TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
GRUPO II – CLASSE VII – PLENÁRIO
TC 009.647/2009-4
Natureza: Representação
Órgão: Câmara dos Deputados
Interessada: 3ª Secretaria de Controle Externo – 3ª Secex
Advogado constituído nos autos: não há
Sumário: REPRESENTAÇÃO. CÂMARA DOS DEPUTADOS.
INDÍCIOS DE UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE COTAS DE
PASSAGENS AÉREAS. CONHECIMENTO. ALTERAÇÕES
RECENTES NA REGRAS DE CONCESSÃO DE PASSAGENS
AÉREAS A DEPUTADOS FEDERAIS, QUE RESTRINGEM O
USO, AUMENTAM OS CONTROLES E CONFEREM MAIOR
TRANSPARÊNCIA
AOS
RESPECTIVOS
ATOS.
PROCEDÊNCIA PARCIAL. DETERMINAÇÕES À CÂMARA
DOS DEPUTADOS. ENVIO DE CÓPIAS.
1. O poder discricionário, na Administração Pública, é limitado,
entre outros, pelos princípios da legalidade, da moralidade e da
impessoalidade, razão por que se veda a prática de ato
administrativo em desacordo com o fim público, mesmo na
ausência de norma proibitiva específica para o caso.
2. Nos termos do art. 8° da Lei 8.443/92 c/c art. 1º, caput e §3º, da
Instrução Normativa TCU 56/2007, compete à autoridade
administrativa responsável a adoção das providências iniciais para
a “apuração dos fatos, identificação dos responsáveis, quantificação
do dano e obtenção do ressarcimento”, devendo instaurar a
competente tomada de contas especial apenas quando “esgotadas as
medidas administrativas internas sem obtenção do ressarcimento
pretendido1”
RELATÓRIO
Adoto como Relatório, nos termos do art. 1º, §3º, inciso I, da Lei 8.443/92, o teor
principal da instrução lavrada no âmbito da 3ª Secex, às fls. 211/243, com os devidos ajustes de forma:
Tratam os autos de Representação formulada por esta 3ª Secex (fl. 39/40), em face de
possíveis irregularidades na concessão e na utilização da cotas de passagens aéreas dos senhores
Deputados Federais, conforme noticiado pela imprensa.
2.
Segundo os apontamentos iniciais desta Unidade Técnica (fl. 39/40), tomando por base
sucessivas informações noticiadas pela imprensa a partir da matéria publicada pelo sítio jornalístico
Congresso em foco em 14/4/2009 (fls.1/3), estaria em cheque a legalidade/moralidade da utilização
do referido benefício nas seguintes situações:
1) pagamento de passagens nacionais e internacionais de terceiros (não parlamentares) –
familiares, amigos, empresários, artistas e autoridades de outros poderes;
1 No mesmo sentido dispõe o §1º do art. 3º da citada instrução normativa.
1
2) quantidade excessiva e injustificada de passagens para o exterior;
3) prática de acumulação do direito à cota mensal não utilizada, gerando suposto “saldo”,
comumente usado para fretamento de aeronaves, com base no valor “cheio” das passagens (maior
tarifa);
4) uso da verba por ex-Deputados – para si ou terceiros – que não tenham esgotado a cota
durante o mandato, caracterizando incorporação velada do benefício aos estipêndios dos
parlamentares;
5) uso de passagens por parlamentares em viagens de férias;
6) existência de suposta comercialização de passagens, com participação de parlamentares,
empresas de turismo e servidores da Câmara – efetivos ou não; e
7) utilização pelos parlamentares e terceiros, para fins particulares, de milhagem obtida junto
às empresas aéreas pela utilização de passagens adquiridas pelo Câmara dos Deputados, com uso
das cotas dos parlamentares.
3.
Dos diversos fatos reportados pela imprensa, de acordo com as matérias veiculadas pelo sítio
jornalístico Congresso em Foco entre 14 e 22/4/2009, pelo jornal Folha de São Paulo em 24/4/2009,
bem como pelo jornal O Globo em 27/4/2009, sobressaem as seguintes ocorrências:
1) A apresentadora de TV Adriane Galisteu e um grupo de artistas teria viajado na cota de
passagens aéreas do Deputado Fábio Faria (fls. 1/3);
2) Parlamentares licenciados para exercer a função de Ministros de Estado teriam utilizado
indevidamente a cota de passagens aéreas da Câmara dos Deputados (fl. 4/5);
3) Passagens aéreas adquiridas na cota de Deputados Federais teriam sido utilizadas pelos
Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal (fl. 8);
4) Diversos parlamentares teriam utilizado, de forma recorrente, a cota de passagens aéreas
em viagens internacionais, inclusive em benefício de familiares, para destinos turísticos na Europa,
América do Norte e Argentina (fls. 9/10);
5) Lideranças partidárias e seus familiares teriam viajado diversas vezes para destinos como
Bariloche, Miami, Nova Iorque e Paris, às custas da cota de passagens aéreas, a exemplo das 82
viagens mencionadas às fls. 13/26;
6) O atual Presidente da Câmara dos Deputados teria utilizado a cota de passagens aéreas em
viagem de turismo para Porto Seguro, na Bahia (fl. 27); e
7) A prática de uso da cota em vôos para o exterior seria sistemática e generalizada. Segundo
levantamento do sítio Congresso em foco, ao menos 261 deputados teriam viajado para 2 mil trechos
internacionais, para 13 destinos aéreos, às expensas de dinheiro público (fls. 29/35).
4.
Dada a existência de indícios de irregularidades, esta Secretaria propugnou preliminarmente
pela realização de diligência à Casa legislativa, buscando obter os elementos necessários ao exame
das questões suscitadas pela mídia na gestão das passagens aéreas da Câmara, haja vista a falta de
clareza quanto à base legal e regulamentar de tais atos administrativos.
5.
Desta feita, conforme Despachos às fls. 41 e 43, o Exmo. Ministro-Relator acolheu a medida
alvitrada por esta Secex, determinado a expedição da diligência de fls. 45/46, visando à obtenção das
seguintes informações, entre outras:
a) base legal e regulamentar para a concessão e utilização das cotas, inclusive uso
destas para pagamento de fretamento de aeronaves;
b) descrição detalhada da sistemática de emissão das passagens e dos mecanismos de
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controle existentes;
c) eventuais providências legais adotadas com vistas à implementação de nova
sistemática de concessão e controle de cotas de passagens aéreas aos Deputados Federais.
II - Em relação aos pontos e/ou milhas em programas de fidelização de companhias
aéreas, decorrentes da utilização de passagens aéreas adquiridas à conta das cotas atribuídas
aos Deputados da República, informe:
a) se os pontos/milhas são convertidos, de alguma forma, em direito da Câmara dos
Deputados;
b) caso não sejam, as razões jurídico-operacionais que impedem;
c) os mecanismos porventura existentes para controle da obtenção do direito pelos
parlamentares.
ANÁLISE
6.
Em resposta ao Ofício nº 757/2009-TCU/SECEX-3 (fls. 45/46), de 8/5/2009, [o Presidente] da
Câmara dos Deputados assim se manifestou (fls. 49/54):
2. Com fulcro nos atos normativos que regulamentam a matéria, cabe informar que a Câmara
dos Deputados não adquire passagens aéreas, tampouco indica qualquer transporte para utilização
pelos parlamentares. Nesse sentido, conforme já assinalado por essa Corte de Contas, na
Decisão/TCU n. 610/99, a relação jurídica de consumo se estabelece entre as companhias aéreas e o
próprio parlamentar, efetivo usuário.
3.Assim, inexistente o vinculo contratual entre esta Casa Legislativa e as companhias aéreas,
não se vislumbra possibilidade de se operarem quaisquer direitos ou obrigações relativos aos
programas de fidelização do setor aéreo, uma vez que os pontos e/ou milhas desses programas se
realizam entre as empresas,pessoas jurídicas de direito privado, e seus usuários.
4.Esclareço ainda a Vossa Excelência que, em observância aos princípios constitucionais da
eficiência e publicidade, a Câmara dos Deputados instituiu a Cota para o Exercício da Atividade
Parlamentar, que aglutina os recursos da Cota Postal-Telefônica, Verba Indenizatória do Exercício
Parlamentar e Verba de Transporte Aéreo, por meio do Ato da Mesa n. 43, de 2009, em anexo. [grifos
da instrução]
[Em anexo à manifestação da Presidência da Câmara dos Deputados, foi encaminhada
a informação da Coordenação de Gestão de Cota Parlamentar, unidade vinculada ao
Departamento de Finanças, Orçamento e Contabilidade da Câmara dos Deputados – Defin/CD
–, às fls. 51/54, acompanhada dos documentos de fls. 55/103, contendo os seguintes registros:]
- Respostas ao item I do ofício de diligência:
a) Base Legal e Regulamentar:
-Decisão da Mesa de 17/10/1996;
-Ato da Mesa n° 42, de 2000 [grifo da instrução];
-Ato da Mesa n° 120,2002;
-Ato da Mesa n° 130, de 2002;
-Ato da Mesa n° 90, de 2006;
-Ato da Mesa n° 04, de 2007; Ato da Mesa n° 11, de 2007;Ato da Mesa n° 42, de 2009;
-Portaria n° 35, de 2009 (Diretor-Geral da CD);
-Ato da Mesa no 43, 2009.
b) Sistemática de emissão das passagens e dos mecanismos de controle:
Com fulcro nos normativos que regulamentam a matéria, a Câmara dos Deputados
3
disponibiliza aos senhores Deputados Federais cotas mensais de transporte aéreo, com valores fixos
e diferenciados por Unidade da Federação. A cota é utilizada pelos parlamentares, mediante emissão
de Requisição de Passagem Aérea — RPA, direcionada para uma das companhias aéreas credenciadas
junto à Câmara dos Deputados, por meio de módulo do Sistema de Gestão de Cotas instalado em cada
gabinete parlamentar, até o limite de saldo da cota correspondente. A RPA ao ser entregue na
companhia aérea é convertida em bilhete ou crédito nominal de passagem aérea a ser utilizado junto
à empresa.
A praxe da Casa de se concederem créditos, no lugar de bilhetes de passagem é sustentada
por Decisão da Mesa Diretora registrada na Ata da 2ª Reunião da Mesa, realizada em 17/10/1996. A
deliberação foi no sentido de se converterem as requisições de passagens em créditos nominais, sem
a indicação dos trechos a serem percorridos, para utilização nas companhias aéreas credenciadas
junto à Câmara dos Deputados, com o intuito de agilizar os deslocamentos dos parlamentares que,
pela singularidade de seus trabalhos, não poderiam ficar subordinados a percursos e horários préestabelecidos, estando limitados apenas pelos valores fixos de suas cotas mensais.
Pertinente registrar que a sistemática de concessão de créditos nominais e em valores fixos
aos Deputados Federais foi objeto de apreciação pelo Tribunal de Contas da União (Decisão n°
61011999, Plenário: Acórdão n° 1525/2003, Plenário e Acórdão n° 467; 2006.Plenário), que acolheu
as justificativas apresentadas pela Direção desta Casa, para a disponibilização dos créditos e
conseqüente inexistência de processo licitatório no fornecimento de transporte aéreo aos deputados.
[grifos da instrução]
Quanto ao controle da despesa com a verba de transporte aéreo, o procedimento adotado
nesta Casa consiste no cadastramento das companhias aéreas no Sistema de Gestão de Cotas, que
acompanha a tramitação das requisições de passagens aéreas, e funciona da seguinte forma:
1. a requisição de passagem aérea é emitida diretamente por meio de módulo do sistema, até
o limite dos saldos das cotas correspondentes:
2. as requisições são encaminhadas para as companhias aéreas, que emitem os bilhetes ou os
créditos de passagem em nome dos Senhores Deputados;
3. para fins de pagamento, as companhias aéreas apresentam as respectivas faturas, à esta
Casa, acompanhadas das requisições e vias dos documentos supracitadas.
Registre-se que o procedimento acima descrito foi validado pela Mesa Diretora da Câmara
dos Deputados, por ocasião da apreciação do relatório de auditoria interna da Secretaria de Controle
Interno - SECIN - mediante processo n°132.360/2005.
c) Novas providências legais adotadas e implementação de novos mecanismos de controle:
A partir de estudos internos levados a efeito pelos órgãos técnicos desta Casa, detectou-se a
necessidade de aprimoramento das normas regulamentadoras do tema, a fim de tornarem mais
transparentes as hipóteses nas quais se admite a utilização da cota de transporte aéreo.
Nesse contexto, a mesa da Câmara dos Deputados editou o Ato da Mesa n° 42, de 2009, em
vigor desde 29/04/2009 (data da sua publicação), contemplando procedimentos já existentes e
introduzindo pontos considerados relevantes para o aperfeiçoamento dos controles na utilização do
recurso.
O referido ato, regulamentado pela Portaria DG n° 35, de 2009, com vistas a facilitar a
operacionalização do controle da verba de transporte aéreo, estabelece as seguintes modificações:
- reduz os valores das cotas, anteriormente fixados pela Portaria DG n°7, de 2009, na
proporção de 20%;
- extingue as cotas suplementares antes devidas aos membros da Mesa e às Lideranças;
- restringe a utilização da verba de transporte aéreo ao próprio parlamentar e aos seus
assessores, estes mediante comunicação à Terceira-Secretaria da Câmara dos Deputados;
- determina a publicação dos dados relativos à utilização da verba de transporte aéreo no
Portal Transparência da Câmara dos Deputados na internet;
- preceitua dedução automática em folha de pagamento do Deputado dos valores relativos
ao uso indevido da verba; [grifos da instrução]
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- estabelece regras para o controle dos créditos de passagens aéreas em nome dos
Deputados.
Buscando maior eficiência na gestão dos recursos públicos. Bem como racionalidade,
flexibilidade e transparência na sua utilização, dentre outros objetivos, a Câmara instituiu, por meio do
Ato da Mesa n° 43, de 2009, a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, que aglutina os
recursos da Cota Postal-Telefônica, Verba Indenizatória do Exercício Parlamentar e Verba de
Transporte Aéreo. O referido ato, publicado em 22.04 .2009, entrará em vigor em 10/07/2009. Com
relação às passagens aéreas, revoga o Ato da Mesa n° 42/2000 e suas alterações, contemplando,
contudo, os aprimoramentos introduzidos pelo Ato da Mesa n° 42/2009.
- respostas ao item II do ofício de diligência:
a) Conversão de pontos/milhas para a Câmara dos Deputados; b) razões jurídicooperacionais que impedem a conversão, caso não sejam convertidos e c) mecanismos existentes para
controle da obtenção do direito pelos parlamentares:
Os programas de fidelização instituídos por determinadas companhias aéreas se constituem
em uma bonificação ou cortesia concedida aos passageiros, com o intuito de torná-los cativos à
empresa.
Os pontos/milhas são atribuídos diretamente pelas companhias aos passageiros, não sendo
convertidos para a Câmara dos Deputados, uma vez que se trata de política interna de determinadas
companhias - nem todas adotam a prática — que não se encontra regulada por normativo legal
federal.
Diante desse fato, as empresas que adotam tal política junto aos seus clientes não
demonstram interesse em promover mudanças no sentido de repassar os bônus aos órgãos públicos
responsáveis pela despesa. Ilustrando a situação, mencionamos que, conforme noticiado no sítio do
Correio Braziliense, em 23/04/2009, cópia anexa, por resistência das companhias aéreas em mudar
seus critérios, no Distrito Federal, as pontuações de fìdelização continuam indo para cartões pessoais,
não obstante lei distrital de 2005 determinar que a pontuação decorrente de viagens seja creditada em
uma conta do Governo do Distrito Federal.
Nesse sentido, por falta de amparo legal, não há interferência da Câmara no processo que
envolve a concessão e utilização de eventuais pontos/milhas adquiridos por parlamentares em
programas de fidelização de companhias aéreas.
Sobre o assunto, ressaltamos, ainda, que existem projetos em tramitação no legislativo
federal, tratando de mudanças nos critérios de bonificação.
7.
Consta da documentação enviada pela Câmara dos Deputados tão-somente que (fl. 80/103),
no período de 21/6/2000 a 28/4/2009, a cota mensal de transporte aéreo do Deputado estava limitada
a valores fixos, de acordo com o estado de origem do parlamentar, conforme (...) [Ato da Mesa nº
42/2000], que estabelece a validade da requisição de transporte aéreo durante o exercício fiscal de
sua emissão.
(...) [Neste ponto, a instrução apresenta algumas páginas com os resumos de dois
pareceres jurídicos sobre o tema, que teriam sido encomendados pela Câmara dos Deputados.
Basicamente, esses pareceres sustentam que os atos praticados sob a égide das normas
vigentes até a edição do Ato da Mesa n° 43/2009 estariam legitimados, por tratar-se de prática
costumeira, naquele órgão, sedimentada desde 1960. Essa peculiaridade afastaria eventual
reprovação ética do costume até então existente (que se traduzia, basicamente, na liberalidade
do modo de uso de créditos de passagens aéreas pelos parlamentares).
Observo que o teor desses pareceres foi obtido na Internet, pela unidade técnica, em
sítio jornalístico indepedente da Câmara dos Deputados (fls. 106/188), e que os argumentos
neles contidos não constam – nem são tangenciados – na resposta à diligência efetuada neste
5
processo.
Dessa forma, não se pode considerá-los, nos presentes autos, como esclarecimentos
prestados pelo órgão responsável.
Assim prossegue a instrução:]
10.
Analisando as notícias divulgadas pela imprensa, à luz dos esclarecimentos prestados pela
Câmara dos Deputados, do Ato da Mesa nº 42, de 21/6/2000 (fl. 81/83) – que disciplinava a
concessão de passagens aéreas aos Deputados até 22/4/2009 –, (...) observamos que remanesce
insolúvel parte dos questionamentos aventados na peça de origem desta Representação, sobretudo
aqueles relativos à utilização da cota de passagens aéreas por terceiros ou em viagens de férias,
principalmente para destinos turísticos no exterior, consoante ponderações a seguir.
I) Utilização indevida da cota de passagens aéreas em viagens particulares
11.
Com efeito, entendemos que o uso da cota de passagens aéreas dos Deputados em viagens de
férias ou passeio turístico, tais como aquelas trazidas à tona pelo sítio Congresso em foco (viagens
internacionais), configura ofensa aos princípios que regem a Administração Pública, em especial os
da legalidade, da moralidade e da impessoalidade, insculpidos do art. 37, caput, da Constituição
Federal de 1988, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda
Constitucional n. 19, de 1998) (grifos da instrução)
12.
Ora, o cerne da questão em apreço passa necessariamente pela real motivação e, mais
precisamente, pela finalidade das viagens realizadas com o uso das cotas disponibilizadas pela
Câmara, aspecto que resvala para o exame da moralidade de tais atos. Trata-se, portanto, da
verificação da existência do interesse público – finalidade certa e inafastável de qualquer ato
administrativo – nas viagens realizadas. Nesse sentido, a destinação a fins privados de passagens
aéreas das cotas mensais de Deputados configura conduta que manifestamente afronta a moralidade
administrativa.
(...) [Neste ponto, a instrução colaciona diversas lições acerca do princípio da legalidade na
Administração Pública, citando vários doutrinadores do Direito Administrativo, podendo-se resumir os
conceitos apresentados na máxima segundo a qual o gestor público somente pode fazer o que a lei
permite. Segue-se a continuidade da instrução:]
18.
Não basta, portanto, se cogitar que o (...) [Ato da Mesa nº 42/2000] não vedava expressamente
a utilização da cota de passagens aéreas por terceiros ou em viagens de férias, passeio ou turismo,
uma vez que a referida regulamentação é, por óbvio, destinada a cobrir gastos do parlamentar dentro
dos limites do interesse público, que em última instância se traduz no interesse da Câmara dos
Deputados, no caso concreto. Qualquer destinação, pois, diversa do interesse público, confere à
despesa com passagens aéreas da cota o vício de desvio de finalidade.
19.
No que tange ao princípio da moralidade, o mesmo autor [Hely Lopes Meirelles], sintetizando
as lições de Maurice Hauriou, assinala que os agentes públicos devem atuar sempre observando,
além da lei jurídica, o elemento ético de sua conduta, conforme se depreende do excerto a seguir:
A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da
Administração Pública (CF, art. 37, caput). Não se trata – diz Hauriou, o sistematizador de tal
conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como ‘o conjunto de regras
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de conduta tiradas da disciplina interior da Administração’. Desenvolvendo a sua doutrina, explica o
mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve,
necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar
o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e
o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o
desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer
somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é
honesto, conforme já proclamavam os romanos: ‘non omne quod licet honestum est’. A moral comum,
remata Hauriou, é imposta ao homem para a sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao
agente público para a sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que se serve, e a
finalidade de sua ação: o bem comum".
(...)’ (in Direito Administrativo Brasileiro. 30ª ed., Malheiros Editores Ltda., 2005, p. 89)
(grifamos)
(...) [A instrução reproduz, neste ponto, outros ensinos doutrinários e precedentes
jurisprudenciais sobre o conceito de moralidade pública, aduzindo, também, conceituação doutrinária
sobre o princípio da impessoalidade ou da finalidade (que se resume na obrigatoridade de o ato
administrativo buscar sempre o fim público, e não objetivos pessoais). Continua a instrução:]
23.
Desse modo, verifica-se que, em alguns casos, a pura e simples aplicação do positivismo
legalista poderá significar desprezo ao interesse público. Donde se conclui que os deveres e as
vedações do administrador público não são apenas aqueles expressos em lei, mas também os exigidos
pelo interesse da coletividade e, via de conseqüência, os impostos pela moral administrativa.
24.
Reitere-se, por oportuno, que a moralidade constitui pressuposto de validade de todo ato
administrativo, não podendo o agente público, ao atuar, desprezar o elemento ético de sua conduta.
Daí decorre o disposto na Lei n.º 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal, ao fazer alusão, em seu art. 2º, caput, à moralidade como sendo um
dos princípios a que se obriga o administrador público.
(...)
26.
Assim sendo, percebe-se que o princípio da impessoalidade estabelece que a Administração
Pública deve praticar os seus atos visando ao interesse público e atendendo a sua finalidade legal,
impedindo que o ato seja praticado em atendimento de interesses individuais.
27.
Na situação vertente, é flagrante que a utilização da cota de passagens aéreas para viagens de
férias com a família e turismo internacional, como nos casos reportados pela imprensa, caracteriza
afronta aos princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade.
28.
De outro lado, remetendo a um princípio não explicitado na Constituição, mas que se aplica
ao caso ora analisado, o renomado professor Celso Antônio Bandeira de Mello [in: Curso de Direito
Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 18ª ed., 2005, pp. 87/89] preconiza que:
‘O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral
de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica
em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem
manifestações concretas dele (...). Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio
social.
(...)
7
30.
Ademais, é de se notar a falta de legitimidade da utilização irregular da cota de passagens
aéreas em viagens particulares, dada a afronta aos princípios da legalidade, da moralidade, da
impessoalidade, da finalidade e da supremacia do interesse público (...)
31.
No que concerne à discricionariedade, não se pode olvidar que a finalidade e a motivação
constituem elementos essenciais à validade dos atos administrativos, que ocorrem dentro dos limites
do interesse público, mesmo que sob a égide da conveniência e da oportunidade, o que se coaduna
com o posicionamento desta Corte sobre a matéria, a exemplo do trecho do Voto prolatado pelo
Exmo. Ministro Aroldo Cedraz, nos autos do TC 007.956/1995-9, para subsidiar o Acórdão nº
459/2007 – Plenário:
Na mesma linha, assinalo que discricionariedade não pode ser confundida com
arbitrariedade. Discricionariedade refere-se à liberdade conferida ao administrador para decidir
livremente entre caminhos igualmente legais, legítimos e que tenham por fim o atingimento do interesse
público. Nas palavras de Marçal Justen Filho, ‘É evidente que discricionariedade não se confunde com
arbitrariedade. A discricionariedade consiste numa autonomia de escolha exercitada sob a égide da
Lei e nos limites do Direito. Isso significa que a discricionariedade não pode traduzir um exercício
prepotente de competências. Não autoriza a faculdade de escolher ao bel-prazer, por liberalidade ou
para satisfação de interesses secundários ou reprováveis’ (in Comentários à Lei de Licitações e
Contratos Administrativos, p. 284,. Dialética, 9ª ed.)’
(...) [Em complemento, a instrução acrescenta outras definições de poder discricionário,
com base em doutrinadores do Direito Administrativo.]
33.
Não é demais ressaltar que o emprego da cota de passagens aéreas em viagens particulares,
sob o argumento de que tal prática não era expressamente vedada, carece da razoabilidade exigida
em qualquer atividade discricionária na Administração Pública, o que impõe a ilegalidade das
condutas distanciadas desse limite, nas palavras de Diógenes Gasparini (in: Direito Administrativo.
8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, pg. 22 e 23).
(...) [Em reforço, a instrução registra sete páginas de lições doutrinárias e jurisprudenciais
para demonstrar a supremacia dos princípios jurídico-administrativos, especialmente os da legalidade,
da moralidade e da finalidade, “como critérios válidos de aferição da conduta dos agentes públicos”.
Também são anotados excertos de doutrina para reforçar a submissão dos agentes políticos aos
preceitos constitucionais.]
38.
Quanto à competência desta Corte para, entre outras atribuições, julgar as contas dos
responsáveis por recursos públicos, tendo em vista a legalidade, a impessoalidade e a moralidade dos
atos de gestão, (...) [trata-se de matéria pacificada na jurisprudência deste Tribunal].
39.
Por conseguinte, restou demonstrada a irregularidade da realização de viagens, por meio da
utilização indevida da cota de passagem aérea da Câmara, sem pertinência com o interesse público
ou sem motivação suficiente, em desacordo com os princípios constitucionais da legalidade, da
moralidade e da impessoalidade, preconizados no art. 37, “caput”, da Constituição da República,
bem como aos princípios administrativos da razoabilidade, da finalidade e da supremacia do
interesse público.
40.
De fato, a utilização de qualquer recurso público, ainda que a título de custeio de transporte
aéreo do parlamentar, deve ser feita por motivo bem determinado, bem explícito, para que os órgãos
competentes (Controle Interno, Tribunal de Contas da União, Poder Judiciário e Ministério Público
Federal) e a própria sociedade possam exercer o indeclinável direito de fiscalizar os atos de suas
autoridades constituídas, de seus agentes políticos. Se realmente havia uma motivação para a viagem
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e para a despesa, era dever dos responsáveis pela correta aplicação do dinheiro público deixá-la
explícita, para que nenhuma dúvida pairasse sobre a lisura de sua conduta.
41.
Digno de registro que a regularidade das passagens aéreas adquiridas pelos parlamentares
mediante a referida cota é facilmente verificada por meio das informações detalhadas nos bilhetes
emitidos pelas companhias aéreas ou agências de viagens (nome do passageiro, itinerário e data, por
exemplo). Ora, ainda que o Ato da Mesa nº 42/2000 não fixasse o itinerário dos bilhetes emitidos,
dada a decisão da Mesa de 17/10/1996 (fls. 80/81), qualquer passagem comprovadamente utilizada
em finalidade diversa da atividade parlamentar (tais como deslocamento de artistas, viagem de férias
em balneário turístico ou no exterior, etc. – manifestamente desvinculados do interesse público) impõe
o ressarcimento do valor correspondente ao erário. Enquadram-se em tal situação irregular, pois, (...)
[os casos noticiados em veículos jornalísticos, que motivaram esta representação ( fls.1/38)].
42.
Em face do exposto, torna-se imperativa a apuração rigorosa dos casos de utilização indevida
da cota de passagens aéreas em viagens particulares, bem como a devolução dos valores pagos
indevidamente pela Câmara (...).
43.
Insta consignar que a Resolução nº 25/2001, da Câmara dos Deputados, não deixa dúvidas
sobre a conduta do parlamentar diante do seu dever de agir com lisura e transparência no exercício
do seu mandato, o que encontra eco no próprio texto constitucional:
Resolução nº 25/2001, Institui o Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos
Deputados
Art. 3º São deveres fundamentais do Deputado:
I - promover a defesa do interesse público e da soberania nacional;
IV - exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular, agindo com
boa-fé zelo e probidade;
VIII - prestar contas do mandato à sociedade, disponibilizando as informações necessárias ao seu
acompanhamento e fiscalização;
Art. 5º Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis na forma deste
Código:
VII - usar verbas de gabinete em desacordo com os princípios fixados no caput do art. 37 da
Constituição Federal; [grifos da instrução]
44.
Desse modo, faz-se necessário determinar à Câmara dos Deputados que apure os demais
casos de utilização indevida da cota de passagens aéreas em viagens particulares, do próprio
parlamentar ou de terceiros, a exemplo dos casos noticiados pela imprensa de abril a junho deste ano
(...).
45.
Cumpre, ainda, determinar à Câmara dos Deputados que promova o ressarcimento dos
valores gastos indevidamente a título de cota de passagem aérea aos Deputados, para custear viagens
particulares, enviando ao Tribunal o comprovante da devolução de tais valores.
46.
Por fim, convém dirigir determinação ao Controle Interno da Câmara dos Deputados para que
acompanhe as apurações e devoluções acima, informando ao Tribunal na próxima tomada de contas
o resultado das medidas adotadas pelo Órgão.
II) Milhagens oriundas da cota de passagens aéreas
47.
Com relação ao questionamento sobre o usufruto de milhagens pelo agente político que
9
realizou viagens utilizando a cota de passagens aéreas da Câmara, resgatamos o seguinte
posicionamento desta Corte sobre a matéria, exarado nos autos do TC 009.645/2007-3, que resultou no
Acórdão nº 1606/2007 – Plenário, de 15/8/2007, parcialmente abaixo reproduzido:
(...) [Neste ponto, a instrução reproduz vários exertos do Relatório e do Voto que
fundamentaram o referido Acórdão. Em face do significativo tamanho das transcrições, sintetizo os
principais pontos então abordados.
O mencionado decisum tratou de solicitação oriunda da Câmara dos Deputados,
questionando a ausência de reversão à Administração Federal dos benefícios oriundos de programas de
milhagem, que estariam sendo indevidamente usufruídos pelos servidores ou agentes políticos que
realizavam as viagens.
Na ocasião, foram expostos diversos argumentos favoráveis à concessão dos benefícios à
Administração, e não aos passageiros, enquanto servidores. Verificou-se, contudo, a inexistência de
normas, no âmbito das empresas aéreas, que autorizassem o crédito dos pontos dos programas de
milhagem à Administração Pública contratante.
Sob essas premissas, proferiu-se o Acórdão 1606/2007 – Plenário, em que foram expedidas,
entre outras, as seguintes informações ao Congresso Nacional:
9.2.3. a falta de aproveitamento pelo Governo Federal dos benefícios oferecidos pelos
programas de fidelidade das companhias aéreas está vinculado aos impedimentos previstos nos
regulamentos dos programas de fidelidade das companhias aéreas, que não contemplam a fruição do
benefício pela fonte pagadora da passagem e à inexistência de dispositivo legal sobre o aproveitamento
desses benefícios;
9.2.4. os procedimentos usados para a aquisição e fruição de passagens aéreas pelo Poder
Executivo, bem como a utilização dos benefícios decorrentes de fidelidade oferecidos pelas companhias
estão descritos na Portaria n.º 98 MP/GM, compreendendo utilização preferencial do pregão na
contratação de agência de viagens, solicitação de bilhete com dez dias de antecedência, que deve ser
emitido ao menor preço, garantida condição laborativa produtiva ao servidor;
9.2.5. não há controle físico ou contábil desses ativos pela União uma vez que, quando
existentes, são apropriados pelos servidores ou agentes políticos em nome dos quais foram emitidos os
respectivos bilhetes;
9.3. recomendar ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - MPOG que, a partir de
negociações com empresas aéreas, verifique a possibilidade de apropriação dos benefícios decorrentes
dos programas de milhagem pela fonte pagadora dos bilhetes de passagem aérea;
Segue-se a conclusão da 3ª Secex sobre o ponto examinado:]
48.
Tendo em vista as considerações constantes do Acórdão nº 1606/2007 – Plenário, de
15/8/2007, acima, cabe tão-somente recomendar à Câmara dos Deputados que, a partir de
negociações com empresas aéreas, verifique a possibilidade de apropriação dos benefícios
decorrentes dos programas de milhagem pela fonte pagadora dos bilhetes oriundos da cota de
passagem aérea dos Deputados.
III) Demais casos de possível irregularidade na cota de passagens aéreas
49. No que toca aos demais fatos noticiados pela imprensa, que indicam possíveis ocorrências de
irregularidades, entendemos que:
a) Quanto a uma suposta acumulação de saldo remanescente da parcela da cota não utilizada
no mês de referência, nos termos aventados pela mídia, de fato, conforme a argumentação
apresentada pela Câmara, a conversão das requisições de passagens em créditos junto às companhias
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
aéreas já foi enfrentada por esta Corte nos autos do TC 015.327/1996-5 (Decisão 610/1999 –
Plenário – fls. 56) e do TC 015-449/2002-6 (Acórdãos 1525/2003 e 467/2006, ambos do Plenário –
fls. 57), que não deixam dúvidas quanto o posicionamento favorável do TCU à concessão dos
créditos, à época;
b) Ademais, com a instituição da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar – CEAP,
por meio do Ato da Mesa nº 43, de 21/5/2009 [fls. 97/103], passaram a ser aglutinados em uma única
rubrica os recursos anteriormente distribuídos em Cota Postal Telefônica, Verba de Transporte Aéreo
e Verba Indenizatória do Exercício Parlamentar, com as seguintes melhorias na gestão de passagens
aéreas:
Art. 2º A Cota de que trata o artigo anterior atenderá às seguintes despesas:
I - passagens aéreas;
(...)
Parágrafo único. As despesas estabelecidas nos incisos I, VII e VIII poderão ser realizadas por
assessores, assim entendidos os servidores efetivos, os ocupantes de cargos de natureza especial ou
secretários parlamentares vinculados à Câmara dos Deputados, desde que custeados mediante
reembolso ao Deputado.
(...)
Art. 4º A solicitação de reembolso será efetuada mediante requerimento padrão, assinado pelo
parlamentar, que, nesse ato, declarará assumir inteira responsabilidade pela liquidação da despesa,
atestando que:
I - o material foi recebido ou o serviço, prestado;
II - o objeto do gasto obedece aos limites estabelecidos na legislação;
III - a documentação apresentada é autêntica e legítima.
(...)
§ 10. A Coordenação de Gestão de Cota Parlamentar do Departamento de Finanças, Orçamento e
Contabilidade fiscalizará os gastos apenas no que respeita à regularidade fiscal e contábil da
documentação comprobatória, cabendo exclusivamente ao Deputado responsabilizar-se pela
compatibilidade do objeto do gasto com a legislação, fato que o parlamentar atestará expressamente
mediante declaração escrita.
(...)
§ 14. Cumpridas as formalidades previstas no art. 228 do Regimento Interno da Câmara dos
Deputados, o reembolso das despesas com passagens aéreas, no interesse do mandato parlamentar,
poderá ser custeado com recursos da Cota, mediante autorização prévia do Terceiro-Secretário.
(...)
Art. 5º A critério do Deputado, o fornecimento de transporte aéreo e de serviços postais poderá se dar
na forma prevista no inciso I do art. 3º, mediante emissão de Requisição de Passagem Aérea (RPA) e
de Requisição de Serviços Postais (RSP), respectivamente.
§ 1º A RPA e a RSP terão validade para uso até o último dia útil do respectivo exercício financeiro.
§ 2º A RPA e a RSP serão emitidas pelo sistema informatizado de controle da Cota e deverão ser
assinadas pelo Deputado interessado ou servidor credenciado.
§ 3º O fornecimento de bilhetes de passagem aérea será feito mediante entrega de RPA do Deputado
diretamente à empresa previamente credenciada e cadastrada junto ao Departamento de Finanças,
Orçamento e Contabilidade.
§ 4º A emissão de RPA e de bilhete de passagem aérea nas empresas de transporte aéreo será feita pelo
Deputado ou por um servidor do Gabinete Parlamentar por ele indicado e devidamente credenciado
pela Terceira-Secretaria.
§ 5º A emissão de bilhetes em nome de servidores exigirá comunicação formal à Terceira-Secretaria,
em relatório próprio encaminhado até o primeiro dia útil do mês seguinte ao da emissão do bilhete.
§ 6º A RPA e o bilhete não utilizado somente poderão ser convertidos em ordem de crédito de
passagem mediante a abertura de conta nominal específica do parlamentar junto à companhia aérea.
(...)
Art. 6º As empresas de transporte aéreo credenciadas, sempre que solicitado pela Câmara dos
11
Deputados, deverão apresentar, além dos documentos necessários à liquidação da despesa,
informações detalhadas dos bilhetes emitidos à conta da Cota para o Exercício da Atividade
Parlamentar, bem como da movimentação da conta a que se refere o § 6º do artigo anterior.
Art. 7º Serão descontados automaticamente em folha de pagamento do Deputado os valores relativos
aos bilhetes emitidos em desacordo com as normas constantes deste Ato.
(...)
Art. 12. O direito à utilização da Cota se restringe ao período de efetivo exercício do mandato,
incluindo o dia de assunção ou reassunção e o do afastamento.
Art. 13. O saldo da Cota não utilizado acumula-se ao longo do exercício financeiro, vedada a
acumulação de saldo de um exercício para o seguinte.
§ 1º A Cota somente poderá ser utilizada para despesas de competência do respectivo exercício
financeiro.
§ 2º A importância que exceder, no exercício financeiro, o saldo de Cota disponível será deduzida
automática e integralmente da remuneração do parlamentar ou do saldo de acerto de contas de que ele
seja credor, revertendo-se à conta orçamentária própria da Câmara dos Deputados.
Art. 14. A Cota não poderá ser antecipada, transferida de um beneficiário para outro, convertida em
pecúnia ou associada, ainda que parcialmente, a outros benefícios, verbas ou Cotas.
(...)
Art. 18. A utilização da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar será publicada no Portal
Transparência da Câmara dos Deputados na internet, na forma dos incisos seguintes:
I - quando se tratar da utilização de serviços de transporte aéreo: nome do passageiro,data de
emissão do bilhete, percurso e valor.
JUSTIFICAÇÃO
Os recursos destinados ao apoio do exercício do mandato, que agora se pretende aglutinar na Cota
para o Exercício da Atividade Parlamentar, estão atualmente distribuídos em Cota Postal-Telefônica,
Verba de Transporte Aéreo e Verba Indenizatória do Exercício Parlamentar. Visam ao custeio de
despesas típicas do exercício do mandato parlamentar, não podendo ser vistos como incremento dos
subsídios pagos aos Senhores Deputados Federais, nem como aporte adicional de dinheiro em espécie.
Foram esses benefícios criados com a finalidade de promover o bom desempenho da atividade
parlamentar, dentro dos limites orçamentários da Câmara dos Deputados. Permitem, em última
análise, que o deputado realize as ações necessárias ao legítimo exercício do seu mandato, sem que,
para tanto, se veja obrigado a lançar mão de meios destinados à própria subsistência.
Levando em conta os entraves da atual sistemática de gestão das Cotas, procurou-se enfrentar os
problemas vivenciados pelos Parlamentares na utilização dos recursos à sua disposição, bem assim as
dificuldades operacionais e administrativas hoje existentes e as que poderiam advir das diversas
propostas apresentadas, além do interesse e repercussão que o assunto teria para os diversos
segmentos da sociedade.
Na verdade, dada a finalidade precípua das Cotas, a utilização dos recursos deve implicar tão-somente
exigências burocráticas imprescindíveis, segundo o sistema normativo, permitindo a flexibilidade
possível na realização dos gastos.
Além disso, padronizou-se o prazo de cumulatividade dos saldos das Cotas para o período de um ano.
Com isso, o parlamentar passa a dispor de maior prazo para utilização dos recursos.
c) Restam elididas, pois, as demais fragilidades atinentes ao controle deficiente no
acompanhamento dos créditos das passagens e na transparência dos itinerários dos bilhetes emitidos
pelas empresas aéreas;
d) Em relação ao desvio de passagens, adquiridas por meio da cota, para venda ilegal a
outros usuários, a Administração da Casa promoveu a Sindicância instituída pela Portaria nº
52/2009-DG (Processo nº 112.498/2009-CD), que concluiu pela existência de “fortes indícios de
comercialização de créditos” de passagens aéreas, o que ensejou a proposta de abertura de diversos
Processos Administrativos Disciplinares contra servidores da Câmara, além do encaminhamento
daqueles autos ao Ministério Público Federal para a adoção das medidas cabíveis nas esferas cível e
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
criminal;
e) No que concerne às apurações em curso no Parquet, conforme notícias do sítio “Congresso
em foco”, foram instaurados 5 Inquéritos Civis, desmembrados do IC 1.16.000.002149/2005-21,
mediante as Portarias de nº 168 a 172/2009, todas de 10/6/2009, por iniciativa da Procuradora da
República Anna Carolina Resende de Azevedo Maia, da Procuradoria da República no Distrito
Federal;
f) (...) no ápice da controvérsia gerada pela divulgação das sucessivas notícias de
irregularidades no uso da cota de passagens aéreas em abril, pelo sítio “Congresso em foco” – o
MPF endereçou recomendação de medidas corretivas à Câmara (parcialmente contempladas no Ato
da Mesa nº 43, de 21/5/2009), apontando os seguintes indícios de irregularidades em apuração pelo
Parquet (fls. 189/210):
“A investigação teve início a partir do Inquérito Policial 2005.34.00.022021-5, no qual foram
apurados diversos ilícitos, inclusive penais que ensejaram a propositura de denúncia criminal pelo
PGR.
A partir dessa análise, o Ministério Público Federal identificou inúmeras irregularidades envolvendo a
utilização da Cota de Transporte Aéreo instituída por meio do Ato da Mesa nº 42, 21/06/2000. São
elas, em síntese:
Quanto às passagens emitidas em nome dos Deputados:
i) emissão de passagens para o exterior não relacionados à missão oficial pela Câmara dos
Deputados;
ii) emissão de passagens domésticas para destino diverso do Estado de origem do parlamentar;
iii) cessão de créditos da Cota para outros parlamentares;
iv) emissão de passagens aéreas em nome de Deputados nas situações de impedimento previstas no Art.
3º do Ato da Mesa nº 42/2000;
v) desarrazoabilidade dos valores pagos, que, em alguns casos, permitem a realização de até 40
viagens de ida e volta para o Estado de origem do parlamentar num único mês, conforme se vê da
Tabela I em anexo;
vi) desproporcionalidade entre os valores pagos a cada um dos parlamentares considerando os
respectivos Estados de origem. Enquanto os Deputados de Roraima, por exemplo, compram com os
recursos da Cota 12 passagens ida/volta de Brasília até a capital do seu Estado, os Deputados
oriundos do MG e do MT, com a verba que lhes é destinada para o mesmo fim, conseguem adquirir,
mensalmente, até 40 passagens ida e volta;
vii) as milhas creditadas em favor dos parlamentares não são computadas no cálculo do valor da Cota,
o que deveria ser feito para diminuir o montante a ser pago sem prejudicar o interesse público
existente nas viagens dos parlamentares;
viii) ausência de orientação normativa no sentido de que os servidores da Coordenação de Gestão da
Cota Parlamentar da Câmara dos Deputado:
viii.1. Exijam, como requisito indispensável à autorização do pagamento, que as faturas
apresentadas pelas companhias aéreas relativas às despesas a serem debitadas da Cota de
Transporte Aéreo tenham a descrição dos trechos voados e o nome do passageiro em favor de
quem foi emitido o bilhete;
viii.2. Apenas autorizarem o pagamento dos bilhetes aéreos emitidos em nome do parlamentar
responsável pela Requisição de Transporte Aéreo, desde que não haja qualquer das situações
de impedimento descritas no art. 3º do Ato da Mesa n. 42 e que a viagem se destine ao Estado
de origem do Deputado;
viii.3. Façam um acompanhamento rígido dos créditos da Cota de Transporte não utilizados
pelos parlamentares para evitar que esses recursos permaneçam nos cofres das companhias
aéreas sem que tenha havido qualquer emissão de bilhetes;
Nesse ponto, cumpre-nos esclarecer que consoante informações prestadas pelas companhias
aéreas, os valores das Requisições de Transporte Aéreo não utilizados no prazo de um ano só
13
são devolvidas à Câmara dos Deputados mediante pedido de reembolso.
ix) ausência de controle eficaz das Requisições de Transporte Aéreo assinadas por servidores
designados pelos parlamentares;
x) inclusive parlamentares do Distrito Federal percebem mensalmente Cota de Transporte Aéreo,
sendo que não necessitam valer-se deste tipo de transporte para ir até as suas bases eleitorais;
Quanto às passagens emitidas em nome de terceiros:
a) uma quantidade expressiva de passagens, inclusive para o exterior, foram emitidas no período
analisado em nome de parentes do Deputado titular da Cota e de terceiros estranhos ao quadro de
servidores da Câmara dos Deputados;
c) passagens aéreas em nome de servidores da Câmara lotados em Brasília;
f) Nesse sentido, convém apenas acompanhar o desdobramento das apurações em curso na
Câmara dos Deputados e no MPF, no que se refere ao suposto comércio ilegal de créditos oriundos
da cota de passagens aéreas.
CONCLUSÃO
50.
Das análises precedentes, verificamos que a utilização indevida da cota de passagens aéreas,
em viagens desvinculadas da atividade parlamentar, fere frontalmente os princípios constitucionais
da legalidade, da moralidade e da impessoalidade, bem assim os princípios administrativos da
finalidade, da supremacia do interesse público e da razoabilidade, pelo que deve ser apurada pelo
Câmara e os respectivos valores devolvidos aos cofres públicos pelos Deputados.
51.
Enquadram-se em tal situação irregular as passagens aéreas utilizadas em viagens de férias,
lazer, turismo, passeio, entre outros, além de todas as viagens internacionais sem justificativa
plausível, por estarem desvinculadas da atividade parlamentar.
52.
(...) [Transcrições do Código de Ética dos Servidores do Tribunal de Contas da União,
invocado por analogia, para tecer considerações sobre ética institucional.]
53.
(...) [Referências à Resolução TCU n° 225, de 13/5/2009, que estabelece critérios para a
emissão e utilização de passagens aéreas no âmbito do Tribunal de Contas da União, cujo acórdão que
a aprovou registra considerações, deste Relator, sobre a necessidade de transparência nos dispêndios
com passagens aéreas para autoridades e de respeito aos “princípios constitucionais da moralidade, da
publicidade e da transparência que, no Estado Democrático de Direito, constituem instrumentos
basilares ao acompanhamento pela sociedade dos gastos públicos”.
Prossegue-se com a instrução da 3ª Secex:]
54.
No que concerne às demais hipóteses de irregularidade suscitadas pela imprensa, restou
procedente apenas a parte relativa ao comércio clandestino de créditos oriundos de passagens
aéreas, o que já está sendo apurado pelas instâncias competentes, bastando acompanhar o resultado
das investigações em curso, haja vista eventuais reflexos futuros na esfera administrativa, em especial
possíveis prejuízos aos cofres públicos que venham a se caracterizar.
55.
Por fim, observamos que as alterações promovidas pela Administração da Câmara para
disciplinar a concessão de passagens aéreas aos Deputados são suficientes para afastar a repetição
futura dos fatos questionados nas reportagens que ensejaram a presente representação, conforme item
49 desta instrução.
56.
Quanto ao valor da nova verba de transporte aéreo, embora a cota instituída englobe gastos de
outra natureza (postal-telefônica, etc.), colacionamos a seguir as quantias especificadas às fls. 101:
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
Valor mensal no Câmara dos Deputados, conforme o estado de origem do parlamentar
Estado do parlamentar
(R$)
ACRE
33.516,34
ALAGOAS
30.723,33
AMAPÁ
32.563,97
AMAZONAS
32.711,89
BAHIA
29.259,38
CEARÁ
31.865,01
DISTRITO FEDERAL
23.033,13
ESPÍRITO SANTO
28.057,67
GOIÁS
26.606,13
MARANHÃO
31.637,78
MATO GROSSO
29.575,29
MATO GROSSO DO SUL
30.419,48
MINAS GERAIS
27.049,62
PARÁ
31.695,15
PARAÍBA
31.547,57
PARANÁ
29.154,13
PERNAMBUCO
31.278,18
PIAUÍ
30.744,29
RIO DE JANEIRO
26.797,65
RIO GRANDE DO NORTE
32.077,21
RIO GRANDE DO SUL
30.671,69
RONDÔNIA
32.789,41
RORAIMA
34.258,50
SANTA CATARINA
29.915,86
SÃO PAULO
27.769,62
SERGIPE
30.113,87
TOCANTINS
29.632,52
15
Fonte: Anexo do Ato da Mesa n° 43/2009, da Câmara dos Deputados (fls. 100/02).
PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO
57.
Diante do exposto, submetemos os autos à consideração superior propondo:
57.1 conhecer da presente Representação, nos termos do art. 237, VI, do Regimento Interno/TCU,
para, no mérito, considerá-la procedente;
57.2
determinar à Câmara dos Deputados que:
a) apure os demais casos de utilização indevida da cota de passagens aéreas em viagens
particulares, do próprio parlamentar ou de terceiros, em especial nas viagens internacionais, a
exemplo dos casos noticiados pela imprensa de abril a junho deste ano (tal como o caso do Deputado
Fábio Faria, que teria lançado mão de cota de passagens aéreas em benefício de artistas e
apresentadora de TV), por afronta aos princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade,
insculpidos no art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988;
b) promova o ressarcimento dos valores gastos indevidamente a título de cota de passagem
aérea aos Deputados, para custear viagens particulares, enviando ao Tribunal o comprovante da
devolução de tais valores;
57.3 determinar ao Controle Interno da Câmara dos Deputados que acompanhe as apurações e
devoluções acima, informando ao Tribunal na próxima tomada de contas o resultado das medidas
adotadas pelo Órgão.
57.4 recomendar à Câmara dos Deputados que, a partir de negociações com empresas aéreas,
verifique a possibilidade de apropriação dos benefícios decorrentes dos programas de milhagem pela
fonte pagadora dos bilhetes oriundos da cota de passagem aérea dos Senadores.
2.
***
A proposta foi endossada pelo Secretário substituto da 3ª Secex (fl. 244).
É o Relatório.
VOTO
Conforme consignei no despacho de fl. 41, a presente representação atende aos requisitos de
admissibilidade previstos no art. 237, inciso VI, do Regimento Interno deste Tribunal, razão por que
ratifico a manifestação quanto ao conhecimento do feito.
2.
A representação em tela decorreu de notícias veiculadas no mês de abril/2009, em veículos
jornalísticos, informando o uso irregular de verbas indenizatórias, pagas pelo Câmara dos Deputados,
destinadas ao custeio de passagens aéreas para Deputados Federais.
3.
Verificou-se que parte das questões suscitadas possuía amparo em normas internas do Câmara
dos Deputados, principalmente no Ato da Mesa Diretora n° 42/2000 (fls. 82/83).
4.
Por outro lado, a Câmara implementou recentes modificações nas regras pertinentes, com
destaque para o Ato da Mesa n° 43, de 21/5/2009 (fls. 97/100). Essas alterações, conforme demonstro
a seguir, restringiram o direito de uso das verbas indenizatórias, além de aumentar os controles e a
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
transparência desse tipo de despesa.
5.
Com efeito, o Ato da Mesa n° 42/2000 foi modificado pelo Ato de n° 42, de 28/4/2009 (fl. 93),
que, entre outras providências, extinguiu “a cota mensal de transporte aéreo dos Deputados (...)
utilizada a critério discricionário”, criando a “verba de transporte aéreo”, com valor limitado e de uso
restrito para viagens no território nacional. Referida norma ainda restringiu expressamente o uso de
passagens aéreas somente aos parlamentares e, mediante notificação formal à 3ª Secretaria da Câmara
dos Deputados, a seus respectivos assessores. Também impôs a divulgação, na Internet, da sua
utilização pelos parlamentares.
6.
A matéria foi regulamentada mediante a Portaria n° 35, de 13/5/2009, que instituiu o desconto
automático em folha de pagamento do Deputado dos valore dos bilhetes emitidos em desacordo com o
precitado Ato n° 42/2009 (fl. 96).
7.
Posteriormente, editou-se o Ato n° 43, de 21/5/2009 (fls. 97/100), que, além de revogar o Ato n
° 42/2000, instituiu a “cota para o exercício da atividade parlamentar”, que engloba várias despesas
indenizáveis, incluindo o uso de passagens aéreas.
8.
A par de manter as inovações trazidas com o Ato n° 42/2009, a nova regulamentação
estabeleceu, explicitamente, em seu art. 1º, que o uso da cota destina-se ao custeio de “gastos
exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar”. Também incluiu dispositivos que
exigem a expressa a declaração do parlamentar sobre sua “inteira responsabilidade pela liquidação da
despesa” (art. 4º), além de disciplinar os casos de requisições de passagens e de bilhetes não utilizados
(art. 5º, §6º). Merecem destaque, ainda, a exigência, junto às empresas de transporte aéreo
credenciadas, de informações detalhadas dos bilhetes emitidos (art. 6°), bem como a vedação expressa
do direito de uso da cota “ao período de efetivo exercício do mandato” (art. 12). Por fim, definiu-se
que a cota “não poderá ser antecipada, transferida de um beneficiário para outro, convertida em
pecúnia ou associada, ainda que parcialmente, a outros benefícios, verbas ou Cotas” (art. 14).
9.
Vê-se, portanto, o caráter moralizador das novas regras instituídas pela Câmara dos Deputados,
relativamente à concessão de verbas indenizatórias, especialmente no que tange às passagens aéreas.
10.
Especificamente quanto aos fatos apontados nos veículos jornalísticos, restaram não elididos os
questionamentos relativos à utilização da cota de passagens aéreas com finalidade estranha ao interesse
do mandato. Conquanto as recentes alterações normativas implementadas pela Câmara impeçam
formalmente a repetição de fatos da espécie, as ocorrências noticiadas na representação, anteriores aos
Atos da Mesa n° 42/2009 e n° 43/2009, exigem apuração administrativa.
11.
Sobre esse ponto, verifica-se que esse tipo de falha era, em tese, facilitada pelo então vigente
Ato n° 42/2000, que dispunha sobre a matéria de forma genérica, sem estabelecer maiores restrições à
requisição de passagens aéreas pelos Deputados Federais.
12.
Todavia, assiste razão à unidade técnica, ao asseverar que as lacunas das normas então vigentes
não autorizavam a prática de atos com desvio de finalidade, em desrespeito aos princípios basilares da
legalidade, da moralidade e da finalidade (ou impessoalidade). São princípios de raiz constitucional,
com força normativa. Por isso devem ser respeitados.
13.
Assim, acolho as propostas da 3ª Secex quanto à necessidade de apuração, pela Câmara dos
Deputados, dos fatos noticiados nesta representação, fazendo-o com os pertinentes ajustes de forma.
17
14.
Observo que, a teor do art. 8° da Lei 8.443/92, c/c o art. 1º, caput, §3º2, da Instrução Normativa
TCU 56/2007, compete à autoridade administrativa responsável a adoção das providências iniciais
para a “apuração dos fatos, identificação dos responsáveis, quantificação do dano e obtenção
do ressarcimento”, devendo instaurar a competente tomada de contas especial apenas quando
“esgotadas as medidas administrativas internas sem obtenção do ressarcimento pretendido3”. Assim,
mostra-se pertinente determinar que a Câmara dos Deputados proceda à apuração dos fatos pontuais
noticiados na representação, nos termos do art. 8° da Lei 8.443/92, c/c art. 1º da IN TCU 56/2007.
15.
Nesse diapasão, ressalto que a busca de ressarcimento das despesas eventualmente
impugnadas, a ser determinada à Câmara dos Deputados, deve alcançar também os fatos objeto da
sindicância instituída mediante a Portaria nº 52/2009-DG, versada no Processo nº 112.498/2009-CD (§
49, letra “d”, da instrução reproduzida no Relatório) e as ocorrências enfocadas no Inquérito Civil n°
1.16.000.002149/2005-21, instaurado pela Procuradoria da República no Distrito Federal (§ 49, letra
“e”, da instrução da 3ª Secex).
16.
No tocante à recomendação para que a Câmara dos Deputados busque obter, junto às
empresas aéreas, o benefício decorrente dos programas de milhagem, entendo que tal providência seria
inócua, pois, conforme demonstrado tanto no Acórdão nº 1606/2007 – Plenário quanto na resposta do
órgão à diligência formulada neste processo, essa espécie de bônus é fruto de uma política empresarial
de captação de passageiros, não existindo, em nível federal, norma que obrigue o crédito do benefício
à pessoa jurídica pagadora. Por outro lado, registro a existência de dois projetos de lei na Câmara dos
Deputados que disciplinam a matéria, buscando viabilizar o uso do benefício pelo Poder Público (PL
156/2007, do Deputado Sérgio Barradas Carneiro; e PL 544/2007, do Deputado Augusto Carvalho,
apensado ao primeiro).
17.
Por fim, quanto ao mérito da representação, divirjo da unidade técnica por considerar
que o feito é parcialmente procedente, haja vista que parte das questões suscitadas foi considerada
elidida pela própria unidade intrutiva (cf. §§ 10 e 49, letra “c”, da instrução reproduzida no Relatório).
Diante do exposto, Voto por que seja adotado o Acórdão que ora submeto à apreciação
deste Colegiado.
TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 14 de outubro de
2009.
RAIMUNDO CARREIRO
Relator
2 Art. 1º Diante da omissão no dever de prestar contas, da não comprovação da aplicação de recursos repassados pela União mediante
convênio, contrato de repasse ou instrumento congênere, da ocorrência de desfalque, alcance, desvio ou desaparecimento de dinheiros,
bens ou valores públicos, ou de prática de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano à administração pública federal, a
autoridade administrativa federal competente deve adotar providências para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis,
quantificação do dano e obtenção do ressarcimento.
(...)
§ 3º Esgotadas as medidas administrativas internas sem obtenção do ressarcimento pretendido, a autoridade administrativa
federal competente deve providenciar a imediata instauração de tomada de contas especial, observado o disposto nesta
Instrução Normativa.
3 No mesmo sentido dispõe o §1º do art. 3º da citada instrução normativa.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 009.647/2009-4
ACÓRDÃO Nº 2426/2009 – TCU – Plenário
1. Processo TC 009.647/2009-4
2. Grupo II - Classe de Assunto: VII – Representação
3. Interessada: 3ª Secex
4. Entidade: Câmara dos Deputados
5. Relator: Ministro Raimundo Carreiro
6. Representante do Ministério Público: não atuou
7. Unidade Técnica: 3ª Secex
8. Advogado constituído nos autos: não há
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação formulada por unidade técnica
deste Tribunal, em face de notícias, em matérias jornalísticas, acerca de irregularidades na concessão e
na utilização da cotas de passagens aéreas de membros da Câmara dos Deputados.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária,
ante as razões expostas pelo Relator, em:
9.1 conhecer a presente representação, nos termos do art. 237, inciso VI, do Regimento Interno deste
Tribunal, para, no mérito, considerá-la parcialmente procedente;
9.2 determinar à Câmara dos Deputados, nos termos dos arts. 5º, §1º, e 8º, da Lei n° 8.443/92, c/c art.
1º da Instrução Normativa TCU n° 56/2007, que:
9.2.1 prossiga com a apuração dos fatos noticiados na presente representação, quanto à utilização
irregular da cotas de passagens aéreas de Deputados Federais com finalidade estranha ao objetivo do
mandato e ao interesse público, franqueando aos interessados o direito ao contraditório e à ampla
defesa, nos termos da Súmula Vinculante STF n° 3;
9.2.2 adote as providências cabíveis, nos termos da Instrução Normativa TCU n° 56/2007, para obter
o ressarcimento das despesas eventualmente impugnadas em face da determinação contida no subitem
9.2.1 deste Acórdão, bem como em decorrência das apurações objeto da sindicância instituída
mediante a Portaria nº 52/2009-DG, versada no Processo nº 112.498/2009-CD, e do Inquérito Civil n°
1.16.000.002149/2005-21, instaurado pela Procuradoria da República no Distrito Federal;
9.3 determinar ao Controle Interno do Câmara dos Deputados, nos termos do art. 74, §1º, da
Constituição Federal, que acompanhe as apurações administrativas e as devoluções de recursos
decorrentes das determinações expedidas neste Acórdão, informando ao Tribunal, na próxima tomada
de contas, sobre o resultado das medidas adotadas pelo Órgão, sem prejuízo de eventual representação
a esta Corte de Contas, em cado de omissão dos responsáveis;
9.4 dar ciência deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto que o fundamentam, à Presidência da
Câmara dos Deputados, para adoção das providências cabíveis, e à Procuradoria da República no
Distrito Federal, em subsídio às investigações objeto do Inquérito Civil n° 1.16.000.002149/2005-21;
9.5 arquivar os presentes autos.
19
10. Ata n° 42/2009 – Plenário.
11. Data da Sessão: 14/10/2009 – Ordinária.
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-2426-42/09-P.
13. Especificação do quorum:
13.1. Ministros presentes: Ubiratan Aguiar (Presidente), Valmir Campelo, Walton Alencar Rodrigues,
Benjamin Zymler, Augusto Nardes, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro (Relator), José Jorge e José
Múcio Monteiro.
13.2. Auditores presentes: Marcos Bemquerer Costa, André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira.
UBIRATAN AGUIAR
Presidente
RAIMUNDO CARREIRO
Relator
Fui presente:
PAULO SOARES BUGARIN
Procurador-Geral, em exercício
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GRUPO II – CLASSE VII – PLENÁRIO TC 009.647/2009