PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
20ª Vara Federal
Processo nº 0000976-33.2009.4.05.8304
Autor: Ministério Público Federal
Réu: Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti e outros.
SENTENÇA (TIPO A) N.º
Ementa: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONSTRUÇÃO DA
CASA DE PARTO NO MUNICÍPIO DE VERDEJANTE-PE. FISCALIZAÇÃO. CONSTATAÇÃO DE
IRREGULARIDADES. INOBSERVÂNCIA DE DISPOSIÇÕES DA LEI Nº 8.666/93.
COMPROVAÇÃO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO.
Vistos, etc.
I. Relatório
Trata-se de ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público
Federal em face de Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, Francisco Alves
Tavares de Sá, Manoel Veiga de Lira Filho e Oscar Amorim Neto.
Aduz o autor que, em virtude das informações provenientes da Auditoria nº 2723 do
Sistema de Auditoria do SUS e do Inquérito Policial nº 362/2005-DPF/SGO/PE, instaurou os
Procedimentos Administrativos nº 1.26.004.000005/2007-15 e nº 1.05.000.000175/200689, os quais constataram, respectivamente, irregularidades na execução do Convênio n.º
373/00 - firmado entre o Ministério da Saúde e a Secretaria de Saúde de Pernambuco,
com repasse de verbas para o Município de Verdejante -, bem como o desvio de recursos
federais destinados à implementação do PSF em Verdejante-PE.
O convênio n.º 373/00 tinha por objeto o fortalecimento do SUS, e destinou recursos
da ordem de R$ 152.749,64 (cento e cinqüenta e dois mil, setecentos e quarenta e nove
reais e sessenta e quatro centavos) para a reforma e ampliação da Unidade de Verdejante
para a construção de uma casa de parto.
Elencou o autor as irregularidades constatadas na construção da casa de parto: a)
confecção de procuração para que o prefeito de Verdejante recebesse os valores da
medição final da obra; b) execução do sistema de aterramento da obra em desacordo com
as normas da ABNT e especificações técnicas constantes nas planilhas de medições; c) a
contratação da empresa Pirâmide Engenharia sem observância das exigências legais
pertinentes.
Quanto ao desvio de recursos das verbas destinadas ao PSF, alegou irregularidades na
contratação de profissionais da área de saúde.
O Ministério Público Federal requereu liminarmente a indisponibilidade dos bens do
patrimônio dos réus Guilherme José Robalinho de Oliveira, então Secretário Estadual de
Saúde, e Francisco Alves Tavares de Sá, prefeito de Verdejante-PE à época, em valor
correspondente ao suposto prejuízo sofrido pelo erário, R$ 152.749,64 (cento e cinqüenta
e dois mil, setecentos e quarenta e nove reais e sessenta e quatro centavos).
Ao fim, pleiteou a condenação dos demandados na perda da função pública, suspensão
dos direitos políticos, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, pagamento de multa civil, e ressarcimento integral do
dano (sanção requerida somente em relação a Guilherme José Robalinho de Oliveira e
Francisco Alves Tavares de Sá).
Juntou documentos (f. 36/897).
Decisão às fls. 900/908, deferindo o pedido liminar de indisponibilidade dos bens de
todos os demandados.
As constrições foram levadas a efeito nos autos (fls. 911/915, 944/953, 996/1.000, e
1.004/1.013)
Notificado através de seu procurador (fls. 942), o demandado Manoel Veiga de Lira
Filho apresentou embargos de declaração (fls. 956/974), requerendo a delimitação da
conduta a ele atribuída no presente feito, bem como pugnando pela responsabilização do
engenheiro Antônio costa Macedo, sendo tais embargos rejeitados por meio da decisão de
fls. 990/993.
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti alegou na sua defesa preliminar (fls.
1063/1084), em síntese, infringência ao princípio do devido processo legal, o escoamento
do prazo prescricional para a propositura da ação, ausência de prejuízos ao erário e de
atos de improbidade.
Às fls. 1.089/1.090, consta decisão proferida no mandado de segurança impetrado por
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, no sentido de autorizar a obtenção de
cópias integrais dos autos.
Às fls. 1.143/1.150, decisão proferida no agravo de instrumento interposto por
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, atribuindo efeito suspensivo a decisão
que deferiu a indisponibilidade dos seus bens.
Manoel Veiga de Lira Filho apresentou defesa preliminar às fls. 1.256/1.280, ocasião
em que argüiu, resumidamente, ofensa ao princípio do devido processo legal, contradição
na imputação do fato delituoso, ilegitimidade passiva e não caracterização de ato de
improbidade administrativa.
O agravo de instrumento interposto por Manoel Veiga de Lira Filho em face da decisão
que tornou indisponível seus bens teve seu prosseguimento negado por intempestividade
(fls. 1.400).
Oscar Amorim neto foi notificado às fls. 1466v, e apresentou defesa preliminar às fls.
1469/1480, suscitando, em suma, os mesmos argumentos de José Robalinho de Oliveira.
O demandado Francisco Alves Tavares de Sá não apresentou defesa preliminar (fls.
1485).
Acerca das defesas preliminares o Ministério Público Federal manifestou-se às fls.
1495/1505, ocasião em que reconheceu, relativamente ao demandado Guilherme José
Robalinho de Oliveira Cavalcanti, a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva por
atos de improbidade administrativa, alegando, a outro giro, ser imprescritível o respectivo
ressarcimento do dano ao erário.
No mesmo petitório reafirmou o autor a existência do dano, bem como de todas as
irregularidades apontadas em sua peça exordial.
O Ministério Público Federal, às fls. 1524/156, aduziu a não ocorrência da prescrição da
ação por atos de improbidade em relação ao demandado Oscar Amorim Neto e, às fls.
1570/1571, a ocorrência de prescrição em relação a Manoel Veiga de Lira Filho.
Decisão às fls. 1579/1585, recebendo a petição inicial, reconhecendo a prescrição da
pretensão punitiva por atos de improbidade em relação a Guilherme José Robalinho de
Oliveira Cavalcanti, e determinando o prosseguimento do feito, mediante a citação dos
réus.
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti apresentou contestação às fls.
1629/1644. Alegou, em suma, a ausência de prejuízos ao erário e a inexistência de atos de
improbidade.
Instado a manifestar, o Estado de Pernambuco manifestou o seu desinteresse em
integrar a lide (fls. 1646/1648).
Às fls. 1656/1670 Francisco Alves Tavares de Sá alegou, em contestação, não ter
praticado irregularidades, bem como não existir dolo na sua conduta.
Oscar Amorim Neto, às fls. 1.675/1.686, contestou no sentido de não restar
configurado prejuízo ao erário e de inexistir atos de improbidade.
Às fls. 1.748, decisão convertendo em retido o agravo de instrumento interposto por
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti contra a decisão que recebeu a petição
inicial.
Manoel Veiga de Lira Filho apresentou contestação às fls.1761/1773, oportunidade em
que, além de pugnar pela liberação dos valores bloqueados em sua conta bancária, argüiu
a ausência de prejuízos ao erário e a inexistência de atos de improbidade.
Manifestação do Ministério público Federal às fls. 1787/1801, pugnando pela
condenação dos demandados Francisco Alves Tavares de Sá, Oscar Amorim Neto e Manoel
Veiga de Lira Filho às penas do art. 10 e 11 da Lei8.429/92, bem como pela remessa de
cópia dos autos à AGU, para promoção de ação de ressarcimento ao erário em face de
Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti.
Devidamente intimadas, nenhuma das partes demonstrou interesse na produção de
provas.
A União e o Município de Verdejante, devidamente intimados, manifestaram
desinteresse em integrar a lide (fls. 1817/1820 e 1.836).
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório do essencial. Decido.
II. Fundamentação
II.I. Preliminares
A preliminar de mérito relativa à prescrição da ação, suscitada pelo réu Guilherme José
Robalinho de Oliveira Cavalcanti, já foi devidamente apreciada pelo Juízo às fls.
1579/1585.
Dessa forma, ratifico a referida decisão, remetendo-me à fundamentação nela
expendida, para acolher a aludida preliminar em relação a Guilherme José Robalinho de
Oliveira Cavalcanti, especificamente quanto aos atos de improbidade que lhes são
imputados, cujos pedidos decorrentes são os de perda da função pública, suspensão dos
direitos políticos, pagamento de multa civil, e proibição de contratar com o Poder Público
ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais.
Contudo, em relação ao referido réu, a ação será apreciada no que concerne ao pedido
de ressarcimento ao erário, haja vista a imprescritibilidade de tal pleito, nos termos do art.
37, parágrafos 4º e 5º, da Constituição Federal.
Quanto aos demais réus, não sendo configurada nenhuma hipótese de prescrição,
consoante fundamentado na mencionada decisão de fls. 1579/1585, prosseguirá
normalmente a análise de mérito, na conformidade dos pedidos manejados pelo autor em
sua peça vestibular.
II.II. Mérito
II.II.I. Considerações Iniciais.
O cerne da presente lide reside em saber se as condutas dos réus Francisco Alves Tavares
de Sá, Oscar Amorim Neto e Manoel Veiga de Lira Filho configuram ato de improbidade
administrativa, a merecer as reprimendas contidas na Lei nº 8.429/92.
No caso específico do réu Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, conforme
pontuado no ponto anterior, a análise buscará concluir se suas condutas causaram, ou
não, dano ao erário.
A Lei n.º 8.429/92 prevê sanções em virtude da prática de atos de improbidade
administrativa, assim considerados aqueles que importem em enriquecimento ilícito (art.
9º), causem lesão ao erário (art. 10) ou que violem os princípios da Administração Pública
(art. 11).
Fixou um novo paradigma de gestão pública, baseado na probidade, eficiência e no
uso racional dos bens e recursos públicos.
Sua matriz é constitucional, conforme prevê o art. 37, §4º, da Constituição Federal:
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao
erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
É certo que a ação de improbidade administrativa tem natureza cível, não penal.
Contudo, não deixa de possuir caráter penalizador, por se destinar, essencialmente, à
aplicação das sanções cominadas no art. 12 da Lei n.º 8.429/92.
Assim, aos atos de improbidade e às respectivas ações aplicam-se, no que couber, os
princípios do Direito Penal e do Direito Processual Penal.
Neste aspecto, a eventual configuração do ato de improbidade dependerá da
existência de conduta dolosa ou culposa por parte do agente, ou seja, não é possível a
atribuição de responsabilidade objetiva.
Como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, "para que se configure a conduta de
improbidade administrativa, é necessária a perquirição do elemento volitivo do agente
público e de terceiros (dolo ou culpa), não sendo suficiente, para tanto, a irregularidade ou
a ilegalidade do ato. Isso porque 'não se pode confundir ilegalidade com improbidade. A
improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do
agente.' (REsp n. 827.445-SP, relator para acórdão Ministro Teori Zavascki, DJE 8/3/2010)."
(STJ/1ª Turma - MC 17112 - DJE DATA: 28/09/2010)
Com essas considerações iniciais, que reputo relevantes, passo ao exame do caso.
II.II.II. Da condição de agente público ou terceiro dos réus Francisco Alves Tavares de Sá,
Oscar Amorim Neto e Manoel Veiga de Lira Filho e da competência para processar e julgar
a ação
Insta verificar, no presente tópico, se os réus Francisco Alves Tavares de Sá, Oscar Amorim
Neto e Manoel Veiga de Lira Filho se subsumem ao conceito de agente público fixado pela
Lei n.º 8.429/92, ou se enquadram na condição de terceiro, nos termos do art. 3º de tal
diploma e, ainda, se o ilícito foi praticado contra pessoa prevista no art. 1.º da norma
mencionada.
Essa demonstração possibilitará a sustentação lógica de que as condutas antijurídicas em
tela são passíveis de incidência das sanções previstas na Lei n.º 8.429/92.
Em relação à condição de agente público dos demandados em questão, necessário trazer
à presente colação a dicção dos arts. 2º e 3º da Lei n.º 8.429/92:
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda
que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego
ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não
sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se
beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
O art. 1º do mesmo diploma legal, por sua vez, dispõe:
Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não,
contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao
patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou
concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão
punidos na forma desta lei.
No caso, pelas alegações e documentos juntados pelas partes, resta inequívoco que os
réus FRANCISCO ALVES TAVARES DE SÁ (então Prefeito do Município de Verdejante),
OSCAR AMORIM NETO (enquanto de Gerente de Engenharia e Arquitetura da Secretaria
de Saúde do Estado de Pernambuco - Ato nº 1537/1999) e MANOEL VEIGA DE LIRA FILHO
(então integrante da comissão que recebeu a Casa de Parto de Verdejante - fls. 1575)
possuem a condição de agente público, estando, portanto, sujeitos à aplicabilidade da Lei
n.º 8.429/92.
De outro lado, as condutas praticadas pelos réus do presente feito, e aqui se inclua o
demandado Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, foram praticadas em
suposto prejuízo de ente e órgão da administração indireta, relacionados no art. 1º do
citado diploma legal.
A definição da competência da Justiça Federal está prevista no art. 109, I, da Constituição
Federal, diante do interesse federal na apuração dos fatos, em se tratando de supostas
irregularidades na aplicação de recursos públicos federais, firmando-se este juízo como o
foro competente para processar e julgar a demanda em razão do local do dano.
O fato de o réu Francisco Alves Tavares de Sá ter praticado a conduta questionada na
condição de Prefeito em nada repercute na definição da competência.
Neste ponto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não tem levado em
consideração a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Rcl. 2.138-DF, pelas
seguintes razões: 1) inexiste incompatibilidade entre as sanções penais contidas no
Decreto-lei n.º 201/67 e na Lei n.º 8.429/92; 2) a decisão proferida na Rcl 2.138 não tem
eficácia erga omnes, nem efeito vinculante; e 3) ainda não houve pronunciamento daquela
Corte, quanto aos prefeitos, haja vista que teria examinado ato de Ministro de Estado,
competência do STF (STJ/1ª Turma - RESP 1066772 - DJE 03/09/2009).
Destarte, indubitavelmente os atos supostamente praticados pelos réus estão sujeitos ao
controle fixado pela Lei n.º 8.429/92.
II.II.III. Dos Atos de improbidade imputados aos réus e sua prova
As condutas imputadas aos réus pelo autor em virtude do procedimento administrativo
n.º 1.26.004.000005/2007-15 fundamentaram-se, principalmente, na Auditoria n.º 2723
do Sistema de Auditoria do SUS.
Deste Procedimento Administrativo o Ministério Público elencou como irregularidades:
a) a violação aos preceitos legais contidos na Lei 8.666/93, especificamente em relação ao
abandono da obra pela empresa vencedora, bem como a confecção de procuração ao
prefeito de Verdejante-PE para recebimento do pagamento da parcela final da obra; b) a
execução do sistema de aterramento da obra em desacordo com as normas da ABNT e
especificações técnicas das planilhas de medições; c) contratação da empresa Ivanilson S.
Lima Ltda. com inobservância das exigências legais pertinentes.
De fato, restou comprovado nos autos o emprego de recursos do Ministério da Saúde
no Município de Verdejante/PE, provenientes do mencionado Convênio n.º 373/2000 (fls.
63/66 e 179/186), no importe de R$ 152.749,64 (cento e cinqüenta e dois mil, setecentos
e quarenta e nove reais).
Foi através do procedimento administrativo CPLS nº 038/2001 (Tomada de Preços nº
06/2001) que a Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco licitou, em 13/09/2001, a
construção da casa de parto de Verdejante-PE, certame que foi vencido pela Empresa de
Construção Dantas Ltda. - EMCODRIL. (fls. 62v).
Os termos do contrato celebrado com a empresa vencedora, além da precisa
delimitação do objeto, estabeleciam, dentre outros aspectos: a) o prazo de execução da
obra - 120 dias a contar da Ordem de Execução dos Serviços; b) a responsabilidade da
Diretoria Executiva de Engenharia e Arquitetura da Secretaria de Saúde, ou de terceiros
pela mesma credenciados, pela fiscalização e recebimento dos serviços contratados; c)
requisitos para a aceitação da obra e aplicação de penalidades (fls. 65/66).
Extrai-se dos autos (fls. 189) que em agosto de 2002, após o regular início dos serviços
(Ordem de Serviço expedida em 11/01/2002, fls. 75), a obra foi abandonada pela
EMCODRIL depois do pagamento da sexta (penúltima) medição (fls. 104 e 502), sob o
argumento de que a conclusão só seria viável mediante a aprovação de um aditivo
contratual de 24,5% do valor originalmente contratado, o que não foi viabilizado pela
Administração (fls. 188/189).
Observa-se no documento de fls. 188/189 que mesmo ante a alegada inviabilidade de
concluir o objeto do contrato, o diretor da empresa EMCODRIL, José Carlos Dantas, se
comprometeu, perante a fiscalização da obra, em concluir a obra, bem como a repassar os
valores referentes à sua medição final, mediante instrumento procuratório, a um terceiro
de sua confiança, ao qual caberia a quitação de débitos contraídos pela empresa em
função da obra em tela.
Ocorreu que apesar da obra não ter sido concluída pela EMCODRIL, a Secretaria de
Saúde de Pernambuco liberou para a mesma, em 02/12/2002, os valores referentes à
medição final dos serviços, da ordem de R$ 34.588,18 (fls. 227), os quais foram recebidos
pelo então prefeito de Verdejante-PE, Francisco Alves Tavares de Sá (fls. 897), com a
autorização da referida empresa.
No que diz respeito ao procedimento de liberação dos pagamentos da obra em
questão, informou o então gerente de Engenharia e Arquitetura da Secretaria de saúde do
Estado de Pernambuco, Oscar Amorim Neto, que as medições eram "feitas pela
contratada dos serviços efetivamente realizados e encaminhados à Engenharia para
análise e o atesto pela fiscalização, conferência dos cálculos pelo Chefe da Fiscalização e
visto do Diretor (a época) hoje Gerente e encaminhado à gerência Financeira para
pagamento da medição" (fls. 188/189).
No caso dos autos, após o pagamento irregular da medição final da obra, esta foi
recebida provisoriamente em janeiro de 2003, por uma comissão designada pela
Secretaria de Saúde de Pernambuco, integrada pelos réus Manoel Veiga e Oscar Amorim
Neto.
Segundo o Termo Provisório de Recebimento (fls. 75v), a obra encontrava-se "em
conformidade com os requisitos contratuais, no que concerne a elementos visíveis". Ao
final, todavia, restava registrado que "ficaram alguns serviços a serem definidos pela
Secretaria, tendo em vista a empresa EMCODRIL ter abandonado a obra".
Às fls. 231/233 consta um pagamento, na data 05/08/2004, no valor de R$42.134,23
em favor da empresa Ivanilson S. Lima Ltda. (Pirâmide Engenharia), com recursos
provenientes do Fundo Estadual de Saúde, pela conclusão das obras da casa de Parto de
Verdejante, cuja execução foi abandonada pela Empresa EMCODRIL.
Consta nos autos que jamais foram apresentados pela Gerência de Engenharia da
Secretaria de Saúde os documentos que comprovem a realização dos necessários
procedimentos legais exigidos para escolha e contratação da empresa Ivanilson S. Lima
Ltda., apesar de solicitado pelo Sistema de Auditoria do SUS em 16/05/2005 (fls. 42 e
168).
Em 01/12/2004 a obra foi definitivamente recebida da empresa Ivanilson S. Lima Ltda.
pela comissão designada, a qual registrou no termo de recebimento que a aludida
construtora "realizou todos os serviços definidos pela Secretaria Estadual de Saúde"
(fls.76).
No relatório de auditoria apresentado pelo SUS, datado de 08/03/2007, constatou-se,
dentre outras não conformidades de ordens administrativas e construtivas, que o sistema
de aterramento da obra não foi executado em conformidade com as normas da ABNT.
O baixo padrão da obra também foi apontado no referido relatório, bem como naquele
elaborado em virtude de auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco,
conforme consta no processo administrativo que tramitou perante o Tribunal de Contas da
União (fls. 103/105).
A petição inicial também relata, com base no Procedimento Administrativo n.º
1.05.000.000175/2006-89, bem assim nos documentos oriundos do Inquérito Policial
nº362/2005-DPF/SGO/PE, o desvio de recursos repassados pelo Ministério da saúde ao
Município de Verdejante-PE para a implementação do Programa de Saúde da Família-PSF.
Segundo a Portaria do Ministério da Saúde nº 648, de 28/03/2006, que estabelece as
diretrizes e normas para a organização do Programa de Saúde da Família, os repasses dos
recursos federais a serem empregados pelos municípios nos PSFs são efetuados em conta
aberta especificamente para essa finalidade, de acordo com a normatização geral de
transferências fundo a fundo do Ministério da Saúde.
Ainda conforme tal dispositivo normativo, compete às Secretarias Municipais de Saúde
assegurar o cumprimento de horário de todos os profissionais nas equipes de saúde da
família, de saúde bucal e de agentes comunitários de saúde, bem como realizar e manter
atualizado o cadastro dos respectivos profissionais nos Sistemas Nacionais de Informação
em Saúde definidos para esse fim.
Depreende-se dos autos que o Município de Verdejante-PE apresentou à Secretaria
Estadual de Saúde uma relação de profissionais de saúde que supostamente teria
contratado para integrar equipes dos PSFs na cidade (fls. 119), sendo que os mesmos
profissionais afirmaram, em depoimentos prestados perante a Polícia Federal, que jamais
trabalharam nas referidas unidades de saúde da família em Verdejante (fls. 426, 429,
430431 e 446).
Eis que num segundo momento, diante da divergência, o município apresentou nova
relação de funcionários que teriam trabalhado em seus PSFs, na qual não constava os
nomes dos profissionais que tinham sido ouvidos pela Polícia Federal (124/125).
Às fls. 673/674, porém, observa-se que no Sistema de Informação da Atenção Básica SIAB, alimentado pelos Estados com informações repassadas pelos respectivos municípios,
consta que os profissionais que prestaram depoimento perante a autoridade policial
trabalhavam em PSFs do município de Verdejante-PE.
Passemos, portanto, à análise das condutas supostamente perpetradas pelos
demandados.
(a) Inobservância dos preceitos legais contidos na lei nº 8.666/93 no que concerne ao
descumprimento contratual da empresa EMCODRIL e a confecção de procuração para que
o prefeito de Verdejante-PE recebesse o pagamento da parcela final da obra, mesmo
diante do descumprimento contratual.
Dos autos sabe-se que a empresa EMCODRIL paralisou a construção da casa de parto de
Verdejante-PE sob a justificativa de que seria impossível a conclusão dos serviços sem a
liberação de um aditivo financeiro no percentual de 24,5% do valor contratado (fls. 188), o
que não foi viabilizado pela Administração (fls. 189).
Nos termos §1º do art. 65 da Lei 8.666/93, observa-se que é possível, no caso de obras,
que os quantitativos contratados possam sofrer acréscimos de até 25%, desde que hajam
eventuais modificações no projeto ou nas suas especificações técnicas, ou modificações
quantitativas no objeto contratado:
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas
justificativas, nos seguintes casos:
I - unilateralmente pela Administração:
a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação
técnica aos seus objetivos;
b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou
diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei;
Daí que, não tendo sido aprovado o aditivo pleiteado pela empresa EMCODRIL, caberia
a esta cumprir rigorosamente o contrato que celebrou, entregando a obra rigorosamente
conforme o projeto básico que lhe foi fornecido por ocasião da licitação pública.
Diga-se de passagem, que o parecer favorável do então Gerente de Engenharia da
Secretaria de Saúde, Sr. Oscar Amorim Neto (fls. 188/189), ao pleito aditivo não
apresentou justificativas concretas e objetivas para os acréscimos sugeridos, restringindose a afirmar que eram devidos em virtude de "uma adequação para atender as exigências
das normas do Ministério da Saúde, como também melhorar o funcionamento da Unidade
de Saúde" (fls. 188).
Por outro lado, não há nos autos provas objetivas de que o objeto licitado tenha
sofrido modificações em seu projeto ou especificações, condições necessárias à alteração
contratual solicitada, mesmo porque os projetos básico e executivo em nenhum momento
foram apresentados, apesar de terem sido solicitados pela Auditoria dom SUS (fls. 42 e
168).
Com efeito, diante do desarrazoado abandono da obra, à Administração, aqui
representada pelos agentes públicos diretamente envolvidos, caberia o uso dos poderes
administrativos que detém para provocar a rescisão do contrato, bem como para a
aplicação as sanções cabíveis, nos termos da Lei 8.666/93, que sobre o tema dispõe:
Art. 77. A inexecução total ou parcial do contrato enseja a sua rescisão, com as
conseqüências contratuais e as previstas em lei ou regulamento.
Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato:
(...)
V - a paralisação da obra, do serviço ou do fornecimento, sem justa causa e prévia
comunicação à Administração;
Art. 79. A rescisão do contrato poderá ser:
I - determinada por ato unilateral e escrito da Administração, nos casos enumerados nos
incisos I a XII e XVII do artigo anterior;
Art. 80. A rescisão de que trata o inciso I do artigo anterior acarreta as seguintes
conseqüências, sem prejuízo das sanções previstas nesta Lei:
(...)
III - execução da garantia contratual, para ressarcimento da Administração, e dos valores
das multas e indenizações a ela devidos;
IV - retenção dos créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos causados à
Administração.
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a
prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a
Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública
enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a
reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida
sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após
decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
No caso dos autos, porém, não há sequer indícios de que o setor de engenharia da
Secretaria de Saúde tenha tomado as medidas necessárias à aplicação das sanções legais
cabíveis em relação à empresa EMCODRIL, mas, do contrário, há provas de que concorreu
para a liberação de recursos da última medição da obra, sem que a mesma tivesse sido
concluída.
O pagamento da referida parcela final, inclusive, foi recebido pelo então prefeito de
Verdejante-PE, Sr. Francisco Alves Tavares de Sá, com ciência por parte da Administração
(fls. 188/189 e 897).
Nos termos de recebimento definitivo e provisório da obra (fls. 75 e 76), firmados pelos
réus Manoel Veiga e Oscar Amorim Neto, nada de concreto foi registrado acerca das
irregularidades técnicas e administrativas acima verificadas.
Ora, sabe-se que na seara do Direito Administrativo os poderes administrativos são
prerrogativas concedidas à Administração Pública para a consecução do interesse público,
motivo pelo qual não pode o agente público renunciar à utilização de tais poderes.
Tal irrenunciabilidade, inclusive, leva a doutrina a denominar os poderes
administrativos de "deveres-poderes", eis que o poder subordina-se ao dever, e assim,
torna-se evidente a finalidade de tais prerrogativas e suas limitações.
Conclui-se, pois, que a não observância das prescrições contidas na Lei n.º 8.666/93
face o descumprimento contratual por parte da empresa EMCODRIL constitui ato de
improbidade, devendo ser atribuído àqueles réus que com suas condutas colaboraram
diretamente para tanto.
Logo, não há outra via senão reconhecer como ímprobas as condutas dos réus Manoel
Veiga de Lira Filho e Oscar Amorim Neto.
Integrante da comissão de recebimento da obra, o réu Manoel Veiga de Lira Filho não
poderia ter recebido a obra tal qual o fez, sobretudo de forma definitiva, dado que a
mesma encontrava-se inacabada e apresentando desconformidades em relação às normas
da ABNT.
A conduta perpetrada pelo citado engenheiro concorreu para o ensejo de perdas
patrimoniais ao erário público, na medida em que permitiu o pagamento da última parcela
de uma obra nitidamente inacabada.
Presentes, pois, os requisitos básicos para a responsabilização civil, a saber, a conduta
do autor, que concorreu inadvertidamente para o recebimento da obra, o nexo causal,
considerando que o recebimento provisório da obra possibilitou o pagamento da medição
final, e o dano, flagrante em virtude do pagamento final de uma obra inacabada.
Da mesma forma, Oscar Amorim Neto, ciente do descumprimento contratual pela
EMCODRIL, tinha, enquanto gerente de Engenharia da Secretaria de Saúde, o dever de
obstar o pagamento da medição final da obra, bem assim de provocar a aplicação das
sanções administrativas previstas pela Lei 8.666/93, dentre as quais a rescisão contratual e
a retenção de eventuais créditos da empresa faltante.
Destarte, também em relação a Oscar Amorim presentes os elementos que
possibilitam a responsabilização civil, eis que suas condutas - omissiva ao não provocar a
sanção da empresa EMCODRIL, e comissiva ao permitir o pagamento final da obra
inacabada - colaboraram decisivamente para o dispêndio indevido de recursos públicos e
conseqüente prejuízo ao erário.
No que se refere ao fato do recebimento da parcela final da obra pelo prefeito de
Verdejante-PE mediante procuração outorgada pela empresa EMCODRIL, clara é a
ilegalidade de tal expediente, eis que além de indevido o pagamento, igualmente indevido
é o recebimento de recursos desta natureza pelos gestores públicos na condição de
pessoas físicas.
Aqui percebe-se claramente que o réu Oscar Amorim Neto se omitiu de suas
responsabilidades enquanto Gerente de Engenharia quando, ciente de que o recebimento
da última medição seria feito por Francisco Alves Tavares de Sá, então prefeito de
Verdejante, permitiu o pagamento da última parcela da obra, a qual, como dito,
encontrava-se inacabada.
Também configura ato de improbidade a conduta de Francisco Alves Tavares de Sá, ao
receber, em nome próprio, pagamentos indevidos da empresa EMCODRIL e o que é mais
grave, sem qualquer tipo de prestação de contas.
As condutas abordadas neste ponto, anote-se por fim, não podem ser imputadas ao
réu Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, uma vez que este não participou de
forma direta e efetiva dos fatos, não se podendo, inclusive, sequer garantir que o mesmo
tinha ciência das irregularidades registradas.
Daí que, por conseqüência lógica, a este réu não pode ser associado qualquer prejuízo
causado ao erário.
(b) Não observância, do sistema de aterramento da obra, às normas da ABNT e
especificações técnicas constantes das planilhas de medições.
Consta no relatório da auditoria nº 2723 do SUS que o sistema de aterramento da obra
foi executado em desacordo com as normas da ABNT (fls. 42v).
O próprio relatório, contudo, não aponta de maneira objetiva a irregularidade, na
medida em que não indica qual item da planilha de serviços está desconforme, bem assim
o porquê de tal desconformidade.
O mesmo documento aduz que não foram apresentados, apesar de solicitados, os
projetos básico e executivo da obra, o que impossibilita uma análise precisa da ocorrência
da prática referida.
Diante de tais considerações, não é possível assegurar com clareza a existência de
condutas ímprobas por parte dos réus, neste aspecto.
c) Contratação da empresa Ivanilson S. Lima Ltda. com inobservância das exigências legais
pertinentes.
Conforme relatado, às fls. 231/233 dos autos consta um pagamento, na data
05/08/2004, no valor de R$ 42.134,23 em favor da empresa Ivanilson S. Lima Ltda.
(Pirâmide Engenharia), com recursos provenientes do Fundo Estadual de Saúde, pela
conclusão das obras da casa de parto de Verdejante, cuja execução foi abandonada pela
Empresa EMCODRIL.
Às fls. 42 dos autos vê-se que jamais foram apresentados pela Gerência de Engenharia
da Secretaria Estadual de Saúde os documentos que comprovem a realização dos
necessários procedimentos legais exigidos para escolha e contratação da empresa
Ivanilson S. Lima Ltda., apesar de solicitado pelo Sistema de Auditoria do SUS em
16/05/2005 (fls. 168).
Analisando-se, porém, a nota de empenho que precedeu o pagamento do valor em
questão (fls. 229), observa-se que houve dispensa do processo licitatório.
Acontece que a lei 8.666/93, apesar de prevê hipóteses em que há dispensa do
processo licitatório, não exime a Administração Pública de realizar o procedimento
administrativo que justifique tais situações.
O art. 26 da mencionada lei aduz:
Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art.
24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o
retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser
comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação
na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.
Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto
neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:
I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando
for o caso;
II - razão da escolha do fornecedor ou executante;
III - justificativa do preço.
IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados.
Vê-se que a não comprovação nos autos da regularidade da contratação da empresa
Pirâmide Engenharia Ltda., vai de encontro às determinações contidas na lei licitatória.
No caso dos autos, a necessidade de justificação do desembolso de tais recursos
tornava-se ainda mais premente pelo fato destes se destinarem à conclusão de uma obra
que, apesar de inacabada, havia sido integralmente paga com recursos públicos.
Ademais, valendo-se do mais elementar silogismo, poder-se-ia, naquela ocasião, inferir
que se a obra havia sido integralmente paga, o que levaria a conclusão de que estaria
acabada, sobretudo a partir do momento em que foi provisoriamente recebida (fls. 75v),
indevido seria, ao menos a priori, o aporte de mais recursos públicos para a sua conclusão.
Flagrante, pois, o dano ao erário na medida dos recursos irregularmente liberados para
contratação da empresa Pirâmide Engenharia, R$ 42.134,23.
Com efeito, evidente é a responsabilidade do ordenador de tais despesas, Guilherme
José Robalinho de Oliveira Cavalcanti (fls. 229), eis que sua conduta associa-se de forma
direta à liberação indevida de tais recursos.
(d) Desvio de recursos públicos federais destinados a implementação do Programa de
Saúde da Família.
A petição inicial relata que o réu Francisco Alves Tavares de Sá, ex-Prefeito de do
Município de Verdejante-PE, inseriu profissionais no Programa de Saúde Familiar sem que
os mesmos tivessem prestados serviços no âmbito do referido programa, o que
caracterizaria atos de improbidade, previstos nos arts. 10, caput e 11, caput e I, da Lei n.º
8.429/92.
Sobre o fato, entendo que o registro de médicos no Programa de Saúde Familiar não
configura ato de improbidade, porquanto não ficou demonstrado nos autos o pagamento
pela prestação de serviços, e, por conseguinte, o correspondente dano ao erário.
A simples inclusão dos profissionais de saúde Marcos Antônio Alves de Vasconcelos,
Danylo Araújo de Sá, Tarcísio veras de Queiroz, Flávia Aparecida de Sá e Antônio Carlos
ferreira (fls. 119) configura mera irregularidade por parte do município, mas não serve de
trampolim, ou melhor, de justificativa para a configuração de um ato ímprobo, mormente
sem estar acompanhada de provas que demonstrem, de maneira inequívoca, a efetivação
de pagamentos indevidos e o respectivo dano ao patrimônio público.
O autor sugeriu na causa de pedir o desvio de recursos destinados ao PSF, o que não
ficou comprovado, mas apenas a inclusão dos nomes dos profissionais mencionados na
relação daqueles cadastrados no PSF, conforme informação de fls. 119/120, sem que os
mesmos tivessem ali trabalhado. Em nenhum momento trouxe aos autos prova do
pagamento desses profissionais.
Atribuir a qualidade de ímproba a condutas meramente irregulares é ampliar a
extensão da pretensão legislativa, que visa a penalizar aqueles que praticaram um ato
ilícito qualificado, o que não é o caso dos autos.
Assim, tendo em vista que não houve comprovação do dano ao erário, consistente no
pagamento por serviços de saúde não prestados, mas apenas a irregularidade na indicação
dos nomes dos profissionais vinculados ao PSF, entendo não estar configurado ato
ímprobo.
II.II.IV. Do elemento subjetivo da conduta
Não se admitindo a responsabilização objetiva e inobstante a possibilidade de
reconhecimento do caráter ilícito das condutas, há que se analisar com cautela os atos
impugnados, no que concerne ao elemento subjetivo.
No caso, os réus Manoel Veiga de Lira Filho e Oscar Amorim neto, integrantes da
equipe de engenharia da Secretaria de saúde de Pernambuco e membros da comissão que
recebeu a obra da casa de parto de Verdejante-PE, tinham consciência de que a execução
dos serviços teria que observar as disposições legais contidas na Lei n.º 8.666/93,
especificamente no que diz respeito à necessidade de conclusão do contrato para o seu
recebimento (art. 73), e à aplicação de sanções à empresa que abandonou os serviços
(arts. 77 e ss).
Ambos, enquanto engenheiros, também sabiam da necessidade da referida obra
observar às especificações técnicas e normas aplicáveis ao tipo de construção que
fiscalizavam.
Da mesma forma eram cônscios da ilegalidade do recebimento, por parte do prefeito
de Verdejante-PE, de valores referentes a medições da empresa contratante, sobretudo
porque não executados.
Evidente também são a consciência e a voluntariedade do demandando Francisco Alves
Tavares de Sá ao receber indevidamente, e em nome da empresa EMCODRIL, o
pagamento por serviços não executados.
A responsabilidade de Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, enquanto
ordenador de despesas, na contratação irregular da empresa Pirâmide Engenharia Ltda.,
resta igualmente configurada, posto que o mesmo era ciente de sua obrigação em checar
a regularidade, ainda que formal, das despesas por ele autorizadas.
Não há escusas, portanto, para que o pagamento da empresa Pirâmide Engenharia
Ltda. fosse autorizado pelo referido réu sem que houvesse justificativas para a dispensa de
licitação.
II.II.V. Da previsão normativa sobre o ato ilícito praticado pelos réus
Uma vez demonstradas as condutas que causaram dano ao erário e que violaram
princípios da Administração Pública, bem assim a submissão dos réus aos termos da Lei n.º
8.429/92, resta apontar o dispositivo específico desse diploma que se aplica à espécie.
Devo destacar que, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, "não infringe o
princípio da congruência a decisão judicial que enquadra o ato de improbidade em
dispositivo diverso do indicado na inicial, eis que deve a defesa ater-se aos fatos e não à
capitulação legal" (STJ/2ª Turma - RESP 842428 - DJ 21/05/2007 p. 560).
Para elucidar a questão, fundamental trazer à colação o disposto no caput e nos incisos
I, IX e XI do art. 10 da lei citada:
Seção II
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer
ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação,
malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º
desta lei, e notadamente: (...).
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular,
de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo
patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;
(...)
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;
(...)
XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de
qualquer forma para a sua aplicação irregular;
A dicção do caput do art. 10 transcrito é clara. Pratica ato de improbidade o agente
público que, dolosa ou culposamente, atenta contra o erário público.
Deve-se considerar, neste correr, que o elenco constante dos incisos do transcrito art.
10 não é exaustivo, consoante deixa claro o vocábulo "notadamente" aposto no caput.
No presente caso, a violação da norma é mais patente, haja vista a perfeita adequação
da conduta à previsão contida nos incisos I, IX e XI.
Com efeito, consoante os argumentos expostos, enquadram-se no caput do
mencionado artigo as condutas praticadas pelos réus Francisco Alves Tavares de Sá,
Manoel Veiga de Lira Filho e Oscar Amorim Neto.
Da mesma forma, aos réus Manoel Veiga de Lira Filho e Oscar Amorim Neto também se
aplicam os incisos I, IX e XI do artigo em referência.
No caso do réu Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti, tem-se que sua
conduta enquadra-se no caput e no inciso XI do artigo em questão, sob a ótica exclusiva do
dano ao erário, eis que quanto ao mesmo não se aplicam as sanções decorrentes da
improbidade do ato, em virtude do reconhecimento da prescrição, conforme já pontuado.
Não se pode falar na subsunção dos fatos ao art. 9 da Lei n.º 8.429/92 haja vista que o
prejuízo causado, aqui, foi reflexo, ou seja, não há provas de que o intento (dolo) dos réus,
desde o início, fosse o enriquecimento ilícito.
Enfim, os atos resultaram em prejuízo ao erário, relativamente ao pagamento de verba
pública indevida, haja vista a não conclusão da obra e correspondentes serviços referentes
à sétima e última medição.
II.II.VI. Das sanções incidentes
Consoante o já exposto, os réus praticaram as condutas previstas no art. 10 da Lei n.º
8.429/92.
Devem ser, em consequência, penalizados com as sanções previstas pelo art. 12, II do
mesmo diploma legal, que dispõe:
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na
legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes
cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a
gravidade do fato:
(...)
II - hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores
acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de
até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
(...)
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão
do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.
Como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, "a Lei de improbidade administrativa não
estabelece a aplicação cumulativa das sanções, cabendo ao magistrado, na análise de cada
caso, aplicar a mais adequada, em conformidade com os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade" (STJ/2ª Turma - Processo 200902426192 - AGRAGA - 1261659 - DJE
07/06/2010).
Não há notícia, aqui, de enriquecimento ilícito por parte dos réus, fato este que deve
repercutir na aplicação das sanções.
Nesse contexto, à exceção do réu Guilherme Robalinho, o qual apenas responde pelo
dano causado ao erário, entendo como sanções suficientes à repressão da conduta, e até
como prevenção de outras, a imposição da suspensão dos direitos políticos, da proibição
de contratar com o Poder Público e a condenação no pagamento de multa civil e
ressarcimento do dano ao erário, o qual limita-se à sétima medição paga à empresa
EMCODRIL.
III. Dispositivo
Pelo exposto, entendendo configurada as hipóteses previstas no art. 10, I, IX e XI da Lei
n.º 8.429/92, julgo parcialmente procedentes os pedidos aduzidos na petição inicial, e, em
consequência:
[1] condeno Manoel Veiga de Lira Filho nas seguintes sanções:
a) suspensão dos direitos políticos por cinco anos;
b) pagamento de multa civil equivalente a 10 vezes o valor da sua última remuneração;
c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da
qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
d) ressarcimento integral do dano no valor de R$ 34.588,18 (trinta e quatro mil,
quinhentos e oitenta e oito reais e dezoito centavos), atualizados desde 12/02/2002 (fls.
227 processo administrativo n.º 1.26.004.000005/2007-15).
[2] condeno Oscar Amorim Neto nas seguintes sanções:
a) suspensão dos direitos políticos por cinco anos;
b) pagamento de multa civil equivalente a 10 vezes o valor da sua última remuneração;
c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da
qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
d) ressarcimento integral do dano no valor de R$ 34.588,18 (trinta e quatro mil,
quinhentos e oitenta e oito reais e dezoito centavos), atualizados desde 12/02/2002 (fls.
227 processo administrativo n.º 1.26.004.000005/2007-15).
[3] condeno Francisco Alves Tavares de Sá nas seguintes sanções:
a) suspensão dos direitos políticos por cinco anos;
b) pagamento de multa civil equivalente a 10 vezes o valor da sua última remuneração;
c) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da
qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;
d) ressarcimento integral do dano no valor de R$ 34.588,18 (trinta e quatro mil,
quinhentos e oitenta e oito reais e dezoito centavos), atualizados desde 12/02/2002 (fls.
227 processo administrativo n.º 1.26.004.000005/2007-15).
[4] condeno Guilherme José Robalinho de Oliveira Cavalcanti no ressarcimento integral do
dano no valor de R$ 42.134,23 (quarenta e dois mil, cento e trinta e quatro reais e vinte e
três centavos), atualizados desde 05/08/2004 (fls. 231 processo administrativo n.º
1.26.004.000005/2007-15).
Condeno os réus, ainda, ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios que fixo em R$ 3.000,00 (três mil reais), na forma do art. 20, §4º, do CPC.
Transitada em julgada, oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco,
comunicando-lhe acerca da suspensão dos direitos políticos, bem assim aos Ministérios do
Planejamento, Orçamento e Gestão e da Fazenda para lhes comunicar a proibição da
contratação com o poder público, ou de que estes recebam benefícios ou incentivos fiscais
ou creditícios.
Registre-se. Publique-se. Intimem-se.
Salgueiro, 29 de agosto de 2013.
Allan Endry Veras Ferreira
Juiz Federal
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA