EMBARGO de Antonio Ferreira_24 de Fevereiro de 2011
sinopse Nuno trabalha numa roulotte mas desde sempre teve um espírito criativo. Um dia, descobre
algo realmente revolucionário: um digitalizador de pés que transformará, para sempre, toda a indústria
do calçado. Mas, quando tudo parece estar a jogar a seu favor, o inesperado acontece: fica fechado no
seu próprio carro e, para seu total desespero, parece que nada, nem ninguém consegue resolver o
problema.
Com realização de António Ferreira é adaptação de um conto de José Saramago, integrado no
livro "Objecto Quase", publicado em 1978.
Ficha técnica
Título original: Embargo
Realização: António Ferreira (Portugal/Espanha/Brasil, 2010, 83 min.)
Argumento: Tiago Sousa a partir de um conto de José saramago
Interpretação: Filipe Costa, Cláudia Carvalho, José Raposo, Pedro Diogo
Produção: António Ferreira, Tathiani Sacilotto
Música: Luís Pedro Madeira
Fotografia: Paulo Castilho
Montagem: António Ferreira, Tiago Sousa
Distribuição: Persona Non Grata
Classificação: M/12
Estreia: 30 de Setembro de 2010
Página Oficial: http://www.embargo-movie.com/
António Ferreira realiza Filme "Embargo", a partir de conto de Saramago
António Ferreira, realizador de "Respirar Debaixo de Água", transformou o conto de "Objecto Quase"
numa "espécie de Mad Max à portuguesa."
Será a terceira adaptação de José Saramago ao cinema, depois de “Jangada de Pedra”, de Georges
Sluizer (2000), e “Ensaio Sobre a Cegueira” (2008), de Fernando Meirelles. “Embargo”, de António
Ferreira, teve antestreia no Fantasporto em Março deste ano e, se se mantiver o plano de lançamento
depois da morte de Saramago, será estreado em sala a 30 de Setembro deste ano.
Em declarações ao site Iol.pt, o realizador, perturbardo pela notícia da morte do escritor português,
adiantou que irá falar com os distribuidores para saber se se justifica antecipar a estreia.
“Embargo” adapta o conto homónimo, incluído em “Objecto Quase” (1978), escrito por Saramago no
contexto da crise petrolífera de 1973, desencadeada pelo conflito israelo-árabe do Yom Kippur. Em
entrevista ao Ípsilon em Fevereiro, o realizador conimbricense explicou que aos 23 anos, caloiro na
Escola de Cinema em Lisboa e fascinado com a leitura de “Evangelho Segundo Jesus Cristo”, procurou
tudo o que conseguisse encontrar de José Saramago. Em “Embargo” encontrou um texto em que se
manifestava fortemente o “cinema” que Ferreira vê no autor de “Levantado do Chão”: “Sempre achei
que o Saramago tem uma escrita muito cinematográfica, os seus livros provocam-nos imagens muito
fortes”, declarou na entrevista supracitada.
Um impulso inicial para o filmar enquanto curta foi seguido e abandonado ainda na década de 1990.
Passada mais de uma década, já depois de António Ferreira ter filmado “Respirar (Debaixo de Água)”, a
sua estreia em longa-metragem, “Humanos – A Vida em Variações” (2006) e “Deus Não Quis” (2007),
regressou ao projecto. Ferreira vê o conto como “uma metáfora da nossa sociedade, da nossa
dependência das máquinas”, e recordou como a crise criada pelo bloqueio dos camionistas, em 2008,
Cineclube de Joane
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lhe provou a sua actualidade. “Em tão poucos dias, por causa de um bloqueio decidido por um grupo de
pessoas, a nossa sociedade pareceu desmoronar-se. [...] Era uma espécie de aviso. De um momento
para o outro, tudo o que temos por seguro pode desmoronar-se.”
Sem intervenção de Saramago durante todo o processo e descrito como “uma espécie de Mad Max à
portuguesa”, “Embargo” é uma produção da ZED Filmes e tem como protagonista Filipe Costa, actor
que é também teclista dos Sean Riley & The Slowriders.
Por: Mário Jorge Torres , Público de 30 de Setembro de 2010
Embargo - A Culpa foi do Carro
Goste-se ou não da sua ficção torrencial, adaptar José Saramago tem-se revelado tarefa complicada,
de tal modo o seu mundo conceptual parece resistir às imagens cinematográficas, carregado que está
de forte carga alegórica e de sentidos que apenas parecem funcionar na página: tanto "A Jangada de
Pedra" como, e sobretudo, "Blindness" evidenciavam essa pesada secura narrativa, essa busca por
bizarrias representativas.
António Ferreira foi buscar para este seu filme "O Embargo", um conto de curtíssima dimensão, uma
das primeiras aventuras do escritor, do tempo em que ainda era director literário da editora Estúdios
Cor, mais tarde reunido em "Objecto Quase". Se optou por um texto menos complexo e dispersivo,
esbarrou com uma outra dificuldade não menos insolúvel: trata-se de uma "anedota ilustrada", com
escasso material narrativo que se possa desenvolver. Um homem fica prisioneiro dos caprichos do seu
carro, durante um embargo petrolífero, de catastróficas dimensões, a roçar, ainda que forma subtil, o
reino da ficção científica, forçando o absurdo das situações e permanecendo fechado em perigosos
limites.
Diga-se, já, que o argumento procura dar a volta ao texto,
complexificando-o e abrindo para outros horizontes, mais
conformes à obra anterior do cineasta, um dos mais
interessantes da sua geração. Desde a média-metragem
"Respirar Debaixo de Água" (2000) que António Ferreira
mostrara dois particulares talentos: uma extrema mobilidade
de trabalho de câmara, a desvelar imaginativas soluções
visuais; e um interesse acrescido por ficções familiares, por
personagens de difícil inserção social e radical revolta
contra o meio atabafante em que se movem.
"Esquece Tudo o Que Te Disse" (2002), o seu melhor filme até hoje, pelo menos dos que conhecemos,
criava um microcosmos familiar, de conflitos surdos e confrontos geracionais com a rara noção do país
real, do isolamento do indivíduo face a condicionalismos sociais e comportamentais. Por isso, o melhor
de "O Embargo" passa pelo que não está em Saramago, uma família disruptiva, com um pai ausente e
vulnerável e um filho desambientado, numa casa triste e depressiva. A questão é saber se esta imagem
de classe encaixa na história "principal", de tal maneira temos, por vezes, a noção de que estamos
perante dois filmes algo desconexos, a que nem a presença crua do real (a roulotte dos cachorros
quentes e o patrão repressivo, por exemplo) consegue dar coesão.
Para agravar o problema, aparece um terceiro segmento narrativo que pretende aproveitar o ponto de
partida do conto e, em simultâneo, remeter para o esforço de melhorar as condições de vida do
acrescentado agregado familiar: uma sofisticada máquina de medir pés, invenção que o protagonista
pretende colocar a nível industrial, esbarrando, na sua demanda, com a dificuldade de se ver livre do
carro "assassino", ou melhor, "aprisionador". Ecos curiosos de "Christine", de John Carpenter, perdemse na pequenez da anedota, na escassa definição de personagens, desde as crianças que roubam
gasolina aos industriais de caricatura, a favorecer a rábula de José Raposo. Continuamos a acreditar
que António Ferreira filma lindamente, mas precisará no futuro de escolher melhor o material de base:
nem o conto de Saramago (o filme é melhor que o conto, diga-se) lhe fornece grandes hipóteses, nem
os acrescentos resolvem uma espécie de vazio que impera.
Ficamos à espera de mais ambiciosos voos de um realizador em que acreditamos.
Cineclube de Joane
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