O CASO DA FABRICAÇÃO DE
LATAS: A análise ergonômica
como ferramenta pericial
• Airton Marinho da Silva
•
Médico do Trabalho Auditor Fiscal do Trabalho
• Delegacia Regional do Trabalho em Minas Gerais
• Endereço: Rua Tamoios 596, 5º andar, Centro, Belo
Horizonte,MG,
• Fax.:31.3270 6150 - E-mail : [email protected]
ANÁLISE DA DEMANDA:
• O longo processo na Justiça do
Trabalho.
• “Acidentes” do Trabalho
• LER/DORT (“suspeitas”)
• Convocação do Agente de
Inspeção do Trabalho
FUNCIONAMENTO DA
EMPRESA:
• 200 toneladas de chapas ao mês
• "just in time”
• Número de empregados: 227, em
2 turnos - 99 mulheres.
• Concorrência: automatizadas
• tendência clara de redução de
número de empregados
Produto:
• latas em chapas finas de aço
(''folhas de flandres"), de diversas
dimensões, formatos, tipos e
finalidades
A OPINIÃO DO PROPRIETÁRIO
• "não adianta" trazer máquinas
mais ágeis porque trabalhariam
por poucas horas ao dia e ficariam
ociosas
• perdas na situação atual de cerca
de 15% da matéria prima
utilizada.
A OPINIÃO DO PROPRIETÁRIO
• insuficiência de recursos para
melhorias e investimentos
• maior desperdício está no "erro
humano" e na falta de manutenção
correta do maquinário.
Recursos humanos
• Não há política de pessoal
• 3 ou 4 anos como "ajudantes”,
apesar de operar máquinas
• não há perspectivas de ascensão
funcional e salarial.
• treinamento "on-the-job”
• “1 semana ele já é capaz de
produzir”
Organização
Hierarquia simplificada:
• gerente geral

• poucos supervisores de área
(trabalhadores provindos da
própria linha de produção) 
• diretamente aos empregados da
produção.
A produção:
• (privilegia a flexibilidade do
produto final)
• seleção e corte de chapas
(“folha de flandres”)
• impressão em litografia
– rotativas e plana
• conformação de partes em cerca
de 40 prensas
A produção:
• montagem em linhas (esteiras)
(15 minutos para novo produto):
• dobradeiras
• "grafagem" ou solda
• "pestanha”
• "frisadeiras”
• "recravadeiras”
• controle de qualidade
• embalagem e expedição.
Seleção e corte de chapas
Limpeza de rolos impressores na rotativa
Operação da impressora “plana”
Folhas de chapas
• 30 ton. de folha "mala" (não
alimentícios) e mais 180 toneladas
ao mês de folhas virgens/mês
– espessura: 0,21 mm
• Peso: 550 chapas = 1090 kg
ou 1,6 toneladas = 1.500 chapas
Tintas e solventes
• “ésteres de colofônia, resinas
maleicas e alquídicas , óleos
vegetais refinados e
hidrocarbonetos alifáticos +
Pigmentos orgânicos e
inorgânicos."
• águarrás
Horário de trabalho
• 2 turnos: 07 às 15:30
14:30 às 22:52 hs
• 1 (uma) hora para repouso e
refeição
• intervalo de 10 minutos antes das
refeições, para "ginástica laboral".
• "banco de horas”, informal
Salários
• Ajudantes: R$ 255,00
• Operadores: R$ 275,00
• Ajudantes "... pegam nas
máquinas ...", por vários anos, e
não são classificadas como
"operadoras"
Acidentes
• 1996 - 25% da força de trabalho
sofreu acidentes (6 acidentes “com
afastamento” por mês.)
• 1997 - 23,1%
• 1998 - 15,7%
• 1999 - 9,32% (3 por mês).
• Linha de Montagem e Estamparia
Análises dos acidentes pelo
SESMT:
SOBRE CHAPAS:
• manuseio de folhas de uma só vez
• "folhas escorregadias"
• folhas sobre fardos desamarrados
SOBRE MÁQUINAS
• proteção insuficiente na prensa de "virolar"
• proteção insuficiente na "enroladeira"
• "a folha agarrou na máquina” (+++)
• "guilhotina" sem proteção
Análises SESMT, cont.
“ATOS INSEGUROS”:
• "falha na avaliação do perigo"
• "falta de cuidado"
• "pisou no pedal com a mão na
máquina"
• "empilhamento inseguro"
• Modo operatório considerado inseguro
Análises do SESMT, cont.
“ATOS INSEGUROS”
• operar pedal com mão na área de
atuação da recravadeira
• funcionamento acidental da
recravadeira com mão nos "roletes";
• limpeza de rolo com máquina em
movimento (impressora rotativa)
HIPÓTESES INICIAIS:
Por que tantos acidentes ?
• falta de proteção adequada de
partes móveis de máquinas
• trabalho sob pressão de tempo
• exigências de produtividade
• picos de produção não previstos
• planejamento precário do ritmo de
produção da fábrica
OBSERVAÇÕES DETALHADAS
SETOR DE PRENSAS:
• Pedais mecânicos (grande curso,
duros)
• falta de proteção de área de ação
das ferramentas
• falta de proteção contra
acionamento acidental
• improvisações
• queixas de "dor no joelho"
IMPROVISAÇÃO NO PEDAL DE GUILHOTINA
A POSTURA SEMI-ASSENTADA NA PRENSA
A RETIRADA DE PEÇAS DE
PRENSA DA LINHA DE
"CUMBUCA"
LINHA DE CUMBUCA (cuia):
• "... primeiro é preciso esperar tomar
confiança com outras máquinas menos
perigosas, prá depois trabalhar na cuia... ”
• "só pessoa com muitos anos de
experiência...”
• "no repuxo, se entrar errado, perde a peça...”
LINHA DE CUMBUCA (cuia):
• "não pode é ficar com medo..."
• "quando está tudo funcionando a gente
nem percebe o tanto de barulho que
cada uma máquina faz...”
• "as mais velhas não querem sair da
"cuia", acostumaram..."
Linhas de Montagem
 LINHA DE “10 kg”:
 (até 8.000 latas/dia)
– SOLDA
– PESTANHADEIRA
– APLICAÇÃO DE VERNIZ
– FRIZADEIRA
– RECRAVADEIRA
– CONTROLE DE QUALIDADE
– EMBALAGEM E EXPEDIÇÃO.
O TRABALHO NA MÁQUINA
RECRAVADEIRA
NA RECRAVADEIRA, AS MÃOS
CHEGAM JUNTO AOS ROLETES
EM MOVIMENTO, segurando a
tampa ainda solta (4 a 6000
peças ao dia)
A LINHA DE MONTAGEM
"eletrodo" (3 a 4 000 peças ao
dia)
AS PEÇAS DEFEITUOSAS:
(até 10% da produção)
 O uso da "Turqueza”
 banquinhos ao final da linha
• Os defeitos de recravagem (maior
fonte de erro) levam ao desmonte
da lata para voltar ao início da
linha.
• - "Nossa!, perdeu isso tudo ?!?...",
ao ver o grande refugo de uma
linha, a ser retrabalhado.
O DESMANCHE DA RECRAVAÇÃO COM A
'TURQUEZA'
O ambiente de trabalho - Ruído
• Litografia I: 91 dB
• Litografia Galpão 2: 87 dB
• Estamparia: 91 dB
• Corte: 91 dB
• Linhas de montagem: 87 a 92 dB
• Área de expedição : 86 dB
Percepções do desgaste
• ”- ... péra aí, gente !!...” (trabalhadora
agitada com o acúmulo de peças junto a
seu posto de trabalho: ”-... deu rôia...”
• "... já frizei a mão uma vez...”
• "...tem de dar rolha neles... senão só eu
trabalho e eles vão pro banheiro, ficam
à-toa... "
Percepções do desgaste
• "mais gente era melhor para
rodízio."
• "reduziu 9 pessoas na linha...”
• "... Aqui é o fim do mundo, muita
agitação, os braços tudo
cortado...".
• "... Agora está mamão com mel...
não tem pressão prá produzir..."
Percepções do desgaste
• "... Antes era muita produção, hora extra
todo dia, trabalhava todo domingo,
folgava 1 sábado outro não, pagavam
300% de hora extra,..., chegava a tirar
500 reais por mês...”
• "... foi por isso que lesou tanta gente na
década de 90..."
AS CADEIRAS:
"... gordo não cabe ..."
2 modelos: (fora as banquetas)
• a) "giroflex", reguláveis em altura
por alavanca, rotativas, apoio
circular para os pés. Assentos e
encostos sem acolchoamento, em
madeira envernizada.
("...desequilibra e machuca..." ).
AS CADEIRAS:
"... gordo não cabe ..."
• b) cadeiras de estrutura de metal,
apoio circular para os pés, regulagem
(difícil) por pinos na coluna central, não
rotativa, assentos e encosto em plástico
acolchoado, encosto na vertical, sem
regulagem em altura ou no sentido
ântero-posterior.
Assento na linha de montagem
AS EXIGÊNCIAS MÚSCULO
ESQUELÉTICAS:
• intensa movimentação dos
membros superiores
• postura semi-assentada, ou em
pé, por longo tempo, cadeiras não
apropriadas
• operação contínua de pedais
pesados e maldimensionados, de
máquinas perigosas
AS EXIGÊNCIAS MÚSCULO
ESQUELÉTICAS:
• ajustes corporais de grande
desvantagem biomecânica
• pernas abertas, ou de um lado,
acionando o pedal, improvisando
apoio para perna esquerda
• equilíbrio instável, contração
estática constante da musculatura
das pernas, dos quadris e da
coluna vertebral.
Posturas de trabalho
(Laville, 1976)
determinadas por:
• exigências visuais
• exigências de precisão de
movimentos
• exigências de força a ser exercida
• os espaços onde o operador atua
• o ritmo de execução.
INADEQUAÇÃO POSTURAL:
• Não possibilidade de alternância
postural  tempo longo 
impossível modificar  postura
penosa
• postura aparentemente confortável
(assentada)  desconfortável pela
necessidade de apertar pedal, a
distância fixa e não regulável.
INADEQUAÇÃO POSTURAL:
• desequilíbrio de um segmento
corporal, corpo todo tem de se
ajustar  parcial ou
temporariamente  esforços
prolongados
• Resultado  dores e lesões
musculo-ligamentares.
LER/DORT :
3 (três) componentes básicos.
("les boucles infernales")
Guérin e cols., 1991
– 1) uma fonte de perda de produtividade não
detectada pela empresa.
– 2) tentativas de compensação:
• aumento de ritmos e de exigências de produção
• horas extras
• trabalho de recuperação de refugos
• manutenção e limpeza de máquinas em
movimento
• redução de mão de obra
(entre outros)
LER/DORT :
3 (três) componentes básicos.
("les boucles infernales")
Guérin e cols., 1991
• 3) agravamento na perda de
produtividade:
– mais refugo, mais acidentes, mais
casos de LER/DORT, queda na
qualidade, retrabalho, maior custo
salarial pelas horas extras, redução
da produtividade individual, entre
outros.
Pontos críticos levantados:
• acionamento a pedais de altura
não regulável nas máquinas
• posição semi-assentada em
cadeiras inadequadas
• milhares de peças por hora em
ritmo de esteira rolante
• “just in time” sem pausas
definidas, ritmo imprevisível, sem
estoques intermediários
adequados;
Pontos críticos levantados:
• movimentação repetitiva contínua
de membros superiores em ciclos
de 40 a 50 segundos por peça
• utilização de ferramentas
inadequadas ("torquezes”), com
movimentos que exigem força,
desvios ulnares e compressão de
partes moles
Pontos críticos levantados:
• Rodízios informais e baseados em
“coleguismo” (apenas nas linhas)
• falta de participação dos
trabalhadores em qualquer decisão
em relação a organização do
processo de trabalho e suas
exigências.
RECOMENDAÇÕES QUANTO A RISCOS
DE ACIDENTES COM MÁQUINAS
• a) ferramenta de prensa fechada
• b) enclausuramento da zona de
prensagem, com fresta que
permita apenas o ingresso do
material e não da mão humana
• c) "mão mecânica"
• d) sistema de alimentação por
gaveta
RECOMENDAÇÕES QUANTO A RISCOS
DE ACIDENTES COM MÁQUINAS
• e) sistema de alimentação por
gravidade e de remoção
pneumática
• f) sistema de bandeja rotativa
(tambor de revólver)
• g) cortina de luz com autoteste
• h) comando bimanual com
simultaneidade e auto-teste.
RECOMENDAÇÕES QUANTO A
INADEQUAÇÕES ERGONÔMICAS
• No acionamento a pedais nas
máquinas:
– eliminação (botoeira dupla)
– regulagem emergencial
– pedais pneumáticos
– proibição de “acionamento
contínuo” (improvisado)
RECOMENDAÇÕES QUANTO A
INADEQUAÇÕES ERGONÔMICAS
• cadeiras inadequadas: todos os
assentos, em todos os postos de
trabalho, deverão atender ao
exigido na NR-17, item 17.3.3
• espaço para pernas
RECOMENDAÇÕES QUANTO A
INADEQUAÇÕES ERGONÔMICAS
Nas esteiras rolantes:
• trabalho em células
• formação de estoques
intermediários adequados
• polivalência ("coringa"),
• utilização de todas as máquinas
disponíveis nas linhas
• rodízio organizado de
trabalhadores do setor
RECOMENDAÇÕES QUANTO A
INADEQUAÇÕES ERGONÔMICAS
• Quanto ao uso de ferramentas
inadequadas, como as "turquezas":
– descarte das peças defeituosas como sucata
– redução do refugo (melhorias na matéria
prima e maquinário)
– equipamento mecanizado de desmanche
– ferramenta ergonomicamente projetada para
as dimensões e formas da mão humana
OUTRAS RECOMENDAÇÕES QUANTO A
INADEQUAÇÕES ERGONÔMICAS
• Medidas ambientais anti-ruído
• participação dos trabalhadores
• ventilação
• iluminação
• tipo de matéria prima
• eliminação ou correção da
“ginástica laboral”
Situação em Agosto/2001
•
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•
•
•
136 empregados (< 40%)
eliminação das linhas “vassoura” e “cuia”
manutenção em pedais
rodízios 4 vezes ao dia
1 técnica de segurança (< 50%)
plataforma na litografia
torneiras nos tambores no almoxarifado
Audiência para 12/09 (DRT, MPT, JT).
CONCLUSÕES:
• Análise Ergonômica do Trabalho,
focada na atividade e com
objetivos práticos e concretos,
pode ser uma ferramenta
inestimável na melhoria dos
ambientes de trabalho
CONCLUSÕES:
• Aplicação direta na Justiça do
Trabalho, nas mãos de Juiz do
Trabalho envolvido, pode ajudar a
por fim a uma longa e ineficaz
discussão, que não tem trazido
benefícios práticos aos principais
interessados.
Airton Marinho da Silva
Médico do Trabalho Auditor Fiscal do Trabalho
Delegacia Regional do Trabalho em Minas Gerais
Endereço: Rua Tamoios 596, 5º andar, Centro, Belo Horizonte,MG,
Fax.:31.3270 6150 - E-mail : [email protected]
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