O USO DE GÊNEROS DO DISCURSO EM LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA
PORTUGUESA (LDP)
BERNARDES, Janima 1
FABIANO, Sulemi 2
RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo verificar a abordagem feita a cerca
da produção textual em livros didáticos de Língua Portuguesa das décadas de 1970 e
2000, com o propósito de responder a seguinte pergunta de pesquisa: quais foram às
mudanças com relação ao ensino de escrita nos livros didáticos de português (LDP) a
partir da publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), 1996? A pesquisa
fundamentou-se nos conceito de gênero do discurso de M. Bakhtin (2000), sobre a
linguagem, sujeito, discurso, compreensão responsiva ativa e gêneros discursivos a fim
de analisar como os LDP abordam as propostas de escrita, considerando a relevância da
especificidade do trabalho de escrita de Riolfi (2003); e a proposta do PCN (1996).
PALAVRAS-CHAVE: livro didático; produção textual; gêneros do discurso
INTRODUÇÃO
Nesta pesquisa, demonstraremos como as propostas de escrita são
apresentadas nos Livros Didáticos de Português (LDP) ao trabalhar o gênero textual
narração. Analisaremos a proposta textual anterior aos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN), 1996, e outra posterior a este documento, que tem por exigência de
que os textos devem ser trabalhados à base de gêneros orais ou escritos com base na
concepção sociointeracionista da linguagem em conformidade com a teoria dos gêneros
do discurso de Mikhail Bakhtin que objetiva possibilitar o diálogo e a interação verbal
ao oportunizar ao aluno um efetivo domínio da língua materna de forma concreta e
significativa. Verificaremos como os autores dos LD abordam o ensino da produção
textual antes e após a publicação do PCN, datados em 1996 para o processo de ensino e
aprendizagem de escrita em situações de ensino, e se as mudanças contribuem para uma
aprendizagem efetiva, significativa e contextualizada para que ocorra construção de
conhecimento. Para responder a pesquisa tomamos como objeto de análise o material
didático anterior a publicação do PCN Reflexão & Ação: Língua Portuguesa, de Marilda
Prates, 5ª série, Ed. Do Brasil S/A, São Paulo, 1984. Analisamos outro livro após a
publicação do PCN, Ponto de encontro: Língua portuguesa, dos autores HAILER,
Marco Antonio de Almeida, MASSONI, Maria Izabel, ARANHA, Solange 6 ano. São
Paulo: FTD, 2009. Manual do professor. (p. 184, 185).
OS GÊNEROS DO DISCURSO
O PCN (1996:21) nos orienta de que “todo texto se organiza dentro de um
determinado gênero (...). Os vários gêneros constituem formas relativamente estáveis de
1
Mestranda do PPgEL, Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, UFRN. Aluna da Pós-Graduação Lato
Senso em Linguística e Ensino de Língua Portuguesa – UFRN e integrante do GETED.
[email protected]
2
Orientadora Professora Doutora do Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em
Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Líder do Grupo de Pesquisa em
Estudos do Texto e do Discurso/GETED e integrante do e Grupo de Estudos e Pesquisa Produção Escrita
e Psicanálise – GEPPEP/USP. [email protected]
enunciados, que são caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo, e
construção composicional.” É em Bakhtin (2010:261) que encontramos esta
conceitualização: “os enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de
cada referido campo não só pelo seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem,
mas acima de tudo, por sua construção composicional”.
Cada enunciado é individual, mas cada campo de utilização da língua
elabora seus “tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos
gêneros do discurso”. (BAKHTIN, 2010: 262).
Os gêneros do discurso impõem condições, segundo Bakhtin (2000:301)
pode-se dizer que há um querer-dizer do locutor que se adapta a uma determinada
“especificidade de uma dada esfera de comunicação verbal” e esse quere dizer se
realiza a partir do intuito discursivo do locutor, ou seja, “à individualidade e à sua
subjetividade” e sem esses elementos não há textos.
Desta forma, percebemos um descompasso nos matérias didáticos
elaborados a partir da exigência do PCN, no trabalho com o texto em sala de aula, no
qual ainda persiste o modelo de produção para o aluno seguir, sem, contudo despertar
no aluno, de que escrever é adotar seu estilo próprio, que saiba reconhecer diferentes
tipos de texto e escolher o apropriado aos seus objetivos, num contexto de produção. E
que ainda seja capaz de refletir sobre seu escrito, e alterá-lo se necessário, para atender
seus propósitos.
Uma vez que os materiais em análise propõem um trabalho com a escrita de
forma artificial, descontextualizada, por meio de ato isolado de escrita, como uma
moldura, certamente, não estará trabalhando o texto com base nos gêneros, pois em um
texto há sempre uma pergunta ativa que provoca uma resposta a um enunciado, ou seja,
a linguagem é dialógica e responsiva, ativa por natureza.
DESCRIÇÃO DOS
FUNDAMENTAL
DADOS
ANALISADOS
NO
LDP
DO
ENSINO
Dado 1
Analisamos Reflexão & Ação: Língua Portuguesa, de Marilda Prates, 5ª
série, Ed. Do Brasil S/A, São Paulo, 1984. Este livro é composto por 12 capítulos e
todos contém a mesma estrutura. Decidimos aqui devido á semelhança dos capítulos
analisar somente o capítulo 5, cujo título do texto é Professora, Eu Não Consigo
Entender... (p.73). Fonte: Estudos Sociais. Uma proposta para o Professor - Equipe
RENOV.Vozes, p. 21 a 23. O foco da pesquisa é a análise da produção textual, mas
anteriormente ao trabalho de escrita, há a leitura do texto, em seguida, o trabalho de
interpretação textual, logo após, o estudo gramatical, e por último a atividade de
produção textual no qual detemos nossa análise. Logo abaixo transcrevemos a primeira
proposta sugerida para o trabalho de escrita do livro didático de português em análise.
Reflexão & Ação: Língua Portuguesa, de Marilda Prates, 5ª série, Ed. Do Brasil S/A, São Paulo, 1984
Observamos nesta proposta de escrita que a autora do LD em análise tem
preocupação com a estrutura formal da língua, isto é, apresenta um esquema de narração
conduzida, com começo, meio e fim e ainda apresenta uma observação contendo a
seguinte mensagem: não esqueça de usar os parágrafos e a pontuação corretamente, ou
seja, desenvolva seu texto seguindo a moldura da proposta no qual no primeiro
parágrafo (COMEÇO) desenvolva a idéia apresentada: Seu pai soube que você foi posta
para fora da classe. Na sequência da moldura a autora sugere a idéia que deve ser
desenvolvida no segundo parágrafo, no qual intitula (MEIO), Ao vê-la: ficou nervoso,
gritou, deixou você de castigo?; ou dialogou com você?, e por último, a conclusão do
texto intitulada (FIM), Da próxima vez você procurará ser diferente em sala de aula, ou
agirá da mesma forma?Além da proposta de escrita estar relacionada com o assunto do
texto trabalhado anteriormente, apresenta uma exposição de esquema para a produção
da narração com (início, meio e fim), e ainda propõem três sugestões de títulos: Fazer o
quê? Aquele diálogo! Aquela bronca! para que o aluno opte por um deles, para compor
seu texto. Desse modo, certamente o aluno ficará preso ao texto original e ao escrever,
torna-se um sujeito passivo, que obedece ao modelo de escrita, uma moldura, proposta
que se diferencia e muito, do enunciado da atividade: Na expressão criativa, que em
momento algum, o aluno tem liberdade para construir textos criativos.
Neste sentido, percebemos que a proposta do ensino da escrita no LDP em
análise do período de 1984, entendida como modelo de escrita, contribui para a ausência
de singularidade, uma vez que o sujeito se constitui num processo histórico, e isto o
torna singular, ou seja, poder se expressar de um lugar que ninguém ocupa no mundo da
vida, e é deste lugar que avalia os fatos do mundo, ou seja, vê a partir das suas crenças,
de seu olhar, um sujeito que ao se expor, expressa sua ideologia, e isto não são
enfatizadas nas propostas de escrita para que produza a partir da sua individualidade, e
subjetividade.
A abordagem bakhtiniana concebe o sujeito como histórico, datado,
concreto, marcado por uma cultura, como criadores de idéias e portadores de
consciência, que ao produzirem e reproduzirem a realidade social são ao mesmo tempo
produzidos e reproduzidos por ela. Um sujeito singular é um sujeito posicionado, um
sujeito que responde pelos seus atos, pelas situações, um sujeito ideológico, redator de
seu próprio texto, que apresenta um ato responsável e ético, que cria seu estilo como
apresenta Bakhtin (2010:262) estilos de gênero de determinadas esferas da atividade
humana e de comunicação. Em cada campo existem e são empregados gêneros que
correspondem às condições específicas de dado campo; é a esses gêneros que
correspondem determinados estilos.
Dado 2
O material de análise de 2000 é o livro Ponto de encontro: língua
portuguesa, dos autores HAILER, Marco Antonio de Almeida, MASSONI, Maria
Izabel, ARANHA, Solange, 6 ano. São Paulo: FTD, 2009. Manual do professor. Está
estruturado em 7 unidades. Entretanto, visando êxito no tema abordado, faremos um
estudo da unidade 5 da página 184 e 185 da sessão intitulada Você, autor no qual a
unidade propõe para o trabalho com a escrita a narrativa: desfecho. Veja no exemplo
abaixo.
(Ponto de encontro: língua portuguesa, 6 ano.Marco Antonio Hailer, Maria Izabel Massoni, Solange Aranha - São
Paulo: FTD, 2009).
Ao fazer a análise do livro Ponto de encontro: língua portuguesa
percebemos que ele também possui a mesma estrutura dos capítulos do livro didático da
década de 70, analisado anteriormente. Visando êxito na proposta de escrita que deve
ser com base na publicação do PCN datados em 1996, de que os textos devem ser
trabalhados em sala de aula com base na concepção de linguagem sociointeracionista
em conformidade com os gêneros do discurso proposto por Bakhtin (2000) para além da
forma, “tornando-se a linguagem como atividade discursiva, o texto como unidade de
ensino”. (PCN, 1996).
Percebemos que este material não difere da proposta da década de 70, uma
vez que não ocorreram mudanças na proposta de escrita após a exigência do PCN, ao
ensino de língua materna, visando o texto como objeto central do ensino (que o aluno
aprenda a produzir e interpretar textos); a questão dos gêneros, e o desenvolvimento da
competência discursivo-textual: produção/leitura. Percebemos que o livro em análise,
do ano 2009, ainda fica preso a esquema para o aluno seguir, apresenta uma moldura de
escrita. A proposta de produção textual sugerida pelos autores para o trabalho de escrita
não ultrapassa a forma, ou seja, apresentam modelos de escrita para o aluno seguir,
desta maneira, não há estímulo e nem construção de conhecimento, porque as idéias são
impostas e o aluno não necessita refletir para escrever. Uma vez que ao escrever o aluno
expõe a sua individualidade, e seu estilo, o trabalho com o gênero não é abordado, para
Bakhtin (2010: 262) “tanto os estilos individuais quanto os da língua satisfazem aos
gêneros do discurso”.
Na proposta de escrita apresentada através de esquema, os autores sugerem
até mesmo o título “Um certo ladrão” e em seguida, a introdução do texto “Conheci um
ladrão que, depois de ter sido encontrado numa garagem, fugiu pela janela e correu até
não agüentar mais de cansaço. Então, dormiu profundamente, acordando sozinho”.
Percebemos que há toda uma preocupação com o aspecto formal da língua, a escrita
baseada em moldura, quando os autores encaminham a produção da história através do
esquema apresentado por setas (em cores diferentes) sendo que, a cada escolha, a
história se encaminha para um novo conflito e desfecho para a narrativa, desta forma o
aluno não precisa pensar sobre o que escrever e como. Apenas no desfecho do texto, o
aluno poderá construir o final da narrativa, mas como tudo foi “dado” anteriormente,
para o desenvolvimento do texto, certamente, não conseguirá produzir a partir da sua
individualidade, ficará preso as idéias apresentadas anteriormente. Ou seja, sua
individualidade não é valorizada, e o “aluno faz apenas redação para a escola, seguindo
determinados moldes”. (GERALDI, 2006:24). No qual o professor certamente irá ser o
único leitor do texto pelo fato da proposta de escrita não abordar as condições de
produção e nem a circulação do texto.
A maneira como o texto é trabalhado na escola, depende muito das
concepções que o professor têm de língua e de sujeito. É fato que a concepção de língua
abordada nos dois livros didáticos em análise, o texto é visto como produto, cabendo ao
leitor/ouvinte, exercer um papel passivo sobre a língua. O texto não perpassa a
concepção de língua, como mero instrumento de comunicação, bastando apenas o
conhecimento explícito das informações do texto, e a fixação do modelo de escrita, no
qual o aluno certamente terá o papel do “decodificador” de forma passivamente.
Se o professor tiver uma boa formação certamente irá interferir para que a
atividade seja concreta, que o aluno escreva de algum lugar e para algum propósito, e
que seu texto tenha uma divulgação, e não apenas para o professor como único leitor.
Nesta atividade de produção escrita os autores também não apresentam a proposta de
reescrita, tendo o texto como produto pronto, acabado.
É preciso, pois – como defende Koch (2002: 2) “pensar o texto como lugar
de constituição e de interação de sujeitos sociais [...] ações por meio das quais se
constroem interativamente os objetos-de-discurso e as múltiplas propostas de sentido de
um texto”. Ou seja, o objetivo da escola é levar o aluno a uma reflexão sobre como se
produzem sentidos na interação, e por intermédio dos textos.
A escrita tem que ter uma funcionalidade e uma finalidade, pois não ocorre
construção do conhecimento em situações artificiais. Desta forma, pode-se afirmar que
conceito do gênero do discurso não é abordado no LDP para o trabalho com a escrita,
uma vez que trabalhar com gêneros do discurso é ir além da forma, “implica considerar
fatores externos à língua, o seu exterior, para entender o que nela é dito, que por si só
seria insuficiente”. (KOCH, 2002:4). Apresentar modelos/esquemas para que a
produção de texto impede/limita o aluno a ser criativo e poder escrever com suas
próprias palavras.
A ESCRITA DEVE SER CONCRETA E SIGNIFICATIVA
O trabalho de escrita defendido por Riolfi (2003: 48), demanda do sujeito a
capacidade de reler-se, calcular efeitos de sentido e, a partir disto, operar sobre aquilo
que escreve. Ou seja, poder com seu estilo, transformar seu escrito quando necessário.
Desta forma, teremos um sujeito singular, que é responsivo pelos seus atos.
Escrever, reescrever e transformar o escrito é uma etapa do trabalho de
escrita, podemos pensar em analogia do processo de escrita com a gravidez, uma vez
que a escrita acontece em etapas, e o mesmo condiz com o corpo de uma mulher
grávida - a sua própria gestação, no qual a barriga vai crescendo, se transformando em
cada etapa da gravidez, que tem duração de nove meses, ou seja, um processo que só se
encerra depois de longas etapas, cada uma com suas particularidades exemplo:
formação do feto.
Nas
etapas
da
“gestação”
ocorre
em
cada
período
a
transformação/crescimento na barriga da gestante; e o “processo de escrita” também
ocorre gradativamente, sendo que ambas estão em constante processo de mudanças,
num continuum. Escrever requer um trabalho também por etapas em que o texto vai se
modificando, de um simples rascunho, acrescentamos outras informações, lemos o
texto, modificamos sempre que necessário, podemos talvez retirar algumas informações
e acrescentar outras. Talvez ficamos perturbados e inseguros com a escrita, porque
podemos pensar que o fato de que escrevemos e como escrevemos possa causar algum
incômodo no leitor, então, modificamos quantas vezes forem necessárias, até
simpatizarmos com o escrito, e interagirmos como outro. A escrita está em constante
processo de construção, não deve ser vista como nos materiais didáticos em análise (um
produto pronto, acabado), mas que por etapas o aluno possa construir seu próprio texto
gradativamente.
Estas etapas de escrita devem ser abordadas na escola, uma vez que o aluno
só aprende escrever, escrevendo, e como os LDP não propõem atividades de escrita de
forma criativa e instigante para o aluno poder produzir texto em etapas, poder escrever
suas próprias palavras, criar seu estilo, e poder ser leitor e crítico de seu próprio texto,
cabe ao professor não seguir o LDP como uma verdade absoluta, mas interferir nas
propostas de escrita e criar condições para os alunos poderem expor suas próprias
idéias, seu conhecimento de mundo, uma vez eu a função do professor é “convidar o
aluno para a prática da escrita e proporcionar que a escrita trabalhe o sujeito, podendo
vir a alterar sua relação com sua palavra, sua história, sua vida.” (RIOLFI, 2003:50).
É necessária, em sala de aula, uma relação dialógica entre professor e aluno,
para que as etapas de escrita ocorram, uma vez que o professor deverá oportunizar ao
aluno a escrever, reescrever, ser leitor e crítico de seu próprio texto. Escrever não é
tarefa fácil, requer persistência e dedicação, escrever em etapas o aluno poderá através
de a escrita operar sobre a linguagem de modo singular, ter coragem de expor suas
idéias, suas crenças, etc. Ou seja, através da escrita individual e singular, permito que o
outro conheça sobre o que penso ou como ajo em determinada situação ou sobre certo
assunto porque há sempre a necessidade de escrever para algum propósito.
Enfim, escrever de modo singular significa criar seu próprio estilo, ser
individual, criativo, sendo o eu de seu próprio texto sem ter que seguir uma regra
canônica, ou seja, escrever é produzir textos e acima de tudo, se responsabilizar pelo seu
escrito e retroagir sobre o que escreve.
CONSIDERAÇÔES FINAIS
De acordo com a análise dos dois LDP percebemos que não ocorreram
mudanças significativas nas propostas de produção escrita, antes e após a publicação
dos PCN que exige que os textos devam ser trabalhados com base nos gêneros do
discurso proposto por Bakhtin. As propostas de produção textual dos dois livros em
análise enfatizam uma moldura para a escrita. Atividade de escrita baseada em
roteiro/esquema para produção, não contribui para que o aluno possa ter a escrita como
atividade concreta e efetiva, desta forma, não há construção de conhecimento.
Devido o descompasso existente entre os objetivos dos Parâmetros
Curriculares Nacionais - PCN (1996) para o ensino de escrita na escola, que é “formar
leitores e escritores competentes, capazes de ler e produzir textos coerentes, coesos e
eficazes”. (BRASIL, 2000:65), esta investigação demonstra que o livro didático
publicado após o PCN, não atende a proposta de que os textos devem ser trabalhados
com base nos gêneros do discurso proposto por Bakhtin (2000). Para efeitos de
aprendizagem, nota-se que o LDP fica a desejar ao abordar a proposta de escrita como
processo interacional, pois o aluno não é estimulado a escrever suas palavras, com seu
estilo, apenas ficam preso as informações dadas no texto, e a consequência é a
incapacidade de ler e escrever textos.
Fabiano (2011) aponta que “a utilização de modelos, castra a criatividade de
uma escrita que tem por base a singularidade”. Porém, somente a utilização de modelos
invalida a possibilidade de o aluno construir textos que contribuem a partir de sua
individualidade, à sua subjetividade às condições de situações concretas de escrita.
Segundo Riolfi (2003:50) “escrever é trabalhar com a linguagem de
diferentes formas, e até mesmo se surpreender com o escrito”, escrita é trabalho.
Apresentar modelo incapacita o aluno ao escrever e operar sobre a linguagem de modo
singular e que possa ser leitor e crítico de seu próprio texto, podendo alterá-lo e adaptálo a novos contextos, e que tenha a atividade de escrita como algo relevante em sua
vida. ( RIOLFI, 2003:47).
Podemos afirmar que no LDP após a publicação do PCN (1996) não há
perspectiva dialógica interativa, uma vez que o texto é apresentado apenas como
pretexto para análise gramatical e modelo para a produção textual, desta forma, pode-se
dizer que a presença da teoria do gênero no trabalho com a escrita, não tem sido
abordado, pois nas propostas de produção textual não envolvem a teoria do discurso,
uma vez que os exercícios propostos não exercitam a criatividade do aluno, pois o
induzem a repetir uma história narrativa usada implicitamente como uma moldura de
escrita.
Desta forma, o aluno não é estimulado a produzir um texto a partir de suas
próprias experiências, acaba elaborando redação para a escola, como aponta Geraldi
(2003) no livro Portos de Passagem; redação se difere de produção textual, no qual o
aluno poderá com seu estilo, trabalhar com as palavras, construir seu texto de forma
criativa e concreta, sem precisar ficar preso a molduras.
A escrita tem que ter uma funcionalidade, e uma finalidade, pois não ocorre
construção do conhecimento em situações artificiais como as propostas de escrita
apresentadas nos dois materiais em análise. Atividades de produção textual baseada em
modelos têm por base a concepção de linguagem como representação do pensamento.
(GERALDI, 2006:41). Nesta primeira concepção da língua “as pessoas não se
expressam bem porque não pensam” (TRAVAGLIA, 1999:21). “Essa concepção
ilumina, basicamente, os estudos tradicionais, as pessoas não conseguem se expressar
não pensam”. (GERALDI, 2006:41).
Como o LDP muitas vezes é o único material de suporte em sala de aula,
cabe ao professor mediar as propostas de escrita de forma diferente, para que atenda o
documento do PCN no trabalho de escrita e que possa contribuir e criar condições para
que o aluno possa aprender a escrever textos na escola, de forma concreta e efetiva, pois
só assim, ele poderá ter a escrita com algo relevante em sua vida.
As propostas de escrita apresentadas nos dois exemplos analisados são
artificiais, descontextualizadas do uso real da língua, que deve ser de forma concreta e
significativa. Portanto, mais do que ensinar os elementos e as normas que compõem a Língua
Portuguesa, precisamos ensinar as Práticas de Linguagem que vivenciamos no dia-a-dia.
Devemos formar praticantes da leitura e da escrita e não apenas sujeitos que possam decifrar o
sistema de escrita.
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PRATES, Marilda. Reflexão & Ação: Língua Portuguesa, 5ª série, Ed. Do Brasil S/A,
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RIOLFI, Cláudia. Ensinar a escrever: considerações sobre a especificidade do trabalho
de escrita. Leitura: Teoria & Prática. Revista da Associação de Leitura do Brasil,
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TRAVAGLIA, L. C. Gramática e Interação. Editora Contexto, 1999.
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