Pesquisa e transcrição dos textos:
Carla Galdeano
Tradução e Revisão linguística
André Luís de Araújo, SJ
Produção
Pateo do Collegio
Fotografia
Helmuth Nils Loose
Projeto Gráfico
Núcleo de Comunicação Integrada - Brasil Centro Leste
Frederico Zarnauskas
Bicentenário de Restauração da Companhia de Jesus
1814-2014
DOCUMENTOS PARA A HISTÓRIA DA COMPANHIA DE JESUS:
SUPRESSÃO E RESTAURAÇÃO
Coletânea de documentos
publicados em comemoração ao
Bicentenário de Restauração da Companhia de Jesus
São Paulo
Pateo do Collegio / Edições Loyola
2013
Apresentação
A tragédia jesuítica do
século XVIII e sua superação
Um acontecimento histórico resulta de um processo que assume, concentra e sintetiza os diversos elementos que estiveram presentes, interagiram e convergiram em sua origem
e evolução.
A supressão da Companhia de Jesus de Portugal foi o
prelúdio de um movimento influente de hostilidades em relação aos jesuítas no decurso do século XVIII. Com diferentes
modalidades, as medidas contrárias à Companhia em Portugal
também foram adotadas por França e Espanha. Esse movimento culminou com o breve Dominus ac Redemptor, do
papa Clemente XIV, de 12 de agosto de 1773, com antedata
de 21 de julho, que decretou a supressão da ordem jesuítica
em toda a Igreja.
A decisão pontifícia foi o ato final e conclusivo de uma
diversidade de fatores históricos que atuaram e confluíram
para sua potencialização, desenvolvimento e desfecho.
Ao longo do século XVIII dilatou-se o círculo de hostilidades em relação à Companhia de Jesus: hostilizados pelos próprios
jesuítas, os jansenistas passaram ao contra-ataque mediante forte
propaganda e recorreram também aos aliados e simpatizantes
dentre os oficiais da Cúria Romana; na questão dos ritos chineses
e malabares, os adversários da Companhia de Jesus acusaram-na de admitir ritos idolátricos em suas missões e de se mostrar
desobediente às diretrizes romanas (onda de acusações, algumas
exageradas, outras mais fundamentadas); a influência dos jesuítas
no ensino acadêmico foi sendo cada vez atacada por docentes
e reitores universitários contrários à tendência ao monopólio
educativo; à irritação pelo crédito de que gozavam vários padres na corte, na alta sociedade,
nas famílias, uniram-se as controvérsias doutrinais sobre o probabilismo e outros pontos, que
acabaram por criar uma verdadeira frente única antijesuítica. No entanto, essa frente aversiva
jamais teria conseguido a supressão da Companhia de Jesus sem a contribuição das cortes
bourbônicas e seus mestres esclarecidos, que
por motivos diversos, e também pela persuasão
de que a Ordem constituía sério obstáculo a
seus intentos jurisdicionalistas, desenvolveram
um ataque sem precedentes aos jesuítas.
O movimento de reforma política, econômica, social e religiosa que alguns soberanos
europeus promoveram, no século XVIII, inspirava-se nos princípios do iluminismo. Movidos por
certo maniqueísmo histórico-cultural, os iluministas desprezavam o passado, considerando-o
a idade das trevas, e exaltavam o presente e o
futuro como a idade das luzes. Desenvolveu-se
uma hostilidade aberta e sem fronteiras contra a Igreja, à qual se queria reformar, mas que
no fundo se queria privá-la de qualquer influxo,
pelo menos sobre a classe dirigente. A vontade
dos soberanos absolutos era controlar inteiramente as atividades da Igreja e subtraí-la da jurisdição de uma autoridade estrangeira; em relação aos religiosos, a legislação visava a subtraí-los
da dependência de superiores residentes fora
do Estado e submeter suas atividades às dioceses – nesta dinâmica, a Companhia de Jesus,
como corpo ligado estreitamente ao papa, não
poderia passar despercebida e ilesa.
A supressão dos jesuítas foi consequência lógica do modo de agir governamental
que os considerava rivais em termos de influência e poder.
A entrada em vigor do breve apenas
após sua promulgação em cada uma das dioceses e a proibição de promulgação do documento pontifício por parte de Catarina da
Rússia permitiram que um pequeno grupo de
jesuítas poloneses sobrevivesse, com a aprovação oral de Pio VI e escrita de Pio VII (1801).
As luzes que brilharam, as sombras
que turvaram e as trevas que obscureceram
a realidade histórica da supressão da Companhia de Jesus podem ser contempladas
nestes documentos para a história da Companhia de Jesus−supressão e restauração
(1773-1814):
Defesa do Pe. Malagrida
(1758)
Carta do papa Clemente XIII a Dom José
(1759)
Pragmática de Carlos III
(27.02.1767)
Carta de Carlos III ao papa Clemente XIII
(31.03.1767)
Resposta do pontífice ao rei Carlos III
(16.08.1767)
Fragmento de carta do papa
Clemente XIV ao conde de Oieiras
(28.08.1769)
Fragmento de resposta do conde de Oieiras
ao papa Clemente XIV
(05.10.1769)
Breve “Dominus ac Redemptor” do papa
Clemente XIV, suprimindo a Companhia de
Jesus
(21.07.1773)
Carta de Dom José aos governantes dos domínios portugueses
(09.09.1773)
Bula “Sollicitudo omnium ecclesiarum”, do
papa Pio VII, restaurando a Companhia de
Jesus
(07.08.1814)
Pesquisados, transcritos e revistos pela
equipe do Pateo do Collegio e publicados
por Edições Loyola, em comemoração ao Bicentenário de Restauração da Companhia de
Jesus (1814-2014), esses textos testemunham
o espírito de uma época e contribuem para
que os amantes da História tenham em mãos
e diante dos olhos um material precioso com
o qual possam historiar, ou seja, interpretar
e compreender cientificamente uma fase do
passado eclesial e jesuítico.
Danilo Mondoni, SJ.
Sumário
I - DEFESA PE. MALAGRIDA, 1758.
Página 8
II - CARTA DO PAPA CLEMENTE
XIII A DOM JOSÉ, 1759.
VII - FRAGMENTO DE RESPOSTA DO
CONDE DE OEIRAS AO PAPA
CLEMENTE XIV, 5 DE OUTUBRO
DE 1769.
Página 24
Página 11
III - PRAGMÁTICA DE CARLOS III, 27 DE
FEVEREIRO, 1767.
Página 14
VIII - BREVE “DOMINUS AC
REDEMPTOR”, DO PAPA
CLEMENTE XIV, SUPRIMINDO A
COMPANHIA DE JESUS, 21 DE
JULHO DE 1773.
Página 26
IV - CARTA DE CARLOS III AO PAPA
CLEMENTE XIII, 31 DE MARÇO, 1767.
Página 16
V - RESPOSTA DO PONTÍFICE AO REI
CARLOS III, 16 DE AGOSTO 1767.
IX - CARTA DE DOM JOSÉ AOS
GOVERNANTES DOS DOMÍNIOS
PORTUGUESES, 9 DE SETEMBRO
DE 1773.
Página 48
Página 18
VI - FRAGMENTO DE CARTA DO PAPA
CLEMENTE XIV AO CONDE DE
fd, 28 DE AGOSTO DE 1769.
Página 22
X - BULA “SOLLICITUDO OMNIUM,
ECCLESIARUM” DO PAPA PIO VII,
RESTAURANDO A COMPANHIA
DE JESUS, 7 DE AGOSTO DE 1814.
Página 51
I. Defesa Pe. Malagrida, 1758
Defesa apresentada pelo Padre
Malagrida ao Papa Clemente XIII
Também o Padre Malagrida, vendo um tal desaforo nestas
infamantes publicações, tomou sobre si a defesa dos seus colegas de além-mar. Compôs uma apologia, num estilo muito
digno, que pudesse chegar a todas as mãos, e enviou-a ao
Papa Clemente XIII. Começava assim:
Beatíssimo Padre. Que triste espetáculo é tudo isso!
Que repentina metamorfose! Neste porto, onde outrora
tantos pregadores evangélicos costumavam partir para África, Ásia e América, vêm agora ancorar as naus carregadas de
missionários que voltam das missões. Não que eles, exaustos
com a sua atividade apostólica, anseiem regressar à sua pátria, na Europa, mas, como que fulminados por um raio, com
estupefação do povo cristão, eles são obrigados pelas autoridades dos reis a abandonar o seu campo apostólico, são
expulsos das missões pelo próprio governador – por ordem
do Rei, são lançados para fora delas, marcados com a ignomínia, atraiçoados pelos homens, esmagados de calúnias como
sedutores, traidores e proclamados inimigos do Estado. Eles,
que nunca deixaram de ser os defensores da paz e da concórdia! Ai de mim! Não sei para onde me voltar! Onde estará a
causa de tamanha calamidade? A quem atribuir a culpa desta
tão horrível tragédia? A Sua Majestade Fidelíssima? Mas, este
nobre filho dos piedosíssimos Reis, D. João V e D. Mariana de
Áustria, foi educado com todo esmero nos sãos princípios
de um príncipe religioso, cuidadosamente formado pelos padres da Companhia e dócil aos seus conselhos, como direto-
Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
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res que eram da sua consciência. É forçoso,
portanto, procurar em outros a causa de tão
nefasta tempestade. Se eu a atribuir ao Primeiro Ministro, Carvalho e Melo, não andarei
longe da verdade. Este autor de tanta ruína,
obcecado pelo esplendor do nome da nossa
Companhia, que lhe ofuscava os olhos cheios
de inveja, esforçou-se por obscurecê-lo com
os seus livros satíricos, espalhados por toda a
parte. A sua voz difundiu-se por toda a terra
e as suas palavras até aos confins do Mundo
(Sl 19, 5). Estas publicações atacam-nos com
um estilo tão violento e estão eivadas de ódio
tão cruel, virulento, implacável, que, se estivesse na mão do seu autor, não ficaria um só
Jesuíta com a cabeça sobre os ombros. Mas,
foi contra mim, que ele, principalmente, vomitou todo o vírus da crueldade que, desde
há muito, nutria no seu coração. Fui expulso
do palácio, exilado da Capital e encerrado no
Colégio de Setúbal, como que sob custódia.
Mas, qual terá sido a causa dessa súbita perseguição? Foi o fato de eu ter refutado a explicação dada pelos descrentes, que atribuíam
a causas meramente naturais o horrível terremoto da cidade de Lisboa. Eu apelei para
a autoridade dos Doutores da Igreja, para a
justiça de Deus, vingador severo dos pecados
dos homens. Defendi ardentemente a honra
de Deus. Se o Ministro me condena, acuse o
Tribunal da Sagrada Inquisição, acuse a Cúria Patriarcal, acuse o Desembargo do Paço,
acuse os três magistrados, que aprovaram o
meu sermão e concederam autorização para
o publicar etc...
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
II. Carta do Papa Clemente XIII
a Dom José, 1759
Filho Caríssimo em Cristo, Saúde e Bênção
Apostólica
O Embaixador de Vossa Majestade, Almada, informou esta Sé Apostólica sobre o
pedido concernente aos Jesuítas que vivem
no vosso reino. Nós, considerando maduramente este assunto, em virtude do nosso
ofício e dever pastoral, não nos fiando do
nosso próprio juízo, não cessamos dia e noite de implorar o divino auxílio junto ao altar
do Príncipe dos Apóstolos. A Ele temos suplicado que, derramando do Alto aquela luz
de que tanto precisamos nestes tempos tão
conturbados, nos dirija e nos indique o que
devemos fazer para a maior honra de Deus e
da Santa Igreja, e para o bem do nosso rebanho, nada desejando com mais ardor do que
paz e tranquilidade para o povo de Deus.
Nem se convença Vossa Majestade
que não tenhamos dado ouvido às queixas
que nos foram expostas. Temos em tanta estima e apreço a segurança e bem-estar de
Vossa Majestade como se de nós se tratasse. Pelo que, insistindo nos passos do nosso
antecessor Bento XIV, de saudosa memória,
rogamos e exortamos a Vossa Majestade
permita a continuação da visita apostólica
confiada ao nosso Cardeal Saldanha. Assim
se manterá a justiça: distinguindo os ino-
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
centes dos culpados, e se algum laxismo se
introduziu na Companhia de Jesus, ela será
chamada ao primitivo estado de perfeição.
Como é impossível que num corpo tão dilatado como a Companhia de Jesus não se
encontrem alguns membros contaminados
de imperfeições que devem ser purificados
ou amputados, assim nos parece incrível que
não haja entre eles muitíssimos inocentes,
homens retos, perfeitos e santos, como nos
consta a nós e a toda a Igreja de Deus; homens que, por todas as quatro partes do
mundo, propagaram a verdadeira fé e que,
com seus trabalhos, suores e até com o próprio sangue, fecundaram as terras incultas
dos bárbaros; homens que trouxeram ao
redil de Cristo inúmeros cristãos e gentios,
que ilustraram a Igreja com a doutrina e a
erudição dos seus escritos e a defenderam
contra os seus inimigos; homens entre os
quais há santos que veneramos nos altares,
por quem sabemos Vossa Majestade tem
particular devoção, embora muitíssimos outros sejam também dignos de tal honra. Por
isso pedimos a Vossa Majestade, com todo o
afeto do nosso coração paternal, que, como
filho obediente e fiel, ratifique o que por
nós for determinado, permita que a causa
da Companhia seja examinada por juízes
especialmente delegados por nós e que os
réus com culpa provada possam ser punidos
por estes, não se tomando os inocentes por
culpados. E, assim, a Companhia, tão grande
benemérita da Igreja, principalmente, naquelas longínquas terras de missão, purificada
de seus erros, seja conservada nos reinos de
Vossa Majestade. Tudo isso, não temos dúvida, Vossa Majestade fará à semelhança do
que sempre fez em tempos passados, como
também fará tudo aquilo que tão santo e
louvável Instituto exigir, procurando sempre
a maior glória de Deus e a salvação e segurança dos súditos de Vossa Majestade.
Suplicamos ainda a Vossa Majestade,
confiados na sua heroica piedade, que, se
rigorosamente examinada a causa, vier a
provar-se jurídica e plenamente (do que
Deus nos livre e de forma alguma nos podemos persuadir) a cumplicidade deles naquele horrível atentado, não queira Vossa
Majestade manchar as mãos no sangue daqueles que são consagrados a Deus como
ministros do altar. Assim, oferecerá Vossa
Majestade a Deus um grande sacrifício, merecerá para si todo o nosso afeto e legará
a todo o mundo cristão um nobilíssimo documento de sua piedade. Conseguindo isto
de Vossa Majestade, como um pai espera
de um filho obediente, a Vossa Majestade e
a toda a família real concedemos afetuosamente a bênção apostólica.
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III. Pragmática de Carlos III,
27 de Fevereiro, 1767
Tendo-me conformado com o parecer dos de meu Conselho Real, no Extraordinário que se celebra com motivo das ocorrências passadas, em consulta
de 29 de janeiro próximo, e do que sobre ela me têm exposto pessoas do
mais elevado caráter; estimulado de gravíssimas causas, relativas à obrigação
em que me encontro constituído de manter em subordinação, tranquilidade
e justiça meus povos, e outras urgentes, justas e necessárias que reservo em
meu ânimo como Rei; usando da suprema autoridade econômica que o Todo-poderoso depositou em minhas mãos para a proteção de meus súditos e
respeito de minha Coroa: venho mandar que se expulsem de todos os meus
domínios de Espanha e Índias, Ilhas Filipinas e demais adjacências, aos Religiosos da Companhia, sejam Sacerdotes, Coadjutores ou Religiosos que tenham
feito a primeira profissão, e aos Noviços que queiram segui-los; e que se ocupem de todos os estipêndios da Companhia em meus Domínios; e para sua
execução uniforme em todos eles, os dou em plena e privativa autoridade; e
para que formeis as instruções e ordens necessárias, segundo o tendes entendido e estimeis para o mais efetivo, rápido e tranquilo cumprimento. E quero
que não somente a Justiça e Tribunais Superiores desses Reinos executem
pontualmente vossos mandatos, mas que os mesmos se entendam com os
que dirigísseis aos Vice-Reis, Presidentes, Audiências, Governadores, Corregedores, Prefeitos e outras quaisquer Justiças daqueles Reinos e Províncias; e que
na virtude de seus requerimentos quaisquer tropa, milícia ou paisano deem
auxílio necessário sem demora nem subterfúgio algum, sob pena de cair em
que fosse omisso em minha Real indignação; e em cargo aos Padres Provinciais, Reitores e demais Superiores da Companhia de Jesus se conformem de
sua parte ao que se lhes previna, pontualmente, e se lhes tratará na execução
com a maior decência, atenção, humanidade e assistência, de modo que em
tudo se proceda conforme a minhas soberanas intenções. Tereis o entendido
para seu exato cumprimento, como a confiança de vosso zelo, atividade e
amor a meu Real serviço, e dareis para isso as ordens e instruções necessárias,
acompanhando exemplares deste meu Real Decreto, aos quais estando por
vós firmado, se lhes dará a mesma fé e crédito que ao original.
Assinado por Mão do Rei. No Pardo, a 27 de fevereiro de 1767.
Ao Conde de Aranda, Presidente do Conselho.
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IV. Carta de Carlos III ao
Papa Clemente XIII, 31 de Março 1767
A 1ª. Carta do Rei ao Papa em que lhe dá notícia do extermínio dos Jesuítas no seu Reino
é a seguinte.
Sabe Vossa Santidade melhor que
nenhuma outra coisa que a principal obrigação de um soberano é viver velando sobre a conservação tranquila de seu Estado,
decoro e paz inteira de seus súditos. Para
cumpri-la, vi-me em vigente necessidade de
resolver a pronta expulsão de meus Reinos
e de meus Domínios de todos os Jesuítas
que se encontravam estabelecidos neles ao
Estado da Igreja, sob a imediata, sábia e santa
direção de Vossa Santidade, Digníssimo Padre e Mestre de todos os fiéis. Cairia eu na
inconsideração de agravar a Câmara Apostólica obrigando-a a fazer gastos para a manutenção desses religiosos Jesuítas que tiveram a sorte de nascer súditos meus, se não
houvesse dado a precisa disposição como o
fiz, para que se dê a cada um, durante sua
vida, quantia suficiente para manter-se. Nesta hipótese, rogo a Vossa Santidade que essa
resolução minha seja vista puramente como
uma indispensável econômica providência
tomada, com maduro exame e profundíssima meditação. Fazendo-me Vossa Santidade
esta justiça, dará seguramente sobre esta
ação (como lhe suplico) e sobre todas as
minhas, que do mesmo modo se dirigem
à maior honra e glória de Deus, sua Santa
Apostólica bênção.
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V. Resposta do Pontíficie ao Rei Carlos III,
16 de Agosto 1767
De todos os estranhos contratempos que caíram sobre mim nos
nove infelizes anos do meu Pontificado, o mais sensível ao meu
coração paterno é claramente o que me faz saber a última carta de Vossa Majestade, em que me dá notícia da Resolução que
tomou de exterminar de todos os seus vastos Reinos e Estados
os Religiosos da Companhia de Jesus.Também (Vossa Majestade,
filho meu muito amado) quer encher o cálice das minhas aflições,
abandonar minha desgraçada velhice às lágrimas e à dor e, por
fim, precipitá-la no sepulcro? O muito religioso e piedoso Rei das
Espanhas, Carlos III, que devia estender seu braço (esse braço
poderoso que Deus lhe deu) para proteger e estender seu divino
culto, à honra da Santa Igreja e à salvação das almas, há de dar (é
possível?) este mesmo braço aos inimigos de Deus e da Igreja,
para transtornar inteiramente um Instituto tão útil e tão apreciado da mesma Igreja, um Instituto, digo, que deve seu caminho
e esplendor àqueles heróis eminentes em santidade que erigiu
Deus na nação espanhola para estender por toda a redondeza
da terra sua maior glória. Quererá privar para sempre a seus Reinos e aos povos dos inumeráveis socorros espirituais que a Igreja
retirou felicissimamente destes religiosos, nos dois últimos séculos,
seja na extensão de seu culto, seja no que se dirige a aperfeiçoá-lo com sermões, missões, catecismos, exercícios, administração
de sacramentos e instrução da juventude na piedade e ciência?
Ah, Senhor! À vista de tão deplorável desgraça minhas
forças desfalecem inteiramente. Mas ainda o que penetra mais
profundamente meu coração é o pensar que o muito sábio e
muito clemente Rei Carlos III cuja consciência é tão delicada,
quão puras suas intenções, se encheria de terror, crendo expor
sua salvação se permitisse causar o mais ligeiro prejuízo do mais
infeliz de seus súditos, sem discorrer regularmente sua causa e
sem observar a formalidade que as leis públicas prescrevem para
assegurar a cada cidadão tudo o que se lhe deve; e agora o mesmo monarca, crê que pode exterminar inteiramente a todo um
corpo de eclesiásticos dedicados e consagrados ao serviço de
Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
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Deus e do público e privar-lhes de sua reputação, de sua Pátria
e dos estabelecimentos que tinham, cuja posse não era menos
legítima que sua aquisição e isto sem examiná-los, sem ouvi-los,
e sem dar-lhes tempo para justificar-se? Ah, Senhor! Quão digno
das minhas mais sólidas reflexões devia ser esta conduta; pois
sem ela jamais poderá justificar-se suficientemente aos olhos de
Deus que é o soberano e o juiz de todas as criaturas. De que
servirá a Vossa Majestade a aprovação dos homens que lhe aconselharam, os aplausos dos que concorreram para sua execução,
o triste silêncio de seus leais súditos e a exemplar resignação
daqueles sobre quem se descarrega um golpe tão terrível? Enfim,
Senhor, eu experimento uma dor inexplicável como preciso resulta deste desgraçado fato; mas confesso ingenuamente a Vossa
Majestade que ainda são maiores o temor e o tremor que me
ocupam pela segurança de sua consciência e pela salvação de
sua alma que merece o mais singular apreço. Diz Vossa Majestade
que a este passo lhe obrigou o manter a paz e a tranquilidade
de seus súditos, com o que quer acaso dar-nos a entender que
algum alvoroço causado no governo de seus povos se moveu e
se fomentou por algum indivíduo da Companhia de Jesus. Ainda
que de todo isto seja certo, por que (o Senhor) não procurou
castigar os culpados sem descarregar a pena sobre os inocentes?
Inocentes absolutamente, os dizemos diante de Deus e dos homens, o corpo, o Instituto e o espírito da Companhia e não somente inocente, mas também útil e santo em seu objeto, em suas
leis, em suas máximas e, por mais que do contrário se tenham
esforçado provar seus inimigos, nenhuma outra coisa conseguiram com as pessoas não preocupadas nem apaixonadas, que o
nenhum crédito e o aborrecimento das mentiras e contradições
com que quiseram ou pretenderam estabelecer seu falso assunto. Este corpo se compõe de homens, como os outros capazes
de enganar-se, de errar e falhar; mas seus erros e culpas dos
particulares não têm apoio, nem fundamento nas leis, nem no
espírito do corpo. Mas, sobretudo, (o Senhor!) as consequências
que se inferem deste passo, como não horrorizar o ânimo piedo-
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
síssimo de Vossa Majestade? Deixemos à parte
a falta de operários diligentes na cultivadíssima
vinha das Espanhas; o fruto, utilidade e piedade
que costumava produzir-se: mas tantas missões
de países remotos e nações bárbaras fundadas,
imitadoras de Santo Inácio ou São Francisco
Xavier, em que estado ficarão logo que se vejam privadas de seus pastores e pais espirituais?
Se uma só ou muitas daquelas pobres almas, já
agregadas ou próximo de agregar-se ao rebanho de Cristo, viesse por isso a perecer, que gritos dará, no tribunal de Deus, contra quem lhe
tivesse subtraído os meios de sua salvação? Mas
o passo se deu, dirão os políticos, o empenho já
está tomado, a ordem Real publicada; que diria
o mundo se viesse a revogar ou suspender sua
execução? Que diria o mundo? Ou Senhor! E
por que não ainda: Que dirá o céu? Mas, que
dirá o mundo? Dirá o que digo e tantos séculos
continua, em dizer do potentíssimo monarca e
rei do Oriente Assírio, que revogando a ordem
desconsiderada que havia dado de dever degolar-se todos os Hebreus existentes em seus
domínios, movido das súplicas e lágrimas da rainha Esther, se adquiriu eterna fama de príncipe
justo e vencedor de si mesmo. Ah, Senhor! Que
bela ocasião de adquirir-vos igual glória. Não fazemos a Vossa Majestade as súplicas da rainha,
uma consorte que desde o céu vos recorda o
amor que teve à Companhia; senão as da sagrada esposa de Jesus Cristo, a Santa Igreja que
não pode ver sem lágrimas o extermínio total
do Instituto de Santo Inácio do qual até agora recebeu tão grandes ajudantes e servidores.
A que agregamos as nossas particulares e de
nossa cátedra romana, que quanto se preza do
constante afeto de Vossa Majestade e de seus
gloriosos predecessores, pela Santa Sé de São
Pedro, outro tanto se gloria de havê-la sempre
distinguido com as maiores demonstrações de
seu amor, assim a pessoa de Vossa Majestade
como a monarquia da Espanha. Suplicamos-lhe,
pelo nome dulcíssimo de Jesus, que é o glorioso
distintivo sob o qual militam os filhos de Santo
Inácio, e pelo da Bem Aventurada Virgem Maria,
cuja Imaculada Conceição têm sempre defendido, e por nossa afligida velhice, se incline e digne
de revogar, ou ao menos suspender, a ordem
por vós dada, e dê lugar ao regular exame do
negócio a justiça e a verdade, para que possam
dissipar-se as sombras das preocupações e das
suspeitas. Escutai os conselhos e pareceres dos
Mestres de Israel, dos bispos e religiosos em
uma matéria que interessa o estado, a honra
da Igreja, a saúde das almas, a de vossa própria
consciência e saúde eterna: e teremos por seguro que facilmente discernireis que não é justo às
culpas (se acaso são verdadeiras) de alguns indivíduos o castigo e extermínio de todo o corpo.
O conhecimento que temos da suma piedade
e da aclamada justiça de Vossa Majestade nos
enche de confiança de que serão ouvidas nossas súplicas amorosas abrasadas. Nosso paternal conselho, satisfeito nesta razoável e justa
demanda; e com esta bem fundada esperança,
damos a Vossa Majestade e a toda família real a
bênção apostólica:
Dado em Roma aos 16 de Abril ou Agosto
de 1767.
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VI. Fragmento de Carta do
Papa Clemente XIV ao Conde de Oeiras,
28 de Agosto de 1769
O Papa Clemente XIV escreve ao Conde de Oeiras (Pombal)
a 28 de Agosto de 1769.
“... Em terceiro lugar, em todos os particulares e mesmo nos negócios dessa Real Corte, queira ter a bondade
de no-los comunicar secretamente, pois nos lisonjeamos de
poder dar-lhe alguma prova do nosso sincero afeto. No assunto que também interessa a outras cortes, pedimo-lhes
que tenha confiança em nós, e não permita que pelos aliados nos sejam feitos certos embates pouco comedidos, que
não conduzam com segurança ao almejado fim que nos propomos alcançar. Confie no senhor comendador Almada por
nós cordialmente estimado, e tenha satisfação em conservar
em segredo esta nossa confiança comunicando-a, no entanto, a sua Majestade fidelíssima, a quem paternalmente damos
a nossa bênção apostólica compreendida à real família e ao
senhor mesmo a estendemos.”
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VII. Fragmento de Carta de Resposta do
Conde de Oeiras ao Papa Clemente XIV
em 5 de Outubro de 1769
“...Quando ao negócio da causa comum com as outras cortes
que tem instado pela dita extinção dos jesuítas em ficando El
Rei pela carta de vossa Santidade na certeza em que vossa
Santidade o põe, de que quer efetivamente extinguir os jesuítas, logo que para isso tiver prudente segurança e vendo
claramente que vossa Santidade a não teve, nem tem, na circunstância em que até agora se achou: não cabia na consumada circunspecção e filial ternura do dito Monarca mandar ao
referido seu Plenipotenciário outra instrução, que não fosse
a que ele secretissimamente comunicara a vossa Santidade.”
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VIII. Breve “Dominus ac Redemptor”,
do Papa Clemente XIV, Suprimindo a
Companhia de Jesus, 1773
“DOMINUS AC REDEMPTOR”
Breve do Papa Clemente XIV
suprimindo a Companhia de Jesus
Clemente XIV, para perpétua memória.
Nosso Senhor e Redentor Jesus Cristo, chamado o
Príncipe da Paz pelo Profeta, como tal se declarou, vindo ao
mundo, primeiramente aos pastores por intermédio dos anjos
e, depois, antes de subir ao céu, Ele mesmo o anunciou duas
vezes aos seus discípulos.
Havendo reconciliado todas as coisas com Deus, seu
Pai, pacificando, pelo sangue que derramou na Cruz, quanto
há sobre a terra e no céu, confiou aos Apóstolos o Ministério
e a Palavra da Reconciliação, a fim de que, completando a missão de Jesus Cristo, que não é o Deus da discórdia, mas sim
da Paz e da Caridade, anunciassem a paz ao universo inteiro,
trabalhassem com fervor e, por seu zelo e fadigas, inspirassem
a todos que foram regenerados em Jesus Cristo o vivíssimo
desejo de conservar a unidade do Espírito nos laços da Paz,
e não fazerem mais de que um só corpo, nem mais do que
um só espírito, assim como eles foram chamados por uma só
esperança de vocação, à qual ninguém chega, no dizer de S.
Gregório, se não caminhar em união com o próximo.
Desde o dia de nossa elevação à Cátedra de São Pedro,
da qual éramos inteiramente indignos, chamamos à memória, e
temos dia e noite diante dos olhos essa Palavra e esse Ministério de Reconciliação, que nos foram confiados pelo próprio
Deus, de um modo mais determinado: e, havendo-o gravado
profundamente no coração, temo-nos desvelado por exercê-lo
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da Companhia de Jesus
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com a maior solicitude, chamando sem cessar
em nosso auxílio, para o conseguir, a assistência
divina, a fim de que se dignasse inspirar-nos a
nós e a todo o rebanho do Senhor, ideias e
sentimentos de paz, e mostrar-nos o caminho
mais seguro de o alcançarmos.
Convencidos, além do mais, de que foi
a vontade de Deus que nos colocou sobre
nações e reinos para arrancar, destruir, dispersar, dissipar, construir e plantar; para cultivar
a vinha do Senhor e sustentar o edifício da
religião cristã, de que Jesus Cristo é a pedra
angular, sempre julgamos e cremos que se,
para repouso e sossego da cristandade, nada
nos era lícito omitir de quanto fosse próprio
a plantar e edificar, da mesma sorte, exigindo-o laço de uma caridade mútua, cumpria-nos
estar prontos e dispostos a arrancar e destruir
aquilo, mesmo que mais agradável nos fosse,
e cuja privação nos causasse amarga dor, vivo
desprazer e sentimento.
Entre todas as coisas que mais contribuem para se alcançar o bem-estar e a felicidade da cristandade, ocupam, sem dúvida, o
primeiro lugar as Ordens Religiosas, que, em
todos os séculos, têm sido o sustentáculo e
o ornamento da Igreja e das quais colheu Ela
sempre inúmeras vantagens.
É esta a razão pela qual a Santa Sé
Apostólica não somente as aprovou e protegeu, senão que também as encheu de benefícios e lhes concedeu isenções, privilégios e
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Bicentenário de Restauração
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poderes para as induzir, excitar e empenhar, no
cultivo da piedade e religião, para aperfeiçoar os costumes dos povos, com a palavra e o
exemplo, e para conservar, finalmente, arraigar
e fortalecer a unidade da fé entre os fiéis
Mas, chegando a tal ponto as coisas, ou
que o povo cristão não colhesse mais de certas Ordens Religiosas os frutos outrora tão
abundantes e ora tão desejáveis ainda, que
pela natureza de sua instituição deviam elas
produzir; ou que tais Ordens se tornassem
perniciosas e mais próprias a perturbar do
que a proporcionar a tranquilidade dos povos; a mesma Sé Apostólica, que empregara
seus cuidados em estabelecê-las, não hesitou
em dar-lhes novos regulamentos, ou em chamá-las à primitiva disciplina, ou mesmo em
dissolvê-las inteiramente.
Daí se conclui que, de forma alguma,
seria permitida a criação de qualquer Ordem
sem uma permissão especial do soberano
Pontífice. E nada há mais razoável: portanto,
sendo essas Congregações instituídas para
maior perfeição e amplitude do serviço de
Deus, a Santa Sé Apostólica deve examinar,
antes, com todo escrúpulo, a forma de seu
regime e disciplina, para que, sob a aparência
de um grande benefício e de vida mais santa,
não se introduzam na Igreja de Deus inconvenientes e, talvez, até males.
Embora tais leis fossem feitas sabiamente por Inocêncio III, nosso predecessor; todavia,
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mais tarde, não somente se extorquiu da Santa
Sé, por meio de súplicas inoportunas, a aprovação de várias Ordens Religiosas, senão também
que a temerária presunção de algumas deu azo
à criação de uma multidão infinita de outras
diferentes, sobretudo de mendicantes, que não
tinham sido ainda aprovadas. Semelhante abuso, por tal absolutamente reconhecido, fez que
Gregório X (também nosso predecessor), para
extirpá-lo e atalhá-lo de pronto, renovasse, no
Concílio Geral de Lyon, a proibição do mesmo
Inocêncio III e vedasse, ainda mais rigorosamente, a fundação de novas Ordens ou Congregações, abolindo para sempre todas as Congregações e as Ordens Mendicantes, que havendo-se
estabelecido posteriormente ao quarto Concílio de Latrão, não tinham obtido a aprovação
nem o consenso da Santa Sé. Porém, ao mesmo
tempo, ordenou que pudessem substituir as
que tivessem sido aprovadas até aquela época,
mas da seguinte maneira: que seria permitido
aos professos das mesmas Ordens conservarem-se nelas se o quisessem, com a condição
de não admitir mais ninguém para o futuro; que
lhes era proibido inteiramente a aquisição de
casas ou terrenos, bem como alienar as casas e
terrenos que possuíam sem permissão especial
da Santa Sé.
Efetivamente, o mesmo Papa reservou
todos esses bens à disposição da Sé Apostólica, para serem empregados, pelos seus comissários ou Ordinários do lugar, em socorro da
Terra Santa, em auxílio à pobreza, ou noutras
obras piedosas.
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
Interdito foi igualmente aos membros daquelas Ordens o direito de instruírem
com suas prédicas aos estranhos, de os ouvir
em confissão, de lhes administrar sepultura;
declarando, todavia, que nesta proibição formal, não se compreendia a Ordem dos Irmãos Pregadores, nem dos Irmãos Menores,
as quais tacitamente se deveriam ter como
aprovadas, em atenção à utilidade evidente
que a Igreja Universal delas colhia.
O mesmo Papa Gregório X quis, além
de tudo isso, que os Eremitas de Santo Agostinho e a Ordem dos Carmelitas ficassem no
mesmo estado, porque a sua instituição precedera o mencionado Concílio Geral de Latrão.
Finalmente concedeu a cada membro
das Ordens a que se estendia a decisão e
Decretos do Concílio, licença plena de entrarem nas outras Congregações anteriormente
aprovadas; observando, porém, que não se
entendia por tal licença a fusão de uma Ordem inteira noutra Ordem, a junção de outro convento com todos os seus bens, para o
que seria necessário permissão especial.
Vários Pontífices Romanos, nossos
predecessores, cujos Decretos seria longo
aqui enumerar, seguiram aquele exemplo e,
entre outros, Clemente V, que por Bula de
2 de Maio de 1312, aboliu e anulou totalmente a Ordem Militar dos Templários, por
causa do seu geral descrédito, embora legitimamente aprovada, mesmo que tivesse
outrora prestado a toda a cristandade benefícios tão importantes que por eles a Santa
Sé lhes havia enchido de favores e lhes tinha
concedido privilégios, mercês, isenções e
poderes muito amplos; ao qual submetera o
exame dessa questão, fosse de parecer que
se abstivesse de pronunciar a tal respeito
sentença formal e definitiva.
O Papa Pio V, também nosso predecessor, cuja eminente santidade a Igreja Católica honra e venera com religioso culto,
fez extinguir completamente a Ordem dos
Irmãos Humilhados, anteriormente ao Concílio de Latrão e aprovada por Inocêncio III, de
feliz memória, por Honório III, Gregório IX
e Nicolau V, e a destruiu pela desobediência
aos Decretos Apostólicos, por causa de suas
dissensões internas e externas: porque não se
entrevia a esperança de os chamar à virtude;
e porque também alguns de seus membros
haviam formado uma horrível conspiração
contra a vida de São Carlos Borromeu, Cardeal, Protetor e Visitador da supradita Ordem.
O Papa Urbano VIII, de grata memória, também suprimiu e aboliu em perpétuo,
por seu Breve de 06 de Fevereiro de 1626, a
Congregação dos Irmãos Conventuais Reformados, solenemente aprovada por Sisto V e
por ele grandemente beneficiada, sendo unicamente razão para isso não recolher para a
Igreja de Deus os frutos espirituais que eram
de se esperar desses religiosos e haver graves
desinteligências entre os mesmos Conventu-
ais Reformados. Outorgou e concedeu à Ordem dos Irmãos Menores Conventuais de São
Francisco as casas, conventos, terrenos, móveis,
bens, efeitos, ações e direitos que pertenciam
a esta Congregação, excetuando simplesmente a casa de Nápoles e a de Santo Antônio
de Pádua, denominada de “Urbe”. Incorporou
esta última à Câmara Apostólica, deixando-a
a sua disposição e dos seus sucessores. Finalmente, aos religiosos da mencionada Congregação abolida, permitiu que entrassem na Ordem dos Irmãos de São Francisco, apelidados
de Capuchinhos ou da Observância.
O mesmo Urbano VIII, por outra Bula
de 2 de Dezembro de 1643, suprimiu e aboliu
perpetuamente a Ordem Religiosa de Santo
Ambrósio e de São Barnabé “ad Nemus”; submeteu os membros desta Ordem à jurisdição
e censura dos Ordinários do lugar e também
lhes concedeu a permissão de se filiarem às
outras Ordens aprovadas pela Santa Sé.
Inocêncio X, como os outros, nosso predecessor igualmente, confirmou na sua Bula de
1º de Abril de 1645 esta supressão; secularizou,
além disso, os benefícios, casas e mosteiros da
dita Ordem, mandando que de futuro ficassem,
e por todo o sempre, seculares.
Foi ainda Inocêncio X, quem, pelo seu
Breve de 16 de Março de 1645, e para serenar as discórdias entre os Religiosos Pobres
da Mãe de Deus e das Escolas Pias, reduziu
tal Ordem, ainda que solenemente aprova-
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da por Gregório XV, à simples Congregação, sem pronunciamento de voto algum, a
exemplo da dos Padres Seculares do Oratório, estabelecido na Igreja de Santa Maria
“In Vallicella de Urbe”, sob a denominação de
São Felipe de Neri. Aos seus membros concedeu o direito de entrarem noutra qualquer
Ordem confirmada, proibiu-lhes a admissão
de noviços e a profissão aos admitidos. Enfim, transferiu a jurisdição aos Ordinários do
lugar, coisa que dantes só andava em mãos
do Ministro Geral, Visitador e outros Superiores. Estes regulamentos estiveram em rigorosa execução durante alguns anos, até que
a Santa Sé, convencida da utilidade do dito
Instituto, revogou-o, reintegrou-o a sua antiga
forma de votos solenes e o restabeleceu no
pé de Ordem absolutamente Regular.
A Bula de 29 de Outubro de 1650,
dada pelo mesmo Inocêncio X, suprimiu totalmente a Ordem de São Basílio dos Armênios,
origem das muitas dissensões e desavenças
que ali havia. Submeteu fraternalmente esses
religiosos à mesma jurisdição e obediência
dos Ordinários do lugar: deu-lhes o hábito de
clérigos seculares, consignando-lhes pensões
suficientes de suas próprias rendas; e também
lhes deixou o direito de poderem unir-se a
quaisquer das Ordens aprovadas.
Mencionaremos ainda a Bula do mesmo Papa Inocêncio X, nosso predecessor,
dada aos 22 de Julho de 1651, que extinguiu
para sempre a Congregação dos Padres do
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Bom Jesus, por considerar que dela a Igreja não tinha mais esperança de algum fruto
espiritual: sujeitou os seus membros à jurisdição dos Ordinários do lugar; assegurou-lhes,
dos seus haveres, uma subsistência decente;
deu-lhes igual faculdade de entrarem noutra
Ordem aprovada pela Sé Apostólica e reservou para si o direito de aplicar os bens desta
Congregação a piedosos fins.
Em conclusão: Clemente IX, reconhecendo que das três seguintes Ordens: a dos
Cônegos Regulares, chamados de São Jorge
“in Alga”, a dos Hieronimitas “de Fesulis” e a
dos Jesuatas, estabelecidos por São João Columbano, se colhia mui pouca ou nenhuma
utilidade e vantagem para os cristãos, e nem
delas se poderia esperar, no futuro, melhores
proveitos, tomou a resolução de as suprimir
e abolir, o que executou por um Breve dado
aos 6 de Dezembro de 1668; e, a pedido da
República de Veneza, decretou os seus cabedais e propriedades, que eram consideráveis,
se destinassem a fazer as despesas da guerra
que os venezianos sustentavam contra os turcos, na Ilha de Cândia.
E os mesmos predecessores, ao mesmo tempo em que lavravam tais Decretos e
os faziam cumprir, entenderam dever sempre usar de certa cautela de meios, para não
darem cabimento às dissensões, evitarem
disputas, fúria ou ódio de partido. É por isso
que, desprezando o método moroso e difícil
que se usa nos processos, guiaram-se pelas
leis da prudência unicamente, e com a plenitude dos poderes de que gozavam como
Vigários de Cristo na terra, e como Administradores supremos da cristandade, executaram todas essas coisas, sem consentir às
Ordens, cuja supressão estava resolvida, que
fizessem valer os seus direitos, ou que procurassem destruir as graves acusações que
pesavam sobre elas, nem tampouco pudessem refutar a insuficiência de provas que os
determinaram a dar tal passo.
Assim, pois, tendo ante aos olhos esses exemplos e outros de grande peso e da
maior autoridade, – ansiosos por caminhar
com segurança e passo firme na resolução de
que mais adiante falaremos – nem cuidados,
nem esforços, nem pesquisas omitimos, para
conhecer a fundo quanto se prende à origem,
aos progressos, ao estado atual da Ordem
Religiosa comumente chamada Companhia
de Jesus. O resultado dos nossos exames minuciosíssimos é: - que tal Ordem foi estabelecida e criada, pelo seu santo Fundador, para
a salvação das almas; - para a conversão dos
hereges, especialmente dos infiéis; - para dar
à piedade e à religião maior esplendor e engrandecimento; - que, a fim de conseguir mais
fácil e propiciamente o almejado intento, fora
a Deus consagrada pelo voto rigoroso de pobreza evangélica, em comum e particular, excetuando-se as casas de estudo e belas letras,
às quais se concedia a posse de rendimentos,
com a cláusula, no entanto, de que deles nem
a mais mínima parte se poderia usar e aplicar
em vantagem, utilidade ou uso da Companhia.
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Foi segundo estas leis e outras igualmente sábias, que
Paulo III, nosso predecessor, aprovou a Companhia, por Bula
de 27 de Setembro de 1540, e a autorizou a redigir regulamentos e estatutos que firmassem a sua tranquilidade, existência e regime; e, posto que então se restringisse a nascente
Companhia ao número de 60 religiosos, mais tarde, por outra
Bula de 28 de Fevereiro de 1543, deixou aos superiores que
nela recebessem todos aqueles cuja admissão lhes parecesse útil ou necessária. Foi logo após que o mesmo Paulo III,
por outro Breve de 15 de Novembro de 1549, lhe concedeu extensos e numerosos privilégios; aos Prepósitos Gerais
conferiu o direito de admitirem 20 padres, na qualidade de
partilharem das mesmas faculdades, dos mesmos benefícios e
da mesma autoridade que os professos gozavam.
Depois mandou que tal permissão se estendesse, sem
a menor restrição e sem número limitado, a quantos fossem,
pelos mesmos Prepósitos Gerais, considerados dignos dela.
Além disso, a Companhia em si, todos os membros que a
compunham, os seus bens e fortunas foram subtraídos a toda
a ação e jurisdição dos Ordinários do lugar, e o mesmo Papa
os tomou sob a sua imediata proteção e da Sé Apostólica.
Os nossos predecessores tiveram para com a Companhia idêntica, se não mais ampla liberalidade. Júlio III, Paulo IV,
Pio IV e V, Gregório XIII, Sisto V, Gregório XIV, Clemente VIII,
Paulo V, Leão XI, Gregório XV, Urbano VIII e outros soberanos
Pontífices, ou confirmaram, ou aumentaram, ou determinaram mais exatamente os privilégios já outorgados à mesma
Companhia. Entretanto, o mesmo teor e forma dessas outorgas apostólicas nos revelam que a Companhia, ainda quase na
infância, viu erguerem-se no seu seio vários germes de discórdias e invejas, não só entre seus membros, como também
com outras Ordens Religiosas, com o clero secular, Academias, Universidades, Colégios, escolas públicas e até com so-
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da Companhia de Jesus
beranos que os acolheram em seus Estados;
e que essas dissensões nascidas, ora em razão
da natureza e caráter dos votos, do tempo de
admissão aos votos, da faculdade de despedir
os membros, da competência de lhes conferir ou não as Ordens Sacras, sem côngrua e
sem votos solenes, o que é literalmente contrário às prescrições do Concílio de Trento e
de Pio V; ora vinham as discórdias a respeito
do poder absoluto que o Geral se arrogava,
e de outros artigos concernentes ao regime
da Companhia; ora, finalmente, a respeito de
colégios, de isenções e privilégios, que Ordinários do lugar e outras pessoas constituídas
em dignidade eclesiástica ou secular contestavam ser nocivas a sua jurisdição, a seus direitos. Finalmente, não houve acusação mais grave que não se fizesse aos mesmos religiosos,
que não pouco perturbaram a tranquilidade
e a paz da cristandade.
Daí romperam mil queixas contra a
Companhia, que foram levadas a Paulo IV, e
transferidas a Pio V e a Sisto V, nossos predecessores, apoiadas pela autoridade e relatórios de alguns monarcas. Entre outros,
Felipe II, Rei Católico da Espanha, de ilustre
memória, patenteou a Sisto V, não somente
motivos graves e urgentes que o moviam,
bem como reclamações que lhe tinham sido
feitas pelos Inquisidores da Espanha contra
os privilégios excessivos da Companhia de
Jesus e a forma de seu regime, mas também
os pontos de disputa, confirmados por alguns membros da Companhia, notáveis por
sua ciência e piedade, solicitando deste Pontífice uma visita Apostólica da Companhia.
A zelosa petição de Felipe II tinha por
certo fundamento a equidade, pois Sisto V a
acolheu benignamente e nomeou como Visitador Apostólico um Bispo, tido por todos
como homem de grande prudência, virtude e
talento. Além disso, designou uma Congregação de Cardeais, que deviam empregar todo
o cuidado e vigilância nessa questão. Mas, com
a morte prematura do referido Papa Sisto V,
nosso predecessor, o salutar projeto caiu no
esquecimento e não teve sequência.
Gregório XIV, apenas ocupara a Cátedra de São Pedro, deu por sua Bula de 28 de
Junho de 1591, nova e mais completa aprovação ao Instituto da Companhia. Confirmou e
ratificou todos os privilégios que anteriormente lhe haviam sido conferidos pelos seus predecessores e, mais notoriamente, o de excluir
e expulsar de seu grêmio qualquer membro,
sem emprego de nenhuma forma judicial, sem
detenções, embora essencial fosse, e simplesmente com a constatação da verdade, só tomando em consideração a culpa ou razoável
causa, as pessoas e outras circunstâncias.
Além disso, impôs um profundo silêncio e proibiu, sobretudo sob pena de excomunhão “latea sententiae”, que se ousasse
atacar direta ou indiretamente o Instituto, as
Constituições e Decretos da Companhia, ou
se buscasse fazer-lhe a menor alteração.
Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
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Todavia deixou a cada um o direito de
propor e peticionar, a ele somente e aos Papas seus sucessores, fosse por meio de delegados ou núncios da Santa Sé, tudo quanto se
julgasse dever-lhes ajuntar, suprimir ou alertar.
Todas estas precauções não puderam
abafar os clamores e queixas contra a Companhia: ao contrário, então se viu espalharem,
recrudescerem sempre mais, por quase todo
o Universo, vigorosas contestações relativas à
doutrina desta Ordem, que muitos denunciaram ser incompatível com a fé ortodoxa e os
bons costumes. No seio da mesma Companhia
e fora, ergueram-se dissensões; e, entre várias
outras acusações intentadas, arguiram-na de
buscar com excessivo ardor os bens da terra.
Tal foi a origem dessas agitações, por
demais conhecidas, que tanta dor e pesar
causaram à Sé Apostólica; tal é o motivo por
que diferentes monarcas tomaram o partido
contra a Companhia.
Sucedeu-se daí que convindo a esses
religiosos obter de Paulo V, de feliz memória,
uma nova confirmação do seu Instituto e privilégios, foram forçados a pedir-lhe a graça de
sancionar e prover, por sua autoridade, alguns
Decretos publicados na 5ª Congregação Geral e inseridos palavra por palavra, na sua Bula
de 4 de Setembro de 1606.
Rezam esses Decretos expressamente
que a Companhia, reunida em Congregação
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
Geral, fora obrigada, tanto por causa da desarmonia e inimizade fomentada no interior,
como por causa das queixas e acusações de
estranhos, a estatuir o seguinte:
“A nossa Companhia, que foi suscitada
por Deus, para propagação da fé e salvação
das almas como pôde, pelos naturais efeitos
das suas instituições que são as armas espirituais, atingir felizmente, sob o estandarte da
Cruz, o fim a que se propôs com utilidade
para a Igreja e edificação do próximo; assim,
por outro lado, destruiria essas vantagens, e
expor-se-ia aos maiores perigos se ela se ingerisse em negócios mundanos, os assuntos
que dizem respeito à política e governos dos
Estados. Eis porque nossos antecessores sabiamente prescreveram que servindo a Deus,
não nos intrometêssemos em objeto contrário à nossa profissão.
Como, porém, nestes tempos calamitosos, a nossa Ordem, talvez por causa da ambição ou do zelo indiscreto de alguns de seus
membros, se veja mal vista e desconsiderada
junto a alguns soberanos, (dos quais o nosso
Padre Santo Inácio, de bem-aventurada lembrança, nos recomendou, no entanto, conservar a benevolência e afeição, para maior agrado de Deus) e que fora disso, a boa opinião é
necessária para produzir bons frutos, a Congregação considerou que cumpria abster-se
de toda aparência do mal, prevenir e atalhar,
quanto possível fosse, as queixas, embora fundadas em enganosas conjecturas.
Portanto, pelo presente decreto, proíbe em forma grave e severa a todo religioso
de se ingerir de qualquer maneira, em tais negócios públicos, mesmo quando sejam a isso
convidados, ou tenham outra razão que a isso
os prenda, e de não se apartar dos preceitos
do Instituto nem por súplicas, nem por instância; recomendando aos padres definidores
de fixar, regular e prescrever os meios mais
apropriados para remediar os abusos, quando for necessário”.
Estes expedientes e outros muitos
tomados posteriormente não tiveram, com
amarga dor o observamos, bastante eficácia,
nem forma bastante para destruir e apaziguar
os distúrbios, as acusações e encrespações
feitas contra a Companhia. Outros nossos
predecessores, Urbano VIII, Clemente IX, XII
e XIII em vão se esforçaram para restituir à
Igreja a desejada tranquilidade, por meio de
vários regulamentos e leis, quer concernentes aos negócios seculares, dos quais a Companhia não se poderia ocupar ao tempo ou
fora do tempo das Missões, quer tendentes
às graves desinteligências e vivas controvérsias suscitadas por seus membros (não sem
grande escândalo) contra os Ordinários do
lugar, contra as Ordens Religiosas, contra as
comunidades de qualquer natureza, na Europa, na Ásia e na América; - quer mesmo
relativos à interpretação e prática de certos
ritos pagãos, omitindo os que são aprovados
pela Igreja Universal; - quer também com
respeito ao uso e interpretação de certas
máximas, justificadamente proscritas como
escandalosas pela Sé Apostólica, e por sem
dúvida contrárias aos bons costumes; - quer
finalmente com relação a outros assuntos de
máxima importância e absolutamente necessários para conservar aos dogmas da Religião
cristã toda a sua pureza, integridade e esplendor, cuja perda tem ocasionado, neste e nos
séculos precedentes, imensos abusos e males
extraordinários, tais, por exemplo, como perturbações e tumultos em diversos Estados
Católicos, e até perseguições contra a Igreja
em algumas províncias da Ásia e da Europa.
Todos os nossos antecessores tiveram
com esta Companhia vivas aflições; entre
outros, o Papa Inocêncio XI, de mui piedosa
memória, que se viu constrangido a vedar-lhe
que desse o hábito a noviços; Inocêncio XIII,
que foi obrigado a ameaçá-la com a mesma
pena; e, enfim, Bento XIV, que decretou uma
visita de investigação a casas e colégios estabelecidos no Estado do nosso mui prezado
filho em Jesus Cristo, o Rei Fidelíssimo de
Portugal e Algarve.
E nem depois a Santa Sé colheu consolação alguma, nem a Companhia proveito,
nem a cristandade vantagem das últimas Cartas Apostólicas de Clemente XIII, que foram
antes extorquidas (segundo a expressão que
usou Gregório X, no Concílio Ecumênico de
Lyon, já citado) do que obtidas, e nas quais se
exalou ao infinito e se aprovou novamente o
Instituto da Companhia de Jesus.
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Depois de tantas borrascas, de tantos
abalos e de tão horríveis tempestades, os verdadeiros fiéis esperavam que se visse finalmente raiar o dia em que se devia restabelecer a
calma e a paz profunda. Mas, no Pontificado do
mesmo Clemente XIII, agravaram-se os males
e a tormenta foi crescendo mais e mais.
Os clamores e as arguições contra a
Companhia aumentavam dia após dia; em algumas partes ergueram-se tumultos, dissenções, sedições perigosíssimas e não poucos
escândalos, que, partindo e aniquilando totalmente os laços de fraternidade cristã, acenderam nos corações o espírito de partido, os
ódios e as inimizades.
O perigo cresceu a tal ponto, que
aqueles mesmos cuja piedade e benevolência
hereditárias para com a Companhia são positivamente reconhecidas, queremos dizer, os
nossos mui amados filhos em Jesus Cristo, os
reis da França, Espanha, Portugal e das duas
Sicílias, viram-se na imperiosa necessidade de
expulsar e banir de seus Reinos, Estados e
Províncias, todos os religiosos desta Ordem,
profundamente convencidos de que este
meio extremo era o único remédio a tantos
males, e o único a empregar para impedir que
os cristãos se provocassem uns aos outros,
se injuriassem mutuamente, e se digladiassem
no seio da própria Igreja, sua Mãe comum.
Mas esses mesmos reis, nossos mui prezados filhos em Jesus Cristo, sabiam que tal
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recurso não podia ter duráveis e salutares efeitos, nem bastava a restabelecer a tranquilidade
no universo cristão, se a própria Companhia
não fosse em seguida inteiramente abolida.
Por isso, patentearam ao dito Clemente XIII os seus desejos e vontade, pedindo
todos a um só tempo, escudados em sua autoridade, auxiliada por súplicas e instâncias,
que lhes assegurasse a seus súditos o bem
geral da Igreja.
Mas, apenas havíamos sido elevados,
pela misericórdia do Senhor, à Cátedra de
São Pedro, logo se nos fizeram os mesmos
pedidos, súplicas e instâncias, às quais grande
número de bispos e de outros personagens
ilustres por sua dignidade e ciência uniram os
rogos e o apoio de sua opinião favorável.
Todavia, para marcharmos com mais
segurança, lealdade e consciência em coisa de
tamanho peso e gravidade, julgamos necessário espaçar o julgamento: a uma, para procedermos à rigorosa pesquisa e escrupuloso
exame; a outra para que o tempo nos deixasse deliberar, com toda a prudência necessária,
e também para implorarmos do Pai Eterno,
que nos criou, que nos socorresse com o auxílio de sua luz divina, pelos rogos constantes
e pelas súplicas e boas obras dos fiéis.
Importava, sobretudo, sabermos e examinarmos que fundamento havia em dizer-se,
e donde vinha essa crença tão geralmente es-
palhada, que o Instituto dos clérigos da Companhia de Jesus fora aprovado e confirmado
solenemente pelo Concílio de Trento. E, pois,
apraz-nos aqui dizer que das indagações concluímos que o mesmo Concílio fez menção
desta Ordem somente para excetuar do decreto geral, em que se estabeleceu, relativamente às outras Ordens Religiosas, que após
o tempo do Noviciado os noviços seriam
admitidos a professar ou seriam demitidos
da Companhia, segundo se julgassem dignos.
Eis porque o precitado Concílio (Sec. 25, Cap.
XVI de Regular) declarou nada querer inovar,
nem tolher tampouco a esses religiosos de
servirem a Deus e à Igreja, nos termos de seu
Instituto aprovado pela Santa Sé.
Assim, portanto, depois de madura reflexão, auxiliados, ousamos crê-lo, pela presença e inspiração do Espírito Santo:
- forçados, além disso, pelo dever do
nosso cargo, que nos impõe essencialmente
a obrigação de buscar, manter e consolidar
o repouso e a tranquilidade do povo cristão,
extirpar inteiramente tudo quando possa
causar-lhe o menor dano;
- por outro lado, reconhecendo que a
Companhia de Jesus jamais poderia tornar a
produzir os abundantes frutos e as vantagens
consideráveis para que fosse instituída e a que
deveu ser aprovada por tão grande número
de Papas, nossos predecessores, e enriquecida com lautos privilégios e que seria quase, se
não totalmente impossível que a Igreja nunca,
enquanto a dita Ordem existisse, gozasse de
paz verdadeira e sólida;
- impelidos por tão poderosas razões
e constrangidos por outros motivos, que nos
Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
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sugerem as leis da prudência e a sábia administração da Igreja Universal, e que deixamos
cerrados no âmago do coração;
- seguindo o exemplo e os passos de
muitos dos nossos predecessores, particularmente os de Gregório X, no Concílio Geral
de Lyon, pois que, da mesma sorte, ora se
trata de uma Sociedade compreendida no
número das Ordens Mendicantes, assim pelo
seu Instituto, como pelos seus privilégios;
- após acurado exame, e porque temos real ciência de tudo;
- pela plenitude dos nossos poderes
apostólicos: Nós suprimimos e abolimos a
Companhia de Jesus; ab-rogamos e dissolvemos todos e cada um dos cargos, empregos
e administrações, casas e escolas, colégios,
recolhimentos, abrigos, granjas e quaisquer
outros estabelecimentos que lhe pertençam,
por algum título e de qualquer maneira, e seja
qual for a Província ou Estado onde se achem
situados; anulamos os seus estatutos, praxes,
costumes, Decretos, regulamentos, mesmo
os confirmados por juramento, por aprovação da Santa Sé, ou por outra diversa forma;
e, outrossim, anulamos todos os seus privilégios e indultos gerais e particulares, cujo teor,
conceito e pensamento, mandamos se considerem tão plena e textualmente inseridos na
presente Bula, como se de fato o estivessem
palavra por palavra, e não obstante qualquer
fórmula ou cláusula em contrário, todo o de-
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
creto ou lei em que se apoiem, fiquem virtualmente compreendidos nesta supressão.
Declaramos, portanto, perpetuamente
cassada e absolutamente extinta toda sorte
de autoridade, seja espiritual seja temporal,
do Geral, dos Provinciais, dos Visitadores e
outros chefes desta Companhia e transferida
essa mesma autoridade, inteiramente, sem a
menor restrição, aos superiores das Dioceses,
conforme as circunstâncias e as pessoas, na
forma e condições que abaixo notificaremos;
proibindo, como pela dita Companhia, quem
quer que seja, que se admitam noviços, ou se
dê o hábito a alguém.
Igualmente será proibida a admissão
daqueles que anteriormente hajam sido recebidos a pronunciar votos simples ou solenes,
com pena de nulidade da sua admissão ou
profissão, e com outras de nosso alvitre.
Além disso, ordenamos e prescrevemos
que os noviços atuais sejam todos, imediatamente, de pronto e realmente, despedidos,
proibindo também que os não iniciados em
nenhuma Ordem Sagrada e os que somente
fizeram votos simples possam ser promovidos
às Ordens Maiores, quer sob o pretexto e a
título de sua profissão, quer em virtude dos
privilégios outorgados à Companhia, contra os
Decretos do Concílio de Trento.
Porém, como o intuito que visamos e
almejamos atingir é de velar pelo bem geral
da Igreja e tranquilidade dos povos: ao mesmo tempo correr e consolar a cada um dos
membros desta Companhia, cujas pessoas
paternalmente amamos no Senhor, a fim de
que, livrando-os das contestações, disputas e
penas, de que até o presente eram vítimas,
cultivem com melhor fruto a vinha do Senhor,
e trabalhem mais eficazmente na salvação das
almas; e pois que, em virtude dos privilégios da
Ordem, podiam dela ser excluídos, sem mais
causa além da vontade, alvitre e ditame dos
Superiores, e sem que a essa exclusão precedesse processo ou forma alguma judiciária, nós
estatuímos e ordenamos que os membros da
aludida Companhia, ainda não iniciados nas
Ordens Sacras, e que apenas tenham feito
votos simples, sejam desligados desses mesmos votos e devam sair das casas e colégios
da Companhia e cada qual abraçará o estado
mais conforme à sua vocação, às suas forças e
à sua consciência, num espaço de tempo que
lhe será fixado pela autoridade diocesana, cujo
tempo se haja por suficiente para buscarem
qualquer emprego ou ocupação de benfeitores que os protejam, mas nunca excederá de
um ano, a contar da data do presente Breve.
Relativamente aos que tomaram as Ordens Sagradas, concedemos-lhes, ou deixarem
as casas ou colégios da Companhia e entrarem
em qualquer outra Ordem Religiosa aprovada pela Santa Sé, onde terão de preencher o
tempo de noviciado prescrito pelo Concílio de
Trento, se é que fizeram somente votos simples na Companhia, e, se fizeram votos solenes,
o tempo então de noviciado não irá a mais de
seis meses, em virtude da dispensa que para
isso lhes damos; ou se conservarem simplesmente como padres e clérigos seculares, sujeitos, subentende-se, à autoridade e jurisdição
do Ordinário do lugar onde houverem de estabelecer o seu domicílio.
E aos que assim secularmente se conservarem, será votada, até que de outra parte
se socorram, uma conveniente pensão, provinda das rendas da casa ou colégio a que
pertenciam, tendo, porém, em conta as rendas e os ônus da mesma casa ou colégio.
Os professos, contudo, que já tinham
recebido as Ordens Sagradas, e que, temendo não haver de que passar honestamente,
quer por falta ou exiguidade de sua pensão,
quer pela dificuldade de obter um asilo; ou
que por muito idosos, ou enfermos, ou qualquer outro motivo razoável e justo, acharem
não oportuno abandonar os colégios e casas
da Companhia; - esses terão a faculdade de aí
morar, sob cláusula explícita de não conservarem nem exercerem administração alguma
nesses estabelecimentos, de não usarem senão vestes seculares, se submeterem inteira
e lealmente ao Ordinário daquele lugar. Mas
lhes proibimos formalmente de substituírem
outro qualquer dos membros que venha a
faltar; de adquirirem, no futuro, casa ou lugar,
conforme aos Decretos do Concílio de Lyon,
e de alienarem as casas, as coisas e lugares
que possuem atualmente.
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Poderão, todavia, reunir-se em uma só
casa, ou mais de uma, conforme o número
dos que assim ficarem, de maneira que possam as casas assim evacuadas aplicar-se a fim
piedoso, segundo se veja estar mais em harmonia, em seu tempo e lugar, com os santos
cânones e com a vontade do fundador; e ser
mais útil ao aumento da religião e salvação
das almas e ao bem-estar do povo.
Igualmente, declaramos que ficam
também compreendidos, nesta abolição geral
da Ordem, todos os membros dela anteriormente expulsos, em qualquer país, e mandamos que esses Jesuítas banidos, embora tenham Ordens Sagradas, se não foram ainda
admitidos em nenhuma outra Congregação,
não tenham desde agora outro estado senão
o de clérigos e presbíteros seculares e fiquem
totalmente sujeitos aos Ordinários do lugar.
Se as precitadas autoridades reconhecerem, contudo, que os indivíduos, transferidos em virtude desse Breve, do Instituto da
Companhia ao estado de padres seculares
possuem a necessária doutrina e pureza de
costumes, poderão conceder-lhes ou recusar-lhes, a seu arbítrio, a permissão de confessarem os fiéis e de pregar ante o povo; e sem
esse consentimento, obtido por escrito, nenhum exercerá tais funções.
Entretanto, os bispos e as autoridades
competentes não concederão jamais essas faculdades, relativamente aos estranhos, àque-
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les que viverem nos colégios e casas outrora
pertencentes à Companhia e, consequentemente, nós lhes proibimos de pregar e de
administrar aos estranhos o sacramento da
penitência, da mesma forma que o nosso predecessor Gregório X o proibiu, no Concílio já
acima aludido.
Impomos expressamente à consciência
dos bispos de velar pela execução de todas
estas coisas pensando incessantemente na rigorosa conta que terão de dar a Deus um dia,
do rebanho confiado à sua guarda e cuidado,
e de se lembrarem da terrível sentença com
que o Soberano Juiz dos vivos e dos mortos
ameaça aos que no mundo governam.
Se entre os membros da Companhia
que extinguimos, alguns estão encarregados da instrução da mocidade ou exercem
magistério em qualquer escola ou colégio,
ordenamos que, privados absolutamente de
toda a direção, administração e governo, se
conceda continuarem em tais ocupações
àqueles que dão esperança de bons frutos
nos seus trabalhos e se mostrem alheios a
essas discussões e pontos de doutrina, que
por seu laxismo ou futilidade costumam
ocasionar, o mais das vezes, inconvenientes
e contestações mui funestas; e decretamos
que as ditas funções sejam perpetuamente
interditas àqueles que não se esforçarem
para manter a paz nas escolas e a tranquilidade pública, e mesmo sejam privados do
cargo se já estiverem em posse dele.
Relativamente às Missões, que serão
compreendidas igualmente no que havemos
estatuído para a supressão da Companhia, reservamos tomar a esse respeito as medidas
próprias para alcançar mais fácil e mais seguramente a conversão dos infiéis e o remate
de todas as disputas.
Ora, depois de termos cassado e ab-rogado plenamente todos os privilégios e
estatutos desta Ordem, como acima o fazemos, declaramos os seus membros, desde
que tenham abandonado as casas e colégios,
e tenham abraçado o estado de clérigos seculares, habilitados e aptos a obter, de acordo com os Decretos dos Santos Cânones e
Constituições Apostólicas, toda a natureza de
ofícios enquanto pertenciam à Companhia,
por um Breve de Gregório XIII, firmado aos
10 de Setembro de 1584, o qual começa por
estas palavras: “Satis superque”.
Concedemos-lhes também que recebam retribuições por celebrarem a Missa, o
que antes lhes era proibido, e gozem de todas as mercês e favores de que se achavam
privados enquanto foram clérigos regulares
da Companhia de Jesus.
Derrogamos todas as concessões obtidas do Geral e dos outros Superiores, em
virtude dos privilégios outorgados pelos soberanos pontífices, como sejam o de lerem
obras de heresia, e outras proibidas e condenadas pela Santa Sé; e de não guardarem
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os dias de jejum, nem usarem alimentos de
abstinência nesses dias; o de anteciparem ou
adiarem as horas prescritas para a leitura do
Breviário, e mais algumas concessões de idêntica natureza, cuja prática de futuro lhes vedamos, sob as mais severas penas, pois a nossa
intenção é que, a exemplo dos padres seculares, a sua maneira de viver seja de harmonia
com as regras do direito comum.
Depois da publicação do presente
Breve, nós proibimos que ouse, quem quer
que seja, suspender-lhe a execução, quer sob
título colorido ou pretexto de petição, apelo,
recurso, declaração ou consulta acerca de dúvidas que possam sobrevir, quer mesmo sob
outro pretexto previsto ou imprevisto; pois
queremos que a supressão e a anulação de
toda a Companhia tenha desde este momento, imediatamente, pleno, inteiro e vigoroso
efeito, pela forma e maneira acima prescritas,
sob pena de incorrer em excomunhão maior,
reservada a Nós e aos Papas, nossos sucessores, contra aqueles que ousem opor o menor
obstáculo, impedimento ou dilatando a execução deste Breve.
Além disso, mandamos e impedimos,
em nome da santa obediência, a todos em
geral e a cada um dos eclesiásticos regulares
e seculares, seja qual for a sua dignidade, qualidade, grau e condição, nomeadamente àqueles que atualmente estavam ligados à Companhia e dela faziam parte, nem contra ela
escrevam ou falem, bem como dos fatos que
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a originaram, nem do Instituto, regulamentos,
Constituições, disciplina da Companhia extinta, nem de nenhuma outra circunstância
relativa a este objeto, sem consentimento expresso do Soberano Pontífice.
Igualmente não se permitirá que ninguém (e transgredir será incorrer em excomunhão reservada a Nós e a nossos sucessores), ouse defender e insultar, por ocasião
desta abolição, seja pública ou secretamente,
de viva voz ou por escrito, por meio de disputa, com injúrias, afrontas ou qualquer outra
demonstração de desprezo, a quem quer que
seja, e muito menos ainda aos membros da
extinta Ordem.
A todos os monarcas e príncipes cristãos em quem reconhecemos respeito e afeição pela Santa Sé, exortamos a empregarem,
para inteira e plena execução deste Breve,
todo seu zelo e cuidado, toda força, autoridade e poder que receberam de Deus, a fim de
defenderem e protegerem a Santa Igreja Romana; a aderirem a todos os artigos que nele
se contêm; a darem e publicarem idênticos
Decretos pelos quais se vele com segurança
a evitar que a execução da nossa presente
vontade não derrame entre os fiéis nem querelas, nem contestações, nem divergências.
Finalmente, exortamos a todos os cristãos e, pelas entranhas de Jesus Cristo, Senhor
Nosso, os conjuramos a lembrarem-se de:
- que todos têm o mesmo Soberano Chefe,
que está nos céus, o mesmo Salvador que a
todos remiu em troca de seu sangue, que todos foram regenerados pela graça do Batismo,
que todos são reconhecidos filhos de Deus e
cordeiros de Jesus Cristo e alimentados com
o mesmo pão da palavra divina e da doutrina católica; - que não formam todos mais que
um só corpo em Jesus Cristo, e são eles os
membros uns dos outros: - que, por consequência, necessário é que se conservem unidos
pelos laços da caridade, vivendo em paz com
todos os homens; - que o seu único dever é de
se amarem reciprocamente, pois aquele que
ama o seu próximo cumpre a lei, e de terem
aversão às ofensas, ódios, disputas, ciladas e
outros males que o feroz inimigo do gênero
humano inventou, imaginou e tem sugerido
para perturbar a Igreja de Deus, e criar obstáculos à felicidade eterna dos fiéis, sob o falso
pretexto de opiniões de escola, muitas vezes
até com aparências de maior perfeição cristã;
- que todos enfim se esforcem, desvelem-se
por adquirir a real sabedoria da qual São Tiago falou (3, 13): “Há aqui entre vós algum homem douto e sábio, que mostre por seu bom
comportamento as suas obras repassadas de
humildade e sabedoria. Mas se tendes inveja
amarga e preocupações egoísticas no vosso
coração, não vos orgulheis nem mintais contra
a verdade, porque esta sabedoria não vem do
alto; antes é terrena, animal e diabólica”.
Efetivamente, onde estiver a inveja e
a animosidade, lá achareis igualmente a discórdia, o desassossego e toda sorte de más
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ações; ao passo que a sabedoria que vem de
lá de cima é casta, plácida, indulgente, conciliadora, aprovando o que é bom, isenta de
parcialidade e hipocrisia. O fruto da justiça
é semeado pacificamente para aqueles que
promovem a paz.
Ainda, mesmo quando os superiores e
outros religiosos desta Ordem, bem como os
que tenham ou pretendam ter interesse de
qualquer natureza no que acima ficou estatuído, não sancionassem o presente Breve, nem
fossem chamados, nem ouvidos, queremos e
decretamos que jamais o possam atacar, destruir e invalidar, por sub-repção, ob-repção,
nulidade ou irregularidade, falta de intenção
da nossa parte, ou qualquer outro motivo por
maior que seja, imprevisto e essencial, nem
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por omissão de formalidades ou preceito que
se devesse observar nas disposições precedentes, ou algures, nem por nenhum outro
ponto capital, resultante de direito ou praxe,
embora compreendido no “corpus juris”, sob
o pretexto de uma enorme, enormíssima e
inteira lesão, nem finalmente, por nenhum
outro pretexto, razão ou escusa, por mais
justos, razoáveis e privilegiados que pareçam,
mesmo tais que fosse necessário expressá-los
por validade dos regulamentos supra.
E proibimos que o presente Breve seja
retratado, discutido, levado a tribunais; ou
contra ele se promova recurso de restituição
por inteiro e discussão, de redução pelas vias
e termos de direito, ou por qualquer outro
meio para obter de direito, de fato, por mer-
cê, por justiça, ou por outra maneira de que
possam lícita ou ilicitamente servir-se tanto
em justiça como de outro modo.
E, sim, queremos expressamente que
a presente execução seja, de agora para
sempre, válida, imutável e eficaz; que tenha
inteiro e pleno efeito e seja inviolavelmente
observada por todos e cada um daqueles a
quem observá-la compete e venha de futuro
a competir de qualquer maneira.
Queremos, pois, assim e não diversamente, que nenhum juiz ou delegado, - nem
mesmo os auditores das causas do palácio
apostólico, nem os Cardeais da Santa Igreja
Romana, os legados “a latere”, ou Núncios da
Santa Sé, nem algum outro, qualquer que seja,
ou haja de vir a ser o seu poder e autoridade,
- possa, em que instância ou causa for, julgar
e interpretar o presente Breve de forma a
tirar-lhe a força e faculdade; - e, acontecendo
que ele sofra a menor queda e diminuição,
cientemente ou por ignorância, de antemão
declaramos nulo e de nenhum efeito o julgamento, seja de que autoridade for.
Tudo quanto acabamos de estatuir
cumprir-se-á, - não obstante as Constituições
e Leis Apostólicas, mesmo dadas nos Concílios Gerais: - não obstante, igualmente a
nossa máxima de não privar ninguém, tanto
quanto humanamente possível, de um direito
adquirido; - não obstante todos os estatutos
e usos da predita Companhia, das suas casas,
colégios, igrejas, apoiados nos juramentos e
aprovação da Santa Sé ou em outra qualquer;
- não obstante ainda os privilégios, as Cartas
Apostólicas e indultos concedidos a esta Ordem, a seus superiores, aos religiosos e outras
pessoas, ou confirmadas ou renovadas sob
qualquer forma e teor, mesmo com cláusulas
derrogatórias; - não obstante, enfim, quaisquer outros Decretos, embora de cassação,
embora promulgados por um motivo semelhante, em consistório, ou de diversa maneira; ainda quando for necessário, para todos e
cada um dos preceitos aqui inscritos, e para
tornar a derrogação suficiente, fazer menção
expressa e formal de todo o seu contexto,
palavra por palavra, neste Breve, sem a menor
omissão e como se houvesse observado, a
ordem prescrita: - tendo-se por tais e ordenado que tenham todo o seu vigor na execução
dos regulamentos acima estabelecidos, derrogando especial e expressamente todas essas
coisas e todas as que lhe são contrárias.
Finalmente, nós mandamos que, tanto
em juízo como fora dele, se dê a simples cópia deste Breve, mesmo impressa, uma vez
que seja subscrita por um notário público e
munida do selo de qualquer pessoa revestida de autoridade eclesiástica, a mesma fé
que se daria se fosse exibido e exposto o
próprio original.
Dado em Roma, em Santa Maria Maior,
sob o Anel do Pescador, aos 21 de Julho de
1773, 5º ano do nosso Pontificado.
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IX. Carta de Dom José aos Governantes
dos Domínios Portugueses,
9 de Setembro de 1773
Carta de Dom José
9 de Setembro de 1773
“Dom José, por graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves,
daqui e de além mar, na África, senhor da Guiné e da conquista,
navegação e comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, aos súditos de todos os Estados de meus Reinos e senhorios, saúde.
O nosso mui Santo Padre Clemente XIV, ora Presidente na
Universal Igreja de Deus: tendo observado, examinado e combinado [...] não só todos os fatos concernentes à fundação, ao
progresso e ao último estado da Companhia, denominada de
Jesus; em ordem à Igreja Universal e às Monarquias soberanas e
povos das quatros partes do mundo descoberto; mas também
todas as revoluções, tumultos e escândalos que nelas causou a
sobredita Companhia; todos os remédios com que não menos
de vinte e quatro dos Romanos Pontífices, seus predecessores, haviam procurado acertar àqueles grandes males [...] sem
outros efeitos que não fossem os de se terem manifestado de
dia em dia mais frequentes as queixas e os clamores contra a
referida Companhia; e os de se verem abortar os mesmos tempos, em diferentes Reinos e Estados do mundo, levantes, motins,
discórdias e escândalos perigosíssimos, que destruindo, e quase
acabando de romper o vínculo da caridade cristã, inflamaram
os ânimos dos fiéis nos espíritos de divisão, de ódio e de inimizade; até chegarem a fazer-se tão urgentes os referidos insultos
e os perigos deles, que os mesmos monarcas, que mais se tinham distinguido na piedade e na liberalidade hereditárias, em
benefício da mesma Companhia, foram necessariamente constrangidos; não só a exterminarem todos os companheiros dela
dos seus Reinos, Províncias e Domínios, por ser este extremo
remédio o único que as urgências igualmente extremas podiam
já permitir-lhes, para impedirem que os povos cristãos dos seus
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respectivos Reinos e Domínios se provocassem, ofendessem
e lacerassem uns aos outros, dentro do seio da Santa Madre
Igreja e nas suas mesmas pátrias [...] Depois de haver concluído,
demonstrativamente o mesmo Santo Padre, que a sobredita
Companhia não só não podia já produzir, a benefício da Igreja
e dos fiéis cristãos, aqueles copiosos frutos que haviam feito os
objetos da sua Instituição e dos muitos privilégios com que fora
ornada; mas que, muito pelo contrário, era impraticável que
a conservação da dita Companhia fosse já compatível com a
restituição e conservação da constante e permanente Paz da
Igreja Universal e da sociedade civil e união cristã [...] Ordenou
a sua Bula, em forma de Breve, [...] no dia vinte e um de Julho
deste ano, quinto do seu Pontificado. Por ele, de seu maduro
Conselho, certa ciência e plenitude do Poder Apostólico, extinguiu e suprimiu inteiramente a mesma Companhia, chamada
de Jesus: abolindo e der[r]ogando todos, e cada um de seus
ofícios, ministérios, administrações, casas, escolas, colégios, abrigos, residências e quaisquer outros lugares a elas pertencentes,
em qualquer Reino, Estado ou Província que sejam existentes;
como também todos os seus Estatutos, Constituições, Decretos, costumes e estilos; todos os seus privilégios e indultos gerais ou especiais, por mais exuberantes que sejam: declarando
inteiramente cassada e perpetuamente extinta toda a autoridade do Prepósito Geral, de todos os Provinciais, Visitadores e
de quaisquer outros Superiores da dita Companhia, assim nas
coisas espirituais, como nas temporais [...] E mando ao Doutor
João Pacheco Pereira, do meu Conselho e Desembargador do
Paço, que serve de Chanceler Mor destes Reinos, que faça publicar esta, na Chancelaria, e remeter as cópias dela, sob o meu
do selo, e seu final, a todos os Tribunais, Cabeças de Comarcas,
Vilas destes Reinos e terras de donatários deles, enviando-se
o original dela ao meu Real Arquivo da Torre do Tombo. Dada
no Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, aos nove dias do mês
de Setembro do Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus
Cristo de mil setecentos e setenta e três. EL REY, com guarda.”
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X. Bula “Sollicitudo Omnium, Ecclesiarum” do
Papa Pio VII, restaurando a Companhia de Jesus,
7 de Agosto de 1814
Roma, 7 de agosto de 1814
O Papa Pio, servo dos servos de Deus. Para dar fé no futuro.
1. O governo de todas as igrejas confiadas por Deus
a nossa humildade, ainda que insuficiente por méritos e por
força, obriga-nos a pôr à disposição todos os meios que estão
em nosso poder e que nos são providos pela divina Providência para socorrer oportunamente às necessidades espirituais
do mundo cristão, diante das diversas e múltiplas vicissitudes
dos tempos e dos lugares, sem diferença de povos e nações.
2. Desejosos de satisfazer o dever de nosso trabalho
pastoral, enquanto ainda vive Francesco Kareu e outros sacerdotes seculares que estão há muitos anos no vastíssimo
império russo, e uma vez agregados à Companhia de Jesus,
supressa por nosso predecessor Clemente XIV, de feliz memória, nos apresentaram sua petição na qual suplicavam nossa
autorização para permanecer unidos em um só corpo, para,
segundo sua instituição, empregar-se mais agilmente em instruir a juventude nas questões de fé, e educá-la nos bons costumes, exercitar o ofício da pregação, ouvir confissões e administrar outros sacramentos, nós julgamos oportuno consentir
sua solicitação, ainda com mais gosto, quando o imperador
Paulo I, agora reinante, nos havia recomendado cordialmente
a tais sacerdotes, com sua gentilíssima carta de 11 de agosto,
dirigida a nós, na qual, comunicando sua singular benevolência para com eles, declarava que lhe seria agradável se, para
o bem dos católicos de seu império, a Companhia de Jesus
fosse estabelecida pela nossa disposição.
3. Por tal coisa, nós, considerando com ânimo atento,
quão grandes favores seriam derivados àquelas vastíssimas regiões quase privadas de trabalhadores evangélicos, e quanto
aumento haveriam aportado à religião católica eclesiásticos de
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tal condição, as justas práticas das quais eram
ponderados com tantos elogios pelo contínuo
esforço, pelo fervoroso zelo dedicado à saúde
das almas e pela indefesa pregação da palavra
de Deus, nós consideramos razoável consentir nos desejos de um príncipe tão grande e
benfeitor. Portanto, com nossa carta em forma
de breve, de 7 de março de 1801, concedemos ao já nomeado Francesco Kareu e a seus
companheiros habitantes do império russo, ou
àqueles que lá fossem reunidos de outras partes, a faculdade de unir-se em um corpo, ou
congregação da Companhia de Jesus, e acordada a liberdade de reunir-se em uma ou mais
casas, segundo a autorização do superior, mas
somente dentro dos confins do império russo, e designamos, com nosso beneplácito e da
Sé Apostólica, Prepósito Geral de tal Ordem
ao mesmo sacerdote Francesco Kareu, com as
faculdades necessárias e oportunas para manter e seguir a regra de Santo Inácio de Loyola,
aprovada e confirmada com suas Constituições por nosso predecessor Paulo III, de feliz
memória. Isto, a fim de que os companheiros
reunidos em um grupo religioso se ocupassem
de educar a juventude na religião e nos bons
costumes, a dirigir seminários e colégios e, com
a aprovação e o consenso dos oriundos dos
lugares, ouvir confissões, anunciar a palavra de
Deus e administrar livremente os sacramentos. Acolhemos a Ordem da Companhia de
Jesus sob a direta tutela e sujeição nossa e da
Sé Apostólica, e reservamos a nós e a nossos
sucessores decidir e estabelecer aquelas coisas que nos pareçam no Senhor eficazes para
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reforçá-la, presidi-la e purgá-la daqueles abusos e daqueles vícios que acaso se haviam podido introduzir. Com tal efeito nós
expressamente revogamos as constituições apostólicas, estatutos, costumes, privilégios e indultos que de algum modo foram
concedidos e confirmados em oposição a nossa carta preliminar, especialmente a carta apostólica do mencionado Clemente
XIV, que começa “Dominus ac Redemptor Noster” naquelas
partes, somente, que fossem contrárias a nossa citada carta em
forma de breve, cujo princípio é “Catholicae” e escrita somente
para o império da Rússia.
4. As decisões que tomamos para o império russo, não
muito tempo depois, julgamos oportuno estendê-las ao reino
das duas Sicílias, a petição de nosso querido filho de Cristo, o
rei Fernando, quem pediu que a Companhia de Jesus fosse estabelecida em sua jurisdição e em seus estados da mesma maneira na qual foi estabelecida por nós no mencionado império,
dado que, naqueles tempos funestos, ele pensava ajudar-se da
obra especialmente dos clérigos regulares da Companhia de
Jesus, para educar na piedade cristã e no temor de Deus –
que é o princípio da sabedoria –, para instruir nas letras e na
ciência a juventude dos colégios e escolas públicas. Nós, desejosos de assentir aos pios desejos de tão ilustre príncipe, que
contemplavam unicamente a maior glória de Deus e a saúde
das almas, por dever de nosso pastoral ofício, estendemos
nossa carta, redigida para o império russo, ao reino das duas
Sicílias, com uma nova carta similar, em forma de breve, que
começa “Per alias”, expedida em 30 de julho de 1804.
5. Urgentes e prementes solicitações para a restauração da mesma Companhia de Jesus, com unânime consenso de quase todo o mundo cristão, nos chegam cada dia de
nossos veneráveis irmãos arcebispos e bispos, e das ordens
e setores de todos os personagens insignes, especialmente
desde que se difunde por todos os lados a fama dos frutos
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férteis que esta Companhia havia produzido nas mencionadas
regiões; posto que ela era dia a dia fecunda e, com sua prole
aumentando, se acreditava oportuno adornar e dilatar amplamente o campo do Senhor.
6. A mesma dispersão das pedras do santuário devida
às recentes calamidades e vicissitudes (as quais convém mais
deplorar que chamar à memória), a disciplina que tem arruinado nossas ordens regulares (esplendor e salvação da religião e da Igreja católica) nas quais amparar todos os nossos
pensamentos e todos os nossos cuidados são agora enviados,
exigem que demos nosso consentimento a votos tão justos
e tão difundidos. Portanto, seremos réus de gravíssimo delito
na presença do Senhor, se em necessidade tão grave da coisa
pública deixássemos de realizar aquelas ajudas saudáveis que
Deus, com singular providência, nos provê, e se nós, colocados
na barca de Pedro agitada e sacudida por contínuos ventos,
lançássemos aos remadores qualificados e valorosos, os quais
se oferecem para romper as ondas do oceano, que em cada
momento nos ameaçam com o naufrágio e a ruína.
7. Induzidos pelo peso de tantas e tão fortes razões e por
motivos tão graves que sacudiam nosso ânimo, nós finalmente
deliberamos efetuar aquilo que consideravelmente desejávamos
fazer desde o princípio de nosso pontificado. Portanto, depois de
haver implorado com fervorosas orações a ajuda divina, ouvidas
as opiniões e conselhos de muitos veneráveis irmãos nossos, cardeais da santa Igreja romana, de certa ciência e com pleno poder
apostólico, deliberamos ordenar e estabelecer, como um feito
com esta Constituição, que deverá valer perpetuamente, que
todas as concessões e todas as faculdades acordadas por nós
unicamente para o império russo e para o reino das duas Sicílias,
agora se entendam estendidas, e por estendidas se tenham, assim
como realmente as estendemos, a todo nosso Estado eclesiástico e a todos os outros estados e governos.
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8. Portanto, concedemos e acordamos
ao amado filho, o sacerdote Tadeusz Borzozowski, atual Prepósito Geral da Companhia de
Jesus, e aos outros por ele legitimamente designados, todas as necessárias e oportunas faculdades, a nosso beneplácito e da Sé Apostólica,
de poder admitir e agregar livre e licitamente
em todos os já mencionados estados e governos a todos quantos solicitem ser admitidos e
incorporados à Ordem regular da Companhia
de Jesus, os quais, congregados em uma ou
mais casas, em um ou mais colégios, em uma
ou mais províncias, e distribuídos segundo a exigência das circunstâncias sob a obediência do
Prepósito Geral pro tempore, conformassem
sua maneira de viver segundo as prescrições
da regra de Santo Inácio de Loyola, aprovada e
confirmada pelas constituições apostólicas de
Paulo III. Concedemos, agora, e declaramos que
para atender e instruir a juventude nas noções
da religião católica e para adestrá-la nos bons
costumes, seja seu direito, livre e licitamente, dirigir seminários e colégios, e com o consenso
e a aprovação dos oriundos dos lugares nos
quais ocorresse que eles permanecessem, ouvir confissões, pregar a palavra de Deus e administrar sacramentos. Assim, todos os colégios, as
casas, as províncias e os companheiros unidos
de tal modo, e que em um futuro se unirão e
agregarão, que nós os recebemos desde este
momento sob a imediata tutela, sujeição e obediência nossa, e desta Sé Apostólica, reservando a nós e aos pontífices romanos, sucessores
nossos, estabelecer e prescrever aquelas coisas
que encontrem conveniente estabelecer e
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Bicentenário de Restauração
da Companhia de Jesus
prescrever para fundamentalmente consolidar,
dotar e purgar a própria Companhia daqueles
abusos, que acaso se houvessem introduzido,
que remova Deus.
9. Por quanto podemos no Senhor, exortamos a todos e a cada um, superiores, prepósitos, reitores, companheiros e alunos desta
restabelecida Companhia a mostrar-se em cada
lugar e tempo fiéis seguidores e imitadores de
seu tão grande pai e fundador, a observar exatamente a regra por ele redigida e prescrita, e
a procurar seguir com sumo fervor os avisos e
conselhos por ele deixados a seus filhos.
10. Finalmente, recomendamos grandemente no Senhor a referida Companhia, e
a cada um de seus filhos, aos amados filhos
em Cristo, os ilustres e nobres príncipes e
senhores temporais, como também aos veneráveis irmãos arcebispos e bispos, e aos
outros constituídos em qualquer dignidade, e
os exortamos e rogamos não somente a não
permitir que sejam incomodados por quem
seja, mas sim a recebê-los benignamente e
com aquela caridade que é apropriada.
11. Decretamos que a presente carta e
cada coisa nela contida seja e deva ser sempre
e perpetuamente válida, firme e eficaz, e que
consiga e obtenha seus plenos e inteiros efeitos, e seja por todos, e por cada um, a quem
compete e em algum modo competirá, inviolavelmente observada. De igual forma, e não
de outro modo, determinamos que em todas
as coisas antecipadas e em cada uma delas se
julgue e se defina por meio de qualquer juiz, de
qualquer autoridade investida, e se alguém por
qualquer autoridade, consciente ou ignorantemente, se arriscar a proceder diferentemente
sobre tais coisas, queremos que tudo permaneça inútil e sem nenhum valor.
12. Não obstante, as constituições e
portarias apostólicas, e especialmente a mencionada carta em forma de breve de Clemente XIV, de feliz memória, a qual começa
“Dominus ac Redemptor Noster”, sob o anel
do Pescador, de 21 de julho de 1773, pelos
efeitos antes ditos, expressa e especialmente
manifestamos revogada, e a qualquer outra
coisa contrária, análoga.
13. Queremos, pois, que às cópias e
aos exemplares da presente carta, ainda que
impressos, escritos a mão por qualquer público notário, e dotados do sigilo de qualquer
pessoa constituída em dignidade eclesiástica,
se preste a mesma fé, tanto em juízo como
fora daquele, que se faria pelo presente original, se fosse exibido ou mostrado.
14. Portanto, não seja lícito a ninguém
romper ou opor-se com temeridade a esta
carta de nossa portaria, estatuto, extensão,
concessão, indulto, faculdade, declaração, reserva, aviso, decreto e revogação. Se alguém
presumisse tentar aquilo, saiba que incorrerá
na indignação de Deus e dos santos apóstolos Pedro e Paulo.
Dada em Roma, próximo de Santa Maria Maior, no ano da Encarnação do Senhor
de 1814, a 7 de agosto, no décimo quinto de
nosso pontificado.
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Fontes manuscritas
e miscelâneas impressas e digitais
DOCUMENTO I
ECKART, Anselmo. Memórias de um jesuíta
prisioneiro de Pombal. São Paulo: Loyola;
Braga: A.I., 1987. p.50
DOCUMENTO II
Idem. p.79.
DOCUMENTO III
PLANAS, Enrique Los jesuitas en el Río de
la Plata: historia de las misiones en la época
colonial. Atlántida, SA. 1941. p. 116
DOCUMENTO IV
Transcrição paleográfica encontrada no
Archivo Jesuítico de la Antigua Provincia de
Quito.
DOCUMENTO V
Transcrição paleográfica encontrada no
Archivo Jesuítico de la Antigua Provincia de
Quito.
DOCUMENTO VI
LOPES, Antônio. “Loucas Relações entre
Clemente XIV e Pombal, sobre a extinção da
Companhia de Jesus”. In: Lusitania Sacra, 2006, 18.
COLLEÇÃO dos Negócios de Roma,
no reinado de El-Rey D. José I, ministério
do Marquez de Pombal e pontificado de
Clemente XIV, 1769-1774. Parte III, Lisboa,
Imprensa Nacional, 1874, copilado por Julio
Firmino Júdice Biker.
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DOCUMENTO VII
LOPES, Antônio. “Loucas Relações entre
Clemente XIV e Pombal, sobre a extinção da
Companhia de Jesus”. In: Lusitania Sacra, 2006,
18.
COLLEÇÃO dos Negócios de Roma,
no reinado de El-Rey D. José I, ministério
do Marquez de Pombal e pontificado de
Clemente XIV, 1769-1774. Parte III, Lisboa,
Imprensa Nacional, 1874, copilado por Julio
Firmino Júdice Biker.
DOCUMENTO VIII
A supressão da Companhia de Jesus 1773:
documentos. Salvador: Comissão de História
da Província Jesuítica da Bahia - COHIBA,
1992.
DOCUMENTO IX
Disponível em: http://www.historiacolonial.
arquivonacional.gov.br/ Conjunto documental:
Documentos sobre a extinção dos jesuítas
(cópias de cartas, requerimentos, cartas de
lei, breve do Santo Padre Clemente XIV e
carta apostólica do papa Pio VII). Códice 794
1773-1801. Código do fundo: NP Data do
documento: 9 de Setembro de 1773. Local:
Palácio de Nossa Senhora da Ajuda. Folhas 1
a 2v. Acesso em: 28/03/2013.
DOCUMENTO X
Disponível em: http://www.restauracionsj.
ibero.mx Acesso em: 28/03/2013.
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: Carla Galdeano André Luís de Araújo, SJ Pateo do Collegio