Relato do Caso
O menor feminina, de dois anos de idade, foi encaminhada ao Ambulatório de
Pneumologia Infantil por crise de broncoespasmo diária e pneumonias de repetição com
necessidade de internação hospitalar nos últimos 6 meses.
HMA
Iniciou quadro de tosse súbita com 1 ano e 6 meses com crise de cianose labial. Levada
ao Pronto Socorro Infantil onde foi diagnosticado broncoespasmo e pneumonia atípica
tratada com macrolídeo com melhora parcial. Foi internada após 7 dias de tratamento
domiciliar devido a quadro febril e pneumonia lobar inferior direita. Desde este episódio
a criança permaneceu com broncoespasmo diário sendo interpretado como asma e
iniciou tratamento com corticóide inalatório. Necessitou de diversas visitas ao Pronto
Socorro por tosse, febre e crise de broncoespasmo. Apresentou mais dois episódios de
pneumonia lobar direita com uso de diversos antibióticos.
Uso de budesonida 200 mcg 12 em 12 horas há 2 meses com pouca melhora.
Não trouxe radiografias antigas, mas relatórios de alta hospitalar e encaminhamento
indicando “pneumonia em lobo inferior direito”
Trouxe tomografia de tórax realizada há um mês.
HF
Pai e mãe com rinite atópica
Irmão com rinite.
Exame físico
BEG, afebril, acianótica, corada, hidratada
AR: MV presentes bilateralmente, roncos grosseiros, sibilos localizados em lobo inferior
direito. Saturação de O2: 98% em ar ambiente.
ABD: flácido, indolor, ruídos hidroaéreos presentes.
ACV: BNF R2T sem sopro.
Oroscopia e otoscopia normal. Hipertrofia de cornetos nasais e secreção clara.
Exames
Hemoglobina 15,5 g/dL
Hematócrito 45,6 %
VCM 82,8 fL
HCM 28,1 pg
CHCM 34,0 g/dL
RDW 13,6 %
Leucócitos 6.440
Neutrófilos 3.149
Eosinófilos 142
Basófilos 32
Linfócitos 2.698
Monócitos 419
Contagem de Plaquetas 194.000
Radiografia de tórax no dia da consulta
Borramento da linha cardíaca direita e discreto infiltrado em campo médio direito próximo
ao hilo direito.
Tomografia de tórax
Hiperinsuflação do pulmão direito e faixa atelectásica em lobo médio.
Questão 1: Quais ao diagnósticos mais prováveis?:
a) ( ) – Atelectasia de lobo médio por muco
b) ( ) – Pneumonias de repetição secundária a imunodeficiência primária
c) ( ) – Asma grave de difícil controle.
d) ( ) - Tuberculose.
e) ( ) – Aspiração de corpo estranho
Questão 2: Qual a melhor conduta neste caso?:
a) ( ) – Fisioterapia respiratória diária e controle radiológico em 1 mês
b) ( ) – Nova tomografia com reconstrução e broncoscopia virtual
c) ( ) – Dobrar a dose de corticóide inalatório
d) ( ) – Associar B2 de longa duração
e) ( ) – Broncoscopia com anestesia geral
Evolução
Devido a história de início súbito, quadro pouco responsivo ao tratamento e pneumonias
de repetição no mesmo lobo, a paciente foi internada e encaminhada para realização de
broncoscopia sob anestesia geral no dia seguinte a primeira consulta. Foi identificado
um amendoim em brônquio principal direito e retirado com broncoscópio rígido.
Imediatemente após o exame, a criança apresentou melhora da sibilância,
permanecendo com roncos grosseiros. Uma semana depois a criança apresentava
ausculta normal, sem uso de medicação. Recebeu alta. A mãe descobriu que o irmão
mais velho (6 anos de idade) ofereceu amendoim para a criança, ela se engasgou mas
ele ficou com medo de contar para os pais.
Visão endoscópica do amendoim endobrônquico
As respostas corretas são 1-E e 2-E.
Aspiração de corpo estranho (ACE) é um acidente sério e potencialmente fatal.
Agudamente, sua gravidade dependerá do grau de obstrução da via aérea.
A ACE pode ocorrer em qualquer fase da vida, mas é um evento muito mais freqüente
em crianças e idosos.
O diagnóstico precoce da ACE é essencial, pois o retardo no seu reconhecimento e
tratamento pode resultar em seqüela definitiva ou dano fatal. Não é incomum pacientes
tratados por semanas e meses por doenças respiratórias recorrentes, erroneamente
diagnosticadas, tais como asma, bronquite crônica, laringite, refluxo gastroesofágico,
serem diagnosticados tardiamente como ACE.
As sementes, principalmente amendoim, milho e feijão são os principais causas de ACE
nas crianças respondendo por 40% das ocorrências. No entanto, fragmentos de
brinquedo, brincos, tampas de canetas são relatados.
A apresentação da ACE é muito variável e depende do evento ser testemunhado, a
idade do paciente, o tipo de material aspirado, o tempo decorrido desde o acidente, o
grau de obstrução das vias aéreas, e a localização do objeto. Somente a metade dos
casos de ACE é diagnosticada nas primeiras 48 horas.
A broncoscopia é o procedimento de escolha para a retirada do corpo estranho e deve
ser realizada em todos os casos de suspeita de corpo estranho mesmo que os exames
radiológicos sejam normais.
Nas crianças, o episódio testemunhado de asfixia, com um quadro de engasgo, seguido
de acesso de tosse muitas vezes acompanhada de cianose perilabial em uma criança
previamente saudável, é bastante sugestiva de ACE e tem uma sensibilidade de 76 a 92
por cento para o diagnóstico. No entanto, nem sempre o episódio é relatado pelos pais
espontaneamente, principalmente quando o episódio agudo for auto-limitado, seguido
por um período sem sintomas, que os pais interpretam errôneamente como um sinal de
resolução, atrasando o diagnóstico. A ACE também pode ser suspeitada no primeiro
quadro súbito de sibilância, na tosse persistente, diminuição localizada da entrada de ar,
estridor, sibilos localizados e dificuldade respiratória refratária ao tratamento.
Aproximadamente 40% dos pacientes podem ser assintomáticos e sem alterações ao
exame físico. Uma história de asfixia, quando especificamente solicitado, é encontrada
em cerca de 80 a 90 por cento dos casos confirmados de ACE.
Apesar de existirem relatos na literatura, tomografia de tórax, broncoscopia virtual,
ressonância magnética, fluoroscopia e cintilografia raramente contribuem para o
diagnóstico de ACE, agregam maiores custos e não excluirão a realização da
broncoscopia se a suspeita for de aspiração de corpo estranho. Portanto, devem ser
utilizados com muita cautela para que não retardem o diagnóstico e o tratamento.
A broncoscopia é o padrão-ouro no diagnóstico e tratamento da ACE.
Quase todos os corpos estranhos aspirados podem ser extraídos por broncoscopia. Nos
casos de falha, broncotomia cirúrgica ou ressecção segmentar pode ser necessária
Referências Bibliográficas:
1. Rodrigues AJ, Scussiatto EA., Jacomelli M, Scordamaglio PR, Gregório MG, Palomino
ALM, Oliveira EQ, Figueiredo VR. Bronchoscopic techniques for removal of foreign
bodies in children's airways. Pediatric Pulmonology, 2012; 47(1): 59–62.
2. Hui H.Therapeutic experience from 1428 patients with pediatric tracheobronchial
foreign body. J Pediatr Surg 2008; 43(4): 718-21.
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