinte indagação: A quem está relacionado o termo “BOA”, a estonteante Juliana Paz ou a
cerveja? A nossa esquerda temos “QUANTO MAIS NOVA, MAIS GOSTOSA”. Quem, a
mulher, neste caso Ivete Sangalo ou a cerveja? Para compreendermos melhor identifiquemos
o maior público consumidor da referida bebida, os homens. Justo por este motivo, os
idealizadores (em se tratando de discurso enunciadores) das propagandas usaram imagens de
duas belas e famosas mulheres, para assim persuadir os interlocutores e atingir o principal
objetivo, a venda do produto anunciado.
Portanto, não há discurso sem uma ideologia, mesmo que este apresente-se de maneira
ingênua como afirma Koch, sempre estará imbuído de intencionalidade. Até mesmo quando
utilizamos um discurso alheio fizemos uma opção, portanto, acreditamos na ideologia exposta
pelo outro, mesmo que não com demasiada credibilidade. Trocando em miúdos “[...] a
simples seleção das opiniões a serem reproduzidas já implica, por si mesma, uma opção”
(KOCH, 2004, p.18).
1.2 O DISCURSO: ALGUNS ESCLARECIMENTOS
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Em meio a muitos conflitos de ordem política, econômica e social, o Século XX serve de
palco para o parimento de duas ciências da linguagem: a lingüística, caracterizada pela
linguagem verbal e a semiótica que tem como objeto de estudo toda e qualquer linguagem.
Nesse período, aquela, em virtude de seus métodos científicos, por merecimento destaca-se
das demais ciências humanas. Este fato consuma-se devido aos grandes debates que dão
origem ao que convencionou-se chamar de análise do discurso, este intricado de ações
políticas, sociais e históricas. Dentro desse contexto, as palavras por si só mostram-se neutras
de sentido e, só o ganham quando o sujeito dialógico se posiciona diante do mesmo. Segundo
Bentes e Mussalim (2004, p.118):
[...] para o conceito lacaciano de sujeito (Santiago, 1995), ao qual não se
pode atribuir nada de substancial, pois ele só se define em relação ao outro
(critérios diferencial e relacional). O sujeito dessubstancializado não está
onde é procurado, ou seja, no consciente, lugar onde reside a ilusão de
“sujeito centro” como sendo aquele que sabe o que diz, aquele que sabe o
que é, mas pode ser encontrado onde não está, no inconsciente, lugar onde
reside o outro- o discurso do pai, da mãe, etc.- ,que lhe imprime identidade
(critério do lugar vazio). Assim a identidade do sujeito lhe é garantida pelo
lugar do outro, ou seja, por um sistema parental simbólico que determina a
posição do sujeito desde sua aparição.
Portanto, a análise do discurso visa ir além da superficialidade dos fatos e adentrar em
questões intrínsecas permitindo que os envolvidos no processo interpretem o que está sendo
proferido e, com isso, compreendam os diversos fenômenos históricos e culturais. Portanto:
Não se pode dizer que o discurso se confunde com a fala. Concebido fora da
dicotomia saussureana, como um terceiro elemento (nem a língua nem a
fala), o discurso é fruto do reconhecimento de que a linguagem tem uma
dualidade constitutiva e que a compreensão do fenômeno da linguagem não
deve ser buscado apenas na língua, sistema ideologicamente neutro, mas
num nível situado fora do pólo da dicotomia língua/fala. Em outras palavras,
ao mesmo tempo em que a linguagem é uma entidade formal, constituindo
um sistema, é também atravessada por entradas subjetivas e sociais. O
discurso é, pois, um lugar de investimentos sociais, históricos, ideológicos,
psíquicos, por meio de sujeitos interagindo em situações concretas
(TRAVAGLIA, 2002, p.21).
Com isso, constatamos que, a análise do discurso é uma grandiosa ferramenta atrelada ao
entendimento e compreensão de fenômenos das mais diversificadas naturezas. Por isso, por
meio desta ciência da interpretação nos é permitido ter uma visão mais apurada acerca dos
acontecimentos que nos circundam e, percebermos que além da superficialidade dos fatos está
seu verdadeiro sentido, o que de fato nos proporciona o entendimento, e nos norteia para o
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caminho das “luzes”. Portanto, o ser desprovido desse entendimento possivelmente não
interpreta os vários discursos existentes, ficando sempre na “escuridão”, ou seja, a mercê de
ideologias já impostas por outro alguém ou um dado grupo.
Relacionados à argumentação estão dois fortes postulados, o convencimento e a persuasão.
Para defini-los, chamemos o filósofo e jurista Perelman, que a partir de seus trabalhos deu
nova roupagem aos estudos relacionados à argumentação, aliando os mais relevantes
elementos da retórica de Aristóteles a uma visão mais atualizada do assunto, dedicou-se a
elaboração de uma “nova retórica”. Este citado por Koch (2004, p.18) afirma que:
Enquanto o ato de convencer se dirige unicamente a razão, através de um
raciocínio estritamente lógico e por meio de provas objetivas, sendo, assim,
capaz de atingir um “auditório universal”, possuindo caráter puramente
demonstrativo e atemporal (as conclusões decorrem naturalmente das
premissas, como ocorre no raciocínio matemático), o ato de persuadir, por
sua vez, procura atingir a vontade, o sentimento do(s) interlocutor (es), por
meio de argumentos plausíveis ou verossímeis e tem caráter ideológico,
subjetivo, temporal, dirigindo-se, pois, a um “auditório particular”.
Tal autor proclama com sapiência a divergência entre os referidos atos. O primeiro habita
caminhos imbuídos de certezas e racionalidade, ao passo que o segundo tem como finalidade
caminhar por entre incertezas e em meio a ações movidas pelo querer e sentimentalismo. Em
outras palavras, argumentar é um processo que apresenta dois aspectos: o primeiro ligado à
razão, supõe ordenar idéias, justificá-las, e relacioná-las; o segundo, referente à paixão, busca
capturar o ouvinte, seduzi-lo e persuadi-lo. Adentremos então neste último por ser peça chave
para o trabalho que aqui estamos realizando e, por ter estado presente na vida da humanidade
desde os primórdios, quando na época clássica na Grécia do século IV a.C a arte de persuadir
era ensinada pelos sofistas por meio da retórica.
Dentro da perspectiva de que a argumentação visa persuadir o interlocutor acerca de uma
posição, ou seja, fazer com que este finde por acatar uma dada ideologia proferida por meio
de um dado discurso fica evidenciado que o enunciador fará uso de certos artifícios
semelhantes à verdade, para que estes venham a convencer o enunciatário fazendo-o acreditar
que seu discurso merece credibilidade. Nesse sentido, atentemos para a explicação de Fiorin:
Neste jogo de persuasão, o enunciador utiliza-se de certos procedimentos
argumentativos visando a levar o enunciatário a admitir como certo, como
válido o sentido produzido. A argumentação consiste no conjunto de
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procedimentos lingüísticos e lógicos usados pelo enunciador para convencer
o enunciatário. Por isso, não há sentido na divisão que se costuma fazer entre
discursos argumentativos e não argumentativos, uma vez que todos visam a
persuadir. É claro que alguns se assumem como explicitamente
argumentativos, como os discursos científicos, que se mostram como
discursos informativos. (2006, p.75)
Isso posto, fica perceptível que qualquer que seja o cunho do discurso, este visa, através de
argumentos apresentados pelo enunciador, se fazer real e encantar o enunciatário fazendo-o
crer que todos os acontecimentos relatados habitam caminhos imbuídos de certezas. O
discurso quando bem elaborado possibilita o seu criador a prender o interlocutor em um
emaranhar de teias, mesmo que inconscientemente, ao passo que este mesmo sem perceber
internalizará as ideologias daquele.
Elemento de suma importância ao tratarmos de análise do discurso é a representação do
sujeito, uma vez que a partir deste nascem os discursos. Assim sendo, quando o sujeito expõe
sua opinião se posicionando diante de um contexto, ou até omitindo-se usando da
neutralidade, culmina por tornar evidentes suas ideologias. De acordo com tais colocações, ao
nos relacionarmos com outros indivíduos, sempre utilizamos da linguagem como aspecto de
ação munido de intencionalidade. Portanto, pegando este fio condutor, constatamos que, a
linguagem é um instrumento que permite o interlocutor interagir socialmente, expondo seus
pensamentos, valores, anseios e experiências. A mesma estabelece ainda uma ligação entre o
destinatário e o pensamento do interlocutor e, quando ocorre a interatividade, o locutor,
intencionalmente influencia no pensar e no agir do seu ouvinte. A intencionalidade presente
no discurso realiza-se por meio de argumentos e, estes, culminam por “dar a luz” à persuasão.
Cabe aqui esclarecermos de forma sucinta que, Considerando-se a existência da
intencionalidade no discurso, deve-se constatar que tal intenção do locutor agir no
pensamento do seu interlocutor, dar-se através da construção do discurso argumentado, no
qual há pretensões e, por sua vez, persuasão. Segundo Fiorin (2006, p.75):
A finalidade última de todo ato de comunicação não é informar, mas
persuadir o outro a aceitar o que está sendo comunicado. Por isso, o ato de
comunicação é um complexo jogo de manipulação com vistas a fazer o
enunciatário crer naquilo que se transmite. Por isso ele é sempre persuasão.
De acordo com tal colocação, fica evidente a presença da intencionalidade no discurso, bem
como o envolvimento, encantamento e até mesmo a manipulação dos envolvidos no processo,
22
a partir de um jogo ideológico onde a verdade não é a personagem principal e, o discurso é
direcionado a um público “particular”.
1.3 LEITURA DE IMAGEM: UMA BREVE ABORDAGEM
A partir dos homens pré-históricos, desde a antiguidade, a arte imagética se fazia presente,
possibilitando os mesmos a comunicar-se entre si por meio de signos não linguísticos. Esta
arte é de suma importância para o despertar da criticidade nos indivíduos, uma vez que, a
partir de imagens nos é permitido, apenas através do pensamento, viajarmos sem sairmos do
lugar.Tendo em vista que, as imagens, se tratando de comunicação humana, foram umas das
primeiras formas de manifestação e sentido, por isso as consideramos anterior à palavra,
observe-se as proposições de Bosi a esse respeito:
A imagem é afim à sensação visual. O ser vivo tem, a partir do olho, as
formas do sol, do amar do céu. O perfil, a dimensão, a cor. A imagem é um
modo de presença que tende a suprir o contato direto e a manter, juntas, a
realidade do objeto em si e a sua existência em nós. O ato de ver apanha não
só a aparência da coisa, mas alguma relação entre nós e esse aparência [...].
A imagem pode ser retida e depois suscitada pela reminiscência ou pelo
sonho. Com a retentiva começa a corre aquele processo de co-existência de
tempos que marca a ação da memória: o agora refaz o passado e convive
com ele. (2000, p. 19)
Refletindo acerca das inúmeras imagens que nos circundam, desde as naturais as produzidas
pelo homem, é possível percebermos a forte influência que estas exercem sobre nossas vidas.
São imagens que contam histórias, que nos faz rir, chorar, refletir e, acima de tudo viajar por
entre mundos que nos remetem ao passado, presente e futuro. A esse respeito Manguel (2001,
p.21) afirma que:
As imagens que formam nosso mundo são símbolos, sinais, mensagens e
alegorias. Ou talvez sejam apenas presenças vazias que completamos com
nosso desejo, experiência, questionamento e remorso. Qualquer que seja o
caso, as imagens, assim como as palavras, são a matéria de que somos feitos.
Disso decorre o fato de que, por trás das imagens, assim como no discurso falado ou escrito,
há toda uma ideologia e, através de argumentos, neste caso, cores, sonoridade, formas, entre
outros, é permitido ao enunciador fazer com que o enunciatário concorde com aquilo que está
sendo anunciado e acabe por ser persuadido. Para tanto, é válido salientar que, o indivíduo
23
para interpretar certa imagem terá como ponte de partida o seu conhecimento prévio acerca do
discurso proferido pelo enunciador, para assim expressar-se conforme seu pensamento, uma
vez que, sua consciência o conduzirá.
Ainda nessa perspectiva Santaella afirma que:
O interpretante imediato consiste naquilo que o signo está apto a produzir
numa mente interpretadora qualquer. Não se trata daquilo que o signo
efetivamente produz na minha, ou na sua mente, mas daquilo que,
dependendo da sua natureza, ele pode produzir. Há signos que são
interpretáveis através de experiências concretas ou ações; outros são
passíveis de interpretações através de pensamentos numa série infinita.
(2005, p. 60)
Destarte, para que o indivíduo, de fato, interprete uma imagem, terá que munir-se de seu
conhecimento sócio-cultural, pois, é na sociedade que este adquire determinadas ferramentas
que o possibilitam compreender aspectos relevantes que o conduzirá a aquisição de uma dada
ideológica proferida por meio de uma imagem. As imagens, por sua vez, desde as pinturas
pré-históricas das cavernas, dizem respeito a expressões das manifestações da cultura humana.
Vimos ao longo dos tempos e espaços distintos por meios discrepantes, estes signos não
lingüísticos irem se avolumando, fato este possível em virtude da historicidade que cada
imagem possue, bem como seus vestígios, iconografias que nos permitem perceber o mundo
interior do sujeito que as produz.
Porém, é pertinente que saibamos que a pretensão do autor que pinta uma tela e de um
produtor de um texto não verbal para uma propaganda, seja ela para qualquer âmbito (TV,
outdoor, revista, entre outras que necessitam da imagem) é divergente. O primeiro reveste sua
obra a partir de um discurso que exigirá do leitor um conhecimento prévio o fazendo pensar,
discursar com o autor da obra em questão por meio dos elementos explícitos e implícitos
nesta, trocando em miúdos, neste tipo de arte o apreciador, a depender do seu conhecimento,
poderá colocar-se criticamente diante do objeto a ser contemplado. Em relação ao segundo,
apesar de explicitar em seu texto fatos vivenciados pela sociedade, este já o produz com a
finalidade última de obter lucros. Assim sendo, este produtor se munirá de argumentos
plausíveis ou verossímeis para persuadir o leitor e nem ao menos o dará oportunidade de
pensar a respeito do que viu para colocar-se criticamente frente ao objeto explicitado. Para
tornar claro esta assertiva, observemos as duas imagens a seguir:
24
Nègres a Fond de Calle (Negros no Porão de Navio) – Johann Moritz Rugendas – Da obra “Voyage Pittoresque au Brésil”.
A primeira imagem revela de maneira sábia a forma como os negros eram transportados da
África para o Brasil nos porões dos navios negreiros. Estes vinham em grande número, por
isso amontoados e misturados homens à mulheres e crianças, sob condições míseras, onde na
maioria das vezes muitos não conseguiam chegar ao destino. Para chegar a tal entendimento
foi relevante que tivéssemos um conhecimento prévio, do contrário observaríamos, nada
entenderíamos e por consequencia não nos colocaríamos criticamente diante do discurso
proferido.
A segunda imagem, desenvolvida para uma propaganda do refrigerante coca-cola, não nos dá
a oportunidade de pensar sobre a ideologia expressa por parte da mesma, uma vez que o seu
discurso está muito claro, “Coca-cola, refrigerante para todas as idades” e “as crianças que
25
bebem coca-cola receberão a visita do Papai Noel”. O discurso é ilusório, porém, fantástico
para a mente dos leitores espectadores, em especial o público infantil. Estes, encantados com
tal imagem consumirão o produto mesmo que distraidamente, uma vez que os elementos
envolvidos no discurso não estão ali por acaso, mas justamente para persuadir o consumidor o
fazendo comprar o produto, para assim dar lucros aos que compreendem a indústria cultural.
Portanto, a partir do que foi versado, ao fazermos uma leitura de imagem se faz necessário,
além de um conhecimento prévio uma postura crítica perante o objeto a ser analisado, uma
vez que a depender da imagem, o leitor poderá ser beneficiado ou não. Assim sendo,
conforme professor Caetano, apud Gomes Filho, (2000, p. 14);
Acreditamos ser ideal que toda pessoa adquira uma educação visual que a
ajude a compreender melhor, e de maneira constante o mundo material à sua
volta, independentemente de preconceitos ou de outros problemas relativos a
fatores e modismos de ordem cultural, condicionantes da nossa postura e
sensibilidade no modo de ver as coisas.
Tal assertiva firma a importância de uma educação visual para a formação crítica do
indivíduo, pois esta permite ao mesmo uma melhor compreensão do mundo que o circunda
fazendo-o refletir a respeito de determinados valores indispensáveis para o convívio em seu
âmbito social.
Para compreendermos o que até aqui foi dito a respeito da importância da arte imagética
façamos uma alusão aos poetas que, buscam a essência em imagens que estão a sua volta,
bem como os acontecimentos do cotidiano da sociedade para escrever suas obras.
Posteriormente, o leitor, ao deparar-se com estas, as interpretam e, rompem desta forma as
barreiras do tempo e do espaço. Nessa perspectiva não precisa muito esforço para observar a
passagem do tempo entre as duas imagens apresentadas a seguir:
26
Observa-se que as imagens levam a memória a buscar aspectos que já estavam perdidos no
tempo e que foram resgatados através da imagem. Sobre esse fenômeno Manguel (2001, p.
20-21) afirma que:
Quer descubramos nesta imagem circundantes lembranças desbotadas de
uma beleza que, em outros tempos, foi nossa (como sugeriu Platão), que elas
exijam de nós uma interpretação nova e original, por meio de todas as
possibilidades que nossa linguagem tenha a oferecer (como Salomão intuiu),
somos, essencialmente criaturas de imagens, de figuras.
Dada tal afirmação, resta-nos compreender que somos estritamente capazes, a partir da
observação e interpretação de imagens, de desenvolver um texto verbal, tendo em vista que,
as imagens muitas vezes, “valem mais que mil palavras”. Porém, para que analisemos um
objeto semioticamente se faz necessário levarmos em consideração três importantes aspectos
que o envolve: a significação, a objetivação e a interpretação. Acerca de ambos Pierce apud
Santaella relata:
O signo tem uma natureza triádica, quer dizer, ele pode ser analisado: em si
mesmo, nas suas propriedades internas, ou seja, no seu poder para significar;
na sua referencia àquilo que ele indica, se refere ou representa; e nos tipos de
efeitos que está apto a produzir nos seus receptores, isto é, nos tipos de
interpretação que ele tem o potencial de despertar nos seus usuários
(SANTAELLA, 2002, P.5).
Dos três aspectos mencionados pelo autor, para que o último vem a concretizar-se, há a
necessidade do receptor ter um conhecimento prévio referente ao objeto a ser analisado, bem
como o seu contexto sociocultural. Portanto, o grau de interpretação está intimamente ligado
27
ao nível de conhecimento que possui o interlocutor. Destarte, A semiótica poderá acontecer
ou não, o que dependerá da bagagem de informações e, sobretudo, do conhecimento que o
possível interpretante tem internalizado em si relacionado a outras áreas do conhecimento,
visto que:
Sem conhecer a história de um sistema de signos e do contexto sociocultural
em que ele se situa, não se pode detectar as marcas que o contexto deixa na
mensagem. Se o repertório de informações do receptor é muito baixo, a
semiótica não pode realizar para esse receptor o milagre de fazê-lo produzir
interpretantes que vão além do senso comum (SANTAELLA, 2002, p. 6)
Santaella refere-se especialmente a visão ou leitura semiótica. Entretanto, qualquer indivíduo
pode fazer uma leitura de imagem conforme sua concepção de mundo e seus valores culturais,
intelectuais e até religioso, esse fato retoma a frase de Leonardo Boff, “cada um ler com os
olhos que tem”, e é justamente por isso que a mídia usa para cada público que quer atingir,
um tipo de discurso e uma imagem.
É importante perceber que uma imagem, seja ela grafada em desenho ou mesmo uma figura
retratada nos dá uma determinada percepção. Ao andar pelas ruas lemos várias mensagens, ou
seja, para identificar uma sorveteria basta ver o desenho de um sorvete em uma porta ou
placa, mesmo o sujeito que não sabe decodificar as letras e ler o nome sorveteria não deixará
de tomar o sorvete. Os sinais de trânsito nos falam através das cores. Nos deparamos também
com símbolos imagéticos de placas como: é proibido fumar, silêncio, perigo, entre outras.
Ao chegar a um estacionamento e encontrar esse desenho as pessoas reconhecem
imediatamente que aquele local está reservado para deficientes, o mesmo acontece nos ônibus
urbanos. Significa dizer que cotidianamente fazemos leitura de imagem o tempo todo sem
perceber, assim como somos levados na “conversa” da mídia também sem perceber.
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Será que ao entrar num bar e observar essa imagem, especialmente o público masculino irá
resistir em tomar o primeiro gole? A imagem traz uma alusão erótica implícita através,
principalmente, da cor vermelha. A boca entreaberta da mulher traz o clima de sensualidade e
convida a partilha do drinque, é uma imagem que provoca a inserção do álcool.
A leitura de imagem vai além do que se possa imaginar é só perceber como as pessoas estão
vestidas no dia-a-dia, o tipo de vestimenta em determinado horário e local passará uma
percepção sobre a pessoa que está vestida, ou seja, é a aparência através da imagem que nos
faz perceber muitas vezes, que a pessoa é socialmente ou profissionalmente. Se nos
depararmos com um homem de terno com uma pasta na mão, vamos associá-lo a um
executivo, político ou advogado, no entanto ao encontrarmos com alguém vestido em um
conjunto de tecido grosso de cor laranja ou azul, com luvas de couro, vamos imaginá-lo um
gari. Vale ressaltar, porém, que essas pessoas não são necessariamente aquilo que imaginamos
através de nossa leitura de imagem, mas a imagem que vemos nos permite fazer essa leitura.
A leitura de imagem merece uma análise profunda uma vez que a imagem transmite uma
mensagem imediata, porém nesse estudo atentamos só para algumas provocações no intuito
de fazer o leitor compreender melhor o objetivo aqui proposto. Assim observemos as imagens
a seguir
29
As imagens mostram duas pessoas, que podem até terem a mesma idade, embora a imagem
deixe uma bem mais envelhecida que a outra, as duas fotos estão em preto e branco, o que não
nos impede de perceber a diferença de classe social entre as duas pessoas fotografadas. Outra
observação seria o espaço que se revela através do solo, um espaço rural e seco à direita e
outro urbanizado. Apesar de ambas as fotos mostrarem pessoas descalças, as imagens dos pés
mostram também uma grande diferença de poder aquisitivo e a representação em uma, da
diversão ou mesmo da arte da dança e a outra do trabalho forçado.
Dessa forma é possível dizer, conforme o jargão popular, que “uma imagem fala mais que mil
palavras”. Assim, buscamos unir o discurso e a imagem para tentar observar como a mídia,
especialmente televisiva, usa esses dois fenômenos da comunicação para atingir seu público.
Destarte, para um melhor entendimento deste trabalho científico temos a princípio que
compreendermos que ao passo que houve a evolução da espécie humana, a linguagem, ao
lado desta ganhou uma nova roupagem, desabrochando de um simples ato de comunicação
para uma forma que possibilita as espécies interagirem entre si. Portanto, fica claro por meio
do discurso até aqui proferido, que a linguagem seja ela verbal, cujo alicerce é a palavra
escrita ou oralizada, ou a linguagem não-verbal que apresenta como formas de manifestações
a escultura, a pintura, a fotografia, o cinema mudo, entre outras, são de suma importância ao
passo que foram criadas para suprir os anseios e necessidades específicas do homem.
Nessa perspectiva, tentaremos mostrar tal importância da linguagem explorando a mídia, mais
precisamente a televisiva. Faremos alusão ao discurso verbal e ao imagético para transparecer
30
ao ledor deste como acontece a persuasão nas propagandas de TV, os argumentos plausíveis
ou verossímeis utilizados pelos locutores para que aconteça tal persuasão e, de que forma o
leitor espectador recebe a mensagem e é manipulado pelo jogo ideológico implícito no
discurso.
Evidenciada a importância da linguagem na vida do homem para que este identifique-se como
um ser atuante em seu âmbito social, bem como a mercante presença desta na vida das mais
diversificadas sociedades humanas, traremos a seguir as facetas utilizadas pela mídia, em
especial televisiva, com o objetivo último de persuadir o leitor espectador.
31
2 - CULTURA, INDÚSTRIA CULTURAL E MÍDIA
2.1 – CULTURA
O presente capítulo trará à baila uma abordagem a respeito de cultura, o que seria a indústria
cultural bem como o poder que esta exerce sobre os indivíduos e como a mídia se coloca
frente a este processo. Para iniciarmos a discussão é pertinente que façamos uma breve
definição acerca de cultura, palavra esta possuidora de demasiada importância e de tamanha
dimensão que vem sendo centro de discussões e debates frequentes na sociedade
contemporânea. Em seu texto, Conformismo e Resistência, Marilena Chauí, recorda
sabiamente o surgimento do pensamento moderno acerca de cultura. Analisemos atentamente
suas significantes palavras:
[...] Cultura era o cultivo e o cuidado com as plantas, animais e tudo que se
relacionava com a terra; [...] era usada para referir-se ao cuidado com as
crianças e sua educação, para o desenvolvimento de suas qualidades e
faculdades naturais; [...] O vocabulário estendia-se, ainda, ao cuidado com os
deuses; [...]. (1989, p. 11)
Se embarcarmos na primeira definição da autora, podemos fazer menção ao cultivo das ações
humanas, doutrinas e atitudes, para que futuras gerações colham como frutos toda a cultura
advinda de seus antepassados, pois só assim se fará viva e presente. Relacionado ao cuidado
com as crianças e sua educação, podemos fazer um paralelo à transmissão dessa cultura aos
jovens humanos que, por meio da educação que receberão, a vivenciará e, não permitirá que
esta se faça ausente na vida dos seus descendentes.
Referente à extensão ao cuidado com os deuses, basta que façamos uma alusão a importância
destes para a cultura greco-romana para que compreendamos tal definição. Ainda buscando
palavras para iluminar nossa mente acerca da definição da concepção que nasce da junção de
todas as práticas sociais, a cultura, mergulhemos nas palavras de Cascudo:
Para fins primários de impressão poder-se-ia dizer que a cultura é o
conjunto de técnicas de produção, doutrinas, e atos, transmissível pela
convivência e ensino, de geração em geração. Compreende-se que exista
processo lento ou rápido de modificações, supressões, mutilações parciais
no terreno material ou espiritual do coletivo sem que determine uma
transformação anuladora das permanências características. (2004,p.39)
32
A partir do argumento apresentado acima fica claro que a cultura não nasce com o homem,
mas do homem, ou seja, ela é resultante das ações humanas que perpassam ao longo dos
tempos. Ela é capaz de ofuscar a ignorância da mente humana, permitindo que os indivíduos
que a possuem avaliem, critiquem, façam juízo de valor e, até mesmo comparem e
classifiquem as civilizações existentes no mundo.
Essa perspectiva se cumpre a partir do convívio com os demais membros sociais que são os
principais personagens responsáveis por tornarem em atividade esse ciclo incessante. São eles
que a partir de suas frequentes ações e das suas crenças frente a um dado objeto, seja ela
material ou espiritual, mantêm acesa uma chama que alimentará as demais gerações que
tendem a surgir. Mas, se a cultura é resultante das ações humanas que são transmitidas de
geração para geração, por que alguns aspectos relacionados a ela são mutáveis? Convidemos
mais uma vez Cascudo para um melhor entendimento:
É bem possível que uma cultura modifique uma cerimônia, um aspecto da
organização administrativa, uma técnica de produção agrícola, a maneira de
preparar um alimento tradicional, um ritmo de dança individual, bailado
coletivo, equipamento ou forma de caçar, pescar, guerrear, tecer, fiar,
modelar, pintar cerâmica, ornamentar-se, tatuar-se, abandonar certos
vocábulos por outros ou fazê-los ter significação diferente, sem que a
civilização perca no conjunto de sua apresentação habitual e sensível
vitalidade e fisionomia normais. (2004, p.40)
Analisando o discurso proferido por Cascudo, encontramos então a resposta para a indagação
acima. A cultura está intimamente ligada a todos os aspectos que condizem com as normas,
doutrinas, hábitos que herdamos dos nossos antepassados, bem como com um conjunto de
ações sociais que são acrescidas as já então vigentes. Assim sendo, uma sociedade não mais
teria vida se não mantive-se em exercício todos os seus costumes, valores e, principalmente a
transmissão destes para às novas gerações que, sem sombra de dúvidas, serão, assim com seus
antepassados, os responsáveis por cultivarem e reproduzirem os saberes terrenos. Para validar
estes versos façamos uma alusão à Bosi:
Cultura é o conjunto das práticas, das técnicas, dos símbolos e dos valores
que se devem transmitir às novas gerações para garantir a nova reprodução
de um estado de coexistência social. A educação é o momento institucional
marcado do processo. [...] Cultura supõe uma consciência grupal operosa e
operante que desentranha da vida presente os planos para o futuro. (2000, p.
16)
33
Desta forma, é imensa a incumbência atribuída às novas gerações. Estas devem exercer o
papel de “cultivadores”, “produtores” e “propagadores” do processo incessante que é o ciclo
cultural. Tarefa árdua, porém necessária para que se mantenha acesa a chama que alimenta os
que vivem e os que estão por vir. No entanto é possível perceber que a prática cultural no
processo acima vem sendo dirimida a cada dia e o grande influenciador disso é a mídia e logo
mais veremos porque.
Assim sendo, explicitada a definição de cultura e a importância desta para a vida das
presentes e futuras gerações, veremos a seguir como a sociedade pós - moderna encara esse
compromisso e se está ciente da importância desse para que tenha de fato uma identidade
cultural.
2.2 – IDENTIDADE CULTURAL
Traremos à tona no presente momento um conceito que vem sendo debatido na teoria social, a
identidade, que apesar de se tratar de uma questão de complexo entendimento ao passo que
apresenta um escasso desenvolvimento e compreensão no que diz respeito às ciências sociais
nos dias atuais, merece que lancemos o nosso olhar para tal. Saber conceituar e conhecer de
que forma esta manifesta-se nos indivíduos contemporâneos significa nos situarmos no
espaço em que vivemos e em especial sermos perceptores e valorizadores dos anseios e
valores que estão em nós implícitos.
Nesta perspectiva, trataremos a identidade cultural de um indivíduo equivalente a elementos
que o identificam como estando inserido em um dado contexto sócio-político. Como exemplo
eficaz para tal afirmação, peçamos licença ao ilustre cantor, compositor e poeta popular, Luis
Gonzaga, para que consigamos tornar claro tal discurso. A partir das suas canções populares
este grande nome da música brasileira, tornou-se conhecido internacionalmente e identificado
como sendo pernambucano, nordestino e brasileiro por retratar em suas canções a cultura do
seu povo ou, melhor dizendo, sua identidade cultural.
Mediante o mencionado exemplo, é válido ressaltar que identidade cultural é tudo aquilo que
nos identifica como sendo membros participantes de um dado grupo histórico-cultural e que
34
revela a outras sociedades aspectos condizentes ao âmbito social em que vive um dado
indivíduo.
Para fomentar tudo o que até aqui foi posto em debate, façamos referência a três concepções
de identidade demasiadamente distintas defendidas pelo teórico social Stuart Hall em sua obra
A identidade cultural da pós-modernidade. Este expõe no já referido trabalho as concepções
de identidade vivenciadas por três sujeitos de épocas discrepantes: o sujeito do Iluminismo, o
sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. Nesse sentido, atentemos para a explicação do
autor no que diz respeito ao primeiro sujeito:
O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da pessoa humana
como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotados das capacidades
de razão, de consciência e de ação, cujo “centro” consistia num núcleo
interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se
desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo – contínuo
ou idêntico a ele – ao longo da existência do indivíduo. O centro essencial
do eu era a identidade de uma pessoa. (2005, p. 10-11)
Isso equivale dizer que, este sujeito, embora imbuído de razão e de atitudes, tinha como
centro sua própria identidade, não compartilhando assim de suas potencialidades com os que
estavam a sua volta, atitude esta que o tornava um ser meramente individualista. Portanto, os
conflitos existiam entre o próprio sujeito e sua identidade não havendo espaço para um
diálogo externo. Contrário a esta concepção temos o sujeito sociológico:
A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo
moderno e a consciência de este núcleo interior do sujeito não era autônomo
e auto-suficiente, mas era formado na relação com “outras pessoas
importantes para ele”, que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e
símbolos – a cultura – dos mundos que ele/ela habitava. (2005, p. 11)
Diante de tal assertiva temos um sujeito com uma identidade formada a partir da relação
existente entre seu eu e os demais membros da sociedade. Este, apesar de ter como peça
chave o seu eu, constrói sua identidade junto a pessoas que lhe transmitem suas crenças,
doutrinas, valores, enfim, sua cultura. O referido sujeito tem sua própria identidade, porém,
esta é moldada a partir dos ensinamentos mediados por aqueles que estão ao seu redor. Nessa
perspectiva, não há uma perda de valores por parte do indivíduo, mas sim um casamento entre
a cultura internalizada desde o seu nascimento e as mais diferenciadas identidades que
constituem o espaço geográfico em que vive. Há de fato um acréscimo de saberes que
35
culminam por fortalecer a concepção até então vigente por esse sujeito, possibilitando-o a
emergir de um simples âmbito, seu próprio interior, a desbravar ambientes longínquos e que
lhe proporcionará uma maior resistência aos acontecimentos do mundo por ele habitado.
Uma ressalva a ser feita diante de tais colocações acerca do conceito de identidade
relacionado ao último sujeito que acabamos de conhecer, é que “a identidade que costura o
sujeito à estrutura” como afirmara Hall, está se fragmentando e por tal motivo se perdendo no
tempo e no espaço. O sujeito que até então estabelecia uma conexão entre seu mundo interior
e as influências que recebia de um mundo público, agora é altamente descentrado pelas
múltiplas identidades que lhe bombardeiam. Diante de tais acontecimentos “germina” o
sujeito pós-moderno que é definido por Hall “como não tendo uma identidade fixa, essencial
ou permanente.” (2005, p. 12).
Porém, destas proposições trataremos a seguir ao debatermos sobre a indústria cultural e
conseguinte a forma como esta, através do processo de globalização acoplado a mídia, tende a
favorecer a então mencionada ausência de identidade do sujeito da contemporaneidade.
2.3 – INDÚSTRIA CULTURAL: O QUE É?
Tudo leva a crer que a nomenclatura indústria cultural foi mencionada pela primeira vez em
Amsterdã, no ano de 1947, pelos teóricos Horkheimer e Adorno. Estes deram à luz ao novo
conceito objetivando extinguir o até então vigente, a cultura de massa, termo este que gerava
uma satisfação para alguns, uma vez que, levava grande parte da população crer que esta
última era uma cultura produzida pelo e para o povo, assim como a então cultura popular.
Porém, tal renovação do vocabulário proposto pelos referidos teóricos veio a desmascarar a
verdadeira face da cultura de massa que tem como foco tornar não produtores, mas, meros
objetos, levando em consideração que os produtos por ela produzidos serão engolidos, mesmo
que distraidamente, pela própria massa, que é a maioria. Nessa perspectiva, Fernando
Rebouças, no site infoescola.com/cultura/industria-cultural, afirma que:
O mundo vive num sistema econômico-político-cultural capitalista e o
surgimento da sociedade capitalista transformou as manifestações culturais
em produto. Este cenário desencadeou a formação da indústria cultural, que
é o conjunto de empresas, instituições e redes de mídia que produzem,
36
distribuem e transmitem conteúdo artístico – cultural com o objetivo de
adquirir lucros. (http://www.infoescola.com/cultura/industria-cultural/)
acesso em 29/ 09/2009
Dentro desta proposta, temos a invalidação da cultura ao colocarmos em evidência as mais
diversas mercadorias produzidas por uma indústria que visa alienar seus consumidores
tornando-os meros objetos incapazes de direcionar seu olhar e pensamento para a direção
desejada, assim como o boi que faz o uso da canga.
Isso posto, fica perceptível que a prática de vender sonhos e maquiar a realidade que condiz
com o jogo ideológico organizado pela indústria cultural com a finalidade última de refletir na
vida dos indivíduos uma ideologia facetada, voltada apenas para o interesse da classe
detentora de saber e de poder, ou seja, dos mais favorecidos economicamente. O poderio
tende, consequentemente, a tornar sujeito do ciclo da indústria cultural à classe dita
subalterna, ao passo que evidencia situações que são condizentes com o cotidiano desta.
Tais esclarecimentos revelam o motivo pelo qual “o rico cada vez fica mais rico e o pobre
cada vez fica mais pobre”, ou seja, quem está no poder se mantêm no poder e, quem não o
tem, continuará sem tê-lo, a menos que seja um ser extraordinário. Porém, conseguindo
chegar ao topo da pirâmide alegórica do capitalismo, que ao nosso olhar se resume em duas
classes; a dos dominantes e a dos dominados, este ser extraordinário reveste-se das mesmas
armaduras e expressa as mesmas atitudes que o diferenciará dos demais membros de uma
sociedade e que um dia fizeram parte da história dele.
Esse ser dito por nós como ser extraordinário, com o poder em suas mãos, passará de
dominado à dominante, porém nada fará para que a sociedade viva em igualdade, mas sim,
continuará mantendo a massa meramente subordinada a um sistema que com o decorrer do
tempo a aliena e a manipula ao seu bel prazer.
Portanto, quem tem o poder tem a máquina nas mãos e, quem a possui são os
economicamente mais fortes que exercem o domínio sobre a massa fazendo-a engolir e
conseguinte digerir tudo que os primeiros produzem a partir da tão opressora máquina que
possuem. Façamos a leitura da imagem a seguir para validarmos tal discurso:
37
A imagem mostra em sua parte superior uma mão, que a partir de um anel e de um botão com
o símbolo da cifra acoplado a um terno que desnude quem a possue, revela sua classe social.
Esta suposta pessoa tem em sua mão um homem com as características de um boneco de
teatro de marionetes, ao passo que é suspenso pela própria mão por meio de cordões. Porém, o
que pretendemos explicitar por meio desta, não é o que estamos vendo superficialmente, mas
a ideologia expressa por meio da mesma.
Se atentarmos para o tema que agora estamos tratando, vejamos esta mão como a de uma
pessoa detentora de poder e o homem boneco como um objeto de um sistema opressor que
finda por alienar os menos favorecidos economicamente e os desprovidos de um senso crítico.
Esse é o poder que tem a indústria cultural, o de manipular as massas a partir de seus mais
diversificados produtos que são divulgados pela poderosa mídia, que adentra na vida do
indivíduo através dos meios de comunicação e o torna um ser indefeso e impotente diante te
tal poder persuasivo.
Dentro dessa proposta afirmamos que os produtores da indústria cultural visam apenas lucros
e para tal usarão de artifícios nem sempre legais, porém, na maioria das vezes convincentes
para fazer com que os produtos produzidos pela mesma sejam consumidos pelo povo mesmo
que sem perceber.
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A violência da sociedade industrial opera nos homens de uma vez por todas.
Os produtos da indústria cultural podem estar certos de serem jovialmente
consumidos, mesmo em estado de distração. (ADORNO, 2002, p. 16 -17)
Diante de tais palavras fica evidente que a indústria cultural manipula os consumidores sem
que estes se dêem conta de tal dominação. Destarte, estes comem, vestem, calçam todos os
produtos desenvolvidos pela indústria cultural de forma que nem percebem que estão sendo
não os principais elementos desse processo, mas, apenas objetos de tal indústria que pretende
apenas, a partir do seu jogo ideológico persuadir seus consumidores para assim obter lucros.
Mas, por que a massa acaba por consumir, mesmo inconscientemente, estes produtos
simplesmente lançados no mercado com a finalidade última da obtenção de lucros? Seria
porque nesta massa há a carência de um conteúdo cultural, de um senso crítico e
possivelmente uma descentralização de sua identidade? Indagações pertinentes para que
compreendamos como acontece na pós - modernidade tal submissão da maioria com relação
aos poucos que se mantêm no poder, uma vez que estes ocupam esta posição na sociedade
pelo evidente fato de terem em suas mãos os meios de produção e de comunicação.
Para que isso posto torne-se melhor compreensível, voltemos na história na época em que o
Brasil foi invadido por portugueses que tentaram impor de todas as formas sua cultura aos
ditos selvagens, os povos indígenas. Desde o início sempre foi assim, os mais fortes
dominando os mais fracos. Porém, os índios não abdicaram da sua cultura, pelo fato de terem
uma própria identidade cultural através da qual os demais membros de uma sociedade o
identificavam por meio dos seus hábitos, crenças e de seus valores. Assim foi com os negros
africanos que ao Brasil vieram com a condição de escravos para fazerem parte da história do
país. Estes politeístas foram obrigados a seguir a doutrina do catolicismo, porém, diante dos
santos da igreja Católica Apostólica Romana, mesmo que em silêncio faziam referência aos
seus orixás. Portanto, é evidente a partir dos exemplos aqui mencionados que estes dois
grupos étnicos não perderam sua própria identidade mesmo em contato com outro grupo
imbuído de valores diferenciados. Mas, por que na sociedade contemporânea, em meio a
globalização, o homem não consegue ter uma única identidade? Por que este enfrenta uma
crise de identidade?
Como resposta para tais indagações temos as forças do poder capitalista que é obtido a partir
da indústria cultural tendo como foco a mídia que é responsável por divulgar os produtos
globalizados produzidos pela mesma e o próprio consumidor, este acrítico e por este motivo
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passivo ao trabalho persuasivo exercido pelos meios de comunicação. Justo por este motivo, o
homem não consegue ter em si uma marca cultural que o faz ser reconhecido como um
indivíduo atuante em um dado âmbito social. Será sempre um ser sem opinião própria, uma
vez que mesmo quando faltar palavras para proferir tal discurso, estará indiretamente dando
crédito à determinada opinião já vigente.
A partir do discurso versado acerca da indústria cultural, fica claro que após o surgimento de
uma sociedade capitalista a cultura passou a condição de produto comercializado. Esta
comercialização se dá a partir da mídia que aliada aos meios de comunicação adrentra no
universo do espectador não deixando espaço para que este se coloque criticamente. Portanto,
argumentação não há, mas apenas uma passividade e alienação por parte destes que acreditam
ser os favorecidos do processo capitalista e que apenas são as peças manipuladas pelos
poderosos para que o jogo aconteça. Deste modo, a indústria cultural não vende apenas os
produtos, mas sonhos, fantasias e desejos. Vejamos a propaganda a seguir produzida para uma
campanha do Ministério da Saúde.
A partir do principal discurso verbal o que eles vendem não é o que você leva, logo
certificamos o que defendemos anteriormente ao referenciar o forte poder persuasivo inserido
nas propagandas aos sonhos, fantasias e desejos que são evidenciados por meio destas. Na
verdade, o cartaz foi elaborado para deixar claro que as propagandas de cigarro costumam
vender felicidade, beleza por meio de dentes brancos e brilhantes e liberdade por meio da
expressão emanada pelos fictícios fumantes que as realizam. No entanto, estas propagandas,
assim como as demais, não levam os leitores a refletir acerca dos males que o produto possa
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vir a causar, neste caso dentes estragados, escurecimento da gengiva, pele e lábios ressecados
e, até mesmo, câncer na boca. Isso se dá a partir do único propósito pela qual a indústria
cultural existe: a obtenção de lucros, nem que para tanto faça os leitores submergirem para o
mundo das ilusões.
Destarte, seguiremos o nosso trabalho com o propósito de tornar evidente como acontece a
persuasão por meio da mídia, em especial a televisiva. Para tanto, percorreremos a seguir
pelos conceitos de três discrepantes culturas: a erudita, a de massa e a popular, que trarão uma
ótima contribuição para que culminemos o presente trabalho com êxito.
2.4 – CULTURA ERUDITA, CULTURA POPULAR E CULTURA DE MASSA:
TENTANDO DIFERENCIAR
Feitas as considerações sobre cultura e de que forma esta se manifesta na sociedade, lancemos
o nosso olhar para uma expressão não muito fácil de ser conceituada, que é a cultura popular.
Segundo Chauí, esta “seria a cultura do povo ou a cultura para o povo?” (1989,p.9 –10). A
dificuldade para o entendimento desta expressão surge a partir da indagação feita acima. A
mesma teórica faz menção a própria dificuldade que os produtores desta têm em classificá-la.
A dificuldade, porém, é maior se nos lembrarmos de que os produtores
dessa cultura – as chamadas classes “populares” – não a designam com o
adjetivo “popular”, designação empregada por membros de outras classes
sociais para definir as manifestações culturais das classes ditas
“subalternas”. (1989, p.10)
Buscando atentamente explicação para este complexo conceito traremos uma personagem que
nos dará uma melhor compreensão em torno do debate em questão, “a cultura de massa”,
expressão esta que esteve no ápice nas ciências sociais norte-americanas durante os anos de
50 e 60. Tal êxito foi possível pelo fato de o pensamento liberal acreditar que, com o
parimento desta idéia de “massa” livrar-se-ia da tão evidente e intrigante guerra entre as
classes sociais. Portanto, este fato não consumou-se, graças ao pensamento antitético de
alguns teóricos como os frankfurtianos, Adorno, Horkeimer e Marcuse que, trouxeram à tona
os relevantes conceitos de “indústria cultural e de “cultura administrativa”.
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Contudo, percebemos que há um confronto de idéias. De um lado, os liberais de “massa” que,
com sua concepção otimista almejavam extinguir de uma vez por todas a luta de classes.
Queriam colocar “sob o tapete” uma explicação científica que vinha sendo cultivada há
tempos, como se isso fosse possível de um instante para outro. Do outro, temos os
frankfurtianos que, tinham plena consciência de que a luta entre classes ainda se mantinha
viva mesmo com o surgimento do termo “massa”.
Muito embora, apesar dos dois termos “cultura popular” e “cultura de massa” apresentarem
aspectos que lhe são comuns, não são postas como equivalentes, uma vez que, ambas
apresentam suas peculiaridades. Vejamos a seguir algumas pertinentes colocações que
revelam algumas discrepâncias entre ambos os termos. Como podem ser os termos idênticos
se os meios de comunicação de massa são únicos e exclusivos do poderio para “adestrar” as
camadas ditas “subalternas”.
[...] no Brasil, sociedade autoritária, os meios de Comunicação de Massa
são uma concessão estatal a empresas privadas, ficando sob o controle
ideológico e político do Estado e, frequentemente, são instrumentos do
Estado para fins de propaganda e de doutrinação. (CHAUI, 1989, p.28)
Outro aspecto condizente com a abordagem feita entre as duas definições, o “popular” e a
“massa” é que ao passo que a primeira evidencia a existência entre as divisões de classes a
segunda tende a colocá-las por trás de um cenário ilusório. Em outras palavras, quando
afirmamos que há uma cultura popular estamos indiretamente, externando que outra não é
popular. Assim, temos um mesmo âmbito social com manifestações divergentes.
Assim sendo, é possível afirmar que a cultura popular está intimamente ligada ao povo, este
advindo de raízes humildes que produzem esta cultura sem a pretensão de obter lucros. É
pura, transparente, muito embora não estática, uma vez que as novas sociedades contribuem
de alguma forma para que esta se mantenha viva. Nascida espontaneamente de um povo que
busca inspiração em acontecimentos corriqueiros do ambiente em que vive a cultura popular
tem como foco principal não o próprio resultado por esta produzido, mas o simples homem do
povo que a produziu.
Contrário a está concepção cultural está a cultura de massa que não é produzida pelo e para o
povo, mas pela classe dominante para a classe dominada, trocando em miúdos, esta é uma
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cultura que já vem pronta e que é engolida pelos desprovidos de poder. Não tem como
elemento principal quem a produziu, mas o lucro que está trará para seus produtores.
Podemos afirmar então que tudo aquilo produzido pela indústria cultural é destinado às
massas e consumidas por estas a partir dos argumentos plausíveis ou verossímeis dos quais se
revestem a poderosa mídia, que em nossos dias é determinante em nosso modo de ser, de
vestir, de se alimentar, entre outros fatores relacionados às nossas necessidades.
Porém depois de juntarmos todos os conceitos e comentários dos teóricos sobre cultura,
indústria cultural, cultura popular, cultura de massa chega-se a um denominador comum.
Podemos afirmar que a cultura faz parte da vida do sujeito em desde sua infância e atribui-se
ao grupo social e cultural a que pertence como foi evidenciado no exemplo do rei do baião.
Por outro lado a indústria cultural trabalha orientada pelo capitalismo, ou seja, ela produz em
todas as áreas como música, literatura, objetos de uso e alimentos para ser consumido pela
massa sem nenhuma objeção, porque a maneira como são passados esses produtos não deixa
que as pessoas pensem a respeito. Nessa perspectiva entra a mídia que trabalha para
convencer a massa a consumir o que é produzido pela indústria cultural. Isso seria a chamada
cultura de massa.
A cultura erudita por sua vez liga-se ao aprendizado artificial, ou seja, é algo que o sujeito
busca para estar incluso nos trâmites exigidos pela sociedade abastada. A cultura acadêmica
faz parte desse perfil. Por esses motivos a cultura erudita não é democrática, porque nem
todos fazem parte desse grupo. Ao contrário dela a cultura popular, irmã mais velha, abraça
todas as comunidades, porque se evidencia nos adventos que são passados de geração em
geração através de quem a criou, o próprio povo. Portanto a cultura popular é a que nasce do
povo para o povo de forma espontânea e sem fins lucrativos.
Dessa forma fica evidente que nem tudo que se populariza é cultura popular, pois o poder da
mídia com a globalização é muito grande e faz com que as coisas se disseminem rapidamente,
se popularizando, ou se já se espalham os conceitos e tudo que é criado entre as pessoas, mas
nem por isso tem raiz popular porque só visa o lucro. Nesse sentido, depois de tentarmos
esclarecer semelhanças e diferenças entre esses aspectos que fazem parte da vida
contemporânea, mas que são difíceis de serem entendidos pela maioria das pessoas,
passaremos a nossa fase final, tentando vê como a mídia, especialmente a televisão trabalha
para que o consumo exacerbado de tudo e a perda de nossa identidade aconteçam.
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3 – O PAPEL DA MÍDIA
Para embasar este capítulo que se inicia, fomentemos a princípio que os meios de
comunicação de massa tradicional (jornal, rádio, cinema, televisão), desde o seu surgimento
sempre foram utilizados pelo poderio (indivíduos e grupos particulares) com a finalidade de
manipular a massa, confirmando assim que são unânimes do que diz respeito ao poder e ao
saber. A sociedade cresce, o mundo evolui em meio à globalização, novos meios de
comunicação ganham espaço na vida da humanidade, porém, o caráter manipulador do
poderio para com a massa não cessa.
A mídia na sociedade contemporânea, veiculada pelos meios de comunicação de massa, vem
encontrando um largo espaço e circundando cada vez mais e com maior intensidade o
indivíduo dessa sociedade. Esta se faz presente em nossas vestimentas, nas embalagens dos
alimentos que ingerimos, em nossos calçados, nos outdoors, nas revistas, panfletos, TV, entre
outros, e sempre com a pretensão de informar o leitor espectador acerca das vantagens que
certo produto anunciado tenha para que este venha a adquiri-lo e certamente dê lucros aos
envolvidos no processo da indústria cultural.
Porém, como foi dito, a mídia objetiva informar. Mas, esta não forma opinião? Para obtermos
resposta a respeito desse questionamento basta percebermos como a população se prostra
diante da mídia, na condição passiva, de mero objeto, a ser manipulado pelo jogo ideológico
expresso pelos meios de comunicação. O indivíduo, a partir de um simulacro criado pela
mídia, compra desejos, fantasias, sonhos findando por ser personagem de um espetáculo onde
o espaço é o das ilusões.
Nesta perspectiva se tem, de um lado, as forças do poder capitalista,
representadas pela mídia e pela publicidade e o mercado globalizador e, do
outro lado, o consumidor indefeso, alienado e robotizado pelo trabalho
sedutor e persuasivo dos meios de comunicação. (SILVA, 2008 p.181)
Para que tal indivíduo não seja sufocado pelo emaranhar de teias lançadas pela mídia, basta
que imbua-se de uma postura crítica, peneirando a gama de informações recebidas,
colocando-as na balança da consciência e analisando até que ponto estas trarão benefícios
para a sua vida. Partindo desse pressuposto, este indivíduo terá, a partir das informações
recebidas, uma opinião própria que lhe permitirá ser reconhecido através de uma identidade
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intrínseca por defender aquilo que acreditara um dia. Porém, infelizmente, não é o que
acontece na maioria das vezes. A mídia acaba seduzindo o leitor espectador por meio de
situações irreais e destorcidas o fazendo acreditar que o mundo evidenciado por alguns
instantes é único e verdadeiro, merecendo ser habitado por todos que o contemplam.
Para continuarmos percorrendo esse universo midiático é conveniente que nos apoderemos
por alguns instantes das palavras de Chaui acerca da definição da propaganda:
A palavra propaganda deriva do verbo “propagar”, que significa:
multiplicar uma espécie por meio da reprodução, espalhar-se por um
território, aumentar numericamente por contágio, irradiar-se, difundir-se e,
por extensão, divulgar. A propaganda é uma difusão e uma divulgação de
idéias, valores, opiniões, informações para o maior número de pessoas no
mais amplo território possível. (2006, p. 37)
Desse excerto, a propaganda visa divulgar um dado produto e, por trás desse, ideologias.
Porém, é conspícuo como os indivíduos são altamente influenciados por elas sem jamais se
darem conta de tal influência, pois estes acabam adquirindo tal produto, mas nem ao menos
reconhecem os verdadeiros motivos que os levaram a tal atitude. Todavia, se direcionarmos o
nosso olhar para os argumentos que revestem as propagandas conseguiremos compreender
como se dá tal persuasão.
Para conseguir alcançar o seu objetivo, a mídia atrelada aos meios de comunicação, apresenta
os seus produtos embasados no que a humanidade necessita, nem que para tanto coloque em
evidência necessidades que não são condizentes com a naturalidade dos fatos. Para que tudo
até aqui discursado ganhe dimensão e percorra por caminhos imbuídos de certezas,
mergulhemos no universo midiático.
Para tanto, utilizaremos antes de adentramos no mundo televisivo (principal foco deste
trabalho) o corpus extraído da revista semanal de circulação nacional, a Veja: 2009, edição:
2104, páginas 6, 7, 48 e 49, respectivamente:
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PROPAGANDA 1
O texto verbal possibilita o leitor, a partir da expressão Sabe quem faz o melhor cachorro
quente do mundo? crer que quem faz o mais saboroso cachorro quente do mundo é um
determinado alguém. Porém, ao ler a resposta para a referida indagação, logo percebe que não
se tratava de um ser humano, mas da salsicha e, obviamente por se tratar de uma propaganda
da perdigão, não seria qualquer salsicha, mas a salsicha hot dog perdigão. Ainda a partir do
texto verbal, é retratado ao leitor que esta salsicha além de deliciosa, fácil de preparar é
irresistível, embora, agora ainda mais, com a nova embalagem que acabara de receber. E, se
você leitor, pretende fazer o melhor cachorro quente do mundo, não erre na receita: salsicha
hot dog perdigão.
A linguagem não verbal é marcada por uma sedutora imagem de um cachorro quente e dos
seus possíveis acompanhamentos. Todavia, o que mais chama a atenção é a mão masculina
que coloca sobre a salsicha, personagem principal da propaganda, uma camada de mostarda, o
que leve os leitores e possíveis consumidores do produto anunciado a crer que até mesmo um
homem, ser sem dom culinário, pode fazer o melhor cachorro quente do mundo.
Concluímos então por meio dessa análise que, a partir da salsicha hot dog Perdigão, qualquer
pessoa, mesmo as desprovidas de dotes culinários, poderão fazer rapidamente, o mais
saboroso cachorro quente do mundo. Os leitores dessa propaganda, acreditando nos
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argumentos apresentados nesta, consumirão o produto mesmo que em estado de distração e
jamais perceberão que foram meros objetos do jogo persuasivo que envolveu sonhos, desejos
e fantasias.
PROPAGANDA 2
Comecemos com a seguinte indagação: a propaganda está vendendo o carro ou diversão? Na
verdade as duas coisas, pois para que o produto, neste caso o carro, fosse apresentado ao
público teria que vir atrelado a algo prazeroso tal como a liberdade de desbravar os quatro
cantos da cidade. E, é claro, para que este sonho se realize não seria necessário um carro
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qualquer, mas um Renault Sandero Stepway. A mensagem é bem clara: para que o leitor vá a
exposições, baladas, restaurantes, enfim, conheça os mais variados lugares que há em sua
cidade só com um carro que propicie tal aventura.
Ao analisar o discurso verbal A sua cidade também vem com um monte de itens que você
desconhece supomos haver outra coisa, além da cidade, que possue algo desconhecido, mas
que é preciso conhecer para lhe ser permitido desfrutar de tudo que sua cidade possa vir a lhe
oferecer, neste caso, o carro anunciado.
No que diz respeito à linguagem não verbal, é revelada uma linda paisagem urbana
caracterizada por lindos prédios, praias, que serão habitados com grande facilidade por
aqueles que aderirem à propaganda e comprarem o carro. Mas onde estão as favelas da vida, o
subúrbio, as paisagens que como afirmam o poderio, mancham a imagem dos grandes centros
urbanos? Será que se esta imagem fosse à estampada na propaganda alguém haveria de
comprar o produto? Obviamente, não. Nem os que habitam lugares semelhantes, tampouco os
que residem em nobres bairros da cidade.
Pensemos ainda no público que faz grande esforço para adquirir um carro como esse,
acreditando a partir do que foi anunciado que realmente desbravará os quatro cantos da cidade
e frenquentará os âmbitos expressados por meio de tal propaganda. É sabido do grande
sacrifício que muitos fazem para ter um carro como esse e que na maioria das vezes abrem
mão de uma boa alimentação, educação, saúde e muitas outras necessidades básicas para
assim tê-lo e agradar a sociedade.
Assim é o poder da mídia sobre os leitores desprovidos de um senso crítico. Estes a partir de
um jogo persuasivo compram não os produtos, mas fantasias, sonhos, enfim, tudo que
acreditam satisfazer seu ego como ser humano. Para o leitor acrítico comprar um determinado
produto significa comprar a felicidade, o sucesso, a beleza, a juventude, a paz, o lazer, a
diversão e inúmeros prazeres a serem desfrutados. “Em outras palavras, a propaganda ou
publicidade comercial passou a vender imagens e signos e não as próprias mercadorias.”
(CHAUI, 2006, p. 39)
De fato, as artimanhas utilizadas pela mídia no sentido de persuadir os leitores, existem e
correspondem a um sistema vigente há tempos. Esta se imbui, a partir das linguagens verbal e
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não verbal, de argumentos que se aproximam do mundo real de seus apreciadores para assim
fazê-los crer que há um mundo que merece ser desfrutado por todos. Na maioria das vezes, a
poderosa mídia desperta em seus espectadores desejos, fantasias, sonhos e necessidades que
nem ao menos estes sabiam ter, mas que agora possuem em glória aos argumentos e imagens
que esta constrói almejando aguçar os sonhos mais eloquentes e obscuros dos enunciatários.
Dentro dessa perspectiva, temos um público manipulado pela mídia e pelos meios de
comunicação de massa. A mídia lança suas artimanhas para assim conseguir seus objetivos,
munindo-se de fortes argumentos que em mobilidade formam demasiadamente seres
semelhantes a robô, e que possuem no lugar de sua mente, lixeiras transbordando de
inconsciência e falta de criticidade. Destarte, traremos posteriormente o poder persuasivo que
esta exerce por meio da televisão, poderoso meio de comunicação de massa que no lar da
sociedade pós-moderna encontra um largo espaço e ocupa a posição de membro familiar.
3.1– ONDE ENTRA A TELEVISÃO
A televisão, considerada um meio de comunicação de massa pelo fato de informar em um
mesmo espaço de tempo um grande número de pessoas, tem marcado presença nos lares da
sociedade contemporânea. Esta vem exercendo bem mais que a função de um
eletrodoméstico, uma vez que como um membro familiar é responsável por grande parte da
formação que tem um dado indivíduo. A cada dia as pessoas tem se prostrado frente a este
meio de comunicação absorvendo todas as informações que este transmite.
No entanto, este poderoso veículo de transmissão de ideologias tem caráter manipulador, pois
a partir de suas programações prende a atenção de seus espectadores fazendo-os na maioria
das vezes adiquirir determinada postura que nem ao menos reconhecem o porquê de tal
escolha. Mas como se dá tal poder que faz com que o indivíduo viva sob a condição de mero
objeto frente à TV? Se pensarmos acerca das temáticas exploradas nos programas que esta
transmite será fácil encontrar resposta para tal questionamento. É conspícuo como ao assistir
um determinado programa de TV os telespectadores se identificam com alguém ou se
imaginam em determinadas situações, pois é assim que esta consegue prender a atenção,
revestindo-se de um simulacro condizente com a vida cotidiana daqueles que a prestigiam.
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A TV condiciona o pensamento do indivíduo a partir da mimese, evidenciando programas que
tem como foco temas banais que afloram o sentimento, seduzem e conquistam os
telespectadores. Nos conteúdos exibidos na televisão, segundo Chaui “Os assuntos se
equivalem, todos são questão de gosto ou preferência, todos se reduzem à igual banalidade do
“gosto” ou “não gosto”, do “achei ótimo” ou “achei terrível”. (2006,p.7) Não é explicitado em
momento algum o porquê da satisfação ou insatisfação, as explicações são sempre evasivas e
condicionadas.
Um claro exemplo para fomentarmos a pauta acima, são as reportagens que envolvem
conteúdos de roubo. É sempre indagado ao cidadão “delinquente”: “como foi que isso
aconteceu?” “você não está arrependido?”. Não é colocado em debate os possíveis motivos
que o levou a cometer tal atrocidade como: a fome, a miséria, o desemprego, problemas estes
que deveriam ser resolvidos para que tantas desgraças não viessem a acontecer. Mas, não é
conveniente para os detentores do saber e do poder evidenciar tal conteúdo, visto que trará a
tona a podridão e a incompetência da sociedade elitizada.
Focalizando as propagandas exibidas por meio desse meio de comunicação, é comum vermos
conteúdos embasados em situações que os telespectadores almejam viver e em determinados
momentos se imaginam na cena mostrada, querendo romper as barreiras que o impede de
estar “dentro” da tela. Acerca dos conteúdos propagandísticos Chaui afirma que:
[...] tanto pode recorrer aos estereótipos da dona de casa feliz (tento
orgasmo com a qualidade do detergente ou da margarina), dos jovens
felizes e saudáveis, prometidos ao sucesso e à exibição do prazer em todas
as suas formas (prazer suscitado pelos objetos que perderam a qualidade de
símbolos sexuais para se tornarem diretamente fetiches sexuais), das
crianças felizes e tranqüilas, prometidas ao amor familiar (o amor definido
pela capacidade dos familiares de satisfazer imediatamente todos os desejos
infantis, de gratificar imediatamente as crianças com o consumo dos
objetos, de cultivar o narcisismo infantil até suas últimas conseqüências).
(2006, p. 8)
Portanto, os elementos lingüísticos e imagéticos que envolvem as propagandas de TV, são
elaborados a partir das necessidades que os telespectadores possuem: serem felizes, livres,
bem sucedidos, entre outras. Para tornar crédulo o que foi versado, façamos a análise de um
dos comercias do refrigerante Coca-cola criado para a campanha do Natal do ano de 2008.
Comecemos a análise a partir da letra da música cantada no comercial:
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PROPAGANDA 3
Natal, natal, natal
Natal, natal, natal
Espalha essa magia ao seu redor
E contagia o mundo com o que você tem de melhor
Natal, natal, natal.
Espalhemos a magia do Natal! Contagiemos o mundo com o que temos de melhor! Mas o que
temos de melhor para oferecer nesta época que deveria ser caracterizada pela união familiar,
pela solidariedade, pelo amor? Pensemos na situação que vivem muitos telespectadores, sem
emprego, com família desestruturada e que sequer tem uma simples refeição para fazer. O que
estes podem oferecer? Quais os seus sonhos para a Noite de Natal?
A Coca-cola pode presentear-lhes com esses sonhos, para isso basta uma única exigência: o
consumo do produto anunciado. Isso fica muito claro ao analisarmos as imagens do
comercial. O bom velhinho, Papai Noel, Produz a partir da sua máquina a fórmula da
felicidade e a lança para o mundo por meio de um super canhão. Todos que estão tristes e
rancorosos, ao verem a produção que sobrevoa ao céu mudam de comportamento.
A princípio, é mostrada uma garotinha que vê pela janela da sua casa a fórmula que vem na
forma de uma estrela e logo em seguida vai ao encontro da sua família para juntos
compartilharem de uma farta ceia, que evidente tem como única bebida o refrigerante
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anunciado. A primeira atitude dessa é ajudar, provavelmente seu irmão, que está com os
braços engessados. Esta leva o copo de coca-cola à boca dele para que ele também seja feliz.
Posteriormente, uma jovem que caminhava triste pelas ruas ao observar a fórmula, depara-se
com uma planta com um galho pendendo e, com uma fita vermelha, cor do rótulo da cocacola, fixa o galho a um pedaço de madeira e em seguida leva à boca uma garrafa do
refrigerante anunciado.
Partindo para o texto verbal temos os seguintes discursos: Presenteie o mundo com o seu
melhor/ Viva o lado coca-cola do Natal e De: coca-cola para: o mundo.
O comercial, a partir das imagens explicitadas, foi muito claro ao enfatizar que o melhor
presente para o Natal é o refrigerante, justo que ao fim deste, é mostrado com a etiquete na
qual está escrito “De coca-cola para o mundo”, o que afirma aos telespectadores que o
produto é consumido por todos no mundo e você que assiste ao comercial não pode ficar sem
saciar a sede com o refrigerante que lhe trará felicidade.
Quanto a viver o lado coca-cola da vida, subtendemos que o lado coca-cola seria o lado bom,
atrelado a felicidade, a solidariedade. No entanto, com base em tudo que foi pautado neste
trabalho, afirmamos que a propaganda vendeu a princípio a imagem da felicidade, para então
vender o produto. Este foi o poder persuasivo utilizado pela mídia para seduzir o leitor
espectador que a partir da necessidade de ser feliz, possivelmente consumirá o produto
mesmo sem perceber que caíra nas artimanhas de um discurso marcado pela fantasia.
Também, muito comum nos comerciais de TV, é a desvalorização humana e o apego ao
material, uma vez que estamos vivendo a era do capitalismo “selvagem”, era esta que exclui,
invalida e que faz do ser humano um objeto que apenas tem valor quando possui algo a
oferecer. Para fomentar o debate, façamos a análise do comercial produzido para divulgar o
novo carro Renault Clio.
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PROPAGANDA 4
Ao parar no semáforo, um motociclista é abordado por três lindas jovens que estavam em um
Renault Clio e acreditara ele, estarem o paquerando. Porém, logo é acometido a decepção. As
garotas deslumbravam o homem do Renault Clio que estava ao seu lado.
Mais a frente é surpreendido por uma cena na qual uma jovem abraça e beija loucamente um
homem que tem o carro anunciado. Continuando seu trajeto, vê desta vez, uma outra jovem
beijar apenas o rosto de um homem, porém, este não tem o carro do anúncio, mas um outro.
Tendo percebido que todos os homens que possuíam o Renaul Clio faziam sucesso com as
mulheres resolveu adquirir de uma forma engraçada o carro do anúncio. Ao passar em frente a
um outdoor, tem a feliz ideia de, com um estilete, retirar o carro e posteriormente acoplá-lo à
sua motocicleta. Para sua felicidade constatou seu pensamento “faz sucesso com as mulheres
o homem que possui tal carro e não caráter e dignidade”, uma vez que logo a frente é
surpreendido por uma linda mulher que o vislumbra, ou melhor, o seu carro-moto.
No caso encenado, já que as propagandas de televisão revestem-se de todo um simulacro para
atingir seus objetivos, neste caso o de persuadir o leitor espectador para fazê-lo aderir a uma
dada ideologia, o poder persuasivo utilizado pelos produtores do comercial analisado, foi
mostrar que, para o homem “possuir” todas as mulheres que queira basta ter um Renault Clio.
No entanto, sabemos que isto não é fato consumado, foi apenas um simulacro montado para
que os homens que assistissem ao comercial acreditassem e comprassem o produto.
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Ao final da propaganda o discurso verbal confirma o que o imagético falara anteriormente:
Novo Renault Clio faz você parecer bom. Ou seja, você pode ser um indivíduo cheio de
falhas, ter caráter duvidoso, mas se possuir o carro Renault Clio se assemelhará a seres
brilhantes, magníficos e merecedores de toda atenção. Mas, diante de tal atitude, onde ficam
os valores humanos? Logicamente, “debaixo do tapete”. Não nos surpreendamos, visto que a
mídia imbui-se de todos estes artifícios para conseguir o que quer, neste caso, formar seres de
mentes vazias e obter lucros a partir de tal persuasão. Nesse caso como fica a situação da
mulher que é vista como mero objeto e alienada pela imagem de um carro, ou seja, mais uma
vez tiram da mulher a condição de ser pensante e dão-lhe um estereótipo de coisa que procura
coisa (mulher-carro), um ser alienado que pode ser ludibriado com um bem material.
Acoplado a desvalorização humana, temos em especial, a desvalorização feminina. Verídico
se torna o discurso, ao analisarmos as propagandas interpretadas por Patrícia Silveira para a
campanha da cerveja Antártica.
PROPAGANDAS 5 E 6
A primeira a ser analisada mostra a atriz fazendo todos os preparativos para receber um
possível namorado. O comercial é marcado unicamente pela linguagem não verbal e por uma
música internacional que serve de pano de fundo para elevar o clima de romance. No embalo
da canção, a atriz e modelo cozinha e utiliza como tempero a cerveja anunciada, passa a roupa
que vai usar na ocasião e a borrifa com a cerveja, aromatiza o ar também com a cerveja e por
fim passa em seus lábios o batom “antártica”.
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Com a chegada do rapaz, este a beija e logo senti-se atraído. Mas por quem, pela mulher ou
pela cerveja? Se o ambiente, o jantar e seu corpo exalavam a cerveja e os seus lábios tinham o
sabor da mesma? Óbvio que foi seduzido pela cerveja e não pelo lado feminino.
O outro corpus analisado mostra Patrícia Silveira desfrutando de seu sono, quando de repente,
leva um pequeno susto ao ouvir o estalar de uma lata de cerveja Antártica sendo aberta por
seu namorado. Este começa a lambuzá-la com o conteúdo da embalagem e conseguinte a
correr os lábios pelos locais do corpo da jovem que recebera a cerveja. Desconcertantemente,
começa a jogar cerveja em objetos como abajur, cela de bicicleta e a correr os lábios assim
como fizera com a jovem, que mostrava a partir da sua expressão facial não entender o que se
passava.
Ao perceber a intenção do rapaz, esta desprovida da valorização pessoal e louca para
satisfazer-se, lança sobre o seu corpo a mesma cerveja na esperança que seu parceiro voltasse
a lhe desejar. O comercial culmina com o seguinte discurso verbal: Com Antártica é mais
gostoso. Destarte, qualquer ou quem quer que seja fica mais gostoso se desfrutar da cerveja
anunciada o que leva os desfavorecidos de um senso crítico a acreditarem em tal atrocidade e
consumirem o produto na esperança de que isso acontece.
Mas qual posição ocupa a mulher na sociedade frente a uma propaganda como esta? Sem
sombra de dúvidas a de mulher objeto, que não tem sentimento e que veio ao mundo sob uma
única condição: satisfazer, satisfazer e satisfazer os homens. Infelizmente, são coisas como
essa que confirmam o poder da mídia sobre os indivíduos. Esta consegue manipular até
mesmo o pensamento dos leitores espectadores que aderem as ideologias veiculadas por meio
dos discursos por ela utilizados.
Analisemos agora uma propaganda promovida pelo Ministério da Educação para divulgar o
programa Prouni do Governo Federal.
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PROPAGANDA 7
O comercial ganha vida com um rapaz de cor negra que, ao cantar a música Para não dizer
que não falei das flores de Geraldo Vandré em um cenário favela, segura com firmeza a
bandeira do Brasil evidenciando que confia em sua pátria, ou melhor, em seus governantes.
Este, caminhando e cantando como diz a canção, recebe como segundas vozes três jovens
também de cor negra. Ao longo da sua caminhada depara-se com jovens negros praticando
esportes e outras pessoas que encontra pelas ruas que o acompanha e seguem juntos a canção.
Ao encontrar, em um bairro classe média da sociedade brasileira um garoto de cor branca,
profere a seguinte parte da canção: “somos todos iguais, braços dados ou não”, e logo em
seguida o garoto também o acompanha. Mas será que diante dos poderosos detentores do
saber somos realmente iguais? Logicamente, não.
O jovem continua a caminhar e cada vez mais leva consigo um maior número de pessoas
sendo estes, brancos, deficiente físico e em maior destaque numérico, negros, já que um dos
objetivos do comercial é enfatizar que os mais beneficiados com o programa serão
pertencentes à classe menos desfavorecida economicamente. O comercial apresenta como
desfecho a seguinte proposta:
O programa Prouni, Universidade para todos do governo federal, já ofereceu mais de 200 mil
vagas no ensino superior. O Prouni garante aos estudantes bolsas gratuitas ou com 50% de
desconto em faculdades particulares de todo o Brasil. Faça parte dessa revolução na educação
brasileira. Ministério da Educação, um país de todos.
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Este comercial trouxe a baila os principais fundamentos teóricos que expomos ao longo deste
trabalho, visto que evidencia o poder da mídia e a coloca na condição especial de que para
produzi-la se faz necessário deter o poder e o saber. O poderio veio explicitar através desta
que muito está contribuindo para o crescimento do povo brasileiro. Mas, para o crescimento
de qual classe da população brasileira?
É sabido que para o jovem ser beneficiado com este programa se faz necessário enfrentar
avaliações que testam os conhecimentos adquiridos em toda a sua vida educacional. Sabemos
ainda que o público menos favorecido economicamente dificilmente vencerá essa barreira,
uma vez que durante sua vida frequentou escolas públicas e enfrentou inúmeras dificuldades
para concluir as etapas estudantis. Chegar lá, este público pode até chegar, mas em meio a
muitas dificuldades e sendo um ser extraordinário como já afirmamos em linhas anteriores.
Este veio afirmar ainda que mesmo os descrentes devem acreditar no país, porque os seus
governantes estão desempenhando um ótimo trabalho; que mesmo tendo padrões de vida
diferenciados somos todos iguais; que este programa criado pelos poderosos para a felicidade
da massa é uma revolução na educação brasileira e que o Brasil é um país de todos.
Tudo muito bem elaborado e convincente, porém para os indivíduos de mentes semelhantes a
uma lixeira vazia, ou seja, aos desprovidos de um senso crítico. Mas, infelizmente esse foi o
maior objetivo do presente trabalho, mostrar como a mídia, em especial a televisiva, manipula
incessantemente a massa a fazendo compactuar com suas ideologias e a dando pequenas e
diárias doses do colírio que favorece a cegueira.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao analisar o tema em foco, constatou-se que as propagandas de um modo geral e,
especialmente a de TV utilizam diversas artimanhas na tentativa de convencer o telespectador
da imprescindível relevância daquele produto para sua vida. Assim, ao término desse trabalho,
comprovou-se que os produtores, juntamente com os patrocinadores desse tipo de propaganda
recheiam de sonhos e fantasias os discursos verbais e imagéticos na tentativa de persuadir os
telespectadores fazendo-os compactuar com suas ideologias.
Por conseguinte, a forma como esses elementos estão dispostos, tanto no discurso verbal
como no imagético nas propagandas de TV, não exigem do telespectador um olhar crítico, e
tampouco, aguçam sua consciência o fazendo pensar acerca das vantagens e desvantagens da
aquisição do produto anunciado. No entanto, para que este não caia no emaranhar de teias
lançadas por meio do discurso propagandístico, deve, a princípio, ser um formador de opinião
e ter um senso crítico a partir do qual transcenda suas ideologias.
Durante sua realização, ficou claro que na busca pelo entendimento amplo da mensagem e
para não ser persuadido, se faz necessário que o telespectador abarque bem mais que o
conhecimento linguistico, sendo-lhe preciso conhecer o mundo que o circunda, bem como ser
um indivíduo de pensamento e opiniões formadas, trocando em miúdos, ser crítico e possuir
suas próprias ideologias.
Ao término das análises, o questionamento formulado anteriormente ao processo de pesquisa
foi satisfatoriamente respondido, ou seja, acerca da indagação de quais os fatores que levam
os telespectadores a compactuarem com as ideologias vigentes nos discursos das propagandas
de TV e conseguinte adquirirem o produto anunciado, obteve-se a seguinte resposta: a forma
como a mídia, em especial a televisiva, emprega tais discursos, partindo da necessidade do
telespectador (felicidade, liberdade, comodidade, entre outros) e a ausência de criticidade por
parte dos mesmos.
Vale ressaltar que os resultados obtidos a partir do presente trabalho não findam com esta
pesquisa monográfica e estão abertos a contestações, visto que o tema oferece um vasto
campo de estudo e poderá servir de alicerce a outros trabalhos que venham a ser
desenvolvidos nesta área.
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