Analise as informações abaixo e disserte em seu caderno a partir da questão abaixo:
Vivemos no Brasil um exercício de cidadania real ou ideal?
Sites com informações da aula anterior:
http://www.transparenciabrasil.org.br/
http://www.brasil.gov.br/sobre/o-brasil/estado-brasileiro/sistema-politico
http://www.brasil.gov.br/sobre/o-brasil/estrutura/organizacao-do-governo
Leitura obrigatória:
Corrupção no Brasil, uma análise sociológica
No livro “O Saber Local” (Vozes, 2001), o antropólogo norte americano Clifford Geertz
afirma que “para acompanhar um jogo de beisebol, temos que saber o que é um bastão, uma
bastonada, um jogador de esquerda e também como funciona o jogo que contém todos esses
elementos”. Assim funciona também com a política e com a corrupção, uma de suas práticas de
subterrâneo. “A corrupção na política sempre existiu, faz parte do jogo de interesse e poder
desde o nascimento da vida em sociedade. No Império Romano, por exemplo, existia até uma
tabela paralela de corrupção feita pelo próprio senado para burlar as leis”, diz José Odair da
Silva, historiador e doutor em Ciência da Religião pela PUC-SP.
Talvez algo esteja começando a mudar. Recentemente, acompanhamos o anúncio da
raríssima prisão de um político em exercício de mandato executivo, acusado de corrupção. A
detenção do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, surpreendeu a todos que
esperavam mais um “final com pizza”. O julgamento político e jurídico de Arruda ainda não
ocorreu, mas o início parece mais auspicioso do que em casos semelhantes no passado. No
entanto, fica uma questão primordial a ser debatida: como entender a escolha dos brasilienses por
Arruda nas eleições de 2006, levando em consideração que em sua biografia já constava o caso
da violação do painel eletrônico do Senado, ocorrido em 2001?
Mas, como se sabe, a corrupção vai além da política e está instalada nas relações sociais.
E os prejuízos são evidentes, sobretudo em termos de cultura política, prevalecendo a tese de que
o mundo é dos espertos e de que a Lei não alcança igualmente a todos. “Uma lógica da
malandragem se espalha pelo país como normal e dificulta o estabelecimento de uma cultura
cidadã, democrática e especificamente moderna”, lembra Rogério Baptistini Mendes, doutor em
Sociologia pela UNESP, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e
coordenador do Grupo de Estudos sobre o Brasil Moderno.
É quase uma instituição que todo mundo vê, afirma repudiar, mas até se beneficia dela. É
como Alberto Carlos Almeida explica em seu livro “A Cabeça do Brasileiro” (Record, 2007):
“Você é a favor da corrupção? Claro que não! E, por acaso já se utilizou pelo menos uma vez na
vida do ‘jeitinho brasileiro’? Sem dúvida que sim. Enfim, há culturas mais complacentes com a
corrupção do que outras, e a nossa é uma delas”, conta o autor.
Em uma sociedade como a nossa, em que existe uma zona nebulosa entre o certo e o
errado e que glorifica o “jeitinho brasileiro” como uma ferramenta da dinâmica social, fica mais
fácil entender porque a cultura da corrupção está entre nós. Almeida mostra em seu livro,
apoiado pela Pesquisa Social brasileira (PESB), que a corrupção não está restrita às ilicitudes de
nossos políticos e governantes. Sob a simpática expressão “jeitinho brasileiro”, ela é socialmente
aceita. É esse jeitinho que quebra as regras e se coloca como a zona cinzenta moral, ou seja,
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entre o certo e o errado. Dependendo das circunstâncias, pode passar rapidamente de errada a
certa.
“Uma lógica da malandragem se espalha pelo país como normal e dificulta o
estabelecimento de uma cultura cidadã, democrática e especificamente moderna”. Rogério
Baptistini Mendes, doutor em sociologia e professor da FESPSP.
Poderíamos nos perguntar: seria o “jeitinho brasileiro” a antessala da corrupção?
Segundo a PESB, sim. Com base em suas pesquisas descobriu-se que quanto maior a tolerância
ao jeitinho, mais se aceita a corrupção. “Quanto maior for a utilização e a aceitação desse meiotermo, maiores serão as chances de que haja uma grande tolerância em relação à corrupção”,
explica Almeida. De acordo com a PESB, Almeida verificou que 60% das pessoas consultadas
são inclinadas a uma visão de mundo patrimonialista. Em casos mais extremos, 17% da
população tolera que alguém se utilize do cargo público como se fosse propriedade particular.
Quase ¾ da população brasileira afirmam não considerar que o público deva cuidado por
todos, mas apenas pelo governo.
Portanto, não é à toa que Macunaíma, magistralmente descrito por Mário de Andrade,
tornou-se o símbolo do herói brasileiro. Se ele estivesse caracterizado com terno, gravata e
frequentasse a alta sociedade brasileira certamente estaria até em um círculo mais adequado.
Obviamente, faz-se aqui uma análise do ponto de vista político do personagem, concebendo
Macunaíma como o típico “herói sem caráter”. Aliás, como o historiador Sérgio Buarque de
Holanda escreve em “O Espírito e a Letra: estudos de crítica literária” (Companhia das Letras,
1996), Macunaíma já existia em um sem-número de fábulas dos índios caraíbas, ou seja, ele não
foi construído por Mário de Andrade, um grande estudioso da nossa cultura, apenas com a força
de sua imaginação.
“Quanto maior for a utilização e a aceitação desse meio-termo, maiores serão as
chances de que haja uma grande tolerância em relação à corrupção”. Alberto Carlos Almeida,
Sociólogo e autor de “A Cabeça Do Brasileiro”.
Como saber em que ponto inicia-se o fenômeno da corrupção? Como entender o
paradoxo de conviver com a corrupção, criticando-a como um ato infame, mas em certas
situações usando-a em seu próprio benefício?
“A corrupção na política sempre existiu, faz parte do jogo de interesse e poder desde o
nascimento da vida em sociedade. No Império Romano, por exemplo, existia até uma tabela
paralela de corrupção feita pelo próprio senado para burlar as leis”. José Odair Da Silva,
Historiador.
A corrupção, como mostra Odair da Silva, não é uma exclusividade brasileira. Ela sempre
existiu em todos os sistemas e regimes políticos: nas democracias liberais, no socialismo, no
fascismo, no nazismo, na socialdemocracia, em teocracias, governos populistas e ditaduras
militares. Mas o esforço de compreensão das raízes da corrupção e da relação da sociedade com
esse desvio da lei em um local específico, no caso o Brasil, exige ir além das estatísticas e das
definições generalizantes. É necessário analisar minuciosamente a formação social e política do
país.
Vivemos, segundo os grandes intérpretes de nossa formação, em uma sociedade calcada
nas relações pessoais, familiares, cuja base não estaria alicerçada no princípio de indivíduo e
cidadão. É o que nos mostra um dos maiores estudiosos do comportamento do brasileiro, o
antropólogo Roberto Da- Matta. Em sua obra “A casa & a Rua: espaço, cidadania, mulher e
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morte no Brasil” (Rocco, 2003), ele descreve o Brasil como heterogêneo, desigual, relacional e
inclusivo, onde o que conta não é o cidadão, mas a relação que ele tem com o poder, seja esse
poder de qualquer nível, do macro poder do Estado ao micro poder do cotidiano. Segundo
DaMatta, tal característica permitiria explicar os desvios e variações da noção de cidadania.
Frases autoritárias como “Você sabe com quem está falando?” ainda têm valor e efeito.
Emblemática, a frase mencionada e analisada pelo antropólogo é uma das derivações possíveis
do tão controverso “jeitinho brasileiro”.
Segundo Odair da Silva, o “jeitinho” pode ser encarado de duas formas: pode ter um
sentido pejorativo, pois diz que o povo brasileiro arranja sempre um modo de viver sem
trabalhar, estudar, pagar impostos e fugindo dos compromissos. Por outro ângulo, o “jeitinho”
tem um sentido de criatividade e de esperteza, qualidades que “valorizam” os seus autores. No
caso dos políticos enrascados, é a capacidade de improvisar soluções acauteladoras quando tudo
parece estar perdido. “É a presença de espírito que dá respostas imediatas para situações
embaraçosas, sobretudo respostas de efeito, mas vazias de significado. Em resumo, o “jeitinho” é
o instrumento mais usado para deixar como está pra ver como fica”, exemplifica.
Buarque e as Raízes do Brasil
Como mostra Baptistini, a corrupção é endêmica. Ela faz parte de um fenômeno gerado
ao longo dos séculos, desde que Portugal instalou aqui uma colônia de exploração apoiada no
latifúndio e na escravidão. Essas instituições, sob o domínio de um ente privado que exercia o
poder por delegação da Coroa, estão na base da constituição de uma sociedade patriarcal, na qual
há concentração de poder e prestígio na figura do senhor rural. Este, separado da metrópole por
um oceano, fazia confundir o seu mando pessoal com um verdadeiro poder de Estado, expressão
de sua vontade particular. Cerca de 17% da população tolera que alguém se utilize do cargo
público como se fosse propriedade particular. 60% Das pessoas consultadas são inclinadas a uma
visão de mundo patrimonialista.
Por essa razão, é fundamental ressaltar alguns pontos como a influência determinante da
colônia portuguesa na formação da nossa cultura e mentalidade. Como diria o sociólogo e
antropólogo Marcel Mauss em “Sociologia e Antropologia” (Cosac Naify, 2005), toda
interpretação deve fazer coincidir a objetividade da análise histórica ou comparativa com a
subjetividade da experiência vivida. E como pensar nos aspectos da nossa formação sem falar no
clássico livro de Sérgio Buarque de Holanda, “Raízes do Brasil”, cuja primeira edição é de
1936?
No capítulo “O Homem Cordial”, Sérgio Buarque inicia a sua análise explicando que o
Estado não é – ou não deve ser – a ampliação do círculo familiar. Mas, como lembra Baptistini,
uma das raízes sociológicas da corrupção política é a ausência de separação entre os espaços
público e privado, sobretudo quando a burocracia do Estado localizava-se em Portugal e a
colônia organizava-se com base na exploração das terras e das pessoas no contexto do latifúndio
escravocrata. Essa é a base do patriarcalismo, com a concentração do poder e do prestígio na
figura do senhor rural.
Se junta a isso o mando privado dos senhores que se prolonga no tempo e assume
característica peculiar, com o retraimento do latifúndio aos próprios limites, configurando uma
verdadeira autarquia rural. “Nesta, como informa Faoro, em “Os Donos do Poder”, o senhor de
terras e de gente se transmuta no senhor absoluto de um pequeno reino. O prestígio outrora
haurido das implícitas delegações de autoridade se transmuta no de senhor de um pequeno reino,
que produz quase tudo”, explica Baptistini.
A confusão entre o latifúndio e o Estado não se resolve com a superação de uma por
outra, mas é uma transação que conduz ao acerto que as preserva no país independente, liberto da
metrópole portuguesa. “O estamento político, alargado desde o Código de Processo Penal de
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1832 e do Ato Adicional de 1834, que consagram a relação entre as autonomias locais e o poder
central, entre o patriarcalismo e o patrimonialismo, consagra o exercício do poder como mando
privado, enquanto a nação padece sob o latifúndio e a escravidão”, resume Baptistini.
“Conforme esclarece José Murilo de Carvalho, em ‘Os Bestializados’, o povo, que pelo
ideário republicano deveria ter sido o protagonista dos acontecimentos, assistira a tudo
bestializado, sem compreender o que se passava, julgando ver talvez uma parada militar”.
Rogério Baptistini Mendes, Doutor Em Sociologia e Professor da Fespsp.
Conclusão:
Dessa forma, o Brasil independente avança em direção ao século 20 sem uma população
verdadeiramente livre, com um Estado parasitário, lugar de privilégios, e uma ordem privada
marcada pelo mandonismo dos senhores rurais. Para Baptistini, “não causa espanto que, ao final
do período, o advento da forma republicana se dê ‘pelo alto’, respeitando o status quo. Conforme
esclarece José Murilo de Carvalho, em “Os Bestializados”, o povo, que pelo ideário republicano
deveria ter sido o protagonista dos acontecimentos, assistira a tudo bestializado, sem
compreender o que se passava, julgando ver talvez uma parada militar”.
Um dos elementos para a compreensão desse fenômeno seria o de que o nosso histórico
social de corrupção tem como alimento a ausência de uma cultura pública robusta e a
oligarquização das decisões. “Elas se somaram, ao longo do tempo, aos resquícios da escravidão
e do mandonismo privado, à cidadania como concessão e à ideia de que o Estado tem
precedência sobre a sociedade. Assim, não se fortaleceu entre nós o ethos republicano e
democrático, mas sim o seu oposto”, finaliza Baptistini.
Na análise do jornalista e historiador Hernâni Donato, outros elementos são importantes.
“Basta percorrer a História. Subiremos os séculos flanqueados por endemia corruptiva que
remete ao ‘Descobrimento’. Não foi o que o escrivão Caminha tentou fazer com o rei, na sua
famosa carta? Elogiou a terra com o que elogiava o esforço real (ainda que secreto) para chegar a
ela. E assinava com um pedido de graça em favor do genro. Verdade que ela, a corrupção, viceja
onde haja relacionamento entre o que pode e o que deseja. Lê-se no primeiro livro de História
guerreira como foi que fornecedores mudaram a sorte de batalha no Peloponeso, promovendo
orgia total para gáudio dos compradores. Depois, e isto me causa arrepios quando me vem à
mente a frase terribilíssima do padre Vieira ao soberano que o mandara identificar corrupção e
corruptor no Brasil. Vieira confirmou e alertou mais ou menos assim: ‘e não tente Vossa
Majestade corrigir de todo esse mal, porque, então, ficaria sem com quem governar’. Não é de
tirar o sono?”, relata.
A reforma política afigura-se indispensável, e mesmo, inevitável, no cenário atual de
ineficácia das instituições democráticas do país. Ela contribuirá significativamente para a
obtenção da estabilidade política, da governabilidade, com o combate à corrupção e para atenuar
a crise de representatividade. Enfim, servirá de estímulo para se alcançar a estabilidade
institucional tão cara ao bom funcionamento da democracia.
Esta estabilidade, juntamente com a solidez dos fundamentos econômicos, com as
reformas microeconômicas e com políticas públicas que aumentem a eficiência da atividade
produtiva (investimentos em infraestrutura), constituirá o cerne fundamental para a criação de
um “ambiente favorável aos negócios” de forma a atrair investimentos estrangeiros diretos.
A redemocratização do país é um fenômeno recente, logo é de certa forma, natural que
ocorram “contratempos”, porém deve-se lutar pelo fortalecimento de suas instituições basilares.
Portanto, ao invés, de ter uma atitude passiva, deve o cidadão brasileiro fiscalizar, propor
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mudanças, punir, através do voto, os gestores públicos incompetentes de forma a contribuir com
o fortalecimento das instituições e, por conseguinte, da democracia no país.
A crise de representatividade deve ser superada através da adoção de medidas que
aumentem a participação política do eleitorado, assegurem o atendimento dos pressupostos para
o exercício de uma cidadania plena e aprofundem a democracia no país e para aqueles que, ainda
assim, não quiserem participar, vale o seguinte lembrete: aqueles que não gostam de política,
serão governados pelos que gostam.
Nesse sentido, quando deparado com episódios como o do “mensalão” ou compra de
sentenças judiciais, o cidadão deve atuar visando operar uma mudança nos poderes legislativo e
judiciário, ao invés de, tão somente, desacreditá-los. É preciso preservar as instituições em
momento de crise, pois os direitos assegurados pela democracia e sua perenidade dependem não
apenas do voto, que é o instrumento da democracia, mas, sobretudo, do bom funcionamento das
instituições democráticas.
Cidadania real ou ideal?
Entende-se por cidadania o direito de viver em condições dignas, com acesso a saúde, a
educação, a habitação, a cultura, ao esporte, a segurança, ao trabalho e renda, entre outros.
Significa ter e manifestar opinião, ter o direito de ir e vir livremente, de votar, de possuir
assistência medica e remédios, não ser discriminado, ter uma religião, etc.
Para DIMENSTEIN (1994), o cidadão brasileiro usufrui uma cidadania aparente que ele
denomina de cidadania de papel. A verdadeira democracia implica na conquista e efetividade dos
direitos sociais, políticos e civis, caso contrário, a cidadania permanece inerte no papel.
A cidadania de papel, portanto surge com o desrespeito aos direitos fundamentais do homem.
Com a falta de escolas, com a migração, com a desnutrição, com o desemprego e com a pobreza.
Quando o ciclo devastador da pobreza se instala nas sociedades, a instituição mais penalizada é a
família, em especial as suas crianças, elo mais fraco e vulnerável da cadeia social. Para o
jornalista nenhum país consegue progredir, senão investir na educação, o que significa
preocupar-se com a infância e com a adolescência. “Ninguém planta nada se não tiver uma
semente”.
Para medirmos o grau de desenvolvimento social e humano de um país, basta observar a
situação da infância e da adolescência. A medida da cidadania está para a razão direta da garantia
dos direitos humanos, do direito a ter direitos, de viver decentemente, de progredir e produzir.
Nesse sentido o mundo caminhou obtendo muitas conquistas no último século, desde o
surgimento da declaração dos direitos universal do homem, em 1948, aprovada pela ONU. Uma
nova mentalidade instalou-se pelo mundo todo, ocorrendo a derrubada de sistemas de opressão e
a abertura de novos caminhos para a democracia com a conquista do direito ao bem estar e
direito de livre expressão.
Em 1988 o Brasil aproximou-se do Estado de Direito Democrático com a aprovação da
Constituição Federal. Entre várias conquistas destaca-se o artigo 227:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.” CF, (1988).
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