Estratégias de Intervenção Socioeducativa em Contextos Sociais Complexos Estudo Prospetivo e de Avaliação RELATÓRIO FINAL PROJETO Estratégias de Intervenção socioeducativa em contextos sociais complexos Estudo Prospetivo e de Avaliação POAT 00377402011 DATA julho de 2013 EQUIPA João Sebastião (coordenador) Joana Campos Sara Merlini Mafalda Chambino Gerir, conhecer e intervir 1 Índice Introdução ...................................................................................................................... 8 I. Violência, controlo disciplinar e estratégias de intervenção .................................... 10 1. A Violência na escola como problema social .................................................................. 10 1.1. transformações no sistema educativo e violência na escola ................................ 10 1.2. Representações sobre a violência ........................................................................ 12 2. A violência como problema científico............................................................................. 13 3. Desigualdades escolares e controlo disciplinar ............................................................... 18 3.1. Distinções territoriais e desigualdades escolares ...................................................... 18 3.2. controlo disciplinar e clima de escola....................................................................... 19 4. organização escolar e as políticas de regulação da violência na escola ......................... 21 4.1. As lideranças escolares e as orientações face à violência na escola ......................... 21 4.2. A evolução e centralidade das "políticas de regulação dos comportamentos" ......... 22 II. Políticas públicas ..................................................................................................... 24 1. As políticas de inclusão e igualdade: evolução, orientações e instrumentos ................... 24 2. As políticas de segurança escolar: contextos, conceitos e instrumentos de intervenção . 26 III. Territórios .............................................................................................................. 30 1. A perspetiva dos agentes locais ....................................................................................... 30 1.1. Caracterização dos agentes locais inquiridos ...................................................... 31 1.2. Relações entre os agentes locais .......................................................................... 33 1.3. Forças e fraquezas: colaboração, trocas e afinidades ......................................... 38 1.4. Prevenir e Intervir: necessidades e propostas de atuação ................................... 42 1.5. Dos instrumentos políticos às interações – considerações finais do diagnóstico exploratório ..................................................................................................................... 43 2. A perspetiva dos representantes das instituições da rede socioeducativa local ............... 44 2.1. Intervenção dos das instituições da rede socioeducativa local – relações entre parceiros .......................................................................................................................... 46 2.2. Estratégias de intervenção e colaboração ................................................................. 47 2.3. Posição face à escola ................................................................................................ 50 2.4. Principais dificuldades e problemas identificados.................................................... 51 IV. Escola ..................................................................................................................... 55 1. Os documentos escolares ................................................................................................. 55 1.1 Orientações da escola ................................................................................................ 55 1.2 Estrutura e Coordenação Organizacional .................................................................. 56 1.3 Estratégias e Mecanismos de prevenção ................................................................... 62 2 1.4 Regulação dos comportamentos e atitudes ................................................................ 63 1.5 Parceiros e parcerias das escolas ............................................................................... 69 2. A perspetiva dos eementos das direções escolares .......................................................... 71 2.1 Alunos violentos ........................................................................................................ 71 2.2 Orientações para a Regulação e Intervenção ............................................................. 73 2.3 Relações da escola com o exterior: famílias, entidades locais e forças da segurança 77 3. A perspetiva dos Professores ........................................................................................... 81 3.1. Percurso metodológico e amostragem ...................................................................... 81 3.2. Caracterização da população inquirida ..................................................................... 82 3.3. Integração organizacional dos professores ............................................................... 84 3.4. Atividade pedagógica e práticas disciplinares .......................................................... 93 3.5. Representações sobre a escola e a violência ........................................................... 100 3.6. representações, práticas e participação docente...................................................... 103 4. A perspetiva dos Alunos................................................................................................ 112 4.1. Violência na escola: a perspetiva dos alunos (inquérito)........................................ 112 4.2. Entrevistas a alunos reincidentes ............................................................................ 146 V. Conclusões ............................................................................................................ 163 VI. Metodologia Integrada de Intervenção ................................................................ 167 VII. Referências Bibliográficas ................................................................................. 170 Anexo A atividades do projeto .......................................................................................i Anexo B Guiões de Inquirição ...................................................................................... ii 1. Questionário aos Agentes Sociais ..................................................................................... ii 2. Guião de entrevista para os Grupos Focais ...................................................................... iv 3. Guião de entrevista às Direções Escolares ........................................................................ v 4. Questionário aos Professores ............................................................................................ vi 5. Inquérito aos Alunos ....................................................................................................... xii 6. Guião de entrevista a alunos com comportamentos reincidentes ................................. xviii Anexo C Lista de entidades locais inquiridas ............................................................ xxx Anexo D Ficha de Produção Científica ...................................................................xxxi Publicações ....................................................................................................................... xxxi Comunicações e participação em Congressos e outros encontros científicos .................. xxxi Formação ......................................................................................................................... xxxii Disseminação de resultados ............................................................................................. xxxii Anexo E Manual de Formação .............................................................................. xxxiii 3 Índice de Quadros Quadro 1 - Relação entre agressão e intencionalidade ................................................ 15 Quadro 3 - Abordagens de regulação da violência em meio escolar ........................... 29 Quadro 4 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios socioeducativos em estudo (seleção) ........................................................................... 31 Quadro 5 - Objetivos de atuação segundo o tipo institucional .................................... 32 Quadro 6 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios socioeducativos em estudo (presenças) ....................................................................... 46 Quadro 7 - Estruturas de Gestão de Conflitos nas escolas – Gabinetes de Intervenção ...................................................................................................................................... 57 Quadro 8 - Medidas disciplinares corretivas - Regulamentação da tutela e das direções das escolas .................................................................................................................... 59 Quadro 9 - Medidas disciplinares sancionatórias - Regulamentação da tutela e das direções das escolas ..................................................................................................... 59 Quadro 10 - Medidas preventivas – Regulamentação das direções das escolas .......... 60 Quadro 11 - Ocorrências, procedimentos e medidas disciplinares registadas no Gabinete Gestão de Conflitos da Escola E2 ................................................................ 64 Quadro 12 - Ocorrências por período e ano escolar no ano letivo de 2011/2012 registadas no Gabinete de Gestão de Conflitos da Escola E2 ...................................... 65 Quadro 13 - Ocorrências e medidas no 3º Período do ano letivo de 2011/2012 registadas pelo Gabinete de Intervenção Disciplinar da Escola E1 ............................ 65 Quadro 14 - Ocorrências por turma e ano escolar no 3º período do ano letivo de 2011/2012registadas pelo Gabinete Intervenção Disciplinar da Escola E1 ................. 66 Quadro 15 - Direitos dos alunos definidos por escola ................................................. 68 Quadro 16 - Deveres dos alunos definidos por escola ................................................. 68 Quadro 17 - Parceiros identificados nos documentos orientadores das escolas .......... 71 Quadro 18 - Responsáveis pela intervenção, por local das ocorrências e gravidade, por escola............................................................................................................................ 75 Quadro 19 - Orientações para a gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros ...................................................................................................................................... 76 Quadro 20 - Representações dos dirigentes sobre a Tutela ......................................... 79 Quadro 21 - Guião do Inquérito por Questionários aos Professores ........................... 81 Quadro 22 - Universo e amostra do inquérito por questionário aos docentes ............. 82 Quadro 23 - Sexo e idade dos docentes inquiridos (%) ............................................... 83 Quadro 24 - Antiguidade dos docentes inquiridos na profissão e na escola (%) ......... 83 Quadro 25 - Situação na escola e cargos ocupados pelos docentes inquiridos (%) ..... 84 Quadro 26 - Perceção individual da cultura profissional e situação na escola dos docentes inquiridos ...................................................................................................... 85 Quadro 27 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno, por escola............................................................................................................................ 87 Quadro 28 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre Regulamento Interno, por funções na escola ......................................................................................................... 87 Quadro 29 - Articulação organizacional em situação de conflito e conhecimento dos docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno ....................................................... 88 Quadro 30 - Recursos considerados importantes pelos docentes inquiridos ............... 89 Quadro 31 - Índices de Gestão de conflitos por escola ................................................ 91 Quadro 32 – Recurso a elementos da escola para a resolução de situações de conflito por estabelecimento de ensino dos docentes inquiridos .............................................. 92 4 Quadro 33 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre as práticas profissionais e o recurso a elementos para intervir ...................................................... 93 Quadro 34 - Recurso a elementos e índices de gestão de conflitos (ANOVA) ........... 93 Quadro 35 - Fatores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos por escola dos docentes inquiridos .............................................................................. 94 Quadro 36 - Práticas disciplinares dos docentes inquiridos, por escola ...................... 95 Quadro 37 - Índices de práticas disciplinares por escola dos docentes inquiridos ...... 96 Quadro 38 – Efeito dos castigos ou tarefas na melhoria do comportamento dos alunos por escola dos docentes inquiridos .............................................................................. 97 Quadro 39 - Relação entre a eficácia dos castigos e as práticas disciplinares dos docentes inquiridos ...................................................................................................... 98 Quadro 40 - Relação entre os critérios importantes na aplicação dos castigos e as estratégias para lidar com a reincidência dos docentes inquiridos .............................. 99 Quadro 41 - Principal fator considerado pelos docentes inquiridos para que ocorram situações de conflito na sala de aula, por escola ........................................................ 100 Quadro 42 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre o clima de escola e a avaliação das situações de violência na escola ....................................................... 102 Quadro 43 - Análise Multivariada das práticas disciplinares renunciantes (MANOVA) .................................................................................................................................... 103 Quadro 44 - Práticas disciplinares renunciantes: fatores associados ......................... 105 Quadro 45 - Análise univariada das práticas disciplinares pacificadoras .................. 106 Quadro 46 - Práticas disciplinares pacificadoras: fatores associados ........................ 107 Quadro 47 - Análise univariada da gestão reativa dos conflitos ............................... 107 Quadro 48 - Gestão reativa dos conflitos: fatores associados.................................... 108 Quadro 49 - Gestão proactiva dos conflitos: fatores associados................................ 109 Quadro 50 - Relação entre a opinião sobre as práticas profissionais e a opinião sobre o clima de escola ........................................................................................................... 110 Quadro 51 - Relação entre as causas da violência e os fatores considerados mais importantes na resolução dos comportamentos violentos .......................................... 111 Quadro 52 - Guião de Inquirição do Questionário aos Alunos .................................. 112 Quadro 53 - Composição da Amostra ........................................................................ 113 Quadro 54 - Autores, Vítimas e Testemunhas: construção dos índices ..................... 115 Quadro 55 - Perfis dos atores nas situações de violência na escola ........................... 115 Quadro 56 - Autores, Vítimas e Testemunhas (leitura em coluna)............................ 116 Quadro 57 - Autores por Sexo (leitura em linha) ...................................................... 116 Quadro 58 - Testemunhas por Idade (leitura em linha) ............................................. 117 Quadro 59 - Testemunhas por Ano Letivo (leitura em linha) .................................... 117 Quadro 60 - Vítimas segundo Benefício de ASE (leitura em linha).......................... 117 Quadro 61 - Categorias de violência: construção dos índices ................................... 118 Quadro 62 - Violência Física: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna) ... 118 Quadro 63 - Violência Relacional: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna) .................................................................................................................................... 119 Quadro 64 - Violência Física: autores por sexo e por benefício de ASE (leitura em linha) .......................................................................................................................... 119 Quadro 65 - Violência Física: vítimas por idade (leitura em linha) .......................... 121 Quadro 66 - Violência Física: vítimas por ano letivo (leitura em coluna)................. 121 Quadro 67 - Violência Física: vítimas por benefício de ASE (leitura em linha) ....... 121 Quadro 68 - Violência Física: testemunhas por idade, ano de escolaridade e benefício de ASE (leitura em coluna) ........................................................................................ 122 Quadro 69 - Violência Relacional: testemunhas por idade (leitura em coluna) ........ 123 5 Quadro 70 - Violência Relacional: testemunhas por ano letivo (leitura em linha) .... 123 Quadro 71 - Legitimidade da violência (leitura em linha) ......................................... 124 Quadro 72 - Legitimidade da violência: construção dos índices ............................... 124 Quadro 73 – Legitimidade da violência: defesa e provocação ................................. 125 Quadro 74 - Autores vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) ..................... 127 Quadro 75 - Vítimas vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) ..................... 127 Quadro 76 - Autores/castigos e recompensas: resultados do teste do Qui-quadrado 128 Quadro 77 - Autores vs. Castigos Familiares (leitura em linha) ................................ 129 Quadro 78 - Autores vs. Recompensas familiares (leitura em linha) ........................ 130 Quadro 79 - Autores/opinião sobre a escola: resultados do teste do Qui-quadrado .. 131 Quadro 80 - Autores vs. Opinião positiva sobre a Escola (leitura em linha) ............. 132 Quadro 81 - Autores vs. Opinião negativa sobre a Escola (leitura em linha) ............ 133 Quadro 82 - Autores/Regulamento Interno: resultados do teste do Qui-quadrado .... 134 Quadro 83 - Razões para não conhecer o Regulamento Interno (leitura em linha) ... 135 Quadro 84 - Opinião sobre o Regulamento Interno (leitura em linha) ...................... 136 Quadro 85 - Autores/Opinião sobre os castigos: resultados do teste do Qui-quadrado .................................................................................................................................... 137 Quadro 86 - Autores vs. Opinião positiva sobre os castigos aplicados na Escola (leitura em coluna) ..................................................................................................... 138 Quadro 87 - Autores vs. Opinião negativa sobre os castigos aplicados na Escola (leitura em coluna) ..................................................................................................... 139 Quadro 88 - Autores/Confiança e Obediência aos adultos da Escola: resultados do teste do Qui-Quadrado ............................................................................................... 140 Quadro 89 – Autores vs. Confiança nos adultos da Escola (leitura em linha) ........... 141 Quadro 90 - Autores vs. Obediência aos adultos da Escola (leitura em linha) .......... 142 Quadro 91 - Autores/Importância dos estudos: resultados do teste do Qui-quadrado .................................................................................................................................... 143 Quadro 92 - Autores vs. Importância dos Estudos: visão positiva (leitura em linha) 144 Quadro 93 - Autores vs. Importância dos estudos: visão negativa (leitura em linha)145 Quadro 94 - Tipo de comportamento e dimensão de rede por aluno e por escola ..... 148 Quadro 95 - Tipo de comportamento e dimensão de rede ......................................... 148 6 Índice de Figuras Figura 1 - A violência enquanto forma de ação contingente ....................................... 16 Figura 2 - Centralidade dos atores em nomeações diretas ........................................... 33 Figura 3 - Intermediação (betweeness) dos atores em nomeações diretas ................... 36 Figura 4 - Simmelian Ties: relações de reciprocidade ................................................. 37 Figura 5 - Qualidade das relações ................................................................................ 39 Figura 6 - Frequência da colaboração .......................................................................... 40 Figura 7 - Frequência das trocas de informação e/ou recursos .................................... 41 Figura 8 - Distribuição etária dos inquiridos ............................................................. 114 Figura 9 - Ano escolar frequentado ........................................................................... 114 Figura 10 - Disposição das variáveis ......................................................................... 120 Figura 11 - Configuração do espaço social ................................................................ 120 7 INTRODUÇÃO O presente estudo centrou-se na avaliação do contributo das políticas de segurança escolar desenvolvidas no âmbito do Programa Escola Segura para a concretização das políticas de integração, inclusão e igualdade educativa e social em contextos escolares marcados pela diversidade e complexidade social e cultural. Procurou-se desse modo avaliar a forma como se concretiza ao nível territorial a articulação entre o Programa Escola Segura e os programas centrados na inclusão e igualdade educativa e social, de forma a identificar os bloqueios e as potencialidades de colaboração entre os agentes e instituições responsáveis pela concretização das políticas públicas, com o objetivo de especificar os elementos centrais de uma metodologia integrada de intervenção (prevenção e regulação) da violência nas escolas e nas comunidades, passível de difusão alargada no sistema educativo e comunidades locais. Para a concretização deste objetivo central, o plano de investigação foi subdividido em cinco objetivos específicos: 1. Avaliação da eficácia local das políticas de prevenção e controlo de comportamentos violentos nas escolas, centradas no Programa Escola Segura; 2. Identificação e caracterização das instituições formais e dos agentes sociais locais que no território concretizam as orientações e medidas de políticas públicas, nas diversas áreas associadas à intervenção no âmbito da violência, integração social e igualdade de género; 3. Análise das conceções e práticas de intervenção relativas à violência desenvolvidas pelas instituições formais e pelos agentes sociais locais; 4. Análise aprofundada sobre as dinâmicas de articulação da intervenção das instituições formais e dos agentes sociais locais, com particular enfoque na articulação entre a intervenção nas dinâmicas de prevenção e regulação da violência em contexto escolar e os programas comunitários de integração e inserção social para jovens, designadamente os relativos à transição para a vida ativa, integração de minorias étnicas e igualdade de género; 5. Identificação dos elementos centrais de uma metodologia integrada de intervenção (prevenção e regulação) da violência em contexto escolar e comunitária, mediante a sistematização de princípios, objetivos e estratégias de intervenção que possibilitem a sua disseminação e implementação em diferentes contextos e territórios. Com esta investigação considerou-se, portanto, a análise dos vários dimensões de produção da violência na escola e a clarificação das circunstâncias e esferas de intervenção acionadas na regulação da violência. A abordagem metodológica desenvolvida centrou-se numa análise integrada e sistemática das diversas estratégias de intervenção socioeducativa em contextos sociais complexos. A triangulação das técnicas de análise contribuiu para uma maior complementaridade e riqueza da informação recolhida, facilitando o processo de interpretação e compreensão das 8 condições produtoras de violência e das esferas de intervenção (prevenção e regulação) acionadas. Visando contribuir para futuras estratégias e mecanismos de prevenção e intervenção a avaliação e estudo prospetivo realizou-se no concelho do país em que se verificou o maior número de ocorrências nos últimos quatro anos letivos (entre 2006 e 2010). Neste concelho da Área Metropolitana de Lisboa foram selecionados três territórios distintos, representado cada um por uma escola de 2º e 3º ciclos do Ensino Básico, todas integradas no programa ministerial Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, com situações de violência escolar relevantes e onde se identificaram em estudos anteriores capacidades de regulação e prevenção das situações de violência diferenciadas. Nesse sentido, o caminho a percorrer para a persecução dos objetivos deste estudo privilegiou o cruzamento entre estratégias metodológicas de investigação diversas combinando técnicas de recolha de informação intensivas, de inspiração etnográfica e de investigação participativa, com outras de caráter mais extensivo. 9 I. VIOLÊNCIA, CONTROLO DISCIPLINAR E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO 1. A VIOLÊNCIA NA ESCOLA COMO PROBLEMA SOCIAL 1.1. TRANSFORMAÇÕES NO SISTEMA EDUCATIVO E VIOLÊNCIA NA ESCOLA Na segunda metade do século XX a violência na escola era um problema essencialmente discutido em círculos académicos restritos ou pelos diversos atores educativos envolvidos nos incidentes. A divulgação persistente dos acontecimentos de violência na escola nos meios de comunicação social levou a que este problema adquirisse uma significativa visibilidade pública, transformando-se numa questão relevante no debate educativo e político a nível internacional que se traduziu pelo desenvolvimento de medidas políticas e recomendações em diferentes países e organizações internacionais. Contudo, a nível nacional, o aumento da visibilidade do fenómeno nem sempre correspondeu a um aprofundamento da problemática nem a um efetivo esclarecimento da sua real importância nas escolas portuguesas. A adaptação da escola às transformações nas sociedades contemporâneas é um elemento chave na compreensão da relevância social atribuída à violência na escola. A massificação acelerada dos sistemas educativos, os efeitos da globalização sobre os contextos nacionais e locais e a perceção do aumento das situações de risco na infância são fatores que isoladamente ou de forma cruzada, conduziram a um aumento da preocupação sobre a segurança nas escolas e se traduziram em políticas e medidas diversas num número crescente de países (Sebastião, Alves e Campos, 2010). Um outro fator relevante pode ser encontrado nos efeitos do prolongamento generalizado da escolaridade obrigatória e da real abertura da escola a todos, o que implica a redefinição dos objetivos educativos, das formas de organização e de trabalho pedagógico tendo em conta o impacto da crescente diversidade sociocultural. Estas exigências constituíram-se como desafios específicos para cada escola, desafios esses que se cruzam com a carga e memória histórica que o sistema educativo carrega consigo. As estruturas institucionais, modelos organizacionais e práticas profissionais ou mesmo os edifícios escolares são neste sentido marcados pela sobreposição dos vários ciclos de expansão da escolaridade ao longo dos dois últimos séculos (Sebastião, 2009b) . A escola constitui uma instituição relevante da primeira grande vaga da modernidade pela sua capacidade de atrair as populações, por um lado, porque proporcionava formas de mobilidade social ascendente e, por outro, porque contribuía para a manutenção dos estatutos e privilégios sociais previamente adquiridos (Sebastião, 2009b). Esta O reconhecimento desta "vocação" fez com que se criasse uma relativa estabilidade das representações sociais e das estratégias face à escola (especialmente das classes médias). Contudo, as transformações económicas e sociais recentes 10 vieram colocar em causa as funções sociais da escola e a realidade da transição para o mercado de trabalho (particularmente na Europa).1 O debate sobre a violência na escola expressa ainda alguns dilemas societais, nomeadamente do confronto das sociedades com a imprevisibilidade, na medida em que instituições centrais, como a escola, parecem perder capacidade para contribuir para algum sentido de segurança ontológica (i.e. capaz de proporcionar um sentido de ordem e continuidade nos quadros de vida dos grupos e indivíduos). A sensação de segurança face ao futuro que a escola dava às novas gerações convertese num sentimento de incerteza quanto aos benefícios potenciais da educação, uma procura desencantada de educação (Grácio, 1986), resultante das transformações radicais no mercado de trabalho (Canário, 2008). Esta transformação teve efeitos particulares em Portugal uma vez que o "desencanto" ocorreu sobretudo em indivíduos provenientes de grupos sociais pouco escolarizadas cujas famílias realizaram esforços significativos para que os seus filhos atingissem níveis elevados de escolaridade. Cumulativamente, o aumento da referida atenção mediática da violência na escola leva a que se passe a encarar a escola como um contexto cada vez mais heterogéneo e conflitual, um espaço inseguro ou mesmo potencialmente perigoso, contribuindo deste modo para mudar as conceções sociais sobre as condições em que a violência se desenvolve (Sebastião, Alves e Campos, 2010). A difusão de interpretações parcelares de conceitos produzidos no campo científico (Sebastião, Alves e Campos, 2003), como o bullying, vem aumentar a visibilidade e a preocupação societal sobre esta problemática. Transmite-se a ideia de que a escola "não é capaz" ou não tem recursos para agir, já que a violência radicaria não apenas em fatores escolares mas em profundos processos de desagregação social. Noutro sentido pode ainda ser constatado um declínio da conceção moderna de infância (Smith, 2012; Vandenbroeck e Bouverne-De Bie, 2006) e uma maior fragmentação das representações sociais sobre as crianças (Sarmento e Cerisara, 2004; Almeida, 2009). Uma mudança nos modos de vida infantis que expressa alterações profundas nas práticas de socialização familiares, no enquadramento normativo e práticas institucionais associadas à infância e nas decisões coletivas e individuais relativas aos percursos escolares (Charlot, 2002; Sebastião, Alves e Campos, 2003; Almeida, 2009). Estas transformações produzem efeitos no modo como atualmente nos relacionamos com as crianças, uma vez que a infância passa a ser progressivamente entendida como uma fase de vida em que as crianças se encontram tendencialmente confrontadas com situações de risco. As famílias reduzem as experiências e atividades antes acessíveis às crianças (brincar na rua, ir a pé para a escola, etc.), atividades essas que são reclassificadas como perturbadoras ou perigosas e os adultos que as permitem considerados negligentes (Gill, 2007:10). Dá-se portanto um processo de "institucionalização" ambivalente (Sarmento, 2008:30), resultante do 1 Esta situação é experimentada de forma muito diferente nos diversos pontos do globo. Nos países em que o crescimento económico tem sido elevado na última década (por ex. nos chamados BRICS ou economias emergentes) o défice de qualificações existente coloca a questão de forma inversa, encontrando-se a escola numa situação de alargamento sem perca da sua capacidade de atração . 11 aumento da supervisão e regulação das crianças por adultos, do enquadramento permanente por instituições especializadas na infância e do fechamento da família. Neste sentido, o alargamento e diluição espacial e temporal das fronteiras protetoras e a difusão da perceção das crianças como vítimas e geradoras de riscos leva portanto a uma tentativa de controlo do risco (Korbin, 2003; Gill, 2007). Este conjunto de transformações sociais favoreceu o aumento da preocupação sobre a segurança nas escolas, contribuindo assim para a construção de representações sociais essencialmente negativas sobre a problemática da violência na escola. 1.2. REPRESENTAÇÕES SOBRE A VIOLÊNCIA Segundo Leal (2010:394), as perceções sobre a violência e os riscos a ela associados são construções sociais que condicionam as práticas e representações na relação com os outros, as suas motivações para o comportamento desviante, e a eficácia dos mecanismos de controlo social. Uma das ideias vulgarmente aceites é de que a violência está associada a características individuais dos alunos e à socialização familiar (consequência das condições e modos de vida precários). Os conflitos na escola resultariam nesta perspetiva de causas "evidentes" como o insucesso escolar, o abandono precoce da escola ou a ausência reiterada, a pertença a uma minoria étnica ou grupo socioeconómico desfavorecido. A ambiguidade do controlo escolar sobre as situações de violência tem contribuído em parte para a reforçar estas conceções, nomeadamente a ideia de que a violência na escola é causada por fatores exteriores e que o seu aumento progressivo resulta de processos de degradação civilizacional e do desrespeito pelos valores e pela cultura dominante. A naturalização das situações de violência resulta em parte do seu entendimento como uma característica típica da adolescência e juventude e que justificaria inclusivamente a reduzida intervenção dos adultos da escola. Neste sentido a violência na escola é entendida como um comportamento desviante juvenil específico, manifestando-se como uma fase passageira que não tende a evoluir para um padrão de violência permanente nos estágios mais tardios de desenvolvimento (Fuchs, 2008:30). Numa outra vertente, constata-se ainda a naturalização da violência no interior de escolas situadas em contextos sociais desfavorecidos. Os incidentes são entendidos como um elemento estrutural desses contextos e como estando num crescendo acelerado e incontrolável. Nesta conceção as escolas são vistas como estando expostas e desmunidas de recursos para atuar, contribuindo consequentemente para a degradação dos valores e da erosão social. Todavia, os resultados da investigação e da intervenção desenvolvidas neste domínio não sustentam as teses da determinação pela "herança social" (Visser, 2006; Sebastião, Alves e Campos, 2010), nem a perceção de uma "escalada" de violência (Fuchs, 2008; Carra, 2009a). Inclusive, tem-se vindo a verificar que a violência na escola é um fenómeno transversal a todos os grupos sociais e que a sua difusão e intensidade são reduzidas. O que não significa que esta não ocorra ou que não necessite do 12 planeamento e implementação de estratégias de prevenção e intervenção. A designada violência de baixa intensidade (Dupper e Meyer-Adams, 2008:164) remete justamente para os atos recorrentes de “pequena” violência, com reduzida gravidade, cuja persistência nos quotidianos escolares tem impactos altamente negativos e a longo prazo para os alunos. Não deixa no entanto de ser notável a divergência existente entre a perceção popular (escalada de violência) e a evidência empírica (redução sustentada dos incidentes ao longo da última década) (Mayer e Furlong, 2010; Fuchs, 2008; Matos, et. al., 2010). 2. A VIOLÊNCIA COMO PROBLEMA CIENTÍFICO A violência na escola surgiu como tema com uma significativa vitalidade na agenda científica a partir dos anos 1970, marcada pela preponderância de propostas teóricas inspiradas no conceito de bullying. Esta presença fez-se notar pelo aumento crescente das investigações sobre o fenómeno e pela constituição de um campo de especialistas (Brown e Munn, 2008). Desenvolveram-se diferentes abordagens, pautadas pela crescente controvérsia acerca do carácter individual e patológico frequentemente atribuídos aos comportamentos violentos (Bansel, et. al., 2009). A desocultação dos processos sociais associados à violência (Casella, 2002; Korbin, 2003; Visser, 2006; Braun, Maguire e Ball, 2011) alertou os investigadores para os enviesamentos analíticos produzidos pela descontextualização dos comportamentos individuais (Fuchs, 2008). Neste âmbito, a pesquisa adquire uma maior amplitude analítica, considerando o "estudo dos atores em contexto" (Torres e Palhares, 2010: 158). Ou seja, a análise desta problemática passa a considerar como centrais tanto os quadros culturais em que a violência se produz (socialização entre pares e comunitária) como os contextos normativos e organizacionais em que os atores educativos desenvolvem diferentes formas de ação. (Sebastião, 2009; Sebastião, Campos e Merlini, 2012a; Sebastião, 2013). Estas abordagens desenvolveram-se impulsionadas pela maior procura de conhecimento sobre a violência na escola e pelas diversas tentativas de a definir. Um dos contributos centrais no desenvolvimento do debate científico sobre a violência na escola foi a proposta de bullying de Dan Olweus em 1973. O facto desta pesquisa partir da Psicologia marcou a evolução da produção científica, com a predominância do conceito de bullying por várias décadas (Smith et al., 2002). Olweus começou por classificar o bullying como comportamento individual, distinguindo-o de mobbing (comportamento coletivo) (Smith, 2013). De uma forma genérica, o bullying caracteriza-se pelo assédio ou intimidação repetida entre alunos, implicando uma intenção deliberada de provocar dano a um colega por parte do aluno ou do grupo de alunos, caracterizado pelo desequilíbrio de forças, a existência de atos repetitivos e uma situação de dominação e anulação da vítima. Desenvolveram-se entretanto outras definições como a de “comportamentos de risco” e de “comportamento antissocial” e o bullying passa a ser considerado uma forma particular do comportamento agressivo (Smith, et. al., 2002). A noção de comportamento de risco, promovida pela Organização Mundial de Saúde, inclui categorias baseadas nas ofensas sofridas ou nos danos infligidos, cujos custos 13 humanos, sociais e económicos deverão ser reduzidos (OMS, 2005). Automutilação (suicídio, consumos de drogas legais ou ilegais), ofensas a outros (homicídio, agressão, etc.) ou à sociedade (vandalismo, discriminação, etc.) estão considerados nos comportamentos de risco e esta definição é particularmente comum nas investigações epidemiológicas. Por sua vez, o conceito de comportamento antissocial encontra-se mais associado às pesquisas na área da psicologia, sociologia e criminologia. Aborda um leque de comportamentos como a violência física, as ameaças e outro tipo de atitudes delinquentes, nomeadamente o roubo, o uso de drogas e ofensas associadas ao incumprimento de regras, entre elas as escolares (Carra, 2009a; Veenstra e Dijkstra, 2011). Apesar de comummente aceite e valorizada nas ciências sociais e humanas, a diversidade conceptual e algum fechamento disciplinar sobre este fenómeno têm dificultado a procura de linhas de contacto entre as várias abordagens científicas. A utilização de termos semântica e conceptualmente próximos, como bullying, violência, indisciplina, agressividade ou incivilidade, quando utilizados sem referência aos contextos teóricos em que foram produzidos, confunde o diagnóstico e a intervenção. É possível superar parcialmente estes problemas se adotarmos uma definição de violência entendida como forma de ação num quadro de relações interpessoais2: "um comportamento levado a cabo por uma pessoa (o agressor) com a intenção de magoar outra pessoa (a vítima) cuja qual o agressor acredita estar motivada para tentar evitar essa ofensa" (Anderson, 2000: 68). Centramos assim a análise na relação entre a intencionalidade e tipos de agressão, que podem assumir formas físicas ou psicológicas, distinguindo-se desta forma de situações acidentais ou resultantes de consequências não esperadas. Podemos então classificar as situações de violência separando aquelas que possuem características de tipo reativo/afetivo, em que a agressão constitui um objetivo em si mesma, das de tipo proactivo /instrumental em que a violência constitui um meio para alcançar um fim. No primeiro caso a finalidade é magoar o outro, resulta de uma reação emocional a um impulso, a uma provocação ou atitude hostil, e esgota-se na agressão; no segundo caso a agressão é meramente instrumental para obter algo em troca, podendo não passar da ameaça se a vítima aceitar tacitamente as condições do agressor. 2 Consideramos nesta definição apenas as situações de violência interpessoal, deixando de lado as formas de violência institucional existentes na escola ou outras formas de violência social. Tal não significa adotar uma abordagem individualista, mas antes delimitar algumas das dimensões centrais do fenómeno no quadro da escola, centrando a análise nos processos relacionais que nela se produzem. 14 Quadro 1 - Relação entre agressão e intencionalidade Tipo de Agressão Intencionalidade Física Reativa/ Afectiva Proactiva/ Instrumental Psicossocial O principal motivo é magoar o alvo, reação emocional baseada em fúria, que ocorre tipicamente em resposta Comportamento que à provocação. procura ferir outros ao Ocorre na ausência de provocação prejudicar o seu estatuto deliberada, é desencadeada para social ou relações de obter algo em troca. O agressor tem amizade (agressão indireta a expectativa de que a agressão ou relacional). física tenha consequências positivas de carácter instrumental. (Sebastião, 2009: 41) Tendo por base esta distinção prévia podemos definir a violência como "atos caracterizados pela agressão intencional, seja esta física ou psicossocial, podendo assumir formas reativas/afetivas ou proactivas/instrumentais" (Sebastião, 2013:27). Nesse sentido, a violência é uma configuração relacional particular marcada pela tensão confrontacional (Collins, 2008), interação que incorpora tendencialmente relações de poder assimétricas entre os atores (Sebastião, 2013). A limitação da capacidade de reação das vítimas às consequências da agressão, seja pelo uso da força física ou de mecanismos de pressão psicológica, coloca-as numa situação particular de desproteção, impedindo muitas vezes o acionamento dos sistemas de regras institucionais. Assim, um agressor caracteriza-se por ser tipicamente um indivíduo que utiliza formas de poder (que são suportadas por agressividade física, verbal ou psicológica) com o objetivo de, simultaneamente, anular a capacidade reguladora do sistema de regras e de desencadear, ao nível relacional, um processo de dominação de um ou mais indivíduos. A vítima nesta perspetiva é tipicamente um indivíduo que não possui capacidade para resistir aos processos de dominação nem para ativar para sua proteção o sistema de regras sociais da escola (Sebastião, 2009a: 46). A anulação dos sistemas de regras pelos agressores (Domingues, 1995; Munn, et. al., 2007; Brown e Munn, 2008; Carra, 2009a; Braun, et. al., 2011) expressa a importância de investigar as variáveis organizacionais e os processos de intervenção em situações de violência na escola, e implica adotar uma abordagem que enquadre as esferas de intervenção e ação das instituições formais e dos agentes sociais e os mecanismos que estruturam e regulam as conceções e práticas de violência. Trata-se de perspetivar a violência enquanto forma de ação contingente, que traduz uma configuração relacional particular com quadros de possibilidades diversos, em que diferentes tipos e graus de tensão podem levar (ou não) a situações de confronto. 15 Figura 1 - A violência enquanto forma de ação contingente Processos longos de socialização institucional Práticas institucionalizadas de regulação da violência (processos de aprendizagem dos sistemas de regras formais) (estado, escola, segurança social, autarquias, etc.) Processos de regulação social das conceções e práticas de violência Fonte: Sebastião, 2013:2 A violência enquanto forma de ação contingente Processos de estruturação das conceções e atitudes violentas Práticas informais de regulação da violência Processos longos de socialização comunitária (aprendizagem de (família, pares, etc.) 9 quadros e modelos sociais e culturais grupais) As conceções e atitudes violentas estruturam-se como resultado dos diversos processos de socialização de que os indivíduos são alvo; dos modos de regulação da violência e das características particulares dos contextos em que estas interações se desenvolvem. Nesse sentido, a violência pode acontecer ou não, dependendo por exemplo da existência ou da eficácia dos processos de regulação existentes na escola. A violência em meio escolar é portanto uma problemática que nos chama a olhar de forma abrangente e cruzada para a escola através de perspetivas políticas e interdisciplinares. Foi com base nestes referenciais e nos elementos chave para a análise da violência na escola que se procurou aprofundar o fenómeno ao longo dos anos no Observatório de Segurança Escolar (OSE), através de uma estratégia metodológica abrangente e compreensiva. O Ministério da Educação contratualizou com uma equipa de investigação, posteriormente designada por OSE (Observatório de Segurança Escolar), a elaboração e implementação de um instrumentos de inquirição sobre o fenómeno da violência na escola em Portugal, a nível continental nas escolas públicas. A identificação de "anomalias estatísticas" aquando da análise dos dados reportados pelas escolas portuguesas ao OSE (Sebastião, Alves e Campos, 2010) veio questionar algumas das conceções socialmente difundidas sobre o problema. A constatação da existência de escolas territorialmente próximas com taxas muito distintas de ocorrências de violência levaram a que se reafirmasse o princípio sociológico que incita a analisar criticamente as evidências relativas aos factos da vida social, transformando essas anomalias em elementos heurísticos fundamentais para a análise dos processos e mecanismos sociais em geral e da escolarização e situações de violência em particular. 16 Para aprofundar o conhecimento sobre o fenómeno da violência na escola a equipa do OSE recorreu a uma combinatória de métodos extensivos e qualitativos em três níveis de análise da difusão das situações violência. A nível macro analítico realizou-se a recolha e análise de dados nacionais coletados através do formulário eletrónico online situado na rede informática do Ministério da Educação, através do qual as escolas devem fazer o registo obrigatório das ocorrências de violência. Um segundo nível de análise pautou-se pelo desenvolvimento de pesquisas que tomaram os territórios educativos (agrupamentos de escolas) ou escolas isoladas como unidades analíticas, centradas numa perspetiva organizacional, territorial e comparativa. A nível micro analítico centrou-se na observação participante e na inquirição de atores chave da comunidade educativa e local (como os diretores da escola, delegados de segurança3, professores, alunos e agentes locais com intervenção nesta matéria). Quer a nível meso, quer a nível micro analítico recorreu-se ainda a técnicas de recolha de informação por aplicação de inquéritos por questionário 4 , entrevistas semiestruturadas, realização de grupos focais, análise de redes, análise documental e observação participante. O tratamento e análise dos dados recolhidos pautou-se pela combinação de diferentes métodos e técnicas como a análise de redes sociais – com recurso ao software UCINET – análise de conteúdo – com recurso ao software MAXqda - análise documental e análise estatística – com recurso ao software SPSS. O uso de informação de diferentes tipos permitiu a construção progressiva de uma visão multifacetada do tipo e extensão das situações violência. Devido à informação peoduzida pelo OSE nos últimos anos, hoje podemos estabelecer a evolução do número de ocorrências registadas por região e escola e é possível mapear a sua difusão. A relativa estabilização do número de escolas que participam ocorrências traduz a fiabilidade do formulário eletrónico, na medida em permite confiar que o registo é uma prática sustentada e de que é possível caracterizar com algum rigor a distribuição das situações violentas. Contudo, apesar de podermos traçar um quadro global da difusão de situações de violência, há ainda pouca informação sobre as estratégias de intervenção das escolas, e a recolhida revela que muitas têm dificuldades em atuar de forma eficaz. Entre os elementos potenciadores das situações de violência estão o fraco conhecimento sobre a situação da própria escola, mecanismos de intervenção desadequados ou insuficientes e a preocupação reduzida com os processos de inclusão e integração educativa de alunos socialmente e culturalmente diferenciados. 3 Responsáveis pela gestão disciplinar da Escola, habitualmente são professores membros da direção, assumindo a função de participar as ocorrências ao Ministério da Educação, através do formulário eletrónico. 4 A opção pela aplicação dos inquéritos numa plataforma online em software especializado – limesurvey – revelou-se vantajosa tanto ao nível da eficiência como da eficácia do processo de inquirição. Um exemplo demostrativo disso mesmo foi o inquérito realizado a uma amostra de 792 alunos. Com a colaboração das escolas, foi possível colocar os alunos responder a partir de computadores com ligação à Internet, em sessões coletivas, contando para o efeito com o apoio presencial de membros da equipa de investigação. Além de evitar os habituais erros de inserção de dados, este processo agilizou o tempo de tratamento dos dados e consequentemente da sua análise. 17 3. DESIGUALDADES ESCOLARES E CONTROLO DISCIPLINAR 3.1. DISTINÇÕES TERRITORIAIS E DESIGUALDADES ESCOLARES A distribuição das escolas no território português tem historicamente resultado das decisões do estado central, e raramente da exigência ou participação das comunidades locais, que têm mantido uma relação historicamente distanciada com os estabelecimentos escolares, vistos como agências locais do estado central. Apesar desta relação distanciada, não podemos afirmar que o seu funcionamento seja estritamente determinado pelas políticas e normativos definidas a nível central. Os quotidianos escolares constituem contextos sociais e organizacionais complexos, já que nele se cruzam, muitas vezes de modo conflitual, os efeitos das políticas de educação, os entendimentos normativos particulares dos vários intervenientes, as conceções pedagógicas e sociais de professores e pais e a intervenção de outras instituições locais com responsabilidades na área da infância e segurança. Nesse sentido a escola é construída como um espaço de confronto de conceções e estratégias políticas e sociais dos diversos grupos interessados (perdendo a imagem de uma aparente neutralidade), podendo as estratégias de intervenção sobre a violência na escola (pedagógicas, disciplinares e organizacionais) ser entendidas como um indicador das suas dinâmicas internas, enquanto resultante das orientações presentes nas políticas educativas e os entendimentos sobre a violência construídos em cada escola e comunidade educativa. Atualmente, verifica-se um entendimento bastante mais estruturado das políticas de segurança no sistema educativo português do que identificada há uma década atrás (Sebastião, Campos e Almeida, 2002). Os estudos realizados no âmbito do OSE contribuíram para mostrar que uma parte muito significativa das situações de violência na escola radicavam de facto no seu interior e resultavam em grande parte da própria lógica escolar. O desenvolvimento centralizado do sistema educativo português incorporou como nuclear a conceção política que a distribuição igualitária de recursos pelo estado central produz resultados mais equitativos no acesso aos vários tipos de recursos escolares por parte de toda a população. Nesta perspetiva, o sistema educativo tem sido organizado de modo progressivamente uniforme através do território, considerando-se que as diferenças entre escolas resultam essencialmente de fatores externos como a estrutura social e económica local. Apesar do sucesso relativo desta conceção na difusão da escolaridade, a pesquisa sociológica tem vindo a demonstrar que a aplicação da conceção de uniformidade da oferta educativa não corresponde a uma homogeneidade efetiva de condições de frequência. Constata-se designadamente diferenças resultantes de processos de seletividade interna nas escolas e diferenças resultantes dos fatores ligados à divisão social do espaço urbano (Campos e Mateus, 2001, 2002; Sebastião, 2009; Abrantes e Sebastião, 2010). As escolas diferenciam-se pela sua inserção espacial, dimensão e qualidade dos equipamentos, composição social dos seus públicos, qualificações dos seus professores, níveis de sucesso escolar, etc. O efeito cumulativo das combinações entre 18 estes indicadores produz hierarquias de prestígio relativo entre escolas, levando ao agravamento da seletividade no acesso às escolas ou na organização do próprio processo de ensino e aprendizagem, ou ainda, na fraca capacidade para atraírem e fixarem os professores mais qualificados. As escolas situadas junto de bairros sociais, bairros degradados ou predominantemente habitados por comunidades étnicas ou imigrantes encontram-se no "fim da lista" dessas hierarquias simbólicas, traduzindo uma forte perceção de que nestas escolas existem menores oportunidades educativas contribuindo assim para reproduzir desigualdades sociais dos contextos sociais em que se integram. No entanto, estas hierarquias nem sempre surgem de forma evidente nas pesquisas, constatando-se justamente que muitas dessas escolas têm maior abrangência de ofertas educativas (como os cursos CEF e PIEF) e um efetiva estabilidade dos seus corpos docentes (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Além disso, os fatores subjacentes ao aparecimento de escolas com necessidades educativas extensas são mais profundos, remetendo tanto para os processos de exclusão social no território como para os processos de seleção social das escolas. Para alcançar os seus objetivos, as escolas servem-se dos seus estatutos territoriais e simbólicos. Thrupp e Lupton consideram os atributos característicos dos alunos (como a classe, etnicidade, proporção de alunos oriundos de famílias refugiadas ou com necessidades especiais), as diferenças características da escola e do meio envolvente como fatores fundamentais da localização territorial, defendendo que "o contexto realmente conta", contradizendo dessa forma os discursos acerca da "neutralidade" da escolaridade (Thrupp and Lupton, 2006: 308). Num dos estudos anteriormente realizados pela equipa do OSE, foi possível constatar que competição pelos alunos de classe média era mais intensa entre as escolas territorialmente mais próximas, concorrendo através de estratégias de atração e seleção para o agravamento das diferenças encontradas nas estrutura social dos territórios destas escolas (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Neste sentido, a seleção dos alunos no momento da entrada para a escola ou através de processos internos de triagem, que passam pelo encaminhamento de alunos para outras vias de ensino além do regular ou pela utilização dos mecanismos de controlo disciplinar com o mesmo fim, traduzem-se em situações de menor inclusão dos alunos e de maior polarização social das escolas. Estes processos internos articulam-se com a reconfiguração social dos territórios locais, com as escolas a reforçarem as desigualdades escolares e sociais. 3.2. CONTROLO DISCIPLINAR E CLIMA DE ESCOLA Uma segunda dimensão respeitante à diferenciação entre escolas relaciona-se com a existência de uma variação elevada nos critérios de decisão na apreciação das ocorrências e na aplicação de medidas disciplinares. A sua existência expressa processos de regulação de conflitos pouco estruturados e marcados pela ausência de uniformidade nas decisões tomadas, enquanto formas de atuação coerentes e justas. Este padrão sugere que as decisões ficam mais à mercê da opinião do responsável pela regulação do conflito ocorrido, do que em função do estabelecido nos normativos da escola. Os diferentes níveis de intervenção e colaboração dos elementos escolares 19 introduzem assim arbitrariedades e desigualdades na interpretação e tratamento das situações (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Medidas como a suspensão são repetidamente usadas para "libertar" a escola dos alunos identificados como fontes de perturbação, por vezes provocando mesmo a expulsão intencional desses alunos. Apesar das ameaças reais e percebidas no imediato estarem entre os principais motivos do recurso à pena de suspensão, a maioria dos alunos suspensos da escola esteve envolvida em atos que não poderão ser considerados violentos ou criminosos (Taras, 2003:1206). Têm sido feitas diversas críticas a estas medidas disciplinares sancionatórias em particular, pela perceção da ineficácia e impactos negativos nos alunos visados. A suspensão ou a expulsão da escola são consideradas por alguns autores como uma transferência de um problema localizado nas escolas para as ruas e para a comunidade em geral, o que pode levar ao seu agravamento e não à sua resolução. A utilização frequente deste tipo de prática disciplinar por algumas escolas reforça o absentismo e o comportamento inadequado, uma vez que provoca a rutura com o percurso educativo do aluno, falhando em lidar com as causas do comportamento disruptivo (Costenbader, 1998:60). Em detrimento do afastamento dos alunos da escola tem sido recomendado, entre outras estratégias, que as escolas recorram a instrumentos pedagógicos (ou restaurativos) de regulação do comportamento do aluno e que aprofundem a relação e o envolvimento das famílias desses alunos (Taras, 2003; Morrison e Vaandering, 2012; Chin, et. al., 2012; Skiba, et. al., 2006). Estas abordagens incorporam uma orientação preventiva e proactiva da intervenção escolar sobre os comportamentos violentos que fomenta a construção e manutenção de climas escolares pacíficos. Diversos estudos têm vindo a demonstrar a importância das características da escola e do seu clima organizacional na produção de maior ou menor número de incidentes e na resposta à violência (Kapari e Stavrou, 2010; Carra, 2009b; Dupper e MeyerAdams, 2008). Escolas com um clima mais positivo (lido nas variáveis de “medo da violência na escola” e de “disciplina”– Carra, 2009b) ou aquelas em que o envolvimento dos grupos de pares e a intervenção dos professores têm efeitos na redução de situações de conflitualidade, possuem menores taxas de vitimização (Kapari e Stavrou, 2010:93). Para Dupper e Meyer-Adams (2008) a proximidade dos funcionários é um fator importante na construção de culturas e climas escolares positivos (tolerantes, acolhedores e cooperativos), resultando no reforço de comportamentos mais adequados dos alunos e na prevenção e redução da hostilidade. As escolas possuem uma margem de atuação para se adaptarem às características sociais locais, pelo que Gottfredson (1998:7) destaca o reforço da capacidade da escola para desenvolver e sustentar a inovação mediante a utilização de equipas escolares ou pelo desenvolvimento organizacional de outras estratégias. A sobrelotação escolar, por exemplo, põe a capacidade organizacional das escolas à prova na procura de soluções inovadoras que não afetem o seu clima escolar, nem potenciem os incidentes de violência na escola, ao que se associa frequentemente a degradação das instalações escolares. Esta relação contribui para o enfraquecimento das relações e interações sociais, assim como do empenhamento e dos níveis de aprendizagem (Ready et al, 2004). As respostas imediatas, como a divisão do dia 20 escolar em turnos, podem acarretar custos sociais e académicos negativos, sobretudo para os alunos mais desfavorecidos ou com maiores dificuldades de aprendizagem. 4. ORGANIZAÇÃO ESCOLAR E AS POLÍTICAS DE REGULAÇÃO DA VIOLÊNCIA NA ESCOLA 4.1. AS LIDERANÇAS ESCOLARES E AS ORIENTAÇÕES FACE À VIOLÊNCIA NA ESCOLA Analisar a escola implica olhar para uma configuração social particular que se caracteriza por condicionamentos estruturais que limitam o seu desenvolvimento organizacional e por atores sociais que interagem a partir de interesses e motivações individuais e grupais, nem sempre coincidentes com os da organização ou dos quadros normativos mais amplos. É nesta relação que se perspetivam as organizações escolares, tanto na sua inteligibilidade como na sua imprevisibilidade, pois torna-se necessário entender as organizações escolares não como entidades altamente organizadas exteriores aos atores mas, antes, "anarquias organizadas e sistemas debilmente acoplados" (Barroso, 1991:74). Esta abordagem incita-nos a olhar para a escola enquanto "um espaço-tempo de mediação de interesses e poderes diversos, interiores e exteriores às suas fronteiras físicas, prefigurando-se como uma organização em ação" (Torres e Palhares, 2010:152). A problemática da violência na escola contribui assim para compreender a reação da escola a situações críticas que colocam frequentemente em causa os seus próprios fundamentos, designadamente os psicossociais, organizacionais e normativos. A definição de regras e de princípios de atuação partilhados por todos é um aspeto fundamental para a adesão às normas e valores a respeitar na escola. Nesse sentido, a implementação de estratégias e mecanismos de regulação constitui um leque de opções cuja materialização resulta na estruturação das relações entre os diversos membros da comunidade escolar e na estrutura organizacional. A ausência de uma definição clara e explícita de regras e princípios de atuação comuns remete para o que Barroso (1996:25) definiu como “autonomias clandestinas”, expressando a ideia de que a imposição normativa pode ser frequentemente: objecto de desconexão, base explorada pelos atores em sua defesa, fonte para diferentes interpretações, alvo de observância seletiva ou mesmo pretexto favorável, ou propiciador, para a produção de regras não formais e informais, por vezes de carácter alternativo (Lima, 1998: 479). A opacidade dos sistemas de regras escolares, marcados pela ambiguidade e fraca comunicação de entendimentos normativos entre direções e professores, traduzse numa sobreposição das regras formais com interpretações particulares pelos diversos atores educativos. Esta diversidade de entendimentos disciplinares e respostas à conflitualidade está diretamente associada aos processos de implementação das políticas de regulação dos comportamentos. A identificação e compreensão das lógicas de ação e dos quadros que orientam a ação sublinham a importância dos "jogos" de poder, interesses, conflitos, estratégias e coligações dos atores no quotidiano organizacional das escolas (Silva, 2007:103). É neste âmbito que as lideranças escolares adquirem maior relevância. Segundo Trigo e Costa (2008:571) a escola "precisa de uma liderança que coloque no centro da sua 21 atividade a ética, a moral, os valores, as pessoas, o diálogo e a relação entre pessoas, a adaptabilidade à mudança, o desenvolvimento organizacional, a qualidade" de forma a corresponder aos desafios atuais. O desempenho da liderança pode constituir um dos principais contributos na mudança dos sistemas educativos e das organizações escolares – devido à procura de maior eficácia e ao aumento dos níveis de qualidade que permitem o crescimento e desenvolvimento institucional. Para Silva (2009) a liderança ganha especial importância quando é potenciada por práticas suscetíveis de alargar e reforçar a sua influência, entre as quais o papel das lideranças intermédias: "elementos críticos potenciadores de sucesso ou artífices do contrário" (Silva, 2009:53), às quais compete gerir recursos de base e estabelecer a ponte entre a realidade da sala de aula e a direção. Relativamente à violência na escola, o papel das lideranças escolares é decisivo e o seu desempenho está particularmente associado com as orientações definidas para responder a esse problema (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a), pois é a elas que cabe garantir a atuação e a eficácia das respostas, evitando processos de intervenção erráticos e isolados que, a médio e longo prazo, levam a uma progressiva perda do controlo sobre a situação e ao fechamento face à comunidade. Neste sentido, pode-se afirmar que se produz um efeito cruzado entre os princípios fundadores do projeto estratégico da escola, os modelos organizacionais, os estilos de liderança e as representações sobre a origem da violência e as formas possíveis de a enfrentar. Foi possível constatar que as escolas mais abertas e preocupadas com a equidade na educação, e por essa razão com processos internos mais democráticos e participados, são as mais capazes de controlar e prevenir as situações de violência e que conseguem construir ambientes mais favoráveis ao desenvolvimento dos processos educativos de todos os alunos (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a). 4.2. A EVOLUÇÃO E CENTRALIDADE DAS "POLÍTICAS DE REGULAÇÃO DOS COMPORTAMENTOS" Os sistemas educativos foram alvo de significativas transformações e reformas nas últimas décadas, processos esses que produziram novos dilemas e desafios, ampliando o debate sobre a democratização do ensino. O questionamento público sobre as situações de violência na escola tem motivado debates intensos sobre a autoridade dos professores, a relação entre modelos pedagógicos e gestão da (in)disciplina, o impacto da diversidade sociocultural e a oferta educativa nas escolas, etc. O intenso debate em torno dos compromissos políticos do pós IIª Guerra Mundial tem-se traduzido por uma forte expressão nas décadas mais recentes de quadros de valores neoliberais, que enfatizam a ideia de uma menor gestão social da população pelo Estado, em detrimento de uma maior responsabilidade individual para enfrentar desafios e inseguranças globalizadas (Ong, 2006). Convicção que sobrevaloriza a centralidade dos comportamentos individuais e a sua conformação em vez da sua gestão através de processos escolares. Como refere Casella (2002:369) "at the beginning of the 21st century, policy reinforces the simple idea that kids need to be changed and that adults have the means to change them, and that the way of changing them is by adjusting their cognitive facilities and threatening them with punishment", assumindo a regulação dos comportamentos um espaço central nas políticas educativas (Maguire, Ball e Brown, 2010: 155). Este entendimento estabelece uma relação de causalidade 22 imediata entre a correção dos comportamentos e a melhoria dos resultados escolares (Maguire, et. al., 2010), encerrando uma visão simplista da melhoria do desempenho dos sistemas educativos. Diversos autores têm chamado à atenção para a existência de diferentes fontes e formas de legitimidade política e organizacional no interior das escolas, resultante dos níveis de autonomia organizacional e capacidade de ação dos diferentes autores (Barroso, 2003; Watkins, et. al., 2007). Estas formas de legitimidade interferem muitas vezes de modo contraditório nos processos de implementação e aplicação das normas. Nesse sentido, a aplicação das políticas nacionais é condicionada pelos entendimentos locais sobre a regulação dos comportamentos (ou micropolíticas, Maguire et. al., 2010). Não constituindo realidades homogéneas, encontram-se nas escolas diferentes acessos à informação e diferentes interpretações das políticas e sistemas de regras da própria organização, que se traduzem em práticas contraditórias ou ambíguas na aplicação das políticas por parte dos diversos agentes organizacionais. No plano das políticas públicas portuguesas relativas às situações de violência na escola verificou-se um desenvolvimento conflitual na estruturação dos instrumentos de intervenção do Estado, que passou por uma reorganização genérica da articulação entre os diferentes agentes educativos e administrativos envolvidos no processo. A estruturação de políticas de regulação dos comportamentos expressa-se, no caso português, através de medidas como a reformulação sucessiva do Estatuto do Aluno, o Programa Escola Segura ou as tentativas de criminalização do bullying. A revisão do Estatuto do Aluno, cujo objetivo é estabelecer o quadro normativo a partir do qual se elaboram os regulamentos disciplinares das escolas públicas, provocou uma batalha entre visões políticas e ideológicas diferentes sobre a regulação dos comportamentos e sobre as formas de organização da vida quotidiana das escolas, o que é demonstrativo da tendência dos diversos poderes políticos centrais para regular ao máximo o quotidiano das escolas. As sucessivas alterações a que este quadro normativo tem vindo a ser sujeito expressam bem a natureza conflitual e negociada dos processos de decisão política. Aliás, este debate foi acompanhado por outros, como a organização da rede escolar e o seu modelo de gestão, as opções curriculares e os modelos pedagógicos, o que demonstra as diversas tentativas de reorientação estrutural das finalidades e procedimentos do sistema educativo. A complexificação das políticas públicas sobre a segurança escolar requer uma avaliação mais aprofundada da situação dos problemas existentes, do impacto das medidas tomadas, da articulação local entre os vários programas (como o TEIP) e do desenvolvimento das escolas e comunidades envolventes. É importante analisar as dificuldades na implementação dessas iniciativas, tendo em conta as diversas dimensões do processo em desenvolvimento e a participação de intervenientes com interesses e motivações variadas (muitas vezes divergentes dos objetivos definidos pelo Estado central). A par disso, são igualmente necessários programas e metodologias de intervenção adaptados à realidade das escolas portuguesas. Foi o reconhecimento destas insuficiências que orientou o presente estudo, sobre as quais a equipa do OSE, com a sua experiência e conhecimento acumulado, procurou ultrapassar. 23 II. POLÍTICAS PÚBLICAS 1. AS POLÍTICAS DE INCLUSÃO E IGUALDADE: EVOLUÇÃO, ORIENTAÇÕES E INSTRUMENTOS Em Portugal e na União Europeia (UE) o progresso significativo melhoria dos níveis de qualidade de vida tem coexistido com a persistência dos fenómenos de pobreza e de exclusão social. Os mecanismos de redução das desigualdades têm demonstrado uma relativa ineficácia por não terem conseguido impedir a manutenção das situações de exclusão social de determinados grupos da população, nomeadamente os que se encontram em zonas de periféricas. No sentido de contribuir para a resolução destes problemas, em Março de 2000 o Conselho Europeu de Lisboa definiu como meta a erradicação da pobreza e da exclusão social, com o objetivo estratégico de atingir um crescimento económico sustentado (emprego em quantidade e qualidade) e maior coesão social em 10 anos. É a partir desta cimeira que se começa a desenhar a Estratégia de Lisboa tendo sido proposto o Método de Coordenação Aberta (MCA) como principal vetor político para alcançar esse objetivo5. Esta nova estratégia de cooperação implicou uma abordagem articulada e tripartida entre as políticas sociais (qualidade social/ inclusão), económicas (competitividade/ dinamismo) e de emprego (qualidade e pleno emprego), bem como a conjugação de objetivos comuns, planos nacionais e programas comunitários. Os quatro objetivos comuns para a inclusão social foram definidos em Dezembro do mesmo ano no Conselho Europeu de Nice e posteriormente revistos em Novembro de 2002, são eles: 1) promover a participação no emprego e o acesso de todos aos recursos, aos direitos, aos bens e aos serviços; 2) prevenir os riscos de exclusão; 3) atuar a favor dos mais vulneráveis; 4) mobilizar o conjunto dos intervenientes. É com base nestes objetivos e nas metas definidas que se definiram os indicadores comuns (de diagnóstico, monitorização e avaliação dos objetivos), Planos Nacionais de Ação para a Inclusão (PNAI) – que propõem políticas e soluções a implementar – e relatórios conjuntos de avaliação dos planos dos Estados-Membros elaborados pela Comissão Europeia. É neste contexto político que surgem as primeiras gerações do PNAI entre 2001-2003 e 2003-2005. A partir de 2005, a revisão da estratégia de Lisboa conduziu a alterações na Agenda Social Europeia e no MCA, passando o processo de inclusão social a integrar uma abordagem mais ampla e racionalizada (streamlining) 6 , que articula políticas de inclusão, pensões e cuidados de saúde e cuidados de longa duração ou continuados. Estas alterações ocorrem essencialmente pela discrepância entre os objetivos comuns e a concretização das políticas, passando a avaliação da eficácia das políticas a ocupar um lugar de destaque. Segundo, pela necessidade de reforçar a dimensão social e 5 Para a sua implementação foi criado o Programa Comunitário de Ação Contra a Exclusão Social em 2002 (Gonçalves, 2006:136) 6 Perspetiva de racionalização em que se procurou maior simplificação, integração e coerência entre os processos de coordenação existentes (op. cit . pp. 137). 24 garantir a coerência e coordenação entre os objetivos da coesão social e os objetivos do crescimento e do emprego. Estas alterações reorientaram a terceira geração do PNAI entre 2006-2008, com um novo quadro de objetivos para a proteção social e a inclusão social, dos quais três são específicos para a inclusão: 1) garantir o acesso de todos a direitos, recursos e serviços essenciais e simultaneamente erradicar as formas extremas de exclusão e discriminações que levam à exclusão social; 2) garantir a inclusão social ativa de todos através da promoção da participação no mercado de trabalho e do combate à pobreza e à exclusão social das pessoas e grupos mais marginalizados; 3) garantir a boa coordenação das políticas de inclusão social e o envolvimento de todos os níveis de governo e agentes pertinentes; a sua eficiência e integração em todas as políticas públicas relevantes (económicas e orçamentais; de educação e formação; programas de fundos estruturais como o FSE) e que consideram a perspetiva da igualdade de género. Em 2008-2010, após avaliação e consequente aprovação da estratégia implementada anteriormente, deu-se continuidade às prioridades e objetivos políticos no sentido de as reforçar e melhorar. Essas prioridades tiveram como eixos estratégicos de intervenção responder ao impacto das alterações demográficas e promover a inclusão social de todos os cidadãos, procurando prevenir e reduzir as desigualdades. Em 2010 foi definida a nova estratégia europeia, designada Europa 2020, que aponta para um crescimento mais inteligente, sustentável e inclusivo, num prazo de dez anos. Representando uma revisão do modelo anterior, esta agenda definiu as prioridades, objetivos e iniciativas para orientação e coordenação das medidas políticas a nível nacional e europeu. Foi dado especial enfoque ao crescimento inclusivo com particular preocupação com a criação de emprego e a redução da pobreza, tendo como um dos grandes objetivos reduzir pelo menos em 20 milhões o número de pessoas em risco ou situação de pobreza e exclusão social7. Parte integrante desta nova estratégia constitui a plataforma europeia contra a pobreza e a exclusão social, iniciativa criada também em 2010, com o intuito de coordenar e gerir as intervenções promovidas, tendo quatro medidas principais: 1) Melhorar o acesso ao trabalho, à segurança social, aos serviços essenciais (cuidados de saúde, alojamento) e à educação; 2) Utilizar mais eficazmente os fundos da UE para apoiar a inclusão social e lutar contra a discriminação; 3) Encorajar a inovação social para encontrar soluções inteligentes na Europa do póscrise, em especial no que toca a um apoio social mais concreto e eficaz. 4) Fomentar novas parcerias entre os sectores público e privado. Estas alterações sustentam uma mudança nas estratégias definidas para a inclusão social, reconhecendo a multidimensionalidade da pobreza e da exclusão social. As estratégias deste modo definidas passaram a considerar, por um lado, um maior número de pessoas em risco de pobreza, em privação material ou com uma intensidade de trabalho muito baixa, e por outro lado, a dimensão territorial dos fenómenos. Sendo os Programas Nacionais de Reforma elaborados por cada Estado membro, a tradução efetiva dessas orientações encontra-se no instrumento político nacional mais relevante nesta matéria, o Plano Nacional para a Igualdade (PNI). Na sua quarta geração, o IV Plano Nacional para a Igualdade, Género, Cidadania e Não 7 No caso português a meta definida refere-se a 200.000 pessoas. 25 Discriminação 2011-2013 enquadra-se nos compromissos assumidos por Portugal nas várias instâncias internacionais e europeias (como a ONU, o Conselho da Europa e a União Europeia). Neste plano procura afirmar-se a igualdade como fator de competitividade através de três eixos: reforço da transversalidade do género e integração desta dimensão em todos os domínios de atividade política e social; implementação de ações específicas para ultrapassar determinadas situações de desigualdade; abordagem das discriminações múltiplas – "quando à pertença sexual se juntam outros fatores de discriminação e os seus efeitos em homens e em mulheres" (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012). A integração das orientações definidas nos vários domínios de decisão e ação política (local, regional e nacional) mediante uma estratégia de territorialização, é vista como garantia da concretização e eficácia das mesmas e um princípio fundamental de boa governação (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012). Emerge portanto uma nova fase de políticas europeias para a inclusão e coesão social e territorial, que procura integrar os diversos atores chave na sua coordenação, através do diálogo entre parceiros institucionais e não institucionais. 2. AS POLÍTICAS DE SEGURANÇA ESCOLAR: CONTEXTOS, CONCEITOS E INSTRUMENTOS DE INTERVENÇÃO O fenómeno da violência na escola começou a ser entendido como um problema social a partir dos anos 1990, na maioria dos países europeus, surgindo um conjunto de respostas diferenciadas para lidar com o mesmo (Carra, 2009a:98). Em consonância com as tendências europeias, Portugal assistiu igualmente a uma ampliação da preocupação com este assunto e, consequentemente, à definição de instrumentos políticos de prevenção e intervenção, com abordagens significativamente diversas (e divergentes) quanto ao entendimento sobre as causas de violência e quanto aos princípios de atuação. Também na esfera científica se assistiu, a partir dessa década, à produção de investigação e discussão em torno do fenómeno em diferentes domínios científicos (Sebastião, Alves e Campos, 2003). A diferenciação, quer na circunscrição, quer nas respostas dadas para reduzir a violência, é em grande parte explicada pelos desenvolvimentos da investigação sobre o tema, seja a nível europeu, seja nacional. Entre as disciplinas que mais se têm ocupado da pesquisa sobre a violência na escola, destacam-se a Psicologia, as Ciências da Educação, a Sociologia e as Ciências da Saúde. Encontram-se assim definições sobre o fenómeno que sublinham dimensões distintas. As mais predominantes têm sido: "bullying escolar" (Olweus, 1993); "comportamentos de risco" (OMS, 2005); "comportamento antissocial" (Carra, 2009a; Veenstra e Dijkstra, 2011). Independentemente da definição usada, as pesquisas têm convergido na ideia de que a violência em meio escolar é um fenómeno restrito, ocorrendo nos quotidianos sob a forma de micro-violências, pequenas vitimizações e incivilidades – aquilo que é usualmente designado por violência de baixa intensidade (Dupper e Meyer-Adams, 2008:164) – reiterando a raridade de incidentes de maior gravidade. Neste âmbito, Carra (2009a:102) defende que a gravidade de um incidente deve ser pensada mais em termos da reincidência da vitimação do que em termos da forma ou proporções 26 que o ato violento assume. Alguns investigadores defendem uma maior preocupação com a escolha dos argumentos, métodos e fórmulas no sentido de adquirir um controlo teórico sobre as virtualidades semânticas dos conceitos (Debarbieux, 2002a:65). Por esse motivo, alertam para o efeito da adoção de uma definição unívoca do fenómeno da violência na escola pelo refinamento de categorias corresponde a um vácuo teórico (e que se encontram na base da criação de alguns modelos de intervenção) (Sebastião, et al 1999; Sebastião, Alves e Campos, 2003). O desenvolvimento e disseminação do conhecimento permitiram apoiar a implementação de instrumentos políticos de intervenção e prevenção, bem como avaliar os efeitos dessas medidas em diferentes escalas territoriais e de modo comparado. Smith (2004:140) relativamente às iniciativas para reduzir a violência nas escolas a nível internacional, distinguiu entre as diretivas ou holistas (combinadas) de larga ou pequena escala, com um formato menos uniforme ou mais padronizado8. Em Portugal, o fenómeno da violência nas escolas ganhou relevância e visibilidade social sobretudo a partir da década de 90, como anteriormente se referiu. A crescente preocupação com o problema resultou essencialmente da persistência das queixas das associações de pais e de professores, por um lado, e pela mediatização do fenómeno, por outro. Contudo, não se pode considerar que se trate de um fenómeno recente no país 9 . Foi neste contexto que se definiram diversos instrumentos políticos, sendo efectivada pela primeira vez uma medida específica de controlo da violência nas escolas em 1992, a partir do estabelecimento de um protocolo interministerial entre o Ministério da Educação e o Ministério da Administração Interna. Sem uma preocupação pedagógica de partida, o objetivo deste protocolo foi o de colocar as autoridades escolares e as forças de segurança (PSP e GNR) num campo de ação conjunto. No decorrer deste primeiro período as atuações sustentavam-se numa abordagem essencialmente policial (Sebastião, Alves e Campos, 2003). Esta abordagem funda-se no entendimento da violência como fenómeno que pré-existe à escola, resultando sobretudo dos problemas existentes em zonas de periferia degradada, marginal ou de bairro sociais cuja conflitualidade contextual, que segundo esta perspetiva se reproduz inevitavelmente nos quotidianos escolares. A criação do Programa Escola Segura em 1996, bem como um acordo de cooperação entre os Ministérios da Educação, Saúde, Segurança Social e Administração Interna, resultou assim do reconhecimento da necessidade de incorporação de outras dimensões, como a pedagógica e securitária no âmbito das medidas políticas definidas a nível nacional nesta matéria. Tal alargamento, implicou a promoção de novos domínios de intervenção e de investigação. O Programa Escola Segura foi, então, 8 De que é exemplo o Programa Anti-bullying de Olweus, que foi largamente implementado na Noruega em conjunto com outras iniciativas, além da Áustria, Finlândia, Alemanha e Islândia. 9 Em termos históricos, a violência policial contra os estudantes universitários no período do Estado Novo e os confrontos físicos resultantes de intensos debates políticos entre estudantes ou mesmo professores na época da Revolução dos Cravos são exemplo disso. Contudo, o enquadramento da violência tinha um carácter essencialmente político, que não se coaduna com o tipo de violência que podemos encontrar nas escolas hoje. Pequenos furtos, agressões esporádicas ou sistemáticas, uso de armas, ameaças a professores e a colegas, ou a destruição de bens e equipamentos escolares ou pessoais são realidades vividas pelas escolas portuguesas nos últimos anos. 27 implementado progressivamente num conjunto de escolas com a coordenação do Gabinete de Segurança do Ministério da Educação10. Tendo como objetivo reduzir ou erradicar as situações de violência e insegurança nas escolas e meio envolvente (Preâmbulo – Despacho n.º 25 650 de 19 de Dezembro de 2006), os seus princípios estratégicos baseiam-se na territorialização, na parceria, na formação e na monitorização do fenómeno. Ao inscrever-se num contexto de novas formas institucionais de resposta que concorrem para a regulação social, esta perspetiva política relaciona-se por um lado, com as iniciativas europeias de carácter territorial, de natureza contratual ou partenarial das políticas públicas. Por outro lado, o Programa Escola Segura é um dos primeiros campos de experimentação do modelo de Policiamento de Proximidade11, cujo enquadramento implica a mudança do paradigma de atuação e da organização na sua relação das forças de segurança com as populações e instituições locais. Assumese assim como uma estratégia com um duplo objetivo: envolver os cidadãos na melhoria da qualidade de vida dos territórios em que se encontram e descentralizar a atuação policial do policiamento reativo. Em conformidade com a filosofia de intervenção subjacente, as estratégias de policiamento são de carácter essencialmente informativo e preventivo e definem-se sobretudo pelas necessidades dos cidadãos. Estas duas vertentes ou inspirações do principal instrumento de intervenção da violência na escola em Portugal possibilitaram assim uma maior adequação aos contextos escolares locais e a concretização de redes de colaboração entre as diversas entidades envolvidas. Com a inclusão de uma dimensão mais pedagógica 12 , o Programa Escola Segura ampliou então o leque de iniciativas implementadas, inscrevendo-se de forma parcial ou total no leque de atuações desenvolvidas nas escolas portuguesas. Esta reorganização do Programa Escola Segura foi coordenada pela em 2006 pelo Observatório de Segurança Escolar (OSE) criado em 2005, cujo objectivo de formação inicial se prendeu com o estudo dos fenómenos relacionados com a segurança dos estabelecimentos de ensino e de fornecer instrumentos e indicadores técnica e cientificamente validados. O leque de iniciativas e lógicas de atuação (direta ou indireta) sobre a violência nas escolas portuguesas não se distancia muito do que tem vindo a ser implementado no contexto europeu, havendo essencialmente dois tipos de abordagem que se alimentam de diversas medidas políticas de escalas e enfoques diferenciados, mas que se complementam. 10 Gabinete criado em 1984 com um enquadramento meramente administrativo até 2007, ano em que foi criada a Equipa de Missão para a Segurança Escolar, cujo mandato de três anos consistiu na concepção, desenvolvimento e concretização de um sistema de segurança nas escolas. Em 2009 é constituído assim o Gabinete Coordenador de Segurança Escolar enquanto estrutura administrativa autónoma a funcionar em dependência do ME, e regulamentada a situação dos prestadores de serviço de vigilância nas escolas e dos procedimentos concursais. 11 Inspirado em experiências de outros países como os EUA, Canadá, Inglaterra, França ou Holanda, o policiamento de proximidade traduz-se no princípio que os agentes das Forças de Segurança devem trabalhar conjuntamente com os cidadãos de modo a encontrar soluções para os problemas da comunidade associados à criminalidade, desordem e outros que concorram para a redução do sentimento de segurança (Lisboa e Dias, 2008:4). 12 Entendendo-se que grande parte das ocorrências resultavam também da necessidade de reorganização das escolas nesta matéria para a prossecução dos objetivos educativos. 28 Quadro 2 - Abordagens de regulação da violência em meio escolar Abordagem Interventiva Preventiva Objetivo da Medida Resolução de incidentes ocorridos ou redução das oportunidades de ocorrência de violência. Sistemas de resposta rápida e reforço da vigilância, que nem sempre são eficazes /contraproducentes na melhoria do clima de escola e da convivência Medidas em Portugal Aumento do número de guardas e à colocação de alarmes e câmaras de videovigilância nas escolas no âmbito do Programa Escola Segura, bem como à Policial/ criação de linhas telefónicas de apoio à vítima, Externa designadamente o SOS Professor da Associação Nacional de Professores. O Sistema Jurídico de Autonomia e Administração Escolar (Decreto Lei 137/2012)14 e o Novo Estatuto do Regulamentação, definição de papéis a Aluno (Lei n.º 51/2012)15 são produtos que desempenhar na gestão de conflitos e apoio ou representam particularmente as iniciativas nacionais de regulamentação e estruturação organizacional das Escolar/ Interna formação de professores (sensibilização, acréscimo de assistentes educativos e/ou treino competências a desempenhar. As iniciativas de apoio específico de gestão de conflitos13). ou formação de professores têm cabido sobretudo ao Programa Escola Segura16 ou a outras entidades formadoras contratadas pelas escolas. Entre o vasto leque de medidas portuguesas estão: 1. Intervenção cívica e/ou comportamental: Formação cívica, Programa Parlamento de Jovens; Intervenção pressupõem a responsabilização dos alunos e Treino de competências pessoais e sociais; Projetos de cívica e/ou podem enquadrar-se no âmbito da Educação gestão de conflitos entre pares ou de melhoria da comportamental para a cidadania e/ou para a Saúde autoestima do aluno; Programa Saúde Escolar e Programa Eco Escolas. O instrumento que melhor se enquadra neste tipo de 2. Alteração do Ambiente ou clima de escola: iniciativa em Portugal foi o Programa de Alteração do Preveem a melhoria das condições físicas dos Modernização do Parque Escolar cujo objectivo foi Ambiente ou espaços escolares e dos seus equipamentos, modernizar a rede pública de escolas secundárias e clima de escola bem como a promoção do clima de escola. outras afetas ao Ministério da Educação. Principais instrumentos: Programa Territórios 3. Procura de Equidade (igualdade de Procura de Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP); oportunidades, democratização do ensino): Equidade Programa Escolhas; Diversificação de vias de ensino: medidas de combate à reprodução das (igualdade de Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF), oportunidades, desigualdades sociais, nomeadamente o Curso de Educação e Formação para Jovens (CEF), democratização insucesso escolar e o abandono escolar Percurso Curricular Alternativo (PCA) e Cursos precoce. do ensino) Profissionalizantes Fonte: Observatório de Segurança Escolar, 2012 – adaptado de Smith (2004) e Debarbieux et al (2003) 13 Na Europa, as formações em gestão de conflitos são habitualmente destinadas a professores, deixando com frequência o pessoal não docente e os pais excluídos destas iniciativas. 14 Este decreto procede à segunda alteração do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril, alterado pelo Decreto-Lei n.º 224/2009, de 11 de setembro. O novo modelo de escola alterou significativamente os níveis organizacionais de decisão e atuação, numa ótica de descentralização e autonomia, permitindo às escolas rentabilizar e mobilizar recursos que resultaram, por exemplo, no decréscimo efetivo do número de incidentes. 15 Sendo um normativo em constante reformulação nos últimos anos e que tem gerado um aceso debate político, o atual Estatuto do Aluno adequa e reforça as medidas disciplinares (de carácter corretivo e sancionatório) a aplicar na escola, agilizando igualmente os processos disciplinares e as tomadas de decisão. Este documento é apropriado e traduzido para o Regulamento Interno de cada Escola ou Agrupamento de Escolas, verificando-se variações pouco significativas de estabelecimento para estabelecimento a nível documental. Nas práticas, porém, a situação é outra. 16 Nomeadamente as sessões de sensibilização e formação promovidas regularmente pelas Forças de Segurança e pontualmente pelo Gabinete Coordenador de Segurança Escolar, para além do apoio sistemático das estruturas regionais em colaboração com este gabinete ou da criação de programas de atuação específica (Vigilantes nas Escolas Primárias na Amadora). 29 III. TERRITÓRIOS 1. A PERSPETIVA DOS AGENTES LOCAIS O desenvolvimento e complexificação das políticas públicas relativas à segurança das escolas nos últimos anos impulsionou a realização deste estudo, no sentido de avaliar o impacto efetivo das medidas tomadas, assim como a articulação local entre os vários programas (como o TEIP, Escolhas, etc.), as orientações e os instrumentos de territorialização da educação e formação. Numa avaliação deste tipo é preciso considerar as diversas dimensões em que se desenvolve o processo de implementação e concretização local das políticas de segurança escolar e a participação dos diversos intervenientes. Assim, os resultados que aqui se apresentam prendem-se particularmente com os objetivos de identificação e análise: a) dos bloqueios de articulação entre políticas, programas e medidas; b) e das potencialidades de colaboração entre os agentes e instituições responsáveis pela implementação das políticas. As opções metodológicas desta pesquisa foram definidas com base na análise (preparatória) dos dados de caracterização recolhidos e desenvolvidos em trabalhos anteriores, ancorando os saberes e experiências teóricos e empíricos acumulados pela equipa do Observatório da Segurança Escolar (Sebastião, Campos e Merlini 2012b; Sebastião, Campos e Merlini 2011; Sebastião Campos e Merlini, 2010). Inicialmente partimos do levantamento do conhecimento prévio dos interlocutores escolares relevantes neste domínio, por serem os atores com responsabilidade na regulação do fenómeno de violência na escola, quer a nível local quer concelhio, combinado com a análise dos documentos estratégicos das respetivas entidades (Projeto Educativo de Escola, Plano de Desenvolvimento Social Concelhio, Diagnóstico Social Concelhio do Conselho Local de Ação Social do Concelho). Posteriormente, realizou-se a aplicação de um inquérito por questionário aos representantes institucionais das diversas entidades identificadas, com implicação nos processos relativos à proteção de crianças e jovens. O inquérito por questionário aos representantes institucionais compreendeu três dimensões principais: a) uma breve caracterização da instituição; b) a nomeação de um conjunto de parceiros e a avaliação do grau ou intensidade das interações estabelecidas com estes para a regulação da violência infanto-juvenil (afinidade, frequência de colaboração e de trocas de informação ou recursos); c) a identificação de necessidades internas e externas da instituição e de propostas de melhoria. A triangulação da informação recolhida permitiu traçar um diagnóstico inicial sobre as relações e articulações entre estes agentes institucionais na concretização de estratégias de intervenção e prevenção. Inscrevendo-se numa pesquisa de pequena escala, os resultados obtidos pela análise de redes que aqui se apresenta, enquadram30 se numa observação de diagnóstico, de natureza preliminar, cuja finalidade principal é avaliar os padrões de interação de um conjunto de instituições locais. 17 Tanto os recursos (temporais e materiais) como os objetivos principais do projeto, no desenvolvimento do qual esta análise se inscreve, circunscreve a análise com enfoque para a descrição das propriedades estruturais emergentes (padrões ou regularidades sociais) na rede. Metodologicamente destaca-se que os diversos momentos de contacto entre a equipa do Observatório de Segurança Escolar e as instituições constituintes da amostra garantiram um nível de confiança significativo e, consequentemente, um acesso privilegiado a esta rede, constituindo um excelente ponto de partida. 1.1. CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES LOCAIS INQUIRIDOS A seleção do conjunto de entidades locais e instituições formais que configuram as redes de intervenção sobre situações de violência, em cada um dos territórios socioeducativos considerados no estudo, procurou enquadrar as respetivas dinâmicas dos contextos territoriais. Ao todo escolheram-se 23 entidades e instituições que se distribuem da seguinte forma pelo concelho e freguesias. Quadro 3 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios socioeducativos em estudo (seleção) Município Freguesia 1 Freguesia 2 Autárquica ou Oficial não judiciária 3 1 2 Zona 1 (Freguesias 1 e 2) 1 Associação, Projeto ou Programa Social 0 2 1 Educação e Formação 1 1 Policial ou Judicial 1 Saúde 0 Tipo/ Local Total Freguesia 3 Total 2 9 0 1 4 1 0 1 4 1 1 0 1 4 0 0 1 1 2 2 6 23 5 5 5 Fontes: Informações privilegiadas das escolas e análise dos documentos oficiais. A classificação atribuída revelou-se de grande utilidade quer para a análise do conjunto global de instituições, quer para a compreensão das relações estabelecidas entre estas. A natureza e função das instituições constituiu o critério principal de aplicação das categorias. O peso de cada tipo institucional no total de inquiridos foi informado e ponderado face à realidade local e à importância destas entidades na regulação do fenómeno. Num total de 23 intervenientes incluídos na análise, cinco 17 Aprofundada posteriormente no decurso do projeto, com a aplicação de mais grupos focais com as instituições em análise, neste relatório no ponto 2. do capítulo III. Comunidade. 31 não responderam. Situação que procuráramos ver suprida em desenvolvimentos posteriores do projeto. Ainda que apenas 18 tivessem respondido, foi simultaneamente relevante constatar que as nomeações dos parceiros18 se centraram sobretudo no conjunto total de entidades que estavam previamente selecionadas para o estudo 19 , verificando-se ainda uma forte correspondência entre os respetivos objetivos de atuação e o tipo institucional atribuído na classificação. Quadro 4 - Objetivos de atuação segundo o tipo institucional Tipo de instituição (sigla) Objetivos de atuação N Autárquica ou Oficial não judicial (AO) Proteção da infância, apoio e bem estar social 5 Associação, Projeto ou Programa Social (APP) Inclusão social, cultural e educativa 4 Educação e Formação (EF) Educativos e formativos 3 Policial ou Judicial (PJ) Prevenção e intervenção policial e judiciária 4 Saúde (S) Promoção de saúde 1 Fonte: Inquérito aos representantes institucionais Esta afinidade verifica-se, por exemplo, entre instituições muito distintas como a Associação APP5 – cujo objetivo revelado é: Acolher, capacitar e integrar são o seu mote de ação/ intervenção. – e o Programa Comunitário APP2.2 – com objetivos idênticos: Promover o desenvolvimento de competências escolares (...) fomentando o sucesso escolar e a inclusão escolar. Contribuir para a inserção social e cultural dos destinatários e beneficiários. Intervir junto das crianças e jovens no sentido de diminuir o risco de exclusão social a partir de ações que promovam a responsabilização pela comunidade. A correspondência entre os tipos institucionais (por nós categorizados) e os principais objetivos de atuação reportados pelos inquiridos permitiu a realização de uma análise das relações entre parceiros segundo a sua afiliação ou pertença organizacional, levantando questões pertinentes em termos das propriedades emergentes desta rede de parceiros. 18 A liberdade de nomeação, restringida até 10 parceiros possíveis, foi uma das opções metodológicas na construção do instrumento de inquirição para a análise de redes. Embora uma lista exaustiva dos parceiros permita suprir os problemas "típicos" de recurso à memória neste tipo de técnica, o facto de se tratar de relações estabelecidas entre instituições garantiu-nos alguma fiabilidade na obtenção dos dados. Resta salientar que cerca de 70% das instituições (N=18) escolheram até 6 parceiros o que, dada a problemática em análise, seria expectável. 19 A lista de entidades locais inquiridas encontra-se em anexo, no ponto B, capítulo IX. 32 1.2. RELAÇÕES ENTRE OS AGENTES LOCAIS Na sequência da perspetiva adotada, procurámos aferir as interações e relações de interdependência mediante uma abordagem meso analítica e sociocêntrica – na medida em que os atores estão "encastrados" (embedded) em redes de relações formais e informais. Particularmente, compreender as forças de estruturação emergentes nas relações estabelecidas entre o conjunto dos atores institucionais que intervêm no fenómeno da violência infanto-juvenil no concelho em estudo. Assim, para aprofundar os padrões de ligação estabelecidos entre os inquiridos consideraramse quatro conjuntos de dados relacionais/ sociométricos: a) as mutualidades ou relações adjacentes entre os atores (quem nomeia quem e quem é escolhido por quem); b) a frequência de colaboração entre os atores (nula, rara ou frequente); c) a avaliação da relação mantida (nula, negativa ou positiva) e d) a frequência das trocas de recursos e informação entre os atores (nula, rara ou frequente). Retomando algumas das questões previamente colocadas, apresenta-se a análise. Uma das primeiras evidências analiticamente consideradas prende-se com a significativa uniformidade entre as finalidades declaradas e os tipos de instituição que integram a rede observada. Para aprofundar a compreensão sobre esta correlação a análise focouse na distribuição das ligações adjacentes segundo a centralidade dos atores. Figura 2 - Centralidade dos atores em nomeações diretas Legenda: Locais – Concelho: Branco; Freguesia 1: Cinza 75%; Freguesia 2: Cinza 50%; Zona 1 (Freguesias 1 e 2): Preto; Freguesia 3: Cinza 25%. Tipo de instituição: AO: Círculo; APP: Quadrado; EF: Triângulo; PJ: Quadrado com círculo; S: Losango. 33 Um dos aspetos a destacar no grafo das relações orientadas (ou direcionadas) apresentado diz respeito à distribuição das instituições segundo a proximidade geográfica. A posição dos atores na estrutura da rede está claramente disposta pelos territórios locais em que estas se encontram. Esta evidência ganha particular relevância relativamente à comunicação, à transferência de recursos e à colaboração entre estas entidades, uma vez que o contexto local em que se situam determina significativamente as ligações de adjacência/ diretas estabelecidas entre elas e circunscreve o funcionamento do seu sistema de relações. Sendo as estruturas reticulares desprovidas de uma hierarquia formal, isto é, observando os padrões de ligação entre os atores com a premissa de que todos estão ao mesmo nível de interdependência, importa medir o grau de centralidade e intermediação das relações mantidas. 20 O grau de centralidade de uma matriz direcionada (com relações de sentido entre os atores, ou, se quisermos, com "preferências") é dado pelo número de nomeações recebidas (in degree) e pelo número de nomeações emitidas (out degree) dos atores institucionais (ou na linguagem usada no âmbito da teoria dos grafos, pelos nodos da rede). A centralidade é um atributo do ator na medida em que este resulta da sua posição na rede de relações, constituindo por isso um atributo de natureza relacional ou estrutural. Em termos substantivos, estas medidas dão-nos, entre outras: o nível de prestígio dos atores (liderança, popularidade), o seu nível de atividade na rede, a força ou fragilidade da reciprocidade entre relações, bem como a maior ou menor dependência entre os atores. Na figura 2 o tamanho dos atores (ou nodos) está representado de acordo com o seu grau de centralidade, seja por terem feito muitas escolhas, seja por terem sido muito escolhidos. A escola EF2 e a unidade de saúde S4 são as instituições que têm maior número de conexões emitidas e recebidas, ocupando uma posição muito particular na rede pois têm um grau de atividade elevado relativamente aos outros, usufruem de maior estatuto (maior prestígio ou liderança) e de maior número de alternativas disponíveis (maior independência)21. Excetuando estas duas instituições, as restantes têm maior frequência de nomeações recebidas ou de nomeações emitidas mas não de ambas. Considerando o prestígio ou o número de nomeações recebidas pelos atores da rede, a PJ2 e a PJ5 têm um lugar igualmente de destaque. Contudo, apesar destes dois atores serem relativamente mais "populares" que os restantes, a sua capacidade de controlo/ liderança é menor, uma vez que só uma dessas ligações é recíproca (PJ2 – EF2). Já as comissões de proteção (AO3.2 e AO4), seguidas pela escola EF1 apresentam um grau elevado de nomeações recebidas e nulo de nomeações emitidas, 20 Para esta análise consideramos apenas a matriz das mutualidades (ou relações diretas) porque os dados matriciais são binários e em maior quantidade do que os recolhidos com as outras dimensões relacionais em estudo. As relações entre os atores estão representadas por setas direcionadas. 21 Tendencialmente, atores com maior centralidade adotam inovações mais cedo por terem maior probabilidade de captar o que flui na rede (informação sensível). 34 colocando-as numa posição de recetoras das trocas e colaborações institucionais, que não são correspondidas22. Relativamente à medida de atividade ou o número de nomeações emitidas, o Programa Comunitário APP1.2 é a entidade com o maior número de escolhas de parceiros, contudo, apresenta uma significativa fragilidade na reciprocidade das relações na rede (por não ter nenhum ator a nomeá-la). Na mesma posição, mas relativamente mais equilibradas, estão as juntas de freguesia AO1 e AO2.1 e a Associação APP3. Neste âmbito, salienta-se que o facto de existir um número significativo de atores não nomeados pelos restantes parceiros da rede de intervenção aponta para um fraco aproveitamento dos recursos disponíveis, que não são capitalizados de forma alargada para atuações concretas. Passando de um nível "individual" para outro "grupal", podemos analisar a medida de intermediação (betweeness), ou seja, por que atores têm de passar os restantes para alcançar os outros (que atores representam "pontes" de acesso de um subconjunto para outro), no sentido de compreender as relações indiretas que se estabelecem entre estas instituições. Um grau de intermediação elevado é sinónimo de maior poder ou acesso à informação, precisamente porque os atores intermediários ocupam uma posição estratégica (gatekeepers) que lhes permite controlar a relação mantida com os outros, além de terem tendencialmente maior capacidade de inovação (por terem informação mais variada) e de alteração das normas de um dado grupo (pelo menor comprometimento relacional e constrangimento face às regras internas) – esta medida revela-se particularmente pertinente no estudo das relações interorganizacionais23. 22 Os dados apresentados mereceriam uma avaliação posterior com as instituições em questão, para aprofundar as razões de fraca interdependência. 23 Um resumo dos principais resultados com este tipo de análises pode ser encontrado em Mizruchi, M. S. (2006:76). Além do grau de centralidade (das relações diretas), a intermediação e a proximidade (closeness) constituem indicadores de centralidade indireta de uma rede, perfazendo os três tipos de análise da centralidade dos atores, cujos referenciais teóricos foram propostos e desenvolvidos por Freeman desde 1979 (Mizruchi, 2006:83). 35 Figura 3 - Intermediação (betweeness) dos atores em nomeações diretas Os atores com maior grau de intermediação na rede em análise (fig. 3) são: a equipa de reinserção social PJ5 e a unidade de saúde S4, seguidos pela comissão de proteção AO3.2 e a equipa da rede social concelhia AO5.1. Um dos fatores que poderá explicar (ainda que parcialmente) esta distribuição remete para o tipo de estrutura organizacional e objetivos destas instituições, pois apresentam uma relativa centralização de funções e serviços específicos de resolução das situações de violência comparativamente aos restantes atores. As duas primeiras constituem órgãos específicos para prevenção e intervenção judicial e cuidados de saúde, enquanto que as últimas são órgão oficiais e autárquicos cuja finalidade é o acompanhamento, seja na proteção de crianças e jovens, seja pelo incentivo a uma abordagem de intervenção integrada das instituições do município. Cada gatekeeper em foco tem pelo menos uma relação direta com um dos outros, criando três subgrupos conectados (ou grafos possíveis). Um desses subconjuntos integra todos os intermediários a uma distância (geodésica) de grau 1 pela seguinte ordem: [S4, AO5.1, PJ5, AO3.2]. Estas relações de adjacência conferem aos referidos atores um nível significativo ou alto de intermediação pois, além de constituírem pontos chave de relação com os restantes integrantes da rede, estão conectados diretamente entre eles. Pode-se inclusivamente inferir que a comissão de proteção AO3.2 e a equipa de reinserção social PJ5, nesta rede em concreto, são atores intermediários do território 3; A PJ5 e a S4 fazem a ponte com o território 1, com a segunda a desempenhar um papel central no acesso ao território 2. A AO5.1, por sua vez, ocupa uma posição de intermediação essencial na ligação entre as outras três instituições. Outro aspeto interessante nas configurações existentes da rede é a tendência para as entidades escolares e policiais (EF3, PJ3/ EF1, PJ1/ EF2, PJ2) serem atores com um grau de intermediação significativamente baixo, colocando-as numa posição periférica e condicionada relativamente ao controlo e acesso a informação "sensível" – eventualmente por trabalharem de modo relativamente isolado. 36 A distribuição das interdependências dos atores desta rede apontam para pistas relevantes na exploração de algumas das dinâmicas relacionais. Apesar da análise da centralidade ser decisiva para a compreensão do estatuto ou poder simbólico dos atores (sobretudo em relações direcionadas), vislumbram-se outros padrões de interação nesta rede com importância análoga, como a coesão e reciprocidade. A observação das relações de adjacência permite-nos constatar que não se trata de um grupo coeso, porque é escassa em circuitos (ou seja, em subgrupos cujos nodos coincidem) e é excessiva em árvores (i.e. grafos conexos sem circuitos). Uma distribuição de relações deste tipo é comum em redes cujos atores têm uma orientação na direção das suas conexões, apresentado portanto uma densidade baixa ou relações dispersas (sparse). Verificando-se que o padrão de interdependências apresenta pouca coesão, a análise das relações recíprocas e de eventual pertença a subconjuntos (mais próximos entre si) no interior da rede adquire especial relevância. Neste âmbito, a aplicação das teorias de G. Simmel (1950; 1955) sobre as formas de sociabilidade é particularmente útil, sobretudo para a análise de díades e tríades 24 Simmelian Tie (ou embedded tie) é uma das medidas de coesão usadas pela análise de redes para identificar as relações de reciprocidade. Por definição uma ligação Simmeliana é uma díade (ou par de atores) reciprocamente conectada com ligações a outros atores. Figura 4 - Simmelian Ties: relações de reciprocidade 24 De forma genérica, assume-se que a inclusão de um terceiro sujeito num encontro entre outros dois (díade), por um lado, transforma a relação substantiva entre os dois primeiros como, por outro, produz uma nova configuração – a tríade [que pode ser de vários tipos: fechada ou hierárquica, etc. – para maior aprofundamento vd. isomorfismo das tríades, Holland e Leihardt (1981:43)]. 37 A aplicação do teste ao padrão relacional que apresentamos confirmou a fraca homogeneidade (e densidade) dos subgrupos, havendo apenas três formações ou subconjuntos de relações recíprocas (triádicas), das quais duas são "hierárquicas" e uma é "coesa". Por outras palavras, em dois subconjuntos (ou componentes do grafo) um dos atores estabelece relações recíprocas com outros dois, mas estes não se relacionam entre si. No subgrupo coeso existem relações recíprocas entre todos os (três) atores. A emergência destes dois padrões revela-se relevante em vários aspetos. Os dois subconjuntos de tipo "hierárquico" dispõem-se por território (um no território 3 e um no 2) e têm como ator intermediário – nesta distribuição específica – a escola em relação com a polícia e com uma associação (no primeiro caso) ou com a junta de freguesia (no segundo caso). Esta quase "equivalência estrutural" em dois dos contextos de análise aponta algumas pistas para a compreensão das dinâmicas de colaboração entre as escolas e outras entidades no que respeita à regulação das situações de violência. Concomitantemente, verifica-se que o território 2 apresenta maior estruturação das relações entre os seus membros, uma vez que – além de uma tríade hierárquica – dois dos atores do subconjunto "coeso" pertencem a este contexto. Tendo em conta a problemática que estamos a analisar, a reciprocidade das relações é particularmente importante porque permite a troca ou transferência de informação e recursos (materiais, humanos, cognitivos) e a distribuição das "responsabilidades e funções" institucionais associadas ao acompanhamento e resolução dos diferentes casos (na medida do que lhes é possível capitalizar). 1.3. FORÇAS E FRAQUEZAS: COLABORAÇÃO, TROCAS E AFINIDADES A intensidade das trocas, da colaboração e a avaliação das relações foram os restantes indicadores relacionais recolhidos pelo inquérito por questionário aos agentes locais. O aprofundamento da intensidade das interações estabelecidas para a regulação da violência infanto-juvenil que se segue toma por referência as oposições no interior de cada um dos indicadores, bem como a análise comparativa das nomeações entre parceiros (relações de adjacência). 38 Figura 5 - Qualidade das relações Legenda: linhas escuras = positiva; linhas claras = negativa Em termos globais a apreciação das relações estabelecidas é "positiva", com a escola EF2 e a polícia PJ2 a acumularem o maior número de escolhas positivas (ocupando uma posição de liderança/ prestígio, sobretudo dentro do seu cluster territorial) e a unidade de saúde S4 juntamente com a associação APP3 a emitirem o maior número de ligações positivas. Apesar das apreciações negativas não serem em grande quantidade (n = 5), as instituições consideradas são todas de tipo Autárquico/ Oficial (AO) ou de tipo Policial/Judicial (PJ). Uma das razões para avaliar as relações negativamente com este tipo de entidades poderá estar associada ao próprio funcionamento organizacional. Mas a procura dos fatores explicativos desta tendência não foram considerados nesta análise, constituindo os resultados aqui encontrados pistas para aprofundamento posterior. Relativamente à colaboração e às trocas de informação e/ou recursos podemos distinguir intensidades distintas de frequência destas relações: a) rara ou ocasional (fraca) e b) diária ou constante (forte). Em ambas as relações verificaram-se duas apreciações de sentido contrário entre os atores: - para o observatório social de freguesia AO2.2 a colaboração com a unidade de saúde S4 é forte, que contrapõe com o inverso (colaboração com AO2.2 é fraca); - para a junta de freguesia AO2.1 tanto a frequência da colaboração como das trocas com a escola EF2 é forte, enquanto que para o estabelecimento de ensino a intensidade destas relações com a autarquia é considerada fraca; Estas dissonâncias revelam que apesar das relações no território 2 apresentarem um forte dinamismo, os sentidos em que elas se fazem não são percecionados de igual 39 modo, sobretudo se se considerarem indicadores mais específicos das relações (frequência da colaboração e trocas). Este padrão também evidencia que as interações mantidas são de carácter maioritariamente unilateral, cuja reciprocidade é pouco significativa, como já tínhamos apresentado anteriormente. Figura 6 - Frequência da colaboração Legenda: linhas escuras = diária; linhas claras = ocasional Ao nível da colaboração as apreciações são mais dispersas, havendo inclusivamente atores que são simultaneamente centrais em frequências raras/ ocasionais e constantes/ diárias. A escola EF2 e a polícia PJ2 ocupam esta dupla posição, com um grau de centralidade elevado, sobretudo pelo número de nomeações recebidas. Esta distribuição complementa a análise da matriz de relações positivas e negativas, uma vez que as duas instituições ocupam um lugar de destaque, beneficiando de um estatuto prestigiante relativamente aos restantes parceiros da rede. Depois da escola EF2, a unidade saúde S4 é a que recebe maior número de avaliações de colaboração frequente, enquanto o Programa Comunitário APP1.2 ocupa uma posição central na designação de parceiros com quem colabora frequentemente. Estes dados seguem as tendências observadas nas relações anteriores, revelando um conjunto de atores dinâmicos que interagem fortemente com os restantes em ambos os sentidos, sendo particularmente valorizados por isso. Por sua vez, a junta de freguesia AO1, a comissão de proteção AO3.2 e as associações APP3 e APP2 são as entidades que apresentam maior número de colaborações fracas. Contudo, excetuando a AO3.2, o grau de centralidade destes parceiros deve-se mais ao número de apreciações feitas do que recebidas. Neste sentido, poderíamos admitir que se tratam de instituições cuja avaliação é mais exigente ou que são vulneráveis à menor colaboração dos outros parceiros. Esta hipótese é parcialmente confirmada quando observamos as relações de troca de informação e/ ou recursos. 40 Figura 7 - Frequência das trocas de informação e/ou recursos Legenda: linhas escuras = constantes; linhas claras = raras Com efeito, a APP3 e a AO1 ocupam uma posição igualmente central no indicador de trocas raras/ ocasionais. Disposição que é explicada exatamente pelo número de apreciações feitas e não pelas recebidas. Também a AO2.1 e a PJ2 integram este grupo, com a primeira a destacar-se pelo número avaliações emitidas e a segunda pelas recebidas, sendo a instituição por excelência que a rede de parceiros avalia como fraca em trocas de informação e/ou recursos. Consistindo num indicador mais objetivo e concreto, a distribuição das relações de troca mostram um padrão de maior consistência, com um número mais reduzido de atores a ocupar uma posição de centralidade. A S4 e a escola EF2 são os atores com maior relevo nas trocas de informação e/ou recursos frequentes, situação que não se distancia muito da análise aos outros indicadores. Contudo, enquanto a escola se mantém mais uma vez central pelo número de avaliações recebidas, a unidade de saúde passa de "avaliada" (como colaboradora constante) a "avaliadora", designando um grau elevado de parceiros cujas trocas são frequentes. Os padrões encontrados – seja pela simples interação entre os atores, seja pela avaliação mais concreta de alguns aspetos relacionais – apontam para algumas pistas relevantes no aprofundamento e compreensão da rede de instituições que intervêm (conjunta ou isoladamente) na regulação das situações de violência com crianças e jovens. Neste âmbito, o cruzamento com os dados qualitativos sobre as necessidades e propostas de atuação constitui informação particularmente útil, no sentido de complementar e enriquecer a análise. 41 1.4. PREVENIR E INTERVIR: NECESSIDADES E PROPOSTAS DE ATUAÇÃO Com o intuito de diagnosticar obstáculos e potencialidades de intervenção e articulação, foi solicitado às instituições que respondessem acerca das necessidades sentidas (interna e externamente) e que elencassem um conjunto de propostas para regular a violência no respetivo território. Houve um conjunto significativo de contribuições neste módulo do inquérito, cuja análise de conteúdo permitiu agregar em cinco temas chave: 1) Articulação ou colaboração entre parceiros; 2) Gestão e planeamento interno; 3) Comunicação; 4) Medidas de controlo e mediação (ações interventivas); 5) Envolvimento e sensibilização. Cumulativamente, verificaram-se também algumas respostas referentes à manutenção das relações estabelecidas ou com apreciações positivas (por ex.: não são verificadas dificuldades). Para os três critérios avaliados houve a indicação de respostas relacionadas com as cinco temáticas. Nas necessidades internas às instituições, as sugestões de intervenção (Medidas de controlo e mediação) são as mais frequentes, nomeadamente na concretização de projetos mais específicos e no que se prende com um melhor acompanhamento dos casos emergentes. As ações relativas a um maior Envolvimento e sensibilização dos agentes educativos e as que concernem à Gestão e planeamento interno de cada instituição também foram propostas significativas. Ao nível externo, os representantes institucionais reportam maior número de necessidades de Articulação ou colaboração entre parceiros (o que resulta particularmente da questão colocada: E relativamente à articulação e colaboração com os outros parceiros, quais as necessidades sentidas?). Entre as respostas enquadradas nesta temática há uma tendência para referir a necessidade de uma abordagem integrada e coordenada dos atores com maior estruturação e frequência de trabalho conjunto (compromissos a médio e a longo prazo). É também nesta questão que se verifica o maior número de respostas positivas ou de manutenção das relações de colaboração existentes. Outro aspeto salientado com frequência é a necessidade de maior Comunicação ou partilha de informação entre as instituições. Quando questionadas acerca de propostas de intervenção, as instituições referem significativamente ações de Envolvimento e sensibilização, enfatizando a necessidade de mais formação, maior entendimento e participação dos vários atores (crianças e jovens, agentes educativos, instituições e comunidade em geral). As ações de carácter regulador, Medidas de Controlo e Mediação, são igualmente salientadas, com a proximidade do acompanhamento, a resolução intercedida dos conflitos e a aplicação de trabalho comunitário (em detrimento das suspensões escolares) a ganharem maior destaque. O tema da Articulação ou colaboração entre parceiros é relativamente distinguido nas propostas, apresentando linhas de ação semelhantes às referidas nas necessidades externas. Esta análise, embora concisa, permite-nos concluir sobre alguns aspetos salientados no estudo das relações entre os parceiros. Nomeadamente, o facto de grande parte das 42 instituições considerar necessário uma maior articulação e coordenação para intervir ou pela alusão a projetos mais específicos e mais participados e envolventes. As respostas dadas validam o padrão global encontrado de relações dispersas e altamente contextualizadas, cuja reciprocidade e intensidade de colaboração e trocas de informação e/ou recursos é pouco significativa. DOS INSTRUMENTOS POLÍTICOS ÀS INTERAÇÕES – CONSIDERAÇÕES 1.5. FINAIS DO DIAGNÓSTICO EXPLORATÓRIO Tendo como pano de fundo a anterior apresentação relativa às abordagens políticas mais relevantes nesta matéria em Portugal, procurou-se analisar as interações (ou padrões relacionais) entre instituições da rede concelhia, tendo em conta o peso e o jogo institucional das diversas entidades locais na regulação do fenómeno da violência infanto-juvenil. Como salientámos noutro momento (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b) a aplicação das políticas implica a sua apropriação e reorientação no quadro de redes locais de poder, hierarquizando competências e responsabilidades, o que se traduz numa relativa redefinição. A autonomia dos atores para interpretar as políticas e definir localmente as estratégias e as práticas que entendem ser mais adequadas multiplica e reconstrói as respostas esperadas e alcançadas. Os resultados emergem da interseção de particularidades, orientações e interesses estratégicos das instituições (e suas lideranças), características territoriais e exigências das políticas. Não só a nível macro, mas também no interior de cada uma das organizações, o leque de interpretações das políticas e sistemas de regras é diverso. A atenção dada e a responsabilização comum pelos casos de violência apoia-se num entendimento difuso, sobretudo nas situações que requerem maior disponibilidade de recursos técnicos, pondo em causa a eficiência e a eficácia de ações realizadas e o consequente sucesso dos resultados. Os padrões encontrados na rede são reveladores disso mesmo, já que no domínio da interação é possível identificar um conjunto de instituições cujas relações são dispersas e com um grau baixo de reciprocidade e comunicação efetiva. Isto quer dizer que as relações institucionais mantidas em matéria de regulação da violência não traduzem explicitamente as demandas e normativos delineados para este efeito. As fontes e formas de legitimidade política e organizacional resultam dos níveis de autonomia organizacional e capacidade de ação dos diversos atores (Barroso, 2003; Watkins et al, 2007), que participam ou interferem no processo de implementação das políticas e na aplicação das normas que orientam o funcionamento do sistema. O domínio das orientações (políticas) e dos objetivos e metas a atingir pelas instituições afigura-se a priori como um "ideal a cumprir", que se implementa de acordo com diferentes condições de partida, escalas de intensidade, modos de organização, etc. Princípios segundo os quais as instituições são (inclusivamente) avaliadas. 43 As necessidades externas e propostas de ação indicadas pelos representantes institucionais analisados mostram que o caminho para a construção dos objetivos de intervenção conjunta e integrada ainda é longo. Apesar da convergência entre objetivos e tipo institucional, a distribuição das relações ocorre sobretudo pela proximidade geográfica, havendo um número muito reduzido de parceiros interdependentes. Estes padrões apontam para um maior isolamentos dos parceiros no desenvolvimento das suas ações, com estratégias de intervenção pouco articuladas, designadamente por parte das escolas e das polícias. Não obstante, uma das escolas (EF3) e uma das unidades de saúde (S4) da rede (total) preenchem um lugar de prestígio junto dos restantes parceiros em todos os indicadores (nomeações, maior frequência nas colaborações e trocas, relações positivas) e apresentam um dinamismo relevante nas relações estabelecidas. O território 2 e as instituições com funções mais centrais destacam-se igualmente por serem aquelas que apresentam relações mais estruturadas ou colaborantes. No que respeita à intermediação, as escolas e as polícias ocupam uma posição periférica no conjunto global da rede, mas apresentam um padrão de reciprocidade semelhante no interior de dois dos territórios. A maior exigência das avaliações ou vulnerabilidade à colaboração e trocas de informação/recurso foi outra das tendências verificadas nesta análise, com as instituições de tipo Autárquico/Oficial (AO) e Policial/Judicial (PJ) a acumularem o maior número de apreciações negativas ou fracas. Além disso, a polarização de instituições com nomeações emitidas ou recebidas é reveladora da fraca interdependência patente na rede. É relativamente paradoxal constatar que apesar de todos os representantes, sem exceção, indicarem a necessidade (interna ou externa) ou proporem atuações em conjunto, os padrões que emergem das suas relações com os parceiros revelam precisamente o contrário. Os resultados encontrados apontam para a necessidade de uma maior convergência e dinamismo das instituições a nível concelhio, já que se constata que as organizações cujos dirigentes se conhecem face a face têm maior relevância na capacidade de resposta local, ampliando as potencialidades de articulação e colaboração. Neste sentido, a proximidade geográfica constitui um fator decisivo nas ações de prevenção e intervenção da violência na escola, mais do que o âmbito de intervenção institucional. 2. A PERSPETIVA DOS REPRESENTANTES DAS INSTITUIÇÕES DA REDE SOCIOEDUCATIVA LOCAL Tendo por base os resultados encontrados na análise de redes locais, recorreu-se à técnica de grupo focal no sentido de identificar os bloqueios e potencialidades de colaboração entre agentes e instituições responsáveis pela concretização das políticas públicas. Em coerência com o modelo de análise proposto e de forma a garantir a continuidade e complementaridade da pesquisa, interessou-nos focar especificamente os seguintes pontos: as conceções e práticas de intervenção dos agentes sociais e as dinâmicas de articulação da intervenção entre essas instituições. Os resultados da 44 análise prévia orientaram a construção do guião semiestruturado de inquirição e a seleção das instituições sociais e seus representantes. A realização dos grupos focais revestiu-se de particular importância para o desenvolvimento dos objetivos analíticos, uma vez que permitiu aprofundar o conhecimento sobre as perspetivas dos agentes locais mediante uma reflexão e discussão conjuntas em torno da problemática. Desta forma complementou-se a informação recolhida com a proveniente dos outros procedimentos metodológicos, garantindo uma melhor aferição dos resultados. Os grupos focais realizaram-se nos territórios educativos em estudo. Os critérios de seleção dos representantes institucionais basearam-se na referida análise de redes, bem como nos documentos das escolas, considerando tanto as fronteiras territoriais, como as relações institucionais mantidas com as escolas e as entidades presentes nesses espaços. Em conformidade com a literatura de referência para esta técnica de investigação, optámos por ter no máximo 10 elementos em cada território25. Assim, convidámos 9 instituições com intervenção na freguesia T1, 9 na freguesia 2 e 9 na freguesia T3. Na freguesia T1 estivera 7 instituições presentes, na freguesia T2 estiveram 6 e na freguesia T3 estiveram 4. Apesar do número mais reduzido de participações os debates foram muito dinâmicos e participados. Em cada uma das sessões explicámos aos intervenientes que o encontro procurava aprofundar o conhecimento relativo às suas perspetivas sobre o fenómeno da violência, enquanto representantes das suas instituições, compreender os modelos de intervenção desenvolvidos no território, assim como a articulação interinstitucional, e o que consideram ser os obstáculos e soluções relativamente ao problema. Os intervenientes demonstraram interesse em participar nestes momentos de discussão e reflexão conjuntas. Os espaços em que se realizaram as sessões foram gentilmente cedidos pelos representantes das escolas, em dois territórios, e da junta de freguesia noutro, e que tiveram uma colaboração de ativa e interessada na organização das sessões. Coube à coordenação da equipa conduzir o debate, introduzindo os tópicos e direcionando a discussão sobre o tema, de uma maneira não-estruturada e natural (Parasuraman, 1986: 245). Para o registo e recolha da informação utilizámos o suporte áudio e retirámos notas sobre os contributos dos intervenientes, a ordem dos participantes e outras informações relevantes para a análise. A análise dos temas discutidos nas sessões, centra-se tanto no que se aproximam e como no que diferem, relativamente aos seguintes aspetos: 1) Foco de ação dos parceiros; 2) Estratégias de intervenção e colaboração entre parceiros; 3) Relação com a escola e 4) Contrariedades encontradas. 25 A literatura indica que cada grupo focal seja composto entre seis e doze participantes, não excedendo cinco grupos por projeto de investigação (Morgan, 1997; Suter, 2004) supracitado em Galego, C. e Gomes, A. (2005). 45 2.1. INTERVENÇÃO DOS DAS INSTITUIÇÕES DA REDE SOCIOEDUCATIVA LOCAL – RELAÇÕES ENTRE PARCEIROS À semelhança dos objetivos pretendidos com a análise de redes efetuada, procurou-se que as entidades locais e instituições formais, que configuram as redes de intervenção em situações de violência infantil e juvenil em cada um dos territórios socioeducativos em análise, enquadrassem as respetivas dinâmicas nos seus contextos territoriais. Nos territórios escolhidos para a realização dos grupos focais, as entidades que se fizeram representar abrangeram os diversos tipos institucionais considerados na seleção prévia. Quadro 5 - Distribuição das instituições com intervenção nos territórios socioeducativos em estudo (presenças) Tipo/ Freguesia Freguesia T1 Autárquica ou Oficial não Judiciária Associação, Projeto ou Programa Social Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (Zona 1) Junta de Freguesia (T1) Associação de Pais Projeto do Programa Escolhas Educação e Formação - Policial ou Judicial Esquadra da PSP (T1) Saúde Agrupamento de Centros de Saúde (Zona 1) Total 7 Freguesia T2 Freguesia T3 Total Divisão da Educação da Câmara Municipal Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (Freguesia T3) 4 Instituição de apoio à infância e à 3ª idade Projeto do Programa Escolhas 4 Escola E2 Escola E3 2 - 4 Agrupamento de Centros de Saúde (T3) 3 4 17 Esquadra da PSP (T2) Equipa de zona do Instituto de Reinserção Social Agrupamento de Centros de Saúde (Zona 1) 6 No caso da freguesia T2, foi solicitado aos participantes para se apresentarem, definindo a sua posição face à escola e às problemáticas, referindo os domínios de intervenção em que atuava e a importância da atuação e funcionamento em rede. A diversidade de instituições foi frutífera pois garantiu uma pluralidade de perspetivas e maior abrangência da discussão, verificando-se uma distinção clara entre intervenções de primeira e de segunda linha. Esta diferenciação revelou-se importante porque permitiu estabelecer dois níveis de atuação das entidades relativamente à heterogeneidade dos casos em estudo. Neste sentido, para os representantes as atuações de primeira linha enquadram-se num despiste ou diagnóstico de situações anómalas ou irregulares, cujo trabalho se centra sobretudo em mecanismos de prevenção, encaminhamento ou acompanhamento. Já nas ações que designam como de segunda linha, concentram-se especialmente os casos de maior gravidade, quando excedem o campo de intervenção das próprias entidades ou exigem uma integração em mecanismos de regulação formais ou sancionatórios, como por exemplo a aplicação de medidas judiciais. 46 Uma outra distinção relevante, quer nas conceções, quer nas práticas de intervenção destas entidades prende-se com o facto de serem de nível central ou local. O leque de possibilidades de ação de cada instituição é condicionado pela sua abrangência, verificando-se por esse motivo um maior ou menor distanciamento na resolução dos casos de acordo com o seu foco de ação. Neste sentido, houve uma grande convergência dos participantes na defesa de atuações a nível local, caso a caso, articulada com os parceiros relevantes para cada situação, em detrimento de uma intervenção mais alargada e abrangente. Efetivamente, ainda que os representantes tenham sido unânimes relativamente à forma como entendem a atuação das redes de intervenção nos territórios, houve diferenças quanto à qualidade e eficácia do seu funcionamento. Em conformidade com a análise previamente realizada, a escola emergiu nestes contextos como ator intermediário, sendo, contudo, no território T2 que se constataram as relações mais estruturadas ou colaborantes, e onde a instituição escolar assume um papel central e de liderança na rede. Tendo em conta a problemática que estamos a analisar, a reciprocidade das relações é particularmente importante porque permite a troca ou transferência de informação e recursos (materiais, humanos, cognitivos) e a distribuição das responsabilidades e funções institucionais associadas ao acompanhamento e resolução dos diferentes casos (na medida do que lhes é possível capitalizar). Os resultados dos grupos focais permitiram confirmar as tendências anteriormente verificadas, apontando para uma rede articulada e cooperante na freguesia T2, uma rede pouco funcional ou mesmo subdividida na freguesia T3 e uma rede cuja articulação e aproximação entre entidades é ainda incipiente na freguesia T1. 2.2. ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO E COLABORAÇÃO Um dos objetivos desta recolha diz respeito ao aprofundamento do conhecimento sobre o trabalho em parceria desenvolvido pelas instituições e entidades da rede socioeducativa local, as suas modalidades, a sua definição da enquanto rede local e o alcance da intervenção da mesma. No território T2, os diversos intervenientes consideram o trabalho em parceria como mais valia para o grupo, sendo a ação coletiva orientada por um Plano de Ação comum, localmente definido e enquadrado pela Rede Social de Freguesia através da Comissão Social de Freguesia. A intervenção nesta rede organiza-se sobretudo para a resolução por casos, chamando os intervenientes relevantes para um trabalho contextualizado e informado, de modo a garantir que não há duplicação das intervenções. Já no caso do território T3, os participantes entendem a atuação por casos como estratégia a seguir, mas assumem que a rede de trabalho é pouco articulada, construindo-se ao redor de cada instituição. Um dos motivos para esta fraca colaboração prende-se com a ausência de um apoio efetivo, em particular por parte da autarquia, mas também pela comunidade em geral, que não está organizada para a prevenção e apoio aos jovens. Apesar de não chegarem a consenso relativamente aos responsáveis pela desarticulação na rede de intervenção, os representantes consideram que mesmo existindo propostas, há problemas de fundo, como a necessidade de recursos ou a desresponsabilização face aos problemas, que não permitem o seu desenvolvimento de uma colaboração mais efetiva. Por sua vez, no território 1 os participantes consideram que a colaboração e a proximidade entre instituições ainda está a ser construída. A representante da CPCJ, 47 por exemplo, menciona o excesso de burocracia e a demora nos processos que trava as tentativas de transmissão atempada da informação e o estabelecimento de pontes interinstitucionais. A ausência de recursos humanos para intervir é outro dos obstáculos identificados pelos parceiros. Todos os representantes deste território consideram que a rede é um espaço privilegiado para a troca de influências, mas isso requer alguma arrumação e preparação das instituições que possibilite a abertura e as trocas, uma organização que nem sempre acontece na freguesia T1. Na freguesia T2 foram identificadas algumas dificuldades na aplicação de medidas políticas. Os parceiros assumem que as definições regulamentadas pelas respetivas tutelas colocam por vezes restrições à capacidade de acompanhamento e resolução de determinados casos, provocando designadamente um choque entre competências de algumas entidades ou mesmo uma sobreposição ou omissão. Para os parceiros há uma exagerada repartição do poder e simultaneamente um excesso na regulamentação, que se traduz no terreno em formas de bloqueio ou omissões quanto a responsabilidades sobre determinadas matérias. Contudo, entendem o funcionamento em rede como uma forma de aumentar os recursos necessários à atuação, sendo as atividades desenvolvidas construídas sempre em equipa. O maior dinamismo desta rede é explicado por um período anterior e relativamente longo (mais de dez anos) em que houve necessidade de criar respostas conjuntas relativamente a problemas vividos no território, sobretudo os problemas criados pela instalação de um bairro de realojamento e acompanhamento do processo de legalização do (extenso) edificado clandestino da localidade. A necessidade de resolução conjunta, implicou uma intervenção porta-a-porta e face-a-face, o que contribuiu para o desenvolvimento de um sentido de ação comum e de pertença. De acordo com o coordenador da divisão de educação da câmara este processo constituiu uma formação que ainda hoje se destaca nas competências e no trabalho que realizam. Os participantes entendem-se como herdeiros de uma rede que tem vindo a desenvolver-se e aperfeiçoar-se, sendo constante nas ilustrações apresentadas pelos parceiros sobre as suas ações, que é demonstrativa disso mesmo. Outro aspeto destacado é a frequência dos encontros do grupo, havendo uma reunião semanal para discussão das situações prioritárias, que além de garantir uma intervenção efetivamente articulada, permite que os parceiros mantenham relações de proximidade fortes. Ainda que esta colaboração esteja formalmente enquadrada, os representantes afirmam que ultrapassam frequentemente a sua esfera de ação, alargando e potenciando deste modo a ação conjunta, onde todos trazem e todos recebem. Nesse sentido, os parceiros procuram identificar estrategicamente os problemas da localidade, contando com a colaboração de todos para a definição de um plano de ação, que lhes permite antecipar situações problemáticas relacionados com a violência. Esta vantagem contribuiu para experimentarem estratégias e modos de ação adequados às especificidades dos problemas com um sentido de territorialidade e proximidade. No caso do território T1, os participantes entendem que a disseminação e moderação de uma atuação conjunta e integrada deve ocorrer a nível local, pois as freguesias têm uma maior perceção dos problemas. Apesar dos obstáculos atrás referidos, os parceiros indicam algumas colaborações e atuações bem sucedidas como a maior proximidade e interação entre a PSP e a as escolas, que possibilitaram o controlo e diminuição do número de casos pela polícia. A representante da Junta de Freguesia do 48 território T1 realça também que tem havido respostas, colaboração e apoios dos vários parceiros à entidade, mas destaca obstáculos na articulação com a escola E1. Relativamente às potencialidades surgiram diversas abordagens de intervenção por parte dos parceiros, nomeadamente a necessidade de medidas estruturais ao nível do território para a habitação, emprego e formação e ainda a necessidade apontada pela PSP de reunir regularmente com as escolas. Além disso, alguns parceiro reforçaram que seria vantajoso ter um plano de ação local para os alunos com medidas disciplinares realizarem trabalho comunitário em detrimento da suspensão. E ainda a aposta na responsabilização das crianças, através da aprendizagem preventiva de gestão de conflitos desde a infância, o coaching ou da participação no desporto escolar. Já no território T3, a comunidade é percecionada como estando pouco interessada ou fracamente orientada para a resolução de problemas. Verificaram-se divergências no posicionamento face às responsabilidades e obrigações da escola, que se traduzem em problemas de relacionamento, designadamente entre a CPCJ e a Escola E3. Entre as diversas críticas apontadas, alguns consideram haver pouco trabalho de primeira linha e uma assunção reduzida das responsabilidades de intervenção. Os atrasos na sinalização e acompanhamento dos casos problemáticos são reveladores dessa desarticulação da rede. Apesar de existir maior facilidade nos contactos, os representantes afirmam que não existe trabalho efetivo em parceria, identificando um problema de linguagem, que acarreta implicações no desempenho profissional dos técnicos e desconhecimento sobre as situações. Referem mesmo que cada um está na sua “quinta”, servindo os encontros da Comissão Social de Freguesia de momentos para se lastimarem. A necessidade de recursos materiais e de disponibilidade de tempo são outra reivindicação patente no discurso dos representantes deste território. Uma das participantes considera que o encerramento do Observatório Social da freguesia T3 veio dificultar ainda mais a colaboração e as trocas de recursos entre parceiros. Esta crítica decorre sobretudo da sua perceção sobre o Observatório Social da Freguesia T2 que entende ser o principal dinamizador daquela rede local, cuja eficácia coletiva é conhecida e afirmada por todos. Questionados sobre o que pode ser feito para ultrapassar essas limitações e melhorar a intervenção, os representantes das entidades locais entendem que o trabalho tem de ser desenvolvido de modo sistémico e com a inclusão de toda a comunidade. Apesar de não haver um trabalho em parceria, a existência de situações de colaboração caso a caso é referida e apoiada por todos. Por sua vez, no território T2 a atuação caso a caso acumula com uma aposta na criação de condições para as crianças e jovens, ou seja, trata-se de uma ação que se pretende que seja mais que paliativa. Os parceiros ilustram esta estratégia com a organização conjunta de colónias de férias e ocupação dos tempos livres das crianças e jovens em período de interrupção letiva, ações que entendem ser chave na prevenção de comportamentos disruptivos, bem como no desenvolvimento de um sentido de pertença e participação na comunidade. Salientam ainda a relevância do trabalho efetuado pelos técnicos junto das suas crianças e jovens, apontando para uma ética profissional comum, na qual prevalece o bom senso na tomada de decisão e na atuação. 49 Em síntese, pode afirmar-se que estes territórios contrastam significativamente em relação ao nível de colaboração e funcionamento da rede, contudo a escola é considerada como parceiro central. Por um lado por ser a instituição onde a maioria das crianças e jovens da localidade se encontram e passam uma parte substancial do seu dia. Por outro, por entenderem que a escola tem, ou deve ter, um papel ativo no diagnóstico e na atuação de primeira linha dos casos problemáticos. Nesse sentido, a postura dos parceiros locais em relação à escola é um indicador pertinente tanto para a compreensão da articulação da rede, como para a identificação dos bloqueios e potencialidades de atuação. Porém, apenas na freguesia T2 se verificou uma disposição efetiva da escola em assumir esse papel preponderante. 2.3. POSIÇÃO FACE À ESCOLA Para os diversos parceiros presentes nos grupos focais, a escola é considerada uma instituição com um papel relevante na atuação em rede. No entanto, a perceção da sua função e da responsabilidade que tem na resolução de casos é frequentemente objeto de discordância e crítica nos debates tidos entre os parceiros no âmbito dos grupos focais. A freguesia T2 constitui uma exceção, para os representantes das entidades locais a escola desempenha uma função central e fortemente aglutinadora, e contribuiu ativamente para a formalização e desenvolvimento da atual rede, usufruindo da sua margem de autonomia, de uma forma global e estratégica. No caso da freguesia T1, os parceiros mencionam a desadequação dos espaços educativos, a frequente precariedade de condições físicas, a ausência de segurança e dificuldades inerentes à vigilância dos espaços livres que favorece as situações com armas e o menor controlo das entradas e saídas escolares. Ao nível do território, os participantes apontam ainda para o problema da sobrelotação escolar e para a dificuldade em mobilizar os pais para participar nas iniciativas escolares. As opiniões dividem-se quanto à recetividade ou fechamento da escola à rede de parceiros. Reconhecendo a diminuição no número de casos reportados pela escola E1 à CPCJ ou à PSP, alguns parceiros referem que este decréscimo se deveu ao maior número de técnicos na escola por ter integrado o Programa TEIP e à melhoria da imagem da escola. Outros parceiros consideram que a escola E1 é um espaço fechado e que não transmite ou que oculta informações ilustrando com casos de resistência ou falta de comunicação por parte da direção escolar. Os representantes da PSP reconhecem inclusivamente a existência de mecanismos de seleção na constituição de turmas da escola E1, referindo a tendência para concentrar alunos mais fracos ou com comportamentos considerados desviantes numa mesma turma. Para este grupo de parceiros a informação que é transmitida depende sobretudo da liderança da escola e do responsável pela segurança escolar (delegado de segurança). Analogamente, na freguesia T3 constataram-se divergências quanto ao papel e às expectativas face à escola. Em primeiro lugar, os representantes dividiram-se quanto à capacidade de resposta da escola relativamente às alternativas formativas oferecidas aos alunos. Para a CPCJ e para a os representantes das instituições da área da Saúde não há ofertas adequadas que vão ao encontro das necessidades dos alunos, considerando o alargamento da escolaridade um problema acrescido. Uma das representantes da área da saúde encara a desadequação da oferta de vias não regulares 50 do Ensino Básico um problema cuja solução tem de passar por uma maior divulgação e possibilidades de encaminhamento, assim como a necessidade de melhorar a imagem negativa que existe na comunidade sobre essas vias. Esta opinião não é partilhada pela escola, por entenderem que existe um grande esforço e trabalho nos cursos alternativos, que frequentemente resulta em casos de sucesso apesar dos problemas iniciais. Esclarecem que a escolha destes cursos formativos exige recursos e negociação, que só é possível depois de se preencherem as vagas do Ensino Regular numa rede educativa que está sobrelotada. A falta de abertura, tempo e colaboração por parte da escola são igualmente apontados pela representante da CPCJ, afirmando que alguma coisa não funciona. Para esta representante, a escola gera por vezes dificuldades no diálogo com as famílias, não se distanciando tecnicamente dos problemas. Nesse sentido, responsabiliza a escola e a área da saúde pelas intervenções que realizam, por serem entidades que pertencem à comunidade e que deveriam funcionar como aglutinadoras da rede, propondo algumas iniciativas como a aposta no associativismo, no sentido de ultrapassar estes bloqueios. A posição desta instituição não é, porém, partilhada pelos restantes parceiros, que consideram haver demasiadas exigências e elevadas expectativas relativamente à instituição escolar. Afirmam inclusivamente que os recursos têm escasseado progressivamente na escola e nos centros de saúde, como afirmaram não fazem milagres. A escola é entendida como tendo uma competência específica, não podendo atuar de modo isolado, e que uma das razões para essa articulação não funcionar é a ausência de uma rede de colaboração. A representante da escola contra argumenta sublinhando que há um grande desconhecimento por parte dos parceiros relativamente às ações da escola. Exemplifica com as iniciativas de disponibilização das instituições a várias instituições, organização de atividades desportivas e de ocupação dos tempos livres. A experiência e o trabalho de equipa dos professores na sinalização e resolução dos problemas é outro aspeto referido. Este tipo de ação foi elogiada por outra representante da área da saúde, designadamente no esforço que realizam para mediar as situações de conflito. Esta técnica afirma ainda ter uma boa relação de trabalho com as escolas, entrando a qualquer hora e sem que seja necessário um aviso prévio. Apesar das divergências encontradas, foi possível constatar que a escola assume uma dupla função na rede, por um lado por ser um espaço onde se realizam parte as intervenções de primeira linha, seja pela sinalização de casos, seja pelo acompanhamento efetuado com os alunos. Por outro, funciona como aglutinadora dos parceiros, na medida em que é promotora de ações conjuntas, orientando muitas vezes as estratégias tomadas, nomeadamente através da cedência de espaços para a concretização de atividades nos tempos não letivos. 2.4. PRINCIPAIS DIFICULDADES E PROBLEMAS IDENTIFICADOS Dada a conjuntura socioeconómica desfavorável que se vive no país, a antecipação de problemas ou obstáculos foi outro dos aspetos largamente apontado pelos parceiros. Relativamente à escola, os representantes do território T2 sublinham dificuldades resultantes da aplicação de novas medidas regulamentadas, como a extinção das áreas curriculares de Formação Cívica e Área de Projeto, momentos que representavam 51 oportunidades para desenvolver trabalho conjunto e junto das crianças e jovens. Apesar disso, procuram manter esse trabalho noutros momentos, mas menos frequentemente. Os problemas de carência alimentar também têm trazido maiores dificuldades na gestão da regulamentação escolar, recorrendo para o efeito sobretudo ao Banco Alimentar Contra a Fome. No território T3, as necessidades alimentares também são uma preocupação substantiva, especialmente porque os Bancos Alimentares existentes na localidade se encontram esgotados. A representante da escola afirma, neste âmbito, que estão empenhados em encontrar respostas, ultrapassando mesmo as suas funções, na medida em que estabelecem contactos com outras entidades através da técnica de serviço social. Refere que o apoio começou por ser dirigido aos alunos com Ação Social Escolar, mas rapidamente se estendeu a outros, cujas famílias têm graves dificuldades. Este problema acumula-se com outros como o distanciamento ou menor supervisão das crianças e jovens, provocado sobretudo pela sobrecarga e extensão dos horários laborais das famílias: eles passam muitas horas sozinhos. Também os parceiros da freguesia T1 alertam para o problema dos horários familiares, referindo que a falta de equipamentos para ocupar o tempo livre das crianças tem impactos na efetivação das respostas. Todos consideram haver uma ausência de recursos e respostas no território passíveis de solucionar os problemas inerentes ao fenómeno da violência. Neste âmbito, os representantes da PSP referem o caso de uma intervenção tardia com um aluno. Situação que todos os parceiros conhecem, explicando que se deveu sobretudo à fraca articulação e erros sucessivos de avaliação e diagnóstico do caso. Esta situação é demonstrativa da reduzida articulação interinstitucional existente no território T1, revelando uma rede em que os parceiros ainda estão a construir relações próximas e colaborativas. Face às contrariedades, os parceiros das redes nos territórios T2 e T3 assumem frequentemente que excedem os seus campos de atuação ou mesmo que desconsideram as regulamentações impostas no sentido de solucionar os problemas. Na freguesia T2, por exemplo, apesar da exigência de encaminhamento das situações de abandono imposta pelo novo Estatuto do Aluno, os participantes afirmam que a gente faz o que sempre fez. Embora reconheçam a importância dos normativos, para estes representes a resolução dos problemas é prioritária: primeiro resolvemos aqui, esgotamos os nossos recursos. Sublinham uma resposta localizada e fortemente enquadrada no plano de ação definido conjuntamente, alicerçada numa rede em que os intervenientes são ativos e colaborantes: agarramos e fazemos nós, fazemos o nosso serviço, que é no fim assumirmos a responsabilidade social. No caso da freguesia T3, tanto a escola como na área da saúde assumem que dão tudo o que devem e o que não devem, canalizando recursos e estratégias de resolução sempre que surge um foco de problemas. Contudo, apontam a necessidade de recursos que tem sido premente e que muitas vezes não conseguem ir além de um determinado patamar de ação, acusando os responsáveis do poder local de estar a par dos problemas e não agirem, pois isso não lhes dá votos. A relação entre a regulamentação de medidas políticas e a sua aplicação encontra outros paradoxos a nível local. Nomeadamente, nas limitações de intervenção sobre os cuidados à primeira infância em particular no território T2. Apesar do maior desenvolvimento de sistemas de creches familiares pelo poder local e segurança 52 social, subsistem muitas amas ilegais no bairro. Esta situação deve-se a um desajustamento do número de creches face às necessidades das famílias, assim como dos horários praticados relativamente aos de trabalho dos pais e do tipo de apoio que precisam em caso de doença das crianças. Ou seja, as amas recebem e cuidam das crianças mesmo que estejam doentes, praticam horários ajustados aos dos pais, aceitando crianças em horários pós-laboral, por exemplo. O que coloca um dilema aos representantes da rede pois: legalmente teríamos que denunciar, mas se o fizermos estas crianças ficarão em muito piores situações. O conjunto de contrariedades identificado nos grupos focais é extenso e relaciona-se sobretudo com impedimentos legais e de recursos necessários para a atuação dos técnicos. Os parceiros demonstraram uma forte preocupação com os problemas que têm emergido na presente conjuntura socioeconómica, apoiando-se em práticas mais flexíveis e dinâmicas para ultrapassar situações frequentemente dilemáticas ou limitadoras. Advogam neste sentido uma exigência moral de responsabilidade social para explicar as suas ações, entendendo a decisão de ir além das suas fronteiras de intervenção é muitas vezes uma necessidade que lhes permite solucionar os problemas. A identificação dos obstáculos e das potencialidades da intervenção, bem como a análise das dinâmicas de articulação local entre os parceiros destes territórios foram as principais focos analíticos na realização dos grupos focais. Confirmando as tendências anteriormente apresentadas resultantes da análise de redes sociais, verificaram-se contrastes significativos no que diz respeito ao dinamismo e funcionamento das redes de intervenção. O território T2 apresenta uma rede de parceiros articulada e cooperante, enquanto nos territórios T1 e T3 o trabalho de parceria é pouco desenvolvido e muitas vezes fragmentado. Apesar destas diferenças, a escola desempenha um papel importante nas redes analisadas, na medida em que reúne grande parte das crianças e jovens das localidades e porque a entendem como instituição de primeira linha no diagnóstico e acompanhamento de casos problemáticos. Neste sentido, por se verificarem fortes divergências quanto ao papel desempenhado pelas escolas das freguesias T1 e T3, é somente na freguesia T2 que esta entidade se assume como elemento aglutinador na rede, com um forte pendor interventivo. Face à atual conjuntura socioeconómica, embora preocupados, os parceiros demonstram-se firmes relativamente às intervenções que realizam, mesmo que para isso tenham ultrapassar os respetivos campos de atuação ou ignorar deliberadamente os impedimentos legais impostos. A modalidade de trabalho em rede constitui uma forma de ultrapassar estas contrariedades, que se associam sobretudo às regulamentações e à aplicação das demandas da tutela a nível local. A rede funciona como uma estrutura de recursos, especialmente no território T2, como uma plataforma de ação a que os parceiros recorrem para superar as suas limitações e suprir as necessidades. Em síntese, podemos afirmar que apesar das vicissitudes apontadas pelos representantes das instituições e entidades locais, as modalidades de trabalho articulado em parceria constituem uma forma de ação coletiva que se revela e é por todos considerada como particularmente útil e produtiva, seja no âmbito dos 53 mecanismos de intervenção e como de prevenção a nível territorial. As redes locais permitem aceder a recursos e estratégias de atuação planeadas conjuntamente, adequadas a problemáticas específicas identificadas pelos parceiros. Verifica-se, porém, que para um funcionamento deste tipo de intervenção bem sucedido é necessário um conjunto de parceiros interessados que dinamizem a rede, superando convicções e práticas institucionais divergentes. 54 IV. ESCOLA 1. OS DOCUMENTOS ESCOLARES Sendo os documentos estruturantes das escolas instrumentos que refletem, formalmente, as linhas orientadoras de atuação a que as organizações escolares se propõem, a presente análise procurou aprofundar e sistematizar de que forma as escolas planeiam a intervenção relativamente ao problema da violência. De acordo com o modelo de análise desenhado, interessou-nos focar por um lado: as dinâmicas organizacionais das escolas e dos territórios respetivos e, por outro, as estratégias definidas e implementadas na resposta e prevenção sobre as situações de violência e agressividade. Os documentos selecionados para a análise foram: o Regulamento Interno, o Projeto Educativo de Agrupamento e o Plano de Intervenção da Diretora, a Avaliação Externa da IGE (Inspeção Geral de Educação), o Projeto TEIP de cada escola, e ainda, os dados internos relativos a situações de violência e indisciplina recolhidos e organizados pelos gabinetes de apoio e mediação de conflitos nas Escolas. 26 1.1 ORIENTAÇÕES DA ESCOLA Da análise conjugada dos Projetos Educativos de Agrupamento, dos Planos de Intervenção da Diretora e das Avaliações Externas da IGE verificamos que as escolas se encontram atentas mas fortemente vulneráveis às transformações e dinâmicas sócio demográficas que têm vindo a ocorrer a nível concelhio, identificando, em diferentes graus, constrangimentos e fraquezas, especialmente de sobrelotação e consequente falta de condições – o que resulta na perceção de um aumento da insegurança e dos riscos (ou perigos) a que estão sujeitos. A diversidade cultural e vulnerabilidade económica das famílias dos alunos parece ser marcante na medida em que são dos aspetos repetidamente apontados, referindo por exemplo os desafios inerentes à abertura da escola a uma população heterogénea e multicultural inserida num meio sócio económico difícil. [Projeto Educativo Agrupamento da Escola E1, pp.7] Segundo os documentos escolares, as características dos alunos e meios de origem criam obstáculos ao nível do funcionamento e papel da escola, uma vez que – quer ao nível das expectativas quer 26 2010/ 2011 e 2011/2012 foram os anos letivos considerados para a análise documental, pela disponibilidade de documentos aprovados e em vigor, uma vez que as alterações normativas da tutela para 2012/2013 não permitiram o acesso atempado aos mesmos. Todas as escolas foram alvo de avaliação externa, tendo sido recolhidos os respetivos Relatórios disponibilizados pelo site da IGE (não houve apresentação de Contraditórios em nenhum dos casos), havendo apenas uma em que a Avaliação foi anterior ao atual mandato (E2) – considerando-se apenas para a análise as continuidades e rupturas de Liderança. Tivemos ainda acesso a outros documentos como o Projeto Curricular ou os Planos Anuais e Plurianuais de Atividades que foram sempre tomados, quando pertinentes, como complemento aos recursos em análise. 55 das práticas – tanto os alunos como os pais/responsáveis apresentam níveis elevados de desinteresse [Projeto de Intervenção da Diretora E3, pp.7]. Ou seja, consideram que a falta de acompanhamento, de participação e as fracas expectativas relativamente à escola e ao percurso escolar dos educandos (especialmente no caso das escolas E2 e E3, numa lógica de reprodução de trajetórias pouco escolarizadas) contribuem frequentemente para o abandono, insucesso e indisciplina [patente por ex. no Projeto Educativo de Agrupamento da E2, pp.8]. Facto que reflete nestes documentos, muitas vezes, a perceção de uma escola com funções acrescidas, como espaço de educação de competências sociais e cívicas, para além do ensino. A presente discussão funda-se, em certa medida, na conceção dos responsáveis escolares relativamente ao que entendem ser as missões da escola, nomeadamente pelo confronto entre as orientações apoiadas num ideal de escola inclusiva, rigorosa e responsável organizada em torno de uma cultura escolar partilhada por todos, tendo como referência principal a Lei de Bases do Sistema Educativo. Nos seus documentos, os responsáveis escolares procuram articular estas orientações e princípios dos normativos da tutela com os valores adotados pelas escolas expressos nesses documentos, como: "equidade", "tolerância", "respeito" e “cidadania” e a promoção de uma convivência pacífica e integradora 27 . Neste sentido, tanto os valores como as missões manifestadas prendem-se não só com a gestão da diversidade sociocultural presente nas escolas, como com as perspetivas pedagógicos e educativas. Em particular, nos documentos orientadores das três escolas e no que diz respeito aos problemas da violência e indisciplina são na definição dos objetivos considerados como prioritários, com referência à definição de planos de melhoria e resposta. A escola E3 encara mesmo este problema como um ponto fraco e/ou negativo: Os pontos fracos foram, então, identificados (…) comportamentos inadequados [dos alunos] em sala de aula e nos espaços exteriores [PID da E3, pp. 9] 1.2 ESTRUTURA E COORDENAÇÃO ORGANIZACIONAL Para compreender como os diferentes intervenientes e responsáveis se articulam na resolução das situações de conflito, nas escolas, considerámos primeiramente as suas estruturas internas. Nas três escolas encontram-se em funcionamento gabinetes de apoio e mediação de conflitos, definidos como espaços intermediários na resolução e controlo dos problemas comportamentais. É pertinente notar que estas estruturas não estão previstas na lei, sendo a sua existência uma iniciativa das escolas, que encontra paralelo noutros estabelecimentos do concelho em estudo (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b:12). Com designações próprias em cada escola28, os seus modelos e finalidades de atuação são semelhantes orientando-se para a elaboração do diagnóstico do problema, da 27 Patentes nos Projetos Educativos de Agrupamento e/ou nos Projetos de Intervenção das Diretoras das escolas, designadamente: PEA/E1, pp.6-7; PEA/E2, pp. 21; PID/C3, pp. 31. 28 Escola E2 – Gabinete Gestão de Conflitos; Escola C3 – Gabinete Acolhimento e Intervenção/Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família; Escola E1 – Gabinete de Intervenção Disciplinar. 56 mediação e intervenção em situações de conflito29. Organizacionalmente e para esse efeito foram constituídas equipas às quais foram atribuídas funções e responsabilidades diversas. Estas equipas são formadas por nomeação das respectivas Diretoras e compostas por docentes no caso de duas das escolas (E1 e E3) ou, como é o caso da E2, com a colaboração/ integração de outros elementos da escola (oriundos das equipas multidisciplinares do Programa TEIP ou integração de Assistentes Operacionais). Quadro 6 - Estruturas de Gestão de Conflitos nas escolas – Gabinetes de Intervenção Designação de Gabinete Freguesia T1 Freguesia T2 Freguesia T3 Gabinete Intervenção Disciplinar E1 Âmbitos de Atuação Diagnóstico, Mediação e Intervenção E2 Gabinete Gestão de Conflitos Diagnóstico, Mediação e Intervenção E3 Gabinete de Acolhimento e Intervenção /Gabinete Apoio ao Aluno e à Família Diagnóstico, Mediação, Intervenção, Melhorar meios de Comunicação e criar clima de respeito e confiança Constituição da equipa Atribuição de Responsabilidades Funções/ Tarefas Formação dos elementos da equipa em gestão de conflitos Constituída por Professores e coordenado por Professores (reuniões quinzenais/mensais); Equipa de Integração/ acompanhamento constituída por diversos recursos humanos do Agrupamento multidisciplinar Diretor pode delegar competências na Equipa do Gabinete de Intervenção Recebe/ encaminha alunos com ordem de saída de sala de aula Sim Não Diretor pode delegar competências no Subdiretor, Adjunto ou Conselho de Turma Recebe/ encaminha alunos com ordem de saída de sala de aula Sim Sim Acompanhamento e encaminhamento dos casos disciplinares Recebe/ encaminha alunos com ordem de saída de sala de aula Não especifica Sim Constituída por Professores Nos Projetos Educativos de Agrupamento e de Intervenção da Diretora as referências às funções e responsabilidades a desempenhar em matéria disciplinar dos alunos é também muito diferenciada, sendo atribuídos pesos diferentes conforme os agentes em cada escola. Podemos, assim, agrupar a partir das funções atribuídas aos diferentes agentes, por escola. Na escola E3 a escola é considerada é como um espaço com imensas potencialidades educativas que devem ser maximizadas, visando a promoção do desenvolvimento integral dos alunos, interlocutor e parceiro de desenvolvimento da comunidade onde 29 A escola C3 prevê ainda objetivos de melhoria dos meios de comunicação e criação de um clima de respeito e confiança. As práticas de monitorização, os procedimentos e os modos de apropriação internos são evidentemente singulares em cada escola. 57 Tutorias está inserida, ou seja, a escola tem a responsabilidade de melhorar e aperfeiçoar o meio social em que está inserida. Na escola E2 uma das principais linhas orientadoras de atuação é o aumento das responsabilidades na manutenção dos espaços mediante o incremento da participação e desenvolvimento cívico das crianças e jovens (os alunos). A escola E1 aposta prioritariamente na informação e sensibilização dos Pais/ Encarregados de Educação sobre as normas de conduta, estando prevista formação específica sobre estes assuntos exclusivamente para estes agentes. Além disso, esta escola perspetiva as responsabilidades de prevenção e intervenção, relativamente à segurança, disciplina e criação de um clima pacífico, a todos os elementos da comunidade educativa (escola, corpo docente e não docente, alunos e demais membros pertencentes ao estabelecimento escolar). No plano das linhas orientadoras de atuação, a escola E1 considera a promoção de hábitos de segurança, estabelecendo para esse efeito metas e objetivos gerais, designadamente ao nível da reflexão, interiorização e cumprimento das normas de conduta, ensino do "respeito" e a criação de condições para garantir a segurança, prevenção do conflito nas escolas e imediações. Das três escolas, apenas esta tem em conta dois interlocutores ou responsável em matéria de segurança e disciplina, orientando a sua atuação tanto para os Pais/E.E. como para a Comunidade Educativa através da sensibilização e a promoção de práticas conducentes à criação de condições que garantam a segurança e previnam os conflitos. É na delegação e atribuição de tarefas e responsabilidades que as diferenças entre escolas são mais visíveis, ilustrando o usufruto da autonomia relativa à decisão sobre regras e procedimentos a observar em matéria de delegação das competências do diretor.30 Em consonância com o previsto na lei, as deliberações de resolução em caso de infração cometida estão organizadas por tipos de medida a aplicar em todos os Regulamentos Internos. É nas medidas corretivas que se verificam as principais alterações face ao definido pela tutela. 30 Estatuto do Aluno, alínea n.º 1 do Artigo 52º, lei nº 39/2010 de 2 de Setembro. Normativo em vigor à data do estudo 58 Quadro 7 - Medidas disciplinares corretivas - Regulamentação da tutela e das direções das escolas Advertência Estatuto do Aluno (39/2010, artigo 26º) Qualquer professor ou membro do pessoal não docente Ordem de Saída de sala de aula Professor (determina período, atividade e decide marcação de falta) Tarefas de Integração Diretor Agrupamento de Escolas (pode consultar Diretor de Turma) Diretor de Turma e Equipa Gabinete de Intervenção ou Diretor Agrupamento de Escolas Condicionamento Mudança de Turma Diretor Agrupamento de Escolas (pode consultar Diretor de Turma) Diretor Agrupamento de Escolas (pode consultar Diretor de Turma) Diretor de Turma e Equipa Gabinete de Intervenção ou Diretor Agrupamento de Escolas Diretor Agrupamento de Escolas (comunicado ao Diretor de Turma) E1 Igual Igual E2 Assistente Operacional, Professor, Diretor de Turma/Professor Titular, Diretor Agrupamento de Escolas Professor, Diretor Agrupamento de Escolas Diretor Agrupamento Diretor de Turma, Diretor Agrupamento de Escolas Igual E3 Igual Igual Conselho de Turma Disciplinar propõe Não referido Não referido Nas escolas considera-se um número de responsáveis pela aplicação de medidas corretivas mais alargado do que o previsto pelo normativo, particularmente no que diz respeito à ordem de saída da sala de aula, às tarefas de integração e ao condicionamento no acesso a espaços escolares ou na utilização de certos materiais e equipamentos. Além do Diretor de Agrupamento, a na escola E1 delega-se na Direção de Turma e na Equipa do Gabinete de Intervenção Disciplinar a aplicação das medidas corretivas de realização de tarefas de integração e de condicionamento a espaços e recursos escolares. Já na escola E2 diferenciam os responsáveis por medida especificando quem são no caso da advertência. A ordem de saída de aula é também considerada da responsabilidade do Diretor de Agrupamento e o condicionamento da Direção de Turma. A escola E3, por sua vez, diferencia-se das restantes na medida em que no que diz respeito à realização de tarefas de integração, deixam a sua aplicação ao critério do Conselho de Turma Disciplinar. Estas especificidades evidenciam o modo como em cada uma destas escolas os normativos gerais são adaptados às características particulares dos seus corpos docentes e discentes. Quadro 8 - Medidas disciplinares sancionatórias - Regulamentação da tutela e das direções das escolas Repreensão Registada Suspensão E1 Professor quando se encontra em sala de aula e Diretor Agrupamento de Escolas restantes situações Igual Diretor Agrupamento de Escolas (pode consultar Conselho de Turma) Igual E2 Igual Diretor Agrupamento de Escolas Igual E3 Igual Igual Igual Estatuto do Aluno (39/2010, artigo 26º) Transferência de escola Diretor Regional (após conclusão do procedimento disciplinar) Igual 59 No caso das medidas disciplinares sancionatórias não se verificam tantas variações. Com efeito, a suspensão é a única medida que surge relativamente diferenciada do que está estabelecido no Estatuto do Aluno e apenas no caso da escola E2. Nesta escola a responsabilidade de aplicar a medida de suspensão é exclusiva do Diretor de Agrupamento, sem a possibilidade de consulta ao Conselho de Turma. O Estatuto do aluno regulamenta que nos casos de aplicação da medida disciplinar sancionatória de suspensão compete ao diretor decidir se deverão, ou não, ser estabelecidas parcerias para o acompanhamento/integração do aluno durante o período de cumprimento da pena, isto é: Compete ao director da escola, ouvidos os pais ou o encarregado de educação do aluno, quando menor de idade, fixar os termos e condições em que a aplicação da medida disciplinar sancionatória referida no número anterior é executada, garantindo ao aluno um plano de actividades pedagógicas a realizar, coresponsabilizando-os pela sua execução e acompanhamento, podendo igualmente, se assim o entender, estabelecer eventuais parcerias ou celebrar protocolos ou acordos com entidades públicas ou privadas. [Estatuto do Aluno, alínea 6, artigo 27º] Para além das medidas disciplinares encontram-se diversas estratégias nestas escolas definidas para prevenir e intervir sobre os comportamentos desviantes dos alunos. O encaminhamento e os apoios individualizados ou dirigidos a grupos específicos são comuns às três escolas. A supervisão de alunos sinalizados, a procura de integração na abertura do ano letivo e a preocupação com a transição de ciclo são outras das medidas preventivas. Quadro 9 - Medidas preventivas – Regulamentação das direções das escolas E1 E2 E3 Encaminhamento para outras vias de ensino (interno ou externo); Intervenção direta da Psicóloga: acompanhamento semanal das turmas PCA, apoio individualizado a alunos identificados. Sensibilização e tarefas na Formação Cívica no 5º ano; Acolhimento no início do ano letivo (a Assistentes Operacionais e a alunos novos – alunos do 9º ano apadrinham alunos de 5º ano). Tutorias; Encaminhamento de alunos para CEF, PIEF e PCA (interno); Reconhecimento de maior articulação entre 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico Alunos reincidentes são sinalizados, vigiados e acompanhados por técnicos que os encaminham/ orientam para vias alternativas (interno ou externo); Tutorias. Organizacionalmente revelaram-se também pertinentes para a análise outros elementos como a articulação entre ciclos, a constituição de turmas e a implementação/ coordenação de outras estruturas internas orientadas para a prevenção e intervenção da violência e segurança em meio escolar. Estes indicadores permitemnos olhar para outros mecanismos de coordenação e mobilização que são acionados pelas escolas, em resposta ao problema, por um lado, e como estratégia de adaptação ao que consideram ser os desafios colocados pela diversidade sociocultural e vulnerabilidade socioeconómica de parte dos seus alunos, por outro. Por exemplo, o processo de transição entre ciclos de ensino ganha particular pertinência na medida em que pode comportar uma mudança de escola e/ou de turma (mesmo que os alunos se mantenham no mesmo agrupamento de escolas) com a 60 necessidade de integração dos alunos num novo quadro de relações e sistema de regras, constituindo-se assim como um momento particularmente sensível no campo da regulação de atitudes e comportamentos. De acordo com as Avaliações Externas da IGE, em matéria de transição e sequencialidade entre ciclos de ensino, verificámos que em todas as escolas é assinalada a procura de articulação e preparação destes processos, nomeadamente pela existência de mecanismos e/ou práticas de orientação vocacional. Em complemento, nos Projetos Educativos de Agrupamento e de Intervenção da Diretora das escolas E3 e E2, há também um especial enfoque no trabalho cooperativo e colaborativo entre os docentes que potencie a articulação disciplinar e interdisciplinar. Numa perspetiva de coesão e fortalecimento do agrupamento, na escola E3 encara-se a integração e articulação entre os diferentes níveis de ensino como veículo para o estabelecimento de um clima escolar bem sucedido, na promoção de uma atmosfera de cooperação e convívio. Enquanto na escola E2 um dos principais objetivos prende-se com o incentivo à articulação entre ciclos, em que o princípio da continuidade pedagógica na constituição de turmas se afigura como uma solução para uma resposta concertada e adequada. Efetivamente, de acordo com o estipulado pelo Despacho n.º 5328 de 28 de Março de 2011: (…) devem ser constituídas equipas pedagógicas que integrem os docentes das diferentes disciplinas do ano de escolaridade e assegurem o acompanhamento das turmas ao longo do ciclo de ensino. [alínea 1 do Artigo 3º, Despacho n.º 5328 de 28 de Março de 2011]. 1) — As equipas pedagógicas referidas no artigo 3.º (…) desenvolvendo o trabalho de constituição das turmas, bem como a análise do percurso escolar dos alunos. 2) — Cabe ao conselho de turma (…) efectuar o diagnóstico, identificar as características e dificuldades de aprendizagem dos alunos da turma, assim como a elaboração do plano curricular da turma, concretizando planos e estratégias para colmatar as dificuldades e necessidades diagnosticadas. [alíneas 1 e 2 do Artigo 14º, Despacho n.º 5328 de 28 de Março de 2011] A escola tem, assim, autonomia para adotar orientações próprias sobre a constituição de turmas que se pretendem criteriosas e ponderadas, devendo para isso ser acompanhadas por um processo de diagnóstico e análise das características e percurso escolar dos alunos. A constituição de turmas representa, portanto, um indicador relevante na análise das dinâmicas organizacionais dos estabelecimentos escolares para a regulação da violência e a construção de um clima de convivência escolar. O estabelecimento de turmas equilibradas (tendo em conta a continuidade dos alunos, dos professores e a dos diretores de turma em cada ciclo) é apontada nos Relatórios de Avaliação Externa da IGE como um dos fatores potenciadores da resolução dos problemas. Segundo esta fonte, todas as escolas em estudo “seguem o critério de continuidade pedagógica”. Está também regulamentado que compete ao Diretor superintender na constituição de turmas (alínea 4 do Artigo 20º, Decreto de Lei n.º 137 de 2 de Julho 2012). E, para além disso, é igualmente da competência do Conselho de Turma, entre outras responsabilidades, definir critérios a adotar perante situações idênticas de indisciplina e tratar de assuntos de ordem disciplinar, podendo o Diretor convocar reuniões 61 extraordinárias do Conselho de Turma (por iniciativa ou proposta), sempre que quaisquer assuntos de natureza pedagógica ou disciplinar o justifiquem. Finalmente, as escolas podem ainda designar professores tutores para acompanhamento em particular do processo educativo de um grupo de alunos. As escolas E2 e a E3 promovem e implementam Sistemas de Tutorias, com o intuito de orientar e acompanhar alunos sinalizados com problemas de aprendizagem e/ou integração na escola e na turma. 1.3 ESTRATÉGIAS E MECANISMOS DE PREVENÇÃO As diferentes circunstâncias em que se encontram as escolas têm um peso considerável na definição e desenvolvimento de estratégias e mecanismos de prevenção e intervenção face ao problema da violência e segurança escolar. A falta de recursos, como a inexistência de vigilantes do Ministério da Educação associada à sobrelotação das escolas são exemplos ilustrativos das dificuldades de gestão da prevenção de situações de conflito. Estes exemplos são apontados em alguns dos documentos de orientação das escolas, como os Projetos Educativos e estão presentes também nos discursos dos responsáveis escolares. É marcante a reflexão em torno do que consideram ser a inadequação e dissociação entre as exigências da tutela e a capacidade de resposta das escolas às metas e objetivos definidos. Os responsáveis escolares alegam que a pressão da rede escolar coloca dificuldades significativas à gestão e organização da escola. Por um lado, o problema do excesso de procura e da sobrelotação das escolas. O número de alunos por turma nestas escolas ultrapassa frequentemente os limites estabelecidos e o rácio de funcionários por aluno encontrase abaixo do estipulado, o que, associado às taxas de absentismo dos Assistentes Operacionais geralmente elevadas, agrava fortemente a construção e manutenção de um ambiente escolar seguro e estável. Por outro lado, a capacidade de adequação e acolhimento da população escolar que atendem por via da promoção da diversificação e enriquecimento da oferta educativa encontra-se, igualmente condicionada, na medida em que carecem de disponibilidade de recursos humanos para afetar à supervisão e acompanhamento dos alunos, assim como de espaços e horários para a realização de atividades transversais e/ou complementares de sensibilização, prevenção e mobilização dos alunos e outros elementos da comunidade escolar no âmbito da problemática da violência e segurança na escola. Apesar das dificuldades identificadas, a análise destas escolas revela que estas se encontram munidas de competências que lhes permitem desenvolver estratégias alternativas, facilitadoras e potenciadoras de um ambiente escolar pacífico e seguro. Na análise identificaram-se diferentes estratégias previstas pelos responsáveis escolares das escolas em estudo, e que se podem agrupar nos seguintes domínios de ações: - Sensibilização e debate sobre as normas e segurança: as três escolas prevêem a reflexão em torno das normas com a comunidade educativa. Nos seus diagnósticos identificam a necessidade de formação orientada especificamente para a gestão de conflitos, planeando para esse efeito um conjunto de ações formativas para os professores e funcionários. 62 - Articulação e coordenação da escola no âmbito da segurança e da regulação da violência: nas escolas E1 e E3 os responsáveis escolares planificam diversas ações a este nível. Na Escola E3 a direção escolar prioriza a uniformização e coerência de regras e procedimentos com vista à promoção da articulação entre as diferentes instâncias e órgãos da escola; nas escolas E1 e E3 há por parte dos responsáveis a previsão da implementação de sistemas de vigilância (como o cartão magnético) e a manutenção dos espaços escolares. - Acompanhamento e supervisão de espaços e atividades educativas: em todas as escolas são identificados pelos seus responsáveis um conjunto de ações dirigidas à prevenção e intervenção sobre os comportamentos violentos e atitudes inadequadas, que são diversas: a aposta na supervisão e controlo dos espaços, sobretudo nas escolas E2 e E3, no sentido de reforçar a vigilância e controlar determinadas áreas consideradas propensas à conflitualidade (como por exemplo a portaria); a animação e/ou supervisão de atividades como é o caso das escolas E1 e E2, que em certos espaços ou momentos, nomeadamente nos pátios/recreios, salas de convívio, intervalos, etc, promove a convivência e o trabalho cooperativo/colectivo com vista à melhoria dos ambientes escolares; a promoção de sistemas de tutorias, na escolas E2 e E3, enquanto estratégia efetiva de acompanhamento de alunos com maiores dificuldades de integração e com condutas desviantes. - Mobilização e Envolvimento da Comunidade: na escola E2 está previsto o envolvimento e apoio de pais/EE, orientando-se para uma atuação mais interventiva/ formativa, que permita direcionar estes elementos para práticas tendentes a uma participação ativa e colaborativa. Já a escola E3 aponta-se para a cooperação com os agentes locais e o reforço/ estabelecimento de parcerias e protocolos com instituições orientadas para a resolução dos problemas de violência e insegurança. Na escola E1 não se encontram referências discursivas a esta dimensão. - Criação e Dinamização de Projetos e/ou Iniciativas: os responsáveis das escolas entrevistados referiram a necessidade de desenvolvimento de um conjunto de mecanismos para controlar a conflitualidade. Afirmaram ainda que se podem considerar tanto as iniciativas que se focam especificamente na problemática, como outras que contribuem indiretamente para a atenuação dos problemas de violência e indisciplina, como a promoção da saúde, o desporto, a cidadania, entre outros exemplos. Parte destas iniciativas são organizadas quer ao nível das estruturas e dos projetos escolares, como os gabinetes de mediação, clubes, núcleos, assim como no âmbito de eventos como workshops, comemorações, exposições, entre outros. Em síntese, as escolas acionam um leque muito diferenciado de estratégias e mecanismos de prevenção, o que mostra que são capazes de agir face à violência de modo diversificado, mesmo em contextos desafiantes. Os modos de definição e apropriação interna da regulação dos comportamentos é outro domínio relevante para a compreensão dessa capacidade. 1.4 REGULAÇÃO DOS COMPORTAMENTOS E ATITUDES A diversidade de estratégias de intervenção sobre o problema da violência na escola resulta em grande parte, como temos vindo a demonstrar, das orientações das 63 lideranças, do envolvimento dos atores nos processos de tomada de decisão, dos fatores organizacionais e das condições para a sua implementação. Tendo gabinetes de apoio para a mediação e intervenção em situações de conflito, as escolas do estudo dispõem igualmente de informação sistematizada sobre as ocorrências participadas e que medidas foram atribuídas em cada ocorrência. A monitorização do fenómeno parece representar para os responsáveis escolares destas escolas uma primeira etapa de regulação do problema na medida em que no âmbito do trabalho desenvolvido por esses gabinetes usam instrumentos de diagnóstico e de avaliação sobre a intervenção no combate à violência na escola. Os processos de monitorização e organização da informação distinguem-se por escola, particularmente em termos de registo e apresentação. Na escola E2 a equipa do gabinete tem como função a recolha de informação sobre o número de ocorrências e respetivas consequências disciplinares. A análise da evolução do registo de ocorrências traduz uma evolução positiva, particularmente no que às nas sanções aplicadas diz respeito. Quadro 10 - Ocorrências, procedimentos e medidas disciplinares registadas no Gabinete Gestão de Conflitos da Escola E2 2010/2011 2011/2012 Ocorrências 433 354 Procedimentos disciplinares 89 23 Medidas Disciplinares Sancionatórias 65 9 Fonte: Direção da Escola E2 De modo mais detalhado, a distribuição das ocorrências por ano de escolaridade e por ciclo de ensino apresenta oscilações significativas ao longo do ano letivo 2011/2012. No 2º ciclo EB há maior número de ocorrências, sobretudo no 5º ano de escolaridade, com um aumento progressivo de situações entre o primeiro e o segundo período escolar. No 3º ciclo EB o número de ocorrências registadas é substantivamente menor, havendo um ligeiro acréscimo no segundo período escolar, especialmente no 8º ano, com 36 ocorrências registadas pela equipa do gabinete. Destas, 22 são apenas numa turma de ensino regular, na qual apenas 2 alunos em 7 identificados, não reincidiram no seu comportamento ao longo do segundo período. A reincidência reforça o a posição do 2º ciclo EB como ciclo que reúne o maior número de ocorrências na escola. Do total de alunos a frequentar a escola neste ano letivo verificaram-se 12 situações com mais de 6 reincidências, distribuindo-se do seguinte modo por anos de escolaridade: 6 no 5º ano; 4 no 6º ano; 1 no 8º ano e 1 no 9º ano. 64 Quadro 11 - Ocorrências por período e ano escolar no ano letivo de 2011/2012 registadas no Gabinete de Gestão de Conflitos da Escola E2 5º ano 6º ano 1º 36 18 Período 2º 72 41 Período 3º 48 39 Período 156 98 Total Fonte: Direção da Escola E2 2º Ciclo 7º ano 8º ano 9º ano 3º Ciclo Total 54 4 13 7 24 78 113 13 36 5 54 167 87 3 19 0 22 109 254 20 68 12 100 354 A escola E1 apresenta apenas dados para o 3º Período de 2011/2012. Do total de situações ocorridas cerca de 40% (22) são com alunos que reincidem no seu comportamento. Outro aspeto a salientar é a existência de maior número de medidas corretivas do que sancionatórias, situação que não se verificava nesta escola em anos anteriores.31 Quadro 12 - Ocorrências e medidas no 3º Período do ano letivo de 2011/2012 registadas pelo Gabinete de Intervenção Disciplinar da Escola E1 Total de Ocorrências 96 3º Período Fonte: Direção da Escola E1 Total de Alunos Total de Alunos reincidentes 58 22 Total de medidas MC MDS 6 5 Também no caso da escola E1 foi possível organizar a informação sobre a frequência no gabinete ao detalhe da turma e ano de escolaridade para o período considerado. À semelhança do que sucede na escola E2 há um maior número de alunos no 2º ciclo EB; os 8 alunos com maior número de reincidências encontram-se todos a frequentar esse nível de ensino. Constata-se ainda que a frequência de incidentes tende a diminuir à medida que o ano de escolaridade aumenta32. 31 Por exemplo, em 2008/2009 foram aplicadas 119 medidas disciplinares sancionatórias, que incluíam o condicionamento no acesso aos espaços escolares e suspensões, estas últimas eram particularmente usadas com alunos reincidentes e com frequência aplicadas de forma sucessiva. 32 Ainda que estas variações necessitem de um maior aprofundamento quanto à gravidade e tipo de ocorrências registadas, destaca-se que há um número de turmas significativamente menor no terceiro ciclo nesta escola. 65 Quadro 13 - Ocorrências por turma e ano escolar no 3º período do ano letivo de 2011/2012registadas pelo Gabinete Intervenção Disciplinar da Escola E1 5º ano 6º ano 7º ano 8º ano A 5 0 4 2 9º ano 1 B 0 2 12 0 0 C 4 1 9 0 1 D 3 0 0 0 0 E 3 0 0 2 3 F 2 1 0 1 - G 7 7 - - - H 1 7 - - - I 6 1 - - - J 4 1 - - - L - 6 - - - 5 5 35 26 25 Total Fonte: Direção da Escola E1 A direção da escola E3 facultou uma apresentação de informação recolhida pelo respetivo gabinete, de modo distinto das anteriores, fornecendo a informação tratada no formato de gráficos, organizados por ano de escolaridade, mês, dia da semana e período do dia. De uma forma sucinta, registou-se maior número de incidentes nos meses de Janeiro e Maio, mais frequentemente no turno da tarde e nos 6º e 7º anos de escolaridade. Sobre esta escola dispomos ainda de alguma informação qualitativa, designadamente que o 2º ciclo EB tem maior número de idas ao Gabinete de Acolhimento e Intervenção, e embora tenha sido registado um ligeiro aumento comparativamente ao ano letivo transato (2010/2011), este deveu-se ao aumento de reincidências nos comportamentos disruptivos e não a um acréscimo no número de alunos a recorrer ao gabinete. Neste sentido, constata-se que, à semelhança das outras escolas, o número de situações na escola E3 também tende a concentrar-se nos níveis de escolaridade mais baixos. Entre os dados relativos a incidentes de violência recolhidos internamente pelos gabinetes destas escolas há significativa continuidade com as tendências registadas ao nível de recolha nacional pelo ME. Em termos globais, as escolas portuguesas de 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico, com especial incidência nos anos de transição (5º e 7º anos de escolaridade), são as que reportam maior número de casos. O pico de incidentes reportados também coincide, com o 1º Período a concentrar mais incidentes e uma diminuição gradual ao longo do ano letivo. Outro aspeto que coincide com os padrões de registo de ocorrências a nível nacional é a existência de focos localizados de emergência da violência. A reincidência dos alunos provoca analiticamente um efeito numerosa ponderar na medida em que, se constata, que não se trata de um fenómeno extensível a toda a escola ou a todos os alunos. Ao nível da regulação e do controlo disciplinar uma análise detalhada dos Regulamentos Internos permite-nos concluir que escolas seguem genericamente as 66 orientações presentes no diploma relativo ao Estatuto do Aluno. O RI das três escolas apresentam uma organização similar : 1) Secção introdutória – em que se apresentam as finalidades, determinação e qualificação das infrações e medidas disciplinares; 2) Secção sobre medidas corretivas – em que que, além dos critérios de aplicação, orientações e procedimentos, se definem e listam o tipo de medidas (5 no total: advertência oral 33 , ordem de saída, tarefas/ atividades de integração escolar, condicionamento no acesso ou utilização de materiais e equipamentos e mudança de turma); 3) Secção sobre medidas sancionatórias – tal como na anterior, nesta parte apresentase a definição das medidas (que são três: repreensão registada, suspensão (de 1 até 10 dias), transferência de escola), as orientações e procedimentos, assim como os critérios de cumulação de medidas disciplinares. Tal como está explanado no Estatuto do Aluno, as escolas têm autonomia para regulamentar outras medidas corretivas, tendo-se verificado na análise aos documentos escolares algumas variações a este nível. A escola E3 define a permanência do aluno nos seus gabinetes de apoio na sequência de uma ordem de saída, já a escola E2 acrescenta o impedimento de participar em visitas de estudo e atividades festivas ou de atividades de representação da escola. As três escolas estipulam um conjunto de tarefas a desempenhar pelos alunos orientadas para trabalhos e ações de manutenção, apoio e organização dos espaços interiores e exteriores da escola ou das atividades não letivas. No caso das escolas E3 e a E2 o desenvolvimento de um trabalho autónomo ao nível das diferentes áreas curriculares, disciplinares e não disciplinares apresenta-se como uma atividade de integração. Nos Regulamentos Internos destas escolas encontra-se ainda a apresentação de tipologias de medidas disciplinares a aplicar. Na escola E1 para as situações de faltas justificadas e/ou injustificadas dos alunos há uma tipificação dos procedimentos, e na da escola E3 há para as situações de ordem de saída de aula para os alunos que cometem infrações. Ambas as escolas têm documentos autónomos sobre as normas de conduta dos alunos. Nos Regulamentos Internos das escolas E2 e E3 a informação sobre os procedimentos disciplinares tal como se encontra no Estatuto do Aluno, não está incluída nos respetivos regulamentos; no documento da escola E1 remete-se para os artigos do referido estatuto. Igualmente relevantes para a análise dos mecanismos de definição normativa são as dimensões relativas aos direitos e deveres constituídos e de participação dos alunos e do seu envolvimento nos processos de tomada de decisão. Nesse sentido, verificou-se uma regulamentação das escolas que ultrapassa os direitos que estão consagrados no Estatuto do Aluno. O direito ao apoio, participação e esclarecimentos no processo de ensino-aprendizagem e o direito a utilizar as instalações e recursos da escola de 33 As alterações ao estatuto do aluno, introduzidas pela lei nº 39/2010 de 2 de Setembro, mais concretamente no artigo 26º, incluíram pela primeira vez a Advertência no conjunto de medidas corretivas. O carácter recente destas mudanças explica porque razão a escola E1 não consideram esta medida nos seus RI (aprovados em 2009). Ressalva-se ainda que as mudanças normativas mais recentes, constantes no novo estatuto do aluno (Decreto Lei n.º 51/2012 de 5 de Setembro), não foram consideradas porque os documentos em vigor nas escolas no momento da análise correspondiam a um período anterior a estas (mandatos de 2009 a 2012). 67 acordo com os horários e normas previstas estão regulamentados nos documentos orientadores das três escolas. Os restantes direitos são específicos de cada escola, estando a possibilidade de reunir, se associar e ter acesso a informação presente em duas escolas (E2, E3). Quadro 14 - Direitos dos alunos definidos por escola Direitos Direito à diferença, bem como a consideração e valorização dos diferentes saberes e culturas Processo de ensino-aprendizagem e avaliação: apoio, participação, esclarecimento Exercer livremente o seu direito de reunião, associação e informação Utilizar as instalações da escola bem como os seus recursos nos termos regulamentares Participação em atividades lúdico-culturais (dispensa das atividades letivas) Ser assistido em caso de acidente ou doença súbita no decorrer de atividades escolares Fonte: Regulamentos Internos e Códigos de Conduta das escolas E1 E2 x x x x x x E3 x x x x x À semelhança dos direitos, as escolas regulamentam mais deveres do que os que estão previstos no Estatuto do Aluno. Em particular aqueles que remetem para normas de conduta e de convivência, designadamente para as situações vividas em sala de aula. As responsabilidades sobre os bens e equipamentos escolares são outro aspeto focado, prevendo-se com detalhe, nos documentos orientadores, os cuidados a ter na utilização e manutenção dos materiais. O cumprimento dos deveres escolares e a informação ou apoio junto dos adultos da escola não são obrigações previstas nas três escolas, possivelmente por abrangerem dimensões que já estão largamente regulamentadas nos deveres gerais do aluno. Quadro 15 - Deveres dos alunos definidos por escola Dever de manter, utilizar e responsabilizar-se pelos bens e equipamentos Atuar segundo princípios cívicos: ter uma conduta ordeira, assídua, pontual, obediente… Evitar riscos, perturbações, atos ilícitos ou proibitivos Cumprir com as responsabilidades escolares (justificação de faltas, plano de recuperação, desempenho de funções atribuídas, etc.) Informar e/ou solicitar apoio de um agente educativo, caso surja algum problema (não solucionável localmente) Fonte: Regulamentos Internos e Códigos de Conduta das escolas E1 x x x E2 x x x x x E3 x x x x O livre exercício da participação e o cumprimento/obrigatoriedade dos alunos relativamente às suas responsabilidades escolares são princípios transversais aos direitos e deveres. A análise dos diversos tipos de envolvimento e representação destes atores nos processos de tomada de decisão é por isso relevante. Tendo como ponto de partida as Avaliações Externas da IGE, ao nível do envolvimento dos alunos nos processos de tomada de decisão, verificámos que, em geral, são abordadas com os alunos as temáticas relativas aos direitos e deveres/ cidadania e comportamento, especialmente ao nível das turmas. Contudo, esta participação circunscreve-se às ações de divulgação dos documentos estruturantes, 68 não estando prevista qualquer participação na elaboração dos mesmos. Na programação de atividades a escola E3 apresenta uma fraca colaboração e envolvimento dos alunos, ao contrário das escolas E2 e E1, que os incluem na construção dos planos de atividades, conhecimento e definição de regras, dos critérios de avaliação, dos temas a abordar e das atividades a desenvolver – podendo ser propostas e executadas pelos próprios discentes. Apesar de não estar previsto o envolvimento dos alunos nos órgãos de decisão, em termos gerais, constatámos nos Regulamentos Internos a indicação de diferentes formas de organização das atividades escolares com vista à promoção da participação dos alunos na vida escolar. Situando-se entre as secções de direitos e deveres do aluno, os documentos das três escolas integram, de maneira mais sumária (E1, E2) ou mais detalhada (E3), um ponto relativo à representação dos alunos. Nas três escolas, as responsabilidades dos delegados e subdelegados estão relacionadas com os seus deveres de representação da turma, que implicam: a solicitação e integração de reuniões, promoção da articulação e cooperação entre os alunos e os professores e a Direção de Turma; e a coordenação dos processos de consulta, informando, e conhecendo a opinião da turma. Por sua vez, a escola E3 estipula as competências e perfis dos representantes dos alunos, de acordo com os valores e princípios promovidos pela escola – nomeadamente a assiduidade, pontualidade, o sentido de responsabilidade, de justiça e de entreajuda e solidariedade – além de boas capacidades de relacionamento e de intervenção nos conflitos. Ser um elemento de coesão da turma e de ligação entre a turma e o diretor de turma também correspondem às características indicadas, e integram o conjunto de competências relativas à representação, participação e comunicação estabelecida entre os alunos e os órgãos deliberativos e consultivos da escola. Por último, os modos de valorização de comportamentos meritórios são igualmente considerados nas três escolas, que dispõem de quadros de Valor/ Mérito Educativo, com o objetivo de reconhecer os alunos pelas suas ações de desenvolvimento cívico, de correção e de esforço no cumprimento das suas obrigações. Contudo, segundo as Avaliações Externas da IGE, apesar das escolas regulamentarem quadros meritórios, nem todas têm a prática de premiar os progressos dos alunos ao nível das atitudes e dos valores como é o caso da escola E234. Aliada à maior definição de direitos e deveres dos alunos, a criação de quadros de mérito demonstra a importância que a responsabilização dos alunos e a promoção das condutas positivas tem no quadro organizacional escolar. Estas formas alternativas de regulamentação apontam assim para a possibilidade das organizações escolares atuarem além do quadro normativo geral da tutela. 1.5 PARCEIROS E PARCERIAS DAS ESCOLAS Ao nível dos documentos procurámos ainda saber se a comunidade e os agentes locais se envolvem e participam nos processos da vida escolar e se constituem um recurso Salvaguarda-se que a avaliação externa na escola E2 foi realizada em 2007, estando a decorrer uma nova avaliação no ano letivo 2012/2013. 34 69 (alternativo) para a resolução dos problemas de violência e agressividade nos espaços educativos. As três escolas definem-se nos documentos orientadores como mediadoras e promotoras do envolvimento e participação dos pais e encarregados de educação, as instituições e outros agentes locais, definindo como estratégia a sensibilização para a construção de um clima de convivência e respeito, assente quer no reforço e valorização da escola, quer numa educação para valores e princípios cívicos. Por outro lado, nos documentos das três escolas afirma-se que procuram dinamizar e participar em atividades direcionadas para a comunidade, manifestando disponibilidade e abertura para envolver os agentes com o intuito de estimular a participação e o interesse destes. As escolas E2 e E3 planificam também estratégias de acompanhamento e apoio e um conjunto diversificado de ações de intervenção, como por exemplo o alargamento das ofertas formativas/ extracurriculares, planos de acompanhamento a famílias economicamente carenciadas,, iniciativas direcionadas para a ocupação dos tempos livres dos alunos, designadamente nas interrupções letivas. Por outro lado, nos documentos orientadores destas escolas os parceiros da comunidade são referidos enquanto recurso usado para solucionar os desafios que vão sendo colocados na operacionalização de ações concretas, como por exemplo pela necessidade de rentabilização de recursos humanos ou materiais. A articulação entre as escolas e as instituições e atores locais faz-se através de uma colaboração que consideram ativa e partilhada, e que tem vindo a contribuir para a consolidação ou estabelecimento de protocolos e/ou parcerias efetivas com diversas entidades da comunidade. Esta articulação desenvolve-se também como estratégia para mobilizar e ampliar as possibilidades disponíveis na comunidade. Tomando por referência os parceiros identificados pelas escolas nos seus documentos orientadores, distribuímos as entidades respetivas pela tipologia institucional anteriormente adotada35. A escola E2 é aquela que apresenta um leque de relações mais abrangente, relacionando-se com todos os tipos de instituição, seguida pela escola E3. Tais resultados reforçam o que na análise de redes apresentada anteriormente se concluiu relativamente a cada território. Por um lado pela diversidade e maior consistência das relações entre parceiros do mesmo território, por outro, pela assunção da escola E2 como elemento aglutinador e promotor da rede do seu território. 35 Explicitada na análise de redes dos agentes locais, ponto 1 do capítulo III. Territórios. 70 Quadro 16 - Parceiros identificados nos documentos orientadores das escolas Tipo institucional Entidades parceiras Autarquia Autárquica ou Oficial Instituições Públicas (Sociais) não judiciária Institutos Técnicos (Formação/ Emprego) Programas Comunitários Associação, Projeto ou IPSS/ ONG Programa Associações Culturais/ Desportivas Associações de Pais e EE Centro de Saúde Saúde Forças de Segurança Policial ou Judicial T1 E1 x x x x x T2 E2 x x x x x x x x x T3 E3 x x x x x x x O aprofundamento das orientações escolares e do peso atribuído às situações de conflito e agressividade, conjugado com a análise das dinâmicas organizacionais e territoriais permitiu-nos retratar as escolas relativamente à definição das suas estratégias e ações face ao problema da violência. Para a prossecução dos objetivos que se prendem com a pacificação das escolas, sejam de caráter preventivo e/ou interventivo revelaram-se elementos particularmente relevantes, o modo de funcionamento das escolas enquanto organização e as suas relações com as outras entidades da comunidade. Igualmente, a definição e implementação de estratégias, regras e distribuição de responsabilidades assumem particular centralidade na gestão e prevenção da violência e conflitualidade nas escolas. 2. A PERSPETIVA DOS EEMENTOS DAS DIREÇÕES ESCOLARES A análise das perspetivas dos dirigentes escolares 36 permitiu que se recolhesse em profundidade informação relativa às orientações e estratégias desenvolvidas em cada escola para responder à conflitualidade e violência. Os elementos das direções das escolas constituíram no processo de desenvolvimento da pesquisa peças fundamentais para a mesma. Embora com estilos de liderança diferenciados, as direções das escolas pautaram-se pela disponibilidade no fornecimento de informação solicitada pela equipa de pesquisa, pela promoção da participação dos restantes elementos da escola no estudo, e ainda, pela oportunidade de em continuidade acompanharem o processo. 2.1 ALUNOS VIOLENTOS A partir da análise às entrevistas aos responsáveis escolares das três escolas foi possível compreender uma significativa uniformidade das representações sobre a violência na escola. Nos discursos dos entrevistados há referências explícitas às diferentes dimensões do fenómeno, seja a física, a psicológica ou a verbal. O aluno violento é entendido pelos entrevistados como uma fonte de preocupação e de elevado 36 Os seis elementos entrevistados residem no concelho em estudo. Na sua maioria têm uma vasta experiência de desempenho de funções em cargos de liderança escolar, embora com formações iniciais muito diferenciadas. 71 desafio para a gestão da escola, considerando como problema prioritário e de extrema importância, seja para a escola em geral, seja para os alunos em particular. (...) é aquele que, sem nós darmos por ela, está “molestar” os outros é mais difícil de detetar – é a maior preocupação! [Diretora Escola E2] Um aluno violento é aquele que não se respeita nem a si nem aos colegas e constantemente! Porque a partir do momento que ele agride, seja verbalmente, seja fisicamente um colega também... Ele também não está... E só vem basicamente para a escola com essa intenção... Além de estar a prejudicar os outros colegas, está a estragar o seu futuro. Por isso é que eu digo que ele não tem respeito por si próprio. Porque, o que é que ele vais ser? É isso sempre que eu os questiono: "O que é que tu vais ser? Como as coisas como estão no país, tu não vês?" [Delegado Segurança Escola E1] Para os elementos das direções aos comportamentos dos alunos violentos, comummente designados como problemáticos, estão associadas causas potenciadoras de conflito de diferentes tipos. Nos seus discursos referem-se às características individuais dos alunos, identificando dificuldades relacionais, intolerância face aos outros, desconforto e revolta face às suas condições de vida e vivências pessoais, a falta de autocontrolo e atitudes agressivas. Por outro lado, consideram outros elementos de natureza contextual, como a residência em bairros considerados difíceis e a pertença a famílias desintegradas. Sobre estas famílias vincam a importância que tem a reprodução de modelos de socialização familiar que são distintos dos da escola, o que traz acrescidas dificuldades de regulação dos comportamentos dos alunos. Por outro lado, assinalam que grande parte dessas famílias vive com parcos recursos económicos e escolares, o que condiciona a capacidade de ocupações dos tempos livres dos alunos refletindo-se numa fraca presença e supervisão parental. Grosso modo, estas observações são convergentes com a análise diagnóstica dos territórios em estudo. Na análise das discussões tidas no âmbito dos grupos focais foi comum a afirmação da incapacidade de grande parte das famílias, pelos horários de trabalho que têm, em acompanhar os filhos no dias de semana, sobretudo no final e início do dia, e durante as interrupções letivas. No que respeita às trajetórias escolares dos alunos considerados violentos os entrevistados referem-se à etapa de transição entre ciclos do Ensino Básico, concretamente entre o 2º e o 3º como as mais problemática; aos percursos escolares marcados por retenções ou pela frequência de vias alternativas de ensino; e ainda, pelas dificuldades de aprendizagem (que associam sobretudo à desmotivação ou fracas expectativas face à aprendizagem) e de cumprimento das regras escolares: Eu acho que é um pouco de tudo, na minha opinião, não é? Ora um aluno que, realmente, não tenha objetivos em termos de aprendizagem, se é obrigado pelo EE ou por um regime qualquer a vir para um local – que é a escola – onde ele está sujeito a regras e neste momento ele não tem objetivo nenhum, eu acho que uma coisa leva à outra, não é? Para alguns alunos pode ser efetivamente o fator: não tem vontade nenhuma de aprender, nem de estudar e então vai chatear; ou o contrário – porque há problemas exteriores que traz para a escola: uma família desintegrada ou alguém que... Efetivamente, se são miúdos com problemas de personalidade, porque há fatores familiares que aí são bastante evidenciados e, efetivamente, a aprendizagem já aí está. [Diretora Escola E1] Relativamente à ocorrência de situações de violência na escola, referem-se às circunstâncias associadas a uma maior frequência. O momento do dia é apontado como um dos elementos mais marcantes, com particular destaque para o turno da 72 tarde. Em grande medida, porque para os entrevistados se trata de um momento mais propenso para que haja mais comportamentos agitados. Outra justificação prende-se com a exiguidade dos espaços escolares destinadas à prática de jogos ou brincadeiras nos intervalos (por vezes usam as salas de aulas ou outros espaços de aprendizagem). Nas descrições e explicações sobre os incidentes no recreio na sua maioria os entrevistados enquadram estes incidentes no que consideram ser um processo de crescimento e adaptação das crianças à escola. Há nos seus discursos uma naturalização relativamente ao comportamento violento dos alunos, referindo-se às caraterísticas das faixas etárias e etapas de desenvolvimento em que se encontram os alunos. Na sua totalidade os entrevistados declararam que a violência está a diminuir progressivamente nos seus espaços escolares, associando de forma significativa a ocorrência de incidentes às características da população escolar e da localidade. 2.2 ORIENTAÇÕES PARA A REGULAÇÃO E INTERVENÇÃO Os dirigentes entrevistados procuraram nos seus discursos situar as suas orientações em geral, e a elaboração das regras escolares, em particular, no quadro dos documentos orientadores emanados pela tutela. Tal como se demonstrou na secção anterior relativa à análise documental, verificam-se variações entre as orientações gerais da tutela e as definições de regras e de procedimentos em cada escola. Tais variações ilustram as diferentes modalidades de apropriação local da regulamentação geral traçando as especificidades de cada organização escolar. Relativamente aos princípios estratégicos para a intervenção, as direções apresentam essencialmente três tipos de orientações. Uma primeira que se prende com a preocupação com o cumprimento das regras definidas, tanto por alunos como professores e outros técnicos da escola. Uma segunda que procura garantir a proximidade no acompanhamento aos alunos que não cumprem as normas e regras escolares, e respetivas famílias. Uma de terceira, relativa à importância que atribuem à monitorização e (re)planeamento das estratégias seguidas. Embora coincidam nas orientações gerais, há especificidades no modo como operacionalizam essas orientações No caso da escola E1 a direção optou pela definição de um Código de Conduta que procura estabelecer o conjunto de orientações estruturadas e organizadas como rotinas da organização escolar, procurando articular todos os agentes educativos. Por outro lado, apostam numa equipa de professores com competências no âmbito da mediação, que se dedicam ao acompanhamento e monitorização do fenómeno da violência e indisciplina na escola, sendo em grande medida coincidentes com os elementos do Gabinete de Intervenção Disciplinar da escola. Na escola E2 o cumprimento do Regulamento Interno assume centralidade, constituindo-se como documento de orientação para a intervenção, para a totalidade da escola. As orientações definidas enfatizam uma atuação por via do diálogo com os alunos, procurando que a totalidade dos intervenientes na comunidade educativa atuem no mesmo sentido. Entendem que a Escola dever ter um papel interventivo forte e de referência, apostando numa abertura à comunidade local, mantendo as suas regras que procuram que sejam respeitadas por todos. Por fim, direção da a escola E3 que aposta na criação de ambiente confortável e de confiança (especialmente para os alunos mais novos). Consideram a escola como um local de trabalho e com um conjunto de regras cujo cumprimento é fundamental. A maior preocupação 73 relativamente à orientação para a intervenção prende-se com as principais dificuldades, nomeadamente, o controlo do cumprimento de regras nos pátios. Organizacionalmente orientam a intervenção a partir de um modelo por etapas, que define os procedimentos de diagnóstico, o plano de ação, as modalidades de participação, a divulgação dos resultados, a reflexão e (re)adequação dos procedimentos. Responsáveis pela intervenção em situação de conflito A autoridade e capacidade dos professores em gerir conflitos foi um assunto recorrente nas entrevistas aos responsáveis escolares, em concreto os da direção das escolas. A definição de papéis e sua articulação com a coordenação organizacional proposta pelas direções das escolas em matéria de regulação da violência na escola, ocupa em grande parte as ilustrações que foram dando na apresentação da escola e a sua gestão. Os Diretores de Turma e os Técnicos em articulação com as Direções são considerados como elementos chave nessa coordenação, mas para situações mais específicas. Concretamente, na escola E1 os elementos da direção consideram que a autoridade do professor depende sobretudo do seu perfil, prestando apoio nas situações em que verificam incapacidade dos professores na regulação dos comportamentos dos alunos. Gerem a distribuição das funções de acordo com o momento e espaço em que decorrem as atividades escolares, assim aos professores compete gerir a sala de aula e aos Assistentes Operacionais o pátio da escola nos momentos de intervalo, cabendo a vigilância do recreio nos tempos letivos a outros para além dos Assistentes, designadamente à Direção, aos animadores socioculturais que se encontram na escola e aos seguranças da escola. Na escola E2 a direção aposta na valorização da figura e função dos Professores, reforçando a sua autoridade e autonomia, como explicam, o modelo deve vir de cima. Mais concretamente, reforçam a autoridade dos Diretores de Turma por considerarem e lhes atribuírem um papel fundamental na regulação dos comportamentos violentos dos alunos, assim como a mediação em caso de conflito entre alunos, entre alunos e professores ou outros elementos da comunidade educativa. Também a direção da escola E3 aposta no reforço da figura dos Diretores de Turma, com a sua responsabilização em diversos domínios de intervenção. É ainda preocupação dos elementos desta direção a transmissão das linhas orientadoras de atuação através de diferentes vias e modalidades de sensibilização, como por exemplo a realização de reuniões periódicas e dinamização de workshops em torno da problemática. No âmbito das orientações para a intervenção definidas pelas direções das três escolas as equipas dos gabinetes de intervenção ocupam uma posição central. A estas equipas cabe o desempenho de uma função de mediação, fundamental na operacionalização dos procedimentos definidos pelas escolas. Pela sua constituição essas equipas usufruem de um elevado grau de influência junto dos vários níveis hierárquicos da organização escolar, seja na liderança de topo, seja nas intermédias, seja ainda junto dos restantes professores e funcionários das escolas. O encaminhamento para os gabinetes de intervenção disciplinar depende do local das ocorrências e da gravidade da situação. Em cada escola a definição dos procedimentos é específica e depende, em grande medida, das modalidades de distribuição da autoridade, por um lado, e da definição de gravidade das ocorrências, por outro. 74 Na escola E1 a uniformização dos procedimentos de atuação apoia-se na organização do Gabinete de Intervenção disciplinar. O gabinete tem uma equipa e espaço próprios, e procede ao atendimento direto dos alunos em conflito, cabendo-lhes a função de registo das ocorrências e consequente transmissão das informações para os órgãos e entidades respetivas. Nesta escola o gabinete produziu Fichas de relato, onde se inscrevem a participação e encaminhamento das ocorrências. Por outro lado, são distribuídas as instruções de atuação a toda a comunidade educativa, nomeadamente na sala de aula na mesa dos professores ou anexado aos livros de ponto. Em casos considerados graves cabe à direção atuar. Na escola E2 em situações consideradas graves ou que ocorrem no pátio, os alunos são encaminhados para as Direções de Turma. Se as situações ocorrem em sala de aula os alunos são encaminhados para o gabinete de intervenção disciplinar ou para outro espaço da escola, que se encontre supervisionado por um adulto. Já na escola E3, à semelhança das anteriores, a atuação depende da gravidade e do local em que ocorre o conflito. Habitualmente há um encaminhamento para o gabinete de intervenção disciplinar, mas nos casos graves ou ocorrências no pátio há um encaminhamento para a direção da escola. Quadro 17 - Responsáveis pela intervenção, por local das ocorrências e gravidade, por escola Ocorrências nos pátios Ocorrências em sala de aula Casos graves E1 Gabinete de Intervenção Disciplinar Gabinete de Disciplinar Intervenção Direção da Escola E2 Direções de Turma Gabinete de Disciplinar Intervenção Direções de Turma E3 Direção da Escola Gabinete de Disciplinar Intervenção Direção da Escola A tomada de decisão sobre a gravidade das ocorrências e consequente aplicação de medidas disciplinares compreende uma grande variedade de critérios. A análise dos discursos dos responsáveis escolares, complementadas pela análise da informação dos gabinetes e dos documentos orientadores, permite concluir que em grande medida a decisão depende das circunstâncias do ato praticado. Os critérios definidos para a tomada de decisão são atravessados pelo que os responsáveis escolares consideram ser os fatores atenuantes ou agravantes, por um lado, e a intencionalidade da medida a aplicar, por outro. Na escola E1 a eficácia da intervenção e das medidas depende sobretudo dos alunos envolvidos, ou seja, para uns a intencionalidade da medida a aplicar prende-se com a dissuasão, para outros prende-se com sobretudo com a reincidência dos comportamentos. A gravidade depende do tipo de situação, da reincidência do comportamento, da atitude dos alunos e da assunção de culpa face ao praticado. Na escola E2 os critérios de definição de gravidade de um incidente ou conflito prende-se 75 essencialmente com a atitude dos autores e do contexto em que ocorre o ato. A justiça na operacionalização dos critérios e aplicação das medidas disciplinares constitui uma das preocupações expressas pelos responsáveis desta escola. Na escola E3 os critérios definidos para a tomada de decisão são: reincidência, grau de resistência, desobediência, força com que se agride, existência de ferimentos físicos, forma como se insulta. A aplicação das medidas procura ser gradativa, dependendo do tipo de intervenção em curso. Compreende-se que os critérios definidos para a tomada de decisão pautam-se sobretudo pela reincidência e genericamente do que podemos designar como atitude dos alunos face ao ato cometido. Há uma preocupação efetiva com o sentido e finalidade da regulação e intervenção em situações de conflito e violência. Dito de outro modo, os responsáveis escolares reconhecem a importância do tipo e modo de ação como instrumento de modelação dos comportamentos dos alunos. A justiça das medidas e as suas consequências constituem o pano de fundo das tomadas de decisão face às medidas a aplicar, contudo mais expressa nos discursos de parte dos responsáveis. Outro tipo de orientação que visa contribuir para a regulação do fenómeno da violência e indisciplina na escola prende-se com estratégias de prevenção, com a dinamização de atividades e projetos dedicados a temáticas mais abrangentes, como a cidadania, o desporto, a cultura, etc. A participação em atividades desta natureza é entendida pelos dirigentes como uma forma indireta de regular os comportamentos, na medida em que, segundo afirmam, os alunos que participam nestas iniciativas são mais obedientes e disciplinados. A pertença ao Programa TEIP tem neste sentido constituído uma mais valia na medida em que fornece complementarmente recursos humanos e materiais que permitem a aposta neste tipo de iniciativas. Em todas as escolas as direções procuram uma otimização dos recursos gerindo o que é disponibilizado no âmbito de programas diversos, distinguindo-se contudo o TEIP. Relativamente ao modo de gestão dos recursos dão conta da importância da identificação das carências e necessidades para que haja uma distribuição eficaz dos mesmos. Quadro 18 - Orientações para a gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros E1 E2 E3 Canalização de recursos para a regulação da violência: disponibilização de um espaço para mediação de conflitos e acompanhamento das ocorrências; Carências de RH em parte superadas pelos técnicos colocados ao abrigo do Programa TEIP Canalização de recursos para a regulação da violência: conjunto alargado de projetos direcionados para a diminuição da violência na escola (nomeadamente, treino de competências sociais) Carências de RH em parte superadas pelos técnicos colocados ao abrigo do Programa TEIP Canalização de recursos para a regulação da violência: Oferta variada de clubes e atividades (frequência diferenciada segundo o perfil do aluno); Carências de RH: Gestão estratégica de RH, a escola dispõe de 2 mediadores, 1 técnica de serviço social e 1 vigilante GCSE. 76 2.3 RELAÇÕES DA ESCOLA COM O EXTERIOR: FAMÍLIAS, ENTIDADES LOCAIS E FORÇAS DA SEGURANÇA As famílias As famílias dos alunos são atores distintos quanto à natureza das relações e vínculos estabelecidos com as escola. O contacto com os Encarregados de Educação é entendido pelos responsáveis das escolas tanto como obrigação e como necessidade. Por esse motivo as direções têm uma postura generalizada que privilegia a promoção da comunicação e colaboração com estes. No entanto, apontam para níveis contrastantes de envolvimento quando caracterizam a relação que se estabelece entre a escola e as famílias dos alunos. Associam de forma significativa um maior dinamismo e elevada participação nos assuntos escolares às famílias que designam como “estruturadas” e o oposto para as famílias que consideram “desestruturadas”, e que reúnem um conjunto de condições que consideram explicativas para a falta de investimento e acompanhamento escolar dos seus filhos, como parcos recursos económicos e escolares, serem imigrantes ou encontrarem-se em condição de exclusão social. Relativamente à colaboração e participação na vida da escola distinguem entre os pais colaborantes com a escola, os pais que responsabilizam a escola e os pais que se demitem das funções parentais, criando obstáculos e resistindo à intervenção da escola. Para este último tipo várias ilustrações foram dadas, explicando que nestas situações é acionado, imediatamente, um processo de sinalização e participação às entidades competentes, como a CPCJ. O que exigem à escola não é muito diferente, a maneira de exigir é que é [Delegada de Segurança Escola E2] As responsabilidades dos Encarregados de Educação na disciplinação dos alunos é outro aspeto vincado por alguns dos responsáveis escolares, que alegam a falta de legislação nesta matéria, com consequências acrescidas para a escola. Os elementos das direções das três escolas consideram que a escola faz frequentemente mais do que pode e do que deve pelos seus alunos, substituindo deste modo os pais em parte das suas funções parentais. Contudo consideram que se trata de uma necessidade dada a condição de vida de muitas das famílias dos seus alunos. Como numa seção anterior referimos, é reconhecido pelos responsáveis das entidades locais, escolas incluídas, o problema dos horários de trabalho dos pais face aos horários escolares dos filhos, por exemplo. As táticas de controlo disciplinar tidas como mais eficazes passam pelo envolvimento dos pais dos alunos que não cumpriram as normas e regras escolares. No caso da escola E3 consideram o contacto imediato do próprio aluno com os pais uma medida infalível. Na escola E1 a direção tem como estratégia reunir com os pais do aluno, e com o próprio chamando-o de surpresa. Os elementos da direção afirmam que por vezes apenas um telefonema para os pais/EE é suficiente para a melhoria de comportamento dos alunos. Há alunos que se nós telefonarmos aos pais, o aluno vem "direito" no outro dia, pronto! [Risos] Percebe o que eu quero dizer? Que basta isso para resolver a situação. Porque muitas das vezes é desconhecimento do EE. E de vez em quando não é por mal, é porque entra às oito e sai às oito da noite e não consegue. Não consegue, pronto! [Delegado Segurança Escola E1] 77 As relações com as entidades locais são estabelecidas através de protocolos de parceria. Em grande parte essas parcerias passam pela cedência de recursos escolares. As escolas E3 e E2 têm protocolos de parcerias de concessão de alguns espaços nos seus estabelecimentos escolares a outras entidades locais dirigidos para a realização de atividades desportivas (com usufruto ou não dos seus alunos) ou recreativas (como eventos de congregações religiosas ou atividades da associações de pais e de diversas instituições locais). Além do pavilhão gimnodesportivo da escola, na E3 referem também a cedência do refeitório e outros espaços escolares. Neste âmbito as direções das três escolas salientam a promoção e/ou o desenvolvimento de projetos/ planos de formação, como por exemplo: cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA, níveis B1, B2 e B3), Português Para Todos (PPT) e cursos de Alfabetização (EFCB). A escola E3, além de realizar cursos de PPT e de Alfabetização (EFCB), promove ainda o desenvolvimento de cursos extra escolares (mediante uma parceria estabelecida com a Comissão Social de Freguesia, o Programa K’Cidade e a Associação Islâmica da localidade, e formações de curta duração (através de um protocolo com a escola profissional do concelho vizinho): Uma escola inserida numa comunidade destas é uma escola da qual se exige muito – temos investido nas parcerias porque nos permite movimentar numa série de situações. A escola não se pode fechar sobre si própria. Isto é um porto seguro, os alunos sentem isso e queremos que os pais também o sintam. [Diretora Escola E3] Por outro lado, as escolas E2 e E3 recorrem às instituições locais na procura de colaboração e participação em iniciativas e estabelecem protocolos ou parcerias efetivas tanto para a prevenção como para a regulação da violência. Na primeira salientam-se as parcerias estabelecidas com uma Associação de defesa dos direitos humanos no acompanhamento de alunos em situação ilegail, as ações de sensibilização promovidas pelo Programa Escola Segura e as parcerias com oficinas, comércio local ou outras instituições para a realização de formação vocacional de alunos que frequentam o PIEF. Já a escola E3 conta com um técnico de uma Associação local representativa de um grupo étnico na equipa multidisciplinar da escola, além da intervenção dessa associação e da Associação religiosa da localidade T3 na mediação de situações de indisciplina, quando necessário. Fazem também um acompanhamento dos alunos através do Programa Escolhas, especialmente aqueles que frequentam vias de ensino não regulares, tendo como objetivo o desenvolvimento de competências pessoais. No caso da escola E1 a direção considera não haver uma comunicação regular ou de colaboração com as entidades locais para a resolução do problema da violência, com exceção do Programa Escola Segura. Justificam-se com dois motivos: o desconhecimento sobre as entidades e respetivos recursos e da predisposição para colaborar por um lado. Por outro lado, não consideram haver necessidade em recorrer ao apoio de outras entidades na , medida em que os casos de reincidência encontramse já identificados e são acompanhados pela rede local: E neste momento a escola acaba por ser apenas mais um local de controlo e não... (...) Evidentemente que poderá haver uma ou outra situação que deveríamos ter solicitado apoio, não só na área de reintegração do aluno porque está com problemas ou tentar perceber junto de... Na Junta de Freguesia ou uma outra entidade que a família ou o aluno tem este comportamento porque a família está, direta ou indiretamente, desestruturada. Mas, lá está, estes casos – se realmente são, se são realidade – já estão identificados na rede social. E como temos uma representação lá, na escola, que é a Psicóloga que, direta ou 78 indiretamente, também em alguns casos está a par ou leva alguns casos de situações... [Diretora Escola E1] No que diz respeito à relação com as forças da segurança, segundo os responsáveis das três escolas, o relacionamento desenvolvido no âmbito Programa Escola Segura é entendido como estreito e vantajoso. Havendo contudo diferenças quanto aos critérios de solicitação e participação feitas às Forças de Segurança. A decisão sobre a comunicação ou queixa de ocorrências aos agentes depende, sobretudo, da gravidade e tipo de ocorrência, sendo mais frequente nos casos em que os conflitos se dão no exterior da escola, quando envolvem as famílias do alunos ou ainda, quando há necessidade de apresentar queixas formais. São as ações de sensibilização e o policiamento esporádico os motivos de contacto mais frequentes por parte dos agentes da polícia. Posicionamento face às medidas da tutela Ainda no que se prende com a relação mantida com a tutela e as representações sobre as medidas políticas e o que os responsáveis das escolas consideram ser a (sua) autonomia para atuar e prevenir as situações de conflito foram aspetos questionados. As respostas foram diferenciadas verificando-se algumas variações inter e intra escolas, nomeadamente com variações de posicionamento entre as diretoras e os delegados de segurança. Em comum todos os responsáveis das escolas, diretoras e delegados de segurança, consideram haver autonomia para regular sobre a matéria em referência. Os representantes das escolas E2 e E3, embora sublinhem a ausência de recursos e apoios necessários para a prevenção e intervenção, manifestam concordância com as medidas e programas desenvolvidos pela tutela. As direções das escolas E1 e E3 indicam como problema a instabilidade normativa que tem pautado a definição da política educativa no país. A discrepância entre posicionamentos ilustra-se pelos posicionamentos assumidos, enquanto a direção da escola E3 considera a regulamentação central como um impedimento para o desenvolvimento de uma resposta capaz ao problema da violência, a direção da escola E2 afirma uma relação positiva com a tutela. Quadro 19 - Representações dos dirigentes sobre a Tutela Consideram haver autonomia para regular Manifestam concordância com as medidas e programas desenvolvidos pela tutela Estabelecem um relacionamento com Positivo (diálogo, entreajuda) a tutela Negativos (conflituoso) Consideram haver ausência de recursos/ apoios Consideram que há uma imposição legislativa, desadequada às condições e características da escola Consideram haver instabilidade na regulamentação do enquadramento legal Consideram que os normativos impedem uma boa resposta de atuação E1 X E2 X E3 X X X X X X X X X X X 79 De uma forma geral, os responsáveis das três escolas consideram haver autonomia para a regulação das situações de conflito, considerando haver uma maior inibição na prevenção do que na intervenção, devido à carência de recursos: Nós é que temos de resolver as situações de conflito. À exceção da legislação e das medidas de transferência, em que estamos dependentes da tutela, somos nós que resolvemos. Em termos de prevenção, dependemos dos recursos da tutela... Para ter mais recursos humanos, por exemplo mais um vigilante, só com a ajuda da tutela. Câmaras de vigilância também não temos... [Diretora Escola E3] Neste momento, eu já me sinto um bocadinho como um colete de forças no sentido de não ter mais condições físicas e também recursos humanos – quando nós em termos de falta de pessoal não é substituído… – porque por muito boa intenção que a gente tenha: não tendo a supervisão de funcionários para vigiar os recreios, esta intenção não é operacionalizável. [Diretora Escola E2] Só que nós tivemos um grande – estamos a ter um grande problema, muitas baixas, o Ministério demora muito tempo a substituir. Porque para uma pessoa que mete baixa nós demoramos quase cerca de um mês para ter cá alguém. Porque o Ministério demora cerca de 15 dias para nos dar resposta se não tem ninguém de quadro de zona, que esteja com horário zero e que possa vir para cá [Delegado Segurança Escola E1] Apesar de afirmarem a sua autonomia, a regulamentação em torno das medidas disciplinares sancionatórias disponíveis no quadro legal são um motivo de queixa das direções das três escolas, assim como a morosidade no tratamento dos casos de alunos reincidentes. A suspensão e a transferência de escola são entendidas como medidas de fim de linha, por considerarem que não trazem benefícios para os alunos, nomeadamente melhorias no seu comportamento. A diretora da Escola E3 defende que outras estruturas da comunidade se poderiam ocupar especificamente da intervenção nestes casos mais difíceis com maior apoio da tutela, uma vez que a considera que a escola é "impotente", e que não pode, em alguns casos, fazer mais nada. Outro obstáculo apontado prende-se com o que consideram ser o excesso de reformas do sistema educativo português e a pressão para a escola agir de acordo com parâmetros definidos mas alterados em intervalos de tempo demasiado curtos e por vezes pouco adequados ao contexto e às condições das escolas. Ainda que sejam apontadas dificuldades e obstáculos, as direções encaram-nos como desafios e manifestam o desejo e interesse na continuidade do trabalho de regulação do problema da violência que estão a desenvolver. O recurso à avaliação (diagnóstico e monitorização) como instrumento de adequação e melhoria é referido pelos representantes das direções das escolas E3 e E2, que apresentam também outras propostas pensadas para o futuro, relacionadas sobretudo com o acompanhamento dos alunos, a sua responsabilização e a diversificação das ofertas formativas. 80 3. A PERSPETIVA DOS PROFESSORES 3.1. PERCURSO METODOLÓGICO E AMOSTRAGEM O inquérito por questionário foi o instrumento metodológico considerado mais adequado para se proceder à recolha da informação sobre as concepções e práticas profissionais dos professores quanto à violência e ao desempenho da função docente, na medida em que se optou por inquirir a totalidade dos docentes. Analiticamente o guião de inquirição procurou abarcar diversas dimensões de análise. Quadro 20 - Guião do Inquérito por Questionários aos Professores Eixos de análise I. Caracterização II. Escola e função docente Dimensões Caracterização Pessoal Caracterização Profissional Práticas Profissionais Participação nos processos de decisão da escola Participa/ Não participa nos processos de decisão Recursos e apoios disponíveis IV. Representações Sexo / Idade Escola onde leciona / Número de anos na profissão/ Número de anos na escola / Desempenho de Cargos Conceções sobre o desempenho de funções Articulação organizacional III. Relação Pedagógica Indicadores Resolução de situações de indisciplina e conflitos em sala de aula Castigos aplicados Frequência de comunicação interna / Participação ou queixa a outras entidades Recurso a elementos da escola / Avaliação das necessidades para atuar Práticas de regulação de conflitos e indisciplina Seleção das medidas mais graves Tomada de decisão (atenuantes/agravantes) Fatores importantes para a resolução / Critérios de decisão Comportamentos reincidentes Intervenção sobre os comportamentos reincidentes Caracterização do ambiente da escola Representações sobre a escola Evolução das ocorrências na escola e da sua frequência Representações sobre o fenómeno na escola Principais razões para a ocorrência de situações Causas da violência na sala de aula A opção pela aplicação dos inquéritos numa plataforma online em software especializado permitiu alargar o alcance e amplitude de uso da técnica, com vantagens anteriormente comprovadas em eficiência e eficácia do processo de inquirição, 81 permitindo aos professores responder através da internet. O desenvolvimento desta estratégia de inquirição teve boa aceitação por parte dos responsáveis escolares, que nos encontros presenciais colaboraram no processo de divulgação e solicitação de preenchimento do questionário. Foi realizado um pré-teste (entre 8 e 12 de Outubro), cujos resultados permitiram avaliar e validar as questões definidas. Assim, em colaboração com as direções das escolas, estabeleceu-se como período de preenchimento dos questionários o período entre 15 de outubro e 4 de novembro, prazo que se previa alargado para que todos respondessem. No entanto, apesar da mobilização dos docentes, o número total de respostas na data prevista não se revelou satisfatório. De modo a garantir o volume de respondentes planeado, as direções desenvolveram conjuntamente com a equipa de pesquisa estratégias alternativas de mobilização dos professores. Apesar disso, em apenas uma escola o número de respostas aumentaram mais significativamente face às solicitações das direções, prolongando-se por essa razão o prazo de aplicação do inquérito até 15 de Dezembro. Apesar dos obstáculos encontrados na aplicação, foi possível recolher um conjunto significativo de resposta. Quadro 21 - Universo e amostra do inquérito por questionário aos docentes Total de Professores Escola E1 Escola E2 Escola E3 Total 100 75 87 262 Total de Respostas 34 34 57 125 % de inquiridos 34% 45% 65% 48% 3.2. CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO INQUIRIDA O conjunto de docentes inquiridos distribui-se de modo relativamente regular no que diz respeito ao sexo e à idade. A amostra é constituída maioritariamente por professoras, sendo na escola E1 que se verifica menor número de professores do sexo masculino. Tendencialmente, os inquiridos situam-se na faixa etária dos 41 aos 50 anos, seguida dos 29 aos 40 anos, com exceção da escola E2 que tem um grupo de inquiridos mais jovem, com menor proporção de professores acima dos 51 anos. 82 Quadro 22 - Sexo e idade dos docentes inquiridos (%) Sexo Idade Feminino Masculino Escola E1 85,3% 14,7% Escola E2 73,5% 26,5% Escola E3 71,9% 28,1% Total 76,0% 24,0% 29-40 20,6% 55,9% 31,6% 35,2% 41-50 50,0% 32,4% 40,4% 40,8% >51 29,4% 11,8% 28,1% 24,0% Ser professor é para a maioria dos inquiridos a profissão que desempenham há pelo menos 10 anos. Este indicador converge com a idade na análise por escola, verificando-se maior antiguidade na profissão para os docentes da escola E1. Se considerarmos o número de anos na escola como indicador de estabilidade do corpo docente, constata-se que em geral estas escolas são estáveis, na medida em que têm cerca de 84% dos seus professores há pelo menos 3 anos na escola. Estes valores alteram-se ligeiramente na análise por escola, com menor número de professores recentes (0 a 2 anos) na escola E1. Quadro 23 - Antiguidade dos docentes inquiridos na profissão e na escola (%) Anos na profissão Anos na escola 0 a 9 anos 10 a 19 anos > 20 anos 0 a 2 anos 3 a 5 anos > 5 anos Escola E1 5,9 Escola E2 20,6 Escola E3 7,0 Total 10,4 29,4 47,1 42,1 40,0 64,7 32,4 50,9 49,6 5,9 35,3 58,8 20,6 32,4 47,1 19,3 15,8 64,9 16,0 25,6 58,4 A maior parte dos professores inquiridos leciona e desempenha outro cargo ou função na escola, especialmente na escola E1 em que 85,3% dos docentes se encontra nesta situação. Entre os cargos ou funções ocupadas, as mais comuns relacionam-se com a direção de turma ou responsabilidades de liderança intermédia (como coordenação dos diretores de turma de ciclo ou coordenação de departamento). As tarefas de coordenação ou apoio a atividades estão mais presentes na escola E2, neste caso, acima dos cargos de liderança intermédia – o que aponta possivelmente para uma coordenação organizacional mais apoiada em projetos/ iniciativas do que em estruturas formais de articulação. Por sua vez, na escola E3 há a mesma proporção de professores com funções não letivas, além das letivas, e de professores com cargos de liderança intermédia. 83 Quadro 24 - Situação na escola e cargos ocupados pelos docentes inquiridos (%) Situação na escola Cargos/ funções Escola E1 14,7 Escola E2 38,2 Escola E3 40,4 Total 32,8 85,3 61,8 57,9 66,4 0,0 0,0 1,8 0,8 DT 38,2 35,3 26,3 32,0 Liderança intermédia 35,3 14,7 17,5 21,6 Funções não letivas Coordenação/ apoio Outro 14,7 11,8 14,7 11,8 29,4 8,8 17,5 10,5 15,8 15,2 16,0 13,6 Leciona Leciona e ocupa outras funções/ cargos Ocupa outras funções/ cargos Neste breve retrato verifica-se que os inquiridos são na sua maioria do sexo feminino e têm entre os 41 e os 50 anos, estão há pelo menos 10 anos na profissão e na escola respetiva há mais de 3 anos, na qual lecionam e ocupam outro cargo ou função, tendencialmente enquanto diretores de turma. Hipoteticamente os não respondentes serão docentes mais novos, há menos tempo na profissão e/ou na escola, ou pelo contrário, mais velhos e há mais anos na profissão e na escola, associando-se a pertença ao início ou final de carreira a uma condição de menor implicação na estrutura organizacional da escola. Por outro lado, pode haver a distinção entre um grupo de professores que se preocupam com a resolução do problema da violência e indisciplina na escola, e por isso se revele o seu interesse colaborando com resposta ao questionários, de outros, que não considerem que haja esse problema na escola ou que não é resolúvel, distanciando-se de pedidos de colaboração face ao mesmo. Estas variáveis sociográficas serão consideradas, sempre que se justificar, na análise das dimensões incluídas no inquérito. 3.3. INTEGRAÇÃO ORGANIZACIONAL DOS PROFESSORES A integração dos professores na organização escolar é uma dimensão significativa relativamente à problemática da violência na escola, uma vez que frequentemente é necessário acionar mecanismos internos para a resolução dos conflitos na escola e/ou desenvolver procedimentos de encaminhamento para outras entidades. Nesse sentido os docentes foram questionados no intuito de compreender como avaliavam o seu desempenho na escola, em que momentos participavam nas decisões da escola, como atuavam, a quem recorriam e quais as necessidades sentidas na resolução de conflitos. Apesar das variáveis não apresentarem associações positivas, a correlação entre a opinião dos docentes sobre o seu desempenho e a situação na escola permitiu verificar algumas distribuições relevantes. 84 Quadro 25 - Perceção individual da cultura profissional e situação na escola dos docentes inquiridos Situação na escola (%)37 Leciona Leciona e ocupa cargos 1 0,0% 1,2% Desempenho as minhas funções de forma adequada, 2 2,4% 0,0% correspondendo ao que é preciso 3 0,0% 19,3% 4 97,6% 79,5% 1 51,2% 61,4% 2 22,0% 13,3% O meu desempenho ainda não é suficiente, mas procuro esforçar-me 3 19,5% 19,3% 4 7,3% 6,0% 1 34,1% 15,7% 2 22,0% 47,0% Cada professor tem o seu método, não há desempenhos bons nem maus 3 36,6% 27,7% 4 7,3% 9,6% 1 9,8% 3,6% 2 0,0% 6,0% Tenho o apoio dos colegas para realizar o meu trabalho 3 43,9% 51,8% 4 46,3% 38,6% 1 58,5% 68,7% 2 31,7% 21,7% A escola é muito competitiva, não permitindo a cooperação entre os colegas para o exercício das suas funções 3 4,9% 6,0% 4 4,9% 3,6% 1 0,0% 3,6% 2 0,0% 6,0% O meu trabalho com os alunos é uma conquista diária 3 29,3% 22,9% 4 70,7% 67,5% 1 4,9% 1,2% 2 9,8% 6,0% Os alunos reconhecem o meu trabalho e valorizam-me por isso 3 53,7% 57,8% 4 31,7% 34,9% 1 4,9% 9,6% Por vezes há alunos que não se interessam pelas minhas 2 12,2% 22,9% aulas 3 70,7% 49,4% 4 12,2% 18,1% Legenda: 1 – Discordo totalmente; 2 – Discordo em parte; 3 – Concordo em parte; 4 – Concordo totalmente. Perceção individual da cultura profissional Tendencialmente, as conceções com maior discordância dos docentes são aquelas que apontam para uma representação negativa ou individualizada das suas práticas profissionais. No caso dos que consideram o seu desempenho insuficiente e a escola competitiva, sem cooperação dos colegas, os níveis de discordância são mais elevados para os que lecionam apenas. A primeira ideia apresenta, porém, uma proporção relativa de concordância (total ou parcial) com 25% do total de inquiridos. A conceção mais individualizada das práticas profissionais (Cada professor tem o seu método, não desempenhos bons nem maus) teve uma maioria de discordância, com tendência para os docentes que ocupam algum cargo além das funções letivas discordarem mais parcialmente. Esta opinião divide um pouco os inquiridos, havendo O desempenho exclusivo de outros cargos não foi significativo, apresentando-se apenas os resultados para a função letiva e a função letiva e de outros cargos em relação à situação dos inquiridos na escola. 37 85 Total 1,0% 1,0% 13,0% 86,0% 58,0% 16,0% 19,0% 6,0% 22,0% 39,0% 30,0% 9,0% 6,0% 4,0% 50,0% 41,0% 66,0% 25,0% 6,0% 4,0% 2,0% 4,0% 26,0% 68,0% 2,0% 7,0% 56,0% 34,0% 8,0% 20,0% 56,0% 16,0% no conjunto cerca de 40% a concordarem, especialmente aqueles que apenas lecionam. Relativamente à perceção dos inquiridos acerca da avaliação dos alunos sobre o seu desempenho profissional, os docentes tanto concordam com o reconhecimento e valorização dos seus discentes como com o desinteresse dos alunos pelas suas aulas. Os professores que também ocupam cargos tendem a concordar mais do que os que só lecionam, manifestando uma conceção mais positiva e a discordar mais com a conceção mais negativa (que no conjunto perfaz 28% de discordância – parcial ou total). Já a ideia de que o trabalho com os alunos é uma conquista diária tem a concordância de uma grande proporção de inquiridos, sobretudo daqueles que lecionam exclusivamente – com a totalidade de inquiridos nesta situação a concordar em parte ou totalmente. Por último, tanto a representação de um desempenho adequado como a do apoio dos colegas para a realização do trabalho têm níveis de concordância elevados, com os professores que ocupam cargos além da função letiva a concordarem de modo mais parcial do que aqueles que dão exclusivamente aulas. Estes resultados sublinham a importância do apoio entre professores sobretudo para aqueles que não desempenham de cargos e outras funções para além da letiva e que organizacionalmente se encontram mais isolados, dependendo mais de formas informais de organização de grupos de trabalho. Reforça-se assim a importância da implicação dos docentes na organização escolar nesta matéria e noutras. A distribuição destas representações por escola acompanha as tendências globais, não se verificando em geral diferenças muito significativas, com exceção de dois casos. A ideia de desempenho insuficiente apresenta uma maioria de discordos nas três escolas, contudo, na escola E3 há uma maior proporção de inquiridos que discordam e concordam parcialmente com esta afirmação. O entendimento do trabalho com os alunos ser uma conquista diária também revela alguma variação, pois apesar dos inquiridos concordarem em geral com esta afirmação, há maior proporção de concordâncias parciais na escola E2. Através do teste do Qui-quadrado verificámos que relação entre estas duas conceções e as escolas está associada positivamente, com valores de 14,357 (sig. 0,026) para o primeiro caso e de 16,079 (sig. 0,013) para o segundo. O conhecimento das regras da escola é outro indicador relevante na análise dos processos de gestão de conflitos, pois como temos vindo a demonstrar em estudos anteriores (Sebastião, Campos, Merlini, 2012a), um entendimento normativo partilhado por todos os elementos da escola constitui um fator chave na pacificação dos quotidianos escolares. Nesse sentido procuramos saber se os docentes não conheciam, conheciam ou conheciam bem o Regulamento Interno (RI) da respetiva escola. O facto de estarmos num período de transição e alterações legislativas significativas no momento do inquérito pode explicar em parte as respostas obtidas, com um número significativo de inquiridos a declarar conhecer o regulamento (62,5%). Esta distribuição por escola não apresentou diferenças significativas, seguindo a tendência global. Não conheço o Regulamento Interno foi selecionado somente três vezes, duas na escola E3 e uma na escola E2, representando uma parcela muito residual da amostra recolhida (3,5% e 2,9% do total de respostas, respetivamente). 86 Quadro 26 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno, por escola Escola (%) Conhece o RI Conheço bem E1 35,30% E2 35,30% E3 35,10% Total 35,20% Conheço 64,70% 61,80% 61,40% 62,40% Não conheço 0,00% 2,90% 3,50% 2,40% Por sua vez, a correspondência entre o conhecimento do Regulamento Interno e as funções ocupadas na escola apresenta uma distribuição ligeiramente diferente, com os elementos que desempenham funções não letivas e cargos de liderança intermédia a afirmarem conhecer melhor as regras da escola. Os inquiridos que coordenam e/ou dão apoio a atividades na escola, seguidos pelos diretores de turma, afirmam conhecer este documento orientador, sem que seja em profundidade. Quadro 27 - Conhecimento dos docentes inquiridos sobre Regulamento Interno, por funções na escola Funções na Escola (%) DT Liderança intermédia Funções não letivas Coordenaçã o e/ou apoio a atividades Total Conheço bem 40,0% 44,4% 47,4% 30,0% 35,20% Conheço 60,0% 55,6% 52,6% 70,0% 62,40% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 2,40% Conhece o RI 38 Não conheço A relação entre o conhecimento das regras e a articulação organizacional da escola nas situações de conflito apresentou a seguinte distribuição: 38 Não conhecer o atual regulamento interno só apareceu na opção funções "outras", sendo apenas especificado num caso – coordenador de departamento. 87 Quadro 28 - Articulação organizacional em situação de conflito e conhecimento dos docentes inquiridos sobre o Regulamento Interno Articulação organizacional Tenho instruções sobre os procedimentos em caso de conflito A escola disponibiliza instrumentos de participação/ queixa Comunico à escola a ocorrência de situações de conflito Sou informado das decisões sobre conflitos ou procedimentos disciplinares acerca dos meus alunos ou de mim Já redigi ou participei na formalização de referenciações de alunos a instituições (como a CPCJ, Polícia, etc.) Não Sim Não Sim Não Sim Não Conhece o atual RI da escola (%) Conheço Não Conheço bem conheço 6,8% 5,1% 66,7% 93,2% 94,9% 33,3% 0,0% 0,0% 33,3% 100,0% 100,0% 66,7% 2,3% 0,0% 33,3% 97,7% 100,0% 66,7% 22,7% 15,4% 66,7% Total 7,2% 92,8% 0,8% 99,2% 1,6% 98,4% 19,2% Sim 77,3% 84,6% 33,3% 80,8% Não Sim 34,1% 65,9% 33,3% 66,7% 100,0% 0,0% 35,2% 64,8% Os mecanismos organizacionais de regulação dos conflitos foram selecionados afirmativamente pela maioria dos inquiridos, com menor proporção relativa nos casos de participação a entidades externas e de conhecimento sobre as decisões tomadas. Os docentes que admitem não conhecer as regras da escola tendem a optar mais pela negativa nestas duas situações. Já as três primeiras apresentaram associações positivas relativamente ao conhecimento das regras da escola. Verifica-se uma maior tendência daqueles que conhecem as regras para estarem mais articulados, afirmando ter instruções sobre os procedimentos (Q2: 16,388 ; sig. 0,000); aceder a instrumentos de participação ou queixa (Q2: 40,995; sig. 0,000) e comunicar internamente situações de conflito (Q2: 20,583; sig. 0,000). Isto permite-nos demonstrar que o conhecimento das regras da escola não é irrelevante no processo de regulação das situações de conflito, pelo contrário, a importância da divulgação e discussão das regras e normas da escola revela-se fundamental na prevenção e intervenção face a situações de violência e indisciplina na escola. Outros aspetos analisados na vertente organizacional foram os recursos para atuar, tendo em conta os instrumentos considerados como mais importantes pelos inquiridos na gestão dos conflitos. 88 Quadro 29 - Recursos considerados importantes pelos docentes inquiridos na gestão de conflitos, por escola Escola (%) E1 E2 E3 Total 2,9% 0,0% 1,8% 1,6% 1 2,9% 5,9% 3,5% 4,0% 2 Procurar formação específica 55,9% 55,9% 59,6% 57,6% 3 38,2% 38,2% 35,1% 36,8% 4 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 1 2,9% 0,0% 0,0% 0,8% 2 Desenvolver trabalho com outros colegas 52,9% 29,4% 47,4% 44,0% 3 44,1% 70,6% 52,6% 55,2% 4 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 1 2,9% 2,9% 0,0% 1,6% 2 Aconselhamento ou intervenção de técnicos especializados 55,9% 44,1% 43,9% 47,2% 3 41,2% 52,9% 56,1% 51,2% 4 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 1 0,0% 2,9% 0,0% 0,8% 2 Procurar ou definir alternativas pedagógicas no acompanhamento de alunos 3 52,9% 26,5% 45,6% 42,4% 47,1% 70,6% 54,4% 56,8% 4 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 1 2,9% 2,9% 0,0% 1,6% 2 Contactar ou reunir com os Encarregados de educação 20,6% 29,4% 33,3% 28,8% 3 76,5% 67,6% 66,7% 69,6% 4 0,0% 2,9% 3,5% 2,4% 1 2,9% 5,9% 15,8% 9,6% 2 Encaminhar as situações para outras instâncias escolares ou públicas 79,4% 52,9% 54,4% 60,8% 3 17,6% 38,2% 26,3% 27,2% 4 5,9% 0,0% 7,0% 4,8% 1 0,0% 2,9% 8,8% 4,8% 2 Evitar a inimputabilidade dos culpados 44,1% 26,5% 26,3% 31,2% 3 50,0% 70,6% 57,9% 59,2% 4 0,0% 0,0% 3,5% 1,6% 1 5,9% 0,0% 0,0% 1,6% 2 Reagir no imediato 32,4% 41,2% 36,8% 36,8% 3 61,8% 58,8% 59,6% 60,0% 4 Legenda: 1 – Nada importante; 2 – Pouco importante; 3 – Importante; 4 – Muito importante. Recursos importantes na gestão conflitos Embora não se verifiquem associações significativas entre estas variáveis podemos constatar que os inquiridos não atribuem o mesmo nível de importância na análise por escola. Globalmente todos os docentes consideram estes instrumentos como importantes ou muito importantes para atuar nas situações de conflito. Desenvolver trabalho com colegas, recorrer a aconselhamento ou intervenção técnica e procurar ou definir alternativas pedagógicas de acompanhamento foram os recursos considerados de maior importância, com os inquiridos da escola E1 a apresentarem uma maior proporção relativa importante nas três categorias (52,9%; 55,9% e 52,9% respetivamente). Os docentes da escola E2 atribuem os valores mais elevados de muito importante ao desenvolvimento de trabalho com colegas e à definição de 89 alternativas pedagógicas (70,6% e 70,9% respetivamente). Contactar ou reunir com os Encarregados de Educação é outro mecanismo considerado como muito importante, havendo uma proporção relativa de docentes a atribuírem importante na escola E3 (33,3%). Estes dados reforçam os resultados analisados por escola relativamente aos princípios e orientações das respetivas direções nesta matéria, e de modo mais generalizado, no que à gestão organizacional diz respeito. A resposta dos docentes da escola E2 vai ao encontro do retrato de uma escola que tem na constituição de equipas escolares e com outros parceiros da comunidade uma prática comum e já com razoável antiguidade. De igual modo, a importância atribuída ao contacto com os familiares dos alunos como estratégia eficaz, tinha sido anteriormente apontada como traço do que consideram ser uma modalidade de atuação profícua, no que diz respeito à regulação de comportamentos desadequados na escola. A reação imediata também é valorizada, havendo um número igualmente significativo de docentes a classificar como importante, especialmente no caso da escola E2 (41,2%). Esta categoria foi considerada por alguns docentes da escola E1 como pouco importante (5,9%). À semelhança de pesquisas anteriores (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a) a celeridade da atuação parece constituir-se como estratégia fundamental na regulação dos comportamentos violentos e/ou de indisciplina. Em análises prévias, verificámos que tal permite atenuar os efeitos indesejados desses atos, seja pelo sentimento de justiça sentido pela restante comunidade escolar, seja por minorar o potencial aumento proporcional do problema. Verifica-se uma maior proporção de inquiridos a classificar como importante a procura de formação específica e o encaminhamento das situações de conflito para outras instâncias, como a última a ter maior número de docentes da escola E2 a valorizar como muito importante (38,2%). Por último, evitar a inimputabilidade dos culpados é, na sequências das outras, considerada globalmente como importante, mas as escolas distribuem-se de forma diferenciada na atribuição de importância. Os inquiridos da escola E2 são aqueles que atribuem valores mais elevados de muito importante (70,6%), os docentes da escola E1 a classificarem esta categoria em maior proporção como importante (44,1%) e os da escola E3 com maior percentagem de pouco ou nada importante (8,8% e 7,0% respetivamente). Considerando este conjunto de variáveis foi feita uma Análise de Componentes Principais (ACP) para verificar se estavam correlacionadas no sentido de construir um índice de recursos para a gestão de conflitos. O teste de Keiser-Meyer-Olkin (KMO) apresentou um valor aceitável de 0,72, isto é, que 72% da variância entre as variáveis corresponde a uma variância comum. Esta análise permitiu agrupar as variáveis em duas componentes: uma mais relacionada com recursos proactivos de gestão de conflitos e outra mais associada a mecanismos reativos. Na componente proactiva foram incluídas as categorias: Procurar formação específica; Desenvolver trabalho com outros colegas; Aconselhamento ou intervenção de técnicos especializados; Procurar ou definir alternativas pedagógicas no acompanhamento de alunos e Contactar ou reunir com os Encarregados de educação. O coeficiente do alpha de Cronbach para a construção do índice foi de 0,74, ou seja, estas variáveis apresentaram 74% de consistência interna, o que podemos admitir como valor aceitável. Na componente reativa, os mecanismos considerados foram: Encaminhar as situações para outras instâncias escolares ou públicas; Evitar a inimputabilidade dos culpados e Reagir no imediato. Neste caso o coeficiente foi relativamente mais baixo, com 54% de consistência interna, sendo tomadas as devidas precauções na 90 utilização deste índice no decurso da análise39. A distribuição destas novas variáveis por escola foi a seguinte: Quadro 30 - Índices de Gestão de conflitos por escola Escola (%) Recursos para a gestão de conflitos E1 E2 E3 Total 0,0% 2,9% 8,8% 4,8% 100,0% 97,1% 91,2% 95,2% Não é importante 5,9% 8,8% 1,8% 4,8% Importante 94,1% 91,2% 98,2% 95,2% Não é importante Índice de gestão reativa Importante Índice gestão proactiva (Escala KMO: 1-0,9 – Muito boa; 0,8-0,9 – Boa; 0,7-0,8 – Média; 0,6-0,7 – Razoável; 0,5-0,6 – Má; <0,5 – Inaceitável. Escala Alpha Cronbach: ≥ 0,9 – Excelente; 0,8-0,9 – Bom; 0,7-0,8 – Aceitável; 0,60,7 – Questionável; 0,5-0,6 – Fraco/ Baixo; <0,5 – Inaceitável) À semelhança do quadro anterior, verificamos que é atribuída uma importância global tanto aos instrumentos de carácter mais reativo como aos mais proactivos, contudo esta classificação apresenta algumas variações por escola que interessam destacar. Quer os inquiridos da escola E1 como os da escola E2 atribuem uma elevada importância aos mecanismos de gestão reativa, apresentando uma proporção relativamente mais baixa nos de gestão proactiva. Este último conjunto de ações tem maior importância atribuída pelos docentes da escola E3 e, em concordância, os valores mais baixos no índice de gestão reativa. A relação entre estes indicadores permite-nos retratar as escolas de um modo mais global, apontando para modos de gestão dos conflitos diferenciados entre escolas, mas com alguma convergência interna – o que nos permite afirmar que as dinâmicas organizacionais da escola têm um peso significativo na regulação das situações de conflito. Tais resultados reforçam as orientações das respetivas direções na resposta às situações de conflitualidade em sala de aula e no recreio40. Na escola E3 as orientações apontam sobretudo para uma intervenção a cargo da direção e, em menor escala, do gabinete de acolhimento e intervenção (GAI). Em posição intermédia encontra-se a escola E1 que tem como orientação sobretudo a intervenção por parte da equipa do gabinete de intervenção disciplinar (GID), contra a orientação da direção da escola E2 que delega nas direções de turma a maior responsabilidade, e complementarmente no gabinete de gestão de conflitos (GGC). Interessa ainda apresentar os dados mais detalhados relativos à frequência no recurso a elementos da escola para a resolução de situações de conflito por estabelecimento de ensino. 39 Este tipo de procedimento estatístico além de permitir a agregação de variáveis, possibilitou a sua conversão em variáveis métricas potenciando o tipo de análises realizadas com as diversas variáveis do inquérito. Com base no índice foram ainda criadas novas variáveis ordinais, no sentido de agrupar as distribuições de acordo com a escala de importância. 40 Analisadas neste relatório, no ponto 2 do capítulo V Escola. 91 Quadro 31 – Recurso a elementos da escola para a resolução de situações de conflito por estabelecimento de ensino dos docentes inquiridos Recurso a elementos da escola Nenhumas Raras Diretor(a) de Turma Algumas Muitas Nenhumas Raras Funcionários Algumas Muitas Nenhumas Raras Professores da Direção Algumas Muitas Nenhumas Raras Gabinete Escolar Algumas Muitas Nenhumas Raras Outros técnicos Algumas Muitas E1 2,9% 29,4% 52,9% 14,7% 20,6% 47,1% 32,4% 0,0% 26,5% 38,2% 29,4% 5,9% 17,6% 32,4% 47,1% 2,90% 35,3% 32,4% 32,4% 0,0% Escola (%) E2 E3 0,0% 5,3% 23,5% 15,8% 44,1% 50,9% 32,4% 28,1% 26,5% 21,1% 35,3% 42,1% 35,3% 35,1% 2,9% 1,8% 23,5% 12,3% 44,1% 28,1% 26,5% 56,1% 5,9% 3,5% 29,4% 10,5% 35,3% 35,1% 26,5% 47,4% 8,8% 7,0% 20,6% 17,5% 26,5% 33,3% 41,2% 45,6% 11,8% 3,5% Total 3,2% 21,6% 49,6% 25,6% 22,4% 41,6% 34,4% 1,6% 19,2% 35,2% 40,8% 4,8% 17,6% 34,4% 41,6% 6,4% 23,2% 31,2% 40,8% 4,8% O/A Diretor(a) de Turma juntamente com Outros técnicos são os elementos da escola a quem os inquiridos recorrem com maior frequência, com tendência para os docentes da escola E1 recorrem menos frequentemente a estas figuras de resolução de conflitos. O recurso aos restantes elementos verifica-se de modo mais esporádico (algumas ou raras vezes), com os docentes da escola E2 a apelarem com menor frequência ao Gabinete Escolar e aos Funcionários. Na escola E1 o recurso aos Funcionários e aos Professores da Direção é igualmente baixo. Por sua vez os docentes da escola E3 apelam com alguma frequência aos Funcionários, bem como aos Professores da Direção, assumindo esta um instrumento mais central na gestão de conflitos desta escola por comparação às restantes. Foi também realizada uma ACP para este conjunto de variáveis, resultando numa só componente (KMO = 0,79) que interpretámos como Índice de Recurso a elementos na escola. Esta análise possibilitou a criação de uma nova variável métrica, tendo um nível de consistência interna aceitável (Alpha = 0,78). A observação desta nova escala por escola confirmou os dados anteriores, constatando-se uma tendência para recorrer frequentemente a elementos da escola (64,0%), com especial preponderância dos docentes da escola E3 (71,9%). No caso da escola E2 esta distribuição é em parte explicada pelo facto de haver uma maior delegação de poderes, cabendo a intervenção à direção apenas quando os outros elementos não são bem sucedidos. Tendo como hipótese que as conceções sobre o desempenho profissional têm influência na frequência com que os docentes recorrem a elementos da escola para 92 atuar nos conflitos, foram realizados alguns testes. Procurando analisar se as conceções dos docentes sobre o respetivo desempenho estavam relacionadas com o recurso a elementos da escola para intervir nos conflitos mediu-se o Qui-quadrado e realizou-se uma correlação bivariada para testar estas variáveis. Nesse sentido verificou-se que o desempenho adequado e o trabalho dos alunos ser uma conquista diária estavam associadas positivamente com o recurso a elementos da escola para intervir. A conceção mais individualizada do desempenho está correlacionada com o recurso a elementos, numa dependência não linear positiva fraca. Apesar disso, isto significa que ambas as variáveis estão de alguma forma relacionadas. Quadro 32 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre as práticas profissionais e o recurso a elementos para intervir Recurso a elementos para intervir Pearson Qui-quadrado Sig. (2-tailed) Correlation Opinião práticas profissionais Desempenho as minhas funções de forma adequada, correspondendo ao que é preciso Cada professor tem o seu método, não há desempenhos bons nem maus O meu trabalho com os alunos é uma conquista diária 121,110/ 0,000 -0,153 0,089 60,546/ 0,349 ,180 0,045 75,291/ 0,053 0,142 0,115 Outra hipótese que interessava testar era se o recurso a elementos da escola para atuar em situação de conflito estava relacionado com a importância dada às necessidades de atuação a nível organizacional. Recorreu-se para o efeito a uma análise univariada, tendo como variável dependente o recurso a elementos na escola. Quadro 33 - Recurso a elementos e índices de gestão de conflitos (ANOVA) Variável dependente: recurso a elementos Tests of Between-Subjects Pearson Correlation Effects Sig. df Sig. (2-tailed) Fatores Índice de Gestão reativa 0,205 6 0,622 Índice de Gestão proactiva 0,428 7 0,166 0,078 21 x Efeito conjugado 2 R = 0,345 Levene sig. 0,000 Apesar de se verificar o pressuposto de homogeneidade e do coeficiente de determinação R2 medir cerca de 34,5% da variabilidade explicada pelo modelo de regressão, o resultado da análise validou a hipótese nula, não se verificando diferenças significativas entre as variáveis. 3.4. ATIVIDADE PEDAGÓGICA E PRÁTICAS DISCIPLINARES 93 Além da dimensão organizacional, a dimensão pedagógica constitui um factor igualmente significativo na análise dos processos de regulação da violência na escola. A relação mantida entre os professores e os alunos na sala de aula implica o estabelecimento de autoridade e legitimidade para que o processo de edução e aprendizagem possa ser bem sucedido. É por isso importante analisar a atividade educativa e respetivas práticas disciplinares dos docentes. Um primeiro aspecto que importou observar foi a seleção dos factores considerados importantes na resolução conflitos por parte dos docentes das escolas. Quadro 34 - Fatores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos por escola dos docentes inquiridos Fatores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos: Escola (%) E1 E2 E3 Aumento das sanções N 11 % 23,9% N 14 % 30,4% N 21 % 45,7% Total N % 46 36,8% Apoio nos estudos 0 0,0% 5 50,0% 5 50,0% 10 8,0% Acompanhamento dos alunos 14 21,5% 20 30,8% 31 47,7% 65 52,0% Vigilância e controlo dos alunos 14 28,6% 14 28,6% 21 42,9% 49 39,2% Sensibilizar os alunos para as regras da escola 20 34,5% 14 24,1% 24 41,4% 58 46,4% Envolver os alunos nos processos de decisão Envolver os pais na aplicação de medidas disciplinares (corretivas ou sancionatórias) 12 25,0% 12 25,0% 24 50,0% 48 38,4% 29 31,2% 21 22,6% 43 46,2% 93 74,4% A análise revelou que o envolvimento dos pais na aplicação de medidas disciplinares constitui o fator globalmente considerado como mais importante pelos inquiridos, com a escola E3 a apresentar maior proporção de docentes a eleger este fator. Os docentes desta escola apresentam as percentagens mais elevadas em todas as opções, o que em parte se explica pelo maior número de respostas dadas, por um lado, e que vem reforçar as respostas sobre importância na relação de proximidade com as famílias encontradas em perguntas anteriores, por outro. O acompanhamento dos alunos e a sensibilização para as regras da escola surgem em segundo lugar na ordem de importância global. A opção com menor número de nomeações foi o apoio nos estudos, não sendo escolhida por nenhum docente na escola E2. O peso destes fatores por escola é no entanto variável. O envolvimento dos pais nas medidas mantém-se como fator de maior importância nas três escolas, mas enquanto para os docentes das escolas E3 e E2 o acompanhamento dos alunos representa uma ação de grande importância, na escola E1 é a sensibilização dos alunos para as regras que ocupa este lugar nas escolhas dos inquiridos. Relativamente às práticas disciplinares dos docentes inquiridos verificou-se a seguinte distribuição por escola. 94 Quadro 35 - Práticas disciplinares dos docentes inquiridos, por escola Escola (%) E1 E2 E3 0,0% 0,0% 0,0% 1 0,0% 0,0% 0,0% 2 Procuro sensibilizar os alunos da turma para terem comportamentos pacíficos 8,8% 11,8% 12,3% 3 91,2% 88,2% 87,7% 4 0,0% 0,0% 0,0% 1 0,0% 0,0% 1,8% 2 Converso com os alunos sobre o problema da Violência e da Indisciplina 23,5% 35,3% 43,9% 3 76,5% 64,7% 54,4% 4 2,9% 0,0% 0,0% 1 2,9% 2,9% 8,8% 2 Atribuo uma tarefa ao(s) aluno(s) 47,1% 50,0% 70,2% 3 47,1% 47,1% 21,1% 4 11,8% 14,7% 14,0% 1 76,5% 64,7% 73,7% 2 Expulso o(s) aluno(s) da sala 11,8% 20,6% 12,3% 3 0,0% 0,0% 0,0% 4 8,8% 17,6% 8,8% 1 61,8% 58,8% 54,4% 2 Encaminho o(s) aluno(s) para outras pessoas na escola e/ ou para outros departamentos/ sectores 26,5% 23,5% 35,1% 3 2,9% 0,0% 1,8% 4 55,9% 55,9% 36,8% 1 38,2% 38,2% 54,4% 2 Chamo alguém da escola para me socorrer ou levar o(s) aluno(s) da sala 5,9% 5,9% 8,8% 3 0,0% 0,0% 0,0% 4 2,9% 0,0% 0,0% 1 5,9% 8,8% 7,0% 2 Acalmo o(s) aluno(s) naquele momento e no final da aula peço para esperarem de forma a ter uma conversa 47,1% 35,3% 50,9% 3 44,1% 55,9% 42,1% 4 11,8% 17,6% 10,5% 1 38,2% 52,9% 52,6% Grito com o(s) aluno(s) para eles se calarem/ pararem com 2 o conflito 44,1% 26,5% 33,3% 3 5,9% 2,9% 3,5% 4 0,0% 0,0% 0,0% 1 0,0% 0,0% 1,8% 2 Intervenho de forma imediata na situação 11,8% 17,6% 28,1% 3 88,2% 82,4% 70,2% 4 Legenda: 1 – Nenhuma vez; 2 – Raras vezes; 3 – Algumas vezes; 4 – Muitas vezes. Com que frequência utiliza algumas destas estratégias de resolução da indisciplina e conflitos em sala de aula: Total 0,0% 0,0% 11,2% 88,8% 0,0% 0,8% 36,0% 63,2% 0,8% 5,6% 58,4% 35,2% 13,6% 72,0% 14,4% 0,0% 11,2% 57,6% 29,6% 1,6% 47,2% 45,6% 7,2% 0,0% 0,8% 7,2% 45,6% 46,4% 12,8% 48,8% 34,4% 4,0% 0,0% 0,8% 20,8% 78,4% No cômputo global, expulsar os alunos da sala de aula e chamar alguém para ajudar são as práticas mais raras segundo os docentes inquiridos. Facto que não deixa de ser interessante, uma vez que o recurso a elementos na escola apresentou valores elevados para todas as escolas, especialmente a E3. Em consonância, verifica-se que chamar alguém para ajudar na resolução de conflitos tem uma frequência ligeiramente mais alta nessa escola. Encaminhar alunos para outras instâncias e gritar com os alunos encontram-se entre as práticas assumidas pelos docentes como esporádicas, sendo a primeira mais frequente na escola E3 e a segunda na escola E1. As restantes são na regulação dos conflitos frequentemente usadas pelos inquiridos, com os docentes da escola E3 a apresentarem uma frequência ligeiramente mais baixa comparativamente às outras escolas. 95 Considerando este conjunto de variáveis também foi realizada uma Análise de Componentes Principais (ACP) para verificar se as mesmas estavam correlacionadas no sentido de construir índices de práticas disciplinares. O teste de KMO apresentou um valor razoável de 0,61, ou seja, 61% da variância entre as variáveis corresponde a uma variância comum. Esta análise permitiu agrupar as variáveis em duas componentes, uma mais relacionada com práticas disciplinares de resolução própria de sentido pacificador – em que os professores resolvem por si as situações na sala de aula – e outra mais associada a práticas renunciantes/apoiadas noutros – isto é, a situações em que os professores recorrem a outros elementos da escola para solucionar o problema. Na componente pacificadora foram incluídas as categorias: Procuro sensibilizar os alunos da turma para terem comportamentos pacíficos; Converso com os alunos sobre o problema da Violência e da Indisciplina; Atribuo uma tarefa ao(s) aluno(s). Estas variáveis apresentaram 60% de consistência interna para a construção do índice. A componente de natureza renunciante e que busca apoio noutros elementos da escola agregou: Expulso o(s) aluno(s) da sala; Encaminho o(s) aluno(s) para outras pessoas na escola e/ou para outros departamentos/ sectores; Chamo alguém da escola para me socorrer ou levar o(s) aluno(s) da sala. Neste caso o coeficiente do alpha de Cronbach foi de 0,65. As variáveis Acalmo o(s) aluno(s) naquele momento e no final da aula peço para esperarem de forma a ter uma conversa; Grito com o(s) aluno(s) para eles se calarem/ pararem com o conflito; Intervenho de forma imediata na situação não foram incluídas na criação dos índices por não terem capacidade explicativa. A distribuição das novas variáveis criadas por escola foi a seguinte. Quadro 36 - Índices de práticas disciplinares por escola dos docentes inquiridos Escola E1 Práticas disciplinares Pacificadoras E2 E3 Total N % (linha) % (coluna) N % (linha) % (coluna) N % (linha) % (coluna) N % (linha) % (coluna) Frequente 34 27,2% 100,0% 34 27,2% 100,0% 57 45,6% 100,0% 125 100,0% 100,0% Raro 24 29,3% 70,6% 25 30,0% 73,5% 33 40,2% 57,9% 82 100,0% 65,6% Frequente 10 23,3% 29,4% 9 20,9% 26,5% 24 55,8% 42,1% 43 100,0% 34,4% Renunciantes Estes resultados permitem retratar globalmente a posição dos docentes das escolas relativamente aos dois estilos de práticas disciplinares identificados. Tal como na distribuição anterior, verifica-se que os inquiridos da escola E3 distinguem-se em parte dos restantes, apresentando maior proporção tanto na frequência de práticas pacificadoras como de práticas renunciantes. Estes dados apontam assim para uma maior uniformidade dos docentes das escolas E1 e E2 e uma relativa divisão do grupo profissional na escola E3. Considerando a avaliação da eficácia dos castigos para a melhoria do comportamento dos alunos, podemos observar a seguinte distribuição por escola: 96 Quadro 37 – Efeito dos castigos ou tarefas na melhoria do comportamento dos alunos por escola dos docentes inquiridos Efeito dos castigos ou tarefas na melhoria do comportamento dos alunos: E1 8,8% 1 55,9% 2 Advertência ou repreensão oral 29,4% 3 5,9% 4 2,9% 1 Ordem de saída da sala de aula 41,2% 2 ou outros locais de desenvolvimento do trabalho 55,9% 3 escolar 0,0% 4 8,8% 1 Realização de tarefas e atividades 2 11,8% de integração na escola ou na 61,8% 3 comunidade 17,6% 4 0,0% 1 Condicionamento no acesso a 29,4% 2 espaços escolares ou na utilização de certos materiais e 50,0% 3 equipamentos 20,6% 4 2,9% 1 26,5% 2 Proibição de participar em atividades não letivas 50,0% 3 20,6% 4 Trabalhos de casa/ tarefas 0 extra 0 Responsabilizar/ contactar EE Motivar/ dialogar/ acompanhar e responsabilizar 2 (40%) o aluno Outra 2 (40%) Suspender/ transferir Proibição de participar em 0 atividades Condicionamento no acesso a 0 espaços/ tempos/ relacional 1 (20%) Trabalho comunitário Legenda: 1 – Nada eficaz; 2 – Pouco eficaz; 3 – Eficaz; 4 – Muito eficaz. Escola (%) E2 E3 2,9% 8,8% 35,3% 54,4% 55,9% 28,1% 5,9% 8,8% 0,0% 7,0% 38,2% 35,1% 58,8% 50,9% 2,9% 7,0% 0,0% 0,0% 5,9% 15,8% 64,7% 57,9% 29,4% 26,3% 0,0% 1,8% 14,7% 24,6% 61,8% 36,8% 23,5% 36,8% 0,0% 1,8% 20,6% 22,8% 41,2% 47,4% 38,2% 28,1% Total 7,2% 49,6% 36,0% 7,2% 4,0% 37,6% 54,4% 4,0% 2,4% 12,0% 60,8% 24,8% 0,8% 23,2% 47,2% 28,8% 1,6% 23,2% 46,4% 28,8% 1 (8%) 3 (15%) 4 (11%) 4 (33%) 7 (35%) 11 (30%) 3 (25%) 1 (5%) 6 (16%) 0 3 (15%) 5 (13,5%) 2 (16%) 3 (15%) 5 (13,5%) 2 (16%) 0 2 (5%) 0 3 (15%) 4 (11%) Em termos gerais, os inquiridos distinguem dois conjuntos de medidas pela sua eficácia na melhoria dos comportamentos. Num primeiro grupo, considerado pela sua maior eficácia, estão as medidas de Condicionamento no acesso a espaços escolares ou na utilização de certos materiais e equipamentos; Proibição de participar em atividades não letivas e Realização de tarefas e atividades de integração na escola ou na comunidade. A importância destas medidas é corroborada pelo número de propostas de outras, análogas a estas categorias, que se apresentam no final do quadro. A Advertência ou repreensão oral e a Ordem de saída de sala de aula ou outros locais de desenvolvimento do trabalho escolar surgem com uma eficácia relativa, com tendência para os docentes a avaliarem mais frequentemente como 97 pouco eficaz ou eficaz. Nas sugestões de outras medidas a responsabilização ou contacto com o encarregado de educação é a medida com maior número de respostas, seguida da responsabilização, acompanhamento, motivação ou diálogo com o aluno. Na análise por escola constata-se que, embora as escolas sejam convergentes com o padrão global identificado, os inquiridos da escola E2 avaliaram as medidas como eficazes ou muito eficazes com maior frequência. No intuito de saber se a importância dos factores de resolução dos comportamentos violentos estava correlacionada com o tipo de práticas disciplinares desempenhadas, foi feita uma análise bivariada para testar esta relação. Os resultados validaram a hipótese nula não se verificando valores significativos que explicassem a relação entre estas variáveis. Por sua vez, a correlação entre as práticas disciplinares e a eficácia dos castigos na melhoria dos comportamentos dos alunos, apresentou resultados significativos para três variáveis no caso das práticas renunciantes. Quadro 38 - Relação entre a eficácia dos castigos e as práticas disciplinares dos docentes inquiridos Efeito dos castigos na melhoria dos comportamentos dos alunos Variáveis dependentes Práticas renunciantes Práticas pacificadoras Pearson Qui-quadrado Pearson Correlation Correlation Value / Sig. Advertência ou repreensão oral Ordem de saída da sala de aula ou outros locais de desenvolvimento do trabalho escolar Realização de tarefas e atividades de integração na escola ou na comunidade Sig. (2-tailed) 0,031 (negativa) Sig. (2-tailed) 76,054/ 0,000 0,012 0,348 68,526/ 0,000 0,041 (negativa) 0,934 41,022/ 0,087 0,078 Constata-se que a ordem de saída de sala de aula está correlacionada e associada positivamente com as práticas renunciantes, o que pode ser em parte explicado por se tratar de uma medida que não implica menor responsabilidade do professor na sua aplicação. Por outro lado, a advertência ou repreensão oral e a realização de tarefas encontram-se correlacionadas negativamente com o desempenho de práticas renunciantes. O motivo encontrado para esta relação negativa entre as variáveis aponta no mesmo sentido, quanto maior a eficácia atribuída à advertência ou à realização de tarefas menor a identificação com práticas renunciantes. Por último, considerando a relação entre os critérios mais importantes na decisão de aplicar um castigo e as estratégias relevantes para lidar com os comportamentos reincidentes foi testada a associação e correlação entre as variáveis. 98 Quadro 39 - Relação entre os critérios importantes na aplicação dos castigos e as estratégias para lidar com a reincidência dos docentes inquiridos Estratégias para lidar com a reincidência Alteração dos castigos ou tarefas que são aplicados Agravamento das sanções Participação ou queixa a entidade policial ou judicial Quais são os critérios que mais pesam na decisão de aplicar um castigo O(s) aluno(s) que melhora(m) o seu O(s) aluno(s) que se recusa(m) a comportamento cumprir o castigo aplicado QuiPearson Sig. (2QuiPearson Sig. (2quadrado Correlation tailed) quadrado Correlation tailed) 5,825/ 0,016 ,216 0,016 1,383/ 0,240 -0,105 0,243 5,445/ 0,020 -,209 0,020 2,120/ 0,145 0,130 0,148 1,592/ 0,207 -0,113 0,210 4,265/ 0,039 ,185 0,039 A melhoria do comportamento dos alunos surge correlacionada e associada positivamente com as alteração dos castigos, isto é, os docentes que apoiam a alteração das medidas aplicadas como estratégia para lidar com a reincidência dos alunos, tendem a considerar a melhoria do comportamento dos alunos como critério importante na aplicação dos castigos. Em sentido inverso, o agravamento das sanções está correlacionado negativamente com o critério de melhoria do comportamento dos alunos. Quer dizer que os docentes que têm como critério a melhoria do comportamento dos alunos tendem a não usar o agravamento das sanções como estratégia para lidar com os comportamentos reincidentes. Estas relações apontam para dois possíveis grupos de docentes na definição de estratégias e aplicação de castigos, um mais "brando" – que privilegia a melhoria dos comportamentos e uma mudança de abordagem para os alunos reincidentes – e um mais "severo" – que tende a agravar as sanções aplicadas, atribuindo menor importância à melhoria dos comportamentos. Por último, verifica-se ainda que os docentes que avaliam como critério importante a recusa no cumprimento de castigos, tendem a recorrer mais à participação ou queixa a entidades policiais ou judiciais enquanto estratégia para lidar com os comportamentos reincidentes. As variações de posicionamento dos docentes das escolas relativamente à eficácia das medidas na melhoria dos comportamentos dos alunos e tipo de medida a aplicar mais regularmente sublinha a importância de as direções das escolas e as lideranças intermédias procurarem garantir a mobilização dos docentes em torno de um conjunto comum de orientações por escola. Parte significativa dos comportamentos de indisciplina resultam da incoerência na aplicação de medidas por parte dos diversos professores, com quem os alunos passam parte do seu tempo escolar. Noutros trabalhos de equipas que se ocuparam da análise sobretudo do fenómeno da indisciplina este foi considerado como um dos fatores mais determinantes (Sebastião, Alves e Campos, 2003). 99 3.5. REPRESENTAÇÕES SOBRE A ESCOLA E A VIOLÊNCIA As representações dos professores sobre a escola e sobre a violência na escola associam-se às dimensões organizacional e pedagógica, na medida em que traduzem frequentemente os modos de organização da escola. Procurou-se por isso inquirir os a docentes sobre o seu entendimento relativamente ao clima de escola, à violência na escola e aos fatores para a ocorrência de conflitos. Partindo de um conjunto de motivos frequentemente apontados e identificados em investigações anteriores pediuse aos professores que se posicionassem sobre os mesmos. Quadro 40 - Principal fator considerado pelos docentes inquiridos para que ocorram situações de conflito na sala de aula, por escola Opiniões contrárias entre os elementos da discussão E1 17,6% Escola (%) E2 E3 20,6% 21,1% Motivos políticos, religiosos ou étnicos (culturais...) 2,9% 5,9% 3,5% 4,0% A puberdade/ fase de vida das crianças em que há maior agitação 32,4% 32,4% 36,8% 34,4% Os modelos de vida da(s) família(s) a que pertence(m) o(s) autor(es) O conflito é uma situação que é normal ocorrer nas interações humanas Provocação ou intimidação 76,5% 79,4% 82,5% 80,0% 5,9% 11,8% 10,5% 9,6% 52,9% 41,2% 36,8% 42,4% Fator principal para ocorrerem situações de conflito na sala de aula Total 20,0% Os professores inquiridos, de modo expressivo, indicam como fator explicativo para a ocorrência de conflitos em sala de aula os modelos de vida da(s) família(s) a que pertence(m) o(s) autor(es). Esta representação aponta para uma causalidade anterior e exógena à escola, residindo na família a principal responsabilidade para a emergência de situações de conflito. As famílias e os seus modelos educativos e culturais são considerados como fatores explicativos, assim como os fatores que podemos designar por situacionais, e que se prendem com a situação geradora do conflito. Assim, o segundo motivo globalmente selecionado pelos inquiridos Provocação ou Intimidação apresenta valores igualmente elevados e situa como principais causas da violência as atitudes do(s) aluno(s). Menos significativo, mas complementar a esta ideia as Opiniões contrárias entre os elementos da discussão reúne valores mais baixos, mas não residuais. Os fatores que se prendem com Motivos políticos, religiosos ou étnicos (culturais...) apresentam os valores mais baixos, distanciando-se de uma leitura que associe o conflito a crenças, diferenças culturais e/ou comportamentos de natureza racista, por exemplo. Pelo contrário, entendem o conflito como prática comum nesta faixa etária, com uma relativa naturalização dos comportamentos violentos, seja pela assunção destes enquanto traço da etapa de desenvolvimento das crianças com a escolha da afirmação relativa à A puberdade/ fase de vida das crianças em que há maior agitação ou de modo mais alargado, com o entendimento d’ O conflito é uma situação que é normal ocorrer nas interações humanas, tal como já se tinha verificado na análise às entrevistas aos elementos das direções das escolas. Verifica-se assim que os professores inquiridos consideram genericamente como principal motivo de conflito, por um lado os fatores exteriores à escola e às 100 caraterísticas dos modelos familiares divergentes face à cultura escolar. Por outro lado, os fatores situacionais, seja pelo comportamento dos alunos de intimidação e provocação, seja por considerarem que nesta idade e em situação de sala de aula é comum a ocorrência de conflitos. Tendo como hipótese que a importância que as representações dos professores relativas ao clima de escola tem influência na avaliação sobre as situações de violência na escola respetiva dos inquiridos, foram realizados testes estatísticos para analisar a relação entre estas variáveis. 101 Quadro 41 - Relação entre a opinião dos docentes inquiridos sobre o clima de escola e a avaliação das situações de violência na escola Na escola, os casos de violência e indisciplina São frequentes Não são frequentes Foram frequentes mas diminuíram Não diminuem porque as medidas implementadas não têm resultado Não necessitam de uma atenção particular Na sua opinião o clima desta escola é: Facilitador de conflitos Quiquadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) ,385 0,000 -,363 0,000 9,234/ 0,026 -,271 0,002 14,902/ 0,002 ,342 9,098/ 0,028 -,209 22,462/ 0,000 17,542/ 0,001 Propício a momentos de tranquilidade Quiquadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) -,474 0,000 ,391 0,000 18,520/ 0,000 ,372 0,000 0,000 14,522/ 0,002 -,329 0,019 2,313/ 0,510 0,124 33,655/ 0,000 21,945/ 0,000 Variável, consoante a fase do dia Quiquadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) -0,043 0,631 -,256 0,004 2,465/ 0,482 0,140 0,119 0,000 0,777/ 0,855 0,064 0,167 4,067/ 0,254 -0,101 0,453/ 0,929 8,579/ 0,035 Construído pelos elementos da comunidade escolar Quiquadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) -,195 0,029 -0,001 0,99 3,906/ 0,272 0,151 0,093 0,479 3,462/ 0,326 -0,097 0,263 3,833/ 0,280 -0,143 5,473/ 0,140 0,964/ 0,810 Em parte explicado pelos alunos que a frequentam Quiquadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) 0,117 0,193 -,286 0,001 8,514/ 0,037 -0,107 0,236 0,284 8,707/ 0,033 0,119 0,188 0,110 0,710/ 0,871 0,016 0,863 8,655/ 0,034 18,217/ 0,000 A análise permitiu constatar uma convergência entre as representações sobre o clima de escola e a violência, com posicionamentos diferenciados que se podem agrupar em dois grupos. De um lado, encontram-se os docentes que avaliam as situações de violência nas suas escolas como frequentes, considerando que as medidas tomadas não têm sido bem sucedidas. Estes professores consideram o clima de escola como facilitador de conflitos e pouco propício a momentos de tranquilidade. Os que classificam a violência na escola como frequente consideram ainda que o clima de escola não é construído pelos elementos da comunidade escolar.Num outro grupo estão os inquiridos que consideram que a violência na sua escola como não é frequente ou como tendo diminuído avaliando o clima de escola como propício a momentos de tranquilidade e pouco facilitador de conflitos (correlações negativas com níveis de significância inferiores a 0,005). Destes, os que consideram que a violência não é frequente tendem a considerar o clima de escola estável (não é variável, consoante a fase do dia) e não o associam às características da população discente (não é em parte explicado pelos alunos que a frequentam). 102 Aqueles que não dão importância às situações de conflito na escola (Não necessitam de uma atenção particular) tendem a avaliar o clima de escola como pouco facilitador de conflitos. Estes resultados reforçam o que se afirmou anteriormente em relação à necessidade de reconhecimento e identificação das conceções e representações dos professores41, entre outros intervenientes na escola e restante território educativo. A definição de estratégias e planos escolares de atuação comum face ao problema da violência e indisciplina na escola tem que partir do reconhecimento da diversidade e diferenciação de posicionamentos e entendimentos. Tal diversidade face aos fenómenos implica a aferição numa primeira etapa, para que da discussão e em face ao que consideram ser as manifestações e as causas do problema e consequentemente os modos de atuação de prevenção e intervenção adequados, haja uma tomada de decisão mais informada e participada. 3.6. REPRESENTAÇÕES, PRÁTICAS E PARTICIPAÇÃO DOCENTE Tendo em conta a análise anteriormente apresentada procurou-se cruzar os diversos indicadores no sentido de aprofundar analiticamente a compreensão sobre as representações, práticas e integração dos docentes nos processos de regulação da violência na escola. Tomando as práticas disciplinares como variáveis dependentes, foram realizadas algumas análises multivariadas e univariadas no sentido de compreender quais os fatores que melhor as explicavam. No caso das práticas renunciantes, foram realizadas duas análises multivariadas tendo em conta as variáveis consideradas nas dimensões organizacional e pedagógica. Quadro 42 - Análise Multivariada das práticas disciplinares renunciantes (MANOVA) Fatores Variável dependente: Práticas disciplinares renunciantes Multivariat Tests of Between-Subjects Pearson Qui-quadrado e Tests Effects Correlation Sig. Sig. df Sig. (2-tailed) Value / Sig. Recurso a elementos da escola 0,029 0,097 19 0,000 173,587/ 0,617 Regulamento Interno 0,177 0,178 2 0,179 23,087/ 0,285 x x 2 Efeito conjugado 0,033 R = 0,389 Ordem de saída de sala de aula 0,021 0,036 3 0,012 76,054/ 0,000 Vigilância e controlo dos alunos 0,000 0,000 1 11,444/ 0,324 Efeito conjugado 0,002 0,001 3 0,233 Cf. tabela práticas x fatores resolução R2 = 0,204 41 Levene sig. 0,002 Levene sig. 0,019 Ponto 2., Capítulo IV. Escola. 103 x As práticas disciplinares renunciantes relacionam-se com o recurso a elementos da escola (como os auxiliares, diretores de turma, técnicos das escolas, etc.) apontando para uma maior solicitação de outros para a apoio aos professores na resolução de conflitos. Esta correlação evidencia a existência de práticas disciplinares mais propícias a recorrer a outros do que à resolução por parte dos próprios professores. Embora o conhecimento do Regulamento Interno não esteja associado a este tipo de práticas, o seu efeito conjugado com o recurso a outros elementos da escola também apresenta valores significativos, numa análise multivariada em que se validou o pressuposto de homogeneidade (Levene sig. 0,002), com o coeficiente de determinação (R2) a medir 38,9% da variabilidade explicada pelo modelo de regressão. Por outro lado, tanto a ordem de saída da sala como a vigilância e o controlo dos alunos encontram-se correlacionadas com práticas disciplinares renunciantes, tendo um efeito conjugado significativo na explicação deste tipo de práticas. Com o pressuposto da homogeneidade validade (Levene sig. 0,019) e 20,4% da variabilidade explicada pelo modelo, verifica-se que os inquiridos que elegem a ordem de saída da sala e a vigilância e controlo dos alunos são os que afirmam com maior frequência a adoção de práticas renunciantes. Estes professores privilegiam assim na sua ação a adoção de estratégias mais "restritivas" optando com maior frequência pela renúncia à tomada de decisão per si na resolução das situações de conflito. É fundamental que tais resultados sejam tidos em conta na definição organizacional das estratégias de intervenção da escola, a responsabilidade e poder dos professores pode distribuir-se de modos mais ou menos delegados, mais ou menos equitativos face a outros elementos das escolas, nomeadamente as direções. A afirmação da autoridade dos professores é por um lado organizacionalmente definida, com a tomada de decisão sobre os modos de intervenção em cada escola, mas por outro, é pelos próprios professores, individual e coletivamente construída pelo tipo de práticas pelas quais optam, e pelo tipo de relação que com os alunos e com os outros elementos escolares estabelecem. Por outro lado, foi igualmente possível testar outras variáveis dos diferentes domínios tendo como variável dependente as práticas renunciantes dos docentes. 104 Quadro 43 - Práticas disciplinares renunciantes: fatores associados Tenho o apoio dos colegas para realizar o meu trabalho Variável dependente: Práticas renunciantes QuiSig. (2Pearson Sig. (2quadrado sided) Correlation tailed) -0,053 0,088 49,019 0,016 Os alunos reconhecem o meu trabalho e valorizam-me por isso 70,923 0,000 -0,224 0,012 Por vezes há alunos que não se interessam pelas minhas aulas 39,818 0,108 0,209 0,020 Participa em reuniões da área disciplinar 30,231 0,001 -0,230 0,010 Índice participação interna escola (métrico) 41,935 0,072 -0,199 0,026 Comunico à escola a ocorrência de situações de conflito 21,064 0,021 -0,039 0,663 Recorre a Diretor de Turma 41,272 0,082 0,313 0,000 Recorre a Funcionários 29,461 0,493 0,180 0,045 Recorre a Professor Direção 38,695 0,133 0,287 0,001 Recorre a Gabinete Escolar 79,313 0,000 0,420 0,000 Recorre a outros técnicos 40,212 0,101 0,183 0,041 Recurso a elementos (ordinal) 30,417 0,001 0,356 0,000 Clima facilitador de conflitos 32,303 0,354 0,178 0,048 Clima construído pelos elemento da comunidade escolar 90,239 0,000 -0,037 0,679 Clima é responsabilidade da direção da escola Causa puberdade/ fase de vida das crianças em que há maior agitação Causa modelos de vida das famílias a que pertencem os autores 35,552 0,223 0,183 0,041 19,893 0,030 0,071 0,431 9,020 0,530 0,208 0,020 Causa o conflito é uma situação normal 37,558 0,000 -0,171 0,056 Idade 23,995 0,243 0,185 0,039 A análise a partir destes cruzamentos permite constatar que os docentes reunidos no que se designou por práticas renunciantes recorrem mais frequentemente a outros elementos da escola para intervir em situação de conflitos (Q2: 30,417 ; sig. 0,001/ r: 0,356; sig. 0,000). Este tipo de práticas está também correlacionado de forma positiva com a ausência de interesse por parte dos alunos nas aulas identificada por estes professores (r: 0,209; sig. 0,020). Por outro lado, o reconhecimento dos alunos e a participação em reuniões ou em outras instâncias de decisão da escola estão correlacionadas negativamente com as mesmas práticas renunciantes. Estas tendências apontam assim, por um lado, para um maior distanciamento organizacional por parte dos docentes que desenvolvem este tipo de práticas, uma vez que não participam internamente nos processos de decisão da escola, nem são reconhecidos ou conquistam o interesse dos alunos. Por outro lado, o grupo de docentes que desenvolve este tipo de práticas tende a recorrer significativamente a outros elementos da escola para intervir nas situações de conflito – o que corrobora a ideia de uma menor responsabilidade no controlo disciplinar. No domínio das representações verifica-se uma correlação positiva entre os docentes com práticas de tipo renunciante e a perceção de um clima de escola facilitador de conflitos como sendo da responsabilidade da direção da escola. Relativamente ao que consideram ser as causas para a ocorrência de situações de conflito, constata-se que 105 enquanto a normalização do conflito se encontra correlacionada de forma negativa, já os modelos de vida das famílias está correlacionada positivamente com os docentes com práticas renunciantes. Estes resultados indicam que os docentes que desempenham mais frequentemente práticas de tipo renunciante entendem o clima escolar mais negativamente, considerando não ser da sua responsabilidade. Este grupo de professores considera que os conflitos resultam dos modos de vida das famílias dos alunos pela sua divergência face à cultura escolar, por um lado, ou por se associarem à fase de vida em que os alunos se encontram, por outro. Por último, verificou-se ainda uma correlação positiva entre a idade dos docentes e o tipo de práticas renunciantes, concluindo-se que quanto maior a idade dos docentes maior a probabilidade de identificação deste tipo de práticas. Ainda no âmbito dos cruzamentos analíticos desenvolvidos, foram realizados testes semelhantes para as práticas disciplinares pacificadoras, considerando especialmente as variáveis da dimensão organizacional. Quadro 44 - Análise univariada das práticas disciplinares pacificadoras Fatores Comunico à escola a ocorrência de situações de conflito A escola é muito competitiva, não permitindo a cooperação entre os colegas para o exercício das suas funções O meu trabalho com os alunos é uma conquista diária Efeito conjugado (Opinião x2) Escola Variável dependente: práticas pacificadoras Tests of Between-Subjects Pearson QuiEffects Correlation quadrado Sig. df Sig. (2-tailed) Value / Sig. 0,001 1 0,000 67,835/ 0,000 0,002 3 0,636 (negativa) 15,266/ 0,644 0,000 3 0,018 23,737/ 0,164 6 Levene sig. 0,071 x x 0,023 (negativa) x x 0,001 R2 = 0,351 x 17,011/ 0,149 A partir da análise dos dados resultantes dos cruzamentos conclui-se que os docentes que afirmam ter práticas mais pacificadoras tendem com maior frequência a comunicar à escola a ocorrência de situações de conflito e a considerar que o trabalho com os alunos é uma conquista diária. Este tipo de práticas está correlacionado em sentido negativo com a escola, isto quer dizer que quanto menor o sentido de pertença à escola por parte dos docentes, maior a identificação com práticas pacificadoras. Tendo em conta o perfil etário dos professores que adotam estas práticas, estes dados apontam parcialmente para a fase de integração na escola. O facto de os professores serem mais novos e/ou estarem há menos anos a lecionar na escola, leva a que adotem uma postura de maior iniciativa própria no controlo disciplinar. Eventualmente por não estarem ainda familiarizados com a estratégia de regulação definida na escola, estes professores assumem o trabalho com os alunos como um desafio que só lhes cabe a eles gerir e regular. Consideraram-se ainda outras variáveis dos diferentes domínios tendo como variável dependente as práticas pacificadoras dos docentes. 106 Quadro 45 - Práticas disciplinares pacificadoras: fatores associados Variável dependente: Práticas pacificadoras QuiSig. (2Pearson Sig. (2quadrado sided) Correlation tailed) 0,150 0,095 25,856 0,000 Participa em reuniões de departamento Conhece o Regulamento Interno Recorre aos funcionários para a resolução dos conflitos Gestão reativa dos conflitos Considera importante envolver os pais na aplicação de medidas Considera que clima é em parte explicado pelos alunos que frequentam a escola Idade dos professores 48,484 0,000 -0,067 0,455 34,243 0,012 0,167 0,063 74,712 0,000 0,201 0,025 12,586 0,050 0,147 0,103 50,082 0,000 0,110 0,221 14,653 0,261 -0,183 0,041 Associado a práticas pacificadoras encontram-se o conhecimento as regras da escola e uma participação em reuniões de departamento, assim como o recurso a funcionários para a resolução de conflitos. Outra correlação importante prende-se com uma maior afirmação relativamente à gestão imediata dos conflitos. Na resolução de conflitos, os professores que adotam este tipo de práticas consideram também como fator de importante envolver os pais/EE na aplicação de medidas. Para estes docentes o clima escolar resulta dos alunos que frequentam a escola. Inversamente aos professores que se identificam com práticas renunciantes, a idade no caso dos professores que adotam práticas pacificadoras tende a diminuir. Estes dados apontam para uma tendência dos professores mais velhos desenvolverem mais frequentemente práticas renunciantes e os professores mais novos a adotarem mais habitualmente práticas pacificadoras. Prosseguindo o intuito de cruzar os diferentes indicadores recolhidos, considerámos como variáveis dependentes no domínio organizacional a gestão reativa e a proactiva, visando compreender que fatores explicavam melhor a adoção destas estratégias de gestão dos conflitos. Quadro 46 - Análise univariada da gestão reativa dos conflitos Variável dependente: gestão reativa dos conflitos Fatores Tests of Between-Subjects Effects Sig. Converso com os alunos Atribuo uma tarefa aos alunos Efeito conjugado Práticas Pacificadoras Recurso elementos Efeito conjugado 0,000 0,045 0,786 R2 = 0,189 0,013 0,093 0,003 R2 = 0,655 df 2 3 2 Levene sig. 0,026 6 19 32 Levene sig. 0,047 Pearson Correlation Qui-quadrado Sig. (2-tailed) Value / Sig. 0,001 0,269 x x 0,025 0,622 x x 46,390/ 0,000 18,008/ 0,455 x x 74,712/ 0,000 91,990/ 0,936 x x 107 Conversar e atribuir uma tarefa aos alunos são identificadas como estratégias associadas de modo independente à adoção de uma gestão de tipo reativo. Sendo validado o pressuposto de homogeneidade (Levene sig. 0,026) e com cerca de 19% da variabilidade explicada, constata-se que uma regulação mais imediata, de reação no momento, se encontra associada a este tipo de mecanismos. Já o efeito conjugado das práticas pacificadoras com o recurso a outros elementos apresenta valores significativos para a gestão reativa, validando-se o pressuposto da homogeneidade (Levene sig. 0,047), com 65,5% da variabilidade explicada. As práticas pacificadoras estão positivamente correlacionadas e associadas a uma gestão de tipo reativo, o que aponta para que os docentes que gerem os conflitos de modo mais imediato ou reativo tendem a ter práticas disciplinares em que a resolução cabe mais a eles próprios do que a outros elementos da escola, reforçando-se assim “duplamente” a sua autoridade em sala de aula. Na sequência desta análise testou-se ainda a relação entre outras variáveis e a gestão reativa, como variável dependente. Quadro 47 - Gestão reativa dos conflitos: fatores associados Quiquadrado Considera que desempenha as suas funções de forma adequada Participa no conselho geral da escola Comunica à escola a ocorrência de situações de conflito Recorre a outros técnicos da escola Gestão reativa Sig. (2Pearson sided) Correlation Sig. (2tailed) 18,273 0,438 0,184 0,039 7,640 0,266 -0,220 0,014 22,027 0,001 0,138 0,126 34,118 0,012 0,061 0,497 Eficácia da ordem de saída 30,064 0,037 0,265 0,003 Eficácia da proibição de participar em atividades 35,239 0,009 0,213 0,017 Considera importante o aumento das sanções Critério para definição do castigo: EE que não concordam com castigo Critério para definição do castigo: existência de queixas ou relatos negativos sobre os alunos Considera clima de escola é facilitador de conflitos Considera clima de escola é propício a momentos de tranquilidade Considera que o clima de escola é em parte explicado pelos alunos que frequentam a escola 5,323 0,503 0,177 0,048 14,805 0,022 -0,048 0,595 9,861 0,131 0,246 0,006 26,311 0,093 -0,177 0,048 24,953 0,126 0,266 0,003 29,490 0,043 0,242 0,006 A comunicação aos órgãos competentes na escola sobre situações de conflito e o recurso a outros técnicos para intervir nas situações de conflito estão associados positivamente aos docentes que se inscrevem num estilo de gestão reativa. Relativamente às práticas disciplinares, constata-se que os docentes que consideram as medidas de ordem de saída e proibição de participar em atividades, bem como os que consideram importante o aumento de sanções para a resolução dos comportamentos violentos, tendem a gerir os conflitos de forma mais imediata. Ter como critério na definição ou aplicação de castigos a não concordância dos Encarregados de Educação está igualmente associado de forma positiva com este tipo de gestão dos conflitos. Ao 108 qual se soma o critério da existência de queixas ou relatos negativos sobre os alunos, também com uma correlação positiva para a gestão reativa. Os docentes que consideram o clima de escola como sendo pacífico e resultante dos alunos que frequentam a escola, tendem a adotar mais frequentemente uma gestão reativa dos conflitos. Em consonância, a percepção de um clima escolar facilitador de conflitos tende a diminuir com o aumento de docentes a gerir os conflitos de forma imediata. Tendo traçado o perfil dos docentes que adotam uma gestão reativa ou imediata dos conflitos, importa agora analisar como afirmam agir os docentes que assumem uma gestão proactiva em situações de violência. Quadro 48 - Gestão proactiva dos conflitos: fatores associados Quiquadrado Considera que os alunos reconhecem o seu trabalho e valorizam-me por isso Conhece o Regulamento Interno Afirma ter instruções sobre os procedimentos em caso de conflito Chama alguém da escola para apoiar em caso de conflito Gestão proactiva Sig. (2Pearson sided) Correlation Sig. (2tailed) 34,365 0,033 0,081 0,371 30,329 0,007 -0,127 0,160 25,422 0,001 0,118 0,188 17,274 0,242 -0,176 0,049 Acalma os alunos e depois conversa em caso de conflito 16,747 0,726 0,232 0,009 Grita com os alunos em caso de conflito 30,173 0,089 -0,230 0,010 Eficácia da advertência ou repreensão Critério para definição do castigo: alunos que reincidem no comportamento Critério para definição do castigo: os alunos que cumprem o castigo aplicado Critério para definição do castigo: os EE que concordam com o castigo Considera o clima de escola como propiciador de momentos de tranquilidade Considera que o clima de escola é em parte explicado pelos alunos que a frequentam 15,179 0,814 0,186 0,038 18,676 0,009 -0,013 0,882 21,067 0,004 0,098 0,277 20,233 0,005 -0,063 0,486 21,319 0,440 0,230 0,010 61,591 0,000 -0,018 0,844 O reconhecimento e valorização do trabalho docente pelos alunos e ter instruções sobre os procedimentos a tomar em caso de conflito estão associadas de forma positiva com a adoção de uma gestão proactiva por parte dos docentes. Já a opção por pedir apoio a alguém da escola e gritar com os alunos nestas situações tendem a diminuir com a maior frequência de uma gestão deste tipo. Acalmar os alunos para depois conversar posteriormente é a estratégia pedagógica de eleição para os docentes que se posicionam numa gestão proactiva dos conflitos. Isto quer dizer que os docentes que tendem a tomar a iniciativa na gestão das situações de violência, consideram o diálogo com os alunos um mecanismo importante para a resolução dos conflitos. Esta tendência converge com o resultado da correlação positiva entre o que consideram ser a eficácia da advertência ou repreensão oral, pois quanto mais eficaz é esta medida para os docentes, maior o recurso a estratégias de tipo proactivo. Ser aluno reincidente, cumprir o castigo aplicado e os Encarregados de Educação aceitarem os castigos aplicados constituem elementos 109 mobilizados para a decisão de aplicação de castigos, que estão igualmente associados de forma positiva a este tipo de gestão dos conflitos. Também uma representação do clima de escola como propício a momentos de tranquilidade aumenta a adoção de uma gestão proactiva. A relação entre a representação sobre as práticas profissionais e a perceção do clima de escola e entre esta e as causas apontadas para a violência foram igualmente testadas. Quadro 49 - Relação entre a opinião sobre as práticas profissionais e a opinião sobre o clima de escola Opinião práticas profissionais A escola é muito competitiva, não permitindo a cooperação entre os colegas para o exercício das suas funções Cada professor tem o seu método, não há desempenhos bons nem maus Os alunos reconhecem o meu trabalho e valorizam-me por isso Causas violência O conflito é uma situação que é normal ocorrer nas interações humanas Na sua opinião o clima de escola é: Construído pelos elementos da Propício a momentos de tranquilidade comunidade escolar QuiPearson Sig. (2QuiPearson Sig. (2quadrado Correlation tailed) quadrado Correlation tailed) 17,474/ 0,042 -,203 0,023 10,878/ 0,284 -0,067 0,460 27,277/ 0,001 -,205 0,022 11,721/ 0,229 -0,042 0,639 43,397/ 0,000 ,343 0,000 11,728/ 0,229 0,226 0,011 Qui-quadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) Qui-quadrado Pearson Correlation Sig. (2tailed) 0,325/ 0,955 0,044 0,629 6,564/ 0,087 0,223 0,012 Verificou-se por um lado que os docentes que consideram que o clima da escola é construído pelos elementos da comunidade escolar não avaliam a escola como competitiva, embora tenham uma perspetiva individualizada do seu desempenho. Por sua vez, os inquiridos que afirmam ter um reconhecimento e valorização do seu trabalho pelos alunos tendem a considerar o clima de escola propício a momentos de tranquilidade e que este se constrói pelos elementos da comunidade escolar. Relativamente às causas para a ocorrência de situações de violência, constata-se que a normalização da violência está correlacionada em sentido positivo com a avaliação de um clima de escola propício a momentos de tranquilidade. A correlação entre estas variáveis aponta para uma possível perceção de segurança na escola em resultado de uma representação naturalizada do conflito. Uma vez que O(s) modelo(s) de vida da(s) família(s) a que pertencem o(s) autor(es) foi a causa mais apontada pelos inquiridos para ocorrem situações de violência, procuramos testar a relação que esta tinha com os fatores considerados importantes na resolução dos comportamentos violentos. 110 Quadro 50 - Relação entre as causas da violência e os fatores considerados mais importantes na resolução dos comportamentos violentos Indique os fatores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos: Aumento das sanções Causas da violência O(s) modelo(s) de vida da(s) família(s) a que pertence(m) o(s) autor(es) Pearson Sig. (2Qui-quadrado Correlation tailed) 0,138/ 0,711 -0,033 0,713 Apoio nos estudos 0,679/ 0,410 -0,074 0,414 Acompanhamento dos alunos 7,212/ 0,007 0,240 0,007 Vigilância e controlo dos alunos 1,015/ 0,314 -0,090 0,318 Sensibilizar os alunos para as regras da escola 1,158/ 0,282 -0,096 0,286 Envolver os alunos nos processos de decisão Envolver os pais na aplicação de medidas disciplinares (corretivas ou sancionatórias) 1,218/ 0,270 -0,099 0,274 0,672/ 0,412 0,073 0,416 Dos fatores considerados importantes, o único que aparece positivamente associado e correlacionado com a causa apontada para a ocorrência de conflitos é o Acompanhamento dos alunos. Esta relação aponta, eventualmente, para uma maior preocupação dos docentes na orientação dos alunos, por considerarem os modelos familiares desadequados ou pouco convergentes com a cultura escolar. 111 4. A PERSPETIVA DOS ALUNOS 4.1. VIOLÊNCIA NA ESCOLA: A PERSPETIVA DOS ALUNOS (INQUÉRITO) 4.1.1. Percurso metodológico e amostragem O inquérito por questionário foi o instrumento técnico selecionado para recolher informação sobre as questões em análise junto dos alunos de 2º e 3º ciclos do Ensino Básico, com o objetivo de conhecer as Práticas de violência dos alunos, considerando as suas relações a nível informal, familiar e institucional. Procedeu-se assim à elaboração de um guião de inquirição a uma amostra estatisticamente representativa da população que frequenta o 2º e o 3º ciclo do ensino básico nas escolas em estudo. Quadro 51 - Guião de Inquirição do Questionário aos Alunos Eixos de Análise Dimensões Indicadores Idade / Sexo / Escola / Ano de escolaridade / Via de ensino frequentada / Ação Social Escolar (ASE) / Caracterização do aluno I. Caracterização Encarregado de Educação – tipo de relação familiar / Escolaridade do Encarregado de Educação Frequência de reprovação por ciclo / Motivos de II. Percurso escolar do Percurso escolar reprovação aluno Frequência escolar/ Motivos de absentismo / Atividades e Absentismo locais nos momentos de absentismo/ Conhecimento pelo EE do absentismo III. Absentismo Frequência escolar/ Motivos de absentismo prolongado / Absentismo prolongado Idade para trabalhar IV. Representação da escola e dos estudos Escola e estudos Relações Informais V. Redes de relações informais e familiares VI. Relação com os adultos da escola VII. Descrição do incidente mais grave VIII. Violência IX. Medidas e regras escolares Relações Familiares Relação de Confiança Relação de Obediência Caracterização do incidente Testemunho e intervenção Atos praticados, sofridos e/ou testemunhados Legitimidade da violência Perceção de justiça Regulamento interno Opinião sobre a escola / Importância dos estudos / Sugestão de abandono / Quem sugeriu o abandono Redes informais fora da escola / Apoio emocional (para problemas escolares) Mobilização familiar em torno da escola (acompanhamento dos assuntos escolares da família) / Castigos familiares / Recompensas familiares Por tipo de adulto na escola Por tipo de adulto na escola Ocorrência / Participantes / Local da ocorrência Existência de testemunhas / Ação das testemunhas / Intervenientes Testemunha / Vítima / Autor Razões para usar a violência Opinião sobre as medidas (Des)conhecimento do Regulamento Interno / Opinião sobre as regras / Razões do desconhecimento / Propostas de regras 112 A opção pela aplicação do questionário através de uma plataforma online em software especializado prendeu-se com as vantagens comprovadas relativamente à eficácia do processo de inquirição, permitindo aos alunos responder individualmente a partir de computadores na escola com ligação à Internet, em sessões coletivas, contando para o efeito com o apoio presencial de membros da equipa de investigação. Foram também tratados os dados socioeducativos dos alunos anteriormente fornecidos pelas respetivas direções das escolas, em formato de listas de turma, tendo em vista definição da amostra. Após o tratamento dos dados, recorreu-se à técnica de amostragem estratificada, considerando o peso relativo dos alunos em cada uma das escolas sobre o universo em estudo e a sua distribuição por anos de escolaridade. Ponderando os referidos estratos, a seleção dos alunos realizou-se tendo em conta as turmas mais contrastantes em termos do sucesso/insucesso escolar e do estatuto socioeconómico dos alunos. Este procedimento garantiu uma amostra representativa da população em estudo com 30% dos inquiridos que, perfazendo um total de 40 turmas, cuja distribuição (selecionada e real) foi a seguinte: Quadro 52 - Composição da Amostra Universo Ano Amostra Total Alunos Total Turmas 5º 626 6º Total de Alunos (%) E1 E2 E3 Seleção Resposta Turma s (%) 26 31,8 28,8 30,8 81 76 49 42 69 62 612 28 34,6 31,9 35,7 86 80 65 57 61 58 7º 563 23 32,1 26,8 30,4 54 41 54 50 73 60 8º 464 21 36,2 29,1 33,3 49 20 49 46 70 69 9º 431 20 38,1 30,4 40,0 46 43 46 41 72 47 Total 2696 118 34,3 29,4 33,9 316 260 263 236 345 296 Seleção Resposta Seleção Resposta Seleção Resposta Posteriormente, construiu-se uma grelha para o calendarização das aplicações a agendar com as escolas. Operativamente cumpriram-se as etapas: de revisão e validação do questionário através de realização de pré-teste; produção e impressão do pedido de autorização aos Encarregados de Educação para aplicação do inquérito aos alunos da amostra; reuniões com as direções escolares para agendamento e organização das aplicações, nomeadamente o estabelecimento de contacto com as Direções de Turma e entrega dos impressos para obtenção de autorização dos Encarregados de Educação. Na aplicação dos inquéritos aos alunos foram consideradas preferencialmente as horas de formação cívica dos alunos por permitirem uma articulação com os Diretores de Turma, e ainda, não interferirem com momentos letivos ou de avaliação. As direções das escolas e os Diretores de Turma colaboraram ativamente neste processo, quer na organização quer na disponibilização de recursos para a realização deste momento de inquirição. A aplicação dos inquéritos totalizou 792 respostas efetivas cujos dados foram posteriormente tratados. 113 4.1.2. Caracterização Sociográfica da Amostra A distribuição dos alunos inquiridos por sexo é relativamente equitativa: 48,4% do sexo feminino e 51,6% do masculino. Relativamente à distribuição etária, a maioria dos alunos tem entre 10 e 15 anos, havendo apenas 9% dos alunos inquiridos com mais de 15 anos. A maioria dos alunos inquiridos (69,9%) nunca reprovou, não havendo diferenças expressivas nos anos letivos frequentados. No que respeita ao benefício de Ação Social Escolar (ASE) é equivalente o número de alunos que são e não são beneficiárias deste apoio, 45% de ambos. Figura 8 - Distribuição etária dos inquiridos Figura 9 - Ano escolar frequentado 114 4.1.3. Autores, vítimas e testemunhas de situações de violência: caracterização dos atores Com o objetivo de traçar os perfis de autores, vítimas e testemunhas, foram construídos índices com base na informação recolhida a partir das questões definidas para esse efeito e posterior categorização. Aos alunos foi pedido que indicassem quantas vezes praticaram/foram vítimas/testemunharam cada uma das opções desde o início do ano letivo, utilizando a escala de respostas: 1 (nenhuma), 2 (raras), 3 (algumas), 4 (muitas). Todas as questões eram de resposta obrigatória. Quadro 53 - Autores, Vítimas e Testemunhas: construção dos índices Autor Divulguei assuntos privados de um colega Falei mal de um colega Insultei um colega Estraguei as coisas de um colega Impedi um colega de participar em atividades Magoei ou bati de propósito num colega Roubei as coisas de um colega Ameacei um colega Ameacei um colega com armas (facas, bastões...) Coagi Apalpei ou toquei num colega contra a sua vontade Vítima Divulgaram os meus assuntos privados Falaram mal de mim Insultaram-me Estragaram as minhas coisas Impediram-me de participar em atividades Magoaram-me ou bateram-me de propósito Roubaram as minhas coisas Ameaçaram-me Ameaçaram-me com armas (facas, bastões...) Coação Apalparam-me ou tocaram-me contra a minha vontade Testemunha Divulgar assuntos privados de um colega Falar mal de um colega Insultar um colega Estragar as coisas de um colega Impedir um colega de participar em atividades Magoar ou bater de propósito num colega Roubar as coisas de um colega Ameaçar um colega Ameaçar um colega com armas (facas, bastões...) Coação Apalpar ou tocar num colega contra a sua vontade Numa primeira fase, procurou-se definir os perfis dos atores face às situações de violência na escola isolando-se: apenas autores, apenas vítimas, apenas testemunhas, nenhum deles, todos eles, combinações diversificadas entre autor/vítima/testemunha. Esta primeira análise demostrou que nas escolas em análise não existem grupos de alunos que se distingam por serem apenas autores, vítimas ou testemunhas de violência. A maioria dos alunos (66,9%) afirma ter assumido os três papéis, enquanto 21% assume uma conjugação de dois dos papéis. Quadro 54 - Perfis dos atores nas situações de violência na escola Autor Vítima n 1 13 % 0,1 1,6 Testemunha Nenhum 54 28 6,8 3,5 Todos Diversos 530 166 66,9 21,0 Total 792 100 115 Assim, optou-se por considerar como autores, vítimas e testemunhas os alunos que em algum momento do ano letivo assumiram estar numa dessas categorias. O que faz com que os mesmos alunos possam simultaneamente estar incluídos nos três grupos em análise. Realizou-se uma Análise de Componentes Principais (ACP) para medir a correlação entre as variáveis (valores do teste KMO e Alfa de Cronbach, em rodapé, na tabela). Os valores demonstram uma boa correlação entre as variáveis, pelo que se construíram três índices com base nas médias de respostas: Autor, Vítima e Testemunha. Tal com foi referido acima, nas variáveis originais a escala de resposta era: 1 (nenhuma), 2 (raras), 3 (algumas), 4 (muitas). Para melhor análise e interpretação dos dados, procedeu-se à recodificação das novas variáveis, através de uma nova escala: Nenhuma, Raros/Esporádicos, Frequentes/Regulares. Quadro 55 - Autores, Vítimas e Testemunhas (leitura em coluna) Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Total Autor (1) n % 205 26,6 539 69,8 28 3,6 772 100 Vítima (2) n % 114 14,8 566 73,3 92 11,9 772 100 Testemunha (3) n % 47 6,1 350 45,3 375 48,6 772 100 KMO: (1) 0,882; (2) 0,870; (3) 0,913; Alfa de Cronbach: (1) 0,861; (2) 0,851; (3) 0,896 No que respeita à diferenciação por sexo, há uma considerável homogeneidade na distribuição das categorias, não se notando diferenças expressivas. Com exceção para os alunos que afirmam ser autores frequentes, que são maioritariamente do sexo masculino (75%). Este resultado vai ao encontro das principais conclusões de outros trabalhos, o perfil dos agressores é efetivamente maioritariamente masculino, não sendo contudo de desprezar a presença feminina neste grupo (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a). Esta análise foi possível realizar apenas com os autores, visto que no que respeita às vítimas (Q2 0,285; sig. 0,867) e testemunhas (Q2 0,972; sig. 0,615) o teste do Qui-quadrado não revelou a existência de relação entre as variáveis. Quadro 56 - Autores por Sexo (leitura em linha) Autor Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Feminino n % 102 49,8 266 49,4 7 25,0 Masculino n % 103 50,2 273 50,6 21 75,0 Total n % 205 100,0 539 100,0 28 100,0 Qui-quadrado: 6,474; sig. 0,039 Como se pode verificar nas tabelas seguintes, tanto a distribuição etária das testemunhas como o ano letivo que frequentam são equilibrados. Devido aos resultados do teste do Qui-quadrado, não é possível realizar esta análise para os autores (Q2 5,196; sig. 0,268 / Q2 13,918; sig. 0,084) e vítimas (Q2 4,342; sig. 0,362 / Q2 8,256; sig. 0,409). 116 Quadro 57 - Testemunhas por Idade (leitura em linha) Testemunha Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares 10-12 anos n % 25 54,30 184 52,70 157 41,90 13-15 anos n % 14 30,40 140 40,10 182 48,50 + 15 anos n % 7 15,20 25 7,20 36 9,60 Total n % 46 100 349 100 375 100 Qui-quadrado: 13,324; sig. 0,010 Quadro 58 - Testemunhas por Ano Letivo (leitura em linha) Testemunha Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes/ Regulares 5º ano n % 14 29,8 99 28,3 65 17,3 6º ano n % 16 34,0 87 24,9 80 21,3 7º ano n % 10 21,3 60 17,1 79 21,1 8º ano n % 3 6,4 57 16,3 74 19,7 9º ano n % 4 8,5 47 13,4 77 20,5 Total n % 47 100,0 350 100,0 375 100,0 Qui-quadrado: 24,341; sig. 0,001 No indicador do estatuto socioeconómico, as vítimas que beneficiam de ASE, não apresentam diferenças muito expressivas entre as diferentes categorias: a maioria dos alunos que se assume como vítima frequente é benificiária de ASE (56,5%), face a 44% das que se assumem como vítimas esporádicas. Os testes do Qui-quadrado demonstram que não existe associação entre ser autor (Q2 5,968; sig. 0,202) ou testemunha (Q2 7,066; sig. 0,132) de violência e ser beneficiário de ASE. Embora nos discursos do senso comum se considere o contrário, reforçando a ideia que as escolas difíceis e violentas são as que acolhem alunos oriundos de bairros clandestinos ou de realojamento social. Na análise realizada a partir da aplicação deste questionário verifica-se que o papel de autor e testemunha desempenhado pelos alunos nos incidentes de violência não está associado à condição socioeconómica. No entanto, o papel de vítima já se encontra associado à situação socioeconómica dos alunos, como podemos ver no quadro abaixo. Quadro 59 - Vítimas segundo Benefício de ASE (leitura em linha) Sim Vitima Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares n 49 249 52 % 43,0 44,0 56,5 Não n 56 270 28 % 49,1 47,7 30,4 Não sei n % 9 7,9 47 8,3 12 13,0 Total n % 114 100,0 566 100,0 92 100,0 Qui-quadrado: 10,506; sig. 0,033 117 4.1.4. Violência Física e Violência Relacional Numa segunda fase da análise, decidiu-se dividir os indicadores de violência escolar em duas categorias: violência física e violência relacional. Chegou-se a esta categorização através de uma Análise de Componentes Principais que apontou para a criação de duas componentes, cujas categorias incluídas se apresentam em seguida. Os resultados dos testes do KMO e Alfa de Cronbach encontram-se nas tabelas, em rodapé. Quadro 60 - Categorias de violência: construção dos índices Violência Física Estragar as coisas de um colega Magoar ou bater de propósito num colega Roubar as coisas de um colega Ameaçar um colega Violência Relacional Divulgar assuntos privados de um colega Falar mal de um colega Insultar um colega Impedir um colega de participar em atividades Ameaçar um colega com armas (facas, bastões...) Coação Apalpar ou tocar num colega contra a sua vontade No que respeita à distribuição entre violência física e relacional, pela análise realizada pode concluir-se que são mais frequentes os casos de violência relacional do que física. Identifica-se uma maioria expressiva de alunos que assumem ser testemunhas frequentes de atos relacionais (63,7%), no entanto os alunos que se posicionam como autores e vítimas indicam que estes atos são esporádicos (57,9% e 54,1%, respetivamente). Quadro 61 - Violência Física: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna) Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Total Autor (1) n % 471 61,0 280 36,3 21 2,7 772 100 Vítima (2) n % 286 37,0 429 55,6 57 7,4 772 100 Testemunha (3) n % 127 16,5 375 48,6 270 35,0 772 100 KMO: (1) 0,880; (2) 0,815; (3) 0,845; Alfa de Cronbach: (1) 0,837; (2) 0,797; (3) 0,866 118 Quadro 62 - Violência Relacional: autores, vítimas e testemunhas (leitura em coluna) Autor (1) n % 238 30,8 447 57,9 87 11,3 772 100 Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Total Vítima (2) n % 145 18,8 418 54,1 209 27,1 772 100 Testemunha (3) n % 59 7,6 221 28,6 492 63,7 772 100 KMO: (1) 0,707; (2) 0,703; (3) 0,660; Alfa de Cronbach: (1) 0,721; (2) 0,741; (3) 0,770 Os alunos que afirmam ter a prática de comportamentos violentos físicos são maioritariamente do sexo masculino (62,9% dos esporádicos e 66,7% dos frequentes); e benificiários da Ação Social Escolar (54,3% dos esporádicos e 57,1% dos frequentes). A análise demonstrou que distribuição etária e o ano de escolaridade frequentado não são fatores explicativos da autoria de violência física (qui-quadrado: 0,083, 0,340, respetivamente). Estas variáveis não se revelaram explicativas da prática de violência relacional (qui-quadrado: 0,235; 0,741; 0,263; 0,762, respetivamente). Quadro 63 - Violência Física: autores por sexo e por benefício de ASE (leitura em linha) Nenhuma Autor: Raros/ Violência Esporádicos Física Frequentes/ Regulares Feminino n % 264 56,1 Sexo (1) Masculino n % 207 43,9 % 39,5 Benefício de ASE (2) Não Não sei n % n % 238 50,5 47 10,0 Total n % 471 100,0 Total n % 471 100,0 n 186 104 37,1 176 62,9 280 100,0 152 54,3 110 39,3 18 6,4 280 100,0 7 33,3 14 66,7 21 100,0 12 57,1 6 28,6 3 14,3 21 100,0 Sim Qui-quadrado: (1) 27,141; sig. 0,000 | (2) 18,639; sig. 0,001 Para um aprofundamento da caracterização sociodemográfica dos alunos que se auto percecionam como autores de violência física ou relacional, realizou-se uma Análise de Correspondência Múltiplas (ACM). De realçar que este procedimento permite uma análise apenas dos dados relativos aos alunos inquiridos, dado que, como foi demonstrado acima, através dos valores do teste do qui-quadrado, algumas variáveis não se correlacionam de forma significativa (i.e., estes padrões não poderão ser extrapolados para o universo em análise). Pretende-se com esta análise descrever o espaço social composto pelos alunos inquiridos e simultaneamente perceber se é possível distinguir a formação de grupos com atributos semelhantes. Através da representação gráfica dos diversos indicadores selecionados, procedeu-se à leitura do espaço multidimensional em análise. Selecionaram-se as seguintes variáveis: autoria de atos físicos, autoria de atos relacionais, ano de escolaridade frequentado, idade. Numa primeira fase foi também considerada a variável sexo, mas esta foi abandonada por não permitir diferenciar os perfis sociais dos alunos inquiridos (ver gráfico seguinte). 119 Figura 10 - Disposição das variáveis O gráfico seguinte permite identificar e distinguir as configurações dos grupos sociais identificados na presente análise: Figura 11 - Configuração do espaço social Esta análise permite, na amostra de alunos em estudo, definir dois grupos sociais: Grupo 1: alunos que se assumem como não violentos (“nenhum”), que frequentam o 5º e o 6º anos de escolaridade e que têm entre 10 e 12 anos. Grupo 2: alunos que se assumem como praticantes esporádicos de violência relacional e física, frequentam o 3º ciclo (7º, 8º e 9º anos) e têm mais de 13 anos. 120 Conclui-se pela análise que não é possível associar aos alunos que se identificam como autores frequentes de violência (física e relacional) a algum dos grupos definidos. Quanto às vítimas de atos violentos físicos frequentes a maioria tem entre 10 e 12 anos (56,1%) e é beneficiária de ASE (59,6%). Embora a distribuição por ano de escolaridade seja relativamente equilibrada, é de realçar que a maioria dos alunos que frequentam o 7º e o 8º ano (64,4% e 66,4%, respetivamente) se assumem como vítimas esporádicas de atos de violência física. O sexo não é uma variável explicativa da vitimação de atos violentos físicos (qui-quadrado: 0,894). No que respeita à violência relacional, não existe relação entre o sexo, idade, ano de escolaridade e benefício de ASE e o facto de os alunos se assumirem como vítimas desse tipo de violência (quiquadrado: 0,291; 0,752; 0,664; 0,652, respetivamente). Quadro 64 - Violência Física: vítimas por idade (leitura em linha) Vítima: Violência Física 10-12 anos n % 146 51,2 188 43,9 32 56,1 Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares 13-15 anos n % 110 38,6 209 48,8 17 29,8 + 15 anos n % 29 10,2 31 7,2 8 14,0 Total n % 285 100,0 428 100,0 57 100,0 Qui-quadrado: 13,231; sig. 0,010 Quadro 65 - Violência Física: vítimas por ano letivo (leitura em coluna) Vítima: Violência Física Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Total 5º ano n % 79 44,4 83 46,6 16 9,0 178 100,0 6º ano n % 71 38,8 94 51,4 18 9,8 183 100,0 7º ano n % 44 29,5 96 64,4 9 6,0 149 100,0 8º ano n % 37 27,6 89 66,4 8 6,0 134 100,0 9º ano n % 55 43,0 67 52,3 6 4,7 128 100,0 Qui-quadrado: 21,864; sig. 0,005 Quadro 66 - Violência Física: vítimas por benefício de ASE (leitura em linha) Vítima: Violência Física Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Sim n % 124 43,4 192 44,8 34 59,6 Não n % 135 47,2 204 47,6 15 26,3 Não sei n % 27 9,4 33 7,7 8 14,0 Total n % 286 100,0 429 100,0 57 100,0 Qui-quadrado: 10,488; sig. 0,033 No caso das testemunhas de violência física, as esporádicas têm tendencialmente entre 10 e 12 anos e as frequentes entre os 13 e 15 anos. Cerca de metade das testemunhas frequentes é beneficiária de ASE, não havendo diferenças expressivas ao nível do ano 121 de escolaridade que frequentam. O sexo, uma vez mais, não é uma variável explicativa deste fator (qui-quadrado: 0,403; sig. 0,817). Quadro 67 - Violência Física: testemunhas por idade, ano de escolaridade e benefício de ASE (leitura em coluna) 10 - 12 anos 13 - 15 anos Idade (1) + 15 anos Total 5º ano 6º ano Ano de escolaridade (2) 7º ano 8º ano 9º ano Total Sim Benefício de ASE (3) Não Não sei Total n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % Testemunhas: violência física Raros/ Frequentes/ Nenhuma Esporádicos Regulares 75 180 111 59,5 48,1 41,1 41 163 132 32,5 43,6 48,9 10 31 27 7,9 8,3 10,0 126 374 270 100,0 100,0 100,0 43 91 44 33,9 24,3 16,3 42 80 61 33,1 21,3 22,6 17 73 59 13,4 19,5 21,9 13 70 51 10,2 18,7 18,9 12 61 55 9,4 16,3 20,4 127 375 270 100,0 100,0 100,0 61 150 139 48,0 40,0 51,5 59 189 106 46,5 50,4 39,3 7 36 25 5,5 9,6 9,3 127 375 270 100,0 100,0 100,0 Qui-quadrado: (1) 12,101; sig. 0,017 | (2) 31,667; sig. 0,000 | (3) 10,965; sig. 0,027 Em consonância com o testemunho de atos de tipo físico, cerca de 70 % dos alunos com idades entre os 13 e os 15 anos assume-se como testemunha de atos violentos relacionais frequentes e a maioria dos alunos com idades entre os 10 e os 12 anos são testemunhas de atos violentos relacionais esporádicos. O que sugere que os alunos mais velhos se assumem mais como testemunha de atos violentos frequentes, tanto relacionais como físicos. A maioria das testemunhas de atos violentos relacionais 122 esporádicos (57%) frequentam o 2º ciclo de escolaridade, enquanto a maioria (60%) das testemunhas de atos frequentes frequenta o 3º ciclo. O sexo (qui-quadrado: 4,411; sig. 0,110) e ser benificiário de ASE (qui-quadrado: 4,024; sig. 0,403) não têm influencia na situação de testemunha de atos violentos relacionais. Quadro 68 - Violência Relacional: testemunhas por idade (leitura em coluna) Quadro nº x – Violência Relacional: testemunhas por idade (leitura em coluna) Testemunha: Violência Relacional Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Total 10-12 anos n % 32 8,7 122 33,3 212 57,9 366 100,0 13-15 anos n % 18 5,4 81 24,1 237 70,5 336 100,0 + 15 anos n % 8 11,8 17 25,0 43 63,2 68 100,0 Total n % 58 7,5 220 28,6 492 63,9 770 100,0 Qui-quadrado: 14,358; sig. 0,006 Quadro 69 - Violência Relacional: testemunhas por ano letivo (leitura em linha) Testemunha: Violência Relacional Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares 5º ano n % 19 32,2 73 33,0 86 17,5 6º ano n % 20 33,9 52 23,5 111 22,6 7º ano n % 11 18,6 35 15,8 103 20,9 8º ano n % 4 6,8 38 17,2 92 18,7 9º ano n % 5 8,5 23 10,4 100 20,3 Qui-quadrado: 39,139; sig. 0,000 123 Total n % 59 100 221 100 492 100 4.1.5. Conceções de violência As conceções de violência são uma dimensão pertinente na análise da violência em contexto escolar, na medida em que importa compreender se os alunos que se auto percecionam como autores ou vítimas de violência (física ou relacional) consideram essa violência como um ato legítimo e, em caso afirmativo, em que situações consideram a possibilidade do seu uso. Nesse sentido os alunos foram questionados quanto à legitimidade do uso da violência nas seguintes situações. Quadro 70 - Legitimidade da violência (leitura em linha) Achas que podes usar a violência para…. Te protegeres de uma agressão Te protegeres de insultos e/ou ameaças Te vingares de alguém que te bateu Te vingares de alguém que te ameaçou e/ou disse mal de ti Defenderes alguém de agressões Defenderes alguém de insultos e/ou ameaças Te devolverem o que te tiraram Obteres o que queres Mostrares que és forte Mostrares que és tu que mandas Os outros aprenderem a respeitar-te Te conhecerem e gostarem de ti Te divertires e divertires os outros Sim n % 513 66,8 236 30,7 272 35,4 206 26,8 440 57,3 238 31,0 252 32,8 90 11,7 88 11,5 57 7,4 166 21,6 126 16,4 133 17,3 Não n % 255 33,2 532 69,3 496 64,6 562 73,2 328 42,7 530 69,0 516 67,2 678 88,3 680 88,5 711 92,6 602 78,4 642 83,6 635 82,7 Total n % 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 768 100,0 Para aprofundar as conceções de violência, realizou-se uma Análise de Componentes Principais (ACP), que permitiu a organização das variáveis em dois grupos: utilização da violência em situações de defesa e em situações de provocação (resultados do KMO e do Alfa de Cronbach em rodapé, na tabela). Quadro 71 - Legitimidade da violência: construção dos índices Achas que podes usar a violência para… Defesa (1) Te protegeres de uma agressão Te protegeres de insultos e/ou ameaças Te vingares de alguém que te bateu Te vingares de alguém que te ameaçou e/ou disse mal de ti Defenderes alguém de agressões Defenderes alguém de insultos e/ou ameaças Te devolverem o que te tiraram Provocação (2) Obteres o que queres Mostrares que és forte Mostrares que és tu que mandas Os outros aprenderem a respeitar-te Te conhecerem e gostarem de ti Te divertires e divertires os outros KMO: (1) 0,801; (2) 0,800; Alfa de Cronbach: (1) 0,811; (2) 0,858 124 A maioria dos alunos inquiridos considera legítima a violência em caso de defesa, mas não em caso de provocação. Esta distinção é demonstrativa da emergência da violência como uma forma de ação contingente, na medida em que constitui uma possibilidade de (re)ação a um estímulo, designadamente a agressão, a ameaça ou o insulto. O reconhecimento da (i)legitimidade do uso da violência traduz a aprendizagem de concepções e atitudes que estruturam e condicionam as decisões tomadas a nível situacional. Quadro 72 – Legitimidade da violência: defesa e provocação Defesa Legítima Ilegítima Total n 602 166 768 % 78,4 21,6 100,0 Provocação n % 240 31,3 528 68,8 768 100,0 Globalmente, a maioria dos alunos que se assume como autor de atos violentos considera a violência legítima, nomeadamente em caso de defesa. Os autores de violência relacional tendem a considerar a violência provocativa menos legítima do que os autores de violência física. Grande parte dos alunos que se assume frequentemente como mais violentos representa a violência (em geral e em caso de defesa) como legítima. Todavia, no que toca à violência em caso de provocação notam-se algumas diferenças entre os autores de atos físicos e de atos relacionais: 90,5% dos primeiros considera este tipo de violência legítima, face a apenas 48,8% dos autores de violência relacional com a mesma opinião. Analisando a questão pela perspetiva dos não-autores (alunos que assumem nunca ter praticado atos de violência durante o ano letivo em análise), é de referir que a maioria destes perceciona a violência em geral e em caso de defesa como legítima, tendo maior tendência para considerar a violência provocativa não legítima. Os alunos que se assumem como praticantes frequentes de violência física consideram a violência legítima independentemente da situação. Todavia, os autores esporádicos de violência física, os autores de violência relacional e os que se identificam como nãoautores tendencialmente não consideram a violência em caso de provocação legítima, considerando que a podem utilizar noutras situações (em geral e em caso de defesa). De referir que para todos os cruzamentos de variáveis (representados na quadro 74) o teste do qui-quadrado revelou valores de significância de 0,000, assumindo-se portanto que existe uma associação perfeita entre as variáveis em questão. Os posicionamentos dos alunos que se definem como autores, frequentes ou esporádicos, é revelador do entendimento de uma distinção expressiva entre formas de violência que consideram legítima e ilegítima. A intencionalidade da ação, lida na distinção entre provocação ou defesa, e o tipo de violência, física ou relacional, são 125 consideradas pelos alunos inquiridos como fatores distintivos da legitimidade, ou não desses atos. Relativamente aos alunos que se posicionam como vítimas de violência em contexto escolar, no que respeita à violência (em geral) a grande maioria considera-a legítima, o mesmo acontecendo no que respeita à utilização da violência em caso de defesa. Contudo, relativamente à utilização da violência em caso de provocação, a situação inverte-se: apenas 28% das vítimas esporádicas a considera legítima, face a 52% das frequentes (valor muito inferior à violência-defesa: vítimas esporádicas 80,1% e frequentes 89%). Se nos centrarmos apenas nos alunos que se consideram vítimas de violência física, a grande maioria entende a violência (em geral e em caso de defesa) legítima, situação que se inverte no que toca ao uso da violência para fins de provocação. Exceção para as vítimas frequentes de atos físicos, que na sua maioria considera a violência legítima independentemente da situação. Os alunos que se assumem como vítimas de comportamentos violentos ao nível relacional têm tendencialmente a mesma opinião que os anteriormente referidos no que toca ao uso de violência em geral e em caso de defesa. O teste do qui-quadrado não revela associação entre ser vítima de violência relacional e a opinião sobre a legitimidade do uso da violência em caso de provocação (Q2 4,504, sig. 0,105). Para todos os outros cruzamentos realizados no quadro 74, os valores do teste do quiquadrado têm significância de 0,000. 126 Quadro 73 - Autores vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) Violência em caso de defesa Sim Não Total n % n % n % 130 64,0 73 36,0 203 100,0 444 82,7 93 17,3 537 100,0 28 100,0 0 0,0 28 100,0 338 72,1 131 27,9 469 100,0 243 87,4 35 12,6 278 100,0 21 100,0 0 0,0 21 100,0 155 65,7 81 34,3 236 100,0 365 81,8 81 18,2 446 100,0 82 95,3 4 4,7 86 100,0 Violência em caso de provocação Sim Não Total n % n % n % 61 30,0 142 70,0 203 100,0 157 29,2 380 70,8 537 100,0 22 78,6 6 21,4 28 100,0 110 23,5 359 76,5 469 100,0 111 39,9 167 60,1 278 100,0 19 90,5 2 9,5 21 100,0 77 32,6 159 67,4 236 100,0 121 27,1 325 72,9 446 100,0 42 48,8 44 51,2 86 100,0 Vítimas: Violência Física Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Legitimidade da violência Sim Não Total n % n % n % 75 65,8 39 34,2 114 100,0 460 81,7 103 18,3 563 100,0 82 90,1 9 9,9 91 100,0 208 73,0 77 27,0 285 100,0 358 84,0 68 16,0 426 100,0 51 89,5 6 10,5 57 100,0 Violência em caso de defesa Sim Não Total n % n % n % 70 61,4 44 38,6 114 100,0 451 80,1 112 19,9 563 100,0 81 89,0 10 11,0 91 100,0 198 69,5 87 30,5 285 100,0 354 83,1 72 16,9 426 100,0 50 87,7 7 12,3 57 100,0 Vítimas: Violência Relacional Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares 98 338 181 93 331 178 Violência em caso de provocação Sim Não Total n % n % n % 37 32,5 77 67,5 114 100,0 156 27,7 407 72,3 563 100,0 47 51,6 44 48,4 91 100,0 85 29,8 200 70,2 285 100,0 122 28,6 304 71,4 426 100,0 33 57,9 24 42,1 57 100,0 - Autores Autores: Violência Física Autores: Violência Relacional Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Nenhuma Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Legitimidade da violência Sim Não Total n % n % n % 139 68,5 64 31,5 203 100,0 450 83,8 87 16,2 537 100,0 28 100,0 0 0,0 28 100,0 350 74,6 119 25,4 469 100,0 246 88,5 32 11,5 278 100,0 21 100,0 0 0,0 21 100,0 164 69,5 72 30,5 236 100,0 371 83,2 75 16,8 446 100,0 82 95,3 4 4,7 86 100,0 Quadro 74 - Vítimas vs. Legitimidade da Violência (leitura em linha) Vítimas 67,6 81,2 87,4 47 78 26 32,4 18,8 12,6 145 416 207 100,0 100,0 100,0 64,1 79,6 86,0 52 85 29 35,9 20,4 14,0 145 416 207 100,0 100,0 100,0 127 4.1.6. Autores: os castigos e as recompensas Considerou-se igualmente relevante compreender, por um lado, quais as estratégias disciplinares dos adultos do agregado familiar dos alunos que se auto percecionam como autores de atos violentos, quando têm comportamentos desajustados na escola, e por outro lado, quais as recompensas atribuídas quando apresentam comportamento adequado às expectativas e regras escolares. Em primeiro lugar, há que referir que muitos dos cruzamentos não demonstraram associação entre as variáveis em estudo (ver Quadro 76, resultados dos testes). Tendo em conta a distinção entre autores de violência física e relacional, embora não se encontrem tendências claras e transversais a todos os grupos de autores. Contudo, é de realçar que os autores de violência física são os que mais afirmam receber recompensas quando os seus comportamentos se adequam às regras escolares; no entanto, quando cometem infrações são menos chamados à atenção pelos adultos do agregado familiar do que os restantes alunos. Por outro lado, as boas ações são recompensadas sobretudo com oferta de bens materiais, sendo a sensibilização e manutenção de relações interpessoais relegadas para segundo plano. Estas respostas podem indiciar um padrão de autoridade dos adultos marcado pelo distanciamento relacional face às crianças. No que respeita aos autores de violência relacional, a tendência é ligeiramente diferente, verificando-se que em geral também não são chamados à atenção quando fazem algo de errado, todavia, sendo incentivados a continuar quando se trata de comportamentos ajustados. Quadro 75 - Autores/castigos e recompensas: resultados do teste do Qui-quadrado Autores Recompensas Castigos Oferecem-te presentes Dizem-te para continuar Dizem-te: não fazes mais do que a tua obrigação Elogiam-te perto de outras pessoas Não te dizem nada Não te deixam sair com os amigos Tarefas Domésticas Obrigam-te a estudar Conversam e chamam a atenção Gritam Ficam chateados mas não dizem nada Batem-te Não deixar ver TV / usar o PC Não dão algo desejado Contam o que fizeste Q2 2,686 6,104 6,251 5,887 1,701 0,352 4,518 3,649 4,182 1,182 8,328 5,462 3,888 7,642 3,328 Sig. 0,261 0,047 0,044 0,053 0,427 0,839 0,104 0,161 0,124 0,554 0,016 0,065 0,143 0,022 0,189 Autores: Violência física Q2 Sig. 8,763 0,130 5,607 0,061 2,466 0,291 0,622 0,733 0,364 0,834 5,690 0,058 5,154 0,076 6,292 0,043 9,285 0,010 7,154 0,028 3,196 0,202 18,117 0,000 3,168 0,205 2,229 0,328 1,878 0,391 Autores: Violência relacional Q2 Sig. 2,320 0,314 11,302 0,004 6,293 0,043 0,366 0,833 0,134 0,935 0,635 0,728 4,327 0,115 1,169 0,558 6,857 0,032 4,938 0,085 6,993 0,030 4,168 0,124 7,034 0,030 9,219 0,010 11,705 0,003 128 Quadro 76 - Autores vs. Castigos Familiares (leitura em linha) Autores: Violência Física Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Autores: Violência Relacional Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Sim Total - - 163 42 205 - - - - - - 175 30 205 - - - - - - - - - - - - 79,5 20,5 100,0 - - - - - - 85,4 14,6 100,0 - - - n - - - - - - - - - 470 69 539 - - - - - - 413 126 539 - - - % - - - - - - - - - 87,2 12,8 100,0 - - - - - - 76,6 23,4 100,0 - - - n - - - - - - - - - 26 2 28 - - - - - - 24 4 28 - - - % - - - - - - - - - 7,1 - 100,0 - - - - - - - - 471 - - - 100,0 - - 17 14,3 - - 454 85,7 - - - - Não Total - Sim - Não Total Sim Total Total - Sim - Não - Sim Total - Não - % Sim Total n Não Não Nenhuma Contam o que fizeste Sim Frequentes/ Regulares Não dão algo desejado Não Raros/ Esporádicos Não deixar ver TV / usar o PC Batem-te Total Autores Ficam chateados mas não dizem nada Gritam Sim Nenhuma Conversam e chamam a atenção Não Obrigam-te a estudar n 371 100 471 128 343 471 408 63 471 92,9 - % 78,8 21,2 100,0 27,2 72,8 100,0 86,6 13,4 100,0 - - - 96,4 3,6 100,0 - - - - - - - - - n 225 55 280 87 193 280 226 54 280 - - - 264 16 280 - - - - - - - - - % 80,4 19,6 100,0 31,1 68,9 100,0 80,7 19,3 100,0 - - - 94,3 5,7 100,0 - - - - - - - - - n 12 9 21 12 9 21 15 6 21 - - - 16 5 21 - - - - - - - - - % 57,1 - 42,9 - 100,0 - 57,1 42,9 100,0 - - - - - - 238 100,0 - - 46 23,8 - - 192 76,2 - - 238 100,0 - - 170 28,6 - - 68 71,4 - - n 188 50 238 204 34 238 225 13 238 % - - - 100,0 - - - 100,0 - - - 79,0 21,0 100,0 85,7 14,3 100,0 94,5 5,5 100,0 n - - - 447 - - - 447 - - - 312 135 447 339 108 447 411 36 447 % - - - 27,5 72,5 100,0 - - - 86,8 13,2 100,0 - - - 69,8 30,2 100,0 75,8 24,2 100,0 92,0 8,1 100,0 n - - - 36 51 87 - - - 79 8 87 - - - 66 21 87 69 18 87 72 15 87 % - - - 41,4 58,6 100,0 - - - 90,8 9,2 100,0 - - - 75,9 24,1 100,0 79,3 20,7 100,0 82,8 28,6 123 71,4 324 80,7 388 19,3 59 129 17,2 100,0 Quadro 77 - Autores vs. Recompensas familiares (leitura em linha) Nenhuma Autores Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Nenhuma Autores: Violência Física Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares Nenhuma Autores: Violência Relacional Raros/Esporádicos Frequentes/Regulares n % n % n % n % n % n % n % n % n % Oferecem-te presentes Dizem-te para continuar Não - Não 417 88,5 228 81,4 16 76,2 - Sim 54 11,5 52 18,6 5 23,8 - Total 471 100,0 280 100,0 21 100,0 - Sim Total Dizem-te: não fazes mais do que a tua obrigação Não Sim Total 54 26,3 124 23,0 12 42,8 - 151 73,7 415 77,0 16 57,1 - 205 100,0 539 100,0 28 100,0 - 139 67,8 314 58,3 19 67,9 - 66 32,2 225 41,7 9 32,1 - 205 100,0 539 100,0 28 100,0 - 62 26,0 95 21,2 33 37,9 176 74,0 352 78,8 54 62,1 238 100,0 447 100,0 87 100,0 161 67,7 262 58,6 49 56,3 77 32,3 185 41,4 38 43,7 238 100,0 447 100,0 87 100,0 Elogiam-te perto de outras pessoas Não Sim Total 156 76,1 416 77,2 16 57,1 - 49 23,9 123 22,8 12 42,9 - 205 100,0 539 100,0 28 100,0 - Não te dizem nada Não - Sim - 130 Total - 4.1.7. Relação com a Escola 4.1.7.1. Opinião sobre a Escola A opinião dos alunos sobre a escola que frequentam é uma dimensão importante na análise da violência na escola. O sentido de pertença e/ou as razões para gostarem ou não da escola permite compreender melhor a relação dos alunos com a mesma, contribuindo assim para uma melhor compreensão das suas práticas em meio escolar, nomeadamente no que ao cumprimento de regras e relação com os diferentes atores da cena escolar diz respeito. Na presente análise centrámo-nos nos alunos das escolas em estudo que se percecionam como autores de violência sobre os seus pares. Na sua maioria, estes alunos gostam da escola porque gostam de estar com os colegas, gostam de aprender, gostam dos professores e sentem-se seguros neste espaço, assumindo, contudo, que a componente negativa da escola é esta “dar muito trabalho”, embora reconheçam a sua importância. Quadro 78 - Autores/opinião sobre a escola: resultados do teste do Qui-quadrado Autores Gosto da escola porque… Gosto de estar com amigos e brincar Gosto das aulas e aprender Sinto-me seguro Posso descansar Gosto dos professores Preocupam-se comigo Não gosto da escola porque… Dá muito trabalho Não gosto dos colegas É uma perca de tempo Q2 13,904 8,598 3,382 5,107 5,715 0,196 21,409 12,797 16,128 Sig. 0,001 0,014 0,184 0,078 0,057 0,907 0,000 0,002 0,000 Autores: Violência física Q2 0,813 11,497 6,029 1,114 9,787 0,753 31,276 14,069 25,374 Sig. 0,666 0,003 0,049 0,573 0,007 0,686 0,000 0,001 0,000 Autores: Violência relacional Q2 Sig. 18,392 0,000 15,722 0,000 6,781 0,034 4,529 0,104 6,668 0,036 1,515 0,469 18,178 0,000 16,633 0,000 12,556 0,002 131 Quadro 79 - Autores vs. Opinião positiva sobre a Escola (leitura em linha) Gosto da escola porque… Nenhuma Raros/ Autores Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Autores: Raros/ Violência Esporádicos Física Frequentes/ Regulares Nenhuma Autores: Raros/ Violência Esporádicos Relacional Frequentes/ Regulares Posso estar com amigos e brincar Discordo Concordo Total n % n % n % Gosto das aulas e aprender Discordo Concordo Total n % n % n % 44 21,5 161 78,5 205 100,0 33 16,10 172 61 11,3 478 88,7 539 100,0 103 19,10 436 80,9 539 100,0 11 39,30 17 74 15,7 397 60,7 28 100,0 84,3 471 100,0 199 42,3 272 57,7 471 100,0 132 28,0 339 72,0 471 100,0 65 23,2 215 76,8 280 100,0 144 51,4 136 48,6 280 100,0 95 33,9 185 66,1 280 100,0 38,1 13 15,5 201 61,9 21 100,0 84,5 238 100,0 57,1 21 100,0 59,7 238 100,0 12 57,1 9 66 27,7 172 42,9 21 100,0 72,3 238 100,0 2 - 7,1 - 26 - 92,9 - 28 100,0 - - - - - - - - - - - - - Sinto-me seguro Discordo Concordo Total n % n % n % 83,9 205 100,0 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 52 21,8 186 78,2 238 100,0 8 37 46 10,3 401 89,7 447 100,0 80 17,9 367 82,1 447 100,0 207 46,3 240 53,7 447 100,0 136 30,4 311 69,6 447 100,0 10,3 89,7 30 34,5 65,5 43,7 57,5 9 78 87 100,0 57 87 100,0 9 42,9 12 96 40,3 142 Gosto dos professores Discordo Concordo Total n % n % n % - 49 56,3 38 87 100,0 37 42,5 50 87 100,0 132 Quadro 80 - Autores vs. Opinião negativa sobre a Escola (leitura em linha) Não gosto da escola porque… Dá muito trabalho Discordo Concordo Total n % n % n % Autores Autores: Violência Física Autores: Violência Relacional Nenhuma Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Não gosto dos colegas Discordo Concordo Total n % n % n % É uma perca de tempo Discordo Concordo Total n % n % n % 164 80,0 41 20,0 205 100,0 200 97,6 5 2,4 205 100,0 188 91,7 17 8,3 205 100,0 394 73,1 145 26,9 539 100,0 511 94,8 28 5,2 539 100,0 488 90,5 51 9,5 539 100,0 11 376 39,3 79,8 17 95 60,7 20,2 28 100,0 471 100,0 23 456 82,1 96,8 5 15 17,9 3,2 28 100,0 471 100,0 19 441 67,9 93,6 9 30 32,1 6,4 28 100,0 471 100,0 185 66,1 95 33,9 280 100,0 261 93,2 19 6,8 280 100,0 240 85,7 40 14,3 280 100,0 8 190 38,1 79,8 13 48 61,9 20,2 21 100,0 238 100,0 17 230 81,0 96,6 4 8 19,0 3,4 21 100,0 238 100,0 14 217 66,7 91,2 7 21 33,3 8,8 21 100,0 238 100,0 330 73,8 117 26,2 447 100,0 429 96,0 18 4,0 447 100,0 409 91,5 38 8,5 447 100,0 56,3 43,7 87 100,0 75 86,2 12 13,8 87 100,0 69 79,3 18 20,7 87 100,0 49 38 133 4.1.7.2. Sistema de Regras Escolares O sistema de regras escolares é um domínio relevante na análise da violência na escola uma vez que se verificou noutras pesquisas que o nível de conhecimento e opinião dos alunos sobre o mesmo possui relação estatística com o tipo de comportamento, identificado em trabalhos anteriores, designadamente sobre a violência no namoro (Sebastião, Alexandre, Ferreira, 2010). Nesse sentido, dividiu-se a análise em duas dimensões: conhecimento do Regulamento Interno e Concordância com os castigos e tarefas aplicados na escola. A maioria dos alunos inquiridos (73,7%) afirma conhecer o Regulamento Interno da escola, considerando que respeita os direitos dos alunos. Os valores do teste do quiquadrado não demonstram a existência de associação entre o conhecimento do regulamento interno e o facto de ser autor de atos de violência (Q2 3,208; sig. 0,201), físicos (Q2 3,913; sig. 0,141) ou relacionais (Q2 2,391; sig. 0,302). A maioria dos alunos que não conhece o regulamento afirma que não está interessado em conhecê-lo, com exceção para os alunos que admitem ser autores frequentes de violência física que na sua maioria afirma que “não sabia que existia” (60%). No que respeita à opinião dos alunos sobre o regulamento, a maioria não considera que seja muito rígido e defende que contribui para a melhoria do ambiente escolar. Os autores de atos de violência relacional, em geral, não consideram que o regulamento interno seja uma ferramenta de apoio à participação dos alunos na escola. Quadro 81 - Autores/Regulamento Interno: resultados do teste do Qui-quadrado Q2 13,463 3,208 Sig. 0,097 0,201 Q2 19,073 3,913 Sig. 0,014 0,141 Autores: Violência relacional 2 Q Sig. 6,232 0,621 2,391 0,302 0,293 0,864 2,301 0,316 1,953 0,377 2,642 0,267 0,109 0,947 4,814 0,090 1,776 0,411 0,572 0,751 6,089 0,048 6,832 0,033 10,736 0,005 6,713 0,035 10,227 0,006 17,183 0,000 7,474 0,024 0,518 0,772 3,191 0,203 0,278 0,870 Autores Não conheces o Regulamento Interno Conheces o Regulamento Interno Respeita os direitos dos alunos Serve para impor a vontade Se conheces o dos professores Regulamento Ajuda-me a participar na Interno, qual a vida da escola tua opinião É muito rígido, não me sobre o deixa fazer nada mesmo? Contribui para se estar melhor na escola Serve para castigar quem se porta mal Autores: Violência física 134 Quadro 82 - Razões para não conhecer o Regulamento Interno (leitura em linha) Não estou interessado Nenhuma Autor: Raros/ Violência Esporádicos Física Frequentes/ Regulares O/A Professor/a não me deu o regulamento da escola n % n % 34 33,3 9 34 44,7 2 40,0 Não sabia que existia Não sabia Não sei onde que podia o posso lê-lo encontrar Total n % n % n % n 8,8 13 12,7 14 13,7 32 31,4 102 100,0 12 15,8 13 17,1 5 6,6 12 15,8 76 100,0 0 0,0 3 60,0 0 0,0 0 0,0 5 100,0 135 % Quadro 83 - Opinião sobre o Regulamento Interno (leitura em linha) Autores Autores: Violência Física Autores: Violência Relacional Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Ajuda-me a participar na vida da escola Não Sim Total n % n % n % - É muito rígido, não me deixa fazer nada Contribui para se estar melhor na escola Não n % Não n % Sim n % Sim n % Total n % Total n % 153 95,0 8 5,0 161 100,0 82 50,9 79 49,1 161 100,0 354 90,5 37 9,5 391 100,0 217 55,5 174 44,5 391 100,0 15 337 78,9 93,9 4 22 21,1 6,1 19 359 100,0 100,0 17 183 89,5 51,0 2 176 10,5 49,0 19 359 100,0 100,0 173 88,3 23 11,7 196 100,0 117 59,7 79 40,3 196 100,0 75,0 94,6 4 10 25,0 5,4 16 185 100,0 100,0 16 100 100,0 54,1 0 85 0,0 45,9 16 185 100,0 100,0 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 133 71,9 52 28,1 185 100,0 12 175 245 75,9 78 24,1 323 100,0 294 91,0 29 9,0 323 100,0 171 52,9 152 47,1 323 100,0 55 87,3 8 12,7 63 100,0 53 84,1 10 15,9 63 100,0 45 71,4 18 28,6 63 100,0 136 4.1.7.2.2. Castigos e tarefas aplicados na escola Em termos gerais, os alunos (independentemente de serem ou não autores de violência – física ou relacional) têm uma visão positiva dos atos disciplinares aplicados na escola: na sua maioria consideram que estes "contribuem para se estar melhor na escola", "são justos", “são o que os mal comportados precisam”, "melhoram os comportamentos" e "respeitam os direitos dos alunos". Contudo, consideram também que estes castigos e tarefas "deviam ser diferentes". Quadro 84 - Autores/Opinião sobre os castigos: resultados do teste do Qui-quadrado Autores Castigos: Visão positiva Castigos: Visão negativa Contribuem para se estar melhor na escola São justos Deviam ser diferentes São o que os mal comportados precisam Melhoram os comportamentos Respeitam os direitos dos alunos Pioram o ambiente da escola São muito duros Servem para impor a vontade dos professores Não servem para nada Autores: Violência física Autores: Violência relacional Q2 Sig. Q2 Sig. Q2 Sig. 8,203 0,017 5,110 0,078 13,107 0,001 5,936 7,128 18,709 7,418 1,678 8,792 1,495 0,051 0,028 0,000 0,025 0,432 0,012 0,473 4,421 12,137 12,440 3,674 0,278 6,015 8,056 0,110 0,002 0,002 0,159 0,870 0,049 0,018 8,286 4,937 14,541 9,273 5,200 7,496 3,585 0,016 0,085 0,001 0,010 0,074 0,024 0,167 2,655 0,265 6,170 0,046 4,894 0,087 21,183 0,000 24,461 0,000 24,661 0,000 137 Quadro 85 - Autores vs. Opinião positiva sobre os castigos aplicados na Escola (leitura em coluna) Nenhuma Discordo Contribuem para se estar melhor na escola Concordo Total Discordo São justos Concordo Total Discordo Deviam ser diferentes Concordo Total Discordo São o que os mal comportados precisam Concordo Total Discordo Melhoram os comportamentos Concordo Total n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % n % 50 24,8 152 75,2 202 100,0 51 25,2 151 74,8 202 100,0 95 47,0 107 53,0 202 100,0 62 30,7 140 69,3 202 100,0 61 30,2 141 69,8 202 100,0 Autores Raros/ Esporádicos 111 20,7 425 79,3 536 100,0 165 30,8 371 69,2 536 100,0 195 36,4 341 63,6 536 100,0 110 20,5 426 79,5 536 100,0 157 29,3 379 70,7 536 100,0 Frequentes/ Regulares 12 42,9 16 57,1 28 100,0 13 46,4 15 53,6 28 100,0 10 35,7 18 64,3 28 100,0 14 50,0 14 50,0 28 100,0 15 53,6 13 46,4 28 100,0 Autores: Violência Física Raros/ Frequentes/ Nenhuma Esporádicos Regulares 204 86 10 43,6 31,0 47,6 264 191 11 56,4 69,0 52,4 468 277 21 100,0 100,0 100,0 120 55 11 25,6 19,9 52,4 348 222 10 74,4 80,1 47,6 468 277 21 100,0 100,0 100,0 - Autores: Violência Relacional Raros/ Frequentes/ Nenhuma Esporádicos Regulares 53 88 32 22,6 19,7 37,6 182 358 53 77,4 80,3 62,4 235 446 85 100,0 100,0 100,0 58 136 35 24,7 30,5 41,2 177 310 50 75,3 69,5 58,8 235 446 85 100,0 100,0 100,0 74 86 26 31,5 19,3 30,6 161 360 59 68,5 80,7 69,4 235 446 85 100,0 100,0 100,0 66 129 38 28,1 28,9 44,7 169 317 47 71,9 71,1 55,3 235 446 85 100,0 100,0 100,0 138 Quadro 86 - Autores vs. Opinião negativa sobre os castigos aplicados na Escola (leitura em coluna) Nenhuma Discordo Pioram o ambiente da escola Concordo Total Discordo São muito duros Concordo Total Discordo Servem para impor a vontade dos professores Concordo Total Discordo Não servem para nada Concordo Total Autores Raros/ Esporádicos Frequentes/ Regulares Autores: Violência Física Raros/ Frequentes/ Nenhuma Esporádicos Regulares Autores: Violência Relacional Raros/ Frequentes/ Nenhuma Esporádicos Regulares n 159 374 16 350 186 13 180 317 52 % 78,7 69,8 57,1 74,8 67,1 61,9 76,6 71,1 61,2 n 43 162 12 118 91 8 55 129 33 % 21,3 30,2 42,9 25,2 32,9 38,1 23,4 28,9 38,8 n 202 536 28 468 277 21 235 446 85 % 100,0 - 100,0 - 100,0 - 100,0 100,0 100,0 n 277 135 13 100,0 - 100,0 - 100,0 - % - - - 59,2 48,7 61,9 - - - n - - - 191 142 8 - - - % - - - 40,8 51,3 38,1 - - - n - - - 468 277 21 - - - % - - - 100,0 100,0 100,0 - - - n - - - 286 144 11 - - - % - - - 61,1 52,0 52,4 - - - n - - - 182 133 10 - - - % - - - 38,9 48,0 47,6 - - - n - - - 468 277 21 - - - % - - - 100,0 100,0 100,0 - - - n 166 403 12 382 188 11 184 351 46 % 82,2 75,2 42,9 81,6 67,9 52,4 78,3 78,7 54,1 n 36 133 16 86 89 10 51 95 39 % 17,8 24,8 57,1 18,4 32,1 47,6 21,7 21,3 45,9 n 202 536 28 468 277 21 235 446 85 % 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 139 4.1.7.3. Relação com os adultos da escola Tal como o sistema de regras, a perceção sobre a relação mantida com os adultos na escola é um domínio importante para explicar as práticas de violência dos alunos. Na sua maioria os alunos confiam e obedecem aos adultos da Escola (Diretor(a) de turma, Diretora da Escola, Professores da turma e da direção, Funcionários). Nota-se, contudo, uma ligeira tendência para os autores frequentes (independentemente do tipo de violência) confiarem e obedecerem ligeiramente menos aos adultos do que os restantes colegas (diferenças de cerca de 10-15%). Quadro 87 - Autores/Confiança e Obediência aos adultos da Escola: resultados do teste do Qui-Quadrado Autores Diretor(a) de Turma Professores da Turma Funcionários da Confiança Escola Professores da Direção Diretora da Escola Diretor(a) de Turma Professores da Turma Funcionários da Obediência Escola Professores da Direção Diretora da Escola Q2 3,791 5,301 Sig. 0,150 0,071 Autores: Violência física Q2 Sig. 4,416 0,110 6,835 0,033 Autores: Violência relacional Q2 Sig. 32,740 0,000 19,958 0,000 10,326 0,006 8,244 0,016 7,940 0,019 13,724 0,001 28,394 0,000 16,657 0,000 10,216 9,754 6,183 0,006 0,008 0,045 22,062 18,089 14,093 0,000 0,000 0,001 13,676 16,204 12,365 0,001 0,000 0,002 8,224 0,016 12,681 0,002 12,441 0,002 14,179 0,001 13,044 0,001 10,351 0,006 14,831 0,001 4,482 0,106 9,198 0,010 140 Quadro 88 – Autores vs. Confiança nos adultos da Escola (leitura em linha) Nenhuma Raros / Autores Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Físicos Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Relacionais Esporádicos Frequentes / Regulares Diretor(a) de Turma Não Confio Total confio n % n % n % Professores da Turma Não Confio Total confio n % n % n % Funcionários da Escola Não Confio Total confio n % n % n % Professores da Direção Não Confio Total confio n % n % n % Diretora da Escola Não Confio Total confio n % n % n % - - - - - - - - - - - - 42 20,5 163 79,5 205 100,0 29 14,1 176 85,9 205 100,0 30 14,6 175 85,4 205 100,0 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 175 32,5 364 67,5 539 100,0 110 20,4 429 79,6 539 100,0 97 18,0 442 82,0 539 100,0 8 28,6 20 71,4 28 100,0 12 42,9 16 57,1 28 100,0 11 39,3 17 60,7 28 100,0 37 7,9 434 92,1 471 100,0 121 25,7 350 74,3 471 100,0 65 13,8 406 86,2 471 100,0 65 13,8 406 86,2 471 100,0 29 10,4 251 89,6 280 100,0 99 35,4 181 64,6 280 100,0 77 27,5 203 72,5 280 100,0 63 22,5 217 77,5 280 100,0 5 23,8 16 76,2 21 100,0 5 23,8 16 76,2 21 100,0 9 42,9 12 57,1 21 100,0 10 47,6 11 52,4 21 100,0 18 7,6 220 92,4 238 100,0 22 9,2 216 90,8 238 100,0 55 23,1 183 76,9 238 100,0 38 16,0 200 84,0 238 100,0 38 16,0 200 84,0 238 100,0 17 3,8 430 96,2 447 100,0 30 6,7 417 93,3 447 100,0 137 30,6 310 69,4 447 100,0 82 18,3 365 81,7 447 100,0 72 16,1 375 83,9 447 100,0 18 20,7 69 79,3 87 100,0 19 21,8 68 78,2 87 100,0 33 37,9 54 62,1 87 100,0 31 35,6 56 64,4 87 100,0 28 32,2 59 67,8 87 100,0 141 Quadro 89 - Autores vs. Obediência aos adultos da Escola (leitura em linha) Diretor(a) de Turma Não Obedeço Total obedeço n % n % n % Nenhuma Raros / Autores Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Físicos Esporádicos Frequentes / Regulares Nenhuma Raros / Relacionais Esporádicos Frequentes / Regulares Professores da Turma Não Obedeço Total obedeço n % n % n % Funcionários da Escola Não Obedeço Total obedeço n % n % n % Professores da Direção Não Obedeço Total obedeço n % n % n % Diretora da Escola Não Obedeço Total obedeço n % n % n % 11 5,4 194 94,6 205 100,0 17 8,3 188 91,7 205 100,0 25 12,2 180 87,8 205 100,0 14 6,8 191 93,2 205 100,0 14 6,8 191 93,2 205 100,0 24 4,5 515 95,5 539 100,0 43 8,0 496 92,0 539 100,0 113 21,0 426 79,0 539 100,0 25 4,6 514 95,4 539 100,0 18 3,3 521 96,7 539 100,0 5 17,9 23 82,1 28 100,0 6 21,4 22 78,6 28 100,0 7 25,0 21 75,0 28 100,0 6 21,4 22 78,6 28 100,0 5 17,9 23 82,1 28 100,0 17 3,6 454 96,4 471 100,0 28 5,9 443 94,1 471 100,0 70 14,9 401 85,1 471 100,0 18 3,8 453 96,2 471 100,0 18 6,4 262 93,6 280 100,0 33 11,8 247 88,2 280 100,0 71 25,4 209 74,6 280 100,0 23 8,2 257 91,8 280 100,0 5 23,8 16 76,2 21 100,0 5 23,8 16 76,2 21 100,0 4 19,0 17 81,0 21 100,0 4 19,0 17 81,0 21 100,0 - - - - - - - - - - - - 13 5,5 225 94,5 238 100,0 19 8,0 219 92,0 238 100,0 31 13,0 207 87,0 238 100,0 16 6,7 222 93,3 238 100,0 14 5,9 224 94,1 238 100,0 15 3,4 432 96,6 447 100,0 31 6,9 416 93,1 447 100,0 88 19,7 359 80,3 447 100,0 18 4,0 429 96,0 447 100,0 14 3,1 433 96,9 447 100,0 12 13,8 75 86,2 87 100,0 16 18,4 71 81,6 87 100,0 26 29,9 61 70,1 87 100,0 11 12,6 76 87,4 87 100,0 9 10,3 78 89,7 87 100,0 142 4.1.8. Importância dos Estudos Para analisar a importância atribuída aos estudos pelos alunos inquiridos, orientou-se a análise por duas dimensões: visão positiva do percurso escolar e visão negativa. De referir que na visão positiva, não foi possível realizar o cruzamento com os autores relacionais, devido aos valores do teste do Qui-Quadrado. Parte dos autores (de violência em geral e de violência física) considera que os estudos são importantes para compreender a realidade e que se deve investir nos estudos para ter um trabalho melhor. A maioria deste alunos admite também que gostaria de continuar a estudar e que os estudos fazem parte dos seus planos futuros, no entanto, muitos afirmam precisar de começar a trabalhar para ganhar o seu dinheiro. Esta análise cruzada permite compreender que estes alunos têm noção da necessidade de um emprego para a sua independência financeira, não considerando, contudo, que esse caminho possa ser realizado sem estudar. Quadro 90 - Autores/Importância dos estudos: resultados do teste do Qui-quadrado Autores Visão positiva Para perceber bem as coisas que se passam à minha volta, tenho de estudar Para ser uma pessoa importante, tenho de ter estudos Deve-se investir nos estudos para ter um trabalho melhor Quem tem um curso é mais inteligente Estar a estudar é melhor que trabalhar Preciso de começar a trabalhar para ganhar o meu dinheiro Não tenho jeito para os estudos Visão negativa Já sei o que quero fazer no futuro e não preciso de estudos para isso Estudar não leva a lado nenhum Se me deixassem, não estudava mais Autores: violência física Q2 Sig. Autores: violência relacional Q2 Sig. Q2 Sig. 2,521 0,284 6,079 0,048 1,324 0,516 0,412 0,814 5,466 0,065 2,086 0,352 14,356 0,001 15,522 0,000 5,091 0,078 3,932 0,391 0,140 0,822 1,350 2,477 0,509 0,290 2,317 0,921 0,314 0,631 0,890 0,641 16,171 0,000 3,679 0,159 3,113 0,211 3,574 0,167 1,802 0,406 13,576 0,001 18,372 0,000 1,462 0,482 28,821 0,000 45,449 14,564 0,001 17,250 0,000 0,000 14,805 12,844 0,001 0,002 143 Quadro 91 - Autores vs. Importância dos Estudos: visão positiva (leitura em linha) Autores Autores: Violência Física Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Raros / Esporádicos Frequentes / Regulares Para perceber bem as coisas que se passam à minha volta, tenho de estudar Discordo Concordo Total n % n % n % - Deve-se investir nos estudos para ter um trabalho melhor Discordo n % Concordo n % Total n % 11 5,4 194 94,6 205 100,0 12 2,2 527 97,8 539 100,0 14,3 3,2 24 456 85,7 96,8 28 471 100,0 100,0 - - - - - - - - - - - - 39 8,3 432 91,7 471 100,0 4 15 29 10,4 251 89,6 280 100,0 8 2,9 272 97,1 280 100,0 5 23,8 16 76,2 21 100,0 4 19,0 17 81,0 21 100,0 144 Quadro 92 - Autores vs. Importância dos estudos: visão negativa (leitura em linha) Nenhuma Raros/ Autores Esporádicos Frequentes/ Regulares Nenhuma Autores: Raros/ Violência Esporádicos Física Frequentes/ Regulares Nenhuma Autores: Raros/ Violência Esporádicos Relacional Frequentes/ Regulares Preciso de começar a trabalhar para ganhar o meu dinheiro Discordo Concordo Total Já sei o que quero fazer no futuro e não preciso de estudos para isso Discordo Concordo Total Discordo Concordo n % n % n % n % n % n n % n % n - - - - - - 185 90,2 20 9,8 205 100,0 193 94,1 12 5,9 205 - - - - - - 484 89,8 55 10,2 539 100,0 515 95,5 24 4,5 - - - - - - 19 67,9 9 32,1 28 100,0 20 71,4 8 216 45,9 255 54,1 471 100,0 429 91,1 42 8,9 471 100,0 454 96,4 90 32,1 190 67,9 280 100,0 246 87,9 34 12,1 280 100,0 261 5 23,8 16 61,9 8 38,1 21 100,0 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 76,2 21 100,0 13 % Estudar não leva a lado nenhum Se me deixassem, não estudava mais Total Discordo % n Concordo Total % n % n % 100,0 180 87,8 25 12,2 205 100,0 539 100,0 478 88,7 61 11,3 539 100,0 28,6 28 100,0 18 64,3 10 35,7 28 100,0 17 3,6 471 100,0 428 90,9 43 9,1 471 100,0 93,2 19 6,8 280 100,0 234 83,6 46 16,4 280 100,0 13 61,9 8 38,1 21 100,0 14 66,7 7 33,3 21 100,0 - 222 93,3 16 6,7 238 100,0 209 87,8 29 12,2 238 100,0 - - 431 96,4 16 3,6 447 100,0 401 89,7 46 10,3 447 100,0 - - 75 86,2 12 13,8 87 100,0 75,9 21 24,1 87 100,0 66 145 4.2. ENTREVISTAS A ALUNOS REINCIDENTES 4.2.1. Objetivos e procedimentos A opção pela realização de entrevistas a alunos com comportamentos violentos reincidentes teve como objetivo compreender como estes avaliam a sua participação em situações de violência e indisciplina grave, as suas representações sobre a escola e os procedimentos disciplinares. No guião de inquirição organizou-se os seguintes eixos: caracterização dos alunos; relação com a escola e percurso escolar; rede de relações pessoais; práticas de violência; representações sobre as normas e a justiça escolares. Optou-se pela inclusão de análise de redes sociais42. A seleção dos alunos a entrevistar resultou de um cruzamento de procedimentos analíticos, partindo da análise estatística dos dados de ocorrências monitorizados internamente pelas escolas (pelos respetivos Gabinetes de Intervenção Disciplinar) e o consequente levantamento de informação sobre os alunos das turmas selecionadas (percurso escolar, procedimentos disciplinares). Conjugou-se assim a informação resultante da análise documental com a informação recolhida em reuniões com os Diretores de Turma das respetivas turmas. O tratamento dos dados dos gabinetes garantiu, por um lado, a sistematização das situações de violência vividas nas escolas (tipo de ocorrências, anos de escolaridade, medidas aplicadas, etc.) e, por outro, uma seleção criteriosa dos alunos a inquirir, de modo a garantir a comparabilidade. De um total de 31 alunos com comportamentos reincidentes escolheram-se 5 alunos em cada escola43, tendo como critérios de seleção a pertença ao ensino regular, à mesma turma e alunos de sexos diferentes (5 na escola E2, 9 na escola E1 e 4 na escola E3). 4.2.2. Caracterização dos alunos Os 18 alunos entrevistados podem distinguir-se por três atributos distintos: a pertença à escola, o tipo de comportamento e a dimensão e composição das suas redes de relações. Os alunos têm entre 10 a 15 anos, frequentam o 5º, 6º e 7º anos de escolaridade do Ensino Básico Regular e 15 deles são do sexo masculino. A dimensão das redes ou comunidades pessoais dos entrevistados varia entre 6 e 26 indivíduos nomeados, significando que neste grupo existem redes de relações muito diferenciadas tanto em grau (número de ligações diretas) como na forma. Tendo em conta esta amplitude, agrupámos as redes em três tipos de dimensão: reduzida (≤10 membros, ≤ 30 laços), intermédia (11-15 membros, 31 a 69 laços) e elevada (≥16 42 O gerador de nomes utilizado no guião de entrevistas baseou-se num conjunto de questões sobre o tipo de apoios recebidos pelo indivíduo focal. 43 Nas escola E2 os 5 alunos foram autorizados e na escola E3 4 em 5 foram autorizados. Na escola E1, apenas 3 em 5 foram autorizados, devido ao tempo de demora nas autorizações pedidas nesta escola foram solicitados mais 7 pedidos, tendo sido autorizados 6 alunos, resultando num total de 9 alunos entrevistados. 146 membros, ≥ 70 laços). Ainda na ótica das comunidades pessoais dos alunos, constatou-se que a maioria dos alunos recebe entre 20 a 30 apoios dos membros das suas redes, sendo o lazer44 e o apoio instrumental45 os mais frequentes. As relações informais são preponderantes, havendo no entanto um número relevante de alunos cujas relações entre os seus membros são mistas, isto é, cujos amigos, familiares e professores se conhecem bem. A avaliação dos comportamentos destes alunos baseou-se na recolha de informação junto da escola e dos respetivos Diretores de Turma, tendo estes sido agrupados segundo três tendências comportamentais relativas às condutas violentas: a) Perturbações emocionais e do comportamento – alunos com acompanhamento psiquiátrico ou psicológico, n=5); b) Indisciplina e resistência à autoridade – alunos com comportamentos marcados por desrespeito para com outros alunos e/ou regras escolares (n=4) ou para com os adultos da escola (n=5); c) Agressividade e conflitualidade – alunos com atitudes e práticas agressivas e conflituosas, como a ameaça e a ofensa à integridade física (n=4). Os casos de indisciplina reiterada, seja contra os adultos da escola, sejam contra as regras escolares e/ou contra outros alunos, são os mais frequentes. 44 45 No sentido de ter companhia para passar o tempo livre. Pedir dinheiro emprestado (pontual ou permanente) ou ajuda para as tarefas da escola. 147 Quadro 93 - Tipo de comportamento e dimensão de rede por aluno e por escola Aluno A1E2 A3E2 A2E2 A5E2 A4E2 A13E1 A15E1 A17E1 A6E1 A8E1 A18E1 A7E1 A14E1 A16E1 A11E3 A12E3 A10E3 A9E3 Escola E2 E2 E2 E2 E2 E1 E1 E1 E1 E1 E1 E1 E1 E1 E3 E3 E3 E3 Tipo de comportamento Perturbações emocionais e do comportamento Agressividade Indisciplina (adultos) Indisciplina (adultos) Indisciplina (colegas/ regras escolares) Agressividade Indisciplina (adultos) Indisciplina (colegas/ regras escolares) Indisciplina (colegas/ regras escolares) Indisciplina (colegas/ regras escolares) Perturbações emocionais e do comportamento Perturbações emocionais e do comportamento Perturbações emocionais e do comportamento Perturbações emocionais e do comportamento Agressividade Agressividade Indisciplina (adultos) Indisciplina (adultos) Dimensão da Rede intermédia intermédia intermédia elevada elevada reduzida reduzida reduzida elevada elevada elevada elevada reduzida intermédia elevada elevada intermédia intermédia Metade dos alunos pertence à escola E1, 4 inseridos em comunidades pessoais de dimensão reduzida, 4 em redes de dimensão elevada e 1 numa rede de dimensão intermédia, sendo que esta escola reúne a maioria de alunos acompanhados por perturbações emocionais ou de comportamento. No caso da escola E2, os alunos inserem-se em comunidades de dimensão intermédia ou elevada, com aqui a reincidência mais associada a situações de desrespeito aos adultos da escola ou às regras e/ou aos outros alunos. Na escola E3 os alunos com comportamentos agressivos estão maioritariamente integrados em comunidades pessoais maiores (interligados com ≥16 indivíduos). Se não tomarmos em consideração a escola, verificamos que não há uma associação entre a dimensão da rede e o tipo de comportamentos dos alunos entrevistados. Quadro 94 - Tipo de comportamento e dimensão de rede Tipo de comportamento Agressividade Indisciplina (adultos) Indisciplina (alunos/ regras escolares) Perturbações emocionais e do comportamento Dimensão da Rede Elevada Intermédia Reduzida 2 1 0 1 3 1 3 0 1 2 2 1 148 Metade destes alunos não conhece ou não vive com o pai, pertence a famílias monoparentais, com a mãe a assumir o papel de Encarregada de Educação. Segundo os diretores de turma, em dois dos casos embora a mãe procure estar presente quando a escola chama, encontra-se muitas vezes ausente ou tem uma má relação com o respetivo aluno. Tendo em conta o perfil dos alunos entrevistados, importa agora apresentar a análise das entrevistas, considerando os eixos analíticos enunciados no início desta secção. 4.2.3. Relação dos alunos na escola Conhecer a relação institucional de um conjunto de alunos com atitudes e comportamentos violentos ou indisciplina grave, é fundamental para se poderem definir as estratégias e mecanismos de regulação. Procurámos assim analisar a forma como os alunos caracterizam o ambiente escolar. Em termos globais, os alunos conhecem a sua escola e têm uma visão positiva sobre esta, valorizando sobretudo o convívio informal com outros alunos nos intervalos: Eu acho que a escola é... Como devo dizer? É bom... O ensino... Ensina bem. É a minha segunda casa. (...) Eu gosto de todos! (A2E2) Acho boa, a escola. O que eu gosto mais é de jogar à bola, divertir-me com os meus amigos. (A4E2) Tanto na escola E3 como na escola E1, alguns alunos reconheceram haver situações de conflito nas suas escolas. Relativamente aos aspetos negativos os alunos da escola E2 a assinalarem conflitos em situações lúdicas, da E3 a apontaram sobretudo as obras a decorrer na escola como o principal motivo para os conflitos e os alunos da E1 salientaram as agressões e situações de dominação dos mais velhos sobre os mais novos: Os mais velhos, que às vezes tiram as coisas aos outros e isso... (A8E1) Há pessoas que brincam com pedras, nas obras... E há colegas que brincam com pedras. (A11E3) Do 8º ano. Nós estávamos a jogar... É sempre! Sempre que estamos a jogar no campo eles chegam lá e tiram-nos [a bola]! (A3E2) Os alunos agressivos e os que desrespeitam os outros alunos e/ou as normas escolares deram conta de vivência de situações de violência na escola, como lutas, roubos e conflitos entre alunos. Estes alunos enunciaram também um maior número de aspetos negativos e maior diversidade de situações de conflito. (...) há meninos que querem almoçar aqui na escola e como não têm a senha roubam o dinheiro. Roubam os nossos lanches. (A12E3) Às vezes há miúdos que vêm aqui muitas vezes... (...) E depois aleijam mesmo os outros... (...) Eles fazem os outros chorar e depois os outros vão chamar os pais (...) E o pai ameaçou o miúdo e depois a polícia veio cá... (A6E1) 149 [Que tipo de problemas há?] Os alunos a discutirem com as contínuas. (...) Às vezes há confusões. Mas é mais fora da escola. [Situações de roubo?] Há muitas! (...)No pavilhão de educação física... [E tu já viste alguma situação dessas?] Ver não... Já ouvi falar. (A5E2) Que eu saiba só foi essa, que aconteceu hoje... (...) Nunca vi roubos. (...) Já soube alguma coisa de roubo.... (A11E3) A maior abrangência das relações sociais entre pares e outras formas de sociabilidade, o acesso a mais informação, recurso e apoios resultantes de um número mais elevado de relacionamentos, contribui para a construção da percepção que os alunos têm da escola. Nesse sentido, a variação de perspetivas poderá estar mais relacionada com a dimensão da rede em que se integram, contribuindo para um sentimento de maior ou menor insegurança e/ou proteção. 4.2.4. Conflitos na escola: intervenientes e motivações A partir das afirmações dos alunos com comportamentos reincidentes, procurou-se aprofundar o conhecimento sobre os tipos de conflitos que ocorrem na escola, e as razões que consideram estar na sua génese. Os entrevistados forneceram descrições pormenorizadas e relativamente diversas sobre os conflitos que vivenciaram na escola. Independentemente da escola de proveniência, os alunos reconhecem a ocorrência de conflitos no espaço escolar associado maioritariamente a situações de dominação ou provocação dos alunos mais velhos (sobretudo os do 3º ciclo EB) sobre os mais novos (2º ciclo), sobretudo entre rapazes afirmando ser raro o envolvimento das raparigas. Eu vejo mais lutas de rapazes... (A11E3) Epá, pelo que eu conheço é mais rapazes que roubam do que raparigas. (A7E1) É os mais novos, os de quinto ano e sexto têm mais receio dos mais velhos. Por isso é que fazem tudo o que eles pedem. (A8E1) Depois há uns que não se arriscam... Mas tem de se saber de quem é mala, se for tipo dos... Dos do CEF ou assim... (...) Oh! São mais velhos, têm respeito. É mais velho! Toda a gente... É mais... Com as raparigas não, mas com os rapazes sim! (A18E1) Os alunos entrevistados na escola E2 referem a ocorrência de roubos, brigas, insultos e violência física na escola (bater), motivados por diferenças de opinião entre alunos, desentendimentos com professores em sala de aula e com funcionários e professores nos restantes espaços escolares. Na escola E3 os alunos identificam situações de lutas, insultos e ameaças, agressões e ainda alguns roubos. Já na escola E1 os alunos apontam sobretudo para roubos e discussões que levam a lutas e aos insultos. Os alunos referem que nesta escola os incidentes muitas vezes começam nas salas de aula 150 e continuam no recreio, contrariando a opinião frequente dos professores que os problemas são "transportados" para a sala de aula. Bem, há problemas que começam dentro da sala de aula. (...) Um chama burro ao outro, porque não soube dizer aquilo... (A14E1) Os alunos referem-se maioritariamente aos recreios, ginásio, bar ou na sala de convívio como locais em que ocorrem os conflitos descritos. Aí no Balneário. Porque antes não havia cacifos dos novos, só havia dos antigos. E às vezes roubavam... (A7E1) É ali no Bar ou no campo. (A2E2) Apenas os alunos com perturbações emocionais e do comportamento referem a ocorrência de desentendimentos em sala de aula entre alunos e professores e fora das salas entre alunos, professores e funcionários. Nas aulas de Matemática e nas aulas de Português, quando querem dar resposta e os professores não deixam... (A1E2) Não se verificaram diferenças relevantes relativamente ao tipo de comportamentos dos alunos. Há, contudo, uma maior variedade de conflitos, intervenientes e locais para os alunos que indicaram redes de relações mais alargadas. “Biless — que é nós metemo-nos em círculos e eles começam a lutar... (A16E1) [Sorri] Isso aí são vários jogos! Isso aí são jogos lá deles, desses malucos aí! Mas eu não me ponho nisso... Há uma coisa, é tipo... Há uns que é o corredor da morte, põemse todos... Normalmente é no C – que o C é o que tem mais – põem-se tipo... (...) Depois põe-se lá, depois sempre que alguém passa começa tudo a bater! (A18E1) A uma maior heterogeneidade de interações, lidas na rede alargada de relações dos alunos, correspondem visões mais diversificadas e abrangentes da conflitualidade existente na escola. Possivelmente, estes alunos por estabelecerem laços com maior número de pessoas na escola, têm uma maior probabilidade de saber ("já ouvi falar"; "já soube") ou de testemunhar situações de conflito. 4.2.4.1. Motivações dos Conflitos Em todas as escolas as provocações entre alunos e os roubos são as causas mais apontadas para a ocorrência de situações de conflitos. Para os alunos da escola E2 um dos principais motivos decorre de disputas pessoais. Hum... Ou é por raiva ou... Deve ter alguma coisa com essa pessoa, alguma coisa assim. (A2E2) 151 Nesta escola também são referidos conflitos nos campos de futebol, havendo brigas pela ocupação do campo e roubos das bolas, maioritariamente por parte dos mais velhos sobre os mais novos. (...) às vezes nós estamos a jogar à bola e eles chegam lá e tiram-nos do campo. (...) Às vezes até nos dão calduços! (...) Se nós não jogarmos com eles, eles tiram-nos a bola e eles jogam. (A3E2) Por sua vez, os alunos da escola E3 consideram que os conflitos ocorrem porque há alunos que são violentos por natureza e que gostam de exibir o seu poder agredindo os mais novos. Em princípio eu quando cheguei aqui senti-me diferente. Aqui os meninos, há miúdos violentos. (...) Isso já é maneira de estar deles, dos alunos. Gostam de violar.... (...) Porque mostram força em cima dos outros mais novos. (A9E3) As lutas são igualmente provocadas por discussões e desentendimentos pessoais, sendo também referidos roubos, nomeadamente para comprar comida no bar e/ou comprar senhas de almoço ou alguns roubos de lanches: Já não é a primeira vez que roubam o dinheiro, o meu dinheiro da mala e isso tudo. (...) Porque há... Isso acontece mais às 10h da manhã, 'praí porque há meninos que querem almoçar aqui na escola e como não têm a senha roubam o dinheiro. Roubam os nossos lanches. (A12E3) Os alunos da escola E1 afirmam também que a maioria dos conflitos existe por provocações entre alunos e por roubos. Então! Provocam-se uns aos outros! (A15E1) É quase tudo ou é por causa das filas ou então é porque um miúdo vai a andar e depois vai contra o outro e depois diz: "Ah, não pedes desculpa?" Ele diz que não... É sempre essas coisas aqui. (A18E1) Apesar de não se verificaram diferenças expressivas nas causas de conflito apontadas pelos entrevistados segundo o tipo de comportamentos, importa destacar alguns aspetos. Os alunos com perturbações de comportamento e os alunos que desrespeitam os adultos da escola foram os que expressaram a ideia relativa ao uso da violência como forma de afirmação pessoal e de demonstração de poder (nomeadamente dos mais velhos sobre os mais novos). As pessoas ligam aos comentários... Depois... Preocupam-se mais com os outros do que com eles. (...) "Aí, eu não admitia que ele me fizesse isso!" Depois a outra pessoa para não se inferiorizar vai lá e começa a lutar. (...) [Lutam] Para mostrar que são melhores que os outros. (A14E1) Os jogos de futebol foram referidos com maior frequência pelos alunos que desrespeitam os colegas e/ou as normas da escola e pelos alunos agressivos. Por se tratarem de alunos com reincidência de comportamentos relacionados com as 152 situações entre pares e a conflitualidade, parece que os momentos de competição no recreio como os jogos de futebol são as ocasiões para a emergência de situações de conflito. Acho que foi por causa de um jogo de futebol... (...) É sempre. O que eu acho é que quando uns chamam nomes aos outros e depois aí é que dá luta. (...) Gostam de chamar nomes, às vezes, os mais velhos... Gostam de estar a dizer asneiras e isso... A chamar nomes aos outros. (A4E2) Os alunos com redes de relações mais alargadas apresentaram um maior leque de possibilidades relativas às razões para a ocorrência de conflitos. Porque é... São aqueles que pensam que são os melhores, gostam de provocar os outros, porque são mais chatos e depois às vezes apanham, outras vezes dão neles... (A8E1) Em síntese, os jogos de futebol, as discussões por bens materiais ou roubos são genericamente apontadas como as principais causas para emergência de situações de conflitualidade na escola. No entanto, a natureza violenta de certos alunos, e os conflitos resultantes de assuntos pessoais foram também motivos indicados pelos alunos reincidentes para a ocorrência de conflitos. Os problemas relatados e as causas apontadas parecem assim estar associadas às redes de sociabilidades e situações de interação vivenciados na escola em momentos e locais de recreio e jogos, mas também com condições contextuais, como as situções de roubo de dinheiro para pagar almoços e lanches. 4.2.5. Perceção da justiça, sistemas de regras e as estratégias de regulação escolares No sentido de conhecer a perceção dos alunos com comportamentos reincidentes sobre os sistemas de regras e as estratégias de regulação escolares os entrevistados foram questionados sobre a intervenção dos adultos da escola em situações de conflito, as normas escolares e os castigos aplicados snas suas escolas. Tanto os alunos da escola E1 como os da escola E2 consideram insuficientes as intervenções sobre as situações de conflito e de violência nas respetivas escolas. Parte dessa insuficiência prende-se com o facto de em algumas situações descritas os adultos da escola, nomeadamente professores, que na sequência de conflitos e atos violentos não darem seguimento do ponto de vista processual à situação. A presença dos adultos para a resolução de conflitos entre alunos, parece assim, no discurso dos alunos entrevistados, não ser por estes considerada como certa, porque nem sempre são chamados pelos alunos, e por em certas situações poder, ou não, intervir. A análise dos discursos dos alunos reincidentes reforça a ideia sobre a importância da participação dos adultos na resolução dos conflitos, assim como da celeridade e tomada de conhecimento sobre a mesma. Igualmente, ganha particular evidência a importância dos outros alunos que testemunham e que se encontram na situação de conflito na condição de espetadores, e que podem ou não, como referem, apoiar a 153 resolução ou contribuir para que se intensifique o conflito, sobretudo no caso das brigas, discussões e lutas. Não sei muito bem. Porque aconteceu um problema e ainda ninguém resolveu nada. (...) Estávamos na aula depois um miúdo começou-me a provocar, lá fora apareceram mais... Eram para aí uns 5 e bateram-me todos e a 'stôra depois, ao fim, a 'stôra disse que ia fazer participação e ainda não fizeram nada. (...) Às vezes, os professores vêem dois miúdos, prontos, a zangarem-se uns com os outros e não fazem nada! (A8E1) Por acaso não costumam fazer nada. Às vezes o senhor lá do bar, às vezes costuma parar mas nem sempre. Nem sempre chamam a empregada. As contínuas vêm lá... (...) O que devia acontecer mais vezes é: quando há discussão chamarem sempre a contínua. Porque nem sempre chamam. Sim, o que devia acontecer era chamarem mais vezes a contínua. (A4E2) Um das explicações avançadas para a insuficiente regulação dos adultos, por dois alunos da escola E1, prende-se com o medo que funcionários têm dos alunos violentos, segundo estes alunos por esse motivo os funcionários intervêm menos quando se trata de conflitos entre pares, principalmente entre os alunos mais velhos. Depende de quem está lá no sítio, quem está há sempre confusão! Pode estar só a ver mas depois o não sei quantos empurra, depois... Depois acaba por estar tudo, toda a gente vai lutar. Depois chegam lá as contínuas e as contínuas também... (...) Elas têm medo! Elas e os professores! Ninguém faz nada! Só o Sr. Z [Guarda da escola] armava-se em esperto, foi lá uma vez, depois há um rapaz – que já cá não está – o ano passado disse: "Ah, eles começaram têm que acabar" E depois empurraram o Sr. Depois desde aí ele passa e finge que não vê e vem cá para cima para a Direção! (...) Quase ninguém faz nada! Ou há lá alguns alunos que chegam lá e que... Tipo, se for um do 9º ou assim... E depois está lá um miúdo de 5º ano eles aí... Eles separam, né? Os mais velhos. Mas mais velhos com mais velhos e isso, isso aí ainda ajudam mais à festa! Se começam-se a picar têm que resolver isso por eles, ninguém tem que ir lá ajudar! Depois há uns que começam a chamar os primos e não sei quê... (A18E1) Às vezes os mais velhos passam à frente no bar e as contínuas olham e não fazem nada! Por exemplo, no outro dia um brasileiro, mais velho, passou-me à frente e eu avisei a contínua, a contínua não fez nada e eu fui lá para a frente também e a contínua não disse mais nada. Eles passam à frente... As contínuas, às vezes, também têm medo. (A14E1) E as contínuas ali do refeitório dão aos mais velhos, eles dizem querem mais comida, elas põe logo mais comida e se se portam mal não dizem nada! E aos mais novos, se nós pedimos mais um bocadinho de comida elas dizem que não, que não se pode repetir. (A8E1) Nesta sequência, um destes entrevistados refere mesmo que os alunos recémchegados à escola são aconselhados por professores e funcionários a aproximarem-se e fazer amizade com alunos mais velhos "problemáticos" que lhes possam oferecer proteção nos intervalos. 154 Cá nesta escola sempre que alguém do 5º ano entra – até os professores e os contínuos já dizem isso, para arranjarem amigos... Não é preciso andarem com ele, mas pelo menos arranjem 1 ou 2 amigos que tenham bué conflitos. Porque nesta escola, sempre... Se ninguém tem um aluno amigo, assim que conheça muita gente aqui na escola ou que tenha muita confusão, está sempre a apanhar! Depois aqueles podem não ser conhecidos, batem-lhes uma vez, depois eles dizem a esse tal amigo, depois vai lá e depois, olha, já ninguém lhes faz nada! (A18E1) Esta estratégia aponta para a existência de mecanismos informais na escola para a prevenção e resolução das situações de conflito. A delegação da responsabilidade nos alunos parece assim contribuir para a distribuição de poder e dominação desigual no espaço escolar, com reforço da primazia dos alunos mais velhos e/ou dos considerados mais problemáticos. Por outro lado, contribui para a naturalização do conflito e da violência entre pares na escola, desresponsabilizando os adultos da escola relativamente à prevenção e intervenção em situações de conflito e violência na escola, sobretudo nos espaços de recreio, jogos e bar. Outra explicação avançada pelos alunos relativamente ao que consideram ser uma intervenção insuficiente por parte dos adultos da escola, prende-se com a necessidade de maior vigilância. Na escola E1 alguns entrevistados referem a necessidade de maior vigilância, seja pelo aumento do número de funcionários, seja pela implementação de um sistema de videovigilância na escola. Pois, [a escola] mais do que faz não pode fazer porque depois se andarem lá pela escola, as funcionárias, não há ninguém nos pavilhões, depois nos pavilhões pode acontecer! E como já têm poucos funcionários... Mas quer dizer ainda têm alguns mas não podem estar... Não se podem multiplicar! Depois é muita gente para pagar! (A16E1) Deviam meter câmaras em todas as salas para controlar os alunos. (...) E ter uma 'stôra para dar aula e um 'stôr de vigilância. (A7E1) Podiam por mais vigilância, mais câmaras no recreio e depois viam o que é que se tinha passado e iam falar com o miúdo, com a pessoa que arranjou a confusão. Punham no recreio e nas salas de aula e depois iam falar com a pessoa que arranjou a confusão e depois castigava de alguma forma. (A8E1) Os alunos identificados por situações reiteradas de indisciplina com os adultos da escola foram os únicos a considerar que a intervenção escolar é suficiente. Esta tendência aponta para o eventual aumento das respostas de regulação escolar nestes casos específicos por envolverem adultos, uma vez que para os outros tipos de comportamento não se verificou esta convergência46. 46 A frequência de tipos de comportamento dos alunos é relativamente equitativa (Perturbações de comportamento n= 5; Indisciplina com Adultos da escola n= 5; Indisciplina com Outros alunos e/ou desrespeito pelas Regras escolares n= 4; Agressividade n=4). 155 Na sequência da necessidade de maior intervenção, os alunos avançaram o que consideram ser as estratégias a desenvolver para a resolução dos conflitos e violência na escola. Nos casos de desrespeito aos adultos da escola, os alunos com comportamentos indisciplinados consideram que os conflitos poderiam ser evitados se houvesse maior responsabilização de modo individualizado, sublinhando que os alunos deveriam assumir os seus erros. [Os alunos deviam] Confessar. (A2E2) Devia fazer mais pelos alunos que perdem os telefones aqui. (...) [Os alunos] Não se responsabilizam por nada! (A5E2) Por sua vez, os alunos com perturbações emocionais e do comportamento defendem o aumento da vigilância, mas também uma maior pacificação do espaço escolar mediante o incentivo das relações de amizade e um maior entendimento entre alunos. Sermos mais amigos uns dos outros... (...) Quando um está a falar os outros nunca deixam ouvir... Começam sempre a falar em cima uns dos outros. (...) Entendermo-nos todos uns aos outros. Ás vezes quando nós fazemos jogos em turma, nós dividimos a turma em dois. Depois quando um ganha, passam a vida a gozar com os outros porque perderam o jogo! Porque isto, porque aquilo, porque ganharam, porque perderam... Eu não percebo porquê! É apenas um jogo! (A1E2) Um pouco mais drasticamente, um dos alunos incluído neste grupo considera que os conflitos diminuiriam se a população escolar fosse constituída por um maior número de alunos sem comportamentos problemáticos, que poderiam servir de exemplo aos restantes alunos. Na sua afirmação associa os problemas da escola à composição do público discente, relacionando os alunos problemáticos com a pertença a grupos étnicos como os ciganos, e a alunos que identifica genericamente como “pretos” fazendo alusão ao continente africano, numa alusão à condição imigrante desses alunos ou à descendência de famílias com trajetórias migrantes. Dividir estes alunos! E trazerem para cá alunos exemplares... (...) Houve um ano que isto era... Isto parecia que era a escola de África! Isto era só pretos, não havia nenhum branco... Havia cá só 1 ou 2 e depois os 'stôres estavam sempre a queixar-se, não sei quê, que era uma das únicas escolas que tinha bué conflitos... Porque isto antes era só tipo bué raças, era só pretos e ciganos, pretos e ciganos! Depois de vez em quando cá aparecia um branco mas não durava cá muito tempo também. E depois houve uma Diretora – que era a anterior a esta – que chegou cá e despachou-os todos para a S. e para a M. ... [Escolas Secundárias] (...) Mais exemplares! Porque depois esta escola parece que foi feita para manter aqui os que se portam mal e depois os outros estão lá todos, não há quase confusão! (A18E1) Por fim, os alunos com reincidência de comportamentos agressivos são os que defendem um sistema de controlo escolar mais proibitivo. [A escola] Devia proibir aqueles meninos de jogar à bola! (...) Porque se nós não lhes fizemos nada, eles também não nos têm de fazer nada a nós! Se nós não queremos jogar com eles... (A3E2) 156 Isso de ficar sem intervalos é uma boa ideia, ser suspenso também e deviam chamar... Buscar o EE avisar que o aluno ia ficar de castigo e ficava... E punham-no no intervalo a estudar. (A12E3) Os alunos mais severamente sancionados na escola são os que defendem maior rigor nos castigos aplicados. Hipoteticamente estamos face a uma reprodução do discurso dos adultos da escola, considerado pelos alunos como a resposta mais adequada a esta questão. Se houvesse uma efetiva interiorização dos valores e dos princípios do sistemas de regras escolares por parte destes alunos ter-se-ía verificado alteração nos seus comportamentos, o que não acontece. Relativamente à percepção da eficácia da intervenção sobre os alunos que desobedecem aos adultos da escola, os alunos estão de acordo sobre a necessidade de uma atuação mais imediata da escola. Ainda no que se prende com os casos de desrespeito a outros alunos e/ou às regras da escola, os alunos defenderam maior celeridade nos processos, nomeadamente no que diz respeito à suspensão. Há muita gente aí que já devia estar suspensa. (A8E1) Às vezes há miúdos que vêm aqui muitas vezes... [à direção] Eles deviam, às vezes ser suspensos! (A6E1) O encaminhamento dos alunos para a direção ou estruturas de apoio da escola, como os gabinetes de intervenção disciplinar, é outro mecanismo de regulação escolar referido pelos entrevistados, independentemente da escola de pertença, tipo de comportamento ou da dimensão da rede de relações. O contacto com os Encarregados de Educação em caso de conflitos foi referido por alguns alunos das escolas E1 e E2, mas no caso da escola E3 é referido por todos. Em continuidade com as afirmações dos dirigentes escolares o contacto com os familiares dos alunos parece ser assim uma prática corrente reconhecida também pelos alunos. [O que é que acontece na Direção?] Acho que vão ter uma conversa e acho que chamam os pais. (A10E3) Vão ligar para o Encarregado de Educação. (A9E3) 4.2.5.2. Castigos e regras Os alunos reconhecem globalmente a necessidade de pacificação do espaço escolar, de maior tolerância por parte dos professores e de melhoria das relações entre alunos. Sobre os castigos aplicados nas escolas, os alunos da escola E2 referem que são sobretudo a limpeza da escola, serem levados à Direção e em casos extremos ou reiterados a suspensão e expulsão da escola. Às vezes põe-nos a varrer a rua ou ali no ginásio... Ficamos sem aula de Educação Física e põe-nos a varrer a rua lá em baixo... (A1E2) 157 Fiquei de castigo. Limpei a escola, fiz cópias. (...) Põem-nos de castigo ou levam para Direção. (...) Se abusam são suspensos. (...) Mas se continuarem... Quando vierem da suspensão, não é? Se eles continuarem são expulsos. (A2E2) Lavar os vidros, limpar o chão, ir suspensa. (A5E2) Na escola E1 são a suspensão, trabalho comunitário na escola (limpeza) e escrita das regras escolares. De referir que a maioria dos alunos entrevistados nesta escola refere a suspensão como sanção comum. Alguns alunos entendem-na como umas férias, convertendo o castigo numa recompensa. Um dos alunos desta escola considera que as suspensões são muito longas e desajustadas face à infração cometida. Sim, foi a última semana de aulas e a outra foi a meio do ano, foi duas semanas. (...) Pois... Fiquei fora da escola um bocadinho! (A16E1) Quem está cá nesta escola não se importa de ir para casa... Suspenso, portanto... (...) [E quando vais suspenso?] Fico em casa. Yah e vou para rua também! A minha mãe está a trabalhar! Fico sozinho em casa... (...) Suspenso é como se tivesse de férias! Só que as faltas não se podem justificar. (A18E1) A única coisa que eu não acho justa são as suspensões, os dias que mandam para casa. (...) Às vezes é uma coisa assim de nada e mandam muitos dias! (A13E1) Na escola E3 o encaminhamento dos alunos, seja para a Direção ou para o GAAF47 é também um dos mecanismos mais referidos, encaminhamento que resulta em suspensão, exclusão do intervalo ou redação das regras escolares (inúmeras vezes) como forma de castigo pelo mau comportamento. Vem o 'stôr do GAI – que é o 'stôr T – e o 'stôr Y e levam-nos para a Direção. (...) Tive de estar o tempo todo da aula no GAI. Às vezes os professores mandavam-me, por exemplo, um disse para fazer os exercícios... E às vezes também, lá no GAI, tinha de escrever 100 vezes "não me devo portar mal na sala" (...) E os meninos que vão mais vezes, depois eles metem-nos lá todos os intervalos. (A10E3) Agora há a regra que quem não faz as coisas que é para fazer será suspenso. Até quando a Diretora da escola mandar vir... (A9E3) Eles perguntam – a professora do GAAF – o nome, a turma e o motivo. E temos que escrever o que é que aconteceu num papel. (...) Primeiro perguntaram o que é que aconteceu, nós dissemos. Depois eles perguntaram "que castigo nós merecemos?" Nós dissemos... Uns disseram... Já não sei! Outros disseram para "escrever regras". Outros que disseram "ficar sem intervalo". Eles escolheram escrever regras. Castigo, escrevemos "Não devemos atirar pedras" (A11E3) O trabalho cívico, a suspensão e a redação de regras escolares ou cópias são referidos pelos alunos independentemente do tipo de comportamento. O impedimento de ida 47 Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família. Neste gabinete está integrado o GAI: Gabinete de Acompanhamento e Intervenção (disciplinar). 158 para o recreio no período de intervalo é referida pelos alunos como sanção que pode ser aplicada cumulativamente, neste caso pelos professores. Às vezes na sala, quando eu fico a falar na sala depois a 'stôra manda os que se portaram bem sair e às vezes os que tiveram a falar na sala ela manda-os ficar. Ficar sem intervalo às vezes. (A4E2) Fiquei sem os intervalos e a minha 'stôra deu uma folha a dizer o que é que eu faço nos intervalos e isso tudo. Tinha 4 intervalos, tinha 5... (...) Às vezes ficava o dia todo sem intervalos. Agora já tenho intervalos. (A12E3) Em termos globais, os alunos não convergem na percepção de justiça dos castigos. No entanto, uma parte significativa dos alunos da escola E2 afirma que nem sempre os culpados são castigados e que “por um pagam todos”, defendendo medidas mais leves e de menor duração. Quando metem um aluno a fazer demasiadas coisas! (...) Por exemplo, passar um ano inteiro a lavar sanitas! (...) Foi no 2º Período. Sim! E ficar a toda a hora de castigo, sempre, sempre, sempre! [Como é que podiam ser mais justos?] Por exemplo, meter um dia eles a limparem sanitas e acabou! (...) ou então só uma semana. (A5E2) É quando, às vezes, uns ‘tão a falar e os outros estão calados e depois podem levar todos! Por isso é que não são justos! (...) Costuma ser mais trabalhos de casa, aumenta o trabalho.(...) Depois a gente faz os trabalhos... (A3E2) Por uma pessoa a varrer a rua acho que não é muito bom! [O que é que a escola podia fazer?] Darem-nos castigos mais leves (...) Põe-nos a fazer umas cópias... (A1E2) Apenas um dos alunos entrevistados desta escola defende uma maior rigidez nas estratégias de proibição de violência física. Para mim, se lutassem, por mim eu expulsava! (...) Se fosse muito grave sim. Mas se... lutas... Assim suspensão de 2 dias ou 3, ou assim... (A2E2) Na escola E1 alguns alunos também referem que os castigos não são justos porque nem sempre são aplicados aos responsáveis pelos problemas. Nem sempre! (...) Porque culpam muito... Por exemplo nas turmas culpam sempre os mais velhos... Os repetentes levam sempre com as culpas... (A17E1) Sim, os castigos são justos, mas acho que há casos mais graves que o meu que a escola não faz nada! (...) Não são tão justos quanto isso. (A8E1) Apesar de também não haver um acordo quanto à justiça dos castigos na escola E3, os entrevistados defendem que a melhoria dos comportamentos dos alunos passaria por ficarem mais vezes sem intervalo, aumentar o número de funcionários e que as regras deveriam ser mais proibitivas de forma a evitarem a violência. 159 [Os castigos são justos?] Sim, acho que sim. Ir para o GAI, estar lá a aula toda, não perturba mais a aula. (A10E3) A escola devia ter mais auxiliares para tomar conta de nós. (A12E3) Os alunos com perturbações emocionais e de comportamento consideram que os castigos deveriam ser mais leves e que os professores deveriam ser mais compreensivos, o que poderá estar relacionado com o tipo de comportamento destes alunos, já que consideram que a causa do confronto individual não é voluntária. Pedir aos professores para ser mais compreensíveis às vezes... (...) Quando nós fazemos as coisas... Nós às vezes não as fazemos e as pessoas culpam-nos! Às vezes... (...) E acontece muitas vezes isso na minha sala de aula. Os meus colegas não fizeram nada e depois os professores culpam-nos porque eles muitas vezes fazem as coisas. Naquela vez podem não ser eles, mas a professora culpa-os! (A1E2) [E são justos?] Sim, de vez em quando sim. Mas há professoras que mandam as pessoas para o GID, às vezes, à toa. Mandam os alunos para o GID à toa. (A14E1) Não, eu dou-me bem com toda a gente, mas há 'stôres que só porque nós já temos coisas anteriores – participações e isso – qualquer coisa, mesmo não sendo nós, somos sempre nós acusados. Isso irrita bué! (...) São sempre as mesmas pessoas! (A18E1) Os alunos reincidentes consideram, genericamente, parte das sanções a que são sujeitos injustas na medida em que relatam situações em que são apontados como autores e responsáveis pelos conflitos, apenas porque são já identificados como caudadores de distúrbios na escola. A maioria dos alunos reincidentes entrevistados conhece as regras escolares, concorda com elas e tem uma visão positiva das mesmas. Por acaso as regras da escola agora estão muito boas. Deixaram de dar aquelas regras que se faltar muitas vezes leva uma multa para casa. (...) [O que é que propunhas?] Era que os alunos que não faziam os TPC ou não realizavam as tarefas na sala de aula ficassem de castigo a varrer a escola e aí começavam logo a fazer os TPC. (...) E não só, podiam ser outras tarefas, como limpar as casas de banho e isso. (A8E1) Contudo, na escola E2 alguns dos alunos consideram que há normas exageradas, como por exemplo as que dizem respeito ao vestuário. Os alunos apontam ainda a desigualdade entre alunos e professores face às mesmas regras escolares. Algumas são injustas. (...) Porque a doutora H., quando estava muito calor dizia que não podíamos vir de chinelos nem de calção, nem de tops e etc. (A5E2) Algumas regras eu não acho bem. (...) Não podermos usar luvas nos espaços fechados. As professoras usam! Quando estão na sala de aula.... E nós não podemos usar! (A1E2) 160 Os alunos entrevistados defendem uma aplicação de regras mais restritivas e controladoras (proibições, revistar os alunos, implementação de videovigilância). Todavia, os alunos da escola E3 consideram que não deveria existir alunos violentos na escola, havendo inclusivamente a sugestão de distribuir os horários não letivos de modo a separar os mais alunos mais velhos dos mais novos. Não haver violentos, violência aqui na escola. (A9E3) Fazer, se calhar, fazer os intervalos repartidos entre os mais velhos e os mais novos... (A10E3) Se calhar, para poderem jogar todos à bola, cada um tinha um dia... (A3E2) Não podermos andar à porrada. Não gosto de andar à bulha! (A1E2) Analogamente à perceção de justiça na aplicação dos castigos, os entrevistados também não são convergentes nas opiniões que têm sobre as regras escolares. Os alunos com perturbações emocionais e do comportamento e em situações de indisciplina com adultos são os que defendem mais a alteração das regras. Não naquele momento, mas fazer participação da professora, depois a escola via quem é que tinha razão e depois a 'stôra não ia ser punida mas ficava lá no Relatório dela também, que ela fez aquilo e aquilo. (A14E1) Oh! Logo de início, logo à entrada era tudo revistado! Tudo revistado, todos os dias! (A18E1) Embora todos os entrevistados considerem as regras normais ou boas, questionam algumas das regras, nomeadamente a proibição do uso do telemóvel. Algumas são estranhas! (...) Não podermos trazer balões de água e essas coisas... Nem fazer guerras de água... (...) E não podermos trazer telemóveis nem nada disso. (A17E1) Há uma, a do telemóvel. Porque há alguns miúdos que precisam do telemóvel, para ligar por exemplo aos pais, para os virem buscar... Acho que é isso... (A6E1) Usar os telefones... Qual é o mal disso? Eu uso o meu, ninguém mo tira... Há professores que deixam, os alunos usam na mesma! Escondidos ou não! (A18E1) Embora os entrevistados sejam alunos com comportamentos reincidentes de violência e indisciplina, a sua relação com a escola parece ser globalmente positiva, uma vez que afirmam gostar da escola e aceitam genericamente as regras e medidas impostas. Outro aspeto a destacar prende-se com a divergência de perceções entre alunos e professores. A visão dos alunos representa portanto um valor acrescentado a esta pesquisa, contribuindo para conhecer melhor as práticas e representações sobre a violência na escola. 161 Os alunos reconhecem a ocorrência de conflitos no espaço escolar, sobretudo entre rapazes. As situações de dominação ou provocação dos alunos mais velhos sobre os mais novos são as mais referidas. Os espaços de convívio como o recreio e o bar são os locais por excelência para a emergência de conflitos. No entanto, é de sublinhar as referências aos incidentes que se iniciam, muitas vezes, nas salas de aula e se prolongam para o recreio. Estas referências são contrárias a opinião dos professores e dos outros responsáveis escolares, que consideram que os problemas são frequentemente levados para a sala de aula após os intervalos e/ou que surgem em sala de aula como resultado da privação/ escassez de momentos não letivos inteiramente dedicados ao lazer e ao brincar. Os motivos mais apontados para a emergência dos conflitos são as provocações e competições entre colegas e os roubos. As rivalidades no recreio sobretudo para os alunos agressivos e os que desrespeitam os colegas e/ou as normas da escola. Os alunos que desrespeitam os adultos são os únicos a considerarem as intervenções da escola adequadas, apontando para um eventual reforço das respostas escolares nesta situação concreta. Já os alunos que desrespeitam os outros alunos e/ou as regras da escola tendem a concordar com a necessidade de uma atuação mais imediata da escola, eventualmente pela razão oposta do grupo anterior. Os entrevistados têm opiniões divergentes seja quanto à justiça dos castigos seja quanto às regras escolares. Ainda que a maioria dos alunos tenha uma visão positiva das regras e concorde com elas, verificaram-se diversas propostas de alteração. Uma parte dos alunos considera haver injustiça nos castigos aplicados e que algumas normas são exageradas. No geral os alunos defendem uma aplicação de regras mais restritivas e controladoras. Globalmente, os entrevistados referem o encaminhamento dos alunos para a direção ou estruturas de apoio da escola (como os gabinetes de intervenção) como o mecanismo de regulação mais praticado. Os castigos mais referidos pelos alunos são a suspensão, a limpeza da escola e a redação de regras e a proibição de usufruto do intervalo. 162 V. CONCLUSÕES Políticas: apropriação e implementação nos territórios A investigação cujas conclusões se apresentam neste relatório centrou-se na avaliação do contributo das políticas de segurança escolar para a integração, inclusão e igualdade educativa e social em contextos escolares marcados por elevada diversidade e complexidade social e cultural. Procurou-se assim identificar os bloqueios e as potencialidades de colaboração entre os agentes e instituições responsáveis pela concretização das políticas públicas ao nível territorial, tendo como objetivo último a identificação dos elementos fundamentais para a definição de uma metodologia integrada de intervenção (prevenção e regulação) da violência nas escolas, passível de ser replicada em outros contextos educativos. A análise permitiu evidenciar os modos como o processo de concretização das políticas de regulação da violência a nível territorial se traduzem na hierarquização de competências e responsabilidades pela disciplinação dos alunos, e como estas se articulam de forma contraditória com as redes institucionais locais. O território educativo constitui-se como um espaço cruzado por diversas medidas políticas setoriais, facto que se traduz pelo frequente confronto entre as abordagens delas resultantes. As orientações para a ação dessas políticas setoriais cruzam-se ainda com as motivações próprias dos diferentes grupos e agentes sociais, com recursos, modalidades de autonomia e capacidades de ação muito diferenciadas. O desenvolvimento dos processos de implementação das políticas de segurança escolar constitui assim um processo contraditório, já que se desenvolve em arranjos institucionais e organizacionais caracterizados, por um lado, pelas restrições resultantes das regulamentações restritivas implementadas pela tutela de cada grupo institucional, traduzida na relativa fragmentação de poder ao nível local; por outro, pela sobreposição de processos de intervenção e a dificuldade de clarificação das responsabilidades de intervenção. Os territórios analisados apresentaram redes com distribuições e relações entre instituições com características e densidade distintas, mas demonstrativas do potencial ainda por explorar no âmbito das redes sociais locais, potencial e necessidade essas unanimemente reconhecidas nos três territórios. A análise das conceções e práticas dos diversos intervenientes articulou-se com uma análise aprofundada sobre as dinâmicas de articulação da intervenção das instituições formais e dos agentes sociais locais, com particular enfoque na relação entre as dinâmicas de prevenção e regulação da violência em contexto escolar e os programas comunitários de integração e inserção social para crianças. No entanto, as relações estabelecidas entre os representantes institucionais com responsabilidades na proteção da infância nos territórios em análise são muitas vezes marcadas por uma separação territorial e institucional, sendo a proximidade geográfica o principal elemento definidor das relações estabelecidas no interior da 163 rede, mais do que o âmbito de intervenção. Os sujeitos da rede em análise formam um grupo pouco coeso, com baixa intensidade de relações – ou com relações dispersas – o que conduz a um baixo aproveitamento dos recursos disponíveis. Esta fraca maximização de recursos decorrente das baixas relações interinstitucionais mantidas nestes territórios é contrária aos princípios de colaboração institucionalmente recomendados nos normativos de regulação da violência, e localmente reconhecidos como necessários. De realçar, contudo, que nestes territórios as escolas emergem como atores institucionais com alguma centralidade nas redes locais, seja pelo seu conhecimento e intervenção primária desenvolvida no âmbito das problemáticas relativas às crianças e jovens do território, seja pela promoção de ações conjuntas com outros atores e consequente partilha dos recursos disponíveis. Os representantes das entidades identificadas pautaram-se por elevada disponibilidade e participação nas atividades e na resposta aos pedidos expressos pela equipa de pesquisa. A oportunidade de desencadear processos de debate conjunto muito participados, desde a fase de diagnóstico até à fase final de validação e discussão de resultados e dos procedimentos de intervenção (metodologia integrada de intervenção), revelou-se um dos aspetos a sublinhar no âmbito do projeto desenvolvido. Embora não fosse um objetivo do projeto, a prossecução do mesmo contribuiu para que se multiplicassem as oportunidades de encontro e discussão entre as entidades dos territórios e que nesses momentos aferissem e discutissem alguns assuntos parcelarmente e em grande grupo. Os representantes institucionais reconheceram a importância de uma intervenção integrada e conjunta, entendida como essencial para uma aplicação bem-sucedida das políticas de regulação da violência – nomeadamente pela construção de um conhecimento partilhado e abrangente das problemáticas sociais, e pela partilha e rentabilização dos recursos necessários à intervenção – contudo esta é uma meta que se encontra longe de estar plenamente alcançada. Apesar deste enquadramento potencialmente constrangedor da cooperação e gerador de conflitos, foi possível constatar que na maioria dos casos os interesses dos alunos (ou numa perspetiva mais ampla quando os problemas extravasam o perímetro escolar, das crianças e jovens) eram no essencial colocados em primeiro lugar. Como forma de superar estes bloqueios, os diversos agentes sociais assumiram exceder por vezes o seu campo de intervenção, realizando ações em campos de intervenção que não são da sua responsabilidade, ou estabelecendo parcerias em áreas que não constituem objeto da política particular pela qual são responsáveis. Estas "transgressões" institucionais têm como objetivo final solucionar alguns dos problemas sociais com que se confrontam, seja porque procuram compensar as insuficiências de outras intervenções setoriais, seja porque procuram na cooperação soluções abrangentes para problemas sociais complexos. Autonomia e definição das estratégias escolares de intervenção sobre situações de violência A pacificação do espaço escolar constitui uma das principais preocupações das direções escolares e, simultaneamente, a principal necessidade da escola referida pelos alunos entrevistados. Esta preocupação está presente, direta ou indiretamente, nas principais linhas orientadoras dos projetos escolares analisados, nomeadamente ao 164 explicitarem que: a) a escola tem a responsabilidade de melhorar e aperfeiçoar o meio em que está envolvida; b) a atuação da escola deve incrementar a participação e o desenvolvimento cívico dos alunos; c) as escolas devem informar e sensibilizar os Pais e/ou Encarregados de Educação sobre a normas de conduta em meio escolar; d) a responsabilidade de prevenção e intervenção no que respeita à segurança, disciplina e ambiente escolar pacífico deve ser partilhada por todos os membros da comunidade escolar. No que respeita às estratégias adotadas pelas escolas em estudo podemos genericamente agrupá-las nos seguintes domínios de ação: a) sensibilização e debate sobre as normas e segurança; b) articulação e coordenação da escola no âmbito da segurança e da regulação; c) acompanhamento e supervisão de espaços e atividades educativas (supervisão e controlo dos espaços, animação e/ou supervisão de atividades, promoção de sistemas de tutorias); d) mobilização e envolvimento da comunidade; e) criação e dinamização de estruturas, projetos ou iniciativas (como os gabinetes de intervenção disciplinares, criados com o objetivo de responder aos problemas de violência). Estas estratégias e domínios de ação seguem três princípios essenciais de orientação: a) preocupação com o cumprimento das regras; b) proximidade e acompanhamento dos alunos que não seguem as normas e o envolvimento das respetivas famílias; c) monitorização e (re)planeamento das estratégias seguidas. Nos normativos internos as escolas procuram adequar o a regulação às especificidades do seu corpo discente, incluindo também orientações e domínios que não estão previstas em normativos gerais. Por exemplo, embora no Estatuto do Aluno não haja referência a aspetos relacionados com a participação dos alunos na escola, todas as escolas em análise definiram nos seus Regulamentos Internos formas mais sumárias ou mais detalhadas de participação e representação dos alunos. É necessário considerar que a construção dos procedimentos internos das escolas é enquadrada pelos normativos legais nacionais, emanados pela tutela, no entanto, dentro dos limites da sua autonomia, os responsáveis escolares destas escolas definem um conjunto de regras e princípios que ultrapassam o número e alcance direitos e deveres definidos nos normativos gerais. Ainda que haja autonomia e seja de realçar analiticamente o exercício da mesma face à tutela, os responsáveis escolares consideram as medidas disciplinares disponíveis no quadro legal e a demora no tratamento de casos reincidentes como fatores negativos e condicionantes para a intervenção escolar face ao problema da violência. Outro constrangimento referido tanto pelas Direções como pelo corpo docente prende-se com os efeitos da extinção recente de algumas áreas curriculares (nomeadamente da Formação Cívica), afirmando que neste domínio houve uma supressão de espaços fundamentais para o trabalho preventivo de sensibilização e mudança de comportamentos e atitudes realizado com os alunos. Este tipo de iniciativas demonstram que a autonomia das escolas, se assume como um fator de extrema importância na gestão escolar, permitindo uma adaptação ao seu contexto específico, realizando ações que complementam e por diversas vezes ultrapassam as orientações definidas nas políticas. Em termos conclusivos, os resultados demonstram a importância de redefinir as estratégias de atuação das redes locais, com o objetivo de maximizar os recursos 165 disponíveis, potenciando intervenções mais eficazes. Os fatores organizacionais são centrais neste domínio sendo essencial potenciar a articulação e coordenação entre os diversos níveis, tanto no interior de cada instituição, como na comunicação entre instituições. É também central a existência de procedimentos estruturados e rotinados de monitorização que orientem a prevenção e intervenção. É necessário que as estratégias de regulação da violência sejam definidas de forma explícita e sistemática, para que todos os intervenientes as compreendam e atuem em conformidade, de forma informada e coerente. O planeamento assume um papel de relevo neste processo, pela importância que tem a criação de um plano de ação conjunto que seja estruturado, claramente definido e com metas claras, objetivas e tangíveis, que permitam a monitorização regular e a detecção atempada de problemas que possam surgir durante a execução do plano de prevenção e intervenção. 166 VI. METODOLOGIA INTEGRADA DE INTERVENÇÃO Tal como tem sido referido ao longo de todo o estudo, constata-se que a aplicação eficaz dos planos de ação e a pacificação dos quotidianos escolares depende em grande medida da colaboração ativa de toda a rede local, o que resulta por sua vez num alargamento da intervenção a outras esferas da vida dos alunos. Quer dizer que as escolas – enquanto elemento central de todo o processo – terão que ter a disponibilidade para a colaborar com os restantes agentes sociais. Partindo da escola e ancorando-se na comunidade, uma intervenção desta natureza permite abarcar os diversos espaços e recursos de regulação, contribuindo para a mudança de atitudes e comportamentos de todos, e consequentemente para a pacificação dos quotidianos escolares e comunitários. A proposta de metodologia integrada de prevenção e intervenção da violência na escola que aqui se apresenta sucintamente 48 é o resultado da investigação desenvolvida pelo Observatório de Segurança Escolar nas três escolas em estudo. Para a construção desta metodologia foram consideradas as principais contribuições teóricas sobre o tema; exemplos práticos de estratégias de intervenção que têm vindo a ser desenvolvidas a nível nacional e internacional; e as características específicas dos territórios educativos em análise, bem como as estratégias atualmente aplicadas por estas escolas. Esta análise foi desenvolvida com a participação dos principais atores sociais (escolas e respetivos parceiros), tendo sido sujeita a momentos de debate e reflexão conjunta. A violência na escola é marcada por fatores externos e anteriores ao espaço escolar, que assumem um peso relevante quando as escolas não atuam na sua regulação. Apesar das condições de partida serem muito diferenciadas, as escolas têm vindo a demonstrar que são capazes de regular a conflitualidade (travar, reajustar e sensibilizar os comportamentos). O mesmo é dizer que as escolas têm a margem de atuação e autonomia necessárias para fazer face aos obstáculos identificados, mesmo que as condições de partida tenham um peso significativo sobre os processos de regulação desenvolvidos nas escolas e seus contextos envolventes. Considera-se, portanto, que uma proposta de atuação sobre a problemática da violência na escola deve partir da escola, estendendo-se à comunidade envolvente mediante uma abordagem integrada de prevenção e intervenção. Neste sentido, esta metodologia de atuação sobre a violência na escola é composta pelos seguintes princípios de atuação: Antecipar e prevenir; Colaborar e envolver; Articular e coordenar; Limitar e disciplinar; Mediar e acompanhar; Avaliar e monitorizar; Reforçar e difundir. 48 Esta proposta é da autoria do Observatório de Segurança Escola, coordenado pelo Prof. Dr. João Sebastião e composto por Joana Campos, Sara Merlini e Mafalda Chambino. O manual de intervenção que resultou desta pesquisa encontra-se em documento à parte, incluído no Dossier TécnicoPedagógico. 167 ANTECIPAR E PREVENIR Definição de estratégias de intervenção que antecipem o aparecimento de situações violentas, nomeadamente : - Realizar um diagnóstico regular da situação Criar e manter uma equipa de ação conjunta e desenvolver um plano de atuação; Desenvolver ações de sensibilização orientadas para a alteração de comportamentos e melhoria do clima de escola; Simular situações de conflito e analisar as resoluções possíveis. COLABORAR E ENVOLVER Atuação em rede que envolva os parceiros da comunidade, de modo a: - Decisões baseadas numa liderança partilhada e democrática; Construir uma visão alargada e complexa de base territorial sobre os fatores geradores de violência Reforço das parcerias estabelecidas e avaliação da necessidade de novas; Aprofundar as relações interinstitucionais, procurando complementaridades e articulando responsabilidades; Atuar conjuntamente, partilhando os recursos disponíveis. ARTICULAR E COORDENAR Definição de estratégias coordenadas a nível escolar e comunitário: - Elaboração participada de um documento de orientação para a intervenção, que explicite as dimensões de intervenção e atores relevantes; Definição e delegação de competências pelos diversos níveis, segundo o tipo e gravidade da situação; Comunicação sistemática entre os parceiros. LIMITAR E DISCIPLINAR O controlo disciplinar como forma de limitar e prevenir situações violentas: - Definição participada de regras claras e objetivas, comuns aos diversos níveis de intervenção; Definição de critérios de decisão uniformes, coerentes e justos; Ação e resolução célere das ocorrências; Opção por medidas de carácter corretivo e pedagógico em detrimento das sancionatórias. 168 MEDIAR E ACOMPANHAR Mediação e acompanhamento da responsabilidade da escola ou instituições parceiras: - Resolução de conflitos através da criação de instrumentos de mediação, com participação das partes na tomada de decisão; Acompanhamento tutorial do desenvolvimento individual do aluno (vítima e agressor) por períodos alargados de tempo; Treino de competências pessoais e sociais a alunos, particularmente em situações de reincidência. AVALIAR E MONITORIZAR Uniformização dos processos de monitorização da escola e entidades locais: - Avaliação sistemática e acompanhamento da intervenção que permita a sua pilotagem e afinação estratégica; Avaliação da eficácia das estruturas de apoio à intervenção e monitorização (gabinetes de intervenção escolares e/ou comunitários); REFORÇAR E DIFUNDIR - Estabilização do plano de ação, por ciclos prolongados; Ações de divulgação sistemática dos objetivos e estratégias definidos; Envolvimento dos líderes locais de modo a ter maior apoio e defesa nos esforços de melhoria da segurança escolar. A prevenção da violência é um aspeto essencial da educação para a cidadania democrática. A escola, para além de um local de passagem de conhecimento, assumese como um espaço fundamental para a construção identitária dos jovens. Torna-se, portanto, da maior importância a definição e concretização de estratégias de sensibilização para a problemática da violência em meio escolar e de prevenção da sua ocorrência. Para além disso, a prevenção da violência assume consequências positivas e globais para a escola, traduzindo-se noutras dimensões, nomeadamente na indisciplina. A complexidade deste fenómeno, o seu carácter transversal no quotidiano dos jovens, e os enormes custos sociais que acarreta, reforçam a necessidade da implementação de estratégias que não sejam focadas unicamente na escola, mas que, pelo contrário, incluam os diversos atores comunitários. As famílias, a comunidade, e as instituições existentes nos territórios assumem-se como parceiros fundamentais para a concretização eficaz das medidas de prevenção e intervenção. 169 VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A Abraão, I. e Tavares, A. (2010) Trilhos – Desenvolvimento de competências pessoais e sociais. Reflexões sobre a metodologia de avaliação. 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QUESTIONÁRIO AOS AGENTES SOCIAIS O Observatório de Segurança Escolar, em parceria com o Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-IUL e financiado pelo Programa Operacional de Assistência Técnica do Fundo Social Europeu, está a realizar atualmente um estudo sobre a violência entre jovens que tem como objetivo contribuir para um melhor conhecimento e prevenção do fenómeno no concelho X Neste âmbito vimos por este meio realizar um questionário às entidades locais, no sentido de compreender as relações e articulações entre os agentes sociais na concretização de estratégias de intervenção, pelo que pedimos que nos responda o mais sincera e objetivamente possível às questões que colocamos. Gratos desde já pela atenção dispensada. 1.Por favor preencha as seguintes informações sobre a sua entidade. a. Nome da Entidade: __________________________________________________________ b. Objetivos de atuação da entidade: _______________________________________________ c. Localidade: _________________________________________________________________ d. Função que ocupa: ___________________________________________________________ 2. Nomeie, por favor, os parceiros que considera serem importantes na intervenção e resolução de situações de violência juvenil. (Por ex.: Parceiro 1: Escola Básica X) a. Parceiro 1: _________________________________________________________________________ b. Parceiro 2: _________________________________________________________________________ c. Parceiro 3: _________________________________________________________________________ d. Parceiro 4: _________________________________________________________________________ e. Parceiro 5: _________________________________________________________________________ f. Parceiro 6: _________________________________________________________________________ g. Parceiro 7: _________________________________________________________________________ h. Parceiro 8: _________________________________________________________________________ i. Parceiro 9: _________________________________________________________________________ j. Parceiro 10: _________________________________________________________________________ 3. Tendo por referência o grupo de parceiros que nomeou na questão 2, diga por favor com quais é que colabora e com que frequência na intervenção e resolução de situações de violência juvenil. Colabora. Colabora Não Colabora raramente diariamente 1 2 3 4 a. Parceiro 1 b. Parceiro 2 c. Parceiro 3 ii Anexos d. Parceiro 4 e. Parceiro 5 f. Parceiro 6 g. Parceiro 7 h. Parceiro 8 i. Parceiro 9 j. Parceiro 10 4. Tendo por referência o grupo de parceiros que nomeou na questão 2, como avalia a relação que mantêm relativamente aos processo de intervenção e resolução das situações de violência juvenil: Negativa 1 2 3 Positiva 4 N/S a. Parceiro 1 b. Parceiro 2 c. Parceiro 3 d. Parceiro 4 e. Parceiro 5 f. Parceiro 6 g. Parceiro 7 h. Parceiro 8 i. Parceiro 9 j. Parceiro 10 5. Tendo por referência o grupo de parceiros que nomeou na questão 2, assinale por favor com que frequência troca informações e/ou recursos com estes na intervenção e resolução das situações de violência juvenil: Raramente Diariamente N/S 1 2 3 4 a. Parceiro 1 b. Parceiro 2 c. Parceiro 3 d. Parceiro 4 e. Parceiro 5 f. Parceiro 6 g. Parceiro 7 h. Parceiro 8 i. Parceiro 9 j. Parceiro 10 6. Indique, por favor, quais as necessidades sentidas pela sua instituição na intervenção e resolução das situações de violência juvenil: ____________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ 7. E relativamente à articulação e colaboração com os outros parceiros, quais as necessidades sentidas? _____________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ 8. Que medidas ou ações propõe para a intervenção e resolução das situações de violência juvenil pelos agentes locais? _____________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ iii Anexos 2. GUIÃO DE ENTREVISTA PARA OS GRUPOS FOCAIS Objetivo central: Identificar bloqueios e potencialidades de colaboração entre agentes e instituições responsáveis pela concretização 1. Balanço da colaboração entre parceiros (trocas de informação e recursos) para prevenir e intervir 2. Balanço do que tem resultado melhor e do que não resultou Dinâmicas de articulação da intervenção 3. Compreensão das orientações políticas como facilitadoras ou bloqueadoras da intervenção 4. Identificação das possibilidade de atuação conjunta iv Anexos 3. GUIÃO DE ENTREVISTA ÀS DIREÇÕES ESCOLARES Dimensões Questões I. O Retrato da Situação 1. Como é que tem sido a evolução da violência até este momento neste ano letivo? II. Os Mecanismos de Regulação III. A Estratégia da Escola IV. A relação com o contexto V. Representação da violência 2. Que medidas são aplicadas, em concreto, na resolução das situações de violência? 3. Quando ocorrem situações de conflito há uma estratégia definida? De que tipo? 3.1. Esta intervenção é feita de acordo com que critérios de gravidade? 3.2.Como é que lidam com comportamentos violentos recorrentes por parte de certos alunos? 4. Quem é que a escola contacta quando ocorrem situações de violência? (P. Escola Segura; OSE e Enc. Educação) 5. Que tipo de recursos a escola dispõem para a prevenção e intervenção das situações de violência? 6. Qual a participação/ apoio da tutela na resposta às situações de conflito? 7. Que regras da escola considera mais importantes na prevenção das situações de violência? (Objectivos/ expectativas de prevenção, pacificação, encaminhamento e castigo; filosofia de atuação subjacente; influência e contributo das regras para a integração e normalização dos comportamentos dos alunos; os documentos estruturantes integram as questões da violência e agressividade) 8. Como é que a escola elabora os seus regulamentos e regras internos, no que diz respeito: - À participação dos diferentes intervenientes da escola? - À articulação entre os diferentes documentos estruturantes? 9. Têm previsto algum projeto de prevenção ou intervenção para o próximo ano? (Referência a novos projetos – concretos – ou ajuste da pergunta a um projeto já referido) 10. A escola dispõe de parcerias/ protocolos específicos para a prevenção ou intervenção da indisciplina e violência na escola? (Articulação com o Centro de Saúde, a Junta de Freguesia, etc.) 11. Qual o envolvimento da escola com a comunidade local na resolução deste tipo de situações? 12. A escola dispõe de algum tipo de iniciativa dirigido à comunidade/ população local? 13. Como é que avalia a participação dos pais/ responsáveis educativos? 14. O que é para si a violência? E um aluno violento? v Anexos 4. QUESTIONÁRIO AOS PROFESSORES O Centro de Investigação e Estudos de Sociologia - Observatório de Segurança Escolar (ISCTEIUL), financiado pelo Programa Operacional de Assistência Técnica do Fundo Social Europeu (POAT/FSE), está a realizar atualmente um estudo sobre situações de violência na escola, no Concelho X, que tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento de metodologias de intervenção. A colaboração da sua escola tem sido fundamental no desenvolvimento do projeto, tendo sido já efetuados um inquérito por questionário aos alunos e outro aos parceiros locais com intervenção nesta matéria. A realização de um breve inquérito aos professores é igualmente importante e significativa para a compreensão do processo de mediação e prevenção de conflitos entre alunos. Vimos por este meio solicitar a sua opinião, garantindo o anonimato e a confidencialidade das respostas. I. Caracterização 1. Sexo: M /F 2. Idade: ______ 3. Localidade da escola onde lecciona: Casal de Cambra Queluz/Monte Abraão Tapada das Mercês/ Mem Martins 4. Há quanto tempo exerce a sua profissão: 5. Há quanto tempo trabalha nesta escola: < 1 ano < 1 ano 2 a 4 anos 1 a 2 anos 5 a 9 anos 3 a 5 anos 10 a 19 anos > 5 anos > 20 anos 6. Das seguintes opções selecione a que mais se adequa à sua situação na escola: a) Dou aulas __ b) Dou aulas e ocupo funções e/ou um cargo na escola __ c) Não dou aulas porque ocupo funções e/ou um cargo na escola__ vi Anexos 6.1. Se respondeu b) e c) Qual o cargo que ocupa? Por favor escolha todas as que se aplicam a) b) c) d) Sou Diretor(a) de turma __ Tenho um cargo de liderança intermédia (Coordenador de ciclo, etc.) __ Desempenho tarefas de apoio à escola (biblioteca, direção, etc.) __ Coordeno ou dou apoio a atividades culturais e recreativas (clubes, projetos, etc.) __ II. Escola e função docente 1. Qual a sua opinião em relação às seguintes frases: use a escala 1 - Discordo totalmente a 4 - Concordo totalmente Discordo totalmente Discordo Concordo Concordo totalmente 1 2 3 4 Desempenho as minhas funções de forma adequada, correspondendo ao que é preciso O meu desempenho ainda não é suficiente, mas procuro esforçar-me Cada professor tem o seu método, não há desempenhos bons nem maus Tenho o apoio dos colegas para realizar o meu trabalho A escola é muito competitiva, não permitindo a cooperação entre os colegas para o exercício das suas funções O meu trabalho com os alunos é uma conquista diária Os alunos reconhecem o meu trabalho e valorizam-me por isso Por vezes há alunos que não se interessam pelas minhas aulas 2. Em que situações costuma participar dos processos de decisão da sua escola: Não Sim No conselho de turma Em reuniões de área disciplinar Em reuniões de departamento Nos órgãos consultivos da direção No conselho geral de escola Outras situações 2.1. Especifique "Outras situações": _______________________________________________________________________ vi Anexos 3. Considere a articulação organizacional da sua escola. Assinale sim ou não: Não Sim a. Tenho instruções sobre os procedimentos em casos de conflito b. A escola disponibiliza instrumentos de queixa/ participação c. Comunico à escola a ocorrência de situações de conflito d. Sou informado das decisões sobre os conflitos ou procedimentos disciplinares acerca dos meus alunos ou de mim e. Já redigi ou participei na formalização de referenciações de alunos a instituições (como a CPCJ, Polícia, etc.) 3.1 Se respondeu d) e/ou e) Com que frequência participa situações de conflito às seguintes entidades externas à escola: use a escala 1 – Nenhuma vez a 4 – Muitas vezes: Nenhuma vez Raras vezes Algumas vezes Muitas vezes 1 2 3 4 a. CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) b. Ministério Público/ Tribunal de Família e Menores c. Polícia de Segurança Pública / Programa Escola Segura d. IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social), ONG (Organização Não-Governamental) ou Programa Comunitário (como o P. Escolhas, K'Cidade, etc.) e. Outra 5. Com que frequência recorre aos seguintes elementos da escola para solucionar uma situação de conflito? use a escala 1 – Nenhuma vez a 4 – Muitas vezes: Nenhuma vez Raras vezes Algumas vezes Muitas vezes 1 2 3 4 a. Diretor de Turma b. Funcionários c. Professores da Direção d. Gabinete escolar (de intervenção, mediação ou gestão de conflitos/ disciplinar(es)) e. Outros técnicos da escola (Animador, Psicólogo, Técnico de Serviço Social, etc.) 6. Para a resolução de conflitos, considera importante: vii Anexos use a escala 1 – Nada importante a 4 – Muito importante: Nada importante Pouco importante Importante Muito importante 1 2 3 4 a. Procurar formação específica b. Desenvolver trabalho com outros colegas c. Aconselhamento ou intervenção de técnicos especializados d. Procurar ou definir alternativas pedagógicas no acompanhamento a alunos e. Contactar ou reunir com os Encarregados de educação f. Encaminhar as situações para outras instâncias escolares ou públicas g. Evitar a inimputabilidade dos culpados h. Reagir no imediato III. Relação pedagógica 1. Indique com que frequência utiliza alguma destas estratégias de resolução da indisciplina e conflitos em sala de aula: Use a escala: 1 – Nenhuma vez a 4 – Muitas vezes: Nenhuma vez Raras vezes Algumas vezes Muitas vezes 1 2 3 4 Procuro sensibilizar os alunos da turma para terem comportamentos pacíficos Converso com os alunos da turma sobre o problema da Violência e da Indisciplina Atribuo uma tarefa ao(s) aluno(s) Expulso o(s) aluno(s) da sala Encaminho o(s) aluno(s) para outras pessoas na escola e/ ou para outros departamentos/ sectores Chamo alguém na escola para me socorrer ou levar o(s) aluno(s) da sala Acalmo o(s) aluno(s) naquele momento e no final da aula peço para esperarem de forma a ter uma conversa com eles individualmente Grito com o(s) aluno(s) para eles se calarem/ pararem com o conflito Intervenho de forma imediata na situação viii Anexos 2. Na sua opinião qual o efeito dos seguintes castigos ou tarefas na melhoria do comportamento dos alunos: Use a escala: 1 – Nada eficaz a 4 – Muito eficaz: Nada eficaz Pouco eficaz Eficaz Muito eficaz 1 2 3 4 a. Advertência ou repreensão oral b. Ordem de saída da sala de aula ou outros locais de desenvolvimento do trabalho escolar c. Realização de tarefas e atividades de integração na escola ou na comunidade d. Condicionamento no acesso a espaços escolares ou na utilização de certos materiais e equipamentos e. Proibição de participar em atividades não letivas i. Outra 2.1. Se respondeu 3 ou 4 a i) Especifique "Outro castigo ou tarefa": _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ 3. Indique os factores mais importantes para a resolução dos comportamentos violentos: Escolha no máximo 3 respostas a. Aumento das sanções ___ b. Apoio nos estudos ___ c. Acompanhamento dos alunos ___ d. Vigilância e controlo dos alunos ___ e. Sensibilizar os alunos para as regras da escola ___ f. Envolver os alunos nos processos de decisão ___ g. Envolver os pais na aplicação de medidas disciplinares (corretivas ou sancionatórias) ___ h. Outro. Qual? _____________________________________________________________ 4. Relativamente à aplicação de um castigo a um aluno, quais são os critérios que pesam mais na sua decisão: Escolha no máximo 3 respostas a. O(s) aluno(s) que reincide(m) no comportamento ___ b. O(s) aluno(s) que se recusa(m) a cumprir o castigo aplicado ___ c. O(s) aluno(s) que não comparece(m) para cumprir o castigo ___ d. O(s) Encarregado(s) de Educação que não concorda(m) com o castigo ___ ix Anexos e. Existência de queixas ou relatos negativos sobre o(s) aluno(s) ___ f. O(s) aluno(s) que melhora(m) o seu comportamento ___ g. O(s) aluno(s) que melhora(m) as suas notas ___ h. O(s) aluno(s) que cumpre(m) o castigo aplicado ___ i. O(s) Encarregado(s) de Educação concorda(m) com o castigo ___ j. Existência de queixas ou relatos a favor do(s) aluno(s) ___ 6. Qual a estratégia que deve ser usada com um aluno que tem um comportamento desadequando de forma recorrente: Escolha no máximo 2 respostas a. Participação ou queixa a entidade policial ou judicial b. Acompanhamento direcionado especificamente ao aluno (com o reforço do apoio de técnicos escolares; vigilância, etc.) c. Alteração dos castigos ou tarefas que são aplicados d. Agravamento das sanções e. Reuniões com o(s) Encarregado(s) de Educação f. Outro. Qual? _______________________________________________________ IV. Representações 1. Na sua opinião o clima desta escola é: use a escala 1 - Discordo totalmente a 4 - Concordo totalmente: Discordo totalmente Discordo Concordo Concordo totalmente 1 2 3 4 a. Facilitador de conflitos b. Propício a momentos de tranquilidade c. Variável, consoante a fase do dia d. Construído pelos elementos da comunidade escolar e. Responsabilidade da direção da escola f. Em parte explicado pelos alunos que a frequentam 2. Na sua escola, os casos de violência e indisciplina: Escolha no máximo 2 respostas a. São frequentes ___ b. Não são frequentes ___ x Anexos c. Foram frequentes mas diminuíram ___ d. Não diminuem porque as medidas implementadas não têm resultado ___ e. Não necessitam de uma atenção particular ___ f. Outro. Qual? _______________________________________________ 3. Na sua opinião, quais são as principais razões para ocorrerem situações de conflito? Escolha no máximo 3 respostas a. Opiniões contrárias entre os elementos da discussão ___ b. Motivos políticos, religiosos ou étnicos (culturais...) ___ c. A puberdade/ fase de vida das crianças em que há maior agitação ___ d. Os quadros de vida da(s) família(s) a que pertence(m) o(s) autor(es) ___ e. O conflito é uma situação que é normal ocorrer nas interações humanas ___ f. Provocação ou intimidação ___ g. Outro. Qual? __________________________________________________ Obrigado por ter preenchido este inquérito. xi Anexos 5. INQUÉRITO AOS ALUNOS Vamos fazer-te algumas perguntas sobre ti e a tua escola. Por favor responde de forma verdadeira e com atenção. MÓDULO I 1. Quantos anos tens? * Escreve aqui a tua resposta: _________________________________ 2. Sexo * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Feminino Masculino 3. Onde é a tua escola? * Escolha apenas uma das opções seguintes: Casal de Cambra Queluz/Monte Abraão Tapada das Mercês/ Mem Martins 4. Em que ano andas? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: 5º ano 6º ano 7º ano 8º ano 9º ano 5. Turma * Escreve aqui a tua resposta: ________________________ xii Anexos 6. Via de ensino: * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Regular PCA CEF PIEF 7. Tens algum apoio da Ação Social Escolar (ASE)? (i.e. Recebes da tua escola o passe e/ou senhas de almoço e/ou livros, etc.) * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não Não sei 8. Quem é o teu/a tua Encarregado/a de Educação? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Pai Mãe Irmão ou Irmã Avô ou Avó Tio ou Tia Outro 9. Até onde é que o teu/ a tua Encarregado/a de Educação estudou? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Não sabe ler nem escrever Menos que o 4º ano (sabe ler e escrever, mas não frequentou/ concluiu o 1º Ciclo) Tem o 4º ano (Ensino Básico 1º Ciclo) Tem o 6º ano (Ensino Básico 2º Ciclo) Tem o 9º ano (Ensino Básico 3º Ciclo) xiii Anexos Tem o 12º ano (Ensino Secundário) Bacharelato e/ou Curso Técnico Licenciatura Mestrado/ Doutoramento MÓDULO II 10. Já chumbaste alguma vez? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 13 11. Chumbaste quando e quantas vezes? * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 vez 2 vezes 3 vezes ou mais Não se aplica 1º Ciclo (1º, 2º, 3º e/ou 4º ano) 2º Ciclo (5º e/ou 6º ano) 3º Ciclo (7º, 8º 3/ou 9º ano) 12. Porque é que chumbaste? * Escolhe no máximo 3 respostas: Não estudava Não conseguia ter atenção nas aulas A matéria era difícil de perceber Porque fui transferido Os professores não explicavam bem a matéria Não gostava dos funcionários da escola Não gostava dos professores Não ia às aulas A matéria era pouco interessante Tinha mau comportamento A minha relação com a turma não era boa Não tinha quem me ajudasse a estudar A escola não tinha condições nenhumas Não tinha condições em casa para estudar Outro: __________________________________________________________ xiv Anexos MÓDULO III 13. Costumas faltar às aulas ou já te disseram que faltas muito? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 18 14. Porque é que costumas faltar? * Escolhe no máximo 3 respostas: Porque nas aulas também não aprendo nada Porque há professores de que não gosto e não quero ir às aulas Porque às vezes preciso descansar das aulas deles Porque não me apetece ir às aulas Porque há professores que não gostam de mim e não me sinto Porque por vezes não posso ir bem nas suas aulas Porque não chego a tempo Porque não gosto da(s) matéria(s) Porque não gosto da minha turma ou da minha escola Outro: __________________________________________________________________ 15. Quando faltas às aulas o que é que costumas fazer? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Brinco Fico em casa Jogo Ajudo a minha família Namoro Não faço nada Outro: ___________________________________________________________ 16. Quando faltas às aulas onde costumas passar o teu tempo? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Em casa Na escola Na rua, no bairro onde vivo xvi Anexos Na rua, perto da escola Em centros comerciais Outro: _______________________________________________________________ 17. O teu/ A tua Encarregado/a de Educação sabe que faltas às aulas? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não 18. Sem ser nas férias alguma vez estiveste mais de 1 mês sem ir à escola?* Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 20 19. Porque é que faltaste tanto tempo? * Escolhe no máximo 3 respostas: Porque tive de ir trabalhar durante algum tempo Porque estive doente Porque mudei de casa Porque decidi mudar e estava à espera de vaga noutra escola Porque a minha família precisou do meu apoio Porque fui acompanhar familiares que foram para outro sítio Porque não tínhamos dinheiro para eu poder ir para a escola Porque estava farto/a de ir à escola Porque já tinha chumbado e não valia a pena lá andar Porque me proibiram de ir à escola Porque estive suspenso Outro: _____________________________________________________________________ xvii Anexos MÓDULO IV 20. Sobre a escola, diz se concordas com as seguintes frases: Usa a escala: 1 = "discordo totalmente" até 4 = "concordo totalmente" * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 - Discordo totalmente 2 - Discordo em parte 3 - Concordo em parte 4 - Concordo totalmente Gosto da escola porque posso estar com os meus amigos e brincar Gosto da escola porque gosto das aulas e de aprender Gosto da escola porque estou seguro e não me fazem mal Gosto da escola porque posso descansar Gosto da escola porque gosto dos professores e de falar com eles Gosto da escola porque se preocupam comigo Não gosto da escola porque dá muito trabalho Não gosto da escola porque não gosto dos meus colegas Não gosto da escola porque é uma perda de tempo 21. Com a tua idade achas que podes ir trabalhar? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não Não sei 22. Sobre continuar a estudar ou não, diz se concordas com as seguintes frases: Usa a escala: 1 = "discordo totalmente" até 4 = "concordo totalmente" * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 - Discordo totalmente 2 - Discordo em parte 3 - Concordo em parte 4 - Concordo totalmente Para perceber bem as coisas que se passam xviii Anexos 1 - Discordo totalmente 2 - Discordo em parte 3 - Concordo em parte 4 - Concordo totalmente à minha volta, tenho de estudar Para ser uma pessoa importante, tenho de ter estudos Deve-se investir nos estudos para ter um trabalho melhor Quem tem um curso é mais inteligente Estar a estudar é melhor que trabalhar Preciso de começar a trabalhar para ganhar o meu dinheiro Não tenho jeito para os estudos Já sei o que quero fazer no futuro e não preciso de estudos para isso Estudar não leva a lado nenhum Se me deixassem, não estudava mais 23. Já alguma vez te disseram que era melhor deixares de estudar? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 25 24. Quem te disse? * Por favor escolhe todas as que se aplicam: Pais (pai ou mãe) Professores Amigos ou colegas Familiares Outro: ______________________________________________________________ MÓDULO V 25. Que confiança tens nos adultos da tua escola? Usa a escala: 1 = "Não confio nada" até 4 = "Confio muito": * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 - Não confio nada 2 - Não confio 3 - Confio 4 - Confio muito xix Anexos 1 - Não confio nada 2 - Não confio 3 - Confio 4 - Confio muito 3 - Obedeço quase sempre 4 - Obedeço sempre Diretor(a) de Turma Professores da Turma Funcionários da Escola Professores da Direção Diretora da Escola 26. Obedeces aos adultos da tua escola? Usa a escala: 1 = "Nunca obedeço" até 4 = "Obedeço sempre": * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 - Nunca obedeço 2 - Nem sempre obedeço Diretor(a) de Turma Professores da Turma Funcionários da Escola Professores da Direção Diretora da Escola MÓDULO VI 27. Com quem te encontras fora da escola? * Escolhe no máximo 2 respostas: Colegas da tua turma Colegas da tua escola Vizinhos do teu bairro Colegas de outra escola onde andaste Familiares Outro: ___________________________________________________________________________ xx Anexos 28. Quando estás com algum problema na escola, a quem pedes ajuda? * Escolhe no máximo 2 respostas: Amigos Outros familiares Pai Professores Mãe Funcionários Irmãos Ninguém Outro: __________________________________________________________________ 29. Em casa, conversas sobre: * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: Sim Não Como correu o teu dia na escola A matéria que estás a aprender nas aulas As tuas notas O teu comportamento Os teus amigos e/ou colegas Os teus professores 30. Se fazes alguma coisa na escola que o(s) adulto(s) com quem vives acham errado: * Escolhe no máximo 3 respostas: Não te deixam sair com os amigos Obrigam-te a estudar como castigo Conversam contigo, chamando-te à atenção Põe-te a fazer as tarefas da casa durante um tempo Gritam contigo Ficam chateados, mas não dizem nada Não te deixam ver televisão ou usar o computador Batem-te Contam a outros o que fizeste Não te dão qualquer coisa que tu queiras muito Outro: _______________________________________________________________________ 31. Se fazes alguma coisa na escola que o(s) adulto(s) com quem vives acham certo: * xxi Anexos Escolhe no máximo 2 respostas: Dizem-te para continuar Oferecem-te presentes Elogiam-te perto de outras pessoas Dizem-te: "Não fazes mais do que a tua obrigação" Não te dizem nada Outro: _________________________________________________________________ MÓDULO VII 32. Desde o início do ano já tiveste alguma vez numa grande discussão ou briga na escola? * Escolha apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 38 33. Pensa na situação mais grave. Quando aconteceu, estavas com quem? * Por favor escolhe todas as que se aplicam: Amigos ou colegas Professores Funcionários Alguém da minha família Ninguém Outro: ______________________________________________________ 34. Onde estavas? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Na sala de aula No recreio À entrada da escola Noutro local da escola xxii Anexos 35. Alguém viu? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 38 36. E o que fizeram as pessoas que assistiram? * Por favor escolhe todas as que se aplicam: Procuraram outra(s) pessoa(s) na escola Pediram ao agressor para parar Apoiaram o agressor Apoiaram a vítima Não fizeram nada Fugiram/ Tiveram medo Aproximaram-se para ver SE RESPONDESTE A ALGUMA DESTAS OPÇÕES, PASSA PARA A PERGUNTA 38 Riram-se da situação Outro: ______________________________________________________________________ 37. Quem foram as pessoas que intervieram? * Por favor escolhe todas as que se aplicam: Os amigos ou colegas O/ A Diretor/a de Turma Os Professores Os Funcionários Os Professores da Direção da Escola Alguém da minha família Outro: _________________________________________________________ MÓDULO VIII 38. Desde o início do ano letivo, diz quantas vezes viste alguém: * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: xxiii Anexos 1Nenhuma 2Raras 3Algumas 4Muitas Divulgar assuntos privados de um colega Falar mal de um colega Insultar um colega Estragar as coisas de um colega Impedir um colega de participar em atividades Magoar ou bater de propósito num colega Roubar as coisas de um colega Ameaçar um colega Ameaçar um colega com armas (facas, bastões...) Obrigar através de ameaças, um colega a fazer coisas que não queira (entregar dinheiro ou materiais, fazer tarefas...) Apalpar ou tocar num colega contra a sua vontade 39. Desde o início do ano letivo, diz quantas vezes: * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1Nenhuma 2Raras 3Algumas 4Muitas Divulgaram os meus assuntos privados Falaram mal de mim Insultaram-me Estragaram as minhas coisas Impediram-me de participar em atividades Magoaram-me ou bateram-me de propósito Roubaram as minhas coisas Ameaçaram-me Ameaçaram-me com armas (facas, bastões...) Obrigaram-me através de ameaças, a fazer coisas que não queria (entregar dinheiro ou materiais, fazer tarefas...) Apalparam-me ou tocaram-me contra a minha vontade 40. Desde o início do ano letivo, diz quantas vezes fizeste: * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: xxiv Anexos 1Nenhuma 2Raras 3Algumas 4Muitas Divulguei assuntos privados de um colega Falei mal de um colega Insultei um colega Estraguei as coisas de um colega Impedi um colega de participar em atividades Magoei ou bati de propósito num colega Roubei as coisas de um colega Ameacei um colega Ameacei um colega com armas (facas, bastões...) Obriguei através de ameaças, um colega a fazer coisas que não queira (entregar dinheiro ou materiais, fazer tarefas...) Apalpei ou toquei num colega contra a sua vontade MÓDULO IX 41. Achas que podes usar a violência para: * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: Sim Não Te protegeres de uma agressão Te protegeres de insultos e/ou ameaças Te vingares de alguém que te bateu Te vingares de alguém que te ameaçou e/ou disse mal de ti Defenderes alguém de agressões Defenderes alguém de insultos e/ou ameaças Te devolverem o que te tiraram Obteres o que queres Mostrares que és forte Mostrares que és tu que mandas Os outros aprenderem a respeitar-te Te conhecerem e gostarem de ti Te divertires e divertires os outros MÓDULO X xxv Anexos 42. Diz se concordas com os castigos e tarefas que aplicam na tua escola: Usa a escala: 1 = "Discordo totalmente" até 4 = "Concordo totalmente" * Por favor escolhe uma resposta apropriada para cada item: 1 - Discordo totalmente 2Discordo em parte 3Concordo em parte 4Concordo totalmente Contribuem para se estar melhor na escola Pioram o ambiente da escola São justos Deviam ser diferentes São muito duros São o que os mal comportados precisam Servem para impor a vontade dos professores Melhoram os comportamentos Não servem para nada Respeitam os direitos dos alunos MÓDULO XI 43. Conheces o regulamento da tua escola? * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Sim Não SE RESPONDESTE SIM, PASSA PARA A PERGUNTA 44 SE RESPONDESTE NÃO, PASSA PARA A PERGUNTA 45 44. O que achas do regulamento? * Escolhe no máximo 2 respostas: Respeita os direitos dos alunos É muito rígido, não me deixa fazer nada Serve para impor a vontade dos professores Contribui para se estar melhor na escola Ajuda-me a participar na vida da escola (aulas, recreios, Serve para castigar quem se porta mal assembleias, etc.) xxvi Anexos Outro: __________________________________________________________ 45. Não conheces o regulamento da escola porque: * Escolhe apenas uma das opções seguintes: Não estou interessado O/A Professor/a não me deu regulamento da escola Não sabia que existia Não sabia que podia lê-lo Não sei onde o posso encontrar Outro: ______________________________________________________________________ 46. Diz uma regra que seria importante existir na tua escola: Escreve aqui a tua resposta: _______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ xvii Anexos 6. GUIÃO DE ENTREVISTA A ALUNOS COM COMPORTAMENTOS REINCIDENTES O ano passado já eras cá aluno? Achas que conheces bem a escola? 1. O que é achas da escola? O que é que gostas mais e menos na escola? Como sabes na escola às vezes há problemas e conflitos entre alunos ou com funcionários e professores. Gostávamos de te pedir para falar um pouco sobre estas situações. Pensa agora em situações de conflito que podem acontecer no dia a dia. 2. Achas que aqui na escola há muitos problemas entre alunos? (brigas, insultos, roubos, …) 3. Já alguma vez viste uma situação dessas? 4. Isso acontece muitas vezes? há algum sítio em que costuma acontecer mais? 5. Alguma vez estiveste envolvido numa situação dessas? De que tipo? Muitas ou poucas vezes? 6. Porque é que achas que isso acontece? 7. O que é que a escola faz quando esses problemas acontecem? Quem é que costuma intervir/ajudar? Fazem alguma coisa? Achas que a escola devia agir de outra maneira? O que se pode fazer para que não aconteçam? 8. Já alguma vez foste castigado na escola? Porquê? Como é que isso aconteceu? 9. E o que é que achas dos castigos? São justos? 10. E das regras da escola? Agora vou-te fazer umas perguntas sobre as pessoas com quem te costumas relacionar, que fazem parte da tua vida A – Com quem passas o teu tempo livre? A conversar, passear, que te faz companhia, etc.? B – Habitualmente estudas sozinho/a ou tens apoio? Sempre ou apenas quando precisas de ajuda? De quem? C – Quando precisas de um conselho para tomares uma decisão sobre um assunto importante com quem é que falas? (exemplos: te inscreveres numa atividade ou para escolheres um curso) D – Com quem falas sobre assuntos que te preocupam? Que pessoas é que pensam como tu, têm as mesmas ideias? E – Imagina que perdias a tua carteira. A quem é que podias pedir dinheiro ou ajuda para comprar alguma coisa que precisasses? F – E no caso de não teres mesmo dinheiro, podias pedir a alguém para te pagar o que precisasses? (exemplo: um programa/ atividade, um lanche, material da escola etc.)? G – Quando tens um assunto uma questão muito pessoal ou íntima com quem falas habitualmente? H – Com que pessoas é provável estares em desacordo? Ou seja, com que pessoas podes ter brigas ou problemas ou que te possam incomodar ou aborrecer? I - E que pessoas podem trazer preocupação para ti? Com quem te preocupas? [ APRESENTAR EM SEPARADO] Pessoa (nome/ abrev.) Relação A B C D E F G H I Sexo Idade Local de Residência 1. 2. 3. 4. 5. xviii Anexos 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. [Repetir nomes da pergunta anterior e mostrar cartão] 6. Em relação às pessoas que mencionaste diz-me se: conhecem-se muito bem (2), conhecem-se razoavelmente (1) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 Interpretação da rede pelo próprio xix Anexos ANEXO C LISTA DE ENTIDADES LOCAIS INQUIRIDAS Sigla Natureza institucional Nome Localidade Resposta AO1 Autarquia Junta da Freguesia (T1) Freguesia 1 SIM AO2.1 Autarquia Junta de Freguesia (T2) Freguesia 2 SIM AO2.2 Instituição Pública Observatório Social da Freguesia Freguesia 2 SIM AO3.1 Autarquia Junta de Freguesia (T3) Freguesia 3 SIM Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (Freguesia T3) Freguesia 3 NÃO Zona 1 SIM AO3.2 AO4 Instituição oficial não judiciária Instituição oficial não judiciária Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (Zona 1 – T1 e T3) AO5.1 Autarquia Conselho Local de Ação Social do Concelho (Rede Social) Município SIM AO5.2 Autarquia Divisão da Educação da Câmara Municipal Município NÃO AO5.3 Instituição Pública Casa da Juventude do Concelho Município NÃO APP1.1 Programa Comunitário Projeto do Programa Escolhas Freguesia 1 SIM APP1.2 Programa Comunitário Projeto do Programa Escolas Freguesia 1 SIM APP2 IPSS/ ONG Instituição de apoio à infância e à 3ª idade Freguesia 2 SIM APP3 IPSS/ ONG Associação étnica Freguesia 3 SIM EF1 Escolar Escola Básica de 2º e 3º Ciclo (E1) Freguesia 1 NÃO EF2 Escolar Escola Básica de 2º e 3º Ciclo (E2) Freguesia 2 SIM EF3 Escolar Escola Básica de 2º e 3º Ciclo (E3) Freguesia 3 SIM EF5 Formadora Entidade Formadora Município SIM PJ1 Policial Esquadra da PSP (1) Freguesia 1 SIM PJ2 Policial Esquadra da PSP (2) Freguesia 2 SIM PJ3 Policial Esquadra da PSP (3) Freguesia 3 SIM PJ5 Ministério Público Equipa de zona do Instituto de Reinserção Social Município SIM S3 Unidade de Saúde Agrupamento de Centros de Saúde (3) Freguesia 3 NÃO S4 Unidade de Saúde Agrupamento de Centros de Saúde (Z1) Zona 1 SIM xxx Anexos ANEXO D FICHA DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA PUBLICAÇÕES 1. Sebastião, João, Campos, Joana e Merlini, Sara (2012) "As duas margens do rio: contrastes urbanos e regulação da violência na escola", Interseções: Revista de Estudos Interdisciplinares, Rio de Janeiro v. 14, n.º 1, pp. 127-164; 2. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (no prelo) "Redes (des)conexas de intervenção local na violência infanto-juvenil", Dossier temático: Análise quantitativa e indicadores sociais. Mediações – Revista de Ciências Sociais (em publicação, submetido em 28 de fevereiro de 2013); 3. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (no prelo) "Education policies, territories and actor strategies", Italian Journal of Sociology of Education (em publicação, submetido em 31 de março de 2013); 4. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (no prelo), "Violência na escola: conhecer para agir" Em: Benavente, Ana (orgs.) A Escola do Século XXI: problemas, desafios, perspectivas.(em publicação, submetido em 28 de fevereiro de 2013); COMUNICAÇÕES E PARTICIPAÇÃO EM CONGRESSOS E OUTROS ENCONTROS CIENTÍFICOS 1. Submissão de comunicação em 15 de junho de 2013 - Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Avaliação da intervenção socioeducativa sobre a violência na escola" VI Encontro do CIED / I Encontro Internacional em Estudos Educacionais - Avaliação: Desafios e Riscos, a realizar-se na Escola Superior de Educação de Lisboa a 15 e 16 de novembro de 2013; 2. Submissão de comunicação em 14 de dezembro de 2012 - Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "The School As A Complex Object: Methodological Strategies and Knowledge Production", 9th International Conference ERNAPE - Families, Schools and Communities: Learn from the past, review the present, prepare for a future with equity, a realizar-se na Universidade de Lisboa de 4 a 6 de Setembro de 2013; 3. Submissão de comunicação em 14 de dezembro de 2012 - Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Social Netwok Analysis in School Violence Research - Methodological Implications", 9th International Conference ERNAPE Families, Schools and Communities: Learn from the past, review the present, prepare for a future with equity, a realizar-se na Universidade de Lisboa de 4 a 6 de Setembro de 2013; 4. Merlini, Sara (2013) "Jovens reincidentes: comunidades pessoais especializadas e circunscritas", 2º Summer Course en Análisis de Redes Sociales y 2º Workshop de Investigación, UNED, Ponferrada, León, 26 a 28 de junho de 2013; xxxi Anexos 5. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Não sei como hei-de dizer... Porrada, pronto! Análise e intervenção em situações de violência na escola", Workshop de Investigação do CIES-IUL, 19 de junho de 2013; 6. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Redes (des)conexas de intervenção local sobre a violência na escola", I Colóquio Internacional de Ciências Sociais em Educação/ III Encontro de Sociologia da Educação, Universidade do Minho, 25 a 27 de março de 2013; 7. Sebastião, João, Campos, Joana e Merlini, Sara (2012) "Street level bureaucracy – Educational Policies and local context", ESA RN10 Midterm Conference - Diversity in Education: Issues of Equity and Social Cohesion, Ghent University, Belgium, 13 e 14 de setembro 2012; 8. Sebastião, João, Campos, Joana e Merlini, Sara (2012) "Processos de regulação da violência escolar: das políticas às práticas", VIII Congresso Português de Sociologia – Sociedade, Crise e Reconfigurações, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 19 a 22 de junho de 2012; FORMAÇÃO 1. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Violência na Escola – Conhecer para Agir", Manual - Metodologia Integrada de Intervenção sobre a Violência na Escola; 2. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Violência na Escola – Conhecer para Agir", Brochura de apresentação da Metodologia Integrada de Intervenção sobre a Violência na Escola (a disponibilizar brevemente no sítio do CIES); 3. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Gestão Organizacional da Violência na Escola - Conhecer para Agir", Formação dirigida a docentes e técnicos com responsabilidades na proteção na infância nas escolas em estudo no Projeto "Estratégias de Intervenção Socioeducativa em Contextos Sociais Complexos" (POAT) nos dias 22, 27 e 29 de Maio de 2013; DISSEMINAÇÃO DE RESULTADOS 1. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Estratégias socioeducativas em contextos sociais complexos" – Apresentação dos resultados de estudo do Observatório de Segurança Escolar / CIES-IUL, Fórum de Colaboração na Casa da Juventude no dia 3 de maio de 2013. 2. Sebastião, João, Campos, Joana, Merlini, Sara e Chambino, Mafalda (2013) "Violência, Escola e Territórios" – Apresentação dos resultados de um estudo de casos do Observatório de Segurança Escolar, Discussão alargada no TeatroEsfera no dia 2 de fevereiro de 2012 (ponto de partida para o projeto POAT). xxxii Anexos ANEXO E MANUAL DE FORMAÇÃO xxxiii Violência na Escola Conhecer para Agir Violência na Escola – Conhecer para Agir FICHA TÉCNICA Conceção: João Sebastião (Coord.) Joana Campos Sara Merlini Mafalda Chambino Observatório de Segurança Escolar/ CIES-IUL [email protected] Avenida das Forças Armadas, Ed. I 1649-026 Lisboa - Portugal Tel.: 210 464 018 / 192 www.cies.iscte.pt Cofinanciamento: Programa Operacional de Assistência Técnica do Fundo Social Europeu (POAT/FSE) Gerir, conhecer e intervir Violência na Escola – Conhecer para Agir Este guia de atuação resulta do projeto Estratégias de intervenção socioeducativa em contextos sociais complexos e o seu objetivo é aprofundar o conhecimento sobre a problemática da violência na escola e simultaneamente proporcionar instrumentos de intervenção socioeducativa de natureza comunitária aos diferentes responsáveis de atuação nesta área. A proposta de metodologia integrada de prevenção e intervenção da violência na escola que aqui se apresenta é o resultado da investigação desenvolvida em diversas escolas ao longo dos últimos anos pelo Observatório de Segurança Escolar. Agradecemos a todas as instituições, técnicos e outros participantes que nos diversos momentos contribuíram para o desenvolvimento deste projeto. 1 Violência na Escola – Conhecer para Agir Índice Violência na Escola .......................................................................................................... 3 Fatores e estratégias de atuação: diversidade de abordagens ........................................... 7 Intervir a partir da Escola: Metodologia integrada de prevenção e intervenção ........... 10 Bibliografia temática ...................................................................................................... 17 2 Violência na Escola – Conhecer para Agir 1. VIOLÊNCIA NA ESCOLA A violência nas escolas tornou-se nas duas últimas décadas uma questão relevante no debate educativo e político a nível nacional e internacional sendo frequentemente expressa a ideia de que a violência resulta de uma degradação civilizacional e que as novas gerações são incivilizadas e não respeitam os valores nem a cultura. Esta ideia é reforçada pelo relevo dado a casos isolados nos meios de comunicação social, o que contribuiu para a construção social das escolas como contextos de insegurança, sustentando conceções que a pesquisa científica tem vindo a refutar. A perspetiva de que os casos de violência na escola são recentes e estão num crescendo imparável não encontra bases científicas, uma vez que a violência em meio escolar é um fenómeno restrito e os incidentes de maior gravidade são raros (Carra, 2009). Estes ocorrem nos quotidianos sobretudo sobre a forma de microviolências, pequenas vitimações e incivilidades (ou violência de baixa intensidade, Dupper e Meyer-Adams, 2008). Nesse sentido podemos afirmar que a relevância social do fenómeno é que é recente. Outra ideia vulgarmente difundida é a de que as situações de violência são provocadas por fatores externos à escola, por características individuais dos alunos e do seu percurso escolar (insucesso escolar, predisposição para o abandono precoce da escola ou para a ausência reiterada) e da socialização familiar, como consequência das condições precárias e de modos de vida marginais, embora a pesquisa tenha vindo a demonstrar que não há associações diretas ou inequívocas entre a violência e estas variáveis. (Sebastião, Campos e Alves, 2003; Skiba et. al., 2006) Definir e Identificar Analisar a violência na escola implica adotar uma abordagem convergente que enquadre as esferas de intervenção e ação das instituições formais e, ainda, os agentes sociais e os mecanismos que estruturam e regulam as conceções e práticas de violência. As conceções e atitudes violentas estruturam-se a partir dos diversos processos de socialização a que os indivíduos são sujeitos, assim como da existência e eficácia dos procedimentos de regulação da violência nos contextos em que estas interações se produzem. Trata-se de perspetivar a violência enquanto forma de ação contingente, que se produz num contexto relacional concreto mas com quadros de possibilidades diversos, em que diferentes tipos e graus de tensão e conflito podem levar (ou não) a situações de agressão. Nesse sentido, a violência pode acontecer ou não dependendo da forma como as escolas promovem (ou não) processos de prevenção e intervenção das situações de violência na escola. Haverá sempre situações de violência, contudo estas podem ser em menor número e de menor gravidade quando esses mecanismos estão organizados e preparados para intervir. 3 Violência na Escola – Conhecer para Agir Figura 1: A violência enquanto forma de ação contingente Processos longos de socialização institucional Práticas institucionalizadas de regulação da violência (processos de aprendizagem dos sistemas de regras formais) (estado, escola, segurança social, autarquias, etc.) Processos de regulação social das conceções e práticas de violência A violência enquanto forma de ação contingente Processos de estruturação das conceções e atitudes violentas Práticas informais de regulação da violência Processos longos de socialização comunitária (aprendizagem de (família, pares, etc.) quadros e modelos sociais e culturais grupais) Fonte: Sebastião, 2013:29 4 Violência na Escola – Conhecer para Agir A utilização indistinta de termos semanticamente próximos, como bullying, violência, indisciplina, agressividade ou incivilidade, obscurece a compreensão das situações de violência na escola ao considerarem simultaneamente igual e oposto aquilo que são perspectivas distintas de um mesmo problema, e, por essa razão, tendencialmente complementares. Quadro n.º 2 – Diversidade conceptual na definição da violência na escola Conceito Definição Áreas de investigação Bullying escolar (Olweus, 1993) Assédio ou intimidação repetida entre pares de alunos, implicando uma intenção deliberada de provocar dano a um colega por parte do aluno ou do grupo de alunos, o desequilíbrio de forças e de atos repetitivos. Sociologia, Psicologia Ciências da Educação Comportamentos de risco (OMS, 2005) Inclui categorias baseadas nas ofensas sofridas ou nos danos infligidos, cujos custos humanos, sociais e económicos deverão ser reduzidos. Nomeadamente a automutilação (suicídio, consumos de drogas legais ou ilegais), ofensas a outros (homicídio, agressão, etc.) ou à sociedade (vandalismo, discriminação, etc.) Ciências da Saúde Violência na Escola (Sebastião, 2009) Definição centrada no carácter intencional da agressão, cruzando dimensões físicas e psicossociais. Sociologia Educação Comportamento antisocial (Carra, 2009; Veenstra e Dijkstra, 2011) Associada ao estudo da delinquência e do uso de categorias legais, que compreende um leque de comportamentos como a violência física, as ameaças e outro tipo de atitudes delinquentes, nomeadamente o roubo, o uso de drogas e ofensas associadas ao incumprimento de regras, em particular as escolares. Criminologia Sociologia Psicologia Indisciplina (Amado, 2001) Fenómeno relacional e interativo que se concretiza no incumprimento das regras que estabelecem, presidem e orientam as condições das tarefas na aula e, ainda, no desrespeito das normas e valores que fundamentam o convívio entre pares e a relação com o professor enquanto pessoa e autoridade Ciências da Educação Psicologia Sociologia 5 Violência na Escola – Conhecer para Agir O que entendemos por Violência? Consideramos como violência na escola os “atos caracterizados pela agressão intencional, seja esta física ou psicossocial, podendo assumir formas reativas/afetivas ou proactivas/instrumentais” (Sebastião,2013). A violência pressupõe agressão e intencionalidade: Quadro n.º 3 – Tipos de violência Tipo de Agressão Física Intencionalidade Reativa Proactiva/ Instrumental Psicossocial Tem como motivo primário magoar o alvo, tipicamente baseada em fúria, ocorre em resposta à provocação ou Comportamento que por descontrolo emocional. procura lesar os outros através do seu estatuto Ocorre na ausência de provocação social ou relações de deliberada e é desencadeada para amizade (agressão indireta atingir um objectivo social. O ou relacional). agressor tem a expectativa de que a agressão física tenha consequências positivas, de carácter instrumental. Fonte: Sebastião, J. (2009) Como consequência desta perspetiva teórica torna-se necessário tomar em consideração: - Tipo de violência (física, psicossocial) - Intencionalidade (reativa, proactiva/instrumental) - Contexto em que ocorre (espaço, tempo) - Intervenientes (autores, vítimas, testemunhas) - Intervenção (recursos disponibilizados, tipo de abordagem, monitorização/ acompanhamento) A pesquisa tem vindo a demonstrar que a violência na escola é um fenómeno restrito e que os incidentes de maior gravidade são raros. Tal constatação não significa que seja um fenómeno de menor importância. É necessário que os responsáveis pela prevenção e intervenção sobre este problema o consigam identificar nas suas diferentes vertentes, sendo esta uma etapa fundamental para a formulação de orientações e estratégias de atuação. Para além da compreensão do problema em toda a sua complexidade, é da maior importância conhecer as estratégias que têm vindo a resultar nos processos de regulação da violência na escola. Nesse sentido, apresentar-se-ão de seguida alguns exemplos dos fatores de sucesso que se destacaram durante a pesquisa realizada. 6 Violência na Escola – Conhecer para Agir 2. FATORES E ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO: DIVERSIDADE DE ABORDAGENS 2.1. Programas de intervenção Atualmente podem ser identificadas diversas estratégias de atuação sobre a violência na escola que são postas em prática de forma isolada ou complementar. Estas podem ser divididas em duas abordagens distintas: Programas centrados na Prevenção Os programas desenvolvidos para prevenir o aparecimento de situações de violência escolar partem da ideia da violência como fenómeno multideterminado. Alguns dos traços comuns a estes programas são a orientação das atuações para a resolução democrática dos conflitos (Diaz-Aguado, 2005) e a formação cívica e comportamental. A sua finalidade é a promoção da equidade e melhoria do clima de escola. O desenvolvimento deste tipo de programas pressupõe a elaboração participada do diagnóstico e do plano de prevenção, e a sua implementação a partir de parcerias comunitárias. Programas centrados na Intervenção Os programas direcionados para a intervenção sobre os problemas de violência na escola tendem a incluir a escola na sua totalidade e o seu meio envolvente e procuram (re) estabelecer a ordem escolar através de diversos mecanismos, tais como: participação dos parceiros da comunidade nos projetos; criação de sistemas de comunicação e ensino efetivo das regras; implementação de sistemas de gestão comportamental dos alunos, com especial enfoque na promoção de modalidades de justiça restaurativa (Morrison e Vaandering, 2012); investimento na relação entre os alunos e os adultos da escola (promoção da autodisciplina, autoconhecimento, autogestão e consciência social); uniformização das estratégias de gestão de sala de aula (por turma). A focalização no alunos e/ou pequenos grupos de alunos é outra abordagem a este tipo de problemática. São intervenções específicas que têm como perspetiva a atuação focalizada. As principais estratégias utilizadas neste âmbito são as Tutorias (relação de apoio e orientação entre um adulto e um ou mais jovens); o Treino de Competências Pessoais e Relacionais (atividades de análise, reflexão, aprendizagem e modificação dos comportamentos); a Mediação (processo voluntário de resolução de conflitos, que procura a manutenção de relações interpessoais pacíficas; organiza-se em cinco fases: apresentação, explicitação, contextualização, avaliação e estabelecimento de acordo – Pacheco, 2006). Estes processos de intervenção individualizada poderão ser realizados tanto por membros da escola (professores), como por outros técnicos, através do estabelecimento de parcerias com agentes institucionais locais. 7 Violência na Escola – Conhecer para Agir No final deste guia encontra-se uma Bibliografia Temática que procura fornecer elementos teóricos e metodológicos que permitam contribuir para o desenvolvimento de projetos e o aprofundamento de estratégias de intervenção neste âmbito. 2.2. Estratégias de Intervenção A metodologia cujos princípios até agora temos vindo a apresentar resulta do percurso de investigação que tem vindo a ser realizado pela equipa do Observatório de Segurança Escolar. Para a construção desta metodologia foram consideradas as principais contribuições teóricas sobre o tema; exemplos práticos de estratégias de intervenção que têm vindo a ser desenvolvidas a nível nacional e internacional; e as características específicas dos territórios educativos em análise. A investigação realizada num conjunto de territórios educativos permitiu aprofundar o conhecimento da equipa sobre os processos de regulação da violência acionados pelas escolas em análise assim como identificar fatores de sucesso e obstáculos à pacificação dos quotidianos escolares. Se nem sempre o que é eficaz deve ser adotado como modelo, pois por vezes atropela as regras mais elementares de uma escola aberta e democrática, o debate e a análise das estratégias e práticas de prevenção e intervenção implementadas pelas escolas permitiu identificar as mais eficazes nos processos de regulação e que melhor correspondiam aos objetivos de uma escola inclusiva. Podem assim ser realçados alguns princípios relevantes, nomeadamente: 1. Dar prioridade ao debate sobre as situações e causas da violência na escola constitui um fator de sucesso central na regulação dos quotidianos escolares, como resultado do planeamento e da estruturação de estratégias explícitas e sistemáticas. 2. Articular a regulação dos comportamentos violentos com a promoção da equidade educativa, nomeadamente a melhoria dos resultados escolares e dos sistemas de apoio educativo. 3. Considerar a importância dos fatores organizacionais, nomeadamente: a articulação e coordenação entre os vários níveis (direção, coordenações setoriais, turma); a existência de procedimentos estruturados, rotinados e avaliados de monitorização que orientem a prevenção e intervenção. 4. Ponderar as diversas modalidades de trabalho em parceria, enquanto forma de ação coletiva particularmente útil e produtiva na ativação e consolidação de mecanismos de prevenção e intervenção territorial. Partindo destes princípios podemos sistematizar um conjunto de aberto de princípios de intervenção capazes de estruturar processos de intervenção que sejam simultaneamente flexíveis, adaptados e integrados, permitindo a cada escola construir uma metodologia própria adaptada às suas características e do território educativo em que atua. 8 Violência na Escola – Conhecer para Agir A resposta à questão "Como podem as escolas enfrentar as situações de violência e reforçar simultaneamente a sua dinâmica interna?" resulta, acima de tudo, da realização de um esforço coletivo para construir: 1. Uma organização escolar coordenada e articulada, sustentada na implicação e comunicação entre os diversos níveis organizacionais da escola, na distinção de competências e responsabilidades segundo o tipo e gravidade da situação e na articulação entre a organização pedagógica e os processos de implementação da disciplina. 2. Um entendimento normativo efetivamente partilhado nos seus elementos essenciais por todos os intervenientes dentro da escola. Não é raro verificarmos que muitos professores, funcionários e alunos desconhecem total ou parcialmente o regulamento interno da escola e/ou outros documentos relevantes nesta matéria, ou que os interpretam de formas muito diferentes. Para esta partilha ser bem-sucedida é necessário haver uma formulação e implementação de regras, critérios de decisão e de aplicação objetivos, coerentes e justos. O nível turma deve ser considerado como central para a construção deste entendimento normativo partilhado, tarefa cuja promoção e enraizamento nas atividades das escolas é, antes de mais, da responsabilidade das lideranças centrais e intermédias das escolas. 3. Um controlo disciplinar que se paute pela atuação imediata, pela proximidade no acompanhamento dos intervenientes das ocorrências e pela procura de formas restaurativas de punição como as medidas disciplinares corretivas. 4. Práticas sistemáticas apoiadas em recursos direcionados para a problemática, como a constituição de estruturas internas de apoio à intervenção e monitorização (gabinetes-grupos de trabalho de prevenção/intervenção). Estas iniciativas devem procurar enquadrar diretamente os alunos problemáticos, tendo como objetivo a alteração de comportamentos e a melhoria do clima de escola, assim como desenvolver processos de qualificação dos recursos humanos que intervêm diretamente nestes processos. 5. A consensualização dos processos de monitorização entre a escola e as diversas entidades com responsabilidades na educação das crianças e jovens, já que o problema da violência não constitui um exclusivo das escolas. A expressão no território de diversas políticas que têm como objetivo concretizá-las (educação, saúde, segurança social, justiça, etc.) leva a que muitas vezes se possam encontrar várias instituições a trabalhar isoladamente para procurar resolver problemas comuns. A análise cruzada e conjunta sobre o fenómeno é vantajosa, sendo que a utilização de definições comuns (ou com elementos comparáveis) sobre a violência; a circulação de informação atempada e preventiva sobre o tipo de ocorrências e a avaliação e acompanhamento dos processos de regulação, contribui significativamente para o aumento da eficácia da intervenção. 6. A mobilização e envolvimento de Encarregados de Educação ou outros familiares através de ações que os impliquem na participação e colaboração com as instituições locais na concretização dos processos de regulação escolar. 9 Violência na Escola – Conhecer para Agir 3. INTERVIR A PARTIR DA ESCOLA: METODOLOGIA INTEGRADA DE PREVENÇÃO E INTERVENÇÃO Considera-se, portanto, que uma proposta de atuação sobre a problemática da violência na escola deve partir da própria escola, estendendo-se à comunidade envolvente tendo como princípio uma abordagem integrada de prevenção e intervenção. Apesar das condições de partida serem muito diferenciadas, as escolas têm vindo a demonstrar que são capazes de regular a conflitualidade e a violência, dentro de quadros de ação centrados em conter, reajustar e sensibilizar para comportamentos não violentos, mostrando que possuem margem de atuação para fazer face aos obstáculos identificados, mesmo que os constrangimentos políticos, organizacionais ou contextuais nem sempre o facilitem. Neste sentido, consideramos como centrais desse tipo de metodologia de intervenção sobre a violência na escola os seguintes princípios de atuação: Antecipar e prevenir Colaborar e envolver Articular e coordenar Limitar e disciplinar Mediar e acompanhar Avaliar e monitorizar Reforçar e difundir Antecipar e prevenir A antecipação e prevenção das situações potencialmente problemáticas nas escolas é um fator chave para a construção de um clima de escola seguro e pacífico. O primeiro passo para a construção de estratégias de intervenção eficazes em qualquer área de intervenção é a identificação e delimitação do problema, do contexto em que ocorre e das suas fragilidades e potencialidades. Para isso, torna-se essencial a realização de um diagnóstico que permita, não só caracterizar o problema sobre que se quer intervir, como compreender as reais necessidades de intervenção (impedindo assim a sobreposição de repostas) e os recursos disponíveis para o efeito. Este conhecimento ganhará em clareza e especificação se produzido através da participação de todos os 10 Violência na Escola – Conhecer para Agir parceiros no seu processo de conceção, centrado na definição clara das estratégias de intervenção, de objetivos e metas concretizáveis. Os exercícios de reflexão e prevenção que permitem elaborar previamente estratégias e procedimentos de intervenção levam a que a escola não se torne refém dos acontecimentos, retirando o efeito surpresa dos atos geradores de conflito e permitindo encarar os factos com maior racionalidade. Deve-se evitar atuar sobre as ocorrências de violência de forma reativa, acionando mecanismos de resposta apenas quando se verifica um aumento de incidentes (em frequência e/ou intensidade). O facto de não existirem níveis elevados de violência numa escola, não significa que esta não necessite de prevenir o problema ou de definir mecanismos de atuação. É neste sentido que se propõe como princípio de atuação a definição de estratégias de intervenção que antecipem o aparecimento de situações violentas. Para isso é desejável: - Criar e manter uma equipa de ação conjunta e desenvolver um plano de atuação. Esta equipa deverá ser composta por elementos da escola (direção, coordenação de departamento e direções de turma), da família e da comunidade (segundo a relevância da sua área de intervenção em cada situação concreta, e tem como objetivo fundamental desenvolver um plano de atuação e que funcione como guia de orientação e possibilite a supervisão das atividades promovidas. - Desenvolver ações de sensibilização orientadas para a alteração de comportamentos e melhoria do clima de escola. Este tipo de atividades tem-se revelado eficiente na prevenção de condutas violentas, pois cria a oportunidade de clarificar e informar os participantes nestas ações, contribuindo para melhorar o seu discernimento na rejeição de atitudes e práticas violentas. As ações podem ser estabelecidas através de projetos ou atividades de formação cívica, que sejam transversais a diferentes disciplinas, desenvolvidas por iniciativa da escola ou dos parceiros. - Simular situações de conflito e analisar as resoluções possíveis. Trata-se de confrontar os participantes com uma situação simulada de conflito considerando as diferentes possibilidades de resposta e as consequências para os sujeitos envolvidos. Estas atividades poderão ser desenvolvidas através de dramatização, do recurso a grupos de teatro da comunidade, ou a atividades de interpretação ou criação de banda desenhada em sala de aula (Chrispino e Santos, 2011). Colaborar e envolver O desenvolvimento de parcerias locais é uma condição essencial para um trabalho de prevenção eficaz no médio e longo prazo. A intervenção em rede representa um claro valor acrescentado na medida em que beneficia de uma maior diversidade de abordagens e permite uma otimização dos recursos disponíveis (Conselho Europeu, 20112). O princípio estratégico da colaboração em rede é importante para: - Decisões baseadas numa liderança partilhada e democrática. Deve haver uma preocupação por parte das lideranças em construir processos de decisão partilhados que impliquem a responsabilização e envolvimento nos diversos níveis de atuação. Esta comunicação deve ser realizada sistematicamente pela equipa de ação junto de todos os parceiros e da comunidade local. 11 Violência na Escola – Conhecer para Agir - Construir uma visão alargada e complexa de base territorial sobre os fatores geradores de violência. O estabelecimento de parcerias e processos de decisão partilhados necessitam de ser fundados na construção de visões comuns e partilhadas das características e causas dos problemas de violência, pelos diversos agentes educativos e sociais dos territórios educativos, produzam-se estes na escola ou fora delas. - Reforço das parcerias estabelecidas e avaliação da necessidade de novas. Perceber qual a relevância das parcerias existentes, o seu contributo para os objetivos de intervenção definidos, e a existência de outras entidades cuja colaboração na estratégia de intervenção seja pertinente. - Aprofundar as relações interinstitucionais, definindo e distribuindo as responsabilidades. A parceria implica uma clarificação e repartição de tarefas e competências (em dois níveis: interno à organização escolar; e entre a escola e a comunidade) e o estabelecimento de laços de cooperação entre as partes. Deve ser considerada a diversidade de âmbitos de atuação, bem como os diferentes graus possíveis de envolvimento de cada parceiro. A definição e delegação de níveis de responsabilidades de atuação sobre a violência na escola é um aspeto central para uma articulação eficaz entre os parceiros e a implementação de mecanismos de resolução céleres. - Atuar conjuntamente, partilhando os recursos disponíveis. É fundamental desenvolver um processo que permita conceber estratégias a longo prazo, capitalizando os recursos existentes para esse fim. De uma forma flexível, revela-se necessária a identificação de objetivos comuns e a partilha de informação, recursos técnicos e materiais que promovam uma intervenção e avaliação das situações de violência. Articular e coordenar O princípio de articulação e coordenação de uma estratégia de intervenção sobre a violência na escola pressupõe a existência de uma equipa de ação designada para o efeito e que as atividades desenvolvidas estejam articuladas com um plano de atuação conjunta. Nesse sentido é importante que se definam estratégias coordenadas a nível escolar e comunitário, nomeadamente através da: - Elaboração de um documento conjunto de orientação para a intervenção. Neste documento devem estar determinados os eixos e objetivos de intervenção, bem como o modelo de funcionamento e a operacionalização do mesmo. Um instrumento deste género baseia-se sempre num diagnóstico amplamente participado e sistemático que permita definir e explicitar conjuntamente a filosofia de atuação a desenvolver e os mecanismos acionados para esse efeito. O envolvimento dos vários parceiros na conceção das orientações de atuação, por um lado, enriquece as abordagens de resolução e, por outro, compromete-os a intervir em conformidade. - Definição e delegação de competências pelos diversos níveis, segundo o tipo e gravidade da situação. A implicação dos parceiros da comunidade no desenvolvimento de uma estratégia de intervenção requer que se determinem e explicitem em que 12 Violência na Escola – Conhecer para Agir situações será desejável a intervenção, tendo em conta o tipo e a frequência das mesmas. Este tipo de procedimento evita a sobreposição de respostas institucionais, que frequentemente se traduz numa afetação desadequada dos recursos existentes. O reconhecimento e priorização das competências de cada instituição de acordo com o tipo de situação implicam o melhor conhecimento mútuo dos diversos níveis organizacionais, tanto no interior do sistema educativo, como nas entidades parceiras, e o estabelecimento de laços de comunicação entre estes. - Comunicação sistemática entre os parceiros. A partilha e transferência de informação é um aspeto essencial no desenvolvimento de uma estratégia de intervenção, na medida em que permite a realização de um diagnóstico efetivo e apoia uma tomada de decisão proporcional e informada. De forma dinâmica, a comunicação entre os parceiros pode ser estabelecida em diversos momentos e circunstâncias, nomeadamente através dos recursos e possibilidades tecnológicas hoje existentes. Limitar e disciplinar A relação entre as dimensões pedagógica e disciplinar é um elemento relevante nos processos de regulação das situações de violência na escola. Os quadros de relações sociais estabelecidos entre alunos e adultos dentro da escola implicam que as regras escolares sejam entendidas como legítimas, enquanto componente básica para que o processo de educação e aprendizagem possa ser efetivado. É por isso importante conceber e implementar o controlo disciplinar com base no conhecimento e aceitação dessas mesmas regras, o que implica: - A definição de regras claras e objetivas. A participação dos diversos membros da comunidade educativa na discussão e elaboração das normas de conduta revela-se fundamental, na medida em que funciona como uma ação de sensibilização para as mesmas, fomentando a sua legitimação e interiorização. A forma como as regras são implementadas pelos adultos é também um elemento decisivo, uma vez que a sua aplicação particularizada e contraditória pelos diferentes adultos despoleta frequentemente situações de conflito, como os resultantes das permissões discordantes quanto à utilização de boné ou telemóvel na sala de aula. A relativa harmonização das normas ao nível da turma e a sua aplicação em consonância por todos os adultos são componentes chave no controlo disciplinar. - A definição de critérios de decisão uniformes, coerentes e justos. A existência de parâmetros definidos para cada situação e respetiva medida disciplinar impede que se criem circunstâncias ambíguas na aplicação de medidas. Nas escolas não são raros os casos em que dois alunos têm diferentes castigos pelo mesmo comportamento, nas tando para isso mudar o instrutor de processo disciplinar ou de haver níveis de tolerância menores para certos grupos de alunos, mesmo que não tenham antecedentes de violência. As situações com dois pesos e duas medidas provocam frequentemente condições para se instalar na escola um sentido de injustiça e para o aumento da reincidência. Nesse sentido, é importante que a avaliação das decisões a tomar em matéria disciplinar seja consistente e criteriosa, de modo a construir um clima de escola onde as normas são vistas como sendo aplicadas de forma legítima e coerente. 13 Violência na Escola – Conhecer para Agir - A ação e resolução célere das ocorrências. No sentido de prevenir um sentimento de impunidade por parte dos alunos, revela-se oportuna a definição de mecanismos, procedimentos e estruturas de apoio que permitam responder às situações de conflito com celeridade. Mesmo que a intervenção não seja imediata, é importante atender aos incidentes com a brevidade necessária para que os intervenientes não interpretem a demora na intervenção como uma “não atuação”. - A opção por medidas de carácter corretivo e pedagógico em detrimento das sancionatórias. Diversos estudos e avaliações de programas têm vindo a mostrar que as “Políticas de Tolerância Zero” possuem menor eficácia a médio-longo prazo e que provocam efeitos perversos, como o aumento da desigualdade e segregação escolar (Skyba, et al, 2006). Neste sentido, é recomendada a preferência por uma justiça restaurativa na regulação das situações de conflito escolar. Quadro n.º 4 – Distinção entre práticas regulatórias punitivas e restaurativas Resultado procurado Processo decisório Mecanismo regulador Fonte motivadora Punitiva Restaurativa Punição do agressor (retribuição) Por terceiros (prescritivo) Contraditório Externa (controlo; baseada em regras) Reparação de danos (restituição) Partes envolvidas (resolução) Reconciliação Interna (compromisso/ envolvimento; baseada em valores) (Morrison e Vaandering, 2012) Mediar e acompanhar É reconhecida a importância da existência de um sistema de apoio e orientação para os intervenientes nas situações de conflito nas escolas, mecanismos que contribuam para a alteração dos seus comportamentos e a promoção da convivência pacífica na escola. Algumas das estratégias mais eficazes identificadas são: - Tutorias: acompanhamento escolar e do desenvolvimento individual do aluno (vítimas e agressores) por um período alargado de tempo, no mínimo um ano. Este apoio tanto pode ser dado por um professor ou técnico da escola designado para o efeito, como por técnicos das entidades parceiras. - Mediação: resolução de divergências de ordem relacional, com o papel ativo das partes na tomada de decisão. É recomendada a formação dos mediadores neste tipo de intervenção, que podem ser professores, técnicos da escola ou da comunidade ou alunos formados para o efeito. O mediador atua como um elemento que apoia os intervenientes na reconciliação, promovendo uma justiça restaurativa, e pode contribuir ainda para evitar que as situações de conflito degenerem em situações de violência. - Treino de competências pessoais e sociais a alunos: estratégia usada particularmente em situações de reincidência dos comportamentos violentos, em que se procura alterar de forma gradual padrões de comportamento agressivos através de um acompanhamento prolongado do aluno, em que a rede de parceiros pode constituir um recurso fundamental. 14 Violência na Escola – Conhecer para Agir Avaliar e monitorizar A criação de um sistema de indicadores que possibilite avaliar a difusão de fenómenos violentos e o impacto da intervenção, contribui para assegurar que as decisões são tomadas com base nos factos e não apenas em perceções. Enquanto princípio, propõe-se que haja uma coordenação entre os processos de monitorização da escola e entidades locais, através de um conjunto de instrumentos que permita a: - Avaliação regular do tipo de ocorrências. É necessário conhecer com pormenor as situações existentes para se poderem tomar medidas de prevenção e intervenção, o que muitas vezes significa analisar e sistematizar a informação já existente na escola. - Avaliação e acompanhamento dos processos de regulação, com vista à redefinição de estratégias. Realização de uma análise que permita verificar se os objetivos propostos estão a ser cumpridos, o que se poderá traduzir numa adequação do plano de intervenção aos resultados encontrados. A avaliação deve ser realizada antes e depois da intervenção e/ou no decurso do processo de implementação de acordo com o conhecimento existente sobre o aluno e a gravidade da situação. - Avaliação da eficácia das estruturas de apoio à intervenção e monitorização. Esta avaliação passa por uma análise dos resultados da intervenção e da eficácia dos procedimentos disciplinares realizados pelas estruturas de regulação dos comportamentos violentos (gabinetes de intervenção escolares e/ou comunitários). Reforçar e difundir O reforço e a disseminação são elementos fundamentais numa estratégia de intervenção, na medida em que contribuem para a manutenção do plano de ação e motivam o envolvimento da comunidade. Neste âmbito, destaca-se um conjunto de práticas: - Estabilização do plano de ação por ciclos prolongados. É decisivo que o plano se mantenha pelo menos por dois anos, sendo depois reformulado com base na leitura dos indicadores de monitorização. - Envolvimento dos líderes locais de modo a ter maior apoio e defesa nos esforços de melhoria da segurança escolar. Esta colaboração dos líderes locais na estratégia de intervenção pode ter diversas finalidades, desde o patrocínio na realização de uma atividade à promoção da iniciativa ao nível territorial. A prevenção da violência é um aspeto essencial da educação para a cidadania democrática. A escola, para além de um local de transmissão de conhecimentos, constitui um espaço fundamental para a construção identitária dos jovens. Torna-se, portanto, da maior importância a definição e concretização de estratégias de sensibilização para a problemática da violência em meio escolar e de prevenção da sua ocorrência. Para além disso, a prevenção da violência assume consequências positivas e globais para a escola, traduzindo-se noutras dimensões, nomeadamente nas aprendizagens, na indisciplina ou no abandono precoce. 15 Violência na Escola – Conhecer para Agir A complexidade deste fenómeno, o seu caracter transversal no quotidiano dos jovens, e os enormes custos sociais que acarreta, reforçam a necessidade da implementação de estratégias que não sejam focadas unicamente na escola, mas que, pelo contrário, incluam os diversos atores comunitários. As famílias, a comunidade, e as instituições existentes nos territórios assumem-se como parceiros fundamentais para a concretização eficaz das medidas de prevenção e intervenção. Não existe nenhuma fonte derradeira do conhecimento. Qualquer fonte, qualquer achega é bem-vinda, muito embora seja também objecto de verificação crítica. (Popper, K., 1992:57) 16 Violência na Escola – Conhecer para Agir BIBLIOGRAFIA TEMÁTICA CONCEITOS E TEORIAS Amado, João da Silva (2001) Interação Pedagógica e Indisciplina na Aula, Porto:Asa Organização Mundial de Saúde. (2005). Violence prevention - An important element of health-promoting school. WHO information séries on School Health- Document three. Geneva: UNESCO. Disponível em: http://www.who.int/school_youth_health/media/en/sch_violence_prevention_en.pdf Sebastião, J. (2013) Violência na escola, processos de socialização e formas de regulação. Sociologia, Problemas e Práticas. 71:23-37. Disponível em: http://www.scielo.gpeari.mctes.pt/pdf/spp/n71/n71a02.pdf Sebastião, J., Campos, J. e Merlini, S. (2012) As duas margens do rio: contrastes urbanos e regulação da violência na escola. Interseções. 14(1):127-164. Disponível em: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/intersecoes/article/view/5772/4192 Sebastião, João (org.) (2011) Violência na Escola. 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