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09/07/2014 -­ 05:00
Rússia quer que Brics acelerem o uso de moedas
locais no bloco
Por Assis Moreira
Vladimir Dmitriev, presidente do banco Vnesheconombank, o BNDES
russo: os Brics "estão muito interessados em diversificar a sua segurança econômica"
A Rússia espera que a cúpula dos Brics -­ com Brasil, Índia, China e África do Sul -­ na semana que vem, em Fortaleza,
dê um forte impulso político para o uso de suas moedas nacionais no comércio e investimentos entre eles, como
alternativa ao dólar.
Em entrevista ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, o presidente do banco
Vnesheconombank (Bank for Development and Foreign Economic Affairs), espécie de BNDES russo, Vladimir
Dmitriev, previu a discussão de um "road map" (mapa do caminho) para a implementação de acordos que foram
assinados entre os bancos de desenvolvimento dos cinco grandes emergentes há dois anos, em Nova Déli.
"Durante a cúpula dos Brics daremos grande importância em ir adiante com novas iniciativas e rumos na nossa
cooperação", afirmou. "Até agora, temos muito boas relações com os bancos de desenvolvimento do Brasil, Índia,
China, África do Sul. Mas gostaríamos de ver plenamente aplicados os acordos que assinamos há alguns anos, o de
cooperação financeira e o outro sobre as transações em moedas nacionais."
Dmitriev reitera que a decisão foi tomada em 2012 e acha que os países dos Brics "estão muito interessados em
diversificar a sua segurança econômica". Estima que a ampla utilização do dólar americano "significa uma grande
dependência em relação a essa moeda e à economia americana". Para ele, o "euro é ok".
A Rússia é diferente dos outros Brics, no momento, e não apenas por razões geopolíticas. Em confronto com os EUA e
a União Europeia (UE) depois da anexação da Crimeia, o país sofre ameaça de novas sanções econômicas quando já
está em plena estagnação, e tem pressa em ampliar o leque de alternativas para suas exportações.
Pelo acordo de moedas, assinado há dois anos, cada banco de desenvolvimento dos Brics comprometeu-­se com
financiamentos em sua moeda para os outros quatro membros. Usar suas próprias divisas para crédito e liquidar
pagamentos poderá dar mais flexibilidade, minimizar exposição a flutuação de câmbio, reduzir a dependência em
relação a outras divisas e facilitar o comércio e investimentos, pelo menos na teoria.
Até agora, a implementação ocorreu mais entre a Rússia e a China. Dmitriev relatou a "boa experiência" no uso do
rublo e do yuan no comércio bilateral, chegando a 5% das transações em pouco tempo. O volume total de comércio
bilateral pode alcançar US$ 100 bilhões neste ano, um ano antes da meta fixada pelos dois governos, segundo a
agência de notícias chinesa Xinhua.
Além disso, empresas da Rússia procuram levantar fundos em Hong Kong e Cingapura em yuan, como alternativa ao
dólar e ao euro, informa o banqueiro. Por sua vez, Pequim prepara a criação de um novo banco cuja atividade será
dedicada a expandir o uso do yuan globalmente.
Os cinco países dos Brics têm população de quase três bilhões de pessoas, PIB combinado de US$ 16 trilhões e cerca
de US$ 4 trilhões de reservas internacionais.
Mas, apesar dos esforços de diversificação, a alternativa real ao dólar ainda é difícil. Mais da metade dos
empréstimos e depósitos internacionais são em dólar. No mercado global de divisas de US$ 5,3 trilhões por dia, a
moeda americana estava num dos lados de 87% de todas as transações. Em comparação, o yuan só representava
2,2% e o rublo, 1,6% em 2013.
Conforme Dmitriev, a ideia nos Brics não é de pôr fim ao uso do dólar americano, pois os governos não podem impor
que todas as operações comerciais sejam pagas nas moedas locais e os operadores precisam "ter algum conforto sobre
isso".
Moscou não espera que a cúpula dos Brics estabeleça uma data para implementação do uso do real brasileiro, yuan
chinês, rublo russo, rúpia indiana e o rand sul-­africano entre eles, e sim um impulso político para alguns passos que
precisarão ser dados nessa direção.
Isso passa pelo acordo de swap de moedas. A presidente do banco central russo, Elvira Nabiullina, declarou à
imprensa russa que Moscou discute com os outros países dos Brics um sistema de swaps que permitirá transferir
recursos de um país para outro, se necessário. Uma parte das reservas poderia ser direcionado para esse novo
sistema.
Para Vladimir Dmitriev, outra razão para que os Brics façam uso de suas próprias divisas entre eles é que "isso vai
impor disciplinas muito fortes sobre as moedas locais. Dá input para disciplina monetária. Penso que todos os países
dos Brics são favoráveis a isso".
Anúncio mais concreto pelos líderes, em Fortaleza, será a criação formal do banco de desenvolvimento dos Brics.
Segundo diferentes fontes, o banco terá capital inicial subscrito de US$ 50 bilhões. Mas o capital autorizado será de
US$ 100 bilhões, já deixando espaço para entrada de mais países e aumento do capital futuro.
O presidente do banco russo contou que a posição inicial da Rússia foi de que, ao invés de criar o banco dos Brics, os
cinco países deveriam capitalizar os seus bancos nacionais de desenvolvimento já existentes para fornecer
financiamento para projetos.
Para ele, isso teria reduzido substancialmente o montante que cada país precisaria se comprometer na criação do
banco. Ao invés de cada um entrar com US$ 10 bilhões (US$ 2 bilhões em dinheiro, US$ 8 bilhões em garantias),
teria sido suficiente colocar US$ 2 bilhões a mais em cada um dos bancos de desenvolvimento já existentes. "Isso
teria nos permitido levantar US$ 20 bilhões em dinheiro adicional no mercado para financiar projetos", disse.
Agora, com o banco praticamente criado, Moscou quer aproveitar as oportunidades, ampliando forças também com
os atuais bancos de desenvolvimento dos cinco países.
"Devido à crise global e a possível impacto de sanções americanas, elas [companhias russas] estão ampliando as
relações com outros países, e temos muitos bons contatos com China e Brasil", afirmou Dmitriev.
O presidente do banco Vnesheconombank repete a versão oficial de que ainda não haveria impacto direto das sanções
dos EUA e da UE sobre a economia russa. "O que vemos agora é mais o resultado da crise global e da situação
macroeconômica russa, o que nos força a acelerar reformas estruturais e depender menos de óleo, gás e outras
matérias-­primas", argumentou.
A inflação da Rússia está acima de 6%, batendo a brasileira, mas ele acha que é "administrável". Julga que a enorme
fuga de capital não é problema unicamente russo e que os emergentes são afetados por capital especulativo. Afirma
que a corrente de Investimento Estrangeiro Direto (IED) para a Rússia continua elevada, mesmo atualmente.
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